UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
ARQUITETURA E URBANISMO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
ARQUITETURA E URBANISMO
ALUNO
GABRIEL GEORGE GROSSKOPF
ORIENTADOR
AMÉRICO ISHIDA
COORIENTADORA
ADRIANA MARQUES ROSSETTO
PESCA ARTESANAL:
TRABALHO E MODO DE VIDA NA BARRA DA LAGOA
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina
Orientador: Américo Ishida
Coorientadora: Adriana Marques Rossetto
1a edição
Florianópolis
Universidade Federal de Santa Catarina
2019
Universidade Federal de Santa Catarina
Centro Tecnológico
Departamento de Arquitetura e Urbanismo
Trabalho de Conclusão de Curso
Título: “Pesca artesanal: trabalho e modo de vida na Barra da Lagoa”
Autor: Gabriel George Grosskopf
Matrícula: 14100797
Orientador: Américo Ishida
Coorientadora: Adriana Marques Rossetto
Florianópolis, julho de 2019
Apresentado para banca avaliadora em 6 de agosto de 2019
Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor, através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC.
Grosskopf, Gabriel George Pesca artesanal: : trabalho e modo de vida na Barra da Lagoa / Gabriel George Grosskopf ; orientador, Américo Ishida, coorientador, Adriana Marques Rossetto, 2019. 63 p.
Trabalho de Conclusão de Curso (graduação)Universidade Federal de Santa Catarina, Centro Tecnológico, Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Florianópolis, 2019.
Inclui referências.
1. Arquitetura e Urbanismo. 2. Pesca artesanal. 3. Barra da Lagoa. 4. Paisagem cultural. 5. Projeto urbano. I. Ishida, Américo. II. Rossetto, Adriana Marques. III. Universidade Federal de Santa Catarina. Graduação em Arquitetura e Urbanismo. IV. Título.
Agradeço em primeiro lugar à minha família, que sempre incentivou a superação dos próprios limites, mostrou-me a disciplina do esforço contínuo e a importância de se cumprir com a palavra. Agradeço por sempre investirem em estudo de qualidade e mostrarem o papel de valores fundamentais como o respeito e a empatia, além de ter aprendido nesse convívio sobre a relevância que a cultura e a natureza têm na vida humana.
Agradeço àqueles que acompanharam esse trabalho de perto e fizeram parte fundamental da minha trajetória acadêmica, especialmente Fellipy, por abrir meus olhos para um universo que existe nas belezas do cotidiano e dos pequenos gestos. Sou grato pelo companheirismo único e por me acolher, juntamente com sua família, na vida e cultura da ilha.
Agradeço ao curso de Arquitetura e Urbanismo da UFSC, que me acolheu como aluno e hoje me forma como profissional. Nesse sentido, agradeço a todos os professores que fizeram parte da minha trajetória acadêmica, nos quais me espelho e tenho como referência por valorizarem o conhecimento, a ciência e o aprendizado. Sou especialmente grato aos meus queridos orientadores Américo e Adriana, professores que admiro profundamente e que não pouparam conhecimento para ajudar a construir este trabalho de conclusão de curso.
Agradeço também aos futuros colegas de profissão que estiveram presentes em diversos momentos significativos dessa trajetória, especialmente Elaine, Alan, Jazmín e Beatriz, além de toda a equipe do Laboratório BIM-SC, pelo convívio, conversas, jogos, jantas, desabafos e risadas.
Agradeço a meus amigos planaltinos que também embarcaram nessa jornada de estudar e morar longe de casa, em especial Heloise, Camila, Danieli e Johan, que foram e são um pedacinho de casa na ilha.
Agradeço respeitosamente aos pescadores e moradores com quem conversei, por terem cedido seu tempo e sua experiência, contribuindo significativamente para a existência deste trabalho.
Por fim, agradeço à Universidade Federal de Santa Catarina por ter aberto uma infinidade de portas, tendo sido uma segunda casa durante esses últimos cinco anos, além de abrir cada vez mais meus olhos e minha mente para a pluralidade da existência, sempre estimulando o pensar crítico.
Dedico este trabalho aos saberes ancestrais, que por sua essência fundamental são capazes de superar a voracidade do tempo e da história, reinventando-se a cada dia.
Introdução
Pela continuidade da pesca artesanal....................................................................................................................12
Modalidade artesanal de pesca..............................................................................................................................14
Pesca e agricultura em uma ilha rural......................................................................................................................16
Problemática
Das canoas às lanchas.............................................................................................................................................18
Processo de estudo
Desenhando paisagens pesqueiras.........................................................................................................................20
Referencial
O que tem sido feito?.............................................................................................................................................24
Local de intervenção
Barra da Lagoa.......................................................................................................................................................28
Barra da Lagoa: um bairro de origem pesqueira....................................................................................................30
Oportunidade num vazio urbano.............................................................................................................................32
Projeto
Implantação da proposta.......................................................................................................................................34
Isométrica do conjunto............................................................................................................................................36
Plantas baixas da área central...............................................................................................................................38
Cortes AA e BB........................................................................................................................................................40
Cortes CC e DD......................................................................................................................................................42
Praça central..........................................................................................................................................................44
Moradias e hortas...................................................................................................................................................46
Moradias.................................................................................................................................................................48
Oficina de barcos e varais de rede........................................................................................................................50
Mercado de pescados e orgânicos........................................................................................................................52
Sede administrativa e Memorial da pesca artesanal.............................................................................................54
Centro comunitário.................................................................................................................................................56
Tratamento de efluentes..........................................................................................................................................58
Sistema estrutural proposto....................................................................................................................................60
Considerações finais...........................................................................................................................................62
Referências...........................................................................................................................................................64
Saberes ancestrais como a construção e o reparo de embarcações, o cerco da tainha com canoa à remo, o entendimento sobre as dinâmicas de ventos e marés, os métodos de manipulação do pescado e a culinária local constituem uma herança cultural que faz da Barra da Lagoa um bairro de origem pesqueira. As orlas da Ilha de Santa Catarina gradativamente vêm sendo transformadas de espaços rurais em balneários de veraneio pela expansão turística, encarecendo o modo de vida e dificultando a permanência de pescadores e agricultores. Nesse processo, questiona-se sobre o futuro não apenas da pesca e dos pescadores, mas da história e cultura locais como partícipes na construção do espaço. Abordando-se a pesca artesanal como modo de vida sustentável e elemento-chave da paisagem cultural da Barra da Lagoa, na costa leste da Ilha de Santa Catarina, assumindo suas transformações frente à contemporaneidade e almejando sua continuidade no futuro, propõe-se ocupar um vazio urbano em localização estratégica com um conjunto que tornaria viável e visível o ciclo da pesca e a produção orgânica. A proposta busca ofertar moradia e equipamentos de suporte para famílias pescadoras e produtoras no intuito de possibilitar sua autonomia, subsistência e segurança alimentar. O projeto prevê centro comunitário, mercado de pescados e orgânicos, oficinas de barcos, moradia acessível, espaços de plantio, tratamento ecológico de esgoto e estratégias para expansão do manguezal remanescente e da restinga, no intuito de costurar natureza e memória e colaborar com uma reflexão sobre o futuro da cultura local e dos espaços de orla.
Palavras-chave: pesca artesanal; paisagem cultural; projeto urbano.
Abstract
Ancestral knowledge such as the construction and repair of boats, the enclosure of the mullet with paddle boat, the understanding of the dynamics of winds and tides, the methods of fish handling and the local cuisine constitute a cultural heritage that makes Barra da Lagoa a fishery-originated district. The waterfront of Santa Catarina Island have been gradually transformed from rural spaces into summer resorts by the tourist expansion, making the lifestyle more expensive and making it difficult for fishermen and farmers to stay. In this process we questions the future not only of fishing and fishermen but of local history and culture as participants in the construction of space. Approaching artisanal fishery as a sustainable way of living and key element of the cultural landscape of Barra da Lagoa, in the east coast of Santa Catarina Island, assuming its transformations in the face of contemporary times and aiming for its continuity in the future, it is proposed to occupy an urban void in a strategic location with a set of buildings that would make the fishing cycle and organic production viable and visible. The proposal seeks to provide affordable housing and support equipment for fishing and farming families in order to enable their autonomy, subsistence and food security. The project foresees a community center, fish and organics market, boat workshops, housing, planting spaces, ecological wastewater treatment and strategies to expand the remaining mangrove and restinga, in order to sew nature and memory and collaborate with a discussion about the future of local culture and waterside spaces.
Key-words: artisanal fishery; cultural landscape; urban design
Em maio, reparadas as redes velhas ou estragadas e ultimadas as novas, alcatroadas as canoas e pintadas as baleeiras, organizam-se as campanhas e as grandes turmas de camaradas e ajudantes, que entram a povoar os numerosos ranchos das praias, então abertos até os últimos dias de agosto. Por essa ocasião, desde a Ponta Grossa à do Rapa, a oeste e a norte da Ilha, como dobrando daí para leste até Naufragados, um enxame geral de homens e rapazes das freguesias e arraiais nessa área espalhados, agita-se dia e noite, a rir, a parlar e a cantar alegremente, sobre a linha alva dos cômoros ou no alto dos cabeços avançados nas vagas, à espera de que enegreçam o mar azul, ao longe, para dentro do Arvoredo, os primeiros magotes ou mantas de peixe de corso – a tainha, sobretudo – que vem tocada do alto-mar pelas primeiras tempestades de inverno e o consequente regelamento das águas, em busca do costão das ilhotas e do recesso mais ou menos sereno das abras e enseadas.
A expansão turística na Ilha de Santa Catarina a partir da segunda metade do século XX transformou rapidamente suas orlas rurais e pesqueiras em balneários de veraneio encarecendo o modo de vida e dificultando a permanência de populações pescadoras e agricultoras nas orlas. Casas rurais e ranchos de pesca foram substituídos por pousadas, beach clubs e condomínios de alto padrão econômico; as atividades produtoras e de subsistência deram lugar ao turismo, ao lazer e ao trabalho assalariado (LAGO, 1996; CLARAMUNT, 2008; CAMPOS, 2009; IPHAN, 2015).
Atualmente a pesca artesanal se apresenta na ilha como um trabalho acessório e uma herança cultural, não mais idêntica à época rural dos colonos açorianos, mas presente ainda em muitas praias, adaptada à condição contemporânea (LAGO, 1996).
Dentre os principais pontos pesqueiros remanescentes, a Barra da Lagoa se mostrou uma complexa construção social à medida em que abriga o maior núcleo pesqueiro da ilha e um popular ponto turístico de veraneio (DISON, 1982; VÁRZEA, 1989; CLARAMUNT, 2008; VAZ, 2008).
A pesca artesanal faz parte da paisagem da Barra da Lagoa e se materializa onde a terra encontra a água: nos ranchos de embarcações; nas plataformas de embarque e conserto dos barcos; nas redes secando ao ar livre. Manifesta-se também de maneira imaterial, em saberes ancestrais: na construção artesanal de embarcações (BUBNIAK, 2007); no cerco da tainha com canoa à remo - patrimônio cultural do estado catarinense (VÁRZEA, 1989; SANTA CATARINA, 2018) - no conhecimento sobre as dinâmicas de ventos e marés (DEVOS; VEDANA; BARBOSA, 2016; GERBER, 2017); nos métodos de manipulação do pescado; na culinária local. Esse conjunto de elementos
materiais e imateriais relacionados à tradição da pesca artesanal, associados ao espaço geográfico em que se encontram, constituem uma paisagem cultural (DEMANGEON, 1952; SANTOS, 2006; CASTRIOTA, 2013) na Barra da Lagoa e testemunham no presente sua origem pesqueira.
Considerando-se que as orlas vêm sendo ocupadas pela expansão turística, surge o questionamento sobre o futuro, não apenas da pesca e dos pescadores, mas da história e cultura locais como protagonistas na construção do espaço, especialmente no maior núcleo pesqueiro da ilha. Desse modo, propõe-se ocupar um vazio urbano em localização estratégica com um complexo que tornaria viável e visível o ciclo da pesca e a produção orgânica. A proposta busca ofertar moradia e equipamentos de suporte para famílias pescadoras e produtoras da Barra no intuito de possibilitar sua autonomia, subsistência e a segurança alimentar local (FAO, 2017).
O estudo do projeto foi desenvolvido como a tradição estudada na pesca: artesanalmente, pelo desenho manual, desde a observação das atividades pesqueiras em campo à proposição dos equipamentos e das espacialidades do projeto. Nesse processo manual foi possível experimentar, testar e verificar proposições para um estudo preliminar de como poderia ser esse complexo agrícola-pesqueiro.
A venda de pescados e produtos orgânicostainha, anchova, corvina, camarão, mandioca, milho, feijão, banana - bem como seus derivados, juntamente com a culinária local e a produção artesanal de bens, constituiriam a base econômica dos moradores desse complexo, contando também com o comércio local e com o turismo como oportunidade de complemento de renda.
O projeto pretende ofertar:
___aos pescadores e produtores locais: uma oportunidade de moradia e trabalho, almejando-se a subsistência, a autonomia e a sustentabilidade;
___à comunidade da Barra da Lagoa: oportunidades de emprego, incentivo à agricultura urbana, alimentação saudável e fresca e valorização da cultura local;
___à região da Grande Florianópolis: um equipamento urbano que pode ser usufruído e visitado por todos;
___aos turistas: a promoção do respeito pela cultura local e valorização dos saberes tradicionais, esperando estimular uma reflexão crítica sobre seu impacto no espaço habitado;
_____à natureza: a expansão do manguezal remanescente e da restinga no trecho de intervenção; a promoção de um modo de vida mais sustentável nos âmbitos sociais e ambientais, buscando valorizar os recursos naturais enquanto fontes de vida, energia e nutrição.
A pesca artesanal e de pequena escala é uma categoria de trabalho que gera emprego para mais de 90% dos pescadores do mundo, representando a principal modalidade de captura, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, FAO (2017). A modalidade artesanal representa mais de dois terços das capturas destinadas ao consumo humano, desempenhando papel fundamental na nutrição e segurança alimentar, além de contribuir com economias locais, regionais e até nacionais (FAO, 2017). Além de um meio de sustento, a modalidade artesanal de pesca representa uma herança cultural e um modo de vida para muitas comunidades ao redor do mundo (DIEGUES, 1983; FAO, 2017).
A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, 2017) e a Lei de Pesca (BRASIL, 2009) estabeleceram definições mais precisas do conceito de pesca artesanal, tendo como pontos em comum as dimensões reduzidas da embarcação e o baixo investimento tecnológico. Os pescadores artesanais também são definidos como detentores dos meios de produção de seu trabalho e do saber-fazer, o que confere a eles autonomia.
Diegues (1983) e Lago (1996) destacam o papel da identidade cultural no universo dos pescadores artesanais, que se identificam como um grupo conhecedor das artes da pesca, da fabricação de utensílios à captura do pescado. Essa modalidade de pesca é destinada principalmente à subsistência e ao comércio local, diferentemente da pesca industrial destinada à exportação em grande escala e ao comércio internacional (DEVOS; VEDANA; BARBOSA, 2016; FAO, 2017).
A continuidade da pesca depende da reprodução das espécies-alvo, que por sua vez depende do equilíbrio dos ecossistemas aquáticos. Autores como Jiménez-Badillo (2008), FAO (2017), Ríos e Gelcich (2017) destacam o reduzido impacto ambiental da pesca artesanal, mas reforçam a necessidade de gestão dos recursos naturais tanto para a modalidade artesanal quanto para a industrial, haja vista que ambas interferem no meio natural. Estratégias como a priorização da pesca artesanal, limitação da pesca industrial e proteção dos recursos naturais são capazes de garantir maior sustentabilidade à atividade pesqueira e, desse modo, promover sua continuidade enquanto atividade econômica e modo de vida.
No litoral de Santa Catarina, há o registro de 317 comunidades pesqueiras nos 34 municípios da costa (BANNWART, 2014), com mais de 25 mil pessoas que obtêm seu principal sustento diretamente da atividade, segundo dados do Ministério da Pesca e Aquicultura. Estão oficialmente registradas 38 colônias de pesca sob o regimento da Federação de Pescadores Artesanais de Santa Catarina (FEPESC), entidade que representa o setor, de acordo com a Lei das Colônias (BRASIL, 2008) e Lei da Pesca (BRASIL, 2009). Três grandes grupos caracterizam os alvos da atividade no estado: moluscos, crustáceos e peixes, totalizando 81 espécies-alvo identificadas.
Segundo dados coletados pela EPAGRI no ano de 2010 (BANNWART, 2014), as espécies que compõem a maior parte da pesca artesanal catarinense são a anchova (26%), o camarão-sete-barbas (15%), a corvina (13%) e a tainha (8%), e dentre as 22 modalidades de pesca identificadas as mais recorrentes são as de emalhe, de arrasto e de cerco.
Figura 4: Pesca conhecida como Arte-Xávega, em Portugal. Fonte: Página da web “Mundo Português”. Figura 5: Pescadores artesanais na Tanzânia. Fonte: Página da web “Alamy”. Figura 7: Pescadores artesanais em embarcação característica das Filipinas. Fonte: Página da web “Travel Blog”. Figura 6: Pescadores artesanais do Rio Tapajós. Fonte: reprodução página da web “Portal G1”, autoria de Sérgio Lobo.Santos (2006) argumenta que o ser humano se apropria do espaço geográfico pela técnica, pelo tempo e pela intencionalidade, que materializam no espaço objetos técnicos e ações referentes a determinado momento histórico. Nesse sentido, a paisagem cultural de um determinado lugar revela, em essência, um modo de vida e um entendimento da população local sobre o espaço geográfico que ocupa (DEMANGEON, 1952; UNESCO, 1999; CHOAY, 2001; SANTOS, 2006).
A pesca artesanal e a agricultura familiar de policultura configuram a matriz de ocupação da Ilha de Santa Catarina, caracterizando uma intencionalidade humana em um espaço ilhéu (LAGO, 1996; LISBOA, 1997; VEIGA, 2010; VAZ, 2008; IPHAN, 2015). Os colonos açorianos foram trazidos para a ilha a partir de 1748 e desenvolveram um modo de vida nos moldes das freguesias portuguesas, com economia de subsistência baseada na agricultura, na pesca e no artesanato, mantendo-se assim até o século XX (figuras 8, 9) (CASCAES, 1978; DIEGUES, 1983; VÁRZEA, 1989; LAGO, 1996; VEIGA, 2010; IPHAN, 2015).
Claramunt (2008) aponta que a ocupação da ilha pode ser compreendida como uma associação entre a fundação de freguesias planejadas pela Coroa, como a Freguesia de Nossa Senhora do Desterro, a Freguesia da Nossa Senhora da Conceição da Lagoa e a Freguesia da Nossa Senhora da Lapa do Ribeirão da Ilha, e a formação autônoma de núcleos agrícolas e pesqueiros, de crescimento espontâneo, como a Barra da Lagoa, Campeche, Armação e Pântano do Sul. Na ocupação da ilha também havia terras destinadas a uso comunal, nas quais os pequenos produtores criavam gado, extraíam madeira e também faziam uso agrícola como forma de complemento à produção de subsistência (CAMPOS, 1991).
As comunidades tornaram-se auto-suficientes, cultivando e pescando o próprio alimento e fabricando os meios necessários para o trabalho, como barcos de pesca, redes, engenhos, utensílios domésticos, renda e fios para vestuário. O cultivo era na forma de policulturas de pequena escala, com significativa variedade de itens, como mandioca, cana, milho, café e feijão (VÁRZEA, 1989).
O pescado sazonal, geralmente corvina, anchova e tainha capturadas pelo arrasto de praia, era dividido entre os participantes do arrasto e levado em barcos ao mercado central (figura 10), juntamente com alguns produtos agrícolas, para ser comercializado e possibilitar ao pequeno produtor a compra de bens que não eram produzidos por ele (CASCAES, 1978; DIEGUES, 1983; VÁRZEA, 1989; LAGO, 1996; LISBOA, 1997; IPHAN, 2015). Engenhos onde se produzia a farinha de mandioca também eram comuns, herança dos povos indígenas originários, onde desenvolveu-se posteriormente a cultura da cana de açúcar e café, em consonância com a economia brasileira (LAGO, 1996; CAMPOS, 2009).
Várzea (1989) descreve a “faina marinha” nos períodos de pesca, especialmente na safra da tainha, apresentando um universo onde os ranchos e as “canoas de voga” são protagonistas. As embarcações eram fabricadas de Garapuvu (Schizolobium excelsum) e Figueira brava (Ficus doliaria); apresentavam bordadura e fundo chato, o que facilitava o acesso a rios, canais e praias devido ao baixo calado e a facilidade de arrastá-las pela terra. Pela noite, guardavam a canoa e penduravam as redes em varais para secar e verificar danos (VÁRZEA, 1989). Após a divisão e venda do pescado, a parte que cabia aos pescadores era levada para suas casas, onde a família e parentes auxiliavam no preparo e na salga do peixe.
Lago (1996), Claramunt (2008) e Campos (2009) salientam que, à medida em que se popularizou o uso recreativo do mar, a produção do espaço nas orlas da ilha passou a seguir os desejos e necessidades dos turistas e novos moradores, priorizando usos como hospedagem, lazer e comércio. As esparsas casas rurais e ranchos de pesca de outrora deram lugar a avenidas, conjuntos residenciais, condomínios de luxo, beach clubs e hotéis de alto padrão econômico. Canasvieiras, Ponta das Canas, Ingleses e Campeche são alguns dos exemplos de antigas comunidades agrícola-pesqueiras que foram transformadas em balneários turísticos (LAGO, 1996).
Quando o valor do solo aumentou pela elevada procura, a especulação imobiliária exerceu pressão sobre ocupações populares e tradicionais. O modo de vida tornou-se caro para muitos pescadores e agricultores, que se viram forçadas a buscar outro local de moradia, mais acessível, migrando muitas vezes para áreas centrais ou continentais e muitos deles se adaptando a trabalhos assalariados (LAGO, 1996; DIEGUES, 1997). A expropriação das terras comunais, utilizadas pelos camponeses-pescadores para complemento de renda, também contribuíram para esse processo (LISBOA, 1997).
Ainda sobrevivem na atualidade alguns elementos da ilha rural como a pesca artesanal, a renda de bilro, as festividades (como a Festa do Divino Espírito Santo) e o dialeto típico (CAMPOS, 2009; IPHAN, 2015), que revelam no presente testemunhos da história e dos modos de vida ancestrais, representando forças de resistência da cultura local à expansão urbana e ao impacto do turismo global.
Atualmente a pesca artesanal se apresenta na ilha como um trabalho acessório e um modo de vida, não mais idêntico ao dos colonos açorianos, mas presente ainda em muitas praias da Grande Florianópolis. Segundo Lago (1996), a sazonalidade da pesca sempre exigiu dos pescadores a participação em atividades que complementassem a subsistência e a renda em períodos entressafra, anteriormente na agricultura e atualmente em trabalhos assalariados, geralmente nas áreas de construção civil, administração pública e turismo de veraneio (LAGO, 1996; BANNWART, 2014). Portanto, a pesca artesanal representa uma herança ancestral, e as localidades pesqueiras remanescentes, um patrimônio que se manifesta na paisagem cultural.
Buscou-se realizar um mapeamento prévio e aproximado da atividade pesqueira nas orlas da Ilha de Santa Catarina na atualidade, tomando-se como base conversas com moradores locais, visitas exploratórias e vivências. Várzea (1989) e Lago (1996) descrevem atividades pesqueiras e extrativistas em toda a orla da ilha, especialmente nas localidades de Saco dos Limões, Costeira do Pirajubaé, Caiacanga-açu, Pântano do Sul, Armação, Lagoa da Conceição, Barra da Lagoa, Campeche, Canasvieiras, Ingleses, Praia das Aranhas, Rapa (que pode abranger a Praia da Lagoinha do Norte e a praia Brava), Ponta das Canas, Ponta Grossa, Cacupé e Ribeirão. Na elaboração do mapeamento, verificouse que muitos dos pontos mencionados por Várzea (1989) e Lago (1996) ainda apresentam manifestações da pesca artesanal, mas com diferenças significativas entre eles em função dos distintos processos de ocupação e urbanização das orlas da ilha.
Buscando-se compreender a relação entre o espaço costeiro e as atividades pesqueiras na ilha, foram realizadas visitas exploratórias a tradicionais pontos pesqueiros mencionados por Várzea (1989) e Lago (1996) que permanecem referências da pesca artesanal na atualidade: Campeche, Armação, Pântano do Sul e Barra da Lagoa. As visitas iniciaram no inverno de 2018, durante a safra da tainha, registrando-se em desenhos de observação e fotografias as vivências e percepções sobre aspectos materiais e imateriais do modo de vida pesqueiro. Conversando com a população local foi possível ter contato com o modo de vida e o cotidiano, numa tentativa de melhor compreender as dinâmicas sociais das localidades visitadas. O objetivo desse estudo exploratório era tentar responder perguntas como: quais são os espaços de referência da pesca artesanal? Como os pescadores e não-pescadores se relacionam com esses espaços? O que essas espacialidades representam para o bairro?
O rancho do “Seu Deca”, na praia do Campeche, segue o partido geral dos tradicionais ranchos de pesca: é composto por um longo volume térreo feito de peças de madeira e revestido com tábuas, com treliças de madeira que sustentam a cobertura. Nesse espaço amplo ficam guardadas as canoas e todos os utensílios de trabalho. No fundo da construção, um volume distinto de alvenaria conforma uma cozinha e um pequeno oratório, indicando que o rancho representa também um espaço de permanência, convívio e representação simbólica. Nas visitas tornou-se evidente que o rancho de pesca é a materialização de um modo de vida próximo ao mar e que mescla identidades pessoais com o ofício de pescador.
Ocupações tradicionais, como núcleos pesqueiros artesaians, frequentemente têm sua continuidade ameaçada frente à expansão urbana, ao desenvolvimento tecnológico e à especulação imobiliária. Em algumas situações, torna-se necessário adotar mecanismos e estratégias capazes de estimular, em conjunto, a permanência e a continuidade dessas ocupações, que trazem consigo relevância social, cultural e econômica. Três estratégias principais podem ser elencadas: de caráter legislativo; de iniciativa popular; de intervenção no espaço.
Na esfera legislativa, a certificação de produtos locais e/ou orgânicos em políticas de ativos territoriais pode estimular a realização de feiras de bairro e mercados locais em um esforço de valorizar os circuitos curtos de produção e venda. No âmbito da pesca, as cotas de captura, as licenças anuais de pesca, o seguro-defeso e os períodos de captura por modalidade atuam, em conjunto, como maneiras de proteger o ecossistema marinho, valorizar a pesca artesanal e frear o impacto da pesca industrial (JIMÉNEZ-BADILLO, 2008; FAO, 2017; RÍOS; GELCICH, 2017).
Políticas de permanência e de uso da terra também são fundamentais na proteção de ocupações tradicionais à medida em que buscam reduzir o impacto da expansão urbana e especulação imobiliária nesses espaços. No Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Salvador (2008), por exemplo, foi criada uma categoria de ZEIS (Zona Especial de Interesse Social) específica para assentamentos de populações quilombolas e/ou de culturas tradicionais vinculadas à pesca e ao extrativismo como maneira de garantir às comunidades permanência e autonomia em seus espaços de atuação (ROLNIK; SANTORO, 2013).
Dentre iniciativas populares em núcleos pesqueiros, destaca-se a formação de cooperativas de pesca, entidades capazes de proporcionar garantias e certa segurança econômica para pescadores artesanais associados. As Cooperativas de pesca do litoral de São Paulo, como as de São Sebastião, Cananeia, Vila Velha e Bacia de Campos são alguns exemplos de êxito.
Tratando-se do papel de projetistas, busca-se demonstrar que algumas intervenções no espaço podem valorizar atividades produtoras e pesqueiras, além de promover ocupações com menor impacto ambiental. Embora não sejam destinados a comunidades tradicionais, propostas de moradia do BedZED, de Bill Dunster Architects em Londres, Inglaterra, 2002 (figura 34), da Christie Walk Eco-village, do grupo Ecopolis Architects em Adelaide, Austrália (figuras 35 e 36) e da Housing Hope - Twin Lakes Landing, da parceria entre Designs Northwest Architects + HKP Architects, em Marysville, WA (figura 37) destacam-se pela geração de energia, aproveitamento da iluminação natural e uso de espaços abertos para cultivo de hortaliças em pequena escala, buscando a eficiência energética e a difusão da agricultura urbana (FARR, 2013).
Na América Latina, intervenções no Equador, no Chile e no Brasil têm proposto sistemas e estuturas de apoio a populações tradicionais e/ou de baixa renda. Destaca-se o projeto de infraestrutura urbana e pesqueira de Puerto Hualtaco, projeto do Ministerio de Desarrollo Urbano y Vivienda de Ecuador (figura 38) e a Comuna (figura 39) - projeto de Natura Futura Arquitectura em parceria com Frontera Sur - ambos em Huaquillas, El Oro, no Equador. Também se destacam o Mercado Fluvial de Valdívia (figura 40), no Chile, o Conjunto Vila da Barca (figura 41), as Moradas infantis de Canuanã (figura 43) e o Estaleiro Escola (figura 42), no Brasil.
O projeto de melhoria da infraestrutura de Puerto Hualtaco iniciou em 2009 e teve como objetivos valorizar as atividades pesqueiras e o potencial turístico associado às orlas e ao consumo de frutos do mar (CRUZ, 2014). A Comuna, por sua vez, buscou mesclar moradia e espaços de trabalho para uma família que realiza a reciclagem de resíduos sólidos em Huaquillas, ao mesmo tempo que oferece suporte a atividades comunitárias (SANTIBAÑEZ, 2018). No Chile, país de tradição pesqueira, destaca-se o Mercado Fluvial de Valdívia, onde é possível comprar pescados frescos e onde o trabalho do pescador e de quem manipula o peixe é evidenciado.
No Brasil, o projeto de moradias para uma ZEIS de pescadores artesanais em Belém (PA) resultou na construção do Conjunto Vila da Barca, em 2006, numa tentativa de manter a interação espacial e a morfologia do conjunto arquitetônico pré-existente, oferecendo moradias de maior durabilidade à população do local (MCIDADES, 2009).
O Estaleiro Escola, construido em 2006, foi uma iniciativa do governo do Maranhão no intuito de promover a continuidade da construção artesanal de barcos e ofertar cursos profissionalizantes à comunidade de Tamancão, em São Luís. A proposta buscou integrar saberes tradicionais às demandas da contemporaneidade, buscando oferecer novas possibilidades de renda à população local.
Destaca-se também a proposta de Moradas Infantis para a escola rural de Canuanã, parceria entre Marcelo Rosenbaum e o escritório Aleph Zero, realizada em 2017. O conjunto foi construído com materiais regionais, com destaque para a estrutura de madeira e para o uso do solocimento numa tentativa de se criar espacialidades às quais as crianças do local estivessem familiarizadas.
Tratando-se de projetos de infraestrutura urbana, destaca-se a Eco-machine para tratamento ecológico de efluentes, desenvolvido por John Todd Ecological Design (TODD; BROWN; WELLS, 2003). O equipamento é um sistema que trata o esgoto em uma série de etapas, com destaque para wetlands e tanques com agentes filtrantes naturais. A edificação que abriga os tanques é geralmente aberta à comunidade como um equipamento urbano e paisagístico, podendo realizar o tratamento de água para reuso em edificações públicas adjacentes. Pode-se citar como exemplo o The Omega Center for Sustainable Living (figuras 44 e 45) e City of South Burlington Municipal Eco-machine.
A Barra da Lagoa é um bairro do município de Florianópolis localizado na costa leste da Ilha de Santa Catarina. É delimitado a leste pelo Oceano Atlântico; ao sul pelo Morro da Galheta; a oeste pela Lagoa da Conceição; ao norte pelo Parque Estadual do Rio Vermelho.
O principal elemento do bairro é o Canal da Barra, uma ligação que conecta o mar e a Lagoa da Conceição e que já sofreu ampliações a pedido dos pescadores locais. Pelo canal transitam barcos de pesca, lanchas, barcos turísticos, botes e bateiras, representando no meio aquático as diversas culturas e esferas sociais presentes no bairro.
Atualmente a pesca artesanal se apresenta na ilha como um trabalho acessório e uma herança cultural, não mais idêntica à época rural dos colonos açorianos, mas presente ainda em muitas praias, adaptada à condição contemporânea (LAGO, 1996).
Dentre os principais pontos pesqueiros remanescentes, a Barra da Lagoa se mostrou uma complexa construção social à medida em que abriga o maior núcleo pesqueiro da ilha e um popular ponto turístico de veraneio (DISON, 1982; VÁRZEA, 1989; CLARAMUNT, 2008; VAZ, 2008).
A pesca artesanal faz parte da paisagem da Barra da Lagoa e se materializa onde a terra encontra a água: nos ranchos de embarcações; nas plataformas de embarque e conserto dos barcos (figuras 50, 51 e 52); nas redes secando ao ar livre (figuras 49, 51, 52, 55). Manifesta-se também de maneira imaterial, em saberes ancestrais: na construção artesanal de embarcações (BUBNIAK, 2007) (figura 54); no cerco da tainha com canoa à remo - patrimônio cultural do estado catarinense (VÁRZEA, 1989; SANTA CATARINA, 2018) - no conhecimento sobre as dinâmicas de ventos e marés (DEVOS; VEDANA; BARBOSA, 2016; GERBER, 2017); nos métodos de manipulação do pescado; na culinária local
Esse conjunto de elementos materiaisconstruções e equipamentos - e imateriais - técnicas e saberes da população local - relacionados à tradição da pesca artesanal, associados ao espaço geográfico em que se encontram, constituem uma paisagem cultural (DEMANGEON, 1952; SANTOS, 2006; CASTRIOTA, 2013) na Barra da Lagoa, que testemunha no presente sua origem pesqueira. A ação humana é influenciada pelo espaço, e ao mesmo tempo também o transforma numa relação dialética (figuras 55, 56, 57).
Na área central da Barra da Lagoa há um terreno ocioso (figuras 58 e 59) de grandes dimensões (aproximadamente 80 m²), chamado aqui de “vazio urbano” em consonância com o termo que descreve lotes que não estão cumprindo com a função social da propriedade, prevista no Estatudo da Cidade (BRASIL, 2001). Esse vazio está localizado em local estratégico: entre as principais vias da Barra e o canal, próximo a uma série de equipamentos comunitários como o Conselho Comunitário da Barra da Lagoa (A), a Escola de Ensino Médio Pref. Acácio Garibaldi Santiago (B), a creche Prof.a Elisabete Nunes Anderle (C, figura 65), atualmente em ampliação, e um estaleiro que produz barcos artesanalmente (D, figura 66).
As principais vias do bairro estão representadas na cor laranja, e os pontos amarelos representam pontos de ônibus. Torna-se evidente, portanto, que
as proximidades do lote são servidas por transporte público, além de contar com comércio local como mercados, lanchonetes, restaurantes, etc. As linhas tracejadas representam vias locais que dão acesso ao terreno. Percebe-se com isso que o lote conta com diversos pontos de conexão com diferentes partes do bairro.
Nos limites do terreno que estão em contato com o canal há um manguezal remanescente numa estreita faixa de vegetação de orla (figura 60), que atualmente se encontra separado do lote por uma cerca (figura 61). Essa interação entre o lote e o manguezal não representa a relação ideal entre o terreno e a vegetação de orla, sendo que uma situação desejável seria haver uma transição mais gradual entre os diferentes tipos de vegetação no intuito de proteger as dinâmicas existentes da fauna local.
Esquema ilustrativo com os principais eixos de conexão da proposta (em vermelho, linha cheia - bairro > Canal da Barra; em laranja, linha tracejada - conexões internas do bairro. Elaborado pelo autor.
Elisabete Nunes Anderle (C) e rancho de produção artesanal de barcos (D). Elaborado pelo autor sobre base do Geoprocessamento Corporativo de Florianópolis
Considerando-se que as orlas vêm sendo ocupadas pela expansão turística, surge o questionamento sobre o futuro, não apenas da pesca e dos pescadores, mas da história e cultura locais como protagonistas na construção do espaço especialmente no maior núcleo pesqueiro da ilha. Desse modo, propõe-se ocupar um vazio urbano em localização estratégica com um conjunto que tornaria viável e visível o ciclo da pesca e a produção orgânica. A proposta busca ofertar moradia e equipamentos de suporte para famílias pescadoras e produtoras da Barra no intuito de possibilitar sua autonomia, subsistência e a segurança alimentar local (FAO, 2017).
Assumindo-se a permanência e o acesso às orlas como as premissas fundamentais para a viabilidade das atividades pesqueiras, foi proposto um eixo longitudinal ao terreno e uma praça com os principais equipamentos comunitários do conjunto - sede administrativa, centro comunitário, mercado de pescados, oficina de embarcações - conectando
o bairro diretamente ao Canal da Barra. Conexões transversais foram pensadas para costurar as áreas do entorno, buscando-se a proximidade com equipamentos existentes como o Conselho Comunitário (A), a Escola de Ensino Médio Pref. Acácio Garibaldi Santiago (B), a Creche Prof.aª Elisabete Nunes Anderle (C), e o estaleiro (D). As conexões conformam quadras habitacionais com espaços livres destinados ao cultivo de legumes, hortaliças e frutas.
Propõe-se a abertura de uma alça aquática adjacente ao Canal que poderia funcionar como principal espaço de trabalho dos pescadores, dando acesso às oficinas e ao mercado de pescados, liberando a orla do canal para a recuperação da restinga e manguezal remanescentes, necessários à proteção das orlas. O complexo produziria sua própria energia, com a instalação de painéis fotovoltaicos na cobertura das edificações, e realizaria o tratamento de esgoto local com o uso de tanques anaeróbicos, agentes filtrantes naturais e wetlands (áreas alagadas) construidas.
Esquema ilustrativo com a proposta de abertura da alça aquática, bem como demonstrando o manguezal remanescente (verde cheio) e o aumento da área de proteção (verde hachurado) destinada à expansão do manguezal e da restinga. Elaborado pelo autor.
ilustrativo da proposta com as edificações comuitárias (cor vermelha) e as habitacionais (cor rosa), bem como as áreas verdes comunitárias (verde claro) e as áreas alagáveis e/ou de proteção (verde escuro). Elaborado pelo autor.
A praça é o coração do complexo, delimitada pelos principais equipamentos públicos - centro comunitário, sede administrativa, pontos de comércio, mercado de pescados e espaço religioso. Conta com um grande espaço livre central para a realização de feiras, festividades e eventos comunitários, além de espaços de permanência sombreados junto aos equipamentos. Espécies da restinga colaboram na definição das espacialidades da praça, conformando áreas sombreadas e de estar e áreas abertas ensolaradas, além de contribuir para a manutenção das dinâmicas da flora e fauna locais. Parte da praça central é elevada e conta com lanchonetes e bares. O reservatório de água das edificações comunitárias também funciona como mirante e marco visual.
Costurando a praça central e os equipamentos às pré-existências do bairro, propõe-se quadras habitacionais com unidades de morar e hortas de cultivo, sendo as moradias ofertadas por aluguel social e destinadas a famílias pescadoras e produtoras. Os conjuntos são formados por blocos de dois pavimentos unidos em fita, considerando-se que cada pavimento de cada bloco constitui uma unidade de morar de aproximadamente 63 m², incluindo áreas de varanda e circulação. Contando com 90 blocos de dois pavimentos, o conjunto teria, portanto, 180 unidades de morar. Junto a cada quadra habitacional, tem-
se canteiros comunitários destinados ao cultivo de alimentos, tais como mandioca, feijão, alface, abóbora, milho, e frutas como pitanga e banana, por exemplo. As varandas e sacadas oferecem oportunidades para atividades como o conserto de tarrafas, limpeza de pescado, seleção de alimentos colhidos e produção de artesanato.
63 m² (considerando circulação e varandas)
48 m²
(apenas cômodos)
63 m² (considerando circulação e varandas)
48 m²
(apenas cômodos)
Corte AA
Escala 1/100 m
x 90 = 180 unidades
Corte BB
Escala 1/100 m
As saídas ao mar muitas vezes danificam os barcos e demais instrumentos de trabalho, havendo a necessidade constante de pequenos consertos. Imaginase uma oficina de barcos comunitária, que seria uma cobertura, em estrutura de madeira, sob a qual os barcos podem ser estabilizados sobre trilhos e reparados. Seria possível também dar continuidade aos saberes de produção artesanal de barcos. Junto à oficina haveria varais para secagem e reparo das tarrafas, atividade que demanda um espaço significativo pois algumas redes, como a de arrasto da tainha, possuem grandes dimensões.
Entre a praça central e o canal proposto, os pescadores e produtores podem vender seus produtos diretamente aos consumidores no mercado de pescados e orgânicos. Um morador da Barra ou um turista poderia comprar anchova, corvina, tainha e camarão frescos, limpos e preparados pela própria comunidade local. Uma grande cobertura em estrutura de madeira delimita o mercado, onde bancadas de trabalho tornam visíveis os processos de manipulação
e limpeza do pescado. Pratos típicos da culinária local podem ser feitos e provados no local, que também conta com bancos, mesas e espaços de permanência. Os peixes e frutos do mar que não fossem vendidos ou fossem capturados em grande quantidade podem ser congelados e armazenados em câmaras frias para que peixarias e mercados possam comprá-los, evitando-se o desperdício.
Junto ao Centro Comunitário, propõe-se uma sede administrativa voltada à gestão da comunidade pesqueira da Barra da Lagoa, atuando como entidade representativa vinculada à Colônia Z-11 capaz de organizar reuniões, assembleias e eventos, bem como fiscalizar o funcionamento das atividades pesqueiras locais e a interferência no meio natural. Um painel de concreto abrigaria um memorial sobre a história da pesca artesanal na Barra da Lagoa, contando com imagens históricas, relatos de moradores e informativos
sobre espécies da flora e fauna locais - espécies de restinga e manguezal; espécies aquáticas marinhas e do canal, dentre outras informações relevantes para a difusão do conhecimento sobre a cultura pesqueira. Na sede também haveria sala de leitura e cursos de artesanato.
Junto à praça central, o centro comunitário dos pescadores pretende ser uma reinterpretação dos ranchos de pesca enquanto espaços de festejo e convívio. Imagina-se um equipamento que pode ser aproveitado pelos moradores do complexo pesqueiro no cotidiano, bem como para eventos maiores como a Festa da Tainha, festas juninas, eventos beneficentes, aniversários de personalidades locais conhecidas, casamentos e festividades da população local. O centro poderia abrigar as antigas canoas bordadas de um pau só usadas na pesca artesanal da tainha na Barra, atualmente levadas até o bairro Rio Vermelho nas épocas entressafra.
Propõe-se um sistema de tratamento de efluentes e reuso de água para as edificações comunitárias, utilizando-se plantas e microorganismos filtrantes naturais como os principais agentes do processo. O sistema é similar ao modelo conhecido como Ecomachine (TODD; BROWN; WELLS, 2003), desenvolvido por John Todd Ecological Design, e possui três etapas básicas: primeiramente em tanque anaeróbico, seguido de tanques aeróbicos com agentes filtrantes e finalmente wetlands construidas. Os tanques ficam abrigados e geridos em edificação específica, que pode ser visitada por escolas e comunidade e tornar visível um processo natural de filtragem.
VIGA-VAGÃO DE
VIGA VIERENDEEL DE MADEIRA
PILAR COMPOSTO DE MADEIRA
BASE DE CONCRETO
A imagem ao lado mostra a venda de pescados no Mercado Público de Florianópolis na década de 1920, quando o mar ainda chegava próximo ao centro histórico. Apesar dessa fotografia mostrar o passado, ela traz à tona uma reflexão sobre o presente e uma discussão sobre o futuro. Ela nos faz esboçar uma pergunta:
- Nós, enquanto projetistas e idealizadores do espaço, estamos olhando de maneira atenta e honesta para a herança cultural das nossas cidades? Compreendendo a cultura e a natureza como pilares da vida humana, como estamos abordando esses aspectos em nossas propostas? Como queremos as cidades do amanhã?
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Saberes ancestrais como a construção e o reparo de embarcações, o cerco da tainha com canoa à remo, o entendimento sobre as dinâmicas de ventos e marés, os métodos de manipulação do pescado e a culinária local constituem uma herança cultural que faz da Barra da Lagoa um bairro de origem pesqueira. As orlas da Ilha de Santa Catarina gradativamente vêm sendo transformadas de espaços rurais em balneários de veraneio pela expansão turística, encarecendo o modo de vida e dificultando a permanência de pescadores e agricultores. Nesse processo, questiona-se sobre o futuro não apenas da pesca e dos pescadores, mas da história e cultura locais como partícipes na construção do espaço. Abordando-se a pesca artesanal como modo de vida sustentável e elemento-chave da paisagem cultural da Barra da Lagoa, na costa leste da Ilha de Santa Catarina, assumindo suas transformações frente à contemporaneidade e almejando sua continuidade no futuro, propõe-se ocupar um vazio urbano em localização estratégica com um conjunto que tornaria viável e visível o ciclo da pesca e a produção orgânica. A proposta busca ofertar moradia e equipamentos de suporte para famílias pescadoras e produtoras no intuito de possibilitar sua autonomia, subsistência e segurança alimentar. O projeto prevê centro comunitário, mercado de pescados e orgânicos, oficinas de barcos, moradia acessível, espaços de plantio, tratamento ecológico de esgoto e estratégias para expansão do manguezal remanescente e da restinga, no intuito de costurar natureza e memória e colaborar com uma reflexão sobre o futuro da cultura local e dos espaços de orla.