Príncipe do deserto

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PRÍNCIPE DO DESERTO

ELISSANDE TENEBRARH


Copyright © 2016 Elissande Tenebrarh Príncipe do deserto Capa: Gisele Souza Revisão: Deborah Ratton Diagramação Digital: Kacau Tiamo Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação da autora. Quaisquer semelhanças com nomes, datas e acontecimentos reais são mera coincidência. Todos os direitos reservados. É proibido o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte destas obras, através de quaisquer meios — tangível ou intangível — sem o consentimento escrito da autora. Criado no Brasil.


Agradecimentos Simplesmente não posso deixar de agradecer primeiramente as minhas queridas leitoras do Wattpad, que acompanharam Príncipe do Deserto desde o começo, deixando-me alegre com cada comentário e cada estrelinha. Vocês tornaram esse livro um grande sucesso na plataforma! Obrigada também a todas as meninas do grupo do WhatsApp, que sempre estão ao meu lado, ajudando-me quando necessário e, muitas vezes, ouvindo meus desabafos. Vocês são muito importantes para mim! Jheniffer Cristine, Gislany Setubal, Patrícia Souza, vocês foram maravilhosas! Ajudaram-me tanto, apoiaram-me em momentos em que pensei que nada daria certo. Suas palavras são mágicas. É impossível não citar o maravilhoso trabalho da Gisele Souza, que me acompanha na série Novos Contos de Fadas, produzindo as capas dos livros, em especial de Príncipe do Deserto, que ficou perfeita. Minha querida e atenciosa revisora Deborah Ratton, que fez um trabalho incrível neste livro. Obrigada!


Nota da autora Antes de começar a ler o livro, eu gostaria que você lesse essa pequena mensagem que tenho para você. Possivelmente, no decorrer da história, você não encontre grande semelhança com o conto original de As Mil e Uma Noites e há um motivo para isso; estava tudo perfeitamente planejado, e eu tinha um roteiro a seguir, mas, conforme os capítulos foram passando, as coisas foram, de certa forma, saindo do controle. Pode lhe parecer estranho ouvir isso, mas os personagens foram mudando, suas atitudes também, levando a história a outro rumo. No conto original Sherazade luta por sua vida, contando histórias ao Rei Shariar, noite após noite, assegurando mais um dia de vida a ela. Em Príncipe do Deserto, Louise decide o mesmo, mas, em vez de histórias, escolhe outro método, que, infelizmente, em certo momento, torna-se falho. Precisei adaptar alguns detalhes no decorrer da história e, ao final, tive certeza de que foi o livro mais difícil de toda série, mas também o mais gratificante. Louise ganhou vida própria, floresceu, tornou-se forte, e eu precisei fazer mudanças no roteiro, no que eu tinha planejado para ela. Com Said não foi diferente, ele saiu de meu controle, tornando-se o personagem mais intenso de todos que já criei. Estou orgulhosa de Louise, por sua coragem, por ser uma mulher a frente de seu tempo, você perceberá isso na leitura. Orgulhosa também de Said, que com toda certeza você odiará até algum momento. Mas garanto que isso mudará! Para construir esta história, foi preciso muita pesquisa, horas e mais horas lendo sobre a cultura árabe, buscando mais conhecimento, principalmente sobre o papel da mulher na cultura árabe daquela época. Gostaria de deixar claro que repudio qualquer tipo de abuso, não só à mulher, mas a qualquer ser vivo. No entanto peço que considerem o contexto em que se passa a história; era outro, anos e anos atrás e muito diferente da realidade contemporânea, o que, muitas vezes, se não justifica, ao menos respalda as ações dos personagens, em especial de Said. Por último, eu quero desejar uma boa viagem a você. Assim que iniciar a leitura, será transportado para 1860, para um deserto insólito. Encontrará grandes aventuras, lutará por sua vida contra os salteadores e precisará se adaptar ao extremo calor. Mas também conhecerá o poderoso Sheik de Hamed, um homem possessivo, preconceituoso e difícil de conviver, mas que esconde alguém especial atrás de todo seu rancor. Desejo que você viva uma grande história de amor; seja beijada, iluminada pelas estrelas do deserto, lute com todas as suas forças contra o homem que ama, tornando-o alguém melhor, e, acima de tudo, não desista.


Seja bem-vinda ao deserto. Que Aláh guie seus caminhos.


Glossário de palavras: Abaya: Um tipo de vestimenta que cobre todo corpo. Semelhante ao vestido. Agarwood: É a madeira mais cara do mundo. É usada na produção de óleos e fragrâncias. Aljibe: Sala de banhos. Babaganuche: Pasta árabe à base de berinjela e tahine. Cahue: Café. Chancliche: Tipo de queijo árabe coberto por uma mistura de ervas. Hijab: Véu usado pelas mulheres islâmicas. Khol: Pigmento de cor escura usado pelas mulheres na pintura dos olhos.


Estrelas não podem brilhar sem escuridão.


Sumário Capítulo Um Capítulo Dois Capítulo Três Capítulo Quatro Capítulo Cinco Capítulo Seis Capítulo Sete Capítulo Oito Capítulo Nove Capítulo Dez Capítulo Onze Capítulo Doze Capítulo Treze Capítulo Quatorze Capítulo Quinze Capítulo Dezesseis Capítulo Dezessete Capítulo Dezoito Capítulo Dezenove Capítulo Vinte Capítulo Vinte e Um Capítulo Vinte e Dois Capítulo Vinte e Três Capítulo Vinte e Quatro Capítulo Vinte e Cinco Capítulo Vinte e Seis Capítulo Vinte e Sete Capítulo Vinte e Oito Capítulo Vinte e Nove Capítulo Trinta Epílogo A autora Outras obras na amazon



Capítulo Um Louise contemplou o céu azul sobre sua cabeça e pensou por um momento no quanto desejava estar em seu quarto, na Inglaterra, imersa em uma banheira de água aromática. Mas, em vez disso, estava ali, sob o escaldante sol da Arábia, com seu vestido e sapatos cobertos pela mesma areia fina que se agarrava a todos os seus pertences. Pegou a bolsa de pele que carregava amarrada a sua cintura e bebeu um pequeno gole de água, que, àquelas horas, já estava quase evaporando com o calor do deserto. Limpou a camada de suor que se acumulava em sua testa e suspirou, sentindo o quanto realmente desejava um banho e uma cama confortável, luxo do qual, obviamente, não disporia por ao menos um par de meses, enquanto seu trabalho naquele lugar não terminasse. Havia chegado ao porto de Harif há cerca de três semanas, junto de sua pequena equipe de escavação, Joshua, Will, Christopher e mais dois guias árabes que contratara para ajudá-los a chegar à região do deserto que pretendiam explorar. A viagem até o ponto em que estavam fora uma das maiores torturas que Louise já tivera a imensa tristeza de passar. Foram mais de cinco dias de suplício, os quais ela fora obrigada a passar sobre o lombo daquele enorme e estranho animal de única corcova que os árabes chamavam de dromedário; espécie que, se comparada a outros que ela conhecia, encontrava-se em extrema desvantagem. — Senhorita, acho que precisaremos voltar à cidade. — Will, usando um lenço vermelho umedecido em um pouco de água para refrescar o rosto, apareceu em frente à Louise. — Aconteceu algo? — ela perguntou preocupada. Se tivessem realmente que voltar à cidade, levariam cerca de dez dias para perfazerem o trajeto completo de ida e volta, o que significava que as escavações ficariam muito atrasadas, obrigando-os a protelar aquilo que Louise mais desejava: o retorno para a Inglaterra. O homem de baixa estatura tirou o chapéu de tecido e o bateu contra a coxa, retirando os minúsculos grãos de areia alojados ali. Olhou para Louise com uma expressão que ela julgou ser de medo. — Amed e Omar estão reticentes em continuar aqui. Disseram há pouco que o lugar onde estamos é amaldiçoado por Aláh e que, se ficarmos aqui, estaremos correndo perigo. — Will engoliu em seco, arrumando a armação dos óculos redondos. Louise o olhou por um momento e, depois de absorver a informação, sorriu debochada. — Achei que você não acreditasse nesse tipo de maldições, Will. Pensei que fosse um homem da ciência — ela disse, erguendo as sobrancelhas em um ato explícito de provocação. Ele piscou constrangido, limpando a garganta e recolocando o chapéu na cabeça. Estufou o peito e olhou sobre o ombro de Louise, retratando uma atitude que ela considerava típica dele, sempre que


tentava demonstrar sua masculinidade. Era um tanto curioso. Conhecera Will em uma das reuniões secretas sobre a possível descoberta de uma cidade perdida no deserto árabe, mais especificamente em Burayhe, pelo que se tinha conhecimento, um local habitado por povos nômades, o que não seria um grande problema para a equipe que explorasse a região. Na ocasião, enquanto usava seu disfarce de cavalheiro e bebericava um chá amargo, teve certeza de que estava preparada para tal aventura. Era exatamente o que precisava para mudar sua vida e provar a todos, inclusive a seu pai, que era muito mais que apenas uma solteirona de vinte e cinco anos abandonada por dois noivos insatisfeitos com o arranjo. Sobre isso, Louise tinha certeza de que certamente o problema não era com ela. O que poderia haver de errado em uma mulher se interessar por arqueologia, em deixar de comparecer a bailes e saraus para infiltrar-se nas reuniões secretas do pai? Ela realmente acreditava que não havia nada de mau nisso, embora os noivos não pensassem da mesma forma. Primeiro foi Nathan, que a cortejou durante toda a temporada há seis anos. Ele fora doce e gentil, tratando-a inclusive com muita estima e sempre demonstrando o quanto apreciava sua companhia. Louise gostava dele, tanto que muitas vezes deixara de estudar suas pedras e artefatos para passear em sua companhia, ou tomar chá e ler alguns poemas. No terceiro ano de noivado — que se estendeu mais do que Nathan gostaria —, ele foi convidado por sua excêntrica mãe a fazer o Grand Tour e conhecer cada canto do mundo. Foi um convite inesperado e sedutor, mais do que os encantos de lady Louise. Mas ela concordou e aceitou que seria um bom tempo, no qual os dois amadureceriam. No entanto, quando um ano se passou e Nathan regressou, ele já não era mais o mesmo e bastou algumas atitudes para o noivado chegar ao fim. Definitivamente, Louise havia ficado arrasada quando ele pedira para romper o compromisso por ter se apaixonado por uma jovem na Índia. O segundo pretendente que Louise desejava fervorosamente esquecer era um completo idiota; pretendia casar-se com ela somente pelos bens que estariam disponíveis depois da morte de seu pai. O noivo era um arqueólogo de meia-idade, à procura de uma jovem com uma fortuna disponível e que parisse seus filhos, ou seja; um caça-fortunas. Dessa vez fora Louise que, com sua perspicácia e paciência, conseguira espantar o noivo interesseiro. Contara algo sobre alguma maldição egípcia que seu pai, em uma de suas explorações, havia recebido, a qual recairia sobre toda sua linhagem, e isso bastara. Aí se comprovava quão acertado era o ceticismo de lady Louise a respeito de maldições; serviam apenas para amedrontar os ignorantes. Ela voltou a se concentrar em Will e, com um sorriso agora mais encorajador, tocou seus ombros dando-lhe conforto. — Não se preocupe com isso, Will. Garanto a você que maldições não existem. Tudo que Amed


e Omar querem é nos ludibriar, mas saiba que isso não vai acontecer — acalmou-o, batendo de leve em suas costas. Ele tomou uma longa respiração e olhou ao redor, ainda visivelmente incomodado. — Não sei, senhorita, os homens pareceram muito sinceros quando disseram que algo ruim aconteceria. Possivelmente eles estejam indo embora agora mesmo. — Buscou no bolso do casaco um relógio e conferiu a hora, olhando em seguida para o sol. — Logo anoitecerá, e temo que não será agradável ficarmos sozinhos sem a proteção deles. Louise usou a mão como viseira, tapando a claridade do sol, e olhou para o acampamento mais a frente, onde realmente os dois homens cobertos por túnicas estavam se movendo com pressa, carregando seus dromedários e proferindo ordens em sua língua nativa. Ela suspirou, irritada pelo fato de que Will tinha razão. — Falarei com eles — disse, ao passar pelo amigo, indo em direção à tenda onde os homens estavam. — Se precisar de mim, estarei me refrescando em minha tenda, senhorita — Will gritou atrás dela, ficando na ponta dos pés e acenando. Louise caminhou até chegar ao início do acampamento e deparou com os guias montando seus animais, prontos para partir. Ela se apressou em perguntar o que de fato estava acontecendo. — Aláh nos quer vivos, estrangeira. Devemos deixar esse lugar e, se quiser continuar pisando nesta terra, deve fazer o mesmo — o homem mais alto e mais moreno dos dois falou devagar para que Louise compreendesse suas palavras. Ela aprendera árabe com o pai e, apesar de ter um pouco de dificuldade, conseguia comunicar-se com os nativos. — Vocês não podem nos abandonar! Foram pagos para nos guiar e ajudar com as escavações! — falou balançando os braços exageradamente. Os homens se olharam por um segundo e depois um deles se voltou para Louise: — Todo seu dinheiro está com o homem de cabelos loiros, estrangeira. Não queremos o que é seu. Precisamos apenas sair deste lugar antes que a morte chegue. — Apertou os calcanhares contra a barriga do animal e o fez começar a caminhar. Irritada, Louise entrou na frente do dromedário, obrigando-o a parar. — Vocês não podem ir! — gritou, assustando o animal. Deu um passo para trás, um tanto desajeitada, pisando na ponta do vestido, mas logo se equilibrou e recobrou a postura. — Eu os proíbo! — Louise, escute. Não há nada que você possa fazer para mantê-los aqui — foi a voz de Christopher que surgiu ao seu lado. Ele acabava de sair de uma das tendas e caminhava até ela, impondo-se com seu enorme tamanho. — Você não conseguirá seduzi-los com dinheiro e muito


menos ameaçá-los. Os homens acreditam que estão correndo algum tipo de perigo e não ficarão neste acampamento em hipótese alguma. Deixe-os ir, Louise. — disse apaziguador. A mulher lambeu os lábios, dando-se conta de que Christopher estava certo e de que não poderia fazer absolutamente nada. Com um gesto rápido, instruiu os guias a se colocarem em marcha para fora do acampamento. Eles fizeram uma rápida saudação e instigaram os animais a avançarem deserto adentro. — O que faremos agora? — perguntou ao amigo, olhando para cima, procurando nele a resposta que tanto precisava ouvir. Mas ele apenas moveu os ombros e suspirou. — Suponho que continuaremos a explorar mesmo sem os guias — respondeu ela mesma. — Podemos fazer isso, verdade? Christopher olhou para baixo e encontrou os olhos dela. Segurou sua mão e a beijou de leve, o contato íntimo sendo evitado pela luva que ela usava. — Acredito que sim, querida. *** No final da tarde, quando o sol começava a se pôr, Louise ordenou a todos que parassem com suas funções e se preparassem para o jantar. Como era a única mulher do grupo, assumiu o preparo das refeições, que nas últimas semanas haviam se resumido a tâmaras e um tipo de queijo desconhecido que haviam comprado na cidade, o qual fora armazenado em uma daquelas horríveis bolsas de pele de animal. Apesar da comida pouco apetitosa, normalmente, todos se sentavam juntos, em volta de uma fogueira ao lado do acampamento, momento que servia para conversarem sobre os feitos do dia. Assim que o frio começava tornar-se insuportável, Louise retirava-se para sua tenda, enquanto os outros homens ficavam acordados até mais tarde, para depois descansarem também, sob a proteção dos guias árabes. Entretanto, naquela noite, não haveria a proteção dos guias e, consequentemente, os homens teriam que se revezar para garantir a segurança do acampamento. — Está tudo bem, senhorita? — Joshua perguntou ao ver como Louise estava concentrada nas chamas do fogo, mal piscando. Ela desviou o olhar e o fitou. — Estava pensando no quanto a sociedade ficará chocada ao saber que estou sozinha em um deserto com três homens — comentou, a voz estrangulada. Joshua tomou um gole do líquido escuro e amargo que os árabes diziam ser café e pensou por um momento antes de responder. — Deve saber que para nós a senhorita é como se fosse um homem — disse pensativo, depois sorriu largamente, soltando uma risada alta. — É claro que não somos estúpidos a respeito de sua


beleza, mas também sabemos o quanto essa expedição é importante, tanto para nós quanto para a senhorita. Louise apertou a manta que usava sobre os ombros e se encolheu, pensando no que ele dissera. — Meu pai deve me odiar — sussurrou olhando para o céu, agora vermelho-alaranjando. — Nunca irá me perdoar. Christopher levantou de onde estava e foi até ela, sentando-se ao lado e a confortando com um leve roçar em suas costas. — Ele irá, quando descobrir a brilhante arqueóloga que você é. E, quanto ao escândalo, o que é a sociedade sem ele? — perguntou, erguendo as sobrancelhas. Lady Louise se afastou sutilmente do toque do amigo e jogou um pedaço de galho seco contra o fogo. — No final, não será diferente de quando estive noiva. — Balançou os ombros, percebendo que na verdade pouco se importava com o que os outros diriam, já que provavelmente estava vivendo a grande aventura de sua vida. Era exatamente isso que ela buscava, certo?! — Vou me deitar — disse, levantando-se, olhando pela última vez para os homens. — Quero que todos estejam acordados bem cedo pela manhã. Se queremos encontrar as ruínas, precisamos trabalhar sem descanso. Todos concordaram, e ela tinha certeza que atenderiam a sua demanda. Confiava naqueles homens e sabia que lhe eram leais. Estudou cada um deles durante os meses em que esteve infiltrada nas reuniões do grupo de arqueologia, definindo o caráter de cada um, sabendo de seus possíveis crimes e também do trabalho e contribuição de cada para a ciência. Somente então, quando já sabia como todos se comportavam, marcou um encontro com os três e revelou seu disfarce de cavalheiro, contando sobre seus planos de viagem à Arábia, convencendo-os de que precisava da ajuda de cada um. É claro que não fora tão fácil assim, pois precisou provar o quanto sabia sobre as ruínas da cidade perdida de Al-Delíh e como pretendia descobri-las, além de garantir-lhes que teriam também seu lugar de destaque na Sociedade de Arqueologia da Inglaterra. Louise deitou sobre as duas camadas de mantas em sua tenda e cobriu-se com a que restava. Apesar de saber muita coisa sobre o deserto, não imaginava que o frio, que tinha certeza que encontraria, seria tão terrível como estava se mostrando. — Imaginarei que estou em uma cama confortável, e tudo ficará bem — murmurou enquanto se acomodava melhor. Bastou alguns minutos para que ela caísse em um sono profundo causado pelo cansaço do dia de trabalho. Nem mesmo a desconfortável acomodação foi capaz de impedi-la de suspirar aliviada sobre as mantas. ***


Lady Louise sonhou com um oásis repleto de água e árvores; algumas produziam frutos, e ela pôde até mesmo ver-se comendo um dos pêssegos rosados que estavam ao seu alcance. Parecia um dos sonhos que tinha quando era menina e passava os verões no campo, junto da mãe, enquanto o pai viajava em suas expedições. A despeito do sonho pacífico, no entanto, Louise acordou com um grito agudo, que a fez sentar-se rapidamente, abrindo os olhos de repente, tentando orientar-se. Um instante depois, outro grito mais alto foi ouvido, seguido de outro e mais outro. Aquilo era um grito de guerra? Ela se colocou de pé imediatamente, pensando no que estava acontecendo. Arriscou-se a olhar para fora da tenda, espreitando pelo vão da entrada e o que viu a fez entrar em choque; havia sete homens vestidos de preto, usando cimitarras afiadas, e eles mantinham Joshua, Christopher e Will como reféns. Louise arregalou os olhos diante da cena, sem saber o que fazer. Um dos homens tinha a maior cimitarra e a apontava diretamente para o pescoço de Christopher, enquanto perguntava algo aos gritos, empurrando cada vez mais a lâmina no pescoço do arqueólogo. Este fechou os olhos e disse algo. Suas palavras provocaram um acesso de ira nos homens, que sem piedade cortaram-no a face, correndo a cimitarra lentamente, o sangue escorrendo. Louise sentiu o estômago revolver quando o homem passou para o lado, indo até Joshua, que o encarava com ódio. Uma pergunta também lhe foi feita e, quando ele negou, em um segundo, a cimitarra atravessou seu estômago, fazendo-o cair de joelhos bem diante do homem de preto. Ela apertou as mãos contra a boca, sufocando um grito de terror que subiu por sua garganta. Joshua estava morto! Lágrimas começaram a descer por seu rosto quando o homem continuou seu trajeto até chegar a Will. Este estava chorando, tentando se agarrar à túnica do bandido, implorando por misericórdia, mas o golpe em sua barriga foi inevitável, e ele se calou imediatamente, os olhos esbugalhados enquanto uma fina linha de sangue escorria de sua boca. De olhos fechados, Louise voltou até o fundo da tenda, onde se ajoelhou, enterrando as mãos sobre o rosto; não queria mais ver aquela cena. E Christopher, o que aconteceria com ele? Eles o deixariam vivo? Oh, meu Deus, Joshua e Will... As vozes fora da tenda ficaram mais altas, um idioma nativo que Louise não conhecia e que era entonado de uma forma que a amedrontava. Ela se arrastou até a pequena abertura na entrada e espiou para fora, percebendo que Christopher não estava mais lá e que agora os homens recolhiam os corpos de Will e Joshua, empilhando-os em um lado. Foi quando percebeu um movimento à direita e encontrou Christopher sendo amarrado a um grande cavalo. Em seguida viu os três homens saindo a galope, levando seu colega arqueólogo para longe do acampamento.


Louise deu-se conta, então, de que estava sozinha, exceto pela presença de quatro dos homens, que vasculhavam o acampamento, procurando por algo. Encolheu-se novamente no fundo da tenda e começou a pedir aos céus por algum milagre, uma luz que mostrasse algum modo de sair dali sem ser vista. Se não fugisse, seria morta. Tomou várias respirações e formulou um plano. Poderia tentar cavar a areia e sair por baixo da barraca, pela parte de trás. Depois disso, correria o máximo que pudesse. Era sua única chance. Afastou as mantas para longe e começou a puxar a areia com as mãos, empurrando-a para a lateral, formando um amontoado. As vozes estavam mais perto, e ela sabia que sua tenda era a próxima, por isso acelerou seu trabalho. Viu as sombras chegando à parte da frente de sua tenda e, mesmo sem concluir o que planejara, Louise empurrou o corpo na areia, colocando metade do torso para fora. Com muito esforço, tentou deslizar para sair totalmente, mas, quando estava quase lá, sentiu alguém puxar seu pé. — Encontrei! — o homem gritou, puxando-a de volta. Louise gritou, debatendo-se, tentando chutar o homem, enquanto agarrava as porções de areia, desesperada para fugir. Então outro dos homens apareceu em sua frente, seus pés enormes ficaram diante dos olhos dela, que elevou o rosto para encontrar o líder do grupo. O lenço do turbante cobria seu rosto, mas, mesmo através do fino tecido negro, Louise conseguiu ver que ele estava sorrindo. — Aláh nos presenteou com uma estrangeira. — Abaixando-se, o homem a segurou pelos ombros e a ergueu facilmente, tirando-a do chão. — Solte-me! — Ela tentou chutá-lo, mas o homem a apertava com força, quase quebrando seus ossos. Logo ele começou a arrastá-la para o centro do acampamento, onde os outros o esperavam. — Deixe-me ir, por favor! — gritou em árabe, usando as palavras que considerava adequadas. — Ela nos servirá, senhor? — um dos homens perguntou, seus olhos caindo para o corpo de Louise. — Sim, ela nos foi dada por Aláh como um presente e agora será nossa escrava. — Com um golpe rápido, jogou-a no chão, fazendo-a ficar de joelhos. Os outros homens fizeram um círculo ao redor dela e desembainharam suas cimitarras, apontando para ela. — Você nos servirá, estrangeira. É sua chance de continuar viva. Ou prefere a morte? — A ponta da cimitarra tocou o lado esquerdo do peito de Louise, que fechou os olhos e prendeu a respiração. Não respondeu. O que deveria dizer? As duas opções eram horríveis. Irei morrer. Oh, perdoe-me, papai. Perdoe-me por tê-lo desafiado. Apertou os olhos tentando evitar que as lágrimas derramassem por seu rosto, mas foi inútil. Morreria ali, naquele deserto inóspito, e nunca mais voltaria para casa. Louise achou que tinha seu destino traçado, sua morte certa, quando de repente viu um dos


homens em sua frente cair de joelhos aos seus pés, com uma cimitarra atravessada em sua barriga. Ela abriu a boca para gritar, mas então os homens se dispersaram, atacando um desconhecido vestido de azul, que enfrentava cada um deles com habilidade, desferindo golpes rápidos, derrubando-os com um membro a menos. O desconhecido limpou o sangue da espada na capa que usava e encarou o homem que restara guardando Louise. Todos estavam chocados; ele havia matado os três homens com apenas alguns golpes e sem piedade alguma. — Solte-a — uma voz profunda e rouca veio do desconhecido, que caminhava lentamente até o homem e Louise. — Lute até a morte, infiel. Um servo de Aláh não mata seus irmãos. — O homem chutou Louise para o lado, dando um forte golpe em seu peito, fazendo-a cair. Em seguida usou o pé para afundar sua cabeça na areia, afogando-a. Com um grito que retumbou pelo deserto, o homem de azul avançou sobre o de preto, empurrando sua cimitarra contra ele, o som das lâminas ecoando alto. A jovem arqueóloga conseguiu se mover, erguendo a cabeça a tempo de ver os homens lutando bravamente. O guerreiro de azul cravou a espada no braço do outro, que gritou de dor. Ato seguido veio o desfecho, quando por fim a cimitarra foi cravada no peito do algoz de Louise, exatamente como ele ameaçara fazer com ela. A líder do acampamento fechou os olhos quando o corpo caiu inerte na areia. O homem de azul deixou sua cimitarra de lado e contornou o corpo do bandido, indo até Louise. Desorientada e com uma série de dores terríveis, Louise tentou ficar de pé e correr, mas suas pernas falharam e ela caiu novamente. Soluçou quando percebeu as mãos do homem segurando seus ombros impedindo-a de fugir. — Eu imploro, por favor, deixe-me ir! — Chorou ainda tentando lutar. Achou que havia sido salva da morte, mas que grande engano! As forças de Louise começaram a se esvair, e ela foi caindo contra a areia, rendendo-se às mãos fortes do homem. Eu não consegui, papai. Não consegui. Apenas notou quando o homem a içou e a segurou contra seu peito, carregando-a para longe. Ele parou para recuperar a espada, montando em seguida em algum animal alto, quando, enfim, os olhos dela se fecharam. *** Said apertou o corpo da mulher mais firme contra o seu, procurando uma forma de não machucála mais. Quando o salteador a feriu, ele perdeu o que lhe restava de humanidade e, ao ver sua


cimitarra entrar no coração do atacante, sentiu o gosto da vitória. Tivera sorte ao encontrar a mulher viva. Ouvira os gritos quando passava próximo ao acampamento e não foi preciso muito esforço para constatar que a pobre estava nas mãos de salteadores e que seu destino seria terrível. Não esperava encontrar uma cena como aquela. Estava apenas voltando de sua desgastante viagem à Omé, desejoso de retornar ao seu palácio, descansar e usufruir de algum conforto, quando seguiu seu instinto e salvou aquela mulher. Ela tinha traços diferentes das mulheres da região e vestia roupas totalmente inadequadas para o deserto. Usava um vestido de algodão que chegava aos pés, e os sapatos que já não levava eram fechados, ele mesmo os jogou sobre a areia. Além disso, o que chamou sua atenção fora a pele tão branca e os lábios rosados contrastando com o rosto redondo. Era bela. Said sentiu algo inquietante em seu corpo, mas ignorou rapidamente, sabendo que não deveria reagir assim. Pegou o pequeno reservatório de água e molhou os lábios da mulher. Em seguida umedeceu sua nuca tentando acordá-la. Não adiantou. Ela continuou inerte. Ele respirou fundo e golpeou os flancos do dromedário, sabendo que precisaria apressar sua volta para casa. A mulher precisava de cuidados, e ele lhe ofereceria isso.



Capítulo Dois Louise acordou lentamente. Sentia todo o corpo rígido e mal conseguiu abrir os olhos, tão inchados se encontravam. Apoiou-se em algo forte e sólido que a retinha. Tentou mover-se, mas a dor latejante que atingiu seu rosto e abdômen fizeram-na guinchar. — Não se mova — a voz de um homem a alcançou, assustando-a. Lady Louise forçou-se a abrir os olhos, enxergando por entre os cílios a figura de um homem imponente, bem próximo dela. — Solte-me. — Tentou empurrá-lo, apavorada ao reconhecê-lo como sendo o homem que tinha matado os bandidos. Ele a sequestrara! Fechou as mãos em punho e tentou golpeá-lo no peito, mas seus movimentos eram lentos, e ele facilmente segurou seus pulsos. — Por favor, não me machuque — pediu, quase à beira das lágrimas. Toda sua dignidade havia dado lugar ao medo de morrer, e ela definitivamente não queria isso. Said manteve as mãos da mulher presas à sua, impedindo que ela os derrubasse do dromedário. Aumentou o aperto em sua cintura e olhou nos olhos dela, procurando o motivo de seu medo. Ele era bom em conhecer a verdade das pessoas, sabia interpretar corretamente os sentimentos e anseios, algo considerado por sua tribo como sendo um presente de Aláh, mas, com aquela mulher, pouco conseguia compreender. — Não farei mal a você — garantiu, fazendo o animal parar para que a mulher pudesse se acalmar. Devagar, soltou os braços dela, prestando atenção aos seus movimentos, desconfiado de que ela tentaria algo. — Está ferida, e estou oferecendo cuidados à senhorita. Louise encolheu-se ao sentir o nó que se formou em seu estômago. Apesar de o homem usar o lenço do turbante cobrindo o rosto, era possível ver seus olhos azuis, contrastando com a pele bronzeada, e o rosto anguloso. Ele lhe dava medo. Pensou que poderia tentar fugir, porque, apesar de ele dizer que a estava ajudando, Louise tinha visto o bastante para saber que não deveria confiar em qualquer homem naquele deserto, principalmente em um que matava outros sem piedade alguma, atravessando uma espada em suas entranhas. Mas ela também era consciente de que não teria forças para fugir, não agora que sentia como se mil facas estivessem cravadas em seu corpo. — Eu preciso voltar para meu acampamento. Tenho que... — Não existe nada lá — interrompeu o homem, voltando a incitar o animal para que retomasse sua marcha. — Apenas morte. O corpo de Louise estremeceu, recordando de repente de como vira os amigos serem mortos brutalmente. Mordeu o lábio, procurando manter-se firme. — Para a cidade então — pediu, refletindo que depois de tudo deveria voltar para casa. Said bufou, olhando sobre a cabeça da mulher, sentindo-se irritando pela falta de percepção


dela. — Levaríamos mais de seis dias para chegarmos à cidade. Você precisa cuidar de seus ferimentos. Minha casa fica a mais um dia de viagem — disse sem olhá-la. — Está me levando para sua casa? — ela perguntou em um fio de voz. — Haverá mulheres que cuidarão de você e que lhe oferecerão conforto e descanso — afirmou ele. Louise fechou os olhos e suspirou. Não tinha outra opção e, se para deixar de sentir as terríveis dores ela precisava ir até a casa desse homem, correria o risco. Era isso ou ficar sozinha no deserto, à mercê de salteadores, da sede e da fome. Tentou novamente mover o corpo, porque a posição em que estava, encostada ao peito do homem, era muito imprópria e a deixava desconfortável. Porém os braços dele apertaram-na na altura da cintura, e a mantiveram no lugar, a grande mão massageando seu quadril, proporcionando um alívio e prazer estranho. — Está anoitecendo. Montarei o acampamento a alguns metros — ele informou. Said fez o dromedário abaixar-se para que, com muito esforço, conseguisse descer sustentando o corpo da senhorita, ouvindo-a gemer de dor no processo. — Consegue ficar em pé? — perguntou ao vê-la estremecer. Ela conseguiu apenas mover a cabeça. Ele então a equilibrou nos braços, enquanto puxava uma das mantas que carregava presa ao animal, e, depois de jogá-la sobre uma porção de areia mais alta, desceu-a para o chão, ajeitando-a com delicadeza. — Preciso que fique aqui até que eu monte a tenda. — Said ainda a ajudou a esticar os ombros e a deitar devagar. — Obrigada — Louise agradeceu, erguendo o olhar para o homem de pé, tão alto sobre ela. Ele ficou de costas e voltou para o dromedário, à procura dos apetrechos necessários para começar seu trabalho. Louise acabou deixando-se levar pelo desejo irresistível de fechar os olhos e descansar, para que a dor fosse embora. Adormeceu depois de contemplar o céu alaranjado, perdida na ideia de que estava presa em um terrível pesadelo e que, assim que acordasse, tudo estaria bem novamente. *** Said usou o dorso da mão para medir a temperatura do corpo de Louise e viu-se ao mesmo tempo acariciando o rosto machucado da bela mulher. Deixou que seu polegar contornasse as marcas arroxeadas que deixavam os olhos inchados e sentiu todo seu corpo estremecer de ódio. Deveria ter sido mais cruel ao acabar com a vida daquele homem, uma morte lenta e dolorosa,


reivindicando reparação por cada uma das feridas que haviam ficado no rosto da estrangeira. Ela era bonita. Mesmo com o rosto inchado e deformado pelas pancadas, era visível o quanto a mulher era encantadora. Provavelmente era inglesa. Tinha os traços aristocráticos tão valorizados na sociedade, e isso provocou certo sentimento de negação em Said. Ele afastou a emoção para o lado e se concentrou em acordar a mulher. — Estrangeira, está me ouvindo? — Segurou o rosto dela entre as mãos e chamou próximo ao ouvido. Ela se moveu franzindo a testa. — Precisa acordar e se alimentar. — Puxou a manta de pele que havia colocado sobre ela e apoiou a cabeça dela em seu peito. Louise inalou o perfume que atingiu seu rosto e suspirou, satisfeita com a névoa de tranquilidade que a invadiu. Negou-se a abrir os olhos, porque tinha medo de que ainda estivesse sonhando. Agarrou-se ao calor, bem-vindo enquanto estava exposta ao ar frio, e pensou que poderia ficar ali a vida toda, até ouvir a voz chamá-la novamente. — Apenas abra os olhos. Sim, ela os abriu rapidamente, encontrando o estranho homem muito próximo dela, mais do que antes e, mais ainda; estava colada ao seu peito e era provável que o calor que estava sentindo proviesse dele. Envergonhada, ela se afastou sutilmente. — Preciso de água — pediu, evitando olhá-lo. Em segundos uma das horríveis bolsas de peles foi levada aos seus lábios, e ela sorveu aos poucos a água, agora fresca, recebendo cada gota com prazer. — Vou ajudá-la a se sentar. Apoie-se em meus braços — Said disse ao deixar a água ao lado e começar a curvar o corpo de Louise, fazendo-a sentar-se devagar. Levou um tempo para que ela conseguisse e, quando o fez, parecia cansada. — Sinto-me como se tivesse sido pisoteada por um dromedário — ela comentou massageando as costas, enquanto olhava ao redor, notando a pequena tenda e a fogueira acesa. Said foi até a tenda e voltou carregando mais uma das pavorosas bolsas de pele que Louise tanto repudiava. Ele sentou-se ao lado dela, os joelhos dobrados, e ofereceu-lhe o conteúdo. Ela aceitou, embora receosa sobre o que encontraria ali, e, para seu desgosto, comprovou que eram tâmaras, fruta que era seu alimento desde que chegara naquele deserto. Seu estômago roncou tão alto e desavergonhadamente, que Louise não se importou em pensar muito no que estava comendo. Entre pequenas mordidas e goles de água, ela conseguiu saciar a fome, sentindo, no final, que estava começando a enganar a morte. — Algo errado? — perguntou quando entregou a bolsa, agora vazia, e viu que o homem a fitava com interesse.


Ele balançou a cabeça. Louise olhou para a bolsa e para o homem, corando em seguida. Tinha comido todas as tâmaras, e não deixara nada para ele! — Perdoe-me, eu pensei que... — ela gaguejou nervosa. — Eu comi enquanto você dormia — ele a interrompeu. — Ah. — Louise desviou o olhar, constrangida. — Agradeço por ter me ajudado. — Eu não tive escolha. Eles iriam matá-la — respondeu ele, aqueles incríveis olhos azuis ainda a fitando, mais misteriosos e intensos, efeito da noite e das chamas do fogo. Por que mesmo à noite ele ainda usava o lenço cobrindo o rosto? O que ele escondia? Louise tinha medo de sequer imaginar. — Tive que ver seus machucados e ter certeza de que nenhum osso estava quebrado — contou, apontando para seu corpo. — Você ficará bem. Quando chegarmos a minha casa, será aplicado um óleo curativo em sua pele. — Quem eram eles? — conseguiu perguntar sussurrando. — Salteadores do deserto. Procuram por riquezas ou qualquer coisa que seja vantajosa para eles. Às vezes escravas e mulheres para servi-los — respondeu irritado. A pele de Louise gelou ao recordar quando o homem disse que a faria sua escrava. — Meus amigos... — murmurou. — Christopher foi levado. Ele deve estar vivo, preciso encontrá-lo — disse mudando de posição, o ombro esquerdo latejando. Said ficou de pé e voltou a dar as costas a ela. — Não entendo o motivo de não o terem matado imediatamente, mas posso garantir à senhorita que ele não está vivo. Ninguém fica vivo em um ataque como aquele. Ninguém. Ela notou como seu corpo ficou rígido de repente, os ombros balançando junto com a respiração. — Você não entende. Ele é meu amigo, e eu não posso abandoná-lo — insistiu. O homem se voltou para ela, a expressão furiosa presente nos olhos. — Não seja tola, estrangeira. Pouco sabe sobre como a morte ronda o deserto, e como ela não poupa ninguém. Está viva, e isso basta — bradou, irritado. Lady Louise se encolheu, assustada pelo acesso de ira do homem. Cruzou os braços sobre o peito e voltou a deitar sobre a manta, cobrindo-se até o queixo. Ele não entendia! Ela não podia simplesmente abandonar Christopher daquela maneira. A menos que... Será que o homem estava certo? Ele estava mesmo morto? — Descanse novamente. Amanhã seguiremos viagem, logo que o sol nascer — Said informou e se afastou para verificar o animal. Louise não o questionou; ainda estava necessitada de descanso e suspeitava que o humor instável do homem não aceitaria seus protestos. Assim ela adormeceu novamente, sob o céu claro e


abrilhantado pelas estrelas. *** Um dia inteiro sobre um dromedário, certamente, era algo que Louise colocaria entre as primeiras posições em uma lista de coisas desagradáveis a fazer, principalmente naquele lugar cercado por areia e um sol escaldante. Também precisava adicionar o incômodo e estranho contato com o corpo másculo do homem, que ainda continuava a apoiando em seu peito, o que Louise não mais rejeitou, admitindo para si mesma que se tratava de um lugar extremamente confortável. Pararam poucas vezes durante o dia, nas quais Louise achou que derreteria ou, na pior das hipóteses, morreria cozida. Quando lhe disseram, na cidade, que deveria usar roupas mais leves e mais soltas, como as das nativas, a senhorita foi enfática ao dizer que não colocaria em seu corpo um vestuário tão obsceno. Não havia nada de errado com seus vestidos e, mesmo sabendo do calor, ela jurava que poderia aguentar, porque os verões da Inglaterra eram suportados pelas damas com pouco desconforto. É claro que tudo não passou de uma estúpida negação por parte de Louise. Esta sabia exatamente o que iria encontrar na Arábia, mas era tão teimosa e voluntariosa que não se deu por vencida. O resultado estava ali; quase morria com o calor e o sol sempre brilhando irritantemente sobre sua cabeça. Tivera o bom senso de pelo menos não usar meias e anáguas, apenas uma leve combinação e seu vestido de linho, mas, naquele momento, estava muito desejosa de rasgar as próprias roupas, sem importar-se com o pudor. As duas refeições que tiveram foram novamente as malditas tâmaras e o restante de água que possuíam. Sobre as dores, Louise diria que seu corpo não passava de um amontoado de membros os quais mal podia mover. Seu rosto, ao que parecia, continuava inchado, e seus olhos lacrimejavam pela secura do deserto, de modo que ela acabou aceitando quando o homem lhe ofereceu um lenço fino para cobrir o rosto. No final da tarde daquele dia, lady Louise notou como a paisagem ao seu redor estava começando a mudar e algumas plantas baixas, de aparência rústica, interpunham-se no caminho. Ela conseguiu enxergar, ao longe, várias árvores altas, de tronco comprido — deviam estar se aproximando da casa do homem. Ele vivia em um acampamento? Mais de uma hora depois, Louise notou que estivera terrivelmente enganada. O homem não vivia em um acampamento, e sim em um palácio! Aos poucos foram adentrando um caminho cercado por mais árvores e arbustos, que se estendiam por todo o norte. Havia várias tendas, construídas como as que Louise vira na cidade em que estivera. Crianças brincavam ao lado de algumas mulheres, que olharam com interesse para a


cena do homem amparando a mulher com roupa estranha. O palácio, em mármore branco, com um desenho interessante, baseado nos salões religiosos em formato oval que a senhorita vira em algumas figuras nos livros dos pais, era incrível. Assim que se aproximaram da magnífica construção, alguns homens usando longas túnicas os ajudaram a descer do dromedário. O homem manteve Louise em seu colo, enquanto caminhava para dentro do palácio, mas pouco olhou para ela, ocupado em distribuir ordens, proferidas em uma língua que a senhorita não conhecia, para as criadas que apareciam em sua frente. Quando chegaram a um pequeno cômodo fechado, onde havia dezenas de almofadas espalhadas pelo chão e uma grande cama disposta no centro, o homem acomodou Louise no colchão macio. — Logo as mulheres virão para cuidar de você, estrangeira — ele disse olhando-a atentamente. — Meu nome é Louise Manning. — Ela sorriu fracamente, quase se dando por vencida pelo cansaço. Ele puxou o lenço que cobria o rosto e fez uma breve mesura diante dela. — Said Abdul-Hadi, Sheik de Hamed, a seu dispor, senhorita — apresentou-se sorrindo. Louise precisou piscar várias vezes para sair do transe em que se encontrava após o choque pela revelação da aparência do homem. — Eu... Eu pensei que somente idosos ocupassem esse cargo — acabou refletindo em voz alta. Said arqueou as sobrancelhas, surpreso. — Bem, eu garanto que não sou nenhum velho — respondeu de pronto. As bochechas de Louise ficaram vermelhas, e ela olhou para o outro lado. — Preciso cuidar de algumas coisas. Avise se precisar de algo. — Said se apressou até a saída. — Espero que sua estadia seja boa, Louise Mannig — e com um farfalhar de suas roupas, ele deixou o quarto. Duas mulheres foram até Louise e lhe prestaram cuidados, passando algum tipo de óleo e bandagens, retirando o vestido, deixando-a nua, coberta apenas por um lençol fino. Tudo foi muito agradável, e ela ficou agradecida quando finalmente a deixaram dormir.



Capítulo Três Said vestiu a túnica sem a ajuda de seu auxiliar naquela manhã. Dispensou o jovem, pois precisava de privacidade e, naquele dia, diferentemente de todos os outros, sentia-se ansioso com a decisão que tinha nas mãos. Fechou os botões de ouro que pendiam em sua roupa e vestiu o elegante turbante adornado de pedras preciosas e fios de prata, cumprindo o religioso critério que seguia todos os dias. Levantavase antes de o sol aparecer sob as areias do deserto e usava parte de seu tempo da manhã para organizar-se sobre os assuntos do palácio e questões dos beduínos sob seu comando. A realidade era que o Sheik de Hamed também sofria do mal do sono e, mesmo que ninguém no reino soubesse disso, para ele, o infortúnio era recorrente, e parte de seu problema, resolvido por meio do prazer carnal. Pensou no quanto necessitava de alívio sexual e cogitou sobre qual mulher deveria buscar na próxima noite, já que as mulheres dispostas de seu reino estavam se extinguindo e, certamente, ele não sentia vontade de buscar uma concubina em outro acampamento, o que poderia, de certa forma, causar algum desentendimento local. Said sofria com seu vigoroso desejo sexual, o qual necessitava ser saciado diversas vezes, para que finalmente pudesse se concentrar em suas funções. Há três anos, quando seu inferno pessoal começou, não era difícil encontrar uma mulher disponível e voluptuosa que estivesse em pleno acordo de satisfazê-lo durante uma noite e que, na manhã seguinte, seguisse sem nem mesmo questionar suas ordens. Toda noite Said era presenteado com uma nova mulher totalmente disponível para seu prazer e, no nascer do dia, ela simplesmente ia embora, sem promessas ou envolvimentos. O ritual aparentemente estranho era uma forma de o Sheik encontrar o que procurava, sem comprometer-se. O problema era que, agora, na atual situação, não havia mais opções de mulheres dispostas para tal ato. Said também não obrigava nenhuma delas, mas as seduzia com promessas de joias, benefícios e, claro, prazer. Há exatos dois meses, Said agonizava em desejo mal contido, esperando ser saciado por alguma mulher que compreendesse suas necessidades físicas. Mas, quando sua opção de mulheres tornou-se nula, ele reprimiu seus impulsos, porque era convicto de que nunca, em nenhuma hipótese, deveria usufruir mais de uma vez do corpo de uma mesma mulher. Em todos aqueles anos, encontrara amantes de todos os tipos, algumas tímidas, outras eufóricas e selvagens, mas obviamente havia também algumas ardilosas, que planejavam usar seus trunfos para seduzi-lo. Nenhuma obteve êxito, porém. A única regra que impedia que Said levasse uma mulher para sua cama era o fato de ela ser virgem. Impusera tal lei a si mesmo, que refutava qualquer tipo de relação com jovens que pudessem facilmente se apaixonar ao deleitarem-se com seus prazeres. Era por isso que escolhia mulheres experientes e que sabiam o que estavam fazendo. Naquele momento, o que o Sheik mais queria era poder acalmar aquele turbilhão que fervilhava


dentro dele. Said deixou seu aposento e atravessou o estreito corredor recoberto por tapetes, até chegar à antessala que sucedia sua câmara. Encontrou o auxiliar disposto na entrada dos dois cômodos, segurando uma bandeja de prata perfeitamente polida, a qual amparava a inconfundível cimitarra do Sheik de Hamed, cujo cabo era encrustado com minúsculas pedras azuis e a lâmina brilhava mortalmente, revelando ter sido recém-limpa. Enquanto o vizir o cumprimentava respeitosamente, Said embainhou sua espada ao lado da túnica, prendendo-a no cinto de tecido grosso que carregava junto ao corpo. Ainda ouvindo os anúncios que o auxiliar ditava, caminhou até o centro da sala principal, passando distraído por alguns emissários que se inclinaram para cumprimentá-lo, esperando pacientemente para uma pequena reunião com o poderoso Sheik. Assim que se acomodou em seu imponente trono adornado em mogno e ouro, Said ordenou que o primeiro emissário se aproximasse e lhe informasse o ocorrido. O homem, nervoso, pôs-se a falar sobre as desavenças criadas há poucos dias, entre duas pequenas tribos próximas, a respeito de um poço que compartilhavam, mas que acabou tornando-se motivo de luta, quando um acusou o outro de usufruir de uma quantidade de água maior do que deveria. Era uma situação corriqueira, que aborrecia Said. Mesmo assim, ele prestava toda a atenção, dedicando-se a trabalhar para que o impasse fosse resolvido. Ao fim da audiência, anunciou que esperava os líderes das duas tribos em alguns dias no palácio, para que conversassem sobre o ocorrido e chegassem a algum acordo. Os outros dois homens traziam assuntos comuns e que eram do cotidiano local; a demarcação de um local próprio para a caça de gazelas e a compra de alguns novos dromedários para o uso doméstico dos membros do acampamento. Sobre isso, Said apenas ordenou que se dirigissem ao vizir, que lhes repassaria os valores. O último emissário revelou um assunto que preocupou Said. Tratava-se da notícia de um assalto a um acampamento a quase dois dias de viagem do palácio. Um grupo de estrangeiros havia sido morto por uma caravana de assaltantes do deserto. Estes haviam coberto a areia com o vermelho do sangue das vítimas, mas, no final, foram abatidos por um guerreiro misterioso, que lhes atravessara as entranhas com sua cimitarra. — Há notícias sobre algum sobrevivente? — perguntou o Sheik. O homem encolheu os ombros. — Alguns dizem ter avistado um dos salteadores na feira da cidade. Mas ele estava sozinho — disse em sua língua natal. Said concordou e com um gesto afastou o homem.


Imaginava que logo todos saberiam sobre o ataque ao acampamento da estrangeira e também como a havia salvado. A outra questão era essa; a estrangeira e o que quer que faria com ela. Comprovara ele mesmo que todos exceto um entre os homens que a acompanhavam estavam mortos. O único sobrevivente havia sido capturado e ele podia presumir, àquela altura, que já estava morto também, o que resultara no fato de que a mulher estava completamente sozinha. Uma coisa incomodava Said. Desejava saber o que uma mulher como aquela fazia, sem companhia feminina, perdida no deserto, junto de apenas homens, o que para ela parecia normal. Seria algum tipo de concubina que viajava com os homens para satisfazê-los? A ideia pareceu estranha na mente de Said, mas, baseado nos fatos que presenciara, principalmente quando a mulher referira-se aos homens mortos como amigos, ele começava a crer que seu julgamento estava certo; tratava-se de uma concubina estrangeira. De repente, a constatação do que ela era agradou Said. Recordou o quanto tinha gostado do contato com o corpo dela, e a percepção, apesar das horríveis vestes, das curvas sinuosas que ela parecia ter, feitas para o prazer de um homem. Inclinou as costas sobre a cadeira almofadada e sorriu sombriamente, pensando que gostaria muito de deleitar-se com ela. Mais ainda; sabia que conseguiria fazê-la dar-lhe prazer também. Era isso que importava e o que desejava. Em pouco tempo o Sheik já tinha decidido que usaria o corpo de Louise para seu prazer, que a levaria para seus aposentos, aliviando finalmente seu tormento e, Aláh era justo, ele gostaria muito disso. — Diga à estrangeira que solicito sua presença. Agora — ordenou ao vizir, pouco se importando em esconder a excitação em sua voz, que agora já descia para seu corpo. *** Ao acordar, um pouco perdida e sem saber exatamente onde estava, Louise procurou por seu vestido, percebendo que estava nua, coberta apenas por um lençol transparente. Sentou-se na enorme cama e examinou o quarto recheado de tapetes e almofadas, dando-se conta de que estava no palácio do Sheik que a salvou no dia anterior, quando estava prestes a ser morta. Engoliu em seco ao recordar as mortes dos amigos e esforçou-se para não permitir que as lágrimas voltassem a fluir. Sabia que não mais adiantava chorar e que a única solução era conformarse e seguir em frente. Mas como fazê-lo sabendo que a culpa das mortes de seus amigos era sua? Fora ela quem os trouxera para aquele deserto, que os convencera a acompanhá-la naquela aventura perigosa. O que diria para seu pai? E para a sociedade de arqueologia da Inglaterra? Oh, Deus, a situação era terrível. Mas por agora precisava sair daquele quarto e procurar pelo Sheik, agradecer-


lhe a ajuda e pedir-lhe auxílio para chegar até a cidade. Precisava voltar para a Inglaterra com urgência. Como não encontrou seu vestido, Louise enrolou-se no lençol e desceu da cama, caminhando na ponta dos pés até a porta, à procura de alguém que pudesse ajudá-la. Sentiu todo o corpo protestar devido às dores que insistiam em queimar em sua pele. Recordava certo momento, na noite anterior, quando algumas mulheres massagearam seus machucados com algum tipo de óleo perfumado. Para sua surpresa, a mesma mulher que a atendera no dia anterior estava do lado de fora do quarto, sorrindo, esperando para entrar. A jovem inglesa indicou que ela entrasse e a seguiu pelo quarto, enquanto a mulher deixava sobre a cama um vestido de cor marfim, de tecido transparente. — Meu senhor ordenou que a senhorita use para se apresentar ante ele — a mulher disse gentilmente ao virar-se para Louise. Esta última ergueu as sobrancelhas, surpresa pela ordem. — Qual é o seu nome? — Karida, senhorita — A mulher, ainda muito jovem, baixou a cabeça, sentindo-se envergonhada. Louise pegou o vestido nas mãos e o analisou, escandalizada ao constatar o quanto era indecente a peça. Será que naquele lugar não havia qualquer vestido que não deixasse nada à mostra? — Não usarei isto — disse, devolvendo a peça à cama. — Quero meu vestido, por favor. A mulher arregalou os olhos e ficou muito vermelha, provavelmente assustada ao ver alguém desafiar o poderoso Sheik. — Seu vestido foi queimado, senhorita. — Juntou as mãos em frente ao corpo e começou a tremer, sem conseguir levantar o olhar. Louise estranhou o comportamento da mulher. Ela estava com medo? — Não se preocupe, Karida. Você apenas estava seguindo ordens de seu senhor. Estou certa? — perguntou complacente. A mulher ergueu os olhos, fitando-a com cumplicidade. — Sim, senhorita. Lady Louise controlou a onda de náusea que sentiu. O que pensava o tal Sheik para ordenar queimar seu vestido? Quem ele pensava que era? Pois bem, falaria com ele imediatamente. Sem ter outra opção, Louise segurou o vestido nas mãos e, com grande coragem, dirigiu-se para o biombo de tecido no fundo do quarto. Voltou pouco depois, sentindo-se como se estivesse completamente nua. O caimento do vestido era diferente de todos os outros que ela já usara. O tecido era fino e, após abraçar seus seios um pouco grandes demais e aferrar-se à cintura, ressaltando as curvas sinuosas de seu corpo, caía em camadas leves através de suas coxas, revelando mais do que o


necessário, até seus pés descalços. — Senhorita, por favor, meu senhor a espera — Karida chamou a atenção de Louise, ainda envergonhada. — Leve-me até ele, Karida. — Louise estufou o peito e endireitou os ombros, procurando toda sua compostura. Acompanhada pela mulher, ela saiu do quarto e seguiu por vários corredores, recebendo olhares curiosos de outras mulheres que encontrava no caminho. Aquele Sheik tinha um harém? Era esse o motivo de tantas mulheres naquele palácio? — Por aqui. — Karida indicou uma enorme porta, onde dois guardas estavam postados, segurando grandes espadas, parecendo duas estátuas prontas para atacar quem quer que fosse. — Ele a espera — e antes que Louise pudesse dizer qualquer coisa, viu-se sendo empurrada pela mulher para dentro da câmara, onde entrou cambaleando, quase se estatelando no chão de mármore. Ela se endireitou rapidamente e ergueu o rosto, olhando para frente, encontrando o olhar de Said, que a fitava com curiosidade. Ela piscou, atormentada pela visão do homem sentado em seu trono como se fosse um rei, ostentando toda sua glória e beleza, fazendo Louise recordar um deus egípcio que tanto estudara. — Aproxime-se, estrangeira — o homem disse sem paciência, e a jovem caminhou rapidamente até ele, parando antes dos degraus que levavam até onde ele estava sentado. — Vejo que está melhor. Ela concordou com um gesto de cabeça. — Muito melhor, obrigada. — Por instinto cruzou os braços sobre o peito, tentando evitar o olhar esfomeado que o homem dirigia ao seu corpo, deixando-a desconfortável. — Se me permite, gostaria de dizer o quanto fiquei ofendida quando, ao acordar, fui informada que meu único vestido havia sido queimado. Como o senhor deve compreender... — Cale-se. — Perdão? — Louise inclinou-se para frente, confusa com o que acabara de ouvir. Said estava perdendo a paciência com a estrangeira. Primeiro, ao vê-la entrar em sua câmara vestida daquela forma, com suas curvas aparecendo sutilmente, havia ficado deslumbrado, o que causou-lhe uma insinuante ereção, deixando-o sedento de tocá-la. Sabia que se fosse outro tipo de homem poderia simplesmente jogar-se sobre ela e possuí-la sem que ela proferisse sequer uma única palavra, mas ele era diferente, e acreditava realmente que valeria mais a pena seduzi-la e tê-la desejosa e disposta em seus braços. Mas, quando ela abriu a boca e começou a falar daquele jeito irritado, Said percebeu que a mulher não era tão submissa quanto ele desejava. — Sua voz faz meus ouvidos doerem, estrangeira. — Fez um gesto com a mão, simulando


desdém. A face de Louise esquentou, envergonhada pela grosseria do Sheik. — Como queira, senhor. Usarei um tom de voz ameno para não ofender seus preciosos ouvidos. — Sorriu cinicamente. — Poderia, por gentileza, emprestar-me um transporte até a cidade? Deve perceber que necessito voltar urgentemente para meu país. Said a encarou por um momento, e Louise pensou estar confrontando o próprio diabo. O olhar dele... era... aterrorizador e, aliado a sua voz, causava-lhe arrepios, além de algo em seu estômago... — Sinto informar que não poderei ajudá-la, senhorita — falou sem mover sequer um músculo da face. Louise franziu a testa sem compreender a atitude arrogante do homem. — Compreendo. Então, poderia recomendar alguém que possa ceder-me uma montaria? Tenho certa pressa para chegar ao porto — insistiu. Said apoiou o queixo na mão e analisou a jovem de cima a baixo, comprovando o quanto realmente estava atraído por ela. Dezenas de imagens dela nua, contorcendo-se de prazer, invadiram sua mente, e ele viu-se quase gemendo com a tortura de seu pênis endurecido dentro de sua calça. Viu que ela esperava por uma resposta e, como queria acabar logo com aquilo, propôs-se a responder: — Seus amigos estão mortos, e somente a senhorita está viva. Eu salvei sua vida e a trouxe para meu palácio e agora está sob minha proteção. Abri as portas do meu palácio para a senhorita — disse de maneira honrosa. Louise concordou, balançando a cabeça. — E talvez a estrangeira não saiba, mas é costume de nosso povo oferecer abrigo a quem necessita e, como eu mesmo lhe disse, sou o Sheik de Hamed, cabe a mim zelar pela segurança de meus hóspedes — continuou ele. Ela não sabia onde ele queria chegar, mas a verdade era que não estava gostando nada do que estava ouvindo. — Não consigo compreender o que está querendo de mim, senhor — Louise disse receosa. Said sorriu lentamente, mostrando os dentes perfeitamente brancos, que contrastavam com sua pele morena e seus olhos azuis. Ela deu um passo para trás, assustada com o que viria a seguir. — Como está sozinha e desprotegida em meu reino, eu tomo o dever de protegê-la, senhorita. E, ao meu entender, estará segura somente se ficar em meu palácio — explicou devagar. — Está me dizendo que não me deixará ir embora? — Louise perguntou perplexa. O sorriso do Sheik voltou, e ele se levantou, descendo os degraus, indo até ela. Louise pensou em correr, mas suas pernas deixaram de funcionar, então simplesmente ficou parada, vendo aquele


homem alto e forte se aproximando dela. — Exatamente. — Parou a poucos centímetros de onde ela estava. — Deixarei mais claro para a senhorita; a partir de agora será minha escrava. — Só pode estar brincando comigo! —explodiu ela, apontando para o peito dele. Said segurou o pulso de Louise com força, mas logo relaxou o aperto. — É a verdade. Quero você em minha cama, atendendo meus desejos, e a senhorita não hesitará sequer um segundo quando eu ordenar fazê-lo. — Os olhos do Sheik pareciam soltar raios contra Louise, que não se encolheu como ele imaginava. — Está louco! — gritou, tentando se libertar. — Solte-me! Ele o fez, e ela aproveitou o momento para correr em direção à porta, desesperada para fugir daquele homem insano. Antes que pudesse ultrapassar a soleira, porém, dois guardas se colocaram em sua frente, e uma enorme mão a segurou pelo braço, quase a derrubando no chão. Ela gritou, debatendo-se, arranhando os braços do Sheik, mas foi inútil; ele era maior e mais forte. — Pare de se debater. Irá se machucar! — ralhou ele, prendendo-a contra seu peito forte, fazendo-a perder o ar. Os pés de Louise estavam fora do chão, balançando no ar, e seu rosto estava sendo esmagado contra o corpo do homem. Ela deu-se por vencida, sem forças para lutar. — Precisará controlar seu temperamento, escrava. — Said segurou o rosto de Louise e a fez olhar em seus olhos. — Não sou sua escrava! — berrou, tentando mordê-lo na mão. — É uma gata arisca. — Riu, deslumbrado pelo gênio dela. — Será divertido treiná-la. Treinar? O que o maldito estava dizendo? — Estou lhe avisando, senhor. Solte-me e deixe-me partir, ou irá se arrepender disso — ameaçou ela, entrecerrando os olhos. O Sheik sorriu maliciosamente. — E o que acontecerá comigo caso eu não faça o que está ordenando? — perguntou ironicamente. Ela lambeu os lábios, pensando em uma resposta rápida. — Eu o denunciarei ao consulado — disse por fim. Ele inclinou a cabeça para trás e gargalhou, como se realmente tivesse achado divertido o que acabara de ouvir. — Esquece que está em meu palácio, sob meu poder, em meu reino, que as leis são feitas por mim, e ninguém pode contradizê-las — informou ele. Louise murchou, desesperada. O que mais poderia fazer? Chorar não era uma boa opção, pelo menos não no momento.


— Não obedecerei suas ordens — disse entre dentes. — Sim, fará. — Said voltou a segurar seu rosto e dessa vez abaixou-se até ela, colocando os lábios junto ao seu ouvido. — Você me esperará em minha cama, de joelhos, pronta para satisfazerme. E, se for boa nisso, dou minha palavra de que te darei prazer, o maior prazer que já sentiu em sua vida. Louise ofegou, assustada com a reação do próprio corpo ao homem. Tentou se afastar, empurrando-o para longe, mas ele não cedeu. — Não me deitarei contigo. Prefiro ser pisoteada por uma dúzia de dromedários! — desabafou e praguejou, virando o rosto para o outro lado. Said irritou-se e a fez olhá-lo. — É isso que acontecerá caso me desobedeça. Meus homens estão prontos para cumprir qualquer uma das minhas ordens e deixe-me avisá-la, senhorita, que meus castigos podem ser terríveis. Estou dando-lhe a chance de escolher; ser castigada sem piedade, ou servir-me e ter todas as regalias que nenhuma das melhores concubinas já teve — disse, francamente, esperando por fim terminar com a discussão. Os olhos de Louise se encheram de lágrimas. Não tinha escolha alguma! Ou tinha? Deveria ser forte o bastante para sujeitar-se aos castigos? Mas a que custo? Estava sozinha naquele país e seria castigada sem piedade, dia após dia. Quando viu que ela não o questionava, Said teve certeza de qual escolha ela tinha tomado. — Tenho algumas coisas para resolver durante o dia, mas, à noite, quando eu retornar, quero encontrá-la em minha cama. E lembre-se; completamente nua e de joelhos, pronta para me satisfazer. — Ele então a soltou, deixando-a no chão com cuidado, e, depois de fazer um gesto para os guardas, saiu pela porta atrás do trono. Louise se ajoelhou no tapete púrpura e permitiu agora que as lágrimas caíssem em abundância por seu rosto. Escrava! Havia se tornado uma escrava. Pior ainda; uma concubina! Oh, Deus, o que faria agora? Precisava encontrar uma maneira de escapar e voltar à Inglaterra. Mas como?



Capítulo Quatro Louise foi levada novamente para seu quarto, escoltada por um homem alto, vestido de branco e que carregava uma espada em sua cintura. Mesmo que quisesse fugir, aquele certamente não era o momento mais oportuno. Mas ela sabia que haveria outros, porque era certo que não se permitiria continuar naquele lugar. — Entre. — O homem a empurrou para dentro do grande quarto, e ela resistiu à vontade de praguejar diante da grosseria. Karida estava próximo a enorme cama, agora coberta por um tipo de tecido dourado, que Louise quase acreditou ser ouro. A jovem inglesa respirou fundo diversas vezes para tentar manter-se calma, mas era difícil, tendo em conta que acabava de ser ameaçada por aquele terrível homem que conseguia amedrontá-la apenas com o olhar furioso. — Deseja alguma coisa, senhorita? — a mulher perguntou de cabeça baixa, a voz serena, demonstrando tranquilidade, tão diferente de Louise. — Preciso de ajuda para sair desse palácio, Karida — Louise disse, aproximando-se dela. — Tenho que voltar para meu país o mais rápido possível. — Sinto muito, mas eu não posso ajudá-la. Devo lealdade ao meu senhor — respondeu ainda sem levantar o olhar. Lady Louise sentou-se na cama e suspirou, nauseada ao pensar em como Karida conseguia ser leal a um homem como Said. Era óbvio que ele a obrigava. Era simplesmente impossível que uma mulher pudesse se submeter a algo tão baixo. — Karida, já saiu desse palácio alguma vez? — perguntou, mudando a tática, esperançosa de que conseguisse tocar o ponto fraco da mulher. Pareceu funcionar, porque ela de repente ergueu o olhar, interessada no assunto. — Meu senhor me trouxe para cá quando fui capturada por seus homens — contou em voz baixa. Louise franziu a testa, não conseguindo compreender sobre o que ela falava. — Você é uma escrava, Karida? — esforçou-se para perguntar, tocando de leve os ombros da mulher. Ela se retraiu ao toque, afastando-se para trás. — A senhorita não compreende. Meu senhor, nosso sheik, salvou-me. Era impossível acreditar que um homem como aquele, tão desprovido de misericórdia, pudesse ter salvado alguém. Karida havia dito que os homens de Said a haviam capturado. Como ela podia dizer que fora salva? Louise tinha mais perguntas, mas parecia que a mulher não estava nem um pouco inclinada em respondê-la e muito menos disposta a ajudá-la a fugir. Porém, não desistiria. Se não houvesse alguém


que a ajudasse, ela mesma, sozinha, conseguiria sair daquele odioso palácio. Formularia um plano e colocaria em prática silenciosamente, sem que ninguém desconfiasse. — Meu senhor ordenou que a senhorita conheça o palácio. Ele me permitiu que a acompanhasse — Karida informou, para deleite de Louise, que previu uma grande oportunidade naquele estranho passeio. As duas deixaram o quarto, acompanhadas pelo mesmo homem que vigiava Louise e que ainda lhe causava um medo intenso, resultado de seu enorme tamanho e da mortal cimitarra que levava presa ao corpo. Karida foi à frente de Louise, conduzindo-a pelo corredor de tapetes, até chegarem a um grande cômodo circular. Lá havia centenas de almofadas espalhadas pelo chão, e as paredes cobertas por cortinas carmim, em conjunto com os almofadões no centro, atribuíam ao lugar um aspecto mágico. A inglesa conseguiu perceber alguns detalhes, que lhe chamaram a atenção. Tudo naquele lugar era bordado em ouro, inclusive os delicados tecidos, que cobriam o batente de uma janela de pedra, enfeitando-a com uma beleza harmônica. — Esta é sala onde meu senhor e seus homens fazem as refeições — Karida explicou enquanto atravessavam o cômodo, desviando das almofadas meticulosamente arrumadas. Ao saírem da grande sala, entraram em um corredor semelhante ao outro, porém maior em extensão. O homem continuava a segui-las tranquilamente, o que deixava Louise desconfortável, sabendo que, se tentasse qualquer coisa, seria morta em segundos. Ela engoliu em seco, sentindo que uma terrível dor se apossava de seu rosto, fazendo-a recordar-se do homem a espancando naquele dia. Tentou afastar o pensamento e se concentrar no caminho, esperançosa sobre o que viria pela frente. O que encontrou no final do corredor a fez arfar. Louise caminhou lentamente, olhando para cima, contemplando o céu azul e o sol quente, que fez arder sua pele. Ao seu redor havia uma grande quantidade de plantas e flores, além de palmeiras que chegavam ao vão, no teto. Alguns cactos espinhosos que ela não conhecia lembraram-na da terra inóspita onde se encontrava. E havia mais. No centro do jardim, imponente em sua beleza, uma fonte em mármore branco, esculpida em formato de jarro, derramava a água cristalina de volta para o reservatório. Era belíssimo, e a lady não resistiu; caminhou até lá e mergulhou as mãos na água, deleitando-se ao encontrá-la fresca. — Como é possível? — perguntou a Karida, sorrindo fascinada. A mulher, parada ao lado dela, moveu os ombros. — Não compreendo exatamente. Apenas sei que é obra de meu senhor. Ouvi dizer que ele conseguiu transportar a água do poço até aqui.


— Ele conseguiu canalizar a água — Louise sussurrou encantada. — Isso é incrível! O lugar era um verdadeiro paraíso, e ela estava sedenta de ficar ali pelo resto do dia, deleitando-se com aquela beleza surreal. Oh, Deus, seu pai ficaria tão surpreso com aquele lugar! Uma tristeza repentina a invadiu, e Louise caminhou para a extremidade do jardim, até as flores de cactos, que irradiavam suas cores alegres. O homem seguiu atrás dela, parando ao lado, e ela se viu em um surto de desespero, querendo correr para fora daquele lugar. Precisava voltar para casa. Suas mãos começaram a suar, tremer, e Louise imaginou-se correndo para o corredor em direção à saída. Poderia despistar o guarda e esconder-se em algum lugar até que conseguisse fugir. — Senhorita, vamos continuar. — Foi Karida quem apareceu ao seu lado e lhe tocou a mão, parecendo ciente do que acontecia com ela. Louise então retornou à realidade e, com um pouco de equilíbrio, conseguiu seguir a mulher para fora do jardim, novamente entrando em um corredor como os outros em que havia passado. Ela permaneceu naquele estado de torpor até chegar a um novo salão o qual, ao contrário do outro, não se encontrava vazio. Estava tomado por algumas mulheres, todas vestidas com aquelas exóticas roupas coloridas, que, para Louise, ainda pareciam escandalosas, por mais que naquele momento ela também se vestisse daquela forma. Todas as mulheres eram belas, seus cabelos longos e negros chegavam à cintura e estavam adornados por pedras e correntes de ouro. Elas usavam também uma espécie de pintura nos olhos, que os tornavam mais negros e atribuíam-lhe, ainda, a aparência de um felino. Quando perceberam a presença de Louise, as mulheres a fitaram com curiosidade, percebendo que ela não fazia parte de seu povo. Mas logo depois sorrisos brilharam nos rostos das mulheres, que se aproximaram de onde ela estava. Uma das mulheres, alta e de pele morena, cumprimentou Louise com um beijo no rosto e disse algo em uma língua a qual a inglesa não identificou. Confusa, esta olhou para Karida em busca de respostas. — Ela se chama Akilah e lhe deseja boas-vindas. E que Aláh esteja ao seu lado — explicou a mulher. — Diga que eu agradeço — Louise respondeu, forçando um sorriso, e esperou até que Karida transmitisse seu agradecimento. Sorrindo, a mulher despediu-se e voltou para junto das outras, para o trabalho que, Louise percebia agora, era próprio das mulheres naquela cultura. A sala era uma cozinha, e todas as que estavam ali trabalhavam para Said. Parte delas esfolava um carneiro, enquanto outras misturavam algum tipo de farinha em uma caixa de pedra, todas cantando alegremente. Aquelas mulheres eram escravas de Said? Ou... Quando a consciência do que realmente aquelas


belas mulheres eram tomou conta de Louise, ela precisou apoiar-se a uma parede, enjoada ao descobrir que o que estava vendo ali, possivelmente, era o harém do Sheik de Hamed. Pelo que sabia sobre os haréns, as mulheres eram mantidas pelo Sheik exclusivamente para seu prazer, e ele as controlava de forma dominadora. Porém, era estranho ver aquelas mulheres trabalhando na cozinha. Normalmente as concubinas, como eram chamadas, viviam cercadas do luxo, esperando apenas pelas ordens do Sheik, que as esperava em sua cama. Havia algo errado ali. Pensou em perguntar a Karida, mas resistiu à curiosidade. A verdade era que estava com medo da resposta, porque Said havia dito que ela agora era sua escrava e que a queria em sua cama. Então... Ela era como aquelas mulheres? Não! Jamais aconteceria tal coisa. Ela não permitiria. Karida explicou que precisavam voltar para o quarto, e Louise seguiu atrás dela, agora mais nervosa do que nunca. Fizeram todo o caminho de volta e, como sempre, o guarda seguia no encalço da inglesa. De volta ao quarto, Karida disse que seria servida uma refeição à senhorita. Avisou que se retiraria, mas que, no final do dia, retornaria. Por fim, Louise se viu sozinha outra vez, trancada naquele enorme e vazio quarto. Bem, na realidade, não estava completamente sozinha, tinha certeza de que estava sendo vigiada pelo lado de fora do quarto. Ela deitou-se na cama e lá permaneceu por algum tempo, até a porta ser aberta e uma jovem entrar carregando uma bandeja com comida, que foi deixada sobre a cama. Faminta, Louise saboreou o pão e a carne fria que estava cortada em pedaços, ambos temperados com um pó vermelho picante, muito saboroso. Na bandeja havia também figos açucarados e um chá escuro de sabor forte, mas que combinava com o doce da fruta. Ela se fartou, comendo até que nada mais coubesse em seu estômago. Estivera vivendo por dias à base de carne assada e tâmaras, agora aproveitaria a boa comida que lhe era servida. Já satisfeita, deixou a bandeja ao lado da porta e voltou para a cama, sentando-se relaxada, preocupada agora em formar o plano para sair dali. Aconteceu, porém, que, aos poucos, a jovem foi caindo em um sono pesado, que logo foi tomado por pesadelos em que Said a castigava batendo em suas costas com um grosso chicote de couro, enquanto o sangue tingia a areia clara. Acordou com um gemido e agradeceu por ter sido apenas um sonho ruim. Moveu-se na cama sentindo ainda as dores queimando em seu corpo e imaginou como seria se o Sheik resolvesse lhe castigar. Ficou quieta, imóvel, esperando que as dores cessassem, até que de repente a porta foi aberta e duas mulheres, além de Karida, apareceram no quarto. Louise sentou-se rapidamente, gemendo de dor, mas enfrentando o olhar das mulheres. — Está no fim do dia, e nosso senhor ordenou que a preparemos para a noite, quando deve


encontrá-lo — Karida explicou indo até ela. Louise pulou para o outro lado da cama, defendendo-se com uma almofada. — Não irei a lugar algum! — gritou assustada. As duas mulheres olharam-se entre si, e uma delas saiu até a porta, voltando acompanhada pelo guarda. — Sinto muito, senhorita, mas são ordens de meu senhor. Nada de mal lhe será feito — e Karida deu espaço para que o musculoso homem avançasse até Louise, que atirou a almofada nele e tentou fugir. Ela foi facilmente interceptada, sendo arrastada até a porta. —Solte-me! — Empurrou o homem para o lado, mas ele era tão forte que o movimento foi mínimo. Mesmo sob protestos, Louise foi arrastada para fora do quarto, as mulheres a seguindo, enquanto ela ainda tentava lutar por si mesma, esmurrando o peito do homem, firmando os pés no chão. Mas tudo foi em vão. Logo estava em frente a uma grande porta guardada por mais dois homens, e um grito de pânico saiu de sua garganta devido ao medo do que a esperava. Oh, meu Deus, o que aconteceria a ela?



Capítulo Cinco Said sentia a cabeça arder como o próprio inferno. Acabara de chegar de um acampamento em que o chefe falecera de repente, pelo que fora chamado para mediar as negociações entre os filhos do homem, que tinham o direito a sucedê-lo. Isso tinha tomado a maior parte de seu dia e, mesmo cansado das intermináveis horas de discussão sobre a união da tribo, o Sheik ainda viu-se preso em um problema sobre a distribuição das tarefas dos servos do palácio, o que levou mais uma parte de seu tempo. Acabava de voltar para o palácio, e o sol já se punha sobre as dunas de areia, levando o calor escaldante, permitindo que a noite chegasse junto do ar frio. Em seu quarto, retirou a grossa túnica e removeu o turbante, além da cimitarra, deixando-a sobre uma mesa ao lado da cama. Dirigiu-se para a sala conjunta ao quarto, onde a grande banheira cheia de água e óleos o despertou. Exausto, retirou a camisa que usava, puxando a calça e as sandálias em sequência. Suspirou quando mergulhou na água morna, sentindo o corpo relaxar rapidamente com a sensação de tranquilidade o invadindo. Apoiou a cabeça na borda de mármore e fechou os olhos, permitindo a si mesmo aquele precioso descanso. Precisava estar disposto para quando enfim tivesse a estrangeira em seus braços. Era provável que naquele momento ela estivesse pronta para ele, recebendo as instruções de como deveria satisfazê-lo naquela noite. O Sheik sorriu satisfeito; somente o pensamento do que faria com ela despertou seu membro, tornando-o duro como pedra. Ainda de olhos fechados, abandonou-se ao escorregar a mão até seu pênis, sentindo-o inchado e pronto para o prazer. Gemeu roucamente enquanto a mão deslizava por seu comprimento e o polegar rodeava a ponta, fazendo com que seus quadris se movimentassem exigindo liberação. Ele então parou. Não encontraria o prazer naquele momento. Estava terrivelmente excitado e, por mais que desejasse libertar-se, esperaria até fazê-lo no corpo de Louise. Sentiria mais prazer e seria recompensador. Said usou o sabão de Agarwood para ensaboar o corpo e remover o pó da viagem, enquanto pensava na maneira como deveria possuir Louise. Forte e rápido, como tanto desejava, ou delicado e lento como uma mulher gostaria? Sabia que ela já conhecia os prazeres secretos do sexo, e isso, aliado ao fato de que seu corpo estava sedento por algo selvagem, incentivava-o a escolher a primeira opção. Seus pensamentos foram interrompidos por um grito estridente, que o fez ficar de pé rapidamente e sair da banheira, ainda nu, de volta para o quarto.


O quê, em nome de Aláh, estava acontecendo? *** Louise gritou com todas as suas forças quando lhe disseram o que deveria fazer com Said naquela noite. Era... terrível! Ela foi empurrada para dentro de uma sala onde havia duas banheiras. Obrigada a entrar em uma delas e a banhar-se na presença das duas mulheres, teve que tolerar o auxílio de ambas, que, inclusive, ajudaram-na a lavar os cabelos e insistiram em esfregar seu corpo. Em seguida, Louise foi enrolada em uma toalha e levada para uma cama onde, apavorada, descobriu o que fariam com ela. — O quê? — perguntou em choque, quando uma das mulheres lhe mostrou uma vasilha com uma mistura de mel que, segundo Karida, seria usada para remover os pelos de seu corpo. — Não permitirei tal coisa! — berrou, levantando-se da cama e seguindo em direção à porta. Mas o maldito guarda estava lá, e ela foi obrigada voltar. Para sua infelicidade, Louise não teve outra opção a não ser submeter-se à horrível tortura. Definitivamente, foi uma das piores coisas que já enfrentara na vida. E a mais humilhante também. Dignou-se a fechar os olhos enquanto as mulheres trabalhavam removendo os pelos de suas pernas e de seu monte púbico, fazendo-a morder os lábios para não gritar. Para seu alívio, depois da tortura, ela foi agradada com um óleo morno que foi espalhado em seu corpo; segundo as mulheres servia para amaciar e acalmar a pele. Como se ela fosse um animal! — pensou indignada, mas acabou se rendendo ao perfume de rosas que se desprendia de sua pele, quase se esquecendo do medo que estava sentindo. Isso, é claro, até ser levada de volta ao seu quarto e receber aquelas escandalosas noções do que deveria fazer! — Jamais farei isso! — Colocou as mãos na cintura e encarou Karida furiosa. Como a mulher tinha coragem de lhe dizer que deveria ajoelhar-se aos pés do Sheik e... Usar a boca para lhe dar prazer! Aquilo era uma afronta! Havia mais mulheres junto a Karida, e elas pareciam assustadas com a atitude de Louise. — Senhorita, eu lhe garanto que isso agradará muito ao meu senhor. — uma das mulheres garantiu. Louise gemeu consternada. O que passava pela cabeça daquelas mulheres? — a inglesa se perguntava, mas pouco teve tempo de refletir, pois começou a ouvir vozes exaltadas vindas do lado de fora da porta, e se assustou quando viu Said empurrar a porta e entrar a passos largos no quarto. — O que está acontecendo aqui? — ele perguntou com a voz pesada, fazendo Louise se encolher e as mulheres a sua volta baixarem a cabeça. Said estacou em choque ao ver Louise vestida daquela maneira, ou melhor, desnuda; o corpo envolto apenas por um fino tecido dourado. Sua reação foi instantânea, e ele precisou pensar rápido


no que fazer. — Como ousa entrar aqui dessa forma? — a estrangeira perguntou, horrorizada, escondendo-se atrás das mulheres. — Saiam — o Sheik ordenou às mulheres, que se levantaram e saíram correndo, deixando Louise desprotegida. Assim que a porta foi fechada e os dois ficaram sozinhos, Louise olhou para os lados, à procura de uma rota de fuga, em busca de um plano de salvação. — Eu aviso... — Não consegue manter a boca fechada, senhorita? — Said cruzou os braços em frente ao corpo e a encarou. Ela entrecerrou os olhos em uma atitude que ele considerou excitante. Said saiu da posição em que estava e caminhou lentamente até a cama. Louise assustou-se e se afastou para o outro canto, próximo à parede. — Vai me dizer por que gritou? — ele perguntou com a voz mais baixa. Oh, céus, o Sheik parecia um predador indo direto para caça... A forma como seus olhos azuis contrastavam com a pele morena e os cabelos azeviche, a barba grossa... Ela fechou os olhos para evitar o contato. — As mulheres me disseram algo impróprio. — O que elas disseram? Ela agora podia sentir a cama se movendo e teve certeza de que ele estava se aproximando. Ainda de olhos fechados, balançou a cabeça negando-se a dizer. — Abra os olhos e fale. Ela não o fez, e ele insistiu: — Faça. É uma ordem. Diante daquelas palavras, Louise abriu bem os olhos e o fitou com ira. Ordem? Como ele ousava...? — Disseram-me o que eu deveria fazer para agradá-lo — respondeu por fim. A expressão de Said se suavizou, aos poucos, e houve um momento em que Louise jurou vê-lo sorrir. — Bem, há muitas coisas que uma mulher pode fazer para me agradar. Agora me pergunto o que exatamente elas disseram a você. Irá me contar, verdade? — Ele usou um tom de voz tão macio e tranquilo que foi como se tivesse voado sobre Louise e a sacudido. Ela deu de ombros, olhando para outro canto do quarto, ignorando furtivamente a presença dele. Se o Sheik achava que poderia afugentá-la somente tocando em um assunto tão impróprio, estava errado. Ora, ela era uma mulher adulta e sabia muito da vida.


— As mulheres me orientaram a mordê-lo — disse simplesmente, como se fosse algo muito comum a se dizer. Said franziu o cenho, realmente achando engraçado o que ela acabara de dizer. — Acho que entendeu errado o que lhe foi dito. — Aproximou-se mais dela, empurrando-a contra a parede. Estava tão próximo que foi capaz de sentir o perfume de rosas, provavelmente do óleo que lhe fora aplicado na pele. Sentiu uma onda de desejo ferver em suas veias e percebeu que aquela noite seria pouco para sanar todo o ardor. — Deixe-me explicar corretamente. — De joelhos sobre a cama, com os braços em volta da cintura de Louise, Said se acercou mais, deixando que os lábios pairassem sobre o ouvido da inglesa, e sussurrou: — Usará sua boca para me dar prazer. Envolverá meu pênis e sugará como se estivesse sedenta por isso, e, tenha em mente; você estará. Louise mordeu o lábio inferior e prendeu a respiração. O toque do homem era tão bom e a estava afetando terrivelmente. O enorme e musculoso corpo estava colado ao seu e, mesmo sobre a longa camisa que ele usava, era possível sentir o quanto estava quente. O cabelo úmido e perfumado a inebriava, enquanto seus lábios pulsavam em um lugar especial atrás de sua orelha. Oh, senhor, ela queria tanto se afastar, correr e gritar, mas seus membros estavam instáveis demais para isso. Said arrastou um beijo pela lateral do pescoço de Louise, até chegar ao queixo, onde a mordeu de leve, provocando-a com a barba. — Se me satisfizer como desejo, prometo que serei bom o suficiente para lhe fazer sentir-se bem e gozar comigo — murmurou contra a pele dela. Quando ergueu os olhos, viu que Louise tinha os lábios abertos e arfava à espera de um beijo. Ele era um homem que não perdia oportunidades e não seria tolo suficiente para fazê-lo agora. Louise estava de olhos fechados quando sentiu o toque da língua do homem em seu lábio. Logo ele os chupava com desejo, fazendo-a abrir os olhos em espanto. Ele a estava beijando! Ela tentou empurrá-lo, mas os ombros dele mal se moveram. A persuasão sobre seus lábios continuou e, quando ele introduziu a língua dentro da boca dela, a inglesa viu-se perdendo a batalha miseravelmente. O Sheik segurou o rosto dela entre as mãos e aprofundou o beijo, querendo mais e mais. Fazia meses desde que beijara pela última vez e, talvez, fosse esse o motivo que o fazia quase perder o controle. Enquanto explorava a boca de Louise, provando o quanto ela era doce, Said comprovou que seu corpo latejava em desespero. Os gemidos que escapavam da garganta da lady o incitavam mais, e ele já não sabia mais o que fazer. Louise assustou-se quando sentiu a mão de Said tocando seu seio, apertando seu mamilo,


tornando-o dolorido, mas de um jeito bom. Não... Não queria aquilo. Said gritou quando a estrangeira mordeu seu lábio, empurrando-o na cama, tendo tempo para correr para o outro lado do quarto. — Isso custará caro a você — disse ele, limpando a marca de sangue de sua boca. Encarava Louise com tanta fúria que ela achou que morreria ali mesmo. Ele ficou de pé e foi até ela, encurralando-a contra a parede. — Não me toque. — Louise virou o rosto para o outro lado. Said a segurou pelo pescoço, não exercendo pressão, mas apenas mantendo-a no lugar. — Não a machucarei, por maior que seja minha raiva. E também não a tomarei essa noite. — Empurrou contra Louise o quadril protegido pelo fino tecido, fazendo com que ela sentisse o quanto estava excitado. — Farei com que implore de joelhos para que eu a tome. — Nunca farei isso — cuspiu, encarando-o nos olhos. Said viu uma força nela que o inquietou. E, por Aláh, ele queria tanto corrompê-la. — Sim, fará. — Pousou os lábios sobre o mamilo de Louise e, mesmo sobre o tecido, sugou-o com força, fazendo um som rouco sair dela. — Há tantas coisas que quero fazer com você. — Sugou o outro, passando os dentes para provocá-la. — E eu juro que irá gostar de cada uma delas. Louise queria chorar. Por que ele não a soltava? Não queria gostar daquilo, e suas forças estavam sendo poucas para continuar com a resistência. — Pare, por favor — era um pedido desesperado, mas por medo de gostar. Ele deixou a mão deslizar para a perna exposta, depois para a parte interna da coxa. Soltou um grunhido quando seus dedos encontraram o calor úmido do sexo de Louise e, quando os movimentou encontrando o ponto sensível, notou a umidade que lubrificava seus dedos. Estimulou-a levemente, sem a intenção de ir mais longe — queria dar-lhe apenas uma amostra do que aconteceria — e então retirou a mão rapidamente. Para chocá-la ainda mais, levou à boca os dedos, sugando-os, enquanto mantinha seus olhos presos nos dela. — Saborosa — falou encantado. Precisava ir. Agora. Soltou-a devagar e deu-lhe as costas. — Nosso encontro acontecerá antes do que imagina, estrangeira. Fique preparada — e sem olhá-la mais ele se foi, trancando a porta ao sair. Sozinha, Louise escorregou até o chão, débil demais para conseguir agir, ou falar, ou pensar... O que tinha acabado de acontecer ali? Ainda com o corpo queimando, Louise deslizou a palma da mão até os seios e os apalpou, notando-os doloridos. Apertou as coxas e gemeu alto quando sentiu a sensibilidade deliciosa que ardia ali. Ela queria mais... Queria que aquilo continuasse.


Sentiu-se mal, de repente, por querer algo tão sujo, principalmente com aquele homem. Sem que ela se desse conta, as lágrimas começaram a cair em suas bochechas, e dessa vez não eram de medo. Era algo muito pior e que a envergonhava muito; estava chorando porque queria mais. Necessitava que fizessem seu corpo pinicar daquela forma, que aquela sensação incrível voltasse. Chorava também porque era uma completa desavergonhada por querer tal coisa. Que vergonha! Ela levantou lentamente e caminhou até a cama, onde deitou com cuidado, ainda sentindo as dores dos machucados. Para seu desespero, o perfume do corpo de Said ainda continuava na cama e provavelmente a atormentaria durante toda a noite. Ficou ali, imóvel, refletindo sobre o tamanho de sua fraqueza e também acerca do que faria daquele momento em diante para nunca mais deixar que aquela situação se repetisse. Precisava agora, mais que nunca, sair daquele palácio e voltar para sua casa, um lugar seguro, longe do Sheik de Hamed.




Capítulo Seis Said mal tinha dormido na última noite. Tudo, evidentemente, era culpa da estrangeira, que o tinha perturbado até mesmo nos sonhos. Ele acordara de madrugada com o corpo suado e quente, e uma evidente e dolorida ereção o incomodava terrivelmente. Em certo momento, cogitou chamar alguma mulher que pudesse atender suas necessidades e acabar com todo aquele sofrimento, mas, quando esteve a ponto de levantar da cama para fazê-lo, um golpe de raiva o atingiu. Não! Teria Louise, e aquela necessidade que estava sentindo serviria apenas para estimulá-lo quando enfim a tivesse à sua disposição. Havia ficado muito irritado com sua negativa de se submeter a ele e, desesperado, quando provara o quanto ela era doce e quente entre as pernas, além da perfeição de seus mamilos em sua boca. Na verdade, Said já não mais sabia o motivo pelo qual insistia em ter aquela mulher que se mostrava tão controversa às suas ordens. Poderia resolver seu problema facilmente, somente indo até algum acampamento e solicitando uma mulher que estivesse disposta a uma noite quente com o poderoso Sheik de Hamed. A maioria delas consideraria o convite como uma honra. Entretanto ali estava ele, com o corpo queimando de desejo, enquanto a maldita estrangeira dormia tranquilamente em seu quarto, com a certeza de que não seria usada naquela noite. Obviamente não seria tão cruel a ponto de possuir uma mulher quando esta estava tão apavorada que mal conseguia se expressar. Apesar de sua reputação de poderoso e impiedoso Sheik, Said também tinha certos princípios. Muitos podiam não acreditar, mas ele prezava por seu senso de justiça, de lealdade e, acima de tudo, por sua palavra, que em todo o palácio era lei. Louise deveria saber, porém, que um de seus grandes defeitos era a impaciência, que às vezes o fazia perder o controle. E sim, ele estava impaciente para fazer a mulher submeter-se a ele, o que só aumentava a certeza de que deveria logo acabar com aquilo. Seria apenas uma noite, da qual aproveitaria cada minuto ao lado de Louise e descobriria cada detalhe de seu corpo para, então, na manhã seguinte, mandá-la embora, exatamente como fazia com todas as outras. Planejava casá-la com algum bom homem de um acampamento qualquer, que a tratasse com dignidade suficiente, ou, quem sabe, até mesmo mantê-la em seu palácio, como escrava, é claro, sem qualquer tipo de envolvimento entre os dois. Era tudo muito simples, e ele não tinha dúvidas de que daria certo. Vendo que não conseguiria mais dormir, Said resolveu deixar seu quarto e aproveitar o ar da noite para refrescar-se. Saiu da cama, vestiu a túnica de lã e calçou as sandálias. Não levaria a cimitarra. Sabia que um guerreiro não saía sem ela, mas era madrugada, e todos no palácio estavam dormindo; ele não corria risco algum. Foi assim que ele caminhou para fora do quarto escuro e saiu para o corredor, indo em direção ao jardim da fonte. Aquele era seu lugar preferido em todo o palácio, o único em que conseguia


encontrar um pouco de paz. A lua cheia estava alta no céu, brilhando com uma intensidade assustadora, como ele não via há tempos. Segundo as tradições de sua tribo, quando a lua estava tão brilhante e livre de nuvens que pudessem encobri-la, era sinal de boa sorte; Said desejava que as lendas estivessem certas. Com a claridade da lua, ele podia enxergar todo o jardim perfeitamente e pôde também caminhar até a fonte, sentando-se à beirada. A noite decorria em agradável silêncio, e o frio, estranhamente, não era tão intenso naquele momento. Said visitava aquele jardim buscando solidão, quando algo o perturbava ou então quando alguma decisão importante deveria ser tomada. Passara também ali muitas noites nas quais o passado o perturbava. Buscava ajuda de Aláh, fazendo preces em uma língua antiga, meditando e procurando orientação. O Sheik banhou as mãos na água fria da fonte, lavando o rosto e o pescoço, sentindo-se momentaneamente melhor. Suspirou, erguendo os olhos para a grande abertura a qual permitia que a luz o alcançasse, e um sentimento de melancolia o tomou, como acontecia quase sempre. Talvez toda aquela dor e angústia que sentia se devesse a Aláh mostrando-lhe que precisava ser um líder melhor, porque Said acreditava que tudo o que acontecia em sua vida era consequência de seus atos. Começou a pensar assim com sua mãe, uma mulher inglesa, seduzida por um Sheik árabe, que, depois de entregar-se completamente a ele, viu-se presa em um amor irrevogável. Said nascera desse amor. Filho de pai árabe, mas com sangue de mãe inglesa, uma nobre dama que escolheu deixar em definitivo seu país para viver ao lado do homem que amava, isolada naquelas terras insólitas. Said, ao contrário do que todos poderiam imaginar, não se orgulhava de suas origens. Não queria ter sangue inglês correndo em suas veias. Ele era árabe, nascera e crescera no deserto. Servia a Aláh, dono de todas as coisas e quem regia o mundo. Era um guerreiro do deserto e Sheik de Hamed, assim como seu pai fora, e não importava o que lhe dissessem, porque não via as coisas de outro modo. Porém a maldição do sangue inglês que recaía sobre ele o irritava, e a lembrança disso estava cravada em seu rosto, nos olhos, azuis como as águas de um oásis, herança da mãe, uma mulher de cabelos dourados, pele branca e os mesmos e inconfundíveis olhos. Como não podia lutar contra isso, o Sheik forçou os pensamentos em outra direção; apesar de tudo, amava a mãe, mesmo agora, anos depois de vê-la partir. O mesmo acontecera com seu pai, quando o encontrara morto, dias depois de retornar de uma viagem ao porto. O frio começou a aumentar, e Said pensou em voltar para o quarto, mas a imagem da lua acima de si era tão bela que ele decidiu permanecer ali por mais um tempo. Ao nascer do dia precisaria reunir-se com alguns comerciantes, o que seria cansativo, então aproveitaria aquele momento para encontrar um pouco de descanso, mesmo que não conseguisse dormir naquela noite.


*** — Papai! — Louise murmurou quando acordou no escuro de seu quarto. Sonhara com o pai, em uma das convenções que os dois conduziram, e, nessa em especial, o homem revelava a todos a descoberta da filha sobre as ruínas da cidade perdida de Al-Delíh. No sonho ele trasbordava felicidade, orgulhoso pelo feito da filha, que então acordara, com um horrível sentimento em seu peito. Louise sentou na cama e passou as mãos pelo cabelo e rosto, tentando se acalmar. Mesmo sabendo que era apenas um sonho, sentiu-se mal; recordou as mortes que aconteceram, e que estava presa ali, naquele palácio, enquanto deveria estar voltando para a Inglaterra. Nervosa, ela levantou da cama e vestiu uma espécie de bata de tecido grosso por cima das vestes de dormir que usava. Queria sair um pouco daquele quarto, nem que fosse apenas alguns minutos. Estava cansada de estar trancada. Na ponta dos pés, ela foi até a porta e a abriu lentamente, espiando para fora, onde notou o guarda apoiado à parede, a cimitarra no chão, enquanto ele roncava profundamente. Louise sabia que não conseguiria fugir do palácio, porque, mesmo que aquele guarda estivesse dormindo, os outros estavam acordados, protegendo a segurança do Sheik. Mas ela poderia respirar um pouco do ar da noite e depois apenas voltar. Ninguém descobriria. Ao sair ela deixou a porta aberta e, sem os sapatos, conseguiu passar pelo homem sem fazer qualquer ruído. Sabia exatamente para onde iria e como chegaria lá. Não teve dificuldades em encontrar o caminho e considerou-se afortunada ao não deparar com algum guarda naquela parte do palácio. Em poucos minutos, entrava no belo jardim que conhecera aquela tarde. À noite ele era mais belo ainda! Apertou a bata contra o corpo, o frio batendo sobre sua pele, e estremeceu ao sentir o quanto o piso de mármore estava gelado. Foi distraída pela imagem da lua, magnífica, brilhando pela abertura do teto. Caminhou até o centro do jardim e encantou-se ao receber a luz prateada em seu corpo. Fechou os olhos e abriu os braços, como se pudesse absorver todo o poder que era irradiado para ela. — Espero que me explique o que está fazendo aqui. — Ouviu uma voz profunda vinda de trás da fonte e, quando se virou, encontrou quem mais temia: Said. Louise recuou um passo, assustada por encontrá-lo ali. O Sheik caminhou até onde ela estava, revelando-se de trás da fonte. Para a surpresa de Louise, ele não parecia irritado ou, pelo menos, sua expressão não demonstrava isso. — Eu queria sair um pouco daquele quarto — respondeu, constrangida por ter sido pega no flagra.


Said conseguiu ver como ela ficava tímida de repente e conseguiu manter sua raiva consideravelmente controlada. — Talvez tenha se esquecido de que não é minha hóspede aqui, estrangeira. Recorde que é minha escrava, e escravos não saem de seus quartos à noite para passear. — Ele não conseguiu evitar provocá-la um pouco. Louise empinou o nariz e deu de ombros. — Talvez você precise compreender que não pode me dar ordens. Sou uma mulher livre e posso fazer o que achar melhor. — Não deixaria que ele lhe dissesse aquelas coisas horrorosas. Said se apoiou na fonte e a olhou ceticamente. — Está errada novamente. Você me pertence e, como seu senhor, posso ordenar o que quiser — rebateu ele. As bochechas de Louise esquentaram, e não era de vergonha; era de pura ira. — Recuso-me a acreditar que possa ser tão desumano. Não vê o quanto está me fazendo mal ao me manter aqui? — explodiu, quase desabando em lágrimas. Mas não se permitiria chorar. Pelo menos não na frente dele. — Fui atacada, meus amigos foram mortos e eu fiquei sozinha nessa terra que mal conheço. Não consegue perceber que preciso voltar para casa? Meu pai... — Seu pai? — Said se aproximou mais, querendo saber sobre o que ela estava falando. Para sua completa surpresa, Louise não fugiu. Ela deixou os ombros caírem e baixou a cabeça. — Preciso voltar para ele — confessou. — Ele precisa de mim. O Sheik tocou o queixo de Louise e o ergueu, fazendo-a olhar para ele. — Está tentando manipular minhas emoções, bela mulher. Mas saiba que não sou tolo para cair em suas armadilhas — disse seco. — É o homem mais sem coração que já encontrei! Suponho que posso compará-lo aos homens que nos atacaram no acampamento. Pode ter me salvado, mas não foi melhor do que eles ao me manter aqui, impedindo-me de voltar para a Inglaterra — gritou, tentando se afastar. Said a segurou com força, deixando-a a poucos centímetros de seu corpo. — Não me compare com aqueles homens. Não farei mal nenhum a você, desde que seja obediente e submissa. Acredite, eu poderia tê-la castigado com cem chibatadas por sua insolência esta noite e não o fiz somente por saber que é uma mulher. Não quero que me tema, nem que me veja como um monstro, Louise. Eu não sou assim. Ela tremeu nos braços dele. — Como você pode não ser um monstro quando me mantém presa? — perguntou em um sussurro, já desistindo de lutar.


O Sheik a fez olhar em seus olhos, mantendo o queixo dela elevado. Louise viu os olhos azuis a fitando com intensidade, e isso a deixou novamente com as pernas moles. — Estou apenas buscando o que desejo, minha gazela. — Com o polegar, ele acariciou a bochecha dela, fazendo a pele formigar. — Sou acostumado a ter tudo que desejo, no momento em que desejo, e sua recusa tem me deixado excitado, disposto a fazê-la minha. — A mão no quadril, com a qual a prendia, foi para as costas, onde passou a fazer círculos lentos. — Posso dar o que você precisa e tirar o que eu preciso também. Podemos fazer isso de maneira agradável. — E se eu disser não? — ela conseguiu perguntar. Tinha os olhos arregalados e estava sendo envolvida em uma névoa em que só ouvia a voz dele. Said beijou a testa dela com ternura e depois voltou a olhá-la nos olhos. — Eu a seduzirei. Louise segurou a mão dele e tentou retirá-la de seu rosto. —Disse-me há pouco que não era mau — disse ela, desesperada para sair dali. Ele sorriu de lado, um sorriso sarcástico que a gelou até os ossos. — E não sou. Ter a mulher que se deseja não é algo errado, estrangeira. Ao contrário, em meu povo, quando um homem deseja uma mulher, ele a reivindica e a faz sua, provando-lhe que podem ser muito bons juntos. Cansada, Louise acabou desistindo de lutar contra ele. — Se eu me entregar a você, o que acontecerá comigo depois? — perguntou em um fio de voz. Said a contemplou por um momento antes de responder. — Se obedecer todas as minhas ordens, terei piedade de ti e concederei um futuro digno. Poderá escolher viver no palácio ou então juntar-se a algum homem que a mantenha sob os costumes de Aláh. — E se eu não lhe obedecer? — Precisava saber quais eram suas escolhas. Said deslizou a mão para o pescoço de Louise e sentiu a pulsação acelerada. — A desobediência ao Sheik é uma falta considerada grave em meu povo e é punida com a morte — respondeu friamente. Louise arregalou os olhos e engasgou. Morte! Ele a mataria! — Por favor, deixe-me ir para casa — implorou desesperada. O Sheik respirou fundo, tentando não se comover com aquelas lágrimas. Não seria manipulado. Não novamente. — Eu a levarei de volta ao seu quarto — e então a tomou nos braços, erguendo-a no colo. Voltou rapidamente para o quarto e não se surpreendeu ao encontrar o guarda dormindo. Entrou e a levou até a cama, onde a deitou devagar. Louise continuava a chorar e se aninhou entre as almofadas, querendo


se proteger dele. Said sentiu-se mal por vê-la chorar. Tocou o cabelo dela e o afastou do rosto. — Não tema o que está por vir, minha bela mulher. Sempre recorde que serei bom contigo, desde que me obedeça. Prometo fazê-la gostar de tudo que acontecer entre nós. Seu futuro é aqui no deserto, e eu mesmo cuidarei para que sua vida seja digna. Louise ouviu a porta se fechar quando ele saiu e ouviu-o chamar pelo guarda, conseguindo finalmente respirar fundo. Não tinha forças para nada e já não sabia como lutar. Será que seu destino seria mesmo aquele, ou deveria ser forte o suficiente para enfrentá-lo e suportar as consequências?




Capítulo Sete O Sheik de Hamed saiu ao nascer do sol, com destino à Al-Madin, uma cidade a três dias de viagem. Ainda de madrugada, depois de voltar ao seu quarto, Said fora informado que um emissário vindo do norte havia chegado com urgência e que era necessário recebê-lo. Preocupado com o que acontecera, o Sheik não hesitou em vestir-se com seus trajes formais e se apresentar na sala real, onde logo ao entrar avistou o homem ajoelhado no tapete, enquanto as mulheres serviam-lhe carne e pão. O homem parecia cansado e contou que tinha viajado o dia todo, pois o comunicado que carregava era de grande importância. Said esperou pacientemente enquanto o homem se alimentava e saciava sua sede, mas em seguida o incentivou a falar. Foi uma conversa breve, mas que ninguém mais presenciou. No final, quando finalmente sabia todos os detalhes, o Sheik ofereceu ao homem acomodações em seu palácio, para que ele descansasse o tempo que achasse necessário. Assim que se viu sozinho, Said chamou alguns guardas, informando que viajariam logo cedo, ordenando que preparassem os animais e as provisões. Foi assim que, aos primeiros raios dourados do sol tocando as areias do deserto, Said seguiu junto a sua caravana para a misteriosa viagem. Quanto a Louise, naquela manhã, foi-lhe permitido dormir até mais tarde, o que certamente não aconteceu, pois seu estado de nervosismo não ajudava. Durante toda a noite, havia intercalado entre momentos de confusão, em que tentava compreender as atitudes do Sheik, e outros em que chorava, pensando no pai e nos amigos mortos, até que finalmente conseguira adormecer, caindo em um sono turbulento. Ao acordar, foi regalada com uma deliciosa refeição servida por Karida, que como sempre permaneceu em silêncio ao seu lado, esperando por qualquer coisa que ela dissesse. — Onde está o Sheik? — Louise perguntou quando devolveu a bandeja de comida, já satisfeita com a comida. — Meu senhor viajou muito cedo e nos deixou ordens sobre a senhorita. — O que ele disse? A mulher encolheu os ombros e a olhou com timidez. — Até sua volta, a senhorita não poderá deixar esse quarto — contou Karida. Louise a olhou assustada. Ficaria trancada ali? — Quando o Sheik volta? — perguntou angustiada. Karida pegou a bandeja e se virou para sair do quarto. Louise correu atrás dela, mas foi impedida pelo guarda que vigiava a entrada. — Ele não informou quando estará de volta. Sinto muito, eu preciso ir. Todas as suas refeições lhe serão trazidas, e a senhorita também poderá banhar-se quando desejar — e, sem olhar para trás, ela se foi, deixando que o enorme homem fechasse a porta e Louise fosse trancada lá dentro.


Não iria chorar e nem se desesperar. Mas o que aquele tirano estava pensando ao deixá-la presa naquele quarto? Isso era uma afronta! Said a estava mantendo como uma verdadeira prisioneira, exatamente como ele tinha dito que faria. Homem terrível! Louise se sentou na cama e tomou respirações rápidas, colocando ar nos pulmões, como seu pai lhe ensinara quando criança e tinha medo de algo. Não que ela estivesse necessariamente com medo naquele momento. Claro que não. Acontecia que a perspectiva de ficar ali trancada por vários dias, completamente sozinha e isolada, não a agradava de maneira nenhuma. Como de costume, a mente de Louise começou a trabalhar rapidamente, pensando no que faria para sair daquele quarto, porque era certo que não estava disposta a permanecer isolada daquela forma. Três horas depois, a dama via-se quase louca, deitada de bruços sobre a cama, agarrada a alguns travesseiros, em uma posição que seria considerada terrivelmente escandalosa para uma dama, se estivesse em Londres, obviamente. O calor era abrasador e, mesmo refrescando-se com os panos umedecidos na água que havia no quarto, Louise sentia-se como se tivesse sido jogada na areia quente fora do palácio. Os efeitos do calor em seu corpo deixavam-na com os pensamentos lentos, e tudo que ela conseguia fazer era recordar seus encontros com Said, enquanto mal podia mover os membros. Maldito calor do deserto! Karida entrou no quarto silenciosamente, deixando uma porção de comida e água fresca para que Louise se alimentasse. Eram ordens do Sheik; cuidar com esmero da estrangeira e provê-la de tudo que fosse necessário para seu bem-estar. A mulher estava pronta para sair quando ouviu a voz de Louise a chamando. Esta não estava dormindo, como Karida achava, e parecia exausta. — Em que posso servi-la, senhorita? Louise apoiou os cotovelos na cama e olhou para Karida, tendo quase certeza de que estava vendo duas mulheres em sua frente. — Preciso sair daqui. Por favor, ajude-me a fugir — pediu, lançando um olhar de desespero a mulher, esperando que realmente funcionasse. — Não posso ajudá-la. — Deu as costas a Louise e marchou para a porta, mas, quando a estrangeira voltou a falar, parou de repente. — Venha comigo. Eu a levarei comigo para a Inglaterra. Será uma mulher livre em meu país. É isso que deseja, Karida, eu sei disso. — Era sua última tentativa naquele momento e estava apostando nela. Os ombros da mulher tremeram, revelando que ela tinha sido afetada pelas palavras de


Louise. Sim, era isso que desejava, verdade?! Houve um momento em que Louise achou que tinha convencido a mulher, mas quando esta se voltou lentamente e, com o rosto sério, encarou-a, percebeu que tinha se precipitado. — Mais tarde poderá se banhar se for de seu agrado, senhorita. Preciso ir. Nem mesmo a liberdade era capaz de quebrar a lealdade de Karida com o Sheik, e Louise se perguntava se todos naquele palácio eram assim. Aquelas famílias, todas elas, curvavam-se à vontade do poderoso Sheik como Karida, ou haveria alguém que não resistiria às tentações do que lhe fosse oferecido? Esse era um mistério que ela gostaria de descobrir; a grande influência de Said sobre aquele povo. O homem a fazia lembrar-se dos faraós do antigo Egito e sua forma de governar ou, pior ainda, os tiranos lordes que viviam no interior da Inglaterra e que lançavam seu poder sobre os mais fracos. Era assim então que o Sheik de Hamed exercia sua vontade sobre seu povo? Ele era tirano e desumano? Tais perguntas deixavam Louise cada vez mais curiosa sobre aquele homem. Porém ela sabia que em breve conseguiria fugir e que não teria tempo suficiente para descobrir todos aqueles mistérios. Na verdade, saber que iria embora daquelas terras sem conseguir explorá-las como tinha planejado a deixava triste. Havia tantas perguntas, tantas descobertas a serem feitas. Tinha um belo deserto ao seu redor, o qual tinha ansiado conhecer, mas agora tudo que mais desejava era voltar para a Inglaterra. Louise sentiu-se mais forte depois de comer o queijo e as frutas que Karida lhe deixara e até considerou a ideia do banho para libertar-se daquele calor escaldante. Chamou o guarda à porta e lhe disse que desejava banhar-se. Menos de uma hora depois, a porta foi aberta, e dois homens entraram carregando uma banheira de cobre igual às que usava na Inglaterra. Ela presumiu que fora trazida por ordens do Sheik e quase cogitou agradecer-lhe por isso, quando finalmente imergiu na água fresca que os homens usaram para encher a banheira. Gemeu deliciosamente com a sensação da água fria beliscando seus mamilos e de repente pegou-se pensando nos lábios de Said quando a tocaram ali. Afastou rapidamente o pensamento e concentrou-se em lavar o corpo. A inglesa demorou para enfim resolver deixar a banheira. Havia aproveitado o momento para conferir as contusões em seu corpo, vendo-se feliz por perceber que as manchas roxas eram agora de um tom esverdeado. Em seus braços e pernas, alguns machucados eram apenas sutis marcas na pele. Ela lavara o corpo e o cabelo com um sabonete de cheiro forte, que lembrou o perfume de Said, e a consciência de que teria o mesmo cheiro que aquele homem a fez sentir algo estranho no ventre. Louise tratou logo de tentar espantar tal sensação, pois isso a assustava. Horrorizou-se quando notou a roupa que Karida havia lhe enviado. Era uma espécie de camisa sem manga, totalmente transparente, na cor amarela, adornada com pedrarias e... uma calça. Sim,


deram-lhe uma calça para que ela usasse. A inglesa estava escandalizada, mas, ao vestir-se, precisou admitir a si mesma que a sensação do tecido da peça agarrada à suas pernas, do tecido fino e macio, deixava-a confortável. Não era de todo ruim, apesar de ainda considera-lo um vestuário muito impróprio para uma dama. A jovem lady sempre fora muito agitada, desde criança quando, fascinada pela profissão do pai, começou a explorar os arredores da propriedade em que moravam em Oxfordshire e, em certo dia, encontrou algumas peças de louça em uma casa de pedra destruída, o que levou a menina a se tornar cada vez mais interessada e apaixonada pela arqueologia. O problema era que, presa naquele quarto, Louise não tinha muito que fazer. E ela achava que dormir e encarar as paredes não era uma atividade muito prazerosa. Precisava de mais, precisava manter sua mente ocupada. Por isso, enquanto fitava a janela aberta e coberta por uma cortina branca, Louise começou a formular uma ideia. Poucos minutos depois, ela sorriu, empolgada com a ideia de que conseguiria sair daquele palácio. Era tão claro! Ela podia escapar pela janela! Louise desfez a cama em que estivera deitada e puxou também a cortina da janela, amarrando os tecidos um ao outro, formando uma corda improvisada. Caminhou até a janela e olhou para baixo, para os lados, certificando-se de que não havia algum guarda ali. A janela era alta, e foi preciso medir o comprimento da corda antes de qualquer intento de escapar. Ao ver a corda tocar a areia abaixo, ela ficou satisfeita. Procurou por um lugar onde amarrar uma das pontas e decidiu usar a banheira, que continuava cheia de água. Não tinha certeza se seria o suficiente para sustentá-la, mas não tinha opção. Conferiu o nó duas vezes e, depois de concluir que estava bem presa, sentou na base da janela e agarrou-se à corda, pedindo aos céus que sua loucura desse certo. Começou a descer lentamente, as mãos queimando ao serem arrastadas pelos tecidos, mas não desistiu. Apoiava os pés à parede, ao mesmo tempo em que tentava encontrar forças para sustentar o próprio corpo. Achara que seria mais fácil! Ela estava na metade do trajeto, quando ouviu um grito estridente e, olhando para cima, percebeu o guarda na janela do quarto, apontando para ela. Desesperada, Louise começou a descer mais rápido, alargando os movimentos das pernas e deslizando as mãos com mais rapidez. Era como se sua pele estivesse sendo arrancada de suas mãos. Mas não tinha tempo para lamentar, precisava chegar ao chão e correr. Infelizmente, Louise não suportou a dor nas mãos e, instintivamente, acabou soltando a corda, caindo de costas na areia. A queda não fora tão ruim quanto ela temia. Ainda podia sentir cada membro de seu corpo; o que realmente estava doendo eram as mãos. A inglesa colocou-se de pé e, descalça, começou a correr


para a direita, para longe do palácio. Não olhava para trás, com medo de estar sendo perseguida. Por um momento, realmente acreditou que conseguiria fugir, mas, quando suas vistas começaram a ficar escuras e suas pernas fraquejaram, ela viu que era apenas ilusão. Caiu novamente na areia e não reagiu quando os homens chegaram e a arrastaram de volta para o palácio. Havia tanta dor agora, ela só queria fechar os olhos e dormir. *** Said esticou o corpo quando finalmente desceu do dromedário que conduzia há quatro dias. Suas costas doíam e suas pernas estavam dormentes. Tinha ordenado à caravana que apressassem a marcha de volta para o palácio, pois estava desejoso de estar em casa novamente. Sua viagem fora um pouco mais longa pois acabara desviando o caminho, interessado em saber mais sobre o ataque ao acampamento de Louise, porém encontrara somente as tendas vazias, e os corpos enterrados. Provavelmente algum viajante ou grupo de beduínos passara por lá nesse meio tempo. Ele deixou o animal na entrada do palácio, aos cuidados dos guardas, e ficou satisfeito ao ver que as servas corriam para preparar um banho refrescante para o Sheik. A viagem tinha sido cansativa, e Said pouco dormira naqueles dias. Não gostava de viajar de repente, mas aquele assunto precisava ser resolvido muito rapidamente e, por isso, ele fora obrigado a partir sem nem mesmo ver a estrangeira uma última vez. Fora estranho, mas o Sheik tinha passado boa parte do caminho e das noites sob o céu claro, exposto ao frio, pensando em Louise. Não conseguia esquecer-se da ocasião em que a tinha tocado e nem mesmo controlar o grau de excitação que o atingia cada vez que recordava o que tinha feito com ela. E, sim, sabia que ela tinha gostado. Era por isso que estava tão ansioso para voltar ao palácio, porque sabia que logo conseguiria têla em seus braços e, certamente, ela estaria tão quente como ele. Emitira uma ordem para que Louise não deixasse o quarto e assim evitaria que ela tentasse fugir. Era para segurança dela mesma. Said caminhou pelos corredores do palácio e achou estranho o modo como as servas o olhavam, como se tivessem algo importante para lhe dizer. Em vez de ir para o quarto, ele se dirigiu à cozinha, pois tinha sede. Lá encontrou algumas mulheres preparando pão e queijo. Entre elas estava Karida, que, ao vê-lo, correu para lhe falar. — Meu senhor — a mulher o cumprimentou humildemente. — Aláh o trouxe de volta. — Aconteceu algo? — ele perguntou enquanto servia-se de um pouco de água. A mulher olhou para as outras com medo. — É a estrangeira, meu senhor. Ela está doente. — O quê? — Said se voltou para ela com espanto. — Onde ela está? — No quarto. Estamos cuidando dela há três dias, mas a febre não cede — explicou a mulher.


O Sheik caminhou apressado até o quarto de Louise, perguntando-se o que tinha acontecido a ela para adoecer. Encontrou a porta aberta e não hesitou; entrou sem reservas e viu a estrangeira deitada na cama, com um homem vestido de branco sentado ao seu lado, ao que parecia, o mestre da cura. Louise estava dormindo e Said, após fazer um gesto para que o homem saísse, sentou-se ao lado dela. Tocou levemente a bochecha da jovem e a sentiu quente. Estranhou ao notar as mãos de Louise enfaixadas com linho, acomodadas ao lado de seu corpo. Ela murmurou algo incompreensível, e Said ficou mais próximo dela, para tentar ouvi-la melhor. — O que aconteceu com você, minha bela gazela? — Segurou-lhe o rosto entre as mãos e a olhou, esperando que ela o visse. Quando Louise abriu os olhos e o fitou, parecia perdida. — Solte-me... — balbuciou movendo a cabeça para os lados. Said deitou ao lado dela na cama e a puxou para seu lado, abraçando-a com cuidado. — Cuidarei de você, estrangeira — falou devagar e em voz baixa. — Confie em mim. Ela se moveu contra o peito dele, e o Sheik prendeu a respiração, assustado com sua própria reação àquele contato. Precisava cuidar das mãos dela e, depois, descobrir o que realmente tinha acontecido em sua ausência. — Durma, minha menina. — Acariciou-a no pescoço até senti-la amolecer ao seu lado. — Você é minha e é meu dever protegê-la.



Capítulo Oito O que tinha acontecido a ela? Said estudou com interesse as mãos de Louise. As queimaduras estendiam-se na palma, formando linhas avermelhadas, que desciam até o dorso da mão, rodeadas por pequenas bolhas. As mãos estavam inchadas e, temendo que infecionassem, o Sheik aplicou uma mistura composta de uma planta e um tipo de lama curativa, encontrada nos raros oásis do deserto. Louise ainda dormia. Mesmo com a febre mais baixa e as bandagens que foram colocadas em suas mãos, ela não se mostrava melhor. Said temia que além das queimaduras algo mais grave tivesse acontecido com ela. Os servos e guardas tinham tentado lhe dizer algo a respeito do que a estrangeira fizera, mas ele resolvera ouvir dela própria o que tinha acontecido. Agora suspeitava que seu corpo também pudesse estar machucado. Isso fez Said considerar remover as vestes de Louise para conferir se realmente havia alguma contusão. Estava prestes a despi-la, quando uma onda de consciência o atingiu. Sabia que a estrangeira não gostaria daquilo e que ficaria aborrecida. Não que não gostasse de vê-la se impondo, isso o agradava muito, aliás. O problema era que, se a mulher perdesse o controle, poderia agravar seu estado. Além do mais, Said a desejava e, mesmo sabendo que ela estava doente, não estava certo se poderia refrear os efeitos da nudez da lady sobre o próprio corpo. Resolveu apenas apalpar seus membros, para confirmar que não tinham fraturas. Deslizou as mãos pelas coxas da mulher, aproveitando intimamente a textura macia das pernas roliças, admirando a compleição curvilínea, tão diferente do biótipo das mulheres de seu reino. — O que pensa estar fazendo? — Louise perguntou ao abrir os olhos e deparar com aquele homem curvado sobre suas pernas, enquanto lhe apertava as coxas. Said sentou-se na cama e a olhou irritado. — Estava procurando por mais ferimentos. Como se sente? Ela o olhou com desconfiança e depois vistoriou o próprio corpo. Pelo menos ainda estava vestida. Percebeu as bandagens de linho em suas mãos e franziu a testa, sem conseguir entender quem as tinha colocado ali. Fora Said? — Para seu desgosto, continuarei viva — respondeu, virando o rosto para o outro lado. O que estava acontecendo? Por que de repente sentira uma enorme vontade chorar? O Sheik a estudou por um momento, sentindo sua mudança. — Preciso que me conte o que aconteceu — falou ele em voz baixa, mas autoritária. — Quero ouvir de você, senhorita. E espero, por Aláh, que não ouse mentir para mim. Louise apertou os olhos, sentindo-os arderem pelas lágrimas. Não era fraca nem covarde. Diria a ele, sim.


— Você me deixou aqui trancada. — Moveu os ombros, inquieta. — Pensei que poderia fugir, voltar para casa. Said ficou de pé e deu as costas a ela. — Como teve coragem de desafiar minhas ordens? — gritou, virando-se de repente para ela. — Não consegue compreender que é minha, e que em meu palácio o que eu digo é lei? — Voltou até a cama onde ela estava e se ajoelhou, colocando os braços em cada lado do corpo de Louise, ficando sobre ela. — Consegue recordar o que eu disse que aconteceria caso tentasse fugir de mim? — perguntou no ouvido dela. Louise engoliu em seco, apavorada. Ele sussurrava em seu ouvido, como se fosse o próprio diabo lhe ameaçando. — Eu deveria cortar sua garganta como faria com todos os traidores. — O Sheik deslizou os lábios para o pescoço de Louise, fazendo uma carícia tentadora, que contrastava com suas palavras de morte. — E depois, quando seu sangue jorrasse sobre a areia, eu deixaria seu corpo perdido no deserto. — Beijou o queixo da jovem e deixou o rosto pairar sobre o dela, olhando-a nos olhos. — Mas não posso fazer isso. — Os olhos azuis se tornaram escuros, assustando Louise ainda mais. — Eu não posso. Ela lentamente ergueu a mão e, mesmo com as faixas, tocou o rosto do Sheik, fazendo-o sobressaltar-se com o toque inesperado. — Por que faz isso? — perguntou, agora deixando que as lágrimas escapassem livremente. — Por que me faz sentir medo? — Said fechou os olhos para não ter que olhá-la. — Deixe-me voltar para minha casa, por favor. Said abriu os olhos lentamente e a compaixão que Louise esperou encontrar não estava lá. — Sua casa é aqui, minha gazela. — Beijou-a na bochecha, enxugando suas lágrimas. — Não quero que tenha medo. Renda-se à minha vontade, e eu lhe darei o que desejar. Ela apertou os olhos, não querendo olhar para ele, não querendo ser afetada. — Permitirá que eu volte para a Inglaterra? — Não, isso jamais. — Irritado, Said saiu de cima dela. Louise se apoiou nos cotovelos para vê-lo melhor. — Percebo que não posso conceder nada a você, estrangeira. Precisarei sair, mas à noite voltarei — e com um último olhar, ele a deixou sozinha no quarto. Louise teve um último vislumbre da túnica escura que Said usava, de seu turbante e da cimitarra. Estava convencida de que aquele homem, sim, era o diabo e a tinha aprisionado no inferno. Ela virou-se para o outro lado da cama e, encolhida pelas dores no corpo, adormeceu novamente. *** Said dispensou o guarda do quarto de Louise e abriu a porta devagar, esperando encontrá-la adormecida. Para seu alívio, ela estava dormindo tranquilamente.


O quarto estava banhado pela luz prateada da lua, que entrava pela enorme janela oval, e isso permitiu que Said conseguisse se guiar até a cama, onde lentamente, ainda de pé, começou a despirse. Desabotoou a túnica e a deixou cair aos pés, assim como a calça. Retirou o turbante e o colocou em uma pequena mesa ao lado. Completamente nu, o Sheik contemplou o corpo de Louise, coberto pelo lençol que lhe moldava as curvas do quadril e dos seios, que subiam e desciam com a respiração. Said fez uma breve prece a Aláh, pedindo-lhe controle e sabedoria. Era um homem acostumado a ordem, um guerreiro das areias, e sabia exatamente como confrontar o inimigo. Louise não era um inimigo, apesar de sua rebeldia, mas tinha poder semelhante e tão mortal quanto o dos melhores guerreiros. Com cuidado para não acordá-la, Said deitou-se ao lado de Louise e cobriu-se com o lençol, sentindo a pele dela tocando a sua. Ela usava uma peça de seda para dormir, e ele estava se questionando sobre o motivo de ela não dormir nua. Era algo a se pensar. Surpreendentemente, Louise aconchegou-se ao calor do Sheik, provavelmente sem se dar conta do que estava fazendo, desinibida pelo sono. Said gostou e a abraçou, atraindo-a para seu peito, soltando um gemido de satisfação ao sentir os seios macios apertando-se contra sua pele, os mamilos eretos o incitando. Ele inalou o perfume do cabelo dela e encostou a cabeça no travesseiro, inebriado pelo aroma. Seria difícil, mas se controlaria naquela noite. *** Lady Louise acordou com uma sensação deliciosa, sentindo um perfume diferente, assim como um calor estranho em seu corpo. Ainda sem abrir os olhos, moveu-se na cama, mas sentiu algo prendendo sua cintura. O que era aquilo? Abriu os olhos e piscou tentando acostumar-se com a claridade que entrava pela janela. Então percebeu que realmente havia algo errado. Olhou para sua cintura e viu uma enorme mão a apertando. Assustada, tentou se afastar, mas não adiantou. — Não tente fugir novamente. Louise sentiu algo tocando seu pescoço e ofegou quando percebeu que era Said. Ora, o que ele fazia ali? — Como ousa... — Sua pele é tão macia quanto eu imaginava. — Ele a beijou no ombro, deslizando a mão para a curva do seio, e ela, afastou-o. — O que está fazendo aqui? — Ela virou-se para ele, os olhos arregalados em choque. Viu-o


sorrir e quase parou de respirar quando se deu conta de que ele estava nu! — Saia da minha cama agora mesmo! — Apontou para a porta, sentindo o rubor cobrir seu rosto. Said viu Louise encolher-se, intimidada por sua nudez, e quase acreditou nela. Era óbvio que a estrangeira já tinha visto outros homens nus, e tudo não passava de uma farsa. Ele apoiou a cabeça no cotovelo e esperou que ela se tranquilizasse. Louise se viu mais assustada ainda, porque agora notava também que o Sheik estava com os cabelos bagunçados, e seu peito e braços... Oh, senhor! Ela estava se comportando como uma qualquer. — Ontem à noite me senti um pouco só e pensei que poderia aliviar minha solidão junto de ti — disse ele ainda sorrindo. — Deveria ter procurado uma de suas concubinas! — cuspiu ela, os olhos faiscando. — Eu poderia — admitiu e, com um movimento rápido, colocou-se em cima de Louise. — Mas o problema é que desejo você, e não outra mulher. Louise queria golpeá-lo! Golpeá-lo no peito...! Não o fez, pois se lembrou de suas mãos machucadas, mas não desistiu de tirá-lo de cima de si; apenas mudou a tática. Começou a movimentar os quadris, movendo-os para cima, decidida a fazê-lo sair de cima dela. — O que está fazendo? — Said perguntou com a voz engasgada. Estava completamente duro, sendo torturado pelos movimentos quase sexuais que a mulher fazia. Ela franziu a testa e continuou a empurrar. — Estou tentando fazer com que saia de cima de mim! — exclamou nervosa, até que sentiu algo estranho a cutucando... Olhou com curiosidade para o corpo de Said, que, mesmo coberto pelo lençol, estava diferente... — Pare com isso! — ele gritou, imobilizando-a. Respirava com dificuldade e estava com raiva. — Sei o que está tentando fazer, mas saiba que não conseguirá. Comporta-se como uma naja, mulher. — Saia de cima de mim! — Louise gritou, quase à beira da loucura. — Feche os olhos — ele ordenou e quando ela o fez, desceu da cama e se pôs a vestir as roupas. Estava de costas para a cama, mas mesmo assim soube que ela o estava espiando. Isso o divertiu. — A partir de hoje começará a aprender a cultura de meu povo. Designarei uma mulher para ensiná-la. — Voltou a olhá-la, agora mais calmo. — Concederei mais uma chance a ti, estrangeira. Apenas uma. Louise ficou muda, olhando-o se afastar. Não tinha absolutamente nada a dizer sobre o Sheik. Bem, talvez pudesse dizer, entre contradições, é claro, que o homem era muito atraente.



Capítulo Nove Ainda naquela manhã, foi apresentada a Louise uma jovem de pele morena e olhos grandes, chamada Najila, que, de forma muito doce, havia lhe cumprimentado e informado que estava ali para orientá-la nos costumes de seu povo. Apesar de simpatizar com a jovem, a primeira reação de lady Louise foi sentir-se furiosa. Mais cedo, ao acordar, encontrara Said ao seu lado e ele lhe dissera que ela deveria conhecer aquela estranha cultura; a inglesa não imaginara que o Sheik falava a sério. Mas o que poderia esperar de um homem que lhe recordava a todo momento qual era a própria posição diante dela? Louise, sentindo que as mãos estavam um pouco melhores, decidiu por abandonar as bandagens e ficou feliz ao perceber que os machucados estavam com uma aparência muito melhor e que já não sentia mais dor, consequência da pomada aplicada por Said e dos cuidados por ele prestados. — Deve me acompanhar à cozinha, estrangeira — Najila tinha dito com a cabeça baixa, evitando olhar para a lady. Louise a seguiu pelos corredores do palácio sem pronunciar uma única palavra. Mantinha-se em silêncio enquanto considerava as atitudes que deveria tomar sobre o Sheik e sua estadia ali, que obviamente estava se tornando mais longa do que poderia imaginar. Sabia que o fato de Said ordenar que ela conhecesse os costumes significava que não a deixaria livre. Mas se ele pensava que Louise havia concordado com aquilo, oh, o pobre homem estava muito enganado. A cozinha do palácio era tão grande e espaçosa como Louise nunca tinha visto. Já estivera ali antes, mas na ocasião pouca consciência teve da dimensão daquele lugar. Não lembrava em nada a cozinha de sua casa na Inglaterra e nem mesmo a que ficava na propriedade da família ao sul. A quantidade de mulheres naquela manhã era menor, mas a profusão de tecidos coloridos e risadas incomodavam Louise. Najila a conduziu até uma comprida mesa de madeira, onde Louise sentou-se ao lado de uma mulher de corpo redondo, adornada em cor púrpura, que lhe olhou a contragosto e voltou-se para o outro lado. — Aprenderá como preparar as lentilhas ao gosto de nosso senhor. — A mulher se sentou ao lado dela e lhe indicou uma porção dos grãos espalhados pela mesa. — Ele gosta que seja cozida com carne e prefere comê-la fria — explicou Najila. Louise apanhou um punhado de lentilha e estudou os grãos por um momento, imaginando a horrorosa combinação que a mulher citara. Como alguém, até mesmo Said, poderia gostar de tal coisa? Devolveu a lentilha à mesa e virou-se para Najila, pronta para conseguir as respostas de que tanto precisava. — Najila, eu queria que...


— Não é permitido que falemos sobre assuntos que não sejam de nossa cultura, senhorita — cortou-a, enquanto separava os grãos em uma tigela de argila, preparando-a para levar ao fogo. As mulheres ao redor deixaram de fazer seus trabalhos e dirigiram um olhar curioso para Louise, que moveu os ombros, inquieta com a atenção recebida. De repente, os olhares das mulheres estreitaram-se na direção da lady, como se ela fosse algum tipo de ser estranho. Algumas delas apontavam-lhe nada discretamente e pronunciavam palavras em uma língua desconhecida. Ela se inclinou para Najila. — O que está acontecendo? — sussurrou. Sem levantar os olhos do que estava fazendo, a mulher respondeu em voz muito baixa: — Elas sabem o que a senhorita é e que tentou fugir há alguns dias. Louise inquietou-se com a resposta. — E o que elas acham que eu sou? — perguntou. Najila ergueu os olhos para ela e franziu as grossas sobrancelhas negras, demostrando estar confusa. — Todos neste palácio sabem que a senhorita é a nova escolhida do Sheik e também escrava — contou, baixando o olhar novamente. Um calafrio percorreu o corpo de Louise quando ela ouviu aquela resposta. A jovem inglesa teve um pouco de temor ao voltar a olhar para aquelas mulheres. Era isso que elas pensavam dela? — Eu não sou nenhuma escrava. Estou aqui apenas por alguns dias, até que possa voltar para minha casa na Inglaterra — protestou em voz alta, em árabe, para que todas ao seu redor pudessem ouvi-la. Tentou transmitir um ar de superioridade, mas ficou evidente que não conseguira o feito desejado, pois as mulheres estacaram em seus lugares e a fitaram com assombro. — Quando o Sheik levá-la para sua cama, perceberá que jamais poderá deixar esse deserto. É o que acontece com todas — uma senhora disse da outra extremidade da mesa, onde separava pequenas bolas de massa de pão. As mulheres olharam para ela e confirmaram com um gesto de cabeça. — Não me deitarei com aquele homem! — assegurou Louise, indignada por tal sugestão. Ouviu um murmúrio de palavras de assombro e decidiu ignorar o que aquelas mulheres estavam dizendo. A velha, em contrapartida, não se calou, sorriu e continuou com seu discurso. — Em nome de Aláh, como estou certa, estrangeira. Nosso Sheik a possuirá e fará com que se renda a ele. — Seus lábios esticaram até que os poucos dentes aparecessem reluzentes. — Como podem ser assim? — explodiu Louise, tentando ao menos manter o controle da voz. Não queria que os guardas aparecessem naquele momento. — Não desejam ser livres e saírem desse lugar? Não anseiam se libertar do julgo desse homem terrível?


Najila se interpôs na conversa: — Nosso Sheik é um homem bom, estrangeira. Devemos nossa vida a ele — afirmou, ficando de pé para levar as lentilhas até o fogo. — Não compreendo — Louise admitiu. — A bondade do Sheik nos manteve vivos durante a fome, senhorita. Assim como o pai, ele nos permitiu acreditar que Aláh tinha planos para nós. — Uma jovem de pele negra que estava sentada à direita comentou devagar, mostrando dificuldade com as palavras. — Mas ele me prendeu aqui. Não me permite voltar para meu país, para meu pai. Como posso achá-lo justo? — Àquela altura, Louise já estava quase se permitindo chorar. Porém, com esforço e dignidade, conseguiu manter-se firme. Não houve resposta, e ela nem imaginou que teria. Aquelas mulheres, apesar de tudo, não conseguiriam defender tal atitude de Said, mesmo que fossem submissas e devotadas a ele. Quando terminou de ajudar a separar as lentilhas, Louise foi levada por Najila até o outro canto da cozinha, onde, no chão, de joelhos, duas mulheres cortavam os pedaços de uma peça de carne. Entregaram-lhe uma faca de lâmina fina e ensinaram como deveria separar a gordura da carne, que logo seria preparada para as refeições ao longo do dia, explicando que o que sobrasse seria reservado para a secagem. Silenciosamente, Louise fez o que fora demonstrado, agradecendo mentalmente por ter algo para distrair seus pensamentos, que estavam tomando rumos rebeldes. Tinha um objeto perigoso nas mãos e, com uma olhada para os lados, notou que no momento não havia qualquer guarda próximo. É claro que houve um princípio de desespero, em que Louise cogitou armar-se de coragem e tentar fugir. Ela poderia. Seria sensato e perdoável caso se rebelasse e corresse pelos fundos da cozinha e, quem sabe, fugisse em um animal. Mas ainda havia certo senso de perigo em Louise, o qual não fora afetado por toda aquela turbulência em sua vida e que a impedia de cometer um ato tão... insano. — Gadhan disse que este era o maior dos animais — a mulher ao lado de Louise comentou, sorrindo por trás do véu que cobria seu rosto. — Ele mesmo o abateu. Najila olhou para a outra com interesse. — Ouvi dizer que Gadhan está à procura de uma nova esposa — disse insinuando um sorriso discreto. — Penso que talvez eu pudesse seduzi-lo. — Eu pensei o mesmo. Gosto de suas duas esposas e acho que podemos conviver harmoniosamente — concluiu a outra. Louise parou o que estava fazendo. Olhou primeiro para Najila e depois para a mulher ao lado. Ainda era difícil acostumar-se com a ideia de que um homem poderia casar-se com várias mulheres e


que todas aceitavam tranquilamente tal situação. — Descanse suas mãos, estrangeira. — Najila estendeu a mão, pedindo a faca de volta, e Louise a devolveu tranquilamente. — Deixaremos a cozinha e seguiremos até seu quarto, onde lhe orientarei sobre as vestes. Para Louise foi um alívio sair daquela cozinha, porque infelizmente não tinha obtido muita habilidade na arte de cozinhar e muito menos tinha conseguido a simpatia das mulheres que serviam Said, não depois de ter tentado fugir. De cabeça erguida, juntando sua dignidade, ela limpou as mãos em uma bacia de água fresca e, sem olhar para trás, seguiu junto a Najila de volta para seu quarto, no outro extremo do grande corredor. — Mantenha guarda — a mulher murmurou para o homem em frente ao quarto, mas Louise conseguiu ouvir perfeitamente quando ela o fez. Com a porta trancada, a lady permitiu-se sentar em sua confortável cama e respirar profundamente, sentindo então o ardor em suas mãos novamente. Teria que voltar a usar as bandagens e pediria mais da pomada curativa. — Mostrarei à senhorita como deve se vestir em cada ocasião no palácio — informou Najila, visivelmente animada, apontando para o amontoado de roupas que Louise não tinha percebido que estava na mesinha ao lado da cama. — Vamos começar por esse aqui — disse mostrando um lenço que, ao ser desdobrado, tocou o chão. Na hora seguinte, Louise foi apresentada ao mundo feminino árabe. Viu-se fascinada pela profusão de texturas e cores vibrantes dos hijabs cobertos por pedrarias e admirada ante a sobriedade das abayas, que protegiam as mulheres das tempestades de areia, assim como dos olhares indesejados de alguns homens. Ao vestir-se com a esfuziante saia, que deixava sua coxa à mostra, Louise acabou corando terrivelmente, pois descobriu que a peça em questão era usada principalmente durante apresentações ao Sheik e quando era necessário usar da sedução. Para surpresa de Najila, Louise não se espantou ao ver as calças bufantes que se afunilavam nos tornozelos e até confessou achá-las confortáveis. Depois de pararem para comer a grande quantidade de comida que fora enviada da cozinha, Louise e Najila continuaram trancadas no quarto, concentradas nas lições agora acerca do corpo. — Quer usar carvão em meus olhos? — Louise perguntou alarmada, ao ver Najila se aproximar com um fino bastão negro, que, segundo explicou, servia para contornar os olhos. — E por que eu permitiria tal coisa? A mulher evitou rir, passando em si mesma a tintura escura. Ela tinha uma grande habilidade e precisão; em poucos minutos tinha concluído o trabalho com maestria. — Se chama khol, senhorita. Usamos para proteger nossos olhos da areia e porque achamos


bonito. — Ofereceu novamente à Louise, que se rendeu ao experimento. — Isso está fazendo meu olho arder. — Louise comentou, piscando rapidamente tentando se adaptar. — Está como uma de nós, senhorita, apesar de sua cor. — Najila se afastou para admirar seu trabalho e sorriu satisfeita. Louise ficou de pé, testando seu equilíbrio ao usar aquela saia adornada em pedrarias e a camisa fina que mal cobria seu busto. Estava acostumada a usar camadas de saias e anáguas, então aquelas vestes, comparadas às inglesas, eram um verdadeiro paraíso. — Se meu pai me visse neste momento, provavelmente teria uma síncope — comentou sorrindo, mas, ao se dar conta de que falava do pai, sua feição mudou de repente. — Sente-se mal? — Najila foi até ela. — Estou bem — confirmou, forçando um sorriso. — Há algo mais que eu deva aprender? — Bem — a mulher entrelaçou as mãos uma na outra e balançou a cabeça concordando —, meu senhor disse que eu deveria orientá-la sobre... — Sobre? — incitou. — Como deve agir ao se deitar com ele. Louise bufou. Said insistia nesse assunto? — Pois eu garanto a você, Najila, que não será necessário que conversemos sobre isso. — Cruzou os braços e a encarou. — Mais alguma coisa? A mulher piscou desconcertada. — Sinto que é meu dever dizer que a senhorita não deve incitar a fúria de nosso senhor. — Najila sentou-se ao lado dela, na cama, e cruzou as mãos sobre as coxas desnudas. — Ele é bom e piedoso, mas não gosta de ser contrariado. É um guerreiro do deserto e tem como honra cumprir as leis que nos regem. — Não temo seu senhor, Najila. Você não consegue perceber, porque vive aqui e está sujeita a ele, mas o Sheik é um homem mau, que controla a vida de todos. — Está enganada. — Então por que estou presa aqui? Por que o Sheik não me permite voltar para casa, para junto do meu pai? — perguntou com a voz trêmula. — Porque você foi sua escolhida, senhorita. Ele a quer, deseja-a. E tenho certeza, por Aláh, que a senhorita também o deseja. O Sheik desperta isso nas mulheres. Louise a fitou em silêncio. Sim, sabia que Said a desejava. Sentia. E o pior era que estava começando a suspeitar que também o desejava. — Eu tenho medo — confessou em voz baixa.


Najila segurou sua mão com delicadeza. — Não tema. Ele será generoso com a senhorita. Basta agradá-lo — e levantando-se a mulher caminhou até a porta. — Por hoje basta. O sol está se pondo, e eu preciso voltar ao trabalho. Voltarei amanhã. Louise foi deixada novamente naquele imenso quarto e, pela primeira vez, sentiu-se sozinha. Tinha gostado da companhia de Najila e tinha desfrutado de algumas coisas que havia aprendido. Alguns detalhes que descobrira, no entanto, deixaram-na ainda mais inquieta. Permanecia confusa e não compreendia como todos naquele palácio adoravam tanto o Sheik e não conseguiam enxergar a verdade diante deles. E mais, o que Najila quis dizer quando disse que ela fora escolhida? Preocupada, Louise caminhou até a janela no outro lado do quarto. Apoiou-se na beirada para admirar o sol sumindo por trás das dunas de areia, que, antes alaranjadas, agora se tornavam escuras; o dia dando lugar à noite, que prometia trazer o frio já esperado. Ela abraçou o próprio corpo e respirou fundo, assustada com a magia que despendia daquela imensidão de areia. Tudo que esperava encontrar naquele lugar, ao chegar, fora multiplicado, assim como suas emoções. Recordou sua escavação, que agora estava abandonada. Seus amigos tinham morrido, e ela nunca encontraria a cidade. Louise observou o céu tornando-se completamente escuro e as estrelas cintilarem com um brilho magnífico, recordando o dia em que embarcara no navio, eufórica para chegar logo à Arábia e começar a escavação. Christopher estava ao seu lado, galante como sempre, dizendo-lhe que se tornariam famosos quando voltassem com as provas da existência da cidade perdida. Tudo em vão. Ela estava tão envolta na beleza da noite e na maré de pensamentos, que mal notou quando ele entrou no quarto e caminhou até ela, ficando ao seu lado. — Devo mandar que fechem essa janela também? — A voz irritada de Said surgiu, e Louise se virou depressa, para confrontá-lo. — Eu estava apenas observando a noite — contou irritada, puxando o lenço para cobrir os ombros. Saiu de perto da janela e caminhou de volta para a cama. Said examinou a janela, procurando por alguma evidência de que ela estava tentando fugir. Ao não encontrar, foi até ela. — Najila me disse que você ajudou na cozinha — falou ele, ainda parecendo aborrecido. — Não me lembro de ter dado ordens para isso, estrangeira. Mostre-me suas mãos. Louise olhou para o rosto de Said, enfrentando-o. Naquela noite ele estava espetacular. Usava uma túnica e calças de cor dourada, junto com o turbante e sua cimitarra, perigosamente presa à cintura. Provavelmente tinha passado o dia fora do palácio. Então abriu as mãos e as elevou mostrando a ele. Esperou por sua reação.


Said apertou a mandíbula ao conferir as feridas das mãos de Louise. — Eu devia ter imaginado. — Segurou-a pelos pulsos e a puxou. Ficaram com os rostos próximos, como ele queria. — Venha comigo e eu cuidarei de suas mãos — ordenou, soltando-a. Louise deu um passo para trás, assustada. — Não irei a lugar algum com você! — gritou, virando as costas. — Sim, irá — respondeu ele. Ela se virou para questioná-lo, mas não teve tempo, foi içada pelos braços fortes de Said e jogada sobre seu ombro. — Abra a porta! — gritou ele, até que finalmente pôde passar, com Louise debatendo-se em suas costas, tentando se libertar. Ele seguiu pelos corredores, pouco se importando com os impropérios de Louise. Ora, ele não sabia que uma lady inglesa soltasse tantos insultos! — Calada! — Ele bateu na nádega dela, fazendo-a se calar instantaneamente, mas, ainda assim, Louise continuou a balançar as pernas e a socá-lo nas costas. Said ignorou e continuou a carregá-la pelo corredor, atravessando o palácio, mesmo consciente de que todos estavam ouvindo sua escrava gritando sobre seus ombros.



Capítulo Dez — Estou avisando; se não me libertar imediatamente, farei com que se arrependa terrivelmente! — ameaçou Louise, socando as costas de Said, que continuava a seguir pelo corredor tranquilamente, ignorando os gritos dela. Ele passou por uma porta em formato de arco e entrou em uma grande sala, onde finalmente soltou Louise deixando-a no chão sem qualquer delicadeza. — Homem insuportável! — exclamou ela, arrumando os cabelos e as saias que tinham saído do lugar. Olhou para os lados, estranhando o local em que estavam. Era uma ampla sala, de paredes revestidas por pedras brutas, onde, ao centro, havia um enorme reservatório de água cristalina. Os raios prateados da lua ultrapassavam as paredes vazadas com desenhos circulares e incidiam sobre a água, transformando-a em algo quase mágico ante os olhos de quem via. Para completar, havia velas espalhadas pelas extremidades da sala, transmitindo conforto ao lugar. Louise virou-se para Said e, entrecerrando os olhos, perguntou: — Que lugar é esse? — Bem-vinda ao aljibe do palácio — respondeu ele, todo orgulhoso. Louise moveu as sobrancelhas, confusa. — É uma espécie de sala de banhos — Said explicou, suspirando. Oh... As pessoas se banhavam ali. Ela deu mais uma olhada no lugar, tentando entender o motivo das estreitas camas que ficavam ao lado da parede e que pareciam muito confortáveis com as almofadas e mantas. Para que elas serviam? — São para massagens. — O Sheik pareceu ter ouvido seus pensamentos ou, talvez, tenha apenas acompanhado seu olhar. — Para meu povo, o banho é um momento sagrado e de extremo prazer. — Os olhos dele cintilaram ao pronunciar aquela palavra tão insinuante. Louise soltou um som estrangulado pela boca. Aquilo seria um assombro em Londres. Na verdade, contudo, na humilde opinião da lady, seria algo bem-vindo em uma sociedade que considerava aceitável um banho completo a cada duas semanas, o que para ela ainda era um total absurdo. — Todos podem usar esse lugar? — questionou, enquanto passava os dedos pela mesa, ao lado de uma das camas, estudando o conteúdo das pequenas vasilhas postas ali. Eram óleos e cera — a mesma que fora usada nela. Constrangida, Louise afastou a mão rapidamente. — Os servos usam uma pequena sala no lado de fora do palácio. Este lugar é apenas para mim — contou Said, ainda com o olhar preso nos movimentos dela. Louise franziu o cenho, admirada ao saber que o Sheik tinha tudo aquilo só para si. Por que ele não podia partilhar aquele lugar com os outros? Por que aquele sentimento de posse sobre as pessoas


e os objetos? Por que era tão importante para ele dominar tudo a sua volta? Ela simplesmente não compreendia isso, essa sede de poder que aquele homem possuía, o controle e a ira que qualquer coisa que saísse dos eixos despertava nele. Pensou que não poderia dizer nada a respeito, não queria confrontá-lo ali, naquele momento, quando já sabia que estava em maus lençóis. O Sheik limpou a garganta, chamando a atenção de Louise. — Dispa-se — ordenou, com uma voz diferente, mais rouca, que fez a lady se arrepiar. Louise cruzou os braços em frente ao corpo e o encarou. Esperava por aquilo. — Não. Said bufou, deixando os braços caírem ao lado do corpo. — Certo. Eu mesmo o farei — ameaçou ele. Louise entrecerrou os olhos na direção dele. — Nem tente se aproximar, ou gritarei! — retrucou ela, apontando para o peito de Said. Divertido, o Sheik deu um passo para frente e mais outro, bem lentamente. — Eu só quero lhe dar prazer, minha gazela — e sorrindo avançou mais um pouco. — Não se dirija a mim dessa forma! — ralhou ela, caminhando sutilmente para trás, procurando uma rota de fuga, mas se desesperou quando bateu contra uma das camas de pedra. Estava cercada, não havia como fugir. Dando-se por vencida, ela respirou fundo. — Tudo bem. Farei, mas quero que vire de costas. — Não — contestou ele. Louise endureceu o olhar contra o homem. Vendo que aquilo se estenderia mais do que estava disposto a suportar, Said virou de costas, não sem antes praguejar uma dezena de palavras em árabe. Ela fez tudo depressa, removendo a pesada saia e a delicada camisa, junto das pedrarias e, por fim, as joias que usava no cabelo. Era curioso, porque, na Inglaterra, levaria cerca de um quarto de hora para remover todas as camadas de roupa e, ali, fizera tudo em poucos segundos. Obviamente, pois estas roupas me deixavam quase nua — refletiu com sarcasmo. Totalmente nua, Louise se apressou em entrar na água, evitando que Said a visse em seu estado “impróprio”. Apoiou-se nos degraus de pedra e deslizou para dentro da piscina, emitindo um som de prazer ao sentir a calidez da água em sua pele. Imergiu até que seus seios estivessem sob a água e esperou pela reação do Sheik. Said, ainda de costas, começou a se despir também, porém com lentidão. Retirou o turbante e o apoiou sobre a cama, assim como seu lenço vermelho e a comprida túnica, que ele removeu sem pressa, desabotoando-a com cuidado. Louise sentiu a boca seca quando viu o Sheik remover a peça, revelando as costas musculosas, de pele morena, que, sob a luz, pareciam firmes ao toque. Assustada


pelo rumo dos pensamentos, ela se obrigou a desviar o olhar. Mas não conseguiu. O feitiço permanecia exercendo efeito sobre ela, enquanto Said tirava as sandálias e finalmente a calça, que caiu aos seus pés, obrigando-o a se mover e ficar de frente para ela. Louise ficou chocada, com os olhos piscando rapidamente para tentar compreender que aquela figura em sua frente era real. Ele estava... Oh, bem, o Sheik era... incrível. Conforme Said descia as escadas até a água, os pensamentos de Louise começaram a formar um nó em sua cabeça. Seu coração disparou e ela mal conseguiu se mover, presa na energia que o homem disparava contra ela. Mova-se, sua boba. A água cobriu somente até a cintura de Said e, quando ele se aproximou de Louise e lhe tocou o ombro, ela o olhou e precisou soltar a respiração. Com os olhos presos nos da inglesa, ele deslizou a mão pelo braço dela, descendo cada vez mais, criando um rastro de fogo em sua pele. Quando a mão masculina mergulhou, descendo por seu corpo, a jovem lady arquejou e tentou se afastar. Ele então capturou suas mãos submersas e as trouxe à superfície. — Preciso cuidar delas — falou, agora deixando de olhá-la. Said segurava um tipo de sabonete escuro, cujo perfume forte se despendeu no ar assim que ele o usou para massagear as mãos dela. Ela se afundou mais na água tentando ocultar os seios e se manter longe dele, enquanto recebia seus cuidados. — Eu disse que deveria aprender nossos costumes, e não machucar suas mãos ainda mais — Said ralhou, olhando-a de canto de olho. Com um sutil movimento de ombros, ela respondeu, tentando parecer superior. — Eu estava ajudando na cozinha. Aprendi como esfolar um porco — contou orgulhosa. O Sheik parou o que estava fazendo e a olhou horrorizado. — Como disse? — Eu disse que aprendi a esfolar um porco — repetiu ela, fitando-o. Um sorriso surgiu nos lábios de Said e logo se converteu em uma gargalhada. — Sinto informar-lhe, mas a senhorita está enganada. O animal que ajudou a preparar era um camelo. Não comemos a carne do porco, porque consideramos impura — explicou, voltando a massagear as mãos dela, passando o sabão pelas feridas. Louise piscou, surpresa pela descoberta. — Oh, então a carne que tem sido servida... — Fez uma careta de repulsa e suspirou, tentando não pensar naquilo. Concentrou-se no trabalho que Said fazia em suas mãos, o cuidado com que contornava sua pele. — O que é isso? — perguntou, olhando para o estranho sabão.


— É feito de raiz de oliveira e tem propriedades curativas. — Ele acabou a massagem e deixou o sabão cair na água, mas não soltou as mãos de Louise. Em vez disso deslizou as suas para os punhos dela. — Eu deveria castigá-la por isso — disse nervoso, a raiva voltando a dominá-lo. Ela puxou os braços, tentando se desvencilhar. Por que mudava de humor tão rapidamente? Antes terno e agora bravo. — Solte-me — sussurrou ela, porém o aperto dele era forte. Seu coração voltou a disparar, mas agora era de medo. Não de que lhe fizesse mal, e sim do olhar azul tão frio que dirigia a ela. — Por favor. — suplicou e então foi liberada. Foi a deixa que Louise precisava para enganá-lo e, com uma rapidez absurda, conseguir se mover até a escada, fugindo, mesmo nua, para fora da água. Encontrou uma toalha sobre a mesa e enrolou no corpo, não querendo que ele visse sua nudez. — Volte aqui agora mesmo! — Said gritou de dentro da água e, ao vê-la olhar para a porta com intenção de fugir, rugiu como nunca: — Nem pense em fugir de mim, porque, tenha certeza, irei castigá-la por isso e não pensarei duas vezes antes de fazê-lo. Quando Said começou a sair da água rapidamente, a lady não pensou muito antes de pegar uma das tigelas de óleo e atirar contra ele, que só teve tempo de desviar-se. O objeto se espatifou contra a parede e caiu na água. O Sheik continuou avançando e, sem mais opções, Louise atirou um pente, que passou voando ao lado da cabeça dele. — Não toque em mim — murmurou ela, espremendo as costas contra a parede. — A culpa de sua desobediência é minha. — Suspirou, abaixando a cabeça. — Desde o começo, eu deveria ter sido mais rigoroso. Não devia ter concedido nada do que me pediste. Eu devia ter tratado você como todas as outras. O lábio de Louise tremeu; ela ficou angustiada ao ouvir aquelas palavras. Tentou desviar o olhar, mas ele segurou seu queixo no lugar, querendo que ela olhasse para seu rosto. — Permiti que tivesse liberdades. — Roçou o lábio dela com o polegar e a fez arregalar os olhos. — Tentei fazer com que compreendesse aos poucos sua posição em meu reino, ofereci-lhe regalias. Mas nada adiantou, não é? Demonstrou sua ingratidão a mim todas as vezes. — Como ousa... — Ofegou. — Mas, felizmente, como o Sheik de Hamed, ainda posso fazer a coisa certa. Ainda posso corrigir meu erro. — Arrastou o dedo até o pescoço dela e apertou a grossa veia, fazendo-a engolir em seco. Oh, Deus! Ele a mataria? Louise estava quase chorando, consciente de que aquele momento era semelhante a um de que o pai muito falara. Ele estava em alguma escavação subterrânea e a terra começava a desabar sobre sua cabeça, trazendo a consciência de que iria morrer. Infelizmente ela


tinha procurado a própria morte. O Sheik inclinou o rosto até o ouvido dela e sussurrou: — Corrigirei meu erro fazendo-a minha como desejei desde o início — e, quando ela ia protestar, ele a segurou pelo queixo, beijando-a na lateral dos lábios. — Beije-me, Louise. Seja minha, por favor. Por Deus! Como ela diria não quando apenas com um leve toque já estava se derretendo? —Sim — ela sussurrou, oferecendo os lábios a ele. Said tomou a boca de Louise em um beijo desesperado, que, num primeiro momento, assustou-a. Quando a língua de Said começou a desbravar a boca da inglesa, conquistando o espaço que lhe pertencia, ela arfou, ainda tentando impelir resistência. Mas acabou não resistindo à mastreia com que o Sheik a beijava e aos movimentos que os lábios dele faziam nos seus; deu-se por vencida diante daquele assalto prazeroso. Os lábios do Sheik deixaram a boca de Louise e desceram para seu pescoço, onde a chupou com força, deixando uma marca avermelhada na pele. Ele ainda teve a ousadia de morder o lóbulo da orelha dela, enquanto soltava a toalha que cobria seu corpo, deixando-a cair ao chão. Ah... Sim, ela queria mais. Ele se afastou para contemplá-la apenas por um momento. Seus olhos devoradores pararam exatamente na junção das coxas dela, e ele sorriu, satisfeito ao ver que havia sido depilada como ele ordenara. Envergonhada, Louise tentou cobrir os seios e sua intimidade, mas então Said afastou-lhe as mãos e as prendeu contra a parede, deixando-a totalmente exposta para ele. Ela esperava pelas palavras dele. Sabia que estava um tanto acima do peso e que sua barriga estava proeminente, assim como seus quadris. Ora, nem sabia por que se importava com os pensamentos dele! Mas Said não disse nada. Não tinha palavras para descrever o desejo que estava sentindo, então fez o que mais desejava: colar o corpo ao dela. Ela arquejou quando a mão do Sheik alcançou sua coxa, subindo lentamente para sua intimidade, o polegar a provocando. Quis gritar, assustada com os sentimentos e com a necessidade que estava sentindo devido ao trabalho da boca de Said em seus seios, chupando seus mamilos e os beliscando com os dentes. Ao ouvi-la gemer, o Sheik perdeu o controle e a suspendeu em seu colo, segurando-a pelas nádegas, pressionando-a contra a parede. Seu membro tocou a intimidade dela e a fez arquejar, surpresa. Said voltou a tocá-la entre as pernas, penetrando-a com um dedo, depois outro, movimentando-os devagar e em seguida com mais velocidade. Quando a viu com a cabeça jogada para trás, Said deu atenção ao ponto de prazer dela, fazendo círculos rápidos, que logo a levaram a experimentar algo supremo.


Louise apertou os ombros de Said, tomada por aquela sensação desconhecida e crescente, que a levava a, mesmo de olhos fechados, ver estrelas. Deus, o que era aquilo? Contorceu-se, sendo jogada pelo precipício, voltando para a Terra em sequência. Ainda estava se recuperando quando sentiu o toque de Said lá novamente. Mas não era com as mãos... Louise gemeu quando o Sheik a penetrou de uma só vez, rasgando sua virgindade, provocando-lhe um grande desconforto. Ele arregalou os olhos e parou, chocado com o que tinha acabado de descobrir. Louise começou a chorar baixinho, colocando o rosto no ombro dele, que, pela primeira vez em anos, viu-se em um grande dilema. — Por que não me contou? — perguntou entre dentes no ouvido de Louise. — Eu tentei! — gritou ela, nervosa. Quando sentiu que ele começava a se retirar de dentro de seu corpo, Louise se prendeu às costas dele. — Não pare! — De maneira nenhuma iria permitir que tudo acabasse daquela forma. Queria mais daquela sensação... O Sheik tomou várias respirações antes de voltar a se movimentar dentro dela, agora mais devagar e com cuidado. — Quero que sinta-se bem, gazela. –murmurou ele, arfando. Agarrada a Said, Louise tentou controlar o nervosismo, enquanto ele entrava e saía de seu corpo. A dor estava passando e agora ela sentia algo bom acontecendo onde seus corpos se encontravam. Sentiu que ele acelerava os movimentos e cravou as unhas em suas costas, apertando os lábios para não gemer com a sensação de prazer que começou a tomar conta dela. Said deixou o corpo de Louise no último minuto e, ainda com ela nos braços, usou a própria mão para finalmente liberar-se. A inglesa não se movia. Quando ele conseguiu clarear os pensamentos, percebeu o que tinha acontecido. Deixou-a sobre uma das camas, vendo-a gemer quando sentou e pegou uma das toalhas, molhando-a na água, usando-a depois para limpar as manchas de sangue das pernas de Louise. Embora constrangida, ela permitiu. Ele então se limpou e jogou a toalha para o lado. — Eu... — Não sabia o que dizer, estava sem chão com o que tinha acontecido. Ela ficou imóvel enquanto ele vestia a calça e usava mais uma toalha para enrolar no corpo de Louise. Quando a pegou no colo outra vez, ela se retraiu. O Sheik deixou o aljibe e fez todo o caminho de volta para o quarto de Louise, mal se importando de encontrar algumas mulheres e guardas, que simplesmente baixavam os olhos, fingindo desinteresse. Ao chegar ao quarto dela, Said a colocou na cama e a cobriu com um dos lençóis. Louise se virou para o outro lado, dando-lhe as costas. O Sheik pensou em algo para dizer, mas tudo que havia em sua cabeça era o desejo de saber o motivo de ela não ter lhe contado.


Virgem. Ele não dormia com virgens. Nunca. Porque sabia que tinha consequências. Como ele pôde se enganar? Ela tinha dado claros sinais de que era experiente. Por Aláh! Aquela mulher tinha passado semanas ao lado de vários homens no mesmo acampamento. Como fora acontecer tal coisa? E o pior de tudo era que Said sabia o que tinha que fazer. Faria mesmo que ela não fosse virgem, mas tinha pensado em aproveitar a companhia dela ao menos mais algumas vezes. Porém naquele momento... Abaixou a cabeça e se voltou de costas. Ao dar uma última olhada nela antes de sair, viu o movimento dos pequenos ombros, revelando que Louise chorava. Ainda tomado pelo ódio de si mesmo, Said deixou o quarto. Deixou-a. *** Para surpresa de Louise, poucos minutos depois, Najila apareceu para vê-la, dizendo que tinha sido enviada pelo Sheik, para conferir-lhe cuidados. Sem dizer uma única palavra, a lady permitiu que Najila a ajudasse a vestir uma das calças folgadas, além de uma camisa de linho. A mulher também lhe penteou os cabelos, com uma delicadeza que fez Louise querer chorar ainda mais. — Deseja comer algo? — a serva perguntou em voz baixa. Louise negou. — Foi tão ruim assim? — insistiu a mulher. — Não. — respondeu, levantando da cama, sentindo um incômodo entre as pernas. Najila percebeu e se aproximou dela. — Ele a machucou, senhorita? — Os olhos da mulher estavam muito abertos, uma expressão assustada. Louise negou. — Eu... Não contei a ele que... era virgem — confessou envergonhada. Najila deixou a escova cair no chão ao ouvir aquilo e ficou alguns minutos sem falar. — Como pôde enganá-lo dessa forma? — quase gritou, estupefata. A lady entrelaçou os dedos uns nos outros e deu de ombros. — Eu não sabia que deveria contar a ele algo tão íntimo! — explodiu, perdendo a paciência. — E eu não entendo por que ele ficou tão bravo por isso. Ele não deveria ficar feliz? — perguntou confusa. Najila respirou fundo e se sentou ao lado dela. — Acho que a senhorita precisa saber de algo. — Hesitou, olhando para Louise, mas decidiu continuar, mesmo sabendo que corria risco de o Sheik saber. — Nosso senhor não se deita com


virgens. — Não? — Não. Há anos, noite após noite, o Sheik se deita com uma mulher diferente, escolhida por ele mesmo ou por seu vizir. Normalmente são mulheres que se dispõem a satisfazer ao Sheik ou que são gratificadas por isso — ela contou. Louise tinha o queixo caído, não conseguindo acreditar no que ouvia. Said se deitava com uma mulher diferente todas as noites! — Por quê? — conseguiu perguntar. Najila brincou com uma pedra azul de sua saia, distraída. — Não sei exatamente. Mas ouvi dizer que tem a ver com uma mulher muito má e algo que ela fez a ele. Depois disso meu senhor nunca mais se envolveu com alguém, a não ser por uma única noite. — E o que acontece com elas na manhã seguinte? — Esse era o medo de Louise. — Algumas aceitam se casar com algum homem que meu senhor ordena, outras querem continuar nos acampamentos, ou voltar para a família — explicou. Louise ainda não queria acreditar em tudo aquilo, principalmente porque se dava conta de que ela mesma era uma daquelas mulheres; agora que Said tinha conseguido o que queria dela, era evidente que se livraria de sua presença ali. — Como ele encontrou tantas mulheres todos esses anos? — questionou, querendo mudar os pensamentos. — Ele faz trocas com os outros reinos, com os outros acampamentos. Há muitos aliados que cedem suas concubinas e há também aquelas que vêm por vontade própria até aqui. — Najila — falou Louise, segurando o braço dela. — Você acha que o Sheik me mandará embora? De volta para minha casa? — Tinha esperanças de que sim. A mulher a fitou por um momento com um olhar de pena e depois a segurou pela mão. — Pelas leis do reino, a senhorita cometeu uma falta grave, passível de punição com morte e, na melhor das hipóteses, com mais de cem chibatadas, exposta diante de todos. — Mas eu apenas não contei que era virgem. Isso é um completo absurdo! — exclamou, ficando de pé. Najila pensou por um momento. — Meu senhor também pode permitir que se case com algum comerciante, ou ser uma concubina. O destino de Louise só piorava! A morte, ser forçada a se casar, ou então ser uma prostituta? — Preciso sair desse lugar. — Sua mente começou a trabalhar rapidamente. — Ajude-me a fugir, Najila, por favor.


A mulher se levantou também. — Se eu fizer isso, meu pescoço será arrancado de meu corpo sem piedade alguma, senhorita. E o mesmo acontecerá com você se tentar. — Olhou para a porta e em seguida cochichou. — Eu tenho um plano. Louise se aproximou para ouvir. Estava ciente de que seria uma completa loucura, mas que opções tinha, além é claro da morte e de uma vida de prostituta? Terminada a conversa, quando Najila deixou o quarto, Louise ficou de joelhos na cama e permitiu-se respirar fundo. A única coisa que desejava era voltar para casa, mesmo agora, desonrada, mesmo sem êxito em sua escavação e ainda que morrendo de medo. Ainda conseguia lembrar-se das sensações deliciosas que ele tinha lhe proporcionado. Mesmo com o desconforto e o silêncio que veio a seguir, ela tinha gostado, em parte, daquilo. Oh..., seu pior erro. Agora teria que colocar em prática o plano de Najila ou então aceitar que aquele homem continuasse a reger sua vida como se ela fosse uma simples boneca em suas mãos. Mas, não. Depois do que tinha se passado, Louise sabia o que fazer; tinha certeza de que derrotaria o poderoso Sheik e enfim voltaria para casa. Precisava apenas controlá-lo, fazendo com que ele lhe permitisse ficar mais tempo no palácio, tempo que precisava para conseguir formular um plano para voltar para a Inglaterra, porque sabia que, se fosse vendida, ou casasse, ou até mesmo se tornasse uma prostituta, suas chances de fuga se reduziriam a zero. Em meio à confusão de sua mente, Louise sorriu, pensando que, para destruir Said, usaria o que ele tanto desejou: seu corpo. Era isso; Louise seduziria o Sheik de Hamed, noite após noite, conseguindo um dia a mais, até que finalmente conseguisse sair daquele palácio.



Capítulo Onze Said tremia, segurando com força a borda da janela de seu quarto, procurando no ar da noite uma forma de conseguir manter a calma. Era como se algo lhe tivesse cravado no peito, roubando-lhe o ar. Tentava encontrar uma explicação, uma fuga para tudo aquilo, mas, quanto mais pensava, mais via que a culpa era totalmente dele. Em nome de Aláh... Virgem. Louise era virgem, e ele a tinha possuído daquela forma... Transtornado, Said pegou a mesa ao lado da cama e a jogou contra a parede, lançando em seguida as peças de cerâmica que ficavam sobre um aparador, as quais aterrissaram em pedaços no chão. A única coisa que desejava era aplacar aquela ira que o dominava. Ajoelhou-se ao lado da cama e enroscou os dedos no lençol, procurando fugir da escuridão que tentava arrastá-lo para baixo. Fechou os olhos e fez uma prece a Aláh, pedindo que o orientasse e que lhe mostrasse o melhor caminho. Havia perdido o controle com ela, deixado se levar pelo desejo que o tinha cegado. Como tinha acontecido? Said era um homem que se baseava no controle, no poder e que não permitia nada sair de suas mãos. Mas naquela noite... Como havia se enganado daquela forma? Concluiu que Louise era experiente devido ao seu comportamento e por ela conviver com aqueles homens. Mas ela era uma dama! Said tinha deflorado uma dama! Ela tinha se sentido bem nos braços dele, o Sheik tinha certeza disso. Mesmo sendo bruto ao possuí-la, ele sabia que Louise tinha alcançado seu prazer. Que tipo de homem ele era? Estava excitado ao recordar como ela tinha se entregado em seus braços, gemendo seu nome de uma forma tão sensual. E, inferno, ele a queria novamente ao lado dele, porém dessa vez mais lentamente, seduzindo-a, deixando-a preparada. Queria mostrar à inglesa que era bom e que havia centenas de formas de se sentir prazer. Por Aláh! Em que confusão tinha se metido? O fato de Louise ser virgem complicava a vida de Said ainda mais, já que era expressamente proibido a ele — dada sua consciência — deitar-se com uma mulher pura. Havia ditado tal regra pelo que tinha acontecido no passado, e essa era a única que nunca quebraria. Mas, bem, havia acontecido! Agora o que faria? É claro que, antes mesmo de tê-la, sabia que teria que fazer com ela o mesmo que com todas e até tinha cogitado mantê-la no palácio, sob seus cuidados, usufruindo de seus dotes por um longo período até que não fosse mais necessária a presença dela ali. Mas como faria isso depois de tudo que tinha acontecido? O pior era que o que mais irritava Said não era sua consciência, que o estava quase matando; era aquele desejo de tê-la ao seu lado por muito mais tempo. Estava dividido entre seu dever de mandá-la embora, casando-a com algum bom homem, e


deixá-la permanecer no palácio ao seu lado. Exasperado, Said levantou e olhou ao redor, presumindo que a destruição do quarto daria muito que pensar às servas que viriam para arrumá-lo pela manhã. Ainda vestido apenas com a calça e de pés descalços, ele caminhou para fora do quarto, sentindo o frio do piso de mármore, que lhe causava arrepios. Os corredores estavam vazios como antes, preenchidos por um enorme silêncio. As velas presas às paredes tornavam o local quase como uma das passagens secretas que o pai descrevia para ele nas histórias. Esse pensamento fez com que o Sheik sentisse saudade daquela época, quando não havia o peso de um reino sobre seus ombros, e ele não era responsável pela vida de tantas pessoas. Said recordou-se de quando sua mãe lhe ensinava que deveria ser um bom menino e dos momentos em que logo depois ele fugia para os poços de água, onde jogava pedras, ou quando soltava as estacas das tendas do acampamento, causando uma enorme confusão. O que sua mãe diria ao vê-lo naquele momento, em seus trinta e um anos, com um reino tão grande para governar, sem esposa, sem filhos e com aquela confusão enorme nos sentimentos? Mais ainda; o que diria ela ao vê-lo ir sorrateiramente até o quarto de Louise no meio da noite? Para sorte de Said, não havia ninguém ali para testemunhar sua atitude. Ele abriu com cuidado a porta, como tinha feito há noites atrás, quando decidiu dormir ao lado de Louise. Porém, dessa vez, queria apenas vê-la. Obviamente desejava tocá-la, sentir a maciez de sua pele e o perfume dos cabelos, mas sabia que não podia deixar-se levar novamente pelo desejo. Parou ao lado da cama e engoliu em seco ao ver a bela imagem de Louise sendo banhada pela luz da lua, que se refletia nos cabelos espalhados sobre travesseiro, fazendo-a parecer uma deusa. Ela ainda dormia na mesma posição de antes, encolhida para o outro lado, mas sua expressão parecia serena. Said a observou por algum tempo, talvez alguns minutos, talvez horas. Estava fascinado pela beleza dela. Com toda certeza era a mulher mais bela que já tinha conhecido. Nenhuma se comparava a Louise. O Sheik sabia que, mesmo querendo, não podia passar a noite em pé ali, contemplando Louise até o amanhecer e, antes de deixar o quarto, obrigou-se a tocá-la levemente, acariciando-a na bochecha, deslizando os dedos para os cabelos, sentindo-os macios. Queria enroscar-se neles, com a inglesa agarrada a seu corpo, enquanto os cabelos dela caíam sobre seu peito. Mesmo nervoso, preocupado que ela acordasse e entendesse errado o motivo pelo qual ele estava ali, permaneceu um pouco mais. Louise não se moveu, inerte nos sonhos. Precisava voltar. Agora. — Perdoe-me, Louise — sussurrou no ouvido dela antes de partir. Não queria que a estrangeira o encontrasse ali. Caso tivesse notado sua presença, poderia supor que tinha sonhado, e ele preferia


assim. *** Quando acordou, na manhã seguinte, Louise sentia-se muito bem. Espreguiçou-se na cama e bocejou, percebendo o leve desconforto entre as pernas, que a fez lembrar o que tinha acontecido na noite anterior. Havia feito amor com Said! Revirou os olhos diante do próprio pensamento. Não havia exatamente “feito amor”, porque ao que parecia o Sheik não era um homem que conhecesse a palavra amor. Mas, de toda forma, tinha se entregado a ele. Certamente Said tinha contribuído para que ela se comportasse daquela forma devassa, sobretudo quando aquelas mãos habilidosas a tocaram de um jeito tão tentador e seu corpo se transformara em apenas sensações. Ah, sim... As sensações maravilhosas que sentira! Mas, espere! Nem tudo tinha sido maravilhoso. Ora, não tinha esquecido que Said, depois do ato, tinha se comportado como um idiota. Como ele podia ter ficado irritado pelo fato de ela ser virgem? Aliás, como pôde ter pensado que ela era uma desvirtuada? Sim, isso a irritou. A virgindade de uma mulher era um presente valioso! Karida entrou no quarto carregando a já conhecida bandeja cheia de pães e fruta, além do café, que Louise tinha aprendido a apreciar. — Bom dia, senhorita. — A mulher tinha um sorriso discreto no rosto. Louise via-se faminta e logo começou a se fartar com os pães. — Eu gostaria de me banhar agora pela manhã, Karida— pediu entre mordidas no pão. — Pedirei que os guardas tragam a banheira para seu quarto. — Ela se sentou na beirada da cama e fitou Louise, procurando assunto. — Meu senhor viajou logo pela manhã. Com a boca cheia, Louise encarou a mulher, surpresa pela notícia. — Ele disse para aonde? — perguntou, sentindo uma grande curiosidade. Said havia voltado há pouco e já viajava novamente? Claro, não que fosse de sua incumbência. — Ao palácio de um amigo ao leste. — Karida lambeu os lábios, ansiosa. — A maioria das mulheres que se entregam ao Sheik são enviadas para lá, onde se casam com algum homem do acampamento ou servem ao califa — contou. Louise ficou sem reação, sentindo uma forte dor no estômago. Afastou a bandeja e limpou a boca na toalha ao lado do prato de frutas. Said tinha ido negociá-la? Fora oferecê-la? Sentiu os olhos pinicarem, mas não chorou. Desde a noite anterior, tinha decidido que tomaria as rédeas de sua vida. Na verdade, tinha decidido isso ainda na Inglaterra quando embarcou naquela viagem. E continuava a pensar da mesma forma. Seguiria com seu plano mais do que nunca. Se Said


achava que podia simplesmente jogar com sua vida, estava enganado. Ela não se tornaria concubina nem se casaria com qualquer homem. Melhor ainda; compreendia que tinha grande influência sobre o Sheik e que seria fácil manipulá-lo para que conseguisse voltar à Inglaterra. Bebeu um gole do café e sorriu ironicamente. Que mal haveria em sentir mais daquelas sensações deliciosas que ele tinha lhe provocado? Louise sabia que sua honra já estava manchada de toda forma. Quando voltasse para a Inglaterra, iria se dedicar somente à arqueologia, não precisava de casamento ou filhos. Bastaria o que estava vivendo ali. Sim, veria tudo aquilo como a grande aventura de sua vida. Não se rebaixaria mais, nem temeria o Sheik com suas ameaças. — Karida, quero ver Najila, para que continuemos com as lições — informou, sorrindo por trás da xícara. As coisas começariam a mudar naquele palácio, e ela seria responsável por isso.



Capítulo Doze Pouco depois de vestir-se com uma túnica que a cobria até os pés, Louise acompanhou Najila pelos corredores do palácio, enquanto a mulher lhe explicava a divisão das tarefas de todos ali. A serva contou como as mulheres reuniam-se para organizar as dependências do palácio e que somente aquelas que estavam autorizadas poderiam entrar no aposento do Sheik. Além do mais, segundo deliberação dele, todos os servos recebiam a cada certo período uma compensação pelo trabalho, diferentemente dos serventes da maioria dos reinos que trabalhavam somente pela comida. — E as famílias? — Louise perguntou, curiosa a respeito daquelas pessoas. Najila abriu uma grande porta de madeira e permitiu que a lady passasse. — A maioria de nós tem parentes vivendo no acampamento, senhorita — respondeu enquanto indicava uma sala onde algumas mulheres fiavam tapetes e cortavam grandes tecidos. — Aprendemos a produzir nossa própria tapeçaria — contou orgulhosa. Louise ficou admirada com a eficiência dos servos do palácio. Tudo era extremamente organizado e nada parecia sair do controle. Obviamente um reflexo do homem que governava tudo aquilo. Depois de visitarem o corredor onde ficavam os quartos de hóspedes jamais usados e os tanques de água onde as roupas eram lavadas, Najila conduziu Louise até o acampamento próximo, o mesmo que ela tinha visto ao chegar ali. Era a primeira vez que Louise realmente saía daquele palácio, e ela estava um pouco nervosa por isso. Os guardas as acompanhavam sorrateiramente, segurando suas adagas mortais, lembrando sutilmente o que acontecia com qualquer pessoa que desobedecesse às leis. Bem, Louise estava ciente de tudo. Com o rosto coberto por um véu escuro, que a protegia da areia e também, de certa forma, deixava-a mais segura, Louise seguiu Najila pela entrada do acampamento, encontrando primeiro um grupo de crianças que corriam atrás do filhote de um animal que ela não reconheceu. Era semelhante aos cervos da Inglaterra, mas diferiam na cor e no tamanho. As crianças incitavam o pequeno animal a correr, enquanto o seguiam gritando, levantando areia por onde passavam. O Acampamento era uma profusão de sons, cores e aromas, que logo no primeiro momento fizeram Louise ficar tonta. Havia centenas de pessoas ali, a maioria homens, gritando em frente às barracas de onde pendiam grandes pedaços de carne, provavelmente camelos, como Said contara a Louise. Ela se obrigou a acompanhar o passo de Najila, que se desviava das pessoas com habilidade. Mais à frente do que parecia ser uma espécie de feira, havia outra grande quantidade de barracas, estas maiores, o que fez Louise suspeitar que fossem moradias.


Enquanto atravessavam por entre as rodas de mulheres que trabalhavam em tecidos e frutas secas, Louise sentiu os olhares que recaíam sobre ela. Era provável que todos soubessem quem ela era e, pior ainda, o que fazia no palácio. Quanto a isso, Louise se dignou a erguer os ombros e continuar caminhando calmamente pelo estreito corredor entre as tendas. — Precisam de ajuda para extrair o óleo, e nós vamos ajudá-las — Najila informou ao entrarem em uma enorme tenda aberta, onde quatro mulheres, cobertas dos pés à cabeça, espremiam uma fruta esverdeada sobre uma placa de ferro fundido em espiral, de onde descia um fio do óleo escuro. Louise sentou em um dos tapetes colocados no chão. Logo tinha nas mãos uma vasilha e uma faca para que retirasse os caroços do fruto. Não era uma tarefa difícil, e ela rapidamente encontrou uma forma de torná-la mais fácil. Najila estava sentada ao seu lado e, enquanto ajudava com os frutos, conversava e ria com as outras mulheres em um idioma antigo o qual Louise não compreendia. Ela começara a aprender árabe ainda criança. Frequentemente, enquanto traduzia e interpretava os documentos trazidos do Egito, o pai lhe permitia ficar em seu estúdio e, às vezes, ensinava-lhe uma palavra nova. Já naquela época Louise começara a se interessar por arqueologia. Uma risada alta atrapalhou a reflexão de Louise e, ao erguer os olhos, ela percebeu que as mulheres estavam rindo dela. Olhou para Najila em busca de uma resposta. — Elas querem saber como foi a noite com o Sheik — ela sussurrou no ouvido de Louise. As bochechas da lady ficaram vermelhas de repente, constrangida pelo assunto impróprio. Ora, aquilo era muito íntimo! As mulheres continuavam a fitá-la com tanta curiosidade, que Louise acabou se sentindo um tanto envaidecida, porque realmente sabia como era a sensação de estar nos braços de Said. — Responda apenas se gostou, senhorita — incitou Najila. Envergonhada, Louise apenas meneou a cabeça, confirmando. Foi o suficiente para as mulheres explodirem em risinhos, ocultando o rosto atrás do véu. Louise abaixou a cabeça sorriu, já que de alguma maneira ansiava contar sua experiência para alguém. Um homem baixo e de barba comprida entrou na tenda e deixou uma cesta com mais frutos, além de figos secos que deveriam ser preparados, revelando mais trabalho para aquele dia. No final, a tarefa acabou se estendendo por mais tempo que as duas haviam previsto, o que Louise não considerou um infortúnio. A inglesa apreciou a companhia das mulheres, que se mostraram amigáveis e lhe ensinaram muito sobre a alimentação no acampamento. Elas ainda serviram cordeiro assado e chá para a lady, que agradeceu pela ótima refeição. O tempo passou tão rapidamente que, quando Najila informou que deveriam voltar ao palácio, Louise se surpreendeu e ficou um pouco triste, pois havia gostado de estar ali. A serva a convenceu a voltar, com a promessa de que no dia seguinte estariam ali novamente.


No final da tarde, quando o sol avermelhado sumia aos poucos no horizonte, Louise voltou para o castelo, sentindo uma vibração no peito, causada pela estranha sensação de liberdade que a assaltou naquele dia. Como era possível sentir isso, sendo que era prisioneira ali? Najila permitiu que a inglesa fosse e a acompanhou até o jardim interno do palácio, o mesmo onde Louise havia encontrado o Sheik noites atrás. Lá, a lady, mesmo sabendo que estava sendo vigiada pelo guarda e sua adaga, decidiu por sentar-se ao lado da fonte e molhar as mãos, agraciada pela água refrescante. Foi quando um pensamento revelador a atingiu. Olhou para Najila, que estava ao lado, entretida na água da fonte. — Najila, o Sheik... — Olhou para o guarda, vendo que ele estava longe demais para ouvi-la. — Ele não possui um harém? Ao ouvir aquilo, a mulher empalideceu e virou o pescoço depressa, com medo de que tivessem sido ouvidas. Aproximou-se de Louise e sussurrou: — Meu senhor segue o mesmo decreto do falecido pai que, desde o momento em que se apaixonou pela mãe do Sheik, ordenou que todas as concubinas deixassem o palácio. Ele as proveu e garantiu-lhes um futuro digno, mas nunca mais permitiu que o harém fosse refeito. — Sorriu tímida. — O Sheik poderia ter encontrado centenas de mulheres para seu prazer, dispostas a servi-lo a qualquer momento. Mas ele simplesmente não quis. Ainda abalada por aquela resposta, Louise foi levada novamente para seu quarto. Ela usou a água das bacias para limpar o corpo e depois recebeu das mãos de Karida uma refeição, que, de acordo com padrões da lady, estava fantástica. O cansaço logo a conduziu a um sono tranquilo, mas não sem antes ser atacada por pensamentos que remetiam a Said, a seus quentes beijos e à terrível falta que estava sentindo dele. *** A rotina do dia seguinte decorreu da mesma forma do anterior. Dessa vez Louise estava animada para saber mais sobre aquele povo e seus — desconhecidos e estranhos, para ela, mesmo que fosse uma arqueóloga — costumes. Pela manhã, Najila e ela passaram o tempo na sala de tapeçaria, recebendo ensinamentos sobre como preparar o fio de ouro para bordar os desenhos tão perfeitos no tecido grosso. Para Louise não foi exatamente algo fácil, já que sempre teve dificuldades com linha e agulha. Precisava admitir que não tinha a mesma habilidade das outras mulheres. Na Inglaterra, durante sua primeira temporada, em que uma tia matrona a conduzira em sua apresentação à sociedade, ela foi terrivelmente humilhada nas reuniões ao ser questionada sobre bordados. Revoltada, Louise impôs-se, argumentando que a perguntassem sobre vasos chineses ou escaravelhos, e não sobre algo tão insignificante quanto bordado. Sobre moda, a jovem dama decidiu não tomar parte na discussão. Desnecessário dizer que


aquela temporada havia sido um desastre. Apesar de sua falta de habilidade, o trabalho junto das mulheres do palácio não foi tão enfadonho como Louise havia suposto. Primeiro vira-se encantada com o minucioso trabalho de bordar os fios de ouro, o que, para completar os mosaicos, levava longas horas. Porém Louise ficou horrorizada quando viu a situação das mãos das mulheres. Os cortes e furos por causa da agulha mediam-se pela palma e os dedos, consequência da falta do uso de um dedal. Fez uma anotação mental de pedir a Said que oferecesse isso a elas. Após o almoço farto, Najila informou que passariam o resto do dia ajudando uma jovem, que estava próximo de ter um bebê, no acampamento. Ao ver a mulher ainda muito jovem, deitada em uma cama de almofadas, com as mãos sobre a barriga protuberante, Louise ficou receosa. Nunca convivera com mulheres grávidas e, mesmo sabendo na teoria o que acontecia, não estava preparada para descobrir na prática a verdade. Najila pediu que ela refrescasse o rosto da jovem com água fresca e a mantivesse calma, enquanto as mulheres mais velhas verificavam como estava o bebê. — Obrigada — a mulher agradeceu quando Louise ofereceu um gole de água na bolsa de couro. Ao final da tarde, quando precisaram retornar ao palácio, Louise estava nervosa por causa da mulher e do bebê. Em um momento escutara uma das senhoras sussurrar para a outra que era possível que o bebê não nascesse com facilidade e que deveriam estar preparadas para escolher entre a mãe e o filho. Com o coração aos pulos, a inglesa acompanhou Najila até a cozinha para ajudar Karida com a comida. Ao que parecia, a ansiedade só atingira Louise e, quando esta contou seus temores às duas mulheres, ficou apavorada, pois logo soube quantas crianças não conseguiam nascer no acampamento. Quando se deitou naquela noite, a lady se embrulhou nos lençóis e pediu aos céus que permitisse que o inocente bebê viesse ao mundo. Não sabia por que tinha se envolvido tanto naquilo, mesmo tendo em mente que deveria deixar sentimentos fora de tudo que fizesse no palácio. No meio da madrugada, a porta do quarto de Louise foi aberta com um empurrão, acordando-a. Com um sobressalto, ela ergueu o torso, quase caindo da cama. Era Said? Angustiada, entrecerrou os olhos e tentou distinguir a figura no escuro. — Senhorita, preciso de sua ajuda. O bebê de Makaila está nascendo! — Era Najila, que já estava ao lado da cama, apontando nervosa para a porta. Louise acendeu as velas e vestiu a grossa túnica rapidamente, lembrando-se de usar o espesso véu que lhe fora dado, além das sandálias de couro. As duas, sob escolta, apressaram-se em atravessar os corredores do palácio e seguir até o acampamento, que estava em completo silêncio e escuridão. A tenda de Makaila era uma das últimas e quando chegaram à sua frente, ao ouvir os gritos


desesperados da mulher, Louise paralisou. O guarda tocou em seu ombro e a mandou continuar. Ela respirou fundo e apertou os panos limpos que carregava contra o peito. Lá dentro, a mulher continuava deitada no mesmo lugar, porém estava nua, com um lençol branco posto sobre a barriga, permitindo que as senhoras tivessem acesso para ajudar o bebê a sair. Sem saber exatamente o que fazer, Louise ficou em um canto da tenda, observando o revezamento das senhoras para ajudar Makaila a ter o bebê. Pelo que podia compreender das conversas apressadas, a jovem não estava conseguindo fazer com que a criança nascesse, já que suas forças estavam esvaindo-se. Não! A lady sentiu os olhos arderem ao perceber que as opções para ajudar a mulher estavam acabando. Queria contribuir! Queria que o bebê nascesse e que a mãe ficasse bem! Mas o que poderia fazer? Era apenas uma arqueóloga e somente sabia varrer poeira de artefatos e catalogá-los. Perturbada pelos gritos, Louise sentou em um banquinho no fundo da tenda e abraçou os joelhos, limitando-se a pedir aos céus que tivessem piedade da pobre mulher. Ficou naquela posição por muito tempo, ouvindo os gritos da jovem, que pedia para abrirem-lhe a barriga e retirar o bebê. Louise espiou por entre as mãos quando outra velha entrou na tenda e foi diretamente para Makaila, colocando-a em outra posição, ensinando-lhe como contrair a barriga e empurrar o bebê. A jovem fez o que era pedido e, agarrada a uma almofada, soltou um último grito. Por alguns segundos, reinou o completo silêncio e em seguida um choro baixinho invadiu a tenda. Najila correu para envolver o pequenino ser nos tecidos limpos e auxiliou a velha senhora no corte do cordão umbilical, segurando o bebê no colo com satisfação logo depois. — Veja como é bonito — Karida chamou Louise para ver o bebê antes de entrega-lo para a mãe, que agora descansava de olhos fechados. Aproximando-se com cuidado, ao deparar com o bebê que continuava a chorar, jogando os pequeninos braços e pernas pelo ar, Louise não controlou as lágrimas. Ela segurou a mãozinha e sorriu ao sentir o calor da pele dele na sua. As mulheres acomodaram o bebê nos braços da mãe, que, ao ver pela primeira vez o filho, sorriu apaixonada. Beijou a cabecinha do bebê e o embalou contra o peito, passando os dedos pelo rosto dele. Louise assistia à cena de longe, surpresa pela extrema felicidade da mãe ao ter o filho nos braços, parecendo esquecer-se dos momentos em que quase perdera a vida. Era como se, ao abraçar o bebê, todos os momentos de dor desaparecessem. A lady engoliu o nó que se formou na garganta ao perceber que jamais sentiria tal sensação. Sabendo que a ajuda não seria mais necessária, Najila levou Louise de volta ao palácio e logo para o quarto, despedindo-se com um sorriso de satisfação.


Depois de tudo que tinha acontecido, Louise teve dificuldade para dormir e, quando conseguiu, mais uma vez foi atormentada pela imagem de Said a beijando. Mesmo na noite escura e fria, a lady sorriu sonhando. *** Gritos. Passos apressados. Ordens. Louise abriu os olhos assustada, quando pela manhã foi acordada com a certeza de que o palácio estava sendo invadido por algum exército. Ela esperou que alguém entrasse no quarto e lhe dissesse o que estava acontecendo, mas, como não aconteceu, decidiu procurar saber o que era aquela confusão. Vestiu a roupa, prendeu os cabelos e abriu a porta, antecipando que o guarda a impedisse de sair. Mas ele não estava ali. Estranhando a situação, Louise deixou o quarto e caminhou pelo corredor, até chegar ao salão principal, onde dezenas de guardas corriam emitindo ordens, abrindo caminho para que dois homens fortes passassem carregando um corpo inerte, que ela não conseguiu identificar. A inglesa abordou uma mulher que corria com uma bacia de água e ataduras. — O que aconteceu? — perguntou assustada. A mulher mal parou para responder: — O Sheik foi ferido e está mal. Louise encostou-se à parede e deixou que as pessoas passassem por ela. Como tinha sido ferido? Ele... morreria? Ainda em choque, ela caminhou pelo principal corredor do palácio e percebeu que a porta que dava para a saída estava desprotegida. Não havia ninguém ali, nenhum guarda. Olhando para os lados, Louise cobriu o rosto com o véu e se apressou para chegar até a porta. Tinha sua chance de fugir! Apenas mais alguns passos e estava livre! Mas antes que saísse para a liberdade, os pés da lady pararam de se mover, e ela se apoiou à parede. Seu coração batia como se fosse arrebentar no peito, e a boca ardia pela secura. Sabia que era um erro, mas, quando olhou para trás, para a direção onde Said tinha sido levado, algo a dividiu. Said estava morrendo... E ela tinha a chance de fugir, de voltar para casa, o que nunca mais aconteceria. Por que hesitava? Não deveria se importar com o Sheik. Na realidade, deveria estar feliz! Mas não estava e quanto mais pensava, mais se via dividida. A liberdade... ou o Sheik.



Capítulo Treze Louise tinha certeza de que se arrependeria daquela decisão mais tarde e que se sentiria uma completa tola. Mas como poderia fugir sabendo que Said estava à beira da morte? O problema é que não poderia! Apesar de tudo que havia acontecido, Louise tinha consciência de que o Sheik não era um homem mau. É claro que ele tinha feito diversas coisas que a desagradaram, principalmente mantê-la ali aprisionada. Mas, infelizmente, para o desgosto de Louise, havia também algo dentro dela que a impedia de partir; algo poderoso, o mesmo que a fazia ficar de pernas bambas quando Said estava ao seu lado e que a fazia odiá-lo com a mesma intensidade que sentia aquelas coisas... quentes. Foi por isso que ela saiu batendo os pés, de volta para o grande corredor do palácio, em busca do Sheik. Talvez, se ele não estivesse tão mal e quando todos estivessem distraídos, ela poderia tentar fugir novamente. *** O Sheik suava frio, com a cabeça inclinada contra o travesseiro, enquanto dois de seus guardas prendiam seu corpo na cama e o mestre da cura do acampamento trabalhava em seu braço. O ferimento era grande e se estendia do ombro até o bíceps. A carne aberta revelava os músculos e a exorbitante quantidade de sangue que molhava os lençóis. Said gemeu, debatendo-se quando o homem rasgou sua camisa e lavou o corte, retirando o sangue que continuava a brotar de sua pele. Todos os presentes no quarto ficaram em silêncio quando o homem explicou que provavelmente a adaga que havia perfurado o braço de Said estivesse envenenada e que, se não conseguissem parar o processo de infecção, o Sheik poderia perder o braço ou até mesmo morrer. Quando as bandagens limpas foram postas sobre o ferimento, o mestre da cura pediu que todos se retirassem e respeitosamente pedissem a Aláh pela vida de seu senhor, enquanto ele mesmo se ocupava de lhe aliviar as dores, administrando chás e compressas. Louise esperou que os guardas e as mulheres deixassem o quarto para finalmente sair de trás do grande tapete onde estava escondida. Caminhou na ponta dos pés até a porta do quarto e a abriu lentamente, assustando-se ao ver que havia um homem ao lado de Said. Ele percebeu a presença de Louise, que, constrangida, fez menção de fechar a porta. — Espere! — O senhor se levantou e foi até a porta. Era um homem de idade avançada, barba comprida e que usava roupas muito coloridas. — É a estrangeira, a escrava do Sheik? — perguntou, olhando-a de cima a baixo. Louise ergueu o queixo e o encarou.


— Sou Louise — respondeu petulante. O homem sorriu, mostrando seus poucos dentes. — Todos estavam certos ao dizerem que o Sheik tinha escolhido a mais bela mulher — comentou, surpreendendo a lady. — Preciso de sua ajuda, bela dama. Pode entrar por um momento? Ela não hesitou em entrar e, quando passou pelo homem, correu até a cama, ficando petrificada ao ver o estado de Said. Ele estava imóvel, o corpo esticado na cama, os olhos fechados em uma expressão de dor, enquanto seu braço... Oh, Senhor... O que tinha acontecido a ele? Louise não pôde evitar a sensação ruim em seu peito e nem a vontade absurda de chorar por aquele homem. Cruzou os braços sobre o peito e mordeu o lábio, tentando manter-se controlada, porque não estava sozinha no quarto e não poderia deixar aquele homem vê-la chorando. Aproximou-se mais um pouco, o suficiente para ter uma boa visão da ferida no braço de Said. Sentiu uma forte onda de náusea e precisou fechar os olhos para não sucumbir. — Ele ficará bem? — perguntou para o homem. Ouviu-o suspirando e, depois, seus passos enquanto caminhava pelo quarto. — A adaga estava envenenada e atingiu o músculo. Se eu não administrar o remédio correto, o veneno causará uma infecção que pode levá-lo à morte — contou. Louise virou-se depressa para o homem. — E por que não está fazendo isso neste momento? — Sua voz soou tão afiada e acusatória que assustou ela própria. O mestre da cura desviou o olhar para a janela e respirou fundo. — Preciso de um óleo que é encontrado apenas na cidade. Sem ele não posso preparar o remédio corretamente — explicou ele. A lady olhou para o Sheik e pensou por um momento. — Envie um guarda para encontrar o que precisa — sugeriu ela. — Ninguém saberia encontrar o óleo sem minha ajuda, estrangeira. É algo precioso e difícil de ser encontrado. Porém tenho um conhecido que poderia me ceder o suficiente para curar o Sheik. A cada minuto que se passava, Said piorava, e Louise estava começando a sofrer junto dele. Não conseguia imaginar a dor que ele sentia e temia pelo que aconteceria caso não tratassem a infecção. E ali estava ela, diante de mais uma grande decisão, a pior de todas; podia ajudar a salvar a vida do Sheik de Hamed, de seu captor, do homem que a aprisionou ali. — Vá até a cidade e consiga o suficiente para curá-lo. Eu cuidarei do Sheik — afirmou, olhando para Said e depois para o homem. — Mas... São dois dias de viagem se prosseguirmos pela noite. Não tenho certeza de que o Sheik conseguirá sobreviver até lá — disse o mestre da cura, visivelmente preocupado.


Louise voltou a olhar para Said, dessa vez sentindo que estava fazendo a coisa certa e de que, sim, ajudaria a mantê-lo vivo. — Parta agora mesmo, e eu prometo que farei tudo que estiver ao meu alcance — e sua promessa era verdadeira, como nunca antes. O homem saiu sem dizer nada, deixando-a finalmente a sós com Said. Ao ver-se sozinha, Louise cedeu ao desejo de se sentar na cama ao lado do Sheik e, com muita delicadeza, tocar sua mão, do lado que não estava ferido. Suspirou ao sentir a pele tão fria contra a sua e não pôde mais controlar as lágrimas ao ver as manchas roxas no peito desnudo de Said. Teve vontade de tocá-lo ali, para que seu toque ajudasse a sanar os hematomas. O que mais poderia fazer além de tentar baixar a febre e pedir aos céus que poupassem a vida daquele homem? O pior de tudo era que Louise não tinha noção do motivo que a levava a querer salvar a vida de Said. Ora, deveria querer vê-lo morto! Deveria estar feliz, seguindo rumo à Inglaterra. Mas, em vez disso, estava sentada ao lado dele, derramando lágrimas de piedade e vendo-se desesperada. O que acontecia com ela? Por que não o odiava como desejava? Tivera a grande chance bem perto de suas mãos, mas a perdera! — Quando estiver melhor, farei com que me recompense por ter ficado ao seu lado. — Ao darse conta do que tinha acabado de dizer, Louise revirou os olhos, irritada. — É tão difícil vê-lo assim, em silêncio, sem emitir ordens, ou sem estar tentando me intimidar — comentou ela, distraída. Deixou a mão dele sobre a cama e levantou, caminhando até a grande janela. Sentiu o ar quente do deserto atingindo seu rosto e empertigou-se pensando no que faria para cumprir a promessa de manter Said vivo. — Se não me tratasse de forma tão rude, penso que eu poderia nutrir algum tipo de afeto por você — falou, desabafando, já que sabia que ele não podia ouvi-la devido ao seu estado de inconsciência. Apoiou-se à janela e olhou para a cama onde ele jazia. — Nunca compreenderei o motivo que levou a me raptar. Por que eu? Nunca haviam se encontrado antes e Louise não entendia o sentimento de posse dele em relação a ela. Parecia tão forte a ponto de ele trazê-la para seu palácio. Sabia que Said não fazia tal coisa com as outras mulheres, o que a deixava ainda mais intrigada. Ao voltar até a cama e tocar levemente o rosto de Said, Louise o notou quente e a pele umedecida. Nervosa, ela correu até a porta, pronta para chamar Karida, quando foi surpreendia por um guarda que estava vigiando o quarto atentamente. Sim, deveria ter imaginado que não a permitiriam ficar totalmente sozinha com o Sheik. Achavam que ela o mataria? Ignorando a ameaçadora espada que o homem tinha em punho, ela tentou usar um tom amigável


ao lhe dirigir a palavra. — Preciso de água fresca para diminuir a febre do Sheik — explicou, tentando usar seu melhor tom de árabe. O guarda a olhou desconfiado, mas acabou cedendo. Apontou para o corredor, permitindo que ela seguisse. Com um gesto de cabeça, Louise correu rumo à cozinha, pouco se importando de ter um homem enorme e armado a seguindo cuidadosamente por cada canto, afinal, já era um velho hábito. Para a felicidade da lady, a primeira pessoa que encontrou ao entrar na cozinha foi Karida, que dava ordens às mulheres, algo sobre limpar o chão. — O que faz aqui, senhorita? — ela perguntou sem entender. Todas as outras mulheres pararam de trabalhar para prestar atenção nas duas. — O Sheik está com febre novamente. Água fresca, Karida. Rápido — falou, ofegante, cansada por ter corrido através de tantos corredores. Ainda bem que usava aquela roupa leve, que lhe permitia mobilidade. A mulher ordenou a uma das servas que fosse até o poço para buscar a água, enquanto segurava as mãos de Louise e lhe conduzia até um canto, para conversarem em particular. — Por que está cuidando do nosso senhor? — Karida quis saber. Louise enfrentou o olhar astuto da mulher e deu de ombros. — Eu não sei — respondeu sinceramente. Karida tocou o queixo de Louise, fazendo-a prestar atenção nela. — Foi seu coração que a fez ir até ele, não foi? — Sorriu, complacente. — Prometi que cuidaria dele, Karida. E o farei — respondeu Louise, desvencilhando-se dela. A mulher chegou com uma vasilha de água e colocou-a nas mãos da lady, que logo se dirigiu para o quarto, sem notar o sorriso resplandecente no rosto de Karida. *** Durante todo aquele dia, Louise dedicou-se a vigiar o Sheik, usando os panos úmidos para diminuir a febre que insistia em castigá-lo, e, quando o percebia agitado, segurava sua mão com cuidado, sussurrando em árabe palavras de coragem. Karida lhe servia as refeições e lhe ajudava a umedecer os lábios de Said, para que não se ressecassem, além de fazê-lo beber de um cantil de pele. Quando a noite caiu, trazendo o frio típico do deserto, ela usou grossas mantas para aquecer o corpo de Said, sempre tomando cuidado para não tocar o lado ferido, e ainda preocupada com as manchas roxas no peito dele. — Precisa dormir, senhorita. Eu cuidarei dele — Najila disse, tocando o ombro de Louise,


quando ela se acomodou em uma cadeira de madeira ao lado da cama. Ela levantou rapidamente, coçando os olhos. — Não é necessário, Najila. Estou bem. — Mais uma vez conferiu a temperatura do corpo de Said e suspirou aliviada ao ver que a febre não voltara. Sem questioná-la, a serva saiu do quarto, levando consigo a bandeja com o que sobrara do jantar de Louise. A lady, por sua vez, decidiu, depois de muito refletir, que a cama que o Sheik ocupava era suficientemente grande, assim como todo o quarto, que tinha conexão com um quarto de banho próprio. Então ela não via problema em descansar alguns minutos ao lado de Said, sem que lhe causasse qualquer dano, é claro. Retirou as sandálias e subiu lentamente na cama, cuidando para não tocar o corpo de Said. Usou uma das almofadas do chão para apoiar a cabeça e suspirou de prazer ao se deliciar com a maciez da cama. Perfeito. Agora, além de relaxar um pouco, seria mais fácil velar pelo Sheik. Cobriu-se com uma das mantas e se posicionou de maneira que conseguisse fitar o rosto de Said. Ele parecia tranquilo agora, sem os traços de dor que ela vira antes. Louise sorriu, pensando no quanto ele realmente era bonito. Provavelmente o homem mais bonito que já conheci. Ela passou mais de uma hora daquela forma, concentrada nos detalhes do rosto do Sheik, quase decorando os traços firmes, o contorno dos lábios cheios... até cair em um sono profundo. *** Nem todos os palavrões que conhecia seriam suficientes naquele momento para aliviar o sentimento de Said ao acordar. Estava completamente escuro e, apesar de aquecido, estava muito longe de sentir-se confortável, a dor que sentia era indefinível. Obviamente já se ferira muitas vezes durante combates, mas absolutamente nenhuma dor que se comparava ao que ele estava sentindo naquele momento. Tentou mover o corpo, mas seu braço esquerdo queimava como o inferno, e ele acabou praguejando alto, perguntando-se como faria para saciar a sede que sentia. Percebeu algo se movendo ao seu lado, tocando seu braço direito. Havia alguém ali! — Said? — Uma voz baixinha surgiu. — Louise? — perguntou desconfiado. O que ela fazia ali? Sentiu que a inglesa se movia ao seu lado, descendo da cama, e depois ouviu seus passos apressados pelo quarto. — O que está fazendo? — Será que ela estava fugindo dele?


Uma vela foi acesa, e ele percebeu que Louise se aproximava. A primeira coisa que viu foram seus olhos grandes, perscrutando-o com preocupação. Em seguida, Said sentiu algo. Era uma sensação de alívio por vê-la ali e, ao que parecia, cuidando dele. — Tem sede? O Sheik apenas meneou a cabeça, vendo-a encher um copo com água e levá-lo até ele, amparando-o para beber. Quando estava satisfeito, ela tentou se afastar, mas Said a segurou pela roupa, forçando seu braço bom. Louise o olhou assustada. — Obrigado — ele agradeceu e foi como se a jovem lady tivesse sido arremessada ao chão. Era a primeira vez que ele lhe dizia aquela palavra e, mesmo parecendo sem sentido, fez com que ela se sentisse feliz por um momento. Tanto que, inconscientemente, Louise depositou o copo no chão e voltou a subir na cama, colocando-se novamente ao lado dele. — Sente muita dor? — perguntou enquanto voltava a se cobrir com a manta. — Dói como o inferno — respondeu ele, gemendo. — O que aconteceu? — Louise o encarou, a meia-luz dando-lhe certa proteção. Ele não respondeu, apenas continuou a olhando. Em seguida a surpreendeu quando a segurou pela mão, deslizando o polegar pela palma, fazendo doces círculos que a deixavam sem ar. — Fui atacado por salteadores quando saía de um mercado — explicou. — Achei que conseguiria me defender, mas não antecipei um golpe e acabei ferido. — Ficará bem — garantiu Louise. Said sorriu de leve. Seu olhar estava nebuloso, perdido. — Não é necessário que minta para mim, gazela — continuou a acariciá-la na mão, agora mais lentamente. — Sei que a lâmina que me atingiu estava envenenada, posso sentir o quão mal estou. Tenho plena certeza do que acontecerá comigo. — Não! — protestou ela, apertando a mão dele na sua. — O mestre da cura foi em busca do óleo que falta para o remédio que combaterá a infecção. Você ficará bem, Said. Eu tenho certeza — mas não tinha mais. Se ele mesmo acreditava que não suportaria, como ela acreditaria? Said fechou os olhos enquanto uma onda de dor o dilacerava. Apertou os dentes, tentando não gritar. Sabia que não tinha muitas chances. Já vira aquilo acontecer com outros homens. Eram necessárias algumas horas para que a infecção os levasse a uma morte lenta, causando delírios e dores terríveis. — Posso fazer algo para ajudar? — Louise perguntou, despertando-o para a realidade outra vez. — Deite-se ao meu lado. Apenas isso. — O que mais poderia exigir? Ao que parecia, não havia mais ninguém para estar ao seu lado daquela maneira.


Em silêncio, Louise fez o que ele pedia, encostando-se em seu peito, sendo rodeada por seu braço. Evitou a área dos machucados e, mesmo em posição desconfortável, permaneceu ali até notar que ele adormecera. A luz da vela se extinguiu, e Louise usou da escuridão para não mais rejeitar o medo que estava sentindo. Oh, Deus... Said estava morrendo em seus braços.



Capítulo Quatorze — Temo não poder fazer mais nada, senhorita — Karida falou, baixando a cabeça, os olhos marejados. Louise controlou as lágrimas e respirou fundo, procurando forças. Enxaguou o pano em uma bacia com água, tornando-a vermelha, e depois voltou a pressioná-lo no braço de Said. Era madrugada e nas últimas horas o Sheik tinha somente piorado. Nada do que se fazia era suficiente para controlar a febre e muito menos os delírios, que agora se tornavam mais frequentes. Era o veneno agindo em seu corpo. A lady acordara durante a noite ao sentir que algo estava errado e então deparou com Said queimando em febre. Desesperada, havia buscado ajuda, mas, mesmo umedecendo o corpo do homem com panos embebidos em água fresca, a temperatura não diminuía. Tudo piorou quando ele começou a emitir frases desconexas, pedindo por ajuda. Provavelmente sonhava com o ataque. — Preciso de mais água. — Louise apontou para a bacia, e Karida saiu do quarto para atendê-la. Assim que viu que estava sozinha, Louise trancou a porta e voltou para Said. Retirou as cobertas e constatou que ele estava vestido com uma calça. Ela não hesitou um momento sequer quando decidiu remover a peça do corpo dele e muito menos conseguiu conter o rubor quando o viu desnudo e memorou seu corpo viril. — A Inglaterra toda me expulsaria se me vissem nessa situação — sussurrou ela, enquanto encharcava o pano mais uma vez e banhava o corpo do homem. Suas mãos tremiam enquanto deslizavam o pano pelo abdômen de Said, porque era impossível não estar ciente da masculinidade daquele corpo e da atração que exercia sobre ela. Era tudo para o bem dele, dizia-se mentalmente. Prendeu a respiração ao contornar as pernas fortes, já que o ângulo em que estava posicionada a deixava exatamente perto de certo órgão, que transformava toda sua autoconfiança em nada. — Por que sempre me coloca em situações difíceis? — perguntou, erguendo os olhos para Said, que continuava adormecido. Já satisfeita por conseguir banhar o Sheik, Louise voltou a cobri-lo, dessa vez, apenas com um fino lençol, porque sabia que ele precisava do máximo possível de ar circulando. Quando Louise era pequena, sua mãe a colocava em uma banheira cheia de água fria para baixar a febre, o que ela teria feito por Said com muita estima, caso pudesse movê-lo até o quarto de banho, claro. Karida voltou logo depois, fatigada por ter atravessado os corredores equilibrando a bacia nos braços. — Deve descansar, senhorita. Ficarei com ele — disse tocando o ombro de Louise, que parecia


visivelmente cansada. — Não. Vou ficar aqui. Deixe-me cuidar dele, Karida — pediu, olhando para a mulher com preocupação. A serva a fitou por alguns momentos, até que acenou com a cabeça e saiu do quarto novamente. Louise respirou aliviada. — Seu povo não confia em mim — comentou ao se levantar e ir até o outro lado da cama, onde se sentou próximo a Said. — Do lado de fora do quarto, há um guarda atento a tudo que se passa aqui dentro. Provavelmente temam que eu o mate. Ele não se moveu. Continuou inerte, agora com a respiração mais calma. Louise colocou a mão no rosto dele e, tomada por uma emoção estranha, acariciou-o no queixo, sentindo a barba fazendo cócegas em sua pele. — Por que precisa ser assim? Eu gostaria tanto de ter conhecido você em outra ocasião. — Ficou de joelhos na cama e se aproximou do rosto do Sheik, ainda o acariciando. — Se você vivesse na Inglaterra, poderíamos ter nos encontrado em algum baile. Você me tiraria para dançar, não é?! — perguntou, sorrindo. Ora, por que estava pensando naquilo? Jamais deveria desejar conhecer aquele homem, em hipótese alguma! Ah, mas seu coração dizia outra coisa... — Não consigo entender por que você é tão frio. — Contornou o lábio dele com o polegar, fascinada pela maciez. — Deus, devo estar enlouquecendo — e, com um último resquício de consciência, afastou-se dele, saindo da cama e indo até a janela. Apoiou as mãos na madeira e fechou os olhos, tentando encontrar aquele ódio que tanto sentia pelo homem e que alimentava com sede de vingança. O que acontecia com ela? Por que se tornava tão vulnerável diante de Said? Agora mais que nunca tinha certeza de que precisava sair dali. Não sentia mais o mesmo medo e desespero de antes, pois conhecia as faces do Sheik, conhecia seu povo e sabia que, quando ganhasse sua confiança, finalmente estaria livre. Seu plano continuava apesar de tudo. Louise decidira também que aproveitaria todo seu tempo ali para saber mais sobre a lenda da cidade perdida que buscava. Mais confiante, olhou novamente para Said e decidiu que descansaria por algumas horas. Ao lado dele, claro. *** Pela manhã, ao acordar, Louise deparou com o pior cenário possível; Said não havia esboçado melhora e agora toda a pele em torno do ferimento estava arroxeada, o que ela sabia que significava que a infecção estava se espalhando, e rapidamente.


— Alguma notícia do mestre da cura? — perguntou à Najila quando foi à cozinha para se alimentar. — Se tudo correr bem, ele deve chegar amanhã ao nascer do dia — explicou ela, visivelmente preocupada. Louise não sentia fome, mas fora obrigada a engolir uma porção de figos, pão e um pouco de chá; precisava se manter saudável para cuidar de Said. Ela fazia tudo o que podia, entretanto não conseguia deixar de pensar que poderia fazer mais do que aquilo. Mas o quê? Tudo estava nas mãos do curandeiro da tribo, e isso fazia com que Louise se sentisse de mãos atadas, sofrendo a cada vez que via Said gemer de dor. A tarde passou lentamente, enquanto ela permanecia ao lado dele, sempre lhe segurando a mão e resfriando a pele. O quarto era morbidamente silencioso, e ela admitia que sim, sentia falta de ouvir a voz de Said e até mesmo seus gritos. Sorriu, lembrando-se do momento, na sala de banhos, em que ele cuidara de suas mãos com extrema delicadeza. — Você não é tão mau quanto diz, poderoso Sheik — sussurrou, apertando a mão dele. Não, ele não era. É claro, no começo o havia temido, pois realmente acreditava que ele a mataria, mas aos poucos foi percebendo que o homem mais ameaçava do que fazia. Louise compreendia também que o temor que achava que os súditos sentiam não era mais que respeito. Até entendia o fascínio daquele povo por Said. O homem tinha um poder de atração assustador. Afetava até mesmo ela. — As damas de Londres perderiam toda compostura diante de você. — Franziu a testa, pensando na possibilidade. — Possivelmente teria várias amantes. Encontraria uma a cada noite, como fez em seu reino. Por que fez isso, Said? Ela não compreendia. Na verdade, tinha medo de fazê-lo. Sabia que aquele homem carregava segredos obscuros, era visível em seu olhar, no jeito frio que demonstrava. Ao mesmo tempo, havia algo que a incitava a mergulhar mais fundo e descobrir tudo. Oh, Deus, estava se tornando maluca! — A culpa de minha mente estar assim é completamente sua. — acusou, dando-lhe as costas. Ao menos era um grande alívio que ele não pudesse ouvi-la e nem mesmo compreender inglês. *** — Karida! Ajude-me, por favor! — Louise apareceu gritando na cozinha, os cabelos soltos pelos ombros e o rosto com uma máscara de pavor. Era noite e o ambiente estava iluminado por uma dúzia de velas. Karida correu até a estrangeira, enquanto limpava as mãos em um pano.


— O que aconteceu, senhorita? — Ele está... — Louise gaguejou, apontando para o corredor. Não foi necessário dizer mais nada. A mulher compreendeu e logo a arrastou de volta para o quarto, as duas correndo pelos corredores escuros. Ao chegar ao quarto, ambas paralisaram ao ver Said gritando, pronunciando palavras incoerentes. A bandagem havia caído, deixando a ferida exposta, o sangue vazando em gotas. Karida usou toda sua força para segurá-lo contra a cama, ao mesmo tempo em que Louise voltava a pressionar a ferida, limpando o sangue. — Está tudo bem. Por favor... — ela sussurrava acalmando-o. Aos poucos, Said foi caindo novamente na inconsciência, seus membros deixando de se mover, permitindo que Louise o ajudasse. Ela tinha os lábios contraídos, a garganta apertada e as mãos trêmulas. Precisou controlar a respiração para conseguir limpar o sangue e umedecer a testa de Said, sem que se deixasse cair em desespero. Quando terminou, Karida o soltou, e Louise sentou no chão, exausta. — Ele precisa aguentar. Apenas mais algumas horas — balbuciou a inglesa, limpando as mãos sujas de sangue na saia que usava. — Pedirei a Aláh que lhe dê forças — disse Karida, saindo silenciosamente, como sempre fazia. Louise ficou de joelhos ao lado da cama e encostou a cabeça ao lado do corpo de Said, enfim deixando que as lágrimas fluíssem por seus olhos. O choro silencioso se tornou alto, e ela agarrou o lençol, cravando suas unhas nele. — Por que não acorda? — exclamou, espiando Said. — Por que não consigo odiá-lo? Eu só... Só quero que saia dessa cama! — gritou, enfurecendo-se. Ficou de pé e se apoiou na parede, dirigindo um olhar raivoso a Said. — Não morra, por favor — suplicou dando-se por vencida, deslizando novamente até o chão. Encostou a cabeça nos joelhos e fechou os olhos. Queria tanto voltar para casa naquele exato momento e não ter que ver Said... Sua mãe a ensinara a rezar, e Louise o fazia todas as noites, sempre sendo muito religiosa. O pai a levava à igreja aos domingos, e ela até mesmo cantava junto das crianças. Naquele momento, porém, não conseguia pensar em nenhuma prece. Sua mente estava vazia. Não era a primeira vez que se via ao lado da morte e já sabia o quanto ela era perversa, portanto desejava mais do que tudo fugir dali. Podia levantar agora mesmo e se empertigar pelos corredores, diretamente para a liberdade, longe da morte, longe de Said. Não precisaria ver aquilo, mas não tinha forças nem mesmo para ficar de pé. Louise permaneceu ali, velando por Said, esperando por algo, por qualquer coisa.


*** Louise foi acordada pelos gritos de Najila e Karida. Anunciavam que os homens haviam voltado e que o curandeiro tinha conseguido o óleo. Ajudaram-na a levantar e a conduziram até o outro lado do quarto, de onde assistiu ao homem misturar o óleo em um vidro e depois aplicá-lo sobre o braço de Said, enquanto murmurava algumas palavras. Era necessário que se esperasse até que o remédio agisse e impedisse que todo o sangue fosse tomado pelo veneno. Isso, segundo o curandeiro, levaria horas. Ele ordenou que todos deixassem o quarto, para que Said descansasse. Louise se negou veementemente a sair e recebeu apoio de Karida, que garantiu que a estrangeira seria útil. Por fim, quando todos se retiraram, a inglesa correu para a cama, onde se deitou ao lado de Said, cobrindo-os com a manta. Constrangido pela situação, o curandeiro saiu, mas não sem antes a lady prometer que o chamaria caso o Sheik piorasse. — Não morrerá, Said. Eu lhe disse — Louise falou, entrelaçando seus dedos nos dele. Deitou no travesseiro macio e suspirou, sabendo que a única coisa que poderia fazer era esperar. *** Said abriu os olhos lentamente, sentindo-os pesados. Piscou para acostumar-se à claridade e gemeu ao sentir o quanto seu braço doía. Levou um momento para recordar o que tinha acontecido, pois tudo parecia um grande borrão. Tentou mover-se, mas a dor foi mais aguda, impedindo-o. Olhou para o outro lado e notou um pequeno corpo colado ao seu, um mar de cabelos castanhos espalhados no travesseiro e uma pequenina mão colada a sua. O Sheik sorriu ao ver que era Louise quem estava ali. Ela estava adormecida, seus ombros subiam e desciam com a respiração tranquila, a pele morna. Ele se inclinou, mesmo sentindo dor, e inalou o perfume do cabelo dela, maravilhado pela sensação. Olhou ao redor e se assustou ao ver a bagunça em que se encontrava o quarto. Conferiu seu braço ferido e deu-se conta de que não tinha padecido. — Louise — falou, a voz soando baixa por causa da secura da garganta, mas o suficiente alta para que ela pudesse ouvir e despertar lentamente, coçando os olhos e ronronando como uma gata manhosa. — Said? — Sentou-se de repente, olhando-o espantada. Ele sorriu para ela, que ainda parecia não acreditar. — Está vivo? — Dê-me a chance de provar que estou. — Apertou a mão dela levemente. Louise abriu a boca e fechou, sem saber o que dizer. Sentiu vontade de voar sobre ele e o abraçar ou, quem sabe, chorar novamente. Mas, como a dama que era, tudo que fez foi se soltar com cuidado e sair à procura do curandeiro.


Nas horas seguintes em que a manhã se estendeu, o mestre da cura e as servas auxiliaram Said, que exigiu privacidade por um momento, retirando todos do quarto, e foi outra vez atendido, seu ferimento limpo e atado. Quanto a Louise, resignou-se em ficar no próprio quarto, já que se encontrava imersa em emoções. Estava confusa, sem saber ao certo o que fazer. Said tinha sobrevivido... E agora? O que aconteceria a ela? A inglesa esperou em seu quarto naquele dia e nem se deu conta de que o guarda que a vigiava não estava em seu posto, do lado de fora. Karida levava suas refeições e notícias de Said, tranquilizando-a. Quatro dias se passaram e Louise continuou no quarto, negando a si mesma ver Said. Tinha medo do que aconteceria caso o visse. Ao menos sabia que ele estava melhor, já podia andar por seu aposento e, inclusive, voltara a dispersar ordens pelo palácio. Mas ele não a chamara, nem perguntara por ela, o que, de alguma maneira, deixava-a triste. Era perto do meio-dia e ela estava apoiada na janela, olhando o movimento de algumas pessoas no acampamento, quando ouviu a porta ser aberta lentamente. Não precisou se virar para saber quem era, apenas o sentiu. — Precisamos conversar, Louise. — Sua voz soava exatamente no mesmo tom da primeira vez em que ela o ouvira, ainda no deserto. O que ele queria com ela?



Capítulo Quinze Said aproximou-se calmamente de Louise e, ao ver que ela não se movia, colocou-se atrás dela, tocando suas costas com o peito, estremecendo com o simples toque. Ela se encolheu, assustada pela energia que reverberava do corpo dele diretamente para o seu. Prendeu a respiração, espantada pela própria reação ao mínimo toque dele, o que confirmava o quanto Said a afetava. — O que faz aqui? Deveria estar descansando — protestou Louise, finalmente criando coragem para virar-se e encará-lo. — Eu precisava vê-la — falou ele, acariciando o rosto dela com a ponta dos dedos. O Sheik estava diferente, percebeu ela. Era difícil explicar, mas não havia a antes constante aura de perigo que ele emanava e nem o olhar furioso. Estava diferente. O olhar era tranquilo, a respiração calma. Louise o segurou pela mão e o levou até a cama, fazendo-o sentar-se. — Pensei que ao menos conversaríamos antes de... — Vou apenas conferir as bandagens — interrompeu ela, abrindo a camisa dele, tomando cuidado com os botões de ouro. Said sorriu, admirando a concentração dela, que fazia com que desabotoar uma camisa se tornasse um ato extremamente excitante. — Posso ficar de pé se deseja remover minha calça também — comentou ele, com um sorriso malicioso. Ela ignorou o comentário, preocupada em remover a camisa dos braços dele sem que o ferisse. Said fechou os olhos quando Louise começou a trabalhar no curativo de seu braço e procurou focar-se em outra coisa. O perfume dela, por exemplo. Cheirava a laranjeira, a frescor o que o levava a imaginá-la na noite do deserto, vestida apenas com uma fina túnica, deixando seu corpo resplandecer sob a luz da lua, enquanto dançava para ele. Ele soltou um gemido, desejando realmente que aquilo acontecesse. — Sente dor? — Louise perguntou, fazendo-o abrir os olhos, sua fantasia se desvanecendo. — Estou bem — Said garantiu. Viu que agora a inglesa voltava a enrolar o tecido em seu braço e, quando ela terminou, deu um passo para trás, afastando-se. — Em poucos dias estará totalmente curado — Louise disse sem olhá-lo, aproveitando para lavar as mãos na bacia de água perto da janela. — Por que está fugindo de mim, Louise? — Ele não entendia o distanciamento dela, não depois do que tinha acontecido.


— Não estou fugindo — interveio ela. — Você deve voltar para seu quarto e descansar. Said ficou de pé. — Está dando ordens a mim? — perguntou, levantando as sobrancelhas com ar divertido. Louise o fitou nos olhos. — Estou — confirmou, cruzando os braços em uma atitude ofensiva. O Sheik concordou com um gesto de cabeça e, novamente, como ele sempre fazia, caminhou até ela, com aquela andar lento que recordava um lince em busca de sua presa. Tentou não fraquejar enquanto ele chegava cada vez mais perto e, por fim, ficasse a poucos centímetros dela. Sustentou o olhar dele, mas soltou os braços, demonstrando que não se abatia diante do poderoso Sheik. — Vejo que não me teme mais — ele falou em voz baixa, analisando a expressão dela. Louise engoliu rapidamente, tentando parecer cada vez mais confiante. — Não — confirmou, empinando o nariz. — E o que sente por mim ainda está dentro de você? — Said sussurrou, tocando o braço dela, sem saber que estava a desarmando. Oh, por favor, não me toque. Era ciente de que não se manteria firme se ele a tocasse. — Não sei do que está falando — protestou, desviando o olhar. Said segurou o queixo dela e a fez confrontá-lo. — Sabe, sim. Estou falando desse calor que sente sempre que a toco. — Colou seu corpo ao de Louise, deixando que ela sentisse como estava se tornando duro. — Do desejo que a acomete cada vez que a beijo e da necessidade que a toma em cada um dos sonhos que tem sobre o que poderíamos fazer. — Não faça isso, Said — implorou, porque as forças que achava que tinha, estavam se tornando vagas. Sim... Ele faria. Como Said deixaria de tocá-la, quando seus dedos queimavam por contato, e suas mãos ansiavam por sentir a maciez daquela pele? — Diga-me que não me deseja e irei embora — e como o trapaceiro que era, Said a beijou de leve no pescoço, satisfeito ao vê-la se arrepiar. Louise se apoiou em seus ombros e se ofereceu a ele. — Diga, Louise. Diga a ele! Não seja boba! — Eu não o desejo. Said gargalhou, agarrando a cintura dela com o braço bom.


— Mentirosa! — disse no ouvido dela. Louise gemeu, constatando que realmente não conseguia mentir. Ah! Sim, desejava Said. Tanto, que mal podia aguentar estar no mesmo ambiente que ele sem sentir-se em chamas. Se isso não era desejo, ela não sabia o que era. E quanto a estar nos braços dele... Ela tinha um plano, não é? Seduzir o Sheik... Então, o que estava esperando? Já não havia nada que a impedia de estar nos braços dele, nada. — Faça amor comigo, Said. — Foi o que ela disse ao envolvê-lo pelo pescoço e o puxar para mais perto. Não foi necessário que Louise dissesse mais nada para que Said enfim a beijasse. E o beijo, ah, o beijo era o mais quente e doce que ele já tinha provado em toda a vida. Os lábios daquela mulher estavam esfomeados sobre os dele e o buscavam desesperadamente. A língua, antes hesitante, agora era dominadora, querendo impor-se sobre a dele, procurando por mais e mais. Os dois já estavam sem fôlego quando Said se afastou, somente para rasgar aquela peça de roupa insignificante que ela usava, sob a qual, para sua glória, não havia nada. — Nua para mim, gazela. — Traçou um círculo em volta do mamilo dela, fazendo-a arfar. — Para a cama — ordenou, sua voz agora mais rouca. Louise obedeceu, contornando a cama, ficando de pé à espera dele. Said parou em frente a ela e, sem cerimônia alguma, começou a se despir. Mas foi inesperadamente impedido por Louise, que se colocou em sua frente e, com inaudita ousadia, começou a remover sua calça. E, em nome de Aláh, aquilo definitivamente foi uma das coisas mais excitantes que uma mulher já tinha feito a ele. Quando ela ficou de joelhos em sua frente, removendo a calça, Said jurou que poderia tê-la ali mesmo no chão. — Levante-se. — Sua voz mal saía devido à excitação. Ao ficar de pé novamente, Louise sentiu-se corajosa o suficiente para tocar o abdômen de Said e descer lentamente por sua barriga, até estar perto o suficiente para tocá-lo onde desejava. — Toque-me, Louise — ele disse gemendo. A inglesa ficou fascinada ao ver como o Sheik reagia quando ela tocava seu pênis, a forma como ele inclinava a cabeça para trás, os olhos fechados e os lábios separados. A carne em sua mão inchava e endurecia cada vez mais ao seu toque e, àquela altura, Louise já sentia os efeitos em seu corpo, seus mamilos doloridos e algo pulsando em seu ventre. A mão de Said a interrompeu de repente, e Louise achou que tivesse feito algo errado. — Quero dar prazer a você — explicou ele ao deitar-se de costas na cama. — Suba em mim e sente-se sobre meu peito. Ela estranhou tal pedido, porque, por tudo que sabia, era o homem quem ficava sobre a mulher.


Mas também não discutiu, curiosa a respeito do que aconteceria. Apoiou-se à cama e fez como Said pedira. Soltou um suspirou ao acomodar-se sobre o peito dele. A posição era diferente e permitia uma visão esplendorosa do corpo de Louise, o que certamente era a intenção de Said. Dessa vez ela não se sentiu inibida nem tentou cobrir-se. Não havia vergonha, tampouco apreensão. Era apenas aquela sensação ardente que parecia sair de cada poro de seu corpo e a deixava... livre para sentir. — Eu gostaria de poder pintar você neste momento, para que eu sempre pudesse vê-la assim, tão linda. — Said deslizou as mãos pelas laterais do corpo dela, soltando um gemido ao sentir o braço doer. Continuou a carícia com apenas uma mão, dando atenção então aos seios, apertando-os delicadamente, venerando-os. — Abaixe seus seios até minha boca, gazela. Segurando nas laterais da cama, Louise abaixou-se sobre o corpo de Said, levando até ele seus seios. Ele a surpreendeu ao sugá-los com força, contornando os mamilos com a língua, alternando entre os dois. Era uma tortura diferente, prazerosa, que a fazia desejar roçar-se contra o corpo de Said, porque havia algo que continuava buscando. Se Louise acreditava que a boca do Sheik era tão habilidosa, tudo caiu por terra quando ele deslizou-se na cama e a arrastou com ele, deixando-a montada sobre seu rosto. — O que está fazendo? — gritou, tentando se levantar. Ele a manteve no lugar e então fez algo que a chocou completamente; Beijou-a lá. E era exatamente onde ela precisava. Pelos céus e por tudo que fosse mais sagrado, Louise estava presa em uma névoa absurda de prazer, que a estava sugando cada vez mais para cima ou a levando à beira da insanidade. Foi tão rápido, facilmente ela viu-se transportada para algo além, carregada por um nível supremo de prazer, que a assombrou. Foi preciso se apoiar na cama para suportar a intensidade e, quando aquela onda de prazer se extinguiu, ela mal tinha forças para se mover. Ainda não era o fim. Said se esforçou para conduzir Louise para seu quadril, impelindo-a a se encaixar nele. — Não suporto mais. — Ele deixou a cabeça cair no travesseiro quando sentiu que, mesmo sem jeito, Louise o enterrava dentro dela. — Mova-se, Louise. — Ofereceu uma mão a ela, que se apoiou enquanto começava a movimentar o quadril. — Said — chamou-o, um pouco assustada com tudo aquilo, pois mal controlava seu corpo, que parecia ter vida própria, sedento por prazer, procurando mais e mais, subindo e descendo, movendose. O Sheik empurrava-se contra ela, aumentando o contato, friccionando exatamente naquele ponto


mágico. Said, estava decidido a fazer com que fosse bom para ela, mais do que qualquer coisa que já tivesse sentido em sua vida, porque para ele estava sendo. Louise mordeu o lábio para não gritar quando as sensações se acumularam e explodiram, levando-a para aquele lugar distante. Said investiu dentro dela mais algumas vezes e com muito esforço se retirou, no último instante, caindo em uma onda de prazer alucinante. Ela se deitou ao seu lado respirando descompassadamente, e ele a abraçou sentindo o mesmo. Ficaram em silêncio, porque não havia nada que pudesse ser dito e que resumisse o que tinham acabado de fazer. Também não desejavam que aquela sensação de tudo nos eixos acabasse. Para Said nunca nada pareceu tão correto, tão perfeito; nunca se sentiu tão bem com uma mulher em seus braços como estava agora. Inalou o perfume do cabelo dela e sorriu, satisfeito por tê-la ali. — Por que cuidou de mim, gazela? — Foi Said quem quebrou o silêncio, trazendo Louise para a realidade. Ela piscou, olhando para ele com sensualidade, por entre os cílios volumosos. — Estive em seu quarto apenas algumas vezes — respondeu ela. O Sheik se ajeitou na cama, levando Louise para seu peito, para que se acomodasse melhor. — Tem o costume de falar sozinha? — perguntou ele, disfarçando um sorriso quando ela compreendeu a que ele se referia. Ele... Ele a tinha ouvido! — Achei que não falasse inglês — comentou Louise, confusa. Um sorriso debochado surgiu nos lábios de Said. Louise sentou-se de repente, ficando de costas para Said. — Não recordo nada do que falei — disse nervosa. Queria acabar com aquilo. — Pois eu recordo cada palavra. Consegue imaginar o que é ouvir tudo aquilo e não poder responder? — O Sheik sentou-se também e a tocou no ombro. — Pare de fugir de mim, Louise. — Já disse que não estou fugindo de coisa alguma! — ela exclamou, levantando e correndo até os pedaços de roupa. Said foi atrás dela, completamente nu. — Se não está, responda-me; por que cuidou de mim, quando sabia que poderia fugir deste palácio a qualquer momento. Por que me escolheu em detrimento de sua liberdade, Louise? Os farrapos de roupas caíram das mãos dela, que tremia. Para piorar, as malditas lágrimas que Louise tanto tentava controlar começaram a derramar-se em seu rosto. — Porque eu não poderia vê-lo morrer! — gritou, caindo em um choro desesperado. — Eu quero odiá-lo, mas não consigo — disse entre dentes, apontando para o peito dele.


Said foi abalado por aquelas palavras, já que sentia absolutamente a mesma coisa. — Preciso que venha comigo a um lugar, Louise — tentou usar um tom de voz neutro, quase sem emoção. Precisava ir com calma. Ela enxugou as lágrimas e o fitou, franzindo a testa. — Como? — Levarei você a um lugar dentro de alguns dias — contou ele, começando a juntar as roupas, vestindo-as em sequência. Louise não ousou perguntar que lugar era aquele. Mas sua mente começou a trabalhar naquilo, levando-a a pensar que talvez ele estivesse querendo desfazer-se dela. Exatamente como Najila lhe dissera. Não! Não poderia permitir. Sabia que tinha conseguido um grande avanço ao se entregar a ele há pouco e não mediria esforços para conquistar o Sheik, antes que ele a mandasse embora. Tinha poucos dias para fazer Said se apaixonar por ela.



Capítulo Dezesseis Naquela tarde o Sheik de Hamed foi surpreendido por uma pequena caravana que se aproximou do palácio. Era um grupo de mulheres e homens, além de crianças, que pediam desesperadamente por abrigo e comida. Todos aparentavam estar muito cansados, mas nada que os impedisse de se prostrarem de joelhos diante de Said, quando ele saiu e foi até eles, junto dos guardas. A cena chamou a atenção de todos no acampamento, que assistiam ao líder do grupo pedindo por clemência ao Sheik, implorando para que este ajudasse a mulher e a filha pequena, que já não se alimentavam há alguns dias. Imponente em seus ombros erguidos e expressão séria, Said fez com que o homem se levantasse e indicou aos guardas que conduzissem os outros para a grande tenda do acampamento onde as mulheres responsáveis os ajudariam. As crianças seguiram as mães e os pais, dirigindo um olhar assustado a Said, que engoliu em seco ao notar o quanto elas estavam famintas e fracas. — De onde estão vindo? — perguntou ao homem alto, vestido com uma túnica cor cobre que lhe tapava o rosto. — Do norte, reino de Yulem. — As mãos do homem tremeram quando Said lhe entregou uma bolsa de pele com água. Bebeu um longo gole, fartando-se com desespero. — Nossa tribo foi atacada pelos salteadores do deserto durante a noite, e muitos de nós não conseguiram fugir. O Sheik olhou para os guardas, procurando pela reação deles. Não podia simplesmente confiar no que o homem dizia, porque, mesmo vivendo tempos pacíficos, o reino de Hamed precisava de segurança e não seria nada bom ter conflitos com salteadores. — Como conseguiram chegar até aqui? — fazia as perguntas corretas e estudava cada uma das respostas. O homem fitou Said com pesar e moveu os ombros. — Precisamos racionar o que tínhamos... — Hesitou, abaixando a cabeça. — E alguns não aguentaram. Said o estudou por um momento. Encarou-o nos olhos, procurando por qualquer coisa que despertasse sua intuição em relação ao perigo; não poderia, sem cuidado, descartar a possibilidade que de fosse algo planejado. Mas só conseguiu sentir pena, não do homem, evidentemente, já que considerava que era apenas o dever dele liderar e garantir que seu grupo continuasse vivo. Mas havia crianças, mulheres e, por elas, o Sheik tornava-se mais humano. — Poderão ficar no acampamento até que se recuperem — declarou, já dando as costas. — Há um problema, senhor — o homem o interrompeu, fazendo-o voltar-se novamente. — A filha do Sultão está conosco. Nós a ajudamos a fugir e garantimos que ela continuasse viva. É


essencial que a mantenhamos viva. Said olhou em direção ao acampamento e suspirou. Era tudo que não precisava. Como Sheik, tinha obrigação de oferecer seu palácio para a menina, considerando-a sua protegida até que tudo se resolvesse. Em momentos como aquele, Said admitia o quanto os costumes podiam ser desagradáveis. E o problema não era apenas esse. Acontecia que precisaria de uma mulher para estar ao lado da criança, obviamente uma mulher de seu reino, que, em outra ocasião, seria uma de suas esposas ou filha. — Eu a acolherei em meu palácio. Haverá alguém que a auxiliará. — e com um gesto de cabeça saiu sem olhar para trás, caminhando com pressa até o palácio. *** Louise precisava concordar que estava começando a tornar-se boa em entrelaçar os fios de ouro nos tapetes que eram feitos no palácio. As mulheres, entre elas Najila, haviam insistido para que ela voltasse a se dedicar à tarefa. O processo estava se tornando mais fácil, já que inesperadamente as tecelãs estavam aceitando Louise e lhe ensinando cada pequeno e dificultoso ponto. Em poucas horas a lady já havia feito um pequeno triângulo com os fios de ouro, que, para ela, pareceu de um bom gosto incontestável. Era estranho como estava entusiasmada em trabalhar no palácio e como essas atividades estavam se tornando prazerosas, o que também e consequentemente a irritava, porque parecia-lhe que estava se tornando tudo aquilo que Said esperava. — Está tão distraída, senhorita. — Najila sorriu, olhando com malícia para Louise. — Tenho certeza de que está pensando no Sheik. Corando violentamente, Louise olhou para as mulheres ao lado, todas com a mesma expressão de Najila. — Não tenha vergonha por isso, estrangeira. Todas nós invejamos você — disse uma jovem entre risos. Louise parou de bordar e a fitou. — Eu pensei que vocês... — gaguejou, sem saber como continuar. Najila franziu a testa. — Oh, não. Nós nunca nos deitamos com o Sheik, apesar de desejarmos, é claro. — Riu por trás do véu. — O Sheik se deita apenas com as escolhidas. Ah, sim. Louise tinha se esquecido disso. Apenas as escolhidas. Suspirou. Ele a tinha escolhido. O que ainda não conseguia compreender claramente. As mulheres ouviram algumas conversas vindas do corredor e, com olhares assustados, todas se puseram de pé. Ao que parecia nenhum homem entrava naquela ala do palácio, o que as deixou ainda


mais assustadas. A porta foi aberta lentamente, e um homem alto, vestido em azul- escuro apareceu, transformando o coração de Louise em um verdadeiro descompasso. Said. Assustada, ela olhou para ele esperando por algo. Talvez tivesse feito qualquer coisa errada e agora sofreria a dura pena. Colocou as mãos em frente ao corpo e esperou, diferentemente das outras mulheres, que se ajoelharam sobre os tapetes. — Acompanhe-me — ele disse em voz baixa, mas que ecoou por todo o cômodo. Louise precisou de forças para fazer seu corpo se mover e, enquanto caminhava até Said, sentiu aquela tão estranha sensação a mover-se dentro dela, a qual a deixava como se estivesse flutuando; um efeito indesejado e, ao mesmo tempo, prazeroso. Era ele quem a colocava daquela maneira, acontecia apenas quando estavam juntos. Said esperou que ela deixasse o cômodo para fechar a porta e indicar o caminho. Ele não dizia nada, mas naquele momento Louise já suspeitava que algo não estava bem. Os ombros dele estavam rígidos, o andar firme, e os punhos apertados contra as laterais do corpo. Já conhecia aquele homem o suficiente para saber quando estava preocupado. O Sheik levou Louise até a outra extremidade do palácio e a fez entrar em sua sala real. Ela ficou parada no centro, admirando os entalhes no teto e os azulejos nas paredes, além do magnífico trono em madeira e ouro, cravejado com pedras preciosas, alocado no lado oposto. Imaginou Said sentado ali, as costas retas, o rosto sério e o olhar superior. Perfeito para ele. — Quando você está em silêncio, minha mente começa a imaginar o que pode estar planejando. Nunca sei se é algo bom ou ruim — ele falou atrás dela, a certa distância. Louise se voltou para ele com um meio sorriso. — Eu estava imaginando que alguns nobres ingleses gostariam de se sentar em um trono como esse — disse disfarçando, porque obviamente não diria o que estava pensando realmente. Said a olhou por um momento e depois sorriu. — Posso imaginar. Seu povo é sedento por algo de tão pouco valor — comentou seriamente. — Está dizendo que não se importa com as riquezas que possui? — Empertigou-se ela. Said se aproximou alguns passos. — A honra pode ser maior que qualquer pedra preciosa, gazela. E, para um homem como eu, ainda há coisas mais importantes que o ouro. — Enrolou uma mecha do cabelo de Louise no dedo e pressionou-a, sentindo a textura. Ela olhou em seus olhos, vendo neles que falava a verdade. — Conheço homens que o chamariam de insano — sussurrou.


— É provável — admitiu ele. — O problema, gazela, é que não sou igual a nenhum outro homem que você já tenha conhecido. Conheço um pouco sobre os costumes de seu povo, minha mãe fazia questão de me ensinar. E posso dizer que, quanto mais sei sobre os ingleses, mais amo cada grão de areia desse deserto. Louise deu um passo para trás, assustada pela revelação. — Sinto muito. — Afastou-se ela, olhando para o outro lado. — Por quê? — ele questionou. Porque se você não odiasse meu povo, tudo seria mais fácil. — Eu soube que um grupo chegou hoje ao acampamento — falou Louise tentando desviar do assunto. Said aceitou a fuga dela naquele momento, porque precisavam conversar. Mas, em breve, certamente falariam sobre aquilo novamente. — A tribo foi atacada durante a noite. Apenas eles sobreviveram — contou. Louise levou a mão aos lábios, horrorizada. — Ouvi que há crianças e mulheres. — Eu os permiti ficarem no acampamento até que as coisas melhorem. — Said passou a mão pelo rosto, nervoso. — A filha do sultão está junto deles e precisa da proteção do palácio, até que possa reivindicar os direitos sobre o que restou da tribo. — Ela está aqui? — A lady abriu bem o olhos para ele. — Com as mulheres no acampamento. Preciso trazê-la para o palácio, mas é necessário que uma mulher a acompanhe. — Pode ser Karida, ou Najila — sugeriu Louise, ansiosa. O Sheik torceu a boca, contrariado. Voltou a se aproximar e segurou as mãos dela. — Na realidade, eu tinha pensado em você, gazela. — Eu? — O queixo de Louise caiu. Ele queria que ela cuidasse da criança? Ele confirmou com um movimento de cabeça. — Mas eu nunca cuidei de bebês, ou crianças, ou... — Parou de falar quando Said colocou o indicador sobre seus lábios. — Tudo que precisa fazer é orientá-la. — Não sei nada sobre seus costumes — argumentou. Said sorriu, segurando-a pelos ombros. — Eu não a encarregaria de algo tão importante se não acreditasse em sua capacidade, gazela. — Olhou-a com seriedade, firmeza. — Estou pedindo sua ajuda, Louise. Oh, Senhor, isso era estranho. O terrível Sheik de Hamed pedindo sua ajuda...


— Farei o que estiver ao meu alcance — concordou ela. O Sheik respirou fundo, soltando o ar dos pulmões. — Mas exijo poder transitar pelo palácio e pelo acampamento sem qualquer guarda pressionando sua cimitarra em minhas costas. — Louise cruzou os braços, parecendo confiante, porque estava fazendo exigências, ora! — Não. — Então, sinto informar que não poderei ajudá-lo — e, pouco ciente do que estava fazendo, rumou para a porta. Said praguejou, desejando poder cravar sua espada em algo, ou esmurrar alguém. Mulher teimosa! Ela o tirava do sério, fazia-o querer ser mau, gritar com ela, fazê-la entender sua liderança. — Por Aláh, estrangeira! Eu o concedo! — cedeu, por fim, mais nervoso do que já ficara antes. Louise não se virou para ele, continuou com a mão na porta, mas sorriu ao sair sentindo-se vitoriosa. — Estarei em meu quarto — anunciou antes de fechar a porta. O Sheik ficou sozinho, pensando no que tinha acabado de acontecer. Louise o manipulara, usando de suas necessidades para favorecer-se. Mesmo irritado, Said sorriu. Só conseguia pensar que aquela insolência poderia ser usada contra ela. E, bem, ele tinha planos para breve, que incluíam muito prazer. *** À noite foi oferecido um faustuoso jantar no grande salão, que havia sido decorado com almofadões e velas perfumadas. A comida, mesmo tendo sido preparada às pressas, era farta, com frutas, carnes assadas, além de iogurte e chás. Os convidados eram a família do líder do grupo, o Sheik, seus auxiliares e, claro, Louise, que se encontrava encolhida em sua almofada, esperando pela filha do sultão. A menina tinha se demorado em seu banho, causando um atraso desconfortável no jantar. A inglesa estava em um estado de nervos insuportável. Todos a olhavam com desconfiança, principalmente o ajudante do Sheik, que claramente não aceitava sua presença ali. Said estava sério, conversava com o homem sobre o Sultão e acerca do que fariam agora sem notícias dele. Enquanto ouvia aquilo, lady Louise recordou os momentos que vivera naquela noite no antigo acampamento. Compreendia a dor e o sofrimento que o homem descrevia, sabia exatamente como era estar à mercê da morte, lutando apenas para permanecer vivo, esquecendo sua dignidade, entregando-se ao desespero. Para alívio dela, a filha do sultão foi anunciada, e todos se levantaram para recebê-la. Para a grande surpresa de todos, principalmente de Louise, quem entrou pela grande porta de


madeira branca não foi uma criança, muito menos um bebê, e sim uma jovem. De vestido vermelho e cabelos negros adornados por pedras verdes, a jovem era muito bela, o que causou instantaneamente um grande desconforto à inglesa, principalmente após perceber o olhar da mulher em direção a Said. — Alisha, seja bem-vinda ao reino de Hamed — o Sheik a cumprimentou elegantemente. A jovem sorriu e se curvou exageradamente. — Agradeço sua hospitalidade, meu príncipe. Louise apertou a mandíbula, nervosa. Talvez não devesse ter aceitado ajudar Said, afinal.



Capítulo Dezessete Todos os presentes no salão estavam visivelmente encantados com a hóspede, que sorria docemente diante de qualquer coisa referida a ela. Sua simpatia e desenvoltura tornavam o diálogo agradável, e seus gestos delicados eram reflexos de sua educação; tudo o que uma boa mulher árabe deveria ter, em especial uma princesa. A única pessoa que não parecia tão deslumbrada pela jovem era Louise, que, sentada ao seu lado, mantinha-se de cabeça baixa, apenas ouvindo a entusiasmada conversa a respeito dos dromedários comercializados na cidade. A comida, apesar de farta, parecia-lhe sem gosto, mas, mesmo estando na presença de pessoas importantes, a lady conseguiu discretamente mastigar algumas colheres de babaganuche e sorver alguns poucos goles de chá preto. — Alisha sofreu muito, meu senhor. Temi por ela durante todo o caminho. Houve momentos em que... — Aban, o homem que conduziu o grupo até o palácio, comentou mostrando-se emocionado. — Compreendo. — Said levou o copo de chá aos lábios, enquanto dirigia um olhar para Louise, que, ao perceber, disfarçou imediatamente. — Por favor, Aban, vamos esquecer o que passou. Estamos a salvo e devemos tudo ao príncipe. — Alisha inclinou a cabeça de leve, em respeito a Said. — Oh, sim, sim. Devemos tudo ao senhor — o homem concordou, sorrindo largamente e cutucou a esposa ao lado, para que também prestasse honras ao Sheik. Said ignorou os gestos, tentando se concentrar na comida e também em Louise, que estava consideravelmente estranha naquele momento. Ele não a ouvira pronunciar sequer uma palavra, desde que a jovem, filha do Sultão, entrara no salão. O Sheik percebeu, além disso, que a inglesa mal tocara a comida. Era óbvio que havia algo errado. Aban voltou a chamar a atenção de Said, agora para contar como sua antiga tribo praticava o comércio, falar das formas de venda que o Sultão, pai de Alisha, havia implantado e que tinham tornado tudo mais eficaz e rápido. Em outra ocasião, Said provavelmente teria se interessado pelo que o homem dizia e teria até mesmo o incentivado a continuar, mas acontecia que naquele exato momento havia apenas uma coisa que lhe interessava, preocupação que se encontrava justamente ao seu lado, aliás. Era difícil para Said concentrar-se quando tinha Louise tão perto de seu corpo, tanto que poderia tocá-la com um simples movimento do braço. E, ah, o que ele não daria para poder tocar aqueles cabelos, envolvendo-os entre os dedos, e, com a graça de Aláh, sentir a textura macia que tanto o excitava. O Sheik precisou respirar fundo para voltar a se concentrar no que o homem dizia e também em


sua hóspede, que parecia muito à vontade diante de todos. Decidiu que, assim que todos se retirassem para dormir, iria à procura de Louise em seu quarto; talvez pudesse convencê-la a banharse com ele. — Já lhe contei como desenvolvemos uma nova técnica de organização de nossas tendas? Poderia ser útil em seu reino, meu príncipe — Aban disse entre as mordidas que dava em um pedaço de carne embebida em azeite. O Sheik meneou a cabeça, incentivando-o a falar, enquanto sua mente continuava a traí-lo, levando-o a pensar em posições prazerosas que gostaria de compartilhar com lady Louise. *** O jantar foi extremamente demorado, não só na opinião de Louise, como também na de Said, que ao final sentia-se exausto, quase a ponto de ordenar a seus convidados que rumassem imediatamente para seus quartos. Mas, para Aban, parecia que a noite continuaria animada, já que incentivou Alisha a entretê-los com suas habilidades na dança. A jovem, enaltecida, concordou em dar uma pequena demonstração a todos. Assim sendo, Said, Louise e os convidados foram posicionados em grandes almofadas perto da parede, na sala lateral, enquanto Alisha, sob a luz das velas, começava uma lenta dança ao som dos tambores tocados por dois homens. No início, os movimentos eram delicados, simples, apenas os braços movendo-se para os lados, mas logo ela começou a mover os quadris no ritmo da música, balançando-os com maestria, ao mesmo tempo em que se inclinava para trás. Louise estreitou os olhos para a jovem, impressionada com a eficiência dos movimentos, que pareciam tão complicados. Como ela conseguia movimentar-se daquela forma? A saia vermelha tinha uma fenda que subia até o quadril, o que permitia uma visão quase escandalosa de suas coxas durante a dança. A lady relanceou o olhar para o Sheik ao seu lado e surpreendeu-se ao perceber que ele não olhava para Alisha, mas para ela, e com uma expressão muito estranha. A inglesa assustou-se quando Said, sutilmente, inclinou-se próximo ao seu ouvido para sussurrar: — Quero possuir você esta noite. Ela o olhou assustada. Oh, Senhor ele realmente havia dito aquilo? Louise esforçou-se para ignorá-lo, tentando parecer interessada na dança de Alisha. Esta agora se remexia tanto, que recordava às serpentes encontradas no deserto. — Espere-me em seu quarto — Said apenas moveu os lábios discretamente contra seu ouvido, mantendo os olhos voltados para a frente. — Não — Louise conseguiu responder em um sussurro. Aban virou-se para os dois, sorrindo. — Disse algo?


— Estava orientando minha serva sobre como tratar nossa hóspede — Said respondeu rapidamente. O homem assentiu, voltando-se novamente para a jovem, que naquele instante avançava até os convidados, mais precisamente até Said. Sem pudor algum, ela começou a deslizar o véu sobre O Sheik, dando voltas em torno dele, passando bem ao lado de Louise, que tinha as faces coradas, constrangida pela situação. Alisha se afastou e a apresentação logo acabou, seguida por uma maré de palmas e elogios por parte de Aban e da esposa, Sabah. Foi a oportunidade que Said esperava para levantar-se e pôr fim à noite. — Imagino que estejam cansados, por isso serão conduzidos aos seus quartos. — Ele indicou as servas que esperavam por eles postadas na entrada. — Agradecemos a hospitalidade, meu senhor. E, se me permitir, como último pedido, gostaria que conduzisse nossa Alisha a um passeio pelo jardim da fonte, lugar do qual ouvimos falar muitíssimo desde que chegamos aqui — Aban comentou, com aquele sorriso que deixava Said desconfortável. — Oh, sim, será incrível! Irá conosco, Aban? — Alisha interpôs-se, animada. — Sinto muito, minha querida, mas estamos muito cansados. Tenho certeza de que nosso príncipe terá a gentileza de conduzi-la por um breve passeio até o jardim. — O homem olhou para Said, esperando pela resposta dele. O Sheik, a contragosto, concordou e, com simpatia, ofereceu o braço à Alisha, que o aceitou com entusiasmo. Ele atravessou a sala e, na saída, encontrou Louise, que o via conduzir a bela jovem ao jardim. Said parou em frente a ela e pensou em lhe dizer algo, mas logo refutou a ideia, porque se deu conta de que não seria apropriado. Em breve a veria e então a teria em seus braços. *** Karida acompanhou Louise até o quarto em silêncio. Nenhuma delas pronunciou palavra alguma enquanto atravessavam os corredores escuros e, ao entrarem no cômodo, a lady afastou-se postandose frente à janela, onde permaneceu parada por longos minutos. Parecia distante, preocupada. — Ela é muito bonita — Karida comentou, ao arrumar a cama de Louise. — Sim, ela é — concordou. — Pensei que a senhorita cuidaria dela — a serva disse, insistindo no assunto. Louise suspirou e virou-se para ela. — O Sheik a levou até a fonte e depois a conduzirá ao quarto — contou, sentindo uma estranha sensação no peito. Karida ficou em silêncio por um momento, entretida em amaciar os travesseiros.


— Ela o deseja — soltou, depois de alguns minutos. Louise levou a mão ao peito, incomodada com o desconforto que sentira ao ouvir tal revelação. — É possível — admitiu tristemente. Ora, por que estava se sentindo daquela maneira? Deveria estar feliz! — Talvez neste momento ela o esteja seduzindo — Karida voltou a falar, olhando de lado para a lady. Louise deu-lhe as costas e voltou à janela. Removeu o véu que usava sobre o vestido e sentiu-se agraciada pela brisa que tocou seu busto, proporcionando-lhe um alívio momentâneo. Sim, Alisha poderia estar seduzindo Said. Louise não duvidava disso e que a incomodava verdadeiramente era essa confusão que estava sentindo. Há poucos dias, seria o que mais desejava; outra mulher na vida de Said, para que assim ele perdesse o interesse por ela e a deixasse ir. Mas agora, ao ter consciência de que isso acontecia, algo ocorria dentro dela. E não era algo bom. Doíalhe. Imaginar Said com outra mulher nos braços produzia um aperto em seu peito. A garganta contraía-se ante o conhecimento de que ele poderia estar beijando Alisha, tocando-a. E era isso o que irritava Louise, essa posse, essa raiva que estava sentindo. Ela fechou os olhos e inalou o ar do deserto, procurando conforto em algo invisível. O que era isso que estava sentindo? E por que era tão doloroso? — Deve descansar, senhorita — Karida a chamou. Louise caminhou até a cama, removendo as pedrarias que usava no cabelo, além das fitas. Deixou-as sobre a cômoda, refletindo sobre o motivo de Said a obrigar a usar tudo aquilo. Era curioso como até o brilho das jades pareciam apagados naquela noite. — Precisa de algo mais? Louise negou, subindo na cama. Aninhou-se entre as cobertas e ficou olhando para Karida, que também a fitava. A mulher tinha um olhar de compreensão, parecia entender Louise. — Sei que não tenho permissão para isso, mas penso que seja necessário dizer, senhorita. — Olhando para trás e para os lados, Karida se aproximou da cama, para murmurar: — Sei o que está sentindo, senhorita. Não permita que ela o tenha. Meu senhor jamais se encantou por outra mulher como pela senhorita, garanto-lhe isso — e antes que Louise pudesse responder, Karida deixou o quarto. A lady moveu-se inquieta na cama, pensativa a respeito do que a mulher lhe dissera e também nervosa com a possibilidade de ela estar certa. Contemplou as chamas das velas, esperando por Said, que prometera ir até ela naquela noite. As horas se passaram, e as velas apagaram-se, transformando o quarto em um completo breu. A lady continuou acordada durante a madrugada, não mais esperando por ele, mas considerando o que o que


poderia tê-lo impedido de procurá-la. Foi inevitável pensar que ele de fato estava com Alisha. Dentre as possibilidades que passavam pela mente de Louise, esta era a única coerente, e tal constatação serviu apenas para aumentar sua angústia. Pela manhã seus olhos ardiam e seu corpo estava dolorido. Louise não havia dormido nem por um minuto durante a noite, atormentada pelos pensamentos impertinentes que tivera. Os raios de sol entravam pela janela, aquecendo-a, enquanto os guardas começavam a se movimentar pelo palácio, e os moradores do acampamento gritavam ordens aos animais. Said já devia estar acordado, vistoriando algo no palácio, ou talvez se reunindo com o califa, tratando de algum assunto importante, e ela deveria levantar-se também. Sentou na cama, gemendo ao sentir as costas latejando, e bufou ao lembrar que teria que passar o dia ao lado de Alisha, como tinha prometido a Said. Preciso parar de prometer coisas das quais posso me arrepender futuramente. Com um sopro de coragem, Louise levantou-se, certa de que precisaria de determinação para enfrentar o dia. Encontrou dentro da cômoda a roupa que usaria naquele dia e penteou com esmero os cabelos, fazendo, no final, uma trança como Najila e as mulheres lhe ensinaram. Deixou o quarto e logo ficou satisfeita ao ver que não havia qualquer guarda do lado de fora, o que revelava que Said cumprira sua promessa. Sorrindo, Louise caminhou para a cozinha, disposta a trabalhar. *** — Ele a levou até o quarto, eu mesma vi — garantiu uma das servas, contando às outras mulheres na cozinha, todas curiosas sobre o que tinha acontecido com o Sheik na noite anterior. Entre elas estava Louise, que, sentada em uma cadeira perto da mesa, comia pedaços de frutas e bebia leite, mantendo-se atenta à conversa. Karida estava sentada em sua frente, cortando pedaços de figo para a calda que faria. A mulher não tirava os olhos dela, o que estava deixando Louise preocupada. — Ela o levou para seu quarto! A pequena mulher conseguiu seduzir o poderoso Sheik! — comentou uma mulher rindo. Outras responderam falando todas ao mesmo tempo, transformando a cozinha em uma algazarra. — O Sheik não entrou no quarto! A mulher o beijou, mas depois ele deu-lhe as costas e foi embora — contou a primeira mulher. — Eu estava no corredor, vi tudo! Louise mastigou com força a tâmara e bebeu um grande gole de leite, abaixando a cabeça, relutante em olhar para os lados. Karida ainda a olhava, agora com mais ênfase, como se tentasse lhe transmitir uma mensagem. — A senhorita deve conduzir Alisha até o acampamento. Ela deseja ver os outros que a


acompanharam durante a viagem — Najila lhe disse, aparecendo ao seu lado. Com um breve olhar para as outras mulheres, que ficaram em silêncio rapidamente, Louise se levantou, pronta para enfrentar o que quer que o dia lhe reservasse. *** Para completo alívio de Louise, Alisha não parecia muito disposta a conversar com uma simples serva, sempre caminhando à frente, elegante em seu vestido dourado, que brilhava sob a luz do sol, exibindo os belíssimos cabelos negros que desciam até o quadril. Louise permaneceu quieta durante a visita ao acampamento, sentada em um banquinho baixo, esperando enquanto Alisha conversava animadamente com outras duas mulheres em uma língua que ela não conhecia. A inglesa suava terrivelmente, pois fora obrigada a esperar do lado de fora da tenda, sob o sol inclemente, longe de Alisha e das amigas, que faziam gestos e sorriam, parecendo felizes demais diante da situação em que viviam. A lady tratou de ignorar as mulheres e voltou a prestar atenção nas crianças que brincavam ao lado, ninando as pequenas bonecas de trapos, o que a fez recordar-se de uma boneca egípcia que o pai lhe dera quando pequena, a qual lhe fizera muito feliz. — Beijou-me noite passada — disse Alisha, em voz baixa, para as outras mulheres, agora falando em árabe, permitindo que Louise compreendesse. — Creio que gosta de mim. Olhando para as palmas das mãos, Louise suspirou inquieta. Era difícil ouvir tudo aquilo e permanecer calma. A verdade estava diante de seus olhos, escancarada; Said havia se interessado por Alisha. Era o que eu desejava, então por que me sinto tão mal? Talvez agora, se realmente Said a trocasse pela filha do sultão, Louise tivesse sua tão desejada chance de partir. Poderia enfim reencontrar seu pai, voltar para sua antiga casa e dedicar-se às suas pesquisas. Tanto precisava ser feito. Não permitiria que as mortes dos amigos fossem esquecidas, carregaria a memória deles consigo e os honraria atribuindo o devido mérito por seus serviços. Tudo voltaria a ser como antes. Apesar dessa resolução, havia algo em seu coração, Louise precisava admitir, que a fazia imaginar-se vivendo ali, no reino de Hamed, perto de todas aquelas pessoas, de Karida e Najila que se tornaram algo próximo de amigas, assim como as outras mulheres do palácio. Nunca escondera que sempre fora fascinada pelo deserto, tanto que havia embarcado naquela grande aventura. A possibilidade, embora vaga, de permanecer ali, fazia com que se sentisse viva. Sim, por tudo quanto fosse sagrado, grande parte dela pulsava dizendo que ali era seu lugar... Ao lado de Said. A realidade a atingiu com uma força surpreendente, assustando-a, deixando-a desnorteada. Será que tudo isso era a constatação de que nutria sentimentos mais intensos por Said? Era possível que...


tivesse se apaixonado por ele? A respiração de Louise falhou, assim como sua pulsação acelerou. Ela fechou os olhos, memorando os momentos mágicos que tinha vivido ao lado de Said, da mesma forma como as brigas que tiveram, tudo parecendo mais real que nunca, verdadeiro. Era impossível ignorar a forma como se sentia quando se lembrava disso; o desespero de imaginá-lo com outra. Exasperada, Louise levantou-se, finalmente admitindo que sim, estava apaixonada por Said. Amava aquele homem! Não consigo acreditar que me permiti amá-lo. Quando isso aconteceu? Talvez fora no primeiro beijo ou, quem sabe, nos momentos de ternura, ou na primeira vez que ele a possuiu. Ah, tampouco importava. Louise estava, além de apavorada com a descoberta, muito preocupada também. Obviamente, agora que admitia estar apaixonada por aquele homem, não permitiria que a jovem Alisha o conquistasse. Ela esquadrinhou o perfil da jovem, que agora caminhava até ela, sorrindo como sempre fazia. — Sinto tanto calor. Podemos voltar ao palácio? — perguntou Alisha, abanando-se com a mão. — Posso providenciar um banho se desejar — Louise ofereceu enquanto caminhavam pelo acampamento, de volta ao palácio. — Sim, por favor. Qual é o seu nome? Vejo que não é daqui. — Sou inglesa. Meu nome é Louise. Alisha desviou de um homem que carregava uma cesta e voltou a olhar para Louise. — Oh, é a primeira estrangeira que conheço — comentou a jovem, empolgada. — Ouvi algumas coisas sobre seu país. É verdade que as mulheres banham-se apenas uma vez ao mês? Louise parou para encará-la e não conseguiu deixar de sorrir diante da pergunta. — Garanto que isso é apenas um mito, apesar de suspeitar que algumas das damas mais notáveis da sociedade não tenham o hábito de fazer isso mais que três vezes ao mês — contou, voltando a caminhar. Alisha correu atrás dela segurando as saias. As duas entraram no palácio e percorreram um corredor. — E os bailes, eu soube que há bailes todas as noites e que as damas usam várias camadas de tecido enquanto dançam — insistiu, olhando para o rosto de Louise, esperando pela resposta. — Temo que isso seja verdade. Eu mesma usava quando necessário essa quantidade exorbitante de tecido e confesso que havia momentos em que tudo o que eu desejava era me livrar de tudo aquilo. — Sim, aquilo Louise precisava dizer. Na realidade, deveria dizer a toda sociedade inglesa, que ainda impunha tal vestimenta, muito ultrapassada para o gosto dela. Ao chegarem ao quarto de Alisha, esta sentou-se na cama e rapidamente começou a retirar as


joias que usava, soltando um suspiro de alívio ao terminar. — Não suporto usar tais coisas — reclamou, franzindo a testa. Louise a estudou, vendo-a exatamente como ela era; uma menina. — Quantos anos tem, Alisha? — obrigou-se a perguntar. A jovem ergueu os olhos para ela e moveu os ombros. — Farei dezoito em pouco tempo. — Pedirei que tragam a banheira e a água para você — disse Louise, indo até a porta. — Louise — Alisha a chamou e, quando a lady a olhou, deparou com uma expressão tímida. — Obrigada. Sem saber o que responder, Louise apenas assentiu e saiu apressada do quarto. Poucos minutos ao lado de Alisha, e Louise começava a ficar ainda mais confusa. A jovem não parecia exatamente como tinha imaginado. Sua fala, seus gestos e atitudes eram diferentes quando estavam sozinhas, ela parecia mais verdadeira. Definitivamente era algo a se pensar. *** No restante do dia, Alisha permaneceu sozinha no quarto, dando oportunidade a Louise para colocar em prática o plano que tinha estudado minuciosamente há pouco. Agora que os guardas não mais a seguiam, sentia-se diferente naquele palácio, de forma alguma como uma serva ou prisioneira. Era como se fizesse parte de tudo aquilo, sobretudo quando Said mostrava confiar nela. Encontrou Najila no poço, atrás do palácio, carregando uma bacia com água. Ao vê-la a mulher pareceu confusa, principalmente por não encontrar o guarda que sempre a acompanhava. — Preciso de sua ajuda, Najila. — Irei apenas levar a água até a cozinha e então me dirá como posso ajudá-la — disse a mulher, resfolegando pelo esforço. Louise a ajudou a transportar a água e depois as duas foram até o quarto da lady onde, ao entrar, ela reconsiderou se o que estava prestes a fazer era certo. Najila ficou em silêncio esperando que ela dissesse algo, até que Louise falou rapidamente, livrando-se da angústia. — Quero que me ensine como seduzir um homem. A serva não reagiu imediatamente, apenas ficou olhando-a, até que um sorriso brilhante surgiu em seus lábios. — Achei que não fosse me perguntar nunca, senhorita. Ao ouvir aquilo, um peso foi retirado dos ombros de Louise. Bem, parte dele, já que agora ter Said dependeria dela.




Capítulo Dezoito — Não usarei esta roupa indecente! — Louise protestou, cruzando os braços contra o peito, indignada com a audácia de Najila ao sugerir que ela vestisse o transparente vestido. A mulher riu e colocou o vestido em frente ao corpo, como se fosse ela quem estivesse vestida. — Se deseja seduzir meu senhor, deve usar algo provocante —insistiu ela. A inglesa descruzou os braços e dirigiu um olhar impaciente a Najila. As duas estavam trancadas no quarto, o que lhes dava certa privacidade, mas, ainda assim, Louise tinha receio do que estava fazendo. Não que estivesse arrependida em pedir ajuda para seduzir Said. A situação tornava-se confusa quando suspeitava que poderia não haver reciprocidade em relação aos seus sentimentos. Obviamente, ela era consciente de que o Sheik não estava completamente apaixonado, como ocorria com ela, porém não sabia se ele ainda a desejava depois da aparição de Alisha. A verdade era que tinha medo de parecer precipitada ou até mesmo de fazer algo que mudasse, para pior, sua relação com aquele homem. Ele poderia finalmente cumprir suas ameaças e mandá-la embora ou casá-la com algum comerciante. O que estava tão decidida a fazer poderia ser o desfecho de seu tão angustiante destino. — A senhorita está bem? Parece tão distante — Najila a tocou no braço, chamando sua atenção. Concordando com a cabeça, Louise esboçou um sorriso, determinada a continuar com a aula. Bem, então deveria usar aquele vestido... E por que não, afinal? Já se aventurara até aquela terra, a seu ver, insólita e provara de coisas tão pecaminosas que sequer ela em outros tempos acreditaria, então por que não aceitar aquele traje? Apenas Said veria. Era para ele. — Irei usá-lo. — Segurou o vestido nas mãos e sentiu a textura do tecido fino, bordado com pequenas pedras brancas arredondadas, e as rendas nos braços as quais deixavam uma grande faixa de pele descoberta. — O que devo usar por baixo? — perguntou um tanto preocupada. Não lhe parecia possível usar qualquer outra peça sem que ficasse visível. O sorriso malicioso no rosto de Najila foi o suficiente para responder a dúvida de Louise, que engoliu em seco ao imaginar o olhar de Said sobre ela, visualizando cada pedaço de seu corpo sob aquele vestido. — Somente isso será suficiente para seduzi-lo? — Apesar da timidez ante a ideia de usar o vestido, Louise estaria feliz se não precisasse de nada mais para que ele gostasse do que visse. Najila retirou o vestido das mãos dela e o deixou na cama. Ajoelhou-se no chão, sobre uma almofada, e indicou que Louise fizesse o mesmo ao seu lado. — Há muitas coisas que a senhorita precisa saber, mas a principal delas é que o controle do prazer de um homem está em você. — Ao ver o olhar confuso da lady, Najila continuou explicando:


— Estou tentando dizer que há formas de praticamente enlouquecer um homem, senhorita. Se fizer tudo do jeito certo, é provável que ele urre de prazer. — Oh, isso é realmente possível? — Os olhos astutos de Louise se arregalaram diante da revelação. — Nunca vi acontecer, mas as mulheres sempre falam a respeito. —Dando de ombros, Najila esperou até que Louise administrasse aquela informação, o que levou uma boa quantidade de minutos. Quando finalmente a lady assimilou o que fora dito, uma dúvida significativa surgiu. — E como farei isso? — Bem, não admitiria tão facilmente, mas estava inclinada a fazer o que fosse preciso para ver Said reagir ao prazer e, quem sabe, vê-lo urrar. — Ele já pediu que a senhorita usasse sua boca nele? — a serva perguntou olhando-a nos olhos firmemente. Louise mal piscou. — Eu... Ele... Não, mas o fez em mim — confessou, sentindo as bochechas pinicarem pela vergonha. Sorrindo de orelha a orelha, Najila se aninhou sobre a almofada, animada em continuar. — Tudo que deve fazer é o mesmo por ele. Franzindo a testa, Louise considerou o quanto mais realmente deveria saber sobre a intimidade entre um homem e uma mulher. Certamente, se pudesse regressar ao passado, iria permitir-se saber de tais coisas. Ao menos assim não se sentiria tão deslocada como naquele momento, sobretudo quando tinha seus vinte e cinco anos tão aparentes sobre seus ombros. Considerando quão prazeroso fora quando Said usara a boca em partes tão íntimas nela, Louise achava que ao fazer aquilo estaria fazendo-o sentir-se muito bem. Talvez até mais. — Farei isso — concordou, pela primeira vez sorrindo de leve. — Preciso saber de mais alguma coisa? Najila levantou e foi até a cômoda, onde havia uma pequena caixa de madeira vermelha, a qual entregou a Louise quando se sentou novamente. — O que é isso? — a lady perguntou, levando à altura dos olhos o pequeno frasquinho de vidro escuro, com um líquido dentro. — É óleo de Oud, preparado pelas mulheres do reino. Ele é comercializado e usado como troca com outras tribos, mas consegui esse frasco para a senhorita — explicou, ajudando a lady a remover a tampa, para que pudesse sentir o perfume. — Devo usar em meu corpo? — No Sheik, senhorita — respondeu Najila.


Louise apertou o frasco na palma da mão, pensando se não estava indo longe demais em tudo aquilo. Então deveria usar o óleo no corpo de Said? Bem, conseguia imaginar-se fazendo isso... — Acredito que não exista mais nada que eu deva saber, verdade?! — disse levantando-se, disposta a terminar o assunto. Najila se pôs de pé também e limpou a garganta, chamando-lhe a atenção. — Pensei que poderíamos falar sobre os beijos... — Beijos? — Louise estacou onde estava. — Sim, escute com a atenção o que lhe direi, senhorita. E para surpresa de Louise, ainda havia coisas que podiam deixá-la alarmada. *** Era notável a irritação de Said durante o jantar daquela noite. Todos comiam tranquilamente, dispostos nos mesmos lugares da noite anterior. Louise estava sentada ao seu lado, especialmente bela naquela noite. Usava um vestido carmim e levava os cabelos presos em uma trança adornada com pedras coloridas. Ele mastigou um pedaço de pão e suspirou, cansado das conversas nada interessantes de Aban, que insistia em lhe demonstrar o quanto a antiga tribo era bem estabelecida, além de enaltecer-se por todos os seus feitos durante a jornada através do deserto, assim como pela forma heroica como protegeu Alisha. Não somente para Said, mas para todos os guerreiros do deserto, um homem perdia seu valor quando se exaltava, já que nada mais era que seu dever servir, proteger e lutar. O homem era tudo que o Sheik desprezava em um ser humano, especialmente no momento, já que lhe pedia a opinião sobre a invasão inglesa, quase que se referindo propriamente a Louise, que se mostrava irritada. — Devemos combater essa praga que avança pelo deserto —comentou o homem, limpando os lábios oleosos com o dorso da mão. — Invadem as areias, importunando nosso passado, como se não tivesse nenhum valor para nós. Said percebeu a tempo o movimento de Louise e a impediu de reagir, segurando disfarçadamente sua mão. Sem que os outros vissem, ele entrelaçou os dedos nos dela, enquanto começava a falar: — Minha mãe era inglesa e, apesar de ter abandonado seu país para viver ao lado do meu pai, sempre manteve viva a memória de onde nasceu e cresceu. — Acariciou a mão de Louise. Já não a olhava, mas ainda assim conseguia sentir a pulsação acelerada dela. — O deserto é do nosso povo, e ninguém conseguirá tomá-lo. Os ingleses não são nossa única ameaça. — Certamente, meu príncipe — concordou Aban rapidamente. — Mas precisa concordar que muitas de nossas cidades vêm sendo invadidas por estrangeiros, muitos dos quais trazem o mau para nosso povo.


Said abandonou a mão de Louise, deixando-a desejosa de mais contato. — Perdoe Aban, meu príncipe. Ele ainda sente os efeitos dos dias perdidos nas areias quentes — intrometeu-se Alisha, sorrindo para Said, rogando com os olhos por sua complacência. O Sheik apenas meneou a cabeça concordando. Mesmo que ainda mantivesse Aban e seus amigos como hóspedes, ele podia facilmente mudar de ideia e mandá-los novamente para o deserto. Tudo o que não precisava era de mais problemas, justo agora que uma maré ruim começava a aparecer. Naquela tarde, reunira-se com seu califa, que lhe explicara os pequenos desentendimentos que estavam acontecendo no acampamento do reino, todos motivados por reações contra a decisão do Sheik de acolher Aban e os amigos. Ao que lhe parecia, alguns homens eram contrários àquela decisão, argumentando que aquela gente colocava em risco a segurança de todo o reino, já que não sabiam com certeza quem eram. Said teria que resolver o tal problema brevemente. Não podia deixar que revoltas começassem a tomar força no acampamento, pois poderia facilmente perder o controle. No final do jantar, quando todos já estavam de pé, Alisha se pendurou no braço de Said, sorrindo sedutoramente. — Poderia me acompanhar novamente até o jardim, meu príncipe? — ela pediu, inclinando o corpo contra o dele. Said percebeu Louise mais adiante. Ela olhava para os dois com uma expressão um tanto ameaçadora, os olhos entrecerrados, o que ele acabou considerando interessante. A inglesa estava com ciúmes? — Sinto muito, Alisha, mas preciso ter com meu califa. Certamente Louise a acompanhará até os jardins em meu lugar. — Sorriu em direção a lady, que intensificou a expressão de raiva sobre ele. Desanimada de repente, Alisha soltou o braço do Sheik. — Na realidade, sinto-me um pouco cansada. Acredito que irei me deitar. — Com um meio sorriso, ela saiu em direção à porta, passando por Louise sem olhá-la. Enquanto Aban e a esposa cumprimentavam o Sheik e deixavam o salão, Louise caminhou discretamente à porta, esperando por Said. Ele logo se dirigiu até ela, que sorriu ao vê-lo. — Está bonita esta noite, gazela — elogiou, com um brilho nos olhos azuis que quase a fez cambalear. — Obrigada, meu príncipe — agradeceu ela, fazendo uma leve mesura. A expressão de Said se fechou de repente. — Não me chame assim — repreendeu-a. — Por que não? Achei que fosse sua escrava e que por isso deveria me referir ao senhor por seu título — falou ela, fingindo cordialidade.


Logo o Sheik percebeu o que acontecia ali. Sim, ela estava jogando com ele. Said, em um movimento rápido, envolveu a cintura de Louise, puxando-a contra seu corpo, levando a boca diretamente ao ouvido dela. — Sua beleza é inegável, gazela, mas sua insolência é irritante. Muitos morreram por menos em meu reino — disse ele lentamente, esperando que surtisse o efeito desejado. Louise teve desejo de rir. Era incrível como não tinha mais medo das vãs ameaças de Said. — Tenha piedade de mim, meu príncipe. Sou apenas uma escrava e estou implorando para que não me faça mal — sussurrou ela, provocando-o. Said endureceu, irritado porque ela conseguia provocá-lo ainda mais. Deslizou a mão até a cintura dela e mais para baixo, agarrando com força as nádegas da lady. — Quero muito fazer mal a você. — Said aproveitou para beijar o pescoço de Louise e morder a ponta de sua orelha, causando arrepios em todo corpo dela. — Farei com que compreenda a quem pertence, Louise. Ela agarrou-se a ele, desorientada. — Quero tudo de você, gazela. Quero sua dor, seu prazer e tudo que quiser me dar. — Empurrou o quadril contra o dela, gemendo ao sentir a fricção contra seu membro. Tome meu coração — queria gritar ela. Tão rapidamente como a havia agarrado, Said a soltou, tomando distância. Ainda era possível ver o quanto ele estava afetado... Excitado. — Quero você em minha cama esta noite. Mal posso manter-me em minhas calças — ele disse, a voz estrangulada. Sabendo que estava em vantagem, Louise deu-lhe as costas, decidida a deixá-lo sozinho, mas, antes de sair pela porta, olhou por cima do ombro e disse: — Encontre-me no aljibe, meu príncipe. Prometo servi-lo com toda minha eficiência.



Capítulo Dezenove Said já se sentira ansioso algumas poucas vezes na vida, mas certamente em nenhuma delas a aflição havia sido tão intensa como agora. A ansiedade, pensava ele, não era boa para seu corpo, já que mal podia mover-se com a dureza entre as pernas, palpitando, implorando por liberação. Por outro lado, reconhecia que também podia ser algo bom, já que a gratificação seria mais intensa no final. Ele removeu o turbante que usava e penteou o cabelo com os dedos, deixando-os ainda mais bagunçados, mas, ainda assim, tornando sua aparência sedutora. Não levava mais a longa túnica e nem as sandálias, apenas a calça, que pendia confortavelmente em seus quadris. Esperou deitado em sua cama por apenas mais alguns minutos, para ter a certeza de que ninguém mais estava acordado no palácio e que enfim poderia seguir de encontro a ela. O Sheik caminhou com pressa até o aljibe, atravessando os corredores sem se importar com a escuridão e, assim que lá chegou, percebeu a luz amarelada que resplandecia vinda de dentro. Ansioso, Said entrou na sala de banhos, imediatamente admirado pelas velas dispostas estrategicamente em cada canto do lugar. Procurou por Louise, confuso ao não encontrá-la ali. — Estou aqui, meu príncipe. Said virou-se rapidamente, disposto a repreendê-la por continuar chamando-o daquela forma, mas as palavras não se formaram em sua boca quando a visão dela assaltou seus olhos. Ficou preso ao chão, olhando com espanto, porque ela não parecia a mesma mulher, estava completamente diferente. A inglesa usava o vestido carmim rendado, que revelava muito de seu corpo. Tinha os cabelos soltos, caindo sobre os ombros, e as mãos pintadas em espirais por uma tinta escura, exatamente como as mulheres árabes faziam. Said não pôde deixar de notar os olhos da lady, que estavam pintados da mesma forma como as mulheres de seu povo usavam, o que a deixou extremamente bela. Louise estava exatamente como uma princesa. Tomando fôlego lentamente, ele a olhou dos pés à cabeça, percorrendo seu corpo com volúpia, recebendo uma onda de desejo ao notar as curvas das pernas de Louise, os mamilos eriçados sob o vestido, que, graças a Aláh, tornava-se quase transparente sob o reflexo das velas. A expressão que tomou o rosto do Sheik deixou Louise nervosa, com medo de que algo estivesse errado, pois ela tinha pensado em tudo. Estudara minuciosamente cada detalhe, então não poderia conceber a ideia de que havia falhado em alguma coisa. Conforme Said se aproximava, cobrindo em segundos a curta distância que os separava, ela percebeu com alívio que aquela expressão era apenas de desejo, de paixão. Mais calma, permitiu-se admirá-lo por um momento, sentindo-se eufórica ao constatar que ele usava apenas a calça e nada mais. Said tinha os pés descalços e o peito desnudo,


revelando os músculos fortes, que tanto a atormentavam quando ele a abraçava. — Está maravilhosa — ele elogiou quando finalmente a tocou, segurando-a pela cintura de forma suave, quase sutil. Louise sorriu, olhando para os olhos tão azuis, os mesmos que antes a amedrontavam, mas que agora a excitavam. Corajosa, ela acolheu o rosto dele com a mão, satisfeita ao sentir a barba contra suas palmas, e corou ao imaginar-se friccionando a pele contra o rosto dele. Oh, Senhor, mal o tinha tocado e já o queria terrivelmente. — Deixe-me tê-la. Farei com que alcance o prazer mais doce de sua vida e então a trarei de volta para meus braços, onde a acolherei — Said disse ao imobilizar o queixo dela, fazendo com que o olhasse nos olhos. — Esta noite — começou ela, beijando a ponta do dedo dele. — Meu prazer será dar prazer a você, meu príncipe — e com uma onda de ousadia, Louise sugou o dedo de Said para dentro de sua boca, surpreendendo-o ao chupá-lo com força, fazendo movimentos eróticos, que só serviram para deixar o pobre homem mais atordoado. — Irá me enlouquecer, gazela. — Sua voz estava rouca, e ele lutou para conseguir deixar a boca dela, para enfim beijá-la. No último segundo, Louise o impediu de tocar seus lábios, afastando-o delicadamente. Confuso, ele a olhou interrogativamente, como se estivesse preocupado de ter ultrapassado os limites. — Deite-se na cama, Said — Louise ordenou ainda sorrindo. — Está me dando ordens, escrava? — perguntou arqueando uma sobrancelha, achando graça no modo imperativo dela. — Eu não me atreveria, meu príncipe — respondeu , disfarçando um sorriso. Divertido, ele aproveitou o momento para remover a calça, dando a ela uma bela visão de seu traseiro. Em seguida se deitou de costas na cama, satisfeito ao vê-la ficar vermelha ao encarar seu pênis inchado. Terei coragem para isso? — questionava-se ela. Precisou apenas recordar as sensações que provara nas outras vezes em que se deitara com Said para enfim decidir que sim, teria coragem para aquilo e para muito mais. Louise caminhou até a cama e pegou o frasco escuro na mesa ao lado. Feliz por conseguir lembrar-se das orientações de Najila, apoiou-se na cama e olhou para Said, que a encarava com... fome. Era possível tal coisa? — O que fará com isso? — perguntou ele, entrecerrando os olhos na direção do frasco, que


tremulava na mão de Louise. Misteriosa, Louise gotejou em abundância o óleo sobre o abdômen de Said e, sem que ele tivesse tempo para questioná-la, deixou o frasco de lado, começando a massagear a pele do Sheik. Untou as próprias mãos no óleo e deslizou-as para cima e para baixo nas laterais do abdômen de Said, insinuando-se para baixo. Ele tinha os olhos bem abertos, e sua respiração começava a acelerar, à medida que Louise exercia pressão em seu corpo. — Preciso de suas mãos em outras partes de mim, gazela —sussurrou, tentando segurá-la pela mão para conduzi-la sobre seu pênis. Era disso que precisava, que ela bombeasse firmemente em torno de seu eixo e liberasse aquela necessidade. — Precisa que eu o toque aqui? — perguntou Louise, contornando o osso púbico de Said, fazendo fricção para que óleo esquentasse a pele. Ele gemeu, arqueando o quadril, mas ela se retirou de repente, deixando-o frustrado. — Está me matando, mulher — Said disse entre dentes, quase a ponto de se render aos cuidados de sua própria mão, o que seria certamente uma grande humilhação. Estimulada pela reação do homem, Louise derramou mais uma quantidade de óleo nas mãos e massageou lentamente as coxas dele, subindo tão devagar, que ele quase implorou para que fizesse logo. Maldita agonia. — Acho que deseja que eu o toque aqui — ela comentou, como se fosse algo pouco importante. — Peça-me, e eu lhe darei alívio, meu príncipe. Said fechou os olhos e gemeu de pura frustração. A que ponto sua vida tinha chegado. Estava sendo coagido, chantageado sexualmente por sua escrava! Aláh o perdoasse, mas isso o estava deixando cada vez mais louco de desejo, de vontade de tomá-la com força, fazê-la gritar e arranhá-lo as costas enquanto ele entrasse nela profundamente. Foi assim que, pela primeira e possivelmente única vez, o Sheik de Hamed implorou. Não por sua vida, mas por seu alívio sexual. — Toque-me, gazela. Envolva meu pênis em sua mão e me dê prazer. Louise até tentou esconder sua satisfação evitando sorrir, mas seus olhos eram tão verdadeiros que Said logo percebeu seus sentimentos e, estranhamente, não se importou. Ela acolheu o membro já ereto entre as mãos, surpresa pela suavidade e dureza, ansiosa para levá-lo ao prazer. Mas Najila havia lhe dito para ter calma e manter aquilo por mais tempo possível. Era algo sobre gratificação que ela não tinha entendido totalmente. Oh, mas a expressão de Said a fez compreender o quanto o que estava fazendo era bom para ele. Mesmo concentrada em mover as mãos na masculinidade do Sheik, Louise olhava de canto de olho


observando como ele, de lábios cerrados e cabeça inclinada, estava sendo arrastado por aquela onda de prazer. Por todas as vidas no deserto! Ela sabia perfeitamente a pressão que exercer em seu pênis, rodeando a ponta com o polegar, fazendo círculos lentos e firmes, enquanto com a outra mão percorria seu comprimento, aumentando o ritmo e o levando a questionar até onde poderia chegar. Ah, como queria mover-se até a boca de Louise, descobrindo toda sua doçura e calor, saber se ela levaria todo ele. Imaginando tal cena, o Sheik fechou os olhos e voltou a mover o quadril para cima, acompanhando o ritmo de Louise. Ela, por sua vez, já estava começando a sentir os efeitos calorosos em seu corpo. Seus seios estavam doloridos, os mamilos eretos, sua intimidade se contraindo deliciosamente. Arriscou um olhar para o rosto de Said e acabou encontrando o olhar dele, que reagiu imediatamente, levantando-se da cama, enquanto juntava suas mãos às dela. — Assim... Dessa forma — orientou ele, acalmando os movimentos, disposto a fazer o momento durar mais. Louise engoliu a saliva, sentindo uma sensação absurda, recordando de uma orientação em particular que Najila havia lhe dado, algo que, segundo ela, faria com que um homem urrasse... Corajosamente, a lady ajoelhou-se na frente do Sheik, abaixando a cabeça da mesma forma que uma serva faria. — Olhe para mim — ordenou ele, quase sem ar diante da cena. Louise ergueu a cabeça, fitando-o de uma maneira que fez parecer que outra mulher havia tomado seu corpo. Luxúria exalava de cada poro. Ele envolveu o rosto de Louise com a mão e acariciou os cabelos macios, ao mesmo tempo em que se ocupava de acariciar a si mesmo, decidindo se ela estava ou não preparada para aquilo. A dúvida logo deixou de existir, quando ela fitou seu membro e lambeu os lábios, ansiosa. Satisfeito, Said a segurou pelo cabelo e, gentilmente, conduziu a boca de Louise até seu pênis, soltando um grunhido quando teve o primeiro contato com a boca úmida. Contrariando tudo que tinha imaginado a partir da revelação de Najila sobre dar prazer a um homem, Louise concordava que possivelmente as mulheres gostassem de fazer tal coisa. Estava deslumbrada, não somente pelo intenso contato visual que estava tendo com Said, vendo-o jogar a cabeça para trás, gemendo, mas também pela deliciosa satisfação por ser ela a causadora de tais efeitos. Ela estava exercendo o prazer. O óleo pinicava-a na língua, mas tinha um gosto adocicado, que se misturava com o sabor de Said, despertando os sentidos de Louise. Ele acariciava seus cabelos e movia os quadris tão rapidamente, que a fez segurar-se em suas pernas, com medo de cair.


Quando estava empolgada e disposta a vê-lo alcançar o ápice, Said se retirou de sua boca e, rapidamente, fez com que ela ficasse de pé, para em seguida a apoiar na cama. — Eu pensei que... — murmurou ela, confusa. Said respondeu beijando-a com fúria, segurando-a pela nuca. Apertou a lateral da cama, sentindo seu próprio gosto na língua de Louise, algo que nunca tinha feito antes com as outras mulheres, mas que agora lhe parecia a coisa mais erótica que já havia experimentado. — O vestido — ele disse sem fôlego, ao puxar do corpo de Louise o tecido fino, que se rasgou no processo e acabou perdido em um canto da sala. A visão de Louise inteiramente nua fez Said pensar em perfeição. Ela gostava da forma como os seios dela eram grandes e os mamilos, rosados. Admirava as pernas grossas e o quadril largo, tudo dele, somente ele e ninguém mais a tinha tocado. Nenhum outro jamais tocará. Assustado pelo próprio pensamento, o Sheik abocanhou o seio de Louise, satisfazendo-se quando ela gritou de prazer. Brincou com o mamilo sem pressa e fez o mesmo no outro. Reuniu forças para arrastar pequenos beijos pela barriga dela, até deslizar os lábios e a língua entre suas pernas, maravilhado com o gosto e o calor ali. Louise estava tão perdida, que, caso alguém os descobrisse ali, ela não teria forças para fazer Said parar. Estava tão perto daquela sensação arrebatadora, que teve vontade de chorar quando Said deixou de beijá-la e se colocou de pé. — Apenas quando eu estiver dentro de você, gazela. — O Sheik envolveu a cintura dela e a prendeu no lugar, deixando os dois na mesma altura, os quadris próximos. Repentinamente ele estava dentro dela, agradecendo aos céus por aquilo. — Por todas essas noites, fiquei me imaginando aqui. — Moveu-se para frente, até o final, e se retirou. — Cada maldita vez em que você me provocava, eu tinha vontade de fazê-la pagar. — Said... — Louise cravou as unhas nos ombros dele quando o ritmo aumentou. — Você teve o controle hoje. — falou ele entre os movimentos. — Mas saiba que pertence a mim, para meu prazer, para meu corpo e minha satisfação. — Mordeu-a no pescoço, deixando uma marca avermelhada no local. — Lançou-me um encanto, gazela. Não consigo ficar longe de ti. Apesar das sensações que a arrebatavam, Louise era ciente do que ele dizia, e sim, concordava perfeitamente com tudo. Pertencia-lhe. Por sua alma, por seu prazer e por seu coração. — Entregue-se, Louise — rugiu Said no ouvido dela e, como se a ordem fosse mágica, ela contraiu-se nos braços dele, choramingando e torcendo-se com a sensação deliciosa. Said investiu nela mais algumas vezes e retirou-se de seu corpo, usando a mão para derramar-se sobre a cama, ao lado dela, um som gutural saindo de sua garganta.


E Louise, riu. *** Mais calmo, o Sheik olhou com estranheza para Louise, que continuava a rir, colocando as mãos sobre o rosto corado. Do que ela ria? Ele caminhou até onde deixara a calça e se limpou, ainda a estudando. Louise controlou-se, percebendo que Said não parecia satisfeito com ela. Como poderia dizer a ele que ria porque descobrira que Najila tinha razão? Um homem poderia urrar. — Perdoe-me — disse desviando o olhar. Ele foi até ela, tocando-a no queixo. — Gosto de vê-la rindo. Sua pele fica quente e suave ao toque. —Said sorriu. — Mas é inegável que começo a pensar que ri de mim, gazela. — Isso o deixa irritado? — rebateu ela, com outra pergunta. Ele pensou por um segundo. — Na verdade, não. Eu só gostaria de saber o que fiz de errado para fazê-la rir. Louise mordeu o lábio, envergonhada. — O senhor, meu príncipe, levou-me aos céus — respondeu timidamente. — Eu gostaria de fazer isso mais vezes — Said disse rindo com vontade. Passou a mão pelos braços de Louise e a notou fria. — Tome um banho comigo — convidou. — Irei — concordou ela, acompanhando-o até o reservatório de água. Ele a ajudou a descer os degraus de mármore e a segurou pelo quadril enquanto pegava em uma pedra lateral um sabão aromático. Louise virou-se de costas para que ele lavasse suas costas e depois permitiu que ele passasse o sabão por seus seios e em todo o resto de seu corpo. — Agora que tivemos o que desejávamos, contará por que não apareceu naquela noite? — questionou ela, segurando-se nos ombros dele, para que lavasse sua perna. — Alisha me tomou muito tempo, com suas histórias sobre sua tribo e seu pai — contou. Deslizou o sabonete pela parte interior da coxa dela, concentrando no que fazia. — Quando me pediu que a acompanhasse até seu quarto, pois tinha medo de seguir sozinha pelos corredores, fez algo de que não gostei. — Beijou-o. — Sim — admitiu ele, suspirando. — Depois que o fez e viu como reagi, pediu-me perdão, dizendo que havia se deixado levar pelo sentimento de gratidão que tinha para comigo. Eu virei as costas e a deixei sozinha. O coração de Louise desmanchou-se de alívio ao compreender aquilo.


— E para onde foi? Said deixou de lavá-la e entregou-lhe o sabonete, virando-se de costas para que fossem esfregadas. — Há um lugar neste palácio ao qual ninguém, além de mim, tem acesso. — Ficou em silêncio até que ela terminasse e virou-se. Colocou as mãos dela em seu peito. — Quando preciso pensar ou fugir de alguma coisa, é para lá que vou. — Não consigo imaginá-lo fugindo de algo — ela disse sorrindo, passando o sabonete nele. Fugi de você, gazela. — Posso levá-la até lá — disse mudando de assunto. Não revelaria suas fraquezas a ela. — Eu gostaria — Louise concordou, mas logo franziu a testa. — Por que eles o chamam de príncipe? Said deu um passo para trás e imergiu na água, voltando segundos depois, emaranhando os dedos no cabelo. — Meu pai era o príncipe verdadeiro. Recebeu esse título por sua liderança, bondade e discernimento. Ele governou para seu povo, com minha mãe ao seu lado, uma verdadeira princesa. Eu apenas herdei seu título quando assumi o trono. — Ninguém aqui no palácio o chama assim — atentou ela, momentaneamente distraída por uma gota de água que caía pelo queixo de Said, desejando lambê-la. — Porque não sou como meu pai, Louise. Assim que comecei a governar, disse a todos que não se referissem a mim dessa forma. Alisha e os outros o fazem porque não são daqui — explicou ele. — Isso o chateia? Ser chamado de príncipe. — Quando dito por você, excita-me, gazela — admitiu ele, com um olhar de cobiça. — Quanto ao meu povo, não posso permitir que o façam, porque não sou bom, não sou como meu pai. Louise sentiu pena dele. Pena por ele não perceber o quanto estava enganado a respeito de si mesmo. Enlaçou-o pelo pescoço e o beijou. — Bem, fico feliz diante desta confissão, porque, quando estivermos a sós, eu o chamarei de “meu príncipe”. — Devo alertá-la, serva — começou Said, segurando as nádegas dela, içando-a contra seu corpo — que todas as vezes que se dirige a mim dessa forma, tenho vontade de fazer coisas más com você. Ela se arrepiou por inteiro e colocou as pernas nos quadris dele. — Então, faça coisas más comigo, meu príncipe. Estou aqui para servi-lo — sussurrou no ouvido dele. O Sheik gargalhou satisfeito, enquanto pressionava Louise contra a parede e começava sua série


de torturas nela. Torturas prazerosas, mostrando quão mau ele podia ser.



Capítulo Vinte Nem a soma de todos os beijos ou a ternura de todas as carícias desapareceriam da memória de Louise tão facilmente. Acontecesse o que acontecesse, as lembranças da forma como ele a conduziu naquela noite seriam eternas enquanto vivesse. Jamais, pensava ela, conseguiria esquecer os momentos cálidos, quando ele a envolveu em seus braços e a possuiu contra as escadas no aljibe, derramando paixão sobre ela, sussurrando em seu ouvido palavras que expressavam o quanto a desejava. Também não se esqueceria de quando, ao final, o Sheik se retirou dela para libertar-se e olhou-a nos olhos, como se fitasse toda a verdade que sempre procurara. Louise suspirou, passando a ponta dos dedos levemente sobre o peito de Said, que dormia profundamente ao seu lado. Depois de extasiarem-se com os deleites do prazer, o Sheik conduzira a lady para seu quarto, garantindo que a desejava ao seu lado durante a noite. O ar estava frio e, coberta apenas com um fino lençol de linho, Louise moveu-se na cama, ficando mais perto do corpo de Said, que estava completamente nu, esticado sobre o colchão, permitindo a ela estudar cada pequeno contorno de seu corpo. Mesmo com a fraca luz da lua que adentrava o quarto, a lady reconheceu, no ombro esquerdo dele, a marca recente, reminiscência do ferimento conseguido no ataque que ele sofrera. No peito, algumas pequeninas feridas antigas instigavam-na a descobrir o que acontecera ali. Ela inclinou-se sobre ele o beijou no peito, sentindo-o suspirar em seus sonhos quando se afastou. Louise desceu lentamente da cama e envolveu o corpo com o lençol para proteger-se. Ainda havia algo que a impedia de ser completamente livre ali, tornar-se o que agora desejava. Nem mesmo permitia-se não temer sua própria nudez. Caminhou até a grande janela, que recorria a parede de alto a baixo, permitindo à luz da lua passar através dos espaços vazados, projetando figuras nas paredes opostas. Ela se apoiou ao batente, como fizera tantas vezes antes, e respirou profundamente o ar seco do deserto, sendo instantaneamente inundada por um mar de perfumes que vinham do acampamento em frente; especiarias e comida. Abaixo dois homens guardavam a entrada do acampamento, sentados em caixas de madeira, enquanto bebiam em uma bolsa de pele, ao redor do fogo. Conversavam baixo e sequer reparavam que Louise os espiava. Ela dirigiu o olhar ao horizonte escuro, onde um aglomerado de estrelas cintilava imponente sobre o deserto árido e reinava em sua magnificência, como se cada ponto brilhante fosse um anjo sobre aquela terra tão inóspita. Louise recordava as ocasiões em que admirava as constelações no


solar do pai, na Inglaterra, quando fugia para o terraço no meio da noite, passando horas estudando com fascínio cada uma das bolinhas cintilantes lá em cima. Havia noites em que o pai de Louise, desesperado por não encontrar a filha adormecida na cama, flagrava-a empoleirada na grade do terraço, com os olhos arregalados para o alto. Ela sentia falta daquilo. Oh, Deus, sentia falta de seu pai. Como gostaria de contar-lhe tudo que estava conhecendo sobre o deserto, coisas que, até então, nem mesmo em seus diários ou pesquisas havia descoberto. Desejava dizer-lhe que estava vivendo verdadeiramente. Louise engoliu em seco, sentindo as lágrimas queimando nos cantos de seus olhos. Por que era tão difícil admitir, até para si mesma, que estava feliz ali? Seria por vergonha de tudo que tinha passado naquele palácio ou por culpa do que acontecera aos seus amigos? Pensar naqueles que se foram foi a motivação que precisava para deixar as lágrimas a dominarem. Louise cravou as unhas na madeira do batente da janela e chorou baixinho, seus ombros chacoalhando com a tristeza que a atingia. Ora, como poderia deixar de pensar nos amigos mortos? Como não culpar-se pelo acontecido? A admissão de que estava feliz enquanto eles estavam mortos a atormentava. Que tipo de pessoa ela era? Até mesmo abandonara sua expedição por amor, por não ter coragem suficiente para fugir. Seus olhos fraquejaram, e ela quase cedeu desvanecendo-se no chão, quando mãos fortes a ampararam pela cintura, puxando-a contra algo quente e forte. Não o impeliu, sabendo quem era, agradecida por ter o conforto de que precisava. Deixou a cabeça repousar contra o peito de Said, enquanto ele gentilmente apertava as mãos em sua volta. Nenhum dos dois disse qualquer palavra. Louise, aos poucos, acalmou-se, mesmo sabendo que estava nas mãos daquele homem que tinha mudado toda sua vida. O homem que amava. — Venha para a cama comigo, gazela — Said disse no ouvido dela, ao mesmo tempo em que a conduzia pelo quarto. O Sheik removeu o lençol do corpo de Louise, aproveitando para vê-la em cada mínimo detalhe, satisfeito com o presente vindo de Aláh, o que certamente era ela. Ajudou-a a deitar na cama e se deitou ao lado dela, cobrindo-os com o lençol em seguida. Ela aninhou-se contra o corpo do Sheik, enterrando o rosto em seu ombro, e ele viu-se tomado por um sentimento de posse tão forte que poderia ser devastador. Tinha desejo de protegê-la de qualquer mal, mantê-la sempre ao seu lado, vendo-a sorrir e todas as noites afundar-se nas sensações de seu corpo. Isso o assustou, já que nunca antes sentira tanta necessidade por uma mulher como


acontecia com Louise. Sabia que já deveria tê-la afastado, como suas próprias leis exigiam, mas ainda precisava dela. Said acreditava estar encantado por lady Louise, a inglesa que fora jogada em sua vida tão de repente, mas a paixão, como bem sabia, iria esvair-se em pouco tempo. A despeito disso, estava certo de algo; manteria Louise ao seu lado, sem pensar nas consequências, enquanto fosse necessário, enquanto aquele sentimento tão intenso ainda durasse dentro dele. Gostava de tê-la, mesmo tendo que admitir que a estratégia de mantê-la como escrava tinha sido um fracasso. Quando o corpo de Louise aquietou-se contra o seu, ele relaxou também. — Tenho medo — sussurrou ela, assustando-o. — Eu posso protegê-la, minha menina — respondeu Said, virando-a para que pudesse olhá-la nos olhos. Ela fungou, negando com a cabeça. — Meus pensamentos, Said. Eu não os posso controlar — contou, voltando a chorar, agora silenciosamente. — O inferno que não pode, gazela. — Segurou o queixo dela com os dedos. — Olhe para mim, Louise. Diga-me o que a amedronta, converse comigo, por favor. Deveria? Isso a ajudaria? Respirando fundo, Louise criou coragem para levar os sentimentos à luz. — Eu os vi morrer — começou ela, nervosa. — Não posso esquecer. Eles estariam vivos se eu... — Não havia nada que você poderia ter feito — interrompeu-a rapidamente. — Você foi corajosa ao se aventurar pelo deserto, Louise. É provavelmente a mulher mais valente que já conheci. — Eu os fiz vir para cá. Prometi que seriam reconhecidos, que ao voltarem para a Inglaterra seriam tratados como verdadeiros nobres. —Soltou-se do abraço de Said e sentou-se na cama. — E há meu pai. Ele deve me odiar neste momento e realmente não o culpo. Irritado, o Sheik também se sentou e a segurou pelo braço, fazendo-a vê-lo mesmo nas sombras. — Não permitirei que dê espaço para esses pensamentos, Louise —disse com tanta intensidade que a lady jurou ver os olhos azuis flamejarem. — Eu a consumirei antes que aconteça. Colocarei dentro de você boas e novas memórias. — Apenas me ajude, Said. Não me importo com o que faça, desde que consiga me ajudar. — Ela estava quase suplicando, tamanho o medo que sentia. Said segurou-a pelas laterais do rosto, exercendo a pressão certa. — Apagarei seus medos e pensamentos com meus beijos, gazela — e dizendo isso a beijou nos lábios. — Deixe-me aliviá-la e assim tudo se irá.


— Sim, por favor. — Louise procurou a boca de Said, jogando-se nos braços dele, em um claro sinal de que se entregava de corpo e alma a ele. Said a deitou na cama, colocando seu corpo sobre o dela, enquanto as mãos grandes e desejosas começavam a deslizar pelas pernas, coxas e seios, infligindo à pele dela a lembrança eterna de seu toque. O Sheik levou lady Louise entre os lençóis, apossando-se de seu corpo, de sua mente e, mais ainda, de seu coração. *** Ela acordou sozinha na manhã seguinte, mas isso não foi motivo para decepção. Nada era capaz de arrefecer o sentimento de ternura e o alívio que estava sentindo. Nunca fora uma mulher dada a crises sentimentais, porém era inegável que, desde que chegara àquele palácio, suas emoções andavam muito inconstantes. Era reconfortante saber que havia alguém ali para ela, alguém que não era precisamente bom com as palavras, mas que fazia verdadeira mágica com o corpo. Said era bom em distraí-la, aliviá-la dos incômodos. Tão mais simples e direto. Ao chegar à cozinha para comer algo, Louise foi informada diretamente por Karida que Said tinha ido às pressas até o acampamento, onde alguns homens tinham perdido o controle e entrado em conflito. Também soube que Alisha se negara a sair da cama, dizendo que estava indisposta e passaria o dia sozinha, o que animou ainda mais Louise. À tarde, para surpresa da lady, o Sheik a convocou para um passeio pelo palácio, o que ela aceitou animadamente. — Amo esse lugar — ela disse sorrindo. Estavam no jardim da fonte, agora mais vistoso do que antes. Havia novas plantas ali, sebes e palmeiras recém-plantadas, além de uma pequenina árvore, que chamou a atenção de Louise pelas belas flores que em seus ramos desabrochavam. — Oh, veja isso! — Deixou Said e correu até a planta, ajoelhando-se para apreciar melhor as pétalas. — São rosas do deserto — informou o Sheik, ficando às costas dela. — Eu a encontrei enquanto viajava, antes de ser atacado. Estava em minhas coisas e, quando voltei, pedi que fosse trazida para cá. — É tão linda — sussurrou Louise, tocando as pétalas rosadas com delicadeza. — Pensei que jamais veria uma dessas tão de perto. — Já a conhecia? — Sim — respondeu, levantando-se, enquanto desamassava a calça e a camisa azul-clara. — Através dos diários do meu pai. — Vamos continuar. Quero levá-la a um lugar — Said ofereceu-lhe o braço, e Louise aceitou


prontamente. Os dois deixaram o jardim e caminharam por um corredor à esquerda, lugar por onde ela nunca tinha passado. — Estou curioso sobre seu pai. Ele já esteve aqui? — Sim. Há muitos anos, papai explorou parte do deserto, fazendo anotações e pesquisas — contou Louise. — Foi logo depois da morte da mamãe, quando ele me deixou com uma tia. — Entendo — o Sheik disse, esperando que ela continuasse, mas, quando Louise se manteve em silêncio, ele pensou que era um assunto difícil para ela. — Onde estamos? — ela perguntou pouco depois, ao pararem frente a uma porta entalhada em madeira e mármore, que subia até metade da parede e estendia-se para os lados. — Eu disse que desejava trazê-la até o lugar onde fico sozinho quando preciso. Said retirou da pequena bolsa que carregava no quadril uma chave já enferrujada e, com paciência, abriu a grande porta, empurrando-a para que Louise passasse. Ela custou a acreditar que aquilo fosse real. Parecia ter sido arremessada ao paraíso, única explicação para estar diante de tanta beleza. Era uma ala circular, com uma fonte em mármore no centro, rodeada por paredes também em mármore, incrustadas de dourado, provavelmente por pepitas de ouro. Louise adentrou ainda mais aquele lugar, dando passos trôpegos, mal sabendo se tudo aquilo era real. Havia bancos de madeira negra dispostos em várias posições, decorados com vasos coloridos nas laterais. A lady explorou o lugar e encontrou uma porta menor do outro lado da ala. Hesitante, olhou para Said, pedindo permissão. — Quero que veja tudo deste lugar, Louise. Abra a porta — respondeu ao caminhar até ela. Com o coração aos pulos, Louise abriu a porta e entrou no cômodo. Era um pequeno quarto, todo decorado em carmim e âmbar. Havia uma cama simples, duas mesas e cortinas vermelho-escuras ao lado da cama, um baú de madeira, que parecia muito antigo. Estava tudo tão limpo, que Louise presumiu que Said designava alguém para limpá-lo. — É aqui que você vem quando precisa? — perguntou ao vê-lo parado na porta de braços cruzados. — Aqui está minha paz e sanidade. — Deixou o lugar em que estava e se colocou ao lado dela. — Somente eu posso entrar aqui. Este lugar é isolado dos outros. A lady franziu a testa, estudando o quarto. — Então por que estou aqui? — Porque quero compartilhar contigo parte do que sou, gazela. — A distância entre os dois era curta e já começava a afetar Louise. — Minha mãe viveu neste lugar, e eu nasci aqui. Ela piscou, admirando-o de repente.


— Quando ela se foi, meu pai isolou este lugar, preservando-o apenas para ele. E, quando ele também se foi, eu o tive apenas para mim. — Pegou a mão de Louise e a fez sentar na cama. Arrastou o baú para perto e se ajoelhou ao lado. O baú estava aberto, e ele logo começou a remexêlo. — Nunca consegui me desapegar destas coisas — disse, erguendo um vestido azul-claro, cheio de fitas e rendas. Era um modelo que uma dama usaria anos atrás na Inglaterra. Louise tocou o tecido, receosa, mas curiosa ao mesmo tempo. — É lindo. — Encontrou o olhar do Sheik, que estava um tanto triste. — Está guardando a memória de sua mãe, Said. — Lembro-me de sentir seu perfume em algumas roupas quando eu era mais jovem. — Acariciou a peça, levando-a ao nariz. — Mas com o tempo foi desvanecendo. Sei que deveria me livrar disso e enterrar o passado, mas neste lugar, aqui, com os pertences dela, é onde tenho paz. Ela sorriu, encantada com a descoberta de como o poderoso Sheik de Hamed, aquele homem terrível, poderia ser tão doce. Arriscaria a dizer que ele estava mudando. — Também sinto falta da minha mãe, Said. E, ao contrário de você, não tenho muitas coisas dela. Eu gostaria, mas não tenho. — Acompanhou-o com o olhar, ele se levantando e fechando o baú. — Por que parece tão mal? — É incrível como consegue saber quando não estou bem. — Ele riu, sentando ao lado dela. — Houve mais conflitos entre os homens do acampamento. Eles acreditam que não haverá comida suficiente para todos se os amigos de Alisha ficarem aqui. — Eles estão certos? — Temos comida para todos nós. Mas, com novas famílias, pode ser algo incerto — admitiu ele. — Não pode tentar convencê-los a partir em breve? Alisha já está recuperada e Aban parece bem — Louise sugeriu. — Não é assim tão fácil, gazela. — Suspirou, segurando a mão dela na sua. — Tenho como responsabilidade zelar por Alisha até que ela decida ir embora. São as leis do meu povo. Louise revirou os olhos. — Às vezes seu povo me parece muito estranho — resmungou. Said riu alto. — Eu diria o mesmo dos ingleses, Louise. Nossos costumes são muito diferentes. — Sim, penso que são — concordou Louise e então se lembrou de algo que, talvez, pela graça divina, pudesse funcionar. — Bem, eu gostaria de pedir algo a você. — O que é? Ela mordeu o lábio, pensando se valia a pena ou não continuar. — Vim para este deserto com uma missão, que foi interrompida quando... — Parou, não


querendo falar deles. Tomou um novo fôlego para continuar. — Peço que me permita encontrar AlDelíh. — A cidade perdida de Al-Delíh? É por isso que veio para o deserto? — O Sheik a olhava incrédulo. Louise apenas meneou a cabeça concordando. Said suspirou olhando para ela. Poderia ser interessante conduzi-la pelo deserto... — Eu irei acompanhá-la. Ela ficou de pé, assustada. — Realmente? Oh, não posso acreditar! — Louise sorria, batendo palmas e quase pulando. — Porém pedirei algo em troca — acrescentou ele. Ela murchou. Ora, era óbvio que ele pediria algo! — O que deseja de mim, Said? — Não resistiu em perguntar. — Quero que me permita usá-la para meu prazer esta noite, aqui. Desejo possuir você com força e garanto-lhe que irei chocá-la com o que tenho em mente. Ela lambeu os lábios, um tanto apreensiva. A proposta, apesar de tudo, parecia-lhe justa. — Faça o que desejar com meu corpo, Said. Sou tua. Ele levantou e parou em frente a ela. — Será somente prazer e a mais plena felicidade que conseguirá imaginar. — Beijou-a na testa e se afastou. Mais felicidade do que estava sentindo? Oh, ela duvidava. Mas também ansiava que a noite chegasse logo.



Capítulo Vinte e Um Mesmo diante da mesa farta servida com pães, carne defumada, Chancliche e tâmaras doces, Said não tinha apetite algum. Ao contrário de seus convidados, que se esbaldavam com a refeição, ele mantinha-se quieto, às vezes olhando disfarçadamente para Louise ao seu lado, que mastigava lentamente um pedaço de pão de cereal. Alisha também estava quieta como ele e parecia-lhe aborrecida. — Sente-se bem, Alisha? — perguntou à jovem, que levantou os olhos para ele, surpresa. — É minha cabeça, meu príncipe. Sinto algumas dores fortes — respondeu ela. — Algo normal, Alisha. Creio que precisa de ar puro. Talvez possa acompanhá-la em um passeio, meu príncipe? — Os olhos de Aban faiscaram de interesse na direção de Said, que se moveu incômodo em seu lugar. — Não será necessário. Se me permitir, irei me retirar para meu quarto, senhor. — Ela olhou com preocupação para o Sheik, que concordou com um gesto de cabeça, permitindo que a jovem se retirasse. — A serva irá acompanhá-la — disse Aban, enquanto levava uma fatia do queijo à boca. Louise deixou o pedaço de carne sobre a mesa e pôs-se de pé, mas Alisha se manifestou rapidamente. — Agradeço, mas necessito ficar sozinha — e com um rápido cumprimento deixou o salão sem olhar para trás. A lady procurou pela reação de Said, esperando que ele lhe dissesse para sair, o que provavelmente seria o correto. Mas ele apenas indicou que se sentasse novamente, e ela, sabiamente, obedeceu , baixando a cabeça e voltando a se concentrar em sua comida. Said respirou fundo e tentou engolir um gole do chá preto que fora servido, já que agora tinha perdido qualquer interesse no jantar. Estava sendo difícil se concentrar quando tudo que desejava era que as horas passassem mais rapidamente e o momento em que ela estivesse ao seu dispor chegasse logo. — Não sei o que fazer com Alisha, meu príncipe — Aban começou, suspirando ao deixar a comida de lado para iniciar a conversa. — Compreendo que o trauma por tudo que aconteceu ainda a abala, mas é certo que seu reino é belíssimo e que poderia fazer bem a ela. Louise desviou a atenção da comida, concentrando-se no que o homem dizia. — Penso que ela deve encontrar algo que a faça querer seguir novamente. Está em seu sangue governar, ser superior, e temo que não exercer suas funções a esteja deixando triste. Said não moveu um músculo, examinando atentamente o que o homem estava dizendo; pelo que começava a descobrir, não lhe parecia-nada bom.


— Deseja voltar para seu antigo acampamento? — perguntou, esperando internamente que a resposta fosse afirmativa, já que, àquela altura, o que mais ansiava era livrar-se do homem incômodo. Aban desviou o olhar do Sheik e limpou a garganta. — Acredito que ainda não seja o momento para Alisha reencontrar o que sobrou de seu antigo lar. Seu reino proporciona a ela a proteção necessária, e sua autoridade a estimula a continuar. És uma boa influência para ela, meu príncipe. O Sheik teve desejo de revirar os olhos diante de tamanha bobagem. Estava claro o que Aban tentava fazer e era certo que não funcionaria de maneira alguma. Já passara pelo mesmo outras vezes e em nenhuma delas fora tão pressionado como agora. Esse era o momento em que voltava a cogitar a possibilidade de ordenar que todos deixassem o reino. Com uma polidez incrível, Said, valendo-se de um comentário qualquer, encerrou o assunto sem deixar brechas para que Aban ignorasse sua decisão. Em silêncio novamente, o Sheik começou a meditar, estudar o homem, que voltara a devorar as porções de comida sem parecer se importar com qualquer outra coisa. Olhou para Louise e a encontrou fitando-o com curiosidade. Rapidamente compreendeu o significado oculto no olhar dela, que claramente concordava com ele a respeito do homem. O olhar da mulher era tão puro e honesto que Said conseguia compreendê-la facilmente. O jantar terminou pouco tempo depois, quando Aban, satisfeito, deixou a vasilha com os restos sobre a mesa e ingeriu um pouco do chá, suspirando no final. — Se meu príncipe não se importar, eu gostaria de dizer algo importante — e com um olhar desdenhoso para Louise, disse: — Sem a presença dos servos. Com toda a dignidade possível, Louise se levantou, não exatamente incomodada com o fato de ter sido chamada de serva por Aban, já que sua consideração por ele era pouca, mas porque sabia que aquela conversa iria atrasar seus planos, os quais envolviam Said, certamente. — Infelizmente não poderei me reunir com você nesta noite, Aban. Louise parou ao ouvir a voz tranquila de Said. — Tenho um compromisso inadiável — continuou o Sheik. — Posso imaginar que sim, meu príncipe — o homem resmungou, decepcionado. Louise seguiu pelo corredor, quase tropeçando em seus próprios pés, morrendo de ansiedade, sabendo que era o compromisso inadiável de Said. *** Se há alguns anos dissessem a Louise que, em algum momento de sua vida, estaria espreitando por entre os corredores escuros de um palácio em pleno deserto, vestida com uma túnica quase


transparente, correndo para os braços de um poderoso Sheik mestiço, ela certamente teria uma crise de risos, tamanho absurdo seria. Mas coisas antes impossíveis, como ter encontros lascivos no meio da noite com um homem sedutor e ardente, disposto a dar-lhe prazer, agora lhe pareciam comuns. Ah, sim a vida não parava de surpreendê-la. Satisfeita por não encontrar qualquer guarda nos corredores, Louise empurrou a grande porta e entrou sorrateiramente na ala em que estivera junto de Said naquela manhã. Foi surpreendia pelas dezenas de lamparinas posicionadas em vários cantos da ala, as quais deixavam o lugar especialmente belo, principalmente a fonte, que, iluminada pelas luzes amareladas das lamparinas, ainda refletiam o brilho prateado da lua, deixando a água com uma cor mágica. Ela caminhou até o outro lado, sabendo exatamente onde encontrar Said. A porta do quarto estava aberta e dele surgiu o homem, vestido apenas com uma calça escura, o peito desnudo e os pés descalços, o cabelo negro bagunçado. Louise sorriu ao vê-lo e não resistiu ao apressar-se em tocá-lo, envolvendo-o pelo pescoço, desesperada para beijá-lo. — Parece feliz em me ver— ele disse ao beijar o delicado nariz. Ela sorriu, ansiosa para tocar o peito esculpido e emaranhar os dedos nos poucos pelos que fariam cócegas em sua mão. — Eu estou — confirmou ela. — E me questionei algumas vezes, enquanto vinha para cá, se isso era correto. Said a segurou pela cintura e sorriu maliciosamente. — Mente para mim, gazela. — Empurrou o quadril contra o dela, simulando o ato sexual, deixando-a ciente de seu estado de excitação. — Sei que a única coisa que conseguiu pensar foi em meu corpo dentro do seu. Está desejando que eu a tome com força e a faça gritar de prazer. Louise mordeu o lábio, envergonhada por ter sido desmascarada. Suspirou, dando-se por vencida. — A culpa de meu comportamento libertino é seu e deste lugar. Há algo que me faz agir assim, como se tudo fosse permitido — desabafou, esperançosa de que ele acreditasse. O Sheik inclinou a cabeça para o lado, olhando-a com um meio sorriso. — Admito que a iniciei nos assuntos do sexo, minha gazela. Mas não me culpe por seus desejos e vontades. Eu apenas a estou ajudando a descobrir o que deseja. É uma mulher bonita, é adulta e agora sabe o que é estar nos braços de um homem. Sim, eu sei. — Apesar de acreditar que meu ponto de vista está certo, não irei discutir com o senhor, meu príncipe, já que uma boa escrava não questiona seu senhor — esclareceu ela, com ironia.


Said riu com vontade, espalmando de leve as nádegas da mulher, deixando-a ainda mais envergonhada. — Estou morrendo de vontade de beijar cada parte do seu corpo, mulher. Venha comigo — e segurando-a pela mão, levou-a para dentro do quarto. Louise surpreendeu-se ao encontrar o cômodo totalmente diferente do que vira pela manhã. As cortinas e as peças da cama foram trocadas por outras de cores azuladas, e o velho baú já não estava mais ali. Ela quis perguntar sobre o motivo da mudança, mas desistiu quando percebeu que era desnecessário. — Quero que tire seu vestido e deite-se na cama completamente nua — anunciou ele em sua frente. Ela hesitou brevemente, mas recordou de sua promessa de entregar-se completamente a ele. Estava ali por isso. Removeu a túnica e a jogou ao chão, perguntando-se se havia sido realmente sábio não vestir qualquer outra peça por baixo. Os olhos de Said deslizando por seu corpo foram suficiente resposta. Como ele pedira, Louise ajoelhou-se na cama e deitou de costas, deixando as pernas apertadas e os braços caídos ao lado do corpo. Sua barriga arredondada subia e descia rapidamente, a respiração acelerada. Ela franziu a testa, percebendo de repente o quanto sua barriga tinha crescido nos últimos dias, consequência da farta comida que tinha a sua disposição. Provavelmente não agradaria Said vê-la tão gorda. Fechou os olhos com força e agarrou-se ao lençol, xingando-se mentalmente por não ter percebido antes a mudança em seu corpo. — Há algo errado? — o Sheik perguntou confuso. Louise abriu os olhos e o fitou forçando um sorriso. — Está um pouco frio. — Por pouco tempo — Said foi até a pequena mesa ao lado da cama e de uma gaveta retirou alguns objetos que ela não conseguiu ver. — Quando eu terminar, estará tão quente que necessitará de um banho. Bem, isso era inesperado. — Deite-se ao meu lado, Said — convidou ela, movendo-se na cama. — É uma proposta tentadora — admitiu o Sheik. — Mas, neste momento, há algo que está me tentando ainda mais, gazela. Ela decidiu não perguntar, e ele se propôs a responder: — A vingança. — Ficou novamente no alcance da visão da mulher e esticou entre as mãos um lenço turquesa. — Quero que sinta exatamente a mesma coisa que senti quando tomou meu corpo para


seu prazer, usando-me como bem desejava. Oh, Senhor... — Louise abriu a boca, não conseguindo articular qualquer palavra. — Abra as pernas — ordenou ele. Ela fez o que era pedido, enquanto Said subia na cama e ajoelhava-se entre suas pernas, ainda sem tocá-la. Ele pairou sobre o corpo dela, os joelhos um de cada lado de seu estômago, e, com muita precisão, cobriu seus olhos com o lenço, impedindo-a de ver qualquer coisa. — Confie em mim, gazela. — Foi gentil ao prender o nó ao lado de sua cabeça para que não a machucasse e, quando terminou, continuou no mesmo lugar que estava. — Está como o próprio pecado, Louise. Exposta, e aberta para mim, como tanto sonhei. Louise nada podia ver, mas a expectativa a fazia querer gritar para que ele a tocasse logo. — Sua respiração está acelerada. — Said colocou a mão sobre a garganta dela por um momento. — Talvez eu deva apressar um pouco as coisas. Sim, ela concordava com isso. Queria tudo que era seu, naquele momento. O Sheik se moveu na cama e alcançou um pequeno frasco na mesa, sorrindo satisfeito quando fitou o líquido escuro. A melhor forma de vingança era usar a mesma arma contra seu torturador. Retirou a tampa do frasco e derramou uma quantidade sobre os bicos dos seios de Louise, causando um arrepio no corpo dela. Os mamilos se intumesceram em instantes, tornaram-se inchados e apetitosos, quase derrubando a contenção de Said, que queria devorá-los no mesmo instante. Ele deixou o frasco novamente na mesa e começou a trabalhar nos seios generosos, espalhando o óleo em círculos, massageando e apertando entre os polegares, arrancando gemidos roucos da garganta de Louise. — Será como o próprio inferno, Louise. — Juntou os seios nas mãos e os espremeu, imaginando seu pênis sendo acariciado entre eles. Quanto a ela, acreditava realmente estar sendo jogada ao inferno, de tão quente que se encontrava seu corpo. As mãos de Said, banhadas no óleo, desceram pela barriga de Louise, e ele contemplou com deleite como ela estava mais cheia, bem como ele gostava. Posicionou-se melhor sobre ela, obrigando-a a afastar os joelhos para que suas pernas ficassem abertas, e a visão de sua intimidade, tão úmida, quase o deixou louco. Ele esfregou uma mão na outra até senti-las quentes e então tocou exatamente no ponto certo, onde sabia que a enlouqueceria. — Said... — exclamou ela, empurrando o corpo para cima, tentando fechar as pernas. — Sentirá exatamente o que senti. E ainda pedirá por mais — disse, fazendo movimentos em torno do clitóris, usando os dedos para estimulá-la, levando-a tão perto do prazer. Sem a visão, as sensações tornavam-se mais intensas, tanto que Louise já não mais controlava o


próprio corpo, entregando-se quando o prazer elevou-se, jogando-a diretamente ao céu. O Sheik pulou da cama, enquanto a via contorcer-se, e retirou a calça com desespero, pronto para estar entre as pernas dela novamente, dessa vez possuindo-a. — Guardarei essa visão para sempre em minha memória. —comentou, enquanto deslizava a mão em seu membro, tornando-o mais duro ainda. — Eu poderia encontrar o prazer apenas vendo-a assim, tão vulnerável a mim. Ela continuava arfando, ouvindo atentamente tudo o que ele dizia, e só se deu conta do que ele fazia quando sentiu a cama balançar com o peso do corpo dele. Ah, Said estava ali. — Quero vê-lo — pediu ela, levando as mãos ao rosto. — Não permitirei. — Said prendeu os braços dela contra a cama e se posicionou entre suas pernas. — Quero que apenas sinta. Louise compreendeu e não se moveu mais, até senti-lo tocando-a intimamente e, de repente, entrando em seu corpo, tomando posse. Ele foi até o fundo e retirou-se, acompanhando as expressões dela, a forma como mordia os lábios e franzia a testa. Debruçou-se sobre o corpo de Louise e permitiu que ela o abraçasse, enquanto aumentava o ritmo, disposto a fazê-la sentir os efeitos novamente. Foi tão fácil tê-la reagindo outra vez aos impulsos, e ele gemeu entre dentes quando se retirou dela e liberou-se em sua barriga. Said removeu o lenço e encontrou os olhos de Louise desfocados, procurando por ele. Ela sorriu languidamente, mal conseguindo mover-se. — Preciso dizer que o senhor é muito mau e vingativo, meu príncipe — provocou ela. O Sheik rolou para o outro lado da cama e usou o lenço para limpar o corpo de Louise. Ela permitiu, totalmente desprovida da antiga vergonha que sentia. — Ainda sente frio? — Said perguntou, jogando o lenço para um canto. — Nem um pouco — confessou ela, encolhendo o corpo, virando para ele. Franziu a testa ao encontrá-lo sério, parecendo preocupado. — Algo errado? — Não. Está tudo bem — respondeu, forçando um sorriso. Louise estranhou o comportamento dele, mas não o questionou. Seu corpo estava desgastado e agora mal tinha forças para manter-se acordada. Bocejou, cansada. — Posso dormir aqui? — perguntou piscando. — Sim, durma, gazela. — O Sheik beijou o dorso da mão de Louise, e ela suspirou, caindo em um sono tranquilo. Ele se acomodou melhor e fitou o teto, sentindo-se um pouco incomodado.



Capítulo Vinte e Dois Após a última noite passada nos braços de Said, Louise não o encontrou novamente por uma semana. Logo na manhã seguinte, quando acordara com beijos e carícias, sendo estimulada a entregar-se a ele novamente, a lady despediu-se do Sheik com um beijo apaixonado e uma promessa de que se encontrariam novamente naquela noite. Porém, ao voltarem ao movimento do palácio, ambos foram avisados de que Alisha sentia-se mal e que necessitava da ajuda da serva, pedido de Aban. Assim Louise foi tomada por uma rotina em que fazia companhia a Alisha durante a maior parte do dia, auxiliando-a sempre que necessário, já que a jovem mostrava-se estranhamente fraca e triste, sem desejo de sair do quarto. Quando não estava ao lado de Alisha, Louise era arrastada para os afazeres junto de Karida, que precisava de sua ajuda. No final do dia, ela mal conseguia sustentar-se sobre as pernas, e um encontro com Said era totalmente impossível, já que ele também se via perdido em seus compromissos. Os problemas no acampamento continuavam e, pelo que se dizia entre os servos, nem mesmo o Sheik conseguia encontrar uma solução pacífica para isso. Alguns homens da tribo pediam que os hóspedes fossem mandados embora imediatamente e, o que começara com poucas pessoas, agora tomava uma dimensão maior. Houve poucas vezes em que Louise e Said encontraram-se brevemente. Apenas uma troca de olhares, um sorriso da parte dela, e os intensos olhos azuis de Said sempre a desestruturando. A lady percebia agora o quanto estava sentindo saudade do Sheik, mesmo tendo-o ali tão perto, pois, apesar disso, não podia tocá-lo. O mesmo acontecia com Said, que morria de desejo, de vontade simplesmente de beijá-la. Ele precisou muitas vezes, ao encontrá-la, controlar-se para não arrastá-la até um lugar isolado e beijá-la até perder o ar. Havia questões inadiáveis a serem resolvidas e, como Sheik, autoridade no reino, ele não poderia ausentar-se, no entanto jurava que, na mínima oportunidade que tivesse, iria perder-se nela completamente. *** Naquela manhã ao ir até o quarto de Alisha, como fizera durante todos aqueles dias, Louise não encontrou a jovem. A cama estava desfeita, e as vestes não se encontravam no lugar de sempre. Procurou-a no salão principal e na cozinha, mas não havia sinal dela, o que deixou a inglesa nervosa. A lady cogitou falar com Said, mas decidiu não fazê-lo, já que ele estava muito ocupado com os assuntos do acampamento. Decidiu continuar procurando, excluindo alguns locais do palácio onde sabia que não a encontraria. Avançou pelos corredores e pequenas alas, perguntando-se o que havia acontecido com Alisha para agir daquela forma. A jovem sempre avisava quando saía e, embora não compreendesse


seu comportamento agora, Louise lembrou-se de que, no dia anterior, a garota mostrava-se desanimada e fraca. De repente ocorreu-lhe que Alisha poderia estar no jardim da fonte, lugar que gostava muito. Correu para lá, pouco se importando com os modos de uma boa dama, feliz por usar aquelas calças confortáveis e as sapatilhas tão leves. Se usasse os mesmos vestidos de antes, mal conseguiria mover-se pelos estreitos corredores. Encontrou a silhueta da jovem, que estava sentada na beirada da fonte onde molhava as mãos, cantando baixinho. Aproximou-se com cuidado para não assustá-la. — Alisha — chamou com a respiração cansada. A jovem ergueu os olhos avermelhados, encarando-a, e fungou, envergonhada. — Estive à sua procura por todo palácio. Estava preocupada — falou Louise, sentando-se ao lado dela. — Desculpe-me — Alisha disse de cabeça baixa. — Acordei cedo e pensei em vir até aqui. Desejava ficar sozinha. — Sente-se mal? Ela negou. — Estou sentindo falta de casa — explicou em voz baixa. — Entendo o que está sentindo — Louise disse suspirando. — Também sinto falta da minha. A jovem novamente elevou o rosto, os lábios trêmulos e os olhos úmidos. — Sua casa ainda está lá, mas a minha não existe mais — murmurou, encobrindo o rosto com as mãos. Louise sentiu pena dela, partiu-lhe o coração. — Formará uma nova casa, Alisha. Terá uma tribo ao seu lado e tudo que deseja — animou-a, tentando imaginar como seria possível tudo aquilo. A jovem limpou o rosto e endireitou os ombros, recompondo-se. — Meu pai dizia que nosso reino era indestrutível, ninguém poderia nos derrubar. Por que ele estava errado? — perguntou a Louise, olhando-a com descrença. — Bastou que alguns de nossos homens estivessem fora, e... não restou nada mais. — Você não está sozinha, querida. Said a acolheu no palácio, eu estou do seu lado, e Aban salvou sua vida. — Louise notou que, à menção do homem, a jovem torceu a boca, contrariada. — Todos que eu amava se foram. Meu pai... Hanin. — Mergulhou a mão na água e a retirou, brincando com as gotas que se acumularam na palma. — Nós iríamos nos casar em alguns dias. Louise a encarou. — Está dizendo que estava noiva?


Ela assentiu. — Hanin lutou ao lado de meu pai. — As lágrimas retornaram e, dessa vez, Louise precisou ampará-la. — Hanin se foi primeiro e em seguida meu pai. Eu não pude enterrá-los. — Aban a resgatou e a trouxe para cá — concluiu Louise. Alisha tremeu nos braços dela, e a lady percebeu isso novamente. — Ah, aqui está você. — Aban surgiu na entrada do jardim e caminhou até onde as mulheres estavam. Sorria, mas ainda assim parecia nervoso. — Sabah deseja vê-la. A jovem se separou de Louise, ficando de pé diante de Aban e, com um rápido cumprimento, saiu do jardim. O homem continuou onde estava e mudou de expressão, enfrentando o olhar de Louise, espreitando-a dos pés a cabeça. Ela se levantou e tentou passar por ele, mas o homem a segurou pelo braço, impedindo-a de continuar. Louise tentou se livrar de sua mão, mas ele começou a entoar frases em uma língua antiga, das quais poucas palavras ela conseguiu compreender. — Solte-me. — Louise o empurrou e aproveitou o momento para correr para fora do jardim, mal olhando para trás. Atravessou o corredor em direção à cozinha com o coração aos pulos, assustada pelo que tinha acabado de acontecer. Aliás, o que tinha acabado de acontecer mesmo? Virou em um corredor, deparando com Said e mais dois homens conversando. Ao vê-los, tentou disfarçar e voltar, mas o Sheik percebeu sua presença e, despachando os homens, foi até ela. — Você parece assustada. — Ele tocou-a no ombro, examinando sua expressão. Louise negou veemente, sorrindo para ele. Não queria preocupá-lo. — Estou bem. Estava indo ajudar Karida. Said, ainda sério, deslizou a mão pelo braço dela e, por fim, entrelaçou seus dedos aos de Louise gentilmente. — Sinto sua falta — confessou. — Morro por tocá-la novamente. — Eu também— ela admitiu, corando. Ficou na ponta dos pés e depositou um leve beijo nos lábios do Sheik. Suspirando, Said desvencilhou-se dela e passou a mão pelos cabelos. — As questões do acampamento têm tomado muito tempo. Não posso deixar de cumprir minhas obrigações. — Voltou-se para ela e a fitou profundamente. — Assim que tudo terminar, quero tê-la novamente em meus braços, meu corpo dentro do seu. — O que pensa em fazer a respeito das revoltas? — ela perguntou, tentando mudar de assunto. Era difícil manter-se estável enquanto Said falava tão abertamente de coisas... prazerosas. — Ainda não encontrei uma solução. Pela primeira vez em anos, eu gostaria de ter a ajuda do


meu pai. Ele saberia o que fazer em uma situação como essa — confessou, escorando-se à parede, de cabeça baixa. Louise olhou para o homem alto e forte em uma posição tão inferior e sentiu-se no dever de dizer algo; qualquer coisa que o ajudasse a entender o quão bom estava sendo para aquele povo e que sim, haveria uma solução para o problema. Mas as palavras não surgiam, e tudo que pensava em dizer tornava-se vago rapidamente, inútil. — Preciso ir até a cozinha — informou, passando por ele. Said não disse nada e nem se moveu, o que acabou deixando Louise ainda mais nervosa. Foi por isso que ela blasfemou baixinho e voltou até ele, agarrando-o pela camisa e colocando os lábios nos dele. Beijou-o com volúpia, empurrando a língua contra os lábios do Sheik, governando, dizendo-lhe que o desejava. Quando ele começou a tentar sobrepor-se, ela simplesmente se afastou. Quanto a Said, ficou ali, parado, ainda afetado pelo movimento do corpo de Louise enquanto iase. Levou certo tempo para que ele percebesse, enfim, o quanto tinha sido interessante a atitude dela.



Capítulo Vinte e Três No final daquele dia, Said foi chamado com urgência ao acampamento. Uma revolta, liderada por dois homens, havia se iniciado. Exaltados, eles gritavam querendo a presença do Sheik e a solução para os embates que estavam surgindo. Logo Said apareceu e, em uma atitude superior, ordenou que os guardas ficassem à distância, já que estava disposto a conversar com os homens e resolver o problema. Quando Louise soube, por meio de conversas das criadas, o que acontecia, sorrateiramente, fugiu da cozinha para fora do palácio, embrenhando-se no meio das dezenas de pessoas, cobrindo o rosto com o véu para não ser descoberta. Queria ver o que aconteceria. Estava nervosa por Said. Ao contrário do que ela imaginava, o Sheik parecia tranquilo diante daqueles dois homens de expressões nada amigáveis. De onde estava, infiltrada entre um grupo de mulheres, Louise conseguiu ouvir parte da conversa entre Said e os homens. — A praga está entre nós, senhor — um dos homens, de pele escura e túnica vermelha, começou, erguendo as mãos para o céu. — Aláh quer que combatamos o mal e o disseminemos de nossa terra. Said olhou sobre os ombros do homem, para as pessoas que murmuravam, concordando com ele. — Continue — ordenou, disposto a saber o que estava acontecendo ali. — A areia será marcada de sangue se eles não partirem. Não há lugar para eles em nosso acampamento, senhor — o outro homem falou, deixando claro a que pé a situação estava. O Sheik suspirou, vendo como os homens haviam conseguido influenciar as outras pessoas do acampamento, incitando-os a se revoltarem também. Um burburinho começou entre as pessoas à direita, que diziam algo sobre expulsão, e outras, que falavam acerca de morte. Os guardas avançaram, mas Said ergueu a mão, indicando que parassem. — Dei a eles abrigo e alimento, acolhi a filha do sultão e me comprometi em protegê-la até que tudo fosse resolvido. Cumpri com meu dever, como fui ensinado desde jovem — falou, a voz em um tom alto, para que todos o ouvissem. — Não é necessário que entremos em conflito, todos terão o necessário para viver. Mais gritos e palavras, alguns concordando e outros ainda receosos. Louise, no meio do povo, levou a mão ao peito, angustiada por ver Said sendo hostilizado daquela forma. Doía-lhe vê-lo sendo questionado de uma forma tão dura por seu próprio povo, sendo motivo de desconfiança e revoltas. Se pudesse dizer àquelas pessoas quem realmente Said era, faria sem hesitar. Porém era consciente de que não podia interferir daquela forma, porque não era parte de tudo aquilo, não tinha o sangue daquela terra. Então, apenas continuou a observar, enquanto os homens davam as costas a Said, deixando um último ultimato.


— Ao nascer do sol do próximo dia, se eles não partirem, nosso povo se unirá para que o façam — disse o homem mais alto, recebendo apoio das demais pessoas. E Said ficou sozinho no meio do povo, observando-os enquanto davam as costas a ele, alguns com olhares de compaixão, outros visivelmente confusos. Ele não os culpava, compreendia a situação e aceitava o sentimento deles. Mas o que mais o incomodava era o fato de não conseguir encontrar uma solução viável para o problema. Era óbvio que não aprovava a permanência do povo de Aban em seu reino e que só o fazia por sua honra e seus costumes, que o obrigavam a prover a presença de Alisha; ele também desejava vê-los saindo dali. Preocupava-o agora saber o que aconteceria. O Sheik foi desperto de suas reflexões por uma pequena menina, de túnica azul-escura, que lhe puxava a calça, olhando-o com os olhinhos arregalados. Ele, sem saber muito bem o que fazer, agachou-se, ficando na altura dela, que sorriu encantada. — Está perdida, princesa? — perguntou, segurando a mãozinha dela. A menina, que não parecia ter mais de quatro anos de idade, confirmou, franzindo a testa. Não parecia ter medo. — Bem, então vamos achar sua mãe. — Ele a segurou pelos bracinhos e levantou-se, colocandoa em seu colo. — É alto — ela disse, segurando-se nos ombros dele. Said sorriu, caminhando na direção das tendas, desviando de um grupo de mulheres que o olhavam. Uma em especial chamou-lhe a atenção, por seu olhar curioso e perscrutador... — O que faz aqui? — perguntou, aproximando-se. A mulher deu de ombros e começou a andar ao seu lado. — Quem é essa princesa? A menina abriu o sorriso de poucos dentes e ofereceu os braços a Louise, que foi pega de surpresa por aquela criança abraçando-a. — Oh, bem... — Olhou para Said, que apenas riu, guiando-a entre uma fileira de tendas. — Talisi. — Uma mulher jovem apareceu em frente a eles, gritando, tomando a menina dos braços de Louise e a abraçando desesperada. — Obrigada, senhor. — Baixou a cabeça em honra ao Sheik e sorriu para Louise, antes de voltar correndo, com a menina nos ombros acenando para os dois. — Você é bom com crianças — comentou Louise pouco depois. Said mal olhou para ela ao responder. — Gosto delas — disse simplesmente. — Vamos voltar para o palácio, estou desejando castigála por sair dessa forma, e sem avisar-me.


Ela fez uma careta. — Queria ver o que estava acontecendo — protestou. O Sheik e ela caminharam para a entrada do palácio. — A curiosidade mata algumas pessoas, Louise. — Eu não estava curiosa. Tinha medo de que acontecesse algo a você — confessou ela, parando de caminhar para fitá-lo. Said também parou e se aproximou. Segurou as mãos dela e a beijou docemente. — Nada acontecerá comigo, garanto a você. — Seu olhar era intenso e provocava arrepios em Louise. — E obrigado por estar ao meu lado. — Sempre estarei ao seu lado, Said — Louise afirmou, segurando a mão dele e levando aos lábios repetindo o gesto dele. Said engoliu em seco, assustado por aquela descarga de energia que reverberou por seu corpo, indo diretamente para seu coração. *** No meio da madrugada, Louise acordou desorientada, sentindo a boca seca. Dormira com esperança de que Said fosse até ela e o esperou até tarde da noite quando sucumbiu ao sono. Sentia-se sufocada e decidiu que precisava de ar fresco. Talvez procurasse Said. Vestiu a leve túnica e calçou as sapatilhas, acendendo a vela que tinha ao lado da cama. Caminhou para fora do quarto, indo para o corredor escuro. Frio percorreu sua pele, e ela encolheuse, decidindo que sim, iria até Said. Ora, que mal haveria nisso? Já tinha aceitado que o amava e o desejava. Estava há dias sem tocá-lo. Deixou para trás o quarto e entrou em um novo corredor, satisfeita por não haver qualquer guarda em seu encalço como acontecia antes. Ouviu algumas falas murmuradas, que pareciam vir do corredor próximo ao quarto de Said. Louise encostou-se à parede e esticou o pescoço para ver Aban e Alisha conversando, o homem visivelmente nervoso, apontando para o rosto da jovem, que parecia chorar, segurando a pequena vela nas mãos. Primeiro Louise quis acreditar que fosse apenas uma simples conversa, mas, quando ouviu a frase seguinte de Aban, sua opinião mudou. — Disse-lhe para envolvê-lo. Deve se casar com ele, Alisha. Só assim teremos o controle do reino. — Eu não posso... — a jovem disse, ainda chorando. Louise viu Aban chacoalhar Alisha pelos ombros com violência. — Sim, fará. Ou eu a matarei como fiz com seu pai. Não irei hesitar um momento. — Torceu o


braço dela, fazendo-a gemer. — Solte-a! — Louise gritou, aparecendo no corredor. — Não toque nela! Aban a olhou assustado, empurrando Alisha para o canto. — Não se meta nisso! — Ele começou a ir em direção a Louise, que se desesperou. — Sempre imaginei que a inglesa imunda se colocaria contra meus planos. Aprenderá exatamente qual é o seu lugar. O homem estava cada vez mais perto, e Louise não sabia o que fazer. Suas pernas não respondiam a sua mente, que gritava ordenando que corresse. Quando as mãos de Aban estavam próximo ao rosto dela, Alisha jogou-se nas costas dele, esmurrando-o no rosto, desequilibrando-o. Louise jogou a vela no chão e correu para ajudar, chutando as pernas do homem. Ele se debatia, tentando derrubá-las, e a lady passou a gritar, tentando chamar a atenção do guarda. Aban jogou Alisha contra a parede e agarrou Louise pelo pescoço, sufocando-a. — Será tão fácil matá-la — disse entre dentes, sentindo o corpo da mulher amolecer em suas mãos. Antes que conseguisse tirar-lhe a vida, porém, foi detido por Said, que vinha correndo desesperadamente, empunhando sua cimitarra, pronto para matar Aban. O homem, assustado, deixou a inglesa cair ao chão e deu um passo para trás, a tempo de os guardas que vinham junto de Said segurarem-no contra a parede. O Sheik contornou Louise, que estava desacordada, e foi direto para Aban, disposto a concretizar seu maior desejo: matá-lo.



Capítulo Vinte e Quatro — Prendam-no — Said ordenou, retirando a lâmina do pescoço de Aban, empurrando-o para os guardas. Imobilizado, o homem saiu do corredor carregado pelos guardas, tentando ainda libertar-se, debatendo-se. O Sheik guardou novamente a cimitarra e se ajoelhou ao lado de Louise, que agora começava a acordar. Ele a segurou nos braços e esperou até que ela voltasse à realidade, piscando atordoada. Louise olhou para Said e acalmou-se rapidamente, sabendo que tinha sido salva por ele. Em meio à fraca luz que surgia da pequena vela esquecida no chão, ela vislumbrou a sombra de Alisha, encolhida contra a parede, o corpo tremendo enquanto chorava baixinho. — Você está bem? — perguntou Said, passando a mão pelo rosto da inglesa, procurando por algum ferimento. Ela se apoiou nele e ficou de pé, ainda um pouco tonta. — Onde ele está? — Louise perguntou procurando por Aban. — Os guardas o levaram — respondeu o Sheik. Não o matara apenas por causa de Louise, não o faria na frente dela. Lentamente, a inglesa foi até Alisha, tocando-a no ombro, buscando seu olhar. — Por favor, eu imploro. — A jovem caiu de joelhos em frente a ela, escondendo o rosto com as mãos. — Eu não tive escolha. Se eu não fizesse, ele me mataria. Desconcertada, a lady olhou para Said, que a fitava com uma expressão de ira. Era evidente que não estava disposto a ter piedade da jovem. — Conte tudo que aconteceu, Alisha — incitou Louise, segurando-a pelos ombros. — Não faremos mal a você. Basta nos dizer o que houve. Suspirando, a jovem limpou as lágrimas que caíam pelo rosto e, com um olhar hesitante, começou a contar: — Nosso reino era forte e seguro, nunca tivemos ameaças de ninguém, orgulhávamo-nos de nosso povo — contou, parando para estudar a reação do Sheik. — Mas, durante uma noite, enquanto dormíamos, fomos atacados por homens vestidos de negro, que usaram as cimitarras contra nós. Eu dormia em minha tenda quando fui atacada. Arrastaram-me até a tenda do meu pai, e eu o vi ser morto... bem a minha frente. Louise prendeu a respiração, antecipando o resto da história. — Foi Aban quem fez isso? — perguntou, incentivando-a. Alisha confirmou, limpando as lágrimas na manga do vestido.


— Ele me ameaçou e, quando Hanin tentou salvar-me... — A jovem se calou, caindo em um choro compulsivo. Said, que assistia a tudo muito atentamente, olhou para Louise, estudando sua reação. Ao que percebia, visto a forma como a confortava, a lady estava do lado de Alisha. — Por que meu reino? Qual era o plano de Aban? — questionou, perdendo o pouco de controle que tinha. Alisha encolheu-se diante dele. — Eu não sei por que ele escolheu Hamed, meu príncipe. E, quanto ao plano, ele queria que eu me casasse com você e tivesse poder sobre o reino, para que ele também o possuísse — explicou ela, baixando o olhar ao ver a reação do Sheik. Nervoso, Said chamou por um dos guardas, que apareceu em segundos, armado com uma cimitarra, esperando apenas pela ordem do Sheik. — Leve-a para o quarto e a prenda — disse, empurrando a jovem para o guarda, que a segurou pelos braços e a carregou pelo corredor escuro. Ela não lutou, apenas soluçou baixinho, deixando-se ser levada. Quando Said e Louise ficaram Sozinhos, a lady se pôs na frente de dele, que agora tinha o pequeno pedaço de vela na mão. — O que acontecerá a Aban? E Alisha? — perguntou ansiosa. O Sheik a segurou gentilmente pela mão e a fez caminhar ao seu lado, direto para a sala do trono. — Receberá seu castigo ao amanhecer, como manda a lei do reino. — Ao ver o olhar de assombro de Louise, Said completou: — Alisha também será castigada. — Não pode fazer isso — argumentou a lady, quase gritando. — Ela foi forçada a fazer tudo. — Ela mentiu, quando podia ter vindo a mim e pedido ajuda. — Como pode dizer algo assim? Alisha estava com medo, viu as pessoas que amava serem mortas! — rebateu Louise, nervosa. Said deixou a vela junto das outras, postas no chão, e encarou a mulher a sua frente. — As leis do reino foram impostas há muitos anos, antes de meu pai governar, e nunca, sequer uma única vez, foram desobedecidas. Não importa quão errado possa parecer a você, Louise, porque, de qualquer maneira, eu cumprirei com minha obrigação — e deu as costas a Louise, saindo da sala, deixando-a sozinha novamente. *** — Abra a porta — ela pediu, de cabeça erguida, ombros retos, mesma postura que tinha aprendido com o pai e que parecia ser uma característica de altivez da família. O guarda, muito mais alto e corpulento que ela, empunhando sua ameaçadora cimitarra em frente


ao corpo, mal se moveu, apenas franzindo a testa diante da ordem da lady. Louise suspirou, colocando as mãos na cintura, entrecerrando os olhos na direção do homem. Bem, ao menos era notável como seu medo, antes iminente, havia sido sobrepujado pela coragem. Já não temia aquele homem. — Preciso vê-la. Será rápido — insistiu. — Irei apenas trocar poucas palavras com ela. O homem desviou o olhar para a parede, ignorando-a. — Ora, saiba que está cometendo um erro! — ralhou ela, brava, apontando o dedo para o guarda. — Falarei com o Sheik e... — Deixe-a passar — a voz de Said surgiu no início do corredor escuro e, quando Louise virouse para vê-lo, ele já tinha partido. Contrariado, o guarda deu um passo para o lado, permitindo que a lady passasse. Ao entrar no quarto, Louise encontrou Alisha encolhida debaixo da janela, agarrada aos joelhos. Ao vê-la, a jovem filha do sultão pareceu ainda mais assustada. — Oh, por favor, senhorita... — choramingou em desespero. Ajoelhando-se ao lado dela, Louise procurou manter a calma. Said dava-lhe um voto de confiança ao permitir que estivesse ali e era óbvio que ela precisava fazer a coisa certa, obtendo mais informações sobre o plano de Aban, além de tentar ajudar Alisha, claro. — Ele me matará? — a jovem perguntou apavorada. — Eu não permitirei — garantiu Louise, pedindo aos céus, desesperadamente, que pudesse de fato cumprir essa promessa. — Eu o farei ver que Aban a usou e que não havia outra escolha. — Imploro que me ajude, senhorita. Tudo que desejo é voltar para o que restou do meu povo. Louise sentiu certo desconforto ao ouvir aquilo. Entendia a situação de Alisha e, mesmo não gostando da jovem no início, sabia o que era desejar voltar para o lugar ao qual pertencia. A porta foi aberta de repente, e o guarda apareceu com uma expressão nada amigável. Louise logo se pôs de pé, com um último olhar para Alisha. Viu a esperança no rosto da jovem, que, encolhida naquele canto, sem saber de seu destino, parecia-lhe ela própria. Ao deixar o quarto, a lady tinha ainda mais convicção de que precisava fazer algo. Sabia que não ficaria em paz vendo Alisha ser castigada impiedosamente. *** O Sheik desfez o laço que segurava sua calça e finalmente deixou que a peça caísse ao chão, dando-lhe a liberdade da nudez, algo que tanto apreciava. Com um suspiro cansado, deitou-se em sua cama, cobrindo-se com o fino lençol de linho bordado, que causava uma sensação interessante em seu corpo. Tentou relaxar os músculos enrijecidos e deleitou-se com a plenitude do silêncio do quarto. A claridade da lua banhava a cama e surtia o mesmo efeito de sempre, relaxando-o. Era tudo


de que precisava, sobretudo quando desejava livrar-se dos pensamentos a respeito de suas obrigações ao clarear do dia. Em momentos semelhantes àquele, Said sentia o peso de seu cargo. Recordava, com alguns detalhes, algumas poucas vezes em que o pai precisara tomar decisões como aquela, em que o falecido Sheik parecia contrariado, mas que, ainda assim, cumpria com as leis. Era uma das obrigações advindas do poder, dizia seu pai. Quanto a Said, já tivera que castigar outros homens outras vezes, mas nenhuma com a morte. E o faria agora, sem piedade alguma, como era necessário. Foi distraído por uma comoção do outro lado da porta e logo reconheceu a voz de Louise, que parecia um pouco alterada. Mal teve tempo de enrolar-se no lençol e sair da cama, quando a porta foi aberta, e a inglesa entrou furiosa, batendo os pés, com uma expressão de quem não desejava ser contrariada. — Tentei impedir que ela entrasse, mas a mulher é difícil de ser contida, senhor — explicou o guarda, envergonhado. Said sinalizou para que ele saísse e esperou até que a porta fosse fechada, para enfim dedicar sua atenção a Louise. — É realmente interessante a forma como me procura, gazela. Começo a acreditar que não consegue mais manter distância de mim — falou, ciente de que a estava provocando. Louise revirou os olhos e, tentando não perder-se na anatomia de Said, revelada pelo lençol preso em suas formas, caminhou pelo quarto. — Vim implorar por Alisha — disse simplesmente, sem oferecer qualquer dúvida ao Sheik. Said não se admirou ao ouvi-la dizer aquilo e até mesmo sorriu. Era apenas mais uma entre as grandes descobertas que estava fazendo sobre aquela mulher, que se revelava mais surpreendente a cada dia, mostrando-lhe sentimentos antes desconhecidos para ele. Quão nobre deve ser uma pessoa para implorar pela vida de outra? Ao que parecia, lady Louise era assim. — Não dirá nada? Deixará que eu fique aqui, sem ao menos ouvir sua voz? — ela perguntou, chamando sua atenção. Said prendeu o lençol em volta da cintura e foi até ela, sentindo de imediato a sensação estranha de estar tão próximo dela. — Por que insiste, gazela? Não percebe que seus pedidos são vagos diante das leis do meu reino? A força e a coragem de Louise quase se esvaiu, mas ela buscou em seu íntimo algo que ainda a fizesse acreditar. Era de se esperar que ele estivesse tão irredutível. Ela parou seu olhar no dele, azulado e intenso, como sempre parecendo uma tempestade diante dela.


— Não posso permitir que ela morra — disse, a voz se tornando fraca. Said colocou a ponta dos dedos sobre a bochecha dela e tocou a lágrima que desceu de seus olhos, tão límpidos e verdadeiros. — Por que se importa tanto, Louise? — perguntou ele, com o olhar fixo no dela, puxando-a novamente para aquela imensidão azul que quase a descontrolava. — Porque sei como é desejar voltar para o lugar a que se pertence — respondeu ela, desviando o olhar. Mas Said não permitiu, segurou seu rosto, para que ela continuasse fitando-o e secou suas lágrimas com o polegar, delicadamente. — É isso que pensa sobre estar aqui? — ele questionou, usando a outra mão para puxá-la para mais perto de seu corpo. — Nada mudou, Louise? Tudo mudou. — Você sabe que não é mais uma prisioneira em meu reino, gazela — Said sussurrou contra a pele de seu pescoço, satisfeito ao vê-la arrepiar-se. — Consegue ver isso, Louise? Abri as portas do meu palácio para você e ninguém mais. O infeliz usava de sedução para desviá-la do assunto! Louise era ciente disso. Mas admitia, embora relutantemente, que era impossível não se deixar ser despida por aquelas mão grandes e habilidosas, que retiravam sua túnica com uma lentidão enlouquecedora, enquanto a boca de Said encontrava seu ombro e serpenteava até seus seios. Ela não negaria que os beijos, tão quentes como brasa em sua pele, eram como o verdadeiro paraíso e nem seria ingrata negando que o desejava mais do que poderia ser descrito. Said, ao colocar Louise completamente nua sobre sua cama, finalmente conseguiu esquecer, por um momento, todas as suas obrigações. O prazer carnal, aliado àquele sentimento estranho, bastava para distraí-lo. — Tenho sede do teu corpo, Louise — disse entre beijos, que recorriam os seios dela, e leves mordidas nos mamilos, testando sua reação. — E não importa quem ouça seus gemidos, não poderá impedir-me de tê-la, porque você é completamente minha. Louise, por instinto, separou as pernas, mordendo o lábio ao sentir os lábios do Sheik, aproximando-se de suas coxas. As palavras dele serviam apenas para aumentar sua necessidade, sua excitação, que parecia estar a ponto de explodir. Desejava-o. E, como se já o tivesse feito outra dezena de vezes, conduziu-o até onde tanto desejava, entre suas pernas, soltando um gemido rouco ao senti-lo investir a língua contra sua carne. Ele a conduziu facilmente ao topo do prazer, arrancando-lhe gemidos e suspiros, fazendo-a


contorcer-se contra os lençóis até que ela entrasse em uma espiral cada vez maior e caísse novamente à Terra. — Said, por favor... — ela implorou outra vez, e agora era por ela mesma. — Preciso de você. O Sheik sorriu e dedicou-se a beijá-la novamente, porque nenhuma dose era suficiente para saciar aquela vontade de beijar tais lábios por toda a noite. — Gosto da forma dos seus seios — ele lambeu o mamilo turgido. — E como eles reagem ao meu toque. — Assoprou de leve, sorrindo ao vê-la ofegar. — Seus quadris são perfeitos para minhas mãos e se encaixam perfeitamente ao meu corpo. Vê? — Ele trilhava caminhos sinuosos pelas coxas dela, enquanto entrava devagar em seu corpo, prendendo a respiração ao estar por completo dentro dela. Louise encontrou-se agarrada a Said, com as pernas cruzadas em volta de seu quadril, os dedos cravando-se na pele dele, enquanto os movimentos dos dois corpos tornavam-se rápidos e desesperados. — Nunca será suficiente — murmurou o Sheik, encostando a testa na da lady, o que permitia apreciar sua boca, ao mesmo tempo em que a penetrava alucinadamente. — Necessito de mais de você, Said. — Você me tem, gazela — e com aquele pedido, Said a fez encontrar o ponto exato, em que seu corpo pareceu ser uma colmeia, todos os seus membros se tornando pesados, enquanto a mente alçava voo. O prazer era sublime. Ele veio logo depois, controlando-se para não gritar seu alívio, agarrado ao corpo suado de Louise, e endureceu-se dentro dela, até que as sensações se apaziguassem completamente. — Não planejei tal coisa — Louise disse pouco depois, com Said ainda sobre ela, dentro de seu corpo. Ele ergueu o rosto e a fitou preguiçosamente. — Serei sincero ao dizer que foi a primeira coisa que pensei quando entrou nesse quarto — confessou. Ela controlou a vontade de rir, mordendo o lábio. — Admira-me saber que o poderoso Sheik passe todo o tempo pensando em prazeres carnais — espetou Louise. Said saiu de dentro dela e se deitou ao lado, jogando o lençol sobre os dois. — Não todo o tempo, mas a maior parte dele — admitiu ele. — Ficaria surpresa se soubesse o que tenho planejado fazer com você, Louise. — Oh, eu realmente não desejo saber, por agora, meu príncipe. Aprecio uma surpresa. — Riu ela, virando-se para o Sheik.


Ele se aproximou e a beijou nos lábios, acolhendo-a nos braços em seguida. Louise aproveitou o contato, consciente de que estava ali, nua, nos braços do Sheik e sentindo-se feliz. — Há algo que desejo perguntar a você — sussurrou de repente, lembrando-se de algo e pensando que poderia aproveitar-se do momento. — Diga. — Por que todas aquelas mulheres, uma diferente a cada noite? Said não esperava por aquela pergunta, mas àquela altura não parecia difícil respondê-la. Em verdade, parecia conveniente até. — Porque, dessa forma, tendo uma a cada noite, não haveria nenhuma cobrança na manhã seguinte. A resposta não pareceu convencê-la, então ele continuou: — Para explicar melhor, precisarei contar sobre o passado. — Suspirou, rodeando o quadril de Louise. — Estive casado por poucos anos, gazela. May era linda, filha de um sultão ao norte. Foi um casamento planejado desde que éramos pequenos e, quando assumi o reino, sabia que era o momento de tê-la ao meu lado. Um Sheik precisa de uma mulher ao seu lado para apoiá-lo e eu acreditava nisso. May parecia feliz nos primeiros meses no palácio, mas, com o passar do tempo, começou a ficar aborrecida. Louise estava concentrada no que ele dizia, e sua expressão de choque revelava muito do que certamente passava em sua cabeça. — Tentei ser melhor para ela, estando mais próximo. Os meses passavam e meu desejo de ter um filho não se realizava. May nada dizia, apenas chorava e se tornava cada vez mais distante. Um dia tive que fazer uma viagem de alguns dias e acabei voltando antes da data combinada. — Said olhou sobre o ombro de Louise, envergonhado. — May não estava no palácio. A lady sentiu um golpe no peito, assustada pela revelação. — O que houve? — murmurou ela. — Procurei por ela, por Aláh, procurei em cada canto desse palácio, e depois percorri o deserto. — Seu olhar ficou duro. — Depois de algum tempo, encontrei um acampamento pequeno, há vários dias de viagem. Estava destruído, os animais estavam mortos. Havia vários corpos na areia e, em uma das tendas, encontrei May. Ela havia fugido com um mercador do acampamento do meu próprio reino. A caravana em que estavam fora atacada por salteadores do deserto. Louise engoliu o nó que se formou em sua garganta e continuou ouvindo o que ele dizia. — Eu senti raiva por ela ter partido, por ter ido com ele. Mas fiquei desesperado ao vê-la morta. Eu a amava — confessou Said. — Levei seu corpo de volta ao sultão e voltei ao palácio. — Eu sinto...


— Depois disso fiquei muito tempo sem conseguir olhar para qualquer mulher, até mesmo as escravas me repugnavam — interrompeu ele. — Mas eu sou homem, tinha necessidades, e elas precisavam ser atendidas. — E a cada noite uma mulher — completou Louise, nauseada pela história. — Era tão fácil. Eu a tinha durante a noite e, pela manhã, mandava embora, normalmente, casando-a com algum bom homem ou a recompensando. Parecia-me correto. — Como pode dizer isso? — perguntou a lady. — Todas vinham até mim de boa vontade, Louise. Nunca as obriguei. Com o tempo, muitas apareciam no palácio, algumas de outros acampamentos. Eu obtinha o que desejava e, em troca, elas eram beneficiadas — disse por fim. Para Louise tudo aquilo ainda era errado. — Por que as mulheres não me disseram que você foi casado? — Esse é um assunto proibido no palácio — respondeu ele. Ela assentiu, pensando que o assunto fazia mal a ele. — Você parece assustada. Louise respirou fundo. — Ouvi que você não se deitava com virgens. — Você foi a primeira, Louise — confidenciou Said. — May me contou, antes do casamento, que havia sido violada e implorou para que não a abandonasse. Não me importei e a aceitei mesmo assim, contrariando as tradições. Sentando-se na cama, agarrada ao lençol, Louise penteou os cabelos, enquanto tentava processar toda aquela informação. Era como se tivesse acabado de conhecer um novo Said, completamente estranho ao que conhecera antes. E estranhamente todas aquelas revelações, saber de uma falecida esposa ou de outras mulheres, não anulava em nada o sentimento que nutria por aquele homem. Talvez aquele momento servisse somente para aumentar o que sentia por ele, porque aquilo era confidência, era confiança. — Por que parece querer me perguntar algo? — brincou Said, cruzando os braços atrás da cabeça. Bem, porque ela queria perguntar mais coisas. Porém, por aquela noite, bastava apenas uma questão. — Por que não me mandou embora na manhã seguinte como fez com todas as outras? Silêncio. De costas, Louise esperou pela resposta, ansiosa por descobrir finalmente a verdade. Mas parecia que para ele não era assim tão importante, já que não respondia.


Ela virou-se para Said e bufou, frustrada ao encontrá-lo adormecido. Irritada e cansada, Louise se deitou na cama e tentou dormir também, sabendo que seria uma tarefa difícil.



Capítulo Vinte e Cinco Naquela manhã ao acordar, Louise deparou-se com a cama vazia, Said não estava do seu lado, o que não a surpreendeu. Já esperava não vê-lo ali, principalmente quando sabia que ele tinha algo muito importante para resolver. A execução de Aban. A lady arrepiou-se ao pensar na cena e tentou repudiar o sentimento de angústia que a dominou. Sabia que, apesar de não aceitar as leis do reino, que incluíam, nos casos mais graves, a morte no deserto, não poderia simplesmente ficar contra Said. Na realidade, faria ao contrário. Aquele era o momento em que o apoiaria e faria isso porque compreendia o quanto o Sheik também era reticente a tal medida. Por um momento recordou as palavras de Said na noite anterior. Elas serviam somente para comprovar o que vinha pensando nos últimos dias sobre ele; havia algo diferente com o Sheik. Já não o reconhecia em certos momentos. Seus sorrisos, antes tão raros, eram agora mais frequentes, e seu humor intempestivo mostrava-se menos acentuado diante de coisas que antes o irritavam terrivelmente. Louise, porém, temia que tudo fosse apenas algo originado nela, em sua mente, que nada daquilo em que estava disposta acreditar fosse verdade. Talvez suas emoções estivessem influenciando seu modo de pensar. Ora, ela, uma mulher convicta de seus pensamentos e ações, viase perdida em relação a simples sentimentos! Oh, podia imaginar o assombro de seu pai ao vê-la em tal situação! — Senhorita, perdoe-me, mas meu senhor mandou vê-la — era a voz de Karida, do outro lado da porta, soando junto de pequenas batidas. Com rapidez, Louise vestiu a túnica, jogada ao chão durante a noite, pela pressa do desejo, e correu até a porta, encontrando a serva com uma bandeja cheia de comida nas mãos. Permitiu que ela entrasse, esperou até que a cama fosse arrumada, para enfim fartar-se com as porções de pastas e pão, acompanhado de Cahue, enquanto Karida lhe contava, com entusiasmo, sobre o anúncio da gravidez de uma jovem recém-casada no acampamento. — Parece-me não muito bem esta manhã, senhorita — atentou a serva, ao ver o olhar distraído de Louise. Suspirando, a lady bebeu mais um pouco do café amargo e olhou para Karida, refletindo se deveria ou não contar suas aflições à mulher. — Estou preocupada com Alisha. Temo que o Sheik possa matá-la — contou, devolvendo um pedaço de pão à bandeja. Karida não respondeu de imediato, e a lady não compreendeu se seu silêncio era a confirmação de seus temores ou apenas o medo das palavras.


— Meu senhor é um homem bom e justo. Tudo que ele faz é por nosso povo, senhorita, e, quanto a nós, retribuímos aceitando suas decisões. — Levantando-se, a serva caminhou para a saída. — Demonstre sua confiança nele, senhorita. Louise foi deixada sozinha outra vez, apenas com as palavras de Karida martelando em sua mente, tornando-a ainda mais confusa. *** A areia estava mais quente naquele dia. Ao menos assim pareceu a Said, enquanto caminhava pelo deserto, orientando seu dromedário em meio às rajadas de vento, que pouco lhe permitiam caminhar sem tropeçar. Tentava proteger o rosto com o lenço, mas a tempestade era forte o bastante para cegá-lo. Sentia a boca terrivelmente seca, mas sabia que não poderia dar-se ao luxo de parar para saciar a sede, ou seria ainda mais difícil conseguir chegar ao palácio antes de o sol se pôr. Tinha por experiência a noção de que qualquer minuto que perdesse o faria permanecer à noite no deserto, e ele não estava minimamente preparado para isso. Saíra ao nascer do sol, junto de quatro guardas que o ajudaram a levar Aban longe o suficiente do palácio para que pudesse acontecer sua execução. O Sheik não se agradava da tarefa que incumbira a si mesmo naquela manhã, mas o fato era que não podia fugir de suas obrigações. E, na realidade, fora mais terrível do que tinha suposto. A cena do homem, de joelhos em sua frente, e a expressão em seus olhos enquanto a vida esvaiase lentamente por obra das mãos do Sheik, atormentava-o e, em seu íntimo, Said faria de tudo para esquecê-la. Não fora a primeira vez que matara um homem, mas este, à diferença dos outros, não era um oponente em combate. Havia matado para defender-se, para proteger seu povo, para salvar Louise. E agora matara para punir. Naquele momento, preso em meio a uma tempestade de areia, ainda longe de seu palácio e sozinho em meio ao deserto, era estranho como a única coisa que conseguia fazê-lo sentir-se um pouco melhor era imaginar que, ao regressar, teria Louise novamente. Exausto, Said tropeçou, caindo de joelhos na areia quente. Agora via que fora um erro ordenar que seus guardas retornassem para o palácio antes dele, mesmo tentando evitar que eles o vissem cumprir sua obrigação. Ciente de que, se cedesse completamente ao cansaço, seria seu fim, Said atou a fita de couro do dromedário em seu pulso e garantiu que estava firme o suficiente. O animal, por instinto, saberia regressar ao palácio e sobreviveria à tempestade, mesmo que ela durasse vários dias. Com o vento arrastando a areia e movendo as dunas, uma viagem de algumas horas poderia facilmente alargar-se para uma noite. Além disso, não seria de admirar que alguém pouco experiente se perdesse em pleno deserto, à mercê da morte, o que felizmente não era seu caso. Nunca deixe que o deserto engane você, Said. Se fraquejar, ele não terá piedade.


As antigas palavras de seu pai, ao lhe contar sobre suas viagens ao norte, vinham em suas recordações, parecendo, a seu ver, tão mórbidas dado o momento. Said forçou os joelhos e ficou de pé, certo de que não morreria ali. Continuou caminhando, arrastando os pés sobre a areia, usando a palma da mão para bloquear o vento e tentar enxergar algo a sua frente, o que se mostrava cada vez mais difícil. Mentalmente implorou a Aláh que o guiasse e lhe suprisse de forças para continuar. *** Louise estava angustiada. Passara o dia esperando por Said, ansiosa para encontrá-lo. No meio do dia os guardas haviam voltado, dizendo que o Sheik os mandara de volta e que ele regressaria sozinho em breve. Mas, quando a tempestade se anunciou no horizonte, aproximando-se do reino, a lady viu-se desesperada, sabendo que Said estava lá fora, sozinho. Temia por ele. Já era noite, e ela não queria admitir a si mesma que o Sheik teria que permanecer no deserto, esperando o dia amanhecer. Sabia que ele não estava preparado para enfrentar o frio da noite e nem mesmo tinha água ou comida para sustentar-se tanto tempo. Todos no palácio estavam apreensivos. Ninguém poderia fazer nada a não ser aguardar o dia amanhecer, para enfim procurá-lo. Mesmo sabendo da experiência e coragem do Sheik, poucos acreditavam que ele chegaria sem danos ao palácio. Louise passara a maior parte do dia ao lado de Karida, na cozinha. Tentara em duas ocasiões visitar Alisha, mas o guarda fez que não a ouviu, e ela decidiu não questioná-lo. — Precisa descansar. — Era Najila, que entrara em seu quarto sem avisar. Louise, que estava em frente à janela, fitando com desespero a noite estrelada, mal se moveu. Não tinha intenção de deitar-se até ter a certeza de que Said estava bem. — Ele é forte, senhorita. Pela manhã estará aqui — garantiu Najila, mas as palavras se perderam no silêncio do quarto. A lady fechou os olhos e sentiu a brisa fria em seu rosto, pedindo aos céus por apenas mais uma chance a Said. A ela. Podia imaginá-lo tão sozinho na noite, e tal imagem a torturava. Não agora que estavam tão bem. Não agora que sabia que o amava. — O Sheik voltará. — Ouviu sua própria voz soando forte e decidida, segura. — Diga a todos para irem para seus quartos, Najila. Todos devem descansar. — Sim, senhorita. De olhos arregalados, a mulher correu para cumprir a ordem, sem questioná-la. Pouco depois Louise já conseguia ouvir o burburinho dos servos correndo de um lado para o outro nos corredores e supôs que estavam fazendo o que ela sugerira. Isso a tranquilizou um pouco. O lugar precisava de


ordem. Era assim que o Sheik gostava. — Volte para mim, meu amor — sussurrou em um último apelo à noite. Deu as costas à janela e rumou para o corredor, decidida a ir até o jardim do palácio, onde acreditava que poderia ter um pouco de tranquilidade. Enquanto percorria o corredor, viu uma figura trôpega caminhando em sua direção e ergueu a vela que carregava para enxergar melhor. — Said? — chamou, abrindo bem os olhos. — Said, é você? — Ela correu até o Sheik e o segurou pela túnica, certificando-se de que ele era real. — Eu precisava vê-la, ainda essa noite, gazela. — Um sorriso apareceu no rosto do Sheik, que, mesmo cansado e machucado pela areia, não deixava transparecer sua fraqueza. Louise não conteve as lágrimas e logo se pôs a ajudá-lo a chegar até o quarto. *** —Temi por você — confessou ela durante a madrugada. Os dois dormiam nos braços um do outro, depois de Said ser gentilmente banhado por Louise, que o fez entrar na banheira de cobre, mesmo sob protestos. Ela usou um óleo para refrescar as feridas causadas pelo vento e o fez deitar na cama, mas ele negou-se a dormir, apenas a abraçando em silêncio. — Eu não poderia deixá-la. Não agora que a tenho — disse ele, beijando-a no ombro. Ela tinha o corpo relaxado, aquecido ao contato dele e desejava mais que tudo permanecer daquela forma pela eternidade. — O que fará com Alisha? — perguntou Louise, sabendo que era um ponto no qual precisava tocar. Said respirou fundo, mas se propôs a responder. — Eu a mandarei de volta para seu reino. — Sua voz parecia tão cansada, e a forma como ele a tocava demonstrava seu receio em continuar. — Não quero mais mortes. Louise não perguntou mais nada. Sentia que ele não estava disposto a continuar falando. — Em alguns dias, quero que viaje comigo, Louise. Eu a levarei a um lugar. — Devo temer? — perguntou ela, receosa. Sentiu a barba do Sheik roçando em sua pele, causando-lhe arrepios deliciosos, e as mãos passeando em sua barriga. — Nunca me tema, gazela. Não mais — pediu ele, beijando seu pescoço.



Capítulo Vinte e Seis Louise sorriu ao ver Alisha ser conduzida até onde estava e não hesitou em envolver a jovem em um abraço carinhoso quando ficaram frente a frente. Ao lado das duas, estava Said, que, mesmo tentando manter-se sério, estava visivelmente mais relaxado. — Que Aláh a cubra com coisas boas, senhorita. Sempre serei grata por ter salvado minha vida — disse a jovem, segurando as mãos da lady nas suas, fitando-a com os olhos marejados. Louise sorriu, recebendo um olhar de Said por sobre os ombros de Alisha. Sabia que a jovem só havia sido poupada por suas súplicas ao Sheik e, ao que parecia, deveria ser grata a ele por muito tempo. Aos outros que seguiam Aban, fora dada a liberdade, para que seguissem para onde desejassem. — Prometa-me que mandará notícias — pediu realmente preocupada com o futuro de Alisha. Com um reino destruído e poucas pessoas para auxiliarem-na, seria difícil recomeçar. Said havia sido compreensivo ao permitir que as outras famílias da caravana, inclusive a mulher de Aban, seguissem com ela. Alisha concordou, dirigindo-se então para o Sheik, que não demonstrou qualquer reação ao tê-la em sua frente. Louise queria poder sussurrar a ele, para que fosse no mínimo educado com a jovem. — Agradeço por sua misericórdia, meu príncipe. Honrarei a chance que meu deu. — Alisha estava de cabeça baixa, mas Said conseguia notar quão nervosa se encontrava, torcendo as mãos no tecido das vestes. — Reconstrua o que lhe pertence, Alisha. Certamente haverá alguém esperando por você. Meu reino estará disponível para ajudá-la, se assim desejar — Said falou, retirando do bolso da calça um pequeno saco de couro, que depositou nas mãos da jovem. — Siga junto ao caminho de Aláh, Alisha. Sem palavras, ela o viu deixar a sala em que estavam e, por um momento, encarou o objeto em suas mãos, não conseguindo acreditar realmente em tudo aquilo. Virou-se para Louise, mas não foi preciso dizer nada. A lady apenas caminhou ao seu lado, até a parte externa do palácio, onde uma pequena caravana com três guardas aguardava para partir. Louise a ajudou a chegar até o dromedário e a sentar-se, entregando-lhe em seguida a pequena bolsa com os poucos pertences que tinha. Com um grito de ordem de um dos guardas, os animais se puserem a caminhar entre as tendas do acampamento, em direção à saída. A lady, de braços cruzados, esperou até que a caravana ultrapassasse os domínios do reino, para então voltar ao palácio, não sem antes desejar novamente sorte a Alisha, mesmo que esta não pudesse ouvi-la agora. *** Apoiado no outro extremo da sala, Said viu Louise seguir até ele, com um sorriso discreto nos lábios, revelando abertamente seu estado de espírito. Podia ver nos olhos dela o quanto estava feliz.


Ao tê-la perto, ele avançou alguns passos e a envolveu pela cintura, enquanto deleitava-se a inalar o doce perfume de seus cabelos. Louise circulou o pescoço dele com os braços e apertou-se contra o peito forte, sentindo o calor agradável contra seus seios. — Devo estranhar o modo como me trata? — perguntou ele, irônico, no ouvido dela. Louise riu, soltando-se dele. — Obrigada — agradeceu emocionada. — Por confiar em meu julgamento e permitir que Alisha regressasse para seu reino. O Sheik apanhou a mão da lady e elegantemente levou aos lábios, beijando-a demoradamente. — É um prazer — brincou, sorrindo para ela no final. Corada, Louise desviou o olhar. Era incrível como, em certos momentos, Said ainda conseguia deixá-la constrangida. — Sinto-me mais tranquila ao saber que ajudará Alisha a reconstruir o que foi perdido — disse, olhando para as palmas das mãos. — Ela já perdeu muito, gazela. Será preciso tempo e esforço para que as coisas voltem a ser como antes e, talvez, ainda assim, não seja a mesma coisa. Mas não posso negar ajuda a uma jovem como ela, não poderia ser tão cruel assim — respondeu Said, perscrutando Louise com o olhar. — Você não é cruel, Said — refutou ela, segurando-o pelo braço, para que prestasse atenção no que dizia. — No começo eu acreditava que sim e até mesmo o temi. Porém, agora, só consigo ver bondade em você. Não sei quando aconteceu, mas aconteceu, e eu consegui perceber que vive para seu povo, Said, e que muitas vezes se sacrifica por eles, mesmo que isso o destrua por dentro. O Sheik a encarou por um tempo, e a inglesa esperou pela resposta, mas não precisou de nenhuma palavra para compreender aquele olhar tão intenso perdido nos seus; não havia nada que ele pudesse dizer a ela, e Louise sabia, por isso apenas se colocou nas pontas dos pés e o abraçou com força, satisfeita mesmo não sendo correspondida. Sorriu da mesma forma, sabendo que havia conseguido deixar o poderoso Sheik sem palavras. *** — Está muito bela, senhorita — Najila elogiou, batendo palmas, eufórica diante de Louise. A lady sorriu, dando uma pequena volta para mostrar o novo traje que lhe fora enviado por Said, com as ordens de que usasse naquela manhã para vê-lo. O vestido era de cor cobre, com um caimento muito simples e sem muitas transparências, mas a deixava muito elegante, combinando com o colar de gemas escuras que usava junto. Louise encontrava-se novamente ansiosa, porque, depois da partida de Alisha, há cinco dias, Said pouco se dedicara a ela, informando-lhe apenas que resolveria os problemas que restaram no acampamento depois da morte de Aban. Ela compreendeu e usou o momento para voltar à sua rotina


do palácio, que agora se tornava cada vez mais importante para ela. Todos os dias, acordava com a alegria de saber que agora era livre naquele lugar e também era importante. As mulheres muitas vezes a procuravam buscando ajuda para resolver alguma situação complicada, porque a lady era ali conhecida por seus excelentes planos — menos quando se tratava de alguma fuga, obviamente. Na noite anterior, Najila entrara em seu quarto com o belo vestido embrulhado em seda e um recado do Sheik, que lhe ordenava que o encontrasse pela manhã em sua câmara real para uma conversa importante. E era imprescindível que a lady usasse o vestido. — Precisa ir, senhorita. Ele a espera — sussurrou Najila, enquanto conferia, pela última vez, os botões nas costas do vestido da lady. Louise assentiu, calçando as sapatilhas e se dirigindo à porta do quarto, pronta para encontrar o Sheik. Caminhou tranquilamente pelos corredores do palácio, sorrindo ao encontrar alguma serva ou até mesmo algum dos guarda, que agora não mais a encaravam com aquela expressão assassina. Cumprimentou discretamente os dois homens na entrada da câmara real e entrou, deparando-se com Said sentado em seu trono. Para sua surpresa, não era o Sheik de Hamed que estava ali, era apenas Said, usando calças simples e uma camisa de tecido claro. Não levava seu turbante nem os anéis pesados que costumava usar. Ao vê-la, ele levantou e desceu lentamente os degraus de mármore, parando em sua frente, com uma expressão de contemplação. — Exatamente como em minha mente — murmurou ele, espreitando-a de cima a baixo com um olhar faminto. Louise queria poder ter dito que ele também estava bonito e que nem em sua mente o teria imaginado daquela forma. Mas sequer teve a oportunidade de dizer algo quando ele, de repente, mudou a expressão. — Mas está atrasada. A lady resistiu à vontade de revirar os olhos diante da provocação e decidiu manter-se no jogo dele. — Perdoe-me, mas infelizmente não consegui acordar antes que o sol estivesse tão alto. — Sorriu, esperando que ele rebatesse. — Tenho certeza de que não fez somente para me desagradar, Louise — disse Said, ao passar por ela e ir em direção aos guardas, onde pareceu proferir algumas ordens. Os homens deixaram a sala com pressa, e o Sheik voltou até Louise, dessa vez ainda mais perto, quase a tocando. — Lembra-se que eu lhe pedi que fosse comigo até certo lugar? — perguntou ele, observando-a assentir. — Esse dia chegou, Louise. É necessário que me acompanhe, agora.


Sentindo a boca seca, a lady olhou para ele, procurando entender se o que estava prestes a acontecer era algo bom ou ruim. — Dirá para onde iremos? — ela perguntou nervosa, com o coração acelerado, quase subindo à garganta. Não havia garantia alguma de que ele não a estava levando para outro acampamento, onde a entregaria a algum homem, como antes prometera. Como ela poderia confiar, apesar de tudo? Um sorriso diferente de todos os outros surgiu nos lábios de Said, e ele indicou a porta, oferecendo a mão a ela, para que o seguisse. — Nossa montaria já está pronta — comentou enquanto caminhavam para fora do palácio, Louise ao seu lado, em silêncio. Ela não se surpreendeu ao ver o grande animal em frente ao palácio, carregado com várias bolsas de pele, o que a fez pensar que viajariam por alguns dias. Os guardas fizeram o dromedário abaixar-se, e Said ajudou Louise a se sentar, para em seguida fazer o mesmo, segurando-a pela cintura enquanto o animal erguia-se novamente. Com um grito em árabe o guarda incitou o dromedário a seguir rapidamente pelo caminho para fora do acampamento. *** — Está muito silenciosa — Said atentou, movendo as mãos pelo quadril de Louise, esperando vê-la acordada. Viajavam há algumas horas, todas em completo silêncio. Said até se preocupara com o bem-estar de Louise, imaginando que o sol estivesse lhe fazendo mal, e então lhe oferecera um véu para proteger seu rosto do sol e uma bolsa com água, que ela aceitou prontamente. — Não saber para aonde estou sendo levada me deixa nervosa. — Está com medo? — ele perguntou achando cômica a situação. Louise moveu os ombros, feliz por ele não poder ver seu rosto. — Estou ansiosa. E um pouco cansada. Dromedários não são muito confortáveis, ainda mais em viagens longas — comentou, suspirando. — Podemos parar se deseja descansar — ofereceu Said, preocupado. A lady respondeu inclinando-se para trás, acomodando-se no peito do Sheik, que a envolveu pela cintura, tentando deixá-la mais confortável. — Seja aonde for que esteja me levando, desejo chegar logo. Estou começando a acreditar que está tentando me castigar por minha desobediência, levando-me para o meio do deserto nesse animal estranho. Já percebeu como eles cheiram mal? — murmurou ela, erguendo os olhos para o rosto dele, que também usava um lenço para se proteger do sol e da areia. — Talvez eu devesse incluir uma rotina de banhos para eles? — Said perguntou rindo.


— Fico feliz em saber que acha engraçado o que estou dizendo. Mas é a verdade — ressaltou ela, bem-humorada. Mesmo sacolejando sobre aquele animal e sofrendo pelo calor, Louise conseguia encontrar um único motivo para não estar totalmente desesperada; tinha Said ali, com ela, o que a fazia lembrar-se de quando ele a salvara, tempos atrás, e de como havia achado confortável apoiarse naquele corpo forte. — Será que eu posso ao menos saber se estamos perto do nosso destino? — Sua ansiedade ainda trará problemas para você, gazela. Por que não descansa? Irritada, Louise se acomodou melhor no peito de Said, sentindo o quadril latejar pelos movimentos do animal, e se viu pensativa a respeito do que o Sheik planejava, levando-a cada vez mais para longe. *** — Chegamos — Said falou, apontando para frente. Lady Louise apertou os olhos e fitou a areia em sua frente. Não havia nada ali. Said estava se divertindo à custa dela? — Não há nada! — exclamou ela, indicando as dunas de areia. Virou-se para Said e o enfrentou com um olhar feroz. — Trouxe-me aqui para rir de mim? O Sheik negou, segurando a mão dela, obrigando-a a ouvi-lo. — Aqui está o motivo de eu tê-la trazido até aqui, Louise. Olhe bem para isso e veja o que tanto desejou encontrar. — Ainda com a mão dela na sua, Said incitou o animal a continuar caminhando, agora mais lentamente. — Era preciso que visse com seus próprios olhos, para enfim saber a verdade. Louise começou a processar o que ele estava dizendo, tentando entender ao que ele se referia quando falava da areia. Não havia nada naquele lugar, nada que pudesse ser visto. A menos que... Assustada, a lady agarrou a mão de Said, quase caindo da montaria. — Al-Delíh? — perguntou em voz baixa. — Você deixou tudo que amava para trás por isso, Louise. Quantas vezes ansiou por esse momento? — Said a sustentava pela cintura, enquanto falava calmamente, próximo ao seu ouvido. — Agora está bem em sua frente. — O que está dizendo? Não vejo nada! — gritou ela, afastando-se dele. — Quando eu era jovem, meu pai me contou sobre a lenda da cidade perdida de Al-Delíh, que desapareceu, junto de seu povo, quando a água e a comida se extinguiram de repente. As areias cobriram o reino, enterrando tudo o que antes fora habitado, levando para o esquecimento o que antes havia ali. A lenda foi sendo contada por gerações, que acreditaram que Aláh lançou um castigo sobre aquele reino, dizimando todos os infiéis — o Sheik contou, explicando os detalhes. — Muitos arqueólogos ingleses viajaram para cá em busca de respostas e juravam saber a


localização exata do reino. Isso não pode estar certo, meu pai estudou a lenda por muitos anos e só consegui viajar para cá quando descobri a teoria dele sobre a localização. Meu grupo e eu, nós estávamos no lugar certo, eu sei disso — disse ela, convicta. Said respirou fundo, sabendo que não seria fácil convencê-la da realidade. — O que encontrou em sua escavação que a faz ter certeza de que está certa? — perguntou ele. Louise pensou por um momento. — Nós apenas havíamos começado. Will supunha que estávamos perto de encontrar algo importante. Ele tinha experiência e estava confiante a respeito das descobertas — explicou ela, ansiosa. Nos dias que passaram no acampamento, nada relevante fora encontrado, nenhum objeto que comprovasse suas teorias. — Preciso que entenda isto, gazela — O Sheik fez o animal parar e, com um malabarismo preciso, posicionou Louise de frente para ele, sentada escarranchada em seu colo. Tocou-a no rosto, para que ela o olhasse nos olhos. — É apenas uma lenda. Poderá passar toda sua vida procurando por esse reino em cada canto do deserto e nada encontrará. — Não... Eu tenho certeza... — Ouça-me — interrompeu-a, gentilmente, segurando seu queixo. — Não posso permitir que continue buscando por algo que não existe. Não agora que a tenho ao meu lado. Preciso que compreenda isso, gazela. Louise fungou, secando as lágrimas quentes que escorriam por suas bochechas. Não! Não queria acreditar que Said estivesse certo. Tivera certeza de que estava certa, dedicara anos de estudo àquela causa, insistira para que os amigos a seguissem naquela expedição. — Eu não consigo acreditar... Como pode ter certeza de que não é real? — desafiou ela, erguendo o queixo, retirando a mão dele. — Porque todos que aqui vivem conhecem essa história como apenas uma lenda para amedrontar infiéis que desrespeitam as leis de Aláh. Os estrangeiros foram atraídos para cá com promessa de tesouros perdidos e aventuras — explicou ele. Louise fechou os olhos, em negação. — Por que não me contou antes? — perguntou em um sussurro. — No começo eu não me importava o suficiente para lhe dizer tal coisa. Mas, agora que tudo mudou, não posso deixá-la à mercê de algo irreal. A lady abriu os olhos e fitou com desgosto o deserto ao redor, sentindo-se enganada. Tinha viajado para aquele lugar por nada. Provavelmente voltaria para a Inglaterra frustrada se não tivesse acontecido o ataque. Ah... E agora se sentia mais culpada do que nunca por conduzir aqueles homens


diretamente para a morte. Sentia ódio de si mesma, raiva por acreditar e ter seguido algo que... simplesmente nunca existiu. Até mesmo seu pai estava errado. — Podemos voltar ao palácio? Não quero mais ter que ficar aqui — pediu, dando-se por vencida, ao abraçar Said, enterrando o rosto em seu peito. — Não chegaremos a tempo ao palácio, mas há outro lugar em que desejo levá-la — o Sheik falou, direcionando o dromedário na outra direção. *** O sol já tocava as dunas de areia no horizonte quando Louise avistou o que achou ser uma miragem causada pelo calor e pelo cansaço em sua mente. Apertou os olhos e tentou identificar as formas das árvores, de copas altas, a vegetação que cobria o chão de areia e, absurdamente, ao centro, notou uma lagoa de um azul cristalino. — Isso é...? — Um oásis, gazela — Said disse, com ela apoiada em seus braços. — Mostrarei a você algo em que acreditar, algo real, bem diante de seus olhos.



Capítulo Vinte e Sete Lady Louise sentia-se como se um pedaço de seu coração lhe fora arrancado. Acreditar a maior parte da vida em algo com tamanha força, algo capaz de conduzi-la para longe de seu país rumo a uma terra desconhecida, para que depois descobrisse que tudo não passava de uma lenda era, com certeza, um golpe irreparável. Ela havia arriscado a própria vida e a de seus amigos à toa. Além disso, saber que seu pai, o maior arqueólogo da Inglaterra, estava enganado também a incomodava fortemente. Na verdade, a inglesa queria acreditar que Said estava errado, ou que tinha mentido, um de seus jogos para desestabilizá-la. Porém, mesmo com o desejo de que fosse tudo uma grande mentira, a lady sentia que ele dizia a verdade. Não hesitou em acreditar em sua palavra, talvez porque, no fundo, em alguma parte desconhecida de seu coração e àquela altura, já soubesse que tudo poderia ser apenas uma lenda. Na verdade, tudo que seu pai e os outros arqueólogos sabiam não passava de teoria, já que jamais qualquer prova fora encontrada. E ela sabia, ao aventurar-se para aquela terra, que estava se arriscando em nome do que acreditava. Ela olhou para o rosto de Said, que a ajudava a descer do dromedário. Será que ele seria realmente capaz de mentir-lhe? Ou, talvez... Oh, Senhor, estava ficando desnorteada com tantos pensamentos. — Passaremos a noite aqui — informou Said, retirando as bolsas do lombo do animal. Em silêncio, Louise desceu a duna de areia até chegar ao lago no centro do oásis. A sombra das tamareiras deixava o lugar mais fresco. Os arbustos e as gramíneas formavam um tapete esverdeado, que contrastava com o tom amarelado do deserto. Enquanto Said cuidava do dromedário, ela decidiu molhar os pés na água, surpreendendo-se ao encontrá-la fresca. Apesar de muito ouvir falar sobre os oásis, nada a preparara para o que tinha encontrado ali. Retirou o lenço que cobria o rosto e o deixou de lado. Em seguida umedeceu as mãos na água, passando pelo rosto e o pescoço, sentindo a maravilhosa sensação de refresco em sua pele. Precisou dar um nó na ponta do vestido, prendendo-o à cintura para que não o molhasse. O sol já se punha por entre as dunas, e o ar começava a tornar-se menos quente, mais agradável. Como sempre fazia desde que chegara naquela terra, Louise contemplou o pôr-do-sol tão mágico, o sol escondendo-se lentamente, dando lugar à noite, e as estrelas, que faziam o céu parecer um tapete como os que as mulheres do palácio bordavam com fios de ouro. Louise levou a mão ao peito, sentindo-o doer. Fez o possível para não chorar, ciente de que não poderia, não agora. A realidade tornava as coisas difíceis, porque era triste descobrir que o grande propósito de sua vida fora uma grande mentira. Ela recordou as noites em que passara no quarto, trancada, sob a luz das velas, fazendo suas anotações, planejando a rota para chegar até à


Arábia e lendo escondida os manuscritos do pai; dos disfarces e mentiras que teve que criar para esgueirar-se nas reuniões da Sociedade de Arqueologia da Inglaterra, muitas vezes dizendo ao pai que estava em algum evento social. Mas o que mais lhe incutia a culpa era lembrar-se do dia em que deixara sua casa, sem informar o pai sobre sua partida. Sim, Louise cometeu a ousadia de simplesmente fugir, alegando que estaria apenas indo até a casa de uma amiga. Quão cruel isso era? Para ela, naquele momento, parecera o correto, já que tinha certeza de que regressaria com a tão sonhada prova da descoberta da cidade perdida. Mas tinha falhado miseravelmente. De todas as formas possíveis. — Logo começará a ficar frio — o Sheik disse, aparecendo ao lado dela, tirando-a dos devaneios. A lady, de cabeça baixa, assentiu, seguindo de volta para a parte de cima do oásis, onde Said havia montado uma simples tenda e preparado o que logo se tornaria uma fogueira. Atrás dela, ele não se moveu, preocupado com sua estranha atitude. — O que acha de se banhar comigo? — perguntou ele. Louise parou de caminhar e o encarou com a testa franzida. Ele queria que os dois entrassem no lago? — Não posso molhar meu vestido — alegou ela, sabendo que não seria uma boa ideia ficar com a roupa molhada durante a noite fria. Said sorriu, olhando para o corpo dela, daquela maneira que a fazia ficar corada, porque sabia o que ele estava pensando. — Pensei que talvez você pudesse ficar sem ele — sugeriu, parando o olhar nos seios de Louise. Ela olhou para o próprio corpo e depois para a água, tentada a aceitar a proposta. Os dois estavam sozinhos ali e, certamente, ninguém os veria. — Está tentando me ver nua, meu príncipe? — perguntou, sentindo-se mais à vontade, ciente de que, apenas por ela, ele gostava de ser chamado daquela forma. O Sheik insinuou-se rapidamente até ela, evitando tocá-la, mas ficando o mais perto possível. — Na verdade, estou preocupado com sua saúde, gazela. Não quero que fique doente por dormir com a roupa molhada. — Com a expressão séria, sem desviar o olhar do dela, ele enroscou o dedo no decote do vestido e o puxou para baixo, revelando os seios, os mamilos turgidos. Sem perder tempo, desceu a boca até eles, mordendo-os de leve, arrancando um gemido dos lábios de Louise. — Sabe por que escolhi esse vestido para você? — Ela fez que não e o Sheik explicou. — Porque eu sabia que poderia ver a forma dos seus seios e, se tivesse sorte, seus mamilos rosados. Sabe o quanto gosto de tê-los em minha boca, Louise? Antes que a lady pudesse responder, Said a segurou pela cintura e voltou a estimulá-la com a


língua em seus mamilos, rodeando-os e beliscando-os com os dentes. Ela segurou-lhe os ombros e inclinou a cabeça para trás, sabendo que realmente tinha deixado que ele tivesse poder sobre seu corpo. Tão rapidamente que ela mal percebeu, Said despiu-a, deixando o vestido cair na areia. Ergueua no colo e a carregou até a água, onde a fez esperar até que ele ficasse nu também. — Venha. — Ofereceu a mão a ela, e os dois entraram na água. — Deixe-me prender seus cabelos. — Said demonstrou uma habilidade interessante ao prender os cabelos da lady no alto de sua cabeça, em um penteado que se assemelhava a um laço. — Não sabia que possuía tal habilidade, meu príncipe. As mulheres com quem esteve devem ter sido agraciadas por seu conhecimento — Louise provocou, de costas para ele. Said prendeu o olhar nas curvas das nádegas da lady e logo sentiu o efeito em seu corpo, mesmo debaixo d'água. — Nenhuma outra conheceu meus segredos, gazela — falou, apoiando as mãos na cintura arredondada, enquanto encaixava seu corpo ao dela. — Apenas você — sussurrou em seu ouvido. — Quero banhá-lo — Louise disse, virando-se. Apoiou-se no peito dele e, lentamente, começou a molhar os braços, a barriga, vendo a reação dele ao seu toque. Seus dedos tocaram as marcas de batalha no abdômen e depois as cicatrizes deixadas pela adaga no braço, fazendo-a lembrar-se da noite em que achou que iria perdê-lo e de sua decisão de ficar. — Você não partiu — disse ele, ao vê-la interessada nas cicatrizes. Ela deu de ombros. — Eu tentei. Estive perto de deixar o reino, mas houve algo... — Hesitou, nervosa. — Não pude deixá-lo. Tive medo de que morresse. Said não lhe deu uma resposta, apenas continuou acompanhando seus movimentos, estudando-a silenciosamente. — Agora é minha vez. — Segurou-lhe os braços e a fez rodear seu pescoço, içando-a para que ela o enlaçasse na cintura com as pernas. O contato era íntimo e, mesmo com a água fresca em cada ponto que seus corpos se conectavam, um calor imenso dispersava-se. Os seios de Louise estavam ao alcance dos lábios de Said, e ele não deixou de tê-los úmidos em sua boca. — Desejo tantas coisas com seu corpo e sei que a maioria delas a deixaria chocada. — Diga-me o que deseja fazer — Louise falou, curiosa com os desejos secretos do Sheik. — Diga-me e eu permitirei. Tentado, Said esfregou seu pênis entre as coxas de Louise, movimentando-se, imitando o ato sexual.


— Quero sua boca em mim — disse em um gemido, esfregando o polegar no clitóris dela. — Quero que me leve profundamente e que seus lábios toquem minha pele. — Leve-me para a tenda, Said. Agora — ordenou ela, com a voz rouca. Aquela era uma das poucas vezes em que o Sheik aceitava de bom grado receber ordens sem hesitar. Carregou a lady pela areia, até a tenda, onde as mantas estavam estendidas, prontas para serem usadas. Ele a deitou com delicadeza, tentando encontrar forças para ser gentil, mas Louise o surpreendeu ao agarrá-lo pelo pescoço e, sem inibição alguma, beijá-lo. Com as mãos tocando-a em todos os lugares, Said castigou Louise com beijos, imobilizando-a com o peso de seu corpo. A lady, eufórica, fez com que ele a tocasse entre as pernas, em uma ordem muda para que tomasse posse de seu corpo. — Espere. — Ele se afastou dela, ofegando. — Deite-se sobre meu corpo. — Said fez com que Louise deitasse sobre seu abdômen, de costas para ele. — Agora leve meu pênis em sua boca, gazela. Louise obedeceu, assustada ao primeiro contato, mas satisfeita ao senti-lo reagir tão maravilhosamente com seu estímulo. O gosto e o calor dele em sua língua, a firmeza e a delicadeza do membro era um grande mistério, que apenas a incitava a continuar. E a pobre lady guinchou quando, de repente, sentiu a língua de Said em seu sexo, dando-se em conta então do motivo da estranha posição que ele tinha ordenado. Os dois estavam dando prazer um ao outro ao mesmo tempo! A inglesa precisava confessar o quanto era difícil manter-se concentrada quando ele trabalhava em seu corpo, usando o dedo para penetrá-la, enquanto a boca continuava a jogar com ela. Desavergonhadamente, Louise começou a mover o corpo, encontrando um ritmo cadenciado que a levava à beira do êxtase. Procurou aumentar os movimentos no pênis de Said, levando-o mais fundo em sua boca, sentindo-o ir junto dela, tão perto... E os dois encontraram juntos um prazer mudo. Louise, sem saber o que fazer, saiu de cima de Said, deitando-se ao lado dele. — Preciso acender a fogueira ou morreremos de frio — o Sheik disse minutos depois, quando ambos recobravam a sanidade. Ele cobriu Louise com uma das mantas e se levantou, andando pelo escuro. Completamente relaxada, ela encolheu-se dentro da tenda, satisfeita por ter conseguido dar prazer ao Sheik. E feliz por ter sido maravilhoso. Said apressou-se em acender a fogueira, depois de tatear a areia até encontrar as roupas esquecidas na pressa da paixão. Assim que o fogo estava aceso, ele se dedicou a conferir se o dromedário estava na tamareira em que o havia deixado. Voltou à tenda e ficou surpreso ao encontrar Louise adormecida. Procurou em uma das bolsas pela garrafa que ordenara às servas prepararem,


além de algumas frutas e pães. Sentou ao lado de Louise e a acordou com um beijo na têmpora, chamando-a pelo nome. — Perdoe-me. Eu acabei dormindo... — Ela se sentou, cobrindo o corpo com a manta. — Preciso alimentá-la. — Said mostrou a comida disposta ao lado dos dois. Louise ficou entusiasmada ao ver a quantidade de comida, já que pouco comera durante o dia, enjoada devido ao calor. Serviu-se de pão e mordiscou um pedaço, gemendo satisfeita por não precisar sobreviver apenas de tâmaras. — Tenho algo que você irá gostar. — Said pegou a garrafa de vidro escuro e serviu o líquido âmbar de odor forte em uma vasilha que havia levado. A lady aceitou a bebida e, preocupada, olhou para o Sheik. Ele a incentivou a provar e, com um suspiro, ela bebeu um pouco. — O que é isso? — Louise perguntou, passando a língua pelos lábios para absorver o sabor adocicado e, ao mesmo tempo, picante. — Legbi — ele respondeu sorrindo. — É um vinho feito com a tâmara. Algumas mulheres do acampamento o preparam. A lady franziu a testa, reconhecendo o sabor da odiosa fruta. Entregou a vasilha para Said e voltou a comer o pão. — Um dia lhe mostrarei as bebidas da Inglaterra. Eu poderei... — Ela se calou, percebendo quão impossível era o que estava dizendo. Said bebeu o resto do legbi e comeu uma das frutas. — Ainda se lembra de seu país — comentou ele, mal a olhando. — Jamais esquecerei, Said. A Inglaterra é minha terra, assim como o deserto é para você — Louise explicou, emocionada. — Sinto falta do meu pai, da minha casa... — Deseja voltar? — o Sheik sondou, assustando a si mesmo com a pergunta. Louise pensou no que responder. — Iria me permitir voltar? — rebateu, olhando-o nos olhos. — Não, não irei. — Said a encarou. — A situação pode ter mudado, mas ainda continua sendo minha, Louise. Seu corpo, seus pensamentos e seu afeto são meus. Meu amor é seu — pensou ela. Algum tempo atrás, possivelmente, Louise ficaria irritada e insultada ao ouvir um homem afirmar que a possuía de corpo e mente. Acharia ridículo entregar-se a alguém tão rude e pretensioso, que se autoafirmava detentor de tal poder. Mas a vida mostrava-se tão surpreendente que a havia colocado em tal situação, e ela não conseguia deixar de reconhecer que o sentimento tão intenso de posse, de domínio que ele tinha sobre seu corpo, a ponto de incendiá-la e fazê-la chegar aos céus, era...


excitante. — Por que está tão distante, Louise? — Said tocou sua bochecha, um toque leve, apenas para chamar sua atenção. — Ainda está pensando sobre o que lhe contei mais cedo? Ela assentiu. — Sinto por ter dito somente agora. Você acredita em mim, gazela? Ou acha que estou mentindo para você? É isso que a tem deixado preocupada, não é? — Eu passei muitos anos da minha vida acreditando nisso, Said. Abandonei meu país e meu pai para me aventurar nesse deserto, certa de que encontraria as ruínas. — Desviou o olhar, não querendo que ele visse sua tristeza. — É como se tudo em que acreditei e que vivi fosse uma mentira. O Sheik engoliu em seco, não esperando por tal resposta. — Tudo foi real, gazela. — Meus amigos morreram por minha culpa! — exclamou ela, levando as mãos ao rosto, escondendo-se. — Não permito que diga isso — Said rosnou, segurando o braço de Louise. — Os únicos culpados foram os salteadores. E eu os puni, não há mais nada para temer ou culpar-se. A lady rendeu-se, respirando fundo, deixando que o peso saísse de seus ombros. — Meu pai jamais me perdoará, quando souber que me arrisquei por algo que nunca existiu. Ele mesmo se sentirá mal ao saber que suas teorias estavam erradas — confessou ela. — O que é isso? — perguntou, mudando de assunto ao ver a estranha fruta em sua frente. Said sorriu. — É um figo. Já provou? Ela negou. — Bem, então me deixe mostrar a você como essa fruta deve ser saboreada. — Ele retirou a manta que a cobria e jogou para o lado, deixando-a desnuada. — Deite-se. Louise anuiu, um pouco reticente. — Abra as pernas. — Said a auxiliou, afastando as coxas dela. Ele partiu a fruta ao meio e mostrou-lhe uma das partes. — Para meu povo, o figo representa a beleza íntima da mulher e alguns acreditam que tem poderes afrodisíacos. A lady arregalou os olhos ao ver o formato da fruta que assemelhava-se realmente à parte feminina em questão. Viu também, com assombro, como o Sheik mordia um pedaço da fruta e levava o restante até seu corpo. — Agora mostrarei a melhor forma de comê-la — e sem nenhum pudor, Said deslizou a fruta até o sexo de Louise, friccionando o clitóris ainda inchado e, depois, levou a iguaria até a boca, comendo-a de uma única vez.


Louise gemeu, fechando os olhos com força, não podendo acreditar no que ele tinha acabado de fazer. Também não podia crer na própria falta de decoro, porque tinha sido muito excitante, e ela desejava mais. Para seu agrado, Said repetiu o gesto, dessa vez demorando-se mais em provocá-la. — Não tenha vergonha de seu corpo, gazela. Abra os olhos e veja o que estou fazendo. — A voz profunda do Sheik, fez Louise reagir, fitando-o. E foi o que faltava para ela entregar-se ao poder sensual dos movimentos que ele fazia e das palavras proferidas em sussurros. Said fartou-se com a fruta antes que Louise alcançasse o prazer, e não deixou de olhá-la, extasiado enquanto retirava a própria roupa. — Desejei fazer isso durante todo o dia — disse ao se colocar entre as coxas dela, completamente duro. Com um beijo em sua testa e as mãos presas na dela, Said penetrou seu corpo, soltando um gemido alto ao invadi-la até o fim. Louise agarrou-se a ele e relaxou, feliz por sentir novamente aquela maré de sentimentos controversos. Ele alternava seu corpo entre rápido e lento, tornava-o quente, provocava uma deliciosa pressão em seu ponto de prazer. O começo lento e doce logo se tornou desesperado, rápido, enquanto Louise cravava as unhas nas costas de Said e quase gritava, apavorada com a intensidade do momento. O Sheik mudou de posição, colocando-a de lado, enquanto a penetrava por trás, podendo assim estimular o clitóris ao mesmo tempo. Mordeu-a no pescoço e depois no ombro, fazendo-a retorcerse, levando-a para perto do fim. Aumentou novamente o ritmo, e Louise perdeu-se de um jeito que pareceu a Said a mais perfeita representação do paraíso na terra Ele fechou os olhos quando o corpo ficou imóvel e mal pensou quando se deixou ir dentro dela. *** — Estou chocada — comentou Louise pouco depois. Said tinha coberto seu corpo novamente com a manta. — Imaginei que aconteceria — respondeu ele, rindo. Os dois estavam deitados juntos, ele a segurando contra seu peito, um de costas para o outro. — Eu me refiro a tudo. Trazer-me ao deserto, revelar a verdade sobre as ruínas, esse lugar... — Suspirou. — O que acabou de fazer. Said a beijou atrás da orelha, sentindo-se vitorioso. — Há muito tempo planejo trazê-la aqui, gazela. Louise ficou de frente para ele.


— Cheguei a acreditar que estava me levando para outro acampamento, para outro homem... — contou, envergonhada. — Eu não faria isso. — Por que não? O Sheik demorou a responder, e Louise estava quase desistindo de esperar para ouvi-lo dizer algo, quando ele sussurrou. — Porque não posso ficar longe de você. — Said... — Escute o que eu tenho a dizer, gazela. — Contornou o ombro dela com a ponta dos dedos, causando arrepios. — Não permitirei que se vá. Quero você ao meu lado. Louise sentiu a boca seca. Estava ouvindo tudo aquilo realmente? Oh, Deus, será que ele a amava também? — Apenas viveremos, sem pensar em mais nada. Sei que gosta de estar ao meu lado, e a mim acontece o mesmo. Não era o que ela esperava ouvir. Mas era o necessário. Não era ingênua a ponto de acreditar que aquele homem, o poderoso Sheik, a amaria assim, tão facilmente. Porém, sabia que ele estava sendo sincero, e ela agora já não tinha mais desejo de partir. — Ficarei ao seu lado, meu príncipe — disse, com um largo sorriso. Said a beijou nos lábios com uma delicadeza que a surpreendeu. Poderia jurar que havia algum sentimento no gesto. — Precisamos dormir. Amanhã voltaremos ao palácio. — Ele a acomodou em seu braço e a envolveu pela cintura, sua mão a massageando. Louise estava sorrindo no escuro, sozinha, porque Said já não mais a via, mas a verdade era que estava inegavelmente feliz.



Capítulo Vinte e Oito O Sheik de Hamed conduziu lady Louise de volta ao palácio, assim que o sol surgiu no céu trazendo o calor escaldante sob suas cabeças. Antes de partirem, porém, ela não resistiu em banharse novamente no lago, dessa vez sem sentir-se envergonhada por sua nudez, enquanto Said, à sombra de uma tamareira, assistia à cena fascinado. Aquela certamente era uma manhã diferente para os dois, principalmente para Louise, que agora sabia algumas coisas importantes, sem que a sombra da dúvida margeasse sua mente. Estava certa de que desejava ficar junto de Said e de que seria feliz naquele deserto. As coisas haviam se tornado diferentes na noite anterior, quando o Sheik revelou não poder deixá-la. — Poderíamos ficar aqui para sempre — ela disse, enquanto vestia-se, pouco depois. — A ideia me agrada muito, gazela. Mas meu povo precisa de mim. — respondeu ele, ajudandoa a atar os nós nas costas do vestido. Seguiram para Hamed com mais rapidez, Said notavelmente preocupado com o reino. Não lhe agradava ficar muito tempo fora do palácio, sem saber o que acontecia ali. Talvez isso fosse resultado das inúmeras recomendações que o pai fizera antes de morrer, dizendo-lhe para manter a ordem e o controle do reino, uma vez que só assim a paz floresceria. Certificando-se de que Louise estava bem, apoiada em seu peito, Said a alimentou durante o caminho, deixando a lady envergonhada quando, em certo momento, ofereceu-lhe o que restara dos figos da noite anterior. Apesar de manter-se firme, Louise parecia um pouco cansada, tendo em vista a noite agitada em que estivera nos braços do Sheik, que a acordara algumas vezes, atormentando-a com beijos e carícias, despertando-a para fazerem amor novamente. Para ela, era interessante o desejo voraz daquele homem, que nunca parecia ser saciado. Conseguia então compreender sua necessidade em buscar por mulheres que o satisfizessem, mesmo que não concordasse com tal atitude. — Chegaremos antes da noite — Said falou, quebrando o silêncio monótono. — Algumas partes do meu corpo estão doendo terrivelmente. Só consigo pensar em minha cama. — Louise esfregou a coxa, sentindo-a adormecida. O Sheik riu, massageando a perna dela, tentando fazê-la se sentir melhor. — Poderá descansar por quanto tempo desejar, Louise. Haverá muito tempo para que eu tenha você novamente. — Com uma leve pressão nas costas da lady, Said começou a relaxá-la. O desconforto era grande, causado não somente pelo calor, mas também pelos sacodidas do animal, que a faziam jurar que seus ossos estavam sendo dissolvidos no caminho. No final da tarde, os dois já se encontravam nas mediações do reino. Louise suspirou aliviada ao ver o palácio mais a frente, dando-se conta de que agora, em definitivo, sua vida seria ali. A verdade


a assustou um pouco, saber que aquele lugar era sua nova casa e que não voltaria para a Inglaterra. Por amor a Said. Os guardas os avistaram e foram até a entrada do acampamento, onde os ajudaram a descer do animal, a lady sentindo que poderia ficar alguns dias sem conseguir sentar-se. Com toda sua dignidade, deixou que Said conversasse com os homens e se voltou para o palácio, disposta a mergulhar em uma banheira de água morna e permanecer lá por algumas horas. Ora, ela merecia! Encontrou as servas acendendo as velas nos corredores, e algumas delas, ao avistarem-na, sorriram, enquanto outras a olharam assustadas. Louise não compreendeu a reação das mulheres, mas não se incomodou perguntar o que estava acontecendo. Naquele momento questionava-se sobre o motivo de os corredores do palácio serem tão longos e seu quarto ficar tão distante. Para sua surpresa, ao entrar nas acomodações de seu quarto, encontrou Karida arrumando as almofadas sobre a cama. Ao vê-la, a serva deu um passo para trás, assustada, mas logo sorriu ao reconhecê-la. — A senhorita voltou! — a mulher comentou, com as mãos para cima. Louise abriu a boca para responder, mas desistiu, seu olhar sendo atraído para a cama, que estava tão atraente, parecendo muito macia e confortável. — Preciso me banhar, Karida. Pode conseguir água morna? — pediu, ansiosa para se livrar do vestido coberto de areia. A serva concordou, indo até a banheira de cobre, do outro lado do quarto, preparando o sabão e os óleos. Em seguida, correu para fora, provavelmente dirigindo-se à cozinha. A lady arrastou-se até a cama e caiu de bruços, gemendo ante o contato com a manta macia e agradável. Seus olhos foram se fechando lentamente e tudo começou a ficar silencioso, até que ela adormeceu completamente. Foi acordada pouco depois, por Karida e mais dois guardas, que carregavam uma caldeira com água morna. Louise ficou de pé rapidamente, esperando até que os homens se retirassem do quarto. — Ajudarei a senhorita a despir-se — Karida dispôs-se, virando Louise de costas e começando a desfazer os laços. Quando o vestido caiu aos seus pés, Louise correu para a banheira, suspirando com a temperatura da água. Apoiou-se na beirada e relaxou os músculos, agradecida aos céus por seus ossos estarem nos lugares, apesar das dores em cada um de seus membros. — Devo trazer seu jantar? — perguntou Karida, aparecendo ao seu lado. — Pode comer enquanto se banha. — Eu posso? — Louise questionou de boca aberta. Seria o paraíso!


— É claro! Vou providenciar agora mesmo. — A serva deixou o quarto em busca da comida. Louise aproveitou o momento para esfregar o corpo, retirando os grãos de areia que se acumulavam em sua pele e deparou com marcas avermelhadas em suas coxas e seios, uma recordação dos momentos intensos que tinha vivido com o Sheik. *** — Estive preocupada com a senhorita. Pensei que não voltaria mais — Karida contou timidamente, de joelhos ao lado da banheira, enquanto Louise devorava os pedaços de carne de carneiro. — Por que pensou isso? — a lady perguntou, beliscando um pedaço de pão. A mulher hesitou, olhando para a porta, temendo que alguém ouvisse. — Achei que meu senhor a estava levando para outro acampamento, para outro homem — disse, baixando o olhar. Louise compreendia o pensamento dela e admitiu mentalmente que, na realidade, em algum momento, também chegou a pensar nisso. Ainda bem que estava enganada. — O Sheik me levou até um oásis, Karida — confidenciou sorrindo, e viu a serva franzir a testa, confusa. — Nunca imaginaria que algo assim iria acontecer um dia — comentou Karida, abrindo um largo sorriso. A lady entregou a bandeja para a serva e decidiu que era hora de secar-se, a água já estava ficando fria e o que Louise mais desejava agora era adormecer em sua cama. Ela ficou de costas para Karida, constrangida ao revelar as marcas da paixão em seu corpo, mas acabou lembrando-se que possivelmente também houvesse marcas em suas nádegas, pois na outra noite descobrira que Said nutria um sentimento selvagem por aquela parte de sua anatomia. — Posso ajudá-la em algo mais? — Karida ofereceu, ao lado da cama, ajudando Louise a remover as mantas para deitar. — Preciso perguntar uma coisa a você, Karida. — A lady segurou a mão dela, impedindo-a de se afastar. — O que desejar, senhorita. Louise cobriu-se até os ombros e fitou a mulher, esperançosa de conseguir algo mais sobre certo assunto. — Você sabe que sou uma arqueóloga, verdade?! Procuro por coisas perdidas, coisas antigas, e vim para o deserto em busca de um reino. Ao vê-la assentir, Louise continuou. — O que sabe sobre Al-Delíh, Karida? A mulher ficou em silêncio, mas logo depois deu de ombros e respondeu:


— Sei o que ouvi quando era criança, sobre a morte de todas as pessoas e o desaparecimento do reino nas areias do deserto. — Karida, você acredita que a história seja real? — Louise não deixou de perguntar. — É apenas uma lenda, senhorita. Ninguém nunca encontrou qualquer coisa que provasse o contrário. A lady assentiu. Já imaginava tal resposta, mas precisava saber, ouvir outra pessoa dizer-lhe. Agora, talvez, bastasse para aquietar seu coração. *** Três semanas depois, em um dia especialmente quente, Louise ajudava as mulheres a organizarem as dezenas de almofadas espalhadas pelo palácio, principalmente na sala das refeições, onde a lady indicou algumas mudanças, removendo boa parte dos tapetes da parede, os quais deixavam o lugar abafado. As mulheres aceitavam a ajuda de Louise com entusiasmo, animadas com a ideia de mudar algumas coisas no palácio. Há dois dias haviam limpado a cozinha e decidido que apenas preparariam a comida ali dentro; as carnes dos animais seriam preparadas do lado de fora. Era admirável a postura da lady, que parecia determinada e feliz ao orientar todas aquelas mulheres, muitas vezes aprendendo coisas que jamais saberia se ainda estivesse na Inglaterra. A verdade era que, com o passar dos dias, estava se tornando cada vez mais semelhante àquele povo, reconhecendo aquela cultura como sua. Said mostrava-se satisfeito com seu trabalho e muitas vezes a elogiara, dizendo que o excitava vê-la daquela forma, perambulando pelo palácio, emitindo ordens, como se fosse ela a quem todos devessem obedecer. Assustada, a lady questionara como ele podia excitar-se com algo tão estranho. O Sheik, divertido, conduzira Louise, em plena luz do dia, até o aljibe onde, ao despi-la e beijá-la dos pés a cabeça, dando-lhe tanto prazer como jamais seria dito, permitiu que ela conduzisse o ritmo. Ele entregara-se desavergonhadamente aos toques ainda envergonhados de Louise, que contornara seu pênis com a pequena mão, provocando-lhe, enquanto seus olhos escuros prendiam os dele. Então a lady compreendeu a que ele se referia quando falava sobre excitar-se ao pensar nela emitindo ordens. Oh, sim, ela podia fazer aquilo. Foi tão fácil e a deixou extasiada ordenar no ouvido do Sheik que seguisse os movimentos de sua mão e, ao vê-lo tão próximo de liberar-se, empurrá-lo contra a parede, para agachar-se e levá-lo entre os seios, como ele mesmo havia dito desejar. Depois de lavar-se, o Sheik a beijara com delicadeza, sussurrando em seu ouvido o quanto ela o tinha deixado feliz, prometendo que logo a recompensaria. — O que faço com essas que restaram, senhorita? — uma das mulheres perguntou, segurando as almofadas debaixo dos braços. — Leve-as até a sala de bordados. Poderemos restaurá-las. — Era evidente que as almofadas


não eram trocadas há tempos, indicando a falta de uma presença feminina. Bem, agora Louise estava ali e não parecia que Said iria importar-se com a mudança de simples almofadas. Outra realidade que agradava Louise era poder agora transitar livremente, não somente pelo palácio, mas também pelo acampamento, onde ia todos os dias visitar a mulher que tivera o bebê recentemente. A lady passava algum tempo conversando com a mãe, enquanto ninava o bebê nos braços, lembrando que já fizera um mês que o vira vir ao mundo. Agradava-lhe sentir o calor do pequeno corpinho adormecido contra o seu, enquanto passava a mão pelos cabelos abundantes de cor escura, os quais pareciam tão finos quanto uma pena. Outras mulheres também iam até a tenda oferecendo chá e frutas, todas alegres e dispostas a saber mais sobre a lady. Ficava evidente a Louise que todos ali sabiam exatamente quem ela era e o que lhe acontecera. E o que mais a surpreendia era que agora a aceitavam e a tratavam como um deles. Precisava confessar, com muito orgulho, que tinha adquirido muitos conhecimentos sobre como cuidar de uma tenda, algo que jamais, em toda sua vida morando na Inglaterra, poderia imaginar. Sabia, ainda com um pouco de dificuldade, como esfolar um carneiro e preparar a carne, além de fazer o homus, um tipo de pasta muito apetitosa feita com grãos. Sim, estava tornando-se uma verdadeira mulher árabe, sem deixar de se interessar, é claro, pela história e pela arqueologia, algo que estava em sua alma. Tinha pensado em começar a fazer algumas anotações, algum tipo de pesquisa sobre a vida no deserto, somente para ela, talvez um diário. Said não precisaria saber daquilo. — Senhorita? — Najila a chamou, parada em sua frente. Louise, distraída, olhou-a e notou a serva assustada. — O Sheik espera a senhorita na sala do trono. A lady deixou uma almofada nas mãos de Najila e seguiu para o corredor, imaginando o que poderia ter feito Said chamá-la naquela hora do dia. Oh, não, não! Se ele desejava fazer amor naquele momento, simplesmente se negaria! Iria atrasar-se em seu trabalho e, mesmo que ele tentasse seduzi-la com seus beijos, não cederia. Havia acontecido o mesmo há uma semana, quando ele a levara até o jardim da fonte, dizendo que desejava apenas ter sua companhia. Com um pequeno beijo em sua boca e as mãos em sua cintura, havia conseguido deitá-la no chão, deixando-a nua sobre suas roupas, enquanto deslizava o pênis entre seus seios, usando em seguida suas excelentes habilidades orais para satisfazê-la. Com medo de ser vista, Louise juntara as roupas e tentara vestir-se, desconcertada diante do olhar faminto de Said, que sorria de orelha a orelha. Louise parou em frente aos guardas na entrada e avistou, no interior do recinto, Said, em pé, de costas para ela. — Mandou me chamar? Aviso-lhe que, se tentar me seduzir, irei mordê-lo ou, quem sabe, gritar


— falou, de braços cruzados, tentando parecer brava. Quando Said se virou para ela, Louise notou algo diferente nele. Havia uma sombra sob seu rosto, os lábios contraídos, o olhar sério. Poucas vezes o havia visto assim, como quando ele a salvara ou quando regressara da execução de Aban. — O que aconteceu? — perguntou, aproximando-se. O Sheik colocou a mão em frente a ela, impedindo-a de chegar mais perto. — Há alguém que deseja vê-la, Louise — explicou ele, suspirando. — Quem? — Seu coração estava dolorido contra o peito, e ela já sentia as pernas amolecerem, quando então ouviu uma voz atrás dela, vindo da entrada. — Sou eu, Louise. O corpo inteiro ficou paralisado ao reconhecer aquela voz. Seus olhos estavam no rosto de Said, que já não tinha mais expressão. Louise reuniu toda a coragem para virar-se, deparando com um senhor de bigode e cabelos brancos, vestido com roupas marrons, apoiado em uma bengala. — Pai? — perguntou, sua voz soando fraca.



Capítulo Vinte e Nove Pareceu uma eternidade o tempo em que Louise ficou estática, olhando para o pai, parado em sua frente, com a mesma atitude imponente que ela lembrava. — O que faz aqui? — questionou, sem saber exatamente se queria ouvir a resposta. Antes de ele responder, um homem surgiu na porta, caminhando elegantemente até o lado direito do pai de Louise. — Mal posso acreditar que a estou vendo novamente, querida. — Era Christopher, de braços abertos, sorrindo para ela. Louise arregalou os olhos, não conseguindo acreditar que ele realmente estava ali. Oh, ele não estava morto, conseguira escapar. Ela lutou contra o desejo de ir até ele e abraçá-lo, dizer que estava feliz por vê-lo e também pedir-lhe perdão por tudo que tinha acontecido. — Estou aqui para levá-la de volta, minha filha — lorde Neville, o pai de Louise, disse, indo até a filha. Parou em frente a ela e a olhou dos pés a cabeça, provavelmente espantado por vê-la vestida com aquelas roupas tão impróprias. A lady se encolheu, desviando o olhar, e dedicou-se a envolvê-lo em um abraço, um tanto rápido demais para o que a situação pedia. — Achei que estivesse morta, Louise — falou ele, enviando um olhar indiferente a Said, que continuava parado ao lado da lady, como um cão raivoso. — Todos nós pensamos — comentou Christopher, enquanto limpava o rosto com o lenço retirado do bolso. Próximo ao seu olho havia uma cicatriz profunda, ainda avermelhada, possivelmente causada durante o ataque. O olhar de Said recaiu sobre o homem de boa aparência, que, ao que parecia, era o homem com quem Louise estivera preocupada, afirmando que estava vivo depois do ataque. Ela estava certa, então. Mas o Sheik, com sua boa percepção e julgamento, no primeiro contato, teve certeza de que não nutriria nenhum tipo de admiração pelo homem. Na verdade, não estava gostando em nada da forma como ele olhava para Louise, provavelmente fascinado com as curvas expostas pela saia fina. Como um aviso silencioso, ele deu um passo mais perto de Louise, certificando-se de que fosse o suficiente para o homem, que lembrava um dromedário, entendesse as circunstâncias. Lorde Neville segurou a mão da filha e respirou fundo, trazendo-a para seu lado, longe do Sheik. — Como soube que eu estava aqui? — Louise perguntou, franzindo a testa, em dúvida sobre como o pai chegara ali tão rápido. O velho soltou sua mão e caminhou pela sala, admirando os grandes tapetes expostos na parede, todos bordados em ouro. Louise notou como ele estava desgastado pela viagem, forçando seu peso


sobre a bengala, o corpo parecendo mais frágil do que ela se lembrava. — Christopher entrou em contato comigo, informando-me sobre o ataque, a morte de todos e seu desaparecimento. — Ele olhou rapidamente para Said, apenas para deixá-lo ciente de que falava dele. — Decidi que, mesmo você não merecendo, eu deveria vir até aqui buscá-la. — Não entendo como conseguiu escapar, Christopher. Eu o vi ser arrastado pelos salteadores, e eles não tiveram piedade com Will e Joshua. Como conseguiu? — Não fazia sentido. O próprio Said afirmara que ninguém permaneceria vivo para contar o que acontecera, os salteadores não hesitavam em matar. O homem deu de ombros, baixando a cabeça, emocionado. — Eu tive sorte. Eles me levaram até a cidade com algum propósito que desconheço, mas foi lá que consegui fugir, refugiando-me nas tendas de comércio. Dois dias depois, resolvi enviar uma carta a seu pai, contando tudo o que tinha acontecido. Esperei por ele, pedindo aos céus que você estivesse bem. Enquanto estava na cidade, ouvi boatos de que o Sheik de Hamed havia dado fim a alguns salteadores em um acampamento e logo deduzi que você poderia estar aqui — contou ele, fitando Said de canto de olho. Louise não sabia o que dizer diante de tudo aquilo. Christopher não morrera e nunca deixara o deserto. Então quando ela tentara, todas aquelas vezes, fugir até a cidade, se o tivesse conseguido, teria encontrado Christopher. Arriscou um olhar a Said, nervosa ante sua reação. Ele estava calado, o que não era comum diante de situações tão extremas. Louise temia que ele estivesse planejando algo, não exatamente contra seu pai, mas contra Christopher, dado olhar cáustico que o Sheik lhe dirigia. — Penso que esteja cansado, pai. Posso levá-lo até um quarto para que descanse — sugeriu, esperançosa de tirá-lo dali, para conversarem a sós. — Imagino que a viagem tenha sido longa. O velho não parecia ter a mesma opinião, pois apontou sua bengala em direção à filha, como se a estivesse condenando por algum crime. — Não quero ficar neste lugar mais do que o necessário. Estou aqui apenas para levá-la de volta à Inglaterra, Louise. Esse é meu único desejo. Estou acostumado com as intempéries de uma viagem como essa — respondeu rispidamente. Louise sentiu as mãos suadas, à beira de um ataque de nervos. — Ela não irá a lugar algum — a voz de Said retumbou na sala silenciosa, chamando a atenção de todos para ele. — O que está dizendo? — Christopher avançou na direção do Sheik, com as mãos em punho, pronto para atacá-lo. Louise correu, ficando na frente de Said, impedindo que o amigo se aproximasse mais. — Ela não é sua prisioneira aqui.


Said teve vontade rir e dizer-lhe o que se passava ali, o que Louise realmente era em seu reino, sua importância para ele. Mas não se importava com o dândi que parecia um dromedário, e sim com o pai de Louise, que parecia um homem determinado em levar sua filha de volta. Bem, ele não permitiria. — Preciso que permita que eles fiquem essa noite no palácio, por favor — Louise pediu, tocando-o no braço. Ele viu a tristeza no olhar dela, e desejou poder consolá-la naquele exato momento, envolvendo-a em seus braços. — Eles podem ficar no acampamento — disse, olhando por cima do ombro dela, evitando fitála. Louise não discutiria isso e até mesmo compreendia a posição dele. Não esperava outra reação do poderoso Sheik. Com uma calma assustadora, a lady foi até o pai, persuadindo-o a acompanhá-la, garantindo-lhe que, assim que estivessem a sós, conversariam a respeito de tudo que fosse necessário. O velho, mesmo contrariado, concordou em seguir para o acampamento, para fora do palácio do Sheik. Christopher seguiu logo atrás, curioso sobre tudo, principalmente em relação às peças de cerâmica e ouro expostas no corredor. — Deixe-me ajudá-lo, pai — Louise ofereceu, segurando no ombro do velho. Os moradores do acampamento os olharam desconfiados, enquanto a lady conduzia os dois homens até uma tenda disponível, mais afastada das pessoas, onde quem quer que fosse poderia aproveitar para relaxar. Ela indicou os assentos de almofadas dispostas no chão e correu para fora, com o intuito de procurar por alguém que pudesse lhes servir comida. Quando voltou, encontrou Christopher deitado, com o chapéu ao lado, dormindo tranquilamente. Seu pai estava sentado mais afastado, ainda segurando sua bengala, como se fosse algum tipo de arma poderosa. — Logo trarão a comida — disse, sentando-se timidamente ao lado dele. Lorde Neville não a olhou e também não disse nada. A filha estava de cabeça baixa, esperando pelas queixas intermináveis que o pai faria. Mas ele não fez e parecia muito concentrado em qualquer outra coisa que não fosse ela. Angustiada pelo silêncio, Louise resolveu explicar-lhe alguns pontos muito importantes. — O Sheik me salvou — revelou em voz baixa. — Matou os salteadores antes que eles pudessem fazer o mesmo comigo. O velho não se moveu. — Ele a manteve presa aqui. A lady se preparou para negar veementemente, mas era a verdade e, mesmo que tentasse mentir, não pareceria certo.


— Não sou uma prisioneira aqui, pai. Aprendi muitas coisas nesse lugar, e todos são muito gentis comigo — contrapôs, ansiosa. Lorde Neville virou o rosto para ela, em uma calma enervante. — O que está dizendo? Você não pertence a esse lugar, sua casa é a Inglaterra. Possivelmente esse povo a tenha feito ver tudo fora da realidade. — Pai... — começou ela, quase se desesperando. — Quero que me deixe descansar por alguns momentos — ele interrompeu, ficando em pé. Em silêncio, Louise levantou e passou por ele, deixando a tenda sem olhar para trás. *** — Agradeço por permitir que eles fiquem esta noite — ela disse ao encontrar Said no jardim da fonte, de costas para ela, encarando a água inerte. — Contou tudo a ele? — Said perguntou, ainda sem olhar para ela. Louise parou ao seu lado e sentou no mármore da fonte, mergulhando as mãos na água fresca. — Não toda a verdade. — Refrescou o pescoço e o vale entre os seios, sentindo o alívio proporcionado pela água em sua pele. — Ainda não posso acreditar que Christopher está vivo. — Admira-me vê-lo tão bem — Said disse, sentando-se ao lado dela. — O que quer dizer? — A lady arqueou a sobrancelha, desconfiada. Suspirando, o Sheik tomou a mão dela na sua, as palmas molhadas uma na outra. — Nada com que deva se preocupar, gazela. — Beijou o dorso da mão dela e sorriu desconcertado. — Seu pai me faz lembrar da minha mãe. Ela também era como ele, impetuosa e, quando desejava, podia se tornar um pouco difícil de conviver, apesar de meu pai amá-la dessa forma. Louise esboçou um sorriso. — Senti falta dele — confessou, rindo de alguma lembrança particular. — Não consigo acreditar que ele viajou tanto tempo para me encontrar. — Na verdade, eu até o compreendo — admitiu ele. Ela olhou para cima, notando o céu escurecendo. O tempo parecia passar de uma forma diferente ali, naquele lugar. Era como se estivesse protegida de qualquer mal. O problema era que não poderia ficar ali para sempre. — Ele me olhou como se eu fosse uma desconhecida — falou, os olhos ardendo com a ameaça das lágrimas. — Eu imaginava que esse momento chegaria um dia, sabia que teria que vê-lo em algum momento. Só não imaginei que seria agora. Said roçou os lábios em sua mão, dando-lhe algum tipo de conforto. — Você é minha, Louise. Lembre-se sempre disso, apenas minha. — Beijou-a no queixo e depois


na bochecha, criando uma linha de fogo em sua pele. — Não irá com ele, não fará isso. Ela assentiu, envolvendo os braços no pescoço dele, beijando-o com fervor. E então lhe pareceu tudo certo, em seu perfeito estado, provando que talvez aquele lugar poderia mesmo impedir o mal de se aproximar. *** À noite, Louise juntou-se ao pai e a Christopher, que partilhavam a farta refeição servida por Karida pouco antes. Os dois estavam famintos, principalmente o amigo, que se deliciava com as lascas de carne sobre o pão e as pastas de grãos temperadas, além do queijo especial. A lady pouco comeu, nervosa com a situação. Tinha se banhado antes de seguir para o acampamento, assegurandose de usar uma roupa que cobria mais seu corpo, um longo vestido até os pés. Seu pai não parecia ter notado qualquer detalhe, concentrado em sua comida, mas ela sabia que ele tinha notado a mudança. Ela estava ali porque desejava conversar, explicar ao pai o que realmente tinha acontecido, e dizer-lhe que era ali seu lugar, que não partiria com ele. Estava certa disso. No final da refeição, depois de beberem o chá amargo oferecido a eles, seu pai e Christopher sentaram-se novamente nas almofadas no fundo da tenda. Havia algumas lamparinas espalhadas, e isso permitia que Louise tivesse uma boa visão da expressão pouco amigável do pai. Mas ela ainda desejava falar com ele. — Pai, há algo que preciso lhe dizer — começou, em pé frente a ele. O velho olhou para Christopher, em um claro sinal de aviso de que ele deveria se retirar. O homem levantou sorrindo, dizendo que iria aproveitar o momento para explorar o acampamento. Quando ficaram sozinhos, Louise sentou ao lado do pai e tomou várias respirações, procurando a coragem que a levara ali. — Não posso voltar para a Inglaterra, pai — soltou de repente, os olhos arregalados. Lorde Neville avaliou a expressão da filha e depois, com a calma que a enlouquecia, propôs-se a responder: — Imagino que o motivo seja aquele homem — sugeriu ele. Louise mordeu o lábio e, com o rosto corado, concordou. — Sim, é ele. O homem refletiu por um momento, visivelmente descontente. — Achei que ele a tivesse feito sua prisioneira nesse palácio, Louise. — No começo, ele o fez — admitiu, de queixo erguido, altiva. — E eu lutei com todas minhas forças para fugir, deixar esse lugar para trás. — Mas não conseguiu — concluiu o pai. — Houve a oportunidade para isso, eu poderia ter partido. Porém escolhi ficar — falou, agora


com o lábio trêmulo, emocionada. — Fiquei por ele, pai. Escolhi permanecer aqui por minha inteira vontade. — Ele a maltratou alguma vez? — perguntou lorde Neville. Louise negou. — Muitas vezes nos desentendemos, nossos temperamentos são muito diferentes. Mas com o tempo descobri sua bondade e lealdade. O Sheik é um bom homem, pai — afirmou, sentindo o peito arder com aquele sentimento maravilhoso que nutria por ele. O pai de Louise nada disse, fitando a luz da lamparina, possivelmente tentando absorver tudo que sua filha dissera. Ela sabia que ele não compreenderia de imediato, mas ao menos esperava que as coisas não se tornassem mais difíceis. — Você voltará comigo, Louise. Para casa — a voz do lorde surgiu novamente, mais rude, sem emoção. — Sinto muito, pai, mas não irei — garantiu ela. Lorde Neville se pôs de pé, apoiando-se em sua bengala, caminhando pela tenda. — Isso é culpa minha. Devia ter suspeitado do que fazia e de seu plano inescrupuloso para vir para essa terra. Como teve coragem de me trair dessa forma, filha? Sei que passou meses mentindo para mim, enquanto esgueirava-se nas reuniões da Sociedade de Arqueologia, e vestida como um homem! Pode imaginar como fui ridicularizado quando sua fuga veio à tona? — rosnou ele, dando as costas a ela. — Eu sei, pai. E sinto terrivelmente. Mas eu precisava fazer isso, eu tinha certeza de que encontraria algo e provaria que... — Provaria o quê? — Ele a fez se calar ao ficar de frente para ela. — Arriscou a vida de homens importantes para procurar por algo que nunca existiu! Ouvir aquilo deixou Louise em choque. — O quê? — perguntou, erguendo a voz. — Está me dizendo que sabia que tudo não passava de uma lenda? — Nunca houve sequer uma prova de que realmente existia a cidade perdida. Tudo era baseado em teorias, a maioria baseada em relatos de pessoas que cresceram nessas terras. Louise levou as mãos aos olhos, quase sucumbindo às lágrimas. Said estava certo, enfim. E agora a culpa pela morte de Will e Joshua se tornava maior, mais real sobre seus ombros. Louise apoiou-se em uma as almofadas e se ajoelhou, sentindo a cabeça girar. — Ainda há tempo de consertar as coisas, filha. A Sociedade de Arqueologia quer ouvi-la, eles lhe estão dando uma chance.


Louise ergueu os olhos para ele. — Eu sempre tive certeza que encontraria. Pareceu-me tão certo quanto respirar. Por que eu me enganei, pai? Eu os conduzi para a morte! — exclamou, aceitando que as lágrimas caíssem por seu rosto. O pai da lady esforçou-se para se colocar de joelhos ao lado da filha. — Volte comigo, filha. Tudo voltará a ser como antes, eu prometo. — Eu amo Said, pai. Não posso deixá-lo. Minha vida está aqui, ao lado dele. Lorde Neville a segurou pela mão gentilmente. — Ele sabe que você o ama? Ela hesitou. — Não disse a ele ainda. — E ele a ama também? — Eu não sei — confessou. O homem suspirou exageradamente. — Não pode ficar ao lado de um homem que não a ama, filha. Você será sempre apenas um objeto para ele. Sei que, dentro de seu coração, sonha em casar-se e ter filhos. Mas neste lugar não encontrará isso, não com ele. O Sheik não a ama, Louise. Já é crescida o suficiente para saber que um homem como ele é movido apenas por desejo, e não amor. Louise virou o rosto para o lado. — Partiremos amanhã pela manhã, e eu espero tê-la ao meu lado na viagem de volta. Ela não respondeu. Deixou a tenda em silêncio. Seu pai estava errado. Tinha certeza disso. *** Louise foi acordada com beijos, que queimavam como brasa seu corpo. Ela abriu os olhos devagar, encontrando, sob a fraca luz de uma vela, a sombra de um homem robusto ao seu lado. — Sente-se — Said sussurrou, ajudando-a. Ele a beijou com fúria, segurando-a pelos ombros, suas mãos exercendo pressão na pele sensível dela. Louise agarrou-se aos seus braços, notando sua completa nudez. Imaginou o que o teria levado ali, no meio da madrugada, buscando por ela. Said afastou as cobertas para o lado e ficou de joelhos entre as pernas de Louise, rasgando com um único puxão a peça de tecido fino que ela usava, deixando-a nua. Ela abriu a boca para protestar, mas calou-se quando o sentiu lambendo-a lá em baixo, com uma fome assustadora. A lady caiu de


costas contra o travesseiro, segurando a cabeça do Sheik, guiando-o para o ponto certo. Gemeu despudoramente, sem se preocupar se alguém podia ouvir. Beliscou os próprios seios e ondulou o quadril, esperando pelo momento de alívio. Mas, cruelmente, Said deixou de beijá-la ali e passou a estimular o próprio membro, movendo a mão para cima e para baixo. Ela o fez parar, para que se colocasse em seu lugar, circulando a carne morna com o polegar, arrancando gemidos altos do Sheik. Sem poder suportar mais, Said a fez separar as pernas e se posicionou em sua entrada. Ela soltou um pequeno grito ao senti-lo em seu interior e precisou se agarrar às laterais da cama para manter-se firme. — Minha — Said rosnava, empurrando dentro dela, sua cabeça caída entre os seios de Louise. Ele alternava o ritmo dos movimentos e usava o polegar para estimulá-la entre as pernas. — Somente minha. — Amo você, Said — ela sussurrou, arqueando o quadril para ele. O Sheik sentiu a pele se arrepiar ao ouvir aquilo e sentiu a raiva crescendo dentro dele. Forçou suas mãos no quadril dela e impôs um ritmo alucinado, o som dos corpos se chocando ecoando pelo quarto. Era o prazer no limiar da dor, exatamente como precisava. Quando a correnteza de prazer rasgou através de seu pênis e correu por cada parte de seu corpo, Said deixou o interior de Louise, respirando com dificuldade. — Gazela... Ela procurou sua mão e o puxou para seu lado. — Fique comigo essa noite, Said. Por favor — sussurrou. Sem saber o que dizer, o Sheik fez o que ela pediu, circulando sua cintura e atraindo-a contra seu corpo. Assim ele podia sentir seu aroma e seu calor. Ela adormeceu rapidamente nos braços dele, que logo mergulhou no sono também. *** Said estava na sala do trono junto do vizir, quando um dos guardas informou que lorde Neville desejava vê-lo. O senhor apareceu pouco depois, junto do dândi esquisito, que lhe dirigia olhares furtivos. — Estamos partindo. O Sheik concordou, feliz por não ter que se preocupar mais em tê-los ali. Mas sua alegria se desfez de repente quando ele viu Louise entrar na sala carregando uma pequena bolsa de couro junto ao corpo. Ela tinha os olhos vermelhos e parecia ter chorado muito. — Louise... — Eu irei com meu pai, Said — disse ela, a voz sem emoção alguma.


Ele deu passos largos até ela. — Não irá. Você não pode ir. — Tentou retirar a bolsa das mãos dela, mas Louise o impediu. — Escolhi isso. Quero voltar para casa. O que estava acontecendo? Said queria gritar e sacudi-la, para que ela confessasse o que tinha mudado. — Não, não, você não irá — decretou ele. — Ora, seu ignorante... — era Christopher tentando interferir na situação. Said o ignorou. Não sujaria sua cimitarra matando aquele homem de pouco valor. Concentrou-se em Louise e em seu coração batendo desesperado no peito, a terrível sensação de perda. — O que mudou? Achei que ficaria ao meu lado. Ela limpou as lágrimas com a ponta dos dedos e olhou para ele. — Meu lugar é na Inglaterra, Said, ao lado do meu pai. — Tocou o rosto dele, acariciando-o. — Jamais me esquecerei de você, meu príncipe. Said fechou os olhos, engolindo em seco. — É isso que deseja, gazela? Louise desviou o olhar para o pai e depois para Said novamente. — Sim — murmurou. O Sheik respirou fundo, mal conseguindo olhá-la. Aquela era a verdade; não poderia obrigá-la a ficar, porque, apesar de suas ameaças, de sua posse e de seu desejo, ele não tinha a coragem suficiente para forçá-la a ficar. Era diferente de todas as outras vezes, porque havia algo que não o deixava nem mesmo imaginá-la ali como sua prisioneira outra vez. Se era o desejo dela partir, ele entenderia, mesmo que seu peito estivesse daquela maneira, apertando-se tanto que ele poderia morrer a qualquer momento. Said acolheu o rosto dela em suas mãos e se inclinou para beijá-la uma última vez, sentindo o sal de suas lágrimas misturadas ao beijo já tão conhecido; o mesmo beijo que fora capaz de enlouquecêlo logo no primeiro contato, há tanto tempo. Louise não se importou com a presença do pai na sala e o beijou com todo seu amor, sentindo pela última vez os lábios exigentes que domaram os seus com tanta paixão. Ao fim, ela se afastou, olhando para o pai, que indicou a saída. Christopher e lorde Neville conduziram Louise para fora da sala, enquanto Said a fitava. Seus olhos se encontraram pela última vez, e Louise jurou recordar, por todos os dias em que vivesse, os olhos azuis tempestuosos que a fizeram tão feliz. Quando Louise saiu de sua vista, sumindo pelo corredor, Said arrastou-se até seu trono,


sentando-se com um baque. Encostou a cabeça na madeira e fitou o teto, ainda sem conseguir acreditar. Louise o deixara. Ele estava sozinho novamente. E dessa vez seria para sempre.




Capítulo Trinta Eu amo você, Said. Aquela frase retumbava na mente de Said todos os dias, desde que ela partira, há alguns meses. Ele ainda tentava dispersar, sem êxito, a imagem dela afastando-se, deixando-o, mas isso se tornava cada vez mais difícil, porque a visão de seu rosto era a última lembrança que guardava dela. Naquele dia, quando conseguira finalmente compreender o que tinha acontecido ali, na sua frente, quando tinha compreendido que Louise não era mais sua, Said caminhara para fora do palácio, ainda com esperança de encontrá-la voltando para ele. Os dias que tinham seguido sem ela foram, com toda certeza, os mais torturantes de todos os que o Sheik já tinha passado. Nada se comparava à perda, ao abandono. O silêncio no palácio o assustava, quando antes havia a voz de Louise para lembrá-lo a cada momento que ela estava ali. Quando ouvia uma voz feminina ou uma risada, ele imaginava, ansioso, que fosse ela. Mas a verdade era que sua lady já estava muito longe dali. Com o passar das semanas, Said acostumou-se àquela sensação ruim que lhe cercava por todo lado. Achava que, com o tempo, tudo voltaria ao normal e que não se recordaria mais da lady, deixando-a no passado como apenas uma lembrança de tempos felizes. Porém, a cada manhã em que acordava e a cada noite em que se deitava para dormir, ela voltava para atormentá-lo, muitas vezes surpreendendo-o durante o dia, em momentos importantes, quando estava reunido com algum governante aliado ou conversando com o vizir. E as recordações eram de momentos felizes, em que Louise se sujeitava aos seus braços, entregando-se com uma paixão que muitas vezes o assustara. O Sheik deixou de lado o prato com o resto da comida e levantou, caminhando para fora da sala das refeições, decidido a finalmente ter uma boa noite de sono. Eram poucas as vezes em que ele conseguia dormir profundamente, sem ter algum sonho com ela. Ignorou as vozes vindas da cozinha e do final do corredor, dirigindo-se ao seu quarto. Naquela noite, em especial, Said estava sentindo algo diferente. Passara a maior parte do dia no acampamento e, mesmo tentando, não tinha conseguido aliviar o desconforto em seu peito nem a imensa tristeza que sentia. Como fizera em todas as outras noites, ele passou pelo quarto de Louise, ainda trancado desde sua partida. Sempre o ignorara e, por ordem sua, as servas foram proibidas de tocar em qualquer coisa dentro do quarto. Curioso, o Sheik decidiu que naquela noite poderia entrar ali, porque talvez assim a sensação ruim passasse. Entrou no quarto devagar, deixou a lamparina na mesa, ao lado da cama, e logo sentiu o perfume impregnado em cada canto. Respirou fundo, inalando o perfume de Louise. Um arrepio percorreu seu corpo, fazendo-o recordar em detalhes os momentos em que estivera ali, naquele quarto, junto dela. Tocou as mantas e o lençol da cama, levando, em seguida, o travesseiro que ela usava até o rosto,


sentindo o aroma de especiarias, exatamente como o corpo de Louise ficava quando ela banhava-se durante a noite. Said deitou na cama, com a sensação de vazio ecoando por todo o quarto mal-iluminado. Nunca tinha notado como seu palácio era triste sem Louise ali. Será que já era dessa forma antes de ela aparecer? Ele acreditava que sim. Na realidade, há muitos anos, sua vida era daquela forma; vazia e silenciosa. Tinha procurado em tantas mulheres, em seus corpos, o alívio de que precisava, mas tudo fora momentâneo. Ao amanhecer, ele estava sozinho novamente e a cada dia parecia que sua solidão aumentava. Malditos fossem os céus por colocarem Louise em seu caminho! Ele respirou fundo, jogando o travesseiro contra a parede, levantando-se depressa. Seguiu até a janela e apoiou-se, recebendo o ar frio do deserto. Louise era culpada por tudo! Culpada por tê-lo colocado naquela situação. O Sheik virou de costas e deslizou pela parede, sentando-se ao chão. Colocou a cabeça entre as mãos e suspirou, sentindo o peito ardendo, sendo quase impossível respirar. Ele pressionou as mãos contra a fronte e soltou um grito, que ecoou pelo quarto. O que estava acontecendo com ele? — Amaldiçoou-me, mulher — murmurou, sem forças para ficar em pé. Apoiou-se contra a parede e olhou para a cama, vendo com perfeição as cenas de quando teve Louise ali ao seu lado. Recordou a última noite que passaram juntos, quando ele viera até ela, durante a noite, e a possuíra com desespero. Naquele momento ela dissera que o amava. Por Aláh! Said soltou um xingamento em árabe, olhando com assombro para a cama, dando-se conta finalmente do motivo que fizera Louise ir embora. A percepção da realidade também o fez pensar sobre uma questão muito mais importante. Ele a amava? Será que tudo que estava sentindo, o desespero, a angústia, o desejo intenso de vê-la eram na verdade os sinais de que amava aquela mulher? Isso o assustou, e ele precisou ficar de pé, cambaleando até à cama. Deitou de qualquer forma, sem importar-se com as roupas e as sandálias. Precisava ficar ali, mais do que nunca, sentindo o perfume de Louise. Ao acordar na manhã seguinte, antes que o sol nascesse sobre as areias do deserto, o Sheik teve a certeza de que precisava fazer uma grande viagem. Havia algo que precisava ser dito a Louise. *** — O chá está pronto para ser servido, senhorita. Louise levantou os olhos do livro que estava lendo e fitou a jovem de cabelos ruivos que estava em sua frente, com um sorriso tímido. Olhando pela janela, para o sol ardente lá fora, ela considerou


se seria mesmo uma boa ideia beber chá àquela hora. Sentia os pés e as mãos inchadas, estava sendo difícil respirar com todo aquele calor. O ar estava abafado, o que a fazia suar debaixo de todas aquelas camadas de roupas. — Direi a você quando puder trazer, Nelly — respondeu em voz baixa, não querendo acordar o pai, que cochilava do outro lado da biblioteca havia alguns minutos, depois de passar horas lendo. A criada retirou-se em silêncio, fechando a porta com cuidado, e Louise deixou o livro de lado, levantando-se devagar. Foi até a janela e olhou para as campinas esverdeadas que ladeavam uma pequena estrada de terra que conduzia a casa. Estava ali há três meses, por insistência do pai, que lhe garantiu que seria melhor refugiar-se no campo até que todos os rumores a seu respeito passassem em Londres. A lady também concordou, acreditando que, dessa forma, esqueceria o passado mais rapidamente. Mas, ao que parecia, nada era tão fácil assim. Seus dias eram tristes, cheios de lembranças de Said e, por mais que se esforçasse em deixar de pensar nele, via-se muitas vezes recordando os momentos que vivera ao seu lado. Seu amor pelo Sheik continuava ali, mais vivo do que nunca em seu coração. Ela deslizou a mão para o ventre, sorrindo. Apesar de tudo, ainda carregava algo dele consigo. Durante a viagem pelo mar, Louise passara a maior parte do tempo trancada em sua cabine, tendo enjoos terríveis e sentindo que não suportaria chegar à Inglaterra. Porém ela aguentou e, ao chegar a Londres, com alguns quilos a menos, o pai a obrigara a falar com um médico, que confirmou sua gravidez, provavelmente de algumas semanas, tendo em conta os enjoos que sentira. Desesperada, ela conseguira guardar o segredo por um tempo, até que seu ventre começara a crescer, revelando sua condição. O pai, ofendido, comunicara a Louise seus planos de levá-la ao campo, onde ela estaria escondida de todos. Ao menos ele não tentara tirar-lhe o bebê. Isso ela jamais permitiria. Era seu filho, de Said, fruto de algo maravilhoso que ela vivera, dos momentos mais felizes de sua vida. E ninguém iria separá-la dele. Um movimento chamou a atenção de Louise, e ela apertou os olhos, tentando ver o cavaleiro que se aproximava pela estrada de pedra, suspirando ao reconhecer que era Christopher. Esquecera completamente que ele a visitaria naquele dia. Segurou as compridas saias e caminhou até o pai, sacudindo-o pelo ombro, tentando acordá-lo pacificamente. O velho abriu os olhos de repente e se ajeitou na poltrona, limpando a garganta enquanto colocava os óculos deixados de lado. Ele olhou para Louise e sua barriga saliente, fechando a cara, desviando o olhar para o outro lado.


Era visível como ele ainda estava bravo com Louise por tudo que tinha acontecido. — É Christopher. Ele está chegando — informou, dando espaço ao pai. Lorde Neville se pôs a arrumar o casaco e os cabelos despenteados, enquanto avaliava a aparência da filha. Vendo a expressão de desaprovação do pai, Louise olhou para si mesma, perguntando-se se o fato de sua barriga estar tão grande prejudicava tanto assim sua aparência. Será que estava tão ruim assim? Não demorou muito para que a criada voltasse, agora anunciando que lorde Westdiff havia chegado e que esperava para ver lady Louise. — Mande-o entrar, Nelly — lorde Neville ordenou, indo até a mesa perto dos livros, para servir-se de brandy. Louise continuou de pé onde estava, olhando para a porta, até que ela foi aberta e Christopher entrou sorrindo, sempre desenvolto e animado. Ao ver Louise do outro lado da biblioteca, o homem franziu a testa, lançando um olhar curioso ao ventre dela. O pai de Louise limpou a garganta, chamando-lhe a atenção, e ele se recompôs rapidamente. — Lorde Neviile, é um prazer vê-lo novamente. — Aproximou-se da lady e fez uma mesura diante dela, beijando-a na mão em seguida. — Louise, minha querida, está adorável. A lady sorriu, agradecendo o gesto gentil. Viu o sorriso satisfeito do pai e disfarçou o desconforto que estava sentindo. — Pensávamos que havia nos abandonado, rapaz. Estava incerto se estava tentando romper o compromisso com minha filha — lorde Neville comentou, oferecendo ao homem uma taça de bebida. Louise dignou-se a voltar a sentar em sua poltrona, suspirando com o peso de seu corpo. Colocou as mãos sobre a barriga e a acariciou, pensando no quanto gostaria que fosse Said recebendo seus afagos. Christopher riu, sentando em frente à lady, ainda com aquele sorriso estranho nos lábios. — Não poderia estar mais errado sobre isso, lorde Neville. Não tenho intenção alguma de romper meu compromisso com lady Louise. — Bebeu um gole do brandy e deixou a taça na mesa ao lado. — A verdade é que estive preso em alguns problemas em Londres e não pude visitá-la antes. Mas fico feliz em vê-la em tão bom estado, minha querida — falou, olhando mais uma vez para a barriga dela. Incomodada, Louise olhou para o pai, que apenas moveu os ombros, pouco preocupado com a situação. Quando o pai descobrira que Louise estava grávida, fora enfático ao dizer que ele próprio decidiria o futuro da filha. A lady não compreendera muito bem até que, na semana seguinte, ele


anunciara seu noivado com Christopher. Nem mesmo com as longas discussões e pedidos desesperados por parte da filha, o pai reconsiderara a ideia. Conforme acordado, os dois só iriam se casar quando o bebê já tivesse nascido, pedido de Christopher, que alegara não querer acompanhar a gravidez da lady. — Em breve esse pequeno empecilho para o casamento acabará e finalmente vocês poderão ficar juntos, rapaz. Louise se assustou com a atitude do pai, que não demonstrava nenhuma preocupação com seu bebê. — Estou ansioso para isso — respondeu Christopher, bebendo mais do brandy. — Mas não estou aqui apenas para uma visita. Recebi a informação de que a Sociedade de Arqueologia da Inglaterra pretende prestar honras a mim, por minha coragem e envolvimento com a causa — anunciou, orgulhoso. Louise sentiu um golpe no peito ao ouvir aquilo. Assim que chegara a Londres fora levada por seu pai e por Christopher até uma das reuniões da Sociedade de Arqueologia, onde, diante de todos, fora obrigada a contar tudo o que tinha acontecido, todos os detalhes e possíveis descobertas. O ápice de seu desespero acontecera quando, ao dizer que havia partido em busca da cidade perdida, recebera gargalhadas como resposta. — Uma grande tola, é evidente. — Ouvira um dos homens comentar, enquanto ela se retirava do lugar. Humilhada, ela havia se trancado em seu quarto, chorando por horas, decidida a não mais pensar no assunto. Mas agora, ao ouvir Christopher dizer que seria honrado por seus feitos, viu-se novamente à mercê das lágrimas. Não suportava olhar para o homem, sentindo o estômago revirar quando ele lhe tocava ou somente por ouvir sua voz. Não tinha ideia de como sobreviveria a um casamento com ele. Seria obrigada a se casar e não haveria nada que pudesse fazer — Isso é uma ótima notícia, rapaz. — lorde Neville fez um brinde em direção ao homem, que o imitou, sorrindo. — Se me derem licença, preciso ir até meu quarto. Estou um pouco enjoada — Louise disse, levantando-se e indo para a saída, sem importar-se com a resposta. Quando estavam sozinhos, Christopher deixou a taça novamente sobre a mesa e bufou irritado. — Não a vejo muito disposta a esse casamento, Neville. O velho olhou para a porta, ainda pensando na filha. — Falarei com ela. Christopher ficou de pé e apontou na direção do outro homem.


— Espero que honre nosso compromisso ou sabe exatamente o que vai acontecer — disse, em voz baixa. Lord Neville engoliu em seco, ajeitando a gola da camisa. — Não se preocupe, rapaz. Assim que a criança nascer, as coisas ficarão mais fáceis — garantiu, nervoso. — Precisarei pensar em algo, não suportarei olhar para essa criança — Christopher disse, olhando para Neville. O velho apenas desviou olhar. *** Said entregou ao cocheiro as moedas de ouro que carregava na pequena bolsa presa ao corpo e montou no cavalo negro. Segundo as informações que havia conseguido no povoado, a casa não estava muito longe dali e, se ele se apressasse, chegaria antes da noite. Estava terrivelmente cansado devido às semanas de viagem, desde que deixara o porto de Harif. Enfrentara muitas dificuldades, entre elas o ataque de ladrões, enquanto seguia para Londres, e a horrível visão daquela cidade, a cidade de sua mãe. Ali, procurara por Louise, encontrando a grande casa na região mais nobre da cidade, mas, ao chegar lá, fora informado que a lady partira para o campo junto do pai, há alguns meses. Ele chegara atrasado. Said podia compreender o amor que a mãe sentia por aquela terra. Os campos eram belos, e o ar, mais fresco, o que tornava o cavalgar mais fácil, já que ele estranhara os cavalos ingleses, tão diferentes dos dromedários. Entristecia-se por não recordar exatamente o nome do lugar onde sua mãe vivera, pois desejava saber mais sobre a paixão dela pela Inglaterra. Podia jurar que era por aqueles campos tão verdes e pelas florestas escuras. Esporeou o cavalo, disposto a sentir o vento fresco em sua pele, enquanto seus pensamentos voltavam a ela. Durante todo aquele tempo, em que o Sheik atravessara terras e mares, não houve sequer um dia em que a lady inglesa deixara de ser lembrada por ele. A certeza de encontrá-la novamente o fazia continuar seguindo, enfrentando o que fosse necessário para tê-la em seus braços mais uma vez. Said refletia muitas vezes, tentando imaginar como ela estava, se mudara muito em todos aqueles meses e se ainda se lembrava dele. Esse era seu medo; Louise poderia ter lhe esquecido ou se arrependido, dando-se conta de que não era “amor” aquilo que sentia por ele, e sim apenas paixão, como ele mesmo pensara que fosse. Evitava pensar que ela o rejeitaria, porque somente o pensamento de sua negação aos sentimentos lhe causava dor física, diretamente em seu peito. O Sheik considerava que a viagem o tinha ajudado a compreender melhor suas próprias emoções. Muitas vezes, enquanto debruçava-se


sobre a murada do navio, pensava em toda a situação, desde o momento em que vira Louise pela primeira vez, sob a mira de cimitarras, até a última visão quando ela lhe dissera adeus. Ele refrescou-se com a água que carregava na bolsa e depois olhou para cima, calculando quanto da luz do dia teria até chegar a casa. Não queria ter que passar mais uma noite sob apenas a luz da lua, como tinha feito quando não encontrara uma hospedaria no caminho. Em um desses estabelecimentos ocorrera uma das situações mais inusitadas; uma mulher se aproximara dele, que jantava em um canto do salão. Ela usava um vestido de pronunciado decote, e os cabelos louros caíam soltos sobre os ombros. Ofereceu-se a ele sem vergonha alguma, dizendo-lhe exatamente o que faria se os dois subissem até o quarto. Achando engraçado tudo aquilo, Said tinha sacado duas moedas de ouro de seu bolso e dado a ela, que, assustada, havia chorado, quase se ajoelhando aos seus pés, contando sobre a filha que precisava alimentar e do marido falecido. Said havia rejeitado a mulher, assim como vinha fazendo desde que Louise o deixara. No palácio, estivera isolado de todas, exceto Najila e Karida, que o ajudavam. Durante a viagem não foi diferente, as mulheres a serviço dos homens ofereceram-se para satisfazê-lo, mas ele simplesmente as ignorara, o que, antes de conhecer Louise, não faria. Algo havia mudado. E agora ele sabia exatamente o que era. Said repreendeu-se, sabendo que, caso se deixasse consumir pelos pensamentos, não chegaria a tempo, e o que ele mais queria era vê-la ainda naquele dia. *** Louise forçou mais uma vez a colher contra os lábios, tentando ingerir a sopa de nabos que lhe fora preparada. Outra vez. Desde que chegara ao campo, por ordem de seu pai, Nelly e as outras criadas foram orientadas a preparar-lhe somente sopa para o jantar, o que a estava deixando cada dia mais enjoada, sobretudo naquela noite, em que Christopher estava compartilhando a refeição com eles. Sentado em sua frente, o homem devorava a carne de faisão assado e as batatas, que pareciam muito suculentas. Ela olhou para a água rala em seu prato e engoliu o gosto amargo em sua boca. — Sente-se bem, querida? — Christopher perguntou, de boca cheia. Louise limpou o canto da boca com o guardanapo e não respondeu. Ignorou também o pai, que a fitava furtivamente. O que mais desejava era subir para seu quarto e ficar ali até que Christopher tivesse partido. Mas ela sabia que não seria assim, porque provavelmente ele a conduziria até a biblioteca, onde lhe diria coisas sobre amor, que a deixariam irritada, e, depois que ela subisse para dormir, ele também dormiria ali na casa. E foi o que aconteceu, quando, ao terminarem a refeição, o homem a pegou pela mão e a levou até a biblioteca, fazendo-a sentar-se ao seu lado enquanto lia um livro com pequenos versos. Louise fechou os olhos e fez o que sempre fazia; fugia mentalmente dali, pensando em Said, no palácio, no


deserto. — Creio que não esteja muito satisfeita com minha leitura, Louise — Christopher disse ao parar de ler. — Estou apenas cansada — ela respondeu, sem olhá-lo. O som do livro sendo fechado com força foi ouvido por Louise, que abriu os olhos para encontrar Christopher a encarando. — Sabe que deve se submeter a mim, querida. Lembre-se do que me prometeu. — Ele a segurou pelo queixo, forçando-a a olhar em seus olhos. Ora, ela nunca se esqueceria daquele dia. Jamais em todos os seus dias. . Por causa dele, fora obrigada a deixar Said. Na última noite no reino, quando deixara o quarto, com Said dormindo em sua cama, Louise encontrara Christopher, que a abordara, ameaçando fazer mal ao seu pai, caso ela não concordasse com seus planos. Afastando-se da mão dele, Louise caminhou até os livros, procurando por algo que a fizesse esquecer a presença dele na sala. Seu pai apareceu logo depois, carregando um de seus diários, indo até Christopher, possivelmente começando mais uma de suas explicações sobre alguma escavação. Passariam horas assim, ela sabia. Pegou um livro qualquer e voltou para sua poltrona, tentando distrair-se da conversa dos dois. Mais de uma hora depois, ela queria desesperadamente descansar. Suas costas latejavam e os pés estavam inchados demais. Tudo o que desejava era deitar-se. Mas, antes que ela pudesse levantar, uma das criadas apareceu à porta. — Há alguém que deseja vê-la, senhorita — informou a jovem. Louise franziu a testa, curiosa ao receber uma visita àquela hora. — Seja quem for, diga para voltar amanhã — interferiu lorde Neville. A lady ficou em pé, ajeitando as saias do vestido. — Ele disse quem é, Susan? — perguntou. — Não, senhorita. Apenas disse que precisava vê-la — a criada respondeu, desconcertada. — Mande-o entrar, Susan — Louise ordenou. A jovem se retirou com um aceno e a lady notou as expressões de Christopher e do pai, que não pareciam contentes com ela. Ignorando-os, ela esperou pelo homem. Nada, em toda eternidade, a teria preparado para ver aquela pessoa entrar na biblioteca. Poderia ser algum tipo de visão ou, talvez, um sonho, mas ela queria acreditar que sim, aquele homem ali, em sua frente, era Said. Abriu a boca para dizer qualquer coisa que fosse, mas sua voz não saiu. Seus olhos queimaram, as lágrimas descendo por seu rosto, enquanto as mãos caíam para a barriga.


Oh, Deus, ele estava ali! Said viera por ela. *** O Sheik prendeu a respiração ao vê-la. Primeiramente seus olhos caíram para seu rosto, exatamente como antes, apenas um pouco mais cheio e pálido. Em seguida foi inevitável não notar o ventre inchado dela. Ele levou alguns segundos até finalmente perceber o que estava acontecendo ali. Suas pernas não o deixavam mover-se e seu coração parecia querer arrebentar-se contra seu peito. Foi ela quem falou primeiro, tirando-o do transe. — Said, é você? — a voz exatamente como ele lembrava. — Sou eu, meu amor — ele respondeu, resolvido a tê-la em seus braços, mas, ao primeiro passo, Christopher apareceu em sua frente. — Deixe-a em paz. Não toque nela — o homem disse, apontando o dedo para o peito de Said. O Sheik o enfrentou, empurrando-o para o lado. E fez o que desejava há meses, foi até Louise a tocou. Ela gemeu quando ele a envolveu nos braços, abraçando-a com cuidado. — Não consigo acreditar que está aqui — ela murmurou contra o peito dele. Said beijou-a no topo da cabeça. — Eu precisava vê-la novamente, há algo que eu não disse. — Ele a segurou pelo rosto, sorrindo emocionado. Ao lado dos dois, Christopher tentou interromper, mas lorde Neville o segurou pelo braço, impedindo-o de se mover. — Oh, peço que me perdoe por ter partido, mas eu precisava... — ela disse, chorando. Com uma das mãos em suas costas e a outra em seu rosto, Said beijou-a nos lábios ternamente, apenas um roçar. Ela suspirou, fechando os olhos. — Preciso que me escute, gazela. Abra os olhos para mim — ele pediu, acariciando-a com o polegar. — Precisei ficar sozinho e sentir sua falta para compreender minhas emoções. Tive que viajar por mar e terra, sob chuva e sol para encontrá-la, porque precisava lhe dizer algo muito importante — e olhando-a nos olhos, o Sheik disse o que descobrira: — Eu a amo, Louise Manning. Amo você com minha alma, com meu corpo e tudo que posso oferecer a ti. — Oh, Said... — Eu ainda não terminei, meu amor — ele a interrompeu. — Estou aqui também para implorar que me perdoe por tudo. Por fazê-la minha prisioneira, por muitas vezes não ser correto contigo. Sei que não mereço seu perdão, mas eu sou egoísta o suficiente para pedi-lo desesperadamente. Louise respondeu escondendo o rosto no peito dele, voltando a chorar. Assustado, ele a abraçou,


sentindo a barriga arredondada contra seu corpo. Ela disse algo a ele, mas sua voz soou abafada. — Acalme-se, gazela. — Afastou-a um pouco. — Eu disse que o perdoo, Said — Louise disse, limpando as lágrimas com o dorso da mão. — E que também o amo. Ele sorriu, dando-lhe um beijo na testa. — Não dirá a ele, Louise? — Christopher disse, soltando-se de lorde Neville. Ele se colocou na frente dos dois e indicou a barriga da lady. — Eu mesmo terei que contar sobre nosso filho? Louise arregalou os olhos, colocando as mãos no ventre. Olhou para Said, esperando ver a explosão de ira nele. — Exatamente o que está ouvindo, Said. O filho que ela está carregando é meu. Estamos noivos, na realidade. Pode negar isso, querida? — Sorriu em direção a Louise. Ela sentiu os braços de Said deixarem sua cintura, e ele se afastar. — Said... — falou, tremendo por inteiro. Ele deu as costas a ela e respirou fundo. Oh, por favor, não... Não agora. Acredite em mim, meu príncipe. — Como pode achar que eu acreditaria em você, Christopher? —Said perguntou, virando-se para ele lentamente. — Antes de matá-lo, farei com que peça perdão por isso. Rindo, Christopher caminhou até a mesa de bebidas, ao lado de Louise, onde serviu uma dose de brandy e o bebeu em um único gole. Acompanhando o olhar do Sheik, ele quebrou a taça contra a mesa e correu até Louise, empurrando o caco de vidro contra sua garganta. — Afaste-se — ameaçou, girando o objeto cortante nas mãos, diante de todos. Said controlou a respiração, sabendo que precisaria de calma para conseguir salvar Louise. — Christopher, não faça isso. — Era lorde Neville, tentando se aproximar. — Fique onde está ou eu a matarei — disse, sorrindo largamente. — Acreditou realmente que viria até aqui e a tomaria novamente como sua escrava? Sinto em dizer-lhe, mas isso não será assim tão fácil, Sheik. — Deixe-a ir. Ela e o bebê não têm nada a ver com isso. — Said abriu os braços. — Lute comigo, mate-me se desejar, mas deixe-a partir. Sabendo que não conseguiria sair dali com Louise, Christopher a empurrou para um lado, quase a derrubando. Empunhou a taça quebrada e rugiu contra Said, tentando feri-lo. O Sheik desviou a tempo, golpeando-o nas costas. Tentou imobilizá-lo, mas o inglês foi mais rápido, cravando-lhe o vidro no braço, fazendo-o cair. O homem aproveitou para chutá-lo no rosto com suas botas e, quando Said estava quase inconsciente, abaixou-se para matá-lo com um golpe diretamente no coração.


Louise gritou, segurando-se à janela e, junto de seu grito, houve um estampido. Em seguida o corpo de Christopher caiu ao lado de Said, imóvel. Said e Louise olharam para lorde Neville, que empunhava uma arma, a mão trêmula, os olhos como dois pratos. — Pai... — A filha se esforçou para chegar até ele, mas o lorde a impediu. — Eu o matei — ele disse. O Sheik ficou de pé, ainda zonzo. Conferiu o buraco da bala, que havia se cravado nas costas de Christopher e atravessado seu peito, uma grande poça de sangue se formando ao lado de seu corpo. Ele caminhou até lorde Neville e tranquilamente retirou a arma de suas mãos. — Está acabado — Said disse enquanto retirava a munição da arma. Lorde Neville se sentou, Louise ao lado dele, ajudando-o. — Ele me chantageou — contou, olhando para o corpo inerte sobre o tapete. — Forçou-me a obrigá-la a casar com ele. — A mim também, pai. Christopher fez-me deixar Said, dizendo que, se eu não fizesse, mataria o senhor — Louise confessou, segurando-o pela mão. O pai baixou a cabeça, indignado. — Pensei que havia voltado porque desejava, filha. — Eu não queria. Meu lugar é ao lado de Said, pai. Eu lhe disse que o amava — ela recordou, olhando para o amado. Suspirando, lorde Neville encarou Said, que continuava mudo, assistindo à cena. — Veio até aqui por minha filha? Por que a ama? — perguntou sério. — Porque sua filha é minha vida e o lugar dela é ao meu lado, em meu reino. — Sabe que seu povo não aceitará Louise como sua esposa, verdade?! — o lorde perguntou. Said concordou. — Penso que talvez seja o tempo de mudanças. Algumas leis devem ser mudadas e eu farei isso assim que regressar. Abrirei mão do que for preciso para ter sua filha comigo novamente, senhor. Só Aláh sabe o que passei nos últimos meses — disse, sua voz soando tensa. — Bem, como pode ver, houve uma consequência do tempo que minha filha passou ao seu lado — Neville falou, e todos olharam para o ventre de Louise. O Sheik sorriu. Seu filho. — Estou surpreso por saber que serei pai — comentou, ainda sem desviar o olhar de Louise. Lorde Neville se encostou à cadeira.


— Não pense que levará minha filha desta forma, sem nenhum tipo de compromisso, como se ela fosse uma... — Pai, por favor — Louise o interrompeu, com o rosto em chamas. — Estou preocupado com você, filha. Da outra vez, ele a raptou e a manteve prisioneira. Como posso estar seguro de que ele não fará novamente? Não posso permitir tal coisa. Louise lançou um olhar de desculpas a Said. Ele, muito sério, tomou-a pela mão, beijando-a sobre os dedos. — Porque eu me casarei com ela assim que for possível. Sua filha voltará para o deserto como minha esposa, senhor. — Ele sorriu de canto. — Se ela assim desejar. Emocionada, Louise o abraçou, ainda pouco acostumada com a barriga entre os dois. — Eu aceito! — exclamou, rindo. Said a abraçou, mas, quando ia beijá-la, ouviu o velho lorde limpando a garganta. Louise e o Sheik olharam para Neville. — Estou me sentindo um pouco incomodado com esse corpo em minha biblioteca. Penso que seja melhor sairmos daqui, enquanto planejo como explicar esse incidente ao juiz. Todos concordaram, principalmente Louise, que, mesmo sob os protestos do pai, levou Said até seu quarto. *** — Posso tocar? — o Sheik perguntou, fitando o ventre de Louise. Ela segurou suas mãos e as levou até sua barriga, vendo-o sorrir quando a tocou. — Teremos um bebê, Said. Em três meses ele estará em nossos braços — a lady falou, tocando-o no rosto. — Queria ter estado ao seu lado desde o começo — ele disse, ficando triste de repente. — Mas agora você está aqui, meu príncipe — falou ela, puxando-o para um beijo. — E preciso alertá-lo sobre algo importante. — Do que se trata? — Said perguntou, enquanto depositava beijos no pescoço de Louise, deslizando os dedos para dentro do decote dela. Arfando, a lady o segurou pelos cabelos, para que a olhasse. — Assim que nos casarmos, você pertencerá a mim. Será apenas meu. O Sheik sorriu maliciosamente, puxando o vestido dela pelos ombros. — Estou começando a achar grande vantagem em nosso casamento, gazela. Quando deseja casarse? — sussurrou, lambendo um mamilo endurecido. Surpreendeu-se ao encontrar os seios mais cheios, depois de remover as várias camadas de roupas. — O mais rápido possível — gemeu ela, sentindo o efeito das carícias dele.


— Ouviu isso? — perguntou ele, erguendo a cabeça. — É provável que meu pai esteja tentando encontrar uma boa história para contar ao juiz ou, talvez, tentando arrombar nossa porta —explicou, rindo. *** Casaram-se um mês depois, próximo ao solar de lorde Neville, na pequena capela, que, para a ocasião, foi toda decorada com flores amarelas colhidas no campo. Poucos presenciaram a união da lady e do Sheik, apenas os criados da casa e o pai de Louise, que, sentado no primeiro banco, emocionou-se com as palavras do padre. Este precisou apressar a cerimônia, por ordens do Sheik, que tinha pressa. O vestido da lady precisou ser refeito três vezes, devido ao seu aumento de peso, o que a fez reclamar e chorar várias vezes, dizendo que sua circunferência assemelhava-se a de um dromedário fêmea prestes a parir, algo que certamente ela ainda não tinha visto. O pai tinha protestado, dizendo que poderiam esperar até que o bebê nascesse, mas mudou de ideia quando a filha novamente voltou a chorar em sua frente. Said usara a horrível roupa inglesa, que não lhe agradava em nada; por Louise, fizera o esforço. Porém, quando regressassem ao deserto, ele mesmo se incumbiria de preparar o casamento segundo suas tradições, para que todos vissem a lady como sua esposa. — Eu não sei como faremos isso — Louise falou enquanto Said retirava seu vestido, mais tarde, quando já tinham deixado a festa e seguido para o quarto. — Deve haver uma maneira. Podemos tentar outras posições —opinou ele, puxando os laços, tentando desamarrá-los. Quando conseguiu soltá-los, Louise respirou fundo, liberando o ar dos pulmões. — Acho que talvez, por agora, devêssemos apenas nos deitar —sugeriu ela, realmente cansada. — Será que poderá esperar até que o bebê nasça? O Sheik arrumou a cama e voltou para ajudá-la a se deitar, a enorme barriga tornando incômoda qualquer posição. Ele se colocou ao lado dela, abraçando-a o quanto conseguia. — Posso esperar o quanto for preciso, meu amor. — Beijou os lábios dela e suspirou. — Até lá penso em fazer algumas coisas. — Algo em especial? — Já que estou na Inglaterra, pensei que eu poderia saber mais sobre minha mãe e talvez conhecer um pouco mais de minha descendência. Se pudesse, Louise teria se jogado sobre ele, tamanha sua alegria. — Por que essa mudança tão grande? — Por você, por nosso filho. Ele será inglês, nascerá aqui. Minha mãe ficaria feliz em saber que


estou fazendo isso. — Sim, ela ficaria — garantiu ela, já sentindo o tão conhecido ardor nos olhos. — Ora, precisa parar de me fazer chorar! Sorrindo, Said virou-se para ela. — Eu consigo pensar em algumas maneiras de fazer isso, meu amor — disse, levando as mãos até os seios dela. Se não podiam fazer amor, ele ao menos lhe daria um pouco de prazer. Satisfeita, plenamente feliz, Louise sorriu. — Amo você, meu príncipe. Ele soltou uma gargalhada, que poderia acordar todos na casa, mas realmente não se importava. — E eu amo você, minha gazela — sussurrou no ouvido de Louise, as mãos e a boca muito ocupadas.



Epílogo Louise podia afirmar, com toda a convicção, que jamais, em toda sua vida, sentira tanto amor como no momento em que segurou pela primeira vez aquela pequena bolinha de cabelos escuros, que chorava terrivelmente em seus braços. Era madrugada, e o doutor, depois de quase ser ameaçado de morte por um Sheik poderoso, permitiu que o homem entrasse no quarto e conhecesse sua filha. O primeiro contato, o primeiro toque na pele sensível, fez com que o homem de aparência robusta e expressão séria se emocionasse como uma criança. Para a esposa, que não deixava de contemplar a filha alimentando-se em seu seio, mesmo exausta, era provavelmente uma cena que jamais sairia de sua mente. Quando o marido beijou com delicadeza a cabeça da filha, a lady não suportou mais segurar as lágrimas e permitiu-se chorar. — Ela é tão linda — disse Said, apoiado à beira da cama, com medo de machucar as duas. — Escolheu o nome, gazela? Louise pensou por um momento e sorriu, sabendo exatamente que nome deveria colocar na filha. — Zara — respondeu, procurando o olhar do marido, esperando a reação dele. Said sorriu, beijando o rosto da esposa, voltando a atenção novamente para a filha. Simplesmente não conseguia desviar o olhar daquele pequeno ser, parte dele. — Princesa — sussurrou. — Zara quer dizer princesa em nossa língua. — Não consegui pensar em um nome mais perfeito — falou Louise, segurando a mão de Zara. — Obrigado, meu amor — disse Said, beijando Louise novamente. Os dois ficaram juntos apenas mais alguns minutos, até que a porta foi aberta e o doutor entrou, dizendo ao Sheik que precisava se retirar, para que Louise descansasse. Mesmo contrariado, Said despediu-se das duas e deixou o quarto, ansioso para conversar com o pai de Louise, que esperava na biblioteca. Encontrou o velho senhor sentado próximo à lareira, com uma taça de bebida escura nas mãos, encarando o fogo com algum tipo de pensamento importante. Ao ver o marido da filha, Lorde Neville apenas fez um gesto para que ele se sentasse na cadeira ao lado. — É uma menina. Zara — Said contou, servindo-se do Porto, bebida que tinha aprendido apreciar naqueles meses que passara na Inglaterra. Certamente levaria algumas garrafas para Hamed. — Lembro-me de quando Louise nasceu — comentou o lorde, ainda olhando para as chamas. — Pensei que iria enlouquecer com todos aqueles gritos e, quando acabou, eu queria apenas abrir uma garrafa de bebida e relaxar. Mas é claro que todo o trabalho havia sido feito por minha esposa e eu, como o cavalheiro que era, coloquei-me ao lado dela, velando seu sono durante toda a noite. O Sheik tinha começado a apreciar as conversas de seu sogro, mesmo que ainda sentisse certo


receio em relação ao que acontecera a respeito de Christopher, a chantagem contra Neville, ameaçando machucar Louise se o lorde não concordasse em lhe entregar a mão da filha. O mesmo acontecera com Louise, que se vira forçada a partir, para salvar a vida do pai. Além de tudo, como se todas as maldades do mundo não bastassem para Christopher, o homem ainda planejara o ataque contra a equipe de Louise. Porém o plano acabou saindo de seu controle, já que o acordo com os salteadores era de que o assalto ocorresse somente depois que a cidade e os artefatos fossem encontrados. Na ocasião, ao ouvir a conversa, quando seu pai contara o que Christopher revelara, a lady emocionara-se, porque, enfim, soube que nada do que acontecera fora culpa sua. Said decidiu não responder ao velho, ciente de que ele estava apenas relembrando momentos e que o que se fazia necessário naquele momento era apenas o silêncio. Ele gostava disso na Inglaterra, o silêncio do campo, apesar de que sua experiência em Londres, semanas antes, tinha sido extremamente desagradável. Por insistência de Louise e também por decisão própria, valendo-se da ajuda de um investigador, Said conseguira saber mais sobre sua mãe. Encorajado, viajara algumas milhas, até chegar a uma imponente casa no campo, onde, para sua completa surpresa, fora recebido por uma gentil senhora, que, logo que o vira, atentara-se para a familiaridade de seus olhos azuis. Naquela agradável tarde em companhia da mulher, que, segundo descobrira, era sua tia, Said tivera acesso a um álbum com alguns retratos de uma jovem mulher de cabelos longos, que sorria encantada para o retratista. — É sua mãe — a velha contara, emocionada. No final da pequena reunião, a tia lhe explicara como a irmã havia se apaixonado pelo Sheik, a quem conhecera em Londres, e sobre a paixão que a fez abandonar tudo para seguir com ele para um deserto distante. Segundo a velha senhora, era um amor tão forte que foi capaz de fazer com que a mãe de Said abdicasse de sua vida perfeita, pelo homem que queria ao seu lado. Quando deixou aquela casa, carregando no bolso o retrato da mãe, o Sheik sentia-se satisfeito. Ao que parecia, para aplacar seu ódio pela Inglaterra e suas origens fora necessário viajar até ali, saber mais sobre o sangue que corria em suas veias e a cor tão bela de seus olhos, algo de que agora, certamente, teria orgulho. — Está na hora, senhor. — Era um dos guardas chamando Said. O sheik acenou para o homem, que se retirou do aljibe. Olhou mais uma vez para o retrato da mãe e, sorrindo, guardou-o no bolso da calça branca. Era fácil perder-se em pensamentos, recordando tudo que passara na Inglaterra. Durante a viagem de volta, tornara o navio um verdadeiro inferno, ao perceber que havia perdido o retrato da mãe. Colocara uma dúzia de marinheiros para


ajudar a procurar, alegando que era um bem maior. Horas depois o encontrou debaixo da cama, caído junto de um livro da esposa. Apesar do momento constrangedor, havia se sentido aliviado. Said ajeitou novamente o turbante em sua cabeça e os botões da camisa que usava. Especialmente naquele dia, precisou vestir-se da melhor maneira possível. Satisfeito, ele deixou o aljibe e caminhou até o quarto, onde encontrou Louise com a filha nos braços, sentada em seus joelhos. Ele se apoiou no batente da porta para observar as duas, especialmente a filha, que parecia encantada com o que a mãe dizia, mesmo ainda não compreendendo. — E então, com suas histórias, Sherazade conseguiu envolver o rei Shariar por mil e uma noites, tempo suficiente para que ele se encantasse por ela, contando-lhe a cada noite uma história diferente, que sempre acabava em um momento importante — contava Louise, segurando os bracinhos da filha. — Acho que já ouvi essa história — disse Said, fazendo-se ver no quarto, indo até as duas. Louise sorriu, sabendo que o marido falava dela e de sua artimanha para tentar seduzi-lo, a fim de que ele poupasse sua vida. Infelizmente ela não fora bem-sucedida em seu plano, mas acabara encontrando, assim como Sherazade, o amor verdadeiro. Sentia apenas falta de seu pai. O lorde prometera visitá-la em breve, já que descobrira uma nova informação, possivelmente verdadeira, sobre a cidade perdida de Al-Delíh, o que pretendia ele mesmo investigar. A lady esperava que ele realmente estivesse certo; seria maravilhoso. — Pode segurá-la para mim? — pediu ao marido, erguendo Zara. Ele a tomou nos braços, balançando-a de um lado para o outro, indo até a janela. A lady aproveitou o momento para prender a faixa do vestido, que descia até os pés, um tom de roxo-escuro, escolhido ainda na Inglaterra. Era de um tecido leve, adornado com pequenas pedras e fios de ouro, bordados por ela mesma. — Está preparada? — Said perguntou ao voltar até ela, Zara mais calma em seus braços. — Estou — Louise garantiu, sorrindo. Said ofereceu o braço a ela, e os três deixaram o quarto. *** Ao chegarem ao lado de fora do palácio, Louise e a filha foram conduzidas pelas mulheres do acampamento até uma tenda mais afastada, onde todas, muito ansiosas, esperaram o decorrer da situação. Ela deixou a filha nos braços de Karida, que sorria largamente. — Ele está vindo! — uma menina mais jovem anunciou, entrando na tenda, as bochechas vermelhas de vergonha. Todas as mulheres correram para fora da tenda, deixando a lady sozinha, como mandava a tradição. Louise apressou-se em ficar de pé no centro da tenda e, quando Said entrou, tentou parecer


tranquila. O Sheik apresentou-se a ela e, limpando a garganta, começou a entonar um poema em árabe, o qual falava sobre o calor do deserto e do quanto um homem havia viajado para encontrar sua amada. Como ninguém os via, Said rodeou Louise, recitando algo sobre a pele quente da mulher e o toque em seu rosto. Ela prendia a respiração, afetada por todas aquelas palavras. No final Said se colocou aos seus pés de joelho e ofereceu-lhe a mão, em um gesto que, mesmo sem palavras, significava muito. Sorrindo, ela colocou a mão sobre a dele, que logo se colocou de pé e a tomou nos braços. Antes que pudesse beijá-la, no entanto, a tenda foi invadida pelas mulheres, que riam e falavam todas ao mesmo tempo. Said roubou um beijo da esposa e saiu, indo preparar-se para a cerimônia. Na Inglaterra, Louise e Said casaram-se poucas semanas antes do nascimento de Zara, certamente um casamento escandaloso, aos olhos da sociedade, mas emocionante, ao ser celebrado na capela da família, na propriedade. A pequena igreja fora decorada com flores e apenas os empregados, além de lorde Neville, assistiram à união da lady com o Sheik. Louise caminhava para fora da tenda, o véu cobrindo rosto. Junto das mulheres, encaminhava-se ao centro do acampamento, onde toda a tribo estava reunida, tendo ainda mais certeza de seu amor por aquele homem. Ele a esperava próximo à fogueira, vestido em sua roupa branca e dourada, com sua cimitarra na cintura, os olhos azuis cintilando na direção dela. O curandeiro da tribo, também responsável pelas uniões, iniciou a cerimônia, lendo algumas partes do Corão. Louise fitava o marido, que não desviava, sequer por um segundo, o olhar do seu. Ela tinha o rosto coberto, os olhos expostos, como uma típica mulher árabe, e realmente sentia-se assim. Said tomou as mãos dela nas suas e surpreendeu-a ao dizer: — Tudo que sou passa a ser teu, meu corpo, minha alma, meu amor. Cada pedaço de mim pertence a você, Louise. Quando ela pensou em dizer qualquer coisa, Said quebrou todas as regras, puxando-a para seus braços e a beijando. Os dois mal notaram quando o homem anunciou que estavam casados, e todos a sua volta gritaram e aplaudiram. Naquele momento todos os antigos medos de Louise estavam perdidos. O povo de Said a aceitara, ela estava ao lado do homem que amava e de sua filha. Zara foi colocada em seus braços, e as duas foram envolvidas por Said, que beijou cada uma, verdadeiramente emocionado. — Estou completo, gazela — anunciou ele em meio às comemorações, que se seguiriam por mais


dois dias no reino. — Amo-a mais do que achei ser possível. Ela sorriu, descobrindo o rosto, revelando-se para ele. — Agora sou de seu povo, sou do deserto, meu amor. Aqui é meu lugar, nosso lugar. Ele voltou a beijá-la, enquanto Zara resmungava segurando em suas roupas. Said se afastou e a tomou nos braços, olhando com interesse para a filha. Sim, certamente estava completo. Não havia nada mais que fosse capaz de querer. Tinha tudo que desejava. Banhados pelo brilho do sol, que se punha à distância, nas dunas de areia, o poderoso Sheik de Hamed, Príncipe do Deserto, abraçou sua esposa, a estrangeira de temperamento difícil, que o fizera encontrar o amor e sua redenção. E viveram felizes para sempre.




A autora

Elissande Tenebrarh é uma jovem autora do interior do Paraná. Descobriu na leitura uma maneira de viajar para todos os cantos do mundo apenas abrindo as páginas de um livro. De seus pequenos poemas nos tempos de escola, para os dias atuais com seus livros de romance, como uma criança sonhadora, Elissande deseja encantar as pessoas com seu trabalho em cada parte do mundo.



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