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ALICE HOFFMAN Autora do best-seller As Regras do Amor e da Magia

Da Magia à Sedução Tradução Denise de Carvalho Rocha

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Título do original: Practical Magic. Copyright © 1995 Alice Hoffman. Copyright da edição brasileira © 2021 Editora Pensamento-Cultrix Ltda. 1a edição 2021. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou usada de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópias, gravações ou sistema de armazenamento em banco de dados, sem permissão por escrito, exceto nos casos de trechos curtos citados em resenhas críticas ou artigos de revistas. A Editora Jangada não se responsabiliza por eventuais mudanças ocorridas nos endereços convencionais ou eletrônicos citados neste livro. Esta é uma obra de ficção. Todos os personagens, organizações e acontecimentos retratados neste romance são produtos da imaginação da autora e usados de modo fictício. Não pode ser exportado para Portugal. Editor: Adilson Silva Ramachandra Gerente editorial: Roseli de S. Ferraz Gerente de produção editorial: Indiara Faria Kayo Editoração eletrônica: Join Bureau Revisão: Luciana Soares da Silva

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Hoffman, Alice Da magia à sedução / Alice Hoffman; tradução Denise de Carvalho Rocha. – 1. ed. – São Paulo: Editora Pensamento Cultrix, 2021. “Autora do best-seller As regras do amor e da magia”. Título original: Practical magic ISBN 978-65-5622-019-2 1. Ficção de fantasia 2. Ficção norte-americana I. Título. 21-70696

CDD-813 Índices para catálogo sistemático: 1. Ficção: Literatura norte-americana 813 Maria Alice Ferreira – Bibliotecária – CRB-8/7964

Jangada é um selo editorial da Pensamento-Cultrix Ltda Direitos de tradução para o Brasil adquiridos com exclusividade pela EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA que se reserva a propriedade literária desta tradução. Rua Dr. Mário Vicente, 368 — 04270-000 — São Paulo, SP — Fone: (11) 2066-9000 http://www.editorajangada.com.br E-mail: atendimento@editorajangada.com.br Foi feito o depósito legal.

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Para Libby Hodges Para Carol DeKnight

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Para cada mal sob o sol, Existe um remédio ou não existe nenhum. Se existir um, procure até encontrar. Se não existir nenhum, não se incomode mais. Mamãe Gansa

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Introdução

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o mundo de Da Magia à Sedução, os lilases florescem da noite para o dia, o real e o mágico se sobrepõem e as mulheres Owens são bruxas há gerações. Este livro é uma tentativa de desvendar os segredos do coração humano. Que preço estamos dispostos a pagar pelo amor? Como reconhecemos e aceitamos nosso eu mais verdadeiro? Como nosso passado afeta nosso presente? Muitos de nós sabem o que é tentar fugir de um legado familiar apenas para descobrir que sempre carregaremos nossa herança conosco, não importa o quanto possamos querer nos distanciar dela. As mulheres da família Owens são do tipo que fazem qualquer coisa umas pelas outras; elas podem discutir, podem discordar, mas demonstram uma dedicação feroz pela sua família. As bruxas são outsiders, e aqueles de nós que foram intimidados e condenados ao ostracismo podem se identificar com elas. Parte do nosso fascínio pelas bruxas é que elas são as únicas figuras femininas míticas que têm poder. São mulheres que não precisam ser resgatadas por príncipes ou por um rei, pois podem salvar a si mesmas, às vezes com uma pequena ajuda de uma irmã. As bruxas são mulheres de coragem, sábias e destemidas. Em suma, são tudo o que uma menina quer ser quando crescer. Tanto em Da Magia à Sedução quanto em seu predecessor, As Regras do Amor e da Magia, as garotas são sempre incentivadas a escolher a coragem, o que levou o Chá da Coragem a ser

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uma das receitas mágicas mais preciosas das tias. Da Magia à Sedução é uma reconfiguração da jornada mítica que a maioria das mulheres faz ao longo da vida, sejam elas irmãs, mães, filhas ou tias. As mulheres Owens praticam magia no mundo moderno. Sally é a irmã mais velha, uma mulher estável, que quer ter uma vida “normal”. Gillian é a irmã mais nova, rebelde e imprevisível, que está sempre flertando com o perigo. Embora tenham personalidades opostas, ambas desconfiam do amor, pois passaram a infância testemunhando o desespero das mulheres apaixonadas que procuravam as tias em busca de poções e feitiços. A ancestral original das Owens é Maria Owens, cuja história eu conto num terceiro livro. Maria, depois de ser abandonada pelo homem que amava, um dos magistrados nos julgamentos das bruxas de Salem, lançou uma maldição sobre as futuras gerações de mulheres da sua família, para que nunca sofressem por amor como ela. Sally e Gillian sabem que carregam a maldição de Maria. Ambas precisam lutar pelo amor num mundo que é mais perigoso quando se abre o coração, mas que também ganha muito mais sentido e alegria quando se tem coragem de amar. As irmãs não podem fugir do amor assim como não podem fugir da magia e, no final, constatam que ele é uma bênção, não uma maldição. Vinte e cinco anos após a publicação de Da Magia à Sedução pela editora original, tenho o prazer de dizer que ele continua muito vivo e pulsante. Assim como há três gerações de mulheres na história, três gerações de leitores o celebraram. Eu conheci filhas, mães e avós que compartilharam o romance, e nada me traz mais alegria do que saber que Da Magia à Sedução é assunto de família. Este é um livro sobre magia, mas o que é mais importante: é uma ode à irmandade entre as mulheres, à família e ao poder do amor. Meus leitores dizem que, quando voltaram a ler Da Magia à Sedução pela segunda ou terceira vez, vivenciaram a história de uma maneira completamente diferente. Isso porque o significado do livro muda 10

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dependendo da fase da vida em que o leitor está. A dinâmica familiar é complexa e, como acontece em nossa própria vida, o modo como vemos as pessoas próximas a nós, mesmo quando elas são apenas personagens fictícias, depende da nossa visão do mundo naquele momento. Ao longo dos anos, meus leitores sempre pediram outros romances sobre as mulheres Owens. Meu interesse pessoal pela história me levou a voltar no tempo e a escrever uma prequela, em vez de uma sequência. As Regras do Amor e da Magia conta a história das tias de Da Magia à Sedução, Franny e Jet, quando elas eram jovens e passavam pelo seu próprio despertar para a magia. Eu queria contar como Franny e Jet se tornaram as tias sábias e adoradas de Da Magia à Sedução. A jovem Franny é uma linda garota de cabelos ruivos, destemida e confiante dos seus poderes; a jovem Jet sofre por amor, mas ainda está disposta a abrir seu coração. As duas irmãs crescem sem nenhum conhecimento da sua história mágica familiar – nos anos 1960, uma época fervilhante e revolucionária em Nova York, a época e o lugar que eu conheci quando menina. Foi um prazer voltar aos anos 1960 e descobrir a maneira mágica e prática como viviam as tias. Também foi um prazer voltar a Greenwich Village como pesquisadora e revisitar a paisagem da minha própria juventude. O romancista pode ser o último a saber do que trata seu romance, e muitas vezes fico surpresa com as reviravoltas que acontecem nas minhas próprias histórias e com as escolhas que meus personagens fazem. Vincent, o irmão de Franny e Jet, tem uma história que nem ele nem eu mesma teríamos previsto e que representa um papel central em Regras do Amor e da Magia. Sempre começo a escrever um romance com uma pergunta que preciso responder. Da Magia à Sedução aborda questões pertinentes e atuais sobre o lugar das mulheres na sociedade – questões que são tão ou mais importantes do que eram 25 anos atrás. Infelizmente, no último quarto de século, o lugar das mulheres na sociedade não progrediu tanto quanto desejávamos, nem naquela época nem agora. Muitas das 11

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mesmas questões ainda precisam ser revistas: igualdade de salários, a criação dos filhos, padrões de beleza, assédio e abuso sexuais. A magia pode não ser capaz de dar soluções para tudo isso, mas a irmandade pode. Os anos apenas intensificaram a importância de contar histórias de mulheres e de fazer o nosso melhor para garantir que as mulheres, historicamente forçadas a ficar em silêncio, possam falar e contar suas próprias verdades. Felizmente, as mulheres Owens falaram comigo. Foi como se tivessem entrado pela porta da minha casa e pedido para eu registrar suas histórias no papel. Sempre gostei de magia, desde as histórias que minha avó russa me contava. Se a palavra “magia” estava no título de um livro, eu certamente o encontrava. No mundo dos contos de fadas, o prático e o mágico convivem lado a lado e o fantástico é tratado como algo natural. Um dia alguém inesperado bate na sua porta ou uma rosa desabrocha no inverno ou um fuso encantado faz alguém adormecer para sempre. Era a fusão do mágico com o cotidiano o que mais me fascinava como leitora, pois no mundo em que eu vivia isso também parecia acontecer. Pessoas que amamos podem desaparecer, por morte ou divórcio; podem se transformar em heróis ou feras. Minha experiência pessoal e minhas leituras da infância me deixaram com saudade de um mundo em que tudo pode acontecer, por magia ou não, num dia normal. Mais e mais leitores sentem que o gênero da fantasia é a forma original de se contar histórias, incluindo contos de fadas, contos folclóricos, mitos e histórias de ficção moderna. Se eu fosse escrever Da Magia à Sedução hoje, começaria exatamente da mesma maneira que comecei 25 anos atrás: Há mais de duzentos anos as mulheres Owens eram responsabilizadas por tudo o que saísse errado na cidade. Há quem se interesse em ler Da Magia à Sedução depois de assistir à sua versão cinematográfica, que se tornou um filme cult muito aclamado e tem um dos elencos femininos mais excepcionais já reunidos: 12

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Sandra Bullock, Nicole Kidman, Stockard Channing, Dianne Wiest, Evan Rachel Wood, Camilla Belle, Chloe Webb e Margo Martindale. É um filme raro, repleto de personagens femininas fascinantes, que discutem, fazem amizade, magoam umas às outras e se apoiam. O filme é muito divertido, mas não evita o lado sombrio: a história de abusos de Gillian, assim como a jornada emocional de amor e perda de Sally, que a faz entender que a sua única chance de felicidade é ser fiel a si mesma. No momento em que escrevo, estou dando início a um quarto livro dessa saga, The Book of Magic, que conta a história final da família Owens. Mal posso esperar até que os leitores descubram o desfecho dessa história e mal posso esperar para descobri-lo por mim mesma. A história pode me surpreender e espero que ganhe vida própria, mas sei que nela vou descobrir que era uma vez uma mulher ou uma menina diferente; que não se encaixava nas convenções da sociedade; que buscava a beleza no mundo; que foi ferida; que se apaixonou apesar dos avisos; que faria qualquer coisa pela irmã, pela sobrinha, pela filha ou pela mãe; que sabia que, apesar de todos os perigos, devemos nos apaixonar sempre que pudermos.

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Superstição

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H

á mais de duzentos anos as mulheres Owens eram responsabilizadas por tudo que saísse errado na cidade. Se chegasse uma primavera úmida, se as vacas no pasto eliminassem sangue no leite, se um potro morria de cólica ou um bebê nascia com uma manczha vermelha no rosto, todos acreditavam que o destino devia ter sido torcido, pelo menos um pouco, por aquelas mulheres da Rua Magnólia. Não importava que problema fosse (relâmpagos, gafanhotos ou uma morte por afogamento). Não importava se a situação podia ser explicada pela lógica, pela ciência ou parecesse simplesmente azar. Assim que surgia uma dificuldade ou o mais leve infortúnio, as pessoas já começavam a apontar o dedo e fazer acusações. Não demorou muito até se convencerem de que não era seguro passar na frente da casa das Owens depois do anoitecer, e só os vizinhos mais tolos ousariam espreitar por sobre a grade preta de ferro que circundava o jardim como uma serpente. No interior da casa não havia relógios nem espelhos e em cada uma das portas havia três fechaduras. Camundongos viviam sob as tábuas do assoalho e dentro das paredes, e muitas vezes era possível encontrá-los nas gavetas da cômoda, onde roíam as toalhas de mesa bordadas e as bordas rendadas dos jogos americanos de linho. Quinze espécies diferentes de madeira tinham sido usadas nos assentos de janela e na cornija da lareira, entre elas carvalho-dourado, freixo-prateado e 17

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uma cerejeira particularmente perfumada, que desprendia o aroma da fruta madura mesmo no rigor do inverno, quando todas as árvores do lado de fora não passavam de troncos pretos e sem folhas. Não importava o quanto o resto da casa pudesse estar empoeirado, nenhuma parte do madeiramento precisava de polimento. Se alguém olhasse de relance, podia ver a própria imagem refletida ali, nos lambris da sala de jantar e no corrimão em que se apoiava quando subia as escadas. Todos os cômodos eram escuros, mesmo ao meio-dia, e frios apesar de todo calor de julho. Qualquer pessoa que ousasse subir até a varanda, onde a hera crescia sem controle, poderia tentar, durante horas, olhar através das janelas e não veria nada. O mesmo acontecia ao se olhar para fora; o vidro esverdeado das janelas era tão velho e grosso que tudo do outro lado parecia um sonho, inclusive o céu e as árvores. As garotinhas que dormiam no sótão eram irmãs, com uma diferença de idade de apenas treze meses. Nunca as mandavam para a cama antes da meia-noite, nem as lembravam de escovar os dentes. Ninguém se incomodava se a roupa delas estava amarrotada ou se cuspiam na rua. Durante toda a infância dessas meninas, deixaram que dormissem de sapatos e desenhassem caretas engraçadas nas paredes do quarto com giz de cera preto. Elas podiam tomar refrigerante gelado no café da manhã, se quisessem, ou jantar só torta de marshmallow. Podiam subir no telhado e ficar empoleiradas no alto das telhas de ardósia, inclinando as costas para trás tanto quanto podiam, para avistar a primeira estrela. Ali ficavam nas ventosas noites de março ou nas úmidas tardes de agosto, sussurrando, discutindo se era possível que até o menor desejo um dia se realizasse. As meninas eram criadas pelas tias, que mesmo se quisessem simplesmente não podiam mandar as sobrinhas embora. As crianças, afinal de contas, eram órfãs de pais descuidados, que estavam tão apaixonados a ponto de não perceberem a fumaça se desprendendo das paredes do bangalô onde tinham ido passar uma segunda lua de mel, 18

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depois de deixarem as meninas em casa com uma babá. Não era de surpreender que as irmãs sempre dormissem na mesma cama durante as tempestades. Ambas tinham pavor de trovões e nunca conseguiam falar acima de um sussurro quando o céu começava a ribombar. Quando enfim adormeciam, os braços passados uma em volta da outra, muitas vezes tinham exatamente os mesmos sonhos. Havia momentos em que podiam completar as frases uma da outra. E não havia dúvida de que cada uma podia fechar os olhos e adivinhar o que a outra mais desejava de sobremesa, fosse o dia que fosse. Apesar da proximidade que havia entre as duas, porém, as irmãs eram completamente diferentes na aparência e no temperamento. Se não fossem os belos olhos cinzentos pelos quais as mulheres Owens eram conhecidas, ninguém teria motivo para imaginar que as duas eram irmãs. Gillian era clara e loira, ao passo que os cabelos de Sally eram tão negros quanto a pelagem dos gatos mal-educados que as tias deixavam que se escondessem no jardim e arranhassem os cortinados da sala. Gillian era preguiçosa e gostava de dormir até depois do meio-dia. Economizava o dinheiro da mesada, depois pagava Sally para fazer seu dever de casa de Matemática e passar seus vestidos de festa. Tomava garrafas de achocolatado e comia barras grudentas de Hershey, enquanto se esparramava no piso frio do porão, contente em observar Sally espanar as prateleiras de metal onde as tias guardavam picles e outras conservas. O que Gillian mais gostava no mundo era se deitar no assento de janela estofado de veludo, que ficava no patamar superior da escada, onde as cortinas eram de um tecido adamascado e um retrato de Maria Owens, a mulher que muito tempo atrás construíra a casa, acumulava poeira num canto. Era ali que Gillian podia ser encontrada nas tardes de verão, tão lânguida e à vontade que as traças pousavam nela, confundindo-a com uma almofada, e passavam a fazer buracos minúsculos na sua camiseta e no jeans. 19

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