Primeira Infância - O impacto da pandemia

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SAÚDE MENTAL

O IMPACTO DA PANDEMIA

Entenda principais desafios e possíveis soluções para problemas emocionais causados pela crise

19 DE DEZEMBRO DE 2022 FORTALEZA - CEARÁ

EXPEDIENTE

PROJETO 1o INFÂNCIA EM PAUTA

Concepção e Coordenação Geral: VALÉRIA XAVIER | Estratégia e Relacionamento: ADRYANA JOCA e DAYVISON ÁLVARES | Análise de Projetos: DAMARIS MAGALHÃES

| Coordenação de Projetos: LELA PINHEIRO | Coordenador Editorial: GIL DICELLI | Editora- executiva: PAULA LIMA

| Editora-adjunta: ANA BEATRIZ CALDAS

| Designer: NATASHA ELLEN | Textos: AMANDA ARAÚJO, ANA BEATRIZ CALDAS e LETÍCIA DO VALE

FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA (FDR)

Presidência: LUCIANA DUMMAR | Direção Administrativo-Financeira: ANDRÉ AVELINO DE AZEVEDO GerênciaGeral: MARCOS TARDIN Gerência Editorial E De Projetos: RAYMUNDO NETTO | Gerência De Audiovisual: CHICO MARINHO | Gerência Educacional: DEGLAUCY JORGE | Gerência De Marketing & Design: ANDREA ARAUJO | Análise De Projetos: AURELINO FREITAS e FABRÍCIA GOIS

Após o período mais rígido de isolamento social e as duras consequências sanitárias, financeiras e emocionais da pandemia de Covid-19, as famílias brasileiras vêm enfrentando uma “nova” pandemia: a de problemas de saúde mental, resultado de uma explosão de casos de depressão, ansiedade e fobia social. Aos poucos, estamos percebendo que o impacto emocional da crise também pode atingir os membros mais jovens das famílias, à medida em que crianças e adolescentes lotam os serviços de saúde em busca de diagnóstico, assistência e apoio psicológico para retomar - ou começar, no caso de crianças na primeira infância - uma vida nos moldes do pré-pandemia.

O projeto “Primeira Infância em Pauta: desafios e oportunidades para o desenvolvimento saudável pós-pandemia” tem como foco a produção e veiculação de conteúdos de fácil assimilação sobre os impactos da pandemia de Covid-19 na saúde emocional, mental e física de crianças de zero a seis anos de idade, apresentando possíveis caminhos para minimizar os efeitos negativos do prolongado isolamento social vivido nos últimos dois anos.

PARA CRESCER COM SAÚDE PROGRAMAÇÃO

Se na vida adulta detectar e cuidar da saúde mental já não é fácil, imagine quando quem enfrenta o problema ainda está se desenvolvendo e encontrando meios de expressar o que sente. Para entender a dimensão do problema e propor soluções, conversamos com especialistas em saúde mental, educação, psicologia e assistência social, que apontaram os desafios e os caminhos possíveis para um desenvolvimento infantil saudável em um cenário de incerteza. Ainda neste material, você confere dicas para compreender quando se deve buscar ajuda profissional, uma lista dos principais direitos das crianças e onde buscar serviços focados na saúde integral dos pequenos. Boa leitura!

O principal objetivo do projeto é fomentar o debate qualificado, com participação de especialistas sobre a primeira infância, gestores públicos, educadores e sociedade civil, sobre os caminhos para propiciar o desenvolvimento sadio na primeira infância, já que é nesse período que que os vínculos e conexões afetivas mais importantes são estabelecidos, e o aspecto cognitivo tem seu crescimento mais acelerado.

CADERNOS ESPECIAIS

19/12 - Impacto emocional e saúde mental da primeira infância pós-pandemia

20/12 - Desafios pós-pandemia da educação na primeira infância

PROGRAMAS DE TV

19/12 - Impacto emocional e saúde mental da primeira infância pós-pandemia

20/12 - Desafios pós-pandemia da educação na primeira infância

21/12 - Desenvolvimento infantil póspandemia

Confira todos os conteúdos do projeto no canal digital: fdr.org.br/primeirainfancia.

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Primeira Infância em pauta APOIO: REALIZAÇÃO:
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Patrocínio: Primeira Infância em pauta

PÓS-ISOLAMENTO

O IMPACTO DA PANDEMIA NA

SAÚDE MENTAL DAS

Mais Infância realiza ações multissetoriais de promoção da saúde

CRIANÇAS

Grande parte das famílias brasileiras foi diretamente impactada pela Covid-19. Além das quase 700 mil perdas humanas, que deixaram o País em um estado permanente de luto, as implicações financeiras da crise ainda repercutem em milhões de lares através da perda de renda, da insegurança alimentar e da violência. Desse modo, não houve como impedir que o impacto da pandemia chegasse aos pequenos. Especialmente durante o período mais rígido de isolamento social, mas também no retorno às atividades presenciais, as crianças têm sofrido com problemas de saúde mental como ansiedade, depressão e estresse – muitas vezes como reflexo dos problemas de saúde mental enfrentados pelos pais ou responsáveis.

Segundo Dagmar Soares, fonoaudióloga, psicopedagoga e coordenadora do programa Mais Infância Ceará, as crianças passaram por uma sobrecarga de informações catastróficas nos últimos meses, o que pode gerar trauma mesmo nos primeiros anos de vida. “Às vezes os adultos acham que as crianças não entendem, mas isso não é real. Na

verdade, elas entendem de uma maneira muito maior, e ouvindo o tempo inteiro sobre morte entenderam que havia um risco de morte iminente”, explica. Dagmar conta que, após enfrentar as restrições impostas pelo isolamento, muitos pequenos tiveram dificuldade de retornar às aulas, especialmente pelo medo de perder um ente querido de repente. As desigualdades sociais também foram acentuadas e, ainda que todas as crianças tenham sido impactadas, a maneira como cada uma sofreu os efeitos da pandemia foi muito particular. “Há uma grande diferença na rotina de crianças que têm casas com milhões de recursos e crianças em situação de vulnerabilidade social. Isso é relevante porque muitas delas passaram pelo menos um terço da vida em isolamento”, completa.

Pautado em políticas integradas de desenvolvimento infantil, o programa Mais Infância Ceará, do Governo do Estado, visa reduzir a desigualdade social e promover a saúde integral das crianças nos 184 municípios cearenses. De natureza multissetorial, ele beneficia cerca de 150 mil famílias e é dividido em quatro etapas: Tempo de Nascer, Tempo de Crescer, Tempo de Aprender e Tempo de Brincar, cada uma com ações específicas voltadas para crianças em situação de vulnerabilidade. De acordo com a Dagmar Soares, o programa atua em diversas frentes, desde o fornecimento do Cartão Mais Infância até projetos como o Criança Feliz, que realiza visitas domiciliares com foco em famílias que possuem crianças de zero a três anos de idade. “Além disso, fazemos capacitações com professores e pais e temos trabalhado muito o tema da saúde mental, para apoiando as crianças no retorno às aulas”.

Especialistas em educação infantil e psicologia afirmam que crise sanitária e econômica ocasionada pela Covid-19 teve efeitos emocionais severos também para os pequenos. Estar atento a mudanças de comportamento é essencial para saber se há algo errado
“Às vezes os adultos acham que as crianças não entendem, mas isso não é real. Na verdade, elas entendem de uma maneira muito maior”
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Primeira Infância em pauta
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Primeira Infância em pauta
DIVULGAÇÃO/MAIS INFÂNCIA CEARÁ

COMO

IDENTIFICAR SE

HÁ ALGO ERRADO

“Quando há algo errado, a criança dá sinais”. É o que afirma Renata Pires, psicopedagoga, psicomotricista relacional e mestre em Psicologia. De acordo com ela, muitos comportamentos que podem parecer “birra” podem ter um significado mais profundo, que mereça atenção dos pais e investigação profissional.

“A criança pode não querer conviver e dar sinais de ansiedade como unhas roídas, mexer em feridinhas o tempo todo, ter comportamentos repetitivos. Ou, ainda, ela pode ficar mais chorosa, irritada, com medo e até mesmo mais agressiva ou com resistência a coisas que ela gostava ou aceitava bem anteriormente, como ir à escola ou estar com os pais”, detalha. Segundo a psicopedagoga, entre os principais problemas de saúde mental na infância que foram acentuados pela pandemia estão a depressão infantil, a ansiedade, a fobia social, a hiperatividade e o transtorno opositivo desafiador.

Os principais sinais para se atentar são:

• Agressividade

• Choro excessivo

• Comportamentos exacerbados

• Comportamentos obsessivos

• Fixação pela rotina

• Mau humor

• Medo de perder

• Muitos pesadelos e/ou terror noturno

• Puxar cabelos e/ou feridas

• Roer as unhas

Ao identificar um ou mais desses sinais, especialmente quando com maior frequência, é preciso buscar auxílio qualificado em instituições de apoio à família, como os postos de saúde, os Centros de Referência da Assistência Social (Cras) e os Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas).

O primeiro passo, no entanto, deve começar em casa. “É preciso ouvir as crianças, deixar esse espaço aberto para a escuta e estimular que elas se expressem de várias formas; através de desenhos, da brincadeira, de conversas. A segunda coisa é falar sobre. Deixar no silêncio é a pior saída, o não dito gera ansiedade e medo”, destaca Renata.

DIAGNÓSTICO

Apesar de haver uma série de fatores emocionais que merecem atenção da família e, muitas vezes, acompanhamento profissional, nem todo problema emocional na primeira infância resultará em um diagnóstico de transtorno mental fechado, definitivo. Isso porque, de acordo com a psicóloga Adriana DallOlio, “as crianças dessa idade ainda estão em um processo de desenvolvimento e têm dificuldade de controlar e administrar suas funções cognitivas e emocionais”. Atualmente, os transtornos mais comumente diagnosticados em crianças são os transtornos de ansiedade, de aprendizagem, de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e o Transtorno do Espectro Autista (TEA). DallOlio reforça, no entanto, que nenhum diagnóstico deve se sobrepor à subjetividade da criança, ou seja, ela não deve ser definida pelo transtorno de saúde mental que enfrenta. Esse é, para Adriana, um dos maiores desafios a ser enfrentado nas áreas da saúde e da educação atualmente, pois há uma alta demanda de crianças que necessitam de serviços de saúde mental na rede pública de saúde.

“Muitas crianças aguardam por atendimento especializados e esse número aumentou significativamente após a pandemia”, destaca. “E identificar os fatores de risco de sofrimento psíquico na infância e/ou na adolescência possibilita o desenvolvimento de tratamentos e intervenções eficazes, que podem minimizar prejuízos ao longo da vida adulta”.

BRINCADEIRA LEVADA A SÉRIO

O acompanhamento do comportamento físico e emocional de uma criança, especialmente nos primeiros anos de vida, é contínuo. Mas, segundo a psicóloga Adriana DallOlio, há um momento em que os pais e responsáveis devem ficar ainda mais atentos, se há suspeita de algum problema de ordem emocional: a hora da brincadeira, quando os sentimentos dos pequenos falam mais alto.

“É preciso estar atento às crianças, ao que elas nos contam, ao que sentem e expressam, seja pela via da fala, do comportamento ou do brincar. Muitas vezes é na hora da contação de história, nos desenhos, nas atividades com os amiguinhos e no brincar que as crianças conseguem expressar o que estão sentindo. Um olhar atento e uma escuta apurada fazem toda a diferença para identificarmos quando algo não vai bem com a criança”, frisa.

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Primeira Infância em pauta Primeira Infância em pauta
INFÂNCIA CEARÁ
Atividade em Praça do Programa Mais Infância Ceará, em Icapuí
DIVULGAÇÃO/MAIS

SERVIÇOS

Todas as pessoas, independente da classe social, têm direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal e elencados no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Embora não se faça distinção entre crianças da primeira, segunda infância ou adolescência, alguns direitos se tornam mais urgentes na primeira infância. Isso porque é nessa fase da vida que as crianças estão se desenvolvendo e precisam de mais cuidados.

DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR

A criança deve crescer dentro de um seio familiar, o qual não necessariamente seja de pais biológicos. "É nessa fase que a criança forma a maioria das sinapses mentais e o desenvolvimento cerebral dela é mais acelerado. Se ela está sendo criada dentro de uma família que tem bons valores humanos, a tendência é que ela leve esse referencial para o resto da vida", explica Lucas Azevedo, do MPCE.

DIREITO À SAÚDE

As crianças na primeira infância devem ter, desde a gestação, um pré-natal de qualidade, um parto em um hospital de referência e consultas de puericultura (subespecialidade da pediatria destinada ao acompanhamento integral do processo de desenvolvimento infantil). “Dentro desse acompanhamento, há a vacinação, transição alimentar, acompanhamento da curva de crescimento e desenvolvimento. Caderneta da Criança, onde há os direitos e o marcos do desenvolvimento”, acrescenta a coordenadora do programa Mais Infância, Dagmar Soares.

DIREITO À PRÁTICA ESPORTIVA

Outro ponto fundamental para o estímulo motor das crianças está relacionado às práticas esportivas. O esporte também é uma forma de prevenir doenças e colaborar com o convívio social, podendo também estar incluído dentro das atribuições da escola.

DIREITO À CULTURA

“É a cultura na perspectiva de as crianças observarem que existem diversidades no nosso mundo, na sociedade. A gente precisa aprender a respeitar, por exemplo, a cultura indígena, os povos indígenas”, cita o promotor de Justiça Lucas Azevedo.

ONDE BUSCAR SERVIÇOS

Postos de saúde

Nos primeiros seis meses, a criança deve ter uma consulta médica por mês, de acordo com o Ministério da Saúde (MS). Do sexto mês de vida aos 12 meses, o bebê precisa fazer pelo menos mais duas visitas. “Ou seja, no primeiro ano são pelo menos oito consultas familiares. No segundo ano, as visitas devem ocorrer de seis em seis meses. Depois do segundo ano, uma vez por ano”, explica Dagmar Soares.

Acesse todos os endereços dos postos na Capital cearense em https://saude. fortaleza.ce.gov.br/postos-de-saude.

Centros de Referência de Assistência Social (Cras)

DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS CRIANÇAS NA PRIMEIRA INFÂNCIA

"O ser humano é bebê de 0 a 2 anos. A primeira infância começa aos 2 anos e vai até 6 anos, 11 meses e 29 dias. Quando se fala da primeira e da segunda infância (época entre os sete e os 12 anos de idade), os direitos são basicamente os mesmos, mas em algumas fases eles são mais marcantes", explica Lucas Azevedo, promotor e coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude (Caopij) do Ministério Público do Ceará (MPCE).

Conheça alguns deles:

DIREITO À EDUCAÇÃO

Além do papel da família na formação educacional, as crianças devem ter acesso à escola para o desenvolvimento de capacidades fundamentais e convívio social. Segundo Lucas Azevedo, é também o espaço onde a criança passa a ter noção de coletividade para além do seu núcleo familiar. Dagmar Soares complementa: “A partir de 4 anos, é obrigatório estar na escola. É dever dos pais, da sociedade e do Estado garantir essa vaga”.

ARTIGO 227 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Ofertam Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (Paif) e o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV). No Cras, os cidadãos também são orientados sobre os benefícios assistenciais e podem ser inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal

Centros de Referência Especializado de Assistência Social (Creas)

Atendimento a famílias e pessoas que estão em situação de risco social ou tiveram seus direitos violados. Oferta Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI), além de informações, orientação jurídica, apoio à família, apoio no acesso à documentação pessoal e estímulo à mobilização comunitária.

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Primeira Infância em pauta Primeira Infância em pauta

COMPORTAMENTO

O IMPACTO DO AFETO NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL SAU DÁ VEL

Indiferença e violência

durante a primeira infância deixam marcas negativas para o resto da vida da criança. Saiba como evitar

Letícia do Vale leticiadovale@opovodigital.com

A primeira infância, período entre zero e seis anos, é o principal momento do desenvolvimento infantil. De acordo com o Ministério da Cidadania, estudos indicam que essa faixa etária corresponde ao período de maiores possibilidades para a formação de competências humanas. Com impactos profundos no futuro do indivíduo, a primeira infância adequada requer que os adultos esqueçam práticas nocivas naturalizadas e entendam verdadeiramente as necessidades infantis.

Quando a criança passa por várias situações que causam níveis de insegurança muito altos, de forma direta ou indireta, esse cenário é chamado de estresse tóxico. Alguns exemplos mais extremos envolvem contextos de abuso sexual, dependência química e agressão física e verbal.

Mas não são apenas essas realidades que podem ser prejudiciais para uma criança. Mesmo as famosas "palmadinhas" aplicadas como castigo devem ser evitadas. "Estudos que analisam o cérebro da criança perceberam que isso é, às vezes, até irreversível. Demanda muito tempo, energia e recurso para fazer com que esse jovem volte a ter autoconfiança", destaca a professora e Cientista Chefe da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap), Márcia Machado. Para a profissional, os limites na educação infantil são essenciais e devem ser estabelecidos por meio da conversa, e não da violência.

Assim, o primeiro passo para evitar o cenário de estresse envolve estímulos de voz ainda durante a gravidez e o ato de dar colo para o bebê. Para o presidente do Instituto Primeira Infância (Iprede), Sulivan Mota, o vínculo entre o indivíduo e a família deve ser o primeiro fator garantido para

o desenvolvimento adequado. Esse incentivo é responsável por estímulos cerebrais essenciais para a criança, representando segurança, apoio e afeto.

“Um adulto que tem vínculo com a criança cuida dela em todos os aspectos. Quando a criança vive em estado violência ou indiferença, sem toque e afeto, é o que nós chamamos de estresse tóxico. No estresse tóxico, ela não recebe estímulo e, se receber, dificilmente vai aproveitar”, destaca.

Sulivan também pontua a importância de escutar a opinião da criança e valorizar suas atitudes, como meio de elevar a autoestima e sedimentar o desenvolvimento na construção da segurança. O especialista alerta, ainda, sobre a dificuldade de quebrar o ciclo de atitudes nocivas, já que, muitas vezes, os adultos responsáveis

pela criança estão apenas reproduzindo as próprias vivências. "A gente tem que conversar com esse adulto para que ele aprenda a conversar com a criança", indica.

Já um ponto destacado por Márcia é o perigo de terceirizar a educação da criança para a escola. Segundo a professora, o envolvimento da família é necessário, uma vez que as crianças costumam copiar os comportamentos vistos em casa.

CONSEQUÊNCIAS DO ESTRESSE TÓXICO

O acúmulo de situações muito adversas na infância faz com que a criança não se sinta segura e amada, favorecendo o desenvolvimento de um indivíduo mais violento, garante Márcia. Além disso, um contexto de interações saudáveis insuficientes, sem estímulos e construção de vínculo, pode afetar diretamente o desenvolvimento cognitivo da criança ao longo dos anos. Sulivan exemplifica: “A criança que, aos três anos, recebe estímulo e vínculo com sua família, é para ter três mil vocábulos registrados no cérebro. Se não recebe estímulo, ela tem só mil vocábulos. Quando chegar aos dez anos, ela terá um terço dos vocábulos que deveria ter. Na vida adulta isso significa que ela não vai saber argumentar, vai ter um déficit de planejamento muito grande e vai ser mais facilmente manipulada. Isso só no lado da linguagem. Nós somos o que recebemos na primeira infância”.

COMO IDENTIFICAR PROBLEMAS NO DESENVOLVIMENTO

A partir do acúmulo de atitudes diversas, os sinais negativos começam a comprometer o comportamento das crianças. Atitudes que merecem atenção envolvem características como a criança estar calada demais, não questionar nada, bater, morder ou gritar com outras pessoas com muita frequência, além de mudanças bruscas de personalidade (de extrovertida para mais introvertida, por exemplo).

MARCOS DO DESENVOLVIMENTO

Os marcos do desenvolvimento descrevem diversas habilidades que devem ser atingidas pela maioria das crianças em determinada idade. Eles envolvem questões de cognição, socialização, capacidade motora, entre outras. Com base nesses marcos, é possível identificar algum déficit e, então, promover um diagnóstico e um tratamento mais eficiente. Um importante aliado na luta por um acompanhamento regular infantil é a Caderneta da Criança, produzida pelo Ministério da Saúde e distribuída em maternidades e hospitais. Além das vacinas, a ferramenta lista todos os marcos do desenvolvimento para cada idade e orienta como analisá-los.

A GERAÇÃO DAS TELAS

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomenda que crianças com menos de dois anos não sejam expostas a telas de forma alguma, enquanto crianças até seis anos podem ser expostas por até, no máximo, duas horas por dia. Para o psiquiatra Rodrigo Freitas, o uso excessivo de telas está ligado ao prejuízo cognitivo e de concentração e, por isso, é essencial que os pais busquem, ainda durante a primeira infância, o estímulo com as crianças fora do mundo virtual.

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