UM PERCURSO PELA PINTURA PORTUGUESA COLECÇÃO TELO DE MORAIS
UM PERCURSO PELA PINTURA PORTUGUESA COLECÇÃO TELO DE MORAIS
3 de Novembro de 2011 a 15 de Janeiro de 2012
O Presidente da Câm Instituto dos Museus Museu de Grão Vas Ex.ma Família para a
UM PERCURSO PEL COLECÇÃO TELO D
Viseu, Museu de Grã horas.
Exposição patente até d
Capa:
MÁRIO ELOY 1900-1951 Mulher com barros ou Mulher da barraca, c. 1923-1925 Óleo s/ cartão, 39 x 31 cm Ass. em baixo à direita: Mario Eloy
Pelo uso quotidiano que fazemos delas – as palavras – é raro pensarmos nas suas origens, na sua semântica. Acrescentaria mesmo, que não reparamos sequer que muitas delas são felizes, como amor, paz, arte, beleza, pois só o simples acto de as dizer dão-nos felicidade, ou seja, ao evocarem valores humanos, vastos, positivos, universalmente entendidos e desejados, fazem-nos bem. Ora neste pensar, livre de pressupostos filosóficos ou outros, que não domino, atrevo-me a considerar o vocábulo museu – uma palavra feliz. Na verdade, museu vem do grego mouseion e dava nome à sala do palácio de Alexandria onde Ptolomeu I reunia os mais célebres sábios e filósofos e na qual existia, também, a famosa biblioteca mais tarde destruída pelos Àrabes. Daqui provêm os significados “lugar delicado à poesia, às artes”, “lugar consagrado às ciências e letras”, “biblioteca”, “escola”. O Museu Municipal de Coimbra, mais concretamente o Edifício Chiado, possui o enorme privilégio de guardar a preciosa Colecção Telo de Morais doada ao município pelo Exmº. Senhor Dr. José Carlos Telo de Morais e Senhora, em 1999, da qual foi elaborado um Catálogo cujo primeiro volume, saiu dos prelos, em 2009, tendo obtido em 2010 o Prémio do Melhor Catálogo do ano atribuído pela APOM. O segundo será em breve editado. Entretanto, o ano de 2011 marca a celebração do 10º aniversário da inauguração do Museu Municipal de Coimbra e da instalação da Colecção em apreço (16 de Julho de 2001). Excelentes pretextos para, igualmente, homenagear os ilustríssimos mecenas levando à terra natal de Telo de Morais, Viseu, e, em particular ao Museu de Grão Vasco, parte das obras do Museu de Coimbra. Em boa hora, a Câmara aprovou, em reunião plenária, de 27 de Julho do corrente ano, um protocolo de colaboração, entre os dois museus, com o objectivo principal, de permitir maior divulgação dos acervos respectivos através da realização de exposições, ora em Viseu ora em Coimbra. No entanto, esta louvável iniciativa ficaria incompleta se não a fizéssemos acompanhar de um Catálogo que, passado o tempo de exposição, guardará, para sempre, pela “arte negra”, a lembrança da Colecção Telo de Morais no Museu de Grão Vasco. Coimbra, 06 de Outubro de 2011 A Vice-Presidente da Câmara Municipal de Coimbra Maria José Azevedo Santos 3
O percurso de vida de José Carlos Telo de Morais iniciou-se em Viseu, cidade onde, ainda menino, visitou o seu primeiro Museu – o Grão Vasco! Creio que as visitas que efectuou, particularmente pela pintura, tuteladas pelo Director do Museu, Francisco António de Almeida Moreira, despertaram, na sua jovem personalidade em formação, uma sensibilidade estética que viria a marcar, de forma decisiva, o seu futuro. De rumo a Coimbra, onde se fez Doutor em Medicina, Telo de Morais começou a reunir, bem cedo, uma colecção de pintura a que acabou por se juntar um espólio artístico muito diversificado, e igualmente precioso, de Cerâmica, Escultura, Mobiliário e Pratas. Um dia, em concordância com a esposa Maria Emília, num gesto de generosidade extrema, tomou a decisão de doar à cidade todo o espólio artístico reunido ao longo da vida. A Colecção Telo de Morais passou então a integrar o Museu Municipal de Coimbra, tendo sido instalada no Edifício Chiado, imóvel emblemático da baixa coimbrã, de fundação centenária. Já lá vão dez anos! Este regresso a Viseu, do menino que em Coimbra se fez Doutor e que percorrendo as salas do Museu Grão de Vasco se deixou fascinar pela Arte, era um regresso incontornável. A cidade que lhe deu berço tinha o direito de poder admirar o seu percurso, de reconhecer o seu mérito de coleccionador. A Colecção Telo de Morais iniciou-se pelo “desejo de melhor conhecer a pintura portuguesa e a biografia dos seus autores”. Reúne um conjunto de 225 peças e 205 autores e foi já objecto de profundo estudo, coordenado, cientificamente, por Raquel Henriques da Silva. Encontrase publicado o 1º volume, precisamente dedicado à Pintura e Desenho, edição recentemente galardoada com o Prémio APOM “Melhor Catálogo 2010”. O conjunto de obras que se reúne nesta exposição resulta de uma selecção de 47 peças. Com exclusão de um pequeno núcleo de pintura sacra, apresentam-se obras exclusivamente portuguesas situadas, cronologicamente, no século XIX e primeira metade do XX, proporcionando um percurso de pouco mais de cem anos, integrando os principais autores e movimentos artísticos. A parceria criada entre os dois museus, que agora dá os primeiros passos, fica a dever-se a uma iniciativa nossa, acolhida, com o maior entusiasmo, pelo Dr. Sérgio Gorjão, Director do Grão Vasco. No próximo ano será Coimbra a deixar-se seduzir pelo belíssimo acervo do Museu de Viseu. Berta Duarte Directora do Museu Municipal de Coimbra
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O Museu de Grão Vasco orgulha-se em receber a exposição UM PERCURSO PELA PINTURA PORTUGUESA COLECÇÃO TELO DE MORAIS, organizada em parceria com o Museu Municipal de Coimbra / Edifício Chiado. Parte significativa da colecção do casal Maria Emília e José Carlos Telo de Morais, composta maioritariamente por arte portuguesa dos séculos XIX e XX, e ainda por arte oriental e artes decorativas, foi oferecida à Câmara Municipal de Coimbra há 10 anos, passando a integrar o museu aberto no antigo Edifício Chiado. Quer a Colecção Telo de Morais, como o Museu Municipal de Coimbra, são hoje importantíssimos marcos na definição cultural e museológica da região, contribuindo decisivamente para a excelência da aposta cultural que se verifica em Coimbra. Atendendo ao crescente interesse no aprofundamento de relações entre museus e entre instituições que se dedicam a promover o Património Cultural numa dinâmica de cidadania, identidade e educação, a concretização desta exposição pretende ser um meio de estabelecimento de relações frutíferas entre Viseu e Coimbra, permitindo a ambos os museus interagirem no sentido de divulgarem os seus espólios, mas também no sentido de potenciar acções que se reflictam na sociedade de uma forma criativa e pedagógica. A criação e fortalecimento das redes museológicas regionais, que por sua vez se estendem a outras dimensões, é um factor crucial para a boa gestão de recursos museológicos, para o entendimento mútuo entre museus, para o desenvolvimento de experiências e, sobretudo, uma forma de oferecer aos visitantes e investigadores a possibilidade de conhecer uma realidade patrimonial e cultural vasta e rica, paradoxalmente muitas vezes desconhecida pese embora a proximidade. Além de uma palavra de apreço pelo excelente trabalho da Dr.ª Berta Duarte e da sua equipa, extensível à Câmara Municipal de Coimbra, que tão empenhadamente e com tanta qualidade vão transportando esta luz de inspiração que é o próprio museu, deve-se ao Dr. José Carlos Telo de Morais e à Senhora D. Maria Emília Morais, uma especial palavra de apreço e de gratidão pelo seu exemplo de vida, desejando que a presente exposição seja, na essência, uma celebração dos raros sentimentos de altruísmo e generosidade que permitiram a Coimbra dispor de um tão excepcional acervo artístico, mas também a Viseu o brio de ter como seu filho um extraordinário mecenas, o Dr. Telo de Morais, reconhecido não só pela colecção doada, mas sobretudo pela alegria e determinação que pôs na sua realização e na sua manifestação pública, prova irrefutável do seu profundo amor às artes. Sérgio Gorjão Director do Museu de Grão Vasco
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UM PERCURSO PELA PINTURA PORTUGUESA COLECÇÃO TELO DE MORAIS REPRESENTAÇÕES DO SAGRADO Iniciando cronologicamente o percurso pela colecção Telo de Morais invocamos a temática representada nas primeiras obras de pintura portuguesa: ícones e representações do sagrado. Até ao século XVII, a pintura em Portugal não era reconhecida como arte pelo que estas obras, vistas como elementos decorativos e evocativos complementares à arquitectura – normalmente religiosa –, não eram assinadas nem datadas. As atribuições terão sido efectuadas através da comparação formal com autores já identificados.
BENTO COELHO DA SILVEIRA 1620-1708 Descanso na Fuga para o Egipto, 1675-1680* Óleo sobre tela, 57,2 x 78,2 cm N. ass. e n. dat.
Pintor prolífico da geração proto-barroca portuguesa. É o mais conhecido, depois de Josefa d’Óbidos. Artista reconhecido no seu tempo pelos seus pares, em 1670, Bento Coelho é alvo de homenagem pela Academia dos Singulares, em poesia que descreve e enaltece parte da sua obra. Pintor régio, inserido no espírito do seu tempo, assinou várias das suas obras. Grande parte da sua produção, realizada para os tectos de igrejas de Lisboa, perdeu-se com o terramoto de 1755. Da infinidade de obras de iconografia cristã que ainda se lhe atribuem, fica a imagem geral de uma produção irregular, com algumas soluções compositivas complexas, com paleta de cores escuras, salpicada por brancos diáfanos, ou vermelhos carmim e povoada regularmente por teorias de anjos de carnações rosadas e cabelos louros. Tal como a maioria dos pintores da sua época, Bento Coelho recorreu frequentemente às gravuras em circulação (italianas, flamengas e francesas, dos sécs. XVI e XVII) que depois reinterpretava, não se lhe conhecendo reproduções literais. 7
SIMÃO RODRIGUES c. 1560-1628 Apresentação do Menino Jesus no Templo, inícios do séc. XVII Óleo s/ madeira, 51 x 42,3 cm N. ass. e n. dat.
Pintor da última geração maneirista tinha, desde 1583, oficina em Lisboa, a partir de onde laborou, um pouco por todo o reino. O seu nome é praticamente indissociável do seu parceiro, o tomarense Domingos Vieira Serrão. Apesar da dificuldade em destrinçar a produção de cada um destes pintores, a maneira de Simão Rodrigues é revelada pelo apego aos modelos iniciais do Maneirismo da Contra-Reforma, presentes nas formas serpentinadas e volumosas dos corpos, no desenho mais rígido e contornado que o do seu parceiro, nas cores pastel, onde sobressaem os rosas alilazados, os amarelos e os verdes, e ainda nos modelos anatómicos recorrentes. Nos anos iniciais de Seiscentos, os temas da infância de Jesus, da Paixão de Cristo, da vida gloriosa da Virgem foram repetidamente pintados nos retábulos dos mosteiros e colégios de Coimbra, e neles colaboraram artistas locais que imitaram e divulgaram estes modelos. Hoje, nesta cidade, as obras de referência da parceria de Simão Rodrigues e Domingos Vieira Serrão são o retábulo-mor da Igreja do Carmo, de c.1597, ainda in situ; as dez pinturas sobre madeira para o arcaz da Sé de Coimbra, c. 1608; e os painéis remanescentes do retábulo-mor da igreja do Convento de Santa Ana, de 1612, onde já se vislumbra uma gramática proto-barroca. Estes dois últimos conjuntos pertencem ao Museu Nacional de Machado de Castro. 8
ANTÓNIO TOMÁS DA CONCEIÇÃO SILVA 1869-1958 Santa Maria Madalena, 1917(?) Óleo s/ tela, colada s/ platex, 27,2 x 58,7 cm Ass. em baixo ao centro: Conceição Silva Inscrição s/ a assinatura: Lisboa…1917 (?)
Iniciou os estudos artísticos na EBAL, onde foi aluno de Ferreira Chaves. Em 1894 através do Grémio Artístico foi contemplado com o prémio concedido pela Rainha D. Amélia, destinado a subsidiar em Paris um aluno de BelasArtes. Ali foi discípulo de Jean-Paul Laurens e de Benjamin Constant, (1894-1895). Regressado a Portugal dedicou-se ao ensino, ministrando a aula de desenho na EBAL, na Escola Preparatória Rodrigues Sampaio e na Escola Industrial Marquês de Pombal, ambas em Lisboa. Nesta última instituição conservam-se os retratos dos pintores Ribeiro Christino e Leopoldo Battistini, da sua autoria. Foi um dos fundadores da Sociedade Nacional de Belas-Artes. É mais conhecido pelos seus retratos, dos quais se destaca o auto-retrato do Museu José Malhoa, cujo fundo, de pinceladas vigorosas e aparência de inacabado se assemelha ao da pintura da Col. Telo de Morais. No âmbito da temática sacra pintou o retábulo do altar-mor da Igreja de S. Mamede, em Lisboa.
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DO ACADEMISMO AO ROMANTISMO Os pintores portugueses dos meados do século XIX, apesar de enquadrados no movimento normalmente designado por Romantismo, mantiveram-se fiéis à tradição académica ou à exploração de temáticas pitorescas mais típicas do rococó. A pintura romântica evoca, muitas vezes, episódios dramáticos, pretendendo os seus autores emocionar o observador. Existiu, por parte de alguns autores românticos, uma tendência pré-naturalista para utilizarem a natureza, os animais e a paisagem humanizada como motivos de pintura. O retrato foi também tema comum no romantismo, respeitando a execução o rigor académico envolvido por uma sensibilidade romântica.
ANTÓNIO MANUEL DA FONSECA 1796-1890 Interior de taberna, 1878 Óleo s/ madeira, 29 x 48 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: Fonseca fect 1878
Iniciou a sua formação artística na Aula de Desenho da Casa Pia. Entre 1827 e 1834 estudou em Roma, onde copiou, a pedido do seu protector, o Conde de Farrobo, obras de Rafael, Van Dyck, Giulio Romano, etc. A sua produção artística ficou marcada por uma grande composição, Eneias salvando seu pai Anquises do incêndio de Tróia, que tem sido considerada como modelo da estética neo-clássica que poucas manifestações teve em Portugal. Dedicouse posteriormente ao ensino, sendo responsável pela cadeira de pintura na ABAL, impondo uma didáctica muito conservadora aos seus alunos, alguns dos quais entrarão em ruptura com a Academia (v. Biografia de Tomás de Anunciação).
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DOMINGOS ANTÓNIO SEQUEIRA 1768-1836 Alegoria à Constituição, c. 1822 Tinta da china s/ papel, 20 x 30,5 cm N. ass. e n. dat.
Nasceu em Lisboa no seio de uma família de fracos recursos. Frequentou a Aula de Desenho da Casa Pia (17811786) e em 1788 partiu para Roma com uma bolsa de D. Maria I. Nessa cidade estudou na Academia de S. Lucas com Antonio Cavalucci e Domenico Corvi e em 1792 foi eleito Académico de Mérito. Depois de uma viagem por Itália, regressou a Portugal, recolhendo-se no Convento das Cartuxas das Laveiras. Nesse período produziu obras sob a influência de Domenichini, Caravaggio e de Gerardo della Notte, entre outros. Em 1802 foi convidado para o cargo de Primeiro Pintor da Câmara e da Corte. Após a morte de Vieira Portuense, substituiu este pintor na Aula de Desenho da Academia Real da Marinha e do Comércio. A sua manifestação de simpatia pelo exército invasor francês, nomeadamente através da obra Junot protegendo a cidade de Lisboa (1808), custou-lhe a liberdade após a saída das tropas napoleónicas. Voltou à Academia Real depois de sair da prisão, produzindo, no período seguinte, retratos dos deputados às Cortes Constituintes (1820-1821). Em 1823 foi obrigado a exilar-se por motivos de ordem política, instalando-se primeiro em França e, depois, em Roma onde retomou a pintura de temática religiosa.
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FRANCISCO METRASS 1825-1861 Camões na Gruta de Macau, c. 1853 Óleo s/ tela, 28 x 20 cm Ass. em baixo à esquerda: Metrass
Natural de Lisboa, frequentou a ABAL, onde foi aluno de António Manuel da Fonseca na cadeira de Pintura de História. A sua estada em Roma (1844-1846), onde estudou nos ateliers de Overbeck e de Cornelius, pô-lo perante a produção do Grupo dos Nazarenos, reforçando o seu interesse pela pintura de história, mas agora com conotações místicas e simbólicas. A sua passagem por Paris teve também grande impacto na sua obra e no meio artístico português na medida em que contactou com a pintura romântica francesa, cujos princípios estéticos terá divulgado no nosso país. O regresso a Portugal (1847) foi, porém, marcado pelo insucesso junto do público, partindo, desiludido, de novo para Paris. Durante o período seguinte de viagens entre Portugal e França, Metrass pintou as suas obras mais emblemáticas, encenando dramaticamente cenas da História nacional (Camões na gruta de Macau, 1853 e Inês de Castro pressentindo os assassinos, 1855, ambas do Museu do Chiado) e explorando expressivamente os temas românticos do limiar da morte ou da angústia existencial. O romantismo popularizou-se então em Portugal, após um primeiro momento de incompreensão, com as pinturas de Metrass, que seria nomeado professor da cadeira de pintura de História da EBAL.
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TOMÁS DE ANUNCIAÇÃO 1818-1879 Vitelos, 1874 Óleo s/ tela, 51 x 45 cm Ass. e dat. em cima à esquerda: Anunciação/ 1874
Nasceu em Lisboa, onde, a partir de 1837, frequentou a Academia Real de Belas-Artes, sendo aluno de António Manuel da Fonseca na cadeira de Pintura de História. Em 1844 protagonizou, juntamente com outros colegas, uma revolta contra o ensino académico, defendendo uma nova temática e uma nova prática centrada no trabalho ao ar livre. O Romantismo deu então um primeiro passo na arte portuguesa, tendo em Anunciação um dos seus principais nomes. Este artista manifestou grande apreço pelo animalismo (que progressivamente se sobrepõe à pintura de paisagem), que foi estimulado por uma breve passagem por Paris (1867), onde contactou com importantes animalistas franceses, como Rose Bonheur e ConstantTroyon. A partir de 1852 teve a possibilidade de pôr em prática a renovação que reclamava da Academia ao ser nomeado professor da cadeira de Pintura de Paisagem, Animais e Produtos Naturais. Ocupou posteriormente os cargos de director da Galeria Real da Ajuda e de director da ABAL. Respeitado pelos seus colegas artistas, Anunciação alcançou grande popularidade junto do público português, tendo sido apoiado por D. Fernando e pelo embaixador da Prússia.
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JOÃO CHRISTINO DA SILVA 1829-1877 Ínsua dos Bentos – Coimbra, c. 1860 Óleo s/ tela, 25 x 40 cm Ass. em baixo à direita: Christino
Frequentou a ABAL (1841-1847), donde saiu precocemente, descontente com o seu ensino. Juntou-se então ao grupo liderado por Tomás de Anunciação, que elevou o paisagismo a um tema de ruptura com a Academia, propondo uma nova metodologia artística baseada no contacto directo com o motivo. A pintura de Christino, Cinco artistas em Sintra (1855), tornou-se num manifesto deste grupo, retratando os pintores e expondo os princípios que defendem. Em 1859 tornou-se professor substituto da cadeira de Paisagem e Produtos Naturais da ABAL. Participou em 1862 na primeira exposição da SPBA. Em 1867 visitou Paris aquando da sua participação na Exposição Universal, viajando ainda para a Suiça apoiado por um subsídio do Estado.
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JOÃO ANTÓNIO CORREIA 1822-1896 Cabeça de Negro, 1873 Tinta s/ papel, 25,5 x 18,5 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: J. C 1873
A sua formação artística teve início na Academia Real da Marinha e Comércio e na APBA. Foi discípulo de Augusto Roquemont, de quem produziu um retrato (MNSR). A estudar em Paris desde 1848, foi aluno de Vernet, Delaroche e Ingres. Estes artistas influenciariam a sua obra, que se traduz sobretudo em retratos de grande clareza plástica e qualidade lumínica. Após sete anos de permanência na capital francesa regressou ao Porto, tornando-se em 1856 professor de pintura histórica da Academia e em 1882 director da Escola de Belas-Artes daquela cidade. Desempenhou, portanto, um papel de referência na formação da geração de artistas de 50-60 do Porto: Marques de Oliveira, Silva Porto, entre outros.
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LUIS DE MENEZES (VISCONDE DE MENEZES) 1817-1878 Retrato da Viscondessa de Menezes, mãe do pintor, 1859 Óleo s/ tela, 81,5 x 60 cm Ass. e dat. ao centro à esquerda: Visconde de Meneses fecit/ Lisboa 1859
Nasceu no Porto no seio de uma família aristocrática – seu pai, o 1.º Visconde de Menezes casou-se com uma senhora inglesa, que se tornaria num dos principais temas das suas pinturas, a par de outros membros do seu núcleo familiar e de auto-retratos. Participou, enquanto militar, no cerco da cidade do Porto pelo lado dos liberais. Após a Guerra Civil instalou-se em Lisboa (1834), onde deu início à sua formação artística, recebendo aulas de um professor francês e, posteriormente, de António Manuel da Fonseca. Estudou ainda na ABAL. Em 1844, aconselhado por D. Fernando, partiu para Itália na companhia de Metrass. Após um período de estudo e prática da pintura religiosa e do fresco sob a influência de Friedrich Overbeck, que então ensinava em Roma, decidiu dedicar-se ao retrato. Copiou então várias obras de Ticiano, Rembrandt, Van Dyck, Reynolds, Gainsborough, Rigaud e Winterhalter, entre outros, durante as suas viagens pela Bélgica, Holanda, Inglaterra e França. Em Londres conviveu com o grupo dos pré-rafaelitas. Em 1850 regressou com Metrass a Lisboa, com quem expõe no ano seguinte. Nessa mostra conjunta apresentou o Retrato do Professor C. W. King, obra de grande qualidade que se integra numa estética romântica. Em 1853, por morte de seu pai, tornou-se 2.º Visconde de Menezes. A sua intervenção no meio artístico nacional foi preponderante, tendo sido nomeado Académico de Mérito e um dos fundadores e vicepresidente da SPBA, onde expôs em 1862 e 1866. Foi também membro da Academia de Roma. Em 1867 apresentou-se na Exposição Universal de Paris e em Madrid.
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MIGUEL ÂNGELO LUPI 1826-1883 Serenata Napolitana, c. 1861-1863 Aguarela s/ papel, 20,5 x 27,5 cm N. ass. e n. dat.
Artista de ascendência italiana, natural de Lisboa, traçou um percurso particular, alheio a programas de grupo ou a propostas de ruptura. Frequentou a ABAL, donde saiu sem terminar o curso de pintura, optando por seguir uma carreira na função pública. Entre 1851 e 1853 viveu em Luanda. No seu regresso a Portugal, pintou o retrato de D. Pedro V para o Tribunal de Contas, para afirmar a sua vocação artística e dar continuidade à sua formação. O sucesso do seu trabalho garantiu-lhe uma estada em Roma como bolseiro, apoiada pelo Vice-Inspector da Academia Real de Belas-Artes. Copiou então obras de Ticiano, Correggio, Andrea del Sarto, Rubens e Velázquez. Visitou ainda Paris, entrando em contacto com o realismo francês, particularmente com as obras de Courbet. A sua obra afirma-se nos domínios da pintura de História e do retrato, modernizando, com grande qualidade, as heranças académicas em que se formara.
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NATURALISMO O naturalismo surge nas últimas décadas do século XIX e permanece até meados do século XX, abarcando várias gerações e diferentes temas. Silva Porto, Marques de Oliveira, Alfredo Keil, Sousa Pinto, João Vaz, José Malhoa, Columbano e Rafael Bordalo Pinheiro são alguns dos principais nomes do primeiro naturalismo português representados na colecção Telo de Morais. Muitos destes autores passaram por Paris utilizando, nas suas obras, uma estética internacional onde o motivo tem menos importância do que a captação da luz em determinado momento. A matéria da pintura é normalmente a paisagem onde surgem frequentemente figuras ligadas a costumes tradicionais, pontualmente cenas burguesas e o retrato. A nível técnico podemos destacar a utilização ritmada da cor, a fusão de tons e o empastamento da tinta. O Naturalismo prolongou-se pelas primeiras décadas do século XX com grupos de discípulos de Silva Porto, de Malhoa e Carlos Reis. Manteve-se o compromisso com a natureza, o “ar livrismo” e os valores casticistas e nacionalistas. No entanto, é possível verificar uma certa tendência para a simplificação das formas, invenção cromática e uma atenção por parte de alguns artistas à técnica impressionista.
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OS FUNDADORES
ANTÓNIO SILVA PORTO 1850-1893 Paisagem da Normandia – Impressão, c. 1874-1879 Óleo s/ tela, 26,4 x 45 cm N. ass. e n. dat.
Natural do Porto, iniciou a sua formação artística nesta cidade, primeiro na Escola Industrial (curso de desenho) e, posteriormente, na APBA, onde foi aluno de João António Correia e colega de Marques de Oliveira. Partiu com este último para Paris, como bolseiro do Estado em “Pintura de Paisagem e de Animais”, frequentando a École de Beaux-Arts, os ateliers de Yvon, Cabanel e Beauverie. Determinantes para o desenvolvimento da sua pintura (e para a consolidação do naturalismo como uma tendência pictórica marcante no panorama artístico nacional) foram o contacto directo com Daubigny, pintor do grupo de Fontainebleu, e com a produção da Escola de Barbizon. Viajou ainda durante o período de pensionato por Itália, Bélgica, Holanda e Espanha. O seu regresso a Portugal (1879) coincidiu com a morte de Tomás de Anunciação que deixou vaga a docência da cadeira de Pintura de Paisagem da ABAL. Silva Porto foi então convidado a ocupar a regência dessa disciplina, tornando-se numa figura central do movimento naturalista português. Foi em seu redor que alguns artistas naturalistas se reuniram, constituindo o Grupo do Leão (1881), que deu, em 1891, origem ao Grémio Artístico, do qual Silva Porto foi o primeiro presidente. Participou regularmente nas exposições realizadas por estas duas organizações, depois de ter integrado, durante o período de estada em Paris, os Salons de 1876, 1878 e de 1879 e a representação portuguesa na Exposição Universal de Paris em 1878.
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ALFREDO KEIL 1850-1907 Paisagem com seara, c. 1878 Óleo s/ cartão, 38 x 24 cm N. ass. e n. dat.
Nasceu no seio de uma família abastada de ascendência alemã, o que proporcionou que os seus primeiros estudos artísticos tivessem lugar na Alemanha. A sua aprendizagem, que decorreu sob a influência do romantismo do norte da Europa, teve início em Nuremberga, no atelier de August Kreling, seguindo depois para Munique, onde estudou no atelier de K. Von Kaulbach. De regresso a Portugal, trabalhou no atelier Joaquim Nunes Prieto e recebeu lições de Miguel Ângelo Lupi. Começou a expor em 1868 na SPBA, distinguindo-se quer da via romântica apresentada pelo grupo liderado por Tomás da Anunciação, quer da estética naturalista emergente. Paralelamente, desenvolveu uma carreira na música, sobretudo no domínio da ópera, mas compôs também A Portuguesa (actual hino nacional), criada aquando do Ultimato inglês. Apresentou-se em vários eventos internacionais, nomeadamente nas Exposições Universais de Paris (1878 e 1900), Exposição Internacional do Rio de Janeiro (1879) e Exposição Internacional de Madrid (1886), onde conquistou vários prémios.
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JOSÉ JÚLIO SOUSA PINTO 1856-1939 Apanha do sargaço – Francelos, 1915 Pastel s/ cartão, 25 x 37 cm Ass. e dat. em baixo à direita: Souza Pinto/ Francellos 1914
Iniciou a sua aprendizagem artística na APBA (1870), onde foi aluno de João Correia e de Soares dos Reis, concluindo o curso com uma média elevada. A exemplaridade do seu percurso académico fê-lo ganhar o concurso para o pensionato no estrangeiro, escolhendo a cidade de Paris para estudar Pintura de História (1880). Inscreveu-se então na École des Beaux-Arts e frequentou as aulas de Yvon e Cabanel, sendo principalmente influenciado por Jules Breton e por Bastien-Lepage. Foi também em Paris que iniciou uma carreira internacional, várias vezes premiada, apresentando-se no Salon a partir de 1883. Expôs também em Londres (Royal Academy, 1882), na Exposição Internacional de Nice (1884), na Exposição Universal de Paris (1889 e 1900), no Rio de Janeiro (1884, 1895, 1908 e 1912) e em Rennes (1896). Instalado em França, onde viria a morrer, manteve-se sempre em contacto com o meio artístico português, participando em várias exposições nacionais, nomeadamente do Grupo do Leão (1885, 1887 e 1888), da SPBA (1880 e 1887) do Grémio Artístico (1898) e da SNBA (1901, 1918 e 1937), onde foi também premiado. Destaca-se ainda a sua presença em alguns eventos realizados no Porto, como a Trienal da APBA (1881 e 1884), as Exposições d’Arte organizadas por artistas do Porto, como António José da Costa e Marques de Oliveira (1887 e 1893). Em 1932 foi homenageado no Porto através de uma exposição que integrou pinturas e desenhos da sua autoria (em 1916 realizara na SNBA a sua primeira individual, expondo pintura, pastel e desenho).
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JOÃO VAZ 1859-1931 Barcos no Sado, s.d. Óleo s/ madeira, 28,8 x 40,1 cm Ass. em baixo à direita: Vaz
Nasceu em Setúbal, onde apreendeu a beleza do rio e das suas margens, o que determinou uma tendência natural para a pintura de paisagem. Entre 1872 e 1878 frequentou a ABAL, onde foi aluno de Tomás de Anunciação. Viajou com António Ramalho por Madrid e Paris. Após o seu regresso a Portugal integrou o Grupo do Leão, participando, de 1882 a 1888, nas suas exposições e, posteriormente, nas do Grémio Artístico (1891-1899). Apresentou-se também na SPBA (1880, 1884), na SNBA (1901-1931) e em alguns eventos internacionais (Berlim, 1896; Paris, 1900; St. Louis, 1904; Rio de Janeiro, 1908). Desenvolveu paralelamente carreira no ensino técnico. Realizou vários projectos de pintura decorativa para edifícios públicos e privados (Assembleia da República, Teatro de Setúbal, Teatro Garcia de Resende em Évora, etc.).
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JOSÉ MALHOA 1855-1933 A retardatária, 1924 Óleo s/ tela colada em madeira, 31 x 39 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: José Malhoa/ 1924
Nasceu nas Caldas da Rainha numa família de poucos recursos, pelo que, aos oito anos teve que procurar trabalho em Lisboa, entrando para a oficina do entalhador Leandro Braga. Este aconselhou-o a estudar na ABAL, onde seria aluno de Tomás de Anunciação e de Miguel Ângelo Lupi. Após duas tentativas falhadas de conseguir a pensão do Estado para estudar no estrangeiro e o sucesso que uma obra sua alcançou numa exposição em Madrid, integrou o Grupo do Leão (1881), assegurando assim um lugar junto dos precursores do movimento naturalista em Portugal. A sua actividade expositiva foi intensa, participando na Exposição Universal de Paris em 1900 e em várias Exposições Internacionais. A sua obra foi conquistando grande popularidade junto do público, quer pelas suas paisagens, quer pelas narrativas populares ou burguesas que retratou. Realizou diversas encomendas públicas e privadas, onde encontramos outras vertentes da sua produção, o retrato e a pintura de história. Esta última foi aplicada na decoração de vários edifícios do Estado: Conservatório Nacional (1888), Supremo Tribunal de Justiça (1888), Câmara Municipal de Lisboa (1899), Palácio da Ajuda (1890), Assembleia da República (1891), Museu Militar (1907-1908).
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ANTÓNIO RAMALHO 1858-1916 Claustros, c. 1884 Óleo s/ madeira, 32,2 x 46,2 cm Ass. em baixo à esquerda: ARamalho F.
Natural da região do Alto Douro, instalou-se com a família no Porto e, mais tarde, em Lisboa. Devido às carências económicas da sua família, começou por trabalhar na área comercial, ingressando depois na ABAL com o apoio monetário de amigos. Na academia foi aluno de Tomás de Anunciação e de Silva Porto. Depois de ter concorrido, sem sucesso, ao pensionato no estrangeiro (1879), expôs a sua obra ao lado de Columbano na Associação dos Jornalistas e escritores (1880). Em 1882 partiu para Paris com o patrocínio do Marquês da Praia, onde frequentou o atelier de Cabanel. A experiência na capital francesa foi fundamental para a consolidação técnica e estilista da sua pintura. No regresso a Portugal (1884) retomou o convívio com o Grupo do Leão, figurando na tela homónima de Columbano (1885), e participou nas primeiras exposições do Grémio Artístico, criado em 1891. Para além de retratos e paisagens, realizou também trabalhos de decoração de interiores em Lisboa (Escola Médica, Cervejaria Leão de Ouro, Cervejaria Jansen, etc.), Buçaco (Hotel Palace), Évora (Hotel Barahona, Teatro Garcia de Resende) e Figueira da Foz (Palácio Sotto-Mayor).
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JOSEFA GRENO 1850-1902 Peónias, s.d. Óleo s/ tela, 56 x 38,5 cm Ass. em baixo à direita: Josefa Garcia Greno
Pintora espanhola, casada com Adolfo Greno (1854-1901), manifestou um talento superior ao do seu marido, especializando-se na pintura de flores e de frutos. Expôs, no início da sua carreira, com o Grupo do Leão. Fialho de Almeida, Silva Porto, Malhoa e Columbano manifestaram apreço pela sua pintura.
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JOSÉ DE ALMEIDA E SILVA 1864-1945 Cabeça de borrego, 1901 Óleo s/ madeira, 27 x 20,7 cm Ass., local. e dat. em baixo à esquerda: Almeida e/ Silva/ Vizeu - 901
Natural de Viseu, formou-se em Pintura na EBAP. A sua produção repartiu-se entre a ilustração (fundou em 1885 o jornal humorístico Maria da Fonte) e a pintura, ligando-se neste caso ao naturalismo. Executou também retratos e publicou livros pedagógicos e de ficção. Foi premiado pelo Grémio Artístico e pela SNBA.
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ENRIQUE CASANOVA 1850-1913 Furnas da Ericeira, 1913 Aguarela s/ papel, 26 x 48 cm Ass. e dat. em baixo à direita: E Casanova/ 1913
Natural de Saragoça, o seu envolvimento na corte do rei Amadeu de Sabóia, de quem pintou vários retratos, resultou na sua prisão após abdicação do monarca e a implantação da I República espanhola (1873). Após ter sido libertado, instalou-se em Portugal em 1880, encontrando lugar na corte de D. Luís como retratista e mestre dos príncipes reais, D. Carlos e D. Afonso. Foi também professor dos filhos de D. Carlos, D. Luís Filipe e D. Manuel. Quer na sua carreira como artista, quer na sua actividade como professor, a aguarela desempenhou papel central, adoptando a em diversas temáticas: paisagem, marinhas, figura humana, motivos arquitectónicos e arqueológicos. A sua acção à frente da oficina de desenho e de litografia da Imprensa Nacional teve consequências importantes, ao introduzir novas técnicas e orientações estéticas.
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PAISAGENS
LÁZARO LOZANO 1906-1999 Convento da Arrábida, s.d. Óleo s/ tela, 65,8 x 81,6 cm Ass. em baixo à esquerda: LÁZARO
Nasceu na Nazaré, donde retirou as personagens e paisagens da sua pintura. De ascendência espanhola, a sua actividade repartiu-se entre Portugal e Espanha. Estudou pintura na EBAL e em Madrid. As referências da sua obra são sobretudo espanholas, particularmente através do pintor valenciano Sorolla.
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ABEL MANTA 1888-1982 Trechos de aldeia – Serra da Estrela, 1918 Óleo s/ cartão, 38 x 46 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: Abel Manta/ 918
Artista nascido em Gouveia, veio para Lisboa em 1904 para estudar na EBAP, com o apoio da Condessa de Vinhó e Almedina. Em 1919 partiu para Paris, onde participou em alguns Salons e recebeu a influência dos artistas impressionistas e, sobretudo, de Cézanne. Manifestou-se, então, o olhar analítico com que abordava objectos (naturezas-mortas), pessoas (retratos) e paisagens de Lisboa, transferidas para a tela através de uma modelação volumétrica, à qual não era alheio o trabalho sensível da cor. Após o seu regresso a Portugal, em 1926, dedicou-se ao ensino técnico, tornando-se professor da EADAA, sem, contudo, abandonar a pintura. Participou em vários projectos públicos, como os pavilhões portugueses em exposições internacionais e os cartões de vitrais para uma das naves laterais da Igreja dos Jerónimos. Em 1957 recebeu o primeiro prémio de pintura na Exposição de Artes Plásticas da FCG.
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ALBERTO DE SOUSA 1880-1961 Casario - Avô, 1933 Aguarela s/ papel, 54 x 38 cm Ass., local. e dat. em baixo à direita: Alberto Souza/ -Avô 1933-
Estudou na EBAL, onde foi aluno de Manuel de Macedo e de Nicola Bigaglia. A partir de 1897 iniciou uma colaboração com Roque Gameiro, também seu professor, que resultou, entre outras obras, na ilustração dos Quadros da História de Portugal (1916). Para além da ilustração, dedicou-se também à aguarela, que utilizou para representar os monumentos portugueses em Marrocos. Estes trabalhos foram expostos no Museu Militar e valeram-lhe o Grande Prémio da Exposição Internacional de Paris (1931). A sua produção abrange a paisagem, figuras do povo e interiores e vistas de monumentos portugueses. Recebeu a medalha de honra da SNBA e foi vogal honorário da ANBA.
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ANTÓNIO VITORINO 1891-1973 Largo pintor José Pereira – Viseu, c. 1947 Aguarela s/ papel, 37 x 27 cm Ass. em baixo à esquerda: Antonio Victorino
Nasceu nas Caldas da Rainha, onde frequentou a Escola de Desenho Rainha D. Leonor. Dedicou-se à cerâmica, tendo tido como mestres Rafael Bordalo Pinheiro e Costa Mota. Foi também um aguarelista atento aos pormenores pitorescos após ter estudado esta técnica com António de Souza. Destacou-se em Coimbra como um artista muito activo sobretudo ao nível da docência na Escola Industrial de Avelar Brotero. Foi galardoado várias vezes como aguarelista pela SNBA.
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FAUSTO GONÇALVES 1893-1946 Veneza, 1923 Óleo s/ madeira, 41 x 32 cm Ass., local. e dat. em baixo à direita: Fausto Gonçalves/ Veneza 923
Natural de Coimbra, iniciou a sua formação artística nesta cidade, na ELAD. Estudou em academias francesas, nomeadamente com Laurens. Dedicou-se ao paisagismo, tendo sido premiado pela SNBA. 32
CENAS DE INTERIOR E RETRATOS
AURÉLIA DE SOUSA 1866-1922 Romãs, s.d. Óleo s/ tela, 32 x 41 cm Ass. em baixo à esquerda: aSouza
Nasceu no Chile, mas ainda muito nova veio para Portugal com os seus pais, que regressam assim à sua terra natal, instalando-se no Porto, na Quinta da China. Aí recebeu as suas primeiras aulas de pintura e desenho com Caetano da Costa Lima. Entre 1893 e 1898 frequentou os cursos de Desenho e de Pintura de História da APBA, sendo aluna nesta última cadeira de Marques de Oliveira. Em 1899 partiu para Paris, com o apoio de uma das suas irmãs. Na capital francesa estudou na Académie Julien com J.-P. Laurens e Benjamin Constant e viajou até à Bretanha para pintar. Visitou também a Bélgica, Holanda, Alemanha, Itália e Espanha na companhia da sua irmã Sofia, apreciando obras de artistas que admirava: Rembrandt, Brouwer, Velásquez, Van Dick, Whistler e Böcklin. A experiência em Paris e as viagens que empreendeu, marcariam a sua produção no seu regresso ao Porto em 1902. Trabalhando recolhida na sua quinta nas margens do Douro, a sua pintura, geralmente em médio e pequeno formato, viveu da intimidade familiar e das imagens reconhecidas do dia-a-dia que transformou em obras de arte: retratos, naturezasmortas e paisagens. O seu auto-retrato (c. 1900, MNSR) é uma obra de relevo da arte portuguesa, abrindo-nos para o talento e para o desprendimento de convencionalismos desta pintora. 33
MANUEL BENTES 1885-1961 Natureza morta – Paris, c. 1910-1911 Óleo s/ tela, 65,5 x 81 cm Ass. em baixo à direita: M. Bentes
Abandonou a ABAL em 1905 para estudar em Paris. Na capital francesa conviveu com outros artistas portugueses que nutriam o mesmo desprezo pelo ensino académico português. Foi com intenção polémica e de denúncia que liderou a Exposição Livre, organizada em 1911, que recebeu alguma atenção pela imprensa. Bentes revelou então as directrizes da sua pintura: “os artistas têm uma só escola – a Natureza; um dogma único – o Amor”. Após o fim da I Guerra Mundial regressou a Paris, onde permaneceu até 1938. A sua obra define-se por um paisagismo discretamente tocado pelo impressionismo.
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RAQUEL ROQUE GAMEIRO 1889-1970 À hora do chá, 1919 Aguarela s/ cartão, 39,5 x 37,3 cm Ass. e dat. em baixo à direita: Raquel/ 1919
Filha de Alfredo Roque Gameiro, dedicou-se ao desenho e à aguarela que utilizou na ilustração de várias publicações, nomeadamente livros infantis, jornais e revistas. Observou com particular interesse a rotina do povo dos arredores de Lisboa, mas também os quotidianos burgueses a partir da sua poética feminina, sempre com o olhar direccionado para os elementos visuais mais atractivos. Foi premiada pela SNBA e expôs em Madrid, Londres, Nova Iorque e Rio de Janeiro.
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RICARDO HOGAN 1843-1890 Cena de salão, 1886 Aguarela s/ papel, 37 x 20,8 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: RHogan/ 1886
A sua formação artística decorreu primeiramente em Inglaterra, onde foi influenciado por Fortuny e Kaemmerer. Interessado particularmente na aguarela, estudou em Lisboa com Enrique Casanova, com quem pretendeu criar a Sociedade de Aguarelistas. Diversificou a utilização da aguarela em diversas temáticas – marinhas, interiores, paisagens, cenas de costumes - tirando partido das possibilidades oferecidas por aquela técnica, sobretudo ao nível cromático.
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JOÃO AUGUSTO RIBEIRO 1860-1932 Homem com uma caneca, s.d. Óleo s/ madeira, 42 x 31,3 cm Ass. em baixo à esquerda: JARibeiro
Nascido em Vila Real de Trás-os-Montes, viveu no Porto entre 1877 e 1885, onde frequentou a APBA. Aluno de João Correia, foi várias vezes premiado pela Academia, terminando o curso com média de 18 valores. Começou a expor com regularidade a partir de 1892, distinguindo-se sobretudo pelos retratos que produziu de amigos e familiares. Os traços fisionómicos captados com grande precisão marcam o seu trabalho que abraçou ainda cenas de quotidiano, paisagens e temas históricos. Fez também carreira no ensino, marcada por uma longa docência no Instituto Industrial e Comercial do Porto e pela regência interina de algumas cadeiras da EBAP. Foi ainda publicista nas revistas Arte Portuguesa e A Águia.
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CONSTANTINO FERNANDES 1878-1920 Mulher espanhola, 1902 Pastel s/ cartão, 39,5 x 19,5 cm Dedicatória em cima à direita: Ao seu bom primo Alfredo Mendes/ off.º/ Constantino/ 20/4/902
Natural de Lisboa, estudou na EBAL com Veloso Salgado, seguindo depois para Paris. Aí frequentou as aulas de J.-P. Laurens, Cormon, Bachet e Schommer. Distinguindo-se por um tratamento realista do motivo, executou retratos, pintura histórica e um tríptico, O Marinheiro (1913, Museu do Chiado), que ilustra cenas da vida de um marinheiro com uma eficácia narrativa e compositiva rara em Portugal. Esta pintura valeu ao seu autor a Medalha de Honra da SNBA. Interveio na decoração dos palácios do Marquês de Val-Flor e de Henrique de Mendonça.
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ANTÓNIO CARNEIRO 1872-1930 Retrato de Nati Alvarez, 1915 Sanguínea s/ papel, 50 x 30,8 cm Ass. e dat. em baixo à direita: Antonio Carneiro/ 1915-XII/ 15 Dedicatória em baixo à esquerda: a Nati Alvarez
Nasceu em Amarante, mas foi, muito cedo, viver para o Porto. A sua formação artística compreendeu não só a aprendizagem na APBA (1884-1896), onde foi discípulo de Soares dos Reis, João Correia e Marques de Oliveira, bem como uma estada em Paris (1897-1900), onde frequentou a Academia Julian. Participou em 1900 na Exposição Universal de Paris, tendo obtido uma medalha de bronze por uma das obras que ali expôs (A fonte do Bem). Na capital francesa foi sobretudo atraído pelo Simbolismo, que influenciou a sua obra mais paradigmática, o Tríptico da Vida. Antes do regresso definitivo ao Porto viajou pela Bélgica e Itália. É dentro de um ambiente de elevação espiritual e intelectual que Carneiro se integrou no meio cultural e artístico portuense no início do século, juntandose ao grupo da Renascença Portuguesa. Entre 1910 (ano da sua fundação) até 1927, foi director artístico de A Águia, principal órgão de divulgação desse movimento. Em 1918 tornou-se professor da EBAP e em 1929 foi nomeado seu director, não chegando a ocupar esse cargo. A sua pintura é dominada sobretudo por dois géneros, o retrato e a paisagem.
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MODERNISMO A ruptura moderna em Portugal deu-se através de pequenas vias individuais em paralelo com o naturalismo. Durante a primeira metade do século XX, os poucos artistas portugueses que demonstraram tendências artísticas contemporâneas nunca abandonaram a representação do visível. Verificaram-se pesquisas individuais que resultaram em formulações diversas de (re)interpretação da natureza. Por outro lado, alguns artistas, sob a influência do casal Delaunay, refugiado em Portugal durante a I Guerra, inspiraram-se nas vivências rurais enaltecendo as cores e geometrizando as formas. Outra via inspirou-se no expressionismo e ingenuísmo, tendência seguida frequentemente por artistas mulheres. Encontramos também, uma modernização do traço e simplificação e exploração plástica das formas no desenho humorístico, na caricatura e na ilustração publicitária. Efectivamente, foram os salões humorísticos, as ilustrações das revistas e o grafismo publicitário que contribuíram para popularização do gosto moderno em Portugal.
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CULTURA POPULAR
MÁRIO ELOY 1900-1951 Mulher com barros ou Mulher da barraca, c. 1923-1925 Óleo s/ cartão, 39 x 31 cm Ass. em baixo à direita: Mario Eloy
Nasceu em Algés no seio de uma família com ligação ao comércio da ourivesaria e ao teatro. Após uma curta passagem pela EBAL, participou no I Salão de Outono (1925) a convite de Eduardo Vianna, que exerceu uma forte influência na fase inicial da sua obra. Em 1926 partiu para Paris, onde apreciou obras de Picasso, Cézanne e Van Gogh, mas foi em Berlim, onde viveu entre 1927 e 1932, que definiu o futuro e a singularidade da sua produção ao entrar em contacto directo com o expressionismo. Nas capitais francesa e alemã trabalhou o retrato privilegiando a exteriorização psicológica do retratado, o que determinava a própria representação física, que se encontrava, por isso, sujeita a transfigurações. Por outro lado, interessava também a Eloy a dimensão popular e folclórica da cultura portuguesa, dando atenção, também neste domínio, à invenção formal. A simplificação da forma era conjugada com uma utilização livre e poética da cor, constituindo narrativas dramáticas e simbólicas (A Fuga, Jacob e o anjo), sobretudo a partir de 1939. Estas obras evidenciavam a instabilidade psicológica do seu autor. De facto, Eloy padecia de uma doença rara que obrigou ao seu internamento permanente a partir 1945.
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JORGE BARRADAS 1894-1971 Peixeira de Lisboa, 1930 Guache e tinta da china s/ papel, 35 x 29,8 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: Jorge/ Barradas ‘930
Frequentou a EBAL, que abandonou antes de receber o diploma, por discordar do ensino que era ali praticado. Introduziu-se no meio artístico português pela via da ilustração e do desenho, participando em 1912 no I Salão dos Humoristas. Colaborou com várias revistas como ABC e Ilustração, e interveio no campo da publicidade. Na pintura, destacou-se também como um dos principais protagonistas da sua renovação modernista, participando na decoração d’A Brasileira e do Bristol Club. A partir dos anos 30 a sua pesquisa orientou-se para as colónias portuguesas em África, recolhendo vários elementos que incorporaria na sua pintura. Nos anos 40 e 50 a sua produção estendeu-se à cerâmica e ao azulejo.
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BERNARDO MARQUES 1899-1962 Mercado, década de 50 Tinta da china e litográfica s/ papel, 33,5 x 44,5 cm Ass. em baixo à esquerda: Bernardo Marques Inscrição: Mercado
Nasceu em Silves, cidade que abandonou em 1918 para frequentar a Faculdade de Letras em Lisboa. Deixou, no entanto, a sua formação inacabada para se dedicar, a partir de 1921, à actividade artística. Autodidacta, ligou-se sobretudo ao desenho, colaborando com várias publicações nacionais (ABC, Ilustração Portugueza, Contemporânea, Ilustração, Sempre Fixe, Civilização, Presença, Colóquio). Interveio na redecoração do café A Brasileira e em várias iniciativas promovidas pelo SPN de António Ferro, como os pavilhões portugueses das Exposições Internacionais de Paris (1937), de Nova Iorque e de São Francisco (1939). A consolidação técnica e estilística da sua produção adveio das suas viagens ao estrangeiro, a Paris em 1934, mas sobretudo a Berlim em 1929, onde contactou com os artistas expressionistas, nomeadamente George Grosz. Para além de ilustrador e publicitário, foi também cenógrafo, figurinista e gráfico. Recebeu vários prémios, como o prémio de aguarela e desenho da Exposição de Artes Plásticas (1957) e o prémio de pintura da II Exposição de Artes Plásticas da FCG (1961).
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CIPRIANO DOURADO 1921-1981 Plantando arroz, 1955 Tinta da china s/ papel, 30 x 44 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: Cipriano Dourado 55
Nasceu no concelho de Mação. Ainda muito jovem, trabalhou como desenhador-litógrafo, frequentando mais tarde o curso nocturno da SNBA. Produzindo sobretudo em gravura e aguarela, adoptou a estética neo-realista, convivendo com outros seguidores deste movimento e participando nos eventos que estes organizam. Apresentou-se nas Exposições Gerais de Artes Plásticas (1946-1956) e participou, juntamente com Júlio Pomar, Rogério Ribeiro, Alves Redol e António Alfredo, no projecto do Ciclo do Arroz (1953), que, no âmbito do neorealismo, assentou no registo do trabalho nos arrozais do Ribatejo, promovendo o contacto directo com a vida da gente do campo.
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REINTERPRETANDO A PAISAGEM
TOMÁS LEAL DA CÂMARA 1876-1948 Rio Douro – Porto, 1912 Pastel e guache s/ papel, 45,2 x 53,2 cm Dat. e ass. em baixo à esquerda: Porto 1912/ Leal da Câmara
Leal da Câmara é uma figura de referência da história da caricatura nacional. Colaborou no popular periódico parisiense L’Assiette au Beurre durante a época em que viveu em Paris (1900-1910). Nesta publicação pôde desenvolver livremente a sua crítica à Monarquia e à Igreja, depois de ter sido censurado em Portugal e obrigado ao exílio, primeiro em Madrid e depois em Paris. O sintetismo do desenho, apoiado na expressividade das figuras e na paródia às instituições marcavam a sua produção caricatural. Dedicou-se também à pintura, sector menos conhecido da sua produção, que foi apresentada em Portugal em 1911 na Sociedade de Belas-Artes do Porto.
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MANUEL JARDIM 1884-1923 Na Ria de Aveiro, s. d. Óleo s/ a tela colada em cartão, 27 x 35 cm Ass. em baixo à esquerda: mJardim
Pintor nascido em Montemor-o-Velho, fez os seus primeiros estudos em Coimbra, onde terá surgido o seu gosto pela arte. Frequentou a EBAL entre 1903 e 1905, ano em que partiu para Paris. Na capital francesa estudou em academias de arte e visitou museus. Regressou a Portugal em 1914, instalando-se em Coimbra, onde dirigiu com Francisco Franco uma galeria particular. Fundou também, com José Pacheko, a Sociedade Portuguesa de Arte Moderna. A sua pintura foi marcada pela sua aprendizagem na capital francesa, adoptando a pincelada impressionista e um cromatismo vivo, aproximando-se, depois, do expressionismo, para, finalmente, dirigir o seu trabalho no sentido de uma purificação plástica. Morreu precocemente, vítima de tuberculose.
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DORDIO GOMES 1890-1976 Cavalos, 1932 Óleo s/ tela, 62 x 50,5 cm Ass. e dat. em baixo à direita: Dordio/ 1932
Artista de origem alentejana, nascido em Arraiolos, a paisagem da sua terra natal terá sido a sua primeira referência e o catalizador da renovação da sua pintura, após a sua segunda estadia em Paris (1921-1926). A forma foi então submetida a uma abordagem mais analítica, seguindo a matriz cezanniana. Dordio viajou ainda pela Bélgica, Suíça, Holanda e Itália. A ida de Dordio para o Porto, para leccionar pintura na EBAP, provocou uma nova fase na sua pintura, que assumiu os valores lumínicos e atmosféricos daquela cidade. O rio Douro tornou-se no principal tema da sua pintura. Figura respeitada no meio artístico português, não só como artista, mas também como professor, Dordio participou em importantes exposições ligadas ao movimento modernista português, como os 5 Independentes (1923), I Salão dos Independentes (1930) e I Exposição de Artes Plásticas da FCG (1957), onde lhe foi atribuído o primeiro prémio de pintura. Participou ainda nas bienais de Veneza e de S. Paulo (anos 50), na Exposição Internacional do Rio de Janeiro (1922) e na Exposição Internacional de Paris (1937). Nestas duas últimas exposições recebeu a medalha de ouro.
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CARLOS BOTELHO 1899-1982 Igreja de S. Cristóvão - Lisboa, 1937 Óleo s/ tela, 62 x 77,5 cm Ass. e dat. em baixo à direita: Botelho 37
Artista autodidacta, com uma breve passagem pela EBAL. Lisboa é o tema por excelência da sua pintura, retratado em inúmeras paisagens que contribuíram para uma nova imagética da cidade. A sua produção abrangeu outras áreas como a cerâmica industrial, tapeçaria e cenografia. Esteve também ligado à ilustração, banda desenhada e caricatura, manifestando o mesmo gosto de experimentação e actualização artísticas dos artistas da sua geração. Destacou-se a página “Ecos da Semana” produzida para o Sempre Fixe. Nos anos de 1930, foi membro da equipa de decoradores do SPN, participando na decoração de numerosos pavilhões portugueses de exposições nacionais e internacionais.
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MILY POSSOZ 1888-1967 No jardim, 1916 Aguarela s/ papel-cartolina, 35,5 x 29 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: Mily Possoz/ 1916
Nascida em Lisboa, filha de pais belgas, estudou com o aguarelista Enrique Casanova, antes de viajar para Paris, onde frequentou ateliers e academias a partir de 1905. Em 1909 iniciou uma intensa intervenção no meio artístico português, participando nos salões da SNBA e do SPN / SNI, obtendo vários prémios. Relacionando-se com os artistas modernistas (foi noiva de Eduardo Vianna), expôs com os humoristas em 13 e com os “independentes” em 1930 e 1931. Foi uma das protagonistas de uma via artística que renovou os géneros pictóricos a partir de uma visão ingénua e deslumbrada, atenta a pormenores estéticos. Assim pintou meninas, gatos e paisagens de Sintra. Entre 1922 e 1937 instalou-se em Paris, onde integrou o grupo da Jeune Gravure Contemporaine e obteve um medalha de ouro na Exposição Internacional de Paris (1937). Ilustrou vários livros infantis.
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LINO ANTÓNIO 1898-1974 Leiria, 1923 Óleo s/ madeira, 49 x 64 cm Ass., local. e dat. em baixo à direita: Lino António/ Leiria 1923
Estudou na EBAP. Durante a sua vida artística participou em poucas exposições, correspondendo, no entanto, às solicitações do Estado – executou várias encomendas públicas, diversificando a sua actividade em frescos, tapeçarias, vitrais e cerâmica. Foi como decorador que contribuiu para o pavilhão português na Exposição de Sevilha (1927) e para a Exposição do Mundo Português (1940). Pintor modernista, mas com forte pendor naturalista, Lino António pertence a um vasto grupo de artistas portugueses que visam realizar uma síntese conservadora entre naturalismo, impressionismo e ingenuísmo, predominantemente ao serviço da celebração das paisagens e dos costumes populares.
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INGENUÍSMO E ILUSTRAÇÃO
FRANCIS SMITH 1881-1961 Uma rua em Portugal, 1927 Óleo s/ tela, 65 x 54 cm Ass. e dat. em baixo à esquerda: Francis Smith 1927
Nasceu em Lisboa, no seio de uma família de tradições militares, que dele esperava que seguisse a mesma carreira. No entanto, sentiu maior vocação para as artes, instalando-se em 1902, em Paris. A sua actividade artística desenrolou-se sobretudo em França (naturalizou-se francês nos anos 30), onde lhe foi atribuída a Legião de Honra (1933) e realizou uma encomenda de 30 telas para o Museu das Colónias (Paris). Manteve, no entanto, uma forte ligação a Portugal, não só expositiva, como também iconográfica. Participou na Exposição Livre de 1911, no I Salão de Outono e, em 1937, na I Exposição de Arte Moderna e na decoração do pavilhão português da Exposição Internacional de Paris. O seu paisagismo recria a sua imagem de Lisboa, com uma paleta suave e uma composição apaziguadora, retirando da memória os elementos castiços da sua cidade natal.
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JOSÉ STUART CARVALHAIS 1887-1961 Ao espelho, 1919 Aguarela s/ papel, 31 x 17,5 cm Ass. e dat. em baixo à direita: Stuart/ 919
Nasceu em Vila Real, filho de pai português e de mãe inglesa. O seu pai era correspondente de um jornal humorístico do Porto. Este antecedente é significativo na carreira de Stuart, que se juntou à sua geração no desenvolvimento do desenho pela via do sintetismo. Colaborou em vários periódicos: A Sátira, O Papagaio Real, O Século (onde criou as Aventuras do Quim e do Manecas, que originaram um filme em 1916), ABCzinho, Ilustração e Sempre Fixe. O seu olhar crítico dirigia-se sobretudo para a vida da cidade e os seus protagonistas (prostitutas, varinas, ardinas, polícias, senhoras de sociedade). Interveio na decoração do café A Brasileira (1925).
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DIOGO DE MACEDO 1889-1959 Enlevo, 1919 Tinta s/ papel, 31 x 23,5 cm Dedicatória em baixo à esquerda: à Maria Eduarda off.º DIOGO DE/ MACEDO/ I-V-XIX
Nasceu em Gaia, iniciando-se na escultura e no desenho com Fernandes Caldas. Frequentou a ABAP entre 1902 e 1911. Neste ano partiu para Paris onde se inscreveu em algumas academias e contactou com a obra de Bourdelle e Rodin, que constituem as principais referências do seu trabalho. Na capital francesa conviveu com os artistas portugueses (Eduardo Vianna, Emmérico Nunes, Manuel Bentes, etc.) e estrangeiros (Modigliani, Diego Rivera…), deixando testemunho do ambiente e convivência desse período na monografia 14, Cité Falguière (publicada em 1930). Regressou a Portugal em 1924, desenvolvendo o seu trabalho escultórico em Lisboa, dedicando-se sobretudo ao retrato. A partir de 1941 abandonou a prática artística a favor de uma acção ligada à divulgação e promoção culturais. Dos cargos que ocupou destaca-se a direcção do MNAC entre 1944 e 1959.
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CHRISTIANO CRUZ 1892-1951 O rei tenista (Afonso XIII de Espanha), c. 1913 Lápis de carvão e sanguínea s/ papel, 28,8 x 16,7 cm Ass. em baixo à esquerda: Chr. Cruz
Nasceu em Leiria no seio de uma família republicana. A sua formação académica fez-se na área da medicina veterinária, desenvolvendo paralelamente uma actividade de grande importância no campo do desenho humorístico, numa altura em que os pressupostos da arte moderna eram introduzidos em Portugal. Fixou-se em Lisboa em 1910, entrando em contacto com outros artistas que se dedicavam ao desenho e à ilustração, nomeadamente Almada Negreiros, Jorge Barradas, António Soares, etc. Com eles criou a Sociedade dos Humoristas Portugueses, participando em 1912 no Salão dos Humoristas. A sua obra foi-se desenvolvendo no sentido da estilização e, numa segunda fase, incorporou a referência expressionista. Em 1916 integrou o Corpo Expedicionário Português e partiu para França. Aí captou, em trabalhos de grande austeridade, cenas da I Guerra Mundial. Dedicou-se também à pintura reproduzindo, da mesma forma esquemática, episódios da vida mundana. Em 1919 instalou-se em Lourenço Marques, Moçambique, abandonando a actividade artística.
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JOSÉ DE ALMADA NEGREIROS 1893-1970 O toureio de Cañero, 1925 Tinta da china s/ papel, 36,4 x 49,6 cm Ass. e dat. em cima à esquerda: almada/ 25
Grande agitador do meio artístico nacional nas primeiras décadas do século XX, foi um artista de referência do modernismo português, ampliando-o a várias manifestações: desenho, pintura, literatura, dança, teatro, performance. Nascido em São Tomé, chegou a Lisboa em 1900. Sem formação artística académica, expôs em 1912 no I Salão dos Humoristas, onde foi notado por Fernando Pessoa. Optou então pela liberdade plástica do desenho, trabalhando em caricatura, ilustração e publicidade. Participou nas revistas Portugal Futurista (1917) e Contemporânea (1922-1926) e foi responsável pelos painéis decorativos para a Alfaiataria Cunha (1913), intervindo também na decoração do café A Brasileira (1925) e do Bristol Club (1926). Em 1927 fixou-se em Madrid, desenvolvendo aí a sua actividade de ilustrador, decorador e ensaísta até 1932, quando regressou a Portugal, iniciando uma colaboração com o SPN, que iria, com a organização de uma retrospectiva (1941) e a atribuição de alguns prémios, consagrar a sua carreira artística. Desta cumplicidade, em articulação com o arquitecto Pardal Monteiro, resultaram os projectos de decoração de edifícios públicos, nomeadamente a Igreja de Nossa Senhora de Fátima (Lisboa, 1938), as gares marítimas de Alcântara (1944) e da Rocha do Conde de Óbidos (1948). O desenho manteve-se como o suporte determinante da sua obra, trabalhando-o sinteticamente, ganhando depois volumetria para mais tarde se planificar e se submeter a uma disciplina geométrica. Entre as obras emblemáticas que produziu encontra-se o retrato de Fernando Pessoa (1954). No entanto, no final dos anos 50, iniciou um trabalho com base numa reflexão matemática, alquímica e mística que subordinaria as suas obras a um abstraccionismo codificado, de que é exemplo o mural alegórico Começar (1968) do átrio principal da sede da FCG.
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Ficha Técnica Coordenação Berta Duarte Joana Barata Textos Leonor Oliveira Raquel Magalhães Virgínia Gomes Raquel Henriques da Silva Montagem António Marques Fernando Acúrcio Jorge Duarte Apoio António Martins João Bacelar Paula Moura Relvas
Fotografia Foto Alvão - Porto Impressão e acabamento Gráfica Ediliber, Lda
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