Revista SUPLEMENTO LITERÁRIO A ILHA - Edição 147 - Dez/2018

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SUPLE MENTO

LITE RÁRIO Florianópolis–SC • Dezembro / 2018 • N.147 • Edições A ILHA • Ano 38

LANÇADA A ANTOLOGIA “POETAS DA ILHA”–Festa da Poesia MACHADO: CRÍTICA E RENOVAÇÃO DO FAZER LITERÁRIO

UM NOVO CRISTO: E SE FOSSE VERDADE?

ADÉLIA PRADO: ESCREVER É FANTÁSTICO! Portal A ILHA: http://www.prosapoesiaecia.xpg.uol.com.br


Florianópolis–SC • Setembro / 2018 • N.147 • Edições A ILHA • Ano 38

COMPANHIA

GENTILEZA

Luiz Carlos Amorim -

Chris Abreu -

Florianópolis, SC

Florianópolis, SC

A poesia me acompanha,

Segundo a querida Isa,

Aonde quer que eu vá.

Gentileza gera gentileza.

Está no rosto das pessoas,

Num mundo onde o gesto

Nos lugares por onde passo,

Se apresenta em desuso,

A adentrar meu olhar,

Admiro sua tamanha certeza,

A encantar os meus olhos,

De que o mais importante

Porta de entrada da alma.

É cultivarmos a doçura,

Ela está na música,

Mesmo que se receba aspereza.

Em todos os sons da vida,

Mas no fim, tem ela razão!

Nos sons da natureza.

Se quero pra mim

Ela está na voz das pessoas,

Um mundo melhor

Nas palavras que eu ouço,

De paz e solidariedade

Nos risos e nos sorrisos.

Primeiro ofereço

A poesia está em tudo.

Amor e bondade.

Ela mora em mim,

Na esperança de que

Em meus amigos,

No exemplo se espelhem,

Em meus amores, também.

Demonstro previamente,

Por isso estou sempre com ela

Ternura e compreensão.

Minha eterna companheira.

E assim confio e ensejo, Que aos bons de coração, Muitos se assemelhem. Segue sua missão, querida Isa Sou mais uma a acreditar Na gentileza gerando gentileza No amor ao próximo Como prática salutar. 2


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SUPLE MENTO

LITE RÁRIO

EDITORIAL O Grupo Literário A ILHA encerra mais um ano literário entregando uma nova edição da sua revista aos seus leitores. E neste ano de 2018, quando o grupo e a revista comemoraram trinta e oito anos de atividades literárias, de existência e resistência, sem nenhum apoio oficial, entregamos também aos nossos leitores mais uma antologia poética, desta vez com poetas da capital Catarina, justificando duas vezes o título do livro: POETAS DA ILHA. Nesta edição, reportagem completa da festa de lançamento da antologia, acontecida no CIC – Centro Integrado de Cultura de Florianópolis. Neste ano de 2018 o Grupo Literário A ILHA amplia, também os espaços fixos para a obra de novos escritores, já que a sua revista SUPLEMENTO LITERÁRIO A ILHA, com trinta e oito anos de circulação, não estava mais comportando a demanda da produção que há para publicar. E lançou a nova revista ESCRITORES DO BRASIL, que com a segunda edição entregue ao público já conta milhares de acessos. Então cá está a última edição do ano, edição especial de Natal, com vários poemas e contos sobre o tema, e com muitos outros assuntos literários e culturais: muita prosa e muita poesia. Desejamos a todos os nossos leitores o Natal mais feliz de suas vidas e um novo ano melhor do que qualquer outro. O Editor

Visite o Portal PROSA, POESIA & CIA. do Grupo Literário A ILHA, na Internet, http://www.prosapoesiaecia.xpg.uol.com.br 3


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disputadíssima entre três mães muito preocupadas em realizar o desejo de consumo de uma filhinha mimada. O nome Betina já veio da TEMPO DE fábrica. Era o nome de NATAL uma atriz famosa de uma Luciane Mari novela infantil de um canal Deschamps – de televisão que sempre Florianópolis, SC estava com boa audiência. Para alegria das pequenas etina era a boneca fãs, a atriz foi “transformais linda do mada” em brinquedo que mundo! Tinha no foi desejado de uma hora rostinho de borracha a expressão das crianças felizes. Usava um vestido de flores miúdas e coloridas, com rendas na barra da saia e nas manguinhas fofas. Os cabelos loiros e lisinhos eram presos em duas partes, com laços vermelhos de cetim. Betina representava as meninas de um grupo especial de crianças bem tratadas e para outra, depois de um nutridas, pois tinha as anúncio publicitário na TV. bochechas grandes e Aliás, depois de muitas rosadas. Trazia um sor- propagandas de variados risinho meigo no rosto brinquedos. angelical. A menina que a ganharia A boneca chegou numa na manhã de Natal a noite de Natal, embrulhada quis logo que soube do em um papel de presente lançamento. A garotinha verde, todo cheio de nem mais brincava com Papais Noéis sorridentes. bonecas. Suas atividades O novo brinquedo foi com- estavam relacionadas a prado em um Shopping celulares, internet, redes Center recém-inaugurado, sociais e jogos eletrônicos. na ala sul da cidade, e Já estava “grande” demais

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para brincar com bonecas! Imagine, já tinha cinco anos! Era uma mocinha! Betina foi desembrulhada com a euforia desejosa de todas as crianças. Foi admirada e levada no colo para ser exibida na casa dos avós e primos. No início da conversa dos parentes, as atenções até foram voltadas para ela, mas isso logo mudou quando todos resolveram falar dos artistas e da novela das nove que começou em substituição àquela que Betina, a atriz, era a personagem principal. Mesmo a dona da boneca não falava mais do brinquedo que ganhara. Logo ficou bem interessada pelo jogo eletrônico do primo um ano mais velho do que ela. A bonequinha de vestido florido e de rostinho angelical ficou jogada no sofá enquanto as crianças se divertiam em disputar a próxima fase. Somente foi recolhida dali na hora da saída por um dos adultos da casa. Betina era só mais um brinquedo e não tinha nada de especial e atraente para a menina que a esquecera no sofá da casa dos avós em um dia de Natal.


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DEZEMBROS Selma Franzoi de Ayala – Jaraguá do Sul, SC

Espelho mágico do tempo

compor os lagos

projetando minhas memórias… Algumas memórias escondidas

Algodão no pinheiro porque neva no Natal…

outras reveladas, poucas revividas

Enfeitar o pinheiro e o presépio,

algumas quase esquecidas…

lembranças de tantos dezembros…

Segredos do tempo

Espelho mágico do tempo

sabor a dezembro, sabor do tempo

segredos do tempo

perfume de uva, sabor de uva

sabor a dezembro

sabor a Natal, tempos de Natal

perfume de todas as flores de dezembro

sonhos de Natal…

cântico de cigarras

Banho de chuva em tardes de dezembro

Todos os caetés do meu riacho

todas as flores de dezembro,

perfumando o silêncio

flor do mato, de jasmim,

que a noite do meu vale traz…

flor de boa noite, flor do tempo

Dezembros.

todos os caetés do meu riacho perfumando o silêncio que a noite do meu vale traz… Ingá, araçá, pitanga, bacupari sabor a dezembro segredos do tempo, cântico de cigarras sonhos de natal… Barba de velho, casquinha de cigarra, ninho de passarinho, fragmentos espelhados para 5


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como é frustrante esse tempo! Mas depois vem o período em que a criatividade anda à solta, e então, como é SER ESCRITOR bom! Não há momento Urda Alice Kueger em que a gente viva – Palhoça, SC tão plenamente, tão intensamente quanto vida do escritor naquele momento em é uma coisa que, com uma caneta muito difícil e na mão, conquista-se gratificante. Há aqueles períodos em que nada se consegue escrever, quando a sensibilidade fica embotada, a imaginação falha, o cérebro torna-se pequeno e opaco, e então a vida perde o colorido, o brilho, fica tão difícil viver! Não adianta ter tempo disponível, material de pesquisa à disposição, todas as facilidades do mundo, porque é época o mundo, o universo de não se escrever, e todo, todos os senti-

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mentos que as pessoas podem sentir, todas as situações possíveis. Ah! O milagre do desabrochar de uma ideia que vai transformar-se em um livro! É um universo todo novo que se descortina, e passar a ideia para o papel é como mergulhar de cabeça na doce loucura desse universo. E então a vida é gratificante, como é! Fica-se desejando que o tempo da criação nunca termine, para que seja mais fácil carregar o fardo de se ser um escritor, já que é um fardo do qual a gente não pode se desfazer. Afinal, as pessoas não escolhem ser escritoras – elas nascem escritoras!

LEIA Para adquirir os livros “MEU PÉ DE JACATIRÃO” – poemas e “PORTUGAL, MINHA SAUDADE”– crônicas, pedir pelo email revisãolca@gmail.com

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ESPAÇOS Rosângela Borges – México

Das altas torres dos meus castelos,

Das altas torres dos meus castelos,

da janela triste, sombria, molhada,

no quarto frio, escuro, sem vida,

sinto e imagino canções…

revivo meus sonhos

Canções tristes que falam de amores

e adormeço no meu pequeno

calo minhas palavras,

espaço de vida…

de sonhos, de vida… A solidão me inspira. A chuva molha meus pensamentos, dando vida ao meu coração. Falo de amores, com esperanças nascidas na solidão. Falo de sonhos, com incertezas nascidas nos pensamentos. Falo da vida, com liberdade, nascida da chuva. Falo de mim, sem esperanças, com incertezas, sem liberdade.

A poetisa joinvillense Rosângela Borges Wiemes é catarinense, mas vive no México há vários anos. Tem três livros de poemas publicados no Brasil e participa do Grupo Literário A ILHA desde o seu início, quando ainda era uma garotinha, mas escrevia os melhores poemas românticos. E ainda escreve. 7


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NASCE A REVISTA ESCRITORES DO BRASIL Por Luiz Carlos Amorim – Escritor, editor e revisor – Fundador e presidente do Grupo Literário A ILHA, que completou 38 anos em 2018. Cadeira 19 da Academia Sulbrasileira de Letras. Http:// lcamorim.blogspot. com.br

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Grupo Literário A ILHA existe há 38 anos, fundado que foi em São Francisco do Sul em 1980, quando começou a publicar, também, a sua revista SUPLEMENTO LITERÁRIO A ILHA. Em 82 o grupo mudou sua sede para Joinville, onde espalhou sua atividade literária e cultural por todo o norte de Santa Catarina. No início deste século, em 2000, a sede foi mudada outra vez,

desta vez para Florianópolis, justificando novamente o título. E o Suplemento Literário A ILHA continuou a divulgar a literatura de Santa Catarina para o Brasil e também para o mundo, a partir do advento e do alcance da Internet. A revista, a mais perene do gênero em Santa Catarina e quiçá do Brasil, lançou muitos escritores que hoje são representantes importantes da literatura aqui do Sul e do Brasil. E continua a agregar os novos e também já consagrados escritores daqui do Estado, do país e também de outros países, como Portugal, Rússia, México, Estados Unidos, Bélgica, Suiça, Índia, Cabo Verde, Espanha, Itália, etc. E projetando escritores brasileiros em outros países, através do alcance que a revista tem e da participação do grupo em feiras e salões internacionais do livro em países europeus. Com os trinta e oito anos de trajetória, a revista tornou-se pequena para tantos 8

escritores que querem divulgar a sua obra. Então o Grupo Literário A ILHA lançou, em agosto, logo após completar os seus 38 anos de atividades, um novo espaço para novos escritores: a revista ESCRITORES DO BRASIL. A revista começa dando espaço a escritores brasileiros, mas está aberta à produção de literatura em língua portuguesa, integrando também os países da lusofonia. Publicamos poesia, conto, crônica, ensaios, entrevistas, excertos de romances, litratura infantil e infanto juvenil, artigos literários e culturais, resenhas, etc. A revista Suplemento Literário A ILHA, a partir da edição de aniversário que comemorou os 38 anos de trajetória, de persistência e de resistência no objetivo de divulgar literatura, cultura e informação literária e cultural, tornou-se eletrônica, digital, para se adequar à atualidade e fugir de custos que estavam inviabilizando a sobrevivência do


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projeto. E a nova revista ESCRITORES DO BRASIL já nasceu on-line e a sua primeira edição teve milhares de acessos. A segunda edição saiu em novembro e já tem, também, milhares de leitores. E a estreia da revista ESCRITORES DO BRASIL, das Edições A ILHA do Grupo Literário A ILHA foi um sucesso. Milhares de acessos, leitores por todos os cantos do mundo, tanto que na segunda edição, que já está circulando na internet, temos uma seção de Escritores Portugueses. E como está havendo procura, mesmo que o título da revista seja Escritores do Brasil, abriremos mais espaço para escritores dos países

lusófonos. A segunda edição da revista ESCRITORES DO BRASIL, com apenas uma semana de

circulação, já contava com milhares de visualizações. Nela, muita prosa e poesia, muita informação literária e cultural, em assuntos como “Língua Portuguesa em Discussão”, Grandes Poetas Brasi-

leiros, Entrevistas com Lýgia Fagundes Teles e Enéas Athanázio, “Raquel de Queiroz, a Dama das Letras”, “Por um Novo País”, “As Cores da Poesia”, “A Literatura dos Catarinenses”, “As Vinhas da Ira, a Literatura no Cinema” e muito mais. A revista ESCRITORES DO BRASIL pode ser lida on-line gratuitamente, na página do GRUPO LITERÁRIO A ILHA e na página deste articulista no Face, assim como no Blog CRÔNICA DO DIA, em http:// lcamorim.blogspot. com.br . Quem quiser ter a revista impressa, pode pedir o arquivo em pdf para imprimir, pelo e-mail acima mencionado.

Visite o Blog CRÔNICA DO DIA Em http://lcamorim.blogspot.com.br Literatura, arte, cultura, cotidiano. Todo dia um novo texto. 9


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HISTÓRIA TRISTE

VERDADES

Else Sant´Ana Brum – Joinville, SC

Erna Pidner – Ipatinga – MG

Verdade nua e crua que se vê pelas ruas provocando tensões. Verdade vetusta que a todos assusta dividindo opiniões. Verdade malvada que as mentes enfada nas suas versões. Verdade maldita que a gente acredita ter mil direções. Verdade vivida nas esquinas da vida com muitos senões. Verdade instigante que vai adiante dos nossos portões. Verdade escondida que aponta as feridas que têm nas nações. Verdade imperfeita nas mentes se ajeita e cria razões. Verdade danosa e muito perigosa com mil tentações! Verdade, eterna verdade que grita do fundo dos corações!

Seu canto era triste. Seu poema não tinha o colorido das nuvens quando o sol as beija. A alegria há muito ele enterrara e sobre o túmulo nascia, em profusão, a flor saudade. Saudade roxa, que sozinha, diz o tamanho da dor. Cada dia ele colhia uma flor para enfeitar seu coração. Um dia, recebeu a visita do amor. Sorriu; Mas sorriu por um dia apenas. Outro dia a morte o visitou. Sorriu; e sorriu para sempre.

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AS FLORES FALAM Harry Wiese

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abe ao cronista atento a difícil missão de decifrar e entender os enigmas relacionados a pessoas e à natureza, ainda mais quando se trata de situações criativas e complexas advindas do mundo imaginário. As crianças, com sua ingenuidade e inteligência, têm mais facilidade de entender tais fenômenos. Vou explicar. Estou diante da floricultura Santa Ana, logo ali, no outro lado da Rua França, em Indaial. Moro aqui há pouco tempo, portanto, tudo é novo e estranho. Tudo necessita ser conhecido e interpretado. – Bom-dia, vizinho novo, seja bem-vindo! – cumprimenta a senhora proprietária da floricultura.

Há um fato inusitado na vidraria frontal da loja de flores. Está escrito, visível entre folhagens magníficas por fora e flores belas por dentro: “Quando as palavras fogem, as flores falam...”. Procuro pela autoria do pensamento e descubro tratar-se de Bruce W. Currie. Loucura, leitor! Currie não é poeta, não é escritor, não é compositor: é lutador de box! Assim é preciso decifrar e entender os enigmas e as incógnitas. Tento compreender Currie e me lembro de que há

George Stevens, em 1953. Então está claro: os brutos dos filmes e das lutas também deixam poemas e pensamentos repletos de subjetividade e poesia. Mas o que me intriga mesmo é: se as flores falam como isso é possível? Para tudo deve haver uma explicação. Minhas dúvidas são: se elas falam, que língua ou linguagem usam? Para quem falam? E o mais importante, o que falam? Tudo isso é intrigante e sem sentido científico. Lembro-me da canção de Cartola, lá dos tempos idos, que

uma canção e há um filme com o título “Os brutos também amam”. A canção foi gravada por vários cantores e o filme foi dirigido por

se queixa exatamente do contrário e põe no chão a tese da fala das flores: “Queixo-me às rosas, mas que bobagem/ As rosas não

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falam/ Simplesmente as rosas exalam/ O perfume que roubam de ti, ai...”. Então, a fala das flores é diferente da fala das pessoas. As falas das flores não podem ser ouvidas com os ouvidos, nem dizem respeito às coisas corriqueiras da vida. São especiais. Percebemos a fala das flores como o degustador percebe o gosto do vinho. A primeira leitura da degustação não se faz com a boca, se faz com os olhos. O degustador olha para o copo, chacoalha, olha de novo, analisa a cor, a espessura e a densidade. O segundo passo ele faz com o nariz. Ele cheira o

vinho, faz caretas, fecha os olhos, sorri, cheira novamente e só depois bota o vinho na boca e se for bom se delicia com o néctar dos deuses. Então a pergunta é: o que isso tem a ver com a fala das flores? É que as falas das flores não podem ser ouvidas com os ouvidos. É preciso vê-las e entrar nelas com ternura e sensibilidade e você entenderá suas mensagens. Cheirá-las é permitir que entrem em você através do perfume. Você entra nelas e elas entram em você. Se isto acontecer ouvirá suas palavras.

bém pode ser ouvida com as mãos e com os dedos. É um exercício de apalpar, como se suas pétalas fossem escritas de braile, as letras dos cegos. Se você passar suavemente os dedos sobre as pétalas, ouvirá sua fala cujos impulsos vão direto ao cérebro, sem intermediários, sem olhos, sem nariz e sem boca. Situação que a ciência não explica, mas a psicologia confirma. Falta ainda contar o que as flores falam. Não vou dizer. Siga os passos descritos e ouça-as, pois, as flores são instrumentos que permitem entender e decifrar certos mistéA fala das flores tam- rios do mundo!

REVISÃO DE TEXTOS E EDIÇÃO DE LIVROS Revisão e copidesque de livros, jornais, artigos, blogs, etc. Revisado e com a editoração feita, entregamos seu livro pronto para a impressão.

Contato: revisãolca@gmail.com 12


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CONVITE

ECLIPSANDO A TORTURA

Júlio de Queiroz – Céu dos Poetas

CLÁUDIA KALAFATÁS - Florianópolis, SC

Não precisa bater.

Dizem que sofrer nos depura,

Entre bem de mansinho;

então, sem delongas, me jura

a porta do coração está aberta;

que após essa ruptura

a morte, ao esvaziá-lo, levou a chave.

magicamente haverá cura, assim, em uma outra conjuntura a paz interna será a desenvoltura

Ocupe-o calma e suavemente.

à eclipsar a tortura...

Há, nele, espaço para você instalar-se, dançar; descansar e ser feliz. Não obstrua sua entrada; deixe lugar para outros; não bata em suas paredes, ou crave nada nelas.

OUTRA IRMÃ

Este coração já foi muito machucado.

No momento que contém

E, entretanto, a cada vez,

seus lampejos de desacordo,

não quis mais nada

vemos sua aura.

senão ser luz e acolhida.

Nesse administrar de ambíguas emoções

Como agora, com você.

sua disciplina se instaura, e, dessa forma, Paula, com toda a sua sutil sabedoria, você, competentemente nos dá aula! 13


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ENTRE A VÍRGULA E O PONTO FINAL Jacqueline Aisenman - Genebra, Suiça

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ode ser que haja entre a primeira vírgula e o ponto final muitas coisas que deem sentido à frase. Palavras (inundadas de exclamações ou interrogações subjetivas); letras (bêbadas, trocadas, angustiadas, sentidas, extasiadas…); outros pontos (perdidos, desencontrados, inesperados, forçados, inativos ou ineficientes). Cabe tanto numa frase quanto o pensamento tenha a dizer. Palavras, expressões, café expresso para via-

gem por favor! Frases de efeito, um perfeito esquema para fugir. Palavras, unicamente palavras. Diminuídas, comprimidas, subestimadas, confessadas, abusadas, exploradas, enterradas, mortas. Somadas, incrustradas, avantajadas, engrandecidas, empodeiradas,

conspiradoras, superiores, santificadas. Divididas, fragilizadas, abreviadas, fatalistas, perdidas, esquecidas, angustiadas. Multiplicadas, espalhadas, corajosas, obreiras, sonhadoras, perigosas… Na verdade, mesmo numa frase palavras não serão nunca apenas palavras. E suas letras brincarão diante de nossos olhos como as nuvens, formando figuras de algodão no azul do céu. Mais que a ilusão das ilustrações, o embaralhamento dos 14

olhos. O incômodo diante do que não se entende perfeitamente. Porque nada é perfeito e a perfeição ela mesma é apenas mais uma palavra. – Corte! – Corte? – Corte… – Corte. – Um corte? – Recorte! – E no corte… – Era um corte. – Corte esta cena! – Por que você quer o corte? – O corte não me agrada… – Apenas corte. – Me fez tão mal quando acabou, senti o coração cortado! – Sentiu a dor do corte? – Sim, senti até o sangue escorrer do corte profundo… – Talvez houvesse mesmo um corte. – Cortesia sua estar agora ao meu lado! – Imagine, com um corte destes na vida? – Mas poderia ser diferente, cortes acontecem o tempo todo… – Só que entre amigos cortes têm significado. – Corta! – Corto? – Corta… – Cortei.


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Percebo-me acariciando as flores,

MEMÓRIAS DE NATAL

Que decoram os canteiros e os olhares,

Lorena Zago – Presidente Getúlio, SC

Que desabrocham sonhos de amores, Que despertam paixões e sonhares! Aquele cenário de beleza sem igual

Sentada sobre a relva umedecida pelo orvalho,

Sugere a comunhão da paz instaurada

Sinto a suavidade da brisa tocar minha face,

Na sublimidade universal,

Que se eleva ao topo do imenso carvalho

Na vida por Deus criada.

Como se nele respostas eu buscasse.

Criador e Criatura

Absorta em meus pensamentos,

Do amor que contagia, preservando a candura,

Vibrando na mesma sintonia, Envolvem-se na magia,

Vasculho lembranças de tempos passados

A beleza e a completude,

Que me fazem reviver sentimentos,

Da noite silenciosa e divinal.

Há muito em meu coração guardados.

Justifica-se a magnitude Da paisagem celestial!

Meus olhos buscam o firmamento E lá, encontram o infinito, fascinação!

Emergem, aos poucos, lembranças de uma infância linda,

A luz do luar acende e afasta o inverno cinzento

Alicerçadas no seio familiar,

Que fez morada em meu coração. Milhares de luzes cintilosas... Quisera eu compreendê-las! Minhas emoções são tão misteriosas Assim como o são as estrelas!

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Que na humildade buscavam acolhimento, e ainda,

PAIXÃO

O amor que os conduzia a um entendimento capaz de edificar.

SUZANA ZILLI DE MELLO Florianópolis, SC

Áureas memórias emergem de tempos idos, Em que as famílias uniam-se em volta de um fogão,

Apenas um olhar que se perdeu

Fortalecendo laços com seus entes queridos,

No tempo determinado

Que com generosidade repartiam o pão.

Que passaram suavemente,

A gratidão espelhava-se em seus semblantes

A saudade de uma voz,

Pelos imites das horas Deixando pelas esquinas da vida, Que jamais será ouvida.

E de mãos dadas louvava-se a vida, Que ainda difícil de ser vivida, Pulsava no interior de cada Ser, constituída.

TEMPO

Aproximava-se mais uma vez o Natal,

Tempo que passa devagar

Remetendo a festas e celebrações memoráveis,

Mergulhado em saudades

De compreensão, respeito, gratidão e afeição especial,

O tempo é o tempo

Esperando a vida renascer, Possíveis de esquecer. Se arrastando nas horas,

De confraternizações inefáveis.

Correndo nos minutos

Entre os sentimentos e a pureza dos olhares,

Precisos pra renovação. O tempo é o tempo

O Natal exalava amor e alegria!

Certo da colheita, da vida,

Os abraços de ternura e inúmeros comungares

Dos amores, Perdido nas asas do coração.

Atingiam o âmago dos seres, Que vivenciavam tão nobre ato, em pura harmonia!

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A MÚSICA DE PIERRE PELO MUNDO E A RUA DAS PRETAS

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desafio é entrar num palacete em pleno Príncipe Real, em Lisboa, receber um copo, conhecer pessoas novas e ouvir música ao vivo. O franco-brasileiro Pierre Aderne, cantor, compositor, escritor, apresentador e produtor, é o anfitrião, mas com ele podem estar músicos de qualquer canto do mundo ou da cidade. As tertúlias musicais da Rua das Pretas, é assim que se chama este projecto, saíram de casa do artista e abriram-se ao público. Numa quarta-feira recente foi lançado o disco Wine Album – Rua das Pretas, que tem a particularidade de cantar o amor e o vinho e de ser vendido em

garrafeiras pois vem acompanhado de uma garrafa criada por Dirk Niepoort. Foi há uns dez ou 12 anos que o cantor começou a fazer saraus em casa, então no Rio de Janeiro. “Recebi alguns portugueses e quando vim para Portugal em 2011, para filmar um documentário, aluguei uma casa no Poço dos Negros e era aí que aconteciam os saraus. Depois mudei-me para a Rua das Pretas e o fotógrafo Alfredo Matos fazia as fotos e usava a hashtag #RuadasPretas, as pessoas seguiam e começaram a ficar interessadas. Um dia decidimos abrir a casa ao público e apareceram umas 30 pessoas. Um dos meus amigos tinha este espaço no Príncipe Real, bairro

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de Lisboa, e há um ano que começamos a fazer aqui”, conta o cantor, sentado num cadeirão branco de verga, confortavelmente decorado com almofadas e panos coloridos. É ali que recebe os seus convidados a quem, mal entram e sobem os degraus que os leva à sala com lareira, recebem um copo de pé. “O vinho ajuda a contar a história”, explica. E assim, além dos músicos, dos artistas e dos escritores “também os produtores de vinho começaram a frequentar a Rua das Pretas”, continua. “Estes encontros nunca são estáticos”, sublinha Aderne. Além de não serem estáticos, também não são fixos. Aderne divide-se entre Lisboa e o Porto, mas também viaja até Paris e Nova Iorque. Agora, Londres e Madrid vão fazer parte do seu percurso. “Viajo com quatro músicos, uma fadista e uma cantora brasileira. Chegando lá, convido


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as pessoas.” É assim o projecto, que é uma “festa de música e de vinho”. “É muito interessante porque todas as noites o concerto é diferente. O vinho é o quinto elemento da banda.” Ao palacete chegam cerca de oito dezenas de pessoas que se sentam em caixas de vinho, com as almofadinhas coloridas. “Não é um show, mas uma festa que se faz em casa. É um formato que promove a intimidade”, explica. Há entradas para petiscar assim que se entra e no final da primeira parte é servida uma refeição quente. É uma experiência Airbnb Music e custa 50 euros. A maior parte dos que passam pela Rua das Pretas são turistas. Depois de tantas tertúlias – por ali já passaram 140 artistas portugueses e estrangeiros, 4000 já fizeram a experiência e foram abertas mais de 1700 garrafas de vinho –, há um ano, Aderne estava com Niepoort no Douro e

pensou: “Está na hora de fazer um álbum temático e fazer do vinho o mote principal do disco – canções acerca do amor e do vinho.” O autor convidou alguns músicos, foi para Nova Iorque, alugou uma casa. “O Dirk Niepoort veio com a gente.” Durante duas semanas o que fizeram foi: “Compor, cozinhar, cantar, abrir garrafas e gravar”, descreve. A produção ficou a cabo de Hector Castillo, vencedor de oito Grammys, e dos compositores e músicos Brian Cullman e Tanner Walle. O disco foi terminado em Lisboa. Depois disso, Aderne pensou na distribuição. “Eu sinto a música mais próxima de uma garrafeira do que de uma loja onde se vendem electrodomésticos”, diz, lamentando a diversidade de produtos que lojas como a Fnac ou a Worten oferecem. Um CD e uma garrafa de vinho é a proposta de Aderne e de Nie18

poort – que criou dois tintos, um do Douro e outro da Bairrada, dois brancos, um do Douro e outro da região do Alto Minho. Os rótulos foram criados pelos artistas plásticos brasileiros Gonçalo Ivo e Rubem Grilo. São oito mil discos e oito mil garrafas (20 euros), mas é possível comprar três também com o CD (60 euros). De futuro haverá um código de download impresso nas rolhas que poderá ser descarregado para ouvir o álbum, informa o autor. Aderne está curioso para saber “se esta loucura resulta”, a da venda em garraf e i r a s , w i n e b a r s e restaurantes. Por agora, já há pedidos para fazer chegar o kit a Nova Iorque e a Paris. Portanto, esta ideia pode ajudar à “inclusão do vinho português em lugares em que não estaria se não tivesse a música associada e vice-versa”, defende. (André Atayde, Expresso)


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POESIA DE NATAL

ESPERANÇA

Cora Coralina

Mario Quintana

Enfeite a árvore de sua vida com guirlandas de gratidão!
 Coloque no coração laços de cetim rosa,
 amarelo, azul, carmim,
 Decore seu olhar com luzes brilhantes
 estendendo as cores em seu semblante

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano Vive uma louca chamada Esperança E ela pensa que quando todas as sirenas Todas as buzinas Todos os reco-recos tocarem Atira-se E — ó delicioso voo!

Em sua lista de presentes
 em cada caixinha embrulhe
 um pedacinho de amor,
 carinho, ternura, 
reconciliação, 
perdão!

Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada, Outra vez criança… E em torno dela indagará o povo: — Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes? E ela lhes dirá

Tem presente de montão 
no estoque do nosso coração
 e não custa um tostão!

(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)

A hora é agora!
 Enfeite seu interior!
 Sejas diferente!
 Sejas reluzente!

— O meu nome é ES-PE-RANÇA…

Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:

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GÊNIO E REBELDE Enéas Athanázio Baln. Camboriú, SC

T

ristan Tzara foi uma figura célebre e controversa na Paris da belle époque. Frequentava o mesmo café onde se reuniam os membros da chamada “geração perdida”, entre os quais Ernest Hemingway, em cujas obras se encontram referências a ele. Nascido Samuel Rosesnstock (1896/1963), de família judia, veio ao mundo na Romênia e faleceu em Paris. Adotou o pseudônimo com que se tornou célebre, cuja tradução livre é “triste em meu país.” Desde muito cedo se revelou um contestador e vanguardista, colaborando em periódicos de seu país. Viveu na Alemanha, na Espanha e em Paris, onde

se fixou em definitivo, tendo adquirido a nacionalidade francesa. Estudou Ciências Humanas e Filosofia em Zurique. Durante a II Guerra Mundial sofreu perseguições antissemitas, obrigando-se a se refugiar no sul da França, tendo participado da Resistência Francesa como elo de ligação com intelectuais simpatizantes. Com outros escritores, poetas e artistas, criou o Movimento Dadaísta, cujo mani-

Foto de Tristan Tzara festo foi lançado em 1918 com intensa repercussão. Nele, o grupo investia contra a poesia convencional, os valores 20

estéticos, culturais e morais imperantes, propondo a destruição dos cânones vigentes numa sociedade que considerava em franca decomposição. Suas ideias revolucionárias teriam sido inspiradoras do Surrealismo. Não obstante, é considerado um dos grandes expoentes da literatura francesa do Século XX. Para ele, a poesia haveria de ser transgressora e rebelde, alheia aos significados lógicos da linguagem, mesmo que não fosse entendida pelo vulgo. Propunha a associação de termos incompatíveis entre si e uma sucessão de ritmos caóticos. Entre seus princípios estavam: a abolição da lógica, de toda hierarquia, da memória, das profecias, do futuro e das dores crispadas, dos grotescos e das incongruências. O entrelaçamento dos contrários e de todas as contradições eram alguns de seus


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postulados. Autor de uma obra vasta e complexa, aliava a rebeldia agressiva a um socialismo utópico. Para orientar os interessados, forneceu a receita de um poema dadaísta. Leia um artigo de jornal,–

instruiu ele – depois use uma tesoura e o recorte. Em seguida, com muito cuidado, recorte palavra por palavra, ponha tudo num saquinho e sacuda de leve para misturar. Vá tirando e copiando cada uma das palavras e

você terá um poema muito parecido com você e repleto de sensibilidade, embora ninguém o entenda e talvez nem mesmo seu autor (digo eu). Com base nessas instruções, vamos construir um:

POEMA DADÁ Com prisões guerra deputado institucional Tendências erramos disputa casas política Contato continuidade membros da justiça Usurpar aproximou destroços gabinete segura Para xadrez a da chinês judiciário Assembleia chegam ministério máximo final Paz debates mira pacheco extra Zona da poder mais e para crítico Mesa alerta faltou é do inovação Importantes xis minha história estrutura A em que o da ao . . . O leitor entendeu? Confesso que também não! Será mesmo parecido comigo?

EXPEDIENTE Suplemento Literário A ILHA – Edição 147 – Dezembro/2018 – Ano 38 Edições A ILHA – Grupo Literário A ILHA – Contato: revisaolca@gmail.com A ILHA na Internet: Portal PROSA, POESIA & CIA.: http://www.prosapoesiaecia.xpg.uol.com.br 21


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NATAL Olavo Bilac

Jesus nasceu! Na abóbada infinita

No entanto, os reis da terra, pecadores,

Soam cânticos vivos de alegria; E toda a vida universal palpita

Seguindo a estrela que ao presépio os guia.

Dentro daquela pobre estrebaria...

Vêem cobrir de perfumes e de flores

Não houve sedas, nem cetins, nem rendas

O chão daquela pobre estrebaria.

No berço humilde em que nasceu Jesus...

Sobem hinos de amor ao céu profundo;

Mas os pobres trouxeram oferendas

Homens, Jesus nasceu! Natal! Natal!

Para quem tinha de morrer na Cruz.

Sobre esta palha está quem salva o mundo,

Sobre a palha, risonho, e iluminado

Quem ama os fracos, quem perdoa o Mal!

Pelo luar dos olhos de Maria,

Natal! Natal! Em toda Natureza

Vede o Menino-Deus, que está cercado

Há sorrisos e cantos, neste dia... Salve, Deus da Humildade e da Pobreza!

Dos animais da pobre estrebaria. Não nasceu entre pompas reluzentes; Na humildade e na paz deste lugar, Assim que abriu os olhos inocentes, Foi para os pobres seu primeiros olhar. 22


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ANTOLOGIA "POETAS DA ILHA": FESTA DE POESIA NOITE DE AUTÓGRAFOS DOS POETAS DA ILHA Por Sande Moraes

Estive presente no lançamento do livro “Poetas da Ilha” – Antologia Poética do Grupo Literário A ILHA, no dia 12 de novembro no Centro Integrado de Cultura – CIC, no Encontro de Poesia do Grupo Poetas da Trindade. O Grupo Literário A ILHA já existe há 38 anos, foi fundado e é presidido por Luiz Carlos Amorim, escritor, jornalista, professor, revisor, editor e poeta. A antologia POETAS DA ILHA é mais uma coletânea organizada pelo escritor, desta vez com poetas da Grande Florianópolis. O livro contém poemas de Júlio de Queiroz uma homenagem póstuma ao escritor, Claudia Kalafatás, Luiz Carlos Amorim, Marli Lucia Lisbôa – Bulucha, Maura Soares e Rita Marília. Uma noite de autógrafos memorável, regada a muita poesia, emoção e alegria, sem faltar os deliciosos doces e salgados do coquetel, decorado com muito carinho. Parabéns aos nobres colegas do Grupo Literário A ILHA pela obra “Poetas da Ilha”. Aproveito para agradecer a oportunidade que me foi dada de recitar um dos meus poemas.

POETAS DA ILHA

Os Poetas da Ilha: Maura, Cláudia, Rita, Marli e Amorim

O

Grupo Literário A ILHA acaba de lançar a sua nova antologia, depois de mais de uma dezena de coletâneas de

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contos, de poemas, de crônicas, publicadas ao longo dos seus trinta e oito anos de atividades literárias e culturais. Trata-se de POETAS DA ILHA, reunindo poetas que vivem na Grande Florianópolis: Marli Lúcia Lisbôa, Maura Soares, Cláudia Kalafatás, Rita Marilia e este que vos escreve. Poetas da Ilha duas vezes: uma, porque pertencem ao Grupo Literário A ILHA

e segunda, porque vivem na Ilha de Santa Catarina. A antologia é uma homenagem póstuma ao grande escritor JÚLIO DE QUEIROZ, falecido há pouco tempo, e ele é o sexto autor da antologia. Ou o primeiro. Nos últimos anos de vida, ele enriqueceu, com sua presença, o Grupo Literário A ILHA. Júlio foi contista, ensaísta, poeta dos

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mais importantes da literatura catarinense e brasileira. Sua obra é conhecida e reverenciada. Ele escreve com tanta naturalidade, que faz parecer muito fácil escrever bem. Mas não é só o trato com a língua, a correção e a clareza de ideias de quem está acostumado a trabalhar com a palavra que chamam a atenção na obra de Júlio. A criatividade do


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autor, transformando o cotidiano em literatura da mais alta qualidade é de uma excelência a toda prova: ler o Júlio é o mesmo que estar conversando com ele, ouvindo ele a contar histórias, recriando a sua sensibilidade, o seu lirismo, porque ninguém sabe contar fatos e fazer poesia como ele. Toda a cultura, toda a sabedoria do Júlio é usada, com humildade e empatia, para encantar e prender a gente na leitura da sua lavra. Então essa é a homenagem do Grupo Literário A ILHA ao Júlio, grande amigo e grande escritor. A cerimônia de lançamento da antologia POETAS DA ILHA aconteceu no Encontro de Poesia dos Poetas da Trindade, no Cinema do CIC. Os poetas do Grupo Literário A ILHA par-

ticiparam do sarau, declamando poemas que fezem parte da antologia e apresentando, com a anfitriã Vera, o livro que então vinha a público. Uma alegria para os Poetas da Ilha participar daquela integração poética que é levada a efeito todos os meses naquele espaço e da qual temos tido a honra de participar, e ainda falar do nosso Grupo A ILHA e do nosso trabalho. A sessão de autógrafos dos Poetas da Ilha, logo após o Encontro de Poesia, foi um sucesso. Os cinco autores sentaram-se à

mesa para autografar os livros e, enquanto uma parte do público comprava o livro e pegava os autógrafos dos autores, outra parte ia se servindo do coquetel que foi servido para recepcionar os leitores. Foi uma belissima festa, com um grande público prestigiando mais este evento do Grupo Literário A ILHA. Agradecemos aos leitores amigos que prestigiaram a festa da poesia em parceria com os Poetas da Trindade, que tão gentilmente nos acolheram em seu espaço. O livro POETAS DA ILHA será lançado, ainda, em dezembro, na Feira do Livro de Florianópolis, no Stand dos Escritores. Pedidos pelo e-mail revisaolca@gmail.com

Fotos de Jéssica Trombini, do blog LITERATISMOS

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E SE FOSSE VERDADE? Conto de Luiz Carlos Amorim

Num dezembro passado, há mais de vinte anos, nasceu, numa família humilde, numa pequena cidade do interior, um menino diferente dos outros. Cristian era, sim, um menino que crescia saudável e feliz, mas era muito comportado, muito educado, acatava o que seus pais lhe diziam, respeitava todos, principalmente as pessoas mais velhas e acreditava num Deus que ele chamava de Pai. Gostava de falar do Pai, de fazer com que as outras pessoas acreditarem nele. - Um dia, todos vamos embora com Ele, se merecermos. – repetia, convicto. As outras crianças, quando era ainda adolescente, chegavam a criticá-lo por

ser muito certinho e algumas pessoas até o achavam estranho, um pouco fanático, por falar tanto em Deus. Mas ele não se aborrecia e continuava a sua missão de pregar o nome do Pai. - Esse menino pensa que é santo – diziam alguns. Já adulto, fazia grupos de oração, benzia pessoas, tentava melhorar a vida das gentes que o cercavam. O número de pessoas

que tinham fé no Deus Pai que ele professava , mas ficava triste, por outro lado, ao ver como caminhava a humanidade. Ele sabia que não era um homem comum, que estava aqui por uma razão especial, e sofria ao ver como os homens eram materialistas, calculistas, destrutivos, talvez mais do que quando estivera aqui em outros tempos. - O ser humano parece

que acreditavam nele aumentava, algumas a té p e n s a va m te r sido curadas por ele, enquanto outras faziam chacota, chamando-o de charlatão. Ele ficava feliz com os seus seguidores que oravam com ele,

não se preocupar com o futuro–pensava Cristian, com frequência. Não se conformava com o que via, as coisas pareciam não ter mudado muito, parecia que a civilidade, as novas tecnologias, ao invés de melhorarem

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o homem, o estavam tornando ainda mais desalmado, mais insensível. - O homem não tem, nos nossos dias atuais, o menor cuidado com a natureza, pelo contrário: destrói o meio ambiente, poluindo ar, os rios, o mar, a água, a terra, tudo. A ganância, a corrida desenfreada pelo lucro fácil passa por cima de qualquer coisa. A violência aumenta cada vez mais e a vida, infelizmente, parece não ter o menor valor para muitos, nessa “sociedade” contemporânea. A corrupção e a impunidade nos altos escalões da administração pública, em quase todos os países, vai tornando a vida das pessoas cada vez mais difícil. - Será que não aprenderam nada, nesses

dois mil anos? O próprio ser humano está se encarregando de tornar o mundo inviável – concluía Cristian.–O descaso para com o lugar onde vivem já dá sinais bem claros – as estações não estão mais definidas, a natureza vem se rebelando, causando catástrofes em várias partes do mundo. E os homens não se dão conta de que este é um sinal do Pai de que Ele não está feliz com o que seus filhos estão fazendo. - Quando vão acordar? Quando não houver mais nada para preservar? Cristian tinha vontade de chorar, mas ao invés disso, tentava trazer mais seguidores para a sua fé, pois essa era a sua missão: salvar a humanidade, salvar o mundo. Pre-

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cisava fazer com que toda a gente soubesse quem Ele era, mas sabia que quase ninguém acreditaria. Tinha um árduo trabalho pela frente. Falsos profetas existiam aos milhares, usando o nome de seu Pai para arrancar dinheiro dos humildes que procuravam alguma coisa em que acreditar. - É muito provável que eu venha a ser sacrificado, de novo. Cristian não queria isso, não por Ele, mas pela humanidade. A alma das pessoas estava cada vez mais estéril, cada vez mais vazia de sentimentos, de solidariedade, de amor. Não era isso que ele pretendia encontrar. Temia que os homens não o deixassem, de novo, fazer o seu trabalho.


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EDITAL DE PUBLICAÇÃO E LANÇAMENTO DE UM LIVRO COLETÂNEA Mara Núbia Roloff e Diretoria.

ANACLA- ACADEMIA NACIONAL DE CIÊNCIAS, LETRAS E ARTES no uso de suas atribuições, faz saber aos interessados que estão abertas as inscrições para a participação na publicação de uma Coletânea com TEXTOS DE CIÊNCIAS, ARTES E LETRAS (CONTOS, CRÔNICAS, POEMAS), conforme critérios abaixo. 1. O Livro Coletânea será composto das categorias acima descritas. 2. Serão selecionados para integrar a obra vinte (20) autores/escritores/ artistas. 3. Os textos deverão ser inéditos, não terem sido impressos em formato de livro. 4. O Livro terá o formato de 15X21 cm, com limi-

tação de 100 páginas; 5. Fica estipulado o nº de 5 (cinco) páginas para o conteúdo no formato do livro de 15X21 cm., sendo a primeira página para a breve Biografia do Autor(a), com uma foto. 6. O material inscrito deverá ser digitado no formato Word, em fonte Times New Roman, tamanho 14, estilo normal, na cor preta, parágrafo de alinhamento justificado, espaço entrelinhas 1,5 e todas as margens com 2,5cm. 7. O material inscrito na categoria POESIA deverá conter 01 poema para cada página. 8. Cada um dos participantes receberá 15 exemplares do livro, e fará um investimento de R$ 210,00 (duzentos e dez reais), valor este que deverá ser pago até 09 de janeiro de 2019. 9. Se o autor/escritor/ artista quiser participar em duas ou mais categorias, o custo dobrará pelo número de páginas. Vide item 12. 28

10. Cada escritor deverá enviar o material revisado e será responsável pelo seu conteúdo. 11. Não serão aceitos os seguintes materiais: Que constituam ofensa à liberdade de crença religiosa, políticas ou informações racistas e discriminatórias. 12. Caso o escritor queira, poderá solicitar mais espaço, mas deverá pagar nova inscrição no valor de R$ 210,00 e ficará a disponibilidade de espaço; - Caso tal pleito seja aprovado, o escritor receberá no total 30 (trinta) exemplares do livro. 13. Os casos omissos nesse Edital serão dirimidos pela diretoria da ANACLA. 14. Os textos deverão ser encaminhados, como documento anexo, para lucianosocimed@ gmail.com, juntamente com o comprovante de pagamento da taxa até as 23h59min do dia 10 de janeiro de 2019.


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NÃO MORREMOS

SIDERAÇÕES

Teresinka Pereira, IWA-USA

Cruz e Sousa

Para as Estrelas de cristais gelados
As ânsias e os desejos vão subindo,
Galgando azuis e siderais noivados
De nuvens brancas a amplidão vestindo… Num cortejo de cânticos alados
Os arcanjos, as cítaras ferindo,
Passam, das vestes nos troféus prateados,
As asas de ouro finamente abrindo…

Na distância me contagiaste Com tua febre sem barreira E me inundaste com um calor Sem verão na regueira De neve caída sobre minha casa.

Dos etéreos turíbulos de neve
Claro incenso aromal, límpido e leve,
Ondas nevoentas de Visões levanta…

Tu és um rei fanático Confiscando os mistérios Da vida e da morte Para acondicionar ciências

E as ânsias e os desejos infinitos
Vão com os arcanjos formulando ritos
Da Eternidade que nos Astros canta…

Amorosas que dão golpes Na minha fronte. Não me assombro. Já me acostumei Ao querer sem fronteiras E estou reabilitada Porque, dentro de nós Repregam sem terminar As absurdas fragrâncias Da esperança. 29


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ESCREVER É FANTÁSTICO!

Adélia Prado nasceu em Divinópolis, MG, e lá permaneceu até hoje. Ela gosta de cidades pequenas. Foi professora, teve um grupo teatral, que reconhece ter sido uma brincadeira, e trabalhou na cultura e na educação públicas. Adélia “faz em prosa o que sempre fez em poesia: fala da mulher e seus conflitos”. E é com essa alma feminina que a escritora observa o mundo como quem senta na soleira e concede sues pensamentos aos leitores. Para ela, “artista nenhum gera sua própria luz” e “o momento poético é dado divininamente”. No seu aniversário de 70 anos, em dezembro de 2005, ela brindou seus leitores com o livro de prosa

“Quero minha mãe”. Naquele livro, a escritora avalia as inquietações que surgem diante da morte. O título é uma súplica da protagonista, Olímpia, uma mulher de 60 anos que luta contra um câncer de uma maneira vitoriosa, convidando o leitor a realizar seus sonhos. Mas não é auto-ajuda. Vindo de Adélia Prado é uma ode à vida. O divino é característica particular de Adélia, assim como a presença de Deus em sua obra. O livro “Munuscritos de Felipa” – 1999, por exemplo, é um diálogo de uma mulher de meia-idade com Deus, num ritmo de prece do início ao fim. “Vou mudar meu coração agora, vou sair de mim mesma, 30

deixar que o vento bom do sonho, o espírito de quem me fez me leve à felicidade”. No mesmo ano, lançou também um livro de poesia: “Oráculos de Maio”. Novamente o tom de oração. O primeiro livro, “Bagagem”, foi publicado em 1976, graças à bênção de um conterrâneo também poeta. Carlos Drummond de Andrade sugeriu a um editor que publicasse os poemas “fenomenais” da mineira. Nada como uma ajuda de um imortal. Como Adélia falou para a revista Cartaz, para a qual ela deu parte da entrevista a seguir: foi “milagre de São Francisco”.


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ENTREVISTANDO criação é o sofrimento de um encontro com ADÉLIA PRADO: maravilhoso e a delícia ela. Meu pai morreu há - Você diz que “experiências literárias e religiosas são a mesma coisa e que a experiência poética é sempre religiosa”. Adélia – Continuo crendo, cada vez mais, que experiência religiosa e experiência poética são iguais e vazadas sempre na mesma linguagem. - Deus continua sendo o personagem princiapl em sua obra? Adélia – Ele é o personagem principal sempre, não em minha obra, mas em toda e qualquer obra ou decisão de natureza moral. Na obra, porque o que se busca, conscientemente ou não, é um centro, um ponto de significação e sentido de natureza absoluta, que nos descanse o coração. Santo Agostinho falou belamente disso quando escreveu “tarde te encontrei, ó beleza tão antiga e tão nova…” e na moral pelo mesmo motivo, é diferente matar e não matar, trair e não trair, amar e deixar de amar. O que nos distingue na

também de termos uma liberdade, limitada, porém real. Intuímos sifnificação para a dor e para a alegria. Mesmo o descrente se pauta por este caminho. É formidável. As transgressões de qualquer ordem não anulam, mas confirmam este sentimento. De

mais de trinta anos e sua morte parece ter detonado minha escrita. São particularidades. Muita gente começa a escrever depois de quebrar um pé, ter um sonho especial, alguma coisa que nos confronte com nossos limites, até a felicidade. Será assim mesmo? Estou pensando alto.

- Você acha que a poesia brota com mais facilidade da tristeza? Adélia – A poesia não precisa de angústia para nascer. Qualquer coisa onde tiramos culpa e é a casa da poesia, a remorso? Deus não é morte, a folha de grama um personagem. Ele se ou a pura alegria. apresenta a mim como ar, água ou montanha. - O universo feminino parece muito bem - A angústia que causa resolvido em sua a morte é inerente escrita. Nem feminista, em sua obra. Até que nem submissa, profisponto as mortes de sua sional, mãe, mulher, mãe e de seu pái foram esposa. Que bandeira marcantes para você Adélia Prado carrega, dar impulso à escrita? já que o “anjo esbelto” Adélia – A angústia da assim anunciou? morte não é minha, é da Adélia – A bandeira que nossa condição. Minha descobri ser a mais difímãe morreu há mais cil, a que vento nenhum de cinquenta anos e só desfralda, porque é a agora tive o que posso bandeira da secundiliterariamente classificar dade, do anonimato, do 31


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exercício do verdadeiro cozinha, criança ou feminino, que supõe a metafisica. morte do egoísmo. - Você abdicou do - Você acredita que magistério para se haja uma literatura de dedicar à literatura? Em mulher? Você mesma algum momento de sua já participou de antolo- vida você conseguiu gias só de mulheres e administrar uma rotina outros encontros cujo para escrever? tema central era esse. Adélia – Quando parei de Os homens escritores dar aulas – por ausência não criaram um rótulo de vocação que graças para sua literatura. O a Deus descobri – ainda que você acha? demorei muito a escreAdélia – De homens ver. Não tenho rotina, e mulheres só estas escrevo à mão e espero precisaram historica- a hora da graça. mente lutar por direitos, incluindo o inacreditável direito de representar papéis femininos no teatro. Temos um universo próprio, do útero, e que, queiramos ou não, configura nosso “sentimento do mundo”. Não - Poeta nasce poeta ter um pênis deve ser ou se constrói como diferente de tê-lo. Mas poeta? como somos mais que Adélia–O poeta, como nossas anatomias, nossa qualquer outro artista, produção artística tem nasce como nascem os a mesma relevância da cantores, já de posse produção masculina. Se do seu dom. O que se é realmente arte, esta- constrói nele é a vida, mos falando de alcance que segue o processo universal, que ignora os natural em toda pessoa, sexos. “Escrever como artista ou não, visando um homem” significa seu amadurecimento. produzir um texto que Tal processo se reflete interesse a homens e inevitavelmente na obra. mulheres, fale eu de Rigorosamente falando, 32

uma oficina literária não “cria” um escritor, mas pode descobri-lo, como uma escola de música descobre um virtuoso. A poesia não é uma descrição de alguma coisa, não é um comentário a respeito de nada. É uma expressão. Toda arte verdadeira só tem um objeto: a poesia. A obra de um artista, quando verdadeira, seja de que arte for, tem o poder de revelar a poesia contida no ser das coisas. Eu não dou conta de pegar o ser de uma rosa, de um rio, de uma passagem, de um rosto. Só quem consegue revelar esse ser das coisas é a arte, que nos mostra a beleza suprema delas. Nesse sentido, a arte me abre para a realidade. A maravilha dela é isso. É uma epifania. Isso em qualquer tipo de arte, como o teatro, a música, o cinema, a dança, a escultura. A poesia é essa radiação que as coisas têm e que é percebida por meio da arte. Essa radiação é como se fosse o brilho da realidade. - Como nasceu sua vontade de escrever?


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É uma necessidade? Conseguiria viver sem escrever? Adélia–Ainda menina, descobri o poder e o prazer da palavra. Escrevo desde os catorze anos, quando fiz meu primeiro soneto. Tudo o que escrevi até “Bagagem” não tem nenhum valor literário. São coisas que têm importância, para mim, afetiva, de um bom tempo da minha vida. Agora, literatura, a entrega a um processo de escrita torrencial, eu comecei aos quarenta anos. Eu é quem preciso do exercício de escrever.

Vejo como um dever, uma fidelidade a Deus que me concede o dom. Qualquer pessoa, e infelizmente isso acontece muito, consegue viver fora de sua vocação, mas com altíssimo custo para sua saúde e prejuízo para a comunidade humana, porque o exercício do dom é exigência desse mesmo dom. - Como funciona seu processo de escrita? Que tipo de sensação ou vontade vem primeiro no momento da construção de seus poemas? Adélia–Você sente que

algo “pede” expressão. Então, é o momento do trabalho concreto de escrever, procurar como dizer aquilo que está pedindo expressão. Num primeiro momento, acredito na inspiração. É o estado e fruição poética que determinada coisa lhe provoca, com o desejo imediato de expressar aquilo. É uma necessidade fatal. O segundo, a escrita propriamente, considero momento de enorme prazer e alegria. É uma coisa fantástica escrever, descobrir sua própria voz. Quem escreve sabe disso.

COM LICENÇA POÉTICA Adélia Prado

Quando nasci um anjo esbelto,

e ora sim, ora não,

desses que tocam trombeta, anunciou:

creio em parto sem dor. Mas o que sinto, escrevo.

vai carregar bandeira.

Cumpro a sina.

Cargo muito pesado para mulher,

Inauguro linhagens, fundo reinos

esta espécie ainda envergonhada.

- dor não é amargura.

Aceito os subterfúgios que me cabem,

Minha tristeza não tem pedigree,

sem precisar mentir.

sua raiz vai ao meu mil avô.

Não sou feia que não possa casar,

Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.

acho o Rio de Janeiro uma beleza

Mulher é desdobrável. E sou.

já a minha vontade de alegria,

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DEPOIS DO FIM José Eduardo Agualusa – Portugal

Os escritores podem dividir-se entre aqueles que dizem sofrer enquanto escrevem e os que afirmam divertir-se. Podem também dividir-se entre os que escrevem para saber como termina a história que começaram, e os que só se sentam para escrever depois que desenharam, dentro da cabeça, a estrutura inteira do romance e definiram o enredo, ao mínimo pormenor. Sou dos que se divertem; sou também dos que escrevem para

saber o que vai acontecer a seguir. A melhor parte do processo de escrita — pelo menos para os escritores que se divertem e escrevem para saber o fim — são as últimas páginas. O que acontece nessas últimas páginas, no instante em que diferentes e distantes fios se amarram e o enredo inteiro adquire subitamente forma e coerência, é uma espécie de prodígio que nunca deixará de me espantar.

vidas se concluem. Sobra um silêncio enorme, uma imensidão de tempo por preencher. É bem certo que essas mesmas vidas a cujo fim assistimos estão prestes a começar para os leitores. Estão sempre a começar. Começam de todas as vezes que um novo leitor abre o livro e inicia a leitura. Como cada leitor cria um livro inédito à medida que o vai lendo, em função do seu próprio mundo, essas vidas nunca são São muitos os escritores exatamente iguais. que se deixam vencer pela melancolia depois Acontece-me muitas que terminam um novo vezes só compreender romance. Durante meses o que escrevi depois vemos crescer as perso- que um leitor me conta nagens. Conversamos a sua versão. Sinto cada com elas. Vivemos com vez mais dificuldade em elas. Aprendemos com falar sobre um livro que elas. E então, vira-se uma terminei de escrever. página e todas aquelas Aflige-me a fatal pergunta dos jornalistas, durante a apresentação de um título novo: «Pode-me dizer de que trata o novo livro?» Apetece-me dizer a verdade: «Leia-o e diga-me.» Há muitos anos, quando comecei a escrever, tinha a pretensão de que sabia. Provavelmente, acreditava nisso. Agora, se tiver sorte, vou descobrindo 34


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de cada vez que um leitor fala comigo. Por isso, sou capaz de discorrer sobre os meus romances mais antigos, como se de facto os tivesse escrito — mas não sobre os recentes. Sinto-me um impostor. Se ainda ninguém os leu, então eu ainda não os escrevi. É difícil escapar à melancolia do criador depois do fim. Os escritores optam por diferentes métodos para tentar iludi-la. Numa entrevista recente, a romancista portuguesa Patrícia Reis explicou que antes de entregar o novo livro à editora começa outro: «É esse outro que me permite sobreviver ao luto que preciso fazer das personagens.» Patrícia emenda um romance no outro, como aqueles fumadores ansiosos, que vão acendendo um cigarro na guimba do anterior até terminarem o maço inteiro — ou a vida. Costumo fazer o mesmo. Semanas antes de concluir um romance começo a criar listas de projetos. No início ignorava os caminhos

impossíveis. Hoje tomo nota de tudo, depois deito fora o que me parece fácil e começo a sondar as possibilidades dos caminhos impossíveis. Os caminhos impossíveis, aqueles que dão medo, são os únicos que merecem ser explorados. Escrever — como toda a viagem — é procurar o espanto. Conheço escritores que tentam driblar a tristeza ocupando o súbito vazio

com outras formas de expressão artística: pintam, fotografam, compõem fados, criam mapas de cidades imaginárias. Alguns são muito competentes nessas atividades paralelas. Bruce Chatwin fotografava bastante bem. Nabokov desenhava borboletas. Ferreira Gullar fazia colagens e cópias de telas famosas. O moçambicano Mia Couto toca violão. Valter Hugo Mãe canta fado. Outro escritor português, Afonso Cruz, dedica-se à produção de 35

cerveja artesanal e de blues. O angolano Ruy Duarte de Carvalho, um dos maiores nomes da poesia africana em língua portuguesa, pintava belíssimas aguarelas de bois. Tenho duas dessas aguarelas, devidamente emolduradas, diante da minha mesa de trabalho. Olho para elas e viajo para o Sul de Angola. Terminei um novo romance. Ainda terei de viver mais algumas semanas dentro daquele mundo, trabalhando com editores e revisores, corrigindo provas, mas já me comecei a despedir dele. Sim a melancolia é inevitável, bem como o medo de não ser capaz de voltar a escrever. Faço listas de projetos. Fotografo. Pinto aguarelas–sem o talento de Ruy Duarte. Um dia destes espero voltar a escrever de novo, como se fosse a primeira vez, com a mesma surpresa, a mesma inquietação, a mesma incapacidade de perceber ao certo o que estou fazendo — até chegar ao fim, até que alguém leia e me diga.


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POEMA DE NATAL Vinícius de Moraes

COMPANHEIROS Mia Couto–Portugal

Para isso fomos feitos: Para lembrar e ser lembrados Para chorar e fazer chorar Para enterrar os nossos mortos — Por isso temos braços longos para os adeuses Mãos para colher o que foi dado Dedos para cavar a terra. Assim será nossa vida: Uma tarde sempre a esquecer Uma estrela a se apagar na treva Um caminho entre dois túmulos — Por isso precisamos velar Falar baixo, pisar leve, ver A noite dormir em silêncio. Não há muito o que dizer: Uma canção sobre um berço Um verso, talvez de amor Uma prece por quem se vai — Mas que essa hora não esqueça E por ela os nossos corações Se deixem, graves e simples. Pois para isso fomos feitos: Para a esperança no milagre Para a participação da poesia Para ver a face da morte — De repente nunca mais esperaremos… Hoje a noite é jovem; da morte, apenas Nascemos, imensamente.

quero escrever-me de homens quero calçar-me de terra quero ser a estrada marinha que prossegue depois do último caminho e quando ficar sem mim não terei escrito senão por vós irmãos de um sonho por vós que não sereis derrotados deixo a paciência dos rios a idade dos livros mas não lego mapa nem bússola porque andei sempre sobre meus pés e doeu-me às vezes viver hei-de inventar um verso que vos faça justiça por ora, basta-me o arco-íris em que vos sonho basta-te saber que morreis demasiado por viverdes de menos mas que permaneceis sem preço companheiros 36


Florianópolis–SC • Setembro / 2018 • N.147 • Edições a ilha • Ano 38

CRÍTICA E RENOVAÇÃO DO FAZER LITERÁRIO Celestino Sachet

No Centenário da morte de Machado de Assis, ao invés de elaborar uma crítica sobre um ângulo da obra desse autor, preferi reter-me na fisionomia da crítica segundo o próprio Machado, ou seja, prefiro analisar o código da doutrina estético-literária de um dos mais importantes críticos brasileiros, no dizer de Tristão de Ataíde. Na necessidade de navegar com algum proveito, nas águas críticas de Joaquim Maria Machado de Assis, entendo necessário mergulhar, ao mesmo tempo, nos passos da história literária que o autor em análise percorreu, lá pelos meados do século XIX.

de Machado, sobre um corpo literário, produzido em 1865, há quase século e meio portanto, parece óbvio afirmar que ninguém poderá modificá-lo e nem agarrar-lhe a especialíssima identidade. O reconhecimento desse fato está submetido a um processo de contínuo aperfeiçoamento, uma vez que a História não passa de uma forte interação entre pesquisador e fato em

pesquisa, num diálogo sem fim entre presente e passado. Qual passado e qual presente? Parto do princípio de que um fato acontecido não pode vir à luz com certezas absolutas ou com a exclusiva fisionomia Diante de uma crítica original de quando foi 37

gerado. Daí ser mais importante ter ideias sobre o passado do que badalar pretensas bases “científicas” para provar o improvável. Uma reflexão sobre os vastos caminhos da História deve estar baseada nestes princípios: - Um fato já acontecido ressuscita com novo corpo pelo discurso do historiador que prefiro chamar de historiante, numa situação de particípio presente. - Na impossibilidade de chegar ao fato, que já não existe na identidade com que foi gerado, o historiador-historiante arma-se de suportes teóricos que não se libertam das influências do contexto em que ele, produtor da história, está engolfado. - A história é um conjunto de ideias e não um código de valores-verdade imerso no passado. - Vivemos uma época em que a catequese científica, velha de 300 anos, está com os templos quase vazios porque os fiéis tornaram-se pastores de


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uma teologia própria. Declaradas essas premissas vamos aos conceitos segundo Machado, cujos princípios estão expressos no texto “O Ideal Crítico”, publicado em 8 de outubro de 1865, há mais de cento e cinquenta anos. Nesse texto, o autor proclama a necessidade de uma crítica fecunda e pensadora que reflita, que discuta e que procure o sentido do texto em análise. É confissão do texto: “Crítica é análise para a consciência e não pelo seu bom ou mau humor”. Não era esta a crítica em vigor no tempo de Machado quando ocorria mais o aplauso da superficialidade e o apupo de mediocridade. A abertura do texto de 1865 parece descrever a época e os dias em que voam neste início do século XXI: a crítica encontrava-se desamparada pelos esclarecidos uma vez que era exercida inadequadamente. A consequência dessa realidade era óbvia: os

escritores, privados do farol seguro do crítico competente corriam o risco de naufragar nos mares desconhecidos da publicidade. Essa leitura cabe exata para o pão-nosso-de-cada-dia-literário: “Qualquer um pode notar com que largos intervalos aparecem as boas obras e como são raras as

publicações seladas por um talento verdadeiro”. Para mudar essa realidade, segundo Machado, bastava estabelecer o hábito da crítica na imprensa brasileira. Hábito que hoje, nesta nossa vida cibernética, desapareceu! Mas qual crítica? Machado não compreende o crítico sem ética. Melhor, ele exige que a crítica seja a soma de três parcelas: texto + ciência + 38

consciência. E chega mesmo a proclamar que “a ciência e a consciência são as duas condições principais para o exercício da crítica”. Essa postura ética deveria determinar que o crítico, ao invés de modelar seus juízos pelo interesse do ódio, da adulação ou da simpatia, esse crítico deveria reproduzir sua convicção, liberta de circunstâncias externas, como simpatia ou antipatia. Com esse mostruário de uma consciência-bom-comportamento e de uma ética-a-serviço-do-outro, Machado proclama este princípio: “A crítica não é uma profissão de rosas, mas é tão somente a satisfação de dizer a verdade da consciência do crítico”. Para chegar próximo a essa verdade, o crítico tem que ser coerente, para manter autoridade; independente, para que o texto seja neutro e imparcial; tolerante, para aceitar e conviver com diferenças, com os contrários e


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as contrariedades; delicado, para não aplicar fórmulas ásperas. Moderação e urbanidade na expressão, eis o melhor remédio para convencer. São essas as condições, as virtudes e os deveres dos que se destinam à análise literária. É que Machado está convencido de que o texto não é um fato neutro. Desde o momento em que se transferem para o âmbito da análise, pesquisador e crítico também devem ser analisados de uma forma que sirva para instalar uma atmosfera de bem-estar de convivência entre aquele que escreve e aquele que lê. Com isto, quem escreve passa a escrever com mais qualidade e quem lê passa a ler cada vez com mais prazer. E com mais ganas de comprar livros! A reforma literária que o jovem Machado – nem tão jovem, pois já conta com 26 anos e com o “Crisálidas”, um livro de poemas, publicado em 1864 – a reforma que o jovem literato quer

implantar na Literatura Brasileira, está no final do artigo de 1865: “Se esta reforma, que

eu sonho, sem esperanças de uma realização próxima, viesse mudar a situação atual das coisas, que talentos novos! Que novos escritos! Que estímulos! Que ambições! A arte tomaria novos aspectos aos olhos dos estreantes: as leis poéticas – tão confundidas hoje, e tão caprichosas – seriam as únicas pelas quais se aferisse o merecimento das produções – e a literatura alimentada ainda hoje por algum talento corajoso e bem encaminhado,–veria nascer para ela um dia de florescimento e prosperidade. Tudo isso depende da crítica.

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Que ela apareça, convencida e resoluta – e a sua obra será a melhor dos nossos dias.” Dias de 1865! E, por que não, dias de 2018? No artigo “O Ideal do Crítico”, Machado se compromete com o florescimento e com a prosperidade da obra ficcional que terá início cinco anos mais adiante com os “Contos Fluminenses”, de 1870, e com o romance “Ressurreição”, de 1872, aos quais vão seguir mais seis volumes de contos e oito títulos de romances. O crítico ousado dos anos 1860 comprovou ser um ficcionista inovador ao longo de quatro décadas, com obras ainda hoje capazes de manter o interesse, mesmo há mais de um século de sua morte, ocorrida em 29 de setembro de 1908. (Celestino é professor e escritor catarinense, residente em Florianópolis, autor de “A Literatura dos Catarinenses”, o registro mais completo da literatura que se produz em Santa Catarina.)


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ANTES

NATAL SEM SINOS

Maura Soares Florianópolis, SC

Manuel Bandeira

Antes eu estava assim, sem inspiração andando pelos cantos fazendo uma tarefa, outra deixando outras inacabadas. Antes eu estava assim, sem nexo sem amplexo, sem sexo. Antes, olhava a lua e nada me transmitia. Depois de sua chegada até o vento me dá inspiração. Antes eu era assim, vazia, sem perspectiva. Agora, depois da sua chegada renasceu em mim a esperança de novamente nos encontrarmos. Antes eu era assim, sem nada. Agora, consigo, sou tudo, fico encantada. A lua me inspira, o por do sol me embriaga, a brisa da madrugada me acalma, a coberta me aquece, o travesseiro eu abraço com saudade de você. Antes eu era assim, sóbria. Hoje, me embriago de você.

No pátio a noite é sem silêncio. E que é a noite sem o silêncio? A noite é sem silêncio e no entanto onde os sinos do meu Natal sem sinos? Ah, meninos, sinos de quando eu menino! Sinos da Boa Vista e de Santo Antônio. Sinos do Poço, do Monteiro e da igrejinha de Boa Viagem. Outros sinos Sinos Quantos Sinos! No noturno pátio Sem silêncio, ó sinos De quando eu menino, bimbalhai meninos, pelos sinos (sinos que não ouço), os sinos de Santa Luzia.

(11.12.12, às 20.38h www.lachascona.blogspot.com)

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FOLHAS DE OUTONO Sônia Pillon – Jaraguá do Sul, SC

A mesa retangular estava ocupada de ponta a ponta por familiares e amigos. Devia ter umas 20 pessoas. Um grande bolo nevado em formato de escada redonda era coberto por cerejas e recheado com calda de chocolate e morangos, bem no centro da mesa. Em cima do bolo de aniversário, uma boneca de confeito representava uma idosa clássica, elegante, delicada, com cabelos cor de prata segurados por um coque, óculos de grau, vestido longo em tom pastel e um gracioso colar de pérolas. Salgadinhos, docinhos e guloseimas para a criançada não faltaram naquele dia. - Parabéns pra você, nessa data querida! Muitas felicidades,

muitos anos de vida! Viva a vovó Vitóriaaa! Vivaaaaa! Cem anos! Vitória nem acreditava que alcançaria um século de vida! Emocionada, circulava o olhar pela mesa. Olhava um a um, com os olhos marejados, agradecida pela presença dos que a aplaudiam enquanto cantavam o “Parabéns”. Apesar da avançada idade, lembrava de cada um deles e do quanto cada um era importante em sua vida, de uma maneira ou de outra. Entre eles estavam a filha, o neto

e a bisneta, pessoas que amava tanto! As memórias da centenária estavam vívidas, com incrível precisão de detalhes, de acon41

tecimentos bons e ruins, como um filme sendo exibido na tela grande. A vida da veterana senhora trouxe conquistas e perdas, alegrias e tristezas, como todo mundo, mas ela aprendeu a ser resistente, a perseverar, ainda que a duras penas. Mesmo nos momentos em que o desânimo tomou conta, quando os pensamentos a conduziam por caminhos tortuosos, de revolta e insegurança em relação ao futuro, lá no fundo, a chama da esperança nunca se apagou. A infância modesta, a educação severa que recebeu, especialmente da mãe, de quem teve poucas demonstrações de amor, a maneira justa e afetuosa do pai, a rebeldia e as traquinagens do irmão mais velho... No frescor dos vinte anos, viveu a expectativa de felicidade com o matrimônio. Mais tarde, com o casamento desfeito, enfrentou a dor, a


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frustração e o preconceito ao se tornar “uma mulher desquitada”. A morte prematura do filho, as dificuldades encontradas para concluir a faculdade, em se manter no mercado de trabalho, ela lembra bem. Como esquecer? Os anos foram passando, o mundo foi mudando e Vitória foi seguindo em frente, como sempre. Se ela sentiu solidão durante a jornada? Muitas vezes! Mas sempre foi reservada. Nem sempre externava o que sentia. Se preservava em seus recônditos. Lentamente, décadas se sucederam. Cons-

tatava que a idade foi pesando. Os passos começaram a se tornar mais lentos, a visão e a audição não eram mais as mesmas. Os cabelos ganharam grandes mechas brancas. Cansava mais rápido com as atividades cotidianas. Se sentia triste com as limitações que a longevidade trazia, mas foi se adaptando, contornando, driblando. Porém, um fato fazia toda a diferença para ela. Mais do que em qualquer outra fase da vida, se sentia amada, amparada pela família, e esse foi o melhor presente que recebeu.

Por isso, naquele dia, quando todos comemoravam os seus 100 anos de nascimento, ela irradiava alegria e fez questão de soprar as velinhas do bolo, posar para as fotos. É como se cada ano correspondesse a uma folha de outono, que lentamente formou um lindo tapete, contornando a Árvore da Vida. Vitória! Sim, literalmente, vitória é a palavra que define esses momentos tão especiais para ela, que mantém a alma de menina.

RENASCIMENTO Luiz Carlos Amorim

Há um raio de luz nascendo no horizonte. Há um fio de esperança apontando o futuro. Há um resto de fé se multiplicando. É a vida ressurgindo, é o Natal do renascimento, do encontro da paz,

Peça seu exemplar: https://www.clubedeautores.

da busca do amor,

com.br/book/176534--HISTORIAS_DE_NATAL#.

a comunhão com Deus!

W_083TFRfIV e pelo email revisãolca@gmail.com

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NATAL DE CORES

MELODIA E LETRA

Aracely Braz Céu dos Poetas

Pierre Aderne - Portugal

Eu tenho aqui do meu lado uma letra

É Natal

E de presente eu pedi melodia

Quando a verde mata

Já que não há tinta na caneta

Se transforma

Que dê pra pintar minha alegria

Em tapete colorido

Eu tenho aqui um poema pequeno

Da flor de jacatirão,

Que não conhece espinho ou veneno

Nosso presente A cada véspera de Natal.

Que ainda nem sabe andar nem voar

É Natal

Só sabe chorar

Quando em cada lar,

Quando não quer mais viajar

Renasce Jesus num presépio De humilde manjedoura

Por terra ou por mar

Como nos corações dos homens.

Melodia e letra

É Natal

Mão e violão

Quando os sinos dobram,

Letra e melodia

E as cigarras trombeteiam

Céu e chão

Trazendo à tona A lembrança feliz e triste

Eu tenho aqui um versinho escrito

Do Cristo amado traído

Que em céu de chuva

Por assumir a nossa culpa.

Faz um dia bonito

Natal

Que olha pra mim pensando em você

A festa maior De esperança e paz

E me faz esquecer de tentar te esquecer

De perdão e de amor.

Melodia e letra Mão e violão Letra e melodia Céu e chão 43


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LITERARTE

LANÇADO “HARPA INERTE” Lançado o livro “HARPA INERTE”, da poetisa Cláudia Kalafatás, no final de novembro, no Espaço Sublime, no Campeche, em Florianópolis. A noite de autógrafos foi um sucesso e contou com sarau, com vários dos poetas presentes declamando poemas próprios ou da autora do livro que estava sendo lançado. Mais uma festa de poesia acontecido no mês de novembro, em Florianópolis, pois no ínício do mês foi lançada, no CIC, a antologia POETAS DA ILHA, da qual Cláudia também fez parte.

FEIRA DO LIVRO DE FLORIANÓPOLIS Neste mês de dezembro acontece mais uma edição da Feira do Livro de Florianópolis, do dia 13 ao dia 23. Este ano a feira não estará no Largo da Alfândega, como sempre, mas sim no calçadão da Av. Paulo Fontes, em frente ao terminal urbano do Centro. O Grupo Literário A ILHA estará participando, mais uma vez, com o lançamento de sua antologia POETAS DA ILHA e com o lançamento de livros de alguns de seus integrantes. Marli Lúcia Lisbôa estará aurografando seu livro HORA H, Cláudia Kalafatás estará autografando seu recém-lançado HARPA INERTE e Luiz Carlos Amorim estará autografando sua mais recente obra, MEU PÉ DE JACATIRÃO–poemas. Estaremos apresentando, também, esta nova edição da revista SUPLEMENTO LITERÁRIO A ILHA e a nova revista literária do Grupo A ILHA: ESCRITORES DO BRASIL. 44


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