MARCOS RELEVANTES DA HISTÓRIA DAS ILHAS DE QUERIMBA

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MARCOS RELEVANTES DA HISTÓRIA DAS ILHAS DE QUERIMBA OU DE CABO DELGADO. O CASO PARTICULAR DA VILA DE SÃO JOÃO DO IBO Por Carlos Lopes Bento Contribuição para as Comemorações do 251º aniversário da Vila do Ibo (Cabo Delgado – Moçambique), em 24 de Junho de 2012

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MARCOS RELEVANTES DA HISTÓRIA DAS ILHAS DE QUERIMBA OU DE CABO DELGADO. O CASO PARTICULAR DA VILA DE SÃO JOÃO DO IBO. 1

Por Carlos Lopes Bento

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- Administrador do concelho e presidente da C. Municipal do Ibo, entre 1969 e 1972. Antropólogo e prof universitário. Diretor Tesoureiro da SGL.

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Ao comemorar-se, no dia 24 de Junho de 2012, mais um aniversário comemorativo da elevação do Ibo, a Vila, o 251º, achei, por bem, lembrar os principais factos ligados à sua criação e instalação. Para fazer face ao estado de ruína total em que se encontrava o governo civil e económico de Moçambique e doutros dos seus portos e, por nestes lugares, não haver, nem quem administrasse na primeira instância a justiça às partes, nem quem tivesse a seu cargo o cuidado do bem comum do povo, em 1761, determinavam as Instruções régias, de 19 de Maio, que, a ilha de Moçambique e os portos e povoações de Quelimane, Sena, Tete, Zumbo, Manica, Sofala, Inhambane e Ilhas de Querimba, fossem erigidas em vilas, sujeitas ao Ouvidor de Moçambique, as quais ficariam a beneficiar de todos os privilégios concedidos às vilas do Reino. Mandavam, ainda, as mesmas Instruções que fossem eleitos um juiz ordinário, três vereadores, um procurador do concelho, um escrivão e mais oficiais da câmara, entre as pessoas mais idóneas, na forma da Ordenança do Livro 1º, Título 67, servindo todos debaixo dos Regimentos que faziam parte da dita Ordenação. Os senadores das Câmaras, presentes e futuros, obrigavam-se a administrar a justiça dos povos e a distribui-la, sem distinção de pessoas, a todos os que a tivessem a seu favor, fossem eles "mouros, gentios, cafres e outros semelhantes". Do novo governo civil e económico das Câmaras a estabelecer, afirmava-se, adviriam resultados de muita utilidade: os habitantes das vilas e seus termos ficariam "reduzidos" à sociedade civil, os vários cultos dos países por ela dominados seriam absorvidos, num tempo mínimo, pela Religião dominante e, finalmente, "os gentios e cafres pelas Câmaras civilizados" aumentaria, significativamente, o número dos cristãos. Pensava-se, euro e etnocentricamente, na intensificação de uma política de assimilação das populações colonizadas e na sua integração na cultura de matriz europeia, considerada como superior. Embora as ditas Instruções régias fossem datadas de 19/5/1761, as Ilhas de Querimba ou de Cabo Delgado, apenas, teriam foros de vila, com câmara municipal e tribunal, três anos mais tarde, ou seja em 26 de Maio 1764. A Provisão, em manuscrito2, assinada pelo Governador de Moçambique, João da Siva Barba, testemunha esse memorável facto histórico:

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- Do riquíssimo acervo do Arquivo Histórico Ultramarino, Lisboa.

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Foi, efetivamente, a 26 de Maio de 1764, que teve lugar a nomeação dos oficiais para a Câmara da "Vila de Querimba" instalada, ao que se julga, por razões estratégicas, na ilha do Ibo e não na ilha de Querimba, a saber: • Juiz Ordinário • Vereador mais velho • 2º Vereador • 3º Vereador • Procurador do Concelho • Escrivão

Caetano Alberto Júdice3 Manuel Carrilho4 Domingos Diogo Baptista Domingos de Campos5 António José de Miranda6, que também serviria de Tesoureiro João de Meneses.

3 - Natural do Reino. Capitão de artilharia. Foi sepultado, na ilha de Querimba, na igreja de Nossa Senhora do Rosário, em cujas ruínas, ainda encontrei, a respetiva campa. 4 - Natural do Reino, foreiro do prazo da ilha de Querimba e juiz e capitão das Ilhas. 5 -Foreiro da ilha de Matemo(1768) 6 -Militar. Foreiro da Amisa. Comandante militar da ilha de Amisa, onde estava em 1770.

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Estas personalidades, eram quase todas militares e titulares de prazos da coroa. Depois da posse, serviriam os seus empregos pelo período de um ano. O juiz prestava juramento perante o Capitão-General e os outros nomeados perante aquele juiz. O novo Capitão-Mor e Governador, Caetano Alberto Júdice, encarregado de fazer no Ibo, a capital das Ilhas7, chegou àquela ilha em 16 de Junho e a 26 do mesmo mês a nova Câmara já estava em funcionamento. A 25 deste mês, "o juiz ordinário e vereadores da Câmara da Vila de São João do Ibo"8 agradeciam ao Capitão-General a criação da nova Câmara das Ilhas de Cabo Delgado e a sua nomeação, ao mesmo tempo que atestavam a sua obediência às Leis do Soberano Fidelíssimo Rei de Portugal e às ordens emanadas de Moçambique. “……………………………………………………………………………………………….. Da mesma sorte todos os moradores, assim cristãos, como mouros e cafres, ficavam tão satisfeitos que para esta Câmara se mandam confessar mil vezes obrigados e agradecidos a tão grande mercê que alcançaram em se estabelecer nestas Ilhas uma Câmara por meio da qual esperam conseguir entre todos uma completa união e que seja a justiça administrada com inteireza sem atenção de pessoa alguma como Deus e el-rei manda.(…)”. A parte final desta primeira mensagem:

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- A escolha do Ibo como nova capital deveu-se ao facto desta ilha oferecer mais e melhores condições defensivas. - São João Baptista, como padroeiro da nova vila, que se manteve até aos nossos dias, estará ligada à sua fundação, que teria lugar a 24 de Junho, dia daquele Santo, ou em data muito próxima, compreendida entre 16 e 25 do mesmo mês. 8

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Este secular Manuscrito, de que se apresenta a 2ª página9, tal como a 1ª, carcomida pela traça dos livros, termina com as assinaturas, legíveis, dos fundadores da Vila do Ibo e primeiros autarcas do Munícipio Iboense. No final do primeiro meio ano de mandato, em 20 de Dezembro de 1764, a Câmara Municipal e os principais Moradores, atestavam sobre o conjunto de ações desenvolvidas, na nóvel e bela Vila do Ibo: “Atestamos nós, os vereadores da Câmara desta nova vila de São João do Ibo, capital das do Cabo Delgado, com os mais moradores abaixo assinados, em como, aos dezasseis do mês de Junho da era abaixo, chegou a estas Ilhas o Sr. Caetano Alberto Judicie sargento-mor de infantaria, com exercício na Praça de Moçambique, capital deste Estado e nele Comandante da Artilharia, vindo despachado em comandante destas Ilhas, o qual, logo em execução das ordens que trazia (...) estabeleceu em um bom terreno desta ilha do Ibo, a nova vila à qual deu o nome de São João do Ibo, dividindo o terreno em ruas e travessas de boa largura, pondo marcos nos ângulos em que as ruas encontram as travessas. Criou a nova Câmara, fez uma cadeia, de duas casas. Levantou um pelourinho, tudo à imitação das melhores vilas do Reino, em uma boa praça e no melhor sítio da vila, eleito pelo povo que se achava presente, para a comodidade de todos. Além das referidas obras fez dois armazéns (...). Depois de que construiu um Forte em redentes a que deu o nome de Santa Bárbara (...) e logo junto ao Forte teve o honorífico trabalho e honra de arvorar a Bandeira de El-Rei.(...)”.

Um exame atento à documentação escrita consultada, entre 1764 e 1890, mostranos que lugares da presidência, vereação e demais oficiais da Câmara eram desempenhados, normalmente, por filhos da terra ou oficiais da tropa, pertencentes às famílias mais antigas das Ilhas, que se situavam nas posições sociais mais elevadas na escala hierárquica da sociedade local. A escolha recaía, quase sempre, em moradores, com prestígio reconhecido, que desempenhavam outros papéis sociais, nomeadamente, de foreiros, empregos públicos, oficiais do Regimento de Milícias, capitães-mores e sargentos-mores, e mercadores/comerciantes importantes. Excepcionalmente, desempenhavam o cargo moradores naturais do Estado da Índia ou do Reino. Favoreciam-se, assim, as famílias mais prestigiadas que, desse modo, consolidavam não só o seu prestígio e autoridade, como também o poder político instituído. Os moradores que serviram na Câmara, nos diversos cargos, mais de 90,0% eram oficiais do Regimento de Milícias, verificando-se ainda que muitos deles estiveram presentes neste órgão, por várias vezes, tanto no mesmo, como em desempenhos diferentes.

Foi estrutura inicial da Vila que Serpa Pinto encontrou, em 1884, quando esteve no Ibo, integrado na Expedição Científica Pinheiro Chagas: “A vila assenta a NO da ilha e consta de dois bairros: o europeu e o indígena. O bairro europeu compõe-se de duas ruas principais, a rua de El- Rei e a Rua Maria Pia que correm proximamente E/O (...). É nesta parte da vila que residem europeus, baneanes, mouros da Índia e as principais famílias de crioulos da ilha. O bairro indígena fica a E do bairro europeu e é formado por muitas palhotas entre palmares. Neste bairro há também duas ruas principais, a de Sá da Bandeira e a 27 de Julho. No levantamento da planta, rigorosamente feito por esta expedição, com 9

- Os Manuscritos aqui apresentados, verdadeiras preciosidades, fazem parte do A.H.Ul. . Aa suaa cotaa poderão ser encontradas na minha tese de doutoramento As Ilhas de Querimba ou de Cabo Delgado. Situação Colonial, Resistências e Mudança. !742-1822.

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fim principal de referir as coordenadas geográficas da casa da expedição ao pau da bandeira do Forte de São João”. Segue-se a Planta cotada da Vila, que ofereceu ao então governador do distrito de Caba Delgado, major Perry da Câmara:

Sobre a temática em análise, o Código de Posturas da Câmara Municipal de Cabo Delgado, de 22 de novembro de 1893, no seu capítulo I, dá-nos indicação da área do município, das ruas e da extensão da Vila:

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“Artigo 1.° O município de Cabo Delgado compreende as ilhas e todos os pontos do continente do distrito onde chega a acção da autoridade. Art. 2.° A vila do Ibo, sede da municipalidade, abrange os terrenos compreendidos entre a praia do sul e rua “27 de Julho”, o paiol do estado e o forte de Santo António. Art. 3.° As ruas, largos e travessas são as seguintes: Rua de El-Rei. » de D. Maria Pia. » do Conselheiro Mariano de Carvalho. » do Infante D. Afonso. » do Príncipe Real. » de D. Manuel. » Nova. » da Alegria. » do Infante D. Henrique. » do Governador Cabral. » do Calado. » do forte de Santo António. Praça de D. Manuel. Largo do Conselheiro Machado. » da Residência. » do forte S. José. » do Doutor. Travessa de El-Rei. » dos Baneanes. » dos Pescadores. » do Príncipe Real. » do Governador Cabral. » do Conselheiro Mariano de Carvalho. § único. A rua “27 de Julho” e outras projectadas e destinadas ao levantamento de palhotas fora da vila, constituiriam os bairros denominados indígenas”. A mesma toponímia da Vila do Ibo, vamos encontra-la no Regulamento do Serviço de Policial, de Limpeza e de Sanidade Pública do concelho do Ibo, de 10.11.1898:

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A referenciada toponímia da Vila do Ibo, com a implantação da República Portuguesa, seria alterada pela Portaria nº 145, de 12/11/1910 (Boletim da Companhia do Nyassa, de 31/3/1911, para: Rua de El-Rei →Rua da República; Rua D. Maria Pia→ Rua Almirante Reis; Rua Conselheiro Mariano de Carvalho→ Avenida Mariano de Carvalho; Rua Infante D. Afonso→ Rua Miguel Bombarda; Rua do Principe Real→ Rua 5 de Outubro; Rua D. Manuel→Rua Machado dos Santos; Rua Nova→ Rua António José de Almeida; Rua d'Alegria→ Rua João Chagas; Rua do Forte de Santo António→ Rua Coronel Barreto; Rua 27 de Julho→ Avenida Afonso Costa; Travessa que liga as duas ruas anteriores, sem nome→ Travessa Alves da Veiga; Praça D. Manuel, Praça da Residência e Largo do Doutor → Praça da República); Largo Joaquim Machado→Rua Conselheiro Machado; Travessa de El-Rei→Travessa da República; Travessa do Principe Real→ Travessa Afonso Costa; Travessa Mariano de Carvalho→ Travessa Mariano de Carvalho; Caminho que vai do Largo Joaquim Machado para a Praça→ Avenida Teófilo Braga; Largo do Matadouro→Largo António Enes. Estas designações toponímicas existiam, ainda, em 1974. A vila do Ibo, com os seus históricos monumentos(sagrados e profanos) e o contíguo bairro ruburbano, com as suas simpáticas e generosas gentes, com um etnoestilo próprio, serão, em breve, importantes fatores de atração turistica, que farão da ilha do

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Ibo, um destino turístico, reconhecido mundialmente. Ao lembrar os primeiros autarcas de Cabo Delgado, os verdadeiros fundadores da vila do Ibo, que as atuais e futuras gerações deverão conhecer, estamos a prestar uma singela homenagem às terras e gentes das Ilhas de Querimba e de Cabo Delgado. Carlos Lopes Bento.

ALGUMAS IMAGENS DA VILA DO IBO

A encantadora vila do Ibo. 1971. CB

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A Vila do Ibo e o seu porto interior. 1971.CB

A grande Praรงa da Vila do Ibo. 1971.CB.

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População do ibo, em dia de festa.1971. CB.

Carlos Lopes Bento Administrador do concelho e presidente da Câmara Municipal do Ibo, entre 1969 e 1972 Antropólogo e prof universitário. Diretor Tesoureiro da SGL ©ForEver PEMBA, 24 de Junho de 2012

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