A viajante da noite

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A VIAJANTE DA NOITE

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Autor do best-seller A Garota Alemã

AVIAJANTE DA NOITE

Da Alemanha de Hitler aos dias de hoje, a jornada de autodescoberta de quatro mulheres separadas pelo tempo, unidas pelo sacrifício e por um poema inspirador

Romance

Tradução

Jacqueline Damásio Valpassos

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Título do original: The Night Travelers.

Copyright © 2023 emanaluC Production Corp.

Copyright da tradução para o inglês © 2023 emanaluC Production Corp.

Publicado mediante acordo com a editora original, Atria Books, uma divisão da Simon & Schuster, Inc.

Copyright da edição brasileira © 2023 Editora Pensamento-Cultrix Ltda.

1a edição 2023.

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou usada de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópias, gravações ou sistema de armazenamento em banco de dados, sem permissão por escrito, exceto nos casos de trechos curtos citados em resenhas críticas ou artigos de revistas.

A Editora Jangada não se responsabiliza por eventuais mudanças ocorridas nos endereços convencionais ou eletrônicos citados neste livro.

Esta é uma obra de ficção. Todos os personagens, organizações e acontecimentos retratados neste romance são produtos da imaginação do autor e usados de modo fictício.

Obs.: Este livro não pode ser exportado para Portugal, Angola, Moçambique, Macau, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Guiné Bissau.

Editor: Adilson Silva Ramachandra

Gerente editorial: Roseli de S. Ferraz

Preparação de originais: Marta Almeida de Sá

Gerente de produção editorial: Indiara Faria Kayo

Editoração eletrônica: Join Bureau

Revisão: Vivian Miwa Matsushita

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Correa, Armando Lucas

A viajante da noite / Armando Lucas Correa; tradução Jacqueline Damásio Valpassos. – 1. ed. – São

Paulo: Editora Jangada, 2023.

Título original: The Night Travelers. ISBN 978-65-5622-070-3

1. Romance cubano I. Título.

23-171011

Índices para catálogo sistemático:

1. Romances: Literatura cubana Cub863.4 Aline Graziele Benitez – Bibliotecária – CRB-1/3129

Jangada é um selo editorial da Pensamento-Cultrix Ltda.

Direitos de tradução para o Brasil adquiridos com exclusividade pela EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA., que se reserva a propriedade literária desta tradução.

Rua Dr. Mário Vicente, 368 — 04270-000 — São Paulo, SP

Fone: (11) 2066-9000 http://www.editorajangada.com.br

E-mail: atendimento@editorajangada.com.br

Foi feito o depósito legal.

CDD-Cub863.4

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Para Emma, Anna e Lucas
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7 Sumário ATO UM 1. Berlim, março de 1931 ....................................................... 13 2. Berlim, março de 1938 ....................................................... 19 3. Düsseldorf, junho de 1929 ................................................. 30 4. Düsseldorf, março de 1934 ................................................ 41 5. Berlim, agosto de 1936....................................................... 54 6. Berlim, outubro de 1938 .................................................... 60 7. Brandemburgo-Görden, janeiro de 1939 ............................ 70 8. Berlim, fevereiro de 1939 ................................................... 87 9. Berlim, março de 1939 ....................................................... 97 10. Hamburgo, maio de 1939 ................................................... 106 ATO DOIS 11. Havana, novembro de 1942................................................ 115 12. Havana, abril de 1944 123 13. Varadero, dezembro de 1948 .............................................. 141 14. Havana, junho de 1951 156 15. Havana, março de 1952 ..................................................... 169 A Viajante da Noite.indd 7 11/09/2023 16:25
8 16. Arroyo Naranjo, dezembro de 1956 182 17. Havana, junho de 1958 ...................................................... 195 18. Havana, janeiro de 1959 205 19. Santiago de Cuba, março de 1959...................................... 219 20. Havana, março de 1962 232 ATO TRÊS 21. Nova York, maio de 1975 245 22. Düsseldorf, novembro de 1975 .......................................... 256 23. Düsseldorf, agosto de 1981 270 24. Berlim, agosto de 1988....................................................... 277 25. Bochum-Linden, abril de 1996 287 26. Berlim, janeiro de 2000 ...................................................... 299 27. Berlim, março de 2014 308 28. Berlim, junho de 1939 ....................................................... 316 29. Oranienburg, janeiro de 1940 324 30. Berlim, abril de 2014 ......................................................... 334 31. Pankow, maio de 2014 349 32. Havana, maio de 2015 ....................................................... 358 33. Havana, janeiro de 1988 369 34. Havana, maio de 2015 ....................................................... 376 35. Berlim, novembro de 2015 380 Nota do autor 386 Agradecimentos .......................................................................... 390 Bibliografia 395 A Viajante da Noite.indd 8 11/09/2023 16:25

Viajantes da noite são plenos de luz.

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– RUMI
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ATO UM

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Na noite em que Lilith nasceu, tempestades de inverno assolaram a cidade em plena primavera.

Janelas cerradas. Cortinas fechadas. Ally Keller se contorcia de dor nos lençóis úmidos. A parteira segurou firme os tornozelos de Ally.

– Desta vez, está mesmo chegando.

Depois da última contração, sua vida mudaria. “Marcus”, pensou Ally. Ela queria gritar o nome dele.

Marcus não podia responder. Estava longe. O único contato que tinham agora era por meio de uma carta ocasional. Ally começara a esquecer-se de seu cheiro. Até mesmo seu rosto havia se dissolvido na escuridão por um instante. Ela olhou para si mesma na cama como se fosse outra mulher, como se o corpo em trabalho de parto não fosse o dela.

– Marcus – ela disse em voz alta. Sua mente estava cada vez mais inquieta.

Depois de tudo que passaram juntos, depois de tudo que disseram e compartilharam, Marcus havia se tornado uma sombra para ela. A filha deles cresceria sem pai. Talvez esse pai nunca a tivesse de fato desejado,

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no fim das contas. Talvez esse sempre tenha sido o destino da filha. Que direito ela tinha de interferir?

Na noite em que Lilith nasceu, Ally pensou na própria mãe. Ela não conseguia se lembrar de uma única canção de ninar, um abraço, um beijo. Passara a infância cercada de tutores, aperfeiçoando sua caligrafia e o uso da linguagem, aprendendo novas palavras para seu vocabulário e construções gramaticais adequadas. Os números eram um pesadelo, a ciência era monótona, e a geografia a deixava desorientada. Tudo o que importava era se refugiar nas histórias de faz de conta que a levavam a embarcar em viagens no tempo.

– Junte-se a nós no mundo real, está bem? – sua mãe diria. – A vida não é um conto de fadas.

A mãe permitiu que ela seguisse o próprio caminho. Havia pressentido como seria a vida de Ally e sabia que não tinha o poder de impedi-la. Em consequência do rumo que a Alemanha estava tomando, sabia que a filha rebelde e obstinada era uma causa perdida. Olhando para trás, Ally podia ver que a mãe estivera certa o tempo todo.

– Você está caindo no sono! – A voz agitada da parteira interrompeu seus pensamentos; suas mãos estavam manchadas com um líquido amarelado. – Você precisa se concentrar, se quiser acabar logo com isso.

A parteira era experiente; podia se gabar das necessárias novecentas horas de treinamento; havia auxiliado o parto de mais de cem bebês. – Nenhum bebê morto, nem um só. Nenhuma mãe também, nem uma – ela dissera a Ally, quando esta a contratou.

Ela é uma das melhores – garantira-lhe a agência.

Um dia, promulgaremos uma lei para assegurar que o parto de todo bebê nascido em nosso país seja feito por uma parteira alemã – acrescentou a mulher da agência, elevando a voz. – Pureza sobre pureza.

“Talvez eu devesse ter encontrado alguém sem experiência, alguém sem a menor ideia de como trazer um bebê ao mundo”, pensou Ally.

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– Olhe para mim! – a parteira vociferou. – Se você não fizer a sua parte, não poderei fazer meu trabalho direito. Você vai me atrapalhar.

Ally começou a tremer. A parteira parecia estar com pressa. Ally imaginou que poderia haver outra mulher grávida esperando por ela. Não conseguia parar de pensar que os dedos daquela mulher, que suas mãos, estavam dentro dela, explorando seu corpo. Salvando uma vida enquanto destruía outra.

Na noite em que Lilith nasceu, Ally tentou se imaginar de novo no apartamento à beira do rio com Marcus – os dois, envolvidos sob o luar, fazendo planos para a vida em família, como se isso fosse possível. A luz da manhã sempre os apanhava de surpresa. Pegos desprevenidos, começavam a fechar as janelas e cerrar as cortinas para ficar no escuro, que era o refúgio que tinham.

– Devíamos fugir – ela disse, uma vez, a Marcus, enquanto estavam deitados encolhidos na cama.

Ally esperou a resposta dele em silêncio, sabendo que para ele só poderia haver uma resposta. Ninguém poderia convencê-lo do contrário.

– Se as coisas estão ruins para nós aqui, seria pior na América – argumentava ele. – Cada dia que passa, mais pessoas nos veem como inimigos.

Para Ally, o medo de Marcus era abstrato. Estava em forças não manifestas, como uma onda crescente que eles não podiam ver, mas que, um dia, talvez, afogaria todos eles. Então, ela optou por ignorar os pressentimentos de Marcus e os presságios de seus amigos artistas; tinha esperança de que a tempestade passasse. Marcus sonhava em trabalhar no cinema. Já havia aparecido em um filme, em um papel menor, como músico, e disse que ela deveria ir com ele a Paris, onde esperava ser escalado para outro. No entanto, ela engravidou e as coisas mudaram.

Os pais de Ally ficaram fora de si. Eles a enviaram para morar em seu apartamento vazio em Mitte, no centro de Berlim, a fim de esconder

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sua vergonha. Disseram-lhe que era a última coisa que fariam por ela. O modo como Ally escolheria viver além desse ponto seria problema dela, não deles. Na carta que a mãe lhe havia escrito, ela podia ouvir sua voz firme e ponderada, com seu sotaque bávaro. Ally não tivera mais notícias dela desde então.

Ally soube da morte do pai por meio de uma nota no jornal. No mesmo dia, também recebeu uma carta a respeito de uma pequena herança que o pai lhe havia deixado. Imaginou que em Munique haveria orações, ave-marias, janelas veladas e conversas artificiais que iriam morrendo em murmúrios. Pensou em sua mãe envolta num luto – um luto que para ela começara no dia em que Ally partiu. Ally estava convencida de que, quando a mãe morresse, deixaria instruções para que a notícia de sua morte não fosse divulgada, de modo a garantir que passasse despercebida, para que a filha não tivesse a chance de chorar por ela. Ally não merecia nem isso. A vingança da mãe seria o silêncio.

Lembrou-se da sensação de estar sozinha no vasto apartamento em Mitte, perdendo-se em seus corredores, seus cômodos repletos de sombras, pintados num tom de verde-musgo que ela sentia que a consumiria. Foi, então, que as cartas de Marcus começaram a chegar. Este não é o país que eu quero para o meu filho, não volte para D üsseldorf, a vida aqui fica mais difícil a cada dia. Eles também não nos querem na América. Ninguém nos quer. Às vezes, não eram respostas às suas próprias cartas, mas desabafos.

Um grito preencheu o vazio da sala. Tinha vindo do fundo de seu peito, de sua garganta sufocada, de seus braços retesados. Sentiu-se partida ao meio. A dor lancinante no ventre se espalhara por todo o seu corpo, e ela se agarrou com desespero às grades da cama.

– Marcus! – Seu grito gutural assustou a parteira.

– Quem é Marcus? O pai da criança? Não há ninguém aqui. Vamos, não pare, você está quase lá. Mais um empurrão e você consegue!

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