Colecionador transforma sua casa em um espaço para celebrar a arte 01/10/2018 | TEXTO MARIA CLARA DRUMMOND | ESTILO ADRIANA FRATTINI |PRODUÇÃO NATÁLIA MARTUCCI FOTOS FILIPPO BAMBERGHI | ASSISTENTE DE PRODUÇÃO STEFANO ZANCHI |MAKE-UP/HAIR: RAPHAEL VENERUCCI (CAPA/MGT)
*Matéria originalmente publicada na edição de agosto da Casa Vogue Movido pelo amigo e artista Tunga, Ricardo Kugelmas transformou sua morada, uma casa de 1957 com projeto de Gian Carlo Gasperini, no espaço independente Auroras
! O morador e idealizador do Auroras posa na biblioteca, montada por seu avô
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A abertura da exposição Tunga - o rigor da distração, em cartaz até novembro no Museu de Arte do Rio, Ricardo Ortiz Kugelmas aponta para a série de aquarelas Quase Aurora e diz: “Eu não sabia que nome dar para o meu projeto. No enterro de Tunga, me lembrei desses trabalhos”. Dali surgiu o Auroras, espaço expositivo independente que o advogado com trajetória no universo das artes idealizou na zona sul de São Paulo – e que por acaso é também a sua casa.
Um banco AYTY, de Hugo França, aparece no jardim com paisagismo de Marcelo Faisal, diante da piscina vazia coberta por uma rede de proteção, com tapete da Botteh Handmade Rugs sobre ela
! A biblioteca da morada reúne títulos de arte que ficam disponíveis para o público visitante do Auroras – no ambiente, mobiliário vintage decora confortavelmente a área
!
Rica era estudante de direito quando conheceu Tunga e Antonio Dias, num dos almoços na residência da sua tia Lenny Niemeyer. “Eu sempre tive amigos mais velhos porque gosto muito de aprender, sou um bom ouvinte”, conta ele. Em 2007, mudou-se para Nova York a fim de ser diretor do ateliê de Francesco Clemente, onde trabalhou por nove anos e conheceu figuras como David Salle, Alex Katz e Jasper Johns.
A escultura Sem Título (2015), de Tunga, que já esteve em exposição no espaço
Na contramão da tendência da época, ele voltou ao país no auge da crise. “Estava todo mundo querendo ir embora do Brasil, mas achei que aqui teria mais contribuições a fazer." Veio então o insight de usar o lar modernista de seus avós, fechado havia dez anos, para abrigar o Auroras.
! Coleção de pinturas em pequenos formatos.
! No cantinho da cozinha com mesa de café, quadros de Roy Lichtenstein (à esq.) e Pedro Alexandrino (à dir.)
“O fato de o projeto ser numa casa habitada dá toda uma personalidade própria", diz o morador. "Enquanto os paulistanos se cercam cada vez mais de muros, achei importante deixar minha própria casa acessível ao público." Como fica numa rua residencial, o Auroras abre apenas aos fins de
semana ou com hora marcada. “Foi Tunga quem estimulou tanto a minha ida quanto a minha volta de Nova York. Conversávamos muito sobre essa ideia de um lugar autônomo, separado das galerias de arte e das instituições. Infelizmente, ele nunca chegou a conhecer o Auroras.”
! Na circulação, quadro de Cecily Brown
Concebida em 1957 por Gian Carlo Gasperini, a construção onde viveram seus avós mantém intactos todos os detalhes originais, com exceção da biblioteca, feita pelo avô de Rica. “Era ali que ele guardava seus 18 mil livros, mas minha avó vendeu tudo. Hoje, o acervo é composto pelo o que eu trouxe de viagem e edições doadas pelo MAM, Pinacoteca do Estado e Cosac Naify, já que é uma biblioteca aberta ao público.”
! Uma escultura pendente de Sonia Gomes antecede a estante do escritório, onde livros dividem espaço com obras de arte, com destaque para uma fotogravura de Hiroshi Sugimoto, uma gravura de Jasper Johns (ambas abaixo, à esq.), uma gravura de Alex Katz (no chão, à dir.) e uma máscara de Francesco Clemente (sobre a mesa)
A primeira iniciativa do Auroras foi a instalação Volume Morto, de Lenora de Barros, no auge da crise hídrica paulista. “Esvaziei a piscina para a obra, e não voltei a encher, dada a situação da cidade em 2015. Quando o Auroras passou a receber quinzenalmente alunos de escolas públicas, fiquei preocupado que as crianças pudessem cair, e a Valeska Soares deu a ideia da rede, que acabou virando nossa marca registrada."
! Em um ângulo do quarto, no segundo andar, a obra de Alex Katz impacta qualquer visitante – por ali, a poltrona Costela, de Martin Eisler, oferece o conforto ideal para admirar a tela
Até agora, o local já recebeu obras de Tunga, Cecily Brown, Lydia Okumura, Alex Katz, Flávio de Carvalho e Leda Catunda. Há também uma sala menor disponível para editais de projetos escolhidos pelo conselho consultivo do Auroras, composto por nomes como Lucia Koch, Arto Lindsay, Charles Cosac e Fernanda Gomes.
! Na entrada do quarto, quadro de Cecily Brown e luminária de mesa de Isamu Noguchi
“Toda a minha experiência com arte foi dentro de um ateliê. Eu nunca trabalhei numa galeria ou instituição. Portanto, quis que o conselho fosse feito de artistas, e busquei pessoas de diferentes áreas”, conta Rica, com o idealismo que desenhou sua trajetória. “O Auroras consegue se manter com algumas vendas porque é um empreendimento de baixo custo. Mas o mercado é o que menos me interessa”, assegura.
! Em outro quarto, autorretrato de Isabel Barber (à esq.) e pintura de David Salle (à dir.) imprimem cor ao décor minimalista com cadeira de Charles e Ray Eames, e luminária de Isamu Noguchi
! Uma balança antiga colocada no banheiro ganha a companhia de um quadro de Vittorio Gobbis e outro de autoria desconhecida