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Paladar eclético

Temida pela capacidade de provocar danos, associada à dificuldade de controle na cultura da soja convencional, a lagarta falsa-medideira, caracterizada também pelo hábito de polifagia, foi encontrada na cultura do milho convencional em infestação numericamente inédita. Produtores rurais e técnicos devem ficar atentos contra eventuais prejuízos econômicos. Identificar e associar práticas de manejo já utilizadas e consolidadas podem auxiliar no controle

Conhecida popularmente como lagarta falsa-medideira, devido ao seu deslocamento dobrando o corpo em movimentos do tipo “mede-palmo”, por muito tempo, essa praga foi referenciada cientificamente como Pseudoplusia includens e, posteriormente, reclassificada no gênero Chrysodeixis includens (Goater et al, 2003). Sua distribuição geográfica está limitada ao ocidente, ocorrendo entre o extremo Norte dos Estados Unidos ao Sul da América do Sul. Pode ser encontrada em diversas culturas como feijão, fumo, girassol, hortaliças, tomate, dentre outras. Todavia, no Brasil, é comum nas regiões produtoras de soja, simultânea ou mais tardiamente em relação às populações da lagarta-da-soja (Anticarsia gemmatalis), uma vez que o aumento do número de indivíduos está geralmente relacionado ao cultivo de algodão em localidades próximas.

Relativo ao ciclo de desenvolvimento na soja (Figura 1), a mariposa realiza posturas isoladas, com ovos globulares, medindo cerca de 0,5mm de diâmetro, de coloração creme-clara logo após a oviposição e marrom-clara próximo à eclosão das larvas. O desenvolvimento embrionário se completa em torno de três dias. As lagartas que eclodem são de coloração verde-clara, com listras longitudinais brancas e pontuações pretas, atingindo de 40mm a 45mm de comprimento em seu último estádio larval. Dentro de cada instar, enquanto se alimenta, a lagarta sofre uma perceptível mudança na coloração, de verde amarronzada clara, para verde-limão translúcida. A injúria na planta é caracterizada pela desfolha de aspecto “rendilhado”, em que as nervuras são preservadas. Após o último instar larval, se transforma em pupa que ocorre sob uma teia, em geral, na face abaxial das folhas. A coloração da pupa vai de amarelo-pálida a verde-clara no início do desenvolvimento, com pigmentação dorsal irregular até 48 horas antes da emergência do adulto com duração média de 7,4 dias. Com o passar dos dias, as pupas tornam-se mais escuras, posto que a coloração é afetada pelo tipo de dieta que a lagarta consumiu. Os adultos são mariposas com 35mm de envergadura de asas dispostas em forma inclinada. As anteriores são de coloração escura, com duas manchas prateadas brilhantes na parte central e as posteriores de coloração marrom.

Considerada praga secundária até o final da década de 1990, raramente exigia medida específica de controle, pois era naturalmente mantida em equilíbrio por epizootias. Assumiu importân

Eduardo Lima do Carmo

Figura 1 - Ciclo de desenvolvimento da lagarta falsa-medideira em soja. Fonte: Reide; Greene (1973); Vásquez (1988)

cia agrícola no Brasil e status de praga-chave com o advento da doença ferrugem-asiática (Phakopsora pachyrhizi) na cultura da soja (2001/2002), visto o desequilíbrio do agroecossistema causado pelas aplicações sequenciais de fungicidas associadas ao uso de pesticidas não seletivos, os quais prejudicam a ação de controladores biológicos, como os fungos entomopatogênicos, predadores e parasitoides, respectivamente (Bueno et al, 2007). Adicionado a isso, há dificuldade de obter eficiência de aplicação, visto a lagarta surgir e posicionar-se com maior abrangência no terço médio das plantas em avançado estádio de desenvolvimento vegetativo. Contudo, a expressiva introdução de materiais geneticamente modificados suprimiu sua ação de desfolha na oleaginosa, eficazmente.

Contrariamente, o cultivo de híbridos de milho convencional tem se intensificado nos últimos anos devido ao custo de aquisição de sementes, bem como pela ineficácia de controle que algumas tecnologias transgênicas estão apresentando. Embora já relatada a presença da falsa-medideira na cultura do milho convencional, apenas como hospedeira (Endris, 1973), no Brasil, casualmente pode ser também observada em número não expressivo, tampouco, prejudicial ao cultivo do cereal. Entretanto, na safrinha de 2020, lagartas dessa espécie foram observadas em diferentes áreas cultivadas com um mesmo híbrido de milho convencional consorciado com Brachiaria ruziziensis no Sudoeste goiano. Mais precisamente, nos municípios de Caiapônia, Montividiu e Rio Verde em infestações jamais constatadas (20% a 30% das plantas com presença do inseto). Curioso foi o fato de se alimentarem do estilo-estigma, popularmente denominado de “cabelo da espiga de milho”, promovendo “roletamento” e corte total dessa estrutura (Figura 2AB).

Apesar disso, não foram encontradas lagartas perfurando a espiga ou mesmo se alimentando dos grãos. Mas, dependendo do estádio de desenvolvimento da planta, essa ação do inseto pode interferir no processo de polinização/fecundação, prejudicando a formação de grãos e, consequentemente, diminuindo a produtividade.

Um produtor rural, comum às localidades de cultivo mencionadas, praticou o manejo de pragas focado no controle da lagarta-do-cartucho do milho (Spodoptera frugiperda), por sua vez, a principal praga da cultura. Visto a pressão de infestação, realizou em intervalo médio de 12 dias aplicações terrestres de espinosina associada a triflumurom, lufenurom e baculovírus Spodoptera, sequencialmente, em taxa de 92L/ha. Por fim, metomil (via aérea), 10L/ha. Após essa última pulverização, percebeu a presença da lagarta falsa-medideira e observou que áreas de cultivo vicinais às instalações das propriedades e matas estavam mais infestadas pelo inseto, pelo fato de a aeronave não aplicar próximo a estes locais. Logo, presume-se que no restante das áreas houve controle dessa lagarta, porém não quantificado em termos de eficácia. Observou-se, também, que áreas vizinhas tratadas com aplicações consecutivas de benzoato de emamectina, embora com eficácia de controle inferior para S. frugiperda, não foram infestadas pela

B

Figura 2 - Lagarta falsa-medideira se alimentando do “cabelo da espiga de milho”

lagarta falsa-medideira, bem como áreas com híbridos transgênicos. Vale ressaltar que todas essas áreas foram cultivadas com soja Bt antecessora (safra verão) ao milho, dado que não foi detectada a presença da lagarta falsa-medideira. Ficou, portanto, a dúvida do produtor em relação ao híbrido implantado ou seu manejo quanto à questão de favorecer, coincidentemente, o surgimento da lagarta nos distintos locais de cultivo, pois não há informações consistentes sobre sua mobilidade nas condições tropicais, salvo que é considerada praga migratória no Hemisfério Norte (Harding, 1976).

Assim como na cultura da soja, o comportamento dessa lagarta no milho foi semelhante, pois surgiu em estádio de desenvolvimento avançado da cultura posicionando-se em local de difícil controle, comprometendo, assim, a eficiência da aplicação de inseticidas. Outro aspecto a ser analisado, com muito cuidado, é a possibilidade do consórcio com forrageiras influenciar na infestação da falsa-medideira, pois ambiente de cultivo diferenciado é constituído com adoção dessa técnica. No tocante a essa informação, atualmente, em algumas regiões do próprio Sudoeste do estado de Goiás, pecuaristas estão com dificuldades em reformar suas pastagens devido à infestação inicial de lagartas, principalmente do complexo Spodoptera sp., tanto em plantas do gênero Panicum sp., quanto Brachiaria sp.

A aplicação de produtos químicos constitui-se como a principal ferramenta de controle nas principais culturas como algodão, feijão e soja. Conjuntamente, há mais de uma centena de produtos indicados para o controle da lagarta falsa-medideira/Pseudoplusia includens/ Chrysodeixis includens. Para a cultura do milho, entretanto, não há nenhum produto registrado nacionalmente. Não obstante, apenas a simples ideia de usar inseticidas para o controle de lagartas e outras pragas, em geral, não é o suficiente, em decorrência de várias falhas que podem ocorrer dentro de um sistema de cultivo. Outras ferramentas, como a tec

nologia de aplicação, devem ser consideradas no intuito de otimizar o uso dos inseticidas, de forma a obter melhor eficácia de controle, evitando, assim, excesso de aplicações, resistência de pragas e contaminação ambiental. Para tanto, é preciso atenção a aspectos práticos como o tipo de ponta hidráulica a ser utilizado, a calibragem e a regulagem de equipamentos pulverizadores, a taxa de aplicação correta, o horário de aplicação, o uso de adjuvantes, entre outros.

Distintas formas de combater a falsa-medideira como o cultivo de materiais modificados geneticamente, assim como a liberação e a aplicação de controladores biológicos (predadores, parasitoides e micro-organismos), podem alcançar níveis de eficácia de controle satisfatórios. Os últimos, desde que utilizados harmoniosamente com outras ferramentas de manejo, como a aplicação de pesticidas seletivos.

Estudos relacionados à presença da falsa- -medideira na cultura do milho convencional como nível de ação, dano econômico, tecnologia de aplicação, bem como a possível influência do consórcio com plantas de cobertura, inexistem. Havendo necessidade de controle, cabe aos setores agrícolas relacionados cooperarem com troca de informações de forma a auxiliar na descoberta de medidas práticas operativas, visto que em outras culturas agrícolas, essa lagarta constitui-se como praga extremamente agressiva, capaz de causar danos irreparáveis. C

Ivan Brucelli, Furtunato Leão Cabral e Eduardo Lima do Carmo, Universidade de Rio Verde (UniRV)

Luiz Fernando Ribeiro Júnior e

João Vitor Alves de Sousa, Gapes/UniRV

Efeito em nematoides

Fertilizante aplicado via tratamento de sementes ativa mecanismos de defesa das plantas de soja e pode ser uma boa alternativa para auxiliar no manejo de Meloidogyne javanica na cultura da soja

Os nematoides estão entre os principais limitantes da produtividade da soja no Brasil, com prejuízos anuais estimados em aproximadamente R$ 16 bilhões. Dentre os nematoides que causam os maiores prejuízos, estão os nematoides das galhas (Meloidogyne javanica e M. incognita) e o das lesões radiculares (Pratylenchus brachyurus). O controle destes nematoides é dificultado, principalmente, pela ampla distribuição geográfica e pela gama de hospedeiros, o que dificulta a escolha de materiais para rotação de culturas. Desta forma, nos últimos anos, tem crescido o

interesse por métodos alternativos de manejo. Pesquisas realizadas ao longo dos últimos anos em parceria com instituições de pesquisa mostraram que o produto Pack Seed apresenta potencial para o manejo de nematoides, por ativar mecanismos de defesa na planta, que melhoraram a lignificação da parede celular, reduzindo a penetração e a sua reprodução. Pack Seed é uma complexa mistura de compostos de natureza bioquímica diferente e biodegradável com registro para tratamento de sementes de soja, milho, trigo e feijão. É um produto diferenciado, pois além dos tradicionais Co e Mo, fornece macros e micronutrientes, enraizantes e aminoácidos. É uma formulação completa para tratamento de sementes, e uma alternativa promissora no manejo de nematoides, aplicado isolado ou associado a outros produtos. Como todos os métodos de controle apresentam limitações, é necessária a investigação para compor o manejo integrado, como o estudo da nutrição de plantas, haja vista que o conhecimento do modo de ação de cada produto pode explicar se agem isoladamente ou em sinergia, otimizando o controle de nematoides em plantas. Portanto, dada a escassez de alternativas de controle de nematoides em soja, fazem-se necessárias pesquisas que avaliem novas tecnologias.

Diante disso, realizou-se um trabalho em parceria com a Fundação ABC para verificar a eficiência de Pack Seed, via tratamento de sementes na dose de 3ml/kg, no manejo de Meloidogyne javanica na cultura da soja.

A metodologia utilizada para a avaliação dos tratamentos foi por meio da contagem da população do nematoide M. javanica em raízes de soja e também seu efeito sobre a produtividade.

Considerando-se a coleta realizada no estádio R2 (Figura 1), o tratamento com Pack Seed apresentou redução significativa no número de espécimes de M. javanica em 10g de raiz em relação à testemunha. Esse efeito pode ser atribuído ao fato de o produto ativar os mecanismos de defesa das plantas, como o aumento da síntese de metabólitos secundários, tais como as enzimas peroxidase e fenilalanina-amônia-liase, relacionadas principalmente ao enrijecimento da parede celular, o que dificulta a penetração, a movimentação e o sítio de alimentação do nematoide. Com relação à produtividade da soja (Figura 2), houve um incremento de 5,22 sacas a mais por hectare, em relação à testemunha, uma resposta natural da cultura em função da melhor nutrição e sanidade, proporcionada pelo Pack Seed.

O Pack Seed, além de nutrir as plantas com os principais macros e micronutrientes, enraizantes e aminoácidos para a máxima expressão de seu potencial produtivo, é uma alternativa promissora no manejo do nematoide M. javanica.

C

Figura 1 - Efeito do tratamento sobre o número de indivíduos de Meloidogyne javanica em 10g de raízes em plantas de soja aos 50 dias (R2) após a emergência

Figura 2 - Produtividade da cultura da soja em resposta ao tratamento com Pack Seed

Competição crítica

Em trigo, a definição do potencial produtivo ocorre logo no início do desenvolvimento da cultura, o que demanda o estabelecimento em área limpa, sem interferência de daninhas, plantas que exigem muita atenção ao controle e manejo de resistência

Saimom Sozo

Aregião Sul do Brasil apresenta algumas características climáticas peculiares, sendo uma delas a distribuição das chuvas durante o ano todo, o que permite a implantação de culturas de interesse econômico. Dentre essas culturas, os cereais de inverno como trigo, cevada, centeio, aveia, detêm papel de destaque. Uma das principais culturas plantadas tem sido o trigo, para a comercialização com os objetivos de diluir os custos e obter melhor aproveitamento da área. A produtividade média de trigo no Brasil na safra 2019 foi de aproximadamente 2.526 quilos por hectare (42,1 sc/ha) conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab, 2019). Apesar disso, dentre os fatores responsáveis por perdas de produtividade na cultura do trigo, estão a ocorrência de plantas daninhas, que podem interferir de forma negativa devido à sua competição direta por água, luz e nutrientes, e em alguns casos, até efeitos alelopáticos.

As plantas daninhas encontradas com maior frequência na cultura do trigo são buva (Conyza sumatrensis, Conyza bonariensis e Conyza canadensis), azevém (Lollium perene spp. muliflorum) e nabo (Raphanus raphanistrum e Raphanus sativum). Outras plantas guaxas ou tigueras podem ocorrer, como a aveia-preta (Avena strigosa) e a aveia-branca (Avena sativa). A presença de biótipos resistentes aos principais mecanismos de

ação utilizados no manejo da cultura do trigo (Tabela 1) tem aumentado a complexidade do manejo em função das poucas opções de herbicidas disponíveis e seletivos à cultura, além de aumentar o custo de produção.

A resistência de plantas daninhas a herbicidas é a habilidade de caráter hereditário de uma planta sobreviver e se reproduzir após a exposição a uma dose de herbicida normalmente letal (Heap, 2020). O uso consecutivo de um mesmo herbicida exerce uma alta pressão de seleção sobre uma população, controlando os biótipos suscetíveis e deixando apenas os resistentes. Os mecanismos que conferem resistência aos herbicidas são classificados como alteração no local de ação, que pode ser via substituição de um ou mais aminoácidos na enzima-alvo ou superexpressão da enzima-alvo, e não alteração do local de ação, via redução na absorção e translocação, metabolização e compartimentalização do herbicida. Vale lembrar que a resistência pode ser simples, cruzada e múltipla, aumentando a complexidade do manejo em ordem crescente.

Para a correta adoção das estratégias do manejo integrado é de extrema importância a identificação das espécies presentes na área. As espécies de nabo são plantas com crescimento vegetativo inicial rápido, grande produção e viabilidade das sementes, elevada dispersão temporal de emergência, tolerância a baixas temperaturas, apresentando uma grande capacidade competitiva com a cultura do trigo. Cabe salientar que esta planta daninha é amplamente encontrada nas diferentes regiões produtoras, nos cultivos de inverno e verão, em que era facilmente manejada pelos herbicidas inibidores da ALS na cultura da soja (clorimuron-etílico, cloransulam- -metílico e imazetapir), milho (nicosulfuron) e trigo (metsulfuron-metil e iodosulfuron-metílico). Em função da pressão de seleção exercida pelo uso contínuo do mesmo mecanismo de ação selecionaram-se biótipos resistentes em ambas as espécies, em algumas regiões (Costa, 2017). A resistência é do tipo cruzada,

Nabo emergindo na cultura do trigo

sendo que o mecanismo que confere resistência é a mutação na enzima- -alvo, este tipo de resistência afeta negativamente o manejo desta planta daninha na cultura de soja, milho e trigo com herbicidas inibidores da ALS.

Já o azevém apresenta crescimento bastante agressivo, alta capacidade de perfilhamento e de polinização cruzada que favorece a evolução da resistência em função da maior variabilidade genética, sendo tolerante a baixas temperaturas. Porém, não se adapta em climas tropicais (mesotérmica), o banco de sementes inicia a sua germinação no final ou após a colheita da soja, quando as temperaturas começam a baixar. É considerada planta de difícil controle na pós- emergência da cultura do trigo, devido às poucas opções de herbicidas seletivos à cultura. Em função da aplicação repentina dos mesmos mecanismos, selecionaram-se biótipos resistentes aos herbicidas inibidores de EPSPS, ALS e ACCase em algumas regiões, dificultando o controle com herbicidas. Estas resistências podem ser dos tipos simples e múltipla. No caso dos herbicidas inibidores da EPSPS, alguns estudos indicam como mecanismo de resistência a translocação diferencial entre os biótipos suscetíveis e resistentes, já para herbicidas inibidores da ALS e ACCase, o mecanismo de resistência é do tipo alteração nos aminoácidos que codificam a enzima-alvo, conferindo ao biótipo altos níveis de resistência.

As espécies de buva são plantas daninhas amplamente disseminadas nos diferentes sistemas agrícolas brasileiros, causando prejuízos em diversas culturas

Tabela 1 - Casos de resistência de cereais de inverno no Brasil (Heap, 2020)

Figura 1 - Gráfico do sistema de produção

de interesse econômico. Apresentam germinação em condições de temperaturas do solo amenas próximas a 20°C. São classificadas como fotoblásticas positivas, ou seja, dependem da luz para germinar. Têm alta produção de sementes, que são leves e facilmente disseminadas pelo vento. Apresentam alta complexidade de manejo, principalmente após a detecção da resistência ao herbicida glifosato, amplamente disseminada no Brasil. A resistência da buva aos mecanismos inibidores da ALS e mimetizadores de auxina é das mais prejudiciais no manejo de plantas daninhas no trigo, pois, são as únicas opções de controle na pós-emergência da cultura. Porém, já foi diagnosticada resistência em outras culturas aos mecanismos de ação inibidores da Protox e Fotossistema I, com distribuição mais regionalizada.

Para o manejo correto de plantas daninhas, com o objetivo de maximizar a produtividade com rentabilidade econômica nos cereais de inverno, é necessário entender alguns conceitos relacionados à matocompetição e qual o seu impacto negativo sobre os componentes da produtividade. Diante disso, tem-se por conceito o período crítico de prevenção à interferência (PCPI), em que as plantas de interesse econômico devem permanecer livres de competição com plantas daninhas, pois o impacto negativo sobre a produtividade é maior, de acordo com a espécie e a densidade de plantas infestantes, e a duração do período de competição. A definição do potencial produtivo do trigo ocorre logo no início do desenvolvimento da cultura, no estádio de duplo anel, que normalmente ocorre com duas a quatro folhas, e espigueta terminal que coincide com a elongação do colmo principal, variando de acordo com a cultivar. São responsáveis pela definição do número potencial de espiguetas, que influencia diretamente no número de grãos por metro quadrado, portanto, durante estes estádios, qualquer tipo de competição com plantas daninhas compromete a construção do potencial produtivo. De maneira prática quando se pensa em ambientes de alto potencial produtivo, a cultura deve

Daniel Müller

ser estabelecida no limpo.

Na escolha das estratégias a serem utilizadas no manejo das plantas daninhas de difícil controle, o conhecimento do histórico da área, do sistema de produção e das práticas de manejo utilizadas permite identificar os gaps e as oportunidades de manejo. O sistema de produção nas regiões que cultivam cereais de inverno (Figura 1) apresenta um vazio outonal entre a colheita da cultura de verão e a implantação da cultura de inverno, que favorece a emergência e o estabelecimento de plantas daninhas, em função da baixa quantidade de palha deixada pela cultura da soja associado a temperaturas amenas e umidade favorável para a germinação das espécies infestantes, como exemplo a buva, o azevém e o nabo.

Portanto, é uma etapa do ciclo produtivo importante na construção de um manejo eficiente de plantas daninhas, com objetivo de reduzir os fluxos de emergência do banco de sementes no solo e também eliminar as plantas remanescentes (rebrotes) da cultura de verão, associando controle químico e controle cultural, através da implantação de plantas de cobertura, ou seja, eliminando o “pousio zero”.

Nesse cenário de complexidade, o cultivo de plantas de cobertura no vazio outonal é uma prática já consolidada por alguns produtores, que além de seus benefícios aos sistemas de produção como um todo, reduz a emergência de novos fluxos de plan

Teston alerta para período crítico de competição de daninhas em trigo

tas daninhas, principalmente as que necessitam de luz para germinar. Além disso, ajuda a reduzir a amplitude térmica, a produção de compostos alelopáticos, permite a formação de uma barreira física sobre o solo, impedindo ou retardando a emergência de plantas daninhas com sementes pequenas com pouca reserva, dentre outros benefícios.

Para o sucesso desta prática, alguns cuidados devem ser considerados, se no momento da colheita da soja tem-se a presença de plantas infestantes estabelecidas que são cortadas pela colhedora. Devem ser manejadas antes da implantação da cultura de cobertura com uso de herbicidas. Já em áreas sem presença de plantas daninhas no momento da semeadura da planta de cobertura, porém com histórico de infestação (banco de sementes do solo), pode-se optar por plantas de coberturas com efeito alelopático e com algum nível de seletividade aos herbicidas que necessitam ser utilizados.

A implantação de um sistema de rotação de culturas potencializa o manejo das plantas daninhas, principalmente pela rotação de diferentes modos de ação dos herbicidas, reduzindo a seleção direcional de biótipos com algum nível de resistência, associado à introdução de práticas que desfavoreçam a biologia das plantas daninhas, reduzindo o estabelecimento da infestação, multiplicação e o aumento do banco de sementes na área.

A introdução de herbicidas pré-emergentes no sistema de produção, tanto na cultura antecessora de verão (soja e milho) como na implantação da cultura do trigo, é uma prática eficiente, que contribui para a redução no banco de sementes, além de retardar e uniformizar a emergência e o desenvolvimento inicial das plantas daninhas na cultura do trigo, facilitando o manejo com herbicidas na pós-emergência da cultura, pois as plantas daninhas estarão jovens, permitindo, em muitos casos, a redução no número de aplicações de herbicidas. Práticas culturais como adubação nitrogenada, ajuste populacional, qualidade de semeadura, que favorecem o crescimento e o fechamento rápido do dossel tanto em plantas de cobertura quanto na cultura do trigo, potencializam a capacidade competitiva da cultura e suprimem o desenvolvimento das plantas daninhas.

Após a implantação da cultura, restam poucas alternativas de herbicidas para o manejo do complexo de plantas daninhas. Por isso é importante estabelecer a cultura livre de infestações de plantas daninhas, priorizando o manejo de dessecação pré-plantio da cultura, principalmente em áreas com histórico de plantas resistentes ou de difícil controle. Os herbicidas registrados para uso pós-emergente na cultura do trigo são inibidores da ALS (que controlam mono e dicotiledôneas), inibidores da ACCase (específicos para monocotiledôneas), mimetizadores de auxina (específicos para dicotiledôneas), inibidores do fotossistema II (que controlam algumas espécies mono e dicotiledôneas).

O controle químico de nabo e buva na cultura do trigo é realizado com herbicidas pertencentes ao mecanismo dos inibidores da ALS. Destacam-se os ingredientes ativos metsulfuron-metil, iodosulfuron-metílico e piroxsulam. Outras

Elevagro.com

Nabo implantado pós-colheita da soja

opções são os herbicidas mimetizadores de auxina, 2,4D e MCPA e inibidores do fotossistema II, neste caso a bentazona. Nas plantas monocotilédones, como azevém e aveia, o controle químico é realizado com herbicidas pertencentes ao mecanismo dos inibidores da ALS, como iodosulfurom-

-metílico e piroxsulam. Outro grupo que pode ser usado no manejo são os inibidores da ACCase, com destaque para o clodinafope-propargil.

A escolha do herbicida deve levar em consideração o his

tórico de plantas resistentes na área. Além disso, para que os herbicidas sejam eficientes no controle deve-se respeitar alguns critérios técnicos, como o tamanho das plantas daninhas, que devem estar nos estádios iniciais de desenvolvi

mento de três a quatro folhas para dicotiledôneas e de um a dois perfilhos para monocotiledôneas, além de dose, tem

peratura, condições fisiológicas da planta daninha, condições ambientais anteriores e posteriores à aplicação, misturas de tanque e tecnologia de aplicação. No tocante a isso, o estádio fenológico da cultura do trigo no momento da aplicação deve também ser levado em consideração, para garantir a seletividade dos herbicidas à cultura, buscando evitar injúrias

e efeitos negativos na produtividade. Portanto, a construção de ambientes de alto potencial

produtivo em trigo depende de um correto manejo de plantas daninhas, principalmente em um cenário onde exista a ocorrência de plantas resistentes, uma vez que o sistema de produção deve ser considerado para um manejo eficiente. Além disso, são necessários a adoção de plantas de cobertura, a utilização de herbicidas pré-emergentes, o manejo de

dessecação pré-plantio, observar a qualidade de semeadura, o ajuste de população, a adubação nitrogenada, dentre outras práticas que suprimem o crescimento das plantas daninhas e maximizam a capacidade competitiva da cultu

ra, permitindo a construção e a expressão do máximo potencial produtivo. C

Renan Teston, Instituto Phytus

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