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Agricultura Familiar no BNDES: Por uma Política Estratégica A produção de alimentos no Brasil passa diretamente pela agricultura familiar, que, ao contrário do agronegócio, se concentra para a produção de consumo doméstico. Embora o campesinato e a agricultura familiar ocupem só 24,3% das terras agrárias, cerca de 60% dos alimentos consumidos pela população brasileira são produzidos por agricultores familiares. No Brasil, a agricultura familiar é responsável pela produção de 87% da produção nacional da mandioca, 70% da produção do feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz, 21% do trigo e, na pecuária, 60% do leite, 59% do plantel de suínos, 50% das aves e 30% dos bovinos. Dentro desse contexto, se torna fundamental o incentivo de políticas de auxílio a essa produção, que possui uma grande dificuldade devido à forte concorrência com a agricultura para a exportação, assim como ações dirigidas a apoiar o seu crescimento, seja através de créditos e ou subsídios. Recentemente, além dos tradicionais créditos e fundos governamentais, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tem começado a destinar recursos específicos para agricultura familiar, oferecendo créditos, seja de maneira individual ou através de cooperativas a pequenos agricultores. Serão estes aspectos sinais de mudanças nas prioridades do financiamento do Banco? Poderíamos pensar na existência de uma linha de financiamento nova para agricultura familiar? Estas e outras questões tentaremos responder nesse trabalho, que tem como objetivo analisar o papel desempenhado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no processo de incentivo à agricultura familiar no Brasil, através da análise dos recursos desembolsados para esse setor. Agradecemos ao Movimento Sem Terra (MST) pela discussão e o debate.
Apoio:
Foto: Marcos Nunes
Foto: Marcos Nunes
Foto: Gilvan Barreto / OXFAM
Nº 2 | Outubro 2013
BNDES e a Agricultura Familiar
1. Introdução Segundo o último Censo Agropecuário do país, referente a 2006, um total de 4,4 milhões de estabelecimentos foram classificados pelo IBGE como sendo de agricultura familiar, o que corresponde a 84% do total de estabelecimentos agropecuários. Naqueles estabelecimentos havia 12,3 milhões de pessoas, o que corresponde a 74% das que ocupam o total de estabelecimentos na área rural. Menos expressiva é a participação no valor da produção agropecuária, sendo que, pelo Censo Agropecuário de 2006, correspondeu a 38% do total, tendo maior destaque através de alguns alimentos básicos, como feijão, leite e mandioca. Estes dados revelam características gerais da agricultura familiar no Brasil: larga superioridade no número de estabelecimentos e pessoas que vivem dessa atividade na agricultura familiar e possuem grande importância no papel da produção de alimentos para o mercado interno mas perdem na comparação com o valor da produção para os estabelecimentos ligados ao agronegócio, que se volta principalmente para a exportação. Embora existam muitas definições para a agricultura familiar no Brasil, a caracterização oficial adotada é estabelecida pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), que indica os seguintes requisitos em sua legislação: que sejam proprietários, posseiros, arrendatários, parceiros ou concessionários de Reforma Agrária; que residam na propriedade ou em lugar próximo; que possuam até quatro módulos fiscais de terra, ou no máximo seis módulos se forem dedicados à atividade pecuária; que 80% da renda bruta anual familiar seja resultante de atividade agropecuária ou não agropecuária - mas realizada dentro do estabelecimento e que mantenha até dois empregados permanentes - com possibilidade eventual de ajuda de terceiros. Assim, a Agricultura Familiar está longe de se constituir em um todo homogêneo, possuindo grande diversidade não só regional, mas inclusive diferenciando-se no seu grau de capitalização. Ela agrega desde agricultores muito pobres, desprovidos praticamente de qualquer renda, até agricultores familiares bastante capitalizados, geralmente exercendo atividades integradas com o agronegócio e/ou com a indústria. É importante assinalar que neste momento em que o país realiza um esforço para a erradicação da chamada “pobreza extrema”, as políticas públicas voltadas para os mais pobres necessitam ter um foco voltado para os agricultores familiares que se encontram nessa condição. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2011, um total de 7,6 milhões de pessoas que vivem na área rural brasileira tinha como renda R$ 70 mensais, per capita, na família, o que os colocava na condição de pobreza extrema, segundo o critério adotado pelo governo brasileiro. Esse grupo representava 25% da população rural e 47% da população mais pobre no país. Parte deles, classificados enquanto agricultores familiares, embora seja expressivo neste total os trabalhadores rurais sem terra e suas famílias, as populações tradicionais e aqueles que exercem atividades de baixíssima remuneração. O exercício da atividade agrícola, para gerar renda Operações Diretas ou mesmo prover para o autoconsumo dos bens necessários aos agricultores familiares, exige investir na etapa anterior BNDES Agropecuária - 2012 da produção, na colheita e na comercialização. O mesmo 13% vale quando a atividade é pecuária. Ao lado disso, estas atividades são cercadas de riscos naturais e daqueles provenientes do mercado, que podem impedir a realização 20% do empreendimento. Por isto, o financiamento da atividade da agricultura familiar é componente essencial nesse processo. Historicamente, a obtenção de crédito pela agricultura familiar sempre foi limitada, sobretudo se comparada com o que foi disponibilizado para a grande produção. O motivo principal para essa dificuldade foi, 67% evidentemente, a diferença na força política entre as duas partes. Isso, agravado pelo fato de que muito frequentemente os agricultores familiares não dispõem das garantias que são exigidas pelos órgãos financiadores, além de não terem Grande Empresa MPME um histórico enquanto tomadores de crédito. Falta-lhes Adminstração Pública Direta ainda, em várias circunstâncias, a informação sobre essa Fonte: Elaboração própria com as operações declaradas pelo “BNDES Transparente” no ramo de atividade ‘Agropecuária’ possibilidade. e na área de Agricultura e Inclusão social
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Série - BNDES Sem Segredos Nº 2
Diante disto, a criação do Pronaf - que foi fruto da mobilização e reivindicação de movimentos sociais do campo representou significativo passo na direção do acesso ao crédito, por parte da agricultura familiar.
O decreto que o constituiu, em junho de 1996, definiu como seu objetivo “promover o desenvolvimento sustentável do segmento rural constituído pelos agricultores familiares, de modo a propiciar-lhes o aumento da capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria de renda”. Também ficou definido que os recursos por ele utilizados seriam provenientes de diversas fontes, públicas ou privadas, a serem operadas por distintas instituições. Na trajetória do programa ocorreram muitas variações na participação das diferentes fontes. De início, contou apenas com um percentual dos recursos obrigatórios relativos aos depósitos bancários à vista, mas foi gradativamente acessando outras fontes, como o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), a Poupança Rural, recursos próprios de bancos cooperativos, recursos ordinários do BNDES, Fundos Constitucionais e recursos do próprio Orçamento Geral da União. Desta maneira, é preciso perceber que a diversidade de fontes que alimentam o programa gera, também, um conjunto de dinâmicas muito peculiares. O Pronaf Custeio, destinado a financiar a safra agrícola anual, sempre liderou o montante financiado, bem como o número de contratos firmados. A ampliação, em 1997, para as áreas de investimento, infraestrutura e serviços municipais, entre outros trouxe nova dimensão para o programa. Uma marca do Pronaf, em toda a sua trajetória, foi a variação nos valores médios dos contratos entre as regiões do país e, de forma mais acentuada, entre as unidades da federação, o que reflete os diferentes sistemas de produção e os diversos produtos apoiados pelo programa. Mas também se registrou e ainda se conserva um forte desequilíbrio espacial, com um maior número de contratos beneficiando sobretudo os estados do sul do Brasil, não só pela maior expressão de uma agricultura familiar com um perfil mais associado às operações de financiamento, como pela força do movimento sindical e associativo das regiões mais ricas. Adicionem-se, ainda, as exigências para o acesso ao Pronaf. Uma vez decidido pelo agricultor familiar buscar o financiamento, ele precisa obter a Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), elaborar um projeto técnico e procurar um agente financeiro, munido do DAP e do projeto técnico, que será avaliado pelo agente, para então ser concedido o crédito. Mas é preciso reconhecer que foram aplicadas, desde o início do programa, diferentes resoluções que afetaram as diversas modalidades e que algumas delas se voltaram para permitirem maior acesso ao crédito pelos agricultores mais necessitados, o que não necessariamente significou a superação da baixa participação daqueles menos capitalizados. No primeiro Plano de Safra da Agricultura Familiar (2003/04), lançado pelo governo então empossado em 2003, criou-se um conjunto de novas modalidades, que ampliaram em muito a abrangência do programa. Surge, então, o Pronaf Alimentos, para estimular a produção de arroz, feijão, mandioca, milho e trigo; o Pronaf Pesca, para apoiar os pescadores artesanais; o Pronaf Agroecologia, visando apoiar a produção familiar que não utiliza insumos químicos e aqueles que estão em transição para um modelo agroecológico; o Pronaf Turismo Rural; o Pronaf Mulher; o Pronaf Jovem Rural; o Pronaf Semiárido e o Pronaf Máquinas e Equipamentos. O crédito rural do Governo Federal, através do Pronaf, já está presente em 95% dos municípios brasileiros. No ano-safra 2011/2012 foram disponibilizados R$ 16 bilhões para o Pronaf. Desse total, foram financiados R$ 13,5 bilhões com mais de 1,2 milhão de contratos. Para o ano-safra 2012/2013 estão disponibilizados R$ 18 bilhões, em diversas modalidades para custeio e investimento. Associado à expansão do volume de recursos oferecidos, ocorreu uma gradual redução das taxas de juros praticadas no programa, aumentando a atratividade do programa. 3
BNDES e a Agricultura Familiar
PRONAF - Valor Financiado e Número de Contratos Anos-Safra 1995-1996 a 2009-2010
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Valor Financiado (em R$ bilhões)
2.000
8
1.500
6
1.000
4
500
2
Nº de Contratos (em mil unidades)
2.500
12
0 0 95/96 96/97 97/98 98/99 99/00 00/01 01/02 02/03 03/04 04/05 05/06 06/07 07/08 08/09 09/10 Valor Financiado
Nº de Contratos
Fonte: Base de dados do Crédito Pronaf - SAF/MDA
É importante entender que a expansão do Pronaf, que se intensificou desde 2003, mantendo seu crescimento a cada ano safra seguinte, se dá no contexto de uma política pública voltada, de fato, para o fortalecimento da agricultura familiar, no sentido de sua modernização e autonomia. Não se trata, assim, de mera consequência do crescimento econômico do país.
2. O BNDES no Financiamento à Agricultura Familiar 2.1. PRONAF
Desde a criação do Pronaf, o Considerando a forma como o BNDES BNDES foi um dos agentes financeiros opera o Pronaf, de sua criação até o de maior destaque para o crédito de investimento para a agricultura presente, verificou-se um conjunto amplo familiar. A fonte dos recursos aplicados de modificações, desde aquelas referentes nesta modalidade de financiamento às linhas de financiamento contempladas era originária do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), formado através das pelo Banco, passando pelas instituições contribuições ao Programa de Integração financeiras repassadoras de recursos e os Social (PIS) e ao Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público valores desembolsados. (PASEP). Observe-se, que dos recursos do montante arrecadado com esses dois programas, 40% são emprestados por determinação constitucional ao BNDES. O BNDES atua com o Pronaf desde o ano-safra 1996-1997, quando o programa foi iniciado. 4
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Mas, até 2007, o BNDES atuou somente com o crédito de investimento. Nesse período, as famílias potencialmente beneficiadas foram aquelas de maior renda, já que o banco não operou com as linhas 1 2 destinadas aos grupos A e B , de mais baixa renda. Presentemente, no crédito de investimento, o banco atua com diversas linhas, como Agroecologia, Agroindústria, Cooperativas, Energia Renovável e Sustentabilidade, Mais Alimentos e Mulher. Ressalte-se, também, que no processo de acelerada expansão do programa, nos últimos anos, a contribuição do BNDES foi significativa na ampliação dos recursos. No que se refere aos recursos utilizados pelo banco, o montante oriundo do FAT pode servir de fonte para o Pronaf, bastando para isso que a diretoria do BNDES assim o defina. Mas essa decisão, evidentemente, não se dá no espaço estrito do banco, sendo determinada em grande medida por orientação do governo federal. Como os juros pagos pelos mutuários do Pronaf são menores do que a taxa de remuneração do Fundo (TJLP), a decisão do BNDES também passa pelos valores equalizáveis do Tesouro Nacional. Observe-se que, com o impulso que foi dado ao programa a partir de 2003, ocorreu uma alteração significativa em relação ao FAT, que perde sua importância enquanto principal fonte do Pronaf para outras, além da incorporação de uma nova fonte, a poupança rural. Esta última tem um custo de captação superior ao retorno propiciado pelas linhas de financiamento do Pronaf e seu uso só é possível devido à portaria do Ministério da Fazenda que equaliza seus encargos Em 2008, o Banco começou a financeiros. Por outro lado, os gastos com operar o Pronaf Custeio. Na safra 2009seguro-desemprego e abono salarial subiram acentuadamente, como resultado da crescente 2010, a participação do BNDES no total formalização do mercado de trabalho no de recursos do programa chegou a 9%. Brasil e do aumento real do salário mínimo. No BNDES, a drástica redução dos repasses do FAT Na atual safra já chega a 15%, com R$ foi compensada, na operação do Pronaf, com 384 milhões para o custeio e R$ 1,2 bilhão recursos ordinários, inclusive aumentando para o investimento. significativamente os valores repassados.
PRONAF - Valor Financiado por Fonte de Recursos Anos-Safra 1995-1996 a 2009-2010 (em R$ milhões) Ano-safra
BNDES
FAT-DE
Fcs
Recursos Obrigatório
Poupança Rural
OGU
RPE
1995 – 1996
443 225 350 197 271 130 86 174 111 123 240 549 844 968
140 601 1029 1166 1563 1169 1355 1615 1339 827 3263 2647 1329 313 0.7
0.01 3 98 124 271 216 156 256 652 1343 2090 1700 1663 2007 1660
167 126 210 177 208 297 155 39 307 1525 1859 3577 3932 2914 1362
835 0.1 1654 4525 6761
0.003 246 381 329 1165 2178 223 406 371 425 403
16 68 95 104 175 67 93 59 0.5 431.2 0.3
1996 – 1997 1997 – 1998 1998 – 1999 1999 – 2000 2000 – 2001 2001 – 2002 2002 – 2003 2003 – 2004 2004 – 2005 2005 – 2006 2006 – 2007 2007 – 2008 2008 – 2009 2009 – 2010
Outros
77 70
190 127
Fonte: Base de dados do Crédito do Pronaf- SAF/MDA e dados internos do BNDES 1 2
Grupo A ¨C Agricultores assentados pelo INCRA e beneficiários do Programa Nacional de Crédito Fundiário. Grupo B ¨C Agricultores(as) familiares com renda bruta anual de até R$ 3 mil.
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2.2. Outros Instrumentos de Financiamento do BNDES para a Agricultura Familiar Embora o Pronaf tenha se constituído na principal via de apoio à agricultura familiar, empreendida pelo BNDES, ela não se mostrou como a possibilidade mais adequada para todos aqueles que são enquadrados nessa categoria.
Como foi assinalado, anteriormente, o crédito oferecido pelo BNDES para agricultores familiares, através do Pronaf, não é propício para os menos capitalizados. Principalmente por este motivo, o Banco abriu outras linhas voltadas para contemplar aqueles que trazem outras demandas de crédito, que serão apresentadas a seguir.
2.2.1. PRONAMP
Antes de apresentar as linhas que se voltam para a agricultura familiar propriamente dita, além do Pronaf, vale mencionar sobre a linha que contempla os agricultores médios. Trata-se do Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural ¨C Pronamp, que tem como objetivo apoiar as atividades rurais dos médios produtores rurais, através de créditos de custeio e investimento, e cujas operações realizam-se por meio de instituições financeiras credenciadas pelo BNDES. São considerados aptos para acessar o programa os proprietários rurais, posseiros, arrendatários ou parceiros em que 80% da renda bruta anual seja resultado da atividade agropecuária ou extrativa vegetal e que não ultrapasse o limite de R$ 800 mil. São financiáveis pelo BNDES para este público os investimentos individuais ou coletivos voltados para bens e serviços necessários ao empreendimento e relacionados com a atividade e com capacidade de produzir o aumento da produtividade ou economia dos custos de produção. Esta linha iniciou-se em 2010. Entre julho e dezembro de 2012, as contratações pelo Pronamp somaram 6 bilhões de reais, representando um acréscimo de 60% para o mesmo período do ano anterior, o que pode ser atribuído à redução da taxa de juros cobrada e à elevação da renda bruta anual para enquadramento no programa. A magnitude que o Pronamp vem alcançando, em seu ainda curto período de existência, quando comparado com outras linhas voltadas para os pequenos agricultores, confirma a prioridade que é dada àqueles que são mais capitalizados.
Foto: IBASE / Acervo
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2.2.2. PROCAP-AGRO
O Programa de Capitalização de Cooperativas Agropecuárias (Procap-Agro) foi criado em 2009, pelo Governo Federal, com recursos do BNDES. Tem como objetivo promover a recuperação ou a reestruturação patrimonial das cooperativas de produção agropecuária, agroindustrial ou pesqueira.
Procura cumprir esse propósito através da integralização de quotasparte 3 das cooperativas. Além dessa finalidade, financia também o capital de giro dessas cooperativas. Portanto, muito provavelmente, passou a ser um elemento chave para a sustentabilidade das mesmas. O Procap-Agro pode ser acessado por produtores rurais (pessoas físicas ou jurídicas), associados a cooperativas de produção agropecuária, aquícola ou pesqueira e por cooperativas singulares ou centrais4 , de produção agropecuária, agroindustrial, aquícola ou pesqueira. Mas também as federações e confederações que atuam diretamente na fabricação de insumos e no processamento e industrialização da produção podem pleitear o crédito. Para o produtor cooperado, é financiável a integralização de quotas-parte do capital social junto à cooperativa singular. Esta, por sua vez, pode fazer o mesmo junto à cooperativa central e, também, levantar financiamento para capital de giro. Já a cooperativa central pode receber crédito para capital de giro e aquele concedido diretamente para saneamento financeiro por meio de integralização de quotas-parte de seus associados. Para operações de financiamento a capital de giro, os juros são de 9% ao ano. Para outras operações são de 5,5% ao ano. O limite de financiamento do produtor cooperado é de R$ 40 mil, podendo corresponder até 100% do valor da integralização de suas quotas-parte. Isto, sem impedir o acesso a crédito obtido em outros programas. Para a cooperativa singular, o valor máximo é de R$ 50 milhões. Também é de R$ 50 milhões o limite para a cooperativa, simples ou central, financiar seu capital de giro e de R$ 50 milhões para a cooperativa central realizar o saneamento financeiro através da integralização de quotas-parte de seus cooperados. Para os financiamentos de capital de giro, o prazo é de até dois anos, enquanto que para as demais operações o prazo é de seis meses de carência. O BNDES oferece apoio direto (mínimo de R$ 10 milhões), ou indireto, por meio de instituição financeira intermediária. O Procap-Agro vem sendo fortalecido, desde sua criação. Em 2010, o Conselho Monetário Nacional (CMN) promoveu ajustes, permitindo mais de uma operação de crédito por produtor ou cooperativa, ainda que em safras distintas. Em 2011, o CMN elevou em R$ 1 bilhão os recursos do Procap-Agro a serem usados para o financiamento do capital de giro na safra 2011/12, recurso este remanejado do Programa de Desenvolvimento Cooperativo para Agregação de Valor à Produção Agropecuária (Prodecoop), isto porque os recursos disponíveis no Procap-Agro já estavam comprometidos desde o início da safra, devido a forte demanda. Autorizou-se, também, a elevação do percentual dos recursos destinado ao capital de giro, de 70 para 80%. Como contrapartida, a taxa de juros para este tipo de crédito subiu de 6,75% para 9,5%. O crescimento dessa demanda, no sistema cooperativista, refletiu segundo alguns analistas o próprio dinamismo da economia e da agropecuária no país. Este reforço do programa teve por trás a capacidade organizativa do sistema cooperativista. Exemplo disso foi a formação de um comitê técnico, em 2009, composto por representantes do cooperativismo, agentes financeiros ¨C incluído entre eles representantes do BNDES ¨C e técnicos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e da Fazenda, que foi determinante para aquilo que depois foi obtido. 3 4
Quando o cooperado ingressa na cooperativa ele adquire quotas-parte. Essa aquisição pode ser feita de uma só vez, ou em parcelas. O capital integralizado é aquele que já foi pago e o capital a integralizar é o que resta a pagar do capital subscrito.
As cooperativas de crédito se dividem em: singulares, que prestam serviços financeiros de captação e de crédito apenas aos respectivos associados, podendo receber repasses de outras instituições financeiras e realizar aplicações no mercado financeiro; centrais, que prestam serviços às singulares filiadas, e são também responsáveis auxiliares por sua supervisão; e confederações de cooperativas centrais, que prestam serviços a centrais e suas filiadas (in http: //www.bcb.gov.br/pre/composição/coopcred.asp).
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Observe-se que, também com o Procap-Agro, mesmo quando se trata de agricultores familiares e de suas cooperativas, refere-se a um tipo de público mais capitalizado, que não inclui aqueles mais fragilizados.
O dinamismo acima citado foi, em parte, fruto das chamadas “altas precificações das commodities”, ou seja, de resultados colhidos por agricultores que estão inseridos no processo de exportação da agricultura brasileira. Para estes, com o financiamento do capital de giro, comprou-se mais insumos, se fez maior uso dos serviços de armazenamento e ocorreu maior participação nas estratégias de comercialização da safra. A partir do final de 2011, o Procap-Agro cumpriu ainda outra função, acionando uma linha emergencial para cooperativas singulares de produção agropecuária, cujos associados dos estados do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina foram atingidos pela estiagem e sofreram consequências significativas com ela. As consequências consideradas foram débitos vencidos e a vencer entre 1 de janeiro de 2012 e 30 de junho de 2012. A concessão de crédito à cooperativa foi condicionada ao repasse ao associado, com limite de R$ 10 milhões por cooperativa. Os juros fixados foram de 5,5% e a contratação pôde ser realizada até 30 de dezembro de 2012. O prazo total do financiamento foi de até cinco anos, com até um ano de carência. Os pagamentos foram fixados para uma periodicidade semestral ou anual.
2.3. PROCAPCRED
O Programa de Capitalização de Cooperativas de Crédito (Procapcred) é mais uma linha, no BNDES, de apoio às cooperativas. Ele tem como objetivo promover o fortalecimento patrimonial das cooperativas de crédito, financiando diretamente aos cooperados. Para isto, o BNDES credencia outras instituições financeiras, repassando através delas o financiamento. Podem acessar esses créditos pessoas físicas (produtores rurais, pescadores, empresários, prestadores de serviços autônomos e microempreendedores) ou jurídicas (que se dediquem a atividades de produção rural, pesqueira, industrial, comércio ou serviços). Assim, os agricultores familiares e suas cooperativas são apenas uns dos tomadores desse crédito. O Procapcred financia a aquisição de quotas parte de cooperativas singulares de crédito. Os recursos recebidos pela cooperativa podem ser utilizados livremente, desde que respeitada a regulamentação específica do setor. O custo financeiro total para quem toma o empréstimo consiste na taxa de juros de longo prazo (TJLP), somado à remuneração de 1% ao ano para o BNDES e de 3% ao ano para a instituição financeira credenciada. O prazo total da operação é de seis anos. E as garantias ficam a critério do agente financeiro. A concessão do financiamento depende da aprovação pela instituição financeira credenciada de projeto que atenda as exigências do Programa. 8
Foto: Pablo Vergara
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2.4. BNDES Fundo Social O Fundo Social do BNDES é a mais importante fonte de recursos no apoio a empreendimentos de baixa renda. É de origem recente esse tipo de política no Banco, iniciada a partir de forte reformulação em 2008. O que vigorava, anteriormente, era um conjunto de iniciativas de financiamento similares àquelas feitas nas linhas normais do Banco, o que acarretava em uma demanda muito pequena por parte de tomadores com esse perfil. O Fundo, que é não Visando ampliar o montante de recursos dirigidos reembolsável, constitui-se com para o público de baixa renda, o BNDES optou por parte dos lucros anuais do BNDES. atuar junto com outros parceiros. Esses podem ser do Ele apoia diferentes projetos na poder público, como alguns ministérios, entre os quais área social, inclusive aqueles ligados ao desenvolvimento o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o rural. O Banco oferece apoio Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), governos permanente a projetos, voltados dos estados da união, municípios, cooperativas e, para a inclusão social, que são não reembolsáveis. Podem acessar também, instituições de direito privado sem fins lucrativos o Fundo, pessoas jurídicas de que são ligadas a grandes grupos econômicos, como direito público interno e de a Fundação Banco do Brasil, a Fundação Odebrecht, direito privado, com ou sem fins lucrativos. o Instituto Votorantim, o Instituto Camargo Corrêa e a Enquadram-se como empreendimentos passíveis de Fundação Vale, entre outros. apoio aqueles de caráter social nas áreas que sejam sustentáveis, com capacidade de manutenção do projeto ou atividades que permaneçam apoiadas mesmo com término da liberação de recursos do BNDES. São também apoiadas iniciativas que não possuam capacidade de endividamento, desde que sustentáveis. E, igualmente, aquelas iniciativas que visem o fortalecimento de aglomerações produtivas, mediante financiamento de equipamentos coletivos, além de outras possibilidades também de cunho social. A participação do BNDES pode chegar até 100% dos itens financiáveis. Quando for à modalidade de apoio continuado, complementar as iniciativas do poder público pode chegar a 50% do valor total dos recursos financeiros previstos.
Quadro Cronológico dos Investimentos Contratados em Projetos de Geração de Trabalho e Renda, Utilizando o BNDES Fundo Social e os Parceiros 400 350 300
174
R$ milhões
250 200 150 50 0
204
80
100 3
2000
7
2001
1
2003
12
2006
BNDES Fundo Social Fonte: AS/DESOL
24
2007
Parceiros
9
5
2008
69
2009
2010
9
BNDES e a Agricultura Familiar
3. Iniciativas de Destaque da Atuação do BNDES na Agricultura Familiar Como foi visto, na descrição das linhas de crédito do BNDES que são oferecidas para a agricultura familiar, a disposição de apoio à agricultura familiar tem aumentado nos últimos anos. Não só pelas várias alternativas que tem sido abertas, como pelo maior volume de recursos financiado. Vale aqui descrever e avaliar algumas das iniciativas que adquirem maior relevância neste campo. A primeira delas refere-se às operações realizadas com o Sistema CRESOL (Sistema das Cooperativas de Crédito Rural com Interação Solidária). O CRESOL atua nos estados do Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina, tendo firmado uma forte marca na viabilização do crédito para a agricultura familiar, através do cooperativismo voltado para essa finalidade. Desde 2006, o BNDES já realizou seis operações com o Sistema CRESOL (CRESOL BASER e CRESOL CENTRAL SC/RS), através do programa de microcrédito, totalizando R$ 59 milhões. São recursos voltados para a fase chamada de pré-custeio, atendendo necessidades dos agricultores que devem ser satisfeitas antes do ano-safra. Assinale-se que o CRESOL sempre se destacou na tomada de recursos também através do PRONAF, para o custeio da safra, que corresponde ao financiamento imediatamente posterior ao microcrédito buscado junto ao BNDES. Dentro do Banco, considerando aquilo que é destinado ao agricultor familiar, o Sistema Cresol é considerado como o maior credor, com larga vantagem sobre os outros. A segunda está ligada aos aportes que são dados, através do Fundo Social, para a agricultura familiar menos capitalizada e, em particular, para assentamentos de reforma agrária.
Dentro desse propósito do Banco, destacase seu engajamento no Terra Forte – Programa de Agroindustrialização em Assentamentos de Reforma Agrária. O Programa conta com recursos de R$ 300 milhões, sendo R$ 150 milhões do Fundo Social do BNDES, R$ 20 milhões da Fundação Banco do Brasil e R$ 130 milhões dos demais parceiros – Ministério do Desenvolvimento Agrário, Ministério do Desenvolvimento Social, INCRA e CONAB.
Por seu turno, o Banco do Brasil disponibilizará R$ 300 milhões em crédito para as cooperativas investirem em agroindústrias, totalizando R$ 600 milhões em recursos. O Terra Forte tem como objetivo apoiar a implantação e modernização de empreendimentos coletivos agroindustriais em assentamentos da reforma agrária criados ou reconhecidos pelo Incra em todo o território nacional. O Programa começou a ser testado em 2009, com a participação de dez cooperativas da reforma agrária, a maioria pertencendo a assentamentos do MST. Estas apresentaram uma proposta de agroindustrialização, com base na qual foi estabelecido protocolo de intenções entre a EMATER/PR e as cooperativas, visando a elaboração, execução e prestação de contas dos projetos. Os beneficiários são famílias de trabalhadores rurais, de assentamentos regularmente cadastrados no INCRA, e que estão organizadas em cooperativas e associações. Os recursos estão previstos para serem aplicados em um prazo de cinco anos, havendo a expectativa de que serão atendidas cerca de 200 cooperativas e associações, a um valor médio de R$ 1,5 milhão por cooperativa, perfazendo um total de oitenta projetos, beneficiando 20 mil famílias. Com isto, persegue-se o objetivo de dar as condições para que os assentamentos possam responder satisfatoriamente a duas políticas do governo federal: o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), criado em 2003, e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que teve lei aprovada em 2009 e garante o direito da agricultura familiar fornecer pelo menos 30% das aquisições de alimentos desse programa. 10
Série - BNDES Sem Segredos Nº 2
No conjunto de apoios do Banco a assentamentos de reforma agrária, entre outubro de 2008 e dezembro de 2012, o BNDES apoiou 55 projetos, totalizando um aporte de R$ 37 milhões. Até aquela data, R$ 22,3 milhões haviam sido desembolsados, com 8.337 assentados beneficiados. No momento, o BNDES tem em carteira outras cinco operações com potencial de atendimento a famílias de assentados, em fase de análise, aprovadas ou já contratadas, mas aguardando liberação de recursos, que podem somar R$ 96,4 milhões. O fato de esse apoio ser concedido aos assentamentos, onde cada um reúne um número significativo de famílias, garante o apoio a muitos beneficiários por projeto. Isso vai de encontro com a estratégia da área de Agropecuária e Inclusão Social do BNDES, já que propicia maior capilaridade na ação do Banco e, ao mesmo tempo, o insere no eixo da Inclusão Produtiva do Plano Brasil sem Miséria. Também através do Fundo Social, Foto: IBASE / Acervo foi estabelecida a parceria entre o BNDES e a UNICAFES - União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária. A Unicafes tem definido como seu objetivo cumprir o papel de ser um instrumento para os agricultores familiares, visando o desenvolvimento sustentável nas ações de apoio para os associados. As quase 1.100 cooperativas associadas da Unicafes encontram-se nas cinco regiões do país. Estão em 17 Unicafes estaduais: Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Maranhão, Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Pará, Goiás, Sergipe e Ceará. Em dezembro de 2011, foi estabelecida uma parceria entre o BNDES e a Unicafes, visando a estruturação de empreendimentos coletivos, voltados para a geração de trabalho e renda, por meio de Edital, que somou 21 milhões de reais, em que o Fundo Social do Banco entrou com 50%, as cooperativas selecionadas no edital com 10% e outras fontes com 40%.
Com a grave seca que atinge o Semi-Árido brasileiro há dois anos, o BNDES foi convocado, diretamente pela Presidente Dilma Rousseff a contribuir no enfrentamento do problema. Da mesma forma, a Petrobras também foi chamada. Assim, estabeleceu-se uma parceria entre o BNDES, a Petrobras e o MDS para assegurar uma maior dotação de recursos, visando acelerar a política de acesso à água na região.
Esta parceria garantirá um investimento de R$ 350 milhões para a expansão do Programa de Cisternas de Placa. Este programa já vem sendo apoiado pelo Governo Federal desde 2003, tendo sido construídas até o presente mais de 500 mil cisternas. Busca-se, dessa maneira, atenuar os efeitos da longa estiagem sobre a produção dos pequenos agricultores familiares do Semi-Árido, recuperando sua capacidade produtiva. A estratégia é criar a infraestrutura necessária para que, ao retornarem as chuvas, estejam dadas as condições para uma retomada rápida da produção.
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BNDES e a Agricultura Familiar
O BNDES financiará o programa, com recursos do Fundo Social, no que se refere às cisternas da chamada segunda água5, que é destinada à produção. BNDES e Petrobras garantirão a instalação de 27 mil cisternas até dezembro deste ano e 64 mil até 2014. Assinale-se que este programa surgiu da parceria entre um conjunto amplo de organizações da sociedade que formam a Articulação do Semiárido e o Governo Federal, que encampou a proposta da Campanha 1 Milhão de Cisternas. O que ocorreu de novo, com a convocação pela Presidente Dilma do BNDES e da Petrobras, é que, dessa vez, a iniciativa não partiu das organizações da sociedade civil, demandando ao Banco e à Petrobras. Veio do próprio governo. Outras iniciativas do Banco, voltadas para o apoio à agricultura familiar, vem sendo desenvolvidas em articulação com órgãos do poder público, em diferentes níveis. Um exemplo foi a parceria com o Estado do Rio Grande do Sul, em 2012, com o objetivo de apoiar projetos agroindustriais e de comercialização em assentamentos de reforma agrária. Foram destinados R$ 72 milhões, por meio do Fundo de Terras do Estado do Rio Grande do Sul (FUNTERRA), que recebeu os recursos, para apoiar as cooperativas ou associações de assentados. O BNDES entrou com 50% dos recursos, oriundos do Fundo Social. Um segundo exemplo e ainda de maior significado foi a parceria estabelecida com a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB). Um processo longo de construção, sobretudo pela novidade que significava para o BNDES a proposta trazida pela CONAB. Concluída a fase de negociação no segundo semestre de 2012, chegou-se a um resultado que tem como objetivo o fortalecimento da produção da agricultura familiar no Brasil, a partir de três linhas de apoio. A primeira, voltada para o investimento na melhoria da infraestrutura produtiva de empreendimentos coletivos rurais de base familiar, que apontam para a estruturação de circuitos de produção, beneficiamento, processamento, armazenamento e comercialização. A segunda, referente ao desenvolvimento de ações, visando à inserção dos produtores rurais de base familiar nos mercados institucional e privado de alimentos. E o terceiro, com o propósito de fomentar a inovação no segmento da produção rural de base familiar, com o intuito de promover a melhoria da qualidade dos produtos e o aumento da eficiência da produção. O valor inicial do apoio é de R$ 23 milhões, mas espera-se que essa dotação seja progressivamente aumentada. A totalidade dos recursos é oriunda do Fundo Social. Disso resulta que o apoio financeiro tem caráter não reembolsável, o que significa que as organizações contempladas não precisarão restituir os recursos às instituições apoiadoras, desde que comprovem a correta aplicação, de acordo com o projeto aprovado. O primeiro edital do Acordo CONAB/BNDES foi lançado em fevereiro de 2013. Para ele foram liberados R$ 5 milhões, destinados a grupos de mulheres, produtores agroecológicos, quilombolas, indígenas e demais povos de comunidades tradicionais. Precisaram comprovar a realização de, no mínimo, uma operação concluída ou em fase de execução, no âmbito do Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA), da Política de Garantia dos Preços Mínimos para os Produtos da Socio-biodiversidade (PGPMBio), ou do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Foto: Marcos Nunes
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A cisterna de “primeira água” é aquela destinada ao consumo humano.
Série - BNDES Sem Segredos Nº 2
Embora de abrangência nacional, seu foco prioritário foi voltado para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, para onde foram destinados 70% dos recursos. No total, cerca de 4 mil famílias foram contempladas. O valor individual do apoio foi fixado em até R$ 50 mil por organização proponente. O que foi notável, na resposta a esta chamada, é que se apresentaram 1.633 proponentes, com um valor médio de R$ 47 mil e um valor total de R$ 76 milhões, superando todas as expectativas sobre a repercussão do edital junto ao público a que ele se dirigiu. A segunda chamada, que BNDES e CONAB realizarão, refere-se à execução de ações voltadas para a formalização e estruturação de grupos informais de produtores rurais de base familiar, eleitos como prioritários pelas Políticas Públicas do Governo Federal, com o intuito de inseri-los no mercado de alimentos, no contexto da inclusão produtiva almejada pelo Plano Brasil Sem Miséria. Está previsto o valor de R$ 3 milhões para execução dessa estratégia. A estratégia de operacionalização deste crédito considera a metodologia do mapeamento e qualificação das demandas, que vai de encontro com a busca ativa instituída no contexto do Plano Brasil Sem Miséria. Ou seja, a CONAB e o BNDES, em diálogo, irão definir os grupos informais e organizações com pouca experiência institucional e sua demanda para posterior atendimento. O objetivo central da operação é contribuir com o fortalecimento socioeconômico dos grupos e prepará-los para sua formalização ou regularização em associação ou cooperativa e para acessar as políticas de mercado governamental.
Principais Operações do BNDES Fundo Social em Agricultura Familiar Cliente
Descrição do Projeto
UF
Datada Valor Contratação Contratado R$
Tem como objetivo o fortalecimento da produção da agricultura familiar no Brasil, através do investimento na melhoria da infraestrutura produtiva e no fomento à inovação no segmento da produção rural de base familiar.
RJ
12/10/2012
23.000.000
CRESOL CENTRAL SC-RS
Relocalização e reestruturação física das cooperativas, mediante implantação de uma unidade de beneficiamento, armazenagem e comercialização de café, construção de nova sede e aquisição de maquinas, equipamentos e veículos de carga.
ES
10/04/2012
1.650.000
CRESOL CENTRAL SC-RS
Estruturação de Cadeias Produtivas, reaplicação de Tecnologias sociais e promoção do desenvolvimento territorial.
DF
02/05/2012
20.000.000
UNICAFES NACIONAL
Fomentar e fortalecer o cooperativismo solidário, através do aprimoramento organizacional e agroindustrial.
DF
17/12/2012
10.400.000
MST –TERRA FORTE
O Terra Forte tem por objetivo promover a agro industrialização de assentamentos da reforma agrária em todo o país. Os beneficiários são famílias de trabalhadores rurais em projetos de assentamento criados ou reconhecidos pelo Incra.
SP
04/02/2013
150.000.000
COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO - CONAB
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do BNDES Transparente e de um pedido de informação sobre as operações do Fundo Social
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BNDES e a Agricultura Familiar
A agricultura familiar é uma prioridade para o BNDES? Dentro do que foi aqui apresentado, não se pode afirmar que a agricultura familiar já se constitua em uma prioridade para o BNDES.
O que vem ocorrendo nos últimos anos é a abertura maior de um espaço para o financiamento da agricultura familiar, muito devido à pressão dos movimentos e organizações camponesas (que tem disputado firmemente o acesso a linhas de crédito). Entretanto o caminho que deve ser percorrido ainda é longo, dado o seu histórico descaso com esse setor e a falta de linhas institucionalizadas para as camadas de baixa renda.
O volume de recursos direcionados para esse setor é acentuadamente inferior àquilo que é dirigido para o financiamento das iniciativas do grande capital, ou dos empreendimentos governamentais de grande porte. Além disso, as regras que são aplicadas na relação com estes últimos nada tem a ver com o que é necessário instituir para os pequenos agricultores, o que muitas vezes implica em tempos
mais prolongados para desencadear esses processos. Apesar do crescimento da atuação do Banco nessa área, também não se pode afirmar que já exista uma linha programática institucionalizada e estabelecida dentro da estrutura operacional do banco. Muito distante de uma política estratégica de atuação, o que existe são programas e atividades isoladas, que longe de se complementarem apontando para um sentido de desenvolvimento nessa área, apenas suprem algumas demandas conjunturais. O BNDES opera o apoio aos produtores da agricultura familiar, a suas cooperativas e associações, com um financiamento consoante com o direcionamento dado pelo Governo Federal. Nesse sentido, se constitui em uma base importante para o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), principalmente no financiamento de equipamentos, visando a modernização e maior produtividade da agricultura familiar. Da mesma maneira, na sua relação com a CONAB, busca viabilizar melhores condições para que os produtores que acessam as políticas da CONAB possam fazê-lo com melhor proveito. Ou mesmo, para os agricultores mais empobrecidos, assegurar condições sociais básicas para que eles possam exercer atividades produtivas, lançando mão de recursos do Fundo Social, que não são reembolsáveis. Outro desafio é a inteligibilidade dos projetos junto a este público. Alguns deles já conseguem ter uma resposta satisfatória naquilo que são exigidos, como é o caso do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Prepararam-se para isto e cada vez estão mais capacitados nesta relação. Outros movimentos, mesmo sendo de porte nacional, ainda demonstram dificuldades. Estas dificuldades, também se acentuam conforme a região geográfica em que estão localizados.
É importante ressaltar o papel do Banco em compreender a diversidade de beneficiários com quem necessita atuar. Tendo em conta os beneficiários da agricultura familiar os critérios de acesso a crédito precisam ser diferentes aos exigidos das grandes empresas e das grandes corporações financeiras. Entretanto, essa diferenciação não deve ser entendida como um descompromisso com a credibilidade do investimento: pelo contrário, novos critérios e mecanismos de controle devem ser criados dentro da especificidade dos investimentos de agricultura familiar. 14
Série - BNDES Sem Segredos Nº 2
Na opinião dos beneficiários destes fundos disponibilizados pelo BNDES houve uma grande melhora desde 2008, que apontam o Fundo Social muito mais acessível as demandas. Entretanto ainda apontam críticas importantes em relação a postura do banco, já que os outros setores do banco continuam ainda muito reticentes e fechados aos financiamentos para inclusão social, o que impede a existência de linhas institucionalizadas dentro do banco. Apesar da melhora do Fundo Social, ele ainda possui um caráter emergencial. O setor no BNDES que responde pelos projetos voltados para a agricultura familiar descreve que, anteriormente, havia uma demanda relativamente pequena em relação aos recursos, com projetos pontuais. Porém, mais recentemente, a demanda tem se intensificado, não só pelos pequenos produtores, mas também pelo governo federal, como foi o caso recente de mobilização do Banco para atuar na ajuda do problema da seca. A pequena equipe, que compõe esse setor, reclama assim de um “estresse” dessa demanda. De um lado, pelo esforço exigido para a viabilização de contratações e a criação de mecanismos compatíveis com as características da agricultura familiar. Ressaltam, sobre isto, os cuidados necessários para atenderem também as exigências dos órgãos de controle. De outro lado, pela possibilidade de que, em breve, os recursos disponíveis não sejam mais suficientes para satisfazer a demanda. O Fundo Social do BNDES recentemente tem atuado fortemente nesse processo de maior intervenção do banco no socorro em casos sociais emergenciais e de áreas de grande carência assistencial ou de grande importância no processo de inclusão econômica. Enquanto em 2008 o Fundo Social realizou um desembolso total de pouco mais de R$ 51 milhões, em 2012 esse valor passou dos R$ 158 milhões. Entretanto, como apresentamos durante esse trabalho, esse fundo aparece mais como um mecanismo político de ação do banco, com destaque em alguns setores e momentos pontuais. Esse Fundo atualmente se encontra mais como uma ferramenta política do que como um mecanismo estratégico do BNDES de atuação no desenvolvimento do país. Por isso, apesar de A avaliação da atuação do BNDES para a melhoras nas atividades em promoção da agricultura familiar no Brasil nos mostra agricultura familiar, ainda não existe - mesmo nesse que, apesar do avanço e de importantes programas setor específico do banco desenvolvidos, ainda há necessidade de se criar uma - uma estratégia especifica para a inclusão dos pequenos política estratégica específica para a área, a qual não dependesse de circunstâncias políticas e conjunturais. agricultores.
Assim como os diversos setores do grande capital possuem suas linhas e programas específicos, está mais do que na hora desse setor tão importante para a economia e para a alimentação brasileira ser desenvolvido.
Foto: Tom Greenwood / OXFAM GB
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“O que vem ocorrendo nos últimos anos é a abertura maior de um espaço para o financiamento da agricultura familiar, muito devido à pressão dos movimentos e organizações camponesas (que tem disputado firmemente o acesso a linhas de crédito). Entretanto o caminho que deve ser percorrido ainda é longo, dado o histórico descaso do BNDES com esse setor e a falta de linhas institucionalizadas para as camadas de baixa renda.”
Agricultura Familiar no BNDES: Por uma Política Estratégica Realização: Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE) Autores: Iderley Colombini e Francisco Menezes Coordenação: Maria Elena Rodriguez Diagramação: Rafael Barreta Boza Apoio: OXFAM / Fundação Ford
Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE) Avenida Rio Branco 124, 8° andar; Centro, RJ - TEL: (21) 2509-0660 / CEP: 20040-001 www.ibase.br Realização:
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