HSM Management - edição 98 | Degustacao

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Julho/agosto 2013

informação e conhecimento para gestão empresarial

alex

osterwalder business model generation

tudo sobre o “canvas”, a ferramenta que conquista cada vez mais empresas (no Brasil também)

sul contra norte:

a ruptura global de

ram charan

storytelling, O SUPERDOSSIÊ

Escolas de negócios europeias estudam

lady gaga R$ ISSN54,00 1415-8868

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surpresa nos líderes mais admirados • Jonah berger desafia malcolm gladwell ISSN 1415-8868

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expediente

Diretor de Marketing Guilherme Soarez DIRETOR DE MÍDIAS André Castro editor de arte Alexandre Braga diagramador Carlos Borges Junior Edição AF Comunicações EdITORA-executiva Adriana Salles Gomes CONSULTOR editorial Jorge Procópio Carvalho Redação/Tradução Alexandra Delfino de Souza, Elizabeth da Penha Cardoso, Fernando Moreira Leal, Graciliano Toni, Lizandra Magon de Almeida, Rosemarie Ziegelmaier Revisão Marcia T. Courtouké Menin Logística Walney Santos Publicidade Rita Prieto Tel. (11) 4302 2642 ASSINATURAS Grande São Paulo: (11) 4689 6699 Outras Cidades: 0800 551029 Fax: (11) 4689 6698 – www.hsm.com.br Al. Mamoré, 989 – 13º andar – Alphaville CEP 06454-040 Barueri/SP SERVIÇO AO CLIENTE Alexandre Oliveira Assinaturas: assina@hsm.com.br Renovações: renova@hsm.com.br ASSINATURAS CORPORATIVAS Alexandre Oliveira corporativo@hsm.com.br ALIANÇAS E PARCERIAS Silvia Sayuri br-parcerias@hsm.com.br Distribuição nacional em bancas pela DINAP S/A. Distribuidora Nacional de Publicações. HSM Management é uma publicação bimestral da HSM do Brasil. ISSN 1415-8868 O conteúdo dos artigos é de responsabilidade dos autores. Como assinante desta publicação, você poderá receber malas diretas e comunicações online da HSM ou de empresas parceiras, com ofertas de produtos e serviços adequados a seu perfil. Caso prefira não recebê-las, solicitamos a gentileza de entrar em contato pelo telefone (11) 4689 6699 ou pelo e-mail assina@hsm.com.br.

L

embro-me como se fosse hoje do meu primeiro texto na página 6: publicado na edição de janeiro-fevereiro de 2008, girava em torno de um velho slogan do jornal Financial Times, cujo papel é cor salmão: “Business is never black and white”. Eu o usava para sintetizar as contradições do mundo da gestão, em que Kevin Roberts desdizia Michael Porter, este desafiava Jack Welch, que, por sua vez, desautorizaria Roberts se fosse indagado a respeito. E terminava afirmando que, culturalmente, também a HSM tem a cor salmão, pois nunca tentou varrer a complexidade da nossa área para debaixo do tapete, jamais se limitando às mesmices e convenções no campo das ideias e das práticas gerenciais. Pois a complexidade é mote e motivação para muitas das iniciativas de gestão retratadas nesta edição. A começar pelo storytelling corporativo, tema do excelente Dossiê: quem diria que, um dia, o líder empresarial teria de aprender a contar histórias? É o que está ocorrendo: a complexidade atingiu níveis inéditos, a razão ficou insuficiente e é preciso despertar emoções contando histórias. Como diz o mestre dos roteiros de Hollywood Robert McKee na entrevista ao nosso José Salibi Neto, hoje, se o executivo não souber contar uma história na apresentação de um IPO, nenhum investidor assinará o cheque. Também é por conta do excesso de complexidade que o pensamento visual está virando tendência no mundo dos negócios. E esse é o assunto dominante quando colocamos em nossa capa Alex Osterwalder e sua ferra-

menta Business Model Generation. A BMG é materializada visualmente em uma tela –“canvas”, em inglês– e nossa reportagem sobre isso, que inclui entrevista exclusiva com Osterwalder, aborda seus vários aspectos, mostrando, inclusive, empresas brasileiras que já a aplicam. A complexidade ainda é protagonista no insight de Ram Charan, o consultor dos grandes CEOs de multinacionais, sobre uma guerra de negócios entre o Sul e o Norte do planeta –e a decorrente ruptura. Publicamos com exclusividade sua provocativa entrevista, capaz de gerar reflexões na comunidade empresarial e de influenciar suas próximas decisões. É hora de reconvocar a cultura de cor salmão da HSM para anunciar que, após quase 14 anos de casa, cinco anos e meio como seu presidente, deixo-a em busca de novos desafios. Aprendi demais com esta organização –nesta revista, em nossos eventos, com os clientes e a maravilhosa equipe que me acompanhou– e espero ter ensinado algo em retorno. Coloco-a em ótimas mãos: o novo presidente, Maurício Escobar, originário do grupo educacional Ânima, tem o foco no conhecimento como principal diferencial. Nessa transição produtiva e saudável, uma certeza é a de que a complexidade continuará a ser tratada com compreensão, respeito e da mesma maneira plural. (Ou, como nossa editora ouviu de uma jovem assinante outro dia, a HSM Management continuará a ser uma publicação “não careta” –risos.) Marcos Braga

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Nascida no Brasil em 1987 com o propósito de oferecer conteúdos de excelência na gestão de empresas, a HSM é hoje referência em educação executiva.

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Diretor-editorial José Salibi Neto

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Diretor-presidente Marcos L. de Almeida Braga

A gestão nunca será em preto e branco

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INOVAcÃO INOVAÇÃO

O “canvas” do

modelo de negócio Reportagem hsm Management focaliza a ferramenta que o suíço Alex Osterwalder criou para promover a inovação e que vem mudando a forma de trabalhar das empresas. Ela é conhecida pela sigla BMG (que significa, em inglês, geração de modelo de negócio)

Só este ano, a área de produtos digi-

tais do grupo brasileiro de comunicação RBS já utilizou a ferramenta Business Model Generation duas vezes. A primeira foi para um novo negócio que vem sendo concebido por meio do convênio de pesquisa entre a RBS e a Faculdade de Comunicação da PUC do Rio Grande do Sul. A segunda tratou de um produto já existente que será relançado com enfoque novo. “Reunimos várias pessoas em torno dos canvas em workshops e, assim, conseguimos construir uma versão de modelo de negócio melhor e mais clara para todos”, conta Diana Corrêa, analista de negócios digitais do grupo RBS. A empresa de comunicação de origem gaúcha vem utilizando desde 2011 o canvas que o suíço Alex Osterwalder criou em meados dos anos 2000, quando terminava seu doutorado na célebre HEC Lausanne. O canvas é a tela esquemática que materializa a Business Model Generation (BMG), ferramenta de geração de modelos de negócio que vem tendo

um sucesso espantoso. Em um mundo com informações em excesso e pulverizadas, e que oferece uma série de ferramentas visuais, o livro Business Model Generation vendeu, em três anos, 750 mil cópias em 26 idiomas (no Brasil, foi lançado pela editora Alta Books) e a ferramenta teve mais de 1 milhão de downloads na internet. Sucesso entre empresas como GE, P&G e 3M, também é bastante aplicada em mercados orientais, especialmente China, Coreia e Japão. Em entrevista exclusiva a HSM Management, Osterwalder atribui grande parte do êxito ao fato de a ferramenta ter interface muito amigável aos usuários. Mas ele não ignora que a maioria das empresas não gosta de fazer experiências e testes, nem do risco de fracassar, e que, para elas, o canvas funciona como um protótipo que autoriza os gestores a fazer outro protótipo mais sofisticado e em escala. O depoimento de Diana Corrêa, da RBS, comprova a ideia da garantia: “O canvas nos fez enxergar vi-

A reportagem é de Adriana Salles Gomes, editora-chefe de HSM MANAGEMENT, e Viviana Alonso, colaboradora da revista.

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sinopse l

Quando o paradigma do setor de fotografias mudou de filme celuloide para digital, a Kodak adotou rapidamente a nova tecnologia, lançando as câmeras digitais, mas ainda assim quebrou. Faltou ter um modelo de negócio que lhe permitisse obter margens similares às dos filmes.

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Uma ferramenta de gestão surgiu com o objetivo de evitar que essa história se repita. Cada vez mais adotado (até no Brasil), o canvas, ou BMG, é um esquema visual que permite às pessoas cocriar modelos de negócio com nove elementos.

l Hoje, com quebras de

paradigmas repentinas, as empresas precisam revisar constantemente seus modelos.


SAIBA MAIS SOBRE

Foto: Arquivo pessoal

osterwalder

sualmente o resultado de meses de pesquisa, e isso permitiu que encontrássemos diversos pontos do modelo de negócio que ainda precisavam ser aprofundados, além de ter novas ideias que aprimoraram a visão do produto”, relata a analista. Para Osterwalder, modelos de negócio superados são o que explica a ruína de tantas companhias dos ramos de música, cinema, fotografia e editorial. Quando o paradigma desses setores mudou, as empresas tentaram mudar tecnologicamente, mas sem alterar os modelos de negócio. Não funcionou. Para o criador da BMG, usar sua criatura só quando o novo paradigma já estiver instalado não é o mais aconselhável. “Principalmente quando têm sucesso, as organizações só pensam em crescer e executar melhor o modelo, esquecendo-se de que a validade desse modelo pode expirar. Se a empresa não faz experimentos com modelos de negócio, para gerar novos ou atualizá-los, enquanto as coisas ainda cami-

Ele é a própria mente sintetizadora do futuro definida pelo psicólogo das inteligências múltiplas Howard Gardner, porque reúne grandes quantidades de conteúdo, identifica seus padrões e as simplifica. Mas o suíço Alex Osterwalder, nascido em 1974, define-se sobretudo como empreendedor. Sua tese de doutorado viralizou na internet em meados dos anos 2000 e, em 2010, virou o best-seller traduzido no Brasil como Business Model Generation (ed. Alta Books). Osterwalder é sócio de várias empresas, como a Arvetica, firma de consultoria especializada no setor bancário, a BusinessModelDesign.com e a strategyzer.com, desenvolvedora de software. Também participa da rede global sem fins lucrativos The Constellation, que combate doenças como a malária e a aids.

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INOVAcÃO INOVAÇÃO

O canvas DO ipod/itunes O iPod/iTunes veio antes da BMG, em 2001, mas o livro de Osterwalder e Pigneur utiliza seu modelo de negócio para ilustrar a ferramenta. Os nove blocos são explicados e exemplificados

Parceiros estratégicos

Atividades-chave

Quem são nossos parceiros-chave? Quem são nossos fornecedores-chave? Que recursos-chave obtemos dos parceiros? Que atividades-chave os parceiros realizam?

Que atividades-chave nossas propostas de valor requerem? Nossos canais de distribuição? As relações com os clientes? Os fluxos de receitas?

Motivação para as parcerias . Otimização e economia . Redução de riscos e incertezas . Acesso a determinados recursos e atividades

Categorias . Produção . Solução de problemas . Plataforma/rede

. Gravadoras de . Fornecedores equipamentos

. Design de

hardware . Marketing

Recursos-chave Que recursos-chave nossas propostas de valor requerem? Nossos canais de distribuição? As relações com os clientes? Os fluxos de receitas?

Tipos de recursos . Físicos . Intelectuais . Pessoas (marca, patentes, . Marca Apple direitos, dados) . Conteúdo e . Humanos acordos de . Financeiros conteúdo od . Hardware iP unes iT are tw . Sof

Propostas de valor Que valor entregamos ao cliente? Qual problema do cliente ajudamos a resolver? Que pacotes de produtos e serviços estamos oferecendo a cada segmento de clientes? Que necessidades do cliente satisfazemos?

Características . Novidade . Desempenho . Customização . “Fazer acontecer” . Design . Marca/status . Preço . Redução de custos . Redução do risco . Acessibilidade . Conveniência/facilidade de uso

. Experiência contínua com música

Fonte: www.businessmodelgeneration.com

Estrutura de custos

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Quais são os custos mais importantes inerentes a nosso modelo de negócio? Quais são os recursos-chave mais caros? Quais são as atividades-chave mais caras?

Sua empresa é mais: . Voltada para os custos (estrutura de custos enxuta, preço baixo, máxima automação, alta terceirização) . Voltada para o valor (focada em criação de valor, preço premium)

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Tipo de custos . Fixos (salários, aluguéis, serviços públicos) . Variáveis . Economia de escala . Economia de escopo

. Pessoas . Produção . Marketing e vendas


O “canvas” do

modelo de negócio

Criado para:

Em: ____/ ____/ _____

Criado por:

Interação:

Relações com o cliente

Segmentos de clientes

Que tipo de relação cada um de nossos segmentos de clientes espera que estabeleçamos e mantenhamos com eles? Quais delas nós já estabelecemos? Como se integram ao restante do modelo de negócio? Quanto nos oneram?

Para quem estamos criando valor? Quem são nossos clientes mais importantes?

Exemplos . Assistência personalizada . Autosserviço . Serviços automatizados . Comunidades . Cocriação

. marca amada ça an . Custo de mud

Categorias . Mercado de massa . Mercado de nicho . Segmentado . Diversificado . Multiplataforma

. Mercado de

Canais Por meio de que canais queremos chegar aos segmentos de clientes? Como estamos chegando a eles? Nossos canais estão integrados? Quais funcionam melhor? Quais são os mais eficientes em termos de custos?

. Pensar no que o canal deve cumprir: ser conhecido, ajudar a perceber valor, fazer comprar, entregar, atender pós-venda

. Varejo . Apple STORE om . site apple.c ore St unes . iT

Fluxo de receita Que valor nossos clientes estão realmente dispostos a pagar? Quanto pagam hoje? Como pagam? Como prefeririam pagar? Em que medida cada fonte de receita contribui para a receita total?

tas are dw har com tas . ALGUMAS Recei ca úsi m com

. Grandes recei

Tipos de receitas . Venda de ativos . Tarifa por uso . Taxa de assinatura . Aluguel/leasing/empréstimo . Licenciamento . Intermediação . Publicidade . Por volume preços dinâmicos . Negociação (barganha) . Gerenciamento de receitas . Em tempo real

massa

nham bem, será obrigada a fazê-lo na pressa da mudança de paradigma, e o mais provável é que seja tarde demais.” A aplicação do canvas tem ido além de gerar novos modelos de negócio ou revisar e atualizar os existentes. O próprio Osterwalder conta que algumas companhias o usam para checar a realidade, como quando, por exemplo, veem-se em processo de fusão ou aquisição e querem saber se o modelo de negócio da outra empresa é compatível com o delas. Uma finalidade ainda mais diferente é o uso para gestão, em diversos departamentos da empresa –conhecem-se aplicações na área financeira e na de recursos humanos, entre outras. Segundo o consultor de empresas Francisco Albuquerque, cofundador da Agência de Cocriação, o canvas funciona muito bem, se utilizado com ferramentas complementares, para engajar os funcionários de seus clientes no alinhamento da estratégia com a gestão operacional. “Historicamente, alinhar estratégia com operação é um grande desafio e, quando realizamos esse tipo de ação, fica bem mais fácil”, afirma Albuquerque. Um caso de empresa que recorreu a esse uso alternativo do canvas é o grupo SCR Tecnologia, que atua no mercado B2B de soluções em automação e tecnologia. De acordo com Ricardo Ferraz, sócio-diretor do SCR, o canvas os levou a gerar maneiras de melhorar o relacionamento com clientes-chave e a redefinir uma estratégia de vendas alinhada com a proposição de valor do grupo, além de possibilitar melhor percepção dos recursos-chave e maior comprometimento da equipe. “E, no campo dos modelos de negócio, conseguimos visualizar um novo negócio que permitirá a diversificação de nossos serviços”, diz Ferraz. Osterwalder aprova novos usos não pensados por ele e declara-se fascinado com a receptividade da ferramenta no Brasil. “Os brasileiros são o segundo grupo que mais visita nosso site, perdendo apenas para o dos Estados Unidos, e também sei

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que o canvas vem despertando o interesse tanto de startups brasileiras como de PMEs [pequenas e médias empresas], corporações locais e subsidiárias de multinacionais.”

CONTANDO A História O canvas do modelo de negócio começou a nascer quando Alex Osterwalder preparava sua tese de doutorado em sistemas de informação gerencial na prestigiosa escola de negócios HEC, de Lausanne, na Suíça. Ele buscava o melhor modo de descrever o modelo de negócio de uma companhia. “Queríamos ver, meu orientador e eu, se era factível criar uma linguagem visual que resultasse útil para representar qualquer modelo de negócio”, relembra. Após a defesa, Osterwalder publicou a tese na internet, como tantos fazem, mas sem muita esperança de que alguém se interessasse em ler um conteúdo acadêmico daqueles. Em pouco tempo, porém, ele teve uma surpresa. Começaram a baixar o documento incessantemente; tornou-se um equivalente do mundo corporativo para o fenômeno viral musical Justin Bieber. “Comecei a perceber que, em muitos casos, os que baixavam meu trabalho eram empresas e executivos, mas não fiz nada ”, recorda o autor. 30

Certo dia, uma companhia de telecomunicações da Colômbia que incorporou a metodologia de Osterwalder por meio da internet o convidou a dar um curso de capacitação e ele notou que havia demanda para o serviço. “Entendi, então, que valeria a pena escrever um livro sobre o tema e me associei a meu professor Yves Pigneur.” Juntos, publicaram, em 2010, o título que em português foi traduzido como Business Model Generation – Inovação em Modelo de Negócios. “Primeiro, reunimos tudo o que se falava sobre estratégia, projetos e como chegar ao mercado –lembro-me da enorme gama de conceitos pregados em meu escritório. O passo seguinte foi depurar o tema, identificar os conceitos obrigatórios quando se trata de modelo de negócio; reduzimos a lista a nove elementos. Alguns eram conceitos correntes para as pessoas, mas de outros quase ninguém falava.” O resultado foi que, apesar de os nove elementos conceituais usados não serem novos individualmente, a maneira integrada com que os analisaram foi inovadora. Antes de o livro ser apresentado oficialmente, contudo, Osterwalder e Pigneur resolveram testá-lo no mercado. “Isso é incomum, porque, em geral, as

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pessoas lançam a ideia primeiro e depois a testam para ver se realmente funciona. Mas nós demos um jeito de nos reunir, presencialmente e a distância, com 470 gestores e consultores de 45 países, para colocar nosso modelo sob seu escrutínio. Queríamos saber se o canvas lhes permitiria criar seus próprios modelos de negócio e entabular discussões melhores nas reuniões da empresa”, diz Osterwalder. A resposta veio em larga escala e eles aprenderam muito, modificando o produto final. O especialista perdeu a conta de quantas vezes ouviu comentários como: “Consigo descrever esse projeto muito bem, mas, para aquele, parece faltar algo”. O canvas do modelo de negócio foi submetido à prova várias vezes e finalmente lançado em 2010. E, embora a primeira impressão tenha sido de algo muito diferente de toda a literatura gerencial, os leitores o abraçaram.

Os nove elementos Em seu livro, Osterwalder e o coautor Pigneur desdobram os clientes, a oferta, a infraestrutura e as finanças de um modelo de negócio em nove blocos construtores essenciais, dos segmentos de clientes à estrutura de custos [veja a figura que os esquematiza e explica na página 28]. O livro traz ainda padrões de modelos de negócio, tipos de usuários mais frequentes e ferramentas de design que podem ser utilizadas complementarmente. Os padrões de modelos de negócio listados são cinco: negócios desagregados (uma organização tem três, por exemplo, e um é ba-

o workshop típico da bmg talvez se no transforme um dia do modelo de reunião cutir século 21, para dis , modelo de negócio tos estratégia e produ


O “canvas” do

modelo de negócio seado em relacionamento com os clientes, outro em inovação em produto e o terceiro em eficiência em custos), cauda longa (oferta de mais produtos de nicho e venda de quantidades menores), plataformas multilaterais (facilitam a interação entre diferentes grupos de consumidores), grátis (ofertas gratuitas são financiadas por outros clientes ou produtos –nesse caso, há o “isca e anzol”, em que o produto gratuito exige que se compre um complemento para ser usado) e modelos abertos (frutos de colaboração com parceiros externos e comunidades). Os personagens que devem ser envolvidos no uso do canvas são o executivo sênior (focado em estabelecer um novo modelo de negócio em um setor maduro), o intraempreendedor (ajuda a explorar os últimos avanços tecnológicos em conjunto com o novo modelo de negócio), o empreendedor (identifica necessidades não satisfeitas dos clientes e constrói modelos de negócio em volta delas), o investidor (investe nas companhias que tenham os modelos de negócio mais competitivos), o consultor (ajuda seus clientes a questionar o modelo de negócio existente e pensar em alternativas), o designer (encontra o modelo de negócio adequado a um produto inovador) e o empreendedor consciente (gera mudança social positiva por meio da inovação em modelos de negócio). Entre as ferramentas complementares aparecem insights dos clientes (usando um “mapa da empatia”), ideação (com perguntas do tipo “e se?”), pensamento visual (por imagens, rascunhos, diagramas e post-its), storytelling (narrativas para introduzir o novo, pensar o futuro, motivar e engajar pessoas), prototipagem (em diferentes escalas –no guardanapo, no canvas, com um case ou teste de campo) e cenários (descrevendo tipos diferentes de clientes ou panoramas futuros).

reunião pós-moderna Há muitas maneiras de pôr o canvas em uso, segundo seu criador. “Eu su-

aproprie-se da ferramenta, por rivadávia drummond Indiscutivelmente, o canvas de Alex Osterwalder e Yves Pigneur reduz a complexidade da literatura gerencial sobre modelos de negócio, que é particularmente árida, e funciona como uma excelente ferramenta para gerar nas empresas ideias novas e experimentação. Porém o gestor também deve ser capaz de criar seus próprios métodos de design ou adaptá-los das inúmeras ferramentas de design existentes, entre as quais o canvas. Elas esperam para ser apropriadas. Uma fonte de inspiração, por exemplo, é o livro Designing for Growth (ed. Columbia University Press), de Jeanne Liedtka e Tim Ogilvie. Conheci Jeanne em um workshop de design thinking na Darden School of Business e me encantei com sua modelagem de “quatro perguntas e dez ferramentas” que “costuram” três importantes perspectivas na resolução sistemática de problemas: humana (desejável), tecnológica (possível) e negócios (viável). Destaco ainda um recente trabalho do professor Vijay Kumai, do Illinois Institute of Technology, que compila 101 métodos ou ferramentas de design que podem constituir “auxílio luxuoso” ao processo empresarial de inovação –alguns já conhecidos, outros mais contemporâneos–, organizados em sete categorias: (1) Sense intent (construção de significado, compreensão da mudança, desenvolvimento e tendências). (2) Know context (contexto e circunstâncias). (3) Know people (compreender pessoas e stakeholders em suas interações cotidianas). (4) Frame insights (estruturar o aprendizado alcançado nas etapas anteriores). (5) Explore concepts (como um brainstorming para identificar oportunidades e explorar novos conceitos). (6) Frame solutions (construir as soluções desenvolvidas nas etapas anteriores). (7) Realize offerings (avaliação para a decisão de implementação). De alguns métodos o leitor nunca terá ouvido falar, e eu tive conhecimento só recentemente, nos cem dias como convidado da University of Hong Kong. São “offering-activity-culture map”, “eras map”, “POEMS, “asymmetric clustering matrix” etc. Por fim, busque refletir sobre as razões de a representação visual, o design e a inovação se (re)apresentarem com tanto vigor nos negócios. E crie sua ferramenta!

giro sempre imprimir um em tamanho grande, pendurá-lo na parede da sala e começar a completá-lo em conjunto com outras pessoas”, ensina. Se for o canvas de um modelo de negócio existente, conforme Osterwalder, prepare-se para a decepção: mesmo os mais experientes executivos da mais consolidada das empresas terão dúvidas no preenchimento. “Isso é compreensível, na verdade: em geral, cada pessoa é especialista em determinado campo, e muito poucos têm a imagem completa do que a organização faz.” Osterwalder descreve uma reunião hipotética: “Você deseja lan-

çar um produto no mercado. Chama para a sala de reuniões um grupo de seis pessoas, pendura quatro painéis vazios na parede para montar quatro modelos de negócio bem distintos para o produto: em um deles, é possível, por exemplo, imaginar um sistema sem custos fixos; em outro, simula-se que o produto seja grátis, como se fosse baixado na internet, e pensa-se como seria o modelo de negócio final para haver renda; e assim por diante. Em quatro horas de workshop, você terá um esboço de cada um para o mesmo produto”. O workshop típico da BMG talvez se transforme um dia no modelo de

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5 perguntas a osterwalder Inspirado na SAP, que criou um sistema para gerenciar as operações de uma empresa, Alex Osterwalder vem trabalhando no “SAP da estratégia”. Esse é um dos projetos em que está envolvido atualmente o criador do canvas, conforme conta a seguir,em entrevista exclusiva a Adriana Salles Gomes. Osterwalder estará no Brasil no Fórum HSM Inovação e Competitividade 2013, em agosto, para “mexer com os executivos, que tendem a ancorar-se nos modelos de negócio existentes, porque se sentem mais confortáveis fazendo o mesmo de sempre”.

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Quão diferente seu canvas é do pensamento do design de uma Ideo, por exemplo, ou de ferramentas visuais afins? Se é diferente ou não, não importa, essa é uma discussão acadêmica. O que realmente importa é se ele ajuda a comunidade de negócios a fazer um trabalho melhor. Você pode criar um conceito genial, mas, se os gestores não o adotarem em larga escala, provavelmente significará que ele não é suficientemente prático. Nossa equipe despende uma quantidade inacreditável de tempo e energia para fazer com que nossos conceitos sejam os mais simples e aplicáveis para os profissionais das empresas. E funciona, o que é comprovado pela venda de 750 mil cópias de nosso livro.

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A simplicidade é o que explica o sucesso da ferramenta? Meu time e eu acreditamos que toda ferramenta de negócios contém uma interface com o usuário e lhe proporciona uma experiência, exatamente como acontece com um website. Se você acerta nesses dois aspectos, as pessoas estarão mais dispostas a usar sua ferramenta. É claro que o conceito também precisa ser relevante, mas isso não significa apenas ser estimulante intelectualmente. Há muitos conceitos intelectualmente sofisticados que não são suficientemente relevantes no dia a dia dos gestores. Meu time e eu acreditamos que juntar negócios, design, pensamento visual e diversão pode tornar nosso trabalho mais acessível e mais relevante para a vida das pessoas.

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Vocês criaram a BMG para quem não gosta de ler? Vocês gostam de ler? Basicamente tentamos criar coisas que nós compraríamos. Na época, não havia no mercado nenhum livro visual, prático e inspirador sobre modelos de negócio; então, criamos um. Sobre eu gostar de ler, digo que não fico mais feliz com um conteúdo que seja apenas texto. Sinto-me atraído pelo pensamento visual, porque ele me ajuda a entender as coisas mais facilmente, e, às vezes, textos me desconectam. Sobre o gosto dos outros pela leitura, só posso especular: talvez a internet já tenha nos acostumado inteiramente à linguagem multimídia.

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Tem algo que você faria diferente em seu livro? Talvez um livro separado sobre o ambiente em que se insere o modelo de negócio, que é o tema dos últimos dois capítulos do livro, sobre estratégia e processos. Não porque eu ache que o resultado seria melhor, mas porque chamaria mais a atenção. A maioria das pessoas foca apenas o canvas do modelo de negócio, porém o contexto em que você desenha o modelo de negócio é tão importante quanto; não é possível desenhá-lo no vácuo.

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Quais são seus próximos passos? Estamos tentando fazer um software disso tudo, o SAP da estratégia –se conseguiremos isso, é outra história. Estamos construindo a Strategyzer.com, nossa startup de software. E sempre trabalhamos em duas ou três ideias de livro ao mesmo tempo. É difícil gerenciar as prioridades [risos].

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reunião do século 21. “Pense em quantas reuniões improdutivas são feitas em sua empresa. Isso acontece porque boa parte das reuniões visa discutir modelos de negócio, ou estratégia corporativa, ou novos produtos, e dificilmente consegue-se falar dessas coisas só na base da conversa”, explica o criador do canvas. É preciso visualizar –e cada coisa em seu lugar. A duração da sessão e o número de pessoas envolvidas variam, embora haja as premissas de fazer sessões concentradas e incluir profissionais de outrasfunçõeseolhares,paraenriquecero debate. Voltando aos exemplos da RBS, Diana Corrêa conta que, para o projeto novo, foram feitos dois workshops de duas horas cada um e compareceram oito pessoas, da PUC e da RBS –seis já faziam parte do grupo de pesquisa, mas duas eram novas, o que proporcionou insights interessantes. Já para discutir o produto a relançar, houve uma reunião de três horas com três participantes, um deles novato no tema. Às vezes, o período de tempo investido é mais longo. O consultor Francisco Albuquerque conduziu um workshop de oito horas com o grupo Systemcred/ Backseg, de empresas de recuperação de crédito e outsourcing de seguros, durante as quais se trabalharam três canvas: o do negócio, o do setor financeiro atual e o do futuro do segmento. Todo o time da alta gestão e área financeira se envolveu, e parceiros internos relevantes também foram convocados, segundo a executiva do grupo, Nilva Berzote. No caso do grupo SCR Tecnologia, por exemplo, houve várias sessões ao longo de nove meses.

reMÉDIO de prateleira O mundo empresarial é repleto de “remédios de prateleira” para a gestão, que costumam tratar os sintomas, mas ignorar as causas de uma doença. Como diz o professor e consultor Rivadávia Drummond, reitor do Centro Universitário de Belo Horizonte (UNIBH), é comum especialistas prescreverem soluções baseadas simploriamente em correlações do tipo “se um spin-off pos-


O “canvas” do

modelo de negócio sibilitou sucesso em uma nova unidade de negócios, se fizermos da mesma forma em todas, teremos sucesso em todas”. Segundo ele, também esquecem com frequência que problemas organizacionais não respeitam barreiras funcionais ou disciplinares. “Um problema de marketing raramente é só um problema do marketing, mas sistêmico”. Para Drummond, assim, não se acha a relação de causa e efeito. Esse caráter inadequado de remédio de prateleira vem sendo minimizado pela BMG, graças ao fato de o canvas ser preenchido caso a caso e muitas vezes por um grupo multifuncional de pessoas, ultrapassando barreiras organizacionais, o que faz com que o contexto e a contingência mencionados por Drummond sejam mais levados em conta. Como diz Diana Corrêa, “o canvas é um ponto de partida, não um plano imutável. É um conjunto de hipóteses que têm de ser testadas e que, certamente, sofrerão modificações”.

No entanto, Drummond alerta que é preciso refletir acerca dos limites de sua utilização, que vem acontecendo no Brasil de modo indiscriminado. Segundo ele, é preciso que as empresas se façam perguntas: quando a ferramenta não se mostra adequada? Por quê? Trata-se de um instrumento eficaz também para desenhar os processos que darão suporte ao recém-criado modelo de negócio? Apresenta a amplitude necessária para o aprofundamento da execução? É mesmo razoável usá-la para se pensar a estratégia ou a concorrência? Para Tennyson Pinheiro, especialista em design de serviços da firma de consultoria live:work, o interessante do canvas é induzir o pensar coletivo, por ser uma maneira de cocriar um business plan. “Basicamente, Osterwalder organizou as áreas do bom e velho business plan em um painel para que as pessoas as visualizem e consigam pensar juntas a seu respeito”, afirma. “O problema acontece, no entanto, quando os gestores começam a se apoiar demais na ferramenta, esperando que a combinação post-it e quadrantes resulte em inovação por si só. Apoiar-se demais em ferramentas, aliás, é um velho hábito da cultura corporativa e uma das causas de as organizações terem se debilitado criativamente ao longo dos anos”, enfatiza Tennyson. Para ele, o ideal é os inovadores desenvolverem suas próprias ferramentas, mesmo que estas tenham o canvas como ponto de partida.

“faça você mesmo” Questionado sobre se há o risco de a BMG repetir o que foi a reengenharia na década de 1990, como remédio para todos os males, Alex Osterwalder não hesita: “É apenas uma das muitas ferramentas disponíveis para os gestores. É curioso como, no campo da estratégia e da inovação, tende-se a promover uma bala de prata para resolver todos os problemas”. Ele garante: “Eu e meu time não acreditamos nisso”. O especialista em inovação cita como prova dessa postura seu “can-

“é curioso como, no e campo da estratégia -se da inovação, tende la a promover uma ba lver de prata para reso . todos os problemas eu e meu time não ” acreditamos nisso

vas das propostas de valor” e o “canvas de posicionamento de marca”, que ele criou como ferramentas “plugin” para ser adicionadas ao canvas do modelo de negócio com base nas necessidades dos clientes. “A ideia é incentivar que novas ferramentas sejam acopladas à BMG, seja pelos próprios usuários, seja por fornecedores como nós. Somos como ferramenteiros; planejamos criar muitas ferramentas nos próximos anos.” Essa lição parece estar sendo rapidamente aprendida pelo mundo empresarial, brasileiro inclusive: no grupo RBS, por exemplo, a intenção é pôr em uso, nos próximos meses, três novos canvas, segundo Diana Corrêa: “canvas de hipóteses”, “canvas de testes” e “lean canvas” –o último é dedicado ao empreendedorismo enxuto.

perigo na esquina Hoje, que empresas precisariam de canvas com mais urgência? Para Osterwalder, as de saúde, porque teriam entrado na fila das quebras de paradigma desde que surgiu o site 23andMe, que faz um mapa genético dos clientes em troca de uma amostra de saliva. “Um canvas talvez mostre que o importante não é mais o que faz o departamento de pesquisa e desenvolvimento da companhia, e sim o que ele faz com os dados do DNA das pessoas.”

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A entrevista, editada como texto corrido, é de Lizandra Magon de Almeida, colaboradora de HSM MANAGEMENT.

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Fotos: lolastudio.com.br

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Sul

contra Norte (e você está no Sul) Em entrevista exclusiva, o célebre coach de CEOs de multinacionais Ram Charan apresenta seu novo livro, Ruptura Global, que defende uma tese surpreendente: o domínio da economia está tendendo ao Sul, movendo-se da tríade Estados Unidos, Europa e Japão para os países que estão abaixo do paralelo 31

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ançado em 1887, o livro Norte contra Sul, de Júlio Verne, registrava, em forma de ficção, a realidade da Guerra de Secessão norte-americana, ocorrida entre 1861 e 1865, em que o Norte abolicionista combatia o Sul escravocrata. Quase 150 anos depois, há outra guerra, também econômica, documentada dessa vez em um livro de negócios: Ruptura Global, de Ram Charan. Quem toma a iniciativa da luta agora é o Sul –não dos Estados Unidos, mas do planeta Terra. A guerra é por empregos e

sinopse l

O mundo vive uma guerra por empregos. Nela, muitos países abaixo do paralelo 31 não mais se submetem aos princípios de livre mercado do Norte. Entre outros, China, Brasil e Índia criam as próprias regras e executam seus planos de crescimento com independência em relação a nações dominantes como os Estados Unidos. l Na visão do especialista Ram Charan, mais do que o mundo plano de Thomas Friedman e além da ascensão de alguns emergentes documentada pelo banco Goldman Sachs, a nova geografia que se está desenhando no mundo é polarizada entre Norte e Sul. l No novo cenário, os países do Sul enfrentam as empresas do Norte com suas estatais em condições vantajosas. E exigem contrapartidas de propriedade intelectual e transferência de tecnologia de nortistas que queiram acesso a seus mercados. O Sul está lutando para deixar de ser um eterno seguidor dos países líderes do Norte e ter empregos.

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a terminologia que caracteriza os combatentes muda: em vez de abolicionistas erguendo-se contra escravocratas, são seguidores rebelando-se contra líderes. Menos explícita e mais sutil do que o conflito de Verne, a guerra vista por Charan ainda está longe de ser admitida oficialmente. A fragmentação dos acontecimentos em curso também tira sua visibilidade para economistas, historiadores e imprensa, tornando-a mais fácil de perceber por quem atua no front microeconômico. Gestores a estão sentindo na pele, mas sem compreendê-la estruturalmente. Coube a Charan, que trabalha como coach de CEOs e consultor de multinacionais, sistematizá-la de modo pioneiro. Se ele estiver certo, a guerra por empregos do século 21 está apenas começando e vai deixar um longo rastro de mortos e feridos nos negócios. Entretanto, como em qualquer combate, muitos personagens têm chance de sobreviver. Assim como membros da família Burbank nos dois volumes de Norte contra Sul, os líderes de empresas aos quais se dirige Ruptura Global podem sair sãos e salvos do combate, segundo o autor, se agirem de maneira correta. Ram Charan falou com exclusividade a HSM Management sobre o novo livro, a ruptura que o mundo vem vivendo e as medidas que os gestores podem tomar. “De modo geral, o contexto é promissor para as empresas das nações abaixo do paralelo 31, mesmo havendo eventuais

Saiba mais sobre A RUPTURA DE CHARAN Em seu livro, Ram Charan define esquematicamente a ruptura em curso (o “global tilt”, no original em inglês): “1. Poder econômico dos países do Norte sendo transferidos para os que estão abaixo do paralelo 31 (que cruza China, Índia, Oriente Médio, Norte da África e México); 2. É a maior mudança da história dos negócios; 3. É um chamado para os líderes deixarem de lado os antigos paradigmas, princípios e inferências sobre o Norte e o Sul e a relação entre eles; 4. É o resultado de forças incontroláveis, incluindo as energias liberadas do Sul, mudanças demográficas, o sistema financeiro global volátil e as tecnologias digitais; 5. É a abertura de megaoportunidades para quem for capaz de lidar com complexidade, velocidade, volatilidade e incerteza; 6. É o estímulo a mudanças radicais no pensamento estratégico, liderança e sistema social da organização”.

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más notícias aqui e ali. Elas encontram muitas oportunidades de crescer”, resume ele. Porém faz questão de acrescentar um alerta: “Elas precisam, no entanto, ficar mais atentas, porque os ambientes de negócios se tornam bem mais instáveis, o que traz novas ameaças”. Na verdade, para o especialista, o maior erro que pode ser cometido no novo contexto é “demorar para agir”. Indagado se o protecionismo do Sul é aceitável, Charan apenas afirma que “a região está querendo garantir seu crescimento e receber investimentos que gerem tecnologia e que não só explorem mão de obra”.

PRINCIPAL ARMa: conhecimento “Agora, todo líder tem de compreender, para valer, os diferentes países e culturas em que sua empresa atua e também precisa mapear a movimentação entre eles”, afirma o especialista como recomendação principal. Se fosse dar apenas um conselho, Charan escolheria este: que os executivos se dediquem a entender o novo contexto multicultural em que passam a viver daqui por diante. Ao fazer essa declaração, Charan parece estar pensando principalmente no líder nortista, que é seu cliente habitual, mas ele insiste que também o líder sulista precisa esforçar-se para ampliar seus conhecimentos. No fundo, o líder sulista é bem informado sobre as economias do Norte, mas não sobre as outras do Sul. De fato, muitos líderes brasileiros tradicionalmente viram as costas para a América Latina e outras economias emergentes. De acordo com Charan, “todo líder precisa arrumar tempo para obter informações sobre os países. Deve estar disponível para criar redes sociais externas e também procurar pessoas que possam lhe dar esse conhecimento. E tem de ser bom em interpretar essas informações”.

conexão EXTERNA e VISão de longo prazo

Charan destaca que a instabilidade exige companhias muito mais flexíveis e ágeis do que estas são normalmente. “É necessário estar realmente conectado com as mudanças externas”, afirma ele. As empresas brasileiras podem saber fazer isso melhor do que as europeias, como diz o consultor, mas não tão bem que as deixe blindadas. Essa é uma mudança de hábito que todos os líderes empresariais têm de implementar. De acordo com Charan, o hábito mais difícil de mudar talvez seja o de priorizar os resultados de curto prazo. Isso precisa acabar. As empresas devem pensar principalmente em sua sobrevivência no longo prazo, sem se dobrarem às expectativas e à pressão dos analistas e investidores de bolsas de valores. Longo prazo não tem nada a ver, contudo, com cautela excessiva, segundo o especialista –ao contrário. “Há muitas empresas com dinheiro em caixa que não estão investindo e, no mundo atual, isso está longe de ser a melhor


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opção”, alerta ele na entrevista. “Os líderes têm é de saber que países são bons para investir, de acordo com a estratégia de crescimento da empresa. Toda empresa precisa ter uma estratégia de crescimento agora.” O mergulho nesse “mar de oportunidades” não pode ser adiado e, nas palavras de Charan, há “peixe para todos os gostos”.

capacidade de adaptação, mudança de olhar, apetite para riscos

Na prática, como um líder aprende a se adaptar a esse novo contexto? Charan enfatiza que ele deve desenvolver com urgência duas habilidades: • Olhar de fora para dentro. “O executivo precisa se sentar fora da empresa e também fora de seu país e observar ambos com um olhar desapaixonado, para realmente entender o que está acontecendo”, diz o consultor. • Olhar do futuro para o passado. “O executivo tem de projetar o que vai acontecer daqui a dez anos e, então, retroagir. Só assim ele terá ideia do que fazer em seguida. Muitas pessoas passam o tempo todo olhando para a história e, atualmente, isso não ajuda”, explica Charan.

educação no brasil: fraqueza ou futura força? Em seu livro, Ram Charan enfatiza a importância da capacidade de pensar no longo prazo, no novo cenário. Quando indagado sobre como desenvolver essa habilidade em um país como o Brasil, cujo sistema educacional tem graves deficiências, ainda longe de ser resolvidas, ele curiosamente questionou a premissa: “Por que longe de ser resolvidas? A educação é fundamental para qualquer país, o Brasil tem consciência de sua importância e está investindo nisso. O acesso à educação superior está aumentando, por exemplo; o governo está incentivando as pessoas a estudar fora. Se a educação infantil ainda deixa a desejar, isso mudará antes do que se pensa. É preciso desenvolver as pessoas que estão diretamente ligadas ao crescimento e ao desenvolvimento, e elas com certeza terão iniciativas para promover a educação infantil”.

Essas duas habilidades pedem que se desenvolva um apetite para riscos, algo que muitos CEOs e conselhos de empresas do Norte não costumam ter, conforme o especialista, e os de alguns países do Sul, como o Brasil, tampouco. Segundo Charan, o crescimento simultâneo da economia de vários países está transformando a expressão “larga escala” em algo jamais visto e de maneira muito rápida, e, para entrar nesse jogo, é preciso correr riscos. A boa notícia, válida para qualquer empresa, é que um risco hoje é mais compartilhado, uma vez que se pode contar com cada vez mais colaboradores, internacionais inclusive, até sem vínculos empregatícios –em vez de se limitar aos próprios profissionais.

durante a entrevista: “Sou um grande fã dos líderes empresariais brasileiros; são realmente excelentes e muito internacionais”. O consultor também vê com entusiasmo o trabalho de outros líderes e executivos de países do Sul, que demonstram muito mais disposição física e psicológica para enfrentar os desafios atuais do que os do Norte. O caminho em direção aos bens de maior valor agregado já começou a ser pavimentado no Sul, lembra Charan. “As coisas estão ficando muito interessantes, porque as empresas multinacionais com origem no Norte estão globalizando sua área de pesquisa, instalando-a no Sul”, Mais Pesquisa e desenvolvimento afirma. Seja por exigência dos governos locais, seja por Os países do Sul devem reduzir sua dependência da iniciativa própria, as grandes corporações vêm desloexportação de matérias-primas. “É preciso investir na cando seus cientistas para trabalhar ao lado de pesquisaprodução de bens com maior valor agregado e também dores locais. “Como existe um número muito grande de diversificar a carteira de exportações. Não é possível conpessoas talentosas no Sul, essa tinuar a se concentrar em exportransferência de tecnologia certar matéria-prima para a China, tamente vai ajudar seus países como tem feito o Brasil, por a desenvolver sua própria pesexemplo. Isso pode causar uma ram charan elogia os quisa”, afirma o especialista. grande instabilidade no futuro”, executivos brasileiros enfatiza o especialista. “O Brasil ainda vive um crescimento baiatenção às e diz que o país pode xo e precisa encontrar logo uma tendências impulsionar um novo forma de aumentá-lo.” Todos os líderes, incluindo os Charan faz questão, no ende pequenas empresas, devem equilíbrio entre os dois tanto, de declarar sua admiacompanhar seis tendências polos, norte e sul ração pelos líderes brasileiros para sobreviver, diz Charan:

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• O mundo está em uma transição inevitável para uma distribuição mais equânime de oportunidades e riqueza, instigada por um motivo irrepreensível: o desejo das pessoas de ter uma vida melhor. • Como o sistema financeiro global, que conecta as economias de todos os países, é altamente instável, a in-

certeza continuará na ordem do dia –por muito tempo. • A guerra por empregos deve tornar-se crônica. Os índices de desemprego tendem a diminuir, mas, como cada país quer fortalecer sua classe média e suas reservas financeiras, ninguém para de lutar e, assim, ninguém sai realmente vencedor.

a europeia BOREALIS FUNDE-SE COM UMA COMPANHIA DO ORIENTE MÉDIO

relata Charan -se m a R e o o livro d Norte aliand de certo d o a Este ex e empresa d l, como form m d u o S s tê s o o a d d c um ois la ação organiz nta como os d ncia. a m u a iê co ncia, e a exper resistê rmado com sfo se tran

Assim como oferece oportunidades, a mudança global expõe a empresa

BOOK EXCERPT: HSM EDITORA 44

a ameaças que, se não forem consideradas, podem limitar seu crescimento. A Borealis viu que seu futuro seria limitado: não havia oportunidades atraentes o suficiente na Europa e o controle de suas matérias-primas tinha mudado basicamente para o Sul. Ela não poderia planejar crescer sem lidar com esse limite. Empresas do Norte dominaram a indústria petroquímica desde seu nascimento, transformando o óleo bruto e o gás natural –as chamadas matérias-primas– em produtos químicos básicos que poderiam ser processados e convertidos em novos produtos, como tintas, plásticos, fertilizantes e fibras sintéticas. Mas, no início da década de 1990, quando a demanda por produtos petroquímicos aumentou, a escala, a capacidade tecnológica e o acesso à matéria-prima atraente tornaram-se vantagens cada vez mais importantes para atender às necessidades novas e emergentes dos clientes e, ao mesmo tempo, ser bem-sucedido em uma economia globalizada. As empresas europeias eram tecnologicamente proficientes, mas, como estavam um pouco fragmentadas, não tinham uma escala grande o suficiente e, além disso, careciam de oportunidades para obter uma matéria-prima a preços atraentes. A reestruturação e a consolidação começaram. Foi nessa época que a Borealis surgiu, agora com matriz em Viena, Áustria, quando duas empresas nórdicas combinaram seus interesses petroquímicos: a Neste, da Finlândia, e a Statoil, da Noruega. A Neste dominava a tecnologia para fazer poliolefinas, e a Statoil tinha acesso, a partir do Mar do Norte, ao etano, matéria-prima fundamental. Todavia, a entidade combinada precisava de maior escala e eficiência para ser competitiva em nível mundial; portanto, continuou a fazer fusões, a reduzir o número de locais e a aprimorar a tecnologia. Em 1998, a Borealis fundiu-se com a PCD Polymere, do grupo OMV da Áustria, para consolidar sua nova posição como o maior produtor de poliolefinas da Europa e o quarto maior do mundo. E, visionários ao reconhecerem a necessidade crucial de garantir o acesso a matérias-primas com preços atraentes, que eram limitadas na Europa, seus líderes começaram a procurar parceiros potenciais em todo o Oriente Médio e Ásia. Outros atores também se movimentaram no Oriente Médio, onde o petróleo e os fundos soberanos faziam uma potente combinação. Os gover-

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contra Norte

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• Os governos tendem a ajudar mais suas empresas, o que pode beneficiar, direta ou indiretamente, qualquer empresa (se você presta serviços a uma estatal, pode ganhar indiretamente com isso). Isso significa que oportunidades surgem do dia para a noite. • Empresas do Norte formam parcerias com empresas

do Sul como forma de luta, seja por conta de exigências governamentais de contrapartidas em termos de propriedade intelectual e transferência de tecnologia, seja por iniciativa própria. • A dinamização econômica do Sul deve gerar novos problemas ambientais provavelmente, que preocuparão

nos locais queriam controlar o valor do petróleo e do gás e buscaram várias formas de fazê-lo. Foi então que, em 1998, a Borealis e a Abu Dhabi National Oil Company (ADNOC) se encontraram e formaram uma joint venture para construir um “craqueador” de etano (que quebra moléculas complexas em outras mais simples) e duas fábricas para produzir polietileno, como parte de um complexo industrial chamado Borouge. A associação deu à Borealis a matéria-prima necessária, e a Abu Dhabi se beneficiou da transferência de tecnologia, criação de empregos e agregação de valor a sua abundante matéria-prima. Até aquela época, se você sobrevoasse o Oriente Médio, veria vários focos de chamas flamejantes saindo do topo das torres de petróleo, através dos quais os gases, que são o subproduto da extração de petróleo, queimavam a céu aberto. Esses gases são agora capturados, craqueados e, então, convertidos em polipropileno e polietileno –que são materiais sólidos de fácil transporte. O processo resolve um problema ambiental para Abu Dhabi e garante para a Borealis e a Borouge um insumo crítico por um preço atraente. Essas fábricas complexas exigem longos períodos de aprovisionamento (lead times) para se desenvolver e tempos ainda mais longos para funcionar de modo eficiente. A petroquímica Borouge entrou em operação em 2001 e, em 2008, estava produzindo 600 mil toneladas de polietileno por ano, somando-se aos 3,5 milhões de toneladas processadas na Europa. Em 2005, quando foram feitos planos para construir uma segunda fábrica (Borouge 2), visando adicionar 1,5 milhão de toneladas de capacidade, a OMV da Áustria ampliou sua participação acionária para 36%, enquanto a da estatal de Abu Dhabi International Petroleum Investment Company (IPIC) aumentou para 64%. O novo arranjo acionário não só garantiu que US$ 3,5 bilhões de capital “paciente” ficassem disponíveis para financiar a Borouge 2, como também mudou o centro de gravidade do antigo negócio europeu para o Oriente Médio. A produção da Borealis na Europa ainda superava a de Abu Dhabi, mas não seria por muito tempo. A Borouge 2 entrou em operação

em 2011, seguida de planos para o próximo projeto, a Borouge 3, para início em 2014. Será um total de 4,5 milhões de toneladas –versus 3,5 milhões da Europa. O insumo crítico de gás etano determinou onde a Borealis cresceria e, até certo ponto, a rapidez com que o faria, mesmo com a expansão em Abu Dhabi trazendo outros tipos de desafios. Sendo Abu Dhabi pouco povoada, a construção das fábricas Borouge requer muitos trabalhadores estrangeiros. Durante o pico da construção da Borouge 2, cerca de 23 mil empreiteiros estavam no local, o que exigiu um apoio logístico complicado para fornecer comida, água, moradia e até mesmo os banheiros necessários no meio de um deserto. Os projetos também demandam muito suporte técnico, vindo principalmente da Europa, para adaptar o layout das fábricas e as condições operacionais ao meio ambiente local. No deserto, as tempestades de areia são muito comuns e as temperaturas externas podem chegar a 54 ºC, bem distante das temperaturas abaixo de 4 ºC que as fábricas da Borealis têm de suportar em lugares como Finlândia e Noruega. Os planos de carreira dos engenheiros e especialistas de produção –em sua maioria, nascidos e formados na Europa– também mudaram. Eles tiveram de entender que progredir na empresa provavelmente significava viver no Oriente Médio e se preparar para adaptar-se à nova cultura. A empresa criou programas de treinamento para ajudá-los na adaptação. A mentalidade teve de ser mudada também, para se adaptar ao período de tempo de planejamento mais longo de Abu Dhabi. Como o CEO da Borealis, Mark Garrett, explica: “Na Europa, nos Estados Unidos e até mesmo na China, o ditado diz que tempo é dinheiro. Mas, no Oriente Médio, a filosofia é diferente. Eles dizem que o tempo está vindo para você, não fugindo de você. Essa é uma diferença crucial, especialmente quando você está sentado sobre 10% do petróleo do mundo. Pensando em longo prazo, não interessa a Abu Dhabi forçar seus campos de gás a produzir desenfreadamente. Eles creem que o melhor é um de­ senvolvimento estável e consistente ao longo do tempo. A Borealis não proporia nada que conflitasse com o melhor interesse de Abu Dhabi. Trabalhamos com nossos acionistas e com nossa parceira ADNOC”.

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entenda O olhar do norte No capítulo 5 de Ruptura Global, Ram Charan explica aos CEOs do Norte dispostos a desbravar os mercados do Sul quais são os cinco cuidados que devem tomar antes de empreender sua viagem. As recomendações são úteis para os líderes do Sul que queiram se defender das ameaças ou aproveitar as oportunidades –de parcerias, entre outras– representadas pela nova postura nortista. 1. Domine rapidamente o contexto local. É muito mais fácil para uma pessoa vinda da Índia, Brasil, China, Indonésia ou Nigéria se adaptar nos Estados Unidos ou Europa do que o contrário. Muitos executivos estudaram ou moraram em países do Norte, que também oferecem fontes mais seguras de informação e estatísticas. Por isso, o líder rumo ao Sul precisa ser um bom ouvinte e valorizar os profissionais locais, para entender como as decisões são tomadas e como as informações circulam entre todos os interessados, que vão desde as pessoas com quem ele trabalha diretamente até os fornecedores e as agências governamentais. “Evite a armadilha em que muitos líderes que saem dos Estados Unidos, Europa e Japão caem ao só se misturar a pessoas de seu próprio círculo social. Na maioria dos países do Sul, onde a informação pode ser enganosa e pouco confiável, você vai precisar se conectar com pessoas que possam interpretá-la inteligentemente e oferecer julgamentos precisos e de qualidade”, afirma Charan no livro. 2. Crie uma visão tangível. Para ser levado a sério em mercados tão diferentes, o líder precisa tornar sua visão tangível e saber comunicá-la. Ao criá-la, é necessário contar com a colaboração de pessoas-chave, em um processo de construir o comprometimento. “Para ser crível, deve haver marcos claros; visões grandiosas serão vistas como alucinações. Você deve comunicar sua visão incansável e repetitivamente, garantindo que os receptores entendam o conteúdo da maneira prevista e se comprometam com ele.” O líder tem de informar que serviços serão oferecidos, que infraestrutura será construída, que investimentos serão feitos, em que ritmo, com quais recursos e envolvendo que pessoas. 3. Desafie seus princípios básicos. Resiliência e flexibilidade psicológica são os requisitos fundamentais aqui, já que o líder precisa deixar de lado suas crenças mais arraigadas e abrir-se

tanto o Sul como o Norte. Esse tema nem é abordado por Charan em Ruptura Global, mas, na entrevista, ele admite a tendência de que isso aconteça e diz acreditar que criará uma série de oportunidades de negócios para empresas de todos os tamanhos.

Os líderes ficam mais importantes Charan lembra que, nesse novo contexto, cada vez mais serão as pessoas que vão tomar atitudes. “Isso fará com que as organizações deixem de concorrer entre si; os líderes é que vão competir uns com os outros. Eles é que vão 46

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radicalmente para aprender novos princípios, modificar alguns e eliminar outros. 4. Construa seu time. Para enfrentar os desafios da ruptura global em projetos que envolvem unidades em vários países, é preciso desenvolver uma equipe que funcione bem independentemente de função, país ou unidade de negócios. Isso porque a empresa tem de desenvolver escala e escopo globais, com uma equipe que crie valor e diferenciais competitivos. “Líderes que fazem isso bem são o que chamo de integradores globais –um novo termo para um novo tipo de líder. A habilidade de um integrador é construir confiança entre as pessoas de culturas e disciplinas muito diferentes. O que ajuda é trabalhar para garantir que eles saibam a meta final muito precisamente e tenham a mesma compreensão da informação, dados, fatos e contexto externo. Um integrador global trabalha com pessoas individual e coletivamente, despertando seu conhecimento e expertise na busca da solução correta e fazendo com que cada uma delas modifique sua visão para chegar a um denominador comum. Isso é trabalho repetitivo para um líder. Uma ação única não vai fazê-lo chegar até aí.” 5. Mobilize sua organização social. Segundo Ram Charan, executar qualquer visão, mudança ou iniciativa exige energizar as pessoas da organização e conduzi-las no sentido das ações específicas que devem ser tomadas. Para isso, é necessário: a. Garantir que a comunicação não tenha filtros e flua livremente. b. Simplificar o processo de tomada de decisão e responsabilidade. c. Conhecer os talentos naturais, experiências e opiniões das pessoas-chave o mais rápido possível, para que ocupem o lugar certo. d. Construir credibilidade e confiança fazendo o que se fala, compartilhando boas e más notícias, explicando claramente o raciocínio de suas decisões. e. Resolver qualquer tensão com a matriz, preparando-se para analisar e explicar riscos e possibilidades das ações nas quais está apostando. Os cinco conselhos comprovam que a capacidade de lidar com incertezas hoje é estratégica para posicionar um negócio na economia global.

tomar as atitudes e determinar o futuro das empresas.” A divisão que Charan está enxergando no paralelo 31, mesmo que não seja percebida estruturalmente, pode, de fato, transformar o mundo empresarial daqui por diante. E, segundo o especialista, o Brasil é uma das forças que podem impulsionar um novo equilíbrio entre os dois novos polos, além de fazer valer a máxima: “Onde há pessoas, há mais oportunidades”.

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Estudo brasil

Tanto candidatos a executivos como gestores atuantes estão reconhecendo mais lideranças empresariais em suas escolhas, especialmente por suas qualidades empreendedoras. É o que mostra a nova edição de dois estudos da Nextview e do Grupo DMRH/Cia de Talentos, publicados em primeira mão por HSM Management O artigo é de Lizandra Magon de Almeida, colaboradora de HSM MANAGEMENT.

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Os líderes mais admirados – 2013 (pelos jovens e pelos executivos)


1. Barack Obama 2. Eike Batista 3. Steve Jobs 4. Roberto Justus 5. Dilma Rousseff 6. Joaquim Barbosa 7. Bill Gates 8. Papa Francisco 9. Mark Zuckerberg 10. Lula

Quem entrou este ano:

Líderes que inspiram os executivos

Líderes dos sonhos dos jovens

top 10 Líderes mundiais 1. Steve Jobs 2. Barack Obama 3. Fábio Barbosa 4. Jack Welch

A

5. Eike Batista 6. Gestor/Ex-gestor 7. Bill Gates 8. Antônio Ermírio de Moraes 9. Fernando Henrique Cardoso 10. Pai e mãe

Quem entrou este ano:

• Joaquim Barbosa • Bill Gates • Papa Francisco • Mark Zuckerberg

• Jack Welch • Gestor/Ex-gestor • Fernando Henrique Cardoso • Pai e mãe

Quem saiu:

Quem saiu:

• Bernardinho • Silvio Santos • Gestor/Ex-gestor • Pai e mãe

• Bernardinho • Lula • Roberto Justus • Silvio Santos

1. Eike Batista 2. Roberto Justus 3. Dilma Rousseff 4. Joaquim Barbosa 5. Lula 6. Silvio Santos 7. Jorge Paulo Lemann 8. Bernardinho 9. Graça Foster 10. Flávio Augusto da Silva

Quem entrou este ano:

Líderes que inspiram os executivos

Líderes dos sonhos dos jovens

top 10 Líderes brasileiros 1. Fábio Barbosa 2. Eike Batista 3. Gestor/Ex-gestor 4. Antônio Ermírio de Moraes 5. Fernando Henrique Cardoso 6. Pai e mãe

reputação das lideranças brasileiras começa a melhorar. A empresa de pesquisas Nextview People, em conjunto com o Grupo DMRH/ Cia de Talentos, entrevistou mais de 60 mil pessoas, entre jovens recém-formados e estudantes e executivos brasileiros, para mapear quem inspira sua carreira. E os resultados mostram que líderes empresariais, nacionais e estrangeiros, finalmente começam a aparecer com destaque nas preferências, superando até lideranças políticas e celebridades dos anos anteriores. Passaram a integrar a seleção de líderes preferidos pelos jovens nomes como Jorge Paulo Lemann, Graça Foster e o jovem empreendedor Flávio Augusto da Silva. Os três, com diferentes origens, parecem ser citados não mais tanto por influência da mídia, como nos anos anteriores, mas por seu empreendedorismo e sua história de superação –ou seja, percebe-se a influência do storytelling na audiência. Lemann, um surfista e tenista altamente competitivo de uma família que valorizava os estudos, encontrou os parceiros certos e hoje controla grandes companhias norte-americanas, entre elas a maior cervejaria mundial,

7. Abilio Diniz 8. Silvio Santos

Sinopse

9. Bernardinho 10. Roger Agnelli

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Um número maior de dirigentes de negócios integra os rankings de líderes mais admirados por executivos e jovens do Brasil, superando políticos e celebridades.

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Características como empreendedorismo e histórias de superação de barreiras embasam as preferências.

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Jovens querem virar líderes corporativos logo; gestores sonham em empreender.

Quem entrou este ano:

• Joaquim Barbosa • Jorge Paulo Lemann • Graça Foster • Flávio Augusto da Silva

• Gestor/Ex-gestor • Fernando Henrique Cardoso • Pai e mãe • Roger Agnelli

Quem saiu:

Quem saiu:

• Gestor/Ex-gestor • Pai e mãe • Professor/Coordenador/Reitor • Abilio Diniz

• Lula • Roberto Justus • Dilma Rousseff • João Dória Jr.

Obs.: Os jovens entrevistados citaram 1.880 líderes, enquanto os executivos mencionaram 508. HSM Management 99 • julho-Agosto 2013 hsmmanagement.com.br

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Estudo brasil

Os líderes mais admirados – 2013 (pelos jovens e pelos executivos)

E A inovação? O fato de uma empresa e um líder serem inovadores é atraente para 95% dos executivos brasileiros. Essa questão foi incluída pela primeira vez na pesquisa com os gestores e as razões da atratividade foram explicitadas: • Mais desafios. • Necessidade de sobrevivência. • Maior oportunidade de crescimento na carreira. • Oportunidade de aprender mais. • Gosto pela mudança. Entre os 5% que rejeitam ambientes inovadores, os motivos para fazê-lo são falta de razão para mudar, instabilidade, insegurança e falta de planejamento.

a AB InBev. Flávio Augusto, com origem na classe média baixa, montou uma bem-sucedida rede de escolas de inglês para poder casar-se com a namorada, vendeu-a e reuniu uma fortuna de R$ 877 milhões –sua próxima aventura empreendedora é um time de futebol nos EUA [veja quadro na página 54]. Graça Foster, a todo-poderosa presidente da Petrobras, cresceu em uma favela carioca (Morro do Adeus, hoje parte do Complexo do Alemão) e chegou a catar papel e lata na rua para vender à reciclagem e assim custear seus estudos. De modo significativo, ela foi votada maciçamente pela parte feminina da amostra, como exemplo de superação de barreiras em um país onde a cultura empresarial ainda é vista como fortemente masculina. O empreendedorismo também explica por que Bill Gates e Mark Zuckerberg garantiram lugar entre os líderes mundiais admirados pelos jovens e, no caso de Gates, características pessoais como determinação e humildade –esta, transmitida em ações filantrópicas– também influíram. Na pequisa com os executivos, Roger Agnelli, ex-CEO da Vale, e Jack Welch, respectivamente nos rankings nacional e mundial, são as novidades. Agnelli agora tem o próprio negócio, a AGN Participações, companhia de investimentos especializada em commodities, fazendo a transição a empreendedor que muitos gestores desejam para si. Welch foi votado principalmente pelos gestores da geração X, que vêm incorporando funções mais complexas, e os relembra da vitória da simplicidade sobre a complexidade. 52

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“não admiro ninguém” Embora o cenário tenha ficado mais favorável aos líderes empresariais, ambas as pesquisas ainda revelam hesitação em apontar um líder digno de admiração. Entre os executivos, por exemplo, 52% não têm nenhum líder inspirador, nem mesmo um gestor que seja ou tenha sido seu chefe. Entre os jovens, o número é ainda maior: 54%. Os motivos, porém, diferem. Danilca Galdini, sócia-diretora da Nextview People e responsável pelas duas pesquisas, explica que, entre os jovens, isso se concentra nos de menor faixa etária e, além do desconhecimento, eles se queixam de que muitos líderes valorizam apenas o lucro e outros são corruptos. Já o fato de tantos profissionais de nível de gerência e diretoria não terem um modelo a seguir pode ser creditado à falta de indivíduos capazes de dar conta de todas as exigências desses cargos no dia a dia. “As respostas revelam uma angústia dos gestores, que, de um lado, sentem que precisam dar mais atenção a sua equipe e, de outro, são cobrados por resultados”, afirma Galdini. Os jovens cobram isso mesmo, como mostra o estudo com eles: suas exigências são de uma liderança quase heroica, mítica. “Os jovens veem que seus pais não estão em condições de orientá-los na carreira –muitas vezes, por desatualização profissional– e esperam dos chefes a capacidade de orientá-los. Só que esses líderes em geral não tiveram preparação para a gestão de pessoas”, pondera Galdini.


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FLÁvio augusto da silva: Do curso de inglês aos EUA Em 1995, aos 23 anos, Flávio Augusto da Silva criou a Wise Up, escola de inglês voltada para o público adulto. Os recursos –R$ 20 mil– vieram de seu cheque especial. No início deste ano, com fortuna estimada em R$ 877 milhões, o empreendedor tornou-se acionista do Grupo Abril Educação, que adquiriu a empresa e sua rede de franquias (com mais de 500 escolas, presentes no Brasil, Argentina, Colômbia, México, EUA e China). Também começou a investir em esportes, comprando um time de futebol em Orlando, Estados Unidos, para o qual pretende inaugurar um estádio em 2015 –em 2012, a liga norte-americana de soccer teve média de público em estádios 50% superior à da primeira divisão do Campeonato Brasileiro. Compartilhando suas experiências no Facebook e colocado entre os dez líderes brasileiros mais admirados pelos jovens na pesquisa Líderes dos Sonhos dos Jovens – 2013, ele falou com exclusividade a HSM Management sobre sua história e suas características de líder que empreende. Como sua trajetória empreendedora começou? Sou filho de uma típica família de classe média baixa do Rio de Janeiro: pai militar, mãe professora da rede pública, sempre estudei em escola pública. Em minha adolescência, nunca pensei que seria um empreendedor; quase me tornei oficial da Marinha –passei dois anos no Colégio Naval. Então, fui estudar ciência da computação na Universidade Federal Fluminense (UFF). No início do curso, comecei a fazer um “bico” em uma pequena escola de inglês no centro do Rio, para ajudar a pagar o cinema e os passeios com minha namorada, Luciana, hoje minha esposa. Eu tinha 19 anos e ela, 16. Não imaginava que o “bico” seria a porta de entrada para essa jornada empreendedora –que já dura mais de 18 anos–, nem sonhei que chegaria tão longe. A que você atribui o sucesso que inspira os jovens? Eu queria muito me casar com a Luciana [risos] e isso me impulsionou a trabalhar forte para cumprir as metas que a empresa propunha –e que, eu acreditava, dependiam apenas de mim. Eu me lembro com carinho do trabalho na área comercial da escola, quando comecei a sonhar com um crescimento profissional e financeiro, porque a empresa oferecia um plano de carreira meritocrático. Dois anos depois, nós nos casamos, eu com 20 e ela com 17. Eu ainda estava aprendendo a lidar com minhas emoções, a administrar ansiedades, e descobrindo o que são perseverança e determinação nessa primeira experiência profissional,

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mas, a partir daí, também comecei a desenvolver habilidades de liderança. Treinava novos vendedores e era responsável por uma equipe de 20 gerentes. Tornei-me diretor comercial com apenas 21 anos de idade. Era tudo o que se podia considerar um emprego desejável do ponto de vista convencional, e acabou sendo a base perfeita para desenvolver meu empreendedorismo. Hoje tanto jovens como executivos pensam em investir em negócios próprios. O que você considera necessário para empreender no Brasil hoje? Que características você acredita que um empreendedor precisa ter? Eu tive a felicidade de nunca ter tido um emprego tão bom do qual pudesse ter medo de pedir demissão para iniciar um negócio próprio. Mas, para quem já é um executivo e está em uma situação aparentemente estável, do tipo “zona de conforto”, o primeiro elemento básico é ter uma visão. Para começar, uma visão de si próprio e de sua capacidade, e também uma visão do mercado. Com isso, não faltarão oportunidades de empreender; elas estão por todos os lados no Brasil, uma economia com sede de consumo e com grande carência de produtos e serviços inovadores e com valor agregado. É necessária visão para sair do


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óbvio. O segundo elemento é ter coragem –abandonar a zona de conforto para se lançar em “carreira solo”, enfrentar a burocracia e os impostos elevados. E o terceiro elemento que considero fundamental é a competência para implementar as ideias, que, do contrário, ficarão engavetadas no arquivo morto das impossibilidades. É interessante observar nas pesquisas que todos, tanto jovens como executivos já em atuação há vários anos no mercado, estão em busca de autonomia, de fazer-se ouvir, de colocar em prática suas ideias. O que você diria a respeito da geração atual e seu contexto de atuação? Essa nova geração tem a sua disposição as redes sociais, onde pode livremente dizer o que pensa. Somos testemunhas oculares das profundas mudanças que vivemos na sociedade, nos meios de comunicação, na forma como se faz publicidade, no fluxo e na velocidade das informações e em como novos players estão abraçando oportunidades que outros consideram ameaças. A internet é a protagonista desse movimento e um grande manancial de oportunidades. Como você vê a escolha de seu nome para a pesquisa? Não sou uma pessoa pública –artista ou político. Sou um empresário e somente posso atribuir essa escolha ao trabalho que realizo nas redes sociais, onde há dois anos procuro colaborar com jovens que estão iniciando a carreira, compartilhando parte de meu conhecimento, produzindo conteúdo voltado para negócios e principalmente sobre como pensam, agem e reagem os empreendedores diante dos desafios de seus negócios. De lá para cá, de forma surpreendente, mais de 1,1 milhão de pessoas acompanham esse conteúdo em nossa página no Facebook. Essa escolha para mim significa uma mensagem vinda desses jovens talentosos: “Obrigado!”. (Lizandra M. Almeida)

Para os jovens, um líder deve conhecer profundamente cada subordinado, orientá-lo na carreira e ajudá-lo nas tarefas do dia a dia o que os jovens esperam A pesquisa dos líderes dos sonhos dos jovens, em sua 12ª edição, foi realizada com 52.252 jovens universitários e recém-formados de 17 a 26 anos, dos quais 58% mulheres e 42% homens. Do total, 78% ainda são estudantes e 22%, recém-formados. Sua primeira conclusão é que, para quem está ingressando no mundo do trabalho, um bom líder precisa ter os superpoderes de conhecer profundamente cada um dos colaboradores, ajudando-os na execução das tarefas do dia a dia e na orientação de sua carreira. Ao mesmo tempo, deve permitir que o profissional “faça as coisas do seu jeito”. Conforme se sucedem as pesquisas, os jovens consideram a capacidade de gerir pessoas mais importante em um líder. Segundo Galdini, em 2009 as respostas valorizavam o líder que tinha conhecimento técnico; em 2011, conhecimento técnico e habilidade com pessoas se equiparavam; e, desde o ano passado, a concentração nas pessoas se tornou predominante. Vale dizer que são sobretudo as mulheres que privilegiam o bom tratamento às pessoas: no recorte feminino dos rankings, quem lidera é Fábio Barbosa, ex-CEO dos bancos Santander e Real e atual presidente-executivo da Abril S.A., conhecido por suas práticas na área; também entre elas sobressaem os líderes próximos, como os pais e os chefes, e, entre suas preferências, aparece o diretor do Bradesco Luiz Fernando Lavor Coelho, pelo fato de esse banco ser identificado com uma grande família. A necessidade de feedback é outra questão sensível: o jovem quer o tempo todo saber do líder se está no caminho certo. Por isso, a comunicação e a transparência são fundamentais. “Como preferem a meritocracia, eles não querem um chefe do tipo ‘amigão’ ou paternalista. Mas ficam insatisfeitos se não souberem o que está por trás das atividades que desenvolvem; desejam conhecer as motivações da empresa e ver propósito em seu trabalho”, continua a especialista da Nextview, acrescentando que líderes jovens costumam ser especialmente valorizados por falarem a mesma língua deles. Assim como na pesquisa do ano passado, os jovens entrevistados não veem um líder como modelo de vida, e sim como representante de determinada característica que eles valorizam; é o que Danilca Galdini chama de “líder customizado”: “Como hoje temos acesso a todos os detalhes da vida das pessoas, elas são eleitas por um aspecto específico, e o desagradável, se houver, fica em segundo plano”.

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Os líderes mais admirados – 2013 (pelos jovens e pelos executivos)

Estudo brasil

Entre essas características, as que mais sobressaem são o empreendedorismo e a capacidade de inovar, apontadas como o motivo da escolha de 26% dos jovens. Atributos pessoais como determinação, disciplina e humildade aparecem em segundo lugar, com 18% das escolhas, e justificam, por exemplo, a inclusão do papa Francisco no ranking deste ano. O terceiro ponto é a clareza sobre aonde se quer chegar, com 14% das respostas. Na quarta e quinta posições ficam a causa defendida pelo líder (com 13% das menções) e sua capacidade de superar barreiras e vencer preconceitos (com 10%). Esses itens explicam os votos dos jovens no ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, estreante no ranking, e também na presidente Dilma Rousseff, que foi votada sobretudo por mulheres.

Para os executivos brasileiros, o que é ser um líder inspirador?

as expectativas dos executivos A pesquisa sobre os líderes que inspiram os executivos fez parte de um estudo que está em sua segunda edição e foi respondida por 4.194 profissionais em cargos de gerência, diretoria e presidência, dos quais 73% homens e 27% mulheres, com idade de 33 a 68 anos ou mais. Concentrados na região Sudeste (82%), são executivos de empresas de grande porte, brasileiras e multinacionais, em 64% dos casos. Além de ter procurado mapear as características de um líder inspirador aos olhos dos executivos, a pesquisa buscou saber também o que eles pensam sobre empreendedorismo. Esses gestores desejam, em primeiro lugar, ter mais autonomia. Espaço para suas ideias, possibilidade de ascensão profissional e trabalhar em uma empresa afinada com seus valores parecem ser exigências latentes em todo o espectro da carreira empresarial. A pesquisa dos executivos detectou, contudo, que, mais do que ascender na carreira corporativa, 60% 56

É bom ouvinte: escuta os liderados e fica atento a suas necessidades. É coerente: o discurso corresponde à prática e vice-versa. É confiável: estabelece uma relação de confiança com as pessoas. Tem visão de futuro: tem um objetivo para amanhã e projeta novas tendências e possibilidades. É referência: é um exemplo a ser seguido. É desenvolvedor de pessoas: ajuda no desenvolvimento de seus liderados, sendo, por vezes, coach e mentor. É motivador: incentiva as pessoas, faz com que elas se sintam integrantes da equipe e gerem resultado.

deles desejam ter o próprio negócio –e 16% já o têm em paralelo a seus cargos empresariais. O índice é superior ao de 2012, quando 51% dos entrevistados diziam desejar abrir a própria empresa. Não à toa: para 36% dos executivos, a necessidade de entregar resultado a qualquer preço é muito desagradável. Os principais motivos apontados para empreender são a independência, a possibilidade de tomar as próprias decisões quanto ao rumo de sua vida e carreira e ter estabilidade financeira. Além disso, o desafio do empreendedorismo e as oportunidades que este pode abrir também motivam os executivos a considerar a ideia. Indagados sobre a atividade profissional caso não empreendam, 36% afirmam ter como objetivo investir em sua carreira atual, enquanto 30% pretendem conciliá-la com outras atividades, como dar aulas ou atuar no terceiro setor. Para melhorar seu desempenho, confiam especialmente em programas

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Os líderes mais admirados – 2013 (pelos jovens e pelos executivos)

Para os jovens, o que é liderança?

Um ato de influenciar pessoas: para os jovens, liderança está associada a gestão de pessoas e, para ser um bom líder, é preciso conhecer a equipe. Uma atitude e não uma posição: para exercer a liderança, não é preciso ser chefe/gestor. Um colega pode fazer esse papel quando consegue mobilizar e influenciar as pessoas. Um exemplo: o líder é um modelo a ser seguido, uma referência. Um conhecimento técnico: para liderar, é preciso saber orientar tecnicamente.

de coaching e também em cursos. Do total, 61% pretendem continuar na empresa em que atuam. Os 39% que dizem ter vontade de buscar novos caminhos alegam como motivos, principalmente, a falta de oportunidades de crescimento e a não aderência aos valores da empresa.

quem quer ser líder (e quem vai segui-lo?) Se os executivos desejam ser empreendedores, os estudantes e recém-formados querem se tornar líderes corporativos; essa é, para eles, a tradução do sucesso profissional. E querem fazê-lo rapidamente: eles se consideram prontos a assumir um cargo de chefia apenas dois anos depois de formados. Gerenciar uma equipe e desenvolver pessoas, canalizar a energia delas para um objetivo e compartilhar um ideal são alguns dos motivos citados. Segundo Galdini, o prazo de dois anos tem a ver com parâmetros estabelecidos nos programas de trainee de grandes empresas, que duram de 18 a 24 meses e hoje balizam a jornada de sucesso. Muito poucos enxergam possibilidade de êxito em uma carreira de especialista. Para a diretora da Nextview, isso acontece porque a maio58

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ria dos cursos universitários tem abordagem voltada para a liderança, especialmente nas áreas de humanas e exatas. Tanto que, na pesquisa, 61% dos alunos de biológicas não manifestaram vontade de se tornar líder, área em que o papel do especialista parece fazer mais sentido. Uma questão que surge a partir desse desejo pela liderança é: com tantos líderes, quem vai executar as tarefas? “Certas empresas começam a falar em carreira Y; algumas poucas já a disponibilizam, mas ainda não é algo realmente disseminado. Essa é uma questão premente diante da escassez de mão de obra especializada. A imagem que se tem é que o estratégico tem valor, enquanto o trabalho operacional é alienado. Ao mesmo tempo, os jovens valorizam o líder que veio do operacional. É uma questão que as empresas precisam abordar”, acredita a especialista da Nextview.

autoconhecimento, seleção e recrutamento

A urgência de fazer valer seus próprios ideais, tanto entre os executivos como para quem está começando a carreira, talvez se deva à realidade cotidiana das empresas. “A grande queixa é a falta de uma proposta de valor coerente e exercida na prática”, afirma Galdini. Se há saída? Ela acredita em duas: (1) Por parte do profissional, maior autoconhecimento, já que nem sempre as pessoas que desejam ser empreendedoras ou líderes têm as habilidades necessárias para isso. (2) Por parte da empresa, o ponto crítico é o processo de recrutamento e seleção. “É preciso ter coragem para contratar pessoas com o perfil adequado.” A saída está na entrada. HSM Management


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