D. Branca Martinho-Sócia Honorária dos Bombeiros da Régua

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Quinta-Feira, 01 de Março de 2012

Arquivo dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua As melhores imagens da sua História

D. Branca Martinho -Sócia Honorária dos Bombeiros da Régua

N

ascida na Régua, no dia 2 de Janeiro de 1891, onde veio a falecer a 31 de Janeiro de 1964, com a provecta idade de 91

José Alfredo Almeida

Araújo Correia. O escritor, no seu livro Palavras Fora da Boca (Imprensa de Douro, de 1972), imprimiu o discurso que ali proferiu. Com arte literária e um sentido crítico apu-

embora não os granjeasse como se vivesse para os servir, obrigouos a servir a sua causa, que foi a do bem-fazer organizado para o tornar profíquo.” Há quem pense que D. Branca Martinho que era assumidamente católica fez uma caridade à moda antiga. Querem dizer que a sua atitude cívica foi meramente de cariz assistencialista e que a acção de nada teve de extraordinário, nunca chegou a resolver os problemas reais das pessoas. Não será esta, seguramente, opinião dominante daqueles que a conheceram ou apenas dela ouviram falar como uma mulher dotada de rara sensibilidade para tratar com nobreza as questões da pobreza.

anos, foi uma mulher de carácter e de crença religiosa firme que dedicou toda a sua vida a fazer a caridade cristã. Caridade em nome dos pobres, ao serviço do seu semelhante mais desfavorecido e abandonado à sua sorte, sem lugar no trabalho e excluído de uma sociedade impotente para garantir os apoios sociais que não eram garantidos pelo Estado. Na sociedade do seu tempo, o seu exemplo de partilha, generosidade, solidariedade e de compaixão a sua atitude cívica marcou a diferença numa causa humanitária que visou o respeito pela vida e dignidade humana dos pobres. Os reguenses chamaram-lhe a Protectora dos Pobres. O Governo concedeu-lhe a Ordem da Benemerência. A Igreja, pelas mãos do Papa Pio XII, atribuiu-lhe a medalha Pro Ecclesia et Pontifice. Na homenagem póstuma, realizada nos anos 70, foram enaltecidas a sua personalidade e a sua obra sublimada pelo dom eloquente da palavra dos oradores Padre Manuel Sequeira Teles e João de

rado, enalteceu a D. Branca, como a tratou, a incutir a ideia que fora sua amiga e contemporânea, admirou os dotes físicos, a beleza do seu corpo enquanto mulher jovem, enobreceu-lhe o carácter, salientou os talentos e considerou-a o último símbolo do catolicismo português. Vale a pena citar um pouco mais doe interessante discurso que a descreve a homenageada com acertadas considerações: “D. Branca Marinho foi protectora dos pobres desta vila. Protegeu-os de maneira que a sua mão esquerda ignorasse o que fazia a sua mão direita? Não foi esse o sistema da sua caridade. Foi caritativa, mobilizando auxiliares contra a indigência, batendo ao ferrolho dos cofres ricos e importunando, se assim se pode dizer, os ouvidos da governação. Horrorizada com os tugúrios onde agonizavam os pobrezinhos da nossa terra, nunca perdeu o azo de pedir, a qualquer espécie de mando, a construção de bairros asseados para gente humilde. Nunca foi ouvida. (…) Dotada de múltiplos talentos,

O voluntariado de D. Branca Martinho seria, neste nosso tempo, reconhecido como de “acção social”, realizando tarefas básicas de dar comida a quem tinha fome, vestir quem precisava de roupas, cuidar de doentes, crianças e aliviar a solidão dos idosos. Pode-nos parecer muito pouco para quem, nos finais dos anos 30, enfrentou problemas sociais delicados, como elevado o desemprego dos trabalhadores rurais que a própria autarquia reconhecia ser impotente para resolver e, em desespero, chegou a pedir ao Governo para que elaborasse um plano de emergência, mas nunca teve qualquer resposta. Eram tempos difíceis, muitas as famílias conheceram o desemprego e a fome que, sem meios para o seu sustento, acorriam às cantinas onde era oferecida uma refeição, a de Sopa dos Pobres. A realidade social era negra, nas ruas gente muito pobre estendia à mão à esmola e à caridade.

de civil uma resposta que aliviasses os principais males de seres humanos que não encontraram nenhum Estado social que melhorasse a sua condição de vida. Olhou de frente a pobreza e a miséria e, apoiada na doutrina social da Igreja, através da Conferência de S. Vicente de Paula, percebeu as fragilidades da sustentabilidade económica da região da duriense. Afinal, o comércio do vinho do Porto, continuava a ser um caso de insucesso, não melhorava a vida dos que trabalhavam na agricultura e, muito pior, não conseguia redistribuir na sociedade reguense a riqueza gerada. Esta mulher foi uma figura que marcou fortemente uma época. Quando morreu com mais de 90 anos de idade, em sua casa na Rua da Ferreirinha, os jornais locais unanimemente manifestaram o sentir de uma perda de uma vida humana que reclamou atenção para os problemas de pobreza e desigualdades sociais. Em sua memória fizeram os maiores elogios, utilizando a imagem de uma delicada metáfora: “Caíu uma flor… ficou o perfume”, realçando o seu valor como pessoa altruísta desta forma:

“reguenses perdiam a Rainha da Caridade”, para concluir que o seu exemplo permanecia vivo: “… a Caridade viva, Divina Azul como o Céu, bela como a flor que cai… Esta a Caridade que a Sr. D. Branca viveu toda a sua vida”. De imediato a autarquia reconheceu o seu valor da benemérita e atribuiu o seu nome a uma rua. O seu legado de humanidade mantêm-se vivo. Lembra D. Cristina Borrajo, voluntária e vicentina que lhe continuou as incitativas de auxílio aos pobres do nosso tempo. Confessou que, como a D. Branca o fazia, tem em prática uma intensa acção de caridade: “Neste momento sabemos que há muitas necessidades, principalmente, envergonhadas; mas há outros apoios que não havia no seu tempo e que ela tentava suprir.” O exemplo de D. Branca Martinho é um apelo à participação dos cidadãos e da solidariedade voluntária, cada vez mais necessária para responder aos novos problemas de pobreza que voltamos a viver. Ao contrário do que se possa pensar, a caridade nunca acaba.

D. Branca Martinho que pertenceu à alta origem social e possuía fortuna pessoal de valor, podia ter-se alheado da situação social de pobreza que se passava em sua volta, mas empenhou-se na acção cívica e procurar encontrar no seio da socieda-

SEMANÁRIO INDEPENDENTE DEFENSOR DO ALTO DOURO

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