Livros que amei

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FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO PRESIDENTE José Roberto Marinho SECRETÁRIO GERAL Hugo Barreto SUPERINTENDENTE EXECUTIVO Nelson Savioli GERENTE GERAL DE EDUCAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO Vilma Guimarães GERENTE GERAL DO CANAL FUTURA Lúcia Araújo

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pROGRAMA 2 | ManaĂ­ra Carneiro

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APRESENTAÇÃO PROFESSOR, PROFESSORA Quem entre nós não guarda a lembrança de pelo menos uma leitura que tenha sido transformadora? Você se lembra de uma história, uma frase, um personagem, um lugar que, como mágica, saltou das páginas impressas e passou a fazer parte de sua história, de como pensa e como vive? A literatura é uma linguagem aberta que proporciona, a cada indivíduo, associar o texto lido às suas próprias vivências e emoções e transformá-lo, assim, em uma experiência totalmente particular. Mas para se apreciar o que se lê, é necessário atribuir-lhe sentido – entender, ler as entrelinhas, relacionar e deduzir. É também preciso criar, criticar e partilhar sentidos e experiências. O significado do que se comunica em um texto verbal vai além do que está escrito e depende da maneira pela qual cada leitor apreende o que é transmitido. Por isso, a apreensão da mensagem varia entre as pessoas, depende da vivência de cada um e do conhecimento que tem do mundo. Depende até mesmo do momento em que se dá o ato de comunicação. Livros que Amei é uma série de programas do Canal Futura sobre a paixão de várias pessoas músicos, escritores, pesquisadores e artistas - por livros que marcaram suas vidas. Essas pessoas compartilham lembranças relacionadas à leitura, hábitos e preferências literárias, revelando, cada uma, por meio de três obras de estilos, épocas e temas variados, como foram fundamentais na sua formação, o papel que tiveram na transformação de seu modo de pensar ou marcas que deixaram em suas vidas. A série conta ainda com a participação de profissionais do mercado editorial e de especialistas em áreas como história, filosofia e crítica literária, os quais comentam os livros escolhidos e as trajetórias de seus autores, contextualizando as publicações e destacando suas particularidades.

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Este Caderno é direcionado aos professores que venham a trabalhar com a série Livros que Amei, com o objetivo de ajudar estudantes a reencontrar o prazer da leitura. Aqui, são apresentadas informações sobre cada um dos leitores entrevistados, bem como trechos dos livros e as biografias de cada um dos quase 40 escritores mencionados na série. São também reproduzidos trechos das obras apresentadas, a fim de levá-los a captar um pouco do espírito dos livros citados nos programas. Os professores encontrarão também referências bibliográficas das obras que integram a série Livros que Amei. Trabalhar textos literários, comparando-os ou aproximando-os de outros gêneros de textos verbais, e até não verbais, ajuda a desenvolver o gosto por nossa cultura, além de levar a uma maior intimidade com a língua portuguesa. Sendo a língua o instrumento que o homem tem para entrar em contato com o mundo que o cerca, ela também lhe possibilita atuar nesse meio, interagir, dar opinião, discordar, vivenciar. Ao melhorarmos a capacidade de nossos estudantes no uso do português (lendo, ouvindo, falando ou escrevendo) estamos, certamente, contribuindo para que vivam melhor. A série Livros que Amei é uma viagem ao mundo da literatura na companhia de cada uma das personalidades e seus livros mais amados. Um exemplo vivo do gostar, compreender e compartilhar que pode proporcionar a leitura. Esperamos que essa seja mais uma aventura transformadora para vocês, professores e professoras, e para seus estudantes.

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A LEITURA cOMO ExPRESSÃO DA VIDA Tenório Telles

Refletindo sobre o ato de ler e suas consequências para a vida do ser humano, pergunto-me: como viver sem ler? Convenço-me a cada dia de que a leitura é uma necessidade existencial. Ser leitor é muito mais do que uma relação instrumental com a palavra, é um ato que extrapola o texto e se projeta no mundo. É por isso que todo diálogo com a palavra resulta num diálogo com a realidade e sua complexidade. Com a vida e os homens. O conhecimento é mais que uma necessidade ditada pelas demandas profissionais e sociais, é uma condição para a existência. Uma pessoa que não lê não estuda. É alguém condenado a ser escravo da sua ignorância e de todos os oportunistas que tripudiam sobre a ingenuidade e a estupidez dos incautos. Numa sociedade de sabedoria, de pessoas esclarecidas e críticas, não há lugar para esse tipo de gente, que vive da cegueira e da alienação daqueles que abdicaram de Ser, de se afirmar criticamente no mundo e, assim, instituir a própria singularidade. A leitura é um antídoto para essas mazelas. Uma pessoa que lê desenvolve aptidões e capacidades que a tornam diferente. Nisso consiste a força transformadora da leitura. Todo aquele que aprende a amar os livros e o saber se distingue pelo senso de responsabilidade, pela consciência social e atitude generosa em relação ao próximo. Esse sentido e essa sensibilidade conduzem seu espírito a uma postura de compaixão e compromisso com a vida, com a justiça e com a possibilidade de construção do novo. Isso talvez explique a negligência com que as elites têm tratado o direito de acesso da sociedade à informação e ao livro. Sem falar que, como não leem, não o consideram relevante. Nisso está provavelmente uma das razões do nosso atraso e indigência. Ler e escrever são experiências definitivas na vida do ser humano e da sociedade. Lemos para viver, para sentir prazer e encontrar um sentido para o nosso existir. O que pode ser mais prazeroso que a leitura de um belo texto? Ou revelador que a força iluminadora de um poema? Só o cultivo do espírito nos redime e nos salva do absurdo de existir num mundo indiferente ao bem e ao belo. A criação é a outra face dessa busca por um sentido novo para a existência. O prazer de conceber um poema, uma canção, um romance é uma experiência indescritível e enriquecedora. A verdade é que, ao criar, o artista também se cria e transforma e, assim, contribui para iluminar a vida dos outros. Por isso, trabalhar pela formação de leitores é mais que um desafio, é um compromisso daqueles que têm responsabilidade com a vida, com o ser humano e com o futuro.

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O livro venceu seus desafios e não vemos como, para o mesmo uso, poderíamos fazer algo melhor que o próprio livro. Talvez ele evolua em seus componentes, talvez as páginas não sejam mais de papel. Mas ele permanecerá o que é. Umberto eco, in Não contem com o fim do livro.

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FAUSTO FAwcETT

apresenta os livros Que amou Quem comenta

VOcê cONHEcE Fausto Fawcett?

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Trópico de Capricórnio Henry Miller Breviário da decomposição Emil cioran Eu e outras poesias Augusto dos Anjos

Luiz Carlos Maciel jornalista, escritor e roteirista José Thomaz Brum filósofo, professor e tradutor de obras literárias e filosóficas

O jornalista, autor teatral, escritor, roteirista e compositor brasileiro Fausto Fawcett nasceu na cidade do Rio de Janeiro em maio de 1957. Seus três principais álbuns gravados, Fausto Fawcett e os Robôs Efêmeros (1987), Império dos Sentidos (1989) e Fausto Fawcett e Falange Moulin Rouge (1993), foram realizados em parceria com o músico e compositor Carlos Laufer. Fausto Fawcett também publicou três livros: Santa Clara Poltergeist (1990), também transformado em show, Básico Instinto (1992), e Copacabana Lua Cheia (2000). Surgiu na noite carioca encenando esquetes que misturavam teatro, música e poesia, então muito em voga na cidade. Seu maior êxito

nas rádios foi com a canção Kátia Flávia - A Godiva do Irajá, de 1987, um dos primeiros raps brasileiros. A música foi trilha sonora de novela e também tocou no filme Lua de Fel (1992), dirigido por Roman Polanski. A canção foi regravada 10 anos depois por Fernanda Abreu. Da sua parceria com a cantora e com Laufer nasceu outro grande sucesso, a canção Rio 40 Graus, de 1993, também ouvida na trilha do filme Tropa de Elite (2007), de José Padilha. Fausto Fawcett expressa em suas letras a convivência íntima entre os símbolos da brasilidade, a avalanche pop e os avanços da mídia e da tecnologia, transformando as mazelas da cidade do Rio de Janeiro em poesia.

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pROGRAMA 1 | Fausto Fawcett

DEGUSTANDO

trópico de capricórnio, de Henry Miller

Eu era uma contradição em essência, como dizem. As pessoas me julgavam sério e nobre, ou alegre e irresponsável, ou sincero e grave, ou negligente e descuidado. Eu era tudo isso ao mesmo tempo — e além disso, eu era mais uma coisa, uma coisa que ninguém desconfiava, muito menos eu. Quando menino de seis ou sete anos, sentava-me à bancada de trabalho de meu avô e lia para ele enquanto ele costurava. Lembro-me vividamente dele nesses momentos em que, apertando o ferro quente sobre a costura de um paletó, punha uma das mãos sobre a outra e olhava sonhadoramente pela janela. Lembro-me da expressão do seu rosto, ali parado a devanear, melhor que o conteúdo dos livros que eu lia, melhor que as conversas que tínhamos ou minhas brincadeiras na rua. Eu ficava imaginando com o que ele sonhava, o que o puxava para fora de si mesmo. Ainda não aprendera a sonhar de olhos abertos. Era sempre lúcido, presente e inteiriço.

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Os devaneios dele me fascinavam. Eu sabia que ele não tinha ligação com o que fazia, não dava a mínima para nenhum de nós, era só, e sendo só, era livre. Eu jamais estava só, menos ainda quando sozinho. Parece-me que sempre vivia acompanhado: como um farelo num queijo grande, que era o mundo, creio, embora eu jamais parasse para pensar nisso. Mas sei que jamais existi separadamente, jamais me julguei o grande queijo, por assim dizer. De modo que, mesmo quando tinha motivo para estar infeliz, me queixar, chorar, tinha a ilusão de participar de uma infelicidade comum, universal. Quando eu chorava, o mundo todo chorava — assim eu imaginava. Raras vezes eu chorava. Na maioria do tempo era feliz, ria, me divertia. Divertia-me porque, como disse antes, realmente estava cagando para tudo. Estava convencido de que, se as coisas davam errado comigo, davam errado em toda parte. E em geral, as coisas só davam errado quando a gente se preocupava demais.

SE qUISER LER MAIS, procure Miller, Henry. Trópico de Capricórnio. Trad. Marcos Santarrita e Angela Pessoa. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 8ª ed., 2008.

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SOBRE

Henry Miller Filho de pais alemães, Henry Valentine Miller nasceu em dezembro de 1891, em Nova Iorque (EUA). Seu pai era um pobre alfaiate do Brooklyn, bairro onde cresceu e exerceu diversas profissões, lutando contra a mediocridade e a pobreza. Foi lixeiro, coveiro, vendedor de livros e empregado de uma companhia de telégrafos. Em 1924, deixou seu emprego para se dedicar à literatura. Mudou-se para Paris em 1930 e, convivendo com outros norte-americanos que haviam escolhido a cidade para viver, sofreu privações econômicas, compensadas para ele pela liberdade moral dos franceses. Tornou-se amigo de expoentes da cultura da época, como o romancista, poeta e dramaturgo inglês Lawrence Durrell e a escritora Anaïs Nin, de quem foi amante. Anaïs Nin ajudou-o a publicar Trópico de Câncer, seu primeiro livro, em 1934, além de Primavera Negra (1936) e Trópico de Capricórnio (1939). Seu estilo é caracterizado pela mistura da autobiografia com a ficção. Voltou aos EUA por causa da Segunda Guerra. Seus livros foram proibidos no país, sob acusação de obscenidade. Na década de 1960, com suas reivindicações de liberdade sexual, a juventude norte-americana passou a ver em Miller um grande autor, quase um guia. A trilogia autobiográfica Sexus (1949), Plexus (1952) e Nexus (1959) foi liberada em 1964, após uma série de processos judiciais. Morreu em 1980, em Los Angeles (EUA).

Interessante No Brasil, Trópico de Capricórnio foi publicado junto com Trópico de Câncer, em 1963. Ambos foram apreendidos pela Polícia de costumes, três anos depois, em plena ditadura militar.

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pROGRAMA 1 | Fausto Fawcett

DEGUSTANDO

Breviário de decomposição, de eMil Cioran O antiprofeta Em todo homem dorme um profeta e, quando ele acorda, há um pouco mais de mal no mundo... A loucura de pregar está tão enraizada em nós que emerge de profundidades desconhecidas ao instinto de conservação. Cada um espera seu momento para propor algo: não importa o quê. Tem uma voz: isto basta. Pagamos caro não ser surdos nem mudos... Dos esfarrapados aos esnobes, todos gastam sua generosidade criminosa, todos distribuem receitas de felicidade, todos querem dirigir os passos de todos: a vida em comum torna-se intolerável e a vida consigo mesmo mais intolerável ainda: quando não se intervém nos assuntos dos outros, se está tão inquieto com os próprios que se converte o “eu” em religião ou, apóstolo às avessas, se o nega: somos vítimas do jogo universal... A abundância de soluções para os aspectos da existência só é igualada por sua futilidade. A História: manufatura de ideais..., mitologia lunática, frenesi de hordas e de solitários..., recusa de aceitar a realidade tal qual é, sede mortal de ficções... A fonte de nossos atos reside em uma propensão inconsciente a nos considerar o centro, a razão e o resultado do tempo. Nossos reflexos e nosso orgulho transformam em planeta a parcela de carne e de consciência que somos. Se tivéssemos o justo sentido de nossa posição no mundo, se comparar fosse inseparável de viver, a revelação de nossa ínfima presença nos esmagaria. Mas viver é estar cego em relação às suas próprias dimensões...

SE qUISER LER MAIS, procure cioran, Emil. Breviário de decomposição. Trad. José Thomaz Brum. Rio de Janeiro: Rocco, 2011.

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SOBRE

eMil Cioran

Tornou-se agnóstico e tinha como princípio "a inconveniência da existência". Após estudar Ciências Humanas no colégio Gheorghe Lazar, em Sibiu, foi viver em Bucareste, capital da Romênia, onde estudou Filosofia e Letras. Na universidade, aproximou-se do dramaturgo Eugène Ionesco e de Mircea Eliade, professor, historiador das religiões, mitólogo, filósofo e romancista romeno. Junto a esses e outros companheiros filósofos,

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historiadores, cientistas, jornalistas, críticos e escritores, participou de uma corrente existencialista. É considerado um dos maiores escritores da prosa em língua francesa e chamado pela crítica, entre outros epítetos, de "pensador crepuscular", "arauto do pessimismo", "cínico fervente", "cavaleiro do mau-humor". Escrevia sobre os temas que o atormentavam: a solidão, o tédio, a morte, o sofrimento, o ceticismo e a fé, Deus e o problema do mal. Em 1937, mudou-se para Paris para desenvolver uma tese sobre o filósofo e diplomata francês Henri Bergson. Não terminou sua tese, mas acabou decidindo viver em Paris. Após seis livros escritos em romeno e publicados em seu país de origem, Cioran adotou então o francês como língua oficial. Breviário da Decomposição, publicado em 1949, foi seu primeiro livro no idioma e foi condecorado com o Rivarol Prize em 1950. Mais tarde, Cioran passou a recusar todos os prêmios literários que lhe eram conferidos. Viveu a maior parte de sua vida isolado, evitando o contato com o público. Faleceu em Paris, em 1995, acometido de Alzheimer.

Interessante

O escritor romeno Emil Cioran nasceu em abril de 1911, no pequeno vilarejo de Rasinari, Condado de Sibiu, na Transilvânia, que fazia parte do território Austro-Húngaro na época. Foi o segundo filho de um casal de religiosos; a linhagem da sua mãe era considerada de nobres. Seus primeiros estudos concentraram-se em Immanuel Kant, Arthur Schopenhauer e, principalmente, Friedrich Nietzsche. Na juventude, quando ainda vivia na Romênia, Cioran simpatizava com o nazismo, cujo ideário inspirou seus primeiros textos. Sofria de insônia, o que quase o levou ao suicídio. Desse sofrimento nasceu sua primeira obra, escrita ainda em romeno, Pe Culmile Disperarii (nos cumes do desespero).

Em 1988, Emil cioran e o dramaturgo Eugène Ionesco, que haviam sido banidos da Romênia, foram nomeados membros de honra da União de Escritores Romenos.

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A FONTE DE NOSSOS ATOS RESIDE EM UMA PROPENSÃO INcONScIENTE A NOS cONSIDERAR O cENTRO, A RAzÃO E O RESULTADO DO TEMPO. NOSSOS REFLExOS E NOSSO ORGULHO TRANSFORMAM EM PLANETA A PARcELA DE cARNE E DE cONScIêNcIA qUE SOMOS. SE TIVéSSEMOS O JUSTO SENTIDO DE NOSSA POSIÇÃO NO MUNDO, SE CoMparar FOSSE INSEPARáVEL DE viver, A REVELAÇÃO DE NOSSA íNFIMA PRESENÇA NOS ESMAGARIA.

o anTiprofeTa cIoran

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pROGRAMA 1 | Fausto Fawcett

DEGUSTANDO

eu e outras poesias, de augusTo dos anjos

Versos Íntimos

O morcego

Vês! Ninguém assistiu ao formidável Enterro de tua última quimera. Somente a Ingratidão – esta pantera – Foi tua companheira inseparável!

Meia-noite. Ao meu quarto me recolho. Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede: Na bruta ardência orgânica da sede, Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

Acostuma-te à lama que te espera! O Homem, que, nesta terra miserável, Mora entre feras, sente inevitável Necessidade de também ser fera.

"Vou mandar levantar outra parede..." – Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho, Circularmente sobre a minha rede!

Toma um fósforo. Acende teu cigarro! O beijo, amigo, é a véspera do escarro, A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Pego de um pau. Esforços faço. Chego A tocá-lo. Minh'alma se concentra. Que ventre produziu tão feio parto?!

Se a alguém causa inda pena a tua chaga, Apedreja essa mão vil que te afaga, Escarra nessa boca que te beija!

A Consciência Humana é este morcego! Por mais que a gente faça, à noite, ele entra Imperceptivelmente em nosso quarto!

SE qUISER LER MAIS, procure Anjos, Augusto dos. eu e outras poesias. São Paulo: Martin claret, 2002.

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SOBRE

augusTo dos anjos

Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos, ou simplesmente Augusto dos Anjos, nasceu em abril de 1884 no engenho Pau d'Arco, na Paraíba, numa família de donos de engenhos, e testemunhou a decadência dessa antiga forma de produção e o surgimento das grandes usinas. Foi com seu pai, bacharel, que aprendeu a ler e escrever. Estudou na Faculdade de Direito do Recife e formou-se em 1907, mas nunca trabalhou como advogado. Preferiu lecionar português. No ano de seu casamento, 1910, teve um desentendimento com o governador e foi afastado do cargo de professor do Liceu Paraibano, onde havia estudado. Resolveu então se mudar para o Rio de Janeiro, onde continuou lecionando. Em fins de 1913, foi morar em Leopoldina, MG, por ter sido nomeado para o cargo de diretor de um grupo escolar. Com saúde frágil e sistema nervoso abalado desde muito jovem, quadro agravado pela perda prematura de um filho, morreu de pneumonia aos 30 anos, em 1914. O livro Eu, publicado em 1912, reúne praticamente toda sua obra e foi escrito num momento de transição, pouco antes do ápice do movimento modernista na década de 20. Enriquecido em edições posteriores com outras poesias, o livro passou a ser publicado com o título Eu e outras poesias. Em sua obra, a obsessão pelo “eu” tem papel central e o poeta eleva a dor humana ao reino dos fenômenos sobrenaturais, com uma expressividade trágica. Sua obra representa o sincretismo entre o parnasianismo e o simbolismo.

Interessante conta-se que Augusto dos Anjos compunha seus poemas falando. costumava ficar no quintal de sua casa elaborando seus versos em voz alta. Só depois de considerar pronto um poema é que o passava para o papel.

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A leitura verdadeira me compromete de imediato com o texto que a mim se dá e a que me dou e de cuja compreensão me vou tornando também sujeito. Ao ler não me acho no puro encalço da inteligência do texto como se ela fosse produção apenas de seu autor ou de sua autora. PaUlo FreIre, in Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.

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MANAíRA cARNEIRO

apresenta os livros Que amou Quem comenta

O Manifesto Comunista Karl Marx e Friedrich Engels Antologia Poética Vinícius de Moraes A Via Crucis do Corpo clarice Lispector

Leila Name diretora editorial da Editora Nova Fronteira Eucanaã Ferraz poeta, ensaísta e professor José Castello cronista, biógrafo, romancista, jornalista e crítico literário

VOcê cONHEcE manaíra carneiro?

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Manaíra Carneiro nasceu em 1987, no Rio de Janeiro. Moradora de uma comunidade do bairro de Higienópolis, na zona oeste do Rio, é a mais jovem entre os diretores do longa Cinco vezes favela – Agora por nós mesmos, lançado no ano de 2010. Começou em cinema aos 16 anos frequentando, em sua comunidade, o curso Cinemaneiro, oficinas gratuitas de audiovisual promovidas pela OSCIP Cidadela – Arte, Cultura e Cidadania, onde Manaíra também estagiou em produção. Cursa atualmente graduação em Estudos Culturais e Mídia na Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, e roteiro na Escola de Cinema Darcy Ribeiro, no Rio de Janeiro. Além de

ser integrante da Cidadela, trabalha no Centro Técnico Audiovisual do MinC. Cinco vezes Favela – Agora por nós mesmos é um conjunto de cinco episódios filmados por diretores que vivem em diferentes comunidades cariocas. Produzido por Cacá Diegues e Renata Almeida Magalhães, o filme esteve na Seleção Oficial do Festival de Cannes de 2010 e recebeu diversos prêmios no Festival de Paulínia do mesmo ano: melhor filme de ficção – pelos júris oficial e popular –, melhor atriz e ator coadjuvantes, melhor roteiro, melhor trilha sonora e melhor montagem. O episódio de Manaíra, Fonte de renda, foi codirigido por Wagner Novais.

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pROGRAMA 2 | Manaíra Carneiro

DEGUSTANDO

o maniFesto comunista ,

de Karl Marx e friedriCH engels Horrorizai-vos porque queremos abolir a propriedade privada. Mas em vossa sociedade a propriedade privada está abolida para nove décimos de seus membros. E é precisamente porque não existe para estes nove décimos que ela existe para vós. Acusai-nos, portanto, de querer abolir uma forma de propriedade que só pode existir com a condição de privar de toda propriedade a imensa maioria da sociedade. Em resumo, acusai-nos de querer abolir vossa propriedade. De fato, é isso que queremos. Desde o momento em que o trabalho não mais pode ser convertido em capital, em dinheiro, em renda da terra, numa palavra, em poder social capaz de ser monopolizado, isto é, desde o momento em que a propriedade individual não possa mais se converter em propriedade burguesa, declarais que a individualidade está suprimida. Confessais, pois, que quando falais do indivíduo, quereis referir-vos unicamente ao burguês, ao proprietário burguês. E este indivíduo, sem dúvida, deve ser suprimido. O comunismo não retira a ninguém o poder de apropriar-se de sua parte dos produtos sociais, apenas suprime o poder de escravizar o trabalho de outrem por meio dessa apropriação. Alega-se ainda que, com a abolição da propriedade privada, toda a atividade cessaria, uma inércia geral apoderar-se-ia do mundo. Se isso fosse verdade, há muito que a sociedade burguesa teria sucumbido à ociosidade, pois que os que no regime burguês trabalham não lucram e os que lucram não trabalham. Toda a objeção se reduz a essa tautologia: não haverá mais trabalho assalariado quando não mais existir capital.

SE qUISER LER MAIS, procure Marx, K. E Engels, F. Manifesto Comunista. Trad. álvaro Pina. São Paulo: Boitempo Editorial, 1998.

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SOBRE

Karl Marx e friedriCH engels

O filósofo Karl Heinrich Marx nasceu em Tréveris, Alemanha, em maio de 1818, em uma família de classe média de origem judaica. Estudou Direito e Filosofia nas universidades de Bonn e de Berlim e se tornou doutor com uma tese sobre Demócrito e Epicuro. A política de repressão da monarquia prussiana destruiu seus planos de seguir a carreira de professor universitário. Ele se tornou então jornalista, profissão na qual entrou em contato com as desigualdades e conflitos econômicos, políticos e sociais e com os pensamentos socialistas francês e inglês. Sua atividade jornalística foi reprimida pelo governo prussiano, o que o levou a se exilar no Reino Unido com a família. Lá, deu prosseguimento aos seus estudos de filosofia, história e economia, às suas atividades de jornalista e ativista socialista e conheceu Engels, com quem escreveu suas mais importantes obras.

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Interessante

Marx, profundo valorizador da classe trabalhista, casou sua filha com Paul Lafargue, autor de um livro muito importante que criticava o trabalho e a submissão dos proletários – o direito à preguiça. Há quem diga que Lafargue defendeu o ócio à revelia do sogro comunista; outros, que o panfleto foi elaborado a partir de anotações do próprio filósofo alemão.

Em Londres, Marx aprofundou ainda mais as suas pesquisas e publicou o primeiro volume da sua obra-prima, O Capital: crítica da economia política. Foi lá também que fundou e foi um dos líderes da Associação Internacional dos Trabalhadores, mais conhecida como Primeira Internacional. É considerado pai do socialismo científico, ou marxismo. Seus trabalhos influenciam diversas áreas do saber humano, como a sociologia, a economia, a filosofia e a história. Morreu em Londres, em março de 1883. O filósofo Friedrich Engels nasceu em Barmen, Alemanha, em novembro de 1820. Teórico revolucionário alemão, fundou, junto com Karl Marx, o chamado socialismo científico, ou marxismo, e escreveu livros de profunda análise social. Foi coautor de diversas obras com Marx e também ajudou a publicar, após a sua morte, os dois últimos volumes de O Capital, principal obra de seu amigo e colaborador. Morreu em Londres, em agosto de 1895. O Manifesto Comunista, fruto mais notório da parceria entre Marx e Engels, é um pequeno panfleto publicado em fevereiro de 1848, em Londres, que se tornou uma das obras mais lidas e difundidas em todo o mundo. Passado mais de um século e meio, a atualidade e o vigor desse texto continuam reconhecidos por intelectuais das mais diversas correntes de pensamento.

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pROGRAMA 2 | Manaíra Carneiro

DEGUSTANDO

antologia poética,

de viníCius de Moraes Poética (I)

A rosa de Hiroshima

De manhã escureço De dia tardo De tarde anoiteço De noite ardo.

Pensem nas crianças Mudas telepáticas Pensem nas meninas Cegas inexatas Pensem nas mulheres Rotas alteradas Pensem nas feridas Como rosas cálidas Mas oh não se esqueçam Da rosa da rosa Da rosa de Hiroshima A rosa hereditária A rosa radioativa Estúpida e inválida A rosa com cirrose A anti-rosa atômica Sem cor sem perfume Sem rosa sem nada

A oeste a morte Contra quem vivo Do sul cativo O este é meu norte. Outros que contem Passo por passo: Eu morro ontem. Nasço amanhã Ando onde há espaço: Meu tempo é quando.

SE qUISER LER MAIS, procure Moraes, Vinícius de. antologia poética. São Paulo: companhia das Letras, 2009.

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SOBRE

viníCius de Moraes Marcus Vinicius de Melo Moraes nasceu no Rio de Janeiro, em outubro de 1913. Além de poeta e compositor, Vinícius de Moraes atuou como diplomata, dramaturgo e jornalista. Essencialmente lírico, também conhecido como "poetinha" — apelido que lhe teria atribuído Tom Jobim — , tornou-se conhecido pelos seus sonetos. Mas sua obra também passa pelo teatro, pelo cinema e pela música. Boêmio inveterado, era também um grande conquistador: casou-se nove vezes ao longo de sua vida. Graduou-se em Ciências Jurídicas e Sociais em 1933. Em 1938 ganhou uma bolsa do Conselho Britânico para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford. Ainda na década de 30, estabeleceu amizade com os poetas Manuel Bandeira, Mário de Andrade e Oswald de Andrade. Em 1941, retornou ao Brasil. Trabalhou como crítico de cinema no jornal A Manhã, colaborador da revista Clima, além de trabalhar no Instituto dos Bancários. No ano seguinte, foi reprovado em seu primeiro concurso para diplomata. Em 1943, concorreu novamente e foi aprovado. Assumiu o primeiro posto em 1946, como vice-cônsul em Los Angeles. Com a morte do pai, em 1950, retornou ao Brasil. Ainda na mesma década, atuou como diplomata em Paris e em Roma, onde costumava realizar animados encontros na casa do escritor Sérgio Buarque de Hollanda. Como dramaturgo, começou a se tornar prestigiado com a peça Orfeu da Conceição, em 1954. No mesmo ano, lançou com ajuda de amigos, entre os quais Manuel Bandeira, a coletânea de poemas Antologia Poética. O livro reúne a maior e a melhor parte de sua obra. Sua conhecida carreira musical decolou em meados da década de 1950, época em que conheceu Tom Jobim. Além do maestro, teve como principais parceiros na música Toquinho, Baden Powell, João Gilberto, Chico Buarque e Carlos Lyra. Vinícius morreu no Rio de Janeiro, em julho de 1980.

Interessante Muitos críticos gostam de afirmar que foi a partir das letras de músicas de Vinícius que se passou a fazer comparações entre música e poesia. Depois dele, compositores como chico Buarque, caetano Veloso e Gilberto Gil tiveram suas canções reconhecidas como poesia também.

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pROGRAMA 2 | Manaíra Carneiro

DEGUSTANDO

a via crucis do corpo, de ClariCe lispeCTor

Maria das Dores se assustou. Mas se assustou de fato. Começou pela menstruação que não veio. Isso a surpreendeu porque ela era muito regular. Passaram-se mais de dois meses e nada. Foi a uma ginecologista. Esta diagnosticou uma evidente gravidez. — Não pode ser! gritou Maria das Dores. — Por quê? a senhora não é casada? — Sou, mas sou virgem, meu marido nunca me tocou. Primeiro porque ele é homem paciente, segundo porque já é meio impotente. A ginecologista tentou argumentar: — Quem sabe se a senhora em alguma noite… — Nunca! mas nunca mesmo! — Então, concluiu a ginecologista, não sei como explicar. A senhora já está no fim do terceiro mês. (...) Na rua, de volta para casa, comprou um casaquinho para o bebê. Azul, pois tinha certeza que seria menino. Que nome lhe daria? Só podia lhe dar um nome: Jesus. Em casa encontrou o marido lendo jornal e de chinelos. Contou-lhe o que acontecia. O homem se assustou: — Então eu sou São José? — É, foi a resposta lacônica. Caíram ambos em grande meditação. (...) A uma amiga mais íntima Maria das Dores contou a história abismante. A amiga também se assustou: — Maria das Dores, mas que destino privilegiado você tem! — Privilegiado, sim, suspirou Maria das Dores. Mas que posso fazer para que meu filho não siga a via crucis? — Reze, aconselhou a amiga, reze muito. E Maria das Dores começou a acreditar em milagres. Uma vez julgou ver de pé ao seu lado a Virgem Maria que lhe sorria. Outra vez ela mesma fez o milagre: o marido estava com uma ferida aberta na perna, Maria das Dores beijou a ferida. No dia seguinte nem marca havia. (...) Mas parecia-lhe que se desse à criança o nome de Jesus, ele seria, quando homem, crucificado. Era melhor dar-

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lhe o nome de Emmanuel. Nome simples. Nome bom. Esperava Emmanuel sentada debaixo de uma jabuticabeira. E pensava: Quando chegar a hora, não vou gritar, vou só dizer: ai Jesus! (...) Até que numa noite, às três horas da madrugada, Maria das Dores sentiu a primeira dor. Acendeu a lamparina, acordou São José, acordou a tia. Vestiram-se. E com um archote iluminando-lhes o caminho, dirigiram-se através das árvores para o estábulo. Uma grossa estrela faiscava no céu negro. As vacas, acordadas, ficaram inquietas, começaram a mugir. Daí a pouco nova dor. Maria das Dores mordeu a própria mão para não gritar. E não amanhecia. São José tremia de frio. Maria das Dores, deitada na palha, sob um cobertor, aguardava. Então veio uma dor forte demais. Ai Jesus, gemeu Maria das Dores. Ai Jesus, pareciam mugir as vacas. As estrelas no céu. Então aconteceu. Nasceu Emmanuel. E o estábulo pareceu iluminar-se todo. Era um forte e belo menino que deu um berro na madrugada. São José cortou o cordão umbilical. E a mãe sorria. A tia chorava. Não se sabe se essa criança teve que passar pela via crucis. Todos passam.

SE qUISER LER MAIS, procure Lispector, clarice. a via Crucis do Corpo. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

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SOBRE

ClariCe lispeCTor

Foi aceita pela Escola de Direito na então Universidade do Brasil, em 1939. Frustrou-se com o que aprendia no curso e descobriu um escape: a literatura. Em 25 de maio de 1940, com apenas 19 anos, publicou seu primeiro conto, Triunfo, na revista Pan. Seu primeiro romance, Perto do Coração Selvagem, foi publicado em 1944 e rendeu-lhe, no ano seguinte, um prêmio da Academia Brasileira de Letras. A edição francesa de Perto do Coração Selvagem, de 1954,

teve a capa ilustrada por Henri Matisse. Em 1956, Clarice Lispector escreveu o romance A Maçã no Escuro e começou a colaborar com a revista Senhor, publicando contos. Em 1960 publicou seu primeiro livro de contos, Laços de Família, seguido de A Legião Estrangeira e de A Paixão Segundo G. H., considerado um marco na literatura brasileira. Nos anos 1970, publicou, ainda, Água Viva, A Imitação da Rosa, Onde Estivestes de Noite? e A Via Crucis do Corpo. Este último é um livro composto por 13 contos, sendo o assunto, segundo a própria autora, uma fresta no cárcere social que mantém a mulher supostamente distante de seus desejos, fardos e fantasias. Entre os temas que aborda, estão os delírios da alma marcada pelas experiências da velhice, da morte, do desejo carnal e dos momentos de fracasso. Reconhecida pelo público e pela crítica, em 1976 recebeu o prêmio da Fundação Cultural do Distrito Federal pelo conjunto de sua obra. No ano seguinte publicou A Hora da Estrela, seu último romance, que foi adaptado para o cinema em 1985. Morreu de câncer, na véspera do dia em que completaria 57 anos.

a via crucis do corpo foi adaptada para o cinema por José Antônio Garcia sob o título de o corpo. O filme contou com a participação de Antônio Fagundes, cláudia Gimenez, Marieta Severo e carla camurati.

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Interessante

Haia Pinkhasovna Lispector (Clarice Lispector), nasceu na cidade de Tchetchelnik, Ucrânia, em 1925, enquanto seus pais percorriam várias aldeias por conta da perseguição aos judeus durante a Guerra Civil Russa (1918-1921). Chegou ao Brasil com dois meses de idade. A escritora passou a infância no Recife. Depois da morte de sua mãe, quanto tinha 12 anos, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro. Naturalizada brasileira, sempre que questionada sobre sua nacionalidade afirmava não ter nenhuma ligação com a Ucrânia. Falava vários idiomas, entre eles o francês e o inglês e cresceu ouvindo, no âmbito domiciliar, o iídiche, idioma materno. Começou a escrever logo que aprendeu a ler.

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Todas as histórias do mundo são tecidas com a trama de nossa própria vida. Remotas, obscuras, são mundos paralelos, vidas possíveis, laboratórios onde se experimenta com as paixões pessoais. rIcardo PIglIa, in Formas breves.

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SéRGIO SANT’ANNA

apresenta os livros Que amou Quem comenta

234 Dalton Trevisan Marcel Duchamp: engenheiro do tempo perdido Pierre cabanne Formas breves Ricardo Piglia

Karl Eric escritor, tradutor, pesquisador e professor de literatura Paulo Venâncio Filho crítico de arte, curador e professor

VOcê cONHEcE sérgio sant'anna?

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O escritor Sérgio Sant'Anna nasceu no Rio de Janeiro no ano de 1941. Embora já tenha publicado poesia, peças de teatro, novelas e romances, é considerado primeiramente um contista. Iniciou sua carreira de escritor em 1969, com o livro de contos O sobrevivente, que o levou a participar do International Writing Program (Programa de Literatura Internacional) da Universidade de Iowa, nos Estados Unidos. O escritor teve obras traduzidas para o alemão e o italiano e

adaptadas para o cinema. Recebeu quatro vezes o prêmio Jabuti além de ter sido agraciado com o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) e o segundo lugar no prêmio Portugal Telecom de Literatura. A obra de Sérgio Sant'Anna é conhecida pelo caráter experimental na abordagem de temas urbanos de várias formas diferentes, algumas bastante transgressivas.

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DEGUSTANDO 234,

de dalTon Trevisan

13 Ao ver o pacote de bala azedinha na mão da mulher: - Assim não há dinheiro que chegue. E um pontapé na traseira do piá de três aninhos.

46 Domingo, de volta do futebol, ele serve-se de uma cachacinha, liga o rádio. - Sabe, paizinho ? É o menino de seis anos, todo prosa. - O que, meu filho ? - Essa a música que a mãe dança com o tio Lilo.

110 Na cama, diz o marido: - Você é gorda, sim. Mas é limpa. - ... - Você é feia, certo? Mas é de graça.

SE qUISER LER MAIS, procure Trevisan, D. 234. 2ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2002.

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SOBRE

dalTon Trevisan Reconhecido como um dos mais importantes contistas da literatura brasileira por grande parte dos críticos do país, Dalton Trevisan nasceu em Curitiba, em junho de 1925. Trabalhou durante sua juventude na fábrica de vidros de sua família e formou-se advogado pela Faculdade de Direito do Paraná (atual UFPR), chegando a atuar nessa área por sete anos. Em 1945 estreou com um livro de qualidade incomum, Sonata ao Luar, e no ano seguinte publicou Sete Anos de Pastor. O escritor renega ambos os livros, afirmando não possuir um exemplar sequer dos mesmos. Entre 1946 e 1948 editou a revista Joaquim. Porta-voz de uma geração de escritores, críticos e poetas, a publicação reunia ensaios assinados por expoentes como Antonio Cândido e Mario de Andrade, além de poemas até então inéditos, como O caso do vestido, de Carlos Drummond de Andrade. Além disso, trazia traduções originais de grandes autores como James Joyce, Marcel Proust, Franz Kafka e Jean-Paul Sartre e era ilustrada por artistas renomados como Di Cavalcanti e Heitor dos Prazeres. Em 1959 lançou o livro Novelas Nada Exemplares, que reúne uma produção de duas décadas e rendeu-lhe, pela primeira vez, o Prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro. Conhecido por seu estilo recluso e enigmático, não foi buscar o prêmio. Em 1996, recebeu o Prêmio Ministério da Cultura de Literatura pelo conjunto de sua obra. Seus livros foram traduzidos para os idiomas espanhol, inglês, alemão, italiano, polonês e sueco. A obra 234 é um mosaico composto por narrativas que vão do haicai ao miniconto.

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Interessante O processo de criação das histórias de Dalton Trevisan geralmente tem como matériaprima as notícias de jornal. Ele costuma colecionar recortes para transformar em contos. Trevisan sempre recusou a fama. cria uma atmosfera de suspense em torno de seu nome que o transforma num enigmático personagem. Não informa seu número do telefone, assina apenas "D. Trevis" e não recebe visitas. Enclausura-se em casa de tal forma que recebeu o apelido de “O Vampiro de curitiba”, nome de um de seus livros.

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marcel duchamp: engenheiro do tempo perdido, de pierre CaBanne

Pierre Cabanne: Você se transformou, do dia para a noite, no homem do Nu descendo uma escada. Suas quatro telas foram vendidas e você era famoso. Isto contradiz seu desprendimento... Marcel Duchamp: Isto veio de longe! Não fui à exposição, ainda estava aqui. Apenas recebi uma carta dizendo que minhas telas tinham sido vendidas. Mas o sucesso não era tão importante, era um sucesso local. Não dei muita importância. Deu-me um grande prazer a venda de 240 dólares do Nu. 240 dólares correspondem a 1200 francos-ouro, o preço que eu havia pedido. É o mesmo que 120 000 francos atuais. O que contribuiu para o interesse provocado por esta tela foi o título. Não se faz uma mulher nua que desce uma escada, é ridículo. Não parece ridículo agora, porque já se falou muito sobre isso, mas quando era novo, sobretudo comparado ao nu, parecia escandaloso. Um nu deve ser respeitado. No plano religioso, puritano, também foi ofensivo. Tudo isso contribuiu para a repercussão do quadro. E ainda havia pintores de lá que se opuseram decididamente. Isso desencadeou uma batalha. Eu me aproveitei disso, e é tudo. Pierre Cabanne: Você mesmo, há mais de cinquenta anos atrás, o que pensava deste Nu? Marcel Duchamp: Gostava muito. Ele apareceu mais do que O Rei e a Rainha. Mesmo no sentido antigo, no sentido pictórico da palavra, é bastante denso, bastante compacto, e muito bem pintado, com cores muito sólidas que um alemão havia me dado. Elas se portaram muito bem e isso é muito importante. (...) Pierre Cabanne: Disseram uma vez que você foi o único pintor que despertou todo um continente para uma nova arte.

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Marcel Duchamp: O continente pouco se interessou! Nosso meio era muito restrito, mesmo nos Estados Unidos, você sabe. Pierre Cabanne: Você se dava conta, naquela época, do que representava para os americanos? Marcel Duchamp: Não muito. O aborrecido é que, cada vez que eu encontrava as pessoas, elas me diziam: “Ah! É você que pintou aquele quadro?” A coisa mais engraçada é que durante pelo menos trinta ou quarenta anos a pintura era conhecida, mas eu não. Ninguém conhecia meu nome. No sentido americano, continental, da palavra, Duchamp não queria dizer nada, não havia conexão entre o quadro e eu. Pierre Cabanne: Ninguém relacionava o escândalo ao autor do escândalo? Marcel Duchamp: Nada disso, para eles era tudo igual. Quando me encontravam, diziam: “Ah, sim!”, mas não havia mais que três ou quatro pessoas que sabiam quem eu era, enquanto o quadro ou as reproduções foram vistas por todo o mundo, mas sem saber quem havia pintado. Na realidade, vivi lá sem ser incomodado pela popularidade do quadro, escondido atrás dele, esquecido. Fui completamente esmagado por este Nu. Pierre Cabanne: Isso não correspondia perfeitamente à ideia que você fazia do artista? Marcel Duchamp: Estava encantado. Nunca havia passado por esta situação, ao contrário, ficava irritado quando me falavam que eu tinha que responder às perguntas dos jornalistas.

SE qUISER LER MAIS, procure cabanne, Pierre. Marcel duchamp: engenheiro do tempo perdido. São Paulo: Perspectiva, 2012.

Pierre Cabanne: Como hoje? Marcel Duchamp: Como hoje!

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SOBRE

pierre CaBanne O crítico de arte, jornalista e escritor francês Pierre Cabanne nasceu em Carcassonne, na França, em setembro de 1921 e morreu em Meudon, França, em janeiro de 2007. Ao longo de sua vida, especializou-se em escrever sobre arte, deixando um legado importante em especial para a história da arte contemporânea. Sua obra foi construída sobre um trabalho de pesquisa rigoroso, apoiado em extensa documentação. Em seus livros, entre outros temas, escreveu sobre arte, sobre a relação entre artistas, críticos, colecionadores e entre artistas e escritores, sempre com uma abordagem provocativa e polêmica. Professor da Escola Nacional de Artes Decorativas da França, Cabanne foi também autor de livros populares, como o Guia dos Museus da França, de 1984, no qual apresenta mais de dois mil estabelecimentos, pelo qual recebeu o Prêmio Nacional de Dicionários Guias Turísticos das Artes no ano de 2000.

Pierre cabanne foi um especialista em Pablo Picasso. Deixou uma obra de quatro volumes só sobre o artista, intitulada The age of picasso (A era Picasso), publicada em 1979.

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Interessante

No ano de 1966, Cabanne realizou uma série de entrevistas com o pintor e escultor francês Marcel Duchamp, em seu ateliê em Neuilly, que resultou na publicação do livro Marcel Duchamp engenheiro do tempo perdido. Nesse livro, publicado apenas dois anos antes de sua morte, Duchamp se dispôs pela primeira vez a falar com descontração sobre seus atos, suas reações, seus sentimentos e suas opções, o que resultou num depoimento profundo e eloquente sobre os altos e baixos do espírito inovador da arte em seu século. Marcel Duchamp (1887-1968) é considerado como um dos mais importantes representantes do movimento artístico conhecido como Dadaísmo.

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Formas Breves, de riCardo piglia Hotel Almagro Quando vim viver em Buenos Aires, aluguei um quarto no Hotel Almagro, na esquina da Rivadavia com a Castro Barros. Estava terminando de escrever as narrativas de meu primeiro livro, e Jorge Álvarez me ofereceu um contrato para publicá-lo e me deu trabalho na editora. Preparei-lhe uma antologia de prosa norteamericana que ia de Poe a Purdy e, com o que me pagou e o que eu ganhava na universidade, consegui instalar-me e viver em Buenos Aires. Naquele tempo eu estava vinculado à cátedra de Introdução à História na Faculdade de Humanidades e viajava todas as semanas para La Plata.

O quarto que eu alugava era cômodo, com uma sacada que dava para a rua e um pé-direito altíssimo. O quarto do Hotel Almagro também tinha um pé-direito altíssimo e um janelão que dava para os fundos da Federação de Boxe. Os dois quartos tinham guardaroupas muito parecidos, com duas portas e estantes forradas com jornal. Uma tarde, em La Plata, encontrei as cartas de uma mulher num canto do guarda-roupa. Sempre se encontram rastros dos hóspedes anteriores quando se mora num quarto de hotel.

Alugara um quarto numa pensão perto do terminal rodoviário e passava três dias por semana em La Plata dando aulas. Minha vida estava dividida, eu levava duas vidas em duas cidades como se fosse duas pessoas diferentes, com amigos e círculos próprios em cada lugar.

É claro que me esqueci do assunto, mas um tempo depois, em Buenos Aires, estendido na cama do quarto do hotel, tive a ideia de levantar-me para inspecionar o guarda-roupa. Em um dos lados, num desvão, havia duas cartas: eram a resposta de um homem às cartas da mulher de La Plata.

O que era igual, no entanto, era a vida no quarto de hotel. Os corredores vazios, os aposentos transitórios, o clima anônimo desses lugares onde sempre se está de passagem.

Explicações não tenho. A única explicação possível é pensar que eu estava enfiado num mundo cindido e que havia outros dois que também estavam enfiados num mundo cindido, passando de um lado para o outro tal como eu e, por uma dessas estranhas combinações produzidas pelo acaso, as cartas haviam coincidido comigo.

(...)

(...)

A pensão em La Plata era um casarão interminável transformado numa espécie de hotel fuleiro administrado por um estudante crônico que vivia de sublocar os quartos. (...)

SE qUISER LER MAIS, procure Piglia, Ricardo. formas breves. São Paulo: companhia das Letras, 2004.

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SOBRE

riCardo piglia

Ricardo Piglia nasceu na província de Buenos Aires, Argentina, em 1940. É considerado um dos mais importantes romancistas argentinos da atualidade. Quando sua família se mudou para Mar del Plata, em 1957, começou um diário íntimo que escreveu por décadas e que deu origem a algumas antologias. Em 1960, iniciou o curso de História na Universidad Nacional de la Plata, onde se tornou professor em 1963. No mesmo ano, foi secretário de redação da revista Liberación, órgão cultural do Movimiento de Izquierda Revolucionario. Em sua extensa atuação, Ricardo Piglia escreveu sobre temas diversos, em teoria e em ficção, além de colaborar com revistas e atuar como professor em

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universidades como as da Califórnia, Princeton, Harvard e Buenos Aires. No livro Formas breves, Ricardo Piglia faz uma reflexão profundamente ligada à sua experiência pessoal sobre o fazer literário. São 11 textos curtos em linguagem acessível e cativante sobre autores da moderna literatura argentina, como Macedonio Fernández, Jorge Luis Borges e Roberto Arlt, sobre clássicos da modernidade como James Joyce e Franz Kafka, sobre as relações entre literatura e psicanálise e sobre a natureza do conto. Formas breves recebeu o Prêmio Bartolomé March de 2001 de melhor livro de ensaios literários publicado na Espanha.

Interessante Ricardo Piglia costuma afirmar que a leitura de Ernest Hemingway, ainda na adolescência, mudou sua vida.

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A Providência divina nos guiou. Conosco tínhamos alimentos alguns e um pouco de água potável que Gonzalo, da nobreza napolitana, e que incumbido fora da execução de todo esse projeto, por piedade, tão-só, nos concedera, além de ricas vestes, linho, panos e muitas outras coisas, que têm sido de grande utilidade. Assim, por pura gentileza, sabendo quanto apego eu tinha aos livros, trouxe-me de minha biblioteca volumes que eu prezava mais do que meu ducado. WIllIam shakesPeare, in A tempestade, Ato I, Cena II.

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e, II.

JULIANA GALDINO

apresenta os livros Que amou Quem comenta

Um relato para uma academia, em Um médico rural, Franz Kafka O poder do mito Joseph campbell Prometeu acorrentado ésquilo

Alberto da Costa e Silva diplomata, poeta, ensaísta, memorialista e historiador, membro da Academia Brasileira de Letras Rosangela Nunes filósofa, jornalista e professora

VOcê cONHEcE Juliana galdino?

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A atriz e diretora Juliana Galdino nasceu em São Paulo, em 1973. Trabalhou de 1999 a 2006 com o diretor Antunes Filho, atuando nos espetáculos Fragmentos Troianos, Foi Carmen Miranda e O Canto de Gregório, entre outros. Foi a protagonista das montagens de Antígona e Medeia 1 e 2. Este último trabalho lhe rendeu o Prêmio Shell 2002 de melhor atriz. Em 2006, entrou para a Escola de Comunicação e Artes da

Universidade de São Paulo (ECA/USP) como professora de interpretação, e fundou, com o diretor Roberto Alvim, a companhia Club Noir, onde deu aulas de interpretação e atuou em diversos espetáculos. Em 2010, estreou como diretora na montagem do espetáculo H.A.M.L.E.T., uma releitura do texto de William Shakespeare feita por Roberto Alvim.

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pROGRAMA 4 | Juliana galdino

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um relatório para uma academia, em um médico rural, de franz KafKa

Conferem-me a honra de me convidar a oferecer à Academia um relatório sobre a minha pregressa vida de macaco. Não posso infelizmente corresponder ao convite nesse sentido. Quase 5 anos me separam da condição de símio; (...) No sentido mais restrito, entretanto, posso responder à indagação dos senhores e o faço até com grande alegria. (...) Mas sem dúvida não poderia dizer nem a insignificância que se segue, se não estivesse plenamente seguro de mim e se o meu lugar em todos os grandes teatros de variedades do mundo civilizado não tivesse se firmado a ponto de se tornar inabalável. Sou natural da Costa do Ouro. Sobre como fui capturado, tenho de me valer de relatos de terceiros. Uma expedição de caça da firma Hagenbeck - aliás, com o chefe dela esvaziei desde então algumas boas garrafas de vinho tinto - estava de tocaia nos arbustos da margem, quando, ao anoitecer, eu, no meio de um bando, fui beber água. Atiraram; fui o único atingido; levei dois tiros. (...) Depois daqueles tiros eu acordei - e aqui, aos poucos, começa a minha própria lembrança - numa jaula na coberta do navio a vapor da firma Hagenbeck.

(...) Eu não tinha saída mas precisava arranjar uma, pois sem ela não podia viver. Caso permanecesse sempre colado à parede daquele caixote teria esticado as canelas sem remissão. Mas na firma Hagenbeck o lugar dos macacos é de encontro à parede do caixote - pois bem, por isso deixei de ser macaco. Um raciocínio claro e belo que de algum modo eu devo ter chocado com a barriga, pois os macacos pensam com a barriga. Tenho medo de que não compreendam direito o que entendo por saída. Emprego a palavra no seu sentido mais comum e pleno. É intencionalmente que não digo liberdade. Não me refiro a esse grande sentimento de liberdade por todos os lados. (...) Não, liberdade eu não queria. Apenas uma saída; à direita, à esquerda, para onde quer que fosse; eu não fazia outras exigências; a saída podia também ser apenas um engano; a exigência era pequena, o engano não seria maior. Ir em frente, ir em frente! Só não ficar parado com os braços levantados, comprimido contra a parede de um caixote. (...) Não fazia cálculos mas sem dúvida observava com toda a calma. Via aqueles homens andando de cima para baixo, sempre os mesmos rostos, os mesmos movimentos, muitas vezes me parecendo que eram apenas um.

Ora, naqueles homens não havia nada em si mesmo que me atraísse. Se eu fosse um adepto da já referida liberdade, teria com certeza preferido o oceano a essa saída que se me mostrava no turvo olhar daqueles homens. Seja como for, porém, eu os observava desde muito tempo antes que viesse a cogitar nessas coisas - sim, foram as observações acumuladas as que primeiro me impeliram numa direção definida. Era tão fácil imitar as pessoas! Nos primeiros dias eu já sabia cuspir. Cuspimos então um na cara do outro; a única diferença era que depois eu lambia a minha e eles não lambiam a sua. O cachimbo eu logo fumei como um velho; se depois eu ainda comprimia o polegar no fornilho, a coberta inteira do navio se rejubilava; só não entendi durante muito tempo a diferença entre o cachimbo vazio e o cachimbo cheio.

SE qUISER LER MAIS, procure Kafka, Franz. um médico rural. Trad. M. carone. São Paulo: companhia das Letras, 1999.

(...)

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SOBRE

franz KafKa O escritor Franz Kafka nasceu em 1883 numa família de classe média judia em Praga, na Áustria-Hungria (atual República Checa). Foi um dos maiores escritores de ficção da língua alemã do século XX. Filho de um abastado comerciante judeu, cresceu sob as influências de três culturas: a judia, a tcheca e a alemã. Formado em direito, ele fez parte, junto com outros escritores da época, do movimento de criação artística chamado Escola de Praga. Durante sua vida, Kafka publicou apenas parte de sua obra e não conseguiu atingir grande fama. Porém, algum tempo depois de sua morte num sanatório para tuberculosos em Viena, em 1924, sua obra literária passou a figurar entre as mais influentes da literatura ocidental. O chamado “olhar kafkiano” é direcionado para temas como a opressão das instituições, a "justiça" e a fragilidade do homem comum frente a problemas cotidianos. Seu primeiro livro, Consideração, foi publicado em 1913. No ano seguinte, Kafka sofreu uma grande crise emocional, atribuída por alguns estudiosos a seu noivado e por outros ao início da 1ª Guerra Mundial, ocorrido no mesmo ano. De forma geral, seus textos foram construídos sobre a dor. As obras mais famosas de Kafka foram escritas entre 1913 e 1921, são elas: A Metamorfose, O Processo, O Castelo, O Foguista, A Sentença e O Artista da fome. Kafka mudou a concepção de linguagem literária e criou uma perspectiva nova para encarar o mundo. O médico rural reúne 14 narrativas e é uma das poucas coletâneas que publicou em vida. Dessa coletânea faz parte o conto Um relatório para uma Academia. Nesse conto, Kafka narra a história de um macaco que, tendo sido capturado por caçadores na África e levado de navio para a Europa, decidiu tornarse humano, por perceber que essa seria sua única chance de escapar. Para tornar-se humano, o macaco imita gestos e linguagem. Aprende a cuspir, fumar cachimbo, tomar aguardente e falar "alô". A repetição é a forma encontrada pelo macaco para aprender a ser humano.

Interessante Nenhuma das obras de Franz Kafka foi publicada em vida. Antes de morrer, Kafka fez um pedido a seu amigo Max Brod: desejava que todos seus manuscritos fossem queimados após sua morte. Kafka só foi reconhecido em vida por um pequeno grupo de intelectuais e amigos, entre os quais, Max Brod, que desobedeceu a sua recomendação.

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o poder do mito,

de josepH CaMpBell MOYERS: Por que há tantas histórias de heróis na mitologia? CAMPBELL: Porque é sobre isso que vale a pena escrever. Mesmo nos romances populares, o protagonista é um herói ou uma heroína que descobriu ou realizou alguma coisa além do nível normal de realizações ou de experiência. O herói é alguém que deu a própria vida por algo maior que ele mesmo. MOYERS: Então, em todas essas culturas, qualquer que seja a vestimenta particular que o herói esteja usando, em que consiste a proeza?

CAMPBELL: Isso mesmo. Otto Rank, em seu pequeno porém importante livro O mito do nascimento do herói, afirma que somos todos heróis ao nascer, quando enfrentamos uma tremenda transformação, tanto psicológica quanto física, deixando a condição de criaturas aquáticas, vivendo no fluido amniótico, para assumirmos, daí por diante, a condição de mamíferos que respiram o oxigênio do ar, e que, mais tarde, precisarão erguer se sobre os próprios pés. É uma enorme transformação, e seria, certamente, um ato heroico, caso fosse praticado conscientemente. E existe aí também um ato heroico de parte da mãe, responsável por tudo isso. MOYERS: Mas os heróis não são todos homens?

CAMPBELL: Bem, há dois tipos de proeza. Uma é a proeza física, em que o herói pratica um ato de coragem, durante a batalha, ou salva uma vida. O outro tipo é a proeza espiritual, na qual o herói aprende a lidar com o nível superior da vida espiritual humana e retorna com uma mensagem. A façanha convencional do herói começa com alguém a quem foi usurpada alguma coisa, ou que sente estar faltando algo entre as experiências normais franqueadas ou permitidas aos membros da sociedade. Essa pessoa então parte numa série de aventuras que ultrapassam o usual, quer para recuperar o que tinha sido perdido, quer para descobrir algum elixir doador da vida. Normalmente, perfaz-se um círculo, com a partida e o retorno. Mas a estrutura e algo do sentido espiritual dessa aventura já podem ser detectados na puberdade ou nos rituais de iniciação das primitivas sociedades tribais, por meio dos quais uma criança é compelida a desistir da sua infância e a se tornar um adulto – para morrer, dir-se-ia, para a sua personalidade e psique infantis e retornar como adulto responsável. E essa é uma transformação psicológica fundamental, pela qual todo indivíduo deve passar. Na infância, vivemos sob a proteção ou a supervisão de alguém, entre os quatorze e os vinte e um anos – e caso você se empenhe na obtenção de um título universitário, isso pode prosseguir talvez até os trinta e cinco. Você não é, em nenhum sentido, autorresponsável, um agente livre, mas um dependente submisso, esperando e recebendo punições e recompensas. Evoluir dessa posição de imaturidade psicológica para a coragem da autorresponsabilidade e a confiança exige morte e ressurreição. Esse é o motivo básico do périplo universal do herói – ele abandona determinada condição e encontra a fonte da vida, que o conduz a uma condição mais rica e madura. MOYERS: Então, ainda que não sejamos heróis, no sentido pleno de redimir a sociedade, temos de enfrentar esse périplo, no interior de nós mesmos, espiritual e psicologicamente.

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CAMPBELL: Oh, não. O macho tem normalmente o papel de destaque apenas por causa das condições de vida. Ele está lá fora, no mundo, e a mulher está em casa. Mas entre os astecas, por exemplo, que dispunham de vários céus, para onde as pessoas iam de acordo com a morte que tivessem, o céu dos guerreiros mortos em batalha é o mesmo das mães que morrem em trabalho de parto. Dar à luz é incontestavelmente uma proeza heroica, pois é abrir mão da própria vida em benefício da vida alheia. MOYERS: Você não acha que perdemos essa verdade, na nossa sociedade, ao considerarmos mais heroico partir para o mundo e fazer dinheiro do que ficar em casa cuidando dos filhos? CAMPBELL: Fazer dinheiro provoca mais repercussão. Você deve conhecer o adágio: Se um cão morde um homem, isso não é nada; mas se um homem morde um cão, isso dá uma história sensacional. Assim, aquilo que acontece repetidas vezes, por mais heroico que seja, não é novidade. A maternidade deixou de ser notícia, dir-se-ia.

SE qUISER LER MAIS, procure campbell, Joseph e Moyers, Bill. o poder do mito. Trad. c. F. Moises. São Paulo: Palas Athena, 1990.

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SOBRE

josepH CaMpBell

O estudioso de mitologia e religião comparativa Joseph John Campbell nasceu em março de 1904 em White Plains, nos EUA, numa família de classe média alta e de religião católica romana. Fascinou-se quando criança pela cultura nativa americana quando seu pai o levou para ver as coleções do Museu de História Natural, em Nova Iorque. Campbell tornou-se especialista nos vários aspectos da sociedade nativa americana, o que acabou por levá-lo a dedicar-se ao mito. Ele mapeou e comparou mitologias das mais diversas culturas.

Interessante Guru de George Lucas, campbell atuou como consultor para os roteiros da saga “Guerra nas Estrelas” (“Star wars”).

Campbell completou sua graduação em literatura inglesa em 1925 e o mestrado em literatura medieval em 1927, na Universidade de Columbia. No mesmo ano, recebeu uma bolsa para estudar na Europa. Estudou francês antigo e sânscrito nas Universidades de Paris e Munique. Além disso, aprendeu a ler e falar francês e alemão e foi fluente em ambas as línguas. Na Europa, foi influenciado pelo período da Geração Perdida, momento de enorme inovação artística e intelectual. Nesse contexto conheceu o escritor alemão Thomas Mann (1875 - 1955), que marcaria para sempre sua vida e suas ideias. Ainda na Europa, tomou contato com a arte moderna e se entusiasmou com artistas como Paul Klee e Pablo Picasso. Descobriu também Sigmund Freud, fundador da psicanálise, e seu discípulo, Carl Jung. Seu livro O Poder do Mito é fruto de uma série de conversas com o jornalista Bill Moyers. Nesse livro, o casamento, os nascimentos virginais, a trajetória do herói, o sacrifício ritual e até os personagens heroicos do filme Guerra nas Estrelas são tratados de modo original e bem-humorado. Campbell afirmava que os mitos passados nos ajudam a compreender o presente e a nós mesmos e que o homem está sempre em busca da experiência e do enlevo de estar vivo. Campbell foi professor na Sarah Lawrence College por 38 anos. Casou-se com uma de suas alunas, a dançarina e instrutora de dança Jean Erdman, em 1938. Faleceu aos 83 anos em 1987, em Honolulu, Havaí, pouco depois de completar a filmagem do documentário O Poder do Mito, com Bill Moyers.

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pROGRAMA 4 | Juliana galdino

DEGUSTANDO

prometeu acorrentado, de Ésquilo

PROMETEU Ai de mim, fecundas filhas de Tétis e do pai Oceano, cujas águas circundam a terra, com suas ondas em perenal movimento. Olhai! e vede, os laços por que estou acorrentado a este íngreme rochedo, onde ficarei de sentinela, bem a meu pesar, pelos tempos afora!

Eu, tão somente, impedi que, destruídos pelo raio, eles fossem povoar o Hades. Eis a causa dos rigores que me oprimem, deste suplício doloroso, cuja simples vista causa pavor. Porque me apiedei dos mortais, ninguém tem pena de mim! No entanto, tratado sem piedade eu sirvo de eterna censura à prepotência de Júpiter.

(...)

O CORO Que coração de granito, ou de ferro, deixará de partilhar de teu sofrimento, ó Prometeu? Nós, que o vimos, temos o coração transpassado pela dor.

O CORO Dize, porém, sem nada ocultar; por que ofensa tua Júpiter ordenou que sofresses tão bárbaro tratamento? Qual foi teu crime? Fala, se é que isso não venha aumentar o teu sofrer. PROMETEU Ai de mim! Doloroso será, para mim, vo-lo contar, mas não menos doloroso silenciar; tudo agrava a minha angústia. O ódio acabara de romper entre os deuses em dissídio. Uns queriam, expulsando Saturno, dar o cetro a Júpiter; outros, ao contrário, esforçavam-se por afastá-lo do trono. Em vão procurei dar os mais prudentes conselhos aos filhos do Céu e da Terra, os Titãs; sua audácia desprezava todo o artifício, toda a habilidade; eles supunham triunfar sem esforço graças a seu próprio poder. Quanto a mim, Têmis, minha mãe, e a própria Terra, adorada sob tantos nomes diversos, me tinham profetizado que, no combate prestes a travar-se, a força e a violência de nada valeriam; o ardil, tão somente, decidiria da vitória. Quando lhes anunciei este oráculo, mal consentiram em ouvir-me! Em tal emergência, pareceu-me prudente, acompanhando minha mãe, adotar o partido de Júpiter, que insistia comigo para que o apoiasse. Graças a mim, e a meus conselhos, foi-lhe possível precipitar nos negros, e profundos abismos do Tártaro, o venerando Saturno e todos os seus defensores. Após tamanho serviço, eis o prêmio ignóbil com que me recompensou o tirano do céu! Tal é a prática frequente da tirania: a ingratidão para com seus amigos... Mas o que tanto quereis saber: a causa do meu suplício, eu vou dizer agora. Logo que se instalou no trono de seu pai, distribuindo por todos os deuses honras e recompensas, ele tratou de fortificar seu império. Quanto aos mortais, porém, não só lhes recusou qualquer de seus dons, mas pensou em aniquilá-los, criando em seu lugar uma raça nova. Ninguém se opôs a tal projeto, exceto eu.

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(...) PROMETEU Graças a mim, os homens não mais desejam a morte. O CORO Que remédio lhes deste contra o desespero? PROMETEU Dei-lhes uma esperança infinita no futuro. O CORO Oh! que dom valioso fizeste aos mortais! PROMETEU Além disso, consegui que eles participem do fogo celeste. O CORO O fogo?!... Então os mortais já possuem esse tesouro? PROMETEU Sim; e desse mestre aprenderão muitas ciências e artes. O CORO E por isso é que Júpiter te castiga tão cruelmente? Não terás, por acaso, um repouso sequer? Virá, um dia, o termo de teus males? PROMETEU Nenhum fim, senão o que ele quiser. O CORO E acaso quererá ele, um dia? Não sentes o teu crime? Censurá-lo, porém, não nos causa prazer, e agrava tuas dores. Silenciemos, pois, e trata de te libertar.

SE qUISER LER MAIS, procure ésquilo. prometeu acorrentado. São Paulo: Martin claret, 2004.

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SOBRE

Ésquilo

Interessante Desde o século passado, a autoria da peça tem sido colocada sob suspeita. Há alguns estudiosos que atribuem a autoria da tragédia a Eufórion, filho de ésquilo.

O dramaturgo grego Ésquilo nasceu em Elêusis, perto de Atenas, e morreu em Gela, na Sicília. Viveu aproximadamente entre os anos 525 a.C. e 456 a.C. no seio de uma nobre família ateniense. Considerado por Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.) o pai da tragédia, é o mais antigo dos três trágicos gregos cujas peças ainda existem (os outros são Sófocles e Eurípedes). Ésquilo revolucionou o teatro ao aumentar o número de personagens em suas peças e criar a interação entre eles, introduzindo o diálogo e a ação dramática. Até então, os personagens interagiam apenas com o coro. Somente sete (de um total estimado entre 70 a 90) de peças escritas pelo autor chegaram aos dias de hoje. O túmulo de Ésquilo tornou-se lugar de peregrinação e, em meados do século 4 a.C., sua estátua foi colocada no teatro de Dioniso, em Atenas. As peças de Ésquilo tratam de temas sobre-humanos e terrificantes, geralmente da mitologia. Entre as ideias fundamentais estão a fatalidade, que age através da vontade divina e da paixão humana; o ciúme dos deuses, provocado pela glória humana; a intervenção dos deuses em favor dos seus devotos; e a inferioridade da força diante do espírito. Ésquilo reinterpretou os mitos gregos tornando-os mais próximos da nova ordem social que surgia com as cidades-estado da Grécia antiga. Prometeu, uma das mais poderosas figuras das lendas gregas – protagonista da peça Prometeu acorrentado – simbolizava a condição humana através de sua busca pelo conhecimento e pela liberdade.

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Os livros nos deleitam quando a prosperidade nos sorri, confortam-nos durante as borrascas da vida. Robustecem os propĂłsitos humanos, sustentam todo severo juĂ­zo. As artes e as ciĂŞncias, cujas virtudes dificilmente se pode conceber, baseiam-se nos livros. rIchard de bUry, in Philobiblion (1345)

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TENóRIO TELLES

apresenta os livros Que amou Quem comenta

Eclesiastes Bíblia Sagrada Quincas Borba Machado de Assis Sentimento do mundo carlos Drummond de Andrade

José Castello cronista, romancista, biógrafo, jornalista e crítico literário Carlito Azevedo poeta, tradutor e editor Luiz Paulo Horta escritor, jornalista e crítico

VOcê cONHEcE tenório telles?

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O professor, poeta, ensaísta, dramaturgo e crítico literário Tenório Telles nasceu em setembro de 1963, às margens do rio Purus, numa localidade de nome São Tomé, no município amazonense de Anori. Seu despertar para a literatura aconteceu diante dos primeiros livros e ilustrações que lhe foram apresentados na escola, ainda na primeira infância. Formou-se em Letras no ano de 1989 pela Universidade Federal do Amazonas, onde também se tornou bacharel em Direito, em 1996. Sua paixão pela literatura o fez trilhar os caminhos da poesia, da dramaturgia, da crítica literária, do magistério e do trabalho de “semeador de livros”. Primeiros fragmentos, seu primeiro livro, de produção independente, foi publicado em 1988. Na essência de sua obra está o questionar da condição do ser humano, num meio

que o oprime e o afasta de suas raízes e de seus sonhos. Como professor de Língua Portuguesa e Literatura, sustenta o compromisso de despertar uma visão crítica e transformadora e de contribuir para que seus alunos sejam agentes construtores de uma sociedade mais justa, que valorize sua cultura. Como pesquisador e crítico, Tenório Telles tem produzido trabalhos sobre literatura brasileira e regional. É colaborador em publicações como o jornal Amazonas em Tempo e A Crítica, com textos de análise literária de obras de autores brasileiros, especialmente amazonenses. Como editor, realiza projetos que resgatam obras da cultura amazonense e revelam jovens autores. As peças A derrota do mito e A rebelião do soldado o inseriram no campo da dramaturgia. O autor ocupa uma cadeira na Academia Amazonense de Letras desde 2001.

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pROGRAMA 5 | tenório telles

DEGUSTANDO eclesiastes,

livro da BíBlia sagrada

SE qUISER LER MAIS, procure http://www.bibliaonline.com.br

Eclesiastes 3: 1-8 Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou; Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derribar, e tempo de edificar; Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de saltar de alegria; Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar; Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de deitar fora; Tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar; Tempo de amar, e tempo de aborrecer; tempo de guerra, e tempo de paz.

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SOBRE

eClesiasTes

O principal tema de Eclesiastes é a vaidade das coisas humanas, numa lição de desapego dos bens terrestres, negação da felicidade dos ricos e exaltação da pobreza com afirmações como "bem-aventurados são os pobres". A Edição Pastoral da Bíblia sustenta que se trata de um livro profundamente crítico, lúcido e realista sobre a condição do povo por volta do século III a.C., quando a Palestina era colônia da dinastia macedônica dos Ptolomeus, aos quais deviam pesados impostos,

arrecadados pela família dos Tobíadas, que controlava o comércio, a economia e a política interna. Era um tempo de exploração, que não deixava esperanças de um futuro melhor para o povo. Num mundo sem horizontes, o livro fez um balanço sobre a condição humana. Ao mostrar os caminhos para realização da vida e da felicidade, o autor desmonta as ilusões de um determinado sistema apresentado como ideal (riqueza, poder, ciência, prazeres, trabalho para enriquecer) e propõe uma reflexão sobre “que proveito tira o homem de todo o trabalho com que se afadiga debaixo do sol”. O Eclesiastes propõe uma nova concepção da vida como dom gratuito de Deus que todos devem partilhar com justiça e fraternidade. Só assim todos poderão ter acesso à felicidade, que consiste em usufruir a vida presente, a qual, intensamente vivida, é a própria eternidade.

considerado muitas vezes como um pequeno tratado sobre a busca da felicidade na terra, o Eclesiastes tem, na opinião de muitos estudiosos, traços da filosofia epicurista.

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Interessante

Eclesiastes faz parte dos livros poéticos e sapienciais do Antigo Testamento da Bíblia cristã e judaica. Embora tenha seu significado considerado como incerto, a palavra tem sido traduzida para o português como pregador ou preletor. Faz parte dos escritos atribuídos tradicionalmente ao Rei Salomão, por narrar fatos que coincidiriam com os de sua vida. No entanto, muitos questionam a unicidade do autor e defendem que foi escrito por alguns autores.

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pROGRAMA 5 | tenório telles

DEGUSTANDO

Quincas BorBa,

de MaCHado de assis

Sofia, depois de estar alguns segundos à escuta, tornou à sala, e foi sentar-se com grande rumor de saias, na otomana de cetim azul, compra de poucos dias. Rubião voltou-se, e deu com ela, abanando repreensivamente a cabeça. Antes que ele falasse, Sofia pôs o dedo na boca, pedindo-lhe silêncio; depois chamou-o com a mão; Rubião obedeceu. — Sente-se naquela cadeira, disse ela; e continuou, depois de o ver sentado: Tenho razão para zangar-me com o senhor; não o faço, porque sei que é bom, e estou que é sincero; arrependa-se do que me disse, e tudo lhe será perdoado. Acabando de falar, Sofia bateu com o leque no lado direito do vestido para o abaixar e compor; depois levantou os braços sacudindo as pulseiras de vidro preto; finalmente, pousou-os sobre os joelhos, e, abrindo e fechando as varetas do leque, aguardou a resposta. Ao contrário do que esperava, Rubião abanou a cabeça negativamente. — Não tenho de que me arrepender, disse ele; e prefiro que me não perdoe. A senhora ficará cá dentro, quer queira, quer não; podia mentir, mas que é que rende a mentira? A senhora é que não tem sido sincera comigo, porque me tem enganado... Sofia retesou o busto. — ...Não se zangue; não desejo ofendê-la; mas, deixe-me dizer que a senhora é que me tem enganado, e muito, e sem compaixão. Que ame a seu marido, vá; perdoava-lhe; mas que... — Mas quê? repetiu ela espantada. Rubião meteu a mão no bolso, tirou a carta, e entregou-lha. Sofia, ao ler o nome de Carlos Maria, ficou sem pinga de sangue; ele viu-lhe a palidez. Dominando-se logo, perguntou o que era, que queria dizer essa carta. — A letra é sua. — É minha. Mas que diria eu aqui dentro? continuou tranquila. Quem lhe deu isto?

SE qUISER LER MAIS, procure

Rubião quis referir o achado; mas entendeu ter alcançado o bastante; cortejou-a para sair.

Assis, M. de. quincas Borba. Porto Alegre: LP&M Editores. 1991

— Fique, abra a carta, aqui a tem; leia tudo, — dizia a moça pegando-lhe na manga; mas, Rubião puxou violentamente o braço, foi buscar o chapéu, e saiu. Sofia, com medo dos criados, deixou-se ficar na sala.

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— Perdão, disse ela, abra o senhor mesmo a carta. — Não tenho mais nada que fazer aqui.

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SOBRE

MaCHado de assis Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista, romancista, crítico e ensaísta, nasceu no Rio de Janeiro em 1839. De família humilde, tinha a saúde frágil, era epilético e gago. Perdeu a mãe muito cedo e foi criado pela madrasta. Com a morte de seu pai, em 1851, sua madrasta empregou-se como doceira numa escola e, por isso, Machadinho, como era conhecido, tornou-se o vendedor de doces. Mesmo com dificuldades para frequentar escola, empenhou-se em estudar. Aos 16 anos publicou o poema Ela, na revista Marmota Fluminense, pela Livraria Paula Brito, que acolhia novos talentos da época. Machado de Assis tornou-se seu colaborador efetivo. Com 17 anos, conseguiu emprego como aprendiz de tipógrafo na Imprensa Nacional e começou a escrever durante o tempo livre. Em 1858 voltou à Livraria Paula Brito e integrou-se à sociedade lítero-humorística Petalógica, fundada por Paula Brito. Ali construiu o seu círculo de amigos, do qual faziam parte importantes escritores brasileiros como Joaquim Manuel de Macedo, Manuel Antônio de Almeida, José de Alencar e Gonçalves Dias. Seu primeiro livro foi impresso em 1861, com o título Queda que as mulheres têm para os tolos. Em 1864 publicou seu primeiro livro de poesias, Crisálidas. Em 1867 foi nomeado ajudante do diretor de publicação do Diário Oficial. Foi casado por 35 anos com Carolina Novais, uma mulher culta que lhe apresentou os clássicos portugueses e vários autores da língua inglesa. Seu primeiro romance, Ressurreição, foi publicado em 1872. Nomeado para cargos públicos, a carreira burocrática foi seu principal meio de subsistência durante toda sua vida. Em 1881 publicou um livro extremamente original, pouco convencional para o estilo da época: Memórias Póstumas de Brás Cubas, considerado, juntamente com O Mulato, de Aluísio de Azevedo, o marco do realismo na literatura brasileira. Machado de Assis morreu no Rio de Janeiro, em 29 de setembro de 1908.

Interessante O título do romance Quincas Borba foi traduzido para o inglês Philosopher or Dog? (Filósofo ou cachorro?), pois Quincas Borba, o mentor intelectual do personagem principal, é um filósofo que tem um cão com o mesmo nome.

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pROGRAMA 5 | tenório telles

DEGUSTANDO

sentimento do mundo,

de Carlos druMMond de andrade Confidência do Itabirano

Morro da Babilônia

Alguns anos vivi em Itabira. Principalmente nasci em Itabira. Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro. Noventa por cento de ferro nas calçadas. Oitenta por cento de ferro nas almas. E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

À noite, do morro descem vozes que criam o terror (terror urbano, cinquenta por cento de cinema, e o resto que veio de Luanda ou se perdeu na língua geral).

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho, vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes. E o hábito de sofrer, que tanto me diverte, é doce herança itabirana. De Itabira trouxe prendas que ora te ofereço: esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil; este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval; este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas; este orgulho, esta cabeça baixa... Tive ouro, tive gado, tive fazendas. Hoje sou funcionário público. Itabira é apenas uma fotografia na parede. Mas como dói!

Quando houve revolução, os soldados se espalharam no morro, o quartel pegou fogo, eles não voltaram. Alguns chumbados, morreram. O morro ficou mais encantado. Mas as vozes do morro não são propriamente lúgubres. Há mesmo um cavaquinho bem afinado que domina os ruídos da pedra e da folhagem e desce até nós, modesto e recreativo, como uma gentileza do morro.

SE qUISER LER MAIS, procure Andrade, carlos Drummond de. sentimento do Mundo. Rio de Janeiro: Record. 2001

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SOBRE

Carlos druMMond de andrade

Interessante

Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira do Mato Dentro - MG, em outubro de 1902, em uma família de fazendeiros. Estudou na cidade de Belo Horizonte e, depois, com os jesuítas no Colégio Anchieta de Nova Friburgo - RJ, de onde foi expulso por "insubordinação mental". De volta a Belo Horizonte, começou a carreira de escritor como colaborador do Diário de Minas, que reunia os primeiros adeptos locais do movimento modernista mineiro, que estava nascendo.

Em 1996, Pedro Drummond, neto do poeta, criou uma website sobre seu avô (www. carlosdrummond. com.br). No site está publicado um documentário sobre Drummond realizado pelo escritor Fernando Sabino e pelo roteirista, diretor e crítico de cinema David Neves – o fazendeiro do ar.

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Ante a insistência familiar para que obtivesse um diploma, formou-se em Farmácia na cidade de Ouro Preto, em 1925. Fundou, com outros escritores mineiros, A Revista, que existiu por pouco tempo, mas foi um importante veículo de afirmação do modernismo. Ingressou no serviço público e, em 1934, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde foi chefe de gabinete do ministro da Educação até 1945. Passou depois a trabalhar no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Colaborou como cronista no Correio da Manhã e, a partir do início de 1969, no Jornal do Brasil. Drummond é considerado um dos maiores poetas brasileiros, tendo também publicado diversos livros em prosa. Várias de suas obras foram traduzidas para idiomas como espanhol, inglês, francês, italiano, alemão, sueco e tcheco. Publicado pela primeira vez em 1940, Sentimento do mundo é o terceiro trabalho poético de Drummond. Seus 28 poemas foram produzidos entre 1935 e 1940, influenciados pela ambiência da II Guerra Mundial, e trazem o olhar crítico e significativamente político do poeta sobre o mundo à sua volta. O livro retrata um tempo de guerras, de pessimismo e, sobretudo, de dúvidas sobre o poder de destruição do homem. Alvo de admiração irrestrita do público, Carlos Drummond de Andrade morreu no Rio de Janeiro, em agosto de 1987, poucos dias após a morte de sua filha única, a cronista Maria Julieta Drummond de Andrade.

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Admite-se comumente que ler é decodificar: letras, palavras, sentidos e estruturas, e isso é incontestável; mas acumulando as decodificações, já que a leitura é, de direito, infinita, tirando a trava do sentido, pondo a leitura em roda livre (o que é sua vocação estrutural), o leitor é tomado por uma intervenção dialética: finalmente ele não decodifica, ele sobrecodifica; não decifra, produz, amontoa linguagens, deixa-se infinita e incansavelmente atravessar por elas: ele é essa travessia. roland barthes, in O rumor da língua.

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LúcIA LAGUNA

apresenta os livros Que amou Quem comenta

Libertinagem Manuel Bandeira Histórias de Cronópios e de Famas Julio cortázar Flor de Poemas cecília Meireles

Eric Nepomuceno jornalista, escritor e tradutor de espanhol José Almino de Alencar sociólogo e escritor

VOcê cONHEcE lÚcia laguna?

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A artista plástica Lúcia Laguna nasceu em Campos dos Goytacazes, RJ, em 1941. Vive e trabalha no Rio de Janeiro. Formou-se em Letras em 1971 tornando-se professora de língua portuguesa. Somente em meados dos anos 1990 passou a frequentar cursos de pintura e história da arte na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro. Sua primeira exposição individual aconteceu em 1998. Fez parte do Programa Rumos Artes Visuais do Instituto Itaú Cultural, na edição 2005/2006.

Em 2006 recebeu o prêmio CNI/SESI Marcantônio Vilaça. Por meio de densas camadas de cores, Lúcia Laguna conecta, poeticamente, a paisagem urbana real e concreta com as imagens pictóricas de sua imaginação. Sua pintura mistura formas geométricas com formas orgânicas, numa justaposição característica de sua obra.

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pROGRAMA 6 | lúcia laguna

DEGUSTANDO

liBertinagem,

de Manuel Bandeira

Evocação do Recife trecho Rua da União... A casa de meu avô... Nunca pensei que ela acabasse! Tudo lá parecia impregnado de eternidade Recife... Meu avô morto. Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro como a casa do meu avô.

SE qUISER LER MAIS, procure Bandeira, Manuel. libertinagem e estrela da Manhã. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.

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SOBRE

Manuel Bandeira Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho nasceu em Recife, em abril de 1886. Mudou-se ainda jovem para o Rio de Janeiro e, em 1903, transferiuse para São Paulo, onde iniciou o curso de engenharia na Escola Politécnica. No ano seguinte, abandonou os estudos por causa da tuberculose. A doença o levou a passar longos períodos em estações climáticas no Brasil e na Europa. De volta ao Rio de Janeiro, escreveu poesia e prosa, fez crítica literária e deu aulas na Faculdade Nacional de Filosofia. Entre 1916 e 1920, perdeu a mãe, a irmã e o pai. Os temas mais recorrentes em sua obra são a família, a morte, a infância no Recife e os indivíduos que compõem as camadas mais populares da sociedade. Em 1917, publicou A Cinza das Horas. Dois anos depois, lançou Carnaval, fazendo uso do verso livre, principal característica de seu trabalho poético, que já se mostrava um dos precursores da linha modernista. O escritor Mário de Andrade viria a chamá-lo de "São João Batista do modernismo brasileiro". Apesar disso, em 1922, por não concordar com a intensidade dos ataques feitos aos parnasianos e

simbolistas, movimentos literários que inspiraram sua obra, não participou diretamente da Semana de Arte Moderna de 1922, nem sequer viajou para São Paulo. No entanto, seu poema Os Sapos, lido por Ronald de Carvalho na segunda noite do acontecimento, provocou muitas reações. Publicado em 1930, Libertinagem é um livro de poemas que sintetiza todas as aspirações revolucionárias da fase heroica do modernismo brasileiro, a chamada “Geração de 22”. A obra reúne 38 poemas (dois em francês), escritos entre 1924 e 1930. Os poemas refletem a intenção do poeta em cortar laços com as formas tradicionais e acadêmicas presas ao passado. Por isso é considerado o livro mais vanguardista do autor e o primeiro totalmente modernista. Apesar dos amigos e das reuniões na Academia Brasileira de Letras (para a qual foi eleito em 1940), Bandeira viveu solitariamente. Mesmo sendo um apaixonado pelas mulheres, nunca se casou: dizia que "perdeu a vez". Morreu no Rio de Janeiro, em outubro de 1968, aos 82 anos.

Interessante A primeira edição de estrela da Manhã, datada de 1936, foi de apenas 47 exemplares

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pROGRAMA 6 | lúcia laguna

DEGUSTANDO

histórias de cronópios e de Famas, de julio CorTázar

História verídica Um senhor deixa cair ao chão os óculos, que fazem um barulho terrível ao bater nos ladrilhos. O senhor se abaixa aflitíssimo porque as lentes dos óculos custam muito caro, mas descobre assombrado que por milagre elas não se quebraram. Agora esse senhor sente-se profundamente grato, e compreende que o acontecimento vale por uma advertência amistosa, de maneira que se dirige a uma ótica e compra logo um estojo de couro acolchoado, com proteção dupla, como precaução. Uma hora depois deixa cair o estojo e ao abaixar-se sem maior preocupação verifica que os óculos viraram farelo. Esse senhor leva tempo para compreender que os desígnios da Providência são insondáveis e que na realidade o milagre aconteceu agora.

Faça como se estivesse em sua casa Uma esperança construiu uma casa e colocou-lhe um azulejo que dizia: Bem-vindos os que chegam a este lar. Um fama construiu uma casa e não colocou azulejo nenhum. Um cronópio construiu uma casa e seguindo o hábito colocou no vestíbulo diversos azulejos que comprou ou mandou fabricar. Os azulejos eram dispostos de maneira a que se pudesse lê-los em ordem. O primeiro dizia: Bem-vindos os que chegam a este lar. O segundo dizia: A casa é pequena mas o coração é grande. O terceiro dizia: A presença dos hóspedes é suave como a relva. O quarto dizia: Somos pobres de verdade, mas não de vontade. O quinto dizia: Este cartaz anula todos os anteriores. Se manda, cachorro.

SE qUISER LER MAIS, procure cortázar, Júlio. Histórias de cronópios e de famas. Rio de Janeiro: civilização Brasileira, 2009.

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SOBRE

julio CorTázar O escritor Julio Cortázar nasceu em agosto de 1914 em Bruxelas, na Bélgica, filho de argentinos. Foi para a Argentina aos quatro anos de idade. Seus pais se separaram e ele passou a ser criado pela mãe, uma tia e uma avó. Passou a maior parte de sua infância em Banfield, na Argentina. Era uma criança de saúde frágil e passava muito tempo na cama, lendo livros que sua mãe selecionava. Muitos de seus contos são autobiográficos.

cortázar era um grande admirador da cultura brasileira. Gostava de clarice Lispector e Osman Lins. Foi amigo de Haroldo de campos e um amante da música popular brasileira. No conto orientação dos gatos faz uma referência a Gal costa.

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Interessante

Formou-se professor em Letras em 1935, na Escuela Normal de Profesores Mariano Acosta. Em 1938 publicou Presencia, livro de poemas, sob o pseudônimo Julio Denis. Lecionou em algumas cidades do interior do país e foi professor de literatura na Facultad de Filosofía y Letras de la Universidad Nacional de Cuyo, mas deixou o cargo quando Perón assumiu a presidência da Argentina. Empregou-se na Câmara do Livro em Buenos Aires e realizou alguns trabalhos de tradução. Em 1951, aos 37 anos, inconformado com a ditadura na Argentina, partiu para Paris. Havia recebido uma bolsa do governo francês para estudar por dez meses e acabou se instalando definitivamente na França. Trabalhou durante muitos anos como tradutor da Unesco. Casou-se em 1953 com uma tradutora argentina. Viviam em Paris sob condições econômicas difíceis, quando surgiu a oportunidade de traduzir a obra completa de Edgar Allan Poe em prosa para a Universidad de Puerto Rico. O trabalho foi referido pelos críticos como a melhor tradução da obra do escritor. Julio Cortázar é considerado um dos autores mais inovadores e originais de seu tempo, mestre do conto curto e da prosa poética. Foi o criador de romances que inauguraram uma nova forma de

fazer literatura na América Latina, rompendo os moldes clássicos com narrações em que o tempo não é linear e os personagens adquirem autonomia e profundidade psicológica inéditas. Em 1962 lançou Histórias de Cronópios e de Famas, que reúne pequenos contos de realismo fantástico e surrealismo com muita poesia, ironia e humor. Seu livro mais conhecido é Rayuela (O Jogo da Amarelinha), lançado em 1963, que teve 5 mil cópias vendidas no mesmo ano. O autor é também conhecido por seu compromisso político com a libertação da América Latina oprimida por regimes ditatoriais. Em 1970, foi para o Chile, onde se solidarizou com o governo de Salvador Allende. Em 1971, foi "excomungado" por Fidel Castro, assim como outros escritores, por pedir informações sobre um poeta desaparecido. Em 1973, recebeu o Prêmio Médicis por Libro de Manuel e destinou seus direitos à ajuda dos presos políticos na Argentina. Em 1974, foi membro do Tribunal Bertrand Russell II, reunido em Roma para examinar a situação política na América Latina, em particular as violações dos Direitos Humanos. Em 1976, viajou para Costa Rica, onde se encontrou com intelectuais nicaraguenses. Com eles fez uma viagem clandestina até as ilhas de Solentiname, na Nicarágua, que marcou sua vida para sempre. Em 1983, com a volta da democracia na Argentina, Cortázar fez sua última viagem ao país, onde foi recebido calorosamente por seus admiradores, em contraste com a indiferença das autoridades nacionais. Voltou a Paris e, pouco depois, lhe foi concedida a nacionalidade francesa. Com o falecimento de Carol Dunlop, sua última esposa, em 1982, Cortázar teve uma profunda depressão. Morreu de leucemia em 1984.

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DEGUSTANDO a poesia,

de CeCília Meireles

Pequeno trecho do poema Cantata da cidade do Rio de Janeiro Cidade nossa heroica e leal, metade morro, metade mar, capaz de sofrer sem se queixar, ferida de setas por lei natural, cidade de S. Sebastião, que não teme as setas do mal, como o seu Santo e o seu Capitão. Levantaremos todos os dias esta Cidade, sempre maior e mais bela, pois os seu naturais aumentam mais a beleza da terra. LEVANTAREMOS ESTA CIDADE, RAINHA DAS PROVÍNCIAS E EMPÓRIO NO MUNDO e nela marcaremos a nossa vontade, o nosso destino , o nosso rumo.

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SE qUISER LER MAIS, procure Meireles, cecília. flor de poemas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003.

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SOBRE

CeCília Meireles A poeta Cecília Meireles nasceu no Rio de Janeiro, em novembro de 1901. Filha de um funcionário de banco e de uma professora de escola municipal, foi a única sobrevivente dos quatros filhos do casal. O pai faleceu três meses antes do seu nascimento e sua mãe morreu antes que completasse três anos. Por isso, foi criada por sua avó. Concluiu o curso primário em 1910, na Escola Estácio de Sá, ocasião em que recebeu de Olavo Bilac, que era Inspetor Escolar do Rio de Janeiro, uma medalha de ouro por ter feito todo o curso com "distinção e louvor". Terminou o curso normal (magistério) em 1917 e passou a lecionar em escolas oficiais do então Distrito Federal. Seu primeiro livro de poesias, Espectros, foi publicado em 1919. Casou-se, em 1922, com um pintor português com quem teve três filhas. Na década de 1930, manteve no Diário de Notícias uma página sobre questões de educação. Seu primeiro marido suicidou-se em 1935. Desse ano até 1938, foi professora de Literatura Luso-brasileira e de Técnica e Crítica Literária na Universidade do

Interessante cecília Meireles fundou, em 1934, no Pavilhão do Mourisco, a Biblioteca Infantil do Rio de Janeiro (a primeira biblioteca infantil do país). Em 1937, o interventor do Distrito Federal invadiu a biblioteca, onde apreendeu As aventuras de Tom Sawyer, obra de Mark Twain, por considerá-la “comunista”.

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Distrito Federal (hoje UFRJ). Foi ativa colaboradora, entre os anos de 1936 e 1938, do jornal A Manhã e da revista Observador Econômico. Casou-se pela segunda vez em 1940, com um professor e engenheiro agrônomo. Aposentada como diretora de escola em 1951, continuou a trabalhar, como produtora e redatora de programas culturais, na Rádio Ministério da Educação do Rio de Janeiro. Manteve-se ativa e viajou pelo mundo ministrando conferências sobre poesia e literatura brasileira. Recebeu diversas honrarias, como a Ordem de Mérito do Chile e o título de Doutora Honoris Causa da Universidade de Nova Delhi, na Índia. Cecília Meireles foi autora de uma poesia harmoniosa e inspirada em elevado misticismo. Sua obra ocupa um lugar de destaque na chamada Segunda Geração do modernismo brasileiro. Em 1939, recebeu o Prêmio de Poesia Olavo Bilac, da Academia Brasileira de Letras, pelo livro Viagem. Esse foi o primeiro de uma série de prêmios ao reconhecimento da alta qualidade de sua obra poética. Em 1965, um ano após sua morte, a Academia Brasileira de Letras reconheceu, com o Prêmio Machado de Assis, o conjunto de sua obra. Sua poesia foi traduzida para os idiomas espanhol, francês, italiano, inglês, alemão, húngaro, hindu e urdu. Flor de Poemas é uma reunião de poemas dos principais livros de Cecília Meireles, selecionados pelo escritor Paulo Mendes Campos. Essa antologia procura registrar não apenas seu estilo moderno e preciso, mas o magnetismo singular de sua obra.

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As coisas que a literatura pode buscar e ensinar são poucas, mas insubstituíveis: a maneira de olhar o próximo e a si próprios, de relacionar fatos pessoais e fatos gerais, de atribuir valor a pequenas coisas ou a grandes, de considerar os próprios limites e vícios e os dos outros, de encontrar as proposições da vida e o lugar do amor nela, e sua força e seu ritmo, e o lugar da morte, o modo de pensar ou de não pensar nela; a literatura pode ensinar a dureza, a piedade, a tristeza, a ironia, o humor e muitas outras coisas assim necessárias e difíceis. O resto, que se vá aprender em algum outro lugar, da ciência, da história, da vida, como nós todos temos de ir aprender continuamente. Ítalo calvIno, in Assunto encerrado: discursos sobre literatura e sociedade.

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HERMANO VIANNA

apresenta os livros Que amou Quem comenta

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O minotauro Monteiro Lobato Uma estranha realidade carlos castañeda Vida conversável Agostinho da Silva

Luiz Carlos Maciel jornalista, escritor e roteirista Carlos Lessa economista e professor

O antropólogo e pesquisador musical Hermano Vianna nasceu em 1960, na Paraíba. Viveu em Brasília por alguns anos e mudouse para o Rio de Janeiro em 1978. Doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é autor de publicações sobre a sociedade e a música. Entre seus livros encontram-se O mundo funk carioca (1994), premiado com o

Troféu Amigo do Funk em 1994, O mistério do samba (1995), que nasceu de sua tese de doutorado, e Galeras Cariocas (1997), com ensaios de diversos pesquisadores sobre questões da juventude, no que chama de “territórios de conflitos e encontros culturais”. Hermano participa também de diversos projetos para cinema e TV com contribuições de suas pesquisas sobre música e sociedade.

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DEGUSTANDO o minotauro,

de MonTeiro loBaTo Lá no pátio o grande heleno continuava de prosa com a velha. Discutiam política. - Vencemos a aristocracia, minha senhora – dizia ele. – Hoje a Grécia é positivamente governada pelo povo. Sólon revelou gênio ao conceber a nossa forma de governo. Não há imposição de um homem. O governante é escolhido pelo povo. Eu, por exemplo, executo o que o povo deseja – e por isso me reelegem. - O senhor é um caso excepcional – argumentou Dona Benta. -, diz que segue os desejos do povo, mas na realidade a sua inteligência e os seus excelentes discursos é que fazem o povo desejar isto ou aquilo. Quem realmente governa é o senhor, não o povo. - Vejo que a senhora possui um alto descortino psicológico – disse Péricles sorrindo. – O povo tem muito das crianças. Quer ser conduzido – mas com aparências de que é ele quem de fato conduz e manda. O meu sistema, entretanto, é nada querer em contrário aos interesses do povo. Sou o intérprete desses interesses – e o esclarecedor da cidade. Esta minha ideia de fazer de Atenas uma obra-prima de arte é hoje a ideia de todos os atenienses. Consegui passá-la do meu cérebro para o de todos – e sinto grande satisfação ao ver o orgulho dos atenienses quando os visitantes se deslumbram com a nossa cidade. - Noto um erro nas suas palavras quando se refere a “povo”, senhor Péricles. Não é o povo quem governa Atenas, sim a pequena classe dos cidadãos. Povo é a população inteira e aqui há quatrocentos mil escravos que não têm o direito de voto. Isso é injusto e será fatal à Grécia. Péricles muito se admirou daquele modo de ver. - Mas eles são escravos, minha senhora! Escravo é escravo. - Engano seu, senhor Péricles. Pelo fato de ser escravo, um homem não deixa de ser homem; e uma sociedade que divide os homens em livres e escravos está condenada a desaparecer.

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SE qUISER LER MAIS, procure Lobato, Monteiro. o Minotauro. São Paulo: Editora Globo, 2009.

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SOBRE

MonTeiro loBaTo José Bento Monteiro Lobato nasceu em abril de 1882, na cidade de Taubaté, interior de São Paulo, filho de um fazendeiro da região do Vale do Paraíba. Além de inventor e maior escritor da literatura infanto-juvenil brasileira, Monteiro Lobato foi um dos personagens mais interessantes da história recente do país. A ele também se credita o surgimento da indústria editorial brasileira por ter fundado, em 1918, a Monteiro Lobato & Cia., primeira editora do Brasil. Antes do feito, todos os livros brasileiros eram impressos em Portugal.

Em 1895, Monteiro Lobato foi reprovado em uma prova oral de Português. Data daí, talvez, o seu profundo interesse pelo conhecimento crítico do idioma. Lobato tinha por hábito ler dicionários e, mais tarde, ao editar seus livros, deixou praticamente de fazer uso da acentuação gráfica.

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Interessante

Monteiro Lobato se mudou para São Paulo quando foi aceito na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em 1900. Já durante o curso, assumiu a presidência da Arcádia, sociedade literária da Faculdade de Direito, e colaborou em seu jornal com crônicas e crítica teatral. Este foi o início de uma longa fase de colaborações com diferentes jornais e revistas, incluindo veículos de grande circulação como O Estado de São Paulo. Formado em Direito, Monteiro Lobato ocupou o cargo de promotor na cidade de Areias, no Vale do Paraíba, e depois passou a cuidar de uma fazenda herdada do avô, na mesma região. Em 1918, publicou seu primeiro livro, Urupês (contos), recebido com grande sucesso pelo público, o que o colocou numa posição de vanguarda na literatura da época. No mesmo ano, vendeu a fazenda e mudou-se para São Paulo, onde fundou a Monteiro Lobato & Cia. A primeira editora nacional. Em 1926, foi nomeado adido cultural da embaixada brasileira nos Estados Unidos, transferindo-se para aquele país. Quando regressou ao Brasil, em 1931, Monteiro Lobato chegou com uma crença: acreditava piamente nas riquezas naturais do país e em sua capacidade de produzir petróleo.

No livro de impressões escrito durante sua experiência nos Estados Unidos, América, expressou posições nacionalistas relativas à exploração de riquezas naturais no Brasil. Foi um dos maiores defensores de uma política que entregasse à iniciativa privada a extração do petróleo em solo brasileiro. Chegou a escrever ao presidente Getúlio Vargas denunciando o interesse estrangeiro em negar a existência do "ouro negro" no Brasil e acabou preso. Do presídio, enviou a seus amigos em todo o país cópias da carta que Getúlio considerara "ofensiva". Monteiro Lobato foi preso novamente pelo mesmo motivo em 1941. A luta pelo petróleo acabaria por deixá-lo pobre, doente e desgostoso. Em seus primeiros livros, Urupês, Cidades Mortas e Negrinha, tocava em temas como o trabalho do menor, o parasitismo da burocracia, a violência contra os negros, imigrantes e mulheres, o crescimento desordenado das cidades e a degradação progressiva da vida interiorana. Mas grande parte da literatura de Monteiro Lobato foi dedicada às crianças. No livro O Minotauro, de 1937, desenrolam-se as aventuras de Pedrinho, do Visconde e da Emília na Grécia Heroica, para onde foram em procura de tia Nastácia. Descobrem seu paradeiro graças à ajuda do Oráculo de Delfos. Presa no Labirinto de Creta, nas unhas do Minotauro, tia Nastácia já havia domesticado o monstro oferecendolhe bolinhos e quitutes; deixara-o tão gordo que os meninos puderam entrar no Labirinto e salvá-la sem que ele, relaxado no trono, pensasse em reagir. Monteiro Lobato morreu em julho de 1948, deixando um legado de personagens que ficarão para sempre na memória de todos aqueles que tiveram e que terão contato com suas histórias.

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DEGUSTANDO

uma estranha realidade, de Carlos CasTañeda

— Sempre que você olha para as coisas, não as vê. Apenas olha para elas, suponho que para se certificar de que há alguma coisa ali. Como não está preocupado em ver, as coisas parecem as mesmas cada vez que olha para elas. Mas quando aprende a ver, por outro lado, uma coisa nunca é a mesma cada vez que você a vê, e no entanto é a mesma. Já lhe disse, por exemplo, que o homem é como um ovo. Cada vez que vejo o mesmo homem, eu vejo um ovo, e no entanto não é o mesmo ovo.

SE qUISER LER MAIS, procure castañeda, carlos. uma estranha realidade. Rio de Janeiro: Nova Era, 2009.

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SOBRE

Carlos CasTañeda O escritor e antropólogo Carlos Castañeda tem uma biografia cercada de controvérsias. Segundo declarações do próprio escritor, ele teria nascido no interior de São Paulo, no ano de 1935. Seu pai, que se tornou professor de literatura, tinha 17 anos em seu nascimento, e sua mãe apenas 15. Após a morte prematura de sua mãe, quando tinha seis anos, sua criação ficou a cargo dos avós maternos, pequenos proprietários rurais. O autor guardou mágoa por ter sido abandonado pelo pai ao longo de toda sua vida, retratando-o algumas vezes como um homem fraco e sem propósito. Castañeda foi enviado para um colégio de Buenos Aires onde permaneceu até os 15 anos. Seu comportamento rebelde levou seu tio diplomata Oswaldo Aranha, famoso por sua participação internacional durante a Segunda Guerra Mundial, a interceder para que tivesse um lar adotivo em Los Angeles, EUA, para onde foi enviado em 1951. Depois de se formar na Hollywood High School e de uma experiência frustrada como estudante de Belas Artes em Milão, na Itália, voltou para os EUA e se formou em Antropologia pela Universidade da Califórnia. A Erva do Diabo, seu primeiro livro e também dissertação de mestrado, tornou-se um sucesso entre os jovens do movimento hippie e da contracultura, que o elegeram uma espécie de “guru da nova era” e formaram legiões de admiradores. Por outro lado, sua obra recebeu muitas críticas daqueles que questionavam sua consistência científica e os que acreditavam que o livro atraía os jovens para o mundo das drogas. O livro chegou a ser proibido no Brasil. Em 1973, no auge de sua popularidade, a revista norte-americana Time publicou uma extensa matéria de capa sobre Carlos Castañeda, resultado de uma suposta investigação envolvendo sua vida antes da fama, que tinha claramente o propósito de retratá-lo como um mentiroso. A reportagem alegava que Castañeda era peruano, nascido na cidade de Cajamarca, cuja origem remonta ao império inca. Foram citados amigos da terra natal e mesmo uma irmã de Castañeda que o descrevia como alguém de imaginação fértil e entregue ao vício do jogo e das drogas. Segundo esta suposta irmã, Castañeda seria filho de um relojoeiro e teria nascido no ano de 1925. Ele teria assistido à morte de sua mãe, assassinada por seu pai, quando tinha seis anos. No livro de entrevistas Conversando com Carlos Castañeda, da jornalista Carmina Fort, o autor ironizou o esforço da matéria em situar sua ascendência junto a índios sul-americanos. Castañeda pesquisou o tema das plantas medicinais e partiu para o trabalho de campo no sudoeste da Califórnia. Foi então para o estado do Arizona, onde conheceu o índio bruxo Don Juan del Peiote, que o levou para o México e viria a ser seu guia e personagem central de seus livros. A obra de Castañeda consiste em onze livros autobiográficos nos quais relata as experiências decorrentes de sua associação com o bruxo. Em Uma estranha realidade, guiado pela mente do excêntrico bruxo e pela ingestão de alucinógenos, o jovem é levado a estados de "realidade não comum" que lhe permitiam ver o mundo de uma maneira diferente, percebendo toda a sua essência. A morte de Castañeda foi divulgada muito discretamente, em junho de 1998, e teria ocorrido dois meses antes, em consequência de um câncer no esôfago.

Interessante George Lucas declarou que fora influenciado pela leitura de porta para o infinito, de carlos castañeda, na criação do filme guerra nas estrelas

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pROGRAMA 7 | Hermano Vianna

DEGUSTANDO

vida conversável,

de agosTinHo da silva

Mas eu quero ver o primeiro homem que não deseja coisa nenhuma! Nunca fazemos o treino para isso e, pelo contrário, todo o mundo está organizado - por exemplo através da televisão e da publicidade - para desejar alguma coisa mesmo quando não se deseja. O homem, ao levantar-se de manhã pode não desejar nada, mas logo a primeira notícia que tem pela rádio é que se inventou um novo automóvel movido a água e no qual não precisa de accionar qualquer alavanca – ele diz pelo telefone ao automóvel para onde quer ir e pronto; então o desgraçado, no caso de não ter dinheiro, corre logo à procura de amigos que lho emprestem para comprar o dito automóvel. Quer dizer, o mundo, na fase actual, está continuamente a semear desejos em nós, sendo esse um dos pontos mais importantes do mundo – como é que nós podemos chegar a uma economia que não semeie em nós o desejo, mas sim a quietação em vez da inquietação, prestando nós, no entanto, toda a homenagem e todo o agradecimento aos tempos históricos passados e em que foi pelo desejo das pessoas que se conseguiu, na realidade, um parque industrial, um parque técnico como aquele que temos hoje à disposição e que – eu continuo a acreditar – bem utilizado podia contribuir para uma libertação do homem.

SE qUISER LER MAIS, procure Silva, Agostinho da. vida conversável. Lisboa: Assírio e Alvim, 1998.

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SOBRE

agosTinHo da silva O filósofo, poeta e ensaísta George Agostinho Baptista da Silva, ou simplesmente Agostinho da Silva, nasceu no Porto, em Portugal, em fevereiro de 1906. Formou-se em Filologia Clássica na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, em 1928. Logo depois, começou a escrever para a revista Seara Nova, uma publicação lisboeta essencialmente crítica, voltada para fins políticos e pedagógicos, com a qual colaborou até 1938. Estudou como bolsista na Universidade de Sorbonne e no Collège de France, em Paris, de 1931 a 1933. Em seu regresso a Portugal, passou a atuar como professor secundário, em Aveiro. Foi demitido do ensino oficial em 1935 por se recusar a assinar a Lei Cabral, que obrigava todos os funcionários públicos a declararem por escrito que não participavam de organizações secretas (acusadas de subversivas). No mesmo ano, partiu para a Espanha como bolsista do governo espanhol e estudou no Centro de Estudos Históricos de Madrid. Voltou para Portugal em 1936, temendo a iminente eclosão da Guerra Civil Espanhola (1936-1939). Por ser opositor do regime do ditador Salazar, foi preso pela polícia política em 1943 e saiu de Portugal no ano seguinte em direção à América do Sul, passando pelo Brasil, Uruguai e Argentina. Viveu no Brasil de 1947 a 1969. Em 1948, começou a trabalhar no Instituto Oswaldo Cruz do Rio de Janeiro, pesquisando entomologia e ensinando, simultaneamente, na Faculdade Fluminense de Filosofia. De 1952 a 1954, foi professor na Universidade Federal da Paraíba e também em Pernambuco. Em 1954 ajudou a organizar a célebre Exposição do Quarto Centenário da Cidade de São Paulo. Em 1961 tornou-se assessor para política externa do presidente Jânio Quadros. Participou da fundação de quatro universidades brasileiras: Paraíba, Santa Catarina, Brasília e Goiás. Agostinho voltou a Portugal em 1969, após a doença e morte de Salazar, fato que gerou alguma abertura política e cultural na ditadura que dominava o país. Continuou a escrever e a lecionar em diversas universidades portuguesas. Considerado um dos principais intelectuais portugueses do século XX, afirmava ser a liberdade a mais importante qualidade do ser humano. O autor faleceu em Lisboa, em abril de 1994. Vida conversável, publicado em 1994, reúne longas conversas realizadas entre o autor e o polonês Henryk Siewierski, ensaísta, tradutor e doutor em ciências humanas, professor da Universidade de Brasília na época. Trata-se de um texto imprescindível para o conhecimento da obra de Agostinho da Silva.

Interessante Agostinho da Silva dizia que alfabetizado é quem é capaz de perceber, entender o mundo em que vive.

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Para um leitor, esta pode ser a razão essencial, talvez a única justificativa para a literatura: que a loucura do mundo não nos tome por completo, mesmo que invada nosso porão (...) e depois, lentamente vá tomando nossa copa, a sala e a casa inteira. (...) Quando o mundo se torna incompreensível, quando atos de terror e respostas aterrorizantes para tal terror enchem nossos dias e nossas noites, quando nos sentimos desorientados e desconcertados, procuramos um lugar no qual a compreensão (ou a fé na compreensão) tenha sido expressa em palavras. alberto mangUel, in À mesa com o Chapeleiro Maluco: ensaios sobre corvos e escrivaninhas.

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LIA RODRIGUES

apresenta os livros Que amou Quem comenta

VOcê cONHEcE lia rodrigues?

a

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s

l, s.

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Livro do Desassossego Fernando Pessoa (Bernardo Soares) O turista aprendiz Mário de Andrade É isto um homem? Primo Levi

Patrícia Simões doutora em Literatura e professora Joel Rufino do Santos escritor, historiador e professor

A coreógrafa Lia Rodrigues nasceu em São Paulo, em 1956. Participou do movimento estudantil contra a ditadura militar e formou-se em balé clássico na Escola de Bailados, no final da década de 1960. Seu envolvimento com a dança a fez abandonar o curso de história da Universidade de São Paulo (USP) seis meses antes de concluí-lo. Aos 21 anos, após assistir à primeira turnê brasileira da companhia de dança Pina Bausch, decidiu ir para a Europa com o intuito de trabalhar com Pina, na Alemanha. Mas os acontecimentos a acabaram levando para Paris, onde, entre 1980 e 1982, integrou a companhia de dança de Maguy Marin. De volta ao Brasil, em 1983, instalouse no Rio de Janeiro, onde começou a coreografar espetáculos teatrais com diretores como Bia Lessa e Sérgio Mamberti. No fim da década de 1980, montou o Atelier de Coreografia em parceria com o também coreógrafo e bailarino João Saldanha. Em 1990, criou a Lia Rodrigues Companhia de Danças, tornando-se um dos ícones da dança contemporânea no país. Em 1992, foi convidada pela Divisão

de Música do Instituto Municipal de Arte e Cultura para organizar uma mostra de dança que recebeu grupos e coreógrafos para apresentar suas produções no Teatro Sérgio Porto. Assim foi criado o Festival Panorama da Dança, um dos maiores festivais de dança contemporânea do Brasil, que dirigiu por 13 anos. Sua personalidade ativista sempre esteve associada à sua vida artística e, nos últimos anos, tem sido militante em favor de uma política cultural eficiente, ocupando um papel importante para a difusão, discussão e fomentação da dança e da cultura nacional. A coreógrafa mantém desde 2007, em parceira com a ONG Redes – Rede de Desenvolvimento da Maré, o Centro de Artes da Maré, no conjunto de favelas do Complexo da Maré, onde desenvolve atividades pedagógicas para a comunidade, além de palestras sobre arte e mostras de espetáculos do seu repertório e de outros artistas. Seu trabalho também dialoga com diversas obras e manifestações artísticas além da dança, como o cinema e as artes plásticas.

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pROGRAMA 8 | lia rodrigues

DEGUSTANDO

livro do desassossego, de fernando pessoa

Cheguei hoje, de repente, a uma sensação absurda e justa. Reparei, num relâmpago íntimo, que não sou ninguém. Ninguém, absolutamente ninguém. Quando brilhou o relâmpago, aquilo onde supus uma cidade era um plaino deserto; e a luz sinistra que me mostrou a mim não revelou céu acima dele. Roubaram-me o poder ser antes que o mundo fosse. Se tive que reencarnar, reencarnei sem mim, sem ter eu reencarnado. Sou os arredores de uma vila que não há, o comentário prolixo a um livro que se não escreveu. Não sou ninguém, ninguém. Não sei sentir, não sei pensar, não sei querer. Sou uma figura de romance por escrever,

passando aérea, e desfeita sem ter sido, entre os sonhos de quem me não soube completar. Penso sempre, sinto sempre; mas o meu pensamento não contém raciocínios, a minha emoção não contém emoções. Estou caindo, depois do alçapão lá em cima, por todo o espaço infinito, numa queda sem direção, infinítupla e vazia. Minha alma é um maelstrom negro, vasta vertigem à roda de vácuo, movimento de um oceano infinito em torno de um buraco em nada, e nas águas que são mais giro que águas boiam todas as imagens do que vi e ouvi no mundo — vão casas, caras, livros, caixotes, rastros de música e sílabas de vozes, num rodopio sinistro e sem fundo.

Pessoa, Fernando. livro do desassossego. São Paulo: companhia das Letras, 2006.

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Fernando Pessoa atribuía a cada heterônimo uma biografia própria: sem instrução, caeiro vivia de pequenos rendimentos; Reis era médico e buscou exílio no Brasil; campos era engenheiro naval. considerava Bernardo Soares um semi-heterônimo, pois se apresentava como uma mutilação da personalidade dele, Fernando.

Interessante

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SOBRE

fernando pessoa

O poeta Fernando Antônio Nogueira Pessoa nasceu em junho de 1888, em Lisboa. Perdeu seu pai em 1893 e seu irmão Jorge no ano seguinte. Em 1896, após o casamento de sua mãe com um cônsul português, Fernando Pessoa se mudou com a família para Durban, na África do Sul, onde estudou e aprendeu inglês. Em 1905, voltou definitivamente para Lisboa, com intenção de se inscrever no curso superior de Letras. Leu autores ingleses, como o dramaturgo Shakespeare e o poeta Wordsworth, além de filósofos gregos e alemães. Tomou também contato com a poesia francesa, especialmente a de Baudelaire, e leu os poetas portugueses Cesário Verde e Camilo Pessanha. Decidiu abandonar o curso superior em 1907 e montou uma tipografia que mal chegou a funcionar. No ano seguinte, começou a trabalhar como correspondente estrangeiro em casas comerciais, profissão que exerceu até a morte. Em 1912, Fernando Pessoa iniciou sua colaboração na revista A Águia. Nessa época, se correspondia com o escritor modernista Mário de Sá-Carneiro que, de Paris, mandava notícias dos movimentos cubista e futurista. No ano de 1913, publicou o poema Impressões do Crepúsculo, cujo primeiro verso começa com a palavra “pauis”. Deste poema derivou a corrente do Paulismo, o primeiro

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“ismo” (de alguns) criado pelo poeta. O poema foi recebido com entusiasmo por seus amigos que, nele, viam uma verdadeira inovação revolucionária na poesia portuguesa. Foi aí que apareceram os famosos heterônimos de Fernando Pessoa: personagens diferentes entre si e do próprio, a quem o poeta atribuiu diversos poemas com estilos distintos do seu, sendo os principais: Alberto Caeiro, que busca o objetivismo absoluto, eliminando todos os vestígios da subjetividade, é o poeta que se volta para a fruição direta da natureza e busca as sensações das coisas tais como são, opõe-se radicalmente ao intelectualismo, à abstração, à especulação metafísica e ao misticismo e, nesse sentido, é o oposto de Fernando Pessoa "ele-mesmo"; Ricardo Reis, que representa a vertente clássica ou neoclássica da criação de Fernando Pessoa, com uma linguagem contida, disciplinada, em versos geralmente curtos que tendem ao formalismo; e Álvaro de Campos, caracterizado por uma vontade de conquista, por um amor à civilização e ao progresso, por uma linguagem de tom irreverente. Correntes literárias como o sensacionalismo, o futurismo e o interseccionismo foram sendo delineadas por Pessoa e seus heterônimos. Em 1915, nasceu a

revista Orpheu, marco do Modernismo em Portugal, na qual poemas de Fernando Pessoa e seus heterônimos foram publicados desde o primeiro número. No mesmo ano, o poeta iniciou-se no esoterismo, traduzindo um tratado de Teosofia. O livro Mensagem, com poemas de cunho místico-nacionalista, lançado em 1934, foi sua única obra em português publicada em vida. O Livro do Desassossego foi escrito em forma de fragmentos por Bernardo Soares, um tipo particular entre os heterônimos do poeta, como ele mesmo explicava: um semi-heterônimo que "não sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples mutilação dela. Sou eu menos o raciocínio e afectividade." Apesar de fragmentário, o livro é considerado uma das obras fundadoras da ficção portuguesa no século XX. O livro revela a dramaticidade das reflexões humanas que vêm à tona por meio de uma escrita “inviável, inútil e imperfeita”. Diversos fragmentos do livro são investigações íntimas das sensações provocadas pelo anonimato e pela cotidianidade da vida comum. Pessoa escolheu ter uma vida discreta mas livre, sem obrigações fixas, nem horários. Morreu em novembro de 1935, aos 47 anos, em Lisboa.

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DEGUSTANDO

o turista aprendiz, de Mário de andrade

SE qUISER LER MAIS, procure Andrade, Mário de. o turista aprendiz. Estabelecimento do texto, introdução e notas de Telê Porto Ancona Lopez. São Paulo: Duas cidades/ Secretaria de cultura, Esportes e Tecnologia, 1976.

Há uma espécie de sensação ficada da insuficiência, da sarapintação, que me estraga todo o europeu cinzento e bem-arranjadinho que ainda tenho dentro de mim. Por enquanto, o que mais me parece é que tanto a natureza como a vida destes lugares foram feitos muito às pressas, com excesso de castro-alves. E esta pré-noção invencível, mas invencível, de que o Brasil, em vez de se utilizar da África e da Índia que teve em si, desperdiçou-as, enfeitando com elas apenas a sua fisionomia, suas epidermes, sambas, maracatus, trajes, cores, vocabulários, quitutes... E deixouse ficar, por dentro, justamente naquilo que, pelo clima, pela raça, alimentação, tudo, não poderá nunca ser, mas apenas macaquear, a Europa. Nos orgulhamos de ser o único grande (grande?) país civilizado tropical... Isso é o nosso defeito, a nossa impotência. Devíamos pensar, sentir como indianos, chins, gente de Benin, de Java... Talvez então pudéssemos criar cultura e civilização próprias. Pelo menos seríamos mais nós, tenho certeza.

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SOBRE

Mário de andrade O poeta, romancista, contista e teórico musical Mário Raul de Morais Andrade, integrante do grupo de criadores do Modernismo no Brasil, nasceu em São Paulo, em outubro de 1893. Era de família rica e aristocrática. Formou-se no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, onde viria a ser professor. Seu trabalho com a literatura começou bem cedo, em críticas escritas para jornais e revistas. Junto com Oswald de Andrade e outros intelectuais, ajudou a preparar a Semana de Arte Moderna de 1922. Teve participação importante nas principais revistas modernistas: Klaxon, Estética e Terra Roxa e Outras Terras. Lecionou por algum tempo na Universidade do Distrito Federal (Rio de Janeiro) e exerceu vários cargos públicos ligados à cultura, com interesse particular pelo folclore nacional. Amar, Verbo Intransitivo (1927), seu primeiro romance, desmascara a estrutura familiar paulistana. A história gira em torno de um rico industrial que contrata uma governanta para ensinar alemão aos filhos. Na verdade, tudo não passa de fachada para a iniciação sexual do filho mais velho. Em Clã do Jabuti (também de 1927), o autor mostra a importância que dá à pesquisa do folclore brasileiro, tendência que atingirá seu ponto alto no romance Macunaíma (1928), no qual recria mitos e lendas indígenas a partir dos quais constrói uma representação da identidade do Brasil e do brasileiro. Esse interesse pela identidade do país e de nosso povo é típico da primeira fase do Modernismo, a fase heroica. Como contista, os trabalhos mais significativos de Mário de Andrade estão publicados nos livros Belazarte e Contos novos. Na musicologia, o autor publicou um grande número de trabalhos sendo também autor de poemas e romances com cadência musical.

Interessante Estudiosos da obra de Mário de Andrade afirmam que os relatos da viagem de 1927 que compõem o turista aprendiz teriam servido de fonte de inspiração para a elaboração de Macunaíma, de 1928, considerado a sua obra-prima. Sabe-se, contudo, que Macunaíma foi escrito em poucos dias, em dezembro de 1926.

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O Turista aprendiz é a publicação póstuma do diário da viagem que fez à Amazônia, em 1927, durante a qual experimentou uma inédita diversidade de linguagens sonoras. A experiência acabou influenciando toda a concepção da música nacional desenvolvida no Modernismo brasileiro. Nesse diário, o autor expressa sua dificuldade em compreender a musicalidade e a sonoridade da música daquela região, lançando mão de recursos como o non sense e o surrealismo. Nessa obra é também possível vislumbrar o íntimo relacionamento entre arte e etnografia para a configuração da arte moderna no Brasil. Grande parte das reflexões surgidas nessa viagem está presente no livro musical Ensaio sobre a Música Brasileira, publicado originalmente em 1928, considerado um texto clássico para a Musicologia Brasileira. A obra influenciou grandes compositores contemporâneos, como Heitor Villa-Lobos, Francisco Mignone, Lorenzo Fernández e Camargo Guarnieri. Mário de Andrade morreu de ataque cardíaco, aos 51 anos. Sua obra poética foi reunida e publicada postumamente em Poesias Completas.

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DEGUSTANDO

é isto um homem?, de priMo levi

Cedo ou tarde, na vida, cada um de nós se dá conta de que a felicidade completa é irrealizável; poucos, porém, atentam para a reflexão oposta: que também é irrealizável a infelicidade completa. Os motivos que se opõem à realização de ambos os estados-limite são da mesma natureza; eles vêm de nossa condição humana, que é contra qualquer “infinito”. Assim, opõe-se a esta realização o insuficiente conhecimento do futuro, chamado de esperança no primeiro caso e de dúvida quanto ao amanhã, no segundo. Assim, opõe-se a ela a certeza da morte, que fixa um limite a cada alegria, mas também a cada tristeza. Assim, opõem-se as inevitáveis lides materiais que, da mesma forma como desgastam com o tempo toda a felicidade, desviam a cada instante a nossa atenção da desgraça que pesa sobre nós tornando a sua percepção fragmentária, e, portanto, suportável.

SE qUISER LER MAIS, procure Levi, Primo. É isto um homem? Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1988.

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SOBRE

priMo levi O químico e escritor italiano Primo Levi nasceu em Turim, Itália, em julho de 1919, no seio de uma família judia liberal. Em 1934, entrou para o Massimo d'Azeglio, uma escola secundária especializada no estudo dos livros clássicos, conhecida por seus professores antifascistas. Levi terminou a escola em 1937 e ingressou na Universidade de Turim, onde estudou química.

Interessante

Em 1938, o governo fascista aprovou leis raciais que proibiam cidadãos judeus de frequentar escolas públicas. Apesar das dificuldades impostas por este fato, conseguiu se formar em 1941, com mérito. Seu diploma, no entanto, foi marcado com a expressão de raça judia. As leis raciais também impediram que Levi encontrasse uma ocupação permanente na faculdade, depois de formado.

Levi afirmava que a experiência em Auschwitz lhe dera a oportunidade de recuperar sua identidade judaica.

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Assim como vários de seus colegas, Levi se juntou aos partisans, do Movimento Justiça e Liberdade. Sem o menor treinamento militar, ele e seus companheiros foram feitos prisioneiros pela milícia fascista. Assim que os milicianos descobriram que ele era judeu, enviaram-no para um campo de prisioneiros em Fossoli, perto de Modena. Em fevereiro de 1944, os prisioneiros do campo foram transportados para Auschwitz. Levi ficou onze meses no chamado campo da morte, até ser libertado pelo Exército Vermelho. Dos 650 judeus italianos mandados para Auschwitz com Levi, apenas vinte sobreviveram.

Embora tenha sido libertado em janeiro de 1945, Primo Levi só voltou a Turim em outubro daquele ano. Foi trabalhar como químico industrial em uma fábrica e começou a escrever sobre suas experiências no campo de concentração. Escreveu memórias, contos, poemas e novelas. Rejeitado por Einaudi, importante casa editorial de Turim, um de seus mais conhecidos livros, É isso um homem?, foi publicado inicialmente por uma pequena editora, em novembro de 1947. Apesar de uma crítica positiva de Italo Calvino no jornal L'Unità, apenas 1.500 cópias foram vendidas. Levi teve de esperar até 1958 para que Einaudi republicasse o livro, numa edição revisada e expandida. O livro é considerado por muitos historiadores a melhor obra sobre o Holocausto. A Trégua, que narra sua jornada de volta para casa após a prisão em campos de concentração, foi lançado em 1963 e alavancou sua reputação. Levi é também autor de obras de ficção. Primo Levi morreu em Turim, sua cidade natal, em abril de 1987. Seu livro O Sistema Periódico, uma coleção de pequenas histórias relacionadas, de algum modo, aos elementos químicos, escritas antes de ser enviado a Auschwitz, foi considerado pela Real Academia de Londres, em 2006, o melhor livro de ciência já escrito.

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Os romances, e principalmente os grandes romances, não são testemunhos nem documentos sobre a vida. São outra vida, dotada dos seus próprios atributos, que nasce para desacreditar a vida verdadeira, contrapondo-lhe uma miragem que, ao aparentar refleti-la, na verdade a deforma, retoca e refaz. márIo vargas llosa, in A tentação do impossível: Victor Hugo e Os miseráveis.

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FRANcIScO BOScO apresenta os livros Que amou Quem comenta

VOcê cONHEcE Francisco Bosco?

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Guerra e paz Liev Tolstói Ecce homo, como alguém se torna o que é Friedrich Nietzsche O império dos signos Roland Barthes

Maria Cristina Ferraz Doutora em Filosofia e professora Pedro Sussekind poeta, romancista, contista, ensaísta e tradutor

Filho do compositor, violonista e cantor João Bosco, Francisco Bosco nasceu no Rio de Janeiro, em outubro de 1976. É poeta, ensaísta e letrista. Formou-se em Jornalismo pela FACHA (Faculdades Integradas Hélio Alonso), em 1997. Em 2003, obteve o título de Mestre em Teoria Literária, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com a dissertação Texto, Crítica e Leitor:

testamento moderno e desafios contemporâneos. No mesmo ano ingressou no programa de doutorado em Teoria Literária, também na UFRJ. É autor dos seguintes livros: Da Amizade (Ed. 7Letras, 2003), Dorival Caymmi (Ed. Publifolha, 2006), Banalogias (Ed. Objetiva, 2007) e E livre seja este infortúnio (Ed. Azougue, 2010). É também colunista do jornal O Globo.

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DEGUSTANDO guerra e paz, de liev TolsTói

Para casar, André precisava do consentimento paterno, e por isso no dia seguinte partiu para a aldeia. O velho encarou a comunicação do filho com uma serenidade aparente e com uma cólera secreta. Não podia compreender que alguém quisesse modificar a sua vida e nela introduzir qualquer coisa de novo quando a sua própria chegava ao fim. “Que, ao menos, me deixem acabar meus dias a meu gosto, depois poderão fazer o que quiserem”, dizia para consigo o ancião. Para com o filho, contudo, procedeu com a diplomacia das grandes ocasiões. Foi com um ar sereno que discutiu com ele. Em primeiro lugar, aquele casamento, do ponto de vista do parentesco, da fortuna e da fidalguia, não era uma aliança brilhante. Em segundo lugar,

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André não estava na primeira juventude e tinha pouca saúde, e o velho insistia especialmente neste ponto, porquanto ela era muito jovem. Em terceiro lugar, havia uma criança, que não podia ser confiada aos cuidados de uma garota. E por fim, acrescentou, fitando o filho com um ar trocista: _ Eis o que te peço, espera um ano, vai viajar pelo estrangeiro, cuida de ti, trata de arranjar um alemão para dirigir a educação do príncipe Nicolau, como é teu desejo, e depois, se o teu amor, a tua paixão, a tua obstinação, tudo o que tu quiseres continuarem os mesmos, então casa-te. E aqui tens a minha última palavra, fica sabendo, a minha última palavra... _ E concluiu num tom que significava nada haver no mundo que o fizesse mudar de opinião.

SE qUISER LER MAIS, procure Tolstói, Liev. guerra e paz. Trad. Silvana Salerno. São Paulo: companhia das Letras, 2008

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SOBRE

liev TolsTói

Liev Tolstói, também conhecido como Léon Tolstói ou Leão Tolstói ou Leo Tolstoy, é considerado um dos maiores escritores de todos os tempos. Junto ao romancista Fiódor Dostoiévski, ao escritor e ativista político Máximo Gorki e ao médico, escritor e dramaturgo Anton Tchecov, Tolstói foi um dos grandes mestres da literatura russa do século XIX. Batizado Liev Nicolaevitch, Conde de Tolstói, o escritor nasceu na aldeia de Iasnaia Poliana na região de Tula, a 200 km de Moscou, Rússia. Era filho de Nicolas Ilyitch, Conde de Tolstói e de Maria Nicolaevna, princesa de Volgonsky. Com a morte prematura dos pais, foi educado por tutores. No fim da década de 1850, preocupado com a precariedade da educação no meio rural, Tolstói criou em Iasnaia Poliana uma escola para filhos de camponeses. Ele mesmo escreveu grande parte do material didático e, ao contrário da pedagogia da época, deixava os alunos livres, sem excessivas regras e sem punições. Em 1862, casou-se com Sophia Andreievna Bers, com quem teve 13 filhos. Durante 15 anos, dedicou-se intensamente à vida familiar, a administrar suas propriedades ao redor do rio Volga e a cuidar de seus servos. Foi nessa época que produziu os romances que o celebrizaram. Suas obras mais famosas são Guerra e Paz, escrita entre os anos de 1865 e 1869, sobre as campanhas de Napoleão na Rússia, e Anna Karenina, na qual denuncia o ambiente hipócrita da época e realiza um dos retratos femininos mais profundos e sugestivos da literatura.

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Embora extremamente bem-sucedido como escritor e famoso mundialmente, Tolstói atormentava-se com questões sobre o sentido da vida. Em sua busca, desistiu de encontrar respostas na filosofia, na teologia e na ciência e deixou-se guiar pelo exemplo da vida simples dos camponeses, a qual ele considerou ideal. A partir daí, teve início o período que ele chamou de sua “conversão”, durante o qual, seguindo “ao pé da letra” sua interpretação dos ensinamentos cristãos, deixou de beber e fumar, tornou-se vegetariano e passou a vestir-se como camponês. Recusou a autoridade de qualquer governo organizado e de qualquer igreja. Criticou também o direito à propriedade privada e os tribunais e pregou o conceito de não-violência. Difundia suas ideias em panfletos, ensaios e peças teatrais. Tolstói chegou a ser vigiado pela polícia do Czar. Devido a suas ideias e textos, foi excomungado pela Igreja Ortodoxa russa em 1901 e só não foi preso porque já era adorado em todo o mundo. No entanto, não conseguiu alcançar a simplicidade em que acreditava. Sua família cobrava-lhe os luxos e riquezas aos quais estavam acostumados. Sophia cobrava que o escritor deixasse para ela, em testamento, os direitos autorais de suas obras. Mas Tolstói elaborou um testamento secreto, deixando os direitos a um tolstoiano de nome Chertkov, que tornaria sua obra pública. Aos 82 anos de idade, Tolstói decidiu, enfim, fugir de casa e abandonar a família para deixar aquela vida na qual ele não mais acreditava. Nos trens e nas estações por que passava, era reconhecido por todos. Porém, devido

a sua preferência por viajar em vagões de terceira classe, onde havia frio e fumaça, o já debilitado escritor contraiu uma pneumonia e morreu durante a fuga, numa estação ferroviária, em novembro de 1910. Ambientado na Rússia do início do século XIX, Guerra e paz é considerado um dos maiores romances da história. Passa-se durante a campanha de Napoleão na Áustria e descreve a invasão da Rússia pelo exército francês e a sua retirada, compreendendo o período de 1805 a 1820. Trata-se de um painel profundo e verdadeiro da aristocracia russa, por ter sido escrito por um de seus membros. Guerra e paz retrata o preconceito e a hipocrisia da nobreza, e também suas tradições religiosas, ao lado da vida cotidiana dos soldados e dos servos.

Interessante Em 1856, Tolstói instalou-se na Iasnaia Poliana, a aldeia que lhe pertencia por herança. Ofereceu, na ocasião, a alforria a todos os seus servos, que, não se sabe por que razão, não a aceitaram. quando saiu o decreto em que Alexandre II abolia a servidão, foi designado «mediador da paz” (pessoa encarregada de aplicar a reforma agrária). Pelo seu senso de justiça, Tolstói foi acusado pelos latifundiários de favorecer os ex-servos.

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DEGUSTANDO ecce homo,

de friedriCH nieTzsCHe

ok A escolha na alimentação; a escolha do clima e do lugar; – a terceira, em que a nenhum preço se deve cometer um erro, é a escolha do seu tipo de recreação. Também aqui, e segundo o grau em que um espírito é sui generis, os limites do que lhe é permitido, isto é, útil, são cada vez mais estreitos. No meu caso, toda a leitura faz parte dos meus lazeres: faz parte, por conseguinte, do que me liberta de mim mesmo, do que me permite passear pelas ciências e pelas almas alheias – do que já não tomo a sério. A leitura reabilita-me justamente da minha seriedade. Em épocas de profundo trabalho, não se veem livros ao pé de mim: não permito então a ninguém falar ou pensar junto de mim. Eis o que eu chamo ler...

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SE qUISER LER MAIS, procure Nietzsche, Friedrich. ecce homo. Trad. Paulo césar de Souza. São Paulo: companhia das Letras, 2008.

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friedriCH nieTzsCHe Interessante A irmã de Nietzsche, Elizabeth, alterou muitos de seus escritos, produzidos quando já se encontrava doente. Por causa disso, o filósofo, que abominava o antissemitismo e o nacionalismo, chegou a ser considerado como inspirador do nazismo.

O filólogo e escritor Friedrich Nietzsche nasceu em outubro de 1844 na cidade alemã de Röcken. Formou-se em filologia clássica, que é a ciência que estuda uma língua, literatura, cultura ou civilização sob uma visão histórica, a partir de documentos escritos. Tornou-se filósofo, segundo ele mesmo, devido à leitura de Arthur Schopenhauer e à identificação com suas ideias: a inexistência de Deus e da alma e a falta de sentido da vida, que se constitui de sofrimento e luta, impelida por uma força irracional que se pode chamar de vontade.

cefaleia, problemas de visão e dificuldade para se expressar, foi obrigado a interromper a sua carreira universitária por um ano, mas não deixou de escrever. Quando tentou retornar às atividades acadêmicas, enfrentou sérios problemas em suas cordas vocais, que tornaram a sua fala quase inaudível. Em 1879, quase cego, Nietzsche abandonou definitivamente a universidade, passando a dedicar-se exclusivamente à escrita. Nesse período editou seus principais livros, mas a fama somente chegou ao final do século XIX, perto de sua morte.

Órfão de pai aos cinco anos, Nietzsche passou a infância em Naumburg, uma pequena cidade alemã às margens do rio Saale, onde cresceu em companhia da mãe, das tias e da avó. Considerado por professores como um aluno brilhante, aos 14 anos obteve uma bolsa para a renomada escola de Pforta. Lá, ganhou fluência em grego e latim e, ao mesmo tempo, começou a questionar os ensinamentos do cristianismo.

Na última década de vida, Nietzsche começou a apresentar sinais de demência. Passou a assinar como “Dionísio” e “O Crucificado”. Internado na Basileia, teve o diagnóstico de paralisia cerebral progressiva, provavelmente causada pelo uso de drogas como ópio e haxixe, ingeridas como automedicação.

Depois de Pforta, foi para Bonn estudar filosofia e teologia. Convocado para o Exército em 1867, não serviu devido a uma queda durante uma cavalgada. Convencido por um professor, passou a morar em Leipzig para estudar filologia. Com apenas 24 anos, foi nomeado professor de filologia clássica na Universidade da Basileia. Seu primeiro trabalho acadêmico conhecido foi A Origem e Finalidade da Tragédia, escrito em 1871. Nessa época, começou a sua amizade com o compositor Richard Wagner em cuja casa de campo, nas imediações do lago de Lucerna, buscava refúgio e inspiração. Seu primeiro livro, O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música (1871), recebeu grande influência de Wagner e Schopenhauer. Em 1870, Nietzsche participou da guerra franco-prussiana como enfermeiro do Exército, mas uma crise de difteria e disenteria o impediu de continuar trabalhando. Com crises constantes de

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Os estudiosos classificam a obra de Nietzsche como uma crítica aos valores ocidentais da tradição cristã e platônica. Desde seus primeiros textos, as ideias do filósofo grego Platão eram condenadas como decadentes. A sua proposta era o resgate de um super-homem criador, que ficasse além do bem e do mal. Em outubro de 1888, ao completar 44 anos de idade, Friedrich Nietzsche decidiu fazer um balanço de sua vida. Escreveu então Ecce homo, um dos mais belos livros da língua alemã. Ecce homo não é uma simples autobiografia: é sobretudo confissão e interpretação, uma síntese de sua obra e de seus conflitos. Nietzsche fala apaixonadamente de suas influências, de sua paixão, de como surgiram suas obras, de seu modo de vida, de seus objetivos. Considerando que o escreveu apenas algumas semanas antes de sofrer a perda completa da razão, Ecce homo é também sua última palavra. Nietzsche morreu em agosto de 1900, sem recuperar a sanidade mental.

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DEGUSTANDO

o império dos signos, de roland BarTHes

O arrombamento do sentido O haicai tem esta propriedade fantasmática: imaginamos sempre que podemos fazê-lo facilmente. Dizemo-nos: o que pode ser mais acessível à escrita espontânea do que isto (de Buson): É noite, outono, Penso somente Em meus pais. O haicai apetece: quantos leitores ocidentais não sonharam em passear pela vida com um caderninho na mão, anotando aqui e ali algumas “impressões” cuja brevidade garantiria a perfeição, cuja simplicidade atestaria a profundidade (em virtude de um duplo mito, um clássico, que faz da concisão uma prova de arte, outro romântico, que atribui um prêmio de verdade à improvisação). Ao mesmo tempo que é inteligível, o haicai não quer dizer nada, e é por essa dupla condição que parece ofertado ao sentido de modo particularmente disponível, prestativo, como um hospedeiro polido que nos permite instalar-nos à vontade em sua casa, com nossas manias, nossos valores, nossos símbolos; a “ausência” do haicai (como se diz tanto de um espírito irreal quanto de um proprietário que viajou) solicita o suborno, o arrombamento, em uma palavra, a maior cobiça, a do sentido.

SE qUISER LER MAIS, procure Barthes, Roland. o império dos signos. Trad. Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: wMF Martins Fontes, 2007.

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roland BarTHes O escritor, sociólogo, crítico literário, semiólogo e filósofo francês Roland Barthes nasceu em 1915, em Cherbourg. Considerado um dos mais importantes críticos literários da história, foi também crítico das atitudes sociais e cotidianas. Formado em Letras Clássicas em 1939 e em Gramática e Filosofia em 1943 pela Universidade de Paris, Sorbonne, fez parte da escola estruturalista, influenciado pelo linguista e filósofo suíço Ferdinand de Saussure, cujas teorias propiciaram o desenvolvimento da linguística como ciência autônoma. Sua contribuição mais marcante à linguística foi a ruptura com a clássica visão do escritor como autor soberano dos textos. Barthes revolucionou o pensamento literário afirmando que a unidade do texto não se encontra na origem, mas em sua destinação. Assim, defendeu o leitor e o crítico como criadores, em conjunto com o autor, do sentido do texto.

Interessante

Segundo Barthes, a ideia de autor tornou-se obsoleta. Em seu lugar, o mundo moderno apresenta uma figura que Barthes chama de “scriptor”, cujo poder é combinar textos preexistentes em novas formas. Barthes acreditava que toda escrita se fundamenta em textos anteriores, reescrituras, normas e convenções. O estudioso relativizou a importância da biografia do autor, atribuindo maior importância à formação do sentido, às convenções textuais e cultu-

rais preexistentes. Segundo ele, o escritor não tem passado, pois nasce com o texto. Ele também afirmava que, na ausência da ideia de um "autor-Deus", que controla o significado de determinado texto, os horizontes interpretativos estão abertos para o leitor ativo. Para ele, “a morte do autor é o nascimento do leitor”. Barthes usou a análise semiótica em revistas e propagandas, destacando seu conteúdo político. Dividia o processo de significação em dois sentidos: denotativo e conotativo. De forma resumida, o primeiro tratava da percepção simples, superficial e o segundo continha as “mitologias”, como chamava os sistemas de códigos que nos são transmitidos e adotados como padrões. Segundo ele, esses conjuntos ideológicos eram às vezes absorvidos despercebidamente, o que possibilitava e tornava viável o uso de veículos de comunicação para a persuasão. Em sua última fase, Barthes manifestou um interesse crescente pelas culturas orientais e escreveu O império dos signos, em 1970. Para ele, o Japão era o país da escrita. De todos os países que o autor pôde conhecer, aquele onde encontrou o trabalho do signo mais próximo de suas convicções. Para Barthes, a escrita japonesa, como o haicai, tem como objetivos alcançar a “palavra calma”, a “prática do neutro” e o prazer do texto. Barthes morreu em 1980, atropelado em uma rua de Paris.

Roland Barthes não gostava de ler seus próprios livros. Tinha medo de achá-los bons e não conseguir superá-los. Ou de achá-los ruins e arrepender-se de tê-los escrito.

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Pela quarta ou quinta vez, ao longo da vida, leio um autor que descobri aos quinze anos e agora me aparecem cheios de novidades. Não, a explicação não está na minha falta de memória, nada disso... É que a gente nunca lê o mesmo livro. márIo QUIntana, in Da preguiça como método de trabalho.

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ALIcE RUIz

apresenta os livros Que amou

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Alguns poemas Emily Dickinson O segundo sexo Simone de Beauvoir A arte cavalheiresca do arqueiro zen Eugen Herrigel

Quem comenta

Cláudia Roquette-Pinto poeta e tradutora

VOcê cONHEcE alice ruiz?

Alice Ruiz nasceu em Curitiba, PR, em janeiro de 1946. Aos 9 anos já escrevia contos e, aos 16, versos. No entanto, seus poemas só começaram a ser publicados aos 26 anos, em revistas e jornais culturais. Seu primeiro livro foi lançado quando já tinha 34 anos. Casou-se aos 22 anos com o escritor, poeta, crítico literário, tradutor e professor brasileiro Paulo Leminski, a quem pela primeira vez mostrou o que escrevia. Surpreso, Leminski comentou que ela escrevia haicais, termo que até então Alice não conhecia. Ela encantou-se com a forma poética japonesa, passando então a estudar com profundidade o haicai e seus poetas. Nos anos 1980, traduziu quatro livros de autores japoneses. Atualmente, dá cursos de haicai.

Isabel Aleixo editora

Antes da publicação de seu primeiro livro, Navalhanaliga, em dezembro de 1980, havia escrito textos feministas no início dos anos 1970 e editado algumas revistas, além de textos publicitários e roteiros de histórias em quadrinhos. Conquistou vários prêmios, incluindo o Jabuti de Poesia, de 1989, pelo livro Vice Versos e o Jabuti de Poesia, de 2009, pelo livro Dois em Um. Alice já publicou 19 livros, entre poesia, traduções e uma história infantil. Compõe letras desde os 26 anos e tem mais de 50 músicas gravadas por parceiros e intérpretes. Lançou, em 2005, seu primeiro CD, o Paralelas, em parceria com Alzira Espíndola, com participações de Zélia Duncan e Arnaldo Antunes.

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DEGUSTANDO

alguns poemas,

de eMily diCKinson

Seus seios uma pérola merecem – Mas quem há de trazê-la – Sua fronte foi feita para o trono Mas que láurea lhe dar? Seu coração por uma casa anseia – Eu – um Pardal – de ramos E de gravetos nele fiz um ninho Que há de eterno durar. _________ Se eu puder evitar que um Coração padeça Não viverei em vão. Se eu fizer que na Vida alguém esqueça A Dor ou a Aflição Ou se ajudar um Pássaro caído A retornar ao Ninho Não viverei em vão.

SE qUISER LER MAIS, procure Dickinson, Emily. alguns poemas. Trad. José Lira. São Paulo: Iluminuras, 2008.

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SOBRE

eMily diCKinson A poeta americana Emily Dickinson nasceu em dezembro de 1830, em Amherst, no estado de Massachussets, EUA, numa casa construída por seus avós. Sua família era abastada e ela teve uma formação escolar de alto nível. Chegou a estudar numa das mais rigorosas instituições que mulheres podiam frequentar naquela época, mas abandonou-a após se recusar, publicamente, a declarar sua fé. Depois dos estudos, retornou à casa dos pais para cuidar deles. Assim como sua irmã, nunca se casou e viveu reclusa. Em raros momentos deixou sua vida reclusa e fez pouquíssimas viagens. Numa delas, conheceu dois homens que influenciaram sua vida e inspiração poética: Charles Wadsworth, um clérigo de 41 anos a quem alguns críticos acreditam que foi dirigida parte de seus poemas de amor; e Thomas Higginson, um crítico literário. Por volta do ano de 1858, Emily começou a confeccionar os chamados “fascicles”, livros manuscritos com seus poemas, produzidos e encadernados à mão. De 1860 a 1870 escreveu centenas de poemas por ano. Em 1862, enviou quatro poemas ao crítico Thomas Higginson, que não compreendeu inteiramente sua poesia e desaconselhou a publicação. A partir de 1864, surpreendida por problemas de visão, o ritmo de sua escrita foi diminuindo aos poucos.

Interessante Alguns escritores brasileiros traduziram os poemas de Dickinson. O pioneiro deles foi Manuel Bandeira, na década de 1940. A escritora Ana cristina césar foi considerada uma importante tradutora do trabalho da poetisa norte-americana. O crítico José Miguel wisnik destaca o trabalho de Ana cristina que, ao traduzi-la, consegue criar “um tipo de verso que não existe na poesia brasileira, e do qual vai se valer ao escrever seus próprios poemas”. Dickinson foi uma das criadoras da poesia moderna, ao lado de seus contemporâneos: whitman, Baudelaire e Hopkins.

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Quase tudo que se sabe sobre a vida de Emily Dickinson tem como fonte as correspondências que ela manteve com algumas pessoas, entre colegas de escola, familiares e intelectuais. Em suas cartas, além de comentários sobre o seu cotidiano, havia também alguns poemas. Emily faleceu em 15 de maio de 1886, na cidade onde nasceu. Ao arrumar seu quarto, sua irmã encontrou uma gaveta cheia de papéis em desordem. Eram dezenas de fascículos costurados e folhas soltas com uma grande quantidade de poemas, dos quais apenas dez haviam sido publicados, anonimamente e por iniciativa de terceiros, em periódicos regionais. Disposta a divulgar a obra da irmã, Lavinia entrou em contato com Thomas Higginson, o crítico literário, que durante trinta anos renegou todos os versos que Emily lhe submetera. Dessa parceria, que não parecia muito promissora, surgiu a publicação póstuma de seus poemas. Sua obra completa é composta de cerca de 1800 poemas e mais de 1000 cartas e só foi publicada em 1955, após a transferência de seu acervo para a Universidade de Harvard. Foi imediatamente reconhecida e aclamada pelos críticos.

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DEGUSTANDO

o segundo sexo,

de siMone de Beauvoir O destino que a sociedade propõe tradicionalmente à mulher é o casamento. Em sua maioria, ainda hoje, as mulheres são casadas, ou o foram, ou se preparam para sê-lo, ou sofrem por não o ser. É em relação ao casamento que se define a celibatária, sinta-se ela frustrada, revoltada ou mesmo indiferente ante essa instituição. É, portanto, pela análise do casamento que nos cumpre continuar este estudo. A evolução econômica da condição feminina está modificando profundamente a instituição do casamento: este vem-se tornando uma união livremente consentida por duas individualidades autônomas; as obrigações dos cônjuges são recíprocas e pessoais; o adultério é para as duas partes uma denúncia do contrato; o divórcio pode ser obtido por uma ou outra das partes em idênticas condições. A mulher não se acha mais confinada na sua função reprodutora: esta perdeu em grande parte seu caráter de servidão natural, apresenta-se como um encargo voluntariamente assumido; e é assimilado a um trabalho produtivo porquanto, em muitos casos, o tempo de descanso exigido pela gravidez deve ser pago à mãe pelo Estado ou pelo empregador. Na U.R.S.S., o casamento foi considerado durante alguns anos como um contrato interindividual, assentado unicamente na liberdade dos cônjuges; parece que é hoje um serviço que o Estado impõe a ambos. A vitória de uma ou outra tendência dependerá da estrutura geral da sociedade no mundo de amanhã: em todo caso, a tutela masculina vai desaparecendo. Contudo, a época em que vivemos é ainda, do ponto de vista feminista, um período de transição. Uma parte somente das mulheres participa da produção e mesmo essa parte pertence a uma sociedade em que antigas estruturas e valores sobrevivem. O casamento moderno só se compreende à luz do passado que ele perpetua.

SE qUISER LER MAIS, procure Beauvoir, Simone de. o segundo sexo. 2. A experiência vivida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.

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SOBRE

siMone de Beauvoir

Interessante Inspiradora do movimento e das líderes feministas em todo o mundo, Simone de Beauvoir sempre foi alvo de muitas críticas. chamavamna de escritora, mas foi-lhe negado, durante muito tempo, o reconhecimento como pensadora. Seu livro o segundo sexo foi tachado de pornográfico e ofensivo ao sexo masculino. quanto à sua ficção, diziam que ela não criava caracteres, apenas copiava perfis de pessoas reais. Ao que ela respondia que Tolstói tinha feito o mesmo em guerra e paz.

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A filósofa Simone de Beauvoir nasceu em Paris, em 1908. Era uma criança mimada e foi o centro das atenções em sua família. Em 1909, o avô materno, Gustave Brasseur, presidente do Banco Meuse, faliu, jogando toda a sua família em desonra e pobreza. A família lutou durante toda a infância de Simone e de sua irmã Hélène, para manter seu lugar na alta burguesia. Desde pequena, Simone de Beauvoir distinguiu-se nos estudos. Seu pai, que lhe transmitiu o amor pelo teatro e pela literatura, afirmava que ela “pensava como um homem”, o que a agradava muito.

Beauvoir e Lanzmann viajarem com Sartre e sua amante, Michelle Vian, ex-esposa do escritor Boris Vian.

Depois de passar nos exames de bacharelado em matemática e filosofia, Simone de Beauvoir estudou matemática, literatura e línguas e, em seguida, filosofia na Universidade de Paris, Sorbonne. Formou-se em 1929, com uma tese sobre Gottfried Leibniz, filósofo, cientista, matemático, diplomata e bibliotecário alemão. Nessa época, conheceu o filósofo Jean-Paul Sartre, que seria seu companheiro por toda a vida. Aos 21 anos, Beauvoir se tornou a pessoa mais jovem e a nona mulher a obter o grau agrégation em filosofia, o qual designa alta competência acadêmica. No exame final, ficou em segundo lugar; Sartre, 24 anos, foi o primeiro.

Beauvoir e Sartre visitaram o Brasil entre agosto e novembro de 1960; foram também a Cuba, onde foram recebidos por Fidel Castro e Che Guevara. Sempre tiveram marcada atuação política, manifestando-se contra o governo francês por suas intervenções na Indochina e na Argélia; contra a perseguição dos judeus durante a Segunda Guerra; contra a invasão americana do Vietnã e em muitas outras ocasiões. Simone de Beauvoir morreu em Paris, em 14 de abril de 1986.

Uniu-se estreitamente a Sartre e a seu círculo, numa relação polêmica e fecunda que lhes permitiu compatibilizar suas liberdades individuais com sua vida em conjunto. Ambos viveram longas relações amorosas, cada um com outras pessoas; Beauvoir teve uma forte relação com o escritor norte-americano Nelson Algren, logo após a guerra. Na década de 1950, manteve outra relação duradoura com Claude Lanzmann. No verão, era comum

Simone de Beauvoir foi professora de filosofia até 1943 em escolas de diferentes localidades francesas, como Ruão e Marselha. Em 1945, fundou, com Sartre, o combativo periódico Les Temps Modernes. Escritora e feminista, fez parte do grupo de filósofos-escritores associados ao existencialismo - movimento que teria enorme influência na cultura europeia de meados do século passado, com repercussões no mundo inteiro.

O Segundo Sexo, publicado em 1949, foi um manifesto pioneiro, no qual Simone de Beauvoir propôs novas bases para o relacionamento entre mulheres e homens. Lançado numa época em que o termo "feminismo" nem sequer havia sido cunhado, o livro é considerado marco inicial do debate sobre a condição da mulher. Segundo volume da obra, O Segundo Sexo II examina a condição da mulher em todas as suas dimensões: a sexual, a psicológica, a social e a política.

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a arte cavalheiresca do arQueiro zen, de eugen Herrigel

O aluno japonês traz consigo três coisas: uma boa educação, um profundo amor pela arte escolhida e uma veneração incondicional pelo mestre. Desde tempos imemoriais, a relação entre mestre e discípulo pertence às relações elementares da vida e ultrapassa muito os limites da matéria que ensina. No princípio, a única coisa que se lhe exige é que imite respeitosamente tudo o que o mestre faz. Pouco amigo de prolixos doutrinamentos e motivações, ele se limita a breves indicações e não espera que o aluno faça perguntas. Observa tranquilamente suas ações, sem esperar independência ou iniciativa própria, aguardando com paciência o crescimento e a maturação. Os dois dispõem de tempo: o mestre não pressiona, o discípulo não se precipita. Longe de querer despertar prematuramente o artista, o mestre considera como sua missão primordial converter o discípulo num artesão que domine profundamente o ofício, o que este fará com a sua habitual e pertinaz dedicação e como se não tivesse aspirações mais elevadas, submetendo-se ao duro aprendizado com resignação, para descobrir, com o passar dos anos, que o domínio perfeito da arte, longe de oprimir, libera.

SE qUISER LER MAIS, procure Herrigel, Eugen. a arte cavalheiresca do arqueiro zen. São Paulo: Pensamento, 1999.

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SOBRE

eugen Herrigel

O filósofo alemão Eugen Herrigel nasceu em março de 1884 em Lichtenau, na região de Baden-Württemberg. Após concluir os estudos de Filosofia, lecionou em Heidelberg, em 1923. Foi professor de Filosofia na Universidade Imperial de Tohoku, em Sendai, Japão, de 1924 a 1929. Enquanto vivia no Japão, além de estudar kyudo, japonês tradicional, treinou arco e flecha com o mestre Awa Kenzo (1880-1939), na esperança de aprofundar sua compreensão do zen. Em julho de 1929, retornou à Alemanha e recebeu uma cadeira de Filosofia na Universidade de Erlangen, na região da Baviera, onde lecionou Filosofia sistemática entre 1929 e 1948. Foi responsável pela difusão da filosofia zen em boa parte da Europa, através de seus escritos. Morreu em abril de 1955, em Partenkirchen, na Baviera. Em A Arte Cavalheiresca, o filósofo alemão conta sua experiência como discípulo do mestre zen Awa Kenzo. Para o praticante zen, atividades como arco e flecha, esgrima, pintura, arranjos florais ou artes marciais são encaradas como um meio para se atingir a sabedoria transcendental, um “coração puro”, trilhar o “caminho do meio” ensinado por Buda.

Interessante A canção Como uma onda (zen-surfismo), composta por Lulu Santos e Nelson Motta para o filme garota dourada, de Antônio calmon, teria recebido a influência de leituras feitas pelo roqueiro de obras de Jorge Luís Borges e de a arte cavalheiresca do arqueiro zen.

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LONGE DE qUERER DESPERTAR PREMATURAMENTE O ARTISTA, O MESTRE cONSIDERA cOMO SUA MISSÃO PRIMORDIAL cONVERTER O DIScíPULO NUM ARTESÃO qUE DOMINE PROFUNDAMENTE O OFícIO, O qUE ESTE FARá cOM A SUA HABITUAL E PERTINAz DEDIcAÇÃO E cOMO SE NÃO TIVESSE ASPIRAÇõES MAIS ELEVADAS, SUBMETENDO-SE AO DURO APRENDIzADO cOM RESIGNAÇÃO, PARA DEScOBRIR, cOM O PASSAR DOS ANOS, qUE O DOMíNIO PERFEITO DA ARTE, LONGE DE OPRIMIR, LIBERA. a arTe CavalHeiresCa do arqueiro zen eUgen herrIgel

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Encheu-se-lhe a fantasia de tudo que achava nos livros, assim de encantamentos, como pendências, batalhas, desafios, feridas, requebros, amores, tormentas, e disparates impossíveis; e assentou-se-lhe de tal modo na imaginação ser verdade toda aquela máquina de sonhadas invenções que lia, que para ele não havia história mais certa no mundo. mIgUel de cervantes, in Dom Quixote de La Mancha, 1ª parte, capítulo I

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SíLVIO MEIRA

apresenta os livros Que amou Quem comenta

Romance d’a pedra do reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta Ariano Suassuna Casa-grande & senzala Gilberto Freyre Da brevidade da vida Lúcio Sêneca

Bráulio Tavares poeta, escritor, compositor, roteirista e pesquisador Ronaldo Vainfas escritor e professor

VOcê cONHEcE sílvio meira?

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Silvio Romero de Lemos Meira nasceu em Taperoá, estado da Paraíba, em 1955. Formado em Engenharia Eletrônica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) em 1977, concluiu o mestrado em informática na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em 1981, e o doutorado em computação pela University of Kent at Canterbury (Inglaterra), em 1985. Foi pesquisador do CNPq, onde concebeu e coordenou o programa temático multi-institucional em ciência da computação. Membro do primeiro comitê gestor da Internet/br, foi presidente da Sociedade Brasileira de Computação e consultor do Banco Mundial e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Já supervisionou dezenas de teses de doutorado e dissertações de mestrado em sua área. Silvio Meira é atualmente professor titular de Engenharia de Software do Centro de Informática da UFPE.

Cientista-chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (C.E.S.A.R), é presidente do conselho de administração do Porto Digital e membro do comitê assessor de tecnologias da informação do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Além disso, faz palestras no Brasil e pelo mundo e escreve em diversas publicações sobre inovação, criatividade, motivação, TICs e games, redes sociais, sociedade da informação, políticas e estratégias de informação e temas afins. Meira recebeu da Presidência da República as comendas da Ordem Nacional do Mérito Científico e da Ordem de Rio Branco; e do Governo de Pernambuco, o Grau Comendador do Quadro de Graduados Especiais da Ordem do Mérito dos Guararapes. Foi considerado, pela revista Info Exame, uma das 100 pessoas mais importantes das tecnologias da informação no Brasil.

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DEGUSTANDO

romance d’a pedra do reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta, de ariano suassuna

É meio-dia, agora, em nossa Vila de Taperoá. Estamos a 9 de Outubro de 1938. É tempo de seca, e aqui, dentro da Cadeia onde estou preso, o calor começou a ficar insuportável desde as dez horas da manhã. Pedi então ao Cabo Luís Riscão que me deixasse sair lá de baixo, da cela comum, e vir cá para cima, varrer o chão de madeira do pavimento superior, onde funcionava, até o fim do ano passado, a Câmara Municipal. O Cabo Luís Riscão é filho daquele outro, de nome igual, que morreu, aqui mesmo na Cadeia, em 1912, na chamada “Guerra de Doze”, num tiroteio da Polícia contra as tropas dos Sertanejos que, a mando de meu tio e Padrinho, Dom Pedro Sebastião Garcia-Barreto, atacaram, tomaram e saquearam nossa Vila. Tem, portanto, o Cabo todos os motivos de má vontade contra mim. Mas como sou “de família de certa ordem” e lhe dou pequenas gorjetas, abranda essa má vontade de vez em quando. Hoje, por exemplo, quando fiz o pedido, ele me concedeu o cobiçado privilégio de preso-varredor. Abriu a porta de grades enferrujadas, trouxe-me para cá, deixou-me aqui sozinho, trancado, varrendo, e foi-se a cochilar na rede da sua casa, que fica no quintal da Cadeia. Aproveitei, então, o fato de ter terminado logo a tarefa e deitei-me no chão de tábuas, perto da parede, pensando, procurando um modo hábil de iniciar este meu Memorial, de modo a comover o mais possível com a narração dos meus infortúnios os corações generosos e compassivos que agora me ouvem. Pensei: - Este, como as Memórias de um Sargento de Milícias, é um “romance” escrito por um “Brasileiro”. Posso começá-lo, portanto, dizendo que era, e é, “no tempo do Rei”. Na verdade, o tempo que decore entre 1935 e este nosso ano de 1938 é o chamado “Século do Reino”, sendo eu, apesar de preso, o Rei de quem aí se fala.

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SE qUISER LER MAIS, procure Suassuna, Ariano. romance d'a pedra do reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta. Rio de Janeiro: José Olympio, 2004.

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SOBRE

ariano suassuna O advogado, professor, teatrólogo e romancista Ariano Suassuna nasceu em junho de 1927, na cidade de João Pessoa, capital da Paraíba. Tinha pouco mais de três anos quando seu pai, que havia governado o Estado no período de 1924 a 1928, foi assassinado no Rio de Janeiro, em consequência da luta política às vésperas da Revolução de 1930. No mesmo ano, sua mãe se transferiu com os nove filhos para Taperoá, também na Paraíba, onde Suassuna fez seus estudos primários. No sertão paraibano, Suassuna se familiarizou com os temas e as formas de expressão que mais tarde vieram a povoar a sua obra. Em 1942, a família se mudou para Recife e seus primeiros textos foram publicados nos jornais da cidade, enquanto ele ainda fazia os estudos pré-universitários. Em 1946, iniciou a Faculdade de Direito e se ligou ao grupo de jovens escritores e artistas que tinha à frente Hermilo Borba Filho, com o qual fundou o Teatro do Estudante Pernambucano. No ano seguinte, escreveu sua primeira peça, Uma mulher vestida de sol, e com ela ganhou o prêmio Nicolau Carlos Magno.

Interessante

Após formar-se na Faculdade de Direito, em 1950, Suassuna passou a exercer também a advocacia. Mudou-se de novo para Taperoá, onde escreveu e montou a peça Torturas de um coração, em 1951. No ano seguinte, voltou a morar em Recife. O Auto da compadecida (1955), encenado em 1957, conquistou a medalha de ouro da Associação Brasileira de Críticos Teatrais. A peça o projetou no país e no exterior, pois foi também traduzida e representada em nove idiomas, além de ter sido adaptada para o cinema. Casou-se em 1957 e teve seis filhos.

Suassuna costuma escrever seus textos à mão. Depois os datilografa numa velha máquina de escrever. costuma fazer a revisão de seus textos deitado.

Sempre interessado nas formas de expressão populares tradicionais, Ariano Suassuna lançou, em 1970, o Movimento Armorial. O objetivo era criar arte erudita a partir de elementos da cultura popular do nordeste brasileiro. O escritor foi Secretário de Educação e Cultura do Recife de 1975 a 1978 e doutorou-se em História, em 1976, pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde foi professor por mais de 30 anos.

Em 1948, o então jovem Ariano Suassuna, com 21 anos, passou alguns dias preso na penitenciária Lemos Brito do complexo Frei caneca, no Rio de Janeiro. Mas engana-se quem pensa que ele havia cometido algum crime. Sua passagem por ali acontecera porque queria entender melhor sobre direito penal. Segundo relatou o próprio autor, “o contato com a realidade penitenciária serviu para aprender muito sobre o ser humano”.

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O Romance d’a pedra do reino e o príncipe do sangue do vai e volta levou quase uma década para ser escrito. Foi publicado originalmente em 1971. É inspirado em um episódio ocorrido no município sertanejo de São José do Belmonte, a 470 quilômetros do Recife, em 1836: uma seita tentou fazer ressurgir o rei Dom Sebastião - transformado em lenda em Portugal depois de desaparecer na África durante a Batalha de Alcácer-Quibir, em 1580. O autor afirma que o romance tem como motivação de fundo a morte do pai, tragédia pessoal presente em sua literatura, e a redenção do seu “rei”. A história, baseada na cultura popular nordestina e inspirada na literatura de cordel, nos repentes e nas emboladas, é dedicada ao pai do autor e a mais doze “cavaleiros”, entre eles Euclides da Cunha, Antônio Conselheiro e José Lins do Rego. O sentimento sebastianista ainda hoje é lembrado em Pernambuco, durante a Cavalgada da Pedra do Reino, manifestação popular que acontece anualmente no local onde inocentes foram sacrificados pela volta do rei. Ariano Suassuna ocupa, desde 1990, a cadeira número 32 da Academia Brasileira de Letras.

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casa-grande & senzala, de gilBerTo freyre

Trecho do prefácio da 1ª edição de Casa-grande & senzala:

Trecho de Casa-grande & senzala:

A casa-grande venceu no Brasil a Igreja, nos impulsos que esta a princípio manifestou para ser a dona da terra. Vencido o jesuíta, o senhor de engenho ficou dominando a colônia quase sozinho. 0 verdadeiro dono do Brasil. Mais do que os vice-reis e os bispos.

Costuma dizer-se que a civilização e a sifilização andam juntas: o Brasil, entretanto, parece ter-se sifilizado antes de se haver civlizado. Os primeiros europeus aqui chegados desapareceram na massa indígena quase sem deixar sobre ela outro traço europeizante além das manchas de mestiçagem e de sífilis. Não civilizaram: há, entretanto, indícios de terem sifilizado a população aborígine que os absorveu.

A força concentrou-se nas mãos dos senhores rurais. Donos das terras. Donos dos homens. Donos das mulheres. Suas casas representam esse imenso poderio feudal. "Feias e fortes.” Paredes grossas. Alicerces profundos. Óleo de baleia. Refere uma tradição nortista que um senhor de engenho mais ansioso de perpetuidade não se conteve: mandou matar dois escravos e enterrá-los nos alicerces da casa. 0 suor e às vezes o sangue dos negros foi o óleo que mais do que o de baleia ajudou a dar aos alicerces das casas-grandes sua consistência quase de fortaleza.

Precisamente sob o duplo ponto de vista da miscigenação e da sifilização é que nos parece ter sido importantíssima a primeira fase de povoamento. Sob o ponto de vista da miscigenação foram aqueles povoadores à-toa que prepararam o campo para o único processo de colonização que teria sido possível no Brasil: o da formação, pela poligamia - já que era escasso o número de europeus - de uma sociedade híbrida. Dos Diogos Álvares, dos Joões Ramalhos, um tanto impropriamente de Jerônimo de Albuquerque (que já pertence a outra fase de povoamento) escreveu Paulo Prado que "proliferam largamente, como que indicando a solução para o problema da colonização e formação da raça no nosso país". Do seu contato com a população ameríndia resultaram, na verdade, as primeiras camadas de mestiçagem formando porventura pontos mais fáceis à penetração da segunda leva de gente europeia. Quando os povoadores regulares aqui chegaram, já foram encontrando sobre o pardo avermelhado da massa indígena aquelas manchas de gente mais clara. Ainda que sem definida caracterização europeia, esses mestiços, quase pelo puro fato da cor mais próxima da dos brancos e por um ou outro traço de cultura moral ou material já adquirido dos pais europeus, devem ter sido um como calço ou forro de carne amortecendo para colonos portugueses ainda virgens de experiências exóticas - e os havia decerto numerosos, vindos do norte - o choque violento de contato com criaturas inteiramente diversas do tipo europeu.

SE qUISER LER MAIS, procure Freire, Gilberto. obra escolhida. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1977. Freire, Gilberto. Casa-grande & senzala. São Paulo: Global, 2006.

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SOBRE

gilBerTo freyre

O sociólogo, antropólogo, historiador e escritor pernambucano Gilberto Freyre nasceu em Recife, em março de 1900. Filho de um juiz e catedrático de economia política, pertencia a uma família nordestina antiga, descendente dos primeiros colonizadores portugueses. Gostava de pintar e de desenhar e aprendeu a ler aos oito anos de idade. Em 1920, chegou a Nova Iorque, onde estudou ciências políticas e sociais. Foi discípulo do antropólogo alemão Franz Boas (1858-1942). Iniciou, então, uma verdadeira descoberta do Brasil e, em 1922, obteve o título de mestrado com a publicação do trabalho Vida social no Brasil nos meados do século XIX.

Interessante Na viagem de navio que transportou os originais de Casa-grande e senzala para o Rio, houve um pequeno acidente: algumas páginas dos originais caíram no mar. como não se fazia cópias naquela época, contaram com a ajuda de um marinheiro para resgatar as folhas.

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Retornou ao Recife em 1924, mas partiu para o exílio após a Revolução de 1930. Depois de lecionar na Universidade de Stanford, EUA, viajou, em 1931, para a Europa. De volta ao Brasil em 1932, deu continuidade, no Rio de Janeiro, às pesquisas que desaguariam na publicação de Casagrande & senzala, em 1933. Durante algum tempo recusou empregos, viveu em casas de amigos e pensões baratas, até que o sucesso do livro o levou de volta à carreira de professor. Casou-se em 1941. No ano seguinte, foi preso no Recife por ter denunciado nazistas e racistas no Brasil. Reagiu à prisão, juntamente com seu pai, Alfredo Freyre. Ambos foram soltos no dia

seguinte, por interferência do amigo e general Góis Monteiro. Sua vida política foi marcada pela ação contra o racismo. Foi Deputado Federal constituinte pela União Democrática Nacional (UDN) em 1946. Em 1954, apresentou propostas para eliminar as tensões raciais na Assembleia Geral das Nações Unidas. Com o livro Casa-grande & senzala, publicado em 1933, Gilberto Freyre revolucionou a historiografia. No lugar do tradicional registro cronológico de guerras e reinados, passou a estudar o cotidiano por meio da história oral, de documentos pessoais, de manuscritos de arquivos públicos e privados, de anúncios de jornais, entre outras fontes. Usou também seus conhecimentos de antropologia e sociologia para interpretar fatos de forma inovadora. Em Casa-grande & senzala, o autor abordou a miscigenação entre negros, indígenas e brancos no Brasil como um aspecto positivo e fundamental na formação da sociedade brasileira. O livro foi traduzido para seis idiomas e teve mais de 40 edições nacionais, constituindo-se num marco a partir do qual a visão do Brasil e dos brasileiros nunca mais foi a mesma. Considerado por muitos como um dos mais importantes sociólogos do país, Gilberto Freyre morreu em Recife, em julho de 1987.

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da Brevidade da vida, de lúCio sêneCa

1. Tenho o costume de ficar admirado, quando vejo alguns que solicitam o tempo alheio e o rogado que se mostra generoso. Ambos encaram o objeto da petição, mas nenhum deles vê o tempo em si. Um pede como se fosse algo de ninharia e como tal é-lhe concedido. Estão brincando com a coisa mais preciosa do mundo. O engano advém do fato que o tempo é algo de incorporal, que não impressiona os olhos e por isso é tido qual coisa desprezível, ou melhor, de valor nulo.

2. Com suma satisfação, os homens recebem os soldos anuais e por eles empatam trabalho, serviço e dedicação. O tempo ninguém o valoriza. Todos o esbanjam qual coisa sem apreço. Isso não obstante, veem os enfermos. Se o perigo da morte aproxima-se, eles abraçam os joelhos dos médicos. Se temem a pena capital, mostram-se dispostos a doar todos os seus bens em troca da prorrogação de sua própria existência.

SE qUISER LER MAIS, procure Sêneca, Lúcio. da brevidade da vida. São Paulo: Editora Escala, 2007. Em algumas edições, o título de brevitate vitae é traduzido como sobre a brevidade da vida.

Interessante Os textos de Sêneca serviram como fonte de inspiração para vários autores. Hamlet, de Shakespeare, é uma peça que sofreu muita influência do dramaturgo romano. São Jerônimo chegou a indicá-lo para ser canonizado.

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SOBRE

lúCio sêneCa

Acredita-se que o filósofo, dramaturgo, político e escritor Lúcio Aneu Sêneca tenha nascido em Córdoba, Espanha, por volta do ano 1 da era cristã. Oriundo de família ilustre, é conhecido também como Sêneca o Jovem, Sêneca o Moço ou Sêneca o Filósofo. Ainda muito jovem foi enviado a Roma para estudar. Lá, aprofundou-se em gramática, retórica e filosofia estoica. Com a saúde abalada pelo rigor dos estudos, passou uma temporada no Egito para se recuperar e regressou a Roma por volta do ano 31 da era cristã. Nessa ocasião, iniciou sua carreira como orador e advogado e logo chegou ao Senado romano. Foi personagem de destaque na vida intelectual e política de Roma, conselheiro nas cortes dos imperadores Calígula, Cláudio e Nero. Embora exercesse altas funções na corte, fez oposição aos imperadores Calígula e Cláudio. Por isso foi exilado na Córsega entre os anos 41 e 49. No exílio, dedicou-se aos estudos e escreveu vários de seus principais tratados filosóficos, entre eles De Consolatione, em que expôs os ideais estoicos clássicos de renúncia aos bens materiais e busca da tranquilidade da alma mediante o conhecimento e a contemplação.

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Sêneca retornou a Roma no ano 49. Agripina a Jovem, sobrinha e esposa do imperador Cláudio, tornou-o orientador da educação de seu filho, o jovem Nero. O filósofo se casou com Pompeia Paulina, uma mulher que fazia parte do círculo próximo ao imperador. Logo após a morte de Cláudio, ocorrida no ano 54, Sêneca vingou-se do exílio com um escrito que foi considerado obra-prima das sátiras romanas, Apocolocyntosis divi Claudii (A transformação em abóbora do divino Cláudio). Nessa obra, critica o autoritarismo do imperador e narra como ele foi recusado pelos deuses. Sêneca se destacava por ser um entusiasta da filosofia, estudioso apaixonado, informado de todas as correntes filosóficas do seu tempo, mas contrário a fechar-se em qualquer sistema ou fórmula. Sua obra literária e filosófica inspirou o desenvolvimento da tragédia na dramaturgia europeia renascentista. Quando Nero, aos dezessete anos, tornou-se imperador, Sêneca converteuse em seu principal conselheiro. Procurou orientá-lo para uma política justa e humanitária e, assim, a índole de Nero foi contida por algum tempo. Mais tarde, o imperador viria a revelar

e exercer toda sua maldade, mandando executar a própria mãe, que vinha conspirando contra seu império. Conta-se que Sêneca chegou a redigir uma carta que, dirigida ao Senado, tentava justificar tal execução. Foi muito criticado pela fraca oposição à tirania de Nero e ao acúmulo de riquezas, incompatíveis com as concepções estoicas que tanto defendia. Sêneca retirou-se da vida pública em 62. Da brevidade da vida é a obra mais difundida do filósofo e um dos textos mais conhecidos de toda a Antiguidade latina. São cartas nas quais fala sobre a natureza finita da vida humana em temas como a aprendizagem, a amizade, os livros e a morte, além de maneiras de prolongar a vida e livrá-la das futilidades. No ano 65 d.C., Sêneca foi acusado de ter participado de uma conspiração para o assassinato de Nero. Sem julgamento, foi obrigado pelo imperador a cometer suicídio. Na presença dos seus amigos, cortou os pulsos com o ânimo sereno que defendia em sua filosofia.

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Longe de serem escritores, fundadores de um lugar próprio, herdeiros dos servos de antigamente, mas agora trabalhando no solo da linguagem, cavadores de poços e construtores de casas, os leitores são viajantes; circulam em terras alheias, nômades caçando por conta própria através dos campos que não escreveram, arrebatando os bens do Egito para usufruí-los. mIchel de certeaU, in A invenção do cotidiano

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MARcOS VINícIUS NEVES

apresenta os livros Que amou

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O palácio de Circe e outras lendas gregas Orígenes Lessa I Ching – o livro das mutações tradução da versão organizada por Richard wilhelm Um paraíso perdido: ensaios amazônicos Euclides da cunha

Quem comenta

Hamilton Vaz Pereira dramaturgo, diretor de teatro e ator

VOcê cONHEcE marcos vinícius neves?

Marcos Vinícius Neves, arqueólogo e historiador, nasceu no Rio de Janeiro e vive no Acre. Extremamente apaixonado pela história e pela cultura da terra de Plácido de Castro, tornou-se uma das pessoas mais autorizadas para explicá-la e defendê-la. É autor de “Rio Branco: de seringal a capital”, em que a capital do Acre conta a sua própria história em primeira pessoa. Marcos Vinicius afirma que, mais que um historiador, ele acabou por se tornar um contador de histórias. Foi presidente da Fundação Municipal de Cultura Garibaldi Brasil.

Francisco Mourão sacerdote taoísta, acupunturista e professor

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DEGUSTANDO

o palácio de circe e outras lendas gregas, de orígenes lessa

As sementes de romã Nem os servos de Plutão, que haviam subido à terra à procura dos frutos e dos alimentos que as árvores oferecem, nem Prosérpina, que estava a contragosto resignada à sua prisão naquele palácio, mas não chegava a odiar o rei das minas e das trevas, afinal tão carinhoso com ela, nem eles nem ela, nem ninguém, sabiam que o alado Mercúrio havia astuciosamente penetrado no palácio e conversava com Plutão. Mercúrio, graças ao seu poder de sobrevoar os perigos que encontrava, driblara alegremente as três cabeças ferozes de Cérbero. O triste cão sombrio e feroz ficara imóvel sobre as quatro patas fincadas no chão, sem poder despegarse, porque cada cabeça dava, ao mesmo tempo que as outras, seu bote mortal, querendo atingir Mercúrio, que voejava de um para outro lado, com infinita rapidez. E quando Plutão menos esperava, tinha, diante dele e do seu trono, a figura sagaz, astuciosa, maliciosa e matreira de Mercúrio, mensageiro dos deuses e, naquele momento, esperança dos homens. Mas, nesse meio tempo, já haviam regressado, na maior desilusão, os servidores enviados à terra. Só desolação tinham visto. Só árvores mortas. Só homens com fome. Só gado magro gemendo nos campos. Nem flores nem frutos. E apenas – mas somente aquilo – numa árvore já sem folhas, uma romã, a última romã emurchecida, rachada e sem cor. Com aquela romã seca e sem vida regressaram. E tristes e acabrunhados com as más notícias que traziam e com o único fruto encontrado, ainda assim o entregaram à princesa encarregada de cuidar da alimentação de Prosérpina. E numa salva de prata a romã feia e murcha foi levada à presença da pequenina prisioneira. Que a recebeu com a alegria de quem revia afinal uma das frutas que mais amava no seu passado de liberdade.

SE qUISER LER MAIS, procure Lessa, Orígenes. o palácio de Circe e outras lendas gregas. Rio de Janeiro: Tecnoprint, 1970.

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SOBRE

orígenes lessa O jornalista, contista, novelista, romancista e ensaísta Orígenes Lessa nasceu em julho de 1903, na cidade de Lençóis Paulista, no estado de São Paulo. Filho do pernambucano Vicente Themudo Lessa, historiador, jornalista e pastor protestante, foi com a família para São Luís do Maranhão, em 1906, e lá viveu até os nove anos.

Interessante O escritor Orígenes Lessa atuou muito tempo como redator publicitário. Mas não possuía uma visão romântica da publicidade, ao contrário, era bem prático. certa vez, declarou que “anúncio é feito não para ser bonito, nem bem escrito... é para produzir resultados”. Graças à propaganda, o autor conseguiu se manter financeiramente para se dedicar com mais tranquilidade ao seu ofício de escritor.

Em 1912, a família retornou a São Paulo. Orígenes Lessa frequentou um seminário protestante dos 19 aos 21 anos e, em 1924, transferiu-se para o Rio de Janeiro com o desafio de, longe da família, exercer o magistério e custear sua própria vida. Chegou a se formar e exercer profissionalmente a educação física, mas acabou no jornalismo, publicando seus primeiros artigos no diário O Imparcial. Ainda em 1924, voltou para São Paulo e passou a trabalhar como redator publicitário na General Motors, onde ficou até 1931. Nessa época também escrevia no Diário da Noite, de São Paulo, e começou a publicar suas primeiras obras literárias.

Em 1932, por seu envolvimento na Revolução Constitucionalista, foi preso e encaminhado ao presídio de Ilha Grande, Rio de Janeiro, onde escreveu Não há de ser nada e Ilha Grande, dois trabalhos que o projetaram nos meios literários. Novamente em liberdade, publicou algumas obras, entre as quais O Feijão e o Sonho, que conquistou prêmios e chegou a ser adaptada para a televisão. Em 1942, mudou-se para Nova Iorque, onde foi coordenador de assuntos interamericanos e redator de uma rede de televisão. Em 1943, de volta ao Rio de Janeiro, reuniu em OK, América reportagens e entrevistas escritas nos Estados Unidos. Fez novas coletâneas de contos, novelas e romances. Durante mais de 40 anos foi também redator em diferentes agências de publicidade. O palácio de Circe e outras lendas gregas narra, entre outras, a história de Ulisses e seus companheiros, que após destruírem Troia, iniciam uma longa e difícil volta a Ítaca, reino de Ulisses. Encontram, no caminho, uma ilha e são recebidos, num palácio, por lindas mulheres, entre as quais Circe, uma feiticeira. Ela transforma Ulisses e seus homens em porcos durante um banquete quando, esfomeados, perdem a compostura. Percebendo o feitiço, Ulisses exige que Circe o desfaça. Ela, apaixonada, pede que ele fique. Ele se recusa. A partir de 1970, Orígenes Lessa se dedicou muito à literatura infantojuvenil, deixando uma importante obra para este público com cerca de 40 títulos. Recebeu inúmeros prêmios literários. Em julho de 1981 foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Orígenes Lessa morreu em julho de 1986, na cidade do Rio de Janeiro.

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DEGUSTANDO

i ching – o livro das mutações, versão de riCHard WilHelM

6 – Há um espírito misterioso presente em todos os seres, e que atua através deles. Entre tudo que movimenta as coisas, nada é mais veloz que o trovão. Entre tudo que curva as coisas, nada é mais rápido que o vento. Entre tudo que aquece as coisas, nada resseca mais que o fogo. Entre tudo que alegra as coisas, nada traz mais contentamento que o lago. Entre tudo que umedece as coisas, nada é mais úmido que a água. Entre tudo que dá início e fim às coisas, nada é mais glorioso que a quietude.

Os primeiros livros do I ching representavam os anagramas, em vez de traços, com desenhos que remetem aos algarismos zero e um, um sobre o outro. Acredita-se que essa visão inspirou a criação do sistema binário matemático que tornou possíveis os computadores e os eletrônicos de forma geral.

Por isso a água e o fogo se complementam, o trovão e o vento não atrapalham um ao outro, as forças da montanha e do lago atuam convergindo. Somente assim é possível a modificação e a transformação. Somente assim os seres podem alcançar a perfeição.

Interessante

Livro segundo. Shuo Kua, Capítulo 1, 6.

SE qUISER LER MAIS, procure i Ching: o livro das mutações. Trad. Richard wilhelm. São Paulo: Pensamento, 1956. Disponível também na Internet em http:// www1.uol.com.br/ iching/index.htm.

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SOBRE

riCHard WilHelM e o i CHing

O teólogo, sinólogo (estudioso da cultura chinesa) e missionário alemão Richard Wilhelm nasceu em 1873. Estudou em escolas de prestígio e tinha profundo interesse pela cultura e pela vida espiritual. Seus estudos se voltaram naturalmente para a teologia. Em 1895, aos 22 anos, foi ordenado ministro protestante. Idealista e em busca de horizontes mais amplos e de aventura, concordou em servir como missionário na China, para onde partiu aos 26 anos. Pouco depois de chegar à China, em 1899, Richard Wilhelm viu eclodir a Guerra dos Boxers (1899-1901), quando chineses radicais rebelaram-se violentamente contra o colonialismo europeu e o cristianismo. Embora fortemente reprimida por forças colonialistas formadas por soldados russos, americanos, britânicos, franceses, japoneses e alemães, a revolta serviu como alerta, à Europa, sobre a necessidade de compreender melhor a cultura chinesa. Richard Wilhelm havia começado a estudar o idioma chinês nesse contexto. Rapidamente, descobriu que tinha um dom natural. Os idiomas orientais são baseados em caracteres e ideogramas, e não em letras. Por isso, a sua tradução para códigos ocidentais é extremamente difícil. As pessoas capazes de fazê-lo eram muito apreciadas, especialmente

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no trabalho missionário. Reconhecendo sua excepcional aptidão para a tradução, o grupo missionário permitiu que Richard Wilhelm investisse seu tempo no estudo do idioma. Em 1905 começou a traduzir o primeiro livro chinês para o alemão. Seus estudos sobre a religiosidade chinesa permeariam toda sua vida. Richard Wilhelm contribuiu de forma decisiva para a revelação do vasto patrimônio cultural e espiritual chinês ao Ocidente. Traduziu grandes obras filosóficas do chinês para o alemão, idioma a partir do qual foram, por sua vez, traduzidas para outros idiomas. Foi o responsável por introduzir filosofia chinesa na Escola da Sabedoria, criada em 1920 em Darmstadt, na Alemanha, um centro de educação para uma nascente humanidade “global”. A escola teve alunos ilustres, como o escritor alemão Herman Hesse e Carl Jung, criador da psicologia analítica, que viria a ser grande amigo de Richard Wilhelm e fazer os prefácios de alguns de seus livros, entre os quais o I Ching – livro das mutações. Mais do que apenas um linguista e erudito, Wilhelm penetrou as profundezas da espiritualidade chinesa. Viveu na China por mais de vinte anos e sentiu na pele as grandes diferenças culturais e espirituais entre Oriente e Ocidente. Lutou para integrar as duas diferentes

tradições espirituais em sua alma, o que acabou por levá-lo a um conflito interior profundo. Em 1910, Wilhelm contraiu disenteria amebiana na China e adoeceu gravemente por meses. No ano seguinte, conheceu Lao Nai-Hsuan, sábio chinês ligado à família do imperador Confúcio e profundo conhecedor da forma de governar e das tradições confucianas. Adepto de yoga e dos princípios taoístas, Nai-Hsuan ajudou Wilhelm a superar sua doença e se tornou seu mestre. Pela primeira vez, as tradições espirituais profundas da China seriam compartilhadas com um europeu. Assim como a Bíblia, o I Ching ou livro das mutações é um dos mais antigos do mundo. Muito além de um oráculo, como é popularmente conhecido, sua filosofia profunda e abrangente trata da linguagem da natureza e do modelo primordial dos padrões orgânicos, que atuam como leis, gerando a vida e as mudanças. Pode ser visto pelos ângulos da história, da filosofia e da ética política. Lao Hai-Hsuan deu a Wilhelm acesso direto aos textos escritos em chinês arcaico e, por isso, sua versão do I Ching é tão respeitada e difundida. Aos 55 anos, já na Europa, Richard Wilhelm sofreu uma recaída de sua disenteria que o levou à morte prematura, dois anos depois, em 1930.

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DEGUSTANDO

um paraíso perdido: ensaios amazônicos, de euClides da CunHa

O povoamento do Acre é um caso histórico inteiramente fortuito, fora da diretriz do nosso progresso. Tem um reverso tormentoso que ninguém ignora: as secas periódicas dos nossos sertões do norte, ocasionando o êxodo em massa das multidões flageladas. Não o determinou uma crise de crescimento, ou excesso de vida desbordante, capaz de reanimar outras paragens, dilatando-se em itinerários que são o diagrama visível da marcha triunfante das raças; mas a escassez da vida e a derrota completa ante as calamidades naturais. As suas linhas baralham-se nos traçados revoltos de uma fuga. Agravou-o sempre uma seleção natural invertida: todos os fracos, todos os inúteis, todos os doentes e todos os sacrificados expedidos a esmo, como o rebotalho das gentes, para o deserto. Quando as grandes secas de 1879-1880, 1889-1890, 1900-1901 flamejavam sobre os sertões adustos, e as cidades do litoral se enchiam em poucas semanas de uma população adventícia de famintos assombrosos, devorados das febres e das bexigas — a preocupação exclusiva dos poderes públicos consistia no libertá-las quanto antes daquelas invasões de bárbaros moribundos que infestavam o Brasil. Abarrotavam-se, às carreiras, os vapores, com aqueles fardos agitantes consignados à morte. Mandavam-nos para a Amazônia — vastíssima, despovoada, quase ignota — o que equivalia a expatriá-los dentro da própria pátria. A multidão martirizada, perdidos todos os direitos, rotos os laços da família, que se fracionava no tumulto dos embarques acelerados, partia para aquelas bandas levando uma carta de prego para o desconhecido; e ia, com os seus famintos, os seus febrentos e os seus variolosos, em condições de malignar e corromper as localidades mais salubres do mundo. Mas feita a tarefa expurgatória, não se curava mais dela. Cessava a intervenção governamental. Nunca, até aos nossos dias, a acompanhou um só agente oficial, ou um médico. Os banidos levavam a missão dolorosíssima e única de desaparecerem... E não desapareceram. Ao contrário, em menos de trinta anos, o Estado que era uma vaga expressão geográfica, um deserto empantanado, a estirar-se, sem lindes, para sudoeste, definiu-se de chofre, avantajando-se aos primeiros pontos do nosso desenvolvimento econômico. A sua capital — uma cidade de dez anos sobre uma tapera de dois séculos — transformou-se na metrópole de maior navegação fluvial da América do Sul. E naquele extremo sudoeste amazônico, quase misterioso, onde um homem admirável, William Chandless, penetrara 3.200 quilômetros sem lhe encontrar o fim - cem mil sertanejos, ou cem mil ressuscitados, apareciam inesperadamente e repatriavam-se de um modo original e heroico: dilatando a pátria até aos terrenos novos que tinham desvendado.

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SE qUISER LER MAIS, procure cunha, Euclides da. amazônia – um paraíso perdido. Org. Tenório Telles. Manaus: Editora Valer, 2011.

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SOBRE

euClides da CunHa O escritor, repórter jornalístico, sociólogo, historiador, geógrafo, poeta e engenheiro Euclides da Cunha nasceu no município de Cantagalo, Rio de Janeiro, em janeiro de 1866. Teve uma vida sempre intensa. Perdeu a mãe aos três anos e passou a infância e a adolescência com tios, em diferentes cidades e fazendas do interior do Rio de Janeiro. Entrou na Escola Militar, onde se mostrou um jovem idealista e contestador. Acabou sendo preso e expulso da escola em virtude de um gesto de insubordinação durante uma cerimônia para o ministro da guerra. Viajou, então, para São Paulo, onde passou a colaborar com o jornal A Província de São Paulo. Depois da proclamação da República, voltou à carreira militar, frequentou a Escola Superior de Guerra e tornou-se bacharel em matemática e ciências físicas e naturais.

Interessante Euclides da cunha tentou mostrar, em seus ensaios, uma visão ecológica e humanista. Alguns textos de “Um paraíso perdido” serviram como denúncia ao trabalho semiescravo dos seringueiros no Acre.

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Em 1895, abandonou a carreira militar, tornando-se engenheiro civil. Foi superintendente de obras do Estado, além de colaborar com O Estado de S. Paulo. Em 1897, escreveu alguns artigos sobre a Guerra de Canudos. Em consequência, foi convidado à Bahia como correspondente, para testemunhar e relatar os acontecimentos. Essa foi a gênese de sua mais conhecida obra: Os Sertões, escrita entre 1898 e 1901, com base em suas pesquisas e cartas sobre a guerra. A autoria desse livro levou Euclides da Cunha a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras e no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

Assim que publicou Os Sertões, Euclides da Cunha revelou em uma carta ao escritor Coelho Neto o desejo de ir ao Acre. A região estava sob domínio peruano e boliviano, embora houvesse sido colonizada por brasileiros. Durante a ofensiva peruana e boliviana para retomar seus territórios, e até o acerto de tratados que anexaram o Acre definitivamente ao Brasil, a região viveu em estado de guerra. Euclides da Cunha havia sido nomeado chefe da Comissão de Reconhecimento do Alto Purus. Viajou para a região e atuou diretamente nas negociações enfrentando, ele próprio, as dificuldades físicas para vencer territórios tão selvagens e hostis. Nessa missão, conheceu profundamente a Amazônia, abraçando a causa desta outra grande parte do território brasileiro, desconhecida pelo país. Voltou ao Rio de Janeiro e trabalhou no Itamarati, no relatório da viagem e na elaboração de mapas da região visitada. Produziu, também, alguns ensaios mais tarde reunidos em Um paraíso perdido: ensaios amazônicos, livro que, afirmam alguns estudiosos, ele não terminou de escrever. Euclides da Cunha tinha um casamento conflituoso. Um dia, em agosto de 1909, sua esposa fugiu com os filhos e se hospedou na casa de seu amante. Na manhã seguinte, Euclides foi armado ao lugar e provocou o tiroteio que culminou com sua morte.

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Apesar de todas as vantagens da nova mídia, nenhuma delas melhorou o livro nos seus atributos práticos como dispositivo de armazenamento de informação: é portátil, tem preço baixo, abrange uma ampla gama de assuntos e é uma tecnologia livre de qualquer tipo de reparo mais custoso. WIlson dIzard Jr., in A nova mídia.

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ADRIANA cALcANHOTO apresenta os livros Que amou Quem comenta

VOcê cONHEcE adriana calcanhoto?

e

r., a.

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Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade Oswald de Andrade Novo dicionário da língua portuguesa Aurélio Buarque de Holanda Ferreira Não poemas Augusto de campos

Chacal poeta e letrista brasileiro Evanildo Bechara gramático, filólogo, professor e membro da Academia Brasileira de Letras

A cantora e compositora Adriana Calcanhoto nasceu em Porto Alegre, em outubro de 1965. É filha de um baterista de jazz e bossa nova e de uma bailarina e professora de Educação Física. Aos seis anos, ganhou de seu avô o primeiro instrumento: um violão. Aprendeu rapidamente a tocá-lo e, mais tarde, a cantar. Com um trabalho inspirado em obras e compositores consagrados da MPB e no fascínio pelo modernismo brasileiro, em especial pelo movimento antropofágico de Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e outros expoentes do movimento, sua vida artística nasceu em bares de Porto Alegre. No final dos anos 1980, mudou-se para o Rio de Janeiro. Em 1990, gravou seu primeiro disco, Enguiço. A faixa Mentiras do CD Senhas fez parte da trilha sonora de uma novela da TV Globo e projetou a cantora nacionalmente. Em 1994, gravou o CD A fábrica do poema, muito elogiado pela crítica. Depois vieram CDs como Marítimo, Público e Cantada, entre outros. Alguns de seus álbuns lhe renderam discos de ouro e prêmios como o

Grammy Latino, conquistado por seu trabalho para o público infantil, Adriana Partimpim, lançado em 2005. Os álbuns e shows Adriana Partimpim I e II conquistaram a crítica e o público infantil. Ao longo de sua carreira, além de obras suas, Adriana Calcanhoto gravou canções e poemas musicados de muitos compositores e poetas consagrados, como Dorival Caymmi, Vinícius de Moraes, Chico Buarque de Hollanda, Caetano Veloso, Roberto Carlos e Erasmo Carlos, Arnaldo Antunes, Roberto Frejat e Antônio Cícero, entre outros. Suas composições abrangem ritmos e estilos variados: samba, bossa nova, rock, pop e baladas. Seu repertório também inclui a regravação de antigos sucessos da MPB em novos arranjos. Polivalente, Adriana Calcanhoto gravou também música para o cinema, participou de documentários como Palavra Encantada, lançado em 2005, que fala sobre nossa música e seu casamento perfeito com nossa poesia da tradição musical brasileira. Fez também 50 ilustrações para um livro do artista plástico Vik Muniz, publicado em 2011.

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cONHEcENDO UM POUcO MAIS primeiro caderno do aluno de poesia oswald de andrade, de osWald de andrade

Combinando paródia com criação na simulação do aprendizado da poesia, Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade é um clássico do modernismo brasileiro. Publicado em 1927 com uma tiragem de trezentas cópias, o livro trazia capa de Tarsila do Amaral e desenhos do próprio autor. O casamento entre palavra e imagem manifestava-se, assim, na própria concepção plástica do livro. Além de desafiar o conceito tradicional de livro de poemas, a obra representou uma radicalização em métodos poéticos da vanguarda: o estilo telegráfico, curto e seco, e a montagem. Ao publicar essa obra, o autor buscava uma poesia como que feita por criança, uma poesia que visse o mundo com novos olhos. Uma poesia em que a liberdade criadora da imaginação se casasse à visão crítica da brasilidade.

SE qUISER cONHEcER MAIS A OBRA, procure Andrade, Oswald de. primeiro caderno de poesia do aluno oswald de andrade. São Paulo: Globo, 2006.

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SOBRE

osWald de andrade O escritor Oswald de Andrade nasceu em janeiro de 1890, no seio de uma família abastada. Ingressou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em São Paulo, em 1909, mas só se formaria em 1919, sendo o orador da turma. Publicou seus primeiros trabalhos em O Pirralho, semanário paulista de crítica e humor, que ele mesmo fundou, em 1911. A atuação de Oswald de Andrade é considerada fundamental na cultura brasileira da primeira metade do século 20. Em 1912, viajou para Paris, onde, convivendo com a boemia estudantil, entrou em contato com o futurismo e conheceu Kamiá, mãe de Nonê, seu primeiro filho. De volta a São Paulo, continuou no jornalismo literário. Em 1917, passou a viver com Maria de Lourdes Olzani (Deise). Defendeu a pintora Anita Malfatti de uma crítica devastadora de Monteiro Lobato e fundou o jornal Papel e Tinta. Em seguida, ao lado da pintora, de Mário de Andrade e de outros intelectuais, organizou a Semana de Arte Moderna de 22, tornando-se um dos grandes nomes do modernismo literário brasileiro. Foi considerado pela crítica como o elemento mais rebelde do grupo, e o mais inovador.

Interessante Tempos depois de serem os idealizadores da Semana de Arte de Moderna, em 1922, Oswald e Mário de Andrade romperiam relações. Oswald passou, então, a chamá-lo, entre outros epítetos, de “Boneca de Piche” e “Miss São Paulo”.

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Em 1924, iniciou o movimento PauBrasil, juntando o nacionalismo às ideias estéticas da Semana de 22. Em 1926, casou-se com a pintora Tarsila do Amaral. Oswald escreveu, em 1928, o Manifesto Antropofágico, em que propôs que o Brasil devorasse a cultura estrangeira e criasse uma cultura revolucionária própria.

Com a crise de 1929, desencadeada pela quebra da bolsa de valores de Nova Iorque, Oswald de Andrade teve as finanças abaladas e sofreu uma reviravolta na vida. Rompeu com Mário de Andrade, separou-se de Tarsila do Amaral e casou com a escritora e militante política Patrícia Galvão (a Pagu). Da união nasceria Rudá, seu segundo filho. Filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) após a revolução de 1930. Em 1931, quando dirigia o jornal O Homem do Povo, foi várias vezes detido. Em 1936, após ter-se separado de Pagu, casou-se com a poetisa Julieta Bárbara. Em 1944 casou-se novamente, dessa vez com Maria Antonieta D'Alkmin, com quem permaneceria até o fim da vida. Além de poemas, Oswald de Andrade escreveu romances e peças de teatro. Em 1939, na Suécia, representou o Brasil num congresso do Pen Club, entidade internacional que congrega os literatos dos diversos países. Prestou concurso para a cadeira de literatura brasileira na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP) e, em 1945, obteve o título de livredocente. Oswald morreu aos 64 anos, em outubro de 1954. Sua poesia seria precursora de dois movimentos distintos que marcariam a cultura brasileira na década de 1960: o concretismo e o tropicalismo.

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DEGUSTANDO

novo dicionário da língua portuguesa, de aurÉlio Buarque de Holanda

SE qUISER LER MAIS, procure Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda. novo dicionário aurélio da língua portuguesa. curitiba: Positivo, 2004.

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leitura. [Do lat. med. lectura] S. f. 1. Ato ou efeito de ler. 2. Arte de ler. 3. Hábito de ler. 4. Aquilo que se lê: # Não sei qual é a sua leitura. 5. O que se lê, considerado em conjunto: # homem de muita leitura. 6. Arte ou modo de interpretar e fixar um texto de autor, segundo determinado critério: “com o benefício de algumas décadas, e a substituição do New Criticism por outras formas de leitura, fica mais fácil separar a poesia da crítica” (Arthur Nestrovski, Ironias da modernidade, p. 45). 7. E. Ling. Forma assumida por um texto em determinado testemunho da tradição (6). 8. Fís. Observação da indicação dum instrumento de medida. 9. Fís. O resultado de uma medição realizada com um instrumento. 10. Tec. Processo complementar ao da gravação de informações, similar ao ato humano de ler (1), e que consiste em percorrer, em determinado suporte físico de armazenamento, as sequências de marcas codificadas que representam informações registradas, e reconvertê-las à forma anterior (como imagens, sons, dados para processamento), reproduzindo o sinal original gravado, ou recuperando os dados armazenados. @ Leitura acelerada. V. leitura dinâmica. Leitura da fala. Apreensão, por parte dos surdos, daquilo que lhes dizem, mediante a observação dos movimentos orofaciais. Leitura dinâmica. Método de leitura que permite a apreensão sintética e instantânea de um juízo ou raciocínio completo, e não uma sequência linear de ideias, como nos dá a leitura comum; leitura rápida, leitura acelerada, leitura fotográfica. Leitura dramática. Teatr. Leitura interpretada de uma peça, seja pelos atores, seja pelo diretor ou por apenas um ator diante do público, durante a qual os atores dão todas as inflexões vocais necessárias, mas sem marcações (ou apenas os movimentos indispensáveis), e cujas rubricas são lidas pelo diretor ou por outro ator. Leitura fotográfica. V. leitura dinâmica. Leitura nova. 1. Conjunto dos documentos legais e administrativos portugueses, copiados por ordem do rei D. Manuel I entre 1504 e 1552 em letra caligráfica cursiva, com o intuito de facilitar sua leitura e evitar sua perda. 2. P. ext. Transcrição de documentos em letra vigente na época de sua transcrição. Leitura rápida. V. leitura dinâmica.

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SOBRE

aurÉlio Buarque de Holanda

Uma vez Aurélio Buarque, vestindo o fardão da Academia Brasileira de Letras, pegou um táxi e pediu: “Depressa, moço, que estou atrasado!”. O taxista procurou acalmá-lo: “Fique tranquilo. Seja quem for, com essa roupa que está usando nada começará sem o senhor!”.

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Interessante

O crítico literário, lexicógrafo, filólogo, professor, tradutor e ensaísta brasileiro Aurélio Buarque de Holanda Ferreira nasceu em Passo de Camaragibe, em Alagoas, em maio de 1910. Filho de um comerciante, passou parte da infância em Porto das Pedras, também em Alagoas, e estudou as primeiras letras em Maceió. Aos 15 anos ingressou no magistério e passou a se interessar pela língua e literatura portuguesas. Formou-se em Direito pela Faculdade do Recife, em 1936. Fez parte de um grupo de intelectuais do Nordeste, formado por, entre outros, José Lins do Rego, Graciliano Ramos e Rachel de Queiroz. Em 1936 e 1937, foi professor de português, literatura e francês no Colégio Estadual de Alagoas, e em 1937 e 1938, diretor da Biblioteca Municipal de Maceió. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1938. Continuou no magistério como professor de português e literatura brasileira no colégio Anglo-Americano em 1939 e 1940; professor de português no Colégio Pedro II, de 1940 a 1969; e professor de ensino médio do Estado do Rio de Janeiro, de 1949 a 1980. Contratado pelo Ministério das Relações Exteriores, exerceu a cátedra de Estudos Brasileiros na Universidade Autônoma do México, de junho de 1954 a dezembro de 1955. Colaborou na imprensa carioca, escrevendo contos e artigos. Foi secretário da Revista do Brasil, de 1939 a 1943. Nessa época, escreveu contos reunidos no livro Dois mundos, publicado em 1942 e premiado em

1944 pela Academia Brasileira de Letras. Em 1941, deu início à atividade a que se dedicaria por toda a vida e que, de certa forma, superaria sua obra como escritor: tornou-se dicionarista. Foi quando o convidaram a executar, pela primeira vez, um trabalho lexicográfico, como colaborador do Pequeno dicionário da língua portuguesa. Em 1947, iniciou no Suplemento literário do Diário de Notícias a seção O conto da semana, que existiu até 1960. Desde 1950, Aurélio Buarque mantinha, na revista Seleções do Reader’s Digest, a seção Enriqueça o seu vocabulário, que em 1958 reuniu e publicou num livro com o mesmo título. Foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1961. A preocupação com a língua portuguesa e a paixão pelas palavras o levaram à imensa tarefa de elaborar seu próprio dicionário, trabalho ao qual se dedicou durante muitos anos. Em 1975, foi publicado o Novo dicionário da língua portuguesa, conhecido por todos como o Dicionário Aurélio. Desde sua publicação, o autor atendeu a muitos convites, no Brasil inteiro, para falar do dicionário e dos mistérios e sutilezas da língua portuguesa, cuja riqueza ele enalteceu ao legitimar tantos brasileirismos. Participou de numerosas conferências, sobre assuntos literários e linguísticos, em países como México, Estados Unidos, Cuba, Guatemala e Venezuela. Aurélio Buarque de Holanda morreu no Rio de Janeiro, em fevereiro de 1989.

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114 pROGRAMA 13 | adriana calcanHoto

DEGUSTANDO não poemas,

de augusTo de CaMpos

Morituro

Preposições

salve céu de mentira presente do passado que não muda

desde durante a até após consoante

do céu do futuro que não mente o poeta morituro te saúda

de ante segundo para em entre visto mediante exceto afora salvo sob

SE qUISER LER MAIS, procure campos, Augusto de. não poemas. São Paulo: Perspectiva, 2003

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perante sobre sem per com por contra

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SOBRE

augusTo de CaMpos O poeta, tradutor e ensaísta brasileiro Augusto de Campos nasceu em São Paulo, em fevereiro de 1931. Estreou em 1951 com o livro Rei menos o reino, quando ainda era estudante da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. É um dos criadores do movimento conhecido como Poesia Concreta, junto com seu irmão, Haroldo de Campos e com o amigo Décio Pignatari. Augusto de Campos é um nome de referência no campo da poesia experimental. Formou a corrente mais avançada da poesia brasileira e se mantém na posição mais de quarenta anos depois da eclosão do movimento da poesia concreta. É um dos poetas mais sensíveis à questão das novas tecnologias e do relacionamento da poesia com a ciência.

Interessante

Em 1987, em seu artigo O Artista na Sociedade Tecnológica, o autor já defendia a ideia de que a tecnologia produz um impacto profundo nos sentidos e no universo mental, e de que novos princípios estéticos devem ser buscados a partir do momento em que novas tecnologias se tornam disponíveis. Convicto de que no fim do século XX a poesia estava extrapolando os tradicionais suportes impressos, ele começou um processo de aproximação com artistas

que estavam experimentando novos recursos como holografia e tecnologias eletrônicas. Com essa experiência concebeu inicialmente releituras de seus poemas mais antigos e, depois, poemas criados especificamente para novos meios. Embora tenha feito, em parceria, poemas para vídeo, holografia, computação gráfica, painéis eletrônicos, etc., foi com o CD e o espetáculo multimídia Poesia é risco, que a sua obra deu uma virada radical, assumindo abertamente os novos meios. Usando recursos visuais como a disposição geométrica das palavras na página, a aplicação de cores e de diferentes tipos de letras, Augusto de Campos criou poemas e publicou antologias. Também é autor de importantes textos críticos. Sua obra dialoga com a música e tem parceria em canções gravadas por Caetano Veloso e Arrigo Barnabé. O livro Não poemas, lançado em 2003, é feito de poesia em cor e movimento, de poemas reunidos ao longo de um período de dez anos, além de versões estáticas de clip-poemas digitais e “poemovies” (filmes-poema) pulsados pela animação. O livro é acompanhado por um CD-ROM com algumas experiências. Essa obra recebeu o prêmio de Livro do Ano, concedido pela Fundação Biblioteca Nacional.

Ao lado de seu irmão, Haroldo de campos, e de Décio Pignatari, Augusto de campos lutou pela revalorização da obra de Oswald de Andrade. Além disso, redescobriu o poeta maranhense Joaquim de Sousândrade (1832-1902), um precursor da poesia moderna, e apresentou-o ao público por meio da antologia re-visão de sousândrade (1964).

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· SUGESTõES DE LEITURA · íNDIcE · LEGENDAS

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118 BiBliOGRAfiA | liVros que amei

SUGESTõES DE LEITURA nos livros

ANDRADE, M. cartas de Mário de Andrade a câmara cascudo. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 2000.

HOMERO. Odisseia. Trad. carlos Alberto Nunes. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001.

BARTHES, R. O rumor da língua. São Paulo: Editora Brasiliense, 1998.

HORTA, L. P. A Bíblia: um diário de leitura. Rio de Janeiro: Editora zahar, 2011.

BOSCO, F. Alta Ajuda. Rio de Janeiro: Foz Editora, 2012. BRUM, J. T. O pessimismo e suas vontades - Schopenhauer e Nietzsche. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1998. CALVINO, I. Assunto encerrado: discursos sobre literatura e sociedade. São Paulo: companhia das Letras, 2006. CAMPBELL, J. A jornada do herói. São Paulo: ágora Editora, 2008. CASTELLO, J. Inventário das sombras. Rio de Janeiro: Editora Record, 1999. CERTEAU, M. A invenção do cotidiano. Petrópolis: Vozes, 1998. DIZARD JR. A nova mídia. Rio de Janeiro: Jorge zahar Ed., 2000.

LLOSA, M. V. A tentação do impossível: Victor Hugo e os miseráveis. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012. MACIEL, L. C. As quatro estações. Rio de Janeiro: Editora Record, 2000. MANGUEL, A. À mesa com o chapeleiro Maluco: ensaios sobre corvos e escrivaninhas. São Paulo: companhia das Letras, 2009. NEVES, M. V. Rio Branco: de seringal a capital. São Paulo: Editora cortez, 2008. PEREIRA, C. A. M. Retrato de época - Poesia marginal anos 70. Rio de Janeiro: Editora MEc/Funarte, 1981.

ECO, U. A memória vegetal. Rio de Janeiro: Record, 2010.

PIGLIA, R. Formas breves. São Paulo: Editora companhia das Letras, 2004.

ECO, U. e CARRIÈRE, J. Não contem com o fim do livro. Rio de Janeiro: Record, 2010.

PIGLIA, R. O último leitor. São Paulo: Editora companhia das Letras, 2006.

FERRAZ, M. C. F. Nietzsche: o bufão dos deuses. Rio de Janeiro: Editora Relume Dumará, 1994.

PIZA, D. Amazônia de Euclides: viagem de volta a um paraíso perdido. São Paulo: Editora Leya, 2010.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.

QUINTANA, M. Da preguiça como método de trabalho. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013.

HOLLANDA, H. B. 26 Poetas Hoje. Rio de Janeiro: Aeroplano Editora, 2007.

VENANCIO FILHO, P. Marcel Duchamp. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986.

HOLLANDA, H. B. e PEREIRA, C. A. M. Literatura comentada Poesia Jovem Anos 70. Rio de Janeiro: Editora Abril cultural, 1982.

VENANCIO FILHO, P. Primos entre si: temas em Proust e Machado de Assis. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2000.

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119

na weB ALICE RUIZ. Disponível em http://www.aliceruiz.mpbnet.com.br/ Acesso: 05/07/2013. BLOG DO SÉRGIO SANT’ANNA. Disponível em http://blogdosergiosantanna.blogspot.com.br/. Acesso:01/07/2013. ERIC NEPOMUCENO. Coisas do mundo (blog). Disponível em http://bandnewstv.band.uol. com.br/colunistas Acesso: 05/07/2013. EUCANAÃ FERRAZ. Disponível em http://www.eucanaaferraz.com.br/. Acesso: 01/07/2013. JOEL RUFINO DOS SANTOS. Disponível em http://joelrufinodossantos.com.br/. Acesso: 01/07/2013. MIOLO DE POTE. Disponível em http://colunamiolodepote.blogspot.com.br/. Acesso: 05/07/2013. MEIRA, Silvio. Computação, comunicação e controle. ímã, 2013. (E-book) . Disponível em http://www.imaeditorial.com/computacao-comunicacao-e-controle/ Acesso: 01/07/2013. PORTAL E.M. CIORAN/ BRASIL. Disponível em http://emcioranbr.wordpress.com/bio/franca2/ Acesso: 01/07/2013. SAAVEDRA, M.C. dom quixote de la Mancha. (E-book). Disponível em http://www.nead. unama.br/site/bibdigital/pdf/oliteraria/497.pdf Acesso em 22/07/2013. SCHOLLHAMMER , Karl Erik. o realismo afectivo - Evocar realismo além da representação. Estudos de Literatura Brasileira contemporânea, v. 39, p.p. 129-148, 2012. Disponível em http://www.gelbc.com.br/pdf_revista/3907.pdf Acesso: 01/07/2013. SCHOLLHAMMER , Karl Erik. Para uma crítica do realismo traumático. SOLETRAS (UERJ), v. 23, p.p. 06-16, 2012. Disponível em http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/soletras/ article/view/3801/2634 Acesso: 01/07/2013. SHAKESPEARE, William. A tempestade. (E-book). Disponível em http://www.ebooksbrasil. org/eLibris/tempestade.html. Acesso: 22/07/2013.

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120 Índice | liVros que amei

íNDIcE 5

APRESENTAÇÃO

7

A LEITURA cOMO ExPRESSÃO DA VIDA, DE TENóRIO TELLES

8

FAUSTO FAwcETT APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando TRÓPICO DE CAPRICÓRNIO, de Henry Miller · Degustando BREVIÁRIO DE DECOMPOSIÇÃO, de Emil cioran · Degustando EU E OUTRAS POESIAS, de Augusto dos Anjos

18

MANAíRA cARNEIRO APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando O MANIFESTO COMUNISTA, de Karl Marx e Friedrich Engels · Degustando ANTOLOGIA POÉTICA, de Vinícius de Moraes · Degustando A VIA CRUCIS DO CORPO, de clarice Lispector

26

SéRGIO SANT’ANNA APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando 234, de Dalton Trevisan · Degustando MARCEL DUCHAMP: ENGENHEIRO DO TEMPO PERDIDO, de Pierre cabanne · Degustando FORMAS BREVES, de Ricardo Piglia

34

JULIANA GALDINO APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando UM RELATO PARA UMA ACADEMIA, de Franz Kafka · Degustando O PODER DO MITO, de Joseph campbell · Degustando PROMETEU ACORRENTADO, de ésquilo

42

TENóRIO TELLES APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando ECLESIASTES, da Bíblia Sagrada · Degustando QUINCAS BORBA, de Machado de Assis · Degustando SENTIMENTO DO MUNDO, de carlos Drummond de Andrade

50

LúcIA LAGUNA APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando LIBERTINAGEM, de Manuel Bandeira · Degustando HISTÓRIAS DE CRONÓPIOS E DE FAMAS, de Julio cortázar · Degustando FLOR DE POEMAS, de cecília Meireles

58

HERMANO VIANNA APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando O MINOTAURO, de Monteiro Lobato · Degustando UMA ESTRANHA REALIDADE, de carlos castañeda · Degustando VIDA CONVERSÁVEL, de Agostinho da Silva

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66

LIA RODRIGUES APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando LIVRO DO DESASSOSSEGO, de Fernando Pessoa (Bernardo Soares) · Degustando O TURISTA APRENDIZ, de Mário de Andrade · Degustando É ISTO UM HOMEM?, de Primo Levi

74

FRANcIScO BOScO APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando GUERRA E PAZ, de Liev Tolstói · Degustando ECCE HOMO, de Friedrich Nietzsche · Degustando O IMPÉRIO DOS SIGNOS, de Roland Barthes

82

ALIcE RUIz APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando ALGUNS POEMAS, de Emily Dickinson · Degustando O SEGUNDO SEXO, de Simone de Beauvoir · Degustando A ARTE CAVALHEIRESCA DO ARQUEIRO ZEN, de Eugen Herrigel

92

SíLVIO MEIRA APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando ROMANCE D’A PEDRA DO REINO E O PRÍNCIPE DO SANGUE DO VAI-E-VOLTA, de Ariano Suassuna · Degustando CASA-GRANDE & SENZALA, de Gilberto Freyre · Degustando DA BREVIDADE DA VIDA, de Lúcio Sêneca

100

MARcOS VINícIUS NEVES APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Degustando O PALÁCIO DE CIRCE E OUTRAS LENDAS GREGAS, de Orígenes Lessa · Degustando I CHING – O LIVRO DAS MUTAÇõES, versão organizada por Richard wilhelm · Degustando UM PARAÍSO PERDIDO: ENSAIOS AMAZôNICOS, de Euclides da cunha

108

ADRIANA cALcANHOTO APRESENTA OS LIVROS qUE AMOU · Conhecendo um pouco mais PRIMEIRO CADERNO DO ALUNO DE POESIA OSWALD DE ANDRADE, de Oswald de Andrade · Degustando NOVO DICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA, de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira · Degustando NÃO POEMAS, de Augusto de campos

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SUGESTõES DE LEITURA

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122 leGendAs | liVros que amei

LEGENDAS PROGRAMA

PÁGINA

LEGENDA

1

11

O caminho do excesso leva ao palácio da sabedoria. william Blake

1

13

Desenho de Fernando zarif, da exposição Cadernos, 2009

1

17

Imagem de l’encyclopèdie de Diderot e D’Alembert, 1751-1772

2

21

Imagem do filme outubro, de Sergei Eisenstein, 1927

3

29

Ilustrações de Poty para a obra de Dalton Trevisan, 1997

3

31

nu descendo uma escada nº 2, tela de Marcel Duchamp, 1912

4

39

Hércules e o Centauro, escultura de Giambologna, 1599

4

41

Busto de ésquilo, Museus capitolinos, Roma

4

41

prometeu, óleo sobre tela de Gustave Moreau, 1868

5

45

Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu. eclesiastes 3:1

5

47

avenida Central, fotografia de Augusto Malta, 1906

6

52

paisagem nº25, acrílica e óleo sobre tela, de Lúcia Laguna, 2009

6

53

Imagem do filme o poeta do Castelo, de Joaquim Pedro de Andrade, 1959

6

56

Tela da série entre a linha vermelha e a linha amarela, de Lúcia Laguna, 2001

8

70

Fotografia de Mário de Andrade, 1928

Acervo IBE/USP

8

70

Fotografia de Mário de Andrade, 1928

Acervo IBE/USP

9

76

Imagens do filme napoleón, de Abel Gance, 1927

10

89

Mestre arqueiro na posição kai, séc. xIx Okinawa Soba / Flickr.com (fonte: http://www.flickr.com/photos/24443965@N08/2383755299/sizes/o/in/photostream/)

11

94

cidade de Taperoá – fotografia de Sílvio Meira

11

99

Um dos bustos associados a Sêneca.

11

99

a morte de sêneca, óleo sobre tela de Jacques Louis David, 1773

12

103

Tinham de porcos, realmente, a cabeça, o grunhido, a figura e as cerdas grossas, mas inda a consciência anterior conservavam. – Odisseia, canto x.

12

105

Os 64 hexagramas

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123

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FIcHA TécNIcA SUPERVISÃO DE CONTEÚDO Vilma Guimarães DESENVOLVIMENTO DE CONTEÚDO Sandra Portugal (coord.) José Henrique Oliveira PESQUISA E REDAÇÃO Metatexto Gestão de conteúdo FOTOGRAFIAS Guanabaratejo PROJETO GRÁFICO Inventum Design

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