SUPLEMENTO LITERÁRIO A ILHA - Dezembro/2021 - Edição 159

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SUPLE MENTO

LITE RÁRIO Florianópolis-SC – Dezembro/2021 – Nº 159 – Edições A ILHA – Ano 41

AGUALUSA

JACK MICHEL A ESCRITORA 2 em 1

LANÇA NOVO LIVRO

ENTREVISTA

COM RITA QUEIROZ

ESCRITOR TANZANIANO GANHA O NOBEL

A “NEUTRALIZAÇÃO” DE GÊNERO

A POESIA DE

HILDA CHIQUETTI BAUMANN

O CENTENÁRIO DE SARAMAGO Portal A ILHA: http://www.prosapoesiaecia.xpg.com.br


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Luiz Carlos Amorim – FLorianópolis, SC

NATAL NO CORAÇÃO

FESTA MAIOR O tempo corre, célere, e a vida aposta corrida com ele. Feito um relógio, a vida se refaz. Vai-se o inverno, vem a primavera e, arauto do tempo, floresce o jacatirão, o pincel da natureza, pintando a tela do mundo, anunciando o verão, anunciando o Natal. Natal, essa época mágica de desembrulhar esperanças, dar muito amor de presente, desempacotar paz e fé e engavetar a saudade. Festa de aniversário do Senhor da grande tela da cor do jacatirão, enfeite maior do Natal.

Disponível na Amazon em e-book e no Clube de Autores impresso.

O Natal chegou em minha casa. Uma criança, signo de pureza, alegria e verdade, adentrou a minha porta. Um menino espírito de luz, símbolo do amor, de fé e esperança, nasceu em meu coração. É Natal!

Disponível no Clube do Autor

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SUPLE MENTO

LITE RÁRIO

EDITORIAL ENCERRAMOS MAIS UM ANO, APESAR DA PANDEMIA Conseguimos seguir com a edição do SUPLEMENTO LITERÁRIO A ILHA sem nenhuma interrupção, mesmo no auge da pandemia e aqui estamos com a edição 159, de dezembro de 2021. A pandemia estava regredindo no Brasil e em outros pontos do mundo, mas na Europa já se fala em uma quarta onda. Esperemos que no Brasil, onde os números vêm caindo, a nova onda não chegue e a curva continue apontando para baixo. Preparamos uma edição bem eclética: temos textos e poemas de Natal, para comemorar a data maior, temos entrevistas com a poeta brasileira Rita Queiroz e com o escritor angolano Agualusa, que acaba de lançar seu novo livro. Abordamos um tema bem “polêmico” no momento, que é a “neutralização” de gênero, muito contraditório, e também a eleição do escritor tanzaniano para o Nobel de Literatura de 2021. Falamos sobre o centenário de Saramago, sobre o bicentenário de Anita Garibaldi, a Heroína de dois mundos. Falamos do fenômeno literário de 1960, Maria Carolina de Jesus, que terá a sua obra relançada. E muito mais prosa, poesia e informação literária, com uma matéria de capa sobre as escritoras 2 em 1: conheça Jack Michel e um pouco da sua obra. Desejamos Feliz Natal e um novo ano bem melhor a todos os nossos leitores. Que o coronavírus desapareça no novo ano e possamos voltar a viver nossas vidas com mais normalidade. Até a próxima edição. O Editor

EXPEDIENTE SUPLEMENTO LITERÁRIO A ILHA – Edição 159 – Dezembro/2021 – Ano 41 Edições A ILHA – Contato: lcaescritor@gmail.com e revisaolca@gmail.com A ILHA na Internet: Portal PROSA, POESIA & CIA.: http://www.prosapoesiaecia.xpg.com.br Os textos assinados não refletem, necessariamente, a opinião da revista. 3


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O CENTENÁRIO DE SARAMAGO

Para comemorar o centenário de Saramago, ocorrido no dia 16 de novembro, publicamos um texto curto do grande escritor português, o único escritor da língua portuguesa a ser contemplado com o Prêmio Nobel de Lite-

ratura. Dia 16 de novembro, às 10 horas, teve início em Por tugal a comemoração do Centenário de José Saramago, através da voz das crianças que realizam sessões de leitura do conto de José Saramago, A

maior flor do mundo. Algumas das atividades do dia 16: O programa da abertura do Centenário, marcado por três iniciativas, distribuídas ao longo do dia: •“Leituras Centenárias”: alunos do Ensino Básico lerão, em simultâneo, o conto A Maior Flor do Mundo; •Diversas atividades pelas sete bibliotecas da Rede de Bibliotecas José Saramago; •Atividade no São Luiz Teatro Municipal: leitura de um Manifesto pela Leitura pela escritora Irene Vallejo, seguida de um concerto pela Orquestra Metropolitana de Lisboa, dirigida pelo maestro Pedro Neves.

A MAIOR FLOR DO MUNDO José Saramago

As histórias para crianças devem ser escritas com pal av r a s m u i t o s i m ples… Quem me dera saber escrever

essas histórias… Se eu tivesse aquelas qualidades, pod e r i a c o nt a r, c o m pormenores, uma l i n d a h i s tó r i a q u e 4

um dia inventei. Seria a mais linda de todas as que se escreveram desde o temp o d os c ontos de fadas e prince-


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sas encantadas… Havia uma aldeia. E um menino.… Sai o menino pelos fundos do quintal e, de árvore em árvore, como um pint a s s i l g o, d e s c e o rio e depois por ele abaixo. Em certa altura, chegou ao limite das terras até onde se aventurara sozinho. Dali para diante começava o “planeta Marte”. Dali para diante, para o nosso menino, será s ó um a p e r g un t a: “Vou ou não vou?” E foi. O rio fazia um desvio grande, afastava-se, e de rio ele estava já um pouco farto, tanto que o via desde que nasc e ra. Resolveu cortar a direito pelos campos, entre extensos olivais, ladeando misteriosas sebes cobertas de campainhas brancas, e outras vezes metendo p el os b os ques d e altas árvores onde havia clareiras macias sem rasto de

gente ou b i c h o, e ao redor um silêncio que zumbia, e tamb ém um c al or ve getal, um cheiro de caule fresco. Ó que feliz ia o menin o! An d ou, an dou, foram rareando as árvores, e agora havia uma charneca rasa, de mato r a l o e s e c o, e n o meio dela uma inclinada colina redonda como uma tigela voltada. Deu-se o menino ao trabalho de subir a encosta, e quando chegou lá acima,

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que v iu el e? Nem a sorte nem a morte, nem as tábuas do destino… Era só uma flor. Mas tão caída, tão murcha, que o menino se achegou, de c a n s a d o. E c o m o este menino era especial de história, achou que tinha de s al var a fl or. Ma s que é da água? Ali, no alto, nem pinga. Cá por baixo, só no rio, e esse que longe estava!… Não importa. Desce o menino a montanha, atraves-


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s a o mun d o to d o, chega ao grande r i o, c o m a s m ã o s recolhe quanta de água lá cabia, volta o mundo atravessar, pelo monte se arrasta, três gotas que lá chegaram, bebeu-as a flor com sede. Vinte vezes cá e lá… Mas a flor aprumada já dava cheiro no ar, e como se fosse uma grande árvore deitava sombra no chão. O menino adormeceu debaixo da flor. Pas saram as ho ras, e os pais, como é c os tum e n es tes

casos, começaram a afli gir- s e mui to. Sa i u to da a fa mília e mais vizinhos à b us c a d o m eni no perdido. E não o acharam. Correram tudo, já em lágrimas tantas, e era quase sol-pôr quando levantaram os olhos e viram ao longe uma flor enorme que ninguém se lembrava que estivesse ali. Foram todos de carreira, subiram a colina e deram com o menino adormecido. Sobre ele, resguardando-o do fresco da tarde, estava uma gran de p ét a6

la perfumada… Este menin o foi levad o para casa, rodeado de todo o respeito, c omo obra de mi lagre. Quando depois passava pelas ruas, as pessoas diziam que ele saíra da aldeia p a r a i r fa ze r um a coisa que era muito maior do que o seu tamanho e do que todos os tamanhos. FIM Este era o conto que eu queria cont a r. Te n h o m u i t a pena de não saber es c rever his tór ia s para crianças. Mas ao menos ficaram sabendo como a história seria, e poderão contá-la doutra maneira, com palavras mais simples do que as minhas, e talvez mais tarde venham a saber escrever histórias para crianças… Quem sabe se um dia virei a ler outra vez esta história, escrita por ti que me lês, mas muito mais bonita?…


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POEMA DO MENINO JESUS Alberto Caieiro (Fernando Pessoa)

Num meio-dia de fim de Primavera Tive um sonho como uma fotografia. Vi Jesus Cristo descer à terra. Veio pela encosta de um monte Tornado outra vez menino, A correr e a rolar-se pela erva E a arrancar flores para as deitar fora E a rir de modo a ouvir-se de longe. Tinha fugido do céu. Era nosso demais para fingir De segunda pessoa da Trindade. (...)Um dia que Deus estava a dormir E o Espírito Santo andava a voar, Ele foi à caixa dos milagres e roubou três. Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido. Com o segundo criou-se eternamente humano e menino. Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz E deixou-o pregado na cruz que há no céu E serve de modelo às outras. Depois fugiu para o Sol E desceu no primeiro raio que apanhou. Hoje vive na minha aldeia comigo. É uma criança bonita de riso e natural. Limpa o nariz ao braço direito, Chapinha nas poças de água, Colhe as flores e gosta delas e esquece-as. Atira pedras aos burros, Rouba a fruta dos pomares E foge a chorar e a gritar dos cães. E, porque sabe que elas não gostam E que toda a gente acha graça, Corre atrás das raparigas Que vão em ranchos pelas estradas Com as bilhas às cabeças E levanta-lhes as saias. 7


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A mim ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas Quando a gente as tem na mão E olha devagar para elas. (...) Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro. Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava. Ele é o humano que é natural. Ele é o divino que sorri e que brinca. E por isso é que eu sei com toda a certeza Que ele é o Menino Jesus verdadeiro. E a criança tão humana que é divina É esta minha quotidiana vida de poeta, E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre. E que o meu mínimo olhar Me enche de sensação, E o mais pequeno som, seja do que for, Parece falar comigo. A Criança Nova que habita onde vivo Dá-me uma mão a mim E outra a tudo que existe E assim vamos os três pelo caminho que houver, Saltando e cantando e rindo E gozando o nosso segredo comum Que é saber por toda a parte Que não há mistério no mundo E que tudo vale a pena. A Criança Eterna acompanha-me sempre. A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado. O meu ouvido atento alegremente a todos os sons São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas. Damo-nos tão bem um com o outro Na companhia de tudo Que nunca pensamos um no outro, Mas vivemos juntos e dois Com um acordo íntimo Como a mão direita e a esquerda. 8


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Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas No degrau da porta de casa, Graves como convém a um deus e a um poeta, E como se cada pedra Fosse todo o universo E fosse por isso um grande perigo para ela Deixá-la cair no chão. Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens E ele sorri porque tudo é incrível. Ri dos reis e dos que não são reis, E tem pena de ouvir falar das guerras, E dos comércios, e dos navios Que ficam fumo no ar dos altos mares. Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade Que uma flor tem ao florescer E que anda com a luz do Sol A variar os montes e os vales E a fazer doer aos olhos dos muros caiados. Depois ele adormece e eu deito-o. Levo-o ao colo para dentro de casa E deito-o, despindo-o lentamente E como seguindo um ritual muito limpo E todo materno até ele estar nu. Ele dorme dentro da minha alma E às vezes acorda de noite E brinca com os meus sonhos. Vira uns de pernas para o ar, Põe uns em cima dos outros E bate palmas sozinho Sorrindo para o meu sono. Quando eu morrer, filhinho, Seja eu a criança, o mais pequeno. Pega-me tu ao colo E leva-me para dentro da tua casa. Despe o meu ser cansado e humano E deita-me na tua cama. E conta-me histórias, caso eu acorde, Para eu tornar a adormecer. E dá-me sonhos teus para eu brincar Até que nasça qualquer dia Que tu sabes qual é.(...) 9


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O GÊNERO “NEUTRO” OU A “NEUTRALIZAÇÃO” DE GÊNERO

Por Luiz Carlos Amorim – Escritor, editor e revisor – Cadeira 19 da Academia Sulbrasileira de Letras. Fundador e presidente do Grupo Literário A ILHA, que completa 41 anos em 2021. Http:// luizcarlosamorim. blogspot.com. br – http://www. prosapoesiaecia. xpg.com.br

Tenho visto algumas matérias sobre a “neutralização” do gênero na língua portuguesa, no Brasil, algumas contra e algumas a favor. Digo no Brasil, porque em Portugal não vejo isto. O que também não tenho visto é alguém usar essa novidade, nem em jornais, nem em revistas, nem na televisão, nem na internet, nem ao vivo e a cores. Tá certo que tenho mais de sessenta anos, mas

tenho muitos jovens nas minhas páginas em redes sociais, pois sou professor e escritor. Importante frisar que leio meia dúzia de grandes jornais brasileiros todos os dias. Mas vamos ver primeiro o que é o “gênero neutro”, que alguns insistem que são de emprego corrente, atualmente: “uso de feminino marcado no caso de substantivos comuns de dois gêneros – exemplo: “ a presidenta” – pergunto: vai ser “a estudanta”, também?; emprego de formas femininas e masculinas, sobretudo em vocativos, em vez do uso genérico do masculino – exemplo: alunos e alunas, ao invés de Alunos!; inclusão de novas marcas no final de nomes e adjetivos, como “x” e

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“@” – exemplos: “amigx, amig@” (que coisa absurda, não? Isso não é linguística, nem gramática: o símbolo @ nem ao menos é uma letra); ampliação da função de marcas já existentes, como a terminação “e” – exemplo: “amigue”; e alteração na base de pronomes e artigos – exemplo: “ile”, “le” (outra vez: que absurdo, nunca vi nada disso). De novo: não vi, ainda, em lugar nenhum esses disparates como “amigx”, “amig@”, “ile”, “nile”, “dile”, “aquile”, etc. Essa não é uma questão linguística, pois essas novidades não são de uso comum, não são de uso geral, pelo contrário, é de uso bem restrito. Línguística é o estudo da língua como ela é falada, mas o pre-


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sente caso da “neutralização” de gênero está se constituindo mais em uma imposição, por que não é de uso geral. Para que querer fazer mudanças na língua – mudanças que não são relevantes, nem inteligentes, nem necessárias – numa época tão difícil, quando precisamos priorizar a educação, que está falida em nosso país? Tivemos dois anos sem aula nas nossas escolas, infelizmente, devido à pandemia, a educação já vem sendo sucateada de há muito tempo, o abandono do ensino no Brasil é flagrante, então por que querer fazer mudanças, bagunçando ainda mais o sistema linguístico? Não temos obrigação de saber a preferência sexual de cada um e nem todas as pessoas homo querem ser identificadas, porque o que fazem na vida privada é direito de cada um, não interessa a mais ninguém. E se não soubermos isso,

como usar as “neutralidades”? Então o tratamento para as pessoas do “terceiro” gênero é uma questão de educação, de novo, para não esquecer. E de respeito. Precisamos tratar com respeito todas as pessoas, para merecermos que sejamos tratados com res-

peito também. Se nos tratarmos com respeito, não é preciso inventar palavras novas para identificar o “gênero” de uns e de outros. Precisamos parar de dar destaque a debates sobre assuntos que não são prioridade geral e dar importância a temas premen11

tes, como o resgate da educação no Brasil. E quando falo educação estou falando de ensino, conforme reza o dicionário português. Ensino, coisa tão menosprezada em nosso país. Há que se estruturar o ensino para que tenham os um povo que possa escolher o que realmente é prioridade e assimilar, se for o caso, uma nova atualização na língua, desde que linguisticamente amparada, é claro. Porque a mudança que querem fazer parecer necessária é uma imposição arbitrária e descabida, beirando o ridículo. Respeito quem acha que ela é necessária, mas respeito também a grande maioria do povo brasileiro que nem sabe do que se trata. Que as mudanças sejam usadas entre as pessoas que querem usá-las, tudo bem. Se o uso se generalizar, o que duvido muito, quem sabe será o caso de voltar a discutir a sua inclusão?


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TAQUARA VERDE (Dito campeiro)

Enéas Athanázio – Baln. Camboriú, SC

A Vila da Taquara Verde se estendia na b eirada de um c omprido c oxilhão c ober to de mato. Ficava apartada da estrada por um barranco de terra vermelha. Ali as casas se enfileiravam, na maioria modestas moradas de madeira bruta, encardida pelo tempo, e umas quantas de tijolos, mal-acabadas, em que viviam os maiora i s da ter ra , un s tantos fa zendeiro tes, o intendente, o inspetor de quarteirão, o professor e uns colonos remediados. Na par te de baixo da estrada ficavam a intendência, a delegacia, a escola

e a igreja. Para os fundos, um campinho de capim surrado onde a gurizada jogava bola, alguns piquetes com os animais do custeio e um banhadal que se estendia até a barranca do rio. Matagal cerrado crescia na beira da água que nem uma cerca viva de p r o te ç ã o. Ca n o a s e botes ficavam amarrados no “por-

to” ser vindo para cruzar o rio, alguma s p es c ar ia s d e pouco resultado e os brinquedos da piazada nos dias quentes. No outro l a d o, a p e r d e r d e vista, estendiam-se os roçados daquele povo. A produção da Vila dava para o gasto e o que sobejava era vendido aos fazendeiros vizinhos, en12

tre eles os coronéis endinheirados Lucidoro e Albuquerque. Milho, feijão, frutas e hortaliças, tudo era levado pelos peões daqueles e outros compradores. A Vila vivia em paz. Raras brigas aconteciam, o inspetor logo acalmava e a paz retornava. Peleias sérias, de sang u e, e s t ava m t ã o longe no tempo que ninguém se alem brava. Os dias corriam serenos, fosse com calor, ventania gelada, geadão de branquear o mundo e até neve. Taquara Verde não incomodava e nem era incomodada. N um r e p e n te, p o rém, um fato pegou a preocupar os moradores. Chegavam converseios sobre a Revolta dos Jagunços que se espalhava por toda par te, cada vez mais per to. Diz- que - diz- que c he g ava a t o d a h o r a


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contando as barbaridades dos dois lados, os caboclos e a polícia. Pelo mês de setemb r o, d u r a n t e u m a chuvarada, apareceu na Vila um andarilho muito conhecido naqueles ermos por nome Vidá. Moreno claro, cabelos crespos, tinha uma cara simpática e um sorriso fácil. Cobria-se com um chapéu de palha esfiapado e uma capa lageana retamada de remendos. Pisava descalço no chão úmido e frio. Com uma corda feita de trapos de tecido atados uns nos o ut r os, t a n gia um guapeca insepa-

rável. En quanto o dono, muito magro, tinha as costelas saltadas, o cachorro pelichava de gordo e exibia uma p elagem lus tr os a . Vidá deixava de comer para dar ao bicho da estima. Escorrendo água, o caminhante chegou numa casa conhecida e logo recebeu um prato que era um cerro de comida e uma caneca es malt ada gran d e de café preto. Enquanto devorava a comida com visível satisfação, ia informando dos acontecidos. - Pois não ha i d e vê que uns trezentos jagunços,

Calmon

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chefiados pelo Chiquinho Alonso, piazão de uns dezesseis anos, invadiram a Vila de Ca lm o n? Q ueima ram a casa verde, escritório da Companhia Americana, a serraria e o estoque de madeira, o a r m a zé m, a e s t a ção da estrada de fe r r o, o n d e m at a ram o telegrafista, e outras moradias. Mataram todos os homens na força do ser vi ç o e s ó p ouparam os velhos, a s m ul h e r e s e a s crianças porque o A l o n s o p e d i u. Fo i u m a m o r t a n d a d e! Quem pode fugiu pros matos ou pras cidades. - No outro dia, continuou o cabo clo, - chefiado pelo Venuto Baiano, invadiram a Vila de São João dos Po bres e a desgraceira ainda foi maior. Mataram todos os homens, sem perdoar ninguém, queimaram muitas


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casas e propriedad e s . Nã o l eva ra m nada; não queriam roubar. Estavam revo l t a d o s c o n t r a o governo e os estrangeiros que to mavam as terras deles. Vidá contou e contou, depois aproveitou uma estiagem da chuva e saiu pela estrada tangendo seu guapeca. Ninguém imaginava qual seria sua próxima parada. As notíc ias c orre ram e o med o to mou conta da Vila, espalhou-se com o vento. São João dos Pobres e Calmon estavam a dois passos dali e num re p ente os jagun ços podiam aparecer matando e q u e i m a n d o. O i n tendente montou no seu cavalo e foi

para a cidade dizendo que ia buscar informação. Na verdade, estava fugindo. Naquela mesma noite outras pessoas foram embora. Então foi a debandada. Os morado res pegavam suas trouxas e par tiam, uns a pé, outros nos seus cavalo e carroças. Rumavam sempre para o oeste que a campanha estava em guerra. Em pouco tempo Taquara Verd e s e e sva zi o u. Pa re c ia uma Vila-fantasma, as casas fechadas, fumaça não saía das chaminés, não se viam pessoas nas poucas ruas. O silêncio só era quebrado pelo canto de algum pás saro ou p el o gr i to d e a n i mal na mataria pró-

xima. Um que outro guapeca sem dono farejava à toa em busca de comida. O tempo passou. Ca p i m v i ç o s o p e gou a tomar conta da estradinha, as poucas calçadas na frente das casas racharam e caíram, o mato foi avançando. Um ar de cemitério cobriu tudo. Na campanha, a guerra acabou. Os caboclos foram massacrados e a p a z d o m a i s f o rte voltou ao c am po ensanguentado. Ventanias varreram o lugar, geada s e neve branquearam o mundo, fogaréus medonhos assustaram o povo, mas Taquara Verde não queima. A Vila nunca foi invadida, mas jamais voltou ao que era.

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DE ALMA EM ALMA

LIÇÕES Mia Couto

Cruz e Sousa

Não aprendi a colher a flor sem esfacelar as pétalas. Falta-me o dedo menino de quem costura desfiladeiros. Criança, eu sabia suspender o tempo, soterrar abismos e nomear as estrelas. Cresci, perdi pontes, esqueci sortilégios. Careço da habilidade da onda, hei-de aprender a carícia da brisa. Trêmula, a haste me pede o adiar da noite.

Tu andas de alma em alma errando, errando, como de santuário em santuário. És o secreto místico templário as almas, em silêncio, contemplando. Não sei que de harpas há em ti vibrando, que sons de peregrino estradivário que lembras reverências de sacrário e de vozes celestes murmurando. Mas sei que de alma em alma andas perdido, atrás de um belo mundo indefinido de Silêncio, de Amor, de Maravilha. Vai! Sonhador das nobres reverências! A alma da Fé tem dessas florescências, mesmo da Morte ressuscita e brilha! CRUZ E SOUSA, o maior poeta simbolista brasileiro e o maior poeta catarinense, teria completado 160 anos no dia 24 de novembro. Nossa homensagem ao Cisne Negro. 15


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TRILOGIA DAS FLORES Harry Wiese – Indaial, SC

A CRÔNICA Uma assídua leitora, chamada Margarida Buganvília da Rosa, me solicitou que escrevesse um tex to sobre flores. Flores, segundo ela, são a tônica dos jardins das residências, principalmente, as do grande Vale do Itajaí, portanto, o tema é merecedor de ser solicitado e escrito. Disse, também, que enviaria o texto para sua filha, que ama crônicas e flores. Agradeço pela solicitação, bondosa senhora, mas há tantos textos sobre flores, em prosa e verso, que nada mais me parece original. A maioria deles é simplória, superficial e leviana. Rima-se flor com dor e

amor e poema está feito. Pode parecer bonito, mas são rimas pobres, desprovidas de poética e lirismo. Então, o que escrever sem ser simplório e repetitivo? Mesmo assim procederei à solicitação com entusiasmo e benquerença. Pedi a um menino que me ajudasse e dissesse o que entende por flores porque crianças são originais e sinceras, merecedoras de serem ouvidas e respeitadas. Ele disse que “as flores nascem e morrem como as pessoas, mas entre nascer e morrer elas florescem”. Sim, florescem no seu devido tempo, de acordo com as características de cada espécie e não

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conforme nossa vontade, fato poetizado por Carlos Drummond de Andrade, que disse em um de seus poemas: “Leis não bastam. As flores não nascem da lei”. Tudo o que foi escrito é importante, mas não o suficiente. Assim, para descrever com maior desenvoltura as flores, peço auxílio a Alberto Caieiro, heterônimo de Fernando Pessoa, fiel assistente poético dos famintos de sensibilidade lírica. “Se às vezes digo que as flores sorriem/ E se eu disser que os rios cantam,/ Não é porque eu julgue que há sorrisos nas flores/ E cantos no correr dos rios.../ É porque assim faço mais sentir aos homens falsos/ A


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existência verdadeiramente real das flores e dos rios”. Cara leitora solicitante do texto! Para incrementar a existência real das flores, ainda vou buscar subsídios na poetisa portuguesa de grande prestígio: Florbela Espanca. Florbela tem flor no nome dela e isso não diz pouco. Perceba como ela transmite “A flor do sonho”: “A Flor do Sonho alvíssima, divina/ Miraculosamente abriu em mim,/ Como se uma magnólia de cetim/ Fosse florir num muro todo em ruína./ Pende em meu seio a haste branda e fina./ E não posso entender como é que, enfim,/ Essa tão rara flor abriu assim!...” Quando enviamos ou oferecemos flores às pessoas é para dizer o que não pode ser dito.

r e s é n o b r e, c a r a leitora Margarida Buganvília da Rosa. Ainda mais quando se trata de flores dos jardins da nossa cidade, como consta em sua justificativa, sem falar das que florescem somente para Deus. Há flores na floresta, orquídeas, bromélias, cipó de São João, caetés e miríades de plantas grandes e pequenas nas montanhas, nas estepes, nas savanas, nos campos, que ninguém vê, mas que cumprem sua função existencial de florescência. Escrever sobre flores foi fenomenal, minha cara leitora! Entre em contato com este cronista sempre que quiser e puder e não se esqueça de que flores não são como gente, flores florescem e falam quando as palavras faltam! E não se esqueça de enviar a crônica para a sua filha!

É quando as flores são mais fortes que as palavras. É nesse momento que elas falam, provocando sorrisos ou lágrimas, na alegria ou na tristeza, nas celebrações ou funerais. Engana-se quem pensa que as funções das flores são só as elencadas acima. Flores também são metáforas e matérias-primas nobres. Há plantações de girassóis de perder de vista, que depois de visuais deslumbrantes viram toneladas de sementes para as mais diversas importâncias. E o que dizer da cultura de lavandas, que parecem mares e céus azuis, perfumados, que além do encanto se transformam em fragrâncias para momentos A RESPOSTA de amor maior. DE MARGARIDA Escrever sobre flo17


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BUGANVÍLIA DA ROSA

Eu li “A crônica das flores”. Ri e chorei ao mesmo tempo de tão feliz que fiquei. Agradeço a Deus por ter gente que escreve coisas tão bonitas e tão certas. Existem coisas que estão perto da gente e a gente não vê e não dá importância. Alguém precisa dizer para nós e quando alguém diz a gente fica surpresa. De Carlos Drummond de Andrade eu lembro um pouco, acho que é da aula, eu só estudei até o Quinto Ano. Meu pai me tirou da escola porque eu precisava ajudar em casa: na cozinha e na roça. Não era como hoje, que criança precisa estudar e não deve trabalhar. Mas Drummond está certo, não adiante querer botar leis na natureza. A natureza é a própria lei. Eu sei pouco sobre essas coisas. Mas sei que não chove ou chove porque a gente quer. Meu avô já di-

zia que não adianta ir contra a natureza, ela faz cobrança, ela pode mandar flores ou mandar destruição. De Fernando Pessoa e Florbela Espanca, eu confesso: nunca ouvi falar, mas estou aprendendo com as coisas que o cronista escreve. Gostei muito da poetisa de Portugal, a Florbela, porque ela tem o nome flor no nome dela, assim como eu: Margarida Buganvília da Rosa. Vou olhar na internet para ver se acho mais alguma poesia dos poetas de Portugal. Meu pai sempre dizia que nunca é tarde para aprender. Uma coisa eu vou dizer para o senhor que escreve para o jornal: eu gosto muito das poesias que falam de amor. Eu sempre

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mando para minhas amigas do “ Face”. Quando aparecem as rimas de flor com amor e dor, eu acho muito bonito porque dá uma emoção muito grande dentro do coração. O senhor escritor que tem o estudo não concorda, mas para nós que têm a simplicidade da vida, é muito bonito. Sabe que eu fiquei matutando algumas coisas sobre “A crônica das flores”? Uma coisa que nunca passou na minha cabeça são as flores que ninguém vê. Elas estão ali espalhadas e estão tão bonitas como se a gente estivesse olhando para elas. Elas, as flores, nem se importam porque florescem para Deus. Que coisa linda essa parte de sua crônica. Pior é


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Margarida Buganvília da Rosa! A RESPOSTA DE GARDÊNIA

que a gente acha que elas não valem nada. Como a gente está errada, pura ignorância. Sempre achei que flores do campo, que graça podem ter. Agora o que mais quero é ganhar um buquê de flores do campo. A minha filha, que gosta de flores e crônicas, eu mandei a crônica para ela. Tirei foto no celular e mandei. Vou esperar para ver o que ela acha. Ela é muito sabida nessas coisas de leitura. Minha filha se chama Gardênia Amarílis da Rosa, nome que eu sempre achei muito bonito, ainda vejo ela brincando e pulando no meio dos canteiros de flor. Quando eu mostrei “A crônica das flores” para minha vizinha, ela disse que tem mui-

ta metáfora ali dentro e eu não sabia o que é metáfora. Então, ela que é sabida, me explicou que metáfora “é uma coisa que a gente acha que é, mas não é”. É como dizer que tu é uma flor, você fica feliz e acaba descobrindo que não é verdade. Eu tenho flor só no nome. Será que meu nome também é metáfora? Eu gostei muito do pedaço que diz que as flores falam quando as palavras faltam. Que coisa maravilhosa! É lindo demais e é verdade mesmo! Agora vou pedir ao escritor que se quiser colocar no jornal, eu aceito, mas precisa colocar os acentos e as vírgulas, que eu não sei fazer direito. No mais tudo bem. Um grande abraço da 19

Eu sou Gardênia Amarílis da Rosa Antúrio, filha de Margarida Buganvília da Rosa. Li a “Crônica das flores”, escrita a pedido de minha mãe. Também recebi e li o texto dela, “Crônica das flores – a resposta”. Ela me mandou até o jornal para eu ler. Nunca imaginei escrever um texto, que até poderá sair para as pessoas, mas se minha mãe escreveu, por que eu não posso escrever também? Muito me lembro da Professora Dona Edy, que sempre incentivou a gente a escrever, escrever qualquer coisa, como uma carta, um diário, ou até uma lista de compras. Para não fugir do assunto, vou escrever sobre flores, já que minha mãe começou com esse tema. Vou contar a história de um amigo meu que


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é cientista. Ele é um pesquisador diferente: agora ele pesquisa as flores que crescem nos barrancos das rodovias. Outra pesquisa dele foi sobre as flores das matas ciliares dos rios. Algumas flores de sua lista são bem conhecidas, mas a maioria nem nome têm. Algumas são tão pequenas que quase ninguém dá importância, ninguém vê, mas elas estão lá cumprindo sua missão. Fiquei impressionado com as fotografias que ele tirou, uma é mais interessante que a outra. Quem viaja não dá importância às flores que estão nos barrancos das estradas. Os carros passam rápidos demais. Muitas vezes estão escondidas entre arbustos e capim o que dificulta mais ainda. Sabe que até o capim dá flores? Os andarilhos, solitários e cansados, eles, sim, veem as flores das rodovias. Eles andam pensativos e às vezes para se distrair,

observam as flores que ali crescem sem regras e cuidados. Outro dia, subindo a Serra da Santa, lá em Pouso Redondo, meu marido parou o carro para descansar um pouco. Então eu vi uma coisa que me impressionou muito e que nunca esqueço. Ali perto, um andarilho sentou-se em uma pedra na beira da estrada e eu só fiquei olhando. De repente ele colheu uma florzinha que cresceu ali perto. Ele olhou, olhou; cheirou, olhou de novo e a guardou no bolso do paletó. Depois ele foi embora devagarinho, porque os andarilhos das rodovias andam devagar. Assim, eu cheguei à conclusão de que as flores das rodovias, mesmo entre mato e capim, florescem para Deus e para os andarilhos. Aquele andarilho não tendo alguém para oferecer a flor que colheu, ofereceu-a para si mesmo. Ti20

vesse eu estudo, faria entrevistas com os andarilhos para saber da vida deles, como vivem e como se relacionam com os outros. Uma coisa eu quero deixar bem explicada: na próxima viagem para o Planalto Serrano, eu quero colher flores ao longo do caminho: as belas flores do campo. Depois para compensar vou seguir o exemplo de Cora Coralina, porque aquela poetisa eu conheço muito bem, que certa vez disse: “Eu sou aquela mulher que fez a escalada da montanha da vida, removendo pedras e plantando flores”. Também vou pedir a você, escritor, se achar conveniente colocar no jornal, que coloque as vírgulas, os acentos e as concordâncias, porque não lembro mais direito das coisas da gramática. Um grande abraço da Gardênia Amarílis da Rosa Antúrio!


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PRESENÇA Mario Quintana

Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela e respirar-te, azul e luminosa, no ar. É preciso a saudade para eu sentir como sinto – em mim – a presença misteriosa da vida… Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista que nunca te pareces com o teu retrato… E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.

É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas, teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento das horas ponha um frêmito em teus cabelos… É preciso que a tua ausência trescale sutilmente, no ar, a trevo machucado, as folhas de alecrim desde há muito guardadas não se sabe por quem nalgum móvel antigo…

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JACK MICHEL – A ESCRITORA 2 EM 1

JackMichel é o primeiro grupo da literatura composto por duas escritoras: Jaqueline e Micheline Ramos. São irmãs e nasceram em Belém – PA (Brasil). Os temas de sua obra abrangem vários gêneros e têm livros publicados de poesia, romance, fábula e conto de fadas.

Tomate (Drago Editorial) • O vo (D r a g o Ed i torial) • Fadastafadasbumplel (Drago Editorial) • O M un d o Vítreo -Plástico-Papelar dos T e l ur p i a n o s X6 5 3 (Drago Editorial)

As suas publicações: • Arco-Jesus-Íris (Chiado Editora) •LSD Lua (Drago Editorial) • 1 Anjo MacDermot (Drago Editorial) • Sor vete de Pizza Mentolado x Torpedo 22

•Sixties (Helvetia Éditions) • Tim O Menino do M undo de Lata (Helvetia Éditions) • Anotações da Lagarta Papinha (Editora Leia Livros) • O Prínc ipe Milho (Editora Leia Livros) • Fabulário JackMic hel (Editora Leia Livros) • Papatiparapapá (Editora Illuminare) • Lobistratusdilapir ulobis (Editora Illuminare) • MumoGnomo (Drago Editorial) • JackMichel Antologia (Editora In-Finita) • Fada - Conto Branco (Editora UNISV)


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• Fada - Conto Rosa (Editora UNISV) • Fada - Conto Azul (Editora UNISV) • Fada - Conto Verde (Editora UNISV) • Fada - Conto Amarelo (Editora UNISV) • Fada - Conto Verm elho (Editora UNISV)

e Movimiento Poetas del Mundo. S eus contos e poem as constam em antologias internacion ais: Amor & Amore ( Edizioni Mandala), O s Melhores Poem a s d e 2 016 ( Z L B ooks), Faz de Conto II, A Vida em Poesia II/III e O Homem, O Projeto do Mundo ( Helvetia Éditions), 1 ª Antologia Cultive (Fast Livro), Além da Terra, Além do Céu – A ntologia de Poesia Brasileira Contempor ânea – Vol II (Chiado Editora), Antologia C riticartes 2017 (Bib lio Editora), Antolo-

A TRAJETORIA NAS LETRAS

J ack Michel é ass ociada à A.C.I.M.A ( Associazione Cult u r a l e I n te r n a zi o n ale Mandala), L ITERARTE (Assoc iação Internacional d e Escritores e Art istas), AMCL (Acad emia Mundial de C ultura e Literatur a), UBE (União Bras ileira de Escritores) 23

g ia Brasileira Prosa e Poesia Vol I (Editor a SOL), Sem Front eiras pelo Mundo... V ols 3/4/5/6 e Colet ânea Literária Internacional em Prosa & Verso - Conexão Méx ico (Editora Rede S em Fronteiras), II A ntologia Cultive Le Temps Du Reveil e I IIa. Antologia Cultiv e Coragem (Editor a Cultive), Mulherio d as Letras Portugal/ M ulherio das Letras n a Lua e Conexões Atlânticas VI (Editora In-Finita). T ambém foi destaq ue em periódicos de arte e cultura: jor-


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n al da Biblio, jornal M atarazzo em Foco, j ornal Sem Fronteir as, jornal O Escrit or (UBE) e revistas d e literatura: Varal d o Brasil, Arca Lit erária, Ami, Divulg a Escritor, Cultive, G eração Bookaholic, Conexão Literatura, Criticartes, Philos, E isfluências, Liter aLivre, Escritores B rasileiros Contemp orâneos, Letrilha, L CB, Escritores do B rasil, Contos e Letras, Sunshine. P articipou de sal ões e feiras do liv ro na Europa e no B rasil: XXIX Salon e I n te r n a zi o n a l e

d el Libro Torino, Fier a dell’a editoria ital iana Tempo Di Libri/ M ilão, BUK Festival D ella Piccola e Med ia Editoria/Moden a, I Salão do Livro de Lisboa, I Salão do L ivro de Berlim, 31° S alon du Livre et de la Presse de Genève, S alão Internacional do Livro do Rio 2018, X VIII Bienal Internac ional do Livro do Rio, 6ª Feira do Livro L ivre de Buenos Air es, XXX Salone Internazionale del Libro Torino, 18° Salon du L ivre et des Cultures d u Luxemburg, 32° S alon du Livre et de la Presse de Genève, 24

25ª Bienal Internacion al do Livro de São P aulo, 5º Salão do L ivro de Nova York, 90ª/91ª Feira do Livro de Lisboa. R ecebeu Menção H onrosa no Prêmio d e Excelência Liter ária Troféu Corujão d as Letras/categoria c onto, no II Concurs o Cultive de Literat ura Prix Cultive de Littérature e na Colet ânea Literária Internacional em Prosa & Verso Conexão México/categoria poesia. C onquistou o 1° lug ar no II Festival de P oesia de Lisboa, o IV Prêmio Talent os Helvéticos-Bras i l e i r o s /c a t e g o r i a i nfantil e infanto-juv enil, o 3º lugar no I Concurso Cultiv e de Literatura Prix A L ALS de Lit térat ure, no I Concurs o Literário da Casa B rasil Liechtenstein e no Concurso Natal d os Sonhos Literarte Kids. E m 2 0 21 e s t r e o u c omo apresentador a do webshow “Chá


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Literário com JackMichel” no YouTube canal Revista Sunshine e passou a fazer part e da “Galeria dos I mor tais” na Casa d os Poetas em Petrópolis/RJ. S eu slogan é A Escritora 2 Em 1. W ebsite Oficial da JackMichel A Escritora 2 Em 1 h ttps://www.websit eoficialjackmichelaescritora2em1.com/

Casa dos Poetas que fica no centro históric o de Petrópolis-RJ. A Galeria é um mural composto por 500 a zulejos com frases e poemas de 500 esc ritores, poetas e artistas brasileiros.

GALERIA DE IMORTAIS NA CASA DOS POETAS

J ackMichel, A ESC RITOR A 2 EM 1 f az parte da Galer ia dos Imortais na 25

O azulejo com a biografia de Jack Michel ficará exposto para a imortalidade na Casa d os Poetas em meio a grandes nomes da l iteratura brasileira como Clarice Lispector, Manoel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Mário Quintana entre outros. A cerimônia de inaug uração da parede ocorreu em 24 de set embro de 2021. O p rojeto foi promovid o pela da Literarte ( Associação Internacional de Escritores e Artistas).


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JACK MICHEL

MEU BRASIL PARA CANTAR ENCANTADO MÁRIO LAGO

Meu Brasil encantado! Um verde rio desmaiado Espalha a névoa da manhã... Voa a pequena maracanã!...

Mário Lago? Disse eu, quando apertei-lhe a mão. Eu mesmo, e, porque não? Respondeu como quem não medra, Começando a cantar “Atire a Primeira Pedra”: Covarde sei que me podem chamar/ Porque não calo no peito essa dor/ Atire a primeira pedra, ai, ai, ai/ Aquele que não sofreu por amor.

Meu Brasil encantado! Um amarelo sol tostado Tinge o topo das montanhas... Nadam, ao longe, ariranhas!... Meu Brasil encantado! Um branco vento galhardo Brinca em muitos jardins... Adiante, despetalam-se jasmins!...

Mário Lago, quantos sambas!... Continuei falando-lhe assim. Sim! E todos da primeira hora. Concordou ele, cantando “Aurora”: “Se você fosse sincera/ Ôôôô Aurora/ Veja só que bom que era/ Ôôôô, Aurora.”

Meu Brasil encantado! Um azul céu ilimitado Guarda o Cruzeiro do Sul... Estrelas brilham no espaço êxul!...

Nossa conversa prosseguiu em compasso binário Com acompanhamento... Até que eu lhe perguntei sem acanhamento: Mário Lago, e samba dói no coração? Não! Só se for samba-canção. Me explicou o compositor cantarolando Aquela música que foi feita para uma Adélia, Mas que se chama “Ai que Saudades da Amélia”: “Amélia não tinha a menor vaidade/ Amélia que era a mulher de verdade.”

Meu Brasil encantado! Trago-te sempre em mim Por muitos já fostes cantado... Doce Terra tupiniquim!...

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CAROLINA MARIA DE JESUS, PARA TODOS CONHECERMOS

U ma exposição no I nstituto Moreira Sall es e a reedição de s eus textos pela C ompanhia das Letras devolvem à atual idade a autora de ‘ Quarto de despejo’, um retrato da batalha cotidiana contra a miséria. “QUARTO DE DESPEJO”

D urante seis meses, em 1960, o livro mais v endido do Brasil foi um diário em que Car olina Maria do Jes u s r e l a t ava c o m t oda crueldade sua m iserável subsistência, a batalha cotidian a contra a fome, a b usca incansável de

p apelão no lixo para r eunir alguns trocad os com os quais alimentar seus três fil hos. Quarto de despejo é um retrato das favelas iluminado por u ma moradora com d ois anos de escol aridade. Foi um fenômeno editorial, um b est-seller. Uma exp osição recém-inaugurada em São Paulo e a reedição de seus e scritos sem a inger ência dos editores t razem novamente à a tualidade uma obra que abrange crônica, romance, contos, teatro, letras musicais… e vai além do clichê. Carolina Maria de Jes us (1914 -1977) é 27

uma personagem ext raordinária. Neta de u m homem escrav izado que tinha o a pelido de Sócrates africano, era uma leit ora voraz dos cláss icos da literatura r omântica e foi emp regada doméstica antes de virar catador a de papelão. Cent rada na sua missão d e conseguir pão, l eite, feijão e sapat os para a prole, ouv ia valsas vienenses e sempre tirou tempo para ler. E m 21 de julho de 1955 escreve no diário que serve de base a Quarto de despejo: “Quando cheguei em casa eram 22h30min, L iguei o rádio. Tom ei banho. Esquent ei a comida. Li um p ouco. Não sei dorm ir sem ler. Eu gost o de manusear um livro. O livro é a maior invenção do homem”. E stava decidida a q ue seus cadernos f ossem publicados, como deixou anotado


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e m 27 de julho: “Est ou escrevendo um livro, para vender. Min ha intenção é comp rar um terreno com e sse dinheiro e sair da favela”. C onseguiu se mudar q uando os escritos q ue guardava foram descobertos pelo jorn alista Audálio Dant as, que visitou a f avela do Canindé, na zona norte de S ão Paulo, para fazer uma reportagem. C om drásticos cortes para aliviar a onip resença da fome n o original —Dantas d izia que “aparece c om uma frequênc ia irritante”—, pub licou aquele relato. C ausou sensação. A h istória dessa mãe s olteira era um po-

d eroso contraponto ao discurso do Brasil m oderno, do futuro, q ue tinha em Brasíl ia, a nova capital, i naugurada também e m 1960, o grande s ímbolo de seu progresso. A partir da sua vida, a catadora analisa uma m iséria que ainda h oje atravanca o cam inho do país. Vend eu meio milhão de cópias. Ela e seus fil hos deixaram para t r á s a fave l a , u m mundo que descreve como uma luta const ante, de moradores que se roubavam uns aos outros e vizinhas f ofoqueiras. Mudou-se para um bairro de c lasse média. Autog rafava exemplares. Q uar to de despe 28

j o foi traduzido em 1 3 idiomas (incluído o espanhol, em três versões, e o catalão), chegou a leitores soviéticos, japoneses… A Cinderela negra apareceu até mesmo na Time. A exposição recém- inaugurada no IMS- SP se chama Um B rasil para os bras ileiros. O museu quis abrir o foco para m ostrar a autora em t oda a sua diversid ade e riqueza. “Foi u ma leitora voraz e u ma escritora com um projeto estético lit erário definido, que passou por vários gên eros. Escrevia diar iamente”, diz uma das curadoras, da exp osição, a historiad ora Raquel Barreto, d estacando que “em c ada um desses gêneros é uma Carolina d iferente, o que diz muito da sua complex idade como autora. A poeta não é como a narradora, nem como a cronista, nem como a contista. Também v emos isso no seu


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t rabalho como compositora”. N a manhã de últim o domingo, Letícia M ontsho, cantora e atriz de 26 anos, era u ma dos dois únicos v isitantes negros na e xposição. Observava cada detalhe com e moção. Para ela, é a lgo pessoal. A escritora recorda as pen úrias que sua avó sofreu, sua coragem, o s desafios cotidian os. Descobriu Carolina Maria de Jesus j á adulta, através do teatro, porque na esc ola não é estudad a. “Foi necessário que ela existisse para que eu estivesse hoje aqui”, diz. A antiga catador a de papelão publicou outros três livros e m vida, mas com o tempo as vendas c aíram, o dinheiro v oltou a minguar, e morreu pobre. Barret o e o outro curador, o antropólogo Hél io Menezes, mergul haram num legado d istribuído em vários a rquivos públicos.

D escobriram originais que mostram até q ue ponto os editor es distorceram sua o bra, 80% da qual p ermanece inédita. S ão 6.000 páginas manuscritas. P or coincidência ou p elo impulso de ren ovação que os prot estos antirracistas e o Me Too trouxeram t ambém à cultura, a e xposição, que fica e m cartaz até 30 de janeiro, ocorre simult aneamente à reed ição das obras de

Carolina Maria de Jes us pela Companhia d as Letras. São textos publicados agora com a grafia original, s em necessariamente seguir a norma cult a da língua. Não é q ue ela tenha tido m enos escolaridade q ue a média. Estudar apenas dois anos era o normal entre as m ulheres negras da época, porque o futuro se limitava a catar p apelão, lavar, pass ar ou criar os filhos dos outros…

(fotos do Arquivo Público do Estado de São Paulo)

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C om o tempo, a aut ora de Quarto de despejo caiu num esq uecimento quase generalizado. Mas alg umas mulheres neg ras viram nela uma r eferência. “É a fund adora de uma lin hagem, inspirou o utras a es creve rem”, destaca o cura-

d or Menezes. Abriu u m caminho pelo q ual nestas décadas t ransitaram escritor as como Conceição E varisto, a literatura das periferias, mul heres rappers ou p oetas do slam imp rovisad o… Al gum as delas também f oram empregadas

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domésticas. Batalharam e batalham para s erem levadas a sério. Carolina Maria de Jesus é mais estudad a em universidades d os Estados Unidos que no Brasil, salienta Menezes. A mostra também a bre o foco no sent ido literal, porque r esgata fotografias inéditas ou pouco conhecidas que se chocam com as imagens m ais difundidas, as de uma mulher cabisbaixa, com um lenço b ranco ocultando o c abelo crespo. Houve outra Carolina Mar ia de Jesus. A que p osa com os vestid os elegantes que t anto ansiou possuir, colar de pérolas e os c achos ao ar, sorridente.


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DEFLORAMENTO

INSPIRAÇÃO

Rita Pea – Portugal

Erna Pidner – Ipatinga, MG

Por que te evades, inspiração? Em que refúgio vou te encontrar?
Te afugenta a vã razão
O imediatismo incomoda tanto
Franco conflito te esvazia
Não mais motivo para teu canto
Serão ternura e nostalgia? Dormes no topo dessas montanhas
Na verde relva, entre os duendes
Pelos caminhos não percorridos
Nos corpos suados, adormecidos,
Na vida mansa, lá na fazenda
Na indagação de homens ateus
Em reencontros, num triste adeus? Se retornares, eu te prometo
Farei poemas, lindo soneto
Sem macular tua nobre essência.
Na tarde calma, ao longe, a aragem
Há de espalhar suave mensagem!
Volta depressa, eis o momento;
Te espera, livre, meu pensamento!

Anoiteceu e a rosa vermelha pousou na minha mão. Nua de olhos fechados doou-se livremente aos meus dedos para eu deflorar a poesia escondida entre as suas pétalas 31


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ESCRITOR TANZANIANO GANHA O PRÊMIO NOBEL

Começou a escrever aos 21 anos como um jovem refugiado tanzaniano no Reino Unido, e no dia 7 de outubro, aos 73, estava na cozinha da sua casa quando recebeu um telefonema da Academia Sueca para lhe informar que ganharia o maior prêmio literário que existe. Horas depois, em Estocolmo, era anunciado ao público que o Prêmio Nobel de Literatura de 2021, dotado de 10 milhões de coroas suecas (6,28 milhões de reais), foi dado ao tanzaniano Abdulrazak Gurnah, “por sua

comovedora descrição dos efeitos do colonialismo na África e do destino dos refugiados, no abismo entre diferentes culturas e continentes”. A surpresa foi notável não só para o autor, cujo nome estava fora das listas e das apostas. Nascido em 1948 na ilha de Zanzibar, Gurnah escreve em inglês e já lançou 10 romances – todos inéditos no Brasil – como Paradise (1994), que foi indicado ao Booker Prize e ao Whitebread Prize. Outros títulos conhecidos são By the sea (2001), De32

sertion (2015) e os mais recentes Gravel heart (2017) e Afterlives (2020), elogiados pela crítica. Na manhã desta quinta (hora do Brasil), Anders Olsson, membro da academia, explicou como em seu “magnífico último livro ele se afasta das descrições estereotipadas e abre nosso olhar a uma África culturalmente diversa, pouco conhecida em outras partes do mundo”. Gurnah também escreveu e editou ensaios sobre literatura pós-colonial e é professor emérito no departamento de língua inglesa da Universidade de Kent. Em seus textos analisou o trabalho de outro Nobel, V.S. Naipaul, e de um eterno candidato ao prêmio da Academia, Salman Rush-


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die – sobre quem também publicou um livro de introdução à obra, Companion to Salman Rushdie (Cambridge University Press, 2007). Mas, na ficção do Nobel de 2021, o que mais ecoa é provavelmente esse exílio britânico sobre o qual o Nobel sul-africano J. M. Coetzee escreveu em Verão. Gurnah é o sexto africano a obter o prêmio, depois do argelino Albert Camus (1957), do nigeriano Wole Soyinka (1986), o egípcio Naguib Mahfouz (1988), e dos sul-africanos Nadine Gordimer (1991) e J. M. Coetzee (2003). No ano passado, o Nobel de Literatura foi atribuído à poetisa americana Louise Glück. Em 2019, para a polonesa Olga Tokarczuk. O prêmio de 2018, ao austríaco Peter Handke, foi adiado

para 2019 devido aos escândalos de abusos sexuais e vazamentos que atingiram a academia sueca no ano anterior. O prêmio para o romancista tanzaniano neste ano revela um autor desconhecido para o grande público, algo que também é parte da tra-

dição da Academia Sueca. O autor chegou ao Reino Unido no final da década de 1960, após sair do seu país em um momento no qual a minoria muçulmana estava sendo perseguida. Tinha es33

tudado na Universidade Bayero Kano, na Nigéria, e de lá se transferiu para a Universidade de Kent, onde se doutorou em 1982. Seus estudos se centram no pós-colonialismo e no colonialismo, especialmente relacionado com a África, o Caribe e a Índia. Abdulrazak Gurnah se impôs na decisão final diante de outros nomes que apareciam como apostas para o prêmio neste ano, como a francesa Annie Ernaux, o queniano Ngũgĩ wa Thiong’o, o japonês Haruki Murakami, o sul-coreano Ko Un, a guadalupense Maryse Condé ou a chinesa Can Xue. Outros autores que sempre aparecem como favoritos são Don Delillo, Salman Rushdie, Adonis, Jon Fosse, Mircea Cărtărescu, Hilary Mantel e Margaret Atwood.


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DERRAPAGEM

Jacqueline Aisenman - Portugal

Ou será somente do vivente um deslize? Que o fez fazer a curva ao invés de seguir a estrada antes desejada? Destino é mais simples de aceitar Pois derrapagens, Intencionais ou não... são erros... E naqueles olhos Tudo estava dito Mais do que isto, estava escrito visto... Por causa então, presente ali a melancolia... Já havia a indiscutível e absoluta certeza de que a estrada nunca mais seria a mesma.

Foi olhando nos olhos dos olhos daquela foto. Olhos felizes de uma outra época outras matizes outras razões para sorrir... E de repente uma sombra um pensamento um momento assombramento: quando foi? por que foi? como foi? que tudo derrapou? Haverá de chamar-se destino? E por assim então recolher o sorriso e soltar a lagrima?

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VÓ LOLITA, ESTOU PENSANDO EM VOCÊ. Tamara Zimmermann Fonseca - INDAIAL, SC

A o som de Agepê na vitrola, com muito charm e, às vezes curtindo u m cigarro, acompan hada de uma cerveja ou de uma caipirinha; e sse muitas vezes foi o cenário de conversas intermináveis entre m im e minha vó Lolita. Mais do que uma vó “doidona”, foi uma grand e amiga, que me fez c ompanhia incontáveis vezes em todas as fases de minha vida. N ossa vó Lolita sorria ao ver mamãe e papai c om seus cinco filhos e algumas amiguinhas, na nossa Kombosa, no p eríodo das férias esc olares, quando chegávamos em sua casa d o Recreio dos Bandeirantes no Rio de Jan eiro! Muitas histórias

d essa época guardadas na memória, entre o s sanduiches de pão d e forma guardados n a geladeira no meio da noite, passeios pela praia da Macumba, jogos de buraco e as bic icletas que ela e seu m arido (Tio Fred), arrumavam para nós, as crianças. Risadas, garg alhadas, olhares que f alavam e muito amor s empre estavam presentes! A ssim que comecei a f azer meus passeios s ozinha, já na adolesc ência, no lugar onde p egava o ônibus de São Paulo para o Rio, v árias vezes lá estav a ela, minha amada vó a me esperar na rod oviária, linda, elegante, amorosa e divertida. Ainda lembro o primeiro dia em que fui a sua c asa de surpresa, foi uma festa! Vó Lolita sempre nos fez sentir bem, super à vontade e muito amados! Numa ocasião, no ô nibus que ia até sua c asa, eu sentada no b anco atrás do motorista e olhei para ela ao 35

meu lado e vi a pequen a grande vó que eu tinha, tão linda no banc o. Percebi que seus p és mal chegavam no chão, ficavam pendurados como se fosse uma c riança balançando os p ezinhos, enquanto os meus... Aff , eu estava p raticamente com os joelhos nas orelhas e aí comentei com ela, quas e sussurrando para n inguém ouvir, a não s er ela: meu, vó, que diabo de banco de ônibus é esse, parece que e stou no “trono”! Não s e ouvia mais nada além de suas inesquecíveis gargalhadas! No auge de meus vint e anos, frequentando barzinhos com música a o vivo, na Duarte de Azevedo, rua badalada d a Zona Norte, lá estava minha vó comigo, me curtindo e curtindo meus amigos. A música começava a tocar e lá ia ela. Linda, solta e s ambando como ninguém, poucos acreditavam que aquela mulher linda e cheia de vida era avó de uma marmanj a como eu. Vó Lolita


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sempre de saltos muito altos, de colar, pulseiras e outros balangandãs q ue a deixavam ainda mais charmosa. Nessa época, vó Lolita passou alguns dias com igo em nossa casa, em Santa Terezinha e, quando voltávamos das n oitadas em Sampa, ela corria para a geladeira para comer o feijão que eu havia feito. Quando perguntava se n ão iria esquentar, ela m e dizia saboreando o prato: ´bom é assim gelado, para quebrar a "onda " da cerveja!” Fazia a propaganda desse meu feijão por onde passava. Nosso tour pelas noites p aulistanas começava pela Barão de Itapetinga, na UBE, União Bras ileira dos Escritores. L á eu e ela curtíamos os "artistas", como diria papai, gente sonhadora que em verso e prosa nos mostrava o lado romântico e até ousado de suas obras literárias, Entre uma poesia e outra , um pastel e outro, u ma cerveja e outra, u m contista, um ro-

m ancista, todos naquele lindo lugar eram uma peça diferente do universo. Depois, saindo desse local mágico o nde alimentávamos a alma, seguíamos a um outro espaço sens acional, que ao meu v er era um teletransp orte no tempo: Conf eitaria Vienense. Ah, q ue lugar, quando me lembro, nesse momen-

to em que escrevo, me a rrepio e ouço o som do piano a nos receber. E m roupa impecável, pianista , garçom e todos que lá trabalhavam t ambém nos recebiam muito bem, não sei se a inda existe a Vienens e , era simplesmente m agnífico , como nos f ilmes antigo. Um lugar sobre o qual ficaria anos narrando pra vocês cada detalhe de lá. 36

Desse recanto do tempo, eu e minha amada vó Lolita temos várias e stórias para contar, u ma delas não sei se me atrevo a contar agora: juro que ela se vira na tumba e vem puxar m eu pé, portanto melhor deixar pra lá. Amáv amos aquele lugar cheio de pessoas interessantes, inteligentes, b onitas e o piano nos f azia um bem incrível. Coisas de São Paulo... Já aqui em Santa Cat arina, também est eve várias vezes ao m eu lado, em festas d e Rodeio Criolo, fest as regionais e até na O ktoberfest, pasmem: minha avó, já beirando suas sete décadas me acompanhava na festa que tanto amo, apreciav a uma gelada assim como eu, só no social. S empre se encantando e encantando meus amigos! E m todos esses mom entos, ao meu lado, p resente em minha vida! Final de ano, enq uanto a família toda e stava no papo bom na sala ou em volta da


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c asa, Vó Lolita comig o ficava na cozinha, Agepê na vitrola e nós d uas se esbaldando, s ambando e fazendo r etrospectivas vividas p or nós duas, quando n ossas risadas tomavam conta do espaço do nosso lar e a família ia chegando de mansin ho para participar da alegria! Vó Lolita se "amarrava" quando eu chegava em s ua casa com minhas n ovidades, papos sérios ou as minhas “abobrinhas, prestava muita atenção no que eu contava. Adorava minha int erpretação enquanto contava o ocorrido, era divertido, sempre foi div ertido e, como diria m eu amigo Leonardo M oliterno, fizemos est órias e deixamos est órias para os outros contarem! D eus a chamou na hora em que Ele acreditou que era a hora e nós sentimos a sua falt a, pessoa tão importante em nossas vidas q ue ninguém sofreu mais ou menos, nós tod as eu, minha mãe e

m inha irmã sentimos na mesma intensidade essa dor. E o que nos aliviou foi ter a certeza d e que curtimos cada s egundo de sua existência aqui na terra e, apesar de tantos anos q ue se passaram de sua morte, minha quer ia vó Lolita continua presente em nossas vidas ,todos os dias! O ntem seria um dia que eu estaria chegand o em sua casa com

M amãe e vó Lolita, num momento muito especial .

um presente e um abraç o de aniversário! Era a ssim, todos os anos, d esde que se mudou p ara a mesma cidade o nde moramos desde a morte de papai. Quero fazer uma homenagem para minha avó, dizer a vocês que não percam tempo, aproveitem quem está ao lado de vocês, que faz par37

te do sangue que corre em suas veias, não só os parentes, mas os a migos também, que são de alguma maneira alguém que tem ligação c onosco, não necess ariamente sanguínea, m as quase isso, que ainda não sabemos explicar: curtam mesmo! A vida é uma caixinha de surpresas e não sab emos até onde vam os, exemplo disso é a dama da TV brasileira Hebe Camargo: ela, c omo minha avó, foi para o céu com a certeza de ter aproveitado t udo com dignidade e de ter deixado um belo exemplo de como ser f orte, como ser boa, c omo ser alguém especial sem fazer mal a q uem quer que seja e c omo elas duas puderam ajudar tantas pessoas, fizeram diferença na vida de tanta gente! Q uero ouvir Agepê, e o ferecer minhas lembranças para minha vó Lolita, pedir uma cervejinha, sorrir, levantar um brinde e agradecer por tanto amor ter me dado! Tim tim, vó Lolita!


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ESPERANÇA QUE SE FOI

A BOA NOVA

Selma Franzoi Ayala – Jaraguá do Sul, SC

Júlio de Queiroz

Hoje revi teus olhos sonhei acordada encantada pelo brilho dos olhos teus... Hoje, sorri com teu sorriso senti uma esperança antigamente tão perdida em minha vida sofrida feita apenas de esperar...

E, muitas vezes, naqueles tempos, passaram por vossos avós homens enganados, que vos falaram de amor, de confiança uns nos outros e de certezas no futuro. Nós, porém, vos ensinamos: o outro é o caminho, passai por cima dele; o outro é impedimento, massacrai seus planos; o outro é apenas um meio, usai dele sempre mais. E, assim, compartilhareis, de visão clara, das etiquetas de moda, dos carros possantes e do desvelo calculado da medicina perfeita. Para vós – só para vós – hoje, tudo. Hoje, apenas hoje. O amanhã nunca é vosso.

Hoje ouvi novamente tua voz senti um frio percorrer meu corpo inteiro estremecer meu rosto febril e minha alma a queimar... Hoje te senti tão próximo a mim e a chuva a cair traz um novo amanhecer. Para mim, a chuva a cair é uma outra noite que inicia para não findar mais...

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ADEUS À MOCINHA

Edltraud Zimmermann Fonseca - INDAIAL, SC

I ndaial, 12 de julho de 1999. Hoje é um dia muito triste para todos nós. Não porq ue está chovendo e o frio está cortant e, m a s p o r q u e a n ossa querida “Moc inha” amanheceu morta. H á dias venho notando que a velhice c hegou de maneir a galopante para a nossa cadelin ha. Hilton deu-lhe u m banho c heiro s o com sabonetes e xampus perfumados e eu a coloquei

d entro da sala para que ficasse ao noss o lad o até o fim c hegar. Assim ela s aberia do nosso a mor e da gratidão q ue todos nós sentimos por ela. J á não era a mesm a, contudo. À n oitinha, com a c hegada de um a migo, ainda cons eguiu erguer a cabeça e, num esforço e norme, latiu como s empre fez para n os alertar da presença de alguém. M ocinha foi, durant e dezessete anos, n ossa fiel guardiã. N inguém ousava s e encostar sequer n o muro ou no port ão de nossa casa. A va n ç ava p ra va ler pulando até dois m et r o s d e a l t ur a , r as gand o mangas

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d e c amis a e mui tos fundilhos de calç as. Por isso era o cão mais respeitado e temido do pedaç o. Nenhuma visita f icaria tranquila ou a ndaria pelo jardim s e não fizéssemos a devida apresent ação. O mesmo a contecia com anim ais estranhos. R espeito também r ecebia dos demais c ães (h ouve ép o c a que tivemos no q uintal, soltos, cinc o ou seis, filhos e n etos dela) que só c omiam depois que e la terminasse a s ua refeição; ficav am distantes esp erando a vez, isso q uando Mocinha liberasse o prato. Por ém toda violência d emonstrada para n o s d efe n d e r e a n ossa casa, transf ormava-se em tern ura e meiguice conosco. M ocinha sabia q uando eu estava t riste. Chegava-se d e mansinho, lambendo minhas lágri-


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m as para secá-las, p ermanecendo ao m eu lado aconcheg ando-se mais e m ais para aquecer- me. Só depois que e u saia da letargia e m que me encont rava , ela vo l t ava para a rua. M ãe amantíssima, (minha filha Tatiana d izia que se espel hava nas atitudes m aternas da Moc i n ha , na c r iaç ã o d os filhos Gustavo

e Rodolfo), sobrev iveu a todos os filhos e netos. N os últimos dias já n ã o a n d ava , p e rm aneceu imóvel na c ama fofinha, mas a companhava noss os movimentos c om o olhar embaçado. O ntem pela manhã, q uando Tamara foi vê-la, estava morta. S ua morte entristeceu toda a família. N o dia em que per-

c ebi que íamos p erdê-la, tomei-a n os braç os e diss e-lhe do nosso a m or, agrad e c en d o por todos esses a nos de fidelidade e companheirismo q ue nos havida dedicado. Hilton sepultou-a no n osso jardim e, sobre ela, plantei muitas flores e fecharei j anelas e trancarei p or t a s, ac en derei l uzes, porque ficam os órfãos de nossa segurança. M ocinha cuidou de m im e de minha fam í l i a d u r a n t e 17 anos! N ossa casa ficou m ais triste e silenciosa!

REVISÃO DE TEXTOS E EDIÇÃO DE LIVROS Da revisão até a entrega dos arquivos prontos para imprimir. Contato: revisaolca@gmail.com

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CONTEMPLAÇÃO (II)

Maura Soares – Florianópolis, SC

Ali ele estava pernas esticadas sobre a espreguiçadeira olhos fechados braços caídos ao longo da poltrona. Dormia o sono dos justos naquela hora da tarde em que o sol se põe Contemplo-o enternecida Observo a montanha ao longe que emoldura o vasto campo atrás da pequena propriedade Quedo-me feliz a observar cada um dos seus traços Sua boca chama-me a atenção Boca que a poucos momentos me cobrira de beijos quando de sua chegada após a lida diária Assim repousando meu guerreiro mais tarde estará pronto para mais uma noite de amor. Aguardo antevendo a noite. (6.11.2011 In: Maura Soares - Um tempo para depois, Clube de Autores, 2021, pág.85)

O despertar de Adonis. John William Waterhouse

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LINGUAGEM NEUTRA Eduardo Afonso

A tentativa de imp lantar uma ling uagem neutra, o brigando 213 mil hões de brasileiros a incorporar novos s ubstantivos (amig ue, alune, patroe, e mpregade), pode a té não ser uma i deia ruim de todo. S e essa turma volt ar ao poder (e ela e s t á à f rente na s p esquisas de intenç ão de voto), teremos a chance única d e pegar carona no f im do machismo t óx i c o d o i d i o m a , a proveitar o inevit ável processo de realfabetização e liq u i d a r vá r i o s o u t ros problemas da língua. Com os novos adjet ivos (progressiste, gorde, fasciste, golpiste), podíamos dar um jeito nos verbos i rregulares. Não h á criança que não d iga “eu fazi” antes d e ser repreendida e adestrada a dizer

“ eu fiz” — que não f az nenhum sentido e vem sem qualq u e r ex- p l i c a ç ã o. “ Fazi” é, intuitivam ente, o certo — e o cérebro (principalm ente o infantil) é i nteli gente o bas t ante para entender c onceitos, generaliz á-los e colocá-los e m p r át i c a . Ca d a v erbo irregular é obstáculo ao aprend izado, uma freada b rusca nas sinap s es, um “volte duas c asas” na comp reensão de como f unciona essa abst ração maravilhosa q ue é a linguagem. Se a criança diz “eu

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c omi, eu li, eu corr i ”, por que have r ia de estar errada a o dizer “eu que r i, eu sabi, eu trazi ou eu cabi”? Acabemos com o falocentrismo do masculino g enérico e com as i rregularidades verb ais, de uma tacada só. Como vamos ter novos pronomes inclus ivos (elu, minhe, n enhume, outre, c uje), que tal elimin ar os p r i v il é gi os o r t o g r á f i c o s? Po d eríamos começar p e l a p a l av r a “ exc eção”, que costum a ser escrita das m ais variadas for-


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mas — excepcionalmente, até da forma correta. P ronomes neutros e tratamento igualitário à grafia —isso, s im, é uma paut a democrática. Se o som é de S, só o S deve ter lugar de f ala (ops, de escrit a). Não à apropriaç ão fonéti c a feit a por Ç, SS, SC ou X. E xceção vira “eses ã o” — e, a s s i m, a té ministros do atual governo serão c apazes de escrev e r p a l av r a s d i f í c eis como “acesso” e “impressionant e” (doravante, tudo c om S). O m es m o va l e r á p a r a o q ue soe como Z ou

c omo J. Quem corr ige prova do Enem poderá se ater apen a s a o c o nteú d o, s em uma síncope a c ada batatada ortográfica. C om particípios t ambém passados a limpo (eleite, derr o t a d e, a u d i t a d e, r e s s e n t i d e), s e r á h ora de abolir o híf en. Por que guard a-chuva tem hífen e mandachuva não t em? Por que não t em hífen em camis a de força e tem e m água- de - c olô n ia? “Fora, hífen!” viria se juntar às faixas de “Fora FHC!”, “ F o r a Te m e r ! ”, “ Fora Bolsonaro!” e “Fora____!” (preen43

cher com o nome do p róximo presidente q ue não for de esquerda). Vírgula sep arando o vocativo, por favor. M as pode-se tamb ém par tir para a t erceira via, que é ensinar a língua c omo se deve, ent endendo que mud anças ocorrem n aturalmente e que a s supostas imperf eições têm uma história e só tornam o idioma mais belo, m ais humano. Que n ão se obriga ning uém a nada, seja n a linguagem, seja n a política: conversa-se, articula-se, d ialoga-se, trocand o o “vencer” pelo “ convencer” (etimol ogicamente, “vencer junto”). E mília, a bonec a de pano que res olveu reformar a n atureza, c oloc ou a bóboras em árvor es e ja b ut i c a ba s e m plantas rasteiras. Quem leu Mont eiro Lobato sabe no que deu.


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SAUDADES

Célia Biscaia Veiga - Joinville, SC

Às vezes fico lembrando De pessoas que passaram Pela minha vida, Algumas em traços fortes Outras só em rápidas pinceladas. Amigos de infância, vizinhos, Professores e coleguinhas de escola, Primeiros colegas de trabalho, Companheiros de espera Na fila no ponto do ônibus, E assim por diante... E sinto saudade dos bons momentos Passados ao lado dessas pessoas, Mas me fica uma dúvida: Será que em algum lugar Alguma dessas pessoas Também lembra de mim E sente saudades, como eu?

MINHA SEDE

Teresinka Pereira - Estados Unidos

Há pedaços de sonhos neste ramo florido e há mãos invisíveis atrás do silêncio. Há um tempo ferido separado da paisagem. Pelo momento ninguém se move. Só um pouco de vento malicioso e árido. Entretanto, a morte se esconde entre as margens. Minha sede não se acalma Um latido longínquo Inquietando e não cessa. Ai! Não cessa... nem pode cessar. 44


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DIÁRIO DA PANDEMIA – 22 E 23 E 24.12.21 – O QUE ACONTECEU NO PRIMEIRO NATAL DA PANDEMIA por Urda Alice Klueger – Palhoça, SC

Dia perfeito. Ao long o da vida sempre s onhei com um Natal como está sendo este dia, mas nunca f oi tão bom. Parec e estranho afirmar i sto em plena pand emia, mas tudo está tão mágico que v ou evitar de estrag a r a l g um a c o i s a entrando em muitos d et a l h es. Sem p re q uis que fosse ass im, desde criança, m as sempre houve a lgum tipo de tens ão que não permit ia esta perfeição. S into falta de Atahu alpa, sim, muita –

q uando almocei, vi q ue e s t ava us a n d o uma colher com o cabo marcado de d entinhos – é uma c olher cujo cabo Atahualpa “mascou” n aquela fase em que os cachorrinhos r oem sapatos. Eu a g uardo com grande c arinho – vou guard á-la enquanto for p ossível, pois agor a a maior parte da vida já passou e um dia já não terei uma c asa e um dia já n ão terei esta vida. J á chorei um bocad o, desde manhã, m as de ternura, de s audade, coisas n ão tensas, choro q ue alivia e conforta. É bom ter esta lib erdade de chorar sem ter que prestar c ontas. Em algum m omento em que p assei a ouvir um programa sobre pol ítica internacional, e squeci de chorar. A política internac ional é cheia de t ensões. Acho que h á quem não comp reenda que as lá45

g rimas podem ser pura doçura. Está tudo adiantado para a festa da noite. Fiz tudo ouvindo a harpa paraguaia de Luiz Bordón. Maria Antônia virá com L ucas, e passar emos a noite nós d uas mais nossos b i c hinhos. Tereza g anhará uma coleira cor-de-rosa, para f icar muito bonita. S empre que andam os de carro Tereza é amarrada, para evitar algum acident e, e então precisa d e uma coleira. Foi uma sorte ter achad o aquela c ol eira c or de rosa, meses atrás, quando ainda c irculava um pouco


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por aí. Hoje a gente j á não circula mais. A cho bom deixar a qui anotado, para q ue um dia, no fut uro, se saiba que a gora é o tempo e m que se compra q uase tudo via int ernet e não se fazem visitas. Antônia e stá, como eu, evit ando todos os risc os, que não s ão p ouc os. O estado d e Santa Catarina e stá totalmente col orido de vermelho, o que significa que em todos os lugares se está em área per igosíssima – abenç oada esta minha c asinha cercada de t anto espaço e tant as plantas, afastada da rua! V a m o s fa zer uma l ive de Natal, aqui n a minha varanda, m ais tarde (p elas 7 ou 7 e meia), via f acebook, para ter c o nt ato c o m a m i gos e parentes. É o novo jeito de viver. DIAS 25 E 26.12.2020

V ou voltar até dia 2 4. Noite de Natal. Antônia e Lucas v ieram – chovia, e s t ava f r e s c o, a s c i g a r r a s e s t ava m q uietas e tínhamos a live programad a p a r a a va r a n da. Então comemos n a sala de visitas, n a antiga mesa de m ogno que fora a m esa onde meu a vô Oskar Klueg er escrevia cartas e em c uja gaveti n ha ele guardava o f umo. Pensei bastante nele – eu tinha

Tereza e Antonia

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4 anos quando ele s e foi, um homem a lto e simpático, do q ual tenho diversas f otografias e umas p oucas lembranças – s e t i ves s e v i v i d o mais, provavelmente teríamos sido a migos. Registro aqui que ele morreu d e hidropisia, para o caso de algum descendente um dia h erdar esse detal he geneticamente. Ele não tinha 60 anos, quando se foi. N unca mais soube d e alguém na famí-


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l ia com hidropisia (a dele foi água em t orno do coração – não sei se há outros t ipos de hidropisia. D eitou-se um pouq ui n h o d e p o i s d o F r ü s t u e c k e m o rr eu silenciosament e. Espero que não tenha sofrido.) M arcáramos a live para as sete, sete e meia. Às oito e meia a inda comíamos. Q uan d o entram os n a internet, muita gente já tinha desist ido de nós e apan hamos um bocado

até colocar a live no a r. Acabou dando c er to, mas perdemos a conexão com muita gente. Outras p essoas vieram, c omo a Andréa e o C ristiano, a Terê, a Valéria, aquela amig a de Campos Novos que tem o nome bem difícil, e que eu n unca sabia se era m oça ou moço. Era moça – foi muito legal falar com ela. É a Siloé Souza, e eu d iria que ela sabe t udo a meu respeit o, pois me leu um 47

bocado! Coisas surp reendentes que a I nternet nos traz. O l ongo papo rendeu a té depois da meia n oite. (Claro que o e ncontro com tant a gente foi virtual.) S em dúvida, foi um Feliz Natal. O nte m, d ia l e nto. Começaram a amad urecer os araçás e as uvas. Já tem a raçás bem bons, e nesta manhã já c o m i a l g un s . Sã o os ciclos da vida se f echando, avisan d o que é mais um a no que passa. E g anhei de present e, n e s t a m a n h ã , u ma crônica de um g rande intelectual de quem gosto muit o, h i s to r i a d o r d e M anaus que é prof essor no Rio De J a n e i r o, D r. J o s é R ibamar Bessa Freire. Segue o link. F iquei muito emocionada. E na Argentina a v acina Sputnik V já c hegou e o povo já e stá sendo vacinado. Viva a vida!!!


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SEI

Eloah Westphalen Naschenweng – Florianópolis, SC

Sei de um poema guardado feito tesouro à espera; Sei do prazer de vagar abrindo espaço na vida, imprevisível, sem rumo; Sei da canção, da dança e da vida suaves a caminhar; Sei do ter tudo e do não ter nada só a alma cansada; Sei do amor entre o preâmbulo e o epílogo e o tempo esvaído; Sei da emoção do momento

e da plena felicidade; Sei da esperança sentida na força e na fé perdida; Sei dos novos voos da alma liberta no silêncio sem ruído; Sei de nós a sós em passos lentos empurrando o tempo sempre em frente; Sei ganhar, mas aprendi a perder. Na dureza e na alegria da vida aprendi a viver…

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ENTREVISTANDO A ESCRITORA RITA QUEIROZ

N atural de Salvad or-BA, Doutora em F ilologia e Língua P ortuguesa, Professora universitária, Escritora, Rita Queiroz é a nossa entrevistada n esta edição. Autora de 7 livros de poemas, 1 de contos e 7 l ivros infantojuvenis. O rganizadora de 12 coletâneas. Coautora em mais de 150 colet âneas. Publicações e m diversas revist as literárias nacionais e internacionais. I ntegra os coletivos: Confraria Poética Fem inina, Mulherio das L etras, Confraria Cir anda Poetrix, Mul heres Maravilhosas, E nluaradas e Colet ivo de autoras de

l iteratura infantojuven il da Bahia. Memb ro das academias: A VAL, AILB, AIML, A ILAP, NAISLA, AAL IBB, AIL, AISLA e A CI LB R AS. M e m b ro do Institut Cult ive Suis se Brésil ( Delegué do Núcleo R ecôncavo baiano). M embro da Casa do P oeta de Alagoinhas ( CASPAL). Destaque L iterário na Categoria Poesia pela Focus Brasil New York/AILB (2021). I LHA - Você é uma e scritora conhecid a e respeitada. A que atribui o seu sucesso? R ita - Quero em primeiro lugar agradecer por você me reconhe49

cer assim, como uma e scritora de sucess o. Creio que para s ermos respeitados e conhecidos, temos d e respeitar nossos pares. Chegar ao suc esso significa que t rabalhamos para i sso. Então acredito que deva meu sucess o ao trabalho, pois m e esforço muito e m e jogo com amor e carinho em tudo o que faço. ILHA - Quais os gên eros que pratica e qual o que prefere? O Suplemento Liter ário A ILHA já publicou poemas seus e a sua poesia rev ela muito talento. E screve poesia há muito tempo? R ita - Pratico poesia


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e prosa, mas a poes ia me envolve e me f az uma pessoa mel hor. Na adolescênc ia rabisquei alguns versos, mas por cont a de comentários nada elogiosos, fiquei b loqueada. Assim, p assei boa parte da m inha vida dedicada à escrita acadêmica, p roduzindo artigos e c apítulos de livros a p artir das pesquisas q ue desenvolvo na universidade. Há seis a nos que venho publicando meus textos l iterários, sem medo d e julgamentos. A maturidade nos deixa mais livres e com isso n os expomos sem vergonha. ILHA - O que a motiva mais a continuar

e screvendo: a opinião do leitor – que a tualmente chega m uito mais fácil e r apidamente ao aut or, face à tecnologia da comunicação c ada vez mais efic iente – ou a aprec iação do crítico? O u os prêmios recebidos dizem mais s obre estar no caminho certo? R ita - Minha motiv ação não parte do e xterior e sim do int erior. Quando esc revo não penso se v ou agradar ao leitor ou ao crítico, simplesmente escrevo. O q ue vem depois fortalece a minha escrit a, seja uma crítica o u um elogio do leitor comum ou do lei50

t or especializado. O reconhecimento atrav és de um prêmio é e ncorajador. Mas o que me deixa mais feliz e ciente de que estou no caminho certo é poder tocar na ess ência das pessoas. É ouvir que aquilo que escrevi diz muito sobre elas. I LH A - E s c r eve r, p ara você, é insp iração, hábito ou n ecessidade? Ou todas as opções? R ita - Escrever para mim combina as três o pções. Ter um ins ight (que para muitos pode ser a famosa inspiração) nos leva a c riar com mais facil idade. No entanto, o exercício da escri-


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t a é muito important e, mesmo que não haja o insight. É preciso criar o hábito da e scrita. Escrevo prat icamente todos os dias, mesmo que sejam textos minimalist as (os quais devem ter uma carga semântica forte a fim de surp reender a quem lê). Q uando passo um p eríodo longo sem e screver (isso acont ece por diversos fat ores), sinto que a e scrita me faz falta, sendo assim uma necessidade. I LHA - Sempre disse a meus alunos e a os meus escritores que um escritor p recisa ter à mão, s empre, um dicion ário e uma gra m ática. O que você acha disso?

Rita - Como sou prof essora, também s empre disse isso a meus alunos. Ter um dicionário e uma gram ática é fundament al para o exercício d a escrita, seja esta a cadêmica ou literár ia. Não somos máq uinas para termos tudo no nosso HD interno (rsrsrs), por isso devemos recorrer aos d icionários e às gram áticas a fim de dir imirmos quaisquer dúvidas. E não devemos ter vergonha diss o. Sempre recorro a os dicionários, por e xemplo, buscando p alavras sinônimas, a fim de não repetir aquelas que já escrevi, bem como às gramáticas, verificando a r egência de um verbo, por exemplo. Isso não nos diminui, pelo contrário. I LHA - Muito já se d isse sobre a função social da literatura. O que você diz a respeito? R ita - A literatura e o utras artes são ess enciais para a hu51

m a n i d a d e. S e n d o assim, sua função social já se faz presente. De que forma essa f unção se mostra? A través das denúncias feitas, do modus v ivendi de um grupo s ócio-histórico-cultural retratado na obra, o tempo cronológico, etc. Pelas entrelinhas d e uma obra literária v iajamos no tempo e no espaço, identificamos traços biográf icos, saboreamos a c ulinária, vivenciam os histórias. Isso t udo é função social da literatura. I LHA - O que gosta d e ler, quais gêneros que prefere? Lê m uitos autores nacionais? Como vê a l iteratura brasileira atual? Vejo a literatura brasileira com bons olhos. H á bons autores e


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b oas autoras fazend o sucesso no Brasil e no exterior e isso é muito bom. Ultim amente tenho lido s omente autoras nac ionais, como Conc eição Evaristo, Cida P edrosa, Luiza Cant anhêde, Érica Azev edo, Elisa Lucinda, Marta Cortezão e outras autoras e autores q ue integram coletâneas nas quais partic ipo, bem como nos g rupos do facebook. S emanalmente, no i nstagram MulherArt eInfinita, dou dicas de leituras através de v ídeos em que leio t rechos de algumas obras coletivas ou ind ividuais. Gosto de l er poesia e romances históricos. I LHA - O que diria q ue é preciso para se escrever bem? Rita - Antes de tudo, e screver, é o primeiro passo. A escrita é u m exercício e para q ue se escreva cada v ez melhor, faz-se n ecessário exercitar. Não teria uma receita p ara o que seria es-

crever bem. ILHA - Como é o seu p rocesso de criaç ão? Existe algum m é to d o p a r a e s crever ou quando a ideia vem é hora de trabalhar? R ita - Não tenho um m étodo específico para escrever. Geralm ente quando tenho um insight, corro para e screver, para não q ue isso não se perc a na memória. Mas t ambém faço da esc rita exercício, busc ando a lapidação d os tex tos. Quand o estou em contat o com a natureza, principalmente com o mar, a escrita flui me-

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lhor, mas isso não me limita. I LHA - Tem algum tema preferido para e screver, ou o que s ente e vê, a vida acontecendo ao seu r edor é a sua fonte de inspiração? R ita - Gosto de esc rever sobre o que s into e vejo ao meu r edor. Mas também f alo muito sobre o t empo e seu caráter efêmero, sobre a brevidade da vida, sobre as marcas que vamos acumulando ao longo da jornada. I LHA - Fale sobre a s ua obra de maior sucesso. Ou obras. R ita - Não sei qual


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seria a minha obra de m aior sucesso. Talv ez seja a que mais v endi, como Ciranda, cirandinha: vamos b rincar com poesia?, que é um livro de poemas para o público infantojuenil. Ou as que t iveram críticas fav oráveis, como Conf issões de Afrodite (poemas eróticos) ou Velas ao vento (livro d e poemas dedicado às águas). Todas elas a inda estão na primeira edição. I LHA - O que re p resenta LER, para v o c ê? L ê muito? I sso faz diferença n a sua produção literária? R ita - A leitura está a trelada com a es-

c rita. Ler e escrever a ndam de mãos dad as. Leio diariament e poesia, por conta dos grupos nos quais p articipo. Ler é fund amental e faz toda a diferença na minha produção literária. ILHA - O que a define como escritora? R ita - Ser escritora é se dedicar à escrit a. Creio que tenho feito isso nos últimos a nos, seja à escrita acadêmica, seja à escrita literária. I LHA - No que diz r espeito ao retorno financeiro da ativ idade literária, é possível viver de literatura? Rita - Não vivo da lit eratura. Na histór ia literária brasileira, p oucos vivem ou viv eram da literatura, c omo Jorge Amado e Paulo Coelho, por e xemplo, mas isso depois de muita luta. Outros grandes autores tinham empregos f ixos, como Carlos D rummond de And rade, Guimarães R osa, João Cabral 53

d e Melo Neto, Cecíl ia Meireles, dentre o utros. Sou profess ora universitária e d isso que tiro o meu sustento. Para se ganhar dinheiro é precis o ter um best seller e como tenho public ado livros de poem as, precisaria que u m deles caísse no g osto popular para v ender milhares de exemplares. I LHA - Para terminar: nós, escritores, entendemos a alma h umana? Ou apen as pensamos que entendemos? R ita - Na verdade, n ós escritores, som os tão complexos e simples ao mesmo, que a nossa alma se i rmana com a alma d o outro. Sendo ass im, entendemos e n ão entendemos ao mesmo tempo. Meus endereços: Facebook: Rita Queir oz - ht tps:// w w w. f acebook.com/rita. queiroz.334 Instagram: @ritaqueir ozpoesiando e @ bordado_de_sonhos


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SONHAR É PRECISO Selma Reis – São Gonçalo, RJ

mister se faz sonhar. Povo meu, viajores da terra, do ar, do mar, deixem-me sonhar. Sou fruto de um sonho. Quem me sonhou a Sua imagem e semelhança, soprou em meus ouvidos: “Sonhe alto”. Não me contento com o ovo de uma galinha caipira, quero o ovo da galinha dos ovos de ouro. Não me permito sonhar com o esturjão; quero o caviar.

Navegar é preciso, já profetizavam antigos navegadores. Para tanto, no entanto, foi preciso sonhar o barco e o remo… Foi preciso sonhar o mar. E quem sonhou o mar, sonhou viajores com suas idas e vindas. Sonhou e fez dias para o trabalho e noites para descanso de seus corpos. Sonhou e fez o céu e tudo que nele cabe: as estrelas para os guiar… a lua para banhar de prata suas faces… a chuva para lavar suas almas... o sol para secar suas lágrimas... o arco-íris… Ah, o mágico arco-íris!… Caminho de luz para encurtar a distância entre eles.

Ah, deixem-me sonhar! Estou plena de sonhos. Feito nuvem solitária, sigo mar adentro, Remando… Cantando… Sonhando! Evocando Fernando Pessoa: há de valer a pena, se não tenho a alma pequena.

Se navegar é preciso,

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AGUALUSA LANÇA NOVO LIVRO EM LISBOA

O escritor angolano f ez o lançamento, em Lisboa, na primeira sem ana de novembro, d o livro «O Mais Belo F im do Mundo», uma c oletânea de crônicas e contos sobre “est es estranhos tempos q ue estamos a atrav essar”. Entretanto, a 25 de outubro, marcou p resença na Fundaç ão Calouste Gulbenk ian para receber o p rémio P.E.N. Clube Português para a categoria de narrativa, pelo r omance «Os Vivos e os Outros» (2020). O que liga estas duas obras? A ideia de que a humanidade precisa de se “reinventar” para s olucionar os problemas que a encostaram à parede. Mas, para

isso, não podemos sucumbir ao pessimismo, algo que os portugues es fazem “insistentem ente, muitas vezes s em razão”, frisa. “É i mportante a utopia, u m pensamento mais radical”, vaticina. A pesar das tragédias, o mundo não termin a. Caminhando entre a ficção e o ensaio, “ O Mais Belo Fim do M undo”, de Agualusa, d ivide-se entre crônicas, contos, notas diar ísticas e divagações, e scritos entre 2018 e 2 021. Nestes anos, o q ue mudou no noss o mundo? Este livro é uma visita – em ficção e não ficção – aos ú ltimos anos da nossa vida. O livro já está nas livra55

rias aqui em Portugal e já estou lendo. A sessão de autógrafos, em 6 de novembro, na Livraria da Travessa, no P ríncipe Real em Lisboa, contou com a pres ença de Mia Couto, q ue fez a apresentaç ão da obra ao públic o presente e foi um s ucesso. Tinha tanta g ente que muitos não conseguiram entrar. P ergunta – Em Os V ivos e os Outros, o seu livro ante r ior, tentar mostrar c omo as pessoas s e podem reinvent ar depois de pens arem que o mundo acabou. Agualusa – A história é sobre um grupo de escritores que se reúne num festival literário n a Ilha de Moçambiq ue e que devido a u ma tempestade que assola o continente fic am completamente i solados naquele espaço. O livro é sobre o poder da palavra, da literatura e da narrativa, s obre o poder da palavra para reinventar o


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mundo. É um livro sob re utopias, sobre a n ecessidade de criar novas utopias para pod ermos sobreviver às situações que hoje enfrentamos. Pergunta – O mundo está assim tão carente de utopias? Agualusa – Sim, está. A queda do Muro de B erlim [em 1989] e o c onjunto de eventos q ue depois se seguiu p arece que desaut orizaram o sonho, a utopia. Pergunta – Muitos int electuais apontam esse período como o momento em que as “grandes narrativas” q ue tentavam explicar o mundo tiveram o seu fim. Concorda? A gualusa – Concordo. O problema é que, e mais do que nunc a, precisamos voltar a sonhar, precisamos criar utopias ajustadas a este tempo novo. P ergunta – “O Mais Belo Fim do Mundo”, que está agora publicando, inclui 400 pág inas de crônicas e textos de ficção que

e screveu nos últimos três anos. O que v amos encontrar ao longo dessas linhas? A gualusa – A maior p arte das crónicas e d os contos que lá est ão são sobre estes estranhos tempos que e stamos a atravess ar, com a angústia q ue estamos a viver, d a pandemia à situação política. Por exemp lo, alguns dos textos f oram publicados no Brasil, dai que fale da t ragédia que se abateu sobre o país com a e leição de Jair Bolson aro como presidente. Este livro acaba por ter uma estranha relação com o anterior romance, com ambos a falar sobre o isolamento e a necessidade de

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utopias. Ele parece um e co de Os Vivo e os Outros. P ergunta – Se o folhearmos vamos enc ontrar otimismo ou pessimismo? Agualusa – Eu gosto d e relembrar que sou a ngolano, e os angolanos, regra geral, são o timistas, porque os p essimistas já se suic idaram todos. Num país como Angola não h á espaço para pess imistas. Tal como eu escrevi num dos meus livros, o pessimismo é um luxo dos povos fel izes: nós, angolanos, não nos podemos dar a esse luxo. Os port ugueses podem… e são insistentemente pessimistas, muitas vezes sem razão para


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i sso. Ainda há pouco t empo estava a falar com uma amiga brasil eira e ela perguntava como é que num país c om tanto sol e tanta luz as pessoas são tão pessimistas. Pergunta – Esse sent imento transparece muito na literatura portuguesa? A gualusa – Transpar ece, completamente. Na literatura e na mús ica. Atenção que eu tenho horror a isto de d efinir os povos, pelo que estou a fazer uma generalização. Mas se h á algo que pode car acterizar o povo português é a melancolia, o exercício da melancolia, a sua exaltação. P ergunta – Parece-

- lhe um sentimento que chega a roçar o masoquismo, por vezes? A gualusa – Um pouco, e vou dar um exemp lo. Neste momento, P ortugal em termos d e combate à pandem ia é um dos países com mais sucesso no m undo. Mesmo assim, se ligarmos a televisão ou falarmos com as pessoas na rua só s e ouve pessimismo. A s pessoas, em Portugal, parece que pass am todo o tempo a c riticar. Recentemente li o livro Humanidad e - Uma História da E sperança, do [historiador neerlandês] Rutger Bregman. Ele faz uma leitura da história da humanidade de um p onto de vista otimist a, mas avisa que as más notícias são sempre notícia, mais vezes q ue as boas notícias, e que preferimos olhar p ara o mundo com uma visão pessimista. M as quando olhamos mais profundamente e a tentamente percebemos que as coisas não 57

são bem assim. Pergunta – Essa form a de olhar para a realidade, que está a descrever, acaba por c ondicionar a noss a capacidade de s onhar e de explor ar novas e diferent es alternativas para o futuro? Agualusa – Isso pode a contecer, sem dúvid a. Se o pessimismo f izer com que a pess oa mergulhe na melancolia e no fatalismo, e ntão ela acaba por p erder uma capacid ade transformadora. Esse é o problema do p essimismo absoluto, u m tipo de pessimism o que leva ao niilism o, à aceitação do d estino como se fos-


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se algo absolutamente inevitável e não contrar iável. Quando assim é , a pessoa não luta, desiste de lutar, e isso é mau. P e r g un t a – A p e s ar do seu otimism o, há fenómenos e acontecimentos q ue neste moment o estão a marcar o mundo e que o preocupam, tal como sug erem alguns dos t extos que tem esc rito para revistas e j ornais. Quais são o s problemas que m ais atenção deveriam merecer e para o quais tenta alertar? Agualusa – Devíamos d ar mais atenção à ideia de que é preciso acreditar nas pessoas. É preciso acreditar na h umanidade e na cap acidade transformadora das pessoas face a eventos trágicos. É p reciso acreditar que s omos capazes de n os adaptar, sobreviver e melhorar o nosso m undo. Ao contrário d a ideia que prevalece (e que é um grande e quívoco), as coisas

hoje não estão piores, e las estão melhores em relação ao passad o: à medida que rec uarmos no tempo p odemos ver que o nosso mundo era muit o pior. Já tivemos a escravatura como algo a ceitável e instituído em todo o mundo, houve uma altura em que as pessoas eram mort as em espetáculos, e m que eram acusadas de feitiçaria e queimadas vivas… Hoje em dia, felizment e, já estamos muit o longe disso, o que n ão significa que de v ez em quando não ocorram casos em que h á pessoas a comet er atrocidades. Ainda h á pouco li a história d e uma mulher, liga-

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da ao Estado Islâmico, que está a ser julgada n a Alemanha por escravatura e por ter deix ado morrer crianças que eram escravas. O Estado Islâmico, que é a franja das franjas do h orror absoluto, aind a é capaz de praticar este tipo de horror, mas ele já não é aceito pelo resto da humanidade. A mundo mudou m uito e mudou muito em relativamente pouco tempo: nós temos a capacidade de nos regenerarmos e de criar s ociedades mais hum anas. É importante realçar esta ideia. P ergunta – Acre d ita que as novas f orças políticas ligad as à extrema-direit a irão ganhar mais


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p oder nos próximos t empos e constituir u ma séria ameaça à d emocracia? O que s ucedeu nos EUA, quando Trump e muitos dos que votaram nele recusaram aceit ar o resultado das e leições, não deveria constituir um sério aviso? A gualusa – Em prim eiro lugar, há que d izer que tudo é pass ageiro. Eu acredito q ue estes moviment os de extrema-direita s erão mais passageiros do que o habitual. É verdade que a emerg ênc ia de Donal d Trump contribuiu muit o para o alastrar de c erto tipo de ideias, m as também é precis o referir que ele não f oi eleito pela maioria da população: só o foi devido ao sistema nort e-americano do col égio eleitoral, que é a lgo completamente arcaico. P ergunta – Mas o J air Bolsonaro, no B rasil, ganhou as e leições com o voto d a maioria, sem ne-

cessidade de um colégio eleitoral. A gualusa – Sim, ele foi eleito, mas não pela maioria da população, pois houve muitas abst enções [apesar de o v oto ser obrigatório]. Ele foi eleito devido ao apoio dos evangélicos, q ue apesar de repres entarem uma baixa percentagem da popul ação total são muito militantes. Pergunta – No Brasil o s grupos evangélicos têm uma grande c apacidade de mobilização e votam em massa num candidat o político que seja da sua predileção… Agualusa – É um grupo pequeno, mas teve i mportância na eleiç ão de Bolsonaro. O fenómeno dos grupos evangélicos é algo im-

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p ortante de estudar, p ois considero que se trata de algo muito p erigoso. Na Europa, d e uma forma geral, e les não conseguir am a mesma afirmaç ão e por uma razão muito simples: os país es europeus estão m ais bem organizados que o Brasil, além de que existe um bem- estar social que não tem comparação – os e stados, na Europa, a poiam a população de um modo que não acontece no Brasil ou em Angola. Em Angol a existe um combate d a parte do Governo a este tipo de entidades, o qual, para mim, t em a sua razão de ser, pois na sua maior p arte trata-se de puro c harlatanismo: estam os a falar de igrejas


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q ue prometem curar p essoas das doenças q ue sofrem. São criminosos que se organ izam para sugar as p opulações mais pob res e desfavorecidas, e no limite, como se vê no Brasil, podem ter muito poder político e conseguir controlar o aparelho de estado. Nos EUA este fenómeno também se verifica, m as o Brasil é o melhor exemplo e o que aí a conteceu é um alerta para este tipo de org anizações, as quais u sam a capa da religião para crescer e se afirmar. Pergunta – Como explica o ressurgiment o e crescimento da e xtrema-direita rac ista e xenófoba na E uropa e nos EUA? D urante décadas,

a pós a Segunda G uerra Mundial, estes grupos estiveram como que na penumb ra, mas, nos últim os anos, parecem t er perdido o pudor e entraram na arena política. A gualusa – A exp ressão certa é mesm o essa: perderam o pudor. Creio que a e mergência e afirmaç ão do Donald Trump a utorizou essas exp ressões [políticas]. S empre houve racismo e racistas, eles não d esaparecem de rep ente. O que aconteceu em muitos países f oi que de repente as p essoas se acharam a utorizadas a exprim ir as ideias racistas e xenófobas que já tin ham. Eu não acredit o que representem a 60

m aioria das pessoas. A maioria não pensa a ssim, trata-se de um g rupo minoritário muit o mobilizado que com eçou a exprimir-se. E m Portugal verifica- se o mesmo com o Chega. Esse partido é outra forma de charlat anismo. Quem se int eresse um pouco e s iga a carreira do líder do Chega, o André Ventura, percebe que ele não é alguém que acredita naquilo: é um c harlatão, é alguém que está a usar certas ideias para adquirir poder e dinheiro. Pergunta – O que se está a passar com a democracia para, de m omento, tanto se c riticar este sistema p olítico, um pouco por todo o mundo? Agualusa – As democ racias precisam de se reinventar. Como é que Donald Trump gan hou as eleições em 2 016? Ele ganhou-as porque todo o sistema americano é extremam ente arcaico, ele foi pensado para uma determinada época, pelo


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que não está adaptado para os tempos atuais. Como já referi, a maior ia dos norte-americ anos não votou nele q uando foi eleito pres idente. Já no Brasil, o nde existe uma mult iplicidade de partidos d emocráticos, predom ina um sistema de corrupção. P ergunta – Como é que um processo de reinvenção da d emocracia, capaz de a tornar num sist ema político ainda m elhor, pode ter iníc io? Que ingredientes são necessários? Agualusa – A primeira condição é que a pessoas dialoguem: é prec iso haver debate. E i sso já está a ser feit o. Mas neste debate é preciso que se au-

torize a utopia, que as pessoas pensem para a lém daquilo que são l ugares-comuns e se atrevam a pensar diferente e «saiam da caixa», como se costuma dizer. É importante dar autorização a um pensamento mais radical. P ergunta – Por norm a, o que é radic al não é mal visto? P artidos e comentad ores políticos, inc lusive intelectuais, p arecem transmitir uma mensagem que d á a entender que q ualquer forma de r adicalismo é mais p rejudicial do que b enéfica para a soc iedade, esgrimindo d iferentes argumentos em defesa dessa posição. A gualusa – Há 150 61

a nos defender um m undo sem escravat ura era uma posição q uase impensável. E se recuarmos dois mil a nos reparamos que n em os profetas mais r adicais, como Jesus C risto, foram capazes de imaginar esse mund o. A Bíblia não imagina nem defende um m undo sem escravos p orque isso parecia impossível. Se eu diss er que imagino um m undo sem exércitos, a maior parte das pessoas vão dizer que i sso não é possível. Todavia, já há países que não têm um exército. A Costa Rica, por exemplo, é um deles P ergunta - Qual o p apel que um escrit or, um intelectual, p ode ter para agitar águas paradas e trazer mais criatividade e arrojo ao pensamento político? A gualusa – Para um escritor é mais fácil def ender certas ideias, como o fim dos exércitos, mas para um político isso é mais difícil, p ois terá menos pos-


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s ibilidade de sucess o, de ganhar umas eleições. P ergunta – Se o A gualusa escrever u m livro onde cont a a história de um m undo muito diferente do atual, os leit ores podem adorar e comprar a obra, m as se ouvirem um p olítico prometer e xatamente o mesm o que descreve, e les poderão consid erar que a ideia é insensata ou impraticável. Como se explica esta dissonância? Agualusa – Mas é assim que uma utopia se i nstala. Uma utopia é c ontagiosa. Num prim eiro momento não a creditamos naquilo, mas se existirem duas p essoas que acreditem então passa a ser

m ais fácil, começa a h aver diálogo. A utop ias passam à prática dessa forma, pouco a pouco, por contam inação. Contudo, o mais importante é aut orizar a expressão d essas ideias e adm itir que precisamos de utopias. O sistema em que a maior parte d os países do mundo vive não está a conseguir resolver os nossos problemas. P ergunta – Quand o escolhe o títul o O Mais Belo Fim d o Mundo para o livro não se está a referir a uma qualquer espécie de apocalipse que trará o fim de t udo. É a sua forma de dizer que estamos n o fim de ciclo de uma forma de estar e agir sobre o mundo,

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que é mesmo possív el mudarmos e fazer diferente? A gualusa – A civiliz ação humana está e ncostada à parede. Estamos a sofrer com o aquecimento global, c om tragédias como ciclones e secas, e se s eguirmos o atual cam inho não conseguim os resolver nada. Todos nós já percebem os isso. Neste momento o sul de Angola está a sofrer uma seca t errível, e todos os a nos Moçambique é afetada por ciclones – sendo que a subida do n ível do mar vai causar ainda maiores problemas –, isto só para dar dois exemplos. Eu sobrevoei a cidade da Beira quando o ciclone Idai [em 2019] a atingiu e parecia que tudo tin ha sido tomado pela á gua Já chegámos a u m ponto de não retorno [no que se refere à s alterações climátic as]. Já chegámos… Isso ninguém pode ter d úvidas. Mesmo pess oas como o Trump, q ue tentam negar o


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a quecimento global, n o íntimo sabem que a quilo que dizem não é verdade. Este tipo de n egacionismo serve apenas para manter o apetite pelo lucro imed iato, para que nada mude. P ergunta – O período de pandemia que o mundo ainda atrav essa é o momento ideal para refletir sobre o que afinal queremos para o futuro? Agualusa – Sem dúvida. Eu, como escritor, nunca me teria atrevido a imaginar um mund o no qual os aviões n ão circulariam. Ang ola fechou todos os seus aeroportos. A cidade de Luanda este-

ve isolada do resto do p aís. Isto era inimaginável, mas aconteceu. O que nós percebemos com isto é que um vírus pode trazer custos económicos absurd os e elevadíssimos para todo o mundo. É p or isso que eu acho que os países, os gov ernos e as empresas terão de assimilar e sta lição. Nós sabemos que se não fizerm os nada outro vírus a cabará por vir, prov avelmente pior do que este. As nações e a s instituições têm de a prender a atuar junt as, temos mesmo de conseguir mudanças. A pandemia, o surgim ento do coronavírus p arece estar relacionado com a deflorestação, com a destruição

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d e ecossistemas. Se a ssim é, então fica mais barato comer men os carne, por exemp lo. Acredito que a m aioria das pessoas a cabará por aceitar este tipo de coisas. P ergunta – Os assuntos que até agora a bordamos surgem n o livro que está s endo lançado. Que tipo de ideias e emoções espera suscitar com ele junto dos leitores? A gualusa – Os bons livros suscitam inquiet ações. Eu quero que e ste livro crie inquiet ações sobre estes temas, sobre a necess idade de criar novas u topias, as deficiênc ias das democracias e a necessidade de as reinventar.


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LEMBRANÇAS DE NATAL

Lorena Zago – Presidente Getúlio – SC

De paz a comemorar. Recordações que outrora Brincavam soltas ao luar.

Sentada sobre a relva umedecida pelo orvalho, Ouço o crepitar de passos Sobre as folhas secas, pelo chão.

Saudades emergiam, Dúvidas instauravam-se, Contracenando com momentos De tempos áureos a rememorar.

Calma e lentamente Unem-se os pares em meditação. Absorta em meu pensamento, acaricio as flores Que decoram os canteiros, e o olhar Partilho com as estrelas e o luar Um singelo cenário que manifesta emoções e nos faz sonhar...

Mas, a vida bem ensina: Viva o hoje com todo seu fervor! Espalhe luz, Semeie amor, Compreenda a dor, Perdoe o seu irmão, Dê paz ao seu coração. Conduza, em suas reflexões, O encanto do viver. Traduza, em seu olhar A gratidão, e estenda a mão... Viva o seu Natal Em comunhão divinal. Um abraço e sua mensagem Aquecerão os corações, A paz abrirá as portas À serenidade e ao amor! Feliz Natal entre nós, Seja constante. Em alegrias e louvor!

Sentimentos envolvem-se graciosamente, Captam o aroma da natureza, E a harmonia da noite eleva os nossos pensamentos. Lembranças estendem-se pelos ares, Notas de nostalgia teimam em ficar... Quisera fosse um sonho Que nos fizesse acordar. Ansiava por momentos

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ENXERGAR

Marli Lúcia Lisboa (Bulucha) – São José, SC

Trevas. Por enquanto, t revas! Em mim, dent ro de mim há trevas. Todo o eu vive em trevas. Vive? Pelo menos e xiste no eu a treva da pergunta, do ser, a t reva da resposta, do não ser! Treva, escuridão, não ver! Até agora, não adianta olhar para dentro de m im, dentro de você, dentro de todos, dentro de tudo, para dent ro de nós... Tudo é t reva... Olhando, o que verei? Nada... Por q uê? Porque tudo é t reva... eu, você, todos, tudo, nós. E u sou a treva, porque eu não passo de u ma simples... simp les, de um simples c onjunto que possui tudo e ao mesmo tempo não possui nada... E você? Consegue ver dentro de si? Sim? En-

t ão o que vê? Saber ia responder? Não... há treva! Talvez na treva dent ro de mim, de você, de todos, eu pudesse ver porcas, parafusos, f ios, células descon hecidas ou talvez... algo! Mas... que algo é esse? Consegue imag inar ou... sabe que algo é esse?! L uz. A luz que traz o p oder de ver. De ver o quê? Sei lá, qualquer coisa. Todos nós t emos luz em nossos o lhos, mas o que vemos? Nada. Por quê? P orque nós não queremos. E nquanto há trevas, não há nada que nos i ncomode. Seguimos um rumo obscuro, sab endo o que fazer, pois já temos uma prog ramação. Programaç ão? Sim. Eu, você, t odos, não vimos nada, temos botões e aparelhagem adequad a, sem nos import ar se vimos ou não. Ah, não concorda com i sso? Então por que não enxerga? Ah, não sabe responder... 65

Isso tudo é nada men os do que perman ecer no escuro, em trevas. E a luz? A luz? B em, ela nos chega, o u melhor, ela chega neste momento em m im. Como? De uma m aneira esquisita... mas chega. Ah, você não está entendendo nada! A trev a existe enquanto e xisto eu, minha porca; a luz existe quando existo eu, minha porca e quando existe máquina, toda ela... O que fez VER luz? I diota que sou, como s aberia responder? Talvez o que me fez v er a luz tenha sido a quilo que me fez... agir do modo que estou agindo, até agora! A treva é o modo mais s imples de ser covarde! A luz é o modo não s imples de ver a verdade! Não simples por


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c ausa de nós mesmos. O medo não nos deixa ver, nos faz perm anecer no escuro, n a treva. E tem mais u ma coisa! Permanecemos na treva com... medo! C ada vez tudo fica m ais complexo, eu fico com mais vontade d e saber do complexo, mesmo que seja o complexo da máquina, da construção, do proj eto... da lata de tinta ou do complexo meu... e u! E você? Não sei de mais nada? Sei, ou idiota é idiota, mas sabemos de algo... O quê? Quando você está na trevas, procur a ver? Não. Quando e stá na luz, procura v er? Não? Então não reclame! Não reclame, p orque não sabe de nada. E eu? Eu... Sei? O que é treva? O que

é luz? Treva é obscur idade. Luz é claridad e. E daí? Depende de cada um o rumo da treva. Há um rumo da t reva que leva para a luz, talvez poucos enxergam... Será necess ário acontecer com cada um o que acont eceu comigo, agora, neste momento? O que aconteceria c om eles... seria... o m esmo que acontec e comigo? E, o que acontece comigo? Talvez aconteça o desaparecimento do medo, p ara ver a luz, a verd ade. Isto porque eu q uero saber a verdade desde que a... Desd e que senti alguma coisa cobrindo o meu lado externo. Que coisa será essa?! É necessário perder o medo da treva, para a cabar com o medo d a luz e começar a s entir a verdade de mim, de você, de nós, de todos e também de tudo... Pois o tudo nos pertence...? A maneira de como perder esse medo dep ende de você... Se 66

quiser, aproveite o que acontece comigo... N ão continue na trev a... Veja a luz! Cont inue para um ponto mais alto sempre que quiser ver a luz... O que sou eu, falando a ssim... Não ria, pois n ão sabe o que você é , portanto não pode i maginar o que serei. Isto, se eu for alguma coisa... V ocê será capaz de sair da treva? Será capaz de enxergar? Sim. Por quê? A treva nada e sconde, mas a luz esconde muita coisa... P rocure. Quando enxergar... O que aparecerá?! ( Do livro HORA H, E ditora Dialogar/Edições A ILHA)


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É NATAL

Else Sant’Anna Brum – Joinville, SC

Vem, olha para o alto e contempla a nova estrela que brilha nos céus.

na tosca mangedoura rodeada pela mansidão das ovelhas e pela fé dos simples pastores que ainda hoje permanecem.

Vem, segue a caravana de fiéis pelos caminhos que conduzem a Belém.

Vem ver a inocência e a pureza a ressurgir em todos os Natais pelo poder da força-Cristo. Vem, despe tua velha roupagem de peregrino errante. É tempo de alegria! É tempo de amor e esperança! É Natal!

Vem! Alista-te! Não és peregrino, és filho e herdeiro! Vem olhar a criança

Lançameno do livro Cri-cró, de dona Else, na feira do livro de Joinville.

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DETALHES

Maria Teresa Freire – Curitiba, PR

P equenos momentos f elizes formam a felic idade, dizem. Então, é como um grande m anto formado por p equenos pedaços c osturados com car inho. Envolvo -me neste manto para obs ervar essas partes todas que formam tanto a minha vida como a sua. A manhã des p on t a com sol brilhante, q uente, convidativo a viver. Pode ser nublada envolta em nuvens b rancas ou cinzas. Ainda, pode estar molhada pela chuva que c ai e nos traz benesses ou alguns descontentamentos com sua a gressividade e violência. A o deparar-se com s eu dia, recorda sua rotina. O café quente, s aboroso, cheiroso,

s imples ou reforçado. As atividades que a quecem seu corpo e ativam seu organism o. Em locais fechad os, individuais ou c oletivos. Com acol hida ou sem. Com o rientação ou sem. A caminhada ao ar livre, usufruindo por estar liv re, apreciando a natureza que deslumbra. Nessa caminhada sol itária, talvez receba u m bom dia dos que passam por você. Talvez, somente simples olhares. O dia segue lhe traz endo, às vezes peq uenas surpresas, a lgumas novidades. N ão há inquietação p elo plano diário est abelecido. Sempre há um novo acontecim ento, muitas vezes, i nesperado. Alimentação diária, em com-

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p anhia ou sozinho, é um privilégio. Sentar à m esa em casa ou no restaurante, tendo sob o olhar observador um prato colorido com as g uloseimas alimentadoras. Saudáveis. O trabalho, que se d esdobra em espec ialidades diversas, r esponde às necessid ades sociais. A ativ idade diversificada, r emunerada, volunt ariada, apaziguada, c omo for, preenche a s horas, repercutind o sentimento de util idade, produtividade, agradabilidade. U m passeio, uma reunião com amigos ou a migas, um café, um doce, um momento de amizade, de distração, de conversas, de convivência. Em casa, na c afeteria, na confeitaria. Outro privilégio!


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U ma mensagem, um c ontato virtual, uma l eitura que faz sorr ir, uns dizeres sedut ores, umas palavras sensuais que causam u m frêmito, mesmo à d istância. Perto, causam um fulgor erótico que lhe estimula o desejo e lhe preenche o ser, que antevê as carícias. A s mensagens de “ bom dia” dali e dac olá, enfeitadas com flores radiantes e pais agens exuberan tes. As de “boa noite” acompanhadas de vel as incandescentes, e strelas brilhantes e l uas românticas. Imag ens que agradam, p rovocam sorrisos, o lhares sonhadores. F otos enviadas que e ntesouram moment os especiais, únicos. Q ue testemunham si-

t uações felizes, datas i mportantes que se r epetem a cada ano, mas ainda assim tem outro gosto, outro sol, outra lua, outros sorrisos, outras conversas. U m amor, perto ou l onge, que sussurra s uavemente palavras c arinhosas, que fala de prazeres extasiantes, arrepiantes e que t oldam a lógica, aguçam os sentidos e tem sabor inexplicável. A rotina interrompida e ncaixa uma viagem. L onga, média, curta. Para rever, matar saudades, conhecer pess oas inesquecíveis, p aragens deslumbrantes, desfrutar dias e horas apreciáveis. O convite para trabalhar, criar, produzir, escrever na folha branca a inspiração que veio, f ixou-se e completou69

- se. Para mostrar o talento, todos os talent os para olhos, ouvidos e mentes atentas e sedentas de sempre aprender. D etalhes que comp õem vidas, que arr ematam as costuras d a felicidade, com p ontos abertos de lib erdade, franque za, timidez, interesse, a mizade, amor. Det alhes que compõem o todo. Esse todo, diz em, é a felicidade. Então, cada pedaço lig ado ao outro, por lin has invisíveis aos o lhos, intangíveis às m ãos, mas sentidas n o coração, ambientadas na alma, vai tec endo o manto com momentos, situações, e ncontros duráveis o u fugazes, risos ou a té lágrimas. Todos com pitadas de alegria para que haja felicidade, como dizem!


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ESSE NATAL QUE NÃO CHEGA!

Conto de Luiz Carlos Amorim - Escritor, editor e revisor – Cadeira 19 da Academia Sulbrasileira de Letras. Fundador e presidente do Grupo Literário A ILHA, que completou 41 anos em 2021. Http:// luizcarlosamorim. blogspot.com. br – http://www. prosapoesiaecia. xpg.com.br

Na rotina estressante d o dia a dia, Natália achava que não tinha t empo para nada. Q ueria que o dia tiv esse mais de vinte e quatro horas para c onseguir fazer tudo o que precisava fazer em um dia, em todos os dias. Vivia correndo de um lado para o outro e, nessa correria, acabava se atrapalhando ainda mais. – Vo c ê c o n s e g u e e xecutar tudo o que e stá na sua agenda do dia? – perguntava

para a colega de serviço, para outra e outra mais. – Não, mas não esq uento muito com i sso – respondia uma. – Consigo, sim, é só e u me organizar. Às v ezes fica alguma coisa pendente, mas nem tudo dá pra gent e resolver de imediato, não é mesmo? – respondia outra. – Ah, divido as taref as comuns com a f amília, senão não consigo mesmo – dizia uma outra. – Pois eu vivo corr endo para cumprir meus compromissos, t anto profissionais q uanto familiares, m as sempre fica al-

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g uma coisa pendent e. Corro atrás do relógio e nunca cons igo terminar as coisas que começo. N atália achava que a s atribuições, tanto no serviço quanto na sua vida particular e ram demais e que precisava de uma folg a. Apesar de tudo, dava um jeito de enc ontrar tempo para d ar uma olhada no c orreio eletrônico, n as suas contas em p rogramas de relac i o n a m e n t o, p a r a m anter contato de t rabalho ou de amiz ade com as pess oas mais distantes. E a c a b ava a r r a n j ando mais comprom issos com esses


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contatos. E lá via que outras p essoas também se q ueixavam da falt a de tempo, implor ando por férias, por f olga, pelo final de a no. Havia quem rec lamasse de tudo, g ente cansada da v ida, querendo largar tudo. Ao invés de a char aquilo chato, p erceber que andava fazendo a mesma coisa e se propor um r e p o s i c i o n a m e n to c omportamental, ela s e identificou com aquelas pessoas. – Não sou só eu que a ndo cansada, dorm indo pouco, indo d ormir muito tarde e acordando muito c edo. Existem muit as outras pessoas

e stafadas como eu. Gostaria que estivéss emos em dezembro, época de festas, mais feriados... Chega, Natal! A colega que ouvia Natália sorriu. – Mas nós estamos a p e n a s e m j ul h o, m enina. Estamos no meio do ano. O Natal está muito longe. – É que o Natal e A no Novo são fe r iados, há mais sol idariedade nes sa é poca, as pessoas s e relacionam mel hor, o ar fica mais a legre, sei lá. Tudo f ica mais festivo e p arece que o tempo anda mais rápido. – Mas há mais trabalho, também, tanto 71

aqui como em casa. E a gente acaba gastando mais, também. – Tudo bem, mas eu j á não aguento mais t rabalho, família, est udo. Não aguento m ais a rotina cans ativa, gostaria que a lguma coisa nova a contecesse em min ha vida. Gostaria de poder adiar tudo e s air para viajar para l ugares bem distant e s , e s q ue c e r um pouco o tédio que é a minha vida. Mas não há dinheiro para isso, n ão adianta pegar f érias e querer viajar, porque há contas para pagar. Também n ão vou ganhar na l oteria, porque não aposto. – Você está precis ando de um namor ado, Natália. Não gosta de ninguém? – Já gostei, mas não d e u c e r to e a c h o q ue a minha vi da e stá muito conturbada para pensar nisso agora. – Mas amor sem p re ajuda. Amor faz a gente superar mui-


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ta coisa. – P o d e s e r, m a s r elacionamentos t ambém são complicados. A amiga percebeu que não era por esse r umo que ela cons eguiria mudar um p ouco a maneira de pensar de Natália. – Minha amiga, o N at a l e s t á l o n g e, a quele clima de fest a e harmonia de fin al de ano ainda não se instalou, mas você já pensou bem, s e quer que a data c hegue logo apenas para ter feriados, folga, festa? – Como as sim? – r espondeu ela, desc onsertada, com outra pergunta. – O que eu acho, na v erdade – argumentou a amiga – é que v ocê espera a época porque ela repres e n t a r e n o va ç ã o, r enas c imento, um r ecomeço. É o verd adeiro significado do Natal que quer se m anifestar em você, p ois o espírito do

Natal é justamente a g ente sentir que há f é e esperança num f uturo melhor e que p odemos rec ome ç ar tudo, reconstruir nossas vidas. E la olhou a amig a como se a outra f osse maluca, mas a cabou cruzando o s braços no peito e , colocando o ind icador direito nos l ábios, ao mesmo tempo que apoiava o queixo com o dedão, ponderou: – Pode ser que você t e n h a r a z ã o. Vo u p ensar nisso. Acho q ue preciso tentar r ecomeçar. Por que não logo? Se eu ficar a qui correndo igual b arata tonta em todas as direções, não v ou chegar a lugar nenhum. E ntão preciso mud ar um pouco a min ha vida, não tentar f azer tudo ao mesm o tempo, não querer abarcar o mundo c om as mãos. Esp erança é uma cois a que não coloquei 72

n a minha agenda. E é uma coisa que prec iso ter. Vai me ajud ar a caminhar com m ais segurança, vai m e a j u da r a c o n fiar mais no futuro, a confiar nas pessoas. – Então, amiga. Esse é um bom caminho. I sso fará com que e ncontre mais amigos, com que conheç a mais p es s oa s. P ode até conhec er alguém, digamos, especial, quem sabe? – É, quem sabe. A cho que vou prom over um Natal fora d e época na minha vida. E foi viver a vi da como se fosse o seu primeiro Natal, aprov eitando um dia de c ada vez, como se u m Menino mágic o tivesse chegado p ara acompanhá-la. C omo se esse Menino lhe guiasse pel os caminhos como se fosse sua estrela-guia, a esperança e a fé que lhe faltavam.


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convés de navios, emp unhando corajosamente arma de fuzil tal q ual flauta da harmon ia. Destemida brada a os homens: Vamos ANITA à luta! E, nas cores GARIBALDI, d estiladas em raja“HEROÍNA DOS DOIS MUNDOS” d as de canhões da R evolução Farroupi(1821-1849) l ha atestou a valentia Neusa Bernado Coelho – Palhoça e sapiência da muE xpresso admiração l her à frente do seu por Anita, mulher revo- tempo para em seguil ucionária, na crônica da desfraldar calmaria d e minha autoria prem iada no Concurso r ealizado pela AJEB/ SC e Associação Itália no Mundo, por ocasião d a comemoração do Bicentenário de nascimento da heroína. “O Poder da Rosa” A na Maria de Jesus R ibeiro, Aninha ou A nita Garibaldi, uma rosa garbosa que com t rejeito e ginga enf eitiçou o coração de G iuseppe, um jovem e xilado italiano, o hom em que a acompan hou no amor e na batalha por 10 longos a nos. Desfilou a magia feminina entre mares e montanhas, lares e casebres, praias e 73

em pétalas brancas da paz e o doce beijo de paixão no amado. O adeus à idílica Lag una, sua terra natal f oi aos dezoito anos de idade rumo ao batismo de fogo na Batalha Naval de Imbituba. N o Uruguai casou-se c om Giuseppe Garib aldi, depois foi lutar ao lado do marido pela U nificação da Itália, deixando rastro de en-


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Museu Casa de Anita, em Laguna, SC

cantamento e admiração por onde passava. A radiosa história dess a mulher sonhadora iniciou há duzentos anos, em 30 de agosto de 1821, na localidade d e Morrinhos, Tubarão, hoje, majestosa e histórica Laguna. Fund ada por açorianos abrigou viajantes para a bastecerem-se de p rovisões e fazerem r eparos em suas emb arcações. No local, e ncontra-se para visit ação o ‘Museu Casa d e Anita’ que relata a h istória da ilustre mor adora. A importante p ersonagem nomeia

a venidas, ruas e esc olas por todo o Brasil. Em sua deferência f oi inaugurada a monumental ‘Ponte Anita

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Garibaldi’, em Laguna. Em 1849, aos 27 anos, grávida do quinto filho, n ão resiste a fugaz perspicácia e desfalec e nos caminhos dos c ampos de Ravenn a, Itália, vindo a sucumbir nos braços do amado que um dia lhe dissera: “Tu deves ser minha”. Mais tarde recordaria: “Era Anita! A m ãe dos meus filhos! A companheira de minha vida, na boa e má fortuna! A mulher cuja c oragem desejei tantas vezes”. O bicentenário de nasc imento da ‘Heroína de Dois Mundos’ con-


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firma o legado de que j amais será esquecid a. Nas confrarias é r ememorada em versos e prosas; em coletâneas, obras autorais e materiais didáticos. Seu nome está inscrito no Livro dos Heróis da P átria, depositado no Panteão da Liberdade e da Democracia, em Brasília. E m 2021, a comem oração a enfeitiçar corações inclui a plant ação da rosa híbrida d esenvolvida na Itália especialmente para h omenagear a jovem f lor que um dia trans itou entre o Brasil e I tália em busca da lib erdade Republicana. Agora, renasce em d iversos jardins por o nde passou em form a de ‘Due Mundi e Uma Rosa per Anita’.

Quadro de Rute Cardoso

Neusa Bernado Coelho, natural de Palhoça/ SC. E scritora, poetisa, historiadora e Embaixadora Imortal da Paz pela OMDDH. Atuante na área social e cultural, ocupa assento no Conselho Municipal da Cultura. Autora de três obras solo e uma centena de coletâneas e antologias, part icipou da 91ª Feira do Livro de Lisboa/2021 e da 1ª Feira Internac. do Livro Cultive/Genebra. Outorgada com Comendas e Títulos, é Membro de Associaç ões e Academias Nacionais e Internacionais, é secretária da Academia de L etras de Palhoça; Colunista cultural em jornais e revistas, entre eles: Jornal Cultural ROL; Revue Art Plus/Cultive; Escritores do Brasil; Suplemento LiterárioA Ilha e https://portalpalhoca.com.br/ 75


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É NATAL

Aracely Braz

É Natal Quando a verde mata Se transforma Em tapete colorido De flor de jacatirão, Nosso presente A cada véspera de Natal. É Natal Quando em cada lar, Renasce Jesus num presépio De humilde manjedoura Como nos corações dos

homens. É Natal Quando os sinos dobram, E as cigarras trombeteiam, Trazendo à tona A lembrança feliz e triste Do Cristo amado traído Por assumir nossa culpa. Natal A festa maior De esperança e paz De perdão e de amor.

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A ZEBRA DE ZANZIBAR Agualusa

E m outubro, conhec emos o nome do P rêmio Nobel de Lit eratura deste ano. A bdulrazak Gurnah n ão constava entre o s mais cotados nas listas de apostas. Há q uem despreze est as listas. Eu não. L eio-as com atenção, mesmo sabendo q ue, quase sempre, d izem mais sobre a s grandes inquietações do nosso tempo d o que sobre a qual idade dos escritores listados. Isso não surpreende. Também a s preferências do C omitê Nobel refletem (refletiram desde s empre)idênticas inquietações. N as listas deste ano d estacavam-se, por e xemplo, várias mul heres africanas ou d e ascendência afri-

cana. Falou-se muito n a Nigeriana Chimam anda Adichie. Fal ou-se ainda nas a ntilhanas Jamai c a Kincaid e Maryse Condé e na ruandesa S cholasti - que Mukasonga. Chimamand a, de 44 anos, é o principal rosto do c hamado feminismo n egro. Os seus três r omances venderam m ilhões de exemplar es. Contudo, não t em ainda obra liter ária que justifique a p remiação. Condé, p elo contrário, esc reveu 15 romances, sobre temas muito diversos, com os quais t em vindo a acumul ar importantes dis-

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t inções literárias no m undo francófono. N ão surpreenderia vê-la ganhar o Nobel nos próximos anos. O esforço que a Academia Sueca tem feit o para mostrar que não se interessa apen as pelas literaturas p roduzidas na Europa e nos EUA chega a ser enternecedor. A verdade é que os j urados suecos, por muito eruditos e bem i ntencionados, são s uecos. Leem origin ais em sueco e ing lês, ou traduções n essas línguas. A contece que menos de dois por cento dos livros de ficção p ublicados nos EUA


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e no ReinoUnido são t raduções. Ter boas t raduções em suec o é ainda mais dif ícil. Contam-se nos d edos de uma única mão os escritores d e língua portugues a cujos livros estão à venda nas livrarias de Estocolmo. S e o Prêmio Nobel d e Literatura tivesse sido criado por um m ultimilionário bras ileiro e a escolha d os autores premiad os coubesse, por exemplo, à Academia B rasileira de Letras, certamente que a list a dos galardoados seria muito diferente. I nfelizmente, não estou nada certo de que fosse melhor ou mais

d iversa. Tenho mesm o muitas dúvidas quanto a isso. “Acho que eles querem descobrir um gên io de um lugar que f oi marginalizado até a gora. Poderíamos chamá-lo de colonial ismo positivo”, afirmou o crítico literário sueco Jonas Thente, r eferindo-se às possibilidades de Chimamanda. Se tivermos em cont a este raciocínio, o triunfo de Abdulrazak G urnah não const ituiu uma surpresa a bsoluta. O seu perf il corresponde às i nquietações do momento: o novo Nobel v em de Zanzibar, na T anzânia, uma ilha q uase mítica, com u ma longa tradição de mestiçagem, send o um dos destinos turísticos mais procur ados do continente africano. E ncontrei-o em div ersos festivais literários, uns na África, o utros na Europa, e assisti a alguns debat es com ele. Guardo 78

n a memória a imag em de um homem gentilíssimo — a figura clássica do gentlem a n—, c o m u m discurso claro e coerente sobre questões como migração, colon ialismo e pós-colonialismo. I nfelizmente, Abdulr azak Gurnah tem a penas um livro trad uzido para português — em Portugal. E spero que em breve possamos encont rar todos os seus t ítulos nas livrarias d o Brasil. A editor a Companhia das L etras anunciou rec entemente que pub li c ará a o b ra d o e scritor tanzaniano A bdulrazak Gurnah, v encedor do Prêmio N obel de Literatur a. O autor, radicado n o Reino Unido desd e o final da década de 1960, é inédito no Brasil. A partir de 2 022,serão lançados quatro romances d e Gurnah:“Afterliv es”,“Paradise”, “By t he sea” e “Desertion”.


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“Afterlives”, livro mais recente de Gurnah — p remiado pela Academia Sueca por sua “ percepção intransig ente e compassiva d os efeitos do colon ialismo e do destin o do refugiado no a bismo entre culturas e continentes” — e stá previsto para o primeiro semestre do a no que vem. Ambientado no início do

s éculo XX, o romance tem como pano de fundo a Rebelião Maji M aji, revolta armada c ontra o domínio colonial alemão na África Oriental. J á “Paradise” acomp anha um garoto de 12 anos que foi vendido pelo pai para pag ar uma dívida com u m comerciante árabe. “Desertion” narra d ua s h i s tó r i a s d e

a mor proibidas: uma em 1899 e outra nos anos 1950. E “By the s ea” retrata a vida d e dois imigrantes a fricanos no Reino Unido. S egundo a nota divulgada pela editora, o s romances e cont os de Gurnah “invertem a perspectiva c olonial e jogam luz s obre a pluralidade cultural da África”.

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POR QUE EU MEREÇO O QUE TENHO?

Hilda Chiquetti Baumann - Ibirama, SC

confiante prossigo. Nem um tempo eu desperdiço. Tudo são oportunidades que o Senhor me deu nesta vida, não levo muito a sério os problemas, tiro proveito da dor. Não me desespero, nem me descabelo. Com a energia do sol vou me recompondo, bebendo água, comendo pão, respirando. Feliz, meio a bolhas de sabão, na vida sigo o fluxo. Para que? O que? Por que mais isso? Mais o que? Tenho, por que tenho? Será que isso eu preciso? Será que mereço? O que faço com tudo isso? Quanta beleza vejo nas flores. Que perfeição as cores! Diferentes perfumes. Espinhos, por que? Eu sou assim. Pois sei quão importante é viver. Um pote de barro remendado também pode amor se fazer.

Se mereço, não sei. Só sei que tenho. Eu entre tantos, sou mais um pote de barro. Todos os dias perco algumas lascas. Então, para parecer inteira, me colo alguns cacos. Neste processo construtivo, vou me remontando como um colorido mosaico. Neste pleito vou perdendo cabelos, lágrimas, unhas, gases, o viço da juventude e outros pedaços. É assim mesmo, neste mistério vida afora vou me aperfeiçoando. Sei, sou 100% responsável por tudo que acontece comigo. Eu que escolhi o roteiro, as provas para redenção. Deus concordou. Então, eu não reclamo. Agradeço o meu deserto. Paciente como um gato, procuro chão firme para meus passos. Nem sempre acerto, porém

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UNIK

Valquira Imperiano - Geneve

N a linguagem hum ana, cachorro é sin ônimo de canalha, e stúpido, irracional. O homem classifica o outro de cachorro para ofendê-lo, no ent anto seria mais certo o cachorro chamar u m canalha de homem, o sinônimo seria mais adequado. Q uisera o homem s er um cachorro, um a nimal fiel e dócil, s entir-me-ia mais seg ura em sua compan hia, mais protegida e com certeza não ter ia medo de ser atac ada e atraiçoada. S e os cães são mod ificados pelos hom ens e adquirem o l ado agressivo para se defenderem não é a sua culpa! Afinal o c ão adquire e aprende os hábitos que lhe são incutidos.

M eu cachorro se foi d eixando um vazio ú nico, único como s eu nome, Unik. Def endo os cachorros, n ossos companheiros e defino-os como n ossos anjos guardiões. Unik era um amigo e guardião. Nunca soub e se seria um bom protetor da casa cont ra ladrões, pois não c onseguia demonst rar agressividade. U nik era uma crianç a. Sua maior agressividade era latir para proteger seu território c ontra um cão invas or. Tinha uma cara r isonha, a boca rasg ada em forma de r iso, dando-lhe um a r de urso feliz. Peluda e macia, as orelhas pontudas, que eu g ostava de acariciar, eram gostosas de pegar. Unik não gostava m uito que tocássemos em suas orelhas, m as ele aceitava minha caricia resignado, a liás, eu era a única pessoa que podia pegar suas orelhas. U nik era o chefe da 81

c asa, determinava a hora do passeio, seu m omento preferido. À s oito horas ele lat ia na porta da cozin ha, acordando meu m arido para o passeio matinal. Escolhia o que comia e nada o obrigava a comer o mesmo tipo de croq uete mais de uma vez por semana, éram os obrigados a int ercalar as marcas p ara que ele se alimentasse. E u sentia uma grande proteção espiritual q uando o Unik estav a por perto. Perceb i muitas vezes que r eagia diferentemente com a aproximação d e certas pessoas conhecidas. Sua reaç ão era colocar-se frente a nós e grunhir, n ão era um grunhido p ara morder, era dif erente. Às vezes a p rópria pessoa ficav a sem graça e me perguntava o que ele estava vendo ou sentindo. Sem graça, nós o colocávamos no jard im, mas ele ficava l atindo na porta até


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que a abríssemos, ele entrava correndo e se c olocava deitado aos nossos pés entre a visita e nós. Outras vez es, grunhia e latia, olhando o exterior da n ossa casa, parado no meio da porta. U nik adorava correr para o lago e espant ar os patos. Corria, f reava a alguns met ros da margem, ent rava no lago só até cobrir as patas e ficav a lambendo os beiç os com vontade de e spantar os patos q ue nadavam tranquilos mais no fundo. E le dava voltas para lá e para cá, mas não se atrevia a entrar no l ago, não gostava de á gua; aliás, detestav a água, talvez sua d efesa genética lhe d issesse para a evitar para não congelar. U nik era um cachorro polar. O tempo termina para t odos e a fragilidad e do corpo é para t odos, gente e cachorros. No período que antec edeu sua morte, eu

compreendi o porquê d a sua dificuldade para comer. Acho que o câncer já lhe perturbava há muito tempo, e lhe provocava o f astio. Lutei para ele s e alimentar desde b ebê. Sempre selet ivo e comendo pouc o, nem o veterinário c onseguiu resolver o p roblema, muitas vezes só comia quando colocávamos a comid a na sua boca, outras torcia o nariz até para um osso e para a carne. Mas semp re foi forte e com m uita vitalidade. Ele d urou pouco, apenas 9 anos. No auge d a doença, escond ia-se de nós, acho que para não nos ver sofrer. Foi um momento horrível vê-lo sofrer com a s dores. Graças a D eus em 3 dias ele p artiu deixando saudade. Não sei se terei c oragem de ter out ro cachorro. O difícil do animal é que eles s ão como bebê, sofrem sem poder dizer o nde é a dor e nós 82

n os sentimos impotentes para ajudá-los. M eu ursinho partiu. A deus meu urso lindo! Urso único. UniK! D ez anos se pass aram e finalmente, compramos outro sam oieda, esperando que tivesse a mesma d ificuldade para com er que Unik e qual a nossa surpresa, temos que esconder os p acotes de presunto e pão brioche, porque a nossa Sissy, é g ourmande e se dermos moleza, ela rouba até sobre a mesa. A única característic a diferente de Unik. N o resto, ela é igual, n ão entra na água, é muito gentil, ador a brincar, super ind ependente e só faz o quer, e late muit o quando quer algo, também já está most rando sinais de ver c oisas, mas estamos a costumados com a raça samoieda. Sissy é a nossa princesa, l inda, cabeça dura, d esobediente e gent il. Nossa ursinha de pelúcia.


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PROFESSORA DE PORTUGUÊS DANDO AULA

Vivian Cabrelli Mansano

" Não sou homofóbic a, transfóbica, gordofóbica. Eu sou professora de português. E u estava explicando um conceito de português e fui chamada de d esrespeitosa por isso (ué). E u estava explicando por que não faz diferenç a nenhuma mudar a vogal temática de substantivos e adjetivos pra ser "neutre". E m português, a vog al temática na maioria das vezes não define gênero. Gênero é definido pelo artigo que acompanha a palavra. Vou mostrar pra vocês: O motorista. Termina em A e não é feminino. O poeta. Termina em A e não é feminino. A ação, depressão, im-

p ressão, ficção. Todas a s palavras que terminam em ção são femininas, embora terminem com O. Boa parte dos adjetivos d a língua portuguesa podem ser tanto masculinos quanto femininos, i ndependentemente da letra final: feliz, triste, alerta, inteligente, emoc ionante, livre, doente, especial, agradável, etc. Terminar uma palavra com E não faz com que ela seja neutra. A alface. Termina em E e é feminino. O elefante. Termina em E e é masculino. Como o gênero em port uguês é determinado muito mais pelos artigos do que pelas vogais temáticas, se vocês querem uma língua neutra, precisam criar um artigo neutro, não encher um 83

texto de X, @ e E. E mesmo que fosse o c aso, o português não a ceita gênero neutro. Vocês teriam que mud ar um idioma inteiro pra combater o "preconceito". Meu conselho é: ao invés de insistir tanto na coisa do gênero, entend am de uma vez por todas que gênero não existe, é uma coisa socialmente construída. O que existe é sexo. Entendam, em segundo lugar, que gênero linguístico, gênero literário, gênero musical, são cois as totalmente diferentes de "gênero". Não faz a bsolutamente diferença nenhuma mudar gêneros de palavras. Isso não torna o mundo mais acolhedor. E entendam em terceiro lugar que vocês podiam tirar o dedo da tela e parar de falar abobrinha, e se engajar em algo que realmente fizesse a diferença ao invés de ficar arrumando pano pra manga pra discutir coisas sem sentido."


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LITERARTE O FILME “O VENDEDOR DE PASSADOS”

P rotagonizado por Láz aro Ram os e Alin n e Moraes, o filme “O V endedor de Passad os”, inspirado no rom ance homônimo de J osé Eduardo Agualus a, já está disponível no Brasil. Em Portugal, o livro faz parte do Plan o Nacionall de Leitur a e é recomendado c omo sugestão de lei-

t ura para o ensino secundário. “ O Vendedor de Pass ados” conta a histór ia de Vicente – Félix Ventura no livro, um car ioca que vende pass ados falsos. No livro, a realidade retratada é a ngolana. Munido de documentos, fotos e víd eos, Vicente constrói u ma história de vida

para prósperos clientes q ue o procuram amiúd e. Um dia, é procur ado por uma mulher misteriosa que, sem revelar nada da sua vida, l h e e n c o m e nda u m p assado. Sátira feroz, m as divertida e bem- humorada, este é um f ilme que mistura elem entos de drama, romance e comédia.

CONFUSÃO INTERNACIONAL NA BIENAL

A Bienal do Livro do Rio a nunciou como certa a presença do escritor p ortuguês Valter Hugo M ãe no evento deste ano. Ele falaria sobre "A nação na língua", tratando de literatura e divers idade, na Bienal que vai de 3 a 12 de dezembro. Acontece que, em s eu Instagram, Valter H ugo Mãe revelou que " não houve aceitação

d o convite e não houv e acordo em relação à s condições em que e sse trabalho se faria".

E le disse que "foi com enorme surpresa que vi o meu nome ser precipitadamente anunciado e é com enorme surp resa que ainda hoje, n este instante, encontro na página oficial da B ienal o suposto evento com a minha presenç a.” A organização da Bienal correu para tirar o escritor da programação oficial.

A NOVA LITERATURA CATARINENSE

Vem aí a segunda ediç ão do livro A NOVA L I T E R AT U R A C A T ARINENSE, uma “ antologia” com biobib liografia, fortuna críti-

c a e amostra da obra d e autores do Grupo L iterário A ILHA, tant o aqueles que já pass aram por ele como aqueles que ainda inte-

g ram a reunião de aut ores. Portanto, uma edição revista e ampliada, com um panorama b em atual da literatura praticada em SC.


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