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A UNIÃO (DE RITMOS) FAZ A FORÇA?
Festivais musicais alternativos reforçam a luta pela visibilidade e pela diversidade
Os festivais de música são responsáveis por aglutinar todas as coisas que um bom fã de música ama: várias bandas e cantores em um único e grande evento, com diferentes estilos, gêneros e ritmos sonoros. Alguns festivais buscam dar um lugar de protagonismo estilos musicais alternativos, como o Lollapalooza, que proporciona uma experiência única para o seu variado e amplo público. Muitos festivais são anuais, ou se repetem de acordo com um intervalo específico de tempo.
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Os festivais de música independente no Brasil surgiram após o sucesso dos primeiros programas de televisão voltados para a música, em especial o “Brasil 60”, que era exibido na TV Excelsior e produzido por Manoel Carlos. O produtor musical Solano Ribeiro achou que era o momento de criar um festival brasileiro de música, e assim idealizou, criou e promoveu os festivais de Música Popular Brasileira, concursos anuais de canções originais e inéditas, que revelaram novos talentos ao mundo, como Elis Regina, Chico Buarque, Nara Leão, Martinho da Vila, entre muitos outros artistas, impulsionando cada vez mais a indústria fonográfica no país.
Dentro desse primeiro modelo de festival, existia uma competição que consagrava a melhor música, numa votação com participação do público. Já o outro formato, o mais atual, consiste em um evento com a apresentação de vários artistas e diferentes tipos e estilos musicais, em que não existe nenhuma competição, e o foco é apenas no entretenimento.
“Eu vejo esses festivais com uma grande importância, tanto no sentido de circulação de artistas quanto na movimentação da cultura e da cadeia produtiva local, além de gerar empregos, movimentar a rede hoteleira, restaurantes, mão de obras, cena de artistas técnicos de som, iluminação, entre muitos outros. A rede que se forma no entorno desses festivais é muito grande e produtiva, então os festivais são muito importantes do ponto de vista econômico e cultural”, afirma o cantor, instrumentista e compositor Rodrigo Borges.
Os festivais de música que são competitivos trabalham mais com músicas regionais, gêneros diversos, sobretudo a MPB, o rock, o sertanejo, o samba e outros gêneros variados. E no caso dos festivais de maior expressão musical, os artistas são normalmente do campo mainstream. Essa importância não só dá circulação, mas também de gerar receita, riqueza, movimentar uma cadeia produtiva, citada por Rodrigo, implica na existência de vários setores segmentados que se beneficiam daquele evento, desde redes de hotéis até mão de obra técnica para som, palco, iluminação.
Os Festivais Atuais
O Rock in Rio, tradicionalmente, foi um festival criado para o estilo musical do rock, como o próprio nome evoca. Como o rock, em 1985, era o principal estilo musical escutado pela maior parte do Brasil e do mundo, isso impulsionou a criação do evento.
Já o Lollapalooza é um festival importado, criado nos Estados Unidos. Inicialmente, surgiu com a ideia de ser a última turnê de uma banda chamada Jane’s Addiction. Em 2003, o evento foi revivido, trazendo muitos outros shows, de vários estilos e gêneros diferentes, tendo sua primeira edição no Brasil em 2012.
Como estes festivais são mais antigos e são de uma outra época, eles precisaram se reinventar com o passar dos anos. Em 2018, o rock ficou fora da lista das 100 músicas mais tocadas em rádios no Brasil, o que indica que o Rock vem perdendo força no cenário musical brasileiro, principalmente entre os mais jovens. Uma pesquisa do jornal Folha de São Paulo revelou que o gênero fica atrás do Sertanejo, do Funk, do Rap e do Pagode, por exemplo.
Isso abre espaço para outros gêneros “roubarem” a cena nestes festivais que estão cada vez mais inclusivos para todos os gostos musicais. O Hip Hop é um estilo que vem crescendo muito nos últimos anos, de acordo com Rodrigo Borges, que também é professor de música. “Eu vejo o Hip-hop como um gênero que cresceu muito e tem grandes expoentes no Brasil hoje. Inclusive o Djonga, cantor mineiro, tem também Poesia Acústica, com essa forma de entoar os versos do hip-hop, que a gente chama de flow. Isso tá bastante difundido na música e se misturando com vários gêneros. O Hip-hop também teve uma ascensão muito significativa do ponto de público e mercado”, aponta.
Como disse o criador do Rock in Rio Roberto Medina: ‘’o Rock in Rio virou uma marca’’. Essa afirmação pode lançar luz sobre a possibilidade de inserção de outros gêneros musicais dentro do festival.
A cantora Anitta, em entrevista ao Yahoo, disse que: “o funk vem numa crescente por razões que transbordam aquilo que o define como gênero. Os gêneros musicais são organismos vivos que se transformam, e isso aconteceu com o funk”. Essa fala pode aludir, inclusive, para a importância da adição do Funk e também do Rap nestes festivais, para o crescimento da cena destes estilos musicais, além do fato de que esses gêneros são muito consumidos pelos brasileiros nos últimos anos.
A edição de 2022 do Rock in Rio foi a que mais contou com artistas do Funk e do Hip Hop, tendo em sua estrutura o palco favela, espaço no qual os artistas puderam cantar para milhões de pessoas. Matuê, MC Poze do Rodo, Teto, Orochi, BIN, MD Chefe, DomLaike, Xamã, Yunk Vino, Criolo, Emicida, Biel Do Furduncinho, Bianca e L7nnon se apresentaram no Festival.
Em um festival desta magnitude, que movimenta mais de 28 mil empregos diretos e atrai cerca 360 mil turistas de fora do Rio De Janeiro, além de mais de 100 mil pessoas de media por dia, é importante que uma gama de artistas e gêneros diferentes sejam parte do line-up. Assim para que haja um agrado geral do público e atraia cada vez pessoas que consomem diferentes ramos da música brasileira e internacional.
Com o passar dos anos, sempre há uma mudança nos gostos musicais do público, o que não se caracteriza como um fenômeno recente, como reforça o professor Rodrigo Borges. “Você tem muitas transformações e muitas mudanças ao longo da história, eu destacaria na música pop os “Beatles”, que revolucionaram não só a música mas a Cultura pop. De uma maneira geral, tanto comportamental quanto do ponto de vista da moda, o corte de cabelo, da forma de se vestir, da atitude”.
INSERIR OU NÃO INSERIR O SERTANEJO NOS FESTIVAIS ALTERNATIVOS?
Segundo o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD), o sertanejo é uma música que tem sua origem no sertão, mas antigamente era conhecida como “música caipira”, visto que as letras representavam e exaltavam a paisagem rural e a simplicidade. No decorrer dos anos, o sertanejo tomou força na sociedade brasileira e tornou-se um dos estilos musicais mais ouvidos e consumidos pelos brasileiros. Entretanto, mesmo sendo um estilo musical muito famoso no Brasil, por que ele não está presente em grandes festivais além do Villa Mix?
Em uma entrevista à revista “Veja”, os organizadores do Rock in Rio disseram: “já existem festivais suficientes para este tipo de música (sertanejo). O estilo country, definitivamente, não é bem-vindo nos gramados da Cidade do Rock”. O funk, por outro lado, teve sua origem em morros da favela do Rio de Janeiro e sempre foi alvo de marginalização por muitos setores da sociedade.
Para Rodrigo Borges, a resposta para esse questionamento é simples. “Isso não acontece talvez pelo fato de o sertanejo já ocupar uma grande parte do mercado, já dominar o mercado musical. Porque é um modelo que recebe grandes investimentos, tanto do agronegócio quanto de prefeituras e do poder público, por ser um modelo popular e por isso eles têm grandes estruturas e conseguem praticamente monopolizar as rádios no interior do Brasil e também nas capitais”, realça.
Ele também acredita que o sertanejo não entre em outros festivais por esses festivais serem alternativos, como o próprio nome evoca, e nutrirem outras alternativas culturais e sociais, com uma diversidade musical que a mídia e as rádios tradicionais não mostram.
A frequentadora assídua de festivais como Rock in Rio e do Lollapalooza, Mylena Melo, também desaprova a presença do gênero nesses espaços. “As pessoas que querem ir ou que frequentam festivais alternativos desejam fugir do que é mais tocado pelo país e do que mais tem visibilidade. Portanto, o próprio público não quer que esse estilo musical entre nesses festivais e espera que os festivais alternativos continuem sendo alternativos”, pondera.