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Introdução

Quando o Plano de Atividades para 2020 foi definido, ninguém poderia prever ou antecipar o que viria a marcar de forma indelével este ano. Um acontecimento inesperado, de contornos imprevisíveis face à sua evolução, e sentido à escala mundial com interferência direta no quotidiano de todos, condicionando os ritmos de vida, da micro à macro escala, do indivíduo ao coletivo, da esfera do privado à esfera pública. A indefinição que acompanhou a gradual propagação do coronavírus SARS-CoV-2 até à efetiva declaração de uma pandemia, com aplicação de medidas de mitigação mais ou menos severas, mas com sucessivos ajustamentos e sempre indefinidas quanto ao seu impacto e duração, criou um estado de permanente alerta, inquietude e incerteza. E se a indefinição se impôs no imediato, muito mais impeditiva se tornou da proposição ou reformulação fiável de planos com alcance a médio e longo prazo. Perante a restrição à circulação, o afastamento social, a adoção de regras duras de convívio interpessoal ou até períodos da sua interdição, uma parte substancial das metas propostas para este ano de 2020, desde logo, cumprimento do calendário previsto, ficou suspensa. No entanto, este não poderia significar um cenário de imobilidade e a Fundação Marques da Silva fez o que lhe cumpria: reinventar-se em tempos de pandemia, continuando a cumprir a sua missão. Ainda que por caminhos mais tortuosos, mais cintados no tempo, acabou por conseguir pôr em marcha os principais projetos a que se tinha proposto, abrindo as portas do Palacete Lopes Martins e da Casa-Atelier José Marques da Silva com duas exposições impactantes, com um horário que permitia o acolhimento de visitantes em termos regulares, de segunda a sábado.

Ampliar a visibilidade pública da instituição, numa demonstração de capacidade expositiva própria, para dar a conhecer ao público em geral a riqueza do património documental, arquitetónico, bibliográfico e artístico que distingue esta Fundação era o objetivo do segundo de três eixos de ação do programa lançado em 2019 e a exposição “Mais que Arquitetura” um dos instrumentos para o atingir.

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Veio na sequência da requalificação e reorganização funcional dos espaços onde se encontra localizada a instituição (Porto: Casa-Atelier José Marques da Silva, Palacete Lopes Martins, Pavilhão e Jardins), com vista a ampliar a sua capacidade de preservação e tratamento documental. Seguir-se-á a outra linha de ação, voltada para o desencadear de incentivos à investigação e a promoção de redes de estudo e cooperação de alcance internacional. Em síntese: Tratar, Estudar, Mostrar para conhecer, respeitar, valorizar. A forma articulada como estes três vetores interagem tem estado sempre presente no plano estratégico da instituição definine o sucesso do seu modus operandi. A sua operacionalização vai exigindo ou conformando contextos e circunstâncias que potenciam um ou outro destes domínios de ação. Para 2020, estava em curso a abertura à comunidade dos espaços. Como já se referiu, o objetivo foi alcançado e mesmo sob uma pandemia, o público respondeu a esse repto, tal como a imprensa que também noticiou em larga escala as duas exposições, “Mais que Arquitetura” e “Siza: Inédito e Desconhecido”.

Estas duas experiências permitiram à Instituição testar a sua capacidade de resposta a um novo desafio, medir condicionalismos próprios dos espaços onde decorreram, desenvolver um plano de acolhimento público em moldes regulares, capacitar recursos humanos e ampliar a visibilidade pública. Em paralelo com esta prova de dinamismo e de vontade de crescimento futuro, preparou território para a construção de um edifício de raiz nos jardins da Fundação, a partir de um estudo de Álvaro Siza, cuja maquete se expôs na Casa-Atelier, destinado a um Centro de Documentação que acolherá conjuntamente os arquivos de arquitetura da Fundação Marques da Silva e da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto. Desta forma, assinalou-se também, simbolicamente, a passagem dos 150 anos do nascimento da sua figura tutelar, José Marques da Silva.

Num ano atípico, como foi o de 2020, com o mundo digital a contrapor-se ao mundo real, era inevitável reformular as atividades em função desta nova realidade. Era preciso reagir a tempo e ao tempo. Os períodos de confinamento transformaram-se em oportunidades de tratamento: primeiro, de um ponto de vista intelectual, depois, para dar lugar à implementação de projetos de higienização e digitalização que um quotidiano corrente dificilmente viabilizaria num tempo tão curto. Os números que este relatório assinala dão conta da sua dimensão, com mais de 20.000 documentos do acervo de Raúl Hestnes Ferreira tratados e a produção de mais 8.000 novas imagens digitais de documentos transversais a 12 acervos de arquitetura em arquivo. Ações essenciais de prevenção da documentação física e que potenciam a sua consulta e divulgação pública.

Contudo, não foram apenas estes projetos em larga escala que foram implementados. O trabalho de atualização do Arquivo Digital foi continuado e conta agora com mais sete sistemas de informação disponíveis para consulta pública. Foi também continuado o trabalho de descrição e inventariação arquivística de acervos recentemente incorporados e de nova documentação que também 2020 voltou a registar. Carlos Carvalho Dias, após uma primeira doação dos registos relativos à sua participação no Inquérito à Arquitetura Popular, doou agora o seu arquivo e biblioteca

profissionais, validando assim a sua confiança no trabalho que esta instituição tem vindo a desenvolver, e Abílio Mourão ampliou igualmente o acervo de José Porto, com a doação de novos desenhos da autoria deste arquitecto.

Algumas ações do plano de atividade proposto para 2020 passaram para as plataformas virtuais, outras, como a Conferência Arquiteto Marques da Silva, ficaram suspensas. Decidiu-se não se desvirtuar a natureza de uma iniciativa que tem na celebração do encontro, no seu acontecer em espaço de academia - que também é herança de Marques da Silva - a sua marca identitária. A conferência que deveria ter acontecido em novembro, “Resiliência”, a proferir por Inês Lobo acontecerá em 2021. Em contrapartida, novos conteúdos foram preparados com o propósito de circularem no mundo virtual, desde registos fotográficos e videográficos, ao lançamento de dois podcast em parceria com a Casa Comum da Reitoria da Universidade do Porto: “Escritos Escolhidos” e “Passa-a-Palavra: falemos de arquitetura”.

Em 2020, também a produção editorial demonstrou a sua vitalidade com a publicação de novos títulos de grande significado no contexto da Fundação, como é o caso do arranque da coleção As raízes e os Frutos, projeto editorial com investigação, organização e notas de Manuel Mendes, a publicação do 7.º volume da coleção Conferências Arquiteto Marques da Silva, ou o lançamento de três Mapas de Arquitetura em colaboração com a OASRN, entidade com a qual foi ainda realizada a 16.ª edição do Prémio Fernando Távora.

O distanciamento físico não invalidou, assim, nem o atendimento a investigadores, nem a prossecução do trabalho em rede, mantendo-se a cooperação com várias instituições que partilham interesses e áreas de atuação com a Fundação Marques da Silva, como a já citada OASRN, a FAUP, ou o Departamento de Arquitetura da Universidade de Coimbra, entre outras que o presente relatório irá reportar. O inusitado estimulou a imaginação e desafiou a capacidade de ajustamento a novos contextos. Flexibilizaram-se modos e agendas, manteve-se o rigor, a exigência e a confiança no futuro.

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