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A semente do Livro
Poderia ler um poema sobre os ventos gélidos de um inverno tardio… Não fosse o frio um entorpecedor de mentes e corpos que se procuram aninhar…
A abominável frieza de ideias e, os movimentos, esses, um slow motion numa superfície despejada.
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Num salto acrobático, alheou-se aos arrepios, descobrindo memórias bem mais aprazíveis. Um por de sol fantástico nas ilhas místicas de um oceano perdido. Ou, mesmo… Aquela viagem às terras calcorreadas por Ali Baba. Aventuras bem remotas. Mas, no conforto dormente de uma cadeira roçada pelo tempo, era inevitável ler, o murmúrio que se escapava na noite. Linhas cruzadas entre a realidade e o devaneio.
A ideia de Ali Baba, nas suas mais tresloucadas peripécias, não soava a uma má distracção. Não fossem as lembranças devolvê-lo ao presente, numa resenha diária, à descrença. Alimento bem mais funesto, servido em palestras sucintas e “desbundas” televisivas, flashando no ecrã, sem marcação.
Estranho… Num ápice, Ali Baba, deixara de ser uma aprazível viagem para o conforto nas noites frias.
O relógio biológico chamara-o à razão de um frigorífico… quase desnudo. E os cascos rompendo as areias quentes e doiradas, não eram mais que um eco insistente do seu corpo magriço. Uma imensa corrente de ar. Com essa insustentável leveza, regressara à roçada cadeira. Sentando os ossos numa almofada e deliciou-se com o néctar dos deuses. Tão transparente quanto o ar que percorria a casa.
Deixaria Ali Baba aventurar-se nas letras que relera um sem número de vezes. O personagem que havia sido um dos seus heróis de juventude, tornara-se um prisma. Espelhando as diversas faces dos mais recentes aventureiros de completos fatos.
Facto…
O quarto esvaziado de identidade, que envergonhados raios de sol pediam o favor de entrar e as sombras das asas, em tangentes artísticas de fronte às vidraças, captaram, por instantes, a sua atenção.
Lavaria a mente com os orvalhos num mundo fantástico. E, os pensamentos percorreriam cada recanto do quarto. Quais notas harmoniosas de um acordeão ecoando ao vento quente das estepes, em pleno verão.
E, a vela que todas as noites sangrava aflições, aluminaria-o com sonhos.
Sonhos de um outro ser, numa noite gélida de solidão.