LITERATURA BRASILEIRA PARA O MUNDO Florianópolis, SC – Novembro/2018 – Número 02 – Edições A ILHA – Ano 01
ENTREVISTA COM LÍGIA FAGUNDES TELES
LÍNGUA PORTUGUESA EM DISCUSSÃO
jackMichel: a escritora 2 em 1 RAQUEL DE QUEIROZ: A DAMA DAS LETRAS
SUMÁRIO EDITORIAL.................................. 3 ENLUARAR.................................. 4 A DAMA DAS LETRAS................ 5 INEFÁVEL.................................... 8 CANÇÃO DO DIA DE SEMPRE.... 9 POEMINHA AMOROSO............. 10 O APANHADOR DE DESPERCÍCIOS.......................... 11 PURÊ DO GATO......................... 12 O DESLEAL CREDO................... 14 A LEITURA DO CORPO.............. 15 LIBERDADE............................... 17 POR UM NOVO PAÍS.................. 18 AS CORES DA POESIA............... 19
POEMA XVII.............................. 32 A LITERATURA DOS CATARINENSES........................ 33 BORBULHAM AS PALAVRAS... 35 LÍNGUA PORTUGUESA EM PAUTA....................................... 36 A FOTO....................................... 40 A HISTÓRIA DO RELÓGIO........ 41 UM VIOLINO E A SUA POESIA.. 42 INTERIOR HABITADO............... 43 DUAS ESCRITORES EM UMA... 44 ENTREVISTA COM JACKMICHEL............................ 46 OCEANIA.................................... 48 PERSISTÊNCIA.......................... 49 AS VINHAS DA IRA – A
OLINDA...................................... 20
LITERATURA NO CINEMA........ 50
DOMINGO.................................. 20
QUASE O TEMPO…................... 51
PRIMAVERA.............................. 21
QUERO SER PAPAI NOEL......... 52
FALANDO DE LITERATURA..... 22
O CARACOL............................... 54
HOMEM DO MAR...................... 25
NAMORO NO PORTÃO ............. 55
ABRAÇO..................................... 30
DÊ LIVRO DE PRESENTE
A VELA....................................... 31
NESTE NATAL........................... 56
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EXPEDIENTE Literatura brasileira para o mundo Edição número 02 – Novembro/2018 Publicação das Edições A ILHA Grupo Literário A ILHA Florianópolis, SC Editor: Luiz Carlos Amorim Contato: revisaolca@gmail.com Grupo Literário A ILHA na Internet: http://www.prosapoesiaecia. xpg.uol.com.br
Todos os textos são de inteira responsabilidade dos autores que os assinam. Contate com a redação pelo e-mail revisaolca@gmail.com para publicar conosco. Veja a página do GRUPO LITERÁRIO A ILHA – ESCRITORES DO BRASIL no Facebook, com textos literários, informações literárias e culturais e poemas e a edição on line, em e-book, desta revista.
EDITORIAL ESCRITORES DO BRASIL É UM SUCESSO A estreia da revista ESCRITORES DO BRASIL foi um sucesso. Milhares de acessos, leitores por todos os cantos do mundo, tanto que nesta segunda edição temos uma seção de Escritores Porgueses. E como está havendo procura, mesmo que o título da revista seja Escritores do Brasil, abriremos mais espaço para escritores dos países lusófonos. O Grupo Literário A ILHA está feliz em ver que o espaço que oferece está sendo bem aceito tanto por novos escritores como por escritores já veteranos. Então nos colocamos à disposição e convidamos todos os escritores que quiserem se juntar a nós, a enviar uma mensagem para o e-mail revisaolca@ gmail.com, que teremos o maior prazer em enviar os parâmetros para participação. Nossos leitores podem se manisfestar, também, quanto ao conteúdo. Mandem seus pareceres sobre o lay-out da revista, sobre o conteúdo, o que está faltando, o que poderia mudar. A revista é literalmente feita pelos leitores-escritores, pois são eles que enviam conteúdo para publicarmos. Aguardamos suas mensagens. Esperamos que gostem desta segunda edição. Divulguem. Ela pode ser lida on-line gratuitamente. Quem quiser ter a revista impressa, pode pedir o arquivo em pdf para imprimir. Sejam sempre bem-vindos, tanto para ler como para publicar. O Editor
Visite o Portal do Grupo Literário A ILHA:
PROSA, POESIA & CIA
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POESIA
LUIZ CARLOS AMORIM ENLUARAR Minhas mãos enluaradas se erguem, a saudar o Universo e iluminam minha saudade, embebida em ternura, encharcada de carinho. Quem habita esse beijo a gritar em meus lábios? Toma o luar de minhas mãos luar que reflete os meus olhos e faz morada em meu peito. Adentra minhas paredes quebra essa saudade, mistura com esperança, um bocadinho de paz e constrói uma fortaleza, casa de nossas vidas.
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REPORTAGEM
RAQUEL DE QUEIROZ A DAMA DAS LETRAS O primeiro romance de Rachel de Queiroz foi escrito em 1929, a lápis, num caderno, durante a recuperação de uma congestão pulmonar e se passava em 1915, quando uma grande seca assolou o nordeste. Embora naquele tempo não se usasse essa expressão, a autora disse que sua intenção era retratar uma seca “light”, ou seja, sem os exageros e concessões de outros escritores. Quando resolveu editar esse trabalho, Rachel procurou uma gráfica e pagou pela impressão de mil livros. Como a imprensa do Ceará permaneceu quase indiferente ao lançamento, alguns exemplares foram mandados para o Rio e São Paulo, onde a reação foi de entusiasmo, com o livro recebendo críticas elogiosas de Augusto Frederico Schmidt e Mário de Andrade, entre outros. Além de admirarem o estilo enxuto, os críticos ficaram especialmente surpresos por
saber que aquela obra-prima de menos de cem páginas representava a estreia de uma mocinha nordestina e desconhecida, com apenas vinte anos incompletos. Graciliano Ramos, por exemplo, que estrearia em livro em 1933, confessaria mais tarde: “Durante muito tempo ficou-me a ideia idiota de que ela era homem, tão forte estava em mim o preconceito que excluía as mulheres da literatura”. O título do livro? “O Quinze”, hoje reconhecido como monumento literário brasileiro, um dos precursores do romance regional nordestino, uma importante vertente de nossa literatura.
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Vinculada ao Partido Comunista, Rachel rompeu sua filiação quando a direção do Partido não aprovou os originais de seu segundo lviro, “João Miguel”, por não aceitar que, na trama, um campesino (eles chamavam assim…) matasse outro, ou que uma proletária se transformasse em prostituta. Rachel contava que abandonou a reunão “em desabalada carreira”. Segundo o jornalista Murilo Melo Filho, ela teria dito: “Vi que era impossível a convivência de pessoas inteligentes com comunistas militantes”. O romance acabou sendo publicado em 1932
A DAMA DAS LETRAS Nos anos 1940, Rachel deu inicio a duas atividades às quais se dedicaria intensamente nos trinta anos seguintes: a de tradutora e a de cronista, sendo exclusiva da revista semanal mais popular do país na época, “O Cruzeiro”, onde assinou a última página entre 1946 e 1975. Por isso afirmava que se sentia “mais jornalista do que escritora”. E, avançando na descrição dessa relação profissional com a palavra, chegava a declarar que não escrevia por prazer, mas pela necesidade de se sustentar… Em 1961, foi convidada pelo presidente Jânio Quadros para ser Ministra da Educação, mas recusou, dizendo que desejava permanecer apenas como jornalista. Ainda nessa década, Rachel, que era desafeto de João Goulart, “conspirou” (como ela mesma dizia) a favor do golpe militar que levou seu primo, o marechal cearense Humberto de Alencar Castelo Branco, à Presidência da República. Segundo ela, seu apoio ao regime de 1964 cessou com o fim do governo
Castelo Branco. Mas isso já foi suficiente para que fosse considerada conservadora, reacionária ou de direita, rótulos que a escritora rejeitava, lembrando: “a verdade é que a esquerda nunca me perdoou por ter deixado o PC”. Rachel não tinha a pretenção de candidatar-se à Academia Brasileira de Letras, mas acabou sendo convencida por amigos, alguns dos quais já acadêmicos, como Adonias Filho. Ela concordou com a candidatura, mas não fez campanha, as tradicionais visitas aos imortais pedindo votos. Mesmo assim, derrotou o jurista Pontes de Miranda por 23 a 15, tornando-se, em 1977, a primeira mulher eleita para a Academia.
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A jornalista Isabel Lustosa, que teve oportunidade de entrevistá-la em mais de uma ocasião, assim sintetiza sua opinião pessoal sobre a escritora: “Conheci Rachel de Queiroz na época em que publicou seu último romance, “Memorial de Maria Moura”. Visitei-a mais de uma vez em sua casa, um apartamento muito agradável no Leblon, Rio de Janeiro, em um prédio que já então ostentava seu nome na fachada. Cheguei levada por um amigo comum, também cearense. Era uma velha senhora muito simples, com seus confortáveis vestidos caseiros de algodão bem parecidos com os que usa a minha mãe. Os grandes óculos e o sorriso
aberto lhe davam um ar de boa velhinha que logo se desfazia quando a gente começava a conversar com ela. Não porque fosse uma velhinha má, mas sim porque sua conversa era divertida, irreverente, maliciosa e jovial. Entre nós duas logo se estabeleceu uma empatia, uma intimidade como se tivéssemos a mesma idade. Guardei dela a impressão da mulher inteligentíssima e com muito traquejo nas coisas do mundo.”
Campos de Lucena ouviu Rachel quase dez anos depois de Isabel Lustosa, para o livro “21 Escritores Brasileiros” (Escrituras). Ela fala sobre as lembranças desse encontro: “Tarde de quarta-feira. Ano 2002. Ela abriu a porta e me recebeu sorridente. Me levou a um quarto repleto de livros e ligou o grande ventilador com pás de ferro. Olhei os livros levemente empo-
Nordeste. Sou uma sertaneja, uma mulher do povo que escreve”. Não por acaso, o nome do seu sítio próximo a Fortaleza era “Não me Deixes”. Acredito que Rachel me recebeu nesta tarde em deferência a uma outra, quando eu e uma colega organizamos um evento em sua homenagem, em João Pessoa, Paraíba. Foi uma tarde surpreendente para quem esperava uma escritora
eirados empilhados em estantes de madeira e os santos de barro afixados nas paredes. Indaguei se sentia saudades do Ceará e ela prontamente respondeu: “Quem lhe disse que eu saí? Quem disse que deixei o Ceará?”, reagiu entre brincalhona e exaltada e concluiu baiS u ê n i o xinho: “Nunca deixei o
acadêmica consagrada, formal e distante. Contou causos, lembrou emocionada da morte de sua única filha. Agradeço a entrevista e ela se despede me convidando para voltar um dia: “Se você morasse aqui eu o chamaria para tomar um uisquinho comigo”.
SERTANEJA Em metade de 1994, foi exibida na TV a adaptação do “Memorial de Maria Moura” para minissérie. A autora tinha restrições: “Não gostei muito porque transformaram tudo em gauchês: só tinha ator do Rio Grande do Sul”. Apesar disso, o efeito sobre as vendas do livro foi expressivo: do lançamento até o início da transmissão, tinham sido vendidos cinco mil exemplares, número que dobrou enquanto a série estava no ar e continuou crescendo, ultrapassando os quarenta mil exemplares. O
jornalista
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(Sérgio Amaral Silva)
GRANDES POETAS BRASILEIROS
CRUZ E SOUSA INEFÁVEL Nada há que me domine e que me vença Quando a minha alma mudamente acorda… Ela rebenta em flor, ela transborda Nos alvoroços da emoção imensa. Sou como um Réu de celestial sentença, Condenado do Amor, que se recorda Do Amor e sempre no Silêncio borda De estrelas todo o céu em que erra e pensa. Claros, meus olhos tornam-se mais claros E tudo vejo dos encantos raros E de outras mais serenas madrugadas! Todas as vozes que procuro e chamo Ouço-as dentro de mim porque eu as amo Na minha alma volteando arrebatadas.
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GRANDES POETAS BRASILEIROS
MARIO QUINTANA CANÇÃO DO DIA DE SEMPRE Tão bom viver dia a dia... A vida assim, jamais cansa... Viver tão só de momentos Como estas nuvens no céu... E só ganhar, toda a vida, Inexperiência... esperança... E a rosa louca dos ventos Presa à copa do chapéu. Nunca dês um nome a um rio: Sempre é outro rio a passar. Nada jamais continua, Tudo vai recomeçar! E sem nenhuma lembrança Das outras vezes perdidas, Atiro a rosa do sonho Nas tuas mãos distraídas...
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GRANDES POETAS BRASILEIROS
CORA CORALINA POEMINHA AMOROSO Este é um poema de amor tão meigo, tão terno, tão teu... É uma oferenda aos teus momentos de luta e de brisa e de céu... E eu, quero te servir a poesia numa concha azul do mar ou numa cesta de flores do campo. Talvez tu possas entender o meu amor. Mas se isso não acontecer, não importa. Já está declarado e estampado nas linhas e entrelinhas deste pequeno poema, o verso; o tão famoso e inesperado verso que te deixará pasmo, surpreso, perplexo... eu te amo, perdoa-me, eu te amo...
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GRANDES POETAS BRASILEIROS
MANOEL DE BARROS O APANHADOR DE DESPERCÍCIOS Uso a palavra para compor meus silêncios. Não gosto das palavras fatigadas de informar. Dou mais respeito às que vivem de barriga no chão tipo água pedra sapo. Entendo bem o sotaque das águas Dou respeito às coisas desimportantes e aos seres desimportantes. Prezo insetos mais que aviões. Prezo a velocidade das tartarugas mais que a dos mísseis. Tenho em mim um atraso de nascença. Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos. Tenho abundância de ser feliz por isso. Meu quintal é maior do que o mundo. Sou um apanhador de desperdícios: Amo os restos como as boas moscas. Queria que a minha voz tivesse um formato de canto. Porque eu não sou da informática: eu sou da invencionática. Só uso a palavra para compor meus silêncios.
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CONTO
ERICK BERNARDES PURÊ DO GATO Muitas vezes nos perguntamos: por que algumas lendas sobrevivem durante tanto tempo? Uns duvidam até certo ponto, outros afirmam, categoricamente, que a língua do povo ecoa profecias divinas. Não sei ao certo, confesso que tenho cá certas manias também. Uma dessas minhas cismas é a de acreditar que os gatos possuem as sete vidas típicas da crendice popular. Quem não põe fé em alguma superstição ou outra, por acaso? Qual cidadão nunca fez sua prece por causa de alguma premonição? Pois é, desnecessário emitir julgamento, fica a sensação estranha no ar. Principalmente porque esses animais costumam nos encarar de frente, olhos nos olhos, coisa de arrepiar.
de raça, usando coleira e tudo, porém abandonado. Com certeza estava morrendo. Olhando bem, notei que uma das patas traseiras encontrava-se em estado avançado de decomposição. Verdade. Um fedor danado só de passar perto. Eu via até parte do osso do membro infectado por larvas de moscas que começavam a roer o quadril. Ferimento nojento, talvez fosse resultado de alguma mordida de cachorro bravo. Absurdo! Cadê o dono do animal, nessas horas, que não faz curativos? Coitado do felino. Se os gatos têm mesmo as sete
Certa vez, em meio à rua onde moro, deparei com um gato siamês extremamente adoentado. Sim, avistei um bichano
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vidas tantas vezes apregoadas, certamente uma dessas vidas já estaria se esvaindo. Duvidava se o bicho sobreviveria ao apodrecimento do corpo daquele jeito. Sentia o estômago embrulhar, verdade. Durante três dias eu vira o gato bem no mesmo lugar, fedendo, decompondo-se aos poucos naquele calor intenso. Revoavam-lhe as moscas verdes brilhosas, enquanto ele encontrava-se deitado na rua, junto ao poste que servia de apoio à placa do lava-jato que havia lá no bairro. Depois disso o bichano
desapareceu, evaporara-se das redondezas — decerto morreu, senão continuaria exalando mal cheiro por lá. Impossível resistir à parte carcomida das larvas de insetos no corpo débil e magro. Bem, passados sete dias exatos (juro a você leitor, não é conta de mentiroso), o semblante com o olhar vitrificado do gato não se apagava da minha lembrança. Ah! Aquele mirar de varar a alma! Sensação de agouro, sete dias corridos, melhor seria esquecer o azul translúcido das pupilas felinas. Mas não, infelizmente não havia como apagar da mente a esfinge moribunda do animal. Ao chegar do trabalho, já pelas onze da noite, qual não foi a minha surpresa! Sim, pasmem, o gato bem ali a me encarar, olhando fixamente meu rosto. E pior, o diabo do bicho estava na cozinha, deitado na enorme panela de purê de batata que a minha adorada esposa deixara com carinho antes de viajar. Imundície. Ainda bem que ela viajara logo,
ou com certeza passaria mal. Havia secreção de membros podres manchando o chão de piso branco. Que porcaria! Vontade de vomitar com aquele cheiro grosso de carniça. Cruzes! Todo lambuzado de purê, certamente comeu tudo, nem enxerguei direito. O cheiro do leite ou da manteiga usados no amolecimento da batata deve tê-lo atraído. Mas como? Ele devia estar morto. O fogão era só manchas escuras de sangue pisado. Sujeira negra. Do outro lado, grãos semelhantes a arroz mexiam-se aos montes já sobre as bordas da panela. Mas não, em hipótese alguma eram de comida aqueles pontos brancos a se retorcerem tanto, coisa mais asquerosa: eram larvas de insetos bailando saciadas. Ojeriza. A saliva engrossou na minha boca, senti odor de morte arder o nó do nariz — e o gato diabólico me encarou de frente. Eu fiquei petrificado, se não fosse meu instinto de defesa, bem
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provável que teria desmaiado ali ao pé da pia. Os olhos do animal, em vias de decomposição, não apresentavam mais aquele cristalino característico da espécie. Não aparentava estar vivo aquele troço ruim. Mostrava-se calmo ao me encarar com os bugalhos baços. Do puré, só restaram as raspas na panela, repletas de pelos cinzentos grudados. Tonteei de entorpecimento. Entretanto, três segundos foram suficientes para eu pegar o soquete de aço e sentar no demônio siamês meia dúzia de pancadas fortes. Resultado? Quer saber o que aconteceu? O gato fugiu. Sim. Pois é, mesmo decompondo-se o felino conseguiu correr. Mas não era de outro mundo o bichano, certamente restava alguma vida do total das sete que teve. O inferno foi ter que lavar casa e fogão com água sanitária depois de jogar a panela nova fora. E o purê? Nunca mais caiu-me bem no estômago esse tipo de alimento amarelo e mole.
POESIA
VERA TRINDADE O DESLEAL CREDO Creio nas coisas pequeninas Creio na presteza dos colibris E no propósito dos cupins Creio no poder dos grãos de areia No segredo a sete chaves E creio na utilidade do botão Creio na revelação das digitais Na importância de cada poro E na supremacia do ossículo estribo Creio nos seres bem minúsculos Creio na força das abelhas E na sociedade das formigas Creio no potencial dos grilos E na energia dos vaga-lumes E creio, sobretudo, naquilo que não se crê
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CRÔNICA
HARRY WIESE A LEITURA DO CORPO Em tempos mais remotos ler tinha um significado somente e consistia em decifrar a escrita. Quem não conseguia tal façanha era chamado de analfabeto. Hoje, ler possui um leque de significados, que nos permite interpretar e entender melhor o que nos rodeia, o que somos e como assimilamos as diversas modalidades de textos. Somos texto. As pessoas são textos, portanto, podem ser lidas.O cronista Affonso Romano de Sant’Anna disse que tudo é leitura. O corpo é um texto e que tudo é decifração, portanto, conclui-se que o corpo é um texto e pode ser decifrado. Existem estudos avançados sobre a corporeidade. Hugo Assmann é uma dessas personalidades. “Metáforas novas para reencantar a educação” é uma obra que não deveria faltar na lista de leituras de professores e educadores. Corporeidade é a maneira pela qual o cérebro reconhece e
utiliza o corpo como instrumento relacional com o mundo. Então, se meu corpo é texto eu me leio. Leio-me por dentro e por fora, cada detalhe, cada atitude, cada célula, cada pensamento. Penso, logo leio! A leitura do corpo é a existência, Descartes que o diga!A primeira leitura do corpo compete à mãe. É ela que lê os movimentos do feto, suas manias e artimanhas, a vida. Não lê com os olhos, lê com o corpo o filho se formando dentro dela.Depois com a criança nascida, ela a lê nos mínimos detalhes, parte por parte, órgão por órgão e descobre o primeiro sorriso, a alegria, a tristeza, a fome, a satisfação e o amor. Mães são exímias leitoras do corpo.O pediatra lê o corpo de jeito superior. Lê a dor e o alívio da dor das crianças e das mães das crianças. Pediatras são como anjos da guarda em noites de tempestades turbulentas.Os professores leem o corpo dos alunos. Cada aluno é um texto exclusivo. A leitura dos corpos dos alunos permite
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ler o mundo de cada um deles: a família, a comunidade, as crenças, as necessidades e as diferenças. Leem, principalmente, as ausências, a índole e os sonhos. Ler sonhos é essencial. Ninguém pode ser menor que os sonhos, disse o poeta.O psicólogo lê o corpo por dentro. Lê o que não vê. Vê o corpo e lê a alma. Psicólogos são como aves noturnas, silenciosas e eficientes na
leitura de seus caminhos. palavras, para que palavras, documentos, que neste Freud era exímio leitor se o texto são os corpos. caso, também são inúteis. de almas através de sua Médicos são eficientes A inutilidade dos corpos se psicanálise. Ele disse: leitores de corpos. São manifesta em suas decom“Existem momentos na especialistas nesse tipo posições irreversíveis. vida da gente, em que as de leitura. Desde Hipó- Mesmo assim, há ainda a palavras perdem o sentido crates os médicos leem os leitura do corpo morto, frio, ou parecem inúteis, e, por complicados predicados sem alma, o último olhar, a mais que a gente pense corporais para conseguir despedida. A imagem perem uma forma de empre- o bem-estar da humani- dura na mente das pessoas gá-las elas parecem não dade. Médicos deveriam ainda por algum tempo e servir. Então a gente não ter existência infinita. O a cada dia que passa corrói diz, apenas sente”.Afagos médico-legista faz a lei- e definha. A lápide de márentre mães e filhos e carí- tura do corpo morto. Não more é o limite e encerra cias entre amantes são sorri como o pediatra. Faz a leitura do corpo. Permaleituras como em Braille, a leitura da causa última. nece a saudade... que não com suas depressões e seus As causas-mortis são pode ser lida! altos-relevos, descartam inúteis e só servem para
MAIS DE 38 ANOS DE LITERATURA Leia a revista SUPLEMENTO LITERÁRIO A ILHA, do Grupo Literário A ILHA, publicação que já está no seu trigésimo oitavo ano de circulação, no endereço: https://issuu.com/grupoliterarioailha/docs/revistaliteraria_146_alta • 16 •
POESIA
LUIZA FILHO LIBERDADE Mera utopia Consubstanciada no abstrato surrealismo humano Apresentada nesses versos dilacerados E em tom nublado RECITAMOS Com a alma revestida em nada Porque somos TODOS, livres aprisionados… Pois, o dinheiro nos faz refém Enquanto nossos pensamentos, permanecem acorrentados!
(LUIZA FILHO nasceu em Luanda- Angola É estudante de Economia pela Universidade Federal de Santa Catarina – Florianópolis/Brasil.Aspirante à escritora e poeta nas horas mortas. Vê a poesia como uma linguagem universal, livre e sem estratificação social de ricos pobres ou pobres ricos.No ano de 2016, Coordenou as atividades do Núcleo Lev’Arte Brasil.)
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CRÔNICA
MARIA TERESA FREIRE POR UM NOVO PAÍS Marchei pela liberdade! Busquei a palavra livre, o caminhar sem restrição. Fui ao encontro dos meus irmãos africanos que, unidos, lutavam pelo direito de viver em seu próprio país, sem interferências, sem prisões, sem separações, sem raiva. Sem morte! Caminhei descalço, comi nada, dormi sob o céu estrelado. Gritei, esbravejei na tentativa de ser ouvido. Surdos ouvidos deixaram-me apartado da vida por 43 anos. Sofri sofrimentos incalculáveis, testemunhei sofrimentos inimagináveis. Chorei sofrimentos de um povo. Esvaído, dilacerado, esgotado aguentou humilhações inaceitáveis pela mente humana. Transpassava a compreensão dos sensatos a força brutal, o autoritarismo exacerbado, a ganância pelo poder, o desejo desenfreado pela riqueza que foram aplicados a um povo, a um país.
Vaguei pelas savanas, busquei alento na natureza dadivosa. Apreciei o nascer do sol brilhante, majestoso a iluminar os caminhos trilhados pelos verdadeiros donos daqueles imensos espaços. Deitei-me com o sol poente, de cor incandescente, exuberante, aos poucos esmaecendo, despedindo-se para ceder seu reinado às incontáveis estrelas, à lua, rainha soberba. Confabulei com animais selvagens, imponentes indiferentes, curiosos, grandes, fortes, pequenos, lépidos. De todos os jeitos. Acompanhei-os embrenhados na selva para encontrar o alento de uma vida que nem fora vivida. Compreendi que sua força provinha da sua própria simplicidade de
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vivência. Encontrei o ânimo impregnado em uma alma grandiosa, em um espírito inquebrantável, em uma vontade invencível. Encontrei o caminho da esperança, da liberdade, da luz, do entendimento e da solidariedade. Segui junto com tantos! Acompanhei a figura carismática, amorosa, solidária, livre de rancores, sem desejo de vingança contra maldades longamente perduráveis. Entendi sua personalidade simples e amplamente afável. Compreendi sua ação firme, porém generosa na liderança de um povo que queria alma livre, mente aberta e corpo são
para usufruir de sua terra pujante, generosa, abençoada com riquezas naturais tão cobiçadas por outros.
finalmente, sua bandeira no chão seco das arbitrariedades, no solo úmido e promissor regado pelas lágrimas que mantiveram a Refiz o caminho da auto- esperança e a fé em todos. nomia, da igualdade, da participação. Consegui ver Não vejo perfeição. Não o povo altaneiro a fincar, anseio pela perfeição ine-
xistente. Anseio por manter uma nação unida, empreendedora e, principalmente, justa. Por fim, encontrei a liberdade!
AS CORES DA POESIA
Leia o novo livro do escritor Luiz Carlos Amorim, uma coletânea de poemas atuais e outros produzidos em outras épocas. Peça o seu exemplar pelo e-mail revisaolca@gmail.com .
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POESIA
CORISCO MURA OLINDA Na sombra, antigos sobrados sussurram na Rua do Sol; As paredes descascadas esfarelam no seu pranto de viúvas abandonadas. Nos átrios ecoam causos de escravos fugidos e amores ao pé da porta. O espectro das Iaiás observa os foliões que sobem os morros acompanhando os blocos.
DOMINGO Domingo que escorre pelos buracos das calçadas. Domingo do silêncio, Domingo das ruas vazias, Domingo da enxaqueca, do quarto trancado com a luz apagada. Domingo que segue indolente, dormindo, dormitando, Como um sapo com a língua presa, Como a menina que perdeu os patins. Domingo que observa, meio zarolho e desconfiado, a chegada do dia seguinte, Porque Chico Buarque já dizia, “a dor é tão velha que pode morrer”.
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POESIA
MICHELE STRINGHINI PRIMAVERA Primavera, as mais belas paisagens. Primavera, a estação da beleza exuberante. Primavera, o cantarolar dos pássaros. Primavera, passeio, piquenique, nostalgia e alegria. Primavera, o desabrochar das vestes reais de obras-primas, Obras-primas criadas por Deus, Das variadas flores em suas espécies. Primavera, cenário para pintura de quadro. Primavera, exóticos perfumes. Estão sempre no prazo de validade, Nunca perdem a essência do seu aroma. Primavera, inspiração de estampas às roupas. Primavera, dia e noite, o mesmo tempo de duração. Primavera, expressa pura poesia. Primavera Brasil, Primavera de margaridas, girassóis, jasmins, Crisântemos, violetas, damas-da-noite, Rosas e hibiscos... É a natureza renascendo para a vida.
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ENTREVISTA
ENÉAS ATHANÁZIO FALANDO DE LITERATURA O Dr. Enéas Athanázio é um dos mais atuantes contistas de Santa Catarina, incansável ensaísta, o escritor dos Campos Gerais e das coisas literárias. Sua literatura é conhecida em todo o Brasil. Aqui, uma conversa com ele sobre escrituras e leituras. LCA - Dr. Enéas Athanázio: com 51 livros publicados e circulando, o senhor é um escritor conhecido? EA – É uma questão complicada. Na verdade, a gente nunca sabe onde e por quem é lido. No Brasil, quem assina artigos em suplementos, revistas e páginas literárias não costuma se tornar muito conhecido. E os livros não suprem essa falha porque não há o hábito da leitura, divulgação e distribuição adequadas. Não posso concorrer com os políticos, cantores sertanejos ou astros televisivos. Mas, considerando que sou um escritor da província (esforçando-me para não
ser provinciano) e avesso a badalações, não posso me queixar As pessoas ligadas nessas coisas de letras em geral me conhecem e aumenta sempre o número de mensagens, cartas, livros e visitas que recebo, inclusive de pessoas de longe e de cuja existência ignorava. Chegam livros sobre os mais variados assuntos, pedidos de prefácios (já fiz um mundaréu deles), textos para capas e orelhas, opiniões sobre originais, convites para falas, entrevistas, artigos, pedidos de obras minhas. Atendo na medida do possível e nunca deixo bilhete sem resposta. Considero o silêncio uma grosseria sem par. São tantos os livros que vão se amontoando pelos cantos e no chão, além de ocupar as estantes disponíveis. Estou a ponto de imitar o Plínio Doyle, que teve que se mudar para o apar-
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tamento vizinho, expulso pela livralhada. Nas minhas viagens pelo país, - e têm sido numerosas, - encontro sempre algum grupo que me conhece e livros meus nas principais bibliotecas locais. De qualquer forma, o que importa é que a obra seja conhecida, e não o autor. E que essa obra tenha qualidade, porque tudo o mais é secundário. Seja como for, não me preocupo muito com isso: depois de décadas com o Código em uma mão e o processo na outra, produzindo em momentos furtados ao lazer e ao sono,
há vários anos vivo a vida do escritor: escrevo, leio e viajo. Um privilégio inigualável.
LCA - O que repercute mais Enéas Athanázio vê a Litena sua obra: o conto ou o ratura Catarinense de hoje? ensaio? EA – Não vejo com bons EA – Sem dúvida, o conto. olhos. Os livros surgem, O ensaio, no Brasil, tem mas pouco ou nada de novo reduzido contingente de acontece. A maioria morre leitores. Às vezes até ima- na casca. Não existe crítica, gino que sou o único leitor em geral tudo se resume a do gênero nestas bandas notinhas, mesmo porque e que ainda escreve a res- a crítica é uma atividade peito. Não vejo ninguém exigente e trabalhosa. Não é a escrever ou comentar brincadeira ler com a maior ensaios, embora muita atenção um cartapácio gente se dedique ao gênero após o outro e extrair um no país. Meus ensaios têm comentário coerente. Recorepercutido mais lá fora, nheço que existem alguns como aconteceu com a bio- abnegados, que eu chamo grafia de Godofredo Rangel, de últimos abencerragens o meu livro sobre Lima Bar- do áspero ofício, a quem eu reto e os trabalhos a respeito de Monteiro Lobato. Estes me valeram um prêmio concedido pela Academia Mineira de Letras e várias apreciações e referências em obras importantes, como a de Vasda B. Landers, professora da Columbia University, e crônicas de Otto Lara Resende. Mestre Wilson Martins comentou meu livro “A Pátina do Tempo” em sua coluna de jornal. Luz e Silva fez uma rendo minhas homenagens extensa apreciação, publi- Celestino Sachet, criterioso cada em volume, sobre e dedicado estudioso das minha produção ensaística. letras dos catarinenses, E surgiram numerosas embora sua obra permaneça outras manifestações sobre restrita mais ao meio uniela. versitário, o que é uma pena, e o incansável Silvério LCA - Como o escritor da Costa, mourejando há
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longos anos no seu “Fronte Cultural”, e que hoje se tornou um dos nomes mais conhecidos fora do Estado pelo que tenho observado nas minhas andanças. Não me furto de reconhecer o trabalho de Luiz Carlos Amorim, sobre o qual não me estendo para não parecer bajulação. Luiz Henrique Schroeder tem recebido grande destaque, aliás merecido. O livro catarinense não encontra espaço, ocupado pelos best-sellers que vêm de fora, e que viveriam muito bem sem eles e, no
entanto, os ocupam com uma força avassaladora. Contudo, ainda alimento a esperança de que surja um catarinense que conquiste o país, como um Érico Veríssimo, no Rio Grande do Sul, um Jorge Amado, na Bahia,
um Guimarães Rosa, em Minas, um Lobato em São Paulo. Mas os anos passam e isso não acontece. Já vou vencendo a curva do tempo e não o avisto no horizonte, por mais que o espreite. No regionalismo campeiro surgiu há algum tempo o Mário Tessari, dando continuidade à corrente. Ainda bem! O Contestado e o ciclo da Erva-mate estão à espera de seu verdadeiro cronista. Por outro lado, perdi a esperança de criar no Estado uma entidade representativa do escritor e engajada na luta por ele. Gastei meu tempo, esforço e trabalho em prol de todas
as tentativas que surgiram: ACES, AESC e UBE/SC, mas todas fracassaram. Até mesmo a UBE nacional, em São Paulo, de que sou associado desde 1980, anda mais apagada que tição adormecido na garoa. Tornou-se uma espécie de sucursal da OAB, privilegiando mais os advogados que os escritores. Deu as costas aos associados, com os quais não mantém contato.
EA – Foi um tema muito discutido mas creio que está superado. A Internet não atrapalhou. Nunca se publicou tanto livro, no mundo e no Brasil. Dizem que ela aumentou o número de leitores. Agora, se merece confiança, é outra questão. A julgar pelos absurdos que tenho encontrado, inclusive a meu próprio respeito, é uma fonte que pode ser duvidosa. Em todo caso, é melhor que É verdade que existem, aqui leiam mal do que nada. no Estado, várias academias atuantes, mas seus objetivos Quanto à linguagem, nas são outros. ditas redes sociais, é de doer. Criaram abreviações LCA - O senhor acha que absurdas, eliminaram a pona informática pode ser uma tuação e escrevem coisas aliada ou prejudicial à lite- destituídas de sentido para ratura ou ao livro como o o comum dos leitores. Que conhecemos hoje? fazer?
REVISÃO DE TEXTOS E EDIÇÃO DE LIVROS Revisão e copidesque de livros, jornais, artigos, etc. Da revisão até a impressão. Contato: revisaolca@gmail.com • 24 •
POESIA
EDLTRAUDE ZIMMERMANN FONSECA HOMEM DO MAR Mar, céu, infinito. Sol, areia, gaivota a voar Cheiro forte de homem! Barco a espera, redes recolhidas É o pescador em luta com as ondas As intempéries, buscando alimento Para bocas famintas saciar! Mar, céu, infinito. Cheiro forte de homem Buscando no copo Atento, coragem, esquecimento!
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ENTREVISTA
LYGIA FAGUNDES TELLES No limite entre a história e a ficção, Lygia Fagundes Telles invade a memória: “Invento, mas invento sempre com a secreta esperança de estar inventando certo”, diz, implacável. O seu livro “Invenção e Memória” (Rocco, 128 páginas), reúne 15 contos inéditos que evocam a infância e adolescência, momentos tristes, amargos, outros de humor sutil e fina ironia. Apesar do tom autobiográfico, a autora desfaz os equívocos: “São fragmentos ou miniaturas reais (ou não), diria Carlos Drummond de Andrade”. Depois de “Invenção e Memória”, Lygia Fagundes Telles já traçava (no pensamento) o novo romance e, numa experiência inédita, apostava na literatura infanto-juvenil – iria contar a história de um bicho. O exercício de transitar pela memória e ficção não é novo na obra da escritora. Experiência semelhante está em “A Disciplina do Amor”. Até onde vai a veracidade dos fatos já não mais preocupa a autora. Sua obra é como um que-
bra-cabeça. Cabe ao leitor Quando você vai contar um combinar as peças. fato, você dá ênfase a esse fato. Nessa ênfase começa Nesta entrevista , Lygia a entrar o imaginário, a Fagundes Telles fala dos invenção. Você não está livros, da família e de uma mentindo, mas você está vida que se confunde com a dando um realce ao fato que própria literatura. você assistiu ou ouviu. Não é mentira e não é verdade. É EB - Apesar de “Invenção uma mistura do ficcionista e Memória” não ser uma - sou sobretudo ficcionista. obra autobiográfica, existe Nunca pensei em fazer uma forte ligação com a autobiografia, tenho horror sua história. Há realmente disso. Então quero, nesse a existência de um passado caso, trazer ao leitor essa pouco camuflado? novidade, esse faz de conta. Minha memória pode não LFT –A invenção e a ser minha memória, não memória se misturam muito. tem importância o fato da É impossível fazer uma realidade existir ou não ali. separação fria, calculada. O importante é a sedução A memória é a invenção. com o leitor. Este livro é o que mais traz traços autobiográficos. Nesse ponto, ele é primo irmão do livro “A Disciplina do Amor”, que também tem uma porção de fragmentos, de miniaturas, como diria Carlos Drummond de Andrade. Tem miniaturas ali que podem ser reais ou não, não interessa. O que interessa é o fato do leitor se aproximar do escritor e formar com ele uma espécie de cumpli-
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cidade.
é a exata. De repente você descobre uma outra e dá EB - Aliás, ser cúmplice do uma alegria muito grande. É leitor é uma particularidade uma espécie de artesanato. sua. EB – “Invenção e Memória” LFT - É bem isso que você foi escrito em quanto falou. O meu objetivo é a tempo? condição humana. A condição humana me apaixona LFT - Comecei a pensar muito, então eu tento me nele em 1998, começava, desembrulhar, desembru- largava, e depois no ano lhando meu próximo. Nesse seguinte me deu uma necesato de me desembrulhar, sidade realmente de complefaço do próximo meu cúm- tá-lo. Depois de pronto pedi plice, meu parceiro. Tenho os originais para a Rocco vontade de trazer este leitor (editora) porque achava até onde estou e na reali- que aquele trecho, aquele dade nós somos parecidos, título não estavam bons. A temos os medos, as espe- editora teve muita paciência ranças. comigo. EB - Quando escreve, a senhora chega a mostrar os originais para outras pessoas?
EB - A sua obra está sendo reeditada pela Rocco. A senhora chegou a rever algumas passagens dos livros?
Nova Fronteira... Todos são meus amigos, não houve nenhuma ruptura. Quando saí da Nova Fronteira... É muito bom mudar de casa é como abrir uma outra porta. Já que a Rocco ia fazer todas as reedições, aproveitei e fiz uma revisão em todos os textos, o que me deu muita alegria. Às vezes, um outro revisor troca ou cancela uma palavra. Os revisores não são, às vezes, as pessoas ideais. O meu trabalho de revisão foi uma forma de corrigir, de limpar. EB - A senhora chegou a alterar o sentido de uma ideia?
LFT - Não. Foi mais uma palavra, uma colocação. Vou te dar um exemplo dessa retomada - a palavra é essa -, no texto que fecha LFT - Em geral converso o livro “Nada de Novo na muito sobre o texto com LFT - Quando eu saí da Frente Ocidental”. Ali, eu o meu filho (cineasta Goffredo Telles Neto), autor da capa de Invenção e Memória. Ele é uma espécie de meu interlocutor, é o meu primeiro cúmplice. EB - Depois de escrito, a senhora retoma muitas vezes ao texto? LFT - Eu volto porque aí é um trabalho gostoso. Volto à palavra, nem sempre ela
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entrelaço a memória do presente que é a minha mãe que vai para Aparecida e eu estou esperando o telefonema de um poeta que vai se encontrar comigo na confeitaria. De repente há a intromissão de um telefonema nesse mesmo dia avisando que meu pai morreu. Mas eu não quero pensar nisso. Nesse texto esqueci de colocar uma coisa que nessa segunda edição quero corrigir. Você deve ter percebido nos meus textos anteriores que meu pai, quando queria mudar de assunto, mudava de lugar. De repente pensei: Meu Deus, quando surge o telefonema com a voz do homem dando a notícia da morte de meu pai, minha vontade é dizer: Pai, muda de lugar. Se a morte estiver sentada nos pés da cama, vá para a cabeceira. Se você estiver na cabeceira, vá para os pés da cama ou então vá para a poltrona ou vá para
condição. É um livro ainda muito atual, porque ali está a natureza humana. Você lê um romance do século 18 e é atual: mudam-se as roupas, os hábitos, mas a natureza humana é sempre a mesma, é o medo, a ansiedade, a vontade da vida. O que o ser humano quer é ser feliz e não consegue, é muito difícil. Ele não consegue e a rua, mas mude de lugar. fica se debatendo e isto é Essas correções, na verdade, muito bonito. Neste debate, são mais uma chance. se ele conseguir chegar até Deus, será o consolo. EB - Revisando sua obra, qual foi o livro que mais lhe EB - A versão cinematográdeu prazer? fica de “As Meninas” conseguiu traduzir sua ideia? LFT – “As Meninas”. Foi um romance que eu fiz LFT - Foi um trabalho feito durante o regime militar, com muita dignidade, mas em 1973. Ali eu exponho não tem profundidade. a realidade de um regime militar horrível. São três EB - De um modo geral as jovens – uma drogada, adaptações para o cinema uma subversiva e uma sofrem perdas? burguesa – vivendo aquele instante cada qual na sua LFT - Às vezes há uma
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identificação da ficção com a imagem. Quando a imagem dá a mão à palavra é muito bonito. Quando essa combinação se concretiza é o esplendor. Tenho muita esperança no cinema brasileiro. O Paulo Emílio (crítico de cinema Paulo Emílio Salles Gomes) me dizia - ele foi meu marido - que preferia ver um filme medíocre brasileiro do que um filme bom norte-americano. Ele apostava no cinema nacional. Central do Brasil, por exemplo, é extraordinário. Aquele moço, o diretor (Walter Salles Júnior) é muito competente.
rários principalmente para somente uma escritora. Não jovens? tenho o poder econômico, nem político. Meu poder é LFT - Continuo sim. Gosto a palavra. muito do contato com os jovens. Enquanto eu puder, (Entrevista concedida a vou continuar passando Maria Cláudia Miguel, do alguma coisa a eles, repe- Correio Popular/Campitindo sempre: o dia em que nas-SP) o Brasil tiver mais escolas terá menos hospitais e menos cadeias. O planeta está enfermo e o Brasil numa fase muito terrível: é o desgoverno e a corrupção, a mentira, a sujeira, os rios talhados, tudo isso é muito triste para nós brasileiros. A gente tem vontade de pedir aos governantes que parem de roubar para amarem EB - A senhora continua na um pouco mais o País. Eu maratona de encontros lite- não posso fazer nada. Sou
LEIA o Blog CRÔNICA DO DIA
Em http://lcamorim.blogspot.com.br Literatura, arte, cultura, cotidiano, poesia. Todo dia um novo texto: um conto, uma crônica, um artigo, um poema. Leia e comente. Sua opinião é importante para que possamos melhorar o conteúdo. • 29 •
ESCRITORES PORTUGUESES
GEORGINA CAÇADOR ABRAÇO Abraço-te Com estes cinco sentidos Que são de todos e de Deus. Que eu quero dar-te E tu sabes, que são meus. Com o calor Só possível da paixão, Calo-me. Sentir na língua A palavra certa, Que afasta a nuvem negra Da ilusão, Que faz a vida linda, Mas deserta. Abraço-te! Na inquietação Que não percebo, Que me faz ir para lá de mim E do medo, Em busca de imensidão. Mas sei, Que os abraços já se perderam Diluídos nos sentidos, Que eu ignorei.
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ESCRITORES PORTUGUESES
GASTÃO CRUZ A VELA A vela que no rio ao luar passa nada revela mas altera o ser de quem a vê sem saber se ela é o signo do amor inexplicado ou os anéis da angústia que a serpente ao corpo da poesia cinge enquanto mais longe as oito luas de saturno sem sonho e sem luar brilham fatais num canto irregular do universo onde nenhum luar acende rios nem angústia ou amor esperam em vão que qualquer verso, inútil, os explique
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ESCRITORES PORTUGUESES
RITA PEA POEMA XVII Ergue-se lá no alto A lua. Imensa e triste… Silêncio! Ouço o canto da sua Luz Ecoar nas minhas palavras… Silêncio! Silêncio! Sinto-lhe as lágrimas a beijar O meu pensamento. Silêncio! Escuto o vaguear do amor No olhar. E nasce o sonho! O sonho de escrever Cada pedaço Teu, no Tempo…
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RESENHA
LUIZ CARLOS AMORIM A LITERATURA DOS CATARINENSES O escritor, professor e historiador Celestino Sachet lançou, há pouco tempo, a
terceira edição do seu livro sobre a literatura produzida pelos escritores de Santa Catarina, “Literatura dos Catarinenses – Espaços e Caminhos para uma Identidade – Poema, prosa, teatro”, com o selo da editora Unisul. Celestino esteve autografando a nova edição, ampliada, do seu livro, na sede da Academia Catarinense de Letras, lotando as dependências da entidade.
catarinenses. Nada do que é publicado em nosso Estado lhe passa desapercebido, tudo é lido e apreciado por ele. Por isso este livro passa a ser, a partir de agora, a maior referência da literatura produzida pelos escritores catarinenses ou radicados em Santa Catarina. Se procurarmos um documento que nos dê o registro de quem escreve em nosso Estado, com certeza é o livro do professor Celestino Sachet que devemos consultar. A primeira edição do livro, com modestas 291 páginas, saiu nos anos 70, com o o título de “A literatura de Santa Catarina”. Lá ele
O professor Celestino é um grande pesquisador da produção literária dos
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apresentava os escritores das principais cidades catarinenses. Em 1985, saiu a segunda edição, ampliada, com 350 páginas, muito mais informação sobre a nossa literatura e um título diferente, por sugestão do editor, o saudoso Odilon Lunardelli: “A literatura catarinense”. Conforme o próprio autor, “a partir de fevereiro de 2000 transferi minhas energias do magistério para uma pesquisa mais ampla sobre o tema dos dois livros anteriores. E o resultado está aí, com uma nova cara: “A literatura dos catarinenses – Espaços e Caminhos de uma identidade”, um calhamaço de 600 páginas e exatos
1.179 autores apresentados, publicada por Marcelino muitos deles submetidos a Antonio Dutra em 1847, uma resumida análise.” considerada a primeira de autor catarinense, até os “- A literatura dos cata- dias atuais. Distribuída em rinenses?” – Celestino poema, prosa e teatro, a pergunta e ele mesmo obra foi temperada com o responde: “Claro! Quem sabor de dois condimentos: escreve não é a entidade, o preferência pela expressão Estado; quem escreve é o “literatura dos catarinenses”, cidadão, aqui nascido, aqui e não “literatura catarinense” vivido ou aqui vivendo.” e indicativos de uma identidade regional difusa, de vez No convite do lançamento que o operário industrial de do livro, a editora apresenta Blumenau-Joinville-Jaraguá a obra: “Um amplo painel do Sul pouco se relaciona da literatura produzida com o pescador do litoral, pelos catarinenses desde com o serrano de Planalto, “Assembleia das Aves”, obra com o colono de Nova Tren-
A antologia POETAS DA ILHA, do Grupo Literário A ILHA, reunindo os poetas Júlio de Queiroz (in memorian), Cláudia Kalafatás, Luiz Carlos Amorim, Marli Lúcia Lisbôa-Bulucha, Maura Soares e Rita Marília, será lançada no dia 12 de novembro, no CIC, em Florianópolis, no Encontro de Poesia do Grupo de Poetas da Trindade, a quem agradecemos a acolhida.
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to-Urussanga-Nova Veneza ou com o “gaúcho” do Oeste e vice-versa.” O livro de Celestino é um documento, uma referência da literatura de nosso Estado. O Grupo Literário A ILHA, com seus 38 anos de trajetória na divulgação das letras catarinense e brasileira, está presente nas páginas de “A LITERATURA DOS CATARINENSES”, com todo um capítulo de várias páginas. A obra de Celestino valoriza o trabalho pionero do Grupo A ILHA.
POESIA
LORENA ZAGO BORBULHAM AS PALAVRAS Os seus olhos me perseguem sem cessar, Seu sorriso alegra e busca o meu olhar, E o vinho nos aproxima a sonhar Que uma vida nos aguarda a comemorar! Em sua taça borbulham as palavras Que em meu peito calam fortes sensações, Este vinho acalanta nossas almas, É impossível controlar as emoções! Longas horas saboreando as suas notas Em uma mesa da cantina italiana, São as uvas e também o seu vinho Que nos movem a alegrias insanas!
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REPORTAGEM
CARLOS ALBERTO FARACO LÍNGUA PORTUGUESA EM PAUTA O professor e sociolinguista Carlos Alberto Faraco, professor titular aposentado e ex-reitor da Universidade Federal do Paraná, fala sobre diversos temas, das origens da língua portuguesa à sua dinâmica de uso nas redes sociais. A sua fala passou pelo surgimento de novos termos (inclusive os estrangeirismos e as gírias) e pelo descarte de palavras, duas faces de um mesmo processo, que é, afinal, próprio da língua. Dos observatórios de neologismos à confecção dos dicionários, o professor mostrou como as palavras se fixam no que chamou de livro do tombo da língua.
Sociopolítica da Língua Portuguesa” (Parábola Editorial, 2016), e do distanciamento entre a norma culta e a norma-padrão, tema do livro “Para Conhecer Norma Linguística”, escrito em parceria com Ana Maria Zilles, professora titular de linguística da Unisinos (RS).
Comunidade de Países de Língua Portuguesa, Faraco está diretamente envolvido na confecção do VOC, o vocabulário comum da língua portuguesa, disponível online desde maio de 2016. O VOC é a reunião das bases de palavras do português de todas as nações lusófonas, feitas Como não poderia deixar em conformidade com o de ser, tratou da história Acordo Ortográfico de 1990. da ortografia do português, marcada por sucessivas ten- Faraco faz questão de tativas de acordos ortográ- dizer que, desde o início da ficos no decorrer do século fixação da ortografia do por20. tuguês, que se deu tardiamente (só no fim do século Coordenador da Comissão 19 e início do século 20), o Nacional do Brasil junto Brasil e Portugal estiveram ao Instituto Internacional às voltas com a tentativa de da Língua Portuguesa, da fazer acordos ortográficos,
Faraco fala com propriedade do fosso sociolinguístico que deu origem à grande divisão entre a norma culta e as variantes populares, tema que perpassa a sua “História
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não reformas ortográficas. “O português nunca teve uma reforma. Fazer uma reforma é mudar as bases da ortografia. A ortografia do português fixou-se em 1911 e os países foram fazendo pequenos ajustes para aproximar as grafias”, afirma.
LÉXICO: UNIVERSO EM EXPANSÃO A ortografia, no entanto, é a única parte da gramática sujeita, de fato, à convenção. De resto, a língua se constrói pelo conjunto de seus falantes, na dinâmica do uso, o que é muito visível no léxico. Faraco lembra cálculo de Antônio Houaiss, que estimava um salto do número de palavras do português de cerca de 50 mil no século 16 para algo em torno de 500 mil no século 20. “O vocabulário de uma língua é um uni-
verso em expansão; ele não tem limites. Novos objetos, novas práticas culturais, os esportes modernos, a comida, o comportamento, para tudo a gente precisa de palavra”, diz.
NEOLOGISMOS: OS EMPRÉSTIMOS LINGUÍSTICOS
‘centre forward’, o ‘referee’ etc. e foram todos descartados”, exemplifica. Os estrangeirismos que passam a integrar o léxico da língua sofrem um processo de “aclimatação”. Alguns são absorvidos integralmente, como “show”, cuja grafia não sofreu alteração, outros são traduções, como “empoderamento” (do inglês “empowering”) e outros são aportuguesados (“esnobe”, de “snob”). O leitor não terá dificuldade de encontrar muitos outros exemplos.
Muitas dessas palavras novas são empréstimos linguísticos, que se fixam por causa da influência de culturas estrangeiras: “No fim do século 19 e início do 20, era muito chique no Brasil usar termos da língua O FILTRO francesa (como “tailleur” ou “soirée”) para descrever a FONOLÓGICO DA moda feminina e os eventos LÍNGUA sociais. Depois da Segunda Guerra Mundial, a ideia de “Normalmente a palavra modernidade se associou que vem de outra língua aos EUA”. passa por um filtro, que é o filtro fonológico da A influência do inglês é língua”, explica o professor, muito presente hoje, mas observando que escrevemos isso não é motivo para pre- “smartphone” mas proocupação com um suposto nunciamos “esmartifone”. risco de descaracterização “Nossa estrutura pede a do idioma. Segundo o pro- vogal que sustenta a sílaba”, fessor, um levantamento da explica. quantidade de anglicismos que, nos últimos cem anos, Antes que alguém diga entraram no português e que nós estamos “falando ficaram chegou a um resul- errado”, Faraco deixa claro tado surpreendente: apenas que esse processo é normal: 4.000 se fixaram. “Quando “O fato de ter essa potenciaeu jogava futebol, eu era lidade é um aspecto bonito ‘back’ (beque); havia o da língua”.
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ERRO DE PORTUGUÊS Aliás, a ideia de erro em língua passa longe de quem se dedica à pesquisa linguística na universidade. Faraco é enfático: “A língua não funciona como a matemática nem como um quartel”. Ele lamenta a educação linguística que se volta apenas à “correção de erros”: “Nós perdemos [com isso] um ponto de observação importante, que é ver a língua em toda a sua mobilidade, na sua ambiguidade, na vagueza, na imprecisão”.
GÍRIA: “O MANGUE DA LÍNGUA” Quem quer conhecer a língua de fato deve abandonar preconceitos. Ao falar da gíria, por exemplo, Faraco explica que essa é
uma faixa do vocabulário muito dinâmica, em que se criam palavras ou se dá novo sentido àquelas que já existem. “A gíria é o mangue da língua; o mangue é o viveiro da vida do oceano, é ali que se formam as novas vidas”, sintetiza.
Tudo leva a crer que a tecnologia venha a impactar também a confecção de dicionários, que tradicionalmente está muito ligada à língua escrita. Como a língua falada vem ganhando o registro escrito nas redes sociais, é possível que, no futuro, esse material seja aproveitado pelos lexicóA internet parece ser mesmo grafos. esse oceano, em que a O DICIONÁRIO: extrema heterogeneidade da língua se manifesta. De “LIVRO DO TOMBO modo totalmente inovador, DA LÍNGUA” a tecnologia permitiu o conPara entrar no dicionário, tato entre as múltiplas varieentretanto, a palavra tem de dades da língua. Poderá ser passar por um “período de também um acelerador do decantação”: “O dicionário processo de mudança liné uma espécie de livro do guística? tombo da língua. Assim como se faz o tombamento MUDANÇA de prédios históricos, de LINGUÍSTICA: “NÃO atividades culturais importantes, também se faz o HÁ PROFETA EM tombamento das palavras, LÍNGUA” mas não é possível incorporá-las logo que aparecem. É “A mudança linguística vem preciso ver se não vão ser do contato; é o contato das descartadas”, explica. variedades que desencadeia processos de mudança. Já Faraco lembra que a língua o caminho das mudanças é sempre tem um número impossível prever porque de palavras muito maior a língua está no jogo das do que aquele que ganha interações sociais. Não há o registro: “O máximo profeta em língua, mas essa que você consegue pôr dinâmica que a tecnologia num dicionário é ainda o nos proporcionou vai ter mínimo”. Isso tem expliimpacto sobre a língua”, cação: “Um dicionário geral afirma. da língua, com a etimologia
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das palavras, o histórico de entrada, as acepções com as abonações, tem de passar por uma filtragem”.
POLITICAMENTE CORRETO: RESSIGNIFICAÇÃO Essa filtragem, é bom que se diga, baseia-se na dinâmica natural das palavras nas interações sociais. Em sua opinião, não há como tirar termos de circulação à força, mesmo que sejam pejorativos ou ofensivos. “As palavras vão sendo descartadas naturalmente, nunca por censura ou imposição; é o próprio dinamismo cultural que ressignifica uma determinada realidade e atribui a ela um nome diferente. A tendência é buscar sempre uma expressão mais precisa, mas a pior coisa que pode acontecer é achar que, substituindo as palavras, o problema está resolvido”, afirma. Faraco, que tem um trabalho importante na área de sociolinguística, não poderia deixar de passar por um dos temas que mais provocam controvérsia entre especialistas em língua.
NORMA CULTA E VARIANTES POPULARES: UM “FOSSO SOCIOLINGUÍSTICO” O professor mostra que as grandes diferenças entre a norma culta da língua e suas variantes populares têm raiz na partição social que se constituiu na época colonial, com uma elite econômica de um lado e uma massa de escravos e trabalhadores pobres de outro. Isso repercutiu na história social do país e, consequentemente, na língua. “Há um fosso sociolinguístico, histórico, muito acentuado entre a língua que os letrados praticavam (e praticam) e a língua que o povo, a massa que não era letrada, praticava. Há uma vinculação entre a cultura escrita, a escola, o tempo de escolaridade, o grau de renda e a língua que a pessoa fala”, resume.
SOBREPOSIÇÃO DE NORMAS Essa distinção, no entanto, vai além da oposição entre norma culta e variantes populares. Não bastasse
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essa acentuada divergência, “por cima dessa norma culta, nós temos outra, a norma-padrão, que é uma invenção efetivamente”. Em suma, existe outra divisão, “uma dualidade entre a prática efetiva dos falantes letrados e o modo como se diz que eles deveriam falar ou escrever”. Esse não é um problema só brasileiro, conforme explica Faraco. Esse é um problema da América Latina, “pois se criou na tradição histórica da região a ideia de que a língua como se fala nas colônias é cheia de erros, é descuidada”. Difundiu-se a ideia de que “a língua modelar mora em outro lugar; o espanhol mora em Madri e o português mora em Lisboa”. Assim, no século 19, criou-se uma norma-padrão que tomou como referência a norma portuguesa. Nas palavras de Faraco, “os letrados vivem essa ‘esquizofrenia’, essa distância entre o que fazem e o que deveriam fazer”. O desafio, portanto, é atualizar a norma-padrão para que ela, no mínimo, reflita a realidade dos falantes da norma culta.
POESIA
FÁTIMA CARDOSO A FOTO Sorriso enigmático seduz o olhar perdido. Adentra na alegria ofuscante, escorrega na entranha arranhada. Encontra mágoa incrustada. Gotas gélidas deslizam nas maçãs quentes. Bradam soluços intermitentes na esquina dos sonhos perdidos. Tropeçam no abraço caloroso. Aninham-se no peito indolente. Adormecem nos lábios do amor. Aprisionada, a foto permanece pendurada na parede.
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CONTO
ISA SARAIVA FERREIRA A HISTÓRIA DO RELÓGIO Logo após seu casamento, vovó constatou que o salário do vovô não seria o suficiente para realizar seu sonho da casa própria. E agora, então, com o primeiro filho a caminho, as despesas só tenderiam a aumentar. Ela, no entanto, não era de ficar esperando que dias melhores viessem, sem que colaborasse com o destino. Arregaçaria as mangas e agiria. Mas fazer o quê? Na época, trabalhar fora só como professora. E ela não tinha qualificação para isso. O jeito seria investir no conhecimento. Habilidosa como era, tomaria então aulas de bolo e confeito. Assim, trabalhando em casa, poderia confeccionar bolos de festa, contribuindo em muito na economia do lar, ao mesmo tempo em que daria assistência à família, em horário integral.
vezes em forma de livro, de coração, de estrela… Mas naquela tarde fizera um relógio. Era um lindo reloginho branco, com mostrador bem ao centro, modelo muito usado sobre os móveis de sala.
um agradecimento singelo mas original e que ele, por certo, haveria de gostar. O compadre não só gostou, como valorizou tanto aquele trabalho de arte, que confessou não ter coragem para desmanchá-lo em fatias. Pedia licença à vovó para ofertá-lo a um grande amigo. Não conseguiria encontrar nada tão belo e ao mesmo tempo tão aparentemente saboroso, para alguém apreciador da boa mesa, como o amigo em questão.
O bolo ficara tão delicado que era pena partí-lo. Melhor seria oferecê-lo como presente ao compadre Reis. Seria uma forma de agradecer o grande favor que prestara à família, quando gentilmente se ofereceu como avalista da casa em que moravam de aluguel. Vovô aprovou a ideia. Seria, A s s i m s e n d o , n o d i a no mínimo, uma gentileza, seguinte, compadre Reis
A cada aula, ela trazia para casa o produto da lição, às
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saiu de casa levando seu relógio doce. Foi direto à igreja e ao amigo vigário o ofertou. O padre ficou muito feliz com o presente. Mas disse que o bolo deveria pertencer não a si, homem solitário, mas a uma família, com mais pessoas que o admirassem e o provassem. Por isso seria leiloado na quermesse: era sem dúvida
uma linda prenda! E assim pelo fato do compadre aconteceu. passá-lo adiante e ir parar em mãos estranhas. Para Vovó nunca soube dizer se ela, o importante de tudo, quem arrematou o leilão a grande gratificação, foi fez também do relógio um saber de tantos sorrisos presente para alguém que que se abriram, de tantos estimava ou se saboreou corações que se alegraram. aquele bolo recheado e de Enfim, de tantas pessoas massa fofa, escondido sob que ficaram um pouco mais fina renda de glacê. Nem felizes ao receber algo feito tampouco ficou ressentida por suas mãos.
UM VIOLINO E A SUA POESIA
Por Luiz Carlos Amorim
Hoje, nesta manhã linda de sol, quando a primavera voltou para encantar nosso dia, ao passar perto da Praça Quinze, uma onda de música, quase magnética, me puxou para ver que som fantástico era aquele. E eu segui a música e reconheci o violino mavioso que lançava poesia transmutada de som – ou seria o contrário? – no ar e logo avistei o violonista que executava aquela performance quase divina. Que som maravilhoso aquele, a me elevar acima do meu corpo e a me embalar, fazendo-me viajar de carona nas notas daquela que nem era uma música clássica, era uma música até bem popular, Despacito. E me sentei na escada da Igreja Matriz, mas minha alma continuou voando ao som do violino. Não prestei atenção ao barulho das pessoas em volta, no burburinho do vaívem que não parava, porque eu ouvia apenas a música. Aí pensei que primavera é isso, o sol brilhando em todos os lugares e a música me envolvendo, nos envolvendo a todos, entrando por todos os poros de cada um de nós. Meus olhos só viam a música daquele violino mágico, meus ouvidos só ouviam a música, meus sentidos só percebiam a música. A música, poesia do som, me transportou para um mundo perfeito, para o mundo da poesia e eu era apenas uma alma dançando ao sabor daquele violino, arrebatado pelas suas notas. Eu voei como nunca nas asas de um violino, nas notas da divina música, divina poesia.
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POESIA
GISLAINE ELLING INTERIOR HABITADO Existe alguém dentro de mim sondando campos, violentando limites, impulsionando aspirações. Alguém dentro de mim vive rasgando formas, provocando vibrações, mostrando-me ângulos variados. Dentro de mim existe alguém amando-me estranhamente, amando-me tão somente. Este alguém faz-me sentar à beira dos meus caminhos e pensar, retroceder, regressar às minhas raízes. Observa-me e compreende as minhas escolhas. Este alguém é como átomo de luz a absorver meu interior, conscientemente posicionando meus atos, fingindo meus pensamentos, fazendo dos meus poemas pedaços de mim, fazendo dos meus sonhos motivos para viver.
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REPORTAGEM
JACKMICHEL DUAS ESCRITORES EM UMA
tora, 2015),
de Lata (Helvetia Edições, 2017) e
LSD Lua (Drago Editorial, 2016), 1 Anjo MacDermot Anotações Da Lagarta Papinha (Editora Leia JackMichel é o primeiro (Drago Editorial, 2016), Livros, 2018). grupo literário na história da literatura mundial, com- Sorvete de Pizza Mentolado É associada da ACIMA posto por duas escritoras: x Torpedo Tomate (Drago (Associazione Culturale Jaqueline e Micheline Editorial, 2016), Internazionale Mandala), da Ramos. São irmãs e nasLITERARTE (Associação ceram em Belém – PA Ovo (Drago Editorial, 2016), Internacional de Escritores (Brasil). O tema de sua obra e Artistas), da AMCL (Acaé variado visto que possui Papatiparapapá (Editora demia Mundial de Cultura e livros escritos nos gêneros Illuminare, 2017), Literatura) e da UBE (União ficção, poesia, romance, Brasileira de Escritores). fábula e conto de fadas. Sixties (Helvetia Edições, Seus contos e poemas Publicações: 2017), constam em antologias internacionais bilíngues. Arco-Jesus-Íris (Chiado Edi- Tim, O Menino do Mundo Também foi destaque em diversos jornais e revistas on-line de literatura, artes e cultura. Participou de salões literários na Europa e no Brasil. Recebeu Menção Honrosa no Prêmio de Excelência Literária “Troféu Corujão das Letras”, conquistou o 3º lugar no Concurso Cultive de Literatura “Prêmio ALALS de Literatura” e no I concurso literário da Casa Brasil Liechtenstein
Alguns dos livros publicados por JackMichel
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e o 1° lugar no II Festival de Poesia de Lisboa. Seu slogan é “A Escritora 2 Em 1”. Website Oficial da JackMichel A Escritora 2 Em 1 https://www.websiteoficialjackmichelaescritora2em1. com/ JackMichel/redes sociais: Facebook: https://www. facebook.com/escritoraJackMichel/ Twitter: https://twitter.com/ JackMichel2017 Instagram: https://www. instagram.com/jackmichel2017/ Google+: https://plus.google. com/112246483579431089961 Tumblr: https://escritorajackmichel.tumblr.com/ Pinterest: https://br.pinterest. com/jackmichel2017/ Google+: https://plus.google. com/112246483579431089961 JackMichel/vídeo: JackMichel “A Escritora 2
em 1” Promo Video https://www.youtube.com/ watch?v=3F8J4ck6XHU JackMichel “A Escritora 2 em 1” Iº Lugar no II Festival de Poesia de Lisboa - Promo Vídeo https://www.youtube.com/ watch?v=E3EgcVsLzBA JackMichel Books - Promo Vídeo https://www.youtube.com/ watch?v=qKNNsL0Kb6E JackMichel na Bienal Internacional do Livro/Rio 2017 - Promo Vídeo https://www.youtube.com/ watch?v=lJ3IrJ9Gg7Y Booktrailer Arco-Jesus-Íris – JackMichel https://www.youtube.com/ watch?v=iBjgF0DkAik&t=34s Spot Televisivo LSD Lua – JackMichel https://www.youtube.com/ watch?v=Khg1oKH6WKo Spot Televisivo 1 Anjo MacDermot JackMichel h t t p s : / / w w w. y o u t u b e . com/watch?v=dmVR-jE07pU&t=31s Spot Televisivo Sorvete De Pizza Mentolado X Torpedo Tomate JackMichel https://www.youtube.com/ watch?v=Zn5xRdnwJvQ Spot Televisivo Ovo – JackMichel https://www.youtube.com/ watch?v=dsBd0O_e5WI Book Trailer Oficial da obra
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Papatiparapapá https://www.youtube.com/ watch?v=qbC4iWoCsTo Spot Televisivo da obra Sixties – JackMichel https://www.youtube.com/ watch?v=FqOHYwE6Ukw Spot Televisivo da obra Tim, O Menino do Mundo de Lata JackMichel https://www.youtube.com/ watch?v=vNetlo9xB9Q Book Trailer Oficial da Obra Anotações da Lagarta Papinha - JackMichel https://www.youtube.com/ watch?v=3NS_atm9t9Q JackMichel na 25ª Bienal do Livro de São Paulo https://www.youtube.com/ watch?v=-nJNEnWOirM
ENTREVISTA
JACKMICHEL ENTREVISTA COM JACKMICHEL EB- Porque resolveram fundir as duas escritoras numa só? JACKMICHEL - O primeiro grupo como o nosso da história da literatura surgiu por acaso, da necessidade de juntar textos. Daí tivemos o timing certo para mover esse meio estático da literatura convencional, composto por autores individuais: dar vida a uma terceira pessoa, JackMichel, cujo slogan é “A Escritora 2 em 1”. EB - A sua produção é escrita a quatro mãos, ou cada uma escreve uma parte, ou a maturação do tema é
das duas, mas apenas uma JACHMICHEL - O tema escreve? da obra é variado visto que JackMichel já escreveu livros JACKMICHEL - Jack e de ficção, poesia, romance, Michel não escrevem juntas. fábula e conto de fadas. A concepção de uma obra é planeada pelo know-how téc- EB - Há algum gênero que nico e criativo de ambas; já o o avatar das duas escrevam critério utilizado para a elabo- que seja preferido por apenas ração da escrita se dá unindo uma? as cotas de texto a posteriori. Trocando em miúdos: às JACKMICHEL - Tendo vezes, Jack escreve a maior escrito livros em múltiplos parte de um livro e separa gêneros literários, não há trechos para Michel preen- identificação maior com cher... outras, esta cria o título poemas, romances, fábulas e aquela a compõem... de ou conto de fadas. modo que, ao fim do trabalho, não se consegue detectar EB - Antes de se unirem os enxertos realizados tão num avatar apenas, as duas já coesos são os resultados. escreviam individualmente? Uma mescla perfeita tal qual o queijo com a goiabada. JACKMICHEL - Quando Micheline “Michel” Ramos EB - Que gêneros a dupla começou a rascunhar seus escreve? primeiros manuscritos, Jaque-
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line “Jack” Ramos, sua irmã e parceira literária já pegava na pena. Anos depois, haja vista termos acumulado muito material escrito, decidimos unir os calhamaços. EB - Escrever é o seu trabalho desde sempre, ou praticam outra profissão? JACKMICHEL - Sim, sempre tivemos a escrita como profissão; e creio que as aptidões de cada ser humano são dons inatos adquiridos antes do berço e que são levados além do túmulo.
EB - Quantos livros e de que Leia Livros, 2018). gêneros a escritora que une duas escritoras já publicou? EB - Para o eleitor interessa a qualidade da obra. Vocês JACKMICHEL - Arco-Jesus- percebem alguma diferença -Íris (Chiado Editora, 2015), na aceitação de seus leitores, LSD Lua (Drago Editorial, quanto à obra ser escrita por 2016), 1 Anjo MacDermot duas pessoas? (Drago Editorial, 2016), Sorvete de Pizza Mentolado JACKMICHEL - É inato no x Torpedo Tomate (Drago ser humano a curiosidade e o Editorial, 2016), Ovo (Drago fascínio por coisas novas. O Editorial, 2016), Papatipa- público leitor recebeu muito rapapá (Editora Illuminare, bem “a escritora 2 em 1” que 2017), Sixties (Helvetia Edi- professa o lema “Escrever é ções, 2017), Tim, O Menino Viver”. Com razão, Fernando do Mundo de Lata (Helvetia Pessoa disse “Eu não escrevo Edições, 2017) e Anotações em português. Escrevo eu Da Lagarta Papinha (Editora mesmo.”.
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POESIA
SILVIO OLIVEIRA DIAS OCEANIA Adormeci poema em frondosos mares E vi meu sonho dividir fronteiras; O amor implantou bandeiras E criou das pérolas lindos colares. O mar, esse mar meu, se vestiu de luto Com a chegada da primeira noite. O negro vento se fazendo açoite, Às costas do marujo bronzeado e bruto! A vagar deixando a nau do amor, Esse mar, às vezes, se faz brando Se pondo a sonhar amando. O arrojo intrépido da humanidade-flor! E despertei-me, também, nauta poesia Sentindo inveja desse mar-tormenta Tocando meu rosto e que sustenta Lembranças de outras praias em maresia! Singrando mares segue o sonhador Em pensamentos e o mar que o sul costeia, Escreve poemas na areia E dá vida ao sonhador!
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POESIA
ELSE SANT´ANNA BRUM PERSISTÊNCIA Se paro e penso tua imagem aparece. Não há momento em que este amor que me aquece deixe de ser canção a alegrar a iluminar meu coração e meu caminho. Do coração fiz altar para a mais ardente prece. Meu caminho enchi de flores somente pra te esperar. De minhas madrugadas fiz vigília para ser a primeira a te abraçar!
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RESENHA
LUIZ CARLOS AMORIM AS VINHAS DA IRA – A LITERATURA NO CINEMA Vi, mais uma vez, o filme “As Vinhas da Ira”, da obra de Steinbeck, publicada em 1939. O filme, dirigido por Henry Fonda, foi realizado logo no ano seguinte ao do lançamento do livro, em 1940, evidenciando o sucesso desta que é a obra-prima de Steinbeck, e que mostra a exploração do homem do campo, expulso da terra quando do advento da mecanização agrícola no sul dos Estados Unidos. Vendo-se sem casa e sem
terra, o agricultor é atraído por tentadoras, mas mentirosas ofertas de trabalho nos pomares da Califórnia. Acontece, então, a invasão da Califórnia por milhares de agricultores do sul que buscam trabalho, mas que quando o encontram não recebem por ele o suficiente para comer.
mas não chegam a comprometer a homogeneidade da obra. É o caso, por exemplo, do casal que se junta, no caminho para a Califórnia, à família Joad. O fato de uma família socorrer outra na corrida pela busca da sobrevivência, apesar de escorraçada e destituída de tudo quanto teve até então mostra, no livro, o espírito O filme prima pela boa de fraternidade daquele interpretação e pela fideli- gente lutadora e sofrida. dade quase que total à obra de Steinbeck. Apenas o O livro “As Vinhas da Ira”, final do livro foi suprimido de Steinbeck, lembra um no filme, talvez pelo forte pouco, pelo tema, pelas impacto dramático que cer- personagens e pelas situtamente causaria. ações, a obra-prima de Zola, “Germinal”, escrito O autor, no seu livro, bem antes que a primeira, registra a importância dos ou seja, em 1881, há mais trabalhadores diante da implacável prepotência dos senhores de fazendas, detentores das fontes de trabalho. Trabalho que deveria dar ao trabalhador condições de ganhar o mínimo necessário para comprar o seu alimento, sem o que morreria de fome.
Algumas personagens e situações também foram deixadas de lado no filme,
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de cem anos. A impressão que se tem, é que Steinbeck talvez quisesse , com “As Vinhas da Ira”, transportar os protestos por melhores condições de trabalho, por uma vida mais digna e pelos direitos do homem, das minas de carvão, da França
(Germinal), para os campos lerância de seus patrões, de algodão e pomares da mas mostram a situação Califórnia. do homem do campo, que cada vez mais é injustiçado Os agricultores – ou cule obrigado a abandonar as tores da terra – de Steinbeck, não chegam a se levantar suas terras para ir morrer como os mineiros de Zola, de fome na cidade grande. contra a ganância e into- Ainda hoje.
POEMA
JACQUELINE AISENMAN QUASE O TEMPO… é quase tempo do calor partir o calor excessivo que satura o corpo… quase tempo de ver chegar a brisa as chuvas leves o leve frio… quase tempo de ver as folhas das árvores se transformarem como se pintadas por um artista do verde ao amarelo, ao laranja, ao vermelho… depois bailarem ao som das músicas dos ventos até cobrirem o chão como um tapete divino! lindezas de uma natureza-mãe. é quase tempo de outono e as temperaturas amenas acenam e eu respondo com um sorriso feliz.
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CONTO
LUIZ CARLOS AMORIM QUERO SER PAPAI NOEL
Velhinho nos Natais que eram sempre felizes se ele, Bruno, estivesse por perto.
Naquele ano, quando já passava dos sessenta natais, ele realizaria seu sonho: seria o Papai Noel da família.
Bruno sempre fora fascinado pela imagem de - Não vou ser um Papai Papai Noel, desde muito Noel convincente, magro - Estamos ainda no pequeno. O carisma como sou, vou ficar uma inverno, até dezembro e o mistério em torno figura sofrível com barba minha barba já terá cresdaquela personagem que postiça e muito enchi- cido o suficiente. o fazia esperar ansioso mento – lamentava, triste. o Natal, quando criança, - Mas a barba de Papai não o abandonara jamais, Então, quando os cabelos Noel tem que ser bem mesmo depois de adulto. comprida – dizia sua esposa – será que ela O final de ano era a crescerá o bastante? época mais feliz para ele, pois tentava incutir - Minha barba cresce nos filhos e sobrinhos e rápido – respondeu ele – depois nos netos o amor bem mais rápido do que pelo Velhinho de barbas o cabelo. brancas e roupa vermelha, que vinha em todos Quando novembro os Natais para trazer chegou, a barba de Bruno algum presente, por mais não estava tão comprida humilde que fosse. Um como ele queria que estiVelhinho bom que anunvesse, mas estava dando a ciava o nascimento de ele um ar de Papai Noel: um Menino que poderia começaram a rarear e a quase toda branca, muito salvar o mundo, se dei- ficarem brancos, decidiu serrada, era o orgulho xássemos, ele dizia. deixar a barba crescer. Já dele. não tinha mais aquele Até a meia idade, era corpo delgado, a idade Paralela a sua felicidade muito magro. Era louco lhe trouxera uma bar- por estar se preparando por uma possibilidade riguinha e achava que para encarnar o Velhinho de se vestir de Papai finalmente ficaria um do Natal, umas dores Noel, representar o Papai Noel de acordo. foram aparecendo e
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pior – já estava Dois dias depois do Natal, e m e s t a d o os médicos avisaram adiantado. à família que Bruno poderia ir-se a qualquer Os parentes momento. Ele estava e os amigos muito abatido, desfiguvinham vê-lo rado, até. Sabia que sua e ao mesmo hora estava chegando. tempo em que ficava feliz por Chamou seu filho mais rever pessoas velho e falando com dififoram se acentuando, queridas que há algum culdade, fez seu último mas o médico dizia que tempo não encontrava, pedido: não era nada, coisa cor- ficava triste porque riqueira, era apenas a poderia ser a última. Até - Júlio, lembra de Adão, idade avançando: artrites, “seu” Adão, grande amigo que esteve aqui antes do artroses, essas coisas. que ficara cego em decor- Natal, me visitando? rência de um acidente, Mas, quando em meados viera visitá-lo. - Sim, lembro, pai. O seu de novembro, ele amigo que ficou cego. começou a emagrecer Definhava e o sofrimento muito rápido, ficou preo- aumentava com os tra- - Pois é. Quero doar cupado: tamentos que lhe eram minhas córneas para ele. ministrados, como qui- É meu presente de Natal, - Como vou ser um bom mioterapia e radioterapia. ainda que atrasado. Papai Noel, se ficar assim, Dezembro o pegou já magro como palito? – confinado à cama e não E assim foi. Antes que reclamava, mais do que poderia, de forma alguma, dezembro terminasse, das dores. ser Papai Noel naquele Bruno foi-se. Mas conNatal. seguiu ser o Papai Noel Infelizmente a preocude Adão, mesmo que não pação dele em não se Foi o Natal mais triste da estivesse redondo para tornar mais um Papai vida de Bruno. A vida lhe vestir a roupa vermelha, Noel magrelo e sem escapando por entre os que combinaria perfeitagraça era o de menos. Os dedos justamente quando mente com a sua barba médicos descobriram que iria ter o mais lindo Natal branca, então já bem Bruno tinha câncer e – que poderia existir. comprida...
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POEMA
ROSÂNGELA BORGES O CARACOL O caracol De tênis, chapéu e óculos de sol Decidiu ser atleta "Vou pilotar um carro Ou então uma motocicleta Vou ser um corredor na maratona Afinal, a São Silvestre está aí, Posso praticar skate, surf Ou ir para o Havaí Posso fazer muita coisa Cuidar um pouco de mim... Só não posso ficar assim, Andando lentamente Vendo a vida passar por aqui E o mundo seguindo em frente!
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POEMA
ARLETE TRENTINI DOS SANTOS NAMORO NO PORTÃO Eu lembro daquele tempo, Namorava no portão Os olhos falavam tudo O que sentia o coração. Um sorriso encabulado Ou até um beijo roubado Faziam parte então Do namoro no portão. Transpor o portão então Era coisa muito séria Podia beijar as mãos Não se pensava em bactéria Namorar, noivar e casar Era coisa elementar. E ninguém duvidaria Acabaria sempre no altar
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DÊ LIVRO DE PRESENTE NESTE NATAL. Peça seu exemplar pelo e-mail
revisaolca@gmail.com
ou no site da editora Clulbe de Autores - https://www.clubedeautores.com.br/book/176534--HISTORIAS_DE_ NATAL#.W88o1flrzIV ou https://bit.ly/2OTSppd
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