UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA
GIOVANA BAGGIO SCHUBERT – RA 081140-1
LEITURA: ASPECTOS COGNITIVOS E ESTRATÉGIAS PARA A FORMAÇÃO DE LEITORES
Cidade Polo: Itapetininga 2011
UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA
GIOVANA BAGGIO SCHUBERT– RA 081140-1
LEITURA: ASPECTOS COGNITIVOS E ESTRATÉGIAS PARA A FORMAÇÃO DE LEITORES
Trabalho de conclusão de curso para obtenção do título de graduação em licenciatura em Letras apresentado à Universidade Paulista – UNIP.
Orientadora: Profª Ana Lúcia Machado
Cidade Polo: Itapetininga 2011
GIOVANA BAGGIO SCHUBERT– RA 081140-1
ENTENDER O PROCESSO COGNITIVO DA LEITURA PARA FORMAR LEITORES
Trabalho de conclusão de curso para obtenção do título de graduação em licenciatura em Letras apresentado à Universidade Paulista – UNIP.
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA _______________________/__/___ Prof. Nome do Professor Universidade Paulista – UNIP _______________________/__/___ Prof. Nome do Professor Universidade Paulista – UNIP _______________________/__/___
DEDICATĂ“RIA
Ao Davi, MEU pequeno leitor. Para que entenda que a leitura leva ao conhecimento e que somente a partir dele podemos crescer.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço a Deus, por me escolher e capacitar e à minha Mãe do Céu, por iluminar meus caminhos. Ao meu esposo Ricardo e à minha mãe Adelza, por todo o incentivo, especialmente por agir por mim na rotina diária a fim de que eu conseguisse alcançar meus objetivos. À querida professora Ana Lúcia Machado, pela orientação e paciência. À minha querida amiga e chefe Roberta Capuano por enxergar em mim potencialidades que eu mesma desconhecia. À Direção do Colégio Objetivo Itapetininga, nas pessoas de Cláudia Fernandes e Telma Almada, pela confiança em mim depositada. À querida amiga e teacher Elaine Rodrigues, por me orientar e conduzir com tanto carinho pelos caminhos da Língua Inglesa.
EPÍGRAFE
―Os poemas são pássaros que chegam não se sabe de onde e pousam no livro que lês. Quando fechas o livro, eles alçam voo como de um alçapão. Eles não têm pouso nem porto; alimentam-se um instante em cada par de mãos e partem. E olhas, então, essas tuas mãos vazias, no maravilhado espanto de saberes que o alimento deles já estava em ti...‖ Mario Quintana in 80 Anos de Poesia
RESUMO
Uma das queixas mais frequentes nas Salas de Professores é a de que os alunos não gostam de ler, ou a de que hoje em dia livros são objetos fora de moda. Pretendemos, com esse trabalho, mostrar ao professor que o gosto pela leitura é algo que se ensina aos alunos. Entendendo o processamento cognitivo da leitura o professor será instrumentalizado para criar estratégias de leitura adequadas à faixa etária de seus alunos. Refletiremos sobre a leitura e o processamento cognitivo. Abordaremos também o processo metacognitivo da leitura, aquele que o leitor faz de maneira consciente, a fim de que isso sirva como base para que o professor seja capaz de criar estratégias de leitura adequadas a seus alunos e ilustraremos com algumas estratégias adotadas em sala de aula e que se mostraram eficazes na formação de leitores.
Palavras chave: leitura, estratégias de leitura, formação de leitores.
ABSTRACT
The common complaints in the teacher‘s rooms are that students don‘t like to read, or that the books are now out of fashion objects. But we intend with this work, to show the teacher that the taste for reading is something that is taught to students. Understanding the cognitive processing of reading the teachers will be manipulated to create reading strategies appropriate to the age of their students. Reflect on the reading and cognitive processing. We will also explore the process of metacognitive reading; the reader is one who learns consciously, so that will serves as the base for the teacher to be able to create reading strategies appropriate to their students and to illustrate some strategies in the classroom and proven effective in the formation of readers.
Keywords: reading, reading strategies, training of readers.
SUMÁRIO
Introdução ………………………....………………………………..........................…. 10 1. Refletir sobre o ato de ler ....…………………………………...……...........................… 12 1.1. O que é leitura? .......................................................................................................... 12 1.2. Percepção, Leitura, Compreensão – O processo cognitivo ...................................... 13 1.2.1. Informação Visual e Informação Não Visual (ou conhecimento de mundo).. 14 1.2.2. Previsões e Inferências ................................................................................... 15 2. Conhecer o Processo Metacognitivo da Leitura............................................................... 18 2.1. Modelar Estratégias Metacognitivas ........................................................................ 20 3. Formar Leitores através de Estratégias Metacognitivas ................................................. 23 3.1. Projeto de Leitura Compartilhada ―Reinações de Narizinho‖ .................................. 24 3.2. Estratégia: Conexões ................................................................................................. 25 3.2.1. Conexões Texto-Texto ................................................................................... 26 3.2.2. Conexão Texto-Leitor .................................................................................... 27 3.3. Estratégia: Inferência ................................................................................................ 28 3.4. Estratégia: Visualização ........................................................................................... 33 3.5. Estratégia: Sumarização ............................................................................................ 38 3.6. Estratégia :Síntese ..................................................................................................... 43 3.7. Que estratégias de leitura usar? ................................................................................ 44 Conclusão .................................................................................................................... 45 Referências .................................................................................................................. 47
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INTRODUÇÃO
Antigamente, o ato de ler presumia somente receber um comunicado importante. Hoje em dia, pesquisas nos mostram que o ato de ler é um processo que, independente de outros fatores, contribui para o desenvolvimento do intelecto. Combinar sentenças e estruturas mais amplas de linguagem constitui simultaneamente um processo cognitivo e um processo de linguagem. A leitura, ao mesmo tempo em que traz à mente alguma coisa já percebida, desperta no indivíduo a antecipação do texto precedente. Ler bem é ser capaz de confrontar criticamente o texto e as ideias do autor, é tornar significativa a compreensão das relações de construção entre o novo texto e as concepções já existentes. Sendo assim, a leitura constitui uma excelente forma de aprendizagem, visto que estudos revelam que o aprimoramento do ato de ler redunda no aprimoramento da capacidade de aprender como um todo. Considerando, portanto, a leitura como fator primordial na formação do indivíduo, como fonte de aprendizado, informação, cultura e até mesmo lazer, preocupa-nos a realidade de muitos professores que têm como principal queixa, em sua rotina de trabalho, a de que seus alunos não se interessam por essa atividade, ou que fazem apenas por obrigação. Como é possível ensinar os alunos a construírem sentido para o que leem, a colocar em ação seus conhecimentos prévios, a fazer antecipações acerca do significado e da forma, a controlar sua compreensão e ainda fazer com que tenham cada vez mais autonomia para realizar essas ações? Acreditamos que a partir do momento que ―conhecemos‖ algo, todo o nosso universo se amplia. Conhecer o funcionamento dos processos cognitivos da leitura e tomar ciência da forma como a leitura se processa no cérebro humano, servirá como um direcionamento para que professores possam melhor conduzir as estratégias adotadas para a formação do leitor em sala de aula. Consequentemente, esse conhecimento servirá como ―start‖ para que o próprio professor possa também aperfeiçoar as próprias habilidades de leitura. Pretendemos, com essa investigação, contribuir para a construção pessoal e coletiva acerca das questões didáticas envolvidas. Pessoal – porque obviamente não estamos em busca de ―descobrir‖ uma resposta. Acreditamos que para formar leitores na escola, cada professor, cada equipe, deve buscar um caminho que, todavia, não será definitivo nem único. Coletiva – porque a experiência de outro ajuda a construir a minha experiência; a troca enriquece.
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O objetivo dessa pesquisa é percorrer diversas bibliografias que esclareçam todo o processo cognitivo da leitura, e que tragam dicas sobre o assunto ―formação do leitor‖, a fim de que possamos encontrar instrumentos que auxiliem o professor nesta árdua e tão importante missão. Assim sendo, a metodologia adotada consiste na revisão bibliográfica de autores renomados no assunto e de estudos de caso já publicados, buscando informações já consolidadas para a comprovação das ideias expostas. No primeiro capítulo traremos algumas reflexões sobre leitura, assim como descreveremos o processamento cognitivo da leitura, com a pretensão de oferecer conhecimento para que o professor conheça e busque ―caminhos‖ para ajudar seus alunos a construírem um conhecimento literário e linguístico necessários para que no futuro eles se tornem leitores competentes: capazes de compreender melhor o mundo em que vivem e as transformações da sociedade, atuando também como agentes transformadores e críticos. No segundo capítulo, abordaremos o processo metacognitivo da leitura, ou seja, o processo de leitura que ocorre conscientemente, aquele que leva o leitor proficiente a retomadas, previsões e conexões durante a leitura de um texto, o que mostra ao professor que é possível ensinar um caminho para que a criança aprenda a gostar de ler, aprenda a interpretar aquilo que lê. No terceiro capítulo apresentaremos detalhadamente cada uma das estratégias metacognitivas a serem ensinadas, ilustrando-as com atividades do Projeto de Leitura Compartilhada do Colégio Objetivo Itapetininga em 2011, o qual adotou a obra ―Reinações de Narizinho‖ para os alunos no 5º ano do Fundamental I. Nesse projeto, a ideia principal é a de que ―falar‖ a respeito dos textos compartilhados entre os estudantes permite que eles articulem seus contatos com o texto – únicos e pessoais – com suas opiniões e interpretações. Em uma discussão literária, os estudantes não só compartilham e defendem suas ideias, mas também descobrem e refletem a respeito dos pontos de vista e interpretações dos outros; esse tipo de intercâmbio faz com que, muitas vezes, os estudantes voltem a pensar e a aprofundar os contatos iniciais, que, como leitores, tiveram com o texto. Não temos a pretensão de criar ―receitas‖ para o ensino da leitura, mas apenas de afirmar que formar leitores proficientes, que encontram prazer na leitura é uma missão possível. Acreditamos na relevância do assunto por descrever os aspectos cognitivos da leitura e mostrar a importância de estimulá-la através dos mais diversos gêneros literários a fim de que o aluno possa desenvolver desde cedo seus próprios esquemas/estratégias de leitura, o que impulsiona e possibilita diferentes enfoques no processo de aprendizagem.
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1.
REFLETIR SOBRE O ATO DE LER 1.1. O que é leitura?
Definir leitura não é uma tarefa fácil, mas tentando explicá-la de forma muito simples, podemos dizer que leitura é o que acontece quando uma pessoa atribui sentido aos símbolos gráficos que vê ao olhar para um texto escrito (AEBERSOLD e FIELD, 1997). A maneira como esse processo ocorre, porém, tem sido foco de muitos pesquisadores, nas mais diferentes áreas como a Sociolinguística, Psicolinguística, Psicologia cognitiva, Educação... O minidicionário SACCONNI da língua portuguesa define o verbo ler como ―olhar atentamente para entender o significado de; prever; interpretar mentalmente; obter conhecimento pela leitura; pronunciar em voz alta.‖ Através dessa definição somente, já conseguimos inferir quantas habilidades estão implícitas no ato de ler. Aquilo que, no senso comum é normalmente entendido por receber, tirar/transmitir conhecimento, decodificar; ganha agora um sentido que supera esse sentido inicial. De acordo com ARENA (2010), ao longo da história, assim como outras palavras, o verbo ler absorveu as mudanças culturais e, por isso, ganhou novos significados. Passou a designar qualquer ação de observar um objeto, mas diz que o estudioso russo Bakhtin, de certa forma, reafirma a ideia de que a palavra do outro, ao ser enunciada, exige o desafio da compreensão, referindo-se à ―palavra do outro‖ como o enunciado escrito. Para ele, ler é buscar compreender o enunciado produzido pelo outro, o que faz com que o leitor estabeleça com o texto uma relação dialógica. Segundo KLEIMAN (1997), a leitura é um processo complexo, porque depende de múltiplos conhecimentos cognitivos utilizados pelo leitor a fim de construir um sentido para o texto, já que ela ―não se dá linearmente, mas de maneira cumulativa, em que a soma do significado das palavras constituiria o significado do texto‖ (TERZI, 2002). Desta forma, a leitura deve ser entendida como um processo dinâmico e ativo, levando em consideração que o texto não possui em si próprio um significado, mas sim o potencial de evocar um significado. É a interação entre texto e leitor que constitui a leitura. Assim sendo, é também uma prática social porque tanto texto quanto leitor estão inseridos em dado momento histórico que determina a linguagem e o sentido.
Leitura não é esse ato solitário; é interação verbal entre indivíduos, e indivíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e com os outros; o autor, seu
13 universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e os outros. (SOARES, 2000)
ARENA (2010) coloca ainda que a leitura corresponde a um processo de ―assimilação das riquezas da cultura humana‖ através das palavras ou por signos não verbais. Através dela o leitor se apropria da cultura humana, aprofunda os traços culturais e psicológicos de sua espécie. Ou seja, a leitura é uma forma de o leitor apropriar-se da cultura. COLOMER(2005) reforça a mesma ideia ao dizer que ―a leitura supões ampliação da experiência, porque nos põe em contato com outras vozes que traduzem outras experiências, outras maneiras de entender a realidade na qual se inclui a visão própria‖. Segundo FULGÊNCIO E LIBERATO (1996) ―leitura é o resultado da interação entre o que o leitor já sabe e o que ele retira do texto‖. Em outras palavras, leitura seria a interação entre as informações visuais que o leitor recebe durante a leitura e as informações não visuais que ele traz armazenadas em sua memória. Concluímos que ler é algo que está muito mais adiante do que a simples apropriação de significado, do que a simples decodificação, porque ―pressupõe a figura do autor presente no texto através de marcas formais que atuam como pistas para a reconstrução do caminho que ele percorre durante a produção do texto‖(KLEIMAN, 1989). Por este motivo a leitura deve ser entendida como processo, visto que o texto ―não traz tudo pronto para o leitor receber de modo passivo‖ (KLEIMAN, 1989) – ele precisa interagir com a informação presente no texto, através de seu conhecimento prévio, para tentar chegar a uma compreensão. 1.2. Percepção, Leitura , Compreensão – O processo cognitivo A compreensão de textos é um processo complexo em que interagem diversos fatores como conhecimentos linguísticos, conhecimento prévio a respeito do assunto do texto, conhecimento geral a respeito do mundo, motivação e interesse na leitura entre outros. (FULGÊNCIO E
LIBERATO, 1996) Acreditamos que discutir a prática do ensino da leitura ou mesmo pensar na formação de leitores eficientes implica no conhecimento de cada um dos fatores expostos acima. Neste estudo, nos restringiremos a alguns deles, que passamos a expor a seguir.
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1.2.1
Informação Visual e Informação Não Visual ou Conhecimento de Mundo
De acordo com FULGÊNCIO E LIBERATO (1996), a leitura não se trata de uma atividade somente visual. Quando lemos, nossos olhos captam as informações visuais (IV) percebidas, obviamente necessárias, mas não suficientes para que ocorra a compreensão. Muito embora possamos enxergar com perfeição um texto, podemos não entendê-lo se estiver escrito em uma língua que não conhecemos. O conhecimento da língua é imprescindível e necessário na leitura de um texto. Ele faz parte do conhecimento que possuímos gravado na memória, ao qual damos o nome de informação não visual (InV). À essa informação não visual, KLEIMAN (1989) nomeia ―conhecimento prévio‖. Ela vai além, dividindo essa InV em ―conhecimento linguístico e conhecimento de mundo‖. Antes de dividirmos o conhecimento prévio nesses dois segmentos, como sugere Kleiman, queremos destacar sua importância com uma frase do grande educador PAULO FREIRE, ao dizer que ―ninguém educa ninguém, como também ninguém educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo.‖, e de MARTINS (1984), que também acredita que a compreensão do texto escrito não depende apenas do conhecimento da língua, mas sim da experiência pessoal de cada indivíduo, e de ―todo um sistema de relações interpessoais e entre várias áreas do conhecimento e da expressão do homem e das suas circunstâncias de vida. Enfim, como dizem os pesquisadores de linguagem, em crescente convicção: aprendemos a ler lendo. Eu diria vivendo.‖
FULGÊNCIO E LIBERATO (1996) reforçam, dizendo que o conhecimento prévio, ou a InV utilizada na leitura compreende tanto o conhecimento da língua quanto outros aspectos, como conhecimento sobre o assunto do texto e outros conhecimentos que possuímos e que compõe nossa teoria de mundo. Isso inclui tudo o que sabemos, desde o conhecimento do nome do nosso melhor amigo e a noção de que ―gatos comem ratos‖ até as relações mais complexas que podemos perceber entre objetos e acontecimentos do mundo. Voltando aos estudos de KLEIMAN(1989), conhecimento linguístico, segundo ela, é aquele que faz com que falemos português como falantes nativos. Esse conhecimento é implícito e não verbalizado. Ela traz como exemplo um texto em que as palavras-chave são colocadas em outro idioma. Isso, logicamente, prejudica o entendimento do texto, caracterizando um caso extremo de falha no conhecimento linguístico.
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Num segundo momento, a autora coloca o mesmo texto totalmente em português, mas explica que a compreensão ainda pode ficar comprometida pelo desconhecimento dos conceitos de algumas palavras-chave colocadas no texto. Assim sendo, o conhecimento linguístico desempenha um papel central no que ela chama de processamento do texto, o que de modo bem simplista, seria dizer que se trata do ―agrupamento‖ das unidades significativas do texto para a construção do significado, da compreensão. Ainda segundo KLEIMAN (1992), temos como componente do conhecimento prévio aquilo que podemos chamar conhecimento textual. O conhecimento textual, de maneira bem sucinta, é a capacidade de reconhecer se o texto é uma narração, uma descrição ou um texto expositivo, por exemplo. Ainda que não saiba ―nomear‖ esses tipos de texto ou a forma de discurso utilizada, o conhecimento textual está em perceber qual a intencionalidade do autor ao escrever o texto. Assim, ―quanto mais conhecimento textual o leitor tiver, quanto maior sua exposição a todo tipo de texto, mais fácil será sua compreensão.‖ Paralelamente, devemos ainda considerar o que a autora chama de conhecimento de mundo ou conhecimento enciclopédico, ligado a conhecimentos que recebemos de maneira formal durante a vida e que nos auxiliam na compreensão de determinados tipos de texto e também o conhecimento que adquirimos informalmente durante o convívio com a sociedade, o conhecimento estruturado, cuja ativação no momento oportuno é também essencial à compreensão de um texto. ―Trata-se, por exemplo, do tipo de conhecimento que temos sobre o que está envolvido em ir ao médico, comer num restaurante, tirar um documento, assistir a uma aula‖. Esse conhecimento permite que o autor, ao relatar qualquer desses episódios possa deixar implícito aquilo que é típico da situação, sendo que o leitor, por possuir esse conhecimento, preencha as lacunas do texto com a informação adequada, ou seja, que possa fazer previsões ou inferências necessárias para relacionar diferentes partes de um texto num todo coerente.
1.2.2. Previsões e inferências Na vida estamos envolvidos o tempo todo em interpretar. Um amigo diz uma coisa que a gente não entende. A gente diz logo: "O que é que você quer dizer com isso?". Aí ele diz de uma outra forma, e a gente entende. E a interpretação, todo mundo sabe disso, é aquilo que se deve fazer com os textos que se lê. Para que sejam compreendidos. Razão por que os materiais escolares estão cheios de testes de compreensão. Interpretar é compreender. (ALVES,2004)
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Antes de examinarmos a capacidade de estabelecer previsões na leitura, precisamos observar que essa capacidade é empregada não só quando estamos lendo, mas a todo o momento, seja qual for a capacidade que estejamos praticando. Na nossa vida usamos nosso ―conhecimento de mundo‖ para fazer previsões acerca daquilo que acreditamos ser mais provável acontecer no futuro. Por exemplo, quando estamos guiando um carro, e vamos atravessar uma rua, olhamos primeiro para os lados, pois outros carros poderão cruzar a rua no mesmo instante e gerar um acidente. Nem sempre as previsões funcionam de maneira consciente FULGÊNCIO E LIBERATO (1996). De forma semelhante esse processo acontece na leitura: apropriamo-nos de todo o conhecimento de mundo que temos para previsões sobre o que lemos. Por exemplo: Ao nos depararmos com o texto ―acrescente um pouco de endívia‖, mesmo sem sabermos exatamente do que se trata, ou sem conhecermos a palavra endívia, podemos prever que se trata de um alimento. Além disso, o leitor também emprega estratégias discursivas que lhe permitem fazer previsões a respeito dos aspectos de um texto. Diante de um romance policial, de uma notícia de jornal ou de um bilhete, ele faz previsões quanto à organização do discurso e quanto ao estilo de cada um, ou seja, o leitor utiliza seu conhecimento prévio, linguístico e não linguístico para fazer previsões durante a leitura. Para processar um texto, o leitor usa ao mesmo tempo a informação visual e a informação não visual, às quais podemos dizer que mantém uma relação inversamente proporcional na leitura. ―Quanto mais InV o leitor tiver sobre um determinado texto, menor quantidade de informações visuais necessitará para compreendê-lo; e o inverso é também verdadeiro: quanto menos InV o leitor possuir, mais ele precisará se valer da informação que pode tirar do material impresso‖ (FULGÊNCIO E LIBERATO,1996). Deduzimos então que quanto mais informação visual o leitor necessita, mais difícil e trabalhoso será ler o texto. Desta forma, o leitor usa o conhecimento de mundo para fazer as previsões, tão importantes para que a leitura possa fluir eficientemente. O leitor deve ser capaz de selecionar no texto as partes que contêm as informações mais importantes, aquelas que podem ser previstas. Um erro na previsão pode significar a compreensão inadequada de um texto. O conhecimento de mundo serve também para deduzir certas informações não explícitas no texto, e que são importantes para a compreensão coerente e global do texto lido - essa é a habilidade de inferir. O significado de um texto não está vinculado somente àquilo que está exposto de forma literal; normalmente o que está escrito não exprime tudo o que o autor teve a intenção
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de comunicar. Faz-se necessário que o leitor acrescente uma série de conhecimentos que ele mesmo já possui para poder estabelecer uma ligação entre isso e os elementos linguísticos realmente presentes no texto, para poder ―ler as entrelinhas‖. Inferência é, portanto, segundo KLEIMAN(1989), o conhecimento que se produz a partir da ligação de informações linguísticas explicitadas no texto com o que já se possui ―Esse tipo de inferência, que se dá como decorrência do conhecimento de mundo [..] é um processo inconsciente do leitor proficiente.‖ O processo de estabelecimento de inferências tem como consequência a geração de conhecimentos novos com base nas informações do texto e nos conhecimentos já possuídos anteriormente. Essa informação adicional, elaborada pelo leitor, passa igualmente a fazer parte do seu conjunto de conhecimentos, como acontece com as informações obtidas literalmente no texto. A capacidade inferencial é de tal forma inerente à compreensão da linguagem que o leitor, quando memoriza as informações recebidas, incorpora a esse elenco também a informação inferida, sem nem mesmo perceber que essa informação não estava explícita no texto. (FULGÊNCIO E LIBERATO,1996).
Segundo KLEIMAN(1997), evidências experimentais demonstram que as lembranças do leitor após a leitura são as inferências feitas durante a leitura; ou seja - não lembramos do texto literalmente, mas sim nos lembramos daquilo que dele pudemos inferir. Podemos sintetizar todo o exposto com o pensamento compartilhado por MARTINS(1984), quando diz que
Na verdade o leitor pré-existe à descoberta do significado das palavras escritas; foi-se configurando no decorrer das experiências de vida, desde as mais elementares e individuais, às oriundas do intercâmbio de seu mundo pessoal e o universo social e cultural circundante. [...] Quando começamos a organizar os conhecimentos adquiridos, a partir das situações que a realidade impõe e da nossa atuação nela; quando começamos a estabelecer relações entre as experiências e a tentar resolver os problemas que se nos apresentam – aí então estaremos procedendo leituras, as quais nos habilitam basicamente a ler tudo e qualquer coisa. [..] O mundo fica a nosso alcance; não só podemos compreendê-lo, conviver com ele, mas até modificá-lo à medida que incorporamos experiências de leitura.
Procuramos, neste capítulo, aproximar-nos da definição de leitura mais próxima àquela que acreditamos ser necessária desenvolver na escola. Expusemos, de maneira bastante simplificada, os processos implícitos no ato de ler. Procuramos esclarecer de que maneira o conhecimento linguístico, o conhecimento textual e o conhecimento de mundo são ativados para se chegar ao momento da compreensão:
18 O mero passar de olhos pela linha não é leitura, pois leitura implica uma atividade de procura pelo leitor, no seu passado e de lembranças e conhecimentos, daqueles que são relevantes à compreensão de um texto que fornece pistas e sugere caminhos, mas que certamente não explicita tudo o que seria possível explicitar.(KLEIMAN, 1989)
Acreditamos que, uma das razões pelas quais o aprendizado da leitura pode ser tão difícil para algumas pessoas - especialmente para crianças - é que às vezes elas têm pouco conhecimento de mundo relevante. Cabe-nos, como educadores - ao conhecer todos os processos envolvidos no ato de ler proporcionar a nossos alunos a gradativa aquisição de estratégias adequadas à leitura, aproveitando ao máximo o conhecimento de mundo que eles possuem, assim como estabelecer objetivos de leitura, para que o ato de ler não seja meramente um processo de decodificação.
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CAPÍTULO 2 CONHECER O PROCESSO METACOGNITIVO DE LEITURA
―O papel do leitor é importante não só na compreensão do texto mas também no desenvolvimento da habilidade da leitura. A capacidade que temos de refletir sobre o que fazemos pode também nos ajudar a desenvolver estratégias adequadas de leitura.‖ (LEFFA, 1996)
Sabemos que no modelo atual de escola, a aprendizagem da criança está inteiramente vinculada à leitura. É a interação entre texto e leitor que permite a aprendizagem, que, não fosse através da leitura, estaria limitada apenas àquilo que é imediatamente acessível aos nossos sentidos. Entretanto, esse tipo de interação não ocorre com muitas crianças – principal motivo do insucesso na escola. Temos então uma questão essencial para o ensino: como ensinar a criança a compreender o texto escrito? Podemos ensinar a compreensão? Podemos ensinar um processo cognitivo? Claro que não!
Nesse contexto, a função do professor é criar oportunidades para que a criança
desenvolva o processo cognitivo. De acordo com Kleiman (1989), ―a compreensão de textos envolve processos cognitivos múltiplos, justificando assim o nome de ‗faculdade‘ que era dado ao conjunto de processos, atividades, recursos e estratégias mentais próprias do ato de compreender.‖ Assim sendo, acreditamos
que quando o professor tem oportunidade de planejar e empregar
medidas de ensino bem adequadas, de base informada, bem fundamentadas,
ele pode
aprimorar a capacidade de leitura do aluno e também sua própria capacidade de leitura. Quando temos capacidade de analisar nossa própria capacidade de leitura, estamos realizando uma atividade de metacognição, uma reflexão sobre o próprio saber. Quando refletimos sobre nosso próprio conhecimento, passamos a controlar nossos processos cognitivos e temos a oportunidade de ―autoconstrução‖ , ganhando capacidade de perceber relações, de descobrir e inferir informações e significados cada vez mais flexíveis e originais. O que queremos aqui é apresentar medidas para que o professor aprenda e ensine o aluno a usar a capacidade de metacognição. ―A metacognição na leitura trata do problema do monitoramento da compreensão feito pelo próprio leitor durante o ato da leitura.‖ (LEFFA, 1996) Esclarecendo melhor, usa-se a metacognição quando em determinado momento da leitura o leitor volta-se para si mesmo e se concentra nos processos conscientes que irá usar para compreender aquilo que está lendo.
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Se não entendeu uma palavra, vai procurar o significado no glossário; se não entendeu uma frase inteira, relê o parágrafo e procura encontrar a ideia principal. Brown (1980 – apud Leffa, 1996) define metacognição como um conjunto de estratégias de leitura que se caracteriza pelo "controle planejado e deliberado das atividades que levam à compreensão" Entre essas atividades, destacam-se: • Definir qual é seu objetivo ao iniciar uma leitura ("Vou ler este manual poder instalar a nova TV", "Só quero saber o conceito de clorofila ", "Vou correr os olhos pelo índice para ter uma ideia geral do livro e saber se aqui vou encontrar as informações que desejo"). • Identificar os aspectos ou trechos mais e menos importantes de um texto ("Aqui o autor está apenas dando mais um detalhe", "Esta definição é importante"). • Concentrar-se mais nos trechos mais importantes ("Essa informação é nova, preciso ler com mais atenção", "Este assunto eu já conheço, posso apenas passar os olhos"). Enfatizamos aqui que a importância de cada segmento varia de leitor para leitor e também de leitura para leitura. • Avaliar a qualidade da compreensão que está sendo obtida da leitura ("Estou entendendo perfeitamente o que o autor está tentando dizer", "Este trecho não está muito claro para mim"). • Determinar se os objetivos de uma determinada leitura estão sendo alcançados ("Estou lendo este capítulo para ter uma ideia geral do que é fenomenologia, mas ainda não consegui ter uma noção clara do assunto"). • Tomar as medidas corretivas quando falhas na compreensão são detectadas ("Vou ter que consultar o dicionário para entender esta palavra, já que o contexto não me bastou", "Parece que vou ter que ler aquele outro artigo para poder entender este"). • Corrigir o caminho da leitura nos momentos de distração, divagações ou interrupções ("Li este parágrafo sem prestar atenção no que estava lendo; vou ter que relê-lo").
2.1. Modelar estratégias metacognitivas.
―As pesquisas demonstram que as estratégias metacognitivas não apenas se desenvolvem naturalmente com a idade, mas podem também ser modificadas pela intervenção pedagógica.‖ (LEFFA, 1996)
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Kleiman (1997) afirma que alguns objetivos que o leitor proficiente se autoimpõe podem ser imitados diretamente no contexto escolar. Assim, entendemos que o professor, ao criar situações de leitura adequadas, estabelece possibilidade de que o aluno, enquanto lê, ative explicitamente - por meio de estratégias - o conhecimento prévio, estimulando-o a fazer novas conexões entre o mundo e o texto (SOUZA, 2010). De acordo com a autora SOUZA (2010), trata-se de ensinar os alunos a pensarem e a aprenderem rotinas que incorporem as rotinas de compreensão, dando-lhes oportunidade de manifestar seus interesses e necessidades, conferindo voz às crianças e reorientando a ação pedagógica a partir de então, ou seja, as estratégias são ―modeladas‖ de acordo com a necessidade, com o intuito de proporcionar aos alunos várias leituras, possibilidades de linguagem, questionamento e ação. ―Modelar significa os diferentes momentos em que o leitor, a partir do auxílio inicial do mediador, no caso o professor, vai moldando o seu pensar na prática de leitura, com vistas a tomar consciência das estratégias mobilizadas no ato de ler, bem como a sua própria compreensão textual [...] A prática guiada em que o professor, em parceria com o leitor aprendiz, vai promovendo situações colaborativas para que esse processo de moldar/modelar passa fazer-se explícito e claro para o aluno, criando situações para que se torne autônomo nessa atividade.‖
Essa ação pedagógica acontece através de oficinas de leitura (de 50 a 60 minutos), momentos específicos em que o professor planeja o ensino de uma estratégia para o grupo todo, dá aos alunos o tempo necessário para ler e praticar a estratégia em pequenos grupos, em pares ou individualmente, atendendo aos diferentes grupos, discutindo suas leituras e por fim reunindo a classe para partilhar seus aprendizados. A oficina de leitura deve ser um momento para que os alunos, além de ler, tenham oportunidade de falar, pensar e escrever sobre o que leram. É fundamental que nessas oficinas que o professor instrua o aluno para a compreensão efetiva do texto lido, objetivo que pode ser atingindo quando o docente:
Ensina com um objetivo em mente; Planeja a instrução que responde às necessidades dos alunos; Modela os usos das estratégias de compreensão e as respostas orais, escritas e artísticas do texto; Lembra aos alunos que o propósito de usar as estratégias é a interlocução com o texto e a construção do significado; Explicita como o pensar sobre o processo de leitura ajuda os alunos a entender melhor o texto; Tem por objetivo construir um repertório de estratégias para pensar sobre o processo da leitura;
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Guia gradualmente os alunos para a responsabilidade de usar as estratégias, sempre objetivando a formação do leitor autônomo; Mostra para os alunos que as estratégias de compreensão se aplicam em uma variedade de textos, gêneros e contextos; Ajuda as crianças a perceberem como as estratégias estão articuladas. Proporciona tempo suficiente para a leitura; Faculta aos alunos oportunidades para conversar entre si sobre suas leituras; Planeja o tempo para observar e orientar diretamente os alunos; e Avalia o progresso da turma e reorienta suas ações. (SOUZA e GIROTTO, 2010)
A espanhola Isabel SOLÉ (1998) reforça a ideia das oficinas de leitura e do ensino de estratégias metacognitivas, ao dizer que os alunos desenvolvem a capacidade de atingir níveis adequados de leitura quando são ensinados a ler de forma apropriada. A pesquisadora sugere o trabalho em sala de aula em três momentos: o antes, o durante e o depois da leitura.
Segundo a autora, o professor pode adotar/ensinar as seguintes estratégias de compreensão leitora para antes da leitura:
Antecipar o tema ou a ideia principal do texto a partir de elementos presentes no texto como: título, subtítulo, do exame de imagens, de saliências gráficas, outros.
Levantar o conhecimento prévio sobre o assunto;
Explicitar aos alunos quais são as expectativas em função da formatação do gênero; e as expectativas em função do autor ou instituição responsável pela publicação.
Estratégias para durante a leitura:
Orientar o aluno a confirmar, rejeitar ou retificar as antecipações ou expectativas criadas antes da leitura;
Localizar ou construir o tema ou a ideia principal;
Esclarecer palavras desconhecidas a partir da inferência ou consulta do dicionário;
Formular conclusões implícitas no texto, com base em outras leituras, experiências de vida, crenças, valores;
Formular hipóteses a respeito da sequência do enredo;
Identificar palavras-chave;
Buscar informações complementares sobre o assunto abordado;
Construir o sentido global do texto;
Identificar as pistas que mostram a posição do autor;
Relacionar novas informações ao conhecimento prévio;
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Identificar referências a outros textos. Atividades para depois da leitura:
Construir síntese semântica do texto;
Utilizar registro escrito para melhor compreensão;
Trocar impressões a respeito do texto lido;
Relacionar informações para tirar conclusões;
Avaliar informações ou opiniões emitidas no texto;
Avaliar criticamente o texto.
Nesse contexto, o objetivo da aula de professores de leitura literária deve ser ensinar um repertório de estratégias para aumentar o motivo de entendimento e interesse pela leitura. Em outras palavras, o objetivo é ofertar situações para que as crianças possam monitorar e ampliar o próprio entendimento, bem como ativar seu conhecimento de mundo, linguístico e textual, a partir do que estão lendo.(Kleiman, 1989) Ainda de acordo com Souza e Girotto(2010), entre o repertório de estratégias a serem ensinadas – fazer conexões, inferências, visualizações, questionamentos, sumarizações e sínteses – o professor deve ter sempre em mente uma estratégia essencial: a ativação do conhecimento prévio, pois esta estratégia agrega todas as outras.
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CAPÍTULO 3 FORMAR LEITORES ATRAVÉS DE ESTRATÉGIAS METACOGNITIVAS Diante de todo o exposto, acreditamos na possibilidade de formar leitores através da ―modelagem‖ de estratégias metacognitivas durante a leitura de textos diversificados. Neste capítulo pretendemos descrever diferentes tipos de estratégia sob o prisma de Souza e Girotto(2010) e ilustrá-las com exemplos de atividades a partir das experiências adquiridas com o Projeto de Leitura Compartilhada ―Reinações de Narizinho‖, realizado de fevereiro a novembro de 2011 no Colégio Objetivo de Itapetininga, numa sala de aula com 28 alunos, com uma turma de 5º ano. 3.1. Projeto de Leitura Compartilhada “Reinações de Narizinho”
Achamos oportuno apresentar Monteiro Lobato aos alunos do 5º. Ano do Colégio Objetivo Itapetininga — crianças na faixa etária entre 9 e 11 anos — acreditando possibilitar que eles vivessem, também, a experiência de leitura tão encantadora que sua obra proporciona ao leitor. Escolhemos ―Reinações de Narizinho‖ por ser o primeiro livro infantil do autor (e também o primeiro livro a ser concebido especialmente para crianças no Brasil), julgando que seria uma excelente porta de entrada para o universo de sua obra, pois apresenta o sítio e seus personagens em aventuras mágicas que apresentam não só o folclore brasileiro, como personagens do mundo das fábulas e contos de fada – levando em conta que os pequenos têm vários conhecimentos prévios que apoiam esse ingresso no universo literário de Lobato. Além disso, por meio dessa obra, Lobato resgata parte do patrimônio cultural da humanidade, possibilitando o encontro do leitor com inúmeros personagens da ficção que invadem o Sítio, em um maravilhoso jogo de intertextualidade. Dona Carochinha, O Pequeno Polegar, Pinóquio, Gato Félix e Peter Pan são alguns deles. Enfrentar essa leitura é abrir inúmeras "janelas literárias", favorecer a construção da autonomia, dos gostos próprios e do desejo de explorar novas obras. O Projeto Reinações de Narizinho foi desenvolvido como ―leitura compartilhada‖ , atividade em que o professor realiza a leitura em voz alta e cada aluno acompanha em seu próprio exemplar. Segundo COLOMER (2007),
25 "o gosto e o juízo de valor são inseparáveis da experiência da leitura logo que esta se inicia na infância e ocorrem sempre em relação a algum parâmetro comparativo. São aspectos que se formam através da prática." Para a especialista espanhola, "não se aprende apenas lendo ‘muito bem’ uns poucos textos, também é necessário ajudar as crianças a estabelecer relações entre muitas leituras."
Por este motivo a escolha da leitura compartilhada de Reinações de Narizinho, a fim de criar situações nas quais as crianças tivessem acesso à diversidade de textos e opiniões para que pudessem construir seu repertório e criar mecanismos de comparação entre diferentes leituras, compartilhando experiências leitoras significativas. As oficinas de leitura, com duração média de 45 minutos foram desenvolvidas de duas a três vezes por semana. Durante as oficinas o professor, previamente preparado, estimulava os alunos a levantar hipóteses, fazia questionamentos, levantava opiniões. Os alunos, ao se depararem com algum questionamento, poderiam anotá-lo ou mesmo interromper a leitura para ―compartilhar‖ seu pensamento. Ao final de cada oficina, algumas vezes o registro foi feito por escrito em atividades pré-elaboradas, outras vezes houve apenas a mediação das conclusões obtidas pela turma. A seguir, procuraremos abordar os vários tipos de estratégias empregadas durante o projeto (apoiadas no livro de Souza e Girotto – 2010), no entanto sem seguir a ordem cronológica do livro ou do desenvolvimento do processo, apenas para facilitar o entendimento do leitor sobre o objetivo e a importância de cada uma das intervenções.
3.2. Estratégia: Conexões Todos os aspectos da aprendizagem e do entendimento dependem do conhecimento prévio que a criança, ou o leitor, possui. Se o leitor não tem nada para articular à nova informação, é impossível construir novos significados. Pelo contrário, quando o leitor possui uma boa bagagem cultural sobre determinado assunto, é capaz de entender um texto. Se possui pouco conhecimento sobre o tópico abordado, é possível que encontre dificuldade. ―Conectar‖ informações antigas com as novas facilita o entendimento. As vivências e conhecimentos prévios abastecem as conexões feitas pelos leitores. Discussões, telejornais, uma conversa com uma pessoa, a Internet criam conexões que levam a novos insights. Ensinar a criança a ativar seu conhecimento prévio e pensar sobre suas conexões é de extrema importância para a compreensão.
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Leitores proficientes naturalmente fazem conexões entre os livros e os fatos da sua vida. Quando as crianças entendem o processo de conexão, não param mais de praticar essa estratégia, comparando-a com fatos que vivenciara, o que as leva a pensar sobre situações maiores, que transcendem os portões da escola, da casa e da vizinhança. O objetivo de fazer conexões é aumentar o entendimento para que o pensamento da criança não escape para áreas alheias ao texto, fazendo conexões rápidas e descontextualizadas. A partir dos interesses e necessidades verificadas na mediação com o leitor, o professor direciona e ajusta suas estratégias. Há três tipos de conexões possíveis, as de texto para texto, as de texto para leitor e as de texto-mundo.
3.2.1. Conexões texto-texto
Nesse tipo de conexão, o leitor, ao ler um texto, estabelece relações com outro gênero do mesmo gênero, ou de gêneros diferentes. No Projeto Reinações de Narizinho, durante a leitura do capítulo da primeira parte, Narizinho Arrebitado (p. 19), em que a menina Narizinho visita o palácio do Príncipe Escamado, a certa altura
aparece uma baratinha de mantilha, bastante aflita
– Dona
Carochinha - perguntando ao Príncipe sobre o Pequeno Polegar, que fugiu do livro onde mora. A esta altura, a professora interrompe a leitura e pergunta quem já ouviu falar de Dona Carochinha ou do Pequeno Polegar: — Minha avó tem um livro bem velho, ele cheira a mofo e na capa tem escrito Contos da Carochinha. Isso tem algo a ver? O livro tem uns desenhos com ―cara de velho‖.(Lucca- 10 anos) — O Pequeno Polegar não é aquele pequenininho que dormia dentro de um dedal? Ele roubou umas botas de sete léguas e apesar de ser pequenininho, ele dá cada ―passão‖... (Isadhora – 10 anos)
A professora esclarece que alguns contos tradicionais integram os ―Contos da Carochinha‖ e que era uma sorte a avó do aluno contar com um desses exemplares. Pede para que seja trazido para a classe, para que todos conheçam. Alguns dos contos são lidos para a turma. Sobre a história do Pequeno Polegar, pede para que Isadhora narre a história aos colegas, ajudada por outros que também conhecem o enredo. Está estabelecida a conexão texto-texto, essencial para que o leitor entenda diversas outras passagens em que o Pequeno Polegar aparece, esclarecendo o motivo pelo qual ele consegue fugir tão rápido (usa as botas
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de sete léguas). A estratégia foi utilizada em muitos outros momentos. Normalmente, por ―combinação‖ com o grupo, quando algum aluno fazia este tipo de conexão, partilhava com a turma dizendo ―isso me faz lembrar...‖
3.2.2. Conexão texto-leitor
As chamadas conexões de texto para leitor são aquelas em que, durante a leitura, ele estabelece conexões com episódios da sua própria vida. Logo acima, quando o aluno estabelece conexão entre a Dona Carochinha de Monteiro Lobato e o livro mofado de sua avó, temos um exemplo de conexão texto-leitor. Outro exemplo ocorre durante a leitura do capítulo ―As Jabuticabas‖ (p. 36-39) quando Narizinho, ao morder uma jabuticaba, morde também uma vespa e acaba com a língua picada. Neste instante, muitos alunos lembraram-se de situações parecidas, em que foram picados por abelhas comuns e outros que foram picados por vespas ou marimbondos, descrevendo a dor e o inchaço ocorrido. —―Coitada da Narizinho... uma picada na língua deve ter sido um trauma!‖ (Iasmim – 9 anos) — o sentimento de comoção tomou conta da turma.
3.2.3. Conexões texto-mundo
As conexões texto-mundo, por fim, são estabelecidas entre o texto lido e algum acontecimento mais global, comum na sociedade ou sobre algum acontecimento que tenha sido noticiado sobre a cidade, o país, ou o mundo. No capítulo ―A história do Gato‖ (p.138 a 144), o suposto Gato Félix – sobre o qual os alunos já haviam pesquisado previamente, pois não faz mais parte do universo cultural das crianças da atualidade - conta aos personagens do Sítio sobre sua história pessoal. Diz que seu avô chegou à América no navio Santa Maria, o de Cristóvão Colombo e conta sua versão pessoal sobre a chegada do ilustre italiano ao novo continente. Segundo o gato, Colombo desembarca no Brasil, pergunta aos índios se aquele lugar é a América que andava procurando e o índio responde que garante que o recém chegado é o Cristóvão Colombo. Após a leitura do capítulo a professora pergunta: ―E então? O que vocês acharam da versão ‗Gato Félix‘ do descobrimento da América? — Concordo com a Emília, esse gato é um mentiroso! Como é que os índios iam falar a língua do Colombo? (José Gabriel – 10 anos)
28 — Pra começar o Colombo nem estava procurando a América... ele queria ir às Índias. ( Gabriel Arcanjo – 11 anos)
Neste momento levantaram-se todos os conhecimentos da turma acerca do descobrimento da América, levando a turma a compreender porque a Emília havia ficado tão furiosa com a história do gato e mais tarde levando a compreender os motivos pelos quais o falso Gato Félix foi expulso do sítio a vassouradas. Demos aqui exemplos de ―conexões‖ feitas durante a leitura de um texto, estratégia básica para a compreensão. Quando o professor explora ficção, ensina os alunos sobre personagens, espaço, problema e solução. Quando investiga não ficção, partilha explicitamente as estruturas do texto como comparar e contrastar, visualizar causa e efeito.
3.3. Estratégia: Inferência Já tivemos, durante o desenvolvimento do primeiro capítulo desta dissertação, a oportunidade de apresentar todo o processo da inferenciação, de todo o processo cognitivo envolvido nessa capacidade, de como isso se processa automaticamente em um leitor proficiente. Ao falarmos em inferências, remetemo-nos automaticamente a ―ler nas entrelinhas‖, mas é conveniente lembrar que usamos inferências também em nosso dia a dia, quando lemos uma expressão facial, a linguagem corporal e o tom de voz de uma pessoa, assim como as informações visuais e não visuais de um texto. Quando pensamos no ensino dessa estratégia, precisamos ter em mente que leitores inferem quando utilizam o que já sabem, estabelecendo relações entre seus conhecimentos prévios e as dicas do texto, procurando chegar a conclusões, adivinhar um tema, deduzir um resultado... Se um leitor não infere, não entende a essência daquilo que lê. Muitas questões sobre um texto podem ser respondidas apenas através das inferências, por isso, quanto mais informações os leitores adquirem, mas sensata a inferência que fazem. Durante o Projeto Reinações de Narizinho, tivemos oportunidade de orientar as crianças quanto ao uso das inferências em vários momentos. O primeiro foi durante a leitura da segunda parte do livro (O Sítio do Picapau Amarelo), quando Dona Benta recebe uma carta anunciando a chegada de seu neto Pedrinho. Paramos com a leitura para listar o que o aluno sabia, conhecia ou suspeitava sobre o menino Pedrinho:
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(Gabriel Felipe – 10 anos)
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(Valentina - 9 anos)
Através desta atividade, pudemos ativar o conhecimento prévio acerca do personagem, assim como levantar hipóteses sobre sua participação na história. Em outra oportunidade, completamos a ficha com as ideias que foram confirmadas durante a leitura do texto e com as características mais importantes do personagem, estratégia caracterizada pela Sumarização, que veremos mais adiante. Em outros momentos do Projeto pudemos levar os alunos a muitas outras inferências:
de vocabulário (perceber o sentido da palavra dentro do contexto);
( Isadhora – 10 anos)
(Lucas K – 10 anos) Outra estratégia foi a de construir significado das palavras usando as dicas do contexto para entender o vocabulário.
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Iasmin – 9 anos
de características de personagens (no exemplo abaixo do sapo Major Agarra, vigia da entrada do Reino das Águas Claras, a quem também se refere a atividade citada anteriormente).
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(Maibi – 9 anos)
(José Gabriel – 10 anos)
de fazer predições sobre o que iria acontecer na história, como no episódio ―o Gato Félix‖, quando o Visconde ( que havia feito uma minuciosa investigação sobre o Gato que se dizia Félix) pede à Tia Nastácia que fique segurando uma vassoura enquanto ele expõe à turma do Sítio o resultado de suas investigações. ―Para quê ele quer uma vassoura?‖, pergunta a professora. — Acho que ele descobriu alguma coisa bem podre sobre esse gato e vai querer socar ele com o cabo da vassoura!(Gabriel Arcanjo – 11 anos) — Ah, não... Acho que ele vai espalhar todas as provas que ele recolheu durante a investigação, vai sujar e por isso a vassoura. (Nicolás – 10 anos) — Eu acho que ele quer dar uma surra no Gato. Certamente foi ele que comeu os pintos do galinheiro. (Isadhora – 10 anos)
É importante também criar situações para que as inferências feitas pelos alunos sejam confirmadas ou refutadas. Desta forma o aluno compreende que podemos acertar ou errar as predições, mas enquanto ―aguardamos‖ sua confirmação, nos envolvemos de forma mais profunda com a leitura. Outros tipos de inferência foram possíveis através da ilustração da capa e dos capítulos, assim como através do enredo e do tema de cada um dos episódios do livro. Objetivando a inferência dos alunos, os professores podem ensinar essa estratégia, mostrando as dicas que cada texto possui e ensinando como combiná-las com seu conhecimento prévio para fazer inferências adequadas. Ao inferir e predizer, o leitor cria uma interlocução com o texto, criando expectativas do que vai acontecer ou que informações o texto irá conter.
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3.4. Estratégia: Visualização A visualização é outra estratégia que, assim como a inferência, usamos quase sem nos darmos conta. Quando usamos desenhos ou gráficos para entender um problema de matemática, um diagrama (como o do ciclo da água) para a compreensão dos processos científicos, ou quando nos imaginamos dirigindo para explicar um caminho a uma pessoa, estamos fazendo uso desta estratégia. Visualizar é inferir significados, sendo, portanto, também uma forma de inferência. Criar cenários e figuras em suas mentes enquanto se lê, aumenta o interesse dos leitores e faz com que a atenção seja mantida, tornando a experiência de leitura mais prazerosa e permitindo o engajamento na leitura literária. Partilhar das imagens que criamos em nossas mentes durante a leitura com o outro, ajuda com que o leitor se sinta ―parte da história‖. Por isso, ensinar as crianças a construir suas imagens mentais também quando leem não ficção as ajuda a refletir e a entender a informação. Sobre a relevância da visualização, as pesquisas de Owoki (2003 – apud SOUZA E GIROTTO 2010) afirmam que: 1. Bons leitores formam imagens mentais quando usam experiências anteriores
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e informações sobre a vida do autor. Outras vezes, os leitores baseiam-se em suportes do texto, como ilustrações ou fotografias para ajudá-los a imaginar o texto. A figura em nossa mente nos conecta com o texto ou com o que estamos aprendendo e elas, geralmente deixam impressões permanentes. Leitores que visualizam enquanto leem têm melhores recordações, melhores performances e melhor rendimento em avaliações. Alunos que visualizam passagens dos textos conseguem reconhecer se a informação não é completa e, por essa razão, são capazes de compreender, mesmo se ajudas visuais não estão à disposição. Pessoas que leem sem visualizar estão apenas ―passando os olhos por cima do texto‖, perdendo a experiência de adentrar completamente em outro mundo ou do engajamento cognitivo que vem da utilização de todas as fontes da mente para entender de fato o que leem.
Para o ensino da visualização, podemos propor a visualização com livros de imagens a fim de completar uma informação ausente, omitindo, por exemplo, o desenho de um quadrinho de HQ, utilizando-se as informações para ―visualizar‖ o desenho, o quadro que falta. Criar imagens mentais para uma passagem de um livro é outra estratégia. Mostramos aqui as visualizações obtidas a partir da leitura do ―Passeio de Narizinho pelo Reino das
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Águas Claras‖, o ―Casamento de Narizinho‖ e o passeio de Narizinho e Emília pelo Reino das Abelhas. ― O passeio que Narizinho deu com o príncipe foi o mais belo de toda a sua vida. O coche de gala corria por sobre a areia alvíssima do fundo do mar conduzido por mestre Camarão e tirado por seis parelhas de hipocampos, uns bichinhos com cabeça de cavalo e cauda de peixe. Em vez de pingalim, o cocheiro usava os fios de sua própria barba para chicoteá-los. — Lept! lept!... Que lindos lugares ela viu! Florestas de coral, bosques de esponjas vivas, campos de algas das formas mais estranhas. Conchas de todos os jeitos e cores. Polvos, enguias, ouriços — milhares de criaturas marinhas tão estranhas que até pareciam mentiras do barão de Munchausen. Em certo ponto Narizinho encontrou uma baleia dando de mamar a várias baleinhas novas. Teve a ideia de levar para o sítio uma garrafa de leite de baleia, só para ver a cara de espanto que dona Benta e tia Nastácia fariam. Mas logo desistiu, pensando: ―Não vale a pena. Elas não acreditam mesmo...‖ Nisto apareceu ao longe um formidável espadarte. Vinha com o seu comprido esporão de pontaria feita para o cetáceo, que é como os sábios chamam a baleia. O príncipe assustou-se. — Lá vem o malvado! — disse ele. — Esses monstros divertem-se em espetar as pobres baleias como se elas fossem almofadinhas de alfinetes. Vamo-nos embora, que a luta vai ser medonha. Recebendo ordem de voltar, o Camarão estalou as barbas e pôs os ―cabecinhas de cavalo‖ no galope.‖ (Lobato, 2000 p. 20)
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— Já reparou, Emilia, como e bem arrumado este reino? Uma verdadeira maravilha de ordem, economia e inteligência! Estive no quarto das crianças. Que gracinha! Cada qual no seu berço de cera, com pernas e braços cruzados, todas tão alvas, dormindo aquele sono gostoso... O que admiro e como as abelhas sabem aproveitar tudo de modo que a colmeia funcione como se fosse um relógio. Ah, se no nosso reino também fosse assim... (p. 66)
36 Chegou o casamenteiro — outro Bernardo Eremita, muito respeitado no reino pelas suas manhas. Fora convidado não só para fazer o casamento como também para coroar o príncipe com a famosa coroa de rosquinha engastada de diamantes. — Começa tudo de novo desde o princípio! — foi a ordem do príncipe. E tudo recomeçou desde o princípio. As sereias repetiram os lindos cantos que já haviam cantado e os noivos repetiram a marcha a passos lentos em direção ao trono nupcial! Enquanto caminhavam, uma chuva de pérolas em pó caia sobre eles. Subiram ao trono. Sentaram-se. O venerando Bernardo Eremita pronunciou as palavras sacramentais e os casou, bem casadinhos. Palmas romperam, e gritos, e hurras. Narizinho estava princesa, finalmente! Restava a coroação. (p.111)
A partir da estratégia de visualização, muitas outras atividades podem ser criadas, com o propósito de usar todos os sentidos para compreender um texto. Durante a leitura, o professor pede para que os alunos procurem ―explorar‖ o espaço em que se passa a história, usando, além da visão, os outros sentidos: olfato, tato, paladar e audição. Após a leitura, pede para registrar suas impressões. Essa ação aprofunda o entendimento do texto e mostra o nível de interação na busca para compreensão. Abaixo, um quadro de visualização após a leitura do episódio ―Cara de Coruja‖, quando Narizinho dá uma festa para a qual todos os personagens de Fábulas e Contos de Fada são convidados.
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Lumma-10 anos
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Isabella- 10 anos
Nesse processo, o professor pode ajudar o aluno com seguintes questões:
Que figuras vêm à sua cabeça depois de ler esse texto?
Que imagens você vê assim que lê? Por que você acha que vê essas imagens?
Como o autor ajuda você a imaginar as ideias do texto?
Como você usou seus sentidos: olfato, audição, paladar e tato?
Grife no texto as palavras ou frases que ajudam você a ―visualizar‖ o texto.
Outra importante atividade de visualização seria, após a leitura de um texto, fazer a comparação com o filme produzido a partir do mesmo texto, o que enriquece o processo, criando possibilidade de diálogo em sala de aula, pois as crianças compartilham opiniões sobre os livros e as adaptações em filmes. Trabalhando desta forma, o professor cria a possibilidade de os alunos visualizarem e instituírem imagens mentais que as auxiliam a construir um sentido para o que leem. Visualizar personaliza a leitura, mantém o leitor engajado e, muitas vezes, evita que ele abandone um livro prematuramente.
3.5.Estratégia: Sumarização
Sumarizar é aprender a determinar a importância, a buscar o que é essencial no texto. No entanto, determinar o que é essencial em um texto infantil autêntico (não produzido para
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análise pedagógica), um editorial de jornal ou de um livro não científico, pode não ser tão fácil. Todos os autores citados no presente estudo concordam ao dizer que aquilo que determinamos ser importante em um texto depende do propósito de quem lê. Quando o leitor lê ficção, fica atento às ações dos personagens, motivos e problemas que constituem o tema. Quando o leitor lê não ficção, próprio texto apresenta problemas e motivos que prendem sua atenção; esse tipo de texto é carregado de características que sinalizam a importância das informações e proporcionam ao leitor dicas para encontrar as informações mais importantes. É comum, nas escolas, pedir para que o aluno sublinhe informações importantes do texto, descobrindo qual é a ideia principal, mas isolar todos os detalhes que aparecem junto dessa ideia não é fácil. O leitor se lembra melhor dos fatos e detalhes quando relaciona aos conceitos mais amplos, separando o que julga importante do interessante. Depois disso, é que pode chegar à ideia principal do texto. O docente, ao oferecer aos alunos textos não ficcionais, pode ajudá-los a ter uma visão geral, uma forma de ver, rapidamente, o texto antes de ler, sabendo que é preciso: Ativar o conhecimento prévio; Entender as características da extensão e da estrutura do texto; Perceber os títulos e os subtítulos importantes; Determinar o que ler, e em que ordem; Orientar a que tópicos prestar atenção e definir o que deve ser ignorado; Orientar para o abandono de partes da leitura quando o texto não apresentar informações relevantes; A habilidade de aprender a encontrar a ideia principal do texto elimina a necessidade de a criança ler tudo se precisa encontrar alguma informação específica. Ensinar a criança a ter uma visão geral representa um início no esforço em determinar a importância. Esses aspectos podem ser ―modelados‖ antes do início da leitura, ensinando para o aluno os seguintes procedimentos: Observar atentamente a primeira e a última linha de cada parágrafo – normalmente a informação importante ali se encontra; Destacar somente palavras ou frases necessárias, não a sentença inteira; Fazer anotações nas margens ou com post-its, relacionando ideias ao conteúdo do texto, ou escrevendo o significado de palavras desconhecidas;
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Verificar quantas palavras foram destacadas, pois se isso é feito com eficiência, o leitor não deve destacar mais que meio parágrafo. Com o tempo as crianças ganham mais habilidade e começam a sublinhar somente um terço do parágrafo.
Embora esta estratégia de leitura seja mais aplicável em textos informativos, seu ensino também é possível por meio de livros de ficção, devendo o professor , antes da leitura, explicitar qual é o propósito da leitura. Como exemplo, atividades do Projeto Reinações de Narizinho (aplicadas em diferentes momentos da leitura do livro), em que durante a leitura de determinados capítulos, o professor pede para que os alunos atentem e anotem nas margens as características pessoais (físicas e psicológicas)de cada personagem e a história de vida dele, posteriormente reunindo e relacionando essas informações para explicar por que aquele é seu personagem favorito.
Isadhora – 10 anos
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Isabella- 10 anos
Iasmin – 10 anos
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Iasmin – 10 anos
Gustavo – 10 anos
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Através do ensino da estratégia de sumarização o professor cria a possibilidade de as crianças aprenderem a distinguir entre o que acham que é mais importante e o que de fato é importante e ainda entre o que o autor quer que se depreenda da leitura. Em outras palavras, o leitor passa a usar evidências do texto para formar opinião, entender as grandes ideias e situações do texto, articulando tudo isso ao seu conhecimento de mundo.
3.6. Estratégia: Síntese Sintetizar é mais do que resumir, pois num resumo, limitamo-nos a recontar a informação contida no texto, ao passo que sintetizar, consiste em acrescentar informações novas, advindas de nosso conhecimento prévio, ao mesmo tempo em que corremos os olhos pela leitura. A sintetização acontece quando relacionamos as informações do texto com nosso próprio pensar, modelando nosso conhecimento enquanto aperfeiçoamos a informação do texto em pequenas ideias importantes ou conceitos mais amplos. Neste processo, às vezes acrescentamos as informações novas para aprimorarmos nossos conhecimentos prévios, e outras vezes mudamos nosso pensar a partir das novas informações, ganhando novas perspectivas. Por isso, quando as crianças adquirem a capacidade de sintetizar, alcançam um entendimento mais complexo de texto. Quando resumimos uma informação durante a leitura, conseguimos selecionar o que é importante, resignificando essa passagem com nossas próprias palavras, o que nos ajuda a memorizar e atribuir significado aos fatos, levando-nos à evolução de pensamento, conforme adicionamos informações ao texto. Realizamos esse processo como um quebra-cabeça, em que cada peça precisa ser movida para formar uma imagem, constituir um todo significante. Para auxiliar o professor no ensino da estratégia da síntese, listamos algumas atividades:
Parafrasear ou resumir um texto, motivando os alunos a realizar anotações sintéticas nas margens usando suas próprias palavras, ou usando chaves nas margens da narrativa para resumir a informação.
Recontar para resumir a informação, por meio de um breve reconto da história. Como apoio, o professor pode valer-se de discussões com a classe, listas de palavras-
chave da narrativa, registros de passagens da história em blocos de notas ou cartazes. Sendo assim, os alunos ganham a oportunidade de usar uma variedade de maneiras para sintetizar a informação e partilhar seu pensamento, sendo que para isso localiza as
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informações mais importantes, mantendo-as em mente para que, com suas palavras, possa dar suas opiniões sobre a narrativa.
3.7. Que estratégias de leitura usar? Acerca das estratégias aqui apresentadas, pudemos perceber através das atividades desenvolvidas durante o Projeto Reinações de Narizinho que é muito difícil pensar em cada uma delas como centro de uma aula. É diferente, por exemplo, ensinar o aluno a inferir, e a reunir informações para uma sintetização. Cada uma das estratégias é importante, porque podem ser adicionadas ao conhecimento organizado em nosso modelo mental. Por outro lado, o processo envolve ações complexas, e aprendê-lo requer repetir atividades aplicadas de maneiras diferentes, ajustando, modificando e redefinindo as ações ensinadas. Por essa razão, trabalhar com estratégias de leitura permite que o leitor amplie e modifique os processos mentais de conhecimento, bem como aumente a capacidade de compreensão de um texto. Compreender é a base para que as crianças se engajem na leitura e se tornem leitoras autônomas. Por isso o ensino das estratégias é fundamental: porque precisamos permitir aos nossos alunos a compreensão do escrito, para que se sinta parte de uma sociedade que a cada dia impõe mais a necessidade do letramento.
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CONCLUSÃO
O presente estudo explicitou os aspectos cognitivos da leitura, esclarecendo que compreender um texto é muito mais do que decodificar palavras, e que esquemas mentais de raciocínio e conhecimento prévio facilitam sua compreensão. Refletindo sobre a leitura, pudemos concluir que o ato de ler se trata de processo dinâmico que não depende só dos processos linguísticos, mas exige ações cognitivas do leitor, sendo necessário que ele formule esquemas mentais para processar as informações obtidas em cada nova leitura. Um leitor maduro também foi inexperiente um dia; precisou passar por um processo de aprendizado dos esquemas cognitivos envolvidos no ato de ler, e deve sempre manter seus processos mentais claros e definidos a fim de captar a intenção do autor. Dessa forma, o leitor lança mão de seus conhecimentos prévios para vislumbrar o significado do texto. Quanto mais amplo o conhecimento do leitor, melhor será sua compreensão. O leitor proficiente usa, inconscientemente, estratégias para resgatar na memória os conhecimentos ali armazenados. Saber algo antes mesmo de aprender ou fazer, não importando a maneira como aprendeu, facilitará a aprendizagem e auxiliará a compreensão da leitura. Acreditando que tais conhecimentos podem servir como embasamento para o professor que deseja formar alunos leitores, aprofundamos este estudo dando enfoque às estratégias metacognitivas, aquelas que o leitor usa de maneira consciente, de forma que o professor, a partir de tais conhecimentos, possa modelar estratégias de leitura adequadas à faixa etária de seus alunos e para a disciplina em que atua, visto que temos a forte opinião de que cada professor, em sua área de atuação, tem o dever de levar o aluno à compreensão dos textos apresentados em cada área de conhecimento. Finalizamos discorrendo sobre as estratégias metacognitivas adotadas no Projeto de Leitura Compartilhada ―Reinações de Narizinho‖, aplicado em 2011 para os alunos do 5º ano do Colégio Objetivo de Itapetininga. Procuramos esclarecer cada uma das estratégias, ilustrando com as atividades propostas. Acreditamos, dessa forma, ter atingido o principal objetivo da pesquisa: mostrar que a leitura - o prazer pela leitura - , é algo que se pode ensinar e deixar como ―marca‖ nos alunos. Convém lembrar, entretanto, que este estudo de maneira alguma esgota o assunto, que
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é bastante amplo e complexo e merece ser estudado por todos os professores que têm o desejo de contribuir para a sociedade com alunos que podem ―fazer a diferença‖.
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REFERÊNCIAS
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