Livro: Monstros Guia da Maldade

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MONSTROS GUIA DA MALDADE Os homens e mulheres mais perversos da História


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SIMON SEBAG MONTEFIORE com John Bew e Martyn Frampton


MONSTROS – Guia da Maldade

SIMON SEBAG MONTEFIORE

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com John Bew e Martyn Frampton

MONSTROS GUIA DA MALDADE Os homens e mulheres mais perversos da História

tradução Sônia Augusto

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MONSTROS – Guia da Maldade

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SUmáRiO 00 Introdução 00 Jezebel século IX a.C. Salomé 00 Nabucodonosor c. 630-562 a.C. Sargão da Acádia: o primeiro grande conquistador da Mesopotâmia 00 Qin Shi Huang c. 259-210 a.C. O mundo subterrâneo do imperador 00 Sila 138-78 a.C. Tiranos e ditadores

00 Justiniano II 669-711 O saque de Constantinopla

00 Imperatriz Teodora 497-548 Revolta de Nika

00 Papa João XII c. 937-964 Marózia, a Jezebel do papado

00 Imperatriz Wu 625-705 Madame Mao

00 Introdução

00 Justiniano II 669-711 O saque de Constantinopla

00 Jezebel século IX a.C. Salomé 00 Nabucodonosor c. 630-562 a.C. Sargão da Acádia: o primeiro grande conquistador da Mesopotâmia

00 Papa João XII c. 937-964 Marózia, a Jezebel do papado 00 Introdução 00 Jezebel século IX a.C. Salomé 00 Nabucodonosor c. 630-562 a.C. Sargão da Acádia: o primeiro grande conquistador da Mesopotâmia

00 Crasso c. 115-53 a.C. Crucificação

00 Qin Shi Huang c. 259-210 a.C. O mundo subterrâneo do imperador

00 Herodes, o Grande 73-4 a.C. A dinastia herodiana

00 Sila 138-78 a.C. Tiranos e ditadores

00 Imperatriz Lívia 58 a.C.- 29 d.C. Tibério e Sejano

00 Crasso c. 115-53 a.C. Crucificação

00 Qin Shi Huang c. 259-210 a.C. O mundo subterrâneo do imperador

00 Herodes, o Grande 73-4 a.C. A dinastia herodiana

00 Sila 138-78 a.C. Tiranos e ditadores

00 Nero 37-68 d.C. Agripina

00 Imperatriz Lívia 58 a.C.- 29 d.C. Tibério e Sejano

00 Crasso c. 115-53 a.C. Crucificação

00 Domiciano 51-96 d.C. A perseguição aos cristãos

00 Calígula 12-41 d.C. Heliogábalo

00 Cômodo 161-192 d.C. Gladiadores

00 Nero 37-68 d.C. Agripina

00 Imperatriz Lívia 58 a.C.- 29 d.C. Tibério e Sejano

00 Caracala 186-217 d.C. Os bárbaros

00 Domiciano 51-96 d.C. A perseguição aos cristãos

00 Calígula 12-41 d.C. Heliogábalo

00 Átila, o Huno 406-453 Hunos, godos e vândalos

00 Cômodo 161-192 d.C. Gladiadores

00 Nero 37-68 d.C. Agripina

00 Imperatriz Teodora 497-548 Revolta de Nika

00 Caracala 186-217 d.C. Os bárbaros

00 Domiciano 51-96 d.C. A perseguição aos cristãos

00 Imperatriz Wu 625-705 Madame Mao

00 Átila, o Huno 406-453 Hunos, godos e vândalos

00 Cômodo 161-192 d.C. Gladiadores

00 Calígula 12-41 d.C. Heliogábalo

00 Herodes, o Grande 73-4 a.C. A dinastia herodiana


00 Caracala 186-217 d.C. Os bárbaros 00 Átila, o Huno 406-453 Hunos, godos e vândalos 00 Imperatriz Teodora 497-548 Revolta de Nika 00 Imperatriz Wu 625-705 Madame Mao 00 Justiniano II 669-711 O saque de Constantinopla 00 Papa João XII c. 937-964 Marózia, a Jezebel do papado 00 Jezebel século IX a.C. Salomé 00 Nabucodonosor c. 630-562 a.C. Sargão da Acádia: o primeiro grande conquistador da Mesopotâmia 00 Qin Shi Huang c. 259-210 a.C. O mundo subterrâneo do imperador 00 Sila 138-78 a.C. Tiranos e ditadores 00 Crasso c. 115-53 a.C. Crucificação 00 Herodes, o Grande 73-4 a.C. A dinastia herodiana 00 Imperatriz Lívia 58 a.C.- 29 d.C. Tibério e Sejano 00 Calígula 12-41 d.C. Heliogábalo 00 Nero 37-68 d.C. Agripina 00 Domiciano 51-96 d.C.

A perseguição aos cristãos 00 Cômodo 161-192 d.C. Gladiadores 00 Caracala 186-217 d.C. Os bárbaros 00 Átila, o Huno 406-453 Hunos, godos e vândalos 00 Imperatriz Teodora 497-548 Revolta de Nika 00 Imperatriz Wu 625-705 Madame Mao 00 Justiniano II 669-711 O saque de Constantinopla 00 Papa João XII c. 937-964 Marózia, a Jezebel do papado 00 Jezebel século IX a.C. Salomé 00 Nabucodonosor c. 630-562 a.C. Sargão da Acádia: o primeiro grande conquistador da Mesopotâmia 00 Qin Shi Huang c. 259-210 a.C. O mundo subterrâneo do imperador 00 Sila 138-78 a.C. Tiranos e ditadores

00 Nero 37-68 d.C. Agripina 00 Domiciano 51-96 d.C. A perseguição aos cristãos 00 Cômodo 161-192 d.C. Gladiadores 00 Caracala 186-217 d.C. Os bárbaros 00 Átila, o Huno 406-453 Hunos, godos e vândalos 00 Imperatriz Teodora 497-548 Revolta de Nika 00 Imperatriz Wu 625-705 Madame Mao 00 Justiniano II 669-711 O saque de Constantinopla 00 Papa João XII c. 937-964 Marózia, a Jezebel do papado 00 Introdução 00 Jezebel século IX a.C. Salomé 00 Nabucodonosor c. 630-562 a.C. Sargão da Acádia: o primeiro grande conquistador da Mesopotâmia

00 Crasso c. 115-53 a.C. Crucificação

00 Qin Shi Huang c. 259-210 a.C. O mundo subterrâneo do imperador

00 Herodes, o Grande 73-4 a.C. A dinastia herodiana

00 Sila 138-78 a.C. Tiranos e ditadores

00 Imperatriz Lívia 58 a.C.- 29 d.C. Tibério e Sejano

00 Crasso c. 115-53 a.C. Crucificação

00 Calígula 12-41 d.C. Heliogábalo

00 Herodes, o Grande 73-4 a.C. A dinastia herodiana


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Este livro dos chamados “monstros” é um volume irmão de meu livro dos chamados “heróis”. A história pode nos dar alertas do passado e lições para o futuro. Essas histórias de heroísmo e vilania são um modo em que podemos aprender a apreciar os valores — como responsabilidade, tolerância, decência, coragem — que deveriam ser as bases da sociedade. Deveríamos aspirar à coragem dos heróis enquanto os crimes dos monstros se erguem como alertas vindos do passado, lições para o futuro e monumentos à surpreendente depravação e à infinita perversidade da natureza humana. Quer você concorde ou discorde em relação às minhas escolhas, esses são personagens, histórias e acontecimentos que todos deveriam conhecer.

INtrOdUçãO Entretanto, eles também são fascinantes em si mesmos, embora sejam terríveis. Na verdade, apesar de todos os esforços do gênio poético de John Milton para realizar o contrário, Satã continua a ser o personagem mais fascinante em Paraíso Perdido. Muitos dos monstros nestas páginas eram estadistas e generais inteligentes e complexos. Mas nada disso deve EDWARD GIBBON nos desviar da descrição de seus crimes. Este livro é dedicado às vítimas que fizeram. Os seis milhões de judeus mortos no Holocausto, o ato mais estarrecedor de perversidade na história humana, certamente não foram esquecidos, embora os detalhes reais desse massacre em escala industrial ainda desafiem a crença, mas aqui também lembramos os milhões assassinados no Congo, Ruanda, os armênios e os hereros da Namíbia, e muitos outros. Ao dar nome a seus assassinos e descrevê-los, desafiamos o desejo dos criminosos que esperavam que a posteridade esquecesse seus crimes. “Quem se lembra agora dos armênios?” ponderou Hitler, ordenando a Solução Final. O comentário dele mostra por que a história é importante, pois Hitler encontrou encorajamento e alívio nos massacres esquecidos dos armênios. O passado e o presente estão intimamente ligados: “Ninguém se lembra dos boiardos mortos por Ivã, o Terrível”, disse Stalin, ordenando o Grande Terror. Na escala imensamente audaciosa e quase inacreditável desses crimes, os monstros encontraram um santuário diabólico de compreensão e julgamento. “Uma morte”, disse Stalin, “é uma tragédia, mas um milhão é uma estatística”. Os mais horrendos desses crimes foram cometidos no século XX quando a utopia corrosiva e inclusiva de ideologias insanas associou-se com a tecnologia moderna e o poder estatal onipresente para tornar o assassinato mais fácil, mais rápido e possível em uma escala gigantesca. Desse modo, o século XX e a II Guerra Mundial devem ser representados em especial.

A história é pouco mais que o registro dos crimes, loucuras e infortúnios da humanidade.


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Como escolhi esses monstros? De um modo totalmente subjetivo. Alguns são óbvios, como Calígula, Vlad, o Empalador, Ivã, o Terrível, Idi Amin ou Saddam Hussein. Hitler, Stalin, Mao — os super-assassinos totalitaristas do século XX, quando trens, metralhadoras e telégrafos facilitaram o massacres — estão aqui. Todos esses monstros foram ajudados por milhares de pessoas comuns que se tornaram assassinos e torturadores para tomar parte em seus planos. Poucos foram punidos, mas partilham a responsabilidade de seus líderes. Incluí alguns assassinos em série — criaturas repelentes, banais e medíocres cujos complexos de inferioridade obsessivos os impeliram a dominar e destruir indivíduos mais fracos do que eles. Os estadistas são os mais difíceis de classificar. Praticamente todos os poderosos tomam algumas decisões que custam vidas inocentes. O monstro de um homem é o herói de outro e esses debates continuam relevantes atualmente. Lênin se beneficiou de uma das maiores reabilitações da história e ainda é reverenciado por muitas pessoas ignorantes e enganadas na Rússia e no Ocidente: ele continua a ser celebrado em seu mausoléu na Praça Vermelha em Moscou. Stalin foi denunciado em 1956, mas o Kremlin apresentou recentemente um livro oficial para os professores de história aclamando Stalin como “o líder russo mais bem-sucedido do século XX”, o construtor de um estado e um triunfante comandante militar que se igual a “Bismarck e Pedro, o Grande”. O presidente Mao Tsé-tung continua a ser o guia espiritual da República Popular da China. Existem alguns líderes que têm de ser situados em algum ponto entre herói e monstro. Napoleão, Pedro, o Grande, Cromwell, Ataturk e Alexandre, o Grande, que poderiam ser considerados heróis ou monstros, mas que apareceram em meu primeiro livro “101 Heróis”, enquanto Henrique VIII, considerado por muitos um herói inglês, aparece como um monstro. Gêngis Khan e Tamerlão eram ambos gênios político-militares, quase heroicos e certamente monstruosos. Talvez esses heróis monstruosos clássicos mereçam um livro próprio. Minhas escolhas foram falhas e feitas ao acaso: eu poderia acrescentar, retirar e trocar nomes incessantemente. Essa é a diversão de fazer listas. O importante é o conhecimento, a lembrança e o julgamento. Todos deveríamos conhecer esses personagens, lembrar esses crimes e fazer nossos próprios julgamentos.

Simon Sebag Montefiore Esta obra, como meu livro dos heróis, é para minha filha LILY e meu filho SASHA.

AGRADECIMENTOS Eu gostaria de agradecer a equipe da Quercus: Anthony Cheetham, Richard Milbank e o heróico editor Slav Todorov; meus coautores John Bew e Martyn Frampton; Nick Fawcett e Ian Crofton por seu texto e edição verdadeiramente extraordinário; os designers Nick Clark e Neal Cobourne; a pesquisadora de imagens Elaine Willis; minha agente Georgina Capel e, como sempre, minha esposa, Santa. 9


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A vilã suprema da Bíblia, Jezebel — uma princesa fenícia e esposa de Acabe, rei de Israel — era uma pagã e meretriz sanguinária que controlava seu marido, desafiava sua masculinidade e o usava como um fantoche para aterrorizar seus súditos. Seu fim brutal — atirada de uma janela e devorada por cães esfaimados — é retratado como um castigo adequado por ela ter desafiado Jeová, o Deus de Israel.

JeZeBeL

século IX a.C.

A história de Jezebel é contada nos livros bíblicos dos Reis 1 e 2. Ela era filha de Etbaal de Tiro, rei dos fenícios, um povo de marinheiros que viviam em cidades-estado ao longo da costa do Líbano e da Síria atuais. Como parte de uma importante aliança regional, ela foi retirada de seu canção “Hardheaded lar e oferecida em casamento a Acabe, o recém-coroado rei de Israel, que woman”, de Elvis Presley havia se separado por volta de 920 a.C. do reino de Judá. O problema, porém, era que os israelitas exigiam a adoração a um só Deus, Jeová, enquanto os fenícios adoravam diversas divindades agrupadas sob o nome geral de Baal, que muitos judeus associavam com o sacrifício de crianças. Jezebel seguia sua religião com o mesmo fervor com que os israelitas seguiam a dele, e isso tornou o conflito inevitável. Acabe estava preparado para tolerar as práticas religiosas de sua nova esposa e até mesmo construiu um templo para Baal no centro da cidade de Samaria, mas isso não era suficiente para Jezebel. Tendo levado a Israel centenas de sacerdotes e profetas fenícios, ela exigiu que Acabe não só seguisse sua religião, mas também a impusesse a seu povo. Segundo o livro dos Reis 1 18:4, ela planejou o extermínio sistemático de seus oponentes, prendendo e matando centenas de sacerdotes judeus e obrigando muitos mais a se esconder. Jezebel logo encontrou um adversário formidável em Elias, um profeta ardente e intransigente e defensor da fé judaica. Elias desafiou a nova hierarquia religiosa de Jezebel — 450 profetas de Baal e 400 profetas de Asherah, o deus dos mares — a um duelo no monte Carmelo, para provar qual religião reinaria suprema. Os sacerdotes de Baal construíram um altar e Elias construiu outro; o desafio era oferecer um touro em sacrifício sem atear fogo a ele. Segundo o relato bíblico, os profetas de Jezebel passaram a maior parte do dia em súplicas a seus deuses, mas em vão, enquanto Elias, tendo primeiro encharcado o altar, a madeira e a oferenda com água, rogou a Jeová, que enviou o fogo do céu que consumiu não só a oferenda, mas também a madeira e as rochas sobre as quais estava. Quando o rei Acabe contou a Jezebel o que tinha acontecido, ela respondeu emitindo uma sentença de morte contra Elias, que fugiu para o monte Sinai, mas não sem antes ordenar o assassinato de 400 dos profetas de Jezebel (um exemplo claro dos padrões duplos bíblicos).

Ouvi falar de um rei que estava indo bem, até que se meteu com a malvada Jezebel.


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O domínio de Jezebel sobre Acabe é mais nítido na história de Nabote, um israelita que possuía um vinhedo vizinho ao palácio real em Jizreel. Quando Nabote se recusou a vendê-lo a Acabe, o rei voltou derrotado ao palácio, o que fez Jezebel perguntar desdenhosamente: “É assim que você age como rei sobre Israel?” Então, ela mesma tomou a iniciativa, usando o selo real para enviar cartas aos cidadãos de Jizreel, instruindo-os a forjar uma queixa de blasfêmia contra Nabote. Este foi apedrejado até a morte e, a seguir, Acabe usurpou sua terra. Depois da morte de Acabe e de seu filho mais velho, Ahaziah, Jezebel governou através de seu segundo filho, Jorão. Porém, os israelitas já tinham sofrido o bastante e o sucessor de Elias, Eliseu, coroou desafiadoramente Jeú, o comandante militar de Jorão, como rei em seu lugar. As esperanças que Jorão tinha de negociar um acordo caíram por terra quando os dois homens se encontraram. Acusando Jezebel de “incontáveis atos de prostituição e de feitiçaria” (2Reis 9, 22), Jeú atirou uma flecha que atravessou o coração de Jorão, levou seu corpo para a terra de Nabote e correu em seu carro para o palácio real onde, vendo sua aproximação, Jezebel começou a arrumar o cabelo glamurosamente e aplicou kohl negro a suas pálpebras, talvez na esperança de seduzir o assassino de seu filho. Quando Jeú chegou, porém, ele ordenou aos eunucos de Jezebel que atirassem a rainha pela janela para a rua abaixo, onde seu sangue salpicou sobre a muralha e os cavalos. Enquanto Jeú celebrava sua vitória dentro do palácio, os cães devoravam o corpo dela, pedaço a pedaço, deixando apenas o crânio, as mãos e os pés. O nome de Jezebel se tornou um sinônimo de promiscuidade, o arquétipo de mulher fatal. Os escritores bíblicos a viam como uma ameaça para sua fé e assim a retrataram sob a pior luz possível. Jezebel continua a ser o protótipo moral e político da mulher manipuladora, malvada, sedutora e ambiciosa por trás de um homem poderoso.

Jezebel e Acabe assumindo a posse do vinhedo de Nabote, um episódio bíblico de Reis 1 21, representado por Frederic Leighton [1836-96]. A figura imponente à esquerda é o profeta Elias, que informa Acabe, que se esconde, que ele se vendeu “ao trabalho do mal à vista do Senhor”. Elias previu que “os cães comerão Jezebel na muralha de Jizree”. 13


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SALOMÉ

Duas mulheres da Bíblia — Herodíade e sua filha Salomé — são lembradas, acima de tudo, por sua capacidade de sedução e por seu oportunismo calculista. Depois da morte de Herodes Filipe — seu primeiro marido — Herodíade casou-se com o irmão dele, Herodes Antipas (c. 20 a.C.-39 d.C.; ver página xx) — o governador da Galileia, indicado pelos romanos e que, mais tarde, zombaria de Jesus de Nazaré e o enviaria para julgamento e crucificação nas mãos de Pôncio Pilatos. O casamento havia sido enfaticamente condenado pelo ardente profeta judeu João Batista, que declarou ser contrário à Lei de Moisés — conforme escrita em Levítico 18,16 — que um homem visse nua a esposa de seu irmão. Como punição, João havia sido preso e jogado ao cárcere, onde, segundo Mateus 14, 3-12 e Marcos 14,15-29, estava definhando quando um grande banquete foi realizado para celebrar o aniversário de Herodes. Herodíade, diz Marcos, ressentia-se amargamente da temeridade de João ao julgá-la e queriva vê-lo morto, mas Herodes — que, segundo Mateus, também queria matar João — tinha medo das consequências, acreditando que ele era um santo homem e, portanto, protegido por Deus. A

desonesta e manipuladora Herodíade viu no banquete uma oportunidade para forçar a questão e se livrar de João de uma vez por todas. Ela persuadiu Salomé a dançar diante do rei, que ficou tão deliciado com sua dança erótica dos sete véus que lhe ofereceu o que quisesse como recompensa. “O que devo pedir?” Salomé perguntou à mãe que respondeu com brusquidão: “A cabeça de João Batista” (Marcos 6, 23-4). Sem deixar margem a nenhuma sugestão de que fosse apenas uma vítima inocente das maquinações de sua mãe, Salomé ansiosamente retornou com essa exigência abominável, exigindo “de imediato, a cabeça de João Batista em uma bandeja” (Marcos 6, 25). Herodes não teve opção a não ser honrar sua palavra, e João foi sumariamente executado em sua cela na prisão, e sua cabeça decepada foi levada em uma bandeja e dada a Salomé, que a passou para sua mãe triunfante.

Salomé recebe a cabeça de são João Batista, uma das cenas mais horrendas e famosas da Bíblia, aqui representada por Caravaggio.


SaloNabucodonosor foi o Leão da Babilônia e o Destruidor de Nações. Governante do grande império neo-babilônio, de 605 até 562 a.C., ele foi a personificação do rei guerreiro. A Bíblia registra que Nabucodonosor foi o instrumento da vingança divina sobre o povo errante de Judá — um destino que ele parece ter acolhido com prazer. O mesmo relato bíblico diz que Deus, mais tarde, puniu Nabucodonosor por seu orgulho e arrogância com sete anos de loucura.

NAbUcoDonOsoR II

(630-562)

Nascido algum tempo depois de 630 a.C, Nabucodonosor foi o filho mais velho do rei Nabopolassar (que governou de 626 a 605 a.C.), o fundador da dinastia caldeia na Babilônia. Nabopolassar havia conseguido quebrar o jugo do império assírio, ao norte, e até havia saqueado a grande cidade de Niníve. Vangloriando-se de seus triunfos, ele havia falado de como tinha “massacrado a terra da Assíria” e “transformado o território hostil em uma pilha de ruínas”. Como convinha a um príncipe herdeiro da antiguidade, o jovem Nabucodonosor foi envolvido nas conquistas militares de seu pai Daniel 3,19-20 desde tenra idade e, em 605, ele testemunhou a derrota das forças egípcias em Carquemis, uma vitória que ajudou a transformar os babilônios nos mestres da Síria. Nabopolassar morreu naquele mesmo ano e Nabucodonosor subiu ao trono.

Então, Nabucodonosor se encheu de furor... E ordenou aos homens mais poderosos que estavam no seu exército que atassem Sadraque, Mesaque e Abednego, para lançá-los na fornalha de fogo ardente.

Nabucodonosor, uma representação fascinante e halucinatória do governante babilônio pelo poeta, pintor e visionário inglês William Blake.


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Então, em uma posição de poder absoluto, Nabucodonosor decidiu expandir seus domínios em direção ao Ocidente; uma aliança por casamento com o império Medo ao leste havia assegurado que surgiriam problemas daquela direção. Entre 604 e 601, diversos estados locais — inclusive o reino judaico de Judá — submeteram-se a sua autoridade, e Nabucodonosor declarou sua determinação de “não ter oponentes do horizonte ao céu”. Encorajado por seu sucesso, em 601, Nabucodonosor decidiu enfrentar seus maiores rivais e enviou seus exércitos para o Egito. Porém, eles foram rechaçados, e essa derrota provocou uma série de rebeliões entre os vassalos de Nabucodonosor que, anteriormente, estavam quietos — em especial Judá. Nabucodonosor retornou para a Babilônia, sua terra natal, planejando sua vingança. Depois de um breve intervalo, ele atacou as terras a oeste mais uma vez, Acabeando praticamente com tudo à sua frente. Em 597, o reino de Judá se submeteu. Nabucodonosor ordenou que o rei, Jeconias, fosse deportado para a Babilônia. Em 588, Judá, governado pelo tio do rei, Zedequias, revoltou-se. Em 587-586, Nabucodonosor marchou para a desafiante Jerusalém, manteve a cidade sob cerco durante meses e, finalmente, invadiu-a, e destruiu-a inteiramente. Nabucodonosor ordenou que a cidade fosse destruída; as pessoas, massacradas; o templo judeu arrasado, e o príncipe Zedequias teve de testemunhar a execução de seus filhos antes que seus olhos fossem arrancados. Depois, os judeus foram deportados para o leste, onde lamentaram Sion “junto aos rios da Babilônia”. Em 585, Nabucodonosor sitiou a cidade rebelde de Tiro. A localização costeira da cidade significava que ela podia receber suprimentos por mar, o que lhe permitia resistir ao bloqueio babilônio. Depois de um cerco extraordinário, que durou 13 anos, foi negociado um acordo: Tiro foi poupada, mas concordou em aceitar a autoridade de Nabucodonosor. As realizações de Nabucodonosor nos campos de batalha foram acompanhadas pelo aumento na construção em seu reino. Como muitos que exercem o poder absoluto, o governante babilônio estava obcecado com a grandiosidade arquitetônica e determinado a fazer com que sua capital refletisse sua grandeza. Utilizando o trabalho escravo dos vários povos que havia subjugado, Nabucodonosor ergueu ou remodelou numerosos templos e prédios públicos. O novo e extravagante palácio real, que seu pai iniciara, foi concluído. E, o que ficou mais famoso, o rei encomendou os Jardins Suspensos da Babilônia — uma das maravilhas do mundo antigo — como um presente para sua esposa. Desse modo, Nabucodonosor transformou a Babilônia em uma capital adequada a uma superpotência — que era o que seu i,mpério havia se tornado na época de sua morte, em 561. Contudo, a obra de sua vida mostrou-se efêmera: apenas duas décadas depois de sua morte, o império de Nabucodonosor deixou de existir, quando Ciro, o Grande, da Pérsia, conquistou a Babilônia em 539. Nabucodonosor é lembrado como o construtor de um império — o homem que restaurou a grandeza da Babilônia, mesmo que por um breve tempo; Saddam Hussein estava especialmente determinado a explorar a imagem de Nabucodonosor para seus próprios fins. Para outros estudiosos, porém, o nome de Nabucodonosor está indelevelmente associado com a conquista desenfreada e o tratamento brutal dos povos subjugados — o Destruidor de Nações que cumpriu a visão do profeta judeu, Jeremias: “Ele saiu de seu país para arrasar a sua terra. Suas cidades ficarão em ruínas, sem habitantes”.


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SARGÃO DA ACÁDIA: O PRIMEIRO GRANDE CONQUISTADOR DA M E S OP O TÂ M I A

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A Mesopotâmia produziu o primeiro grande conquistador conhecido na história: Sargão I da Acádia (c. 2334- 2279 a.C.). Filho ilegítimo de uma sacerdotisa, Sargão — que era natural da cidade de Acádia, na região de mesmo nome no norte da Mesopotâmia — serviu como um copeiro na corte real do rei Ur-Zababa de Kish. Depois de o rei ficar com ciúmes e tentar assassiná-lo, Sargão derrubou Ur-Zababa e deu início a sua própria conquista da Mesopotâmia. Nessa época, a Mesopotâmia era constituída por uma série de cidades-estado independentes, mas uma a uma elas caíram diante de Sargão que passou a exercer sua autoridade sobre todo o sul da Mesopotâmia, a região conhecida como Suméria. No processo, ele destruiu a grande cidade de Uruk e colocou em seu governante, Lugalzagesi, uma coleira de madeira, fazendo-o percorrer as ruas da Acádia sob humilhação. Outras vitórias se seguiram. Depois de um triunfo, Sargão destruiu totalmente a cidade de Kazala, de modo que “os pássaros não podiam encontrar um lugar para pousar acima do solo”. Ele acabou por dominar toda a Suméria, chegando finalmente ao Golfo Pérsico onde supostamente se banhou e lavou suas armas no mar para simbolizar o sucesso de sua conquista. Depois, Sargão levou suas forças para o oeste, conquistando terras no Crescente Fértil, chegando até a Síria e o leste da Ásia Menor, no Mediterrâneo. Não é de admirar que um cronista o descrevesse como não tendo “nem rival nem igual”. Depois de sua morte, grande parte do império da Acádia levantou-se em revolta, mas seus filhos conseguiram retomar o controle sobre a maior parte de seus territórios, seus descendentes posteriores obtiveram outras conquistas e um deles, Naram-Sin (que reinou c. 2254-2218 a.C.), até se declarou “Rei das Quatro Direções, Rei do Universo”. Uma cabeça de bronze de Sargão I, o conquistador acádio que se declarou “Rei do Universo”. 17


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Qin Shi Huang criou o primeiro império chinês unificado que surgiu do “Período dos Reinos Combatentes”. Em 221 a.C., ele havia conseguido destruir os últimos reinos rivais remanescentes dentro da China e havia se tornado governante supremo: o Primeiro Imperador. Um estadista e conquistador admirável e implacável, com dons maníacos, assombrado pela loucura, sadismo e paranoia. O reinado de Qin Shi Huang rapidamente degenerou em uma tirania brutal e sangrenta. Sua reputação na China sempre havia sido a de um tirano, mas foi o presidente Mao Tsé-tung, outro ditador monstruoso, quem se associou ao “Primeiro Imperador” e o promoveu a seu precursor glorioso.

QIn SHi HUaNg, O PRiMeIrO c. 259-210 a.C. IMpErAdOr Nascido um príncipe da família real do reino de Qin, Zheng, como se chamava o futuro imperador, foi criado em um cativeiro honroso. Seu pai, o príncipe Zichu de Qin, estava então servindo como refém no estado inimigo de Zhaou, sob um acordo de paz entre os dois reinos. Libertado depois de algum tempo, Zichu retornou a Qin e assumiu a coroa, com seu filho Zheng como herdeiro. O Legalismo do sr. Shang, Em 245 a.C., Zichu morreu e Zheng, aos 13 anos, subiu ao troadotado por Qin Shi Huang como base de seu reinado no. Durante os sete anos seguintes, ele governou com um regente, até que, em 238 a.C., ele assumiu pleno controle em um golpe no palácio. Desde o início, Zheng mostrou uma nova crueldade: ele costumava executar os prisioneiros de guerra, o que era contrário à etiqueta estabelecida na época. Zheng, então, competiu pelo poder com os outros reinos chineses e criou um exército poderoso. Ao chegar ao trono, Qin era um estado vassalo do reino de Zhaou. Em uma sequência de vitórias militares, seis reinos caíram diante das forças de Zheng: Han (230), Zhaou (228), Wei (228), Chu (223), Yan (222) e Qi, o último reino chinês independente, em 221 a.C. Um comandante soberbo, Zheng também era um diplomata habilidoso, especialmente em explorar as divisões entre seus inimigos. Então, ele tinha uma posição indisputada em uma China unificada. Para comemorar seu feito, ele assumiu um novo nome que refletia seu status sem igual: Qin Shi Huang, “O Primeiro Imperador Augusto de Qin”. Qin Shi Huang então criou um estado forte e centralizado em seus territórios. Como uma extensão das práticas já existentes no reino de Qin, as antigas leis e estruturas feudais que haviam permanecido em grande parte da China foram abolidas e substituídas por autoridades indicadas pelo

Se você governar o povo por meio de punições, as pessoas terão medo. Com medo, elas não cometerão vilezas.


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