Livro - As mulheres de Altamira em defesa da água como direito fundamental

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Patrocínio

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Esta publicação é o resultado do estudo de caso promovido por iniciativa do Comitê de Mulheres de ASC – Aliança Social Continental, com o apoio do GT Gênero da REBRIP e da IGTN – Rede Internacional de Gênero e Comércio/Brasil. Patrocínio: Fundação Böell. Esta pesquisa formou parte de um projeto envolvendo dois estudos de caso: em Cochabamba, Bolívia e na Amazônia – Brasil. Responsável pelo Estudo de caso do Brasil: Edna Maria Ramos de Castro – Universidade Federal do Pará. Assistente de Investigação: Jacqueline Freire. Contribuições: Antonia Melo, Marta Suely, Raimunda e Toinha. Fundação Viver, Produzir e Preservar. Coordenação do Projeto: Graciela S. Rodriguez, Instituto EQÜIT, Comitê de Mulheres de ASC. Edição: Graciela S. Rodriguez Projeto Gráfico: Marco Godoy Tradução: Ricardo Silveira Revisão de texto: Elisabeth Simões Foto de capa: Mulheres de Altamira no 8 de março – Dia Internacional da Mulher – em “barqueata” no Rio Xingu Foto: FVPP Agradecemos a Colaboração Especial de Silke Helfrich, Annekathrin Linck, Ângela Meentzen, Lina Pohl e Elyzabeth Peredo que muito contribuíram para a viabilização deste resultado.

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Agradecemos também a todas as companheiras do Comitê de Mulheres da ASC, que durante a realização do projeto foram contribuindo no debate político necessário para chegar a este resultado.

Rio de Janeiro, 2004


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INTRODUÇÃO ..........................................................................................................................6 CAPÍTULO 1 ..............................................................................................................................9 AMAZÔNIA, FRONTEIRA DE RECURSOS E GRANDES BARRAGENS 1. Política estatal e abertura de fronteiras ao mercado 2. Grandes barragens e os impactos sócio-ambientais: o caso de Tucuruí 3. Belo Monte: complexo de barragens para o rio Xingu 4. Privatização de grandes barragens nos rios da Amazônia CAPÍTULO 2............................................................................................................................22 DIREITOS SOCIAIS, GÊNERO E ÁGUA 1. Cidadania das águas. 2. Cultura da água e do rio enquanto expressão local 3. Movimento de mulheres de Altamira e defesa do rio Xingu sem barragens 4. As mulheres e a problemática da água: o paradoxo da carência e abundância 5. Água, saúde e direito das mulheres do campo e da cidade 6. Participação das mulheres indígenas na preservação do rio Xingu CAPÍTULO 3............................................................................................................................37 ÁGUA E LIVRE COMÉRCIO 1. Novo marco regulatório 2. Água e livre comércio: diretrizes da OMC e de outras Agências Multilaterais 3. O domínio empresarial da água na América Latina e no Brasil 4. O Banco Mundial volta a financiar grandes represas 5. Movimento Social Global pela Água como bem público 6. Argumentos dos movimentos sociais e de mulheres CAPÍTULO 4............................................................................................................................51 AGENDA DAS MULHERES PELO DESENVOLVIMENTO REGIONAL 1. Agenda global dos direitos das mulheres 2. Movimento das mulheres da Transamazônica e do Xingu e desenvolvimento regional ANEXOS ...................................................................................................................................56 1 A Corporação Suez na Amazônia: privatização dos serviços de água e esgoto em Manaus 2 Carta da Campanha Águas sem Barragens nas Bacias Amazônicas 3 Quadro 1 - Povos Indígenas do Sudeste do Pará, por município e população.

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APRESENTAÇÃO

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presente pub li ca ção é o resul tado de estudos e mp r eendidos pelo Co mitê de Mulh e r es da ASC – Alian ça Social Co n t in e n tal – com o apoio da Fun da ção Böe ll, para contrib uir com a elabo ração de uma propos ta de es t ra tégia de ações e políticas a partir das mulhe r es em defesa de um dos rec urs os mais prec i o s os para a vida: a água. Foram elabo ra d os dois es t u d os de caso dos impa c t os produzi d os sobre as mulhe res pelos processos de pri v a t iza ção da água no Brasil e na Bolívia ao longo do ano 2003. Apresentamos agora o resulta do completo do estudo de caso na Amazônia brasileira, Com as ações e propostas que são ap r es e n ta das neste d oc umento queremos contrib uir com a lu ta que diferentes movimentos, organizações de mulheres e organizações sociais de base es tão desenvolvendo na Améri ca La t ina e no mun d o para evi tar que as po lí t i cas neo libe rais continuem arr e ba tan do a água, acentuando os impa c t os nega t i v os da sua mercan t ilização, imp ulsi o n ando o menosp r ezo pelos sabe r es locais para a ges tão da água e mantendo as imp lica ç ões negativas da privatização nos direitos das mulheres. Comitê de Mulheres de ASC Setembro 2004


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A ASC, da qual faz parte o Comitê de Mu l h e res, é uma art i c u l a ção de diversas entidades e movimentos sociais das Américas que se reúnem em torno da luta contra o “livre comércio” e a globalização neoliberal enquanto estas priorizam os interesses das grandes companhias transnacionais. A ASC foi criada em 1998 com o objetivo de resistir à co n fo rm a ção da ALCA – Área de Li vre Comércio das Améri cas - e evoluiu no se ntido da co n so l i d a ção de alte rn at i vas fre nte ao “livre comércio” em tod as as suas exp res sões no co nt i n e nte, que passam inclusive pel os diversos aco rd os Bilaterais ou regionais e as negociações entre UE/AL e na OMC. Na realidade, muitos dos impactos dos acordos comerciais já são sentidos em diversos países, pois a partir das décadas de 80 e 90, eles vêm sendo os destinatários dos processos do chamado ajuste estrutural. A paulatina liberalização faz parte do processo que foi implementado com a forte presença do FMI – Fundo Monetário Internacional – e do BM - Banco Mundial – os principais impulsores das medidas recomendadas pelo Consenso de Washington. Estas medidas assumidas por países em desenvolvimento preco n izavam a apertura das economias ju nto com a “diminuição do papel do Es tado” e em co n seqüência do gasto público, acompanhando a reestruturação produtiva. A ALCA, que está sendo negociada desde 1994, busca formular um marco de regulamentação jurídica para o processo de apertura do comércio e os investimentos entre os países do continente. Ao mesmo te mpo, as negociações da União Eu ro péia com o co ntinente vêm sendo acel e r a d as. De forma semelhante ao que acontece com as negociações da ALCA, ela procede com pouca transparência e inclusive avança em alguns temas que ainda não estão incorporados às negociações na OMC. É a partir daí que se fala dos chamados “acordos OMC – plus”. Como parte dos te m as “a d i cionais” avança ali a negoci a ção de regr as de liberaliza ção dos se rvi ços. Quando falamos de serviços, falamos de uma diversidade enorme de atividades econômicas: desde serviços bancários, telefônicos e de transporte até a educação e a saúde. Por serem cada dia mais importantes no PIB - Produto Interno Bruto dos países e por incluir setores muito diversos e essenciais para a po p u l a ção, as regras para a libe r a l iza ção dos se rviços para o cap i tal estrange i roprovocam mu i ta po l êm i ca. Tr ata-se, em resumo, de re nu n ciar à possibilidade de regular internamente seto res estratégicos das economias nacionais. Significa também submeter os serviços às regras internacionais e ao livre acionar d os cap i tais transnacionais e às gr a n d es co rpo r a ções, inclusive em seto res como a educa ção e a saú d e públicas, onde está garantido, até agora, em muitos países o controle monopólico do Estado. Um dos te m as que merece ate n ção especial é o do uso e distri b u i ção da água doce. Evi d e nte m e nte se trata de um bem essencial à vida das populações do mundo inteiro. Sua escassez em diversos lugares do planeta vem aumentando sua importâ n cia e a preoc u p a ção em torno del a. Ao mesmo te mpo, vem agu çando o inte res se comercial das grandes co rpo r a ções. Negociações co m e rciais como a da ALCA e da UE/AL propõem ta m bém incluir a água na pri vat iza ção de se rvi ços ab rindo, dessa fo rm a, um impo rta nte campo de negócios. Em resumo, as negoci a ções de comercio, e em particular a ALCA e os aco rdos UE / A L, vão além dos assuntos comerciais, incluem investimentos e serviços e estão se transformando em verdadeiras constitu i ções supranacionais que buscam estabel ecer regras pe rm a n e ntes para as transnacionais, no que os meios de comunicação chamam “ambientes favoráveis aos investimentos”.

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Es te trabalho é res u l tado da pesquisa Impa c t os da pri v a t iza ção da água nos dir e i t os das mulh e r es. Propos ta por inici at i va do Comitê de Mu l h e res da Aliança Social Cont i n e ntal e pat rocinada pela Fundação Böll, esta pesquisa foi desenvolvida em Bolívia e Brasil por meio de estudos de caso, com o objetivo de analisar, de fo rma comparativa, os efe i tos da pri vat ização de se rvi ços rel a cionados à água sobre os direitos das mulheres. No caso brasileiro a que este trabalho se circunscreve, ela foi realizada, contando com o apoio do GT Gênero da REBRIP (Rede Brasileira pela Integração dos Povos) e o Ponto Focal Brasil da IGTN – Rede Internacional de Gênero e Comércio. Foi sel ecionado um caso para estudo na região amazônica, que env o l via a co n s t rução de um co mp l exo de gr a n d es barr a gens no rio Xingu. Du r a nte anos o movi m e nto das mu l h e res de Alta m i r a, no Es tado do Pará, mantev e -se mobilizado para aco mpanhar o dese n rolar das deci sões e das ações do Es tado relativas a esse grande projeto, posicionando-se contra a sua execução. E m bora não se trate, s t ricto sensu, de analisar os imp a c tos de um emp reendimento em fu n ci o n amento, pois ele até o presente não se efetivou, foi a possibilidade de supressão de seus direitos que levou as mu l h e res do ca mpo e da cidade, e até mesmo as mu l h e res indíge n as, a se mobiliza rem, por mais de uma década, para impedir sua realização. Nos planos governamentais, estava prevista a construção do complexo Belo Monte, um conjunto de cinco grandes hidrelétricas que barrariam o rio Xingu nas proximidades da cidade de Altamira. Organiza d as em uma extensa rede que reco b ria 13 mu n i cí p i os, ramifi ca n d o -se para distri tos rurais e bairros das cidades, as mulheres estiveram na linha de frente de processos conflituosos com a empresa estatal Eletronorte e as elites locais interessadas na viabilização do complexo. A postura era de defesa de direitos, do rio sem barr a ge n s, de qualidade da água e da abe rtura de possibilidades para a construção de um modelo de desenvolvimento social e ambientalmente sustentável, no qual os atores locais tivessem seus direitos reconhecidos e respeitados. As conseqüências da construção de grandes barragens na Amazônia têm sido amplamente analisadas, focalizando-se os impactos sobre o deslocamento de trabalhadores, as mudanças nas suas condições de vida, além da emergência de conflitos, violência e pobreza no entorno dos empreendimentos. Por essas razões, os grupos locais presentes nas áreas urbanas e rurais e as etnias indígenas resistem contra os interes ses de mercado em barrar o rio para fins de ge r a ção de energia. Além dos imp a c tos sociais, eco n ô m i cos e ambientais para os gru pos loca i s, as mu l h e res de Alta m i r a, nos seus argu m e ntos, ace ntu aram o fato de ser essa a primeira grande obra do setor de energia hidráulica a ser privatizada no Brasil. Na maior parte das comunidades rurais e também nas áreas urbanas da Amazônia, a propriedade e a gestão co l et i va dos rec u r sos de água têm sido a ch ave do uso des se recurso sem gr a n d es confl i tos, o que não deve ser at ribuído somente à ab u n d â n cia da água nas baci as hidrográfi cas amazônicas. Mas es s a geogr a fia é fundamental para entender a histó ria regional, so b retudo da co l o n iza ção, pois a Amazônia foi ocupada at r av és de ri os e igarapés, que foram os canais de entrada de oc u p a çãopor dife re ntes grupos. Eles marcam a toponímia regional, definem os modelos de ocupação da terra, de uso de seus recursos e de constituição de uma economia agroextrativa. O mesmo se pode dizer sobre o uso de lagos pelos pescadores – moradores ribeirinhos do médio e alto Amazonas ou de outros rios e do litoral –, como é


o caso das po p u l a ções tradicionais de pequ e n os prod u to res fa m i l i a res e de povos indíge n as. A gestão coletiva tem assegurado, ao longo do tempo, a sociabilidade e a eqüidade no uso desses cursos de água e de seus recursos, pois o movi m e nto das águas povoa o cotidiano des ses gru pos. O terri tó rio aqu át i co guarda elementos rituais que alimentam as tradições e, por isso, as razões apresentadas, contra a const ru ção de gr a n d es usinas hidrel ét ri cas, es tão fu n d a d as nessa expe ri ê n cia co l et i va. A cultura regional es tá impregnada dessa relação com a água, que é interiorizada como elemento da identidade com o território, com as dimensões da vida e de sua rep rod u ção, e afi rmada por inte rm édio da política enqu a nto capacidade de articular valores e estratégias, e a condição de sujeitos de direitos. Essa percepção traduzse nos princípios do movimento das mulheres de Altamira. Do po nto de vi s ta da dinâmica dos mercados em expansão, o inte res se mundial des pe rtado mais rece nte m e nte pela água es tá rel a cionado a pres sões para ampliar o lugar des se recurso no universo de mercadorias. Efetivamente, na última década do século passado, co m eçou a ser definido, por agê n ci as inte rnacionais, o conce i to de “cri se mundial da águ a” e as metas para 2020 de garantia de “á gua para todos”. A água tornou-se um tema central nas negociações da ONU (Organização das Nações Unidas) e de agê n ci as econômicas tais como o FMI (Fundo Mo n etá rio Inte rnacional), o GATS (Acordo Geral sobre Comércio de Serviços) e a OMC (Organização Mundial de Comércio). Como desdobramento da intensificação desses interesses de mercado, os países têm sido pressionad os a construírem um novo marco regulador que libe re o co m é rcio de servi ços em que se inclui o “seto r” água. Não é por acaso que o debate internacional tem colocado em confronto, de um lado, a agenda dos Estados e suas políticas de ajustamento às decisões de cúpula e, de outro, as organizações da sociedade ci vil, ab ri g a d as em fó runs alte rn at i v os de caráter global em defesa de maior au tonomia do Es tado e da sociedade civil em relação ao mercado. Indignação e afirmação de identidades remarcam os horizontes na co n s t ru ção de novas uto p i as que emergem na co ntes ta ção da atual ordem do mundo que es ta marcada pela co b i ça do mercado, pela racionalidade da efi ci ê n cia e produtividade a qu a l quer custo social e ambiental e, co n seqü e nte m e nte, pela exclusão social cresce nte. Sl ogans como a Améri ca La t ina não es tá á venda, ou ainda um outro mundo e possível e não somos mercadoria, tem como principio unificador a co n s t ru ção da democr a cia e a afi rm a ção da esfera da cultura como exp ressão das ident i d a d es e da diversidade dos povos que habitam o planeta, e, portanto a não submissão á racionalidade da economia que a todos quer padronizar pelas leis de mercado. A pesquisa realizada teve, como objetivos, compreender os efeitos da liberalização comercial e dos acordos comerciais intern a cionais sobre a pri vat iza ção dos se rvi ços públicos, examinar as estratégi as do setor el ét ri co nacional para a construção da hidrel ét ri ca de Belo Mo nte no rio Xingu e os imp a c tos a serem gerados pela obra, entender a lógica do comércio e das políticas comerciais e, finalmente, identificar os impactos sobre os direitos das mulheres provocados pela liberalização comercial e pela privatização dos serviços relacionados aos recursos hídricos. A primeira etapa da pesquisa teve início com o Workshop “Gênero e Água”, realizado em Altamira em julho de 2003, promovido pelo Mo vi m e nto de Mu l h e res Trab a l h a d o r as de Altamira do Ca mpo e Cidade (MMTA / CC) em coo pe r a ção com a IGTN – REB RIP/GT Gê n e ro. Part i ciparam 60 lideranças do Mo vi m e nto deMu l h e res vi n d as de diversos mu n i cí p i os e ainda represe nta ntes das org a n izações de mu l h e res indíge n as (po v os Xipaia e Ju ru n as) e de mu l h e resnegras (Altamira). Os imp a c tos da pri vat ização de serviços de água sobre o direito das mulheres foram aprofundados em três grupos de trabalho,

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cujos resultados estão apresentados neste texto. A problemática da água e os riscos da privatização pela construção de grandes projetos hidrelétricos estão associados, na percepção do movimento das mulheres, às lutas pela melhoria das co n d i ções de saúde e de sanea m e nto, no âmbito das mobiliza ções pel a cidadania das águas que vêem empreendendo. A segunda etapa consistiu em um trabalho de campo feito em Altamira e nos municípios de Uruará, Pacaj á, Pl a cas, Med i cilândia e Vi tó ria do Xingu, localiza d os ao longo da Rod o via Transamazônica. Anteriormente, já haviam sido realizadas entrevistas nas cidades de Santarém e Itaituba. O estudo conte mplou ainda obse rvações e co l h eu depo i m e ntos de auto ri d a d es e líderes do poder po l í t i colocal e do Es tado. Mas, em particular, foram ent revi s ta d as lideranças do movi m e nto demu l h e res, considerando suas múltiplas inserções em estruturas organizativas da sociedade civil, lideranças sindicais (Sindicatos de Trabalhadores Rurais e Federação de Trabalhadores da Agricultura (FETAGRI), empresários, prefeitos, lideranças de movimentos sociais e da Igreja Católica. Foi feito ainda um levantamento bibliográfico co b rindo mate rial resulta nte de pesqu i s as soci oeconômicas e et n ogr á fi cas, re fe re ntes à ques tão energética e à construção do complexo de cinco usinas hidrelétricas no rio Xingu, denominado Belo Monte, produzido pelas organizações da região, por ONG, universidades e institutos de pesquisa e pelo sistema es tatal de energia, a Eletro b r ás e sua subsidiária para a região Norte, a Eletro n o rte. Finalmente, es te rel atório apresenta uma revisão dos argumentos do Movimento pelo Desenvolvimento da Transamazônica e do Xingu (MDTX) e do Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade (MMCC), na cidade de Altamira, so b re os imp a c tos que poderão oco rrer em fu n ção do proces so, como denominam em Alta m i r a, de “privatização do rio” para fins de geração de energia. Eles assinalam que há 20 anos vêm construindo coletivamente um projeto de desenvolvimento para essa região, e os empreendimentos de grande porte, por funcionarem sob a pressão de interesses de fora, compondo o quadro que dinamiza por excelência a economia para fora da região, deixaria de pri o rizar as dinâmicas e os projetos locais. Qu estionam o au m e nto da vu l n e r abilidade dos segm e ntos locais, em uma região que já tem sufi ci e ntes problemas sociais e econômicos. Referem-se à problemática da água potável, cujo abastecimento familiar depende principalmente do esforço cotidiano das mulheres. Agradecemos ao Movimento das Mulheres do Campo e da Cidade da Transamazônica e do Xingu, ao Movimento de Mulheres contra a Violência, às Associações de Mulheres Indígenas, nas pessoas das s u as lideranças e daqu el as que part i ciparam do Seminário “Gê n e ro e Água”, em Altamira, no mês de julho de 2003. Em especial, agradece m os a Antônia Melo, Toinha, Raimunda, Paulinha e Marta, que nos acompanharam mais de perto. Este relatório foi possível graças a sua disponibilidade e ao interesse em participar da pesqu i s a, organizar mate rial de arquivo para co n s u l ta, liberar fo tos e outros materiais importantes para contextualizar os momentos de suas lutas em prol dos direitos humanos e dos direitos das mulheres em defesa do rio Xingu sem barragens.


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AMAZÔNIA: FRONTEIRA DE RECURSOS E GRANDES BARRAGENS

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d i scussão so b re a histó ria rece nte dessa região para a qual es tá previ s ta a construção do co mp l exo de hidrelétricas que atingirá vários municípios distribuídos ao longo da Rodovia Transamaz ô n i ca e do rio Xingu, tem como objetivo co ntextualizar alguns elementos impo rta ntes da co n stituição dos movi m e ntos sociais e das lutas de mu l h e res em to rno de um pro jeto de dese nv o l vi m e nto regional que se constrói na contramão das forças hegemônicas. Enquanto nova força social que emerge de situações adversas, os atores locais, da região citada, em sua maioria famílias camponesas assentadas pelos programas de colonização oficial do Estado nos anos 70, estabelecem marcos de identidade política apesar de suas origens espaciais e sociais distintas. O padrão tradicional de ocupação do te rri tó rio na Amazônia seguiu os ri os e o movi m e nto das á gu as, sendo a nav eg a ção fl u vial o pri n cipal meio de transpo rte. Os ri os dese mpenharam papel fu n d amental na estruturação da vida social e econômica da região, tendo sido o eixo de ocupação do território, desde os seus primeiros povoadores, os grupos indígenas, movimento igualmente corrente na ocupação colonial. Em meados da década de 50 do século XX, esse padrão de ocupação começou a se alterar a partir das po l í t i cas dese nv o l viment i s tas, que visavam integrar o Norte ao Sul do país por meio da estratégia geopolítica de construção de grandes eixos rodoviários. O primeiro deles, a rodovia Belém-Brasília, conseguiu definir um padrão de estrutura fundiária que norteou o avanço da fronteira econômica na Amazônia visando sua integração ao mercado nacional. O segundo, a Rod o via Transamazônica, já nos anos 70, re fo rça es se movi m e nto de expansão, agora co rta ndo a região no sentido Leste-Oeste. A mesma rodovia e suas estradas transversais integram o Norte ao Nordeste e ao Centro-Oeste do país, dando continuidade a um movimento que, no passado, incorporara ao mercado novas áreas no Sul e no Sudeste do país. Mas, dessa vez, tratava-se de concluir esse ciclo de expansão ab rindo defi n i t i va m e nte ao mercado as novas fro nteiras terri to riais e de rec u r sos natu r a i s para o capital nacional e internacional. Por meio de incentivos fiscais, o Estado atraiu capitais e empree n d ed o res de diversos seto res da economia, que se des l ocaram para as novas fro nte i r as do país. Finalmente, um te rce i ro eixo, a rod o via Cu i ab á -S a ntarém, integra a Amazônia ao Cent ro-Oes te do país, at r av essando uma região antes aces s í v elape n as por seus ri os, marcando de fo rma mais agres s i va a ocupação de novas terras mais a oeste do Pará e interligando, social, econômica e espacialmente, as terras interiores dessa região às do Estado do Mato Grosso. O programa de colonização implantado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária ( INCRA) nos anos 70 teve a Rod o via Transamazônica como eixo ce ntral, co rtado simet ri camente por d e z e n asde es t r a d asvi cinais na fo rma de espinha de pe ixe. Ali milhares de fa m í l i as de campo n eses foram

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assentadas, vindas do Nordeste e do Sul do país, expulsas pelo esgotamento do padrão de ocupação da fro nteira e pela alta co n centração da es t ru tura fundiária, po rtanto, ta n gi d as pela fa l ta de te rra e de rec u rsos para plantar em seus lugares de origem. Ao longo daqu el as rod o vi as, os progr a m as de co l o n iza ção diri gida co n solidaram a oc u p a ção de grandes fa ixas de t e rra firm e em ambas as margens da estrada em fu n ção de uma po l í t i ca nacional de descompressão de conflitos de outras regiões do país, que acabou incentivando uma migração dirigida à Amazônia. Foram canalizados intensos fluxos migratórios para essas áreas de floresta densa abertas à coloniza ção. A Rod o via Cu i abá-Santa rém co mp l eta o traçado da Transamazônica, como pode ser obse rvado na Figura 1. Ao longo dessas rodovias foi implantado um modelo agrário fundado na grande propriedade, reforçando o padrão altamente concentrador e excludente que caracteriza a estrutura fundiária no país. Apesar da intensidade de confl i tos e do quadro de vi o l ê n cia e impunidade, a es t ru tura da prop ri edade da te rra foi demarcada pela pressão dos movi m e ntos po p u l a res. Pequ e n os e méd i os es tabel ecimentos rurais viriam a predominar como unidades produtivas em certas áreas, a exemplo de municípios cortados pela Rodovia Transamazônica. Figura 1- Principais Eixos Rodoviários e Cidades da Transamazônica

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Porém es se padrão da estru tura fu n d i á ria dos pro jetos de co l o n ização (modalidade de 100 ha) so fre ri a alteração pela prese n ça de novos ato res, fazendeiros capitaliza d os, gr a n d es empreendimentos madeireiros e mineradores, além de um grande pro jeto, a Usina Hidrel ét rica de Tu c u ruí. Os pas tos subs t i tuíram a fl o-


res ta, e as áreas degr a d a d as espalharam-se por gr a n d esextensões. A dinâmica regional mos t rou como el es se co ntrapõem, pela pró p ria lógi ca de funcionamento, à pequena prod u ção familiar, pois o mod elo aplicado pelo INCRA não rompeu com o padrão alta m e nte concentrador da propri edade da te rr a. Essa região também foi palco da construção dos grandes projetos de energia e mineração que atraíram milhares de trab a l h a d o res. Es ses emp ree n d i m e ntos foram também fato res de co n ce ntração da terra. Des ped i d os no final da obra, co mpuseram o ce n á rio de dese mp rego e misé ria no ento rno dos grandes emp reendimentos. Povoados, vi l ase cidades surgiram durante a fase de co n s t ru ção, mas permanecem ainda sem a mínima infra-estrutura urbana. A estratégia governamental associou às áreas de colonização o espaço das cidades, considerando-o um dinamizador do dese nv o l vi m e nto regional, loc us de decisão e mod e rn iza ção. Cidades como Alta m ira, Marabá e Tucuruí tornaram-se pólos regionais. Na estrutura de colonização criada na Transamazônica, as agro vilas, agró polis e ru rópolis, eram conceb i d as como um espaço distinto e co mp l e m e ntar. Ho je aqu el as pequ e n as aglomerações nas margens da estrada tornaram-se sedes dos municí p i os qu e surgiram no final dos anos 80, no processo de divisão territorial decorrente das dinâmicas econômicas, políticas e sociais ocorridas na região

1 POLÍTICA ESTATAL E ABERTURA DE FRONTEIRAS AO MERCADO O objetivo central da política estatal voltada para a Amazônia dos anos 70 e 80 era a ocupação para a exploração de seus recursos naturais. A colonização garantiu, com sua mão-de-obra, o amansamento da terra e a produção agrícola voltada para o abastecimento do mercado local. Ao mesmo tempo, assegu rou o po v o a m e nto e a integração da região ao mercado nacional. Mas o Es tado também pri o rizou po l í t i cas direcionadas à emp resa agropecuária. Por isso, o modelo desenhado pelo INCRA para ce rtas áreas da Transamazônica e para a Rodovia Cuiabá-Santarém é também de grandes propriedades. O Programa Polamazônia foi concebido como um programa de pólos agropecuários, madeireiros e minerais. Foram pro jeta d os 15 pó l os no Pará, um del es na região de Altamira, cidade pri n cipal e na co nfluência da Rod o via Transamazônica e do rio Xingu. A histó ria econômica rece nte dessa região es tá marcada pela influência dos investimentos desse Programa que, na década de 70, repassou gordos subsídios públicos a empreendimentos privados nos setores voltados para a exportação: pecuária, madeira e mineração. Os empreendimentos de infra-estrutura elevaram o preço da terra, aquecendo o seu mercado com a chegada de novas empresas, fazendeiros e trabalhadores que vinham trabalhar nas mineradoras, nos garimpos e no desmatamento de fazendas. Na atualidade, cresceram os inte res ses de mercado também por parte de empres as multinacionais.As fro nteiras geogr á fi cas com os países vizi n h os es tão sendo integr a d aspor meio de eixos rodoviários e de hidro vi as co n ceb i d osem siste m as mu l t i m od a i s.Nomovi m e nto po rtuário, veri fi ca -se a partida de gr a ndes ca rreg a m e ntos de minério, madeira, lingo tes de alumínio (indústria eletrointe n s i va), pescado e grãos. A fro nteira red ese n h a -se, mas, desta vez, ace ntuando a cap a cidade de integr a ção de merca d os para além dos limites nacionais mediante negociações internacionais no GATS e na OMC, de liberalização das barre i r as econômicas. A ação do Es tado efet i va -se por meio de processos econômicos que garantem uma presença ativa em mercados além-fronteira. E a Amazônia, pelo fato singular de ter oito países como vizinhos, representa um trunfo que interessa ao novo arranjo geopolítico, uma vez que a orientação

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obse rvada na política nacional é a de traçar po l í t i cas que refo rcem a integr a ção de merca d os com os países que se alinham nas amp l as fro nteiras da região amazônica. Em nos so entender, essa dinâmica do jogo político define de outra fo rma o lugar da Amazônia na atual geo política, como es t r atégia nacional. O Es tado encontra, assim, na co n cepção de uma geopo l í t i ca de oc u p a ção te rrito rial, as es t r atégi as de desenvolvimento econômico baseadas na exploração intensiva dos recursos naturais. Se a década de 70 abriu novas frentes pela colonização, nos anos 80 instalaram-se grandes empresas de mineração, usin as hidrel ét ri cas, indústri as de papel e cel u l ose, de madeira e de pesca, ent re outras. Os meg ap ro jetos eco n ô m i cos (hidrel ét ri cas e seto res de mineração, cel u l ose e agro i n d ú s t ria) rep rese ntam um outro modelo de ocupação, cujo padrão é imposto pelo mercado globalizado, que aposta na racionalidade, na i n fo rm a ção e na efi ciência tecnológi ca. Mas, em que pese essa racionalidade, emp ree n d i m e ntos minerais, como os da Companhia Vale do Rio Doce, em Carajás, a exploração de bauxita pela Mineração Rio do Norte, no rio Tro m betas, ou as emp resas de alumínio, Albrás e Alunorte, tod os no Es tado do Pará, são ilhas de ri queza e fa ntasia. Eles res pondem ainda pela poluição, em níveis jamais vistos em ri os da Amazônia brasileira, como é o caso da Mineração Rio do Norte, emp resa joint venture com part i ci p a çã o da Companhia Vale do Rio Doce, no município de Oriximiná, que há mais de 20 anos tinge com o vermelho da baux i ta o fundo do rio Tro m betas e de seus lagos, apesar do disc u r soambienta l i s ta e de responsabilidade social. As grandes obras de infr a - es t rutura, como a das plantas hidrel ét ri cas de Tucuruí (Pará) e Balbina (Amazonas), foram construídas para atender demandas nacionais e de grandes corporações internacionais da siderurgia, com as plantas de alumínio apresentando impactos locais, sociais e econômicos, bastante restritos. A fronteira em movimento configura a dinâmica dos atores sociais. As lideranças de trabalhadores rurais dessa região falam das tensões e dos co n fl i tos que marcaram essa dinâmica e caracterizaram a região da Transamazônica. Há situações, paradoxais, de ausência do Estado, de impunidade, de ilegalidade de processos e instituições e de avanço do desmatamento e da degradação ambiental. Os pecuaristas ju nta m e nte com os madeire i ros, e mais rece nte m e nte com gr a n d es planta d o res de grãos, soja em particular, acabaram por ocupar o va zio do Es tado, pelo menos em âmbito local, em diversos mu n i cí p i os estudados, procurando delimitar um espaço de ação e de intervenção sobre o território. Eles estão presentes em todas as esferas da política local e estadual e ainda articulados em bancada suprapartidária no C o n gres so Nacional, o que implica subs ta n ciais mu d a n ças na estrutura político-institucional, que se refletem nos processos partidários e eleitorais. 14

2 GRANDES BARRAGENS E OS IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS: O CASO DE TUCURUÍ Os grandes projetos de energia entram em funcionamento nos rios da Amazônia nos anos 80, inundando grandes extensões de terra. A Usina de Tucuruí, no rio Tocantins (Pará), formou um reservatório com 2.875 km2; a deBa l b i n a, no rio Uatumã (Amazonas), oc u pou 2.360 km2 de terr as; a de Samuel, no rio Ja m a ri (Roraima), espalhou-se por 560 km2. A Usina de Tu c u ruí no rio Toca ntins gera 7745,0 MW. Delas não foi retirada a cobertura vegetal antes do fechamento das comportas, o que provocou o apareci m e nto de pragas, a red u ção de pescado, a emissão de gases devido ao processo de decompos i ção do mate rial org â n i co sob as águ as, impos s i b i l i tando a vida e o trabalho em inú m e ros povoados hab i ta d os por famílias ribeirinhas. Os reservatórios dessas três grandes usinas emitem quantidades consideráveis


de CO2 e CH4, ambos gases de efe i to es tu fa, colaborando para o agr ava m e nto do imp a c to ambienta l desses reservatórios, como esclarece Bergmam (2002). Muitos pontos críticos sobre a construção de grandes hidrelétricas tem sido apontados no mundo. A literatura é vasta sobre as mudanças na composição da água, a queda de produtividade biológica prim á ria do ecos s i s tema com a alte r a ção dos biomas. Identifi caram ta m bém mu d a n ças na fauna (pe ixes) causadas pelo bloqueio na migração e pela alteração do acesso aos nutrientes. Igualmente a emissão de g ases cau s a d o res do efe i to es tu fa como mostra Fearnside (1995; 2000) e as evi d e ntes mudanças na co be rtura fl o res tal em áreas não des p rezíveis, em extensão, no ento rno dos rese rvató ri os e nas matas ci l i a res dos ri os pri n cipais e de seus afl u e ntes próx i m os. Ent re os pri n cipais inte res s a d os na barr a gem de Tucuruí, es tavam as emp res as de prod u ção das plantas de alumínio, que desde 1985 foram indireta m e nte subsidiadas pelo Estado brasileiro: Alcoa, Billington, Votorantim e a Companhia Vale do Rio Doce. Em Tucuruí, o reservatório apresentou alta emissão de poluentes, provocados pela degradação de maté ria orgânica acumulada, tro uxe pragas de mosqu i tos, ocasionou perd as pela supressão da biod i v e rsidade, levou ao des ap a reci m e nto ou à red u ção de es péci es de pe ixes e ao agr ava m e nto da tensão so b re a te rra e os rec u r sos naturais, além de desalojar um nú m e ro exp ressivo de famílias. Elas receberam indeniza ções irri só ri as pel as pe rd as mate ri a i s. Em co ntrapartida, os impactos sociais pro v ocaram o surgi m e nto do movi m e nto de at i n gi d ospela rep resa (SIGAUD: 1986; CAST RO: 1989; MAG A LHÃES:1996;VAINER : 1990) que ainda hoje integra a rede nacional do Mo vi m e nto dos At i n gi d os por Ba rr a gens (MAB). Es se é o argumento dos ato res locais para ex i gir a part i ci p a ção no processo de decisão sobre os emp reendimentos, como em Belo Mo nte. Eles alegam que, além das rel a ções au to ri tá ri as da emp resa com os movi m e nto soci a i s, fa l tou transparência na discussão do pro jeto de Tu c u ruí. No Brasil, mais de um milhão de pesso as te riam sido atingi d as por barr a gens, segundo info rm es do MAB. Como vemos, a qu es tão soci o a m b i e ntal permanece pe ri fé ri ca, apesar do fo rte disc u r so ambienta l i sta dos anos 90. Pesqu i s a d o res têm salientado a possibilidade de utiliza ção de altern at i vas limp as de ge r ação de energi a. Ora, no Brasil, 95% da energia consumida vêm dos cursos d’á gu a, e a cri se energét i ca pe rsiste, segundo os especialistas, devido a lacunas advindas dessa orientação restritiva.

3 BELO MONTE: COMPLEXO DE BARRAGENS PARA O RIO XINGU Em 1975, a Eletronorte projetou a construção das barragens de Kararaô (Belo Monte), Babaquara, Ja ri n a, Ip ixuna e Ko kr a i m o ro, seguindo os inv e ntá ri os do po te n cial energét i co do rio Xingu. Ju ntas, elas a l a g a riam uma área mu i tas vezes maior do que o trajeto da Rod o via Transamazônica, incluindo os 100 ha de cada lado por onde se estendia o pro jeto inicial de co l o n iza ção. Em 1980, a emp resa rea l izou es tu d os so b re o Complexo Hidrel ét ri co de Alta m i r a, fo rmado por duas usinas, a de Kararaô e a Bab a quara, que, juntas, inu n d a riam 8 mil km2 de te rr as, mais de duas vezes o rese rvató rio da hidrel ét ri ca de Tu c u rui. . No enta nto a usina não ch egou a ser co n s t ruída. As etap as iniciais com os estudos de vi abilidade e de negociações ent re Es tado e setor pri vado foram paralisadas por diversas vezes devido a luta dos movimentos soci a i s. As mulheres tiveram part i ci p a ção impo rta nte em todo es se proces so. A mobiliza ção em torno da defesa do rio Xingu sem hidrelétricas fortaleceu a estrutura interna do movimento de mulheres que teve na cidade de Altamira o centro de manifestações e de irradiação desse processo. Os povos indíge n as, cujas te rr as são banhadas pela bacia hidrogr á fi ca do rio Xingu, que incl u i

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outros rios importantes como o Iriri e o Curuá, consideraram que seu sistema de uso do rio ficaria vulneráv el devido aos imp a c tos e por isso se opuseram à co n s t ru ção da barr a gem. Em 1988, o Enco nt ro dos Povos Indígenas do Xingu em Altamira reuniu diversas nações indígenas e visibilizou, para o mundo, a sua indignação em virtude do menosprezo de suas culturas e da sua ancianidade na terra, denunciando que a empresa teria passado por cima de direitos constitucionais sobre a terra, garantidos aos índios. A índia Tuíra to rn o u -se o símbolo da luta dos po v os indíge n as e das mu l h e res do Xingu, marcando esse evento pelo afro ntamento, com um fa cão em punho, de uma au to ridade da Elet ro n o rte. Pos tu l ava a defesa das terras, da floresta, das águas e da vida no Xingu. A usina de Belo Monte será a primeira de um complexo de cinco. Pelo projeto, sua construção está p l a n ejada para a Vo l ta Grande do Xingu, no município de Vi tó ria do Xingu, at i n gindo direta m e nte ainda os municípios de Alta m i r a, Senador José Po rfírio e Anapu. A enge n h a ria da obra dife re da de Tucuruí, pois Belo Mo nte terá dois canais de adução na Volta Grande do Xingu, que irá enco ntrar o leito do rio abaixo da usina. O volume de material a ser retirado para a construção dos canais é de 144 milhões, 622 mil metros cúbicos de terra e 51 milhões e 955 mil metros cúbicos de rocha, cujo destino ainda está por ser definido. A alteração do rio é, evidentemente, de grande magnitude. Os impactos no ecossistema, na v egeta ção, nas es péci es de fauna e flora aqu át i cas serão inevi táv e i s, dadas as evi d e ntes alte r a ções no movimento e na qualidade da água e de seus nutrientes. As obras de Belo Monte importam em diques, portos, vilas, estradas e finalmente na linha de transmissão de alta tensão que se destina ao consumo de regiões industrializadas no país. A Eletronorte projetou a geração de 11.182MW, volume que seria reduzido para 4.000MW em período de seca, quando o rio tem sua lâmina de água menor, o que inviabilizaria economicamente a obra, segundo especialistas. N o va es (2003) argumenta so b re a des n eces s á ria e inco n seqü e nte co n s t ru ção de gr a n d es barr a gens no país, que, aliás, são objeto de deb ate nacional há bas ta nte te mpo. (MOUGEOT: 1985; SIG AUD: 1986; ROSA & SANTOS:1999). Mas, apesar de ser uma qu es tão ainda po l ê m i ca, o go v e rno pretende que o ri o X i n gu fo rn eça 20% de energia hidrel ét ri ca de todo o po te n cial estimado para ser gerado pel os ri os da Amazônia, 113 mil MW1 Qu es tões cru ciais como essa, que têm provocado tensão ent re segm e ntos da soci edade ci vil co nt r á ri os à obra e o Estado, não têm sido abordadas com cl a re za e consistência. No entanto, trata-se de questões que dizem respeito à natureza e à abrangência dos impactos socioambientais, à apropriação privada do território e de seus recursos e à equação ganhadores/perdedores. A pri n cipal cidade da região, Alta m i r a, junto com outras sed es mu n i ci p a i s, já co m eça a experimenta r mu d a n ças em fu n ção da expec tat i vaem rel a ção à implanta ção do pro jeto. A oc u p a ção dessa área segue o padrão tradicional de pequenos povoados dispe r sos nas margens de ri os, combinado com a oc u p a ção das terras firmes na rodovia Transamazônica. A economia de inúmeros municípios é de base agrária. Nas proximidades da Volta Grande do Xingu, área central da planta hidrelétrica, encontra-se 30 povoados co n fo rme enu m e r a d os na Fi gura 2. No enta nto foram aponta d os 14 que se riam os mais vu l n e r áveis aos impactos da barr a gem, nos es tu d os prel i m i n a resrea l izados pela Universidade Federal do Pará (LÍRIO e 1 O Brasil possui cerca de 20% de toda a água doce do planeta, o que o deixa em uma situação vantajosa em relação a outras regiões do mundo. O país tem ta m bém o maior manancial de água doce da Améri ca do Sul. Des se to tal, ap rox i m a d a m e nte dois te rços (63,6%) encont r a m -se na Amazônia, onde se encontram justamente os rios brasileiros com maior potencial para gerar energia, destacando-se os rios Xingu, Tocantins, Araguaia, Madeira, Trombetas e o Tapajós.


SÁ: 2001). Agro vila Leonardo da Vi n ci, Sagrado Coração de Jes u s, São José, Boa Esperança, São Franci sco de Assis, Vila Rica, Santa Terezinha, São Raimundo Nonato, Bom Jardim, Bom Jardim II (Goianos), Santo Antônio, Santa Luzi a, São Fr a n ci sco de Chagas (Deus é Amor) e Te rra Preta. Na cidade de Alta m ir a, pe rto da foz do rio Itatá, enco nt r a m -se mais três loca l i d a d ese doze nú cleos também suje i tos a imp a ctos: Paratizinho, Palhal de Cima, Palhal de Baixo, Cana Verde, Ituna, Ressaca, Fazenda, Paratizão, São Lá za ro, Ilha Itaboca, Santa Luzia e São Ped ro, além dos três po v o a d osoriginári os do gari mpo, conhecid os por Galo, Itatá e Japão. Porém são as ci d a d es de Alta m i r a, Vi tó ria do Xingu e Senador José Porfí rio as regi ões co n s i d e r a d aspela emp resa Elet ro n o rte como sujeitas aos maiores imp a c tos. Em outras áreas, be irando o rio, pe rto da área urbana de Altamira e em seus igarapés Alta m i r a, Ambé e Panel as, es tão previ stas vá ri as obras, ent re as quais a vila res i d e n cial do empreendimento. Na pe rcepção da sociedade ci vil, que valoriza dimensões da vida em geral não consideradas na visão técnica e burocrática das empresas, a abrangência dos impactos será muito maior do que a admitida pela empresa Elet ro n o rte. Figura 2- Povoados localizados ao longo da Volta Grande do rio Xingu

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Figura 3 - Volta Grande do Rio Xingu na Região de Altamira

Fo nte: ELET RO NO RT E, 2001.

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É dif í cil estimar a população a ser atingida pelos imp a c tos das hidrelétricas, caso elas venham a ser construídas, uma vez que há ainda inúmeras indefi n i ções qu a nto ao pro jeto, o que invi ab i l iza a análise so b re a natu re za e o gr au dessas mu d a n ças. Po rém, a po p u l a ção dos três mu n i cípios que serão pro vav el m e nte mais at i n gidos segundo pesqu i s a d o res e técnicos do go v e rno - Alta m i r a, Vitória do Xingu e Senador José Po rfírio - so m ava um to tal de 105.215 habita ntes pelos dados do Censo de 2000 (FIBGE). O mu n i cípio de Altamira é o maior mu n i cípio do Pará em extensão te rri to rial; é nes se mu n i cípio qu e o rio Xingu faz a maior parte de seu curso. Em suas te rras, parte del as co nto rnando a Terra do Me i o2 e n co nt r a m -se muitos po v os indíge n as3 O Pará é um dos Es ta d os que tem mais índios na Amazônia Legal, depois do Es tado do Amazonas. Eles somam ap roximadamente 270.000 índios que vivem nas 400 2 A Terra do Meio, como é conhecida uma grande área contornada de terras indígenas, pertencente ao Estado e prevista para ser instalado um mosaico de unidades de conservação, tornou-se espaço de grilagem e de violência pela disputa pela terra por fazendeiros, comerciantes diversos e trabalhadores rurais. 3 Segundo o IBGE, em todo o país existem 701.462 índios, distribuídos em 218 etnias. Desse total, a maior


Te rr as Indíge n as, parte del as demarca d as e reco n h eci d as legalmente como tal. Na área do rio Xingu e na confluência de municípios cortados pela Rodovia Transamazônica, concentra-se um número significativo de etnias: 5.923 índios vivem nas aldeias na floresta e mais de 2.000 residem nas cidades de Altamira, São Fél ix do Xingu, Senador José Porfí rio, Vi tó ria do Xingu ou Uru a r á, to ta l izando ce rca de 8.000 índios4. São aproximadamente 20 povos com culturas deferentes. A distribuição espacial, uma circunferência cujo eixo é o rio Xingu, atinge inúmeros municípios cortados pela Transamazônica e em direção à cidade de São Félix do Xingu. A avaliação dos impactos de uma grande represa sobre os povos indígenas não pode ser feita examinando-se os casos isoladamente. Os argumentos que os povos indígenas apresentam contra a barragem re fe rem-se à unidade cultural de cada povo, que ab r a n geas fo rm as de uso da te rra e dos rec u r sos da biodiversidade da floresta e dos rios. D i fi ci l m e nte eles não serão afeta d os pelo complexo de hidrel ét ri cas planej a d as para o Xingu, em fu nção da alte r a ção que se veri fi cará no rio. Po rém a emp resa Eletronorte tem procurado desqu a l i fi car o discurso dos povos indígenas e minimizar os possíveis impactos socioambientais. O que está em questão não é apenas a área que, de acordo com os planos de engenharia, receberá um reduzido impacto ou um impacto in direto, ou ainda a co n cepção de geogr a fia da obra (SIGAUD, 1995; MAG A LHAES, B RI TO, CAST RO: 1996). Es s as são as catego ri as fo rm a i s, que ignoram a dinâmica socioeconômica decorrente da grande obra, conforme verificado em inúmeros estudos relativos a outras plantas, regiões ou países. É essencial analisar a magnitude real dos impactos sociais, econômicos e ambientais a partir de uma perspectiva de conjunto, pois o que está em pauta é um complexo formado por cinco usinas, incluindo Belo Monte5. Os gru pos locais preoc u p a m -se com os imp a c tos – previsíveis – na qualidade da água do rio e de seus afl u e ntes, na dinâmica de ca ch oe i r as, lagos e ilhas e dos pequ e n os cursos de água, os igarapés. De fendem o dire i to de manter suas tradições e háb i tos de usos do rio (para pesca, nav egação, rituais, banhos e como lugares sagrados), nichos de reprodução das espécies da fauna e da flora. Para esses grupos, a po l u i ção dos ri os signifi ca a supressão de fo rm as de trabalho e de manu te n ção da saúde, pois o ri o tem múltiplos usos, em sua maioria relacionados à reprodução da vida. Cabe ressaltar, porém, que essa posição não é consensual: é a visão de segmentos da população urbana e rural dos municípios referidos, ent re el es os ri be i ri n h os, os agriculto res, alguns grupos da cl as se méd i a, movi m e ntos sociais e ce rtas org a n izações confes s i o n a i s, pro fissionais e ambienta l i s tas, além dos povos indíge n as. Ao co nt r á rio, gr a nde parte das elites políticas e econômicas é favorável ao projeto, ao qual associam as idéias de progresso, modernização e desenvolvimento regional. Por outro lado, vários especialistas perguntam por que construir Belo Monte, se é possível ter o quil o watt de energia mais barato? E isso sem considerar os reais custos soci o a m b i e ntais em geral subes t imados por esses empreendimentos (FEARNSIDE:1998). Entretanto, em um momento em que se reforça a idéia de evitar os desperdícios e de reduzir os riscos devidos ao mau uso ambiental, o setor elétrico 4 Segundo o IBG E, em todo o país ex i s tem 701.462 índios, distri b u í d os em 218 et n i as. Des se to tal, a maior parte vive na Amazônia, ou sej a, 170 povos distintos, com culturas e línguas diferentes. 5 As demais são: Altamira (6.588 MW), Ipixuna (1.900 MW), Kakraimoro (1.490 MW) e Jarina (620 MW).

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no país opta pelo discurso das gr a n d es obras, extremamente oneros as e com impactos na dívida do Estado, como solução prioritária para a geração de energia.

4 PRIVATIZAÇÃO DE GRANDES BARRAGENS NOS RIOS DA AMAZÔNIA

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N os últimos anos do go v e rno do Pres i d e nte Fe rnando He n ri que Ca rd oso, a empresa Eletronorte apressou-se para aprovar o projeto Belo Monte nas instâncias nacionais, atropelando os estudos de viabilidade e ignorando a co mpetê n cia legal de órg ã os do go v e rno para el aborar lau d os pe ri ciais e au to rizar a realização de estudos. A luta da sociedade civil em defesa do rio tem conseguido adiar a conclusão dos estudos. Atualmente eles estão paralisados por ordem judicial, devido à ação impetrada pelo Ministério Público Federal por demanda fo rmal de organizações da soci edade ci vil. O pro jeto Belo Mo nte não ava nçou, apesar do l obby de seto res prod u t i v os e da cri se de energia de 2001, que pro v ocou ce rto desgas te po l í t i co no go v e rno. Mas o pro jeto pe rmaneceu na agenda do planej a m e nto nacional do setor energi a, ao lado de ce rca de 50 outros projetos hidrel ét ri cos previstos para os ri os da Amazônia. Segundo lideranças locais dos movimentos sociais, vitórias têm sido conquistadas graças ao engajamento expressivo do Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade, para o qual a questão da hidrelétrica teve um significado particular nas mobilizações. Apesar dos argu m e ntos dos movimentos sociais e de outros segm e ntos da soci edade ci vil co nt r á ri os às grandes barr a gens, o atual go v e rno, de Luís Inácio Lula da Si l va, co nt i nua pri o rizando a construção de dois gr a n d es co mplexos hidrel ét ri cos na Amazônia, o de Belo Mo nte, com ge r a ção de 11.180 MW, orçado em US$ 8 bilhões, incluindo o sistema de transmissão, e o do rio Madeira, em Rondônia, co m previsão de 7.600 MW, estimado em US$ 4,5 bilhões, distribuídos em duas usinas, a de Santo Antônio e a de Jirau, tendo o mercado como seu parceiro. Em setembro de 2003, o governo brasileiro concluiu o Programa Público-Privado (PPP), que aposta na parce ria com emp res as pri va d as para au m e ntar o montante dos inv es t i m e ntos em infr a - es t ru tu r a. Em contrapartida, o governo promete às empresas um ousado programa de concessões para a operação d os pro jetos pat rocinados e alte r a ções no marco regulador. Isso pe rmitira às administrações locais co mprometerem seus orçamentos em contratos de mais de cinco anos. Embora essas propostas não passassem, ate o momento da redação deste trabalho, de intenções, elas revelam a linha de orientação da política e a estratégia de investimentos do governo, que pretende com essas medidas dispor de R$ 65 bilhões anuais (R$ 35 bilhões do seu orçamento e R$ 30 bilhões da iniciativa privada) para investir até 20076, somando um to tal, ent re 2004 e 2007, de R$ 191 bilhões. As duas grandes obras hidrel ét ri cas acima re feridas já foram incluídas no Plano Plurianual de Governo (PPA) de 2004 a 2007, contando-s com a iniciat i va pri vada que ent r a ria com a metade dos recursos. A grande ved ete é o setor energético, e o maior pro jeto é o de Belo Mo nte. O objetivo da Eletro b r ás é retomar os es tu d os de vi abilidade, para que a usina co m ece a operar em 2008, quando poderá oco rrer novo défi cit de energia, segundo cálculos fe i tos por especialistas do setor.

6 Informações veiculadas pela mídia, em várias matérias, entre elas a Revista ISTOÉ DINHEIRO, de 20 de agosto de 2003.


O pri m e i rogrande co n sórcio da Eletrobrás, em negoci a ção, tem, de um lado, as emp res as es tata i s Fu rn as, Elet ro n o rte e Chesf, que fi ca riam com 49%, e, de outro, o setor pri vado, com 51%. A idéia qu e ganha co rpo é de um co n só rcio de emp res as pri va d as. Nas negociações es tão prese ntes as emp res as fab ri cantes de equ i p a m e ntos – ALSTO RN, ABB, General Elet ric e Vo l th Siemens – e as co n s t ru to r as Ca m a rgo Correa e Andrade Gutierrez (COIMBRA: 2004). Ju s ta m e nte, há inte res se de ab rir mais o lequ e de empresas parceiras, para incluir as eletrointensivas. A Companhia Vale do Rio Doce, com forte atuação na Amazônia, é apontada como uma parceira “n atural”. Mas, em março de 2003, Was h i n gton Novaes a d v e rtia que os inte res ses do mercado no po te n cial hidrel ét rico da Amazônia co l ocavam em ri sco iniciativas para preservar um estado ainda equilibrado dos ecossistemas, comentando: Uma fi gura insuspeita como Davi Zylbe r s tajn, ex-diretor da Agê n cia Nacional do Pet ró l eo e exge n ro do pres i d e nte Fe rnando Henrique Ca rd oso, adverte que es tá sendo leiloado, para emp res as que se dedicam principalmente à produção de eletrointensivos ou outros itens de sua fabricação própria, praticamente todo o potencial hidrelétrico. No dia em que a sociedade precisar de energia para outros fins, diz ele, terá de pagar muito mais caro por ela, já que terá de vir de outras fontes. R ea l m e nte se es tá diante de uma outra dinâmica de mercado, na qual o Es tado se movi m e nta de fo rma at i va, adotando es t r atégi as dese nv o l vi m e nt i s tas. A verte nte naci o n a l i s tae de Brasil grande potên c iaconstitui o eixo org a n izador do disc u r so ofi cial e da racionalidade técnico do Es tado. As usinas hidrelétricas até então têm se mantido no sistema estatal. Mas é impossível ignorar ou pretender que outros ignorem que a oferta dos serviços ao mercado nacional é apenas um passo do processo de privatização por empresas multinacionais, conforme a tendência verificada nessa fase de globalização. Afinal não foi isso que ocorreu em outros setores, como o financeiro e o de telecomunicações? E as empresas públicas do setor elétrico em todo o país não foram privatizadas em cascata nos anos 90? Nesse caso, o jogo torn o u -se mais co mp l i cado, pois o Es tado, pressionado pelo lobb y de emp res as no co m é rcio de energia hidráulica, deve es tabel ecer um novo marco regulador para o seto r. A experi ê n cia de Tucuruí talvez tenha po u co a ensinar so b re o que aco ntecerá com Belo Mo nte, que será uma usina fu n cionando pel a lógica de mercado, sob o controle privado de corporações nacionais ou estrangeiras. Além disso, a Eletrobrás estuda a possibilidade de assumir ou não a co m e rcializa ção da energia que, segundo cá l c u l os preliminares, teria um custo de produção entre US$12 e US$18 e chegaria ao mercado consumidor em torno de US$30 por MWh. A qu es tão é saber se é pos s í v el uma outra mat riz energét i ca. O pesquisador Bergmam considera vi áv el atender à demanda de energia no país, para os próximos anos, sem precisar sacri ficar o rio Xingu, a rrolando as segu i ntes alte rn at i vas: aplicação de um plano para red uzir as perd as no sistema el ét rico brasileiro; realização de ações que repotencializem as usinas com mais de 20 anos, bastante numerosas no país; geração de energia em sistemas descentralizados por meio de pequenas centrais hidrelétricas e de u s i n aseólicas (que ap ro v e i tam a energia dos ventos); ap ro v e i tamento da biomassa (b a g a çode cana ou resíduos do papel e cel u l ose) em co - ge r a ção. O au tor argu m e nta que, se es s as so l u ções tives sem sido adotadas há mais te mpo, além de evi tar o qu a d ro atual, te riam permitido uma economia de recursos. São so l u ções de baixo custo e de baixo impacto que “disponibiliza riam para a soci edade brasileira o equ ivalente a mais de 33% da capacidade de geração atualmente instalada” (BERGMAN: 2002). Pergunta -se: por que es s as so l u ções não são adota d as? Ainda: o que o sistema el étri co inco rpo rou de tod os os progr a m as de pesquisa de ciência e tecn o l ogia fe i tos no país so b re mu d a n ças, ri scos e imp a c tos

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de processos hidroel ét ri cos em regi ões tro p i cais como a Amazônia? Efet i va m e nte, a diversidade de m ecanismos para gerar energia em qualidade e qu a ntidade, sem ter de destruir, necessariamente, os ecossistemas aquáticos e a vida social e econômica organizada nas margens de rios amazônicos, foi um dos temas principais dos fóruns de debate que reuniram pesquisadores de diversas formações, disciplinares e interdisciplinares, nas décadas de 80 e 90 no país. Entretanto, esse capital intelectual, acumulado com o apoio inclusive de investimentos públicos na pesquisa em C&T, continua sendo ignorado pelo setor energético. O deb ate so b re energia alte rn at i va e gr a n d es obras hidrel ét ri cas dura há mais de 20 anos no país, te mpo sufi ci e nte para gerar um acúmulo de conheci m e ntos na área. A qu es tão de dar pre fe rê n cia a pequ e n as unidades e a fo ntes alte rn at i vas de energia (eó l i ca, so l a r, biomassa) é de ordem po l í t i ca, mas também de ges tão, pois fi cou co mp ro vado, com a cri se energét i ca no país em 2001, que é pos s í v eldar prioridade à conservação da energia e eleger a sua economia como estratégica para o país, adotando-se inclusive outras pri o ri d a d es, como a red u ção das des i gu a l d a d es sociais no aces so à energi a. Outra opção é seguir as estratégias de mercado, de maior produção para maior volume de venda. Conciliar esses dois movimentos é um desafio e ao mesmo tempo uma quebra-de-braços. A maior hidrelétrica na Amazônia, Tucuruí, foi viabilizada para exportar energia embutida em produtos eletrointensivos de corporações estrangeiras. As plantas de ferro-gusa localizadas nos Estados do Pará e Maranhão até o presente queimam carvão vegetal de florestas nativas; as indústrias de celulose e papel foram reje i ta d as por causa de seus fo rtes danos ambienta i s. O alumínio é prod uzido com altos custos energéticos; a energia rep resenta qu ase 50% de seu custo to tal. As usinas hidrel ét ri cas têm deixado para o poder público e os ato res locais a co nta a ser paga, ou seja, os custos ambientais (inu n d a ções, pe rda da biodiversidade) e sociais (populações des l oca d as, dese mp rego, disseminação de doe n ças co m o a malári a, inu n d a ções de áreas imensas, migr a ção, etc.). Além evidentemente, do subsídio de ta ri fas co ncedido à Eletronorte pela soci edade, que paga no lugar das emp res as de alumínio, tod as el as de cap i ta l p ri vado, nacional e inte rn a cional. Paradox a l m e nte, países importa d o res, como o Japão, os EUA e o Ca n a d á, são justamente os que detêm o co nt role eco n ô m i co das ca d e i as prod u t i vas globalizadas, incluindo os mais sofisticados produtos derivados do alumínio. Os imp a c tos das barr a gens têm fi cado cada vez mais evi d e ntes. Em todo o mundo, a discussão é po l ê m i ca, mas amp l i a -se o cí rculo do movi m e nto mundial co ntra as barr a ge n s. Novos ato res surge m , exp l i ci tando as razões para co m b ater esses emp ree n d i m e ntos que, pela natu re za dos investimentos e dos interesses em jogo, alteram o modo de vida de milhares de pessoas no planeta. Um estudo concluído em 2000 pela Comissão Mundial de Ba rr a ge n s, com o apoio do Ba n co Mundial, da Organiza ção das Nações Unidas e da União Inte rnacional para Conserva ção da Natu re za, reunindo es pecialistas de 42 países, d epois de analisar mais de mil emp reendimentos, recomendou que se tenha “ext rema pru d ê n cia nessa área”. Em um século, construíram-se barragens em 60% dos rios no mundo. Foram mais de 45 mil barrage n s, considerando ape n as as que têm mais de 15 met ros de altura ou mais de 3 milhões de met ros cúbicos de água represados. Nelas foram investidos mais de US$ 2 trilhões. E dezenas de milhões de pessoas – em torno de 60 milhões – foram deslocadas pelos empreendimentos. No Brasil a maior concentração está nas regiões sul e sudeste, somando cerca de 80 barragens mais importantes no potencial energético responsável em grande parte pelos 80,55% da potência em energia elétrica instalada no país (TUNDISI: 2003).


Tabela 1 - Disponibilidade, em potência instalada, de energia elétrica no Brasil. Tipo

Potência Instalada (MW)

Participação

Pequenas centrais hidrelétricas

1.485

2,02

Usinas hidroelétricas

59.165

80,55

Usinas térmicas

9.664

13,16

Usinas nucleares

1.966

2,68

Importações

1.150

1,57

Total

73. 449

Fonte: ANEL, 2000, Apud Tundisi, 2003.

Os cá l c u l os econômicos incluem outros usos para os ri os. Pros pecções do setor de transpo rte apo ntam para a viabilidade de exploração dos rios da Amazônia para fins de navegação, potencial esse refletido nos 21.300 km em co mparação aos 16.900 km das demais regi ões do país, segundo a tabela 2. As h i d ro vi as tem sido inco rpo r a d as crescente m e nte nos planos de integr a ção co nt i n e ntal, tendo a panamazônia como referência. Tabela 2 - Principais hidrovias brasileiras – Usos de navegação Bacias Amazonas

Rios Principais Amazonas, Negro, Madeira, Purus, Jurus, Branco e Juruá

Extensão (Km)

Tocantins e Araguaia

3.000

Jacuí, Taquari, Lagoa dos Patos e Lagoa Mirim

1.300

Doce e Paraíba do Sul

1.000*

Mearim, Pindaré, Itapecuru e Parnaíba

3.000

São Francisco e Grande

4.100

Paraná e Tietê

4.800

Paraguai

Paraguai e Cuiabá

2.800

Uruguai Totais

Uruguai e Ibicuí Amazônia Demais Regiões Brasil

1.200* 21.300 16.900 38.200

Tocantins Atlântico Sul Atlântico Leste Atlântico Norte/Nordeste São Francisco Paraná

Fonte: Cabral (1995), apud Tundisi, 2003. * Valor potencial.

18.300

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C

A

P

I

T

U

L

O

2

DIREITOS SOCIAIS, GÊNERO E ÁGUA 1 - CIDADANIA DAS ÁGUAS

O

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Mo vi m e nto pelo Dese nv o l vi m e nto da Transamazônicae do Xingu (MDTX) nasceu no final dos anos 90, com forte participação de agricultores familiares e suas organizações, mas articuladamente a diversas catego ri as de trabalhadores urbanos. A irr a d i a ção das mobilizações, com profes so res, estudantes, gru pos de pas torais rel i gios as e org a n izações de mu l h e res direcionaram-se para responder às neces s i d a d esmais imed i atas: mel h o ria nas co n d i ções de trabalho e de prod u ção, encaminhamento de regu l a rização fu n d i á ria junto ao INCRA e de financi a m e nto agropec u á rio em outros órg ã os do Es tado, manu te n ção das es t r a d as vi cinais e mesmo da Transamazônica, esco a m e nto da prod u ção e organ iza ção de se rvi ços como transporte, esco l as, pos tos de saúde e ab as tecimento de águ a. A situ a ção precá ria dos lotes e das es t r a d asvi ci n a i s, ret r ato do des i nteres se do Es tado e dos limites impos tos pelo padrão de inv es t i m e nto do setor público na região, re fl etia o quadro de recessão eco n ô m i ca do país nos anos 80. Pe rí odo no qual o Es tado red uz seus investimentos na Amazônia freando as ações em curso e paralisa os pro jetos de infraes t ru tura e de pó l os de dese nv o l vi m e nto que vinham sendo pri o riza d os pelo Programa Polamazônia.Por isso também esse pe rí odo irá registrar maior violência em to rno da qu es tão fu n d i á ri a, em grilagem de te rr as e ava n ço para novas fronte i r as, prese n ça de “m i l í ci as” ilegais arm a d as (p is t o lag e m), m o rte de lideranças sindicais e impunidade em geral. O MDTX org a n izou es t r atégi as de represe nta çã o po l í t i caat r av és inici a l m e nte de sindicatos e pos teriormente de as sociações, coo perativas e part i d os po l íticos. É nes te co ntexto que os novos inte res ses do mercado materializa d os em Belo Mo nte passam a co n stituir um espaço de luta para as 113 org a n izações, segundo lideranças locais, a ele vinculado em 2003. O Mo vi m e nto de Mu l h e res do Ca mpo e da Cidade, que se esboça nessa dinâmica da rel a ção com o m o vi m e nto mais geral, teve uma part i ci p a ção ativa em todos os momentos po l í t i cos, ent re el es o de p ri o rizar as ações co ntra a co n s t ru ção de barr a gens no rio Xingu. O pro jeto social tal qual fo rmu l a d o foi ultrapassado por uma nova co n cepção de inte rvenção, de pensar a região Transamazônica como es p a ço de inte rvenção para fins de planej a m e nto do desenv o l vi m e nto regional. Inco rporaria de fo rm a mais evi d e nte a dimensão econômica da agri c u l tura familiar, at r av és de pro jetos de dese nv o l vi m e nto e m od e rn iza ção de siste m as agro fl o res tais. Evoluiu ta m bém para criar fo ros de art i c u l a ção intercategori as sociais, rurais e urbanas. Rea l izou mobilizações e inco rporou a análise de co nju ntura so b re as dinâm i cas econômicas, sociais e políticas como dimensão das lutas locais dos movi m e ntos de mu l h e res. O p ro jeto de co n s t ru ção de Belo Mo nte, nessa perspectiva, é qu estionado pel as mu l h e res em fu n ção do m od elo de desenvolvi m e nto por ele representado. Pe rgu ntavam so b re a natu reza dos benefíci os das


b a rr a gens e de seus beneficiári os nacionais e inte rn a cionais? Conseqü e nte m e nte, so b re os ganhos e pe rd as para os gru pos locais? Os documentos produzidos pelos movimentos sociais nos anos 80 e 90 sobre Belo Monte insistiam em uma discussão democr át i ca que inco rporas se, como pre m i s s a, a escolha de possibilidades para o dese nv o l vi m e nto da região, sem o que fi ca ria invi ab i l izado qu a l quer pro jeto de co n s t ru ção de hidrel ét ricas. A grande polêmica para eles recaia sobre o destino da energia e da própria empresa. Acompanhando as discussões em torno das negociações multilaterais de livre comércio, os atores locais temem hoje pelo ava n ço dos proces sos de pri vat iza ção e pel os inte res ses em jogo na ap ro p ri a ção de rec u r sos energét i cos. Não é sem razão, pois o que es tá na pau ta é a venda da barr a gem pelo setor público nacional para empres as “p a rce i r as ”que iriam co nt ro l a r, ju nta m e nte com a energia, a água do rio Xingu, pelo m e n os na área sob infl u ê n cia da barr a gem. Efetiva m e nte, Tucuruí foi um laborató rio so b re a ap ro p ri ação de terras, ainda que a empresa seja do setor energia e de natureza estatal. A Companhia Vale do Rio Doce também se apropriou de enormes extensões de terra na Serra de Carajás, que foram subtraídas do Estado, portanto, do patrimônio público. Incorporadas à empresa quando esta era estatal, foram escandalosamente vendidas, juntamente com o empreendimento, a grupos privados. Os exemplos dados por outros gr a n d es pro jetos de energia hidráu l i ca mostram proces sos de exclusão social além da degradação ambiental no entorno dessas grandes obras. A Ca rta da Campanha Águas sem Barrag e ns nas Ba c ias Am azôni cas, ap ro vada no I Enco nt ro Inte res tadual so b re Ba rragens do Araguaia-Toca ntins e Xingu, rea l izado em Impe r at riz (MA), de 9 a 11 de dezembro de 2002, e referendada pelos participantes do II Fórum Social Pan-Amazônico, realizado em Belém, ent re os dias 16 e 19 de janeiro de 2003 foi diri gida ao Sr. Pres i d e nteda Rep ú b l i ca, Lu iz Ináci o Lula da Si l va, às Ministras de Minas e Energia e de Meio Ambiente, ao Pres i d e nte da Elet ro b r ás, ao Secretário Nacional dos Direitos Humanos, ao Presidente do Senado Federal e ao Presidente da Câmara dos Deputados. Na resposta, o diri ge nte da Elet ro b r ás reco n h ece a pos i ção e as pro postas das ent i d a d espresentes ao Enco nt ro, no que ta n ge ao co mp ro m i s so com a prese rvação dos rios, ecossistemas e respe i to às po p u l a ções locais das bacias dos rios Araguaia, Toca ntins e Xingu. Res s a l ta sua preocupação com a preservação do meio ambiente e a prioridade que deve ser dada a essa área, incluindo aí os imp a ctos ambientais e sociais das barragens, a poluição at m os fé ri ca das te rm el ét ricas, o efe i to es tu fa e os ri scos dos reatores nu cl eares. Assume o comp ro m i s so de levar as re i vindicações ao co n h eci m e nto das au to ri d a d es, que se comp ro m eteram em “criar cenários de co n fo rto, boa qualidade de vida e integridade ambiental” àqu eles que so frem com o desequ i l í b rio eco l ógi co”, como afi rmara Pinguelli Rosa. Mas fi ca a pe rgunta: a relação ent re Estado e mercado globalizado não estaria no Brasil já apontando para outras te n d ê n ci as? Como já dissemos, os estudos de construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, Estado do Pará es tão paralisados. Segundo o pró p rio Pres i d e nte da Eletro b r ás, a usina traria pro b l e m as ambienta i s à região Norte no período da seca, que vai de junho a novembro. Nesses seis meses, a hidrelétrica poderia gerar ape n as 40% do que foi programado, sob ri sco de preju d i car a va zão do rio Xingu. Fonte do setor explica que, nesse caso, a construção de uma te rm el ét ri ca anexa ao co mplexo hidrel ét ri co garant i ria a energização da linha de transmissão quando a usina estiver gerando 60% a menos da capacidade instal a d a. Mas a Eletrobrás pretende retomar as obras para que a usina co m ece a operar em 2008, quando

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poderia ocorrer novo déficit de energia no país. A decisão da estatal é de ser minoritária no empreendimento, com forte presença do capital privado. As corporações mais fortes do setor, de países ricos, têm os olhos voltados para esse grande filão do mercado, a energia. A relação entre hidrelétricas e o interesse do mercado de água não aparece explícito no debate nacional e nem em reuniões ministeriais embora em Conferência7 ministrada em Bruxelas por Haleh Bridi, representante do Banco Mundial na União Européia tenha deixado claro o interesse do Banco Mundial em apoiar grandes obras de infra-estrutura, como hidrelétricas tanto pela geração de energia quanto pelos serviços relacionados à água. O Ba n co Mundial tem sido o pri n cipal fi n a n ciador dos gr a n d es pro jetos na Amazônia, de hidrel ét ricos à mineração e infra-estrutura, e parte importante da dívida externa do país deve-se ao financiamento de grandes obras. Os rios Araguaia e Tocantins voltam a representar uma alternativa à crise energética do país com 14 hidrelétricas que teriam a capacidade de gerar, conjuntamente, 20.000 MWh de energi a. As de Lajeado e Cana Brava, no Es tado do Tocantins, se enco ntram em fu n ci o n a m e nto. Es tão em lici ta ção as de Serra Qu eb r a d a, no oes te do Estado do Maranhão e a de Santa Isabel, planejada para a confluência dos três Estados, Maranhão, Pará e Tocantins. O movi m e nto co ntra a constru ção de barr a gens co ntextualiza a pro b l e m át i ca da água como um direito humano, e luta pelo rio, na defesa da co nt i nuidade de sua ex i s tê n cia a salvo dos imp a c tos pro fu ndos e rupturas drásticas em seus processos de reprodução. As barragens que, se processadas, somariam ce rca de cinco dezenas, a se rem constru í d as nos próx i m os anos no Brasil, se enco ntram na grande maioria localizadas na Amazônia. Se privatizadas, seguindo a tendência que parece predominar no governo atual, certamente desencadearia um movimento de privatização em cascata para outros setores relacion a d os com recursos hídri cos, levando em consideração a fo rça das co rpo r a ções mundiais da água e a geopolítica que se desenha em nível internacional. A rede Fó rum Ca r aj ás, em parce ria com o Mo vi m e nto Nacional dos Atingidos por Ba rragens (MAB), Fó rum da Amazônia Ori e ntal (FAOR), Inte rn ational Rivers Net w o rke outras ONGs, es tão promovendo a campanha “Águas sem barragens”, que tem a intenção de divulgar os impactos das 46 hidrelétricas propostas para a bacia Araguaia-Tocantins.

2. CULTURA DA ÁGUA E DO RIO ENQUANTO EXPRESSÃO LOCAL

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Ainda que nos argumentos formulado pelo movimento de mulheres de Altamira e Xingu não esteja tão evi d e nte a associ a ção ent re pri vat iza ção dos se rvi ços no país e a problemática das hidrel ét ri cas, o co n fl i to e a luta co ntra a construção da hidrel ét ri ca de Belo Mo nte eclodiu em função dos possíveis impactos locais que poderiam inviabilizar o uso do rio como espaço público. Os fundamentos dos co n fl i tos, em última análise, giram em to rno de co n cepções dife re ntes de dese nv o l vi m e nto que têm a ver com o uso social do rio e o seu uso pri vado. A pri vat iza ção a que aludiam nos anos 80 os moradores de Tucuruí desalojados pela barragem, dizia respeito ao poder de disciplinamento que a empresa de energia exercia sobre o território onde se localiza a planta, na área do reserva-

7 Conferência Water Access for All in the Li g ht of the Millennium Devel o p m e nt Goals Which role for Eu ro pean Public and Pri vate Ac tors? realizada em 29/03/2004.


tório e de seu entorno este caracterizado como zona de segurança. O exemplo do rio Tocantins ainda é lembrado entre moradores. Os rios, historicamente, têm importância vital na Amazônia. A potência das águas brancas e pretas que correm na região, e se convertem em rios furta-cores – verdes, azuis, pretos, barrentos – é relevante na dimensão material e simbólica da vida de homens e mulheres nessa região (DIEGUES: 1998; LEONARDI: 1999). As águas, territórios indivisíveis e penetrantes, são espaços da pesca, das travessias, das moradias, das culturas de várzea, do lazer, das encantarias de povos e tribos, que muito antes do processo de colonização nas terras amazônicas, aqui já habitavam. Na lingu a gem dos gru pos de mulheres, a imagem de ri os, igarapés e lagos e os sabe res so b re seu s cursos, sua natureza e suas mudanças sazonais, são elementos da cultura, e expressão de sua identidade. Distinguem, por uma série de processos complexos inerentes aos ecossistemas de florestas úmidas tropicais, os recursos apropriáveis e a própria paisagem com habitats diversos, que se renova com a beleza p a rticular de cada es ta ção, segundo os ci cl os de vida da natu re za. A luta pela terra e pela água es tá assim associada para as mulheres às suas formas de trabalho e à sua identidade, que passam, necessariamente, pelo território, pois viveram historicamente de uma economia baseada nos recursos florestais e aquáticos ali presentes e abundantes. Des ses gru pos sociais form a d os por populações nat i vas, res i d e ntes ou não nas ci d a d es, uma parte conseguiu preservar a localização de suas casas e sítios nas margens de rios, lagos e igarapés ou mesmo na proximidade de áreas baixas de várzea, rica em biodiversidade. Eles trouxeram ao presente os traços ident i tá ri os que envolvem as tradições, os cos tu m es e as prát i cas – alimentos, fes t i vi d a d es, músicas, rituais de cura –, além de certos símbolos, como a cerâmica marajoara, os brinquedos de miriti, os perfu m es, as ervas aro m át i cas e a ces ta ria de fi b r as vegeta i s. Tod os es ses elementos materiais, ori u n d os dos recursos da água têm sido manipulados e atualizados em um campo identitário e simbólico. As redes de relações comerciais que alimentaram os vínculos dessas áreas ribeirinhas com as cidades resguardaram esses traços sócio-culturais8. Ainda que a rodovia Transamazônica tenha ocupação mais recente, a relação com a floresta e o rio demarca também a sua história recente. A prát i ca co rre nte ent re gru pos locais é a do uso social dos cursos d´águ a, que se inscreve em proced i m e ntos regu l a d os pela cultura em um se ntido mais geral. A água como bem co mum e dire i to de tod os. Esses gru pos criaram prát i cas de preserva ção de fo ntes, igarapés, lagos e ri os. A luta pela prese rva ção dos lagos na Ilha de Marajó ou no baixo Amazonas, co ntra o ava n ço das emp res as industri a i s de pesca, é exemplo de um processo mu i to mais amplo. Não se trata ce rta m e nte de um processo disp u ta pela água em si (FURTADO:1993; MELLO: 1985). Au m e nta, po rém, a ch egada de emp resas que p ri vat izam, ju nto com as te rras, os seus cursos d´água. As grandes emp res as mineradoras e as fa z e ndas de gado e soja nessa região vêm potencializando novas fo rmas de co n fl i to pela pri vat ização de m a n a n ciais de água doce. Por tod os es tes motivos, as mulheres da Transamazônica e do Xingu co ntestam os interes ses do mercado de água e do uso do rio para geração de serviços privatizados. A participação de uma liderança (Antônia Melo) no “Se m i n á rio so b re a pro b l e m át i ca da água e os imp a c tos na vida das mu l h e res”,

8 Sobre estudos da relação de cidades estuarinas com os rios e as ilhas do entorno ver o site www.ufpa.br/projetomegam.

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durante o II Fórum Social Mundial realizado em Po rto Alegre (RS), em janeiro de 2002, a co nvite da A l i a n çaSocial Cont i n e ntal, pe rmitiu foca l izar a pro b l e m át i cada água de fo rma mais co mp l exa e as s umi-la como um dos pontos de pauta prioritários no movimento de mulheres na região. Porém, no decorrer dos anos ante ri o res, vá ri as mobiliza ções tinham sido org a n izadas, exp a n d i n d o -sea luta pela água nos municípios vizinhos. Altamira fez, em uma de suas celebrações pelo 8 de março, grande manifestação pela defesa das águ as. Uma caravana de barcos com bandeiro l as e carta z es suspe n sos no ar pe rcorreu a Volta Grande do rio Xingu, área que seria atingida pela hidrelétrica de Belo Monte, em um abraço coletivo reafirmando a imagem do rio Xingu sem hidrelétricas.

3. MOVIMENTOS DE MULHERES E DEFESA DO RIO XINGU SEM BARRAGENS No Dia Internacional da Mulher de 2002 o tema central na região de Altamira foi a defesa das águas do rio Xingu. As mulheres firmaram posição contra o projeto da Eletronorte de construir a hidrelétrica de Belo Monte. Uma das fundadora do MMTA/CC e atual Coordenadora do MDTX sintetiza o que considera fundamental na luta pela água e em sua relação com o barramento do rio: N ós prete n d e m os, a partir de ago r a, trazer es se deb ate para o domínio p ú b l i co. Nós já es ta m os vendo que a sociedade lá fo r a, já está as sociando es s a luta da água, porque nós fomos as primeiras que colocamos em público a participação e tudo mais, com a mobilização e sensibilização do dia 8 de março. Essa é a nossa fu n d a m e ntal bandeira de luta, a água como uma po l í t i capública, como um dire i to fu n d a m e ntal. Essa marca nós qu e re m os trazer aos go v e rn os, e à sociedade de toda a nossa região (Antonia Melo, Altamira, 2003). É impo rtante registrar que a preocupação manifes tada pel as mu l h e res com a qu es tão da água se i n se re numa comp reensão mais ampla do pro b l e m a, que ultrap assa a qu es tão do imp a c to ambienta l . Trata-se de direito humano de todos e de gerações futuras, ao meio ambiente preservado, como insiste uma liderança de Altamira,

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Aí entra o co n ce i to não só da água do rio, e sim do rio como um dire i tode política pública. Todos têm direito à água, e água limpa, água boa pra saúde. Também é reconhecida por elas a relação entre água e floresta, entre o assoreamento dos rios e igarapés e a dinâmica dos processos de desmatamento. Uma liderança feminina explicita sua percepção da socioeconomia regional e o papel político das mulheres: Na realidade, o objetivo é que as mulheres sejam protagonistas para desencadear essa luta e essa discussão, onde quer que el as es tejam, em seus municíp i os, nas esco l as [...] essa mobiliza ção, sensibiliza ção da sociedade que está ao seu redor, sobre a defesa da água (Tônia, Altamira, 2003).


A luta pela redemocratização do país nos anos 70 acabou por ajudar a politizar também as relações de gê n e ro, a partir do movi m e nto de mulheres. Na Transamazônica, as mu l h e res enfre ntavam nesse período os desafios da colonização, conforme sintetiza uma de suas coordenadoras: Desde a abe rtura da Transamazônicaa mulher es teve envolvida, es teve se mp re de fre nte, ju nta m e nte com os homens, batalhando, co n s t ruindo, cozi n h a ndo nos barr a cos, e logo que se dão as gr a n d es reivindicações, foi a greve da ponte União conhecida aqui, as grandes reivindicações, a mulher que vem para dentro para discutir, em 1984, daí se dese n rolou a saída em caravana para Brasília. Então, lá nessa época, a gente era bastante jovem [...] a gente já sentia a presença da mulher reivindicando os direitos, não só o seu, mas o direito à agricultura, à família, à escola e à educação. A partir dessa greve a gente conseguiu conquistar o maior colégio que tem aqui, o Colégio Abraham Lincoln, foi uma conquista dessa greve. Logo depois o hos p i tal mu n i cipal também foi res u l tado des s a l u ta, dessa greve. (Elicé ria Fr a n co, Coo rdenadora do Mo vi m e nto de Mu l h e res de Medicilândia, julho de 2003). A Década da Mu l h e r, instituída pela ONU em 1975 durante a I Confe rê n cia Mundial da Mu l h e r, ainda hoje é vivenciada na Transamazônica num contexto de resistência e luta pela sobrevivência. Forta l eci d as, as mu l h e res passam a ocupar es p a ços es pecíficos, promovendo enco nt ros, rea l izando reun i ões, discutindo os pro b l e m as da co munidade, da família, de como so b reviver social e politica m e nte diante de tantas adversidades. Depoimentos de lideranças femininas de Medicilândia apontam que houve na região encontros que aglutinavam até seiscentas mulheres, ainda na década de 809.No município de Vitória do Xingu as mul h e res começam a se org a n izar, fazendo co ro com as dos mu n i cí p i os de Medicilândia, Uru a r á, Pl a cas e A l ta m i r a. A década de 90 vai ser marcada pela amp l i a ção das organiza ções de mu l h e res, dinamiza ção de redes e articulações em nível nacional, regional e local. É nesse proces so que emerge fo rm a l m e nte o Mo vi m e nto de Mu l h e res Tr ab a l h a d o r as de Altamira Campo e Cidade (MMTA / CC), e as que fazem parte das Associações e dos Movimentos no eixo da Rodovia Transamazônica e do rio Xingu. A participação desses movimentos em redes nacionais e internacionais lhes permitiu agregar informações e uma agenda de problemas, que pos s i b i l i tou pe rceber a art i c u l a ção ent re economia global e impactos loca i s. Es ta pe rcepção tem levado a reco n fi gurar a dimensão das ações locais mais rece ntes como é o caso da vi o l ê n cia co m etida co ntra as mu l h e res, mate rial ou simbó l i ca, e aos seus dire i tos de org a n iza ção e de expressão. O movi m e nto de mu l h e res cresceu em fu n ção de um aco nteci m e nto dra-

9 Nos anos 80 no Brasil, o movimento feminista amplia e diversifica a inserção das mulheres em espaços sociais – sindicatos, partidos políticos E associações comunitárias. A criação da Secretaria de Mulheres da CUT é expressão dessa nova dinâmica. Essa luta vai determinar o reconhecimento pelo Estado, da especificidade da condição feminina, que se traduz na incorporação de suas reivindicações na Constituição Federal de 1988 e elaboração de políticas públicas voltadas para as mulheres, a exemplo da criação de Conselhos de Direitos da Mulher, de programas de atenção à saúde integral, das primeiras delegacias especializadas, entre outros.

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mático de violência contra crianças, que sensibilizou as sociedades local e nacional. Foi também impulsionado pela Campanha da Fr aternidade de 1991. Na voz de uma das fundadoras des se movi m e nto, é marcante a influência da Igreja nesse processo: [...] nessa época, eu já militava nas Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica. Eu fui co nvidada para part i cipar do Enco nt ro de form a ção sobre a Ca mpanha em Belém, para que vi es se aqui para a região [...] para ser essa pes soa que fos se rep assar es s as informações. E no Enco nt ro em Belém, sobre essa Ca mpanha, es tu d a m os bastante o texto base que fa l ava mu i to dessa qu es tão[...] da Ca mpanha da Fr ate rnidade “Mulher e Homem, imagem de Deus”, era assim, muito forte, falava da situação de discriminação e marginalidade das mulheres, fa l ava da inju s t i ça social, das desigu a l d a d es [...] então isso foi ab rindo a mente para que a ge nte pudes se incent i var as mulheres a se org a n iza rem, para lutar co ntra es s as form as de discriminação e des i gualdade (Antonia Mel o , MMTA/CC, julho de 2003).

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Inicialmente tendo se org a n izado em torno dos Clubes de Mães, um es p a ço onde se pro m o viam cursos, enco nt ros e gru pos de re fl exão, o movimento hoje se estende por uma rede de org a n izações co m núcl eos de bairros nas áreas urbanas e núcl eos de co munidades nas es t r a d as vi ci n a i s, nas áreas rurais, além de as soci a ções, como se obse rva no Qu a d ro 1 contendo o org a n ograma com a es p a cialidade do movi m e nto e de sua es t ru tura pel os mu n i cí p i osde atuação do MDTX. Essa art i c u l a ção foi sendo fe i ta na rel a çã o com outras red es: de sindicatos, de as sociações e de gru pos da Igrej a. Dinâmica articulada ao MDTX, aco mpanhando a agenda do movi m e nto mais geral sobre po l í t i cas de dese nv o l vi m e nto regional de ca r áter macro, mas mantendo um espaço singular de afi rm a ção de identidade e de es peci fi cidade feminina. Esta capacidade de lidar com agendas diversas talvez explique a sua participação em múltiplas militâncias e nos espaços de poder ocupados na condução política do movimento mais geral e, em particular, no movimento de mulheres da Transamazônica e do Xingu. Entreta nto, pod e -se dizer que a emergência do movimento de mulheres es tá diretamente rel a cionada à indignação pela neg a ção aos direitos humanos mínimos e a luta contra a impunidade. A intolerância às diferenças de gênero e ao mesmo te mpo de cl as se, pro v oca no dia-a-dia enfrentamentos violentos, com fa z e ndeiros e pistoleiros, expressando o red uzido valor da vida na fronteira. Tensão, co n flito e arbitraried a d es comet i d ascontra as mu l h e res, as soci a d osà violência física contra crianças e adolesce ntes10 no município de Alta m i r a, se constituíram nas lutas no início do movimento de mulheres na região da Transamazônica. O dia 8 de março de 1991, no momento da co m e m o r a ção do Dia Inte rn a cional da Mulher, torn o u -se um 10 A face mais cruel dessa violência, para as mulheres em Altamira, está na mutilação e nas mortes de meninos e na impunidade dos 15 crimes co m et i d osentre os anos de 1992 e 2000, ainda sem sufi ci e nte inv es t i g a ção, agi l iza ção dos proces sos, ju l g a m e ntos e punição dos culpados Tr atase dos pe rv e r sos cri m es co m et i d os co ntra cri a n ças e adolesce ntes de Alta m i r a, conheci d os nacional e internacionalmente como o caso das crian ças emas c ula das, cujo proces so de ju l g a m e nto ainda tramita na Justiça, com previsão de rea l iza r-se em agos to de 2003. Ent re 1989 e 1993, foram assassinados e castrados seis meninos, três foram mutilados, cinco desapareceram e mais cinco foram vítimas de seqüestro, o que totaliza 19 casos. Foram a julgamento em Belém constituindo um evento amplamente difundido na mídia, e provocando indignação, porém apenas alguns dos acusados foram condenados.


marco na luta das mulheres da Transamazônica e do Xingu, pois pela primeira vez saíram às ru as. Denu nci avam a vi o l ê n ci a, a impunidade, e exigiam ju s t i ça, reunindo diversas catego ri as sociais que se espalhava m ao longo da rod o via Transamazônica. O org a n ograma a seguir (Quadro 1) dá uma idéia dessa es p a ci a l ização do movimento e de suas es t rutu r as org a n iza cionais nos municí p i os de atu a ção do MDTX . Quadro 1 - Estrutura do MMCC e articulação com o MDTX

MDTX FVPP

FETAGRI

MMTA-CC (Altamira) MMCE-CC (Medicilândia) M.M. Lutadoras de Anapu M.M. de Uruará M.M. de Vitória do Virgu M.M. de Senador José Porfírio M.M. de Pacajá M.M. de Placas M.M. de Rurópolis M.M. de Porto de Móz

Associação de Mulheres de Brasil Novo Associação de Mulheres de Anapu

Associação de Bairros de Altamira

Associação de Mulheres do Setor Gonzaga Altamira

Associação de Mulheres de Placas Associação de Mulheres de Placas AMT Brasil Novo ASMUPACAJÁ EMANUELA - Porto de Móz Associação de Mulheres de Rurópolis

Bairro de Boa Esperança Bairro de Itapuru

Associação de Mulheres Indígenas XipaiaAltamira

Bairro de Açaizal Bairro de Vivalândia Associação de Mulheres Assurini Altamira Bairro de Bela Vista

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Bairro de Sudão I Associação de Mulheres Indígenas Jurunas e Cunaia - Altamira Associações de Bairros de sedes municipais de demais municípios da Transamazônica e do Xingu

Fonte: Pesquisa de Campo, agosto de 2003

Associação das mulheres de Itapuassu (Travessão (Vicinal) Assurini)


A reconheci m e nto do movi m e nto de mulheres de Med i cilândia foi em 1999, no bo jo da luta de reversão do quadro de desnutrição das crianças e apoio às gestantes do município, cuja atuação conjunta com a Igreja Cató l i ca por meio da Pastoral da Cri a n ça e com a Secreta ria Mu n i cipal de Saúde, vai pautar a necessidade da legalização da organização feminina, para que pudessem avançar nos trabalhos que lá se dese nv o l viam. A inclusão do te rmo trab a l h a d o r as na co n fi gu r a ção do movimento inse ri u -se no contexto da discussão para demarcar, segundo as lideranças, sua posição de classe e o comprometimento na construção de uma sociedade mais justa e menos desigual. Em Vitória do Xingu, o ano de 1997 é um marco de reco n h ecimento público do movi m e nto de mu l h e res que havia sediado naqu ele mu n i cípio, em 1996, a primeira assembléia do movimento de mulheres da região. Ele emerge assim no contexto urbano, em uma região cujas lutas es tavam fu n d a m e nta l m e nte localiza d as nas disputas pela te rra e por melhores condições técnicas e de financiamento para viabilizar a agricultura familiar. As lideranças femininas com outros movimentos sociais acabam por incorporar novos grupos de mulheres do campo à organização emergente. Se nos primeiros anos da década de 1990, o combate à violência e a luta por justiça foram as principais bandeiras do movi m e nto de mu l h e res na região, a part i ci p a ção na fo rmu l a ção e o co nt role social das políticas públicas tornar-se-iam as mais relevantes nos anos 90.

4- AS MULHERES E A PROBLEMÁTICA DA ÁGUA: O PARADOXO CARÊNCIA & ABUNDÂNCIA

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A luta das mulheres da Transamazônica e do Xingu traz à discussão, de forma polêmica, o paradoxo existente na Amazônia entre a abundância de água e a carência de acesso à água potável de qualidade nos domicí l i os. E é por isto que as mulheres tomaram a dianteira na luta pelo dire i to à águ a. O potencial hídrico do Estado do Pará, que é de 12,3% no contexto da região Norte, que detém 79,7% do potencial hídrico do país não significa melhoria no abastecimento de água potável às populações do Estado. No Estado do Pará, apenas 42% da população é servida de água tratada. É baixa a taxa de cobertura do ab as teci m e nto de água po táv el, como mostram os dados de 199011: região do Ba ixo Amazonas, 60,56%; Xingu, 29,68%; Tocantins, 39,34%; Ilhas, 59,65%; mu n i cí p i osda Região Met ropolitana de Bel é m , 76,44% e Nordeste paraense, 64,46%, ficando a média de 65,05% para o Estado. Observa-se pelos dados, que a região do Xingu é a de menor cobertura em todo o Estado. As políticas públicas de abastecimento de água são prat i ca m e nte inex i s te ntes nessa região, deixando à população o encargo de resolver o problema utilizando-se, seja do rio, de igarapés, poços, cacimbas ou de outras formas de aprovisionamento como enca rgo familiar. Na região da Transamazônica e Xingu essa qu es tão vem se agr avado ao longo d os anos. Dos treze municípios que co mpõem es se eixo, apenas três dispõem de se rvi ços e escritó ri o local da Companhia de Sanea m e nto do Pará (COS A NPA), órgão es tadual compete nte para esses fi n s. São os municípios de Altamira, Senador José Porfírio e Vitória do Xingu. O mu n i cípio de Uruará dispõe de uma unidade de cap tação e trata m e nto de água em fase de imp l a ntação em parceria com o Projeto Alvorada12 significando que os demais municípios não dispõem de ne-

11 IBGE, Censos Demográficos, 1990 e 2000 12 Projeto do Governo Federal em articulação com os Estados e Municípios.


nhum sistema público deste tipo. Os municípios de Brasil Novo e Medicilândia, como não dispõem de ri os com cap a cidade de vi ab i l izar a cap ta ção de água, na ava l i a ção do ge re nte local da COS A NPA em Altamira, o sistema teria que ser implantado a partir da perfuração de poços artesianos ou da captação de igarapés que disponham de volume de água expressivo para viabilizar uma espécie de barragem, que permita fazer a decantação da água, que depois passará por uma estação de tratamento, o que encarece ainda mais o inv es t i m e nto13. As limita ções e a precariedade dos siste m as de ab as teci m e nto de água impõem mais sacri fí ci os às mu l h e res na sua labuta cotidiana. A água é um el e m e nto fundamental no seu dia-a-dia, nas tarefas domésticas e no trabalho, sobretudo relativo à agricultura. A falta de água obriga a lavagem de roupa nas margens de igarapés e rios, muitas vezes bem distantes de suas moradias. Prover as neces s i d a d es domésticas tem impos to histo ri ca m e nte uma so b reca rga às mu l h e res e cri a n ças, respo n s áveis pelo ap rovisionamento da água no cotidiano. A mulher dese mpenha impo rta nte papel na luta pelo aces so à águ a, pois há mu n i cí p i os, como Medicilândia, Pl a cas e Uruará, onde os po u cos mananciais foram poluídos pelo mau uso. A falta d´água constitui um sério problema no suprimento das principais n eces s i d a d es fa m i l i a res. Mas há uma outra problemática rel a cionada à água, que ta m bém mobiliza as mulheres: o abastecimento de água potável em áreas secas. O desmatamento contribui para a perda de recursos hídricos do solo, reduzindo a lâmina de água em certos rios e igarapés. E l as se ntem e reagem aos imp a c tos pro v oca d os pela fa l ta de se rvi ços de distri b u i ção da água po tável nas cidades; pelo agrava m e nto da situ a ção de saúde, so b retudo das cri a n ças, mais suje i tas a co ntaminação de doenças provocadas pela má qualidade da água; a poluição de rios e de igarapés, e, finalmente, a falta de serviços de saneamento. Ao mesmo tempo, a falta de saneamento básico em quase todo o Estado, aliado à situação de pobreza e à desinformação, fruto dos baixos níveis educacionais, dificultam o combate a doenças, a exemplo da malária, leishmaniose e febre amarela, que ainda apresentam índices preocupantes. Uma das fundad o r as do movi m e nto de mulheres de Vi tó ria do Xingu registra e ao mesmo cri t i ca a divisão sexual do t r abalho que ao es t ruturar as rel a ções fa m i l i a res e nos espaços de trabalho, rese rva à mulher a ta re fa familiar de aprovisionamento da água: “[...] agora você pode ver, a mulher, nós, cada uma trabalha, como agente de s aúde, pro fes so r a, por exe mplo, mas, além disso, ela tem outras at i vi d a d es, se mp re o trabalho parece que se co n ce ntra mais na mu l h e r, pensam que carregar á gua é sinônimo de mu l h e r, que ela tem que carreg a r, então quando o homem não passa a fazer aqu ele trabalho, ele po u co se inte ressa. Eu vejo em alguns lugares, que a família tem condições de puxar uma água encanada [...] e não faz. Por que? Porque a mulher carrega [...] (Benedita Azevedo, Movimento de Mulheres de Vitória do Xingu, 2003)”.

13 Esse quadro não é isolado naquela região. Dados da Cosanpa demonstram que apenas três municípios do Pará, dos 143, até o final da década de 1990, dispunham de rede de es goto sanitá rio – Belém, Marabá e Ba rca rena -, equ i valendo a 7,87% da po p u l a ção da cap i tal e 0,56% do interior do Estado. (Revista Novo Pará).

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Outra ent revistada, moradora do bairro da Vila Nova, em Medicilândia, e ex-moradora do Trecho Seco, na Transamazônica, lista os traços em seu co rpo do trabalho co nt í nuo no abastecimento familiar devido a inefi ciência das políticas públicas mu n i cipais rel at i vas aos servi ços de água na cidade e no campo: “[...] então hoje eu me sinto arrebe ntada de carregar água na cabeça, para aguar a casa, para fazer piso, para fazer tudo. E aí o Prefeito, o quê que o Prefeito faz? Na minha mente é assim, no lugar do Trecho Seco, é o seguinte: nós preci s a m os ter água, que nós se bate mu i to pela fa l ta de água no Trecho Seco, e também aqui na rua pri n cipal. Agora vai entrar o verão, aqui vai ge nte chorar por água aqui, e não tem água. E os travessões14? Os travessões têm muita colônia, pri n ci p a l m e nte quem mora nos trav es sões do Trecho Seco, nós preci s ávamos ter uma bomba de água, lá dentro, para turma tomar banho, chegar do seu serviço morto de cansado, e ter que andar uma distância de três, cinco quilômetros para chegar na água [...] (Neuza do Nascimento, julho de 2003)”.

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E fetivamente, a situ a ção mais gr ave no mu n i cípio de Med i cilândia é a do Trecho Seco, uma área que es tá situada ao norte do mu n i cípio, que ab r a n ge vicinais de até 15 km sem água, por não conta rem com ri os e igarapés, nem com qu a l quer se rviço público que assegu re o aces so à água . O agravamento da situ a ção es t i mulou os movi m e ntos sociais – Sindicato de Trabalhadores Rurais, Igreja Cató l i ca, Movimento de Mulheres de Medicilândia, associações comu n i tá rias – a constitu í rem o C o m i tê de Democratização da Água do Trecho Seco. Esse Comitê tem promovido fes tas, bingos, recebido doações, para inv es t i m e nto na instalação de pequenas barr a ge n s, aquisição de tubulação e tu rbina, na perspectiva de distribuição de água para famílias que moram e trabalham nas estradas vi ci n a i s. Esse Comitê tem se co n s t i tuído num efi caz instru m e nto de mobilização da sociedade civil, que já conseguiu atender os moradores de qu at ro estradas vicinais com esse regime de mu t i r ã o . Sem desresponsabilizar o Estado, os movi m e ntos sociais locais em Medicilândia têm pressionado o poder executivo e a Câmara Mu n i cipal no se ntido de as segurar o ap rovisionamento de água potáv el para as co munidades. A proximidade entre as casas e o rio, ou os igarapés, faz parte das estratégias desses grupos no aprovisionamento de água tanto para se rviços domés t i cos qu a nto para seus proces sos de trabalho. Por isso consideram que a mudança no rio pelo seu barramento provocará forte impacto para alguns no acesso à água e sua gestão. Para outros, as condições criadas nos lotes rurais, ou nos bairros das cidades seriam perdidas pelo alagamento do rio, sem falar de doenças causadas pelas mudanças na cultura, nas tradições, nas fo rm as de cura, fí s i cas e es p i ri tu a i s, que co mpõem seu universo mítico e suas fo rm as de rep rodução da vida. Nesses locais as mulheres são consideradas guardiãs de um saber tradicional que ancora o sistema de curas com plantas e raízes, em ri tuais que se fazem com os co n h ecimentos fundados no qu e tem o rio e a floresta, no movi m e nto das marés, na rep rod u ção de es péci es animais e vegetais. Elas falam 14 travessões: são pequenas estradas que cortam a Transamazônica , onde foram assentadas as familias de colonos.


de “ ri scos” por co n s i d e r a remamea ça d os seus siste m as de re ferência, razão de reivi n d i ca rem o dire i to de manter sua cultura e seus costumes. Rece nte m e nte, a qu es tão do sanea m e nto ambiental mereceu ate n ção especial na I Confe rê n cia Regional das Cidades, realizada em Altamira no dia 1º de agos to de 2003 pela Associação dos Mu n icí p i os da Transamazônica (AMUT) e Consórcio Belo Mo nte, org a n i s m os que aglutinam os mu n i cíp i os da região, em atendimento à convocató ria do Ministé rio das Cidades. O Gru po de Tr abalho de Sanea m e nto Ambiental, na re fe rida Confe rê n cia, apo ntou a qu es tão da água como uma das principais pro b l e m át i cas dos municípios da região da Transamazônica, Xingu e Santa ré m - Cu i ab á, que em sua maioria não dispõem de serviços da COS A NPA, e cujo abas teci m e nto de água tem sido assumido preca ri a m e nte pel as pre fe i tu r as mu n i cipais. O imp a c to dos preju íz os ambientais à saúde hu m a n a e a educação ambiental foram amp l a m e nte discutidos, essa última entendida como uma das principais possibilidades de co nt ribuir para a reversão do qu a d ro de desinformação e fa l ta de consci e nt ização da população. Uma das reco m e n d a ções, submetida e aprovada na Plenária Final da Conferência, afirma o posicionamento co nt r á rio a qu a l quer possibilidade de privatização no setor água. Outras pro postas, não menos importa ntes da Confe rência, no que tange à qu estão da água e saneamento foram: i mp l a ntação de um sistema público de abastecimento e trata m e nto de água capaz de atender a demanda da população até 2006; inserção de programas de saneamento ambiental e de educação ambiental; imp l a ntação do processo de mu n i cipalização dos servi ços de saneamento básico e a i mp l e m e ntação de um programa de gestão integrada das bacias com participação e controle em consó rcio de grupos locais.

5. ÁGUA, SAÚDE E DIREITO DAS MULHERES NA CIDADE E NO CAMPO Em que se fundaria ou qual seria a lógica da luta das mulheres pela água? A observação do cotidiano das mulheres rurais e da pe ri fe ria das ci d a d es amazônicas mostra que ele não dife re muito daqu ele de tantas mulheres latino-americanas. Elas são, no grupo familiar ou na comunidade, as que abastecem de á gua a fa m í l i a, cuidam de sua ges tão e, por se rem mais sensíveis as neces s i d a d es de água para tod as as ci rc u n s tâncias da vi d a, são el as ta m bém que so frem mais os imp a c tos pela sua fa l ta, pel as difi c u l d a d es de aces so ou mudanças no modo de ge rir o rec u r so. É o caso de pequ e n os có rregos que at r avessam os l o tes rurais e que precisam de manejo e de co n serva ção, para pod e rem se manter vi v os e com água de qualidade. Entretanto, observa-se com mais freqüência os conflitos em torno da água, sobretudo quando um córrego atravessa terras de fazendeiros ou produtores agrícolas carregando elementos químicos das pastagens e plantações para outras áreas com moradores, ou tensões provocadas pela não preservação das matas ciliares. A rel a ção ent re a saúde e a qualidade da água nos municípios da Transamazônica alcançou vi s i b ilidade na pro po rção que se exp l i ci tava a problemát i ca dos servi ços de saúde e sanea m e nto. Em mead os da década de 1990, a qu estão da saúde da mulher des po nta como importa nte foco de preocupação do movi m e nto de mulheres na região. Boa parte do te mpo das mu l h e res rurais e das moradoras d as peri fe rias das cidades é gas to na busca de água. Os depo i m e ntos de algumas das mu l h e res ent revi s tadas são narr at i vas so b re a ca rê n cia da água em vári os trechos secos da estrada Transamazônica.

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At r av és dos rel atos fica evidente que as mu l h e res têm um papel fundamental na gestão cotidiana da água. Elas são respo n s áveis pela reprodução da vida e por isso sua rel a ção com a água adqu i re ta nta rel evância. Embora o seu trabalho seja desvalorizado na sociedade cap i talista medido por equ a ções de prod u t i vidade, para es s as mulheres, a noção do te rritório e o aces so aos seus rec u r sos, estão na base da luta pela água. A água tem um sign i fi cado como bem simbó l i co, sagrado, síntese de vi d a. E por isso a pri vat ização das águas do rio para fins energét i cos pode rep rese ntar um grande impacto para suas vi d as e a da sociedade dessa região. O debate sobre a água insere-se nesse contexto, de acesso aos serviços, junto com as demandas por saneamento, escolas, postos médicos, manutenção das estradas e abertura de ramais para poder escoar a prod u ção agrí cola. Ou sej a, nas pequ e n as ci d a d es que vão se co n fi gurando ao longo da Transamazôn i ca com a formação de novos municípios, au m e ntou o qu es t i o n a m e nto sobre os espaços de poder local e suas relações com os movimentos sociais. A luta e a garantia da participação do movimento de mulheres nos Conselhos Municipais de Saúde de Altamira de Med i cilândia e de Vitó ria do Xingu são exp res sões da amp l i a ção de bandeiras sociais encampadas pelo movimento de mulheres da região. A preocupação com a saúde da mulher extrapola o e ixo mate rn o - i n fa ntil, co n cebendo-a de fo rma integral. Po rtanto, não se res t ri n ge às es peci a l i d a d esde ginecologia e obstetrícia, reduzindo a mulher a sua capacidade reprodutora, incorporando desse modo, a ate n ção à qu es tão da vi o l ê n ci a, da alimenta ção, do sanea m e nto bás i co, do aces so à água po táv el, da educação e da prevenção e promoção da saúde. As difi c u l d a d es mais relevantes enfre ntadas pelas lideranças do movi m e nto de mu l h e res dizem respe i to a três qu estões principais. A primeira está relacionada à po b re za, à precariedade da situação econômica das famílias. A segunda reside na questão da dificuldade de organização, mais a ce ntuado na zona rural; e por último, estão as dificuldades relacionadas à auto suste ntabilidade do pró p rio movi m e nto de mu l h e res. No que tange a primeira, não há uma ação específica do movimento de mu l h e res no sentido da reversão desse qu a d ro. O que existe é um pro jeto mais global de desenvolvi m e nto regional liderado pelo MTDX, ancorado, sobretudo, no fo rtalecimento da a gricultura familiar e na busca de políticas mais sat i s fatórias para melhorar o padrão eco n ô m i co e social da população local. A Marcha das Margaridas em 2002 incluiu a questão da água como um dos seus focos prioritários, o que evidencia a sensibilização dos trabalhadores rurais com a questão. Dezenas de ônibus com “margaridas” foram part i cipar da manifes ta ção em Brasília, levando as propos tas ret i r a d asno V Congres so Estadual do Movimento de Mulheres, ocorrido em Altamira, nos dias 8 e 9 de agosto de 2003. As band e i r as de luta daqu ele ano foram assim sintet izadas: re fo rma agr á ria e defesa do meio ambiente, pel a pos se da te rra, uso do solo e das águ as, salário mínimo digno, d i re i toà saúde pública com as s i s tê n cia integral à mulher, co ntra a vi o l ê n cia sex i s ta e tod as as fo rm as de discriminação e vi o l ê n cia no ca mpo (CONTAG: 2003).

6. PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES INDÍGENAS NA PRESERVAÇÃO DO RIO XINGU Deixem o rio Xingu em paz, é o gri to de guerra dos Kayapós que ecoa ao longo do rio. O mesmo gri to do povo Gavião re feri n d o -se ao rio Toca ntins no início da década de 80, embora estes não te-


nham co n seguido impedir a construção da usina de Turucuí. A Carta dos Índios Ap i n a gés sobre a barr a gem de Serra Quebrada fi rma posição co ntra o pro jeto com argumentos ju rí d i cos e evocando garantias constitucionais. A carta revela o que o pro jeto esconde quando ap rese ntado à soci ed a d e pela Elet ro b r ás. Por outro lado, as lideranças do movi m e nto de mu l h e res indíge n as de Altamira, co n fo rme depo imentos transcritos abaixo, traçam os argumentos e a posição em relação à barragem. Explicitam significados sobre a água, a noção de impacto e, sobretudo, um balanço sobre as mudanças na biodiversidade. Mas também mostram a perda de controle sobre os recursos que as mudanças trarão. [.. ]. eu e meu marido a gente vive da pesca, então se acaba isso, aí fica ruim de se rviço para nós, porque ninguém tem saber para se emp regar, o se rvi ço é esse, ou na mata, ou no rio pescando. E aí aonde a gente faz os acampamentos, a gente se arr a n ch a, é nas praias, no beiradão dos ri os. Então, acabando isso, como é que a ge nte vai vi v e r, e pesca no pedral, nas co i s as assim? Então, isso tudo indo para o fundo, como é que fi ca para nós trab a l h a rm os, pescarm os ? (Fátima Juruna, povo Juruna). O reconhecimento de interesses em oposição que expressam projetos econômicos e sociais é destacado por uma moradora indígena de Altamira, [...] aqui no verão tem essas praias, essa bel e za que é Alta m i r a, cartão pos ta l , m as se vier a hidrel ét ri ca, vai acabar toda essa bel e za. Nos sos pare ntes moram nas casas ri be i ri n h as, aí onde ex i s te ca ça, pesca, roça. Isso tudo vai para o fundo, vai ser ruim para nós, mas para os ri cos, para o pes soal que qu e rem fo rm a r indústria aqui, vai ser bom para el es, mas para nós vai ser ruim, e a bel e za de Altamira vai acabar. Se a gente tiver uma praia, vão fazer uma praia artificial.[..] (Lucia Xipaia, índia do povo Xipaia). Manifestações dos povos indígenas a propósito do rio Xingu têm sido reiteradas e motivo de novas articulações, para além das fronteiras nacionais. A questão ambiental e as novas dinâmicas socioeconômicas que pressionam a ocupação de suas terras, com atividades de pecuária e soja, recoloca para eles a necessidade de afirmação de identidades e territorialidades. O Mo vi m e nto de Mu l h e res Indíge n as de Altamira luta co ntra o que pode destruir a nossa natureza, aquilo que a gente viveu há muito tempo [...] porque, por exemplo, a hidrelétrica de Tucuruí, somos contra por quê? Porque é a água. N ós sabe m os que a água para o índio é muito importa nte, não apenas para o índio, mas para o branco, para o ribeirinho, porque se vier a hidrelétrica, vai vir rec u r sos, mu i ta co i s a, no co m eço vai ter coisa bo a, mas vai ser difí cil, mas qu a ndo te rminar a hidrel ét ri ca, nós sabe m os que vêm muitas indústri as que vã o poluir o rio, e a gente vai so frer com as co n seqü ê n ci as, po rque nós moramos

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aqui na cidade e va m os depender do rio. Não tem hidrel ét ri ca e a ge nte já está com mu i to problema aqui no rio, com a poluição” (Ad riana Xipaia, índia do povo Xipaia). Os povos indígenas têm uma experiência recente, vivida por eles de forma dolorosa em quase todas as regiões do país. Embora tenham dire i tos amparados na Constitu i ção, que inte rd i ta qu a i squer usos das suas terras sem seu consentimento, eles têm sido continuamente desconsiderados na decisão de projetos hidrel ét ri cos. Ra zão da manifes ta ção dos ca ci qu es e das lideranças indíge n as do povo Ap i n a gé das a l d e i as Botica, Bo n i to, Mari a zinha, São José, Pat izal, Cocalinho e Bu ruti Comp rido, que co nv ocaram uma assembléia em Tocantinóplis para discutir a retomada da construção de vinte hidrelétricas previstas para o rio Tocantins. Ca rtas co ntendo os pri n cí p i os que fu n d a m e ntam suas pro pos tas po l í t i cas foram tiradas em foros importantes.15

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15 Em anexo enco nt r a m -se duas ca rtas escri tas por org a n iza ções, em assembléias reu n i d as em Impe r at riz, no Es tado do Maranhão e em Tocantinópolis, no Estado do Tocantins, onde afirmam um conjunto de direitos ao território e à reprodução de suas culturas, enquanto trabalhadores e trabalhadoras rurais e urbanos, povos indígenas, extrativistas, ribeirinhos dos Estados do Pará, Maranhão e Tocantins, e reiterando a Campanha Águas sem Barragens nas Bacias Amazônicas.


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ÁGUA E LIVRE COMÉRCIO

O barr a m e nto do rio Xingu pela hidrelétrica de Belo Mo nte, caso es ta venha a ser construída, rep rese nta uma forma de pri vat izar o rio, pelo menos nos trechos a ca rgo do co n sórcio de emp resas p ri va d as conforme pensado pelo atual governo. Será a primeira vez, na Amazônia, que o Estado repassa um grande emp ree n d i m e nto do setor de energia hidráu l i ca para a inici at i va pri vada. Isso não oco rreu com a hidrelétri ca de Tucuruí, até o prese nte sob administração de emp resa estatal do sistema Eletrobrás, a Eletronorte. Mu i to menos com as usinas de Balbina ou Samu el que se mantém na Eletrobrás. Mas a de Belo Mo nte será construída at r av és de um pro tocolo que ince nt i va a relação e nt re o sistema público e o privado (PPP), ju s t i fi cando assim a viab i l ização de seu financi a m e nto. Em lugar de venda o go v e rno pre fe re falar de parce ria. Logí s t i ca em sintonia com o movi m e nto atual de m e rcado, que pressiona a liberalização dos serviços em países em dese nv o l vi m e nto, obse rvando-se na es fera mundial o cresci m e nto do inte resse privado nos serviços bás i cos tradici o n a l m e nte mant id os em mãos do Estado. Ainda que se trate de pro jetos de ge r a ção de energia, o esse n cial é o rio, e considerando os deb ates e a co a l izão de inte resses pri va d os em to rno dos servi ços advindo dos rec u r sos hídri cos, a pri vat iza ção de Belo Mo nte pode sign i fi car um pri m e i ro passo na direção da pri vat ização de outros recursos e se rvi ços rel a ci o n a d os ao rio. Os grupos locais que co ntes tam a barr a gem se apóiam em argu m e ntos so b re a pri vat ização do pro jeto, que justifica, a seus olhos, as mobiliza ções e negoci a ções para impedir sua co n s t rução. A barragem do rio significa alterar o equilíbrio ambiental e, por isso, a luta das mulheres de Altamira rep rese nta um enfre nta m e nto singular na histó ria dos gr a n d es pro jetos na Amazônia, e ce rtamente na Améri ca Lat i n a, po rque traz para o deb ate uma pro b l e m át i caconstruída no ente n d i m e nto e na aliança das po p u l a ções urb a n as, de comunidades rurais de pequ e n os e méd i os prod u tores familiares, de organizações ambientalistas e de organizações indígenas. Na grande maioria, as organiza ções manifestam-se at r av és do Movi m e nto pelo Dese nv o l vim e nto da Transamazônica e do Xingu/MDTX, que é a organização guard a - chuva de representação política no conflito, ao qual se articula o movimento de mu l h e res. Isso porque a matriz energética na Amazônia, nas últimas décadas, tem se pautado fu n d a m e ntalmente na exp l o r a ção dos recursos hídri cos de suas principais bacias hidrogr á fi cas, es t i mulada por políticas govern a m e ntais que encontram, na barragem dos rios, uma das pri n cipais saídas para enfre ntar a crise energética

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de regiões mais ricas e industrializadas no país. A geração de energia para fins de exportação é a razão de ser da linha de transmissão prevista para longas distâncias, por enquanto interligando Belo Monte ao co mp l exo sistema nacional, não excluindo po rém a exportação de energia para o mercado externo. No enta nto, no deb ate local, tem ainda po u co peso o acomp a n h a m e nto das negociações que vem sendo leva d as pelo GATS e pela OMC fa ce à pri vat iza ção do setor se rvi ços, onde se pretende incluir a água, no caso em que esta proposta consiga entrar na OMC como pretende o lobby das agências multilaterais e de co rporações do setor águ a. Na atual co nju ntu r a, a co n s t ru ção de uma hidrel ét ri ca rep rese nta uma forma de apropriação privada de trechos do rio para fins de mercado. E, paralelamente à venda de energia outros serviços podem ser trazidos, gerando uma série de empreendimentos para o mercado g l o b a l izado. Essa qu es tão es tá pos ta pelo rumo das negociações e aco rd os inte rn a cionais com base no conceito da água como bem econômico. O governo brasileiro mantém-se alinhado a esse debate, com uma compreensão sobre a água como bem que deve ser regulado eco n o m i ca m e nte, tendo em vi s ta a ca rê n cia de ce rtas áreas no mundo e a possibilidade de gerar cresci m e nto, embora no co rpo ju rí d i co permaneça a noção de bem público e inalienável.

1. NOVO MARCO REGULATÓRIO

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N os últimos anos foi criada no Brasil uma nova estrutura institu cional para lidar com a qu es tão da á gu a, embora desde o final dos anos 70, tenha co m eçado a se instituir uma agenda de ge re n ci a m e nto d os recursos hídri cos no país. Aco mpanha-se assim, o movi m e nto que ocorre em outros países em d esenvolvi m e nto, igu a l m e nte pres s i o n a d os pel as es t r atégi as do mercado at r av és das agê n ci as multilate r a i s. O presidente Fe rnando He n rique Cardoso em pro nu n ci a m e nto de abe rtura do Seminário “Água, desafio para o próximo mil ê ni o” realizado em Brasília em 2000, enfat izou a importância da cri a ção da Agê n cia Nacional da Água/ANA e do Si s tema Nacional de Gerenci a m e nto dos Recursos H í d ri cos / SNRH (MMA:2001), integr a d os de certa fo rma ao Programa Ava n ça Brasil. Considerou que esses novos arr a njos institu cionais rep rese ntaram uma revolução na es t ru tura do Estado brasileiro. Novas instituições no fo rm ato de Agências Nacionais com ca r áter de controladoras, reguladoras, foram cri a d as enqu a nto parte de uma re fo rma no ap a relho es tatal, com uma part i ci p a ção cresce nte de a ge ntes priva d os, uma caracterí s t i ca, segundo ele, do mundo co nte mpo r â n eo. O Ministro do Me i o A m b i e nte, José Sarn ey Filho, na época responsáv el pel os dois anteprojetos preparados no âmbito do M i n i s té rio do Meio Ambiente / M MA, declarou, ent re as premissas básicas, que a água dos rios e rese rvató rios, seja para consumo ou diminu i ção de efl u e ntes, deve ser considerada como um bem eco n ô m i co, ainda que exp l i ci tasse as co n d i ções de desce nt r a l ização do ge re n ci a m e nto e a participação dos inte ressados no proces so decisó rio. Ta m bém co l ocou no disc u r so, lado a lado, el e m e ntos da regulação econômica e política como dimensões ce ntrais do ente n d i m e nto da água como rec u r so, em p ri m e i roplano, econômico. O papel regulador do Estado e o efe i to sobre o funcionamento dessas institu i ções é ce ntral, bem como o espírito dos instrumentos legais que deram ori gem à ANA e ao SNRH. Ent reta nto, convive com a tese da gestão global da água, que está posta no debate inte rnacional e nas agê n ci as mu l t i l ate-


rais, na qual se inscreve ainda, como co n ce i tos comp l e m e nta res, o de bacia hidrográfica e o de ges tã o co mp a rtilhada16.

2. ÁGUA E LIVRE COMÉRCIO: DIRETRIZES DA OMC E DE OUTRAS AGÊNCIAS MULTILATERAIS O ano de 2003 foi escolhido pelas Nações Unidas como o Ano Internacional da Água Doce. E certam e nte não se trata de um fato isolado. Nesse mesmo ano, no mês de março, foi rea l izado o III Fórum Mundial das Águas, em Ky o to, no Japão, onde a pri n cipal pau ta política co n ce nt ro u -se na gestão dos recursos hídricos. O discurso sobre a carência de água no mundo, numa coloração alarmista, foi a justifi cat i va anu n ciada para acelerar a defi n i ção das metas sobre o aces so à água po táv el no planeta, com a redução à metade, até 2015, do total de pessoas hoje privadas de água potável e quase o dobro de serviços de saneamento. E m bora o Comitê de Economia, Cu l tura e Dire i tos Sociais da ONU tenha declarado a água co m o um dire i to humano e um bem social e cultural, ainda no final de 2002, es ta org a n iza ção inte rnacional não rea giu às prete n sões da Organiza ção Mundial de Comércio em incluir na pau ta da 5a Reunião Ministe rial de Cancun, a água em um de seus pri n cipais trata d os, o Aco rdo Geral para o Comércio de Serviços (GATS). A União Européia também pressiona para que o OMC incorpore os serviços de água. Evidentemente, pois as maiores co rpo r a ções mundiais nes se setor são euro pé i as como a Vivendi e a Suez (Fr a n ça ) , RWE e Aquamundo (Alemanha) e Thales Water e Biwater (Grã-Bretanha). Esses países estão tentando instituir a noção global de água como um bem comum, o que certamente trará conseqüências à abertura de espaços para contestar projetos e políticas locais. É impo rtante examinar as po l í t i cas que es tão sendo fo rmuladas pel as agê n ci as inte rn a cionais at r avés dos inúmeros encontros de Cúpula, que contam com a influência de Estados, sobretudo aqueles que têm grandes interesses em garantir os mercados futuros desse recurso com empresas de porte, a exemplo da Fr a n ça, do Ca n a d á, dos Es ta d os Un i d os. Ta m bém no âmbito de movimentos soci a i s, de organiza ções não govern a m e ntais e outros segmentos sociais es tão sendo fo rmu l a d os co n ceitos e demandas de políticas. São interesses e discursos que começam a se explicitar e que expressam interpretações diversas, que nos permitem supor conflitos futuros relacionadas aos recursos hídricos, a começar pela noção de propriedade da água e dos recursos comuns. Por outro lado, os inte res ses de Esta d os, agê n ci as multilaterais e empres as desenham a dinâmica social e eco n ô m i ca a nível mundial. O que es tá em qu es tão, no fundo, é a pro p ri edade dos se rviços de á gu a, mas impulsionada por uma lógi ca econômica que vê a água como mercadoria, um prod u to de regu l a ção pelo mercado. Por isso parece bem ambígua a fr ase freqü e nte m e nte repetida em fóruns oficiais, estatais e empresariais, de que não se trata da propriedade da água, mas dos serviços de tratamento e distribuição de água, e de saneamento. Países como o Chile tem estatutos de direito à propriedade

16 A Lei 9.433/97, marco institu cional res ponsáv el por direcionar o planej a m e nto e as ações de po l í t i cas (CNRH), ao lado de outras regu l a m e ntações sobre recursos hídricos e inclusive de Leis Estaduais, faz parte dos princípios de base da reforma administrativa do Estado, empreendida pelo governo brasileiro desde o início de 1995.

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que assegura a propriedade privada de mananciais aquáticos. Por isso está em curso, ao mesmo tempo, uma revisão do direito de acesso à água. Em 1992 at r av és de um deb ate impulsionado, so b retudo, pel as gr a n d es po tê n ci as econômicas e agências multilaterais, avançou a idéia da água como bem econômico e objeto de regulação pelo mercado, enqu a nto age nte eco n ô m i co, demonstrando o cresce nte inte res se pelo rec u r so direcionado para a exp l o r a ção inte n s i va no modelo emp res a rial (PET RELLA). Ev e ntos de repe rcussão inte rn a cional reu n i ndo pesquisadores do mundo inteiro têm atraído a atenção crescente de segmentos interessados na organ iza ção empres a rial e institucionaliza ção dos se rvi ços rel at i v os à águ a. Por es se ângulo, o setor água é bem dinâmico. Ao mesmo te mpo, os inte res ses de Es ta d os, agê n ci as multilaterais e emp res as, definem as ações políticas e econômicas que estão sendo encaminhadas a nível mundial. O que está em questão, no fundo, é a disponibilidade da água como um elemento da esfera do público, com caráter de inalienabilidade, para fins de acesso e domínio privado. A água como bem para oferta futura no mercado de serviços, impulsionada pela perspectiva de uma economia neoliberal que se expande para espaços da vida, do mundo da vida, como sustenta Habermas, até então não negociável no rol de bens de mercado. O pres i d e nte Ca rdoso liderou negoci a ções com o GATS assumindo pos i ções mais agres s i vas que as de qu a l quer membro da OMC, segundo Ellen Gould17, qu a nto à qu es tão da libe r a l iza ção de se rvi ços, Na conjuntura, o papel do Brasil no cenário internacional era importante para fazer avançar as estratégias quanto à libe r a ção de ise n ções, pois segundo mostra a au to r a, “qu a i squer co n ces sões fe i tas ao Brasil serão au to m at i ca m e nte estendidas, a partir da cl áusula da nação mais fav o reci d a, a tod os os membros da OMC. Assim, as transnacionais norte-americanas e eu ro pé i as, que dominam co mp l etamente o co m é rcio inte rnacional de se rvi ços, vão tirar va nta gens da pos i ção de barganha brasileira assumida no GATS pelo Brasil”. Enqu a nto os membros da União Eu ro péia registraram uma “limita ção em seus co mp ro m i s sos com o GATS, para es peci fi car que não se ap l i cam aos se rvi ços públicos a um nível nacional ou local, que pod e m es tar sujeitos a monopó l i os públicos ou a dire i tos excl u s i v osofe reci d os a ope r a d o res privados”, o Brasil, co n fo rme Gould, pede para eliminar esse entrave. Ora, co mp ro m i s sos plenos do GATS rel at i v os ao tratamento nacional requ e rem que os mes m os subs í d i os do go v e rno conced i d os aos forn eced o res locais sej a m disponibiliza d os para os fo rn ecedores estrange i ros. So b re as demandas econômicas o Brasil pede aos países a el i m i n a çãode tod os os es tu d os prévi os em qu a l quer setor de se rvi ços co n s i gn a d os. Implica ções: se m essa limitação em seus compromissos com o GATS, os governos que tentam influenciar o desenvolvimento de um serviço por razões sócio-econômicas estariam violando o acordo ao limitar o número de permissão no fornecimento do serviço. Quanto aos Serviços Específicos, em várias áreas, o Brasil está solici tando abe rtura to tal ao inv es t i m e nto exte rno a ser limitado pel os co mp ro m i s sos do GATS. Isto significa que os governos não poderiam - nacional, regional ou localmente - manter qualquer monopólio público de se rvi ços ou disponibilizar qualquer benefício aos forneced o res locais sem es tendê-lo aos co mpetidores estrange i ros. Onde quer que o setor público ofereça um destes se rviços, o Brasil tende a pe rm itir a co mpet i ção do mercado nacional com as empres as pri va d as estrange i r as. Com es ses prece i tos, confo rme o trabalho citado, o Brasil não te ria limites em seus co mpromissos com o GATS, e des ta fo rm a, ele não pod e ria fazer distinções para enco r ajar um tipo de inv es t i m e nto qu e

17 No artigo intitulado A Posição do Brasil nas Negociações do GATS enfatiza o papel do Governo. Fundação Böel, Berlin, 2003.


de fato beneficie as economias locais, como as subsidiárias tendem a fazer quando comparadas a meras filiais de uma empresa estrangeira. Porém as ações encaminhadas pelo Brasil em Cancun mostram uma certa alteração nas suas posições quanto à questão dos serviços. Faleiros18 informa que houve a rejeição pelo Brasil do co nt role inte rn a cional da água no III Fórum Mundial da Água, em Kyoto, ju nto co m outros países em desenvolvimento. O Ministério das Relações Exteriores defendeu posição contrária ao texto final da co nv e n ção, que vi s ava criar meca n i s m osinte rn a cionais de co nt role da águ a. Igualmente, m i n i s t ros de diversos países da Améri ca Latina consideraram que es se co nt role inte rn a cional so b re a água colocava um problema de soberania sobre os recursos naturais. Contrariando assim as nações dese nv o l vi d as, que suste ntam os inte res ses de gr a n d es co rpo r a ções do setor e defenderam em Ky o to a cri ação de uma espécie de conselho mundial, que cobraria dos países pobres investimentos em suprimento de água e saneamento, além de boas práticas na gestão dos recursos hídricos. Farto mate rial prod uzido pela Org a n iza ção Mundial de Comércio e pelo Ba n co Mundial mostra o grande interesse de organismos multilaterais em relação à água enquanto conceito econômico. Primeiro, pelo inte res se em regular a água como bem eco n ô m i co e de ges tão global; segundo, pelo apoio a emp resas pri vadas para que es tas possam direcionar seu cap i tal para os se rviços de águ a, visando com isso envolver-se em concessões de abastecimento. As agências querem avançar em direção à liberalização dos serviços de água. Cada vez mais, as regras em negociação no GATS e na OMC fomentam polít i cas de inv es t i m e ntos diretos para venda aos países em dese nvolvimento de um amplo leque de serviços tradici o n a l m e nte sob res po n s abilidade do setor público. Além disso, os se rviços públicos bás i cos estão ficando sujeitos às normas do GATS, que tem procurado disciplinar e restringir as normas nacionais para que o capital estrangeiro possa entrar livremente no mercado, eliminando as restrições nacionais ou regulamentações que protegem os serviços das pretensões das empresas estrangeiras e transnacionais. Por isto a água es tá rel a cionada aos aco rd os de co m é rcio, onde es tá sendo pensada como uma m e rca d o ria para regulação pelo mercado. Isso sign i fi ca, que no fu tu ro o Es tado pode não ter mais o co ntrole sobre a água de seu território19. Há inclusive inte ntos cl a ros do Ba n co Mundial de ab rir novos campos para a pri vat iza ção da águ a. Nos últimos meses, por exemplo, o banco tomou decisão de ampliar suas ações em direção ao financiamento de gr a n d es obras de infr a - es t rutura a partir de 2003. Pode ser coincidência, mas isto aco ntece justamente, no momento em que as co mp a n h i as es tatais es tão se retirando do seto r. Por outro lado, o fi n a nciamento de grandes projetos, inclusive os de usinas hidrelétricas que, desde os anos 80 foram desaconsel h a d os devido aos imp a c tos sociais e ambientais, passam a fazer parte nova m e nte das carte i r as de financiamento do referido banco. Ent re os argu m e ntos ap rese nta d os pel as Agê n ci as Mu l t i l aterais e o Ba n co Mundial em rel a ção à á gu a, es tá o reco n h ecimento da ex i s tê n cia de uma cri se mundial de água20. A tese que ju s t i fi ca a defl agr ação de uma crise de água tem outros co ro l á ri os tais como, a água é escassa e deve por isso ter um

18 Ver Valor Econômico de 21/03/2003, Difusão pela REDEPLAN. 19 Assim, os investimentos pri va d os de se rvi ços de água e de sanea m e nto não se fazem pri o ri ta ri a m e nte onde el es podem ser mais neces s á rios, por exemplo, nas áreas rurais ou cidades pequenas, mas nas grandes cidades em função da maior densidade de potenciais consumidores. 20 Quando se fala de crise de água, em geral não é explicitado que 70%, da água usada vai para os sistemas agrícolas de porte industrial, e não para os sistemas do setor da pequena produção de alimentos.

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preço justo para não ser des pe rd i çada e que os países do Sul são demasiado po b res e as inv e r sões no se rvi ço de água são altas e, por isso, as emp res as locais não têm cap a cidade de inv es t i m e nto. Assim, os investimentos do Banco devem ter menos riscos. Por outro lado, a União Européia está apoiando suas empresas de água e aquelas que desejem entrar no mercado, com subs í d i ospara pro jetos de pri vat iza ção e de as ses so ria às emp res as para dese nvolver projetos nos paises em desenvolvimento, e apoiando a solicitação das Companhias de água para liberação do setor em 72 países. Os USA estão também atentos a lograr o acesso ao mercado da água e ganhar espaço de negociação nessa área. A disputa entre esses dois blocos está cada dia mais evidente. Mas o argumento principal para justifi car a pri vat ização dos se rviços de água é de que es ta é a única forma de dispo n i b i l iza-la para tod os. Realmente há carência de água em muitos países, mas também há uma fabricação da crise legitimando o interesse por soluções mais técnicas para o mercado de expertos. Em Cancun, por ocasião da 5ª Reunião Ministe rial da OMC, Vandana Sh i va argu m e ntara so b re as reais preoc u p a ções dos movimentos sociais com a possibilidade da retirada do tema da agri c u l tura da pau ta da OMC. A agri c u l tura orgânica co n serva o solo, segundo resultados de pesqu i s as econômicas. Ela justificava que apoiando a agricultura orgânica, se poderia produzir cinco vezes mais alimentos sem au m e ntar o gas to de águ a, sem pe rder os ri os e a cultura que vai com el es, ou sem saqu ear o que “é nos so para ir mais além vender o que temos”. É bom não esquecer que nos bastidores se trava uma disputa de mercado ent re USA e UE e, por isso, o pro tocolo da biodiversidade que fa ci l i ta a manu tenção de sistem as agr á ri os co mp l exos não inte ressa aos países dese nv o l vi d os. Pois as gr a n d es co rpo r a ções lançam campanhas com metas para serem atingidas e direcionadas para o mundo inteiro. Confrontam-se assim discursos ambientais contraditórios que não conseguem esconder os interesses de mercado. Este debate fi cou mais cl a ro com as manifes tações das org a n izações sociais de dife re ntes países e co nt i n e ntes prese ntes em Cancun21, e na interação das red es de movi m e ntos sociais e de Ongs, onde foram defi n i d os três temas considerados prioritários enquanto estratégias dos movimentos sociais: água, direitos humanos e agricultura. As emp res as norte - a m e ri ca n as exe rcem uma dominação cresce nte sobre as expo rta ções mundiais de serviços. Ao controlar 18,8 % do mercado mundial de serviços, os Estados Unidos exportam mais de d u as vezes e meia que a Grã-Breta n h a, seu co n co rre nte mais próximo. Já a Améri ca Latina res ponde po r 4% das expo rtações mundiais de se rvi ços e a Áfri ca ape n as por 2,2%. Ape n as cinco nações dese nv o l vid as detêm 53% das expo rta ções mundiais de segu ros; 73% de expo rtações culturais e recreat i vas e 74% de exportações de serviços financeiros e obtêm 87% de todas as receitas oriundas de taxas de royalties e licenças, sendo que as emp res as norte-americanas recebem mais da metade do to tal (Apud. GO ULD: 2003). As es tat í s t i cas mostram que o Brasil, segundo a au to r a, importa mu i to mais servi ços do qu e exporta - 11,9 bilhões de dólares em impo rta ções versus 6,8 bilhões de dólares em expo rtações -, uma situ a ção que só pode piorar com as mod a l i d a d es de libe r a l iza ção exte n s i va de se rviços que o pró p ri o Brasil estaria buscando nas negociações com o GATS22. 21 Fórum sobre Água realizado pela Fundação Böll pós-Cancun, 2003. 22 Para co n s u l ta: hppt:// www. reb ri p . o rg.br; www. p l a n etapo rto a l egre . n et; www.world-ps i . o rg; www. ps i ru . o rg ; www. te rce i ro mu n d o . o rg. b rç http://www.irn.org.


Um sinal do olhar ate nto das grandes corporações para os mananciais de água, onde quer que eles estejam, está nas negociações rece ntes sobre o aqüífero Guarani. Representa ntes do Banco Mundial ju nta m e nte com os governos do Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai reunidos em maio de 2003 em Mo ntevidéu, decidiram levar em fre nte um projeto de pesquisa so b re um manancial de águ as subterr â n eas, que co n s t i tui a maior reserva mundial de água doce e que at r av essa os territó rios desses países. Com o nome de Pro jeto de Pro teção Ambiental e Desenvolvi m e nto Su s te ntáv el, iniciaram as negociações para inv es t i m e ntos na ordem de 27 milhões de dólares em que entrariam ainda os governos da Alemanha e da Ho l a n d a, a Agência Internacional de Energia Atô m i ca e a Org a n ização dos Estados Americanos. Este aco rdo, segundo informa Are n cibia 23, significa que as informações estratégicas sobre a mais importante reserva subterrânea de água doce da região,”considerada también la más grande del mundo, será manejada por qu i e n es financien el proyecto. Ligados a grandes grupos eco n ó m i cos y corporaci o n es transnacionales, dominarán el conoci m i e nto que ha sido gestado durante años por investigaciones desarro l l a d as en las universidades latinoamericanas”.

3 - O DOMÍNIO EMPRESARIAL DA ÁGUA NA AMÉRICA LATINA E NO BRASIL A água no mundo é dominada por duas multinacionais francesas, a Suez e a Vivendi, que controlam dois terços dos serviços de água privatizados no mundo. As outras grandes companhias são a Saur, Thames, Anglian e IWL. Na América Latina a principal empresa que atua é a Suez, que opera na Argentina e no Brasil, e em qu ase todos os países que já pri vat izaram siste m as de águ a. A primeira pri vat iza ção no Brasil foi ta mbém da Suez, no município de Limeira24, em São Paulo, e pode ser constatado pela sua atuação em algumas cidades, inclusive na cidade de Manaus, na Amazônia brasileira. O serviço que realiza inclui a captação, tratamento e fornecimento de água potável. Certamente não se pode antecipar como irá evoluir a situação, mas ela não é confortável para o Estado, a sociedade civil e nem para a empresa. O qu a d ro a seguir mostra alguns dados da presença das corpo r a ções Suez e Vi v e n d i -Violia no m e rcado de servi ços de água em ci d a d es e mu n i cí p i os do Brasil. A maior co n ce nt r a ção enco nt r a se no sudes te, mas se estende por todas as regiões, a presença de emp resas privatizadas dos seto res água e sanea m e nto. 45

23 Fabiana Arencibia - fernandoramirez@igwc.org, difundido pela Red Eco Alternativo. 24 As co rpo r a ções Vivendi e Suez são as maiores do mundo, es tando a primeira ent re as 51 pri m e i r as emp res as e a Suez no 99º lugar do m esmo ranking das 500 maiores fo rtu n as do mu n d o . ( Fo rtu n e’s Global 500 ci tado Markus Krajew s ki – GATS? O que es tá em jogo? BROT – www.brot- fu e r-die-w el t.d e – distribuído no Fórum Boell de Cancun, set de 2003). Juntas, co nt rolam e cap tam 40% das co tas existe ntes do m e rcado de águ a. A alemã RWE segue as duas pri m e i r as, fi cando em 3o lugar. Ad qu i riu a gi g a nte bri tâ n i ca da águ a, a Water Wo rks. Ou t r as gr a n d es co rporações da Água são a Bo u y gu es / S au r, a U.S. Watder e a Sev e rn. A base de cl i e ntes des s as emp res as regula mercado em torno de 50 milhões de co n s u m i d o res de seus servi ços.


Quadro 2 - Privatização de serviços de água no Brasil Estado do Brasil

Município Cidade

Nomeação da Empresa no Brasil

Empresa privada estrangeira

Financiamento

Ano da concessão

São Paulo

Limeira

Águas de Limeira

Suez

-

2000

Amazonas

Manaus

Águas do Amazonas

Suez

BNDES

2001

Mato Grosso do Sul

Campo Grande

Águas de Guariroba

Suez

-

-

Paraná

Curitiba

Sanepar25

Vivendi

Banco WBIFC

2001

Mato Grosso

Centro Oeste do Mato Grosso Chapada dos Parecis

Tangará da Serra

Águas de Portugal

-

2001

Rio de Janeiro

Região dos Lagos Cabo Frio, São Pedro d´Aldeia, Iguaba Grande, Búzios e Arraial do Cabo (cinco municípios)

Prolagos26

Suez

Banco EIB

2001

Fonte: Dados obtidos junto à ABCOM, à ASSEMAE, em documentos diversos e sites das empresas.

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25 A SANEPAR é uma sociedade de economia mista co nt rolada pelo Go v e rno do Es tado do Paraná, tendo po rém como sócio es t r atégi co, como se refere em documentos oficiais, a Dominó Holding S/A. esta é formada pelas empresas: Andrade Gutierrez Concessões S/A (27,50%), a francesa Vivendi Environmental S/A, Opo rtunity Daleth S/A e Companhia Paranaense de Energia/COPEL. A Dominó Holding S/A adqu i riu em junho de 1999, 39,7% da SANEPAR. Embora a cidade de Curitiba concentra.mais de 30% do consumo de serviços de água e esgoto da SANEPA R, e por isso o co nt r ato de co n cessão co n ce nt re -se so b re a cap i tal, a emp resa SANEPAR reco b re 342 dos 499 mu n i cí p i os do Es tado do Paraná e já era, antes da cessão de direitos à Domino Holding, uma empresa com boas referências pela qualidade dos serviços públicos prestados. 26 Com um prazo de co n cessão de 25 anos, a Conces s i o n á ria de se rvi ços de água e es go to, Pro l a gos, é fo rmada pela Águ as de Portugal/AdP (12,5%); Empresa Brasileira de Águas Livres/EBAL (80,0%) e Empresa Portuguesa de Águas Livres/EPAL (7,5%).


Em Manaus os se rvi ços pres ta d os, de tratamento, distri b u i ção de água e es gotamento es tão sendo co ntes ta d os pela po p u l a ção. A Prefeitura Mu n i cipal havia transferido ao Es tado a ges tão des ses se rvi ços e é ju sta m e nte o Estado que inicia o proces so de pri vat ização no seto r, vendendo em 2001 a empresa pública, na fo rma de concessão, à co rpo r a ção francesa Suez, legalmente instituída como Águas do Amazo n as. A ação impetrada contra a empresa objetivava sustar o aumento de 31,50% na tarifa de água, o terceiro aumento consecutivo, sem a mesma ter nesse período ampliado sua rede de atendimento. Julgada p roced e nte, as co b r a n ças de ta ri fas majo r a d as foram suspensas por um pe rí odo de três meses. Ou t r a a ção ju d i cial pleiteava anu l a ção do co nt r ato, ju s t i fi cando descumprimento de qu ase tod as as cl áu s u l as. Aqui se pe rcebe um dos imp a c tos da pri vatiza ção dos se rvi ços de águ a, que é o enfr a queci m e nto das instâncias de poder local que tradicionalmente se ocupam do suprimento da água. Por outro lado, a popul a ção não sabe bem a quem reclamar o não cumpri m e nto do co nt r ato pela emp resa, uma vez que a Agência Estadual de Regulação criada pelo estado mantém-se inoperante. A conclusão a que chegam os usuários de Manaus é a mesma referida em outros casos de empresas p ú b l i cas pri vat iza d as em diversos países do mundo de que é qu estionáv el a afi rm a ção co rre nte so b re a e fi ci ê n cia dos se rvi ços pri va d os co mp a r at i vamente aos ofe rta d os pelo sistema público. As emp res as priva d as não são neces s a ri a m e nte mais efi ci e ntes que as públicas. Qu a nto ao financiamento, ele acaba vindo do próprio sistema público, desafiando a argumentação que o Banco Mundial formula ao enfatizar a insufi ci ê n cia dos recursos dos Es ta d os para bancar o ate n d i m e nto nos servi ços de água com melhor qualidade e maior cobertura.

4 - BANCO MUNDIAL VOLTA A FINANCIAR GRANDES REPRESAS Desde o final dos anos 80 e durante a década de 90, momento do au ge do disc u r so ambientalista, o Banco Mundial deixou de financiar grandes projetos de represas, considerando a pressão de movim e ntos sociais e ambienta l i s tas. Belo Mo nte, no rio Xingu, foi uma das rep res as susta d as no Brasil por fa l ta de financi a m e nto do Ba n co Mundial. Mas houve mudanças, e agora essa institu i ção es tá em sintonia com o Rel atório da Comissão Mundial de Diqu es e com a Cúpula de Jo h a n n esb u rg cuja recom e n d a ção foi ince nt i var a pressão do setor pri vado para liberar ao mercado os se rvi ços. Essa te n d ê ncia pri o riza grandes projetos de infraestrutura. No Brasil, os processos em curso co n d uzem a liberar o co m é rcio de energia hidráu l i ca dent ro dos objetivos do GATS. Além do que co nt i nua so b re a mesa o inte resse das grandes emp resas pelas barr a gens segundo mostra a pesquisa de Bru g ger (2003). O I n fo rme Ca m d essus deixa cl a ro suas inte n ções de inv es t i m e ntoe de mu d a n ças no marco regulató rio d os países em desenvolvimento. Mo ntado so b re dois pilares, os projetos de grande escala e a part i ci p a ção do setor pri vado, o Rel ató rio Camdessus to rnou-se uma peça fu n d a m e ntal, de pri n cípios, para ori e ntar os enca m i n h a m e ntos ju nto aos Esta d os. Não é por acaso, portanto, que a te n d ê n cia do Ba n co Mundial é apoiar e fi n a n ciar grandes obras, e já vem adotando uma política de retomar o financiamento e as negoci a ções com o u t r as agê n ci asmu l t i l aterais para grandes pro jetos de infr a estru tura hidráu l i ca. Ent reta nto, é o seto r p ú b l i co que co nt i nua a ser a pri n cipal fo nte de financi a m e nto do setor hídrico. Ora, é esse mesmo financiamento ava l izado pel os Estados que vai fa ci l i tar a part i ci p a ção do setor pri vado e não necessari a m e nte novos recursos trazi d os pel as emp resas. Ao mesmo te mpo, bem sabe m os que o financia-

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mento de gr a n d es obras au m e nta ainda mais a dívida dos países e sua vulnerabilidade po l í t i ca ju nto ao FMI e ao BancoMu n d i a l . O modelo recomendado pelo Relatório Camdessus e pelo Banco Mundial é de deixar o fornecimento de água em mãos do setor pri vado ou, se for o caso, de empres as mistas (pri va d o -p ú b l i co). Es se mod elo está sendo seguido pelo Brasil no caso de Belo Monte que pretende manter a participação do Estado, mas fomentando uma presença significativa do setor privado27. Para os atores locais, isso significa a privatização dessa grande obra de infraestrutura. A as soci a ção pri va d o -p ú b l i co foi a alte rn at i va enco ntrada pelo Go v e rno Luis Inácio Lula da Si l va para retomar o programa de construção de grandes represas na Amazônia, onde Belo Monte seria a primeira nesse formato.

5. MOVIMENTO GLOBAL PELA ÁGUA COMO BEM PÚBLICO

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Em torno da água o mundo está dividido entre aqueles que defendem a liberação do mercado, o fortalecimento da economia globalizada onde a água constitui um recurso econômico e por isso seu foco é a privat iza ção cresce nte dos servi ços antes ofe rta d os pelo sistema público e, de outro, as organiza ções da sociedade civil perfilados com a concepção da água como bem público e fundada em princípios éticos, de dire i tos humanos e dos códigos da cultura. Mas uma qu es tão pe rm a n ece, é de saber se as gr a n d es co rporações já estão interessadas no mercado de água a partir de grandes obras hidrelétricas? Ora, a hidrel ét ri ca não é, a ri go r, uma modalidade direta de pri vat ização da água. No enta nto, ta l as soci a ção es tá sendo evi d e n ciada nas negoci a ções em curso ju nto ao Ba n co Mundial e ao GATS em atenção à pressão de corporações do setor água interessadas em grandes obras, onde se incluem diques e barr a ge n s, e ta m bém por aqu ela do setor de construção e de mú l t i p l os se rvi ços. Por outro lado, o Banco Mundial, que havia abandonado o financiamento de grandes projetos hidrelétricos desde os anos 80, devido às manifestações da sociedade civil em diversos países do mundo e aos resultados de pesquisas que mostraram os gr av es impactos sociais e ambientais des s as grandes obras, nova m e nte os inclui em sua age n d a, seguindo as negociações em torno da liberação do co m é rcio e a formu l a ção de novos protocolos de financiamento. O I Fórum Social Mundial das Águ as, rea l izado em Flore n ça, em março de 2003, reuniu rep rese nta ntes de diversos países inte ressados no deb ate so b re o aces so aos recursos hídri cos como dire i to co mum e, po rta nto, no âmbito dos dire i tos humanos, aco mpanhando as fo rmu l a ções da reunião de cúpula de Kyoto. Procurou institucionalizar um espaço propositivo, visando apontar políticas que aliassem a qu es tão da água aos proces sos de participação e democr at iza ção de seu aces so como dire i to de tod os, reconhecendo a possibilidade de arr a njos locais, que atendam a cri té ri os soci a i s, eco n ô m i cos e a m b i e ntais de cada país ou região. Postulação ét i ca fu n d a m e ntal, po i s, como os demais recursos naturais, o acesso à água também reflete a estrutura de poder e as desigualdades sociais, inscrevendo-se certamente na ordem dos direitos humanos. As dife re n ças sociais es tão es ta mpadas, por exemplo, em ci d a-

27 Go v e rno apos ta em progr a m as de parce ria público -p ri vado para ampliar a capacidade de inves t i m e ntos na Economia. Hugo Studart e Re n a to Mendes. VEM AÍ O PPP. (Isto É- Dinheiro – 02/08/2003.) http://www.irn.org


des como Lima e México pelo acesso aos serviços, ou nas favelas do Rio de Janeiro e São Paulo. O acesso à água nas cidades tem dependido das condições econômicas dos atores locais e de seu relativo poder de barganha no jogo político, em busca de direitos aos serviços urbanos. A pro posta co n sensual do Fó rum foi de pro por às Nações Un i d as uma sessão es pecial com objetivo de discutir e ap ro var um Cont r ato Mundial da Água balizado nos pri n cí p i os dos dire i tos hu m an os, neste caso re fe rido ao dire i to de acesso à água, visando frear o movi m e nto de privat ização dos se rvi ços de ab as teci m e nto, reafirmando o dire i to inalienáv el dos indiví d u os à vida, sendo a água um bem público fu n d a m e ntal. A cri a ção no plano institu cional de uma entidade chamada de Au to ridade Mundial da Água, nessa perspectiva, deixa em abe rto a possibilidade de filtrar argu m e ntos que venham de experiências locais. No Brasil as rea ções da soci edade ci vil fre nte à problemát i ca da água org a n iza r a m -se em vá ri os es p aços constituindo-se enquanto Movimento da Cidadania pelas Águas. Em 1997 ele afirmava-se na defesa da fo rmulação de novos co n ceitos cap a z es de co b rir os inte resses fo rmais e difu sos dos indiví d u os, a m ea ça d os no seu ente n d e r, pela difusão de inte rp reta ções que consideram a água como um bem econômico. Para ele a defesa da água como bem público é vi tal pois fundada em pri n cí p i os re fe ri d os à rep rod u ção da vi d a. Na age n d a, passa a ser considerada a construção co l et i va de uma re fl exão so b re novas práticas cap a z es de inco rporar os dire i tos fundamentais dos indiví d u os nesse novo co ntexto de uma arena de luta globaliza d a. A revisão do campo dos dire i tos sejam eles ci vi s, po l í t i cos, econômicos, soci a i s e culturais impõe -se ao diálogo jurídico visando à co n s t ru ção da cidadania e garant i as de seu exe rcí cio em nível local. A defesa do uso e do acesso à água, nessa perspectiva, é entendida como um eixo central na luta pela cidadania. Os gru pos em defesa da água como bem público defronta m -se em primeira instâ n cia com atores empres a ri a i s, a exemplo de Colch abamba na Bo l í via e Manila nas Filipinas. De um lado, estão os interesses da economia globalizada e dos empresários, que propugnam pela privatização dos recursos, com objetivos de lucro e acumulação; do outro, todos aqueles que concebem a água como um bem comum, público, princípio da vida e, por isso no âmbito dos serviços básicos que sempre fizeram parte da agenda do Estado. Como se insere a Amazônia nessa dinâmica de privatização? Em que medida as decisões globalizad as e age n e r a l iza ção do proces so de pri vat iza ção neo l i beral repe rc u tem a nível local? Qual o papel do m o vi m e nto de mu l h e res nes se deb ate? É importa nte examinar as estratégi as do FMI, da OMC e do Banco Mundial e, ao mesmo tempo, entender os interesses das empresas sobre os recursos naturais da região. Os exe mp l os são nu m e rosos, da mineração (pri vat ização da Companhia Vale do rio Doce) ao setor madeireiro (compra por asiáticos de indústrias no Amazonas), passando pelos serviços (privatização das emp resas es taduais do setor el ét ri co), e a pri vat iza ção de se rvi ços de água (e mpresa es tatal do Amazonas vendida à empresa Suez). A Usina hidrel ét ri ca de Belo Mo nte, a primeira a ser co n s t ruída, é ape n as um emblema des se processo mais largo de expansão das fronteiras de mercadorização na Amazônia. A lógica das empresas é a da exploração a todo custo, de florestas e rios ao subsolo e aos conhecimentos tradicionais sobre a biodiversidade e os pri n cípios at i v os de fá rm a cos. Es se proces so de pri vat iza ção, de ap ro p ri a ção tem sido portador de exclusão e pobreza para as populações locais pois se funda em um modelo concentrador de riquezas. Por isso que a luta contra as barragens no Brasil assumiu maiores proporções, pois o conflito

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se refere a modelos opostos de desenvolvimento. Os impactos das grandes obras hidrelétricas são múltiplos, e recaem muito especialmente sobre as mulheres com as políticas neoliberais que pretendem subordinar a vida aos preceitos de mercado. A qu es tão tal qual fo rmulada é da ordem dos dire i tos humanos – dire i to à água e sua qualidade, ao rio livre e de uso co mum, aos te rri tóri os étnicos dos gru pos indíge n as, que es tão inco nto rnav el m e nte l i g a d osao rio Xingu, à cultura da água, el e m e nto de identidade nessa região. Dire i to ao aces so à água nos domicílios, atrav és de redes de ab as teci m e nto e saneamento nas cidades, e formas alte rn at i vas segu r as no ca mpo, cap a z es de abolir com o pe n oso trabalho das mu l h e res de carregar as latas de água na cabeça. Dire i to de poder engaj a r-se em um outro modelo de dese nv o l vi m e nto que não seja pri vat iza nte e excl u d e nte. Justamente por estar co n ce ntrada na Amazônia a maior diversidade biológica e onde se enco nt r a igualmente um dos maiores reservatórios de água doce do planeta, além de grandes extensões de terras ainda com cobertura florestal28, a região acaba exercendo um forte atrativo para os novos interesses que se co n fi guram mundialmente. A rep rod u ção da biodiversidade está direta m e nte ligada à prese rva ção dos ecossistemas, terrestres e aquáticos, de flora e fauna29. Mas as ações e estratégias em direção à gestão global da água permanecem ainda restritas às cúpulas de Estados e de agências multilaterais. As reações da sociedade civil a um processo muito pouco discutido e de alta relevância social estouram em diferentes espaços, ganhando visibilidade como o Movimento da Cidadania pelas Águas. Na agenda, a reflexão para a construção de novas práticas, capazes de i n co rporar os dire i tos fundamentais dos indiví d u os no co ntexto de uma arena de luta globalizada. Ou t ros movi m e ntos sociais agreg a m -se na busca de es t r atégi as para fazer fa ce às ações ofi ciais dos Es tados e das Agências Multilaterais, como se tem verificado nos últimos anos no Brasil. O debate sobre os Conselhos de Bacias Hidrográficas, e de sua gestão, em curso no país, é um bom exemplo ainda que mal aplicado, de como se constitui essa arena política certamente de tensões e conflitos, mas com a possibilidade de presença de atores diversos, estatais, empresariais e da sociedade civil.

6 – ARGUMENTOS DOS MOVIMENTOS SOCIAIS E DE MULHERES

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A l guns dos argumentos construídos pel os movi m e ntos sociais e o movimento das mulheres para frea r a os projetos de barragens nos ri os da Amazônia se montam sobre os pri n cí p i os dos dire i tos hu m a n os. ARGUMENTO 1 - Para grande parcela da população de Altamira e municípios próximos, a “privatização do rio” representa uma usurpação do direito das comunidades em relação a uma série de serviços – mate riais e simbó l i cos - prestados pelo rio, inclusive o ab as teci m e nto de água po tável, mu i tas vezes at r avés de usos alternativos. Nesse contexto, as mulheres se sentem concernidas completamente à luta pela preservação do rio sem barragens.

28 Biodiversidade na Amazônia brasileira: avaliação e ações prioritárias para a conservação, uso sustentável e repartição de benef ícios. Capobianco, João Paulo R. et. all (orgs.). São Paulo: Estação Liberdade: Instituto Sócio Ambiental, 2001. 29 A parte brasileira recobre uma área de seis milhões de km? e corresponde a 61% do território do país. A biodiversidade existente no planeta está localizada nos países do sul, onde se incluem os países da Pan-Amazônia, da América Latina, da África Central e de todas as ilhas que conformam o mundo asiático, áreas nas quais se concentra a maior parte das populações pobres.


ARGUMENTO 2 - Quanto ao direito às fontes de água e a sua preservação, a construção de barragens significa evidentemente a passagem dos direitos de uns para outros, ou seja, os direitos deslocam-se das mãos da população localizada às margens do rio Xingu, que habita tradicionalmente esse território. ARGUMENTO 3 - Os desd o b r a m e ntos, em te rm os de economia da água, a partir das tendênci as de estruturação mundial do setor, são inúmeros. Assim vejamos: essas tendências nos documentos oficiais do Banco Mundial e da OMC mostram que o interesse pelo mercado de água, grande negócio do novo milênio, ext r apola de longe o qu a d ro de se rvi ços de água potáv el e de sanea m e nto. No co nju nto dos co mp ro m i s sos que podem vir a ser assumidos pelo Brasil, a pro p ri edade em mãos estrange i r as não pod e ser restringida, nem os governos podem restringir parcerias entre investidores estrangeiros e empresas locais (GOULD: 2003). Esta é, certamente, uma porta de entrada para os múltiplos serviços que emergiriam desse mercado, e aí começa a se tornar claro os interesses do Banco Mundial, em voltar a apoiar grandes pro jetos, ci tando em seus doc u m e ntos os diqu es e as barr a ge n s, ambos rel a cionados com os cursos d´água. É por isso que nosso argumento vai no sentido de não considerar uma planta hidrelétrica apenas como um projeto de energia. Ele é também, na atual conjuntura, um projeto de mercado para a água e os rec u r sos natu r a i s, antes fora do co ntexto merca ntil, um pro jeto que altera as co n d i ções do ri o e de sua ap ro p ri a ção para fins energéticos. Uma vez abe rto o mercado da água no rio Xingu, será a co rrelação de forças do jogo econômico que irá determinar o seu rumo. ARG U M ENTO 4 – Essa região é, tradici o n a l m e nte, ocupada por trab a l h a d o res da te rra, ca mpo n eses nativos de muitas gerações, ou que chegaram nas levas de migrantes dos programas de colonização dos anos 70. As mulheres camponesas, detentoras de saber sobre as plantas e animais, que servem aos seus sistemas de curas, serão direta m e nte afeta d as pel as alte r a ções do rio, de seu curso, suas margens e do l i vre aces so aos mananciais e a biodiversidade, que milenarmente lhes vem pe rmitindo curar seus doe ntes e prod uzir seus alimentos. Por outro lado, embora a água de chuva seja sufi ci e nte para os plant i os, há uma tradição de plantações de vá rz ea que dependem, porta nto, do regime de águas dos gr a n d es e pequ e n os cursos. Assim, se pretende alterar siste m as de prod u ção campo n esa e ignorar os co n h eci m e ntos dessas mulheres, que serão suprimidos sumariamente com a perda de acesso aos recursos. ARGUMENTO 5 – Para as organizações sociais atuantes em Altamira e na região da Transamazônica, a ap ro p ri a ção do rio Xingu para fins de prod u ção de el et ri cidade deveria implicar tod os os prováv e i s at i n gi d os no proces so deci só rio em fu n ção dos impactos so b re sua a atual org a n iza ção econômica e social que fundam suas práticas de manejo e gestão d´água que estão classificados em seus sistemas de s aber so b re a biodiversidade do Xingu. Se os anos 90 va l o rizaram es ses saberes, pois el es rep rese ntam uma ri qu e za e ao mesmo te mpo um pat rimônio cultural da humanidade, sem o qual a biodiversidade não te ria se rep roduzido ao longo dos séc u l os nem mu i to menos se enri qu ecido com a prese n ça dos saberes dos povos tradicionais, agora se está desprezando toda essa riqueza acumulada. ARGUMENTO 6 – Os ri os fazem parte de bacias que at r av essam municipalidades, es ta d os e mes m o p a í ses, o que sign i fi ca siste m as culturais diversos e fo rm as de ge re n ci a m e nto e expec tat i vas dos usos sociais diferentes, tendo gerado complementaridade ou mesmo conflitos, embora até o presente não se tenha registrado nas baci as supranacionais, na Pan-amazônia, confl i tos rel eva ntes. O te m a, pela sua natureza, já contém em si uma problemática, que não pode ser passada por cima, em função de interesses imediatos, externos ao contexto desses grupos locais e nacionais e de suas institucionalidades. ARGUMENTO 7 – A experiência da Usina hidrelétrica de Tucuruí, construída e até hoje administrada

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pela empresa estatal Eletronorte, parte do Sistema Nacional Eletrobrás, é a referência na qual se apóia a população local para rejeitar a co n s t ru ção do co mp l exo de hidrel ét ri cas no rio Xingu. Ali, a rel a ção es tabelecida entre empresa e estruturas sócio-econômicas locais ou étnicas foi não só autoritária como hierarqu iza d a. As indeniza ções receb i d as pela po p u l a ção des l ocada de seus po v o a d os ou vi l as, de seus sítios e te rr as agrí co l as, foram irri só ri as. A qu es tão fundiári a, por exemplo, e os co n fl i tos deco rre ntes pela tensão sobre a terra e os recursos, até o presente, só tem feito aumentar. A l guns estudos apo ntaram também casos de dep ressão que aco m eteram, so b retudo as mu l h e res, po rém mostrando que os imp a c tos foram generaliza d os para homens e mu l h e res, em fu n ção de respo nsabilidades socialmente definidas e relativas ao processo de reprodução social e cultural. ARG U M ENTO 8 - Embora as negoci a ções iniciais sejam promovi d as pela Eletro n o rte, emp resa es tata l , es tá definido que o emp reendimento será co n d uzido e depois administrado pelo setor pri vado. O qu e coloca frente-a-frente interesses de empresas privadas nacionais, que pretendem se associar a empresas estrange i r aspara administrar es se grande negócio que passará a ser o sistema de energia, vinculado a uma sé rie de outros se rviços, como ate n d i m e nto de demanda rel at i va à águ a, ao turismo, etc. Além do que, a produção de benefícios locais, como se verificou no município de Tucuruí, é escassa, mesmo que se considere a geração de emprego e o atendimento de novas demandas de saúde, saneamento e educação, que au m e ntarão devido à migr a ção, proporci o n a l m e nte maior que a capacidade de ate n d i m e nto, pelo pagamento de impostos, quando os empreendimentos entrarem em funcionamento. ARGUMENTO 9 - Finalmente, os processos de privatização como vem sendo aplicados, seguindo um pensamento único, red u ci o n i s ta e fo rm ata d os a partir de inte res ses de lucro das grandes co rpo r a ções, afetam a vida de grupos e de pessoas. Alteram suas vidas e o sistema de direitos nas quais inscrevem sua histó ri a, com justifi cat i vas et i camente co rretas, ou seja, em nome da eqüidade social e da prese rva ção do meio ambiente para ge r a ções fu tu r as, acoplando a es se ideá rio o te rmo dese nv o l vi m e nto suste ntáv el. ARG U M ENTO 10 - Em tod os as situ a ções até aqui demonstradas, as mu l h e res e as cri a n ças são bastante afetadas, pois têm alterados seus direitos e o sistema de vida e de valores com os quais educam seus filhos. Dire i tos humanos que tem como premissa fundadora, o dire i to à vi d a, o dire i to à reprod u ção se m empeci l h os, e o dire i to humano más el e m e ntar como o dire i to à água, que é uma das pri o ri d a d es da Decl a r a ção do Milênio. Es tas qu es tões devem ser basilares no qu a d ro da fo rmu l a ção de po l í t i cas eco n ômicas, ao nível de cada país, mas também na formulação de conceitos que reduzam as ambições econômicas e garantam um mínimo de governança global. E fetivamente, es s as políticas globais, que desco n h ecem os impactos que advém de seus inte res ses p ri va d os, gerando amp l i a ção da dívida exte rna para o país em troca de be n e f í ci os para as emp res as transacionais, todo o sistema de direitos construídos ao longo do tempo, uma qualidade de vida na qual o rio está integrado, longe de propugnar o desenvolvimento e muito menos o desenvolvimento sustentáv el, es tarão propugnando uma mod e rn iza ção co n se rvadora e des i gual, além de po te n ci a l izar fu tu ros conflitos sociais locais e mesmo intra culturas e países.. Os mananciais de água doce do mundo estão no centro do interesse de grandes empresas do setor, que calculam um potencial de mercado em mais de 30%. O mercado não te ria inte res se em inv estir na região justamente com maior incidência desse recurso no planeta? Cresce a crítica contra a privatização nos exemplos de Buenos Aires, Manila, Jakarta e Nelspruit sudafricano e inclusive também nos “mercados seguros” como Europa (PILLER: 2003).


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AGENDA DAS MULHERES PELO DESENVOLVIMENTO REGIONAL

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percepção sobre a privatização dos serviços – onde se inclui a energia - e a situação de exclusão social crescente no mundo, mostra que as mulheres sofrem impactos também pela sua situação de fragilidade no mercado de trabalho. Esta também é uma das desigualdades sociais. Isto reflete na agenda feminina que se amplia com a entrada desses novos temas, e ganha uma dinâmica impulsionada pela urgência. A questão, portanto, é saber como a macro-agenda afeta as agendas locais30. O aces so à água é um indicador impo rta nte para se avaliar a des i gualdade social e a exclusão a qu e es tá submetida uma boa parte da po p u l a ção, justamente aqu ela que mora nas peri fe ri as das ci d a d es, e es tá longe de ser uma problemát i ca de cidade grande. A qu es tão da escas sez é a mesma da exclusão social, que implica em um acesso não democrático aos serviços31. Uma outra ordem de impacto sobre as mulheres é ambiental, considerando a sensibilidade e a relação co n s t ruída socialmente com a natu re za e suas form as de prese rva ção, tema bas tante discutido em literatura es peci a l izada, fo rte m e nte prese nte no deb ate so b re o modelo de desenvolvimento nacional e os impasses da sua sustentabilidade sócio-ambiental.

1. AGENDA GLOBAL DOS DIREITOS DAS MULHERES O Movimento de Mulheres vem apresentando ao poder municipal e estadual, há 12 anos, um rol de p ro pos tas e reco m e n d a ções de políticas volta d as para mel h o ria das condições de vida das famílias do 53

30 Ao mesmo tempo tem sido levantada a questão de como influir na macro-agenda a partir de novas formas de luta que estão emergindo na agenda local das mulheres já existente. 31 A Associação Brasileira de Águas Subterrâneas tem mostrado que essa redução deve-se, no país, ao crescimento desordenado das cidades, ao aumento da poluição dos cursos d´água, ao uso de agrotóxicos nas áreas cultivadas, à limpeza industrial em rios e lagos, ao desmatamento, ao óleo queimado na navegação fluvial e marítima, ao lixo em geral nas orlas das cidades e nos portos, entre outros impactos da ação entrópica sobre os ecossistemas. Todas as atividades econômicas necessitam de água, mas os cuidados com os mananciais são completamente inexistentes, transformando com o tempo, a qualidade do rio, dos igarapés, lagos e fontes.


ca mpo e da cidade, que vivem nos 13 municípios da Transamazônica e do rio Xingu. Ent re es s as recomendações encontram-se: • As segurar um sistema transpare nte e igualitá rio, que garanta o dire i todas mu l h e res aos se rvi ços públicos e, em especial, à água potável com atendimento domiciliar, considerando a conquista da cidadania também pelo acesso à água; • Garantia do direito às riquezas regionais formadas pela floresta, as terras que os trabalhadores do campo cultivam e às águ as do rio Xingu que a tod os serve, e de onde muitas pesso as retiram grande parte de sua subsistência; • O rio Xingu sem barr a gens e sem co nt r atos de negoci a ção e pri vat iza ção; as so l u ções de energia para a região devem vir de pequ e n os projetos ou da energia da grande hidrel ét ri ca de Tu c u rui (4ª do mundo em pote n cial e energia gerada) que fi ca ta m bém em mu n i cí p i osco rta d os pela Rod o via na Tr a n samazônica. • Po te n ci a l izar outros usos do rio Xingu para pos s i b i l i tar trabalho e renda para as mu l h e res, que não as segurados pelo mod elo de co n ce nt r a çãoda at i vidade eco n ô m i ca por uma única grande empresa e para um único fim que seria a geração de energia. • Direito ao trabalho com programas de qualificação profissional para as mulheres. • Políticas de pavimentação, esgoto e água tratada para todos os municípios. Um modelo que seja capaz de incentivar o desenvolvimento apropriado para a Transamazônica e o Xingu no qual tenha lugar a produção e a natureza. • Li n h as de financiamento para as emp res as industri a l iza rem matéria-prima, agregando valor co m marcas e desenhos vinculados à imagem de conservação ambiental. • Ap rese nta ção em fó runs amp l i a d os (local/ nacional e ta m bém inte rn a cional) da negoci a ção dos acordos comerciais de ALCA e OMC.

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O 5º C o n gresso Es tadual do MMCC rea l izado ent re 8 e 10 de agos to de 2003 em Altamira - “A Amazônia sob o olhar feminino” – teve como um dos temas principais a questão da água, onde se reafirmou a proposta de que é possível um outro desenvolvimento da Transamazônica e do Xingu, sem barragens, sem pri vat iza ção e com dese nvolvimento e prese rva ção dos rec u r sos aqu át i cos. Ent re as metas pri n cipais em relação à água estão manter o rio livre de hidrelétricas e os serviços de água de caráter universal e atendidos pelo sistema público municipal. Na Mesa de Abe rtura do Congres so com o tema “Diversidade ét n i ca da mulher da Amazônia: a b r a n ca, a índia e a negr a, em suas fo rm as mes t i ças”, es teve prese nte a índia Tu í r a, da aldeia Gorotire, como co nvidada de honra. Es tavam ainda represe nta d os diversos segmentos de mu l h e res do campo e da cidade, vindas dos diferentes municípios do Estado do Pará. A índia Tuíra (do povo Kayapó), reconhecida entre índios e brancos, declarou na sessão de abertura, a necessidade de se fazer gr a n d es enco nt ros mostrando, para além das te rras do Brasil, ao mundo, que não querem grandes hidrelétricas em suas terras pelos impactos que provocam na vida das mulheres e dos homens, das crianças, na criação dos filhos, na sua produção agrícola e extrativista e na reprodução de sua cultura. As mulheres indígenas consideram como direito inalienável do seu povo, manter a relação cultural com as águas dos rios que contornam e atravessam seus territórios.


As propostas das mulheres do MMCC estão em sintonia com os princípios da Declaração Universal dos Direitos da Água da ONU, nas quais se explicita: A água faz parte do pat rimônio do planeta. Cada continente, cada povo, cada nação, cada região, cada cidade, cada cidadão, é plenamente responsável a os olhos de tod os ”.... “o equilíbrio e o fu tu ro de nos so planeta dependem da prese rva ção da água e de seus ci cl os. Es tes devem permanecer inta c tos e fu n ci onando normalmente para garantir a co ntinuidade da vida so b re a Terra. Es te equilíbrio depende em particular, da prese rva ção dos mares e ocea n os, por onde os ciclos começam. Na Confe rê n cia, as mu l h e res concluíram que a alte r a ção dessa qualidade é uma supressão de direitos hu m a n os ao te rri tó rio de co n qu i s ta e de ancestralidade. A sua pro posta é pela busca de alte rn at i vas energét i cas que não violem os dire i tos das mu l h e res e nem pro v oquem danos ambientais. C o n so a nte, po rtanto, com a Declaração adotada pela IV Confe rê n cia Mundial so b re as Mu l h e res, realizada pela Org a n ização das Nações Un i d as – ONU – em 1995 em Beijing, na China, sob o te m a “Mulheres: ação para Igualdade, Dese nv o l vi m e nto e Paz”. Reco n h ecendo a rel evâ n cia da mulher e prop u gnando por “co n d i ções de igualdade, em todas as es fe r as sociais, incluindo a part i ci p a ção nos processos de decisão e acesso ao poder” consideradas es se n ciais para atender aqu el es pri n cí p i os de igualdade e desenvolvi m e nto. A discussão so b re a suste ntabilidade ambiental é transversal. E por isso pe rco rre qu ase todos os te m as dos movimentos soci a i s, que dizem respeito ao terri tó rio. As mu l h e res disc u tem co n ceitos de suste ntabilidade a nível local e regional apo ntando para estratégi as de organiza ção po l í t i ca, que lhes pe rm itam formular pro pos tas de políticas voltadas para a prod u ção, a part i ci p a ção em órg ã os del i be r at i v os l ocais e que exprimam a sua demandas por se rvi ços de saneamento e de água po táv el ligada em rede aos domicílios, em função das mobilizações nas campanha pela Cidadania das Águas. Assim, a tomada de decisões contra a privatização dos bens públicos é uma bandeira do movimento de mu l h e res há algum. Ainda não ex i s tem a nível local, es t ru tu r as de participação da po p u l a ção na ges tão das águas. Dessa fo rm a, a sua participação se dá pela pressão do Mo vi m e nto de Mu l h e res, em articulação com o MDTX. As qu es tões enca m i n h a d as têm um ca r áter ao mesmo te mpo seto rial e regional, uma vez que co nv e rgem para propos tas macro de dese nvolvi m e nto regional com responsabilidade social e ambiental e voltadas para as especificidades dos direitos das mulheres. Por isto, acentuam os impactos que os grandes empreendimentos podem trazer aos seus direitos, nessa região onde a legalidade e o respeito às instituições são muito frágeis. As lutas contra a violência, pelo direito à escola com qualidade, à garantia de serviços de saúde e de acesso à água potável, atravessam as estratégias de pensar um modelo de desenvolvimento regional que conviva com as diferenças e que inclua aqueles segmentos que se mantém fora do campo de direitos fundamentais. A participação das mu l h e res da Transamazônica e do Xingu nesse processo de luta tem particularidades derivadas do lugar que ocupam na divisão social e sexual do trabalho, e certa m e nte dos es p a ços de prod u ção e de trabalho rel a cionados ao rio e à fl o resta. Processos que se mostraram rele-

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va ntes nas mobiliza ções das mu l h e res e na sua sensibilidade aos impactos das grandes barr a ge n s so b re os seus dire i tos.

2. MOVIMENTO DAS MULHERES DA TRANSAMAZÔNICA E XINGU E DESENVOLVIMENTO REGIONAL Em síntese, o movimento de mulheres posiciona-se no debate sobre desenvolvimento regional com as seguintes proposições: • Reconhecimento dos múltiplos papéis, econômicos, sociais e culturais das mulheres; • Ampliação da participação das mulheres nos processos de decisão, nas organizações representativas da sociedade civil e nos espaços de negociação e de tomada de decisões. • A noção da água como bem público e direito humano fundamental e inalienável. • Contra a imp l a nta ção de pro jetos de infr a estrutura em grande escala como as mega rep res as qu e não são sustentáveis nem ecológica e nem socialmente. • Superação da desigualdade existente até o momento entre homens e mulheres no acesso, manejo e direitos em relação aos recursos hídricos e à água potável. • Res pe i to e pro teção dos dire i tos e sabe res das po p u l a ções tradicionais – camponeses, indíge n as, pescadores, dentre outros - sobre água e floresta.

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Os grupos de mulheres concluem, que o abandono pelo Estado dos serviços sociais tem conduzido à diminuição do volume de rec u r sos com que co nta para pagar os se rviços públicos.A pressão das empresas para privatizar os serviços e os aumentos de tarifas, tem debilitado a medicina social e os sistemas cooperativos, e co n seqü e nte m e nte, os saberes so b re curas e prod u tos tradicionais. Ao se deb i l i ta r setores como saúde, educação e segurança social, as mais afetadas são as mulheres, pois se vêem sobreca rreg a d as com os cuidados das cri a n ças, dos doe ntes e dos idosos. Reco n h ecem ainda, que homens e mulheres são afeta d os de fo rma distinta devido aos lugares dife re n ci a d os que ocupam nas rel a ções fa m iliares e no trabalho. Em síntese, as mulheres da Transamazônica e do Xingu identificam-se com as principais qu es tões do movimento de mu l h e res no Brasil e no mundo. Na pe r s pec t i vada ação po l í t i ca, consideram que as políticas macroeconômicas e comerciais devem respeitar os direitos econômicos, sociais, políticos, ci vis e culturais em geral, incluindo os dire i tos das mulheres, com o pro pósito de incre m e ntar os se rviços básicos, remover os obs tá c u l ospara a part i ci p a ção das mu l h e res, eliminar tod as as form as de vi o l ê n cia co ntra a mulher, as segurar ed u ca ção, saúde e sanea m e nto, além das liberdades econômicas, na família e no trabalho. É impo rta nte co mp reender e proteger as dinâmicas dos ecos s i s te m as, da flores ta e das baci as fluviais para promover o desenvolvi m e nto humano eqü i tativo. Os ri os co nt ribuem para o equilíbrio de toda a região amazônica e por isso, sua alte r a ção ex i ge um conheci m e nto maior do sistema fl u vial pois é necessário, além de conhecer as suas dinâmicas e funções, considerá-la no seu conjunto, como um macro sistema integrado e equilibrado, com nutrientes que permitem refazer o ciclo das cadeias alimentares e de seus fluxos de energia, no qual a vida humana é possível em suas manifestações complexas, materiais e simbólicas.


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ANEXO 1

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A Corporação Suez na Amazônia: privatização dos serviços de água e esgoto em Manaus (Estado do Amazonas) O mu n i cípio de Manaus há mais de 30 anos havia co n cedido ao Es tado a ges tão do ab as tecimento de água e tratamento de esgotos. A Empresa Estatal, COSAMA, responsável pelo fornecimento de água e se rvi ços de es go to da cidade de Manaus é vendida pelo Go v e rno do Es tado à maior co rpo r a ção do setor água, a francesa SAUR. A nova emp res a, denominada Águ as do Amazonas, recebe os at i v os e as s ina um generoso contrato de concessão com direitos de exploração dos serviços para uma população de quase um milhão e meio de pessoas por 30 anos, prorrogável por mais 15. . Metas Vendida em 2000, se cumprido o contrato, a empresa deverá ter concluído em 2006 a cobertura de 99% nos se rvi ços de água e 35% de rede de es go tos e co l eta em todo o mu n i cípio de Manau s. No enta nto, com três anos de co mpra e já no meio do prazo estipulado, os res u l ta d os são des astrosos e os res u l ta d os fa ntas i osos, segundo o Deputado Es tadual Fr a n ci sco Praciano. Apesar de ter implantado novas estações de trata m e nto, e a água ser de boa qualidade, pe rm a n ece res t ri ta aos bairros onde já havia co be rtura pel o s i s tema ante ri o r. Em três anos de atu a ção, a emp resa Água do Amazonas não cresceu em co be rtura do atendimento, mantendo os mesmos 70% referentes aos bairros centrais. Quanto ao esgoto, nada foi imp l a ntado. Manaus co nt i nua com 5% de co l eta de esgo to, e 0% de trata m e nto. O destino do es go to da cidade co nt i nua direcionado para os cursos de água que co rtam a cidade e deles para o rio Negro. Investimentos A empresa declara ter gastado em três anos o montante de 6 milhões de reais em adutoras e recuper a ção do sistema devido o es tado de obso l escê n cia dos equ i p a m e ntos. Por co nta disso, argu m e nta não poder estender a rede no tempo conforme o cronograma previsto no contrato, como também o atendim e nto at r av és de perfu r a ção de poços, nas áreas da pe ri fe ria da cidade, mais po b res, procedimento entendido pela população como tradicional e com caráter quase de autoatendimento. Aumento de tarifas A única clausula que co n seguiram cumprir foi a do au m e nto das ta rifas, é a voz co rre nte em Manaus. Em três anos, três go rd os au m e ntos de ta ri fa, sendo o ultimo de 31,5% no ano de 2003. Por qu atro meses o ultimo aumento foi sustado por ação judicial, mas finalmente restabelecido. Anulação do contrato Neste momento há um conflito e processo de luta pelo respeito ao contrato. A empresa diz que o Governo do Estado fez o contrato com dados enganosos, dizendo que já havia instalado uma cobe rtura de se rviços de água em 90%, o que não era real, mas para o Deputado Praciano que encaminha ações com vistas a anular o contrato de venda, cabia à empresa averiguar o que estava comprando. O problema apontado como principal é a vulnerabilidade da população que além de que precisa pressionar para obter a rede de esgoto e melhor cobe rtura do abastecimento de águ a, não conta com o Estado como instância de mediação. Estado e município lavam as mãos, o que significa uma conivência com a empresa. A Agencia criada para fiscalização não funciona. Um outro lado da conivência.


ANEXO 2 CARTA DA CAMPANHA ÁGUAS SEM BARRAGENS NAS BACIAS AMAZÔNICAS Imperatriz, 11 de dezembro de 2002 I Encontro Inter-Estadual sobre Barragens do Araguaia-Tocantins e Xingu, Belém, 18 de janeiro de 2003 Fórum Social Pan-Amazônico N ós trab a l h a d o res e trab a l h a d o r as rurais e urbanos, po v os indíge n as, ext r at i vi s tas, ri be i ri n h os do P a r á, Maranhão e Tocantins participantes da Campanha Águas sem Ba rr a gens nas Ba ci as Amazônicas, em rece nte enco nt ro na cidade de Imperatriz (MA), que reuniu sessenta e seis ent i d a d es, num to tal de 160 pes so as, analisamos os últimos emp ree n d i m e ntos previ s tos no Programa Ava n ça Brasil do go v e rno federal na área de ge r a ção de energia, art i c u l a d os a pro jetos de exploração mineral e de plantio de gr ã os, na bacia do Araguaia-Toca ntins e Xingu. Confo rme dados do mapa de po te n cial hidrel ét ri co da E l et ro b r ás (1999) e do Banco Inte r a m e ri cano de Dese nv o l vimento (BID), um to tal de 55 obras es tã o p revi s tas para nossas bacias, sendo 40 barr a gens planejadas para o rio Toca ntins e seus afl u e ntes (31 grandes barr a gens e 09 pequ e n as barr a gens), 10 para o rio Araguaia e rio das Mortes e 5 para o ri o X i n gu. Já es tão em proces so de operação 04 destas (Tu c u ruí, Serra da Mes a, La geado e Cana Brava), 01 em construção (Peixe-Angi cal), 04 em proces so de lice n ciamento (Santa Isabel, Couto Magalhães, São Salvador e Es t re i to) e, para 2003, 10 barr a gens es tão previ s tas para abe rtura de concessão (Belo Mo nte, M a r ab á, Se rra Qu eb r a d a, Aragu a n ã, Ipueiras, Tupiratins, Maranhão, Torixo réu, Novo Acordo e Mirador). Além das barr a ge n s, es tão planej a d as ou em execução para es ta região a co n s t ru ção da hidrovia do Araguaia-Tocantins e a imp l a nta ção de mais de 10 gr a n d es projetos de plantio de grãos, que trarão i mp a c tos cumu l ativos para a população humana e o meio ambiente. A exe mplo da UHE de Tucuruí (PA) e La geado (TO), os imp a c tos neg at i v os advi n d os com a imp l e m e ntação des tas gr a n d es obras nas regi ões amazônica são: - Desap a reci m e nto de algu m as es péci es de peixes (suru b i n s, dourada, jaú etc) , b ase da alimenta ção da po p u l a ção local, devido a grande qu a ntidade de biomassa na água e o surgi m e nto de plantas aqu át i cas, que obstruem os leitos dos igarapés; fechamento dos ri os com co n seqü e nte inviabiliza ção do ci clo rep rodutivo dos peixes; - Remanej a m e nto das pesso as at i n gi d as, sem a garant i a de infra-es t ru tura mínima neces s á ria para a so b revivência dign a; - Pe rda das terras de vida e de trab a lho, da identidade cultural das po p u l a ções tradicionais (povos indíge n as, ri beirinhos, qu eb r a d e i r as de coco etc.); - Pe rda da biodiversidade, da cap a cidade prod u t i va dos lotes das áreas de va za nte e pro l i feração de mosquitos nas áreas at i n gidas e ento rno; - Inch a ço das peri fe rias das cidades e au m e nto da vi o l ê n cia e dese mp rego na área urb a n a. – Imp a c to cl i m át i co, es pecialmente so b re o regime das chu vas e a te mpe r atura; Mesmo com todos os problemas já vi vi d os pe r s i s temos mes m os erros. Os EIA/RIMA que foram ou es tão sendo prod uzi d os so b re es s as obras na região não co nte mplam a part i ci p a ção local, ap rese ntam discrepâncias técn i cas e rea l izam es tu d os fr a gmentados que desconsideram os impactos

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cumu l at i v os em toda bacia. É necessário e urge nte pensar em outras alte rn at i vas de ge r a ção de energia, reco rrendo a fo ntes limp as, como a eólica, biomassa e solar, além da red u ção das pe rd as do atual sistema e a repote n ci a l ização das barr a gens em operação. Diante des te qu a d ro, as ent i d a d es prese ntes ao e n co nt ro rea fi rmam o comp ro m i s so com a prese rva ção dos ri os, ecos s i s te m as e res pe i to às populações locais das Ba ci as do araguaia-Tocantins e Xingu, e pro põem: (i) abertura de discussão com a equ ipe de go v e rno no se ntido de pro por uma morató ria nas obras em curso na região para que, a partir de uma ava l i a çãodos imp a c tos cumu l at i v os e das alte rnat i vas ex i s te ntes, seja revi s ta a política energética do país, a fim de que não haja mais preju ízos às populações e ao meio ambiente local; (ii) cri a ção de um CPI no Congresso Nacional para inv estigar os imp a c tos e vi o l a ções dos dire i tos humanos e ambienta i s p ro v ocados pela construção e pelo fu n ci o n a m e ntode hidrel ét ricas na bacia Amazônica, tomando as d evi d as pro vi d ê n ci as; (iii) fo m e ntar po l í t i cas no campo da ci ê n cia e tecn o l ogia para pesquisa so b re fontes limpas e alte rnat i vas de geração de energia. Subscritam: Fórum Carajás, Fórum da Amazônia Oriental (FAOR), MAB, Movimento pela Preservação dos rios Tocantins e Araguaia (MPTA), Mo vi m e nto pelo Dese nv o l vi m e nto da Transamazônica e Xingu ( M DTX), CO NTAG, CUT, FETAET, FETAGRI, IRN, ABO NG - N o rte, FASE, APA-TO, MEB, CENTRU, AA E, CPT, CI M I - A l tamira e Tocantins, CÁRITAS- I mpe r at riz, GTA Regional Altamira, AS M UB IP, A B IPA, CEPASP, ST Rs do Araguaia-Tocantins, Mo vi m e nto das Comu n i d a d es Indíge n as de Altamira e Povos Juruna da Volta Grande do Xingu, Povo Apinajé, Gavião, Prefeitura de Imperatriz, Associação de Pescadores da Ilha de Serra Quebrada, Dioceses de Tocantinópolis.

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ANEXO 3 Quadro 1- Povos Indígenas do Sudeste do Pará, por município e população Povos Indígenas

Municípios onde se localizam

População

Parakanã

Altamira e São Félix do Xingu

248

Arara Araweté

Altamira, Medicilância e Uruará Altamira, São Félix do Xingue José Porfírio São Félix do Xingu, Cumaru do Norte

143

Altamira

128

Rurópolis, Altamira e Uruará

156

Kipaia Kuruaia

Altamira

91

Kararaô Kuben Kran Ken, Kikretum, Gorotire, Kokraimoro, Moikarakô e A´Ukre

Altamira

28

São Félix do Xingu

2866

Altamira

91

Kayapo, Mekragnoti, Kayapo (isolado)

Altamira, São Félix do Xingu

657

Panará

Altamira e Guarantã do Norte

202

Juruna

Senador José Porfírio

35

Altamira

-

Altamira e São Félix do Xingu

382

Kayapo e Kuben Kran Ken

Kayapo Mekragnoti Arara

Asurini do Xingu

Kayapo Pituiaro (isolados) Assurini do Xingu, Mekragnoti, Kayapo Total

269 82

5923

Fonte: ISA – Povos Indígenas no Brasil 1996-2000. São Paulo, ISA.

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Sponsor

HEMISFHERICAL SOCIAL ALLIANCE HSA WOMEN’S COMMITTEE

HEINRICH BÖLL FOUNDATION


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This publication is the outcome of a study case promoted by a Hemispheric Social Alliance (HSA) Women’s Committee initiativ with support from the Gender Working Group of the Brazilian Network for the Integration of Peoples (REBRIP) and from the International Gender and Trade Network (IGTN/Brazil). Sponsor: Heinrich Böll Foundation. This research was part of a project involving two case studies: in Cochabamba, Bolivia; and in the Amazon, Brazil. Chairperson of the Brazilian case study: Edna Maria Ramos de Castro – Federal University in the State of Pará Research Assistant: Jacqueline Freire Contributions by: Antonia Melo, Marta Suely, Raimunda, and Toinha – Fundação Viver, Produzir e Preservar (Live, Produce and Preserve Foundation) Project Coordination: Graciela S. Rodriguez – EQÜIT Institute; HSA Women’s Committee Editor: Graciela S. Rodriguez Graphic Design: Marco Godoy Manuscript review: Elisabeth Simões Translation: Ricardo Silveira We acknowledge Silke Helfrich, Annekathrin Linck,

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Ângela Meentzen, Lina Pohl, and Elyzabeth Peredo for their special collaboration which has enabled this outcome. We also acknowledge all sisters from the HSA Women’s Committee who have contributed in the necessary political debate throughout the development of this project in order to achieve this final result.

Rio de Janeiro, 2004

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INTRODUTION CHAPTER 1................................................................................................................................66 AMAZON, FRONTIER OF RESOURCES AND LARGE DAMS 1. State policies and opening frontiers to the market 2. Large dams and socio-environmental impacts: the Tucuruí case 3. Belo Monte: complex of dams for the Xingu River 4. Privatizing large dams in rivers of the Amazon CHAPTER 2................................................................................................................................81 SOCIAL RIGHTS, GENDER AND WATER 1. Citizenship for the waters 2. Culture of the water and the river as a local expression 3. Altamira Women’s movement and advocacy of a Xingu River without dams 4. Women and the water predicament: the paradox of scarcity & abundance 5. Water, health, and rights of rural and urban women 6. Participation of indigenous women in preserving the Xingu River CHAPTER 3................................................................................................................................95 WATER AND FREE TRADE 1. New regulatory framework 2. Water and free trade: guidelines by the WTO and other Multilateral Agencies 3. Corporate domain of water in Latin America and Brazil 4. The World Bank resumes funding large dams 5. Global movement for water as a public good 6. Social movements’ and women’s arguments CHAPTER 4 .............................................................................................................................108 WOMEN’S AGENDA FOR REGIONAL DEVELOPMENT 1. Global agenda for women’s rights 2. Transamazônica and Xingu women’s movement and regional development

ANNEXES.................................................................................................................................113 1 The Suez Corporation in the Amazon: privatizing water and sewer services in Manaus 2 “Waters without Dams in the Amazon Basin” Campaign Charter 3 Chart 1 – Indigenous Peoples of Southeastern Pará, per municipality and population

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PRESENTATION

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his pub lication is the result of studi es by the He mispherical Social Alliance (HSA) Women’s Co mmi t t ee wi th sup po rt from the He inrich Böll Fo un dation to contribute for the development of a women’s proposed stra t e gy of actions an d po li c i es advoca t ing one of li f e’s most precious resources: water. Two case studies were develo ped on the impa c ts caused upon women by th e pri v a t ization of water in Brazil and in Bo li via during 2003. We now present complete resul ts of our case study in the Brazilian Amazo n. Wi th the actions and propos als contain ed in this docu ment, we wish to contribute to the struggle that different movements, women’s organiza t i o ns and gras sroots gr o ups h ave been dev e l o p ing in La t in America and the world in order to stop neo libe ral policies from snatching water, from streng th e ning the negative impacts of th e ir mercan t ilism, from e n h an c ing th e ir slight for local kn owl edge of water man ag e ment, and from maintaining the negative implications of pri vatization upon the rights of women. HSA Women’s Committee Setember 2004


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The HS A, which co mpri ses the Women’s Committee, is a net w o rk of va rious social ent i t i es and movements in the Ameri cas th at gather around the struggle against “free trade” and neo l i beral globalization while the latter prioritize the interests of large transnational companies. The HSA was created in 1998 wi th the purpose of resisting the inco rpo r ation of the FTAA (Free Trade Area of the Ameri cas) and evolved to co n so l i d ate alte rn at i v es to “free trade” in all of its exp ressions throughout the continent, which have to do with the various bilateral or regional agreements and the negotiations between European Union and Latin America and within the WTO. In fact, many of the impacts of commercial agreements are currently being felt in various countries because they have, as of the 1980’s and 90’s, been the objects of the processes in the so called structural a d ju s t m e nt. The gradual libe r a l ization is part of the process that was imp l e m e nted under the strong influence of the International Monetary Fund (IMF) and the World Bank (World Bank) as major drivers for the meas u res reco m m e n d ed by the Was h i n gton Conse n s u s. Ad o p ted by dev eloping co u nt ri es, th ese measures commended that they open their economies at the same time that they “reduce the role of the State” and, consequently, public spending, in line with a productive restructuring. Negotiated since 1994, the FTAA seeks to develop a framework of legal regulation for the process of opening trade and investments between countries in the continent. At the same time, European Union negotiations with the continent have accelerated. Like what happens wi th FTAA nego t i at i o n s, th ey have not had mu ch transparency and even adva n ces into so m e themes that have not been incorporated to WTO negotiations yet. That is the starting point for the socalled “WTO agreements – plus”. As part of the “additional” th e m es, the nego t i ation of se rvi ce libe r a l ization ru l es advances ri g ht th e re and then. When we speak of se rvi ces, we speak of a hu ge diversity of economic activi t i es: from banki n g th rough tel ephone and transpo rt to ed u cation and hea l th. Given that they are ever more importa nt in the countries’ GDP (Gross Domestic Product) and include diverse and essential sectors for the population, the rules for liberalizing services to foreign capital raise a lot of controversy. It is, in short, a matter of renouncing the possibility to internally regulate strategic sectors of national economies. It also means submitting se rvices to inte rn ational ru l es and to the free action of transnational cap i tals and large co rpo r at i o n s, including sec tors such as public ed u cation and hea l th, where a State monopolistic co nt rol has been guaranteed in various countries to date. Special atte ntion must be paid to the issue of fresh water use and distribution. Evi d e ntl y, this is an es se ntial good to people’s lives all over the world. Want of this resource in a nu m ber of places in the planet has been increasing its importance and the general concern about it. At the same time, large corporations’ commercial interest has increased. Trade negotiations such as FTAA and EU/LA also propose to include water in the privatization of services, thus opening an important business field. In short, trade negotiations, especially the FTAA and the EU/LA agreements, go beyond commercial matte r s, as th ey include inv estments and se rvi ces, and are becoming true supranational co n s t i tutions th at seek to es tablish pe rm a n e nt ru l es for transnational companies in what the co m mu n i cat i o n media call “favorable investment environments”.

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This book is an outcome of the Water pri v a t ization impa c ts on women’s rig h ts resea rch work. Proposed by the Hemispheri cal Social Alliance (HSA) Women’s Committee and sponso red by the Bö l l Fo u n d ation, this resea rch was developed in differe nt co u ntri es by means of case stu d i es in order to make a co mp a r ative analysis of the effec ts of pri vat izing water rel ated se rvi ces on women’s ri g hts. In the Brazi lian case herein, this research was an initiative of the Gender WG of the Brazilian Network for the Integration of Peoples (REBRIP) and with the support from IGTN’s Brazil Focal Point. One case was ta ken from the Amazon region for study, as it inv o l v ed building a large co mp l ex of dams in the Xingu Ri v e r. For years, the Altamira women’s movement in the State of Pará has been mobilized to follow up on State decisions and actions related to this large project, standing up against it. Though it is not strictly a matter of analyzing the impacts of an ongoing ente rp rise, since the pro ject is still to come through, it was the possibility of having their rights suppressed that led rural, urban, and even indigenous women to mobilize against it for yet another decade. Go v e rn m e nt plans incl u d ed building the Belo Mo nte co mp l ex, a set of five large hy d roel ec t ric power plants that would dam the Xingu River nearby the city of Altamira. Organized in an extensive network co mprising 13 municipalities th at branch ed out to rural and urban distri c ts, the women were on th e front line of conflicts with state-owned Eletronorte and the local elites who were interested in enabling the co mp l ex. Th ey stood to defend their ri g hts, for a river wi thout dams, for the quality of the wate r, and for new possibilities of an environmentally sustainable model of social development where local actors will have their rights recognized and respected. The co n sequ e n ces of building large dams in the Amazon have been wi d ely analyz ed, with a focus on the impacts of displacing workers and the ch a n ges to their conditions of living, as well as on th e emerge n ce of co n fl i c ts, violence and poverty in the vicinities of the ente rpri se. For th ese reaso n s, local urban and rural as well as indigenous ethnic gro u ps ri se against market inte rests to dam the river fo r e n e rgy. Bes i d es the social, eco n o m i c, and envi ro n m e ntal imp a c ts on locals, the Altamira women distinctively argu ed th at this is the first large ente rpri se in the hy d r aulic energy industry to be pri vat iz ed in Brazil. In most rural communities as well as in urban areas of the Amazon, water rel ated pri o ri t i es and co l l ective manage m e nt have been key fa c tors for the non-co n flictive use of this reso u rce, which should not be excl u s i v ely att ri b u ted to the abundance of hy d rogr aphic basin waters in the region. Th i s geography, however, is cru cial if we are to understand the local histo ry, es pecially in the days of co l on ization, since Amazonian occ u p ation took place mos tly th rough rivers and strea m s, or igarapés in th e Tupi langu a ge, which diffe re nt co l o n izing gro u ps used as ent r a n ce channels. Th ey underline th e regional topo nymy, define mod els for land occ u p ation, resource use and co n s t i tution of an agroextract i vist economy. Lakes can also be said to play an impo rtant role th e re, es pecially to the fishermen who dwell on the banks of middle and high Amazon as well as other local rivers and on co as tal lands, such as traditional po p u l ations of small family fa rmers and indigenous peo p l es. Collective manage m e nt has a l ways ensured sociability and equity in the use of th ese streams and rel ated reso u rces becau se the flow of water is part and parcel in the lives of th ese gro u ps. Th ese bodies of water co ntain ritualistic el ements th at feed tradition and, th e re fo re, the reasons for co u ntering large hy d roel ec t ric power plants are


b ased on this co l l ective expe ri e n ce. Regional culture abounds wi th such rel at i o n s h i ps wi th water, which a re inte ri o riz ed as el e m e nts of identity wi th the te rritory, wi th the dimensions of life and its rep rod u ction, and are as s u red th rough politics as the cap a city to art i c u l ate va l u es and strategies, and as the co ndition of the people to be subjec ts of their own ri g hts. This pe rception is translated in the pri n ci p l es of the Altamira women’s movement. From the viewpoint of expanding markets dynamics, the more recently aroused worldwide interest in water is rel ated to pressures to wa rds enhancing the place of this reso u rce in the realm of merchandise. Effectively, in the last decade of the previous century international agencies started to shape up the concept of “world water crisis” and the 2020 goals to ensure “water for all”. Water became a core issue in UN negotiations as well as in economic agencies such as the International Monetary Fund (IMF), the General Agreement on Trade and Services (GATS), and the World Trade Organization (WTO). As a development of these intensified market interests, the countries have been compelled to building a new regulatory framework that will liberate trade in services, including the water “sector”. It is not by chance th at inte rn ational deb ate has bro u g ht fa ce to fa ce, on the one hand, national age n d as and po l ici es of adju s t m e nt to summit decisions and, on the oth e r, ci vil soci ety organizations th at are shel te red in alternative fo rums of a global natu re in defe n se of greater State and ci vil soci ety au to n o my from the market. Ho rizons are redrawn by indignation and efforts to wa rds dev eloping a se n se of identity as new utopias are built upon challenging the worl d ’s current order of market greed, of rational effi ci e n cy and productivity at any social and environmental cost, and, consequently, of growing social exclusion. Mottos such as La t in Ameri ca is not for sal e, or still an o ther world is pos sible and we are not merch an dise have the unifying principle of building democracy and assuring the realm of culture as the expression of identities and diversities of the peoples th at inhabit the planet, and there fo re not submitting to th e rationale of an economy that seeks to standardize everyone under the rules of the market. The purposes of this research were to understand the effects of trade liberalization and international trade agree m e nts on pri vat izing public se rvi ces, to revi ew national power sector strategies to wa rd building the Belo Mo nte hy d roel ec t ric plant on the Xingu River and the impacts th e re from, to unders tand the logic of co m m e rce and trade po l i ci es, and, finally, to ident i fy trade libe r a l ization and wate r related services liberalization impacts on women’s rights. The first resea rch step was initiated wi th the July 2003 “Gender and Wate r” workshop held in A l tamira by the MMTA/CC (Altamira Rural and Urban Women Wo rkers’ Mo v e m e nt) in cooperation with the IGTN – REBRIP/Gender WG. Participants included 60 women’s movement leaders from several mu n i ci p a l i t i es and also rep resentat i v es from indigenous (Xipaia and Juruna) and black (Alta m i r a ) women’s org a n izations. Imp a c ts of water se rvi ces pri vat ization on women’s ri g hts were fu rther disc u s sed in three working groups and the pe rtaining outcome is incl u d ed in this text. The water pred i ca m e nt and the ri s ks of pri vat izing large hy d roel ec t ric pro jects are as soci ated, as pe rce i v ed by the women’s movement, to their ongoing struggle for improved conditions of hea l thand sanitation in the realm of mobilizations that favor enfranchising the waters. The second step involved field work in Altamira and in the municipalities of Uruará, Pacajá, Placas, Med i ci l â n d i a, and Vi tó ria do Xingu, located alongside the Transamazônica Highway. Inte rvi ews had been held previously in the ci t i es of Santa rém and Ita i tuba. The study also co nte mp l ated obse rvat i o n s and co l l ected depositions from local and State political leaders and au th o ri t i es. Women’s movement

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l eaders in particular were inte rvi ewed, though, co n s i d e ring their multiple inse rtions in org a n izational structures of civil society, trade union leaderships (Rural Workers Union, and Agriculture Workers Federation – FETAGRI), businesses, town halls, social movement leaderships, and the Catholic Church. A bibliographic as sessment was also conducted to cover soci o - economic and eth n ogr aphic research material that had been developed in reference to the energy issue and the construction of the five hydroelectric power plants on the Xingu River, the so-called Belo Monte complex, by local organizations, NGOs, universities and resea rch institutions as well as by the State power system, the Eletrobrás and its subsidiary for the north region, the Elet ro n o rte. Finally, this repo rt incl u d es a review of argu m e nts by th e Mo v e m e nt for the Devel o p m e nt of the Transamazônica and the Xingu (MDTX) and the Rural and Urban Women’s Mo v e m e nt (MMCC), in the city of Alta m i r a, on the impacts th at may result from th e process th at the Altamira people call “pri vat ization of the river” to generate energy. They signal th at th ey have been co l l ec t i v ely building a development pro ject for the region and th at large size ente rp ri ses, since they emerge under the pressure of external interests, as part of the most effective conjuncture expelling the eco n o my from the region, would not pri o ri t ize local dyn a m i cs and pro jec ts. Th ey qu estion th e i n creased vu l n e r ability of local segm e nts in a region where social and economic problems alrea d y abound. They refer to the drinking water predicament: family supplies of drinking water depend mostly on women’s daily efforts. We ackn o w l edge the Transamazônica and Xingu Rural and Urban Women’s Mo v e m e nt, th e Women’s Mo v e m e nt against Vi o l e n ce, the Indigenous Women’s Associations, their leaders and part i ci p a nts in the July 2003 “Gender and Wate r” seminar in Altamira. We es pecially ackn o w l ed ge Antônia Melo, Toinha, Raimunda, Paulinha, and Marta, who have part i ci p ated a little more cl osel y. This report was made possible th a n ks to their ava i l ability and inte rest in part i ci p ating in the resea rch, in o rg a n izing archive mate rial for co n s u l tation, in rel easing photogr aphs and other importa nt mate ri a l to co ntextu a l ize the moments of their struggle for human ri g hts and women’s ri g hts in the defe n se of a dam less Xingu River.

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AMAZON: FRONTIER OF RESOURCES AND LARGE DAMS

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i scussing the rece nt history of a region where a co mp l ex of hy d roel ec t ric plants is to be built in a way th at will affect a nu m ber of municipalities alongside the Transamazônica Highway and the X i n gu River is inte nt on co ntextualizing some impo rta nt el e m e nts of the constitution of soci a l movements and the women’s plight around a regional development project that is built against the trend of hegemonic fo rces. As a new social fo rce emerging from adverse situat i o n s, the local acto r s, mos tly peas a nt families settl ed by State offi cial co l o n ization programs in the 1970’s, es tablish miles to n es of po l i t i cal identity des p i te their distinct spatial and social ori gi n s. Traditional sta n d a rds for the occ u p ation of the Amazonian te rri to ry fo l l o w ed rivers and waterway s, where most of the transpo rtation took place. The rivers have play ed a key role in stru c tu ring social and economic life in the region, as the axis along which occ u p ation developed, from the early indigenous settlers to the colonial ones. In the mid 1950’s, this sta n d a rd of occ u p ation sta rted to ch a n ge as the result of d ev elopmental polici es th at so u g ht to integr ate the co u ntry’s north and so u th by means of a geo political s t r ategy of building major inte rconnecting moto rway s. The first such motorway, the Bel é m - B r asília Highway, succeed ed in defining a land stru c tu re standard th at led the advancement of the economic frontier in the Amazon inte nt on integr ating it to the nat i o n a l market. The second one, the Transamazônica Highway, well into the 1970’s, reinforces this expansion movement, now cutting across the region on the eas t-w est axis. The same highway and its inte r secting highways integrate the co u nt ry’s north wi th the northw est and ce nter-w est regi o n s, affording co ntinuity to a movement th at had already inco rporated new south and so u th east areas to the national market. Th i s time, however, it was a matter of co n cluding this expansion cy cle by definitely opening the new land and natural reso u rce frontiers to the market of national and inte rn ational cap i tal. By means of fi scal incentives, the State att r a c ted cap i tal and entrepre n eurs from several sec tors of the economy, who moved in to th e country’s new frontiers. Finally, a th i rdax i s, the Cuiabá-S a ntarém Highway, integrating the Amazon to the country’s ce nte r-w es t, cutting across a region th at could only be rea ch ed th rough its rivers be fore, more a g gres s i v ely underlining the occ u p ation of new land fa rther west of Pará and socially, eco n o m i cally and spatially inte rco n n ecting the inlands of this region to the inlands of the Mato Gros so state. The co l o n ization program deployed by the National Institu te of Colonization and Land Reform ( INCRA) in the 1970’s relied on the Transamazônica Highway as its central axis, sym m et ri cally cut across by tens of vicinal roads like a fishbone. Thousands of peasant families were settled there, having come from the north east and south of the co u ntry, expel l ed by ex h au s ted sta n d a rd of fro ntier occ u p a-

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tion and by the high concentration of the land structure, therefore herded by the lack of land and want of resources to plant in whatever land they still had. All along those highways, guided colonization programs consolidated the occupation of large strips of s o lid gr o un d on bo th margins of the road as a result of a national po l i cy of deco mp ressing confl i c ts elsewhere in the country, which eventually incentivated migration towards the Amazon. Intense migration flows were channel ed to th ese areas of dense fo res ts open to co l o n ization. The Cu i ab á -Santa ré m Highway co mp l etes the outline of the Transamazônica, as can be seen in Fi gu re 1. Along these highway s, the adopted land distribution model was based on large properties, thus reinforcing the highly concentrating and excluding sta n d a rdth at characterizes land ownership in the co u nt ry. Despite the intensity of conflicts and the scenario of violence and impunity, the land ownership structure was underlined by the pressure of popular movements. Small and mid-sized rural properties would prevail as productive units in certain areas, like in the municipalities cut across by the Transamazônica Highway. Figure 1 – Major Transamazônica Motorways and Cities

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This land distribution standard of the colonization projects (100 ha mode) would be changed by the prese n ce of new actors, such as cap i ta l iz ed fa rm e r s, large lumber and mining ente rp ri ses, and a big pro jec t: the Tucuruí Hy d roel ectric Power Pl a nt. Grazing fi elds rep l a ced the fo rests and degraded areas s p read far and wide. The regional dyn a m i cs showed how th ese large occ u p ation schemes, by vi rtue of their own logi c, oppose small family production sch e m es, becau se the INCRA mod el did not break wi th the highly concentrating standard of land ownership. This region also witnes sed the dev el o p m e nt of large energy and mining pro jects th at att r a c ted thousands of workers. These enterprises were also driving factors for land concentration. Fired at the end of


the co n s t ruction phase, th at labor fo rce stood in the ce nter of the unemp l o ym e nt and po v e rty scene th at d ev el o ped around th ose large ente rp ri ses. Settl e m e nts, vi l l a ges and ci t i es emerged during th ose initial stages but have remained without minimal urban infrastructure. The governmental strategy associated city spaces to the areas of colonization and considered them as regional dev el o p m e nt drivers, l oci of decision-making and mod e rn ization. Cities like Altamira, M a r abá and Tu c u ruí have become regional hubs. In the co l o n ization stru c tu re created in th e Transamazônica, agrovi l l a ges, agro polis and ru ro polis were co n ce i v ed as distinct and co mp l e m e ntary spaces. Today, those small clusters on the margins of the roads became the headquarters of the municipalities that came about in the late 1980’s, in the process of land division that resulted from the economic, political and social dynamics developed in the region.

1 STATE POLICY AND OPENING FRONTIERS TO THE MARKET The co re objective of the Amazon foc u sed state po l i cy in the 1970’s and 80’s was to occupy it in order to exploit its natural reso u rces. Wi th its ensuing labor ava i l ab i l i t y, co l o n ization ensured land taming and agricultural produce focused on meeting local market demand. At the same time, it enabled the area to be po p u l ated and the region to be integr ated to the national market. But the State also pri o ri t iz es agribusiness focused policies. This is why INCRA’s model for certain Transamazônica and Cuiabá-Santarém Highway areas also involves large properties. The Polamazônia was conceived as a program for farming, timber and mineral hubs, with an initial design of 15 such hubs in the Pará State, one of which in the region of Altamira, the major city located at the confluence of the Transamazônica Highway and the Xingu River. The recent economic history in the region is marked by the influence of this Program’s investments which, in the 1970’s, transferred fat public subsidies to pri vate enterpri ses in the export sectors: cattle, timber and mining. Infr as t ru c tu re enterprises have raised the price of land, driving up the market as new companies, farmers and workers were coming to explore the mines, to pan for gold and to fell the forests. Cu rrentl y, market inte res ts have also ri sen becau se of transnational co mp a n i es. Geogr aphic fro ntiers wi th neighbo ring countri es are being integr ated by means of major motorways and waterways co n ce i v ed as multimode systems. Port movements include large shipments of ore, timber, aluminum ingots (electro i ntensive industry), fish and grain. The fro ntier is red es i gn ed but, this time, enhancing the market integration cap a city beyond national limits by means of intern ational nego t i ations wi thin the GATS and the WTO, and also by means of liberalized economic barriers. State action is effected by means of economic proces ses that ensure active part i ci p ation across the bo rd e r. Due to the singular fact of having eight neighbo ring co u nt ri es, the Amazon is a tru mp ca rd of inte rest to the new geopo l i t i cal arr a n gem e nt, since national gu i d el i n es lead to policies that will re i n fo rce market integr ation wi th co u nt ri es a l i gn ed on the broad fro ntiers of the Amazon region. As we see it, this dyn a m i cs of the political game puts the Amazon in a different place in today’s geopolitics as a national strategy. With this geopolitics of land occ u p ation, the State thus finds strategi es for economic dev elopment that are based on intensive exploitation of natural reso u rces. If the 1970’s ope n ed new fronts th rough co l o n ization, the 1980’s saw large mining companies, hydroel ec t ric power plants, paper and pulp as well as timbe r and fish industri es come into the picture. Economic mega pro jec ts (hydroel ec t ric power plants and mining,

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pulp and agri b u s i n ess sec tors) rep rese nt another mod el of occ u p ation whose standard is imposed by the g l o b a l iz edmarket foc u sed on rationality, info rm ation and tech n o l ogical effi ci e n cy. However rational they may be, mining enterprises such as the Ca r aj ás by the Vale do Rio Doce co mpany, the baux i te extraction in the Trombetas River by Mineração Rio do Norte, or the Albrás and Alunorte aluminum co mp a n i es are islands of wea l th and fantasy. Th ey are also res ponsible for unprecedented pollution lev els in the Brazi l i a n Amazon ri v e r s,such as that cau sed by Mineração Rio do Norte which, in a joint venture with Companhia Vale do Rio Doce in the municipality of Orix i m i n á, has been tinting the Tro m betas River and its rel ated lakes with the red color of the baux i te for over 20 yea r s, des p i te their discourse on envi ronmentalism and soci a l responsibility. The big infrastructure work, like that of the Tu c u ruí (Pará) and Balbina (Amazonas) hydroelectric power plants, was built to meet the national demand and the demand of large international steel co rpo r ations, wi th the aluminum plants causing rather res t ri c ted local, social, and economic impacts. The moving frontier sets the dynamics of social acto r s. Rural workers leaders in this region speak of tension and co n fl i c ts that have underl i n edthis dynamics and characte rized the Transamazônicaregion. There are paradox i cal situations of State absence, impunity, illegal proces ses and institutions, and adva n cing defores tation and environmental degradation. Cattle breeders and grain producers, mos tly so y, eventually occ u p i edthe State’s empty place, at least on the local level, in many of the study municipalities, in an attempt to stake out the space for action and intervention on the terri to ry. Th ey are present in every sphere of local and state politics and they are further net w o rked in a nonp a rty bench in the National Congres s, which imp l i es substantial changes to the politico-institucional structu re, which are re fl ec ted in the party and elec toral proces ses.

2 LARGE DAMS AND SOCIO-ENVIRONMENTAL IMPACTS: THE TUCURUÍ CASE

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Big energy projects start operating in the Amazon rivers in the 1980’s, flooding large tracts of land. The Tucuruí plant, on the Tocantins River (Pará), created a 2,875 km2 reservoir; the Balbina one, on the Uatumã River (Amazonas), occupied 2,360 km2 of land; the Samuel one, on the Jamari River (Roraima), s p read over 560 km2. The Tu c u ruí plant ge n e r ates 7,745 MW. In all of them, the vegetal co v e r a ge was not removed before the floodgates were closed, which led to emerging plagues, reduced amount of fish, emission of gases due to the process of decomposing organic matter under the water, thus hindering the l i feand work of va rious ri v e rine peo p l es. The rese rvoirs of these th ree power plants emit co n s i d e r able amounts of CO2 and CH4, bo th gree n h o u se gases, which co nt ri b u tes to increasing the envi ro n m e nta l impact they cause, as clarified by Bernmam (2002). Many cri t i cal po i nts about building large hy d roel ec t ric power plants have been underl i n ed th ro u g hout the world. Th e re is extensive lite r atu re about ch a n ges to the co mposition of water and abo u t d ecreased pri m a ry biologi cal prod u c t i vity of the ecosy s tem wi th alte red biomes. Changes to fauna (fi s h ) h ave also been ident i fied as cau sed by blocked migr ation and a diffe re nt type of access to nu t ri e nts. Emission of gree n h o u seeffect gases has been shown, too, by Fea rnside (1995; 2000) and evident ch a n ges to the forest coverage in considerably extensive areas around the reservoirs and the ciliary forests by the main rivers and their nearby tributaries. Most interes ted in the Tu c u ruí dam were some aluminum plant manufacturers, which have been indirec tly subs i d iz ed by the Brazilian State: Alco a, Billington, Voto r a ntim, and Companhia Vale do Rio Doce . In Tucuruí, the reservoir presented high emission of pollutants, caused by the degradation of accu-


mulated organic matte r, and it also bro u g ht about mosqu i to plagu es, led to los ses due to suppres sed biodiversity and to reduced or even disap pearing fish speci es, and ev e ntually increased tension over land and natural resources besides displacing an expressive number of families. These families have received neglectable compensation for their material losses. On the other hand, social impacts led to the emerging movement of th ose who had been affec ted by the dam (Sigaud: 1986; Cas t ro: 1989; Magalhães: 1996; Vainer: 1990) which is part of the national MAB (movement of those who have been affected by dams) network to date. This is the local actors’ argument to require their participation in the decision making p rocess of ente rpri ses like the Belo Mo nte. Th ey claim th at, bes i d es the co mp a ny’s authori ta rian rel ations with the social movements, there was no transparency in discussing the Tucuruí project. In Brazil, more than a million people would have been affected by dams, according to MAB reports. As we can see, the soci o - e nvironmental issue remains in the pe riphery, despite the strong environmentalist discourse of the 1990’s. Resea rchers have been highlighting the possibility of using clean alternatives to generate energy. Well, in Brazil, 95% of the energy comes from water generation sources; nev e rtheles s, the energy crisis remains, according to speci a l i s ts, due to the gaps generated in the wa ke of this restrictive orientation.

3 BELO MONTE: COMPLEX OF DAMS FOR THE XINGU RIVER In 1975, Eletronorte des i gn ed the Kararaô (Belo Mo nte), Bab a qu a r a, Ja rina, Ipixu n a, and Kokraimoro dams, after energy potential inventories of the Xingu River. Together, these would flood an area many times as big as the extension of the Tr a n s a m a z ô n i caHighway, including the 100 ha on each side covered by the initial colonization pro ject. In 1980, the co mp a ny did stu d i es on the Altamira Hy d roelectric Complex, composed of two plants, the Kararaô and Babaquara ones, which would jointly flood 8 thousand km2 of land, more than twice the Tucuruí reservoir. However, the dam was never built. Initial steps with feasibility studies and negotiations between the State and the pri vate sec tor were disco nt i nu ed a nu m ber of times due to the effo rts made by the social movements. The women play ed an impo rta nt role in the ent i re proces s. Advocating a Xingu River wi thout hydroelectric power plants strengthened the internal structure of the women’s movement, with the city of Altamira being the starting point for manifestations and for the irradiation of the process. The indigenous peoples, whose lands are all bo rd e red by the Xingu River basin, which incl u d es other impo rta nt rivers such as the Iri ri and the Cu ru á, considered th at their sy s tem of using the river would be rendered vulnerable due to the impacts and therefore opposed the construction of the dam. In 1988, the Meeting of the Xingu Indigenous Peoples held in Altamira bro u g ht together a nu m ber of indigenous n ations who exp res sed their indign ation to the ent i re world on acco u nt of the sco rn shown for their cultu res and their land seniority, denouncing th at the co mp a ny would have vi o l ated land ri g hts as s u red them by the co n s t i tution. Tuíra became the sym bol of the indigenous peoples’ and the Xingu women’s plight, as she re m a rkably stood wi th a mach ete held high in defi a n ce of an Elet ro n o rte authority. Th i s indigenous woman was defending lands, forests, waters and life in the Xingu River. The Belo Mo nte power plant will be the first of a comp l ex of five. Construction is planned for th e Volta Grande do Xingu, in the municipality of Vitória do Xingu, and will directly affect the municipalit i es of Altamira, Senador José Po rfírio, and Anapu. The engineering is diffe re nt from the Tucuruí, because Belo Monte will have two adduction canals on the Volta Grande do Xingu, which will meet the

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river bed downstream of the plant. The volume of material to be removed for the construction of both canals is 144,622,000 cubic meters of earth and 51,955,000 cubic meters of rock, whose fate is yet to be d eterm i n ed. Changes to the river are, obvi o u s l y, of great magnitude. Impacts on the ecosy s tem, on th e vegetation, on the species of local water fauna and flora are inevitable, given the evident changes to the movement and quality of the water and its nutrients. Belo Monte construction works involve dikes, ports, villages, roads, and, finally, the supply of power lines for the country’s industrialized regions. Eletronorte designed the generation of 11,182 MW, a volume th at would be red u ced to 4,000 MW in times of dro u g ht, when the river expe riences lower wate r depths that would reduce the economic feasibility of the entire project, according to some experts. N o va es (2003) argu es about the unneces s a ry and heed l ess co n s t ruction of large dams in the co u ntry, which have been the object of national debate for quite a while now. (Mougeot: 1985; Sigaud: 1986; R osa & Santos: 1999) However, though it is still a co nt roversial issue, the go v e rn m e nt intends th at th e X i n gu River provide 20% of all the po te ntial hy d roel ectric power es t i m ated for the Amazon region, 113,000 MW1. Leading to tension among ci vil soci ety segm e nts th at oppose the construction and th e State, cru cial issues like this one have not been cl ea rly and co n s i s te ntly addres sed. Th ey are, however, i s s u es th at have to do wi th respect for natu re and the range of soci o - e nvi ro n m e ntal impacts, wi th private encroachment of the territory and its resources, and with the winners/losers equation. Together with other smaller ones, the larger city of Altamira already experiences changes as a result of expectations about the development pro ject. Occ u p ation of th at area follows the traditional pattern of small vi l l a ges scatte red along the river banks in combination wi th occupation of solid ground near th e Transamazônica Highway. The economy of various local cities and towns is based on agriculture. In the vicinities of the Volta Grande do Xingu, central area for the hydroelectric power plant, there are 30 villages, as listed in Figure 2. However, preliminary studies by the Federal University of Pará (Lírio and Sá: 2001) have indicated 14 as the most vu l n e r able to the imp a c ts generated by the dam. Agro vi l l a ges Leonardo da Vi n ci, Sagrado Coração de Jes u s, São José, Boa Esperança, São Fr a n ci sco de As s i s, Vila Ri ca, S a nta Te re zi n h a, São Ra i mundo Nonato, Bom Ja rdim, Bom Ja rdim II (Go i a n os), Santo Antônio, Santa Luzia, São Francisco de Chagas (Deus é Amor, or God is Love), and Terra Preta. In the city of Altamira, n ear the mouth of the Itatá Ri v e r, there are yet another three settl e m e nts and twelve cl u s ters also subject to imp a c ts: Parat izinho, Palhal de Cima, Palhal de Ba ixo, Cana Verde, Ituna, Res s a ca, Fazenda, Parat izão, São Lá za ro, Ilha Itaboca, Santa Luzia, and São Pedro, bes i d es the th ree settl e m e nts th at have res u l ted from the garimpo (gold mining activity), known as Galo, Itatá, and Japão. However, the cities of Altamira, Vitória do Xingu and Senador José Porf írio are the regions Eletronorte considers most subjected to imp a c ts. In other areas alongside the river, near the Altamira urban area and in igarapés Altamira, Ambé and Panel as, a nu m ber of constructions are planned amongst which the ente rp ri se res i d e ntial vi l l a ge . Keen on the dimensions of life th at are not usually not considered from co rpo r ate tech n i cal and bureaucratic view, civil society sees a much broader scope of impacts than what Eletronorte admits. 1 Brazil has around 20% of the fresh water supply of the entire planet, which leaves it in an advantageous position compared to other regions of the world. The country also has the largest fresh water source in South America. Approximately two thirds of all that (63,6%) are located in the Amazon, ex a c tly where the Brazilian rivers wi th the most po te ntial to ge n e r ate energy are located, amongst which the Xingu, the Toca nt i n s, th e Araguaia, the Madeira, the Trombetas, and the Tapajós.


It is difficult to estimate the population that will be affected by hydroelectric power plant impacts, if these plants ever get to be built, since the pro ject still lacks a nu m ber of definitions, thus re n d e ring, at this stage, any analysis of the nature and degree of such changes useless. However, the population of the th ree municipalities that are likely to suffer the greatest imp a c ts acco rding to go v e rn m e nt resea rchers and technicians—Altamira, Vi tó ria do Xingu, and Senador José Po rfíri o —to ta l ed 105,215 inhab i ta nts as per data from the 2000 Census (FIBGE). Altamira is Pará’s largest city in terms of terri to rial extension, and it is through this mu n i cipality that the Xingu River runs most of its co u r se. Part of that land surrounds the Te rra do Meio2 and are home to many indigenous peo p l es3. Pará is one of the Legal Amazon States wi th the most Indians, summing up to 270,000 2 The Te rra do Meio, popular re ference for a large State-own ed area surro u n d ed by indigenous land where a mosaic of co n se rvation units is planned for the future, has become an area of squatting and violence involving land dispute by farmers, merchants and rural workers. 3 According to the IBGE, there are 701,462 Indians all over the country, distributed among 218 ethnic groups.

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i n d i viduals living in the 400 Indigenous La n d s, a po rtion of which have already had their limits set and have been already legally recogn iz ed as such. In the Xingu River area and in the confluence of municipalities cut a cross by the Transamazônica Highway, th e re is co n cent r ation of a sign i fi ca nt number of ethnic groups: 5,923 Indians live in fo rest vi l l a ges and over 2,000 live in the ci t i es of Alta m i r a, São Félix do Xingu, Senador José Po rfí rio, Vitó ria do Xingu or Uruará, to taling some 8,000 Indians4. Th e re are approx i m ately 20 peo p l es with different cultures. Sp atial distribution, a ci rcumference whose axis is the Xingu Ri v e r, rea ch es various municipalities cut across by the TransamazônicaHighway and extends toward the city of São Fél ix do Xingu . An eva l u ation of the imp a c ts of a large dam upon the indigenous peoples cannot be made on th e b asis of examining iso l ate cases. The argu m e nts prese nted by the indigenous peoples against the dam refer to each people’s cultural unit, which involves the way they use the land and the resources from forest and river biodiversity. They will hardly not be affec ted by the co mp l ex of hy d roel ec t ric power plants planned for the Xingu as a result of the ch a n ges that will ta ke place in the river. The Elet ro n o rte co mp a ny, however, has tri ed to disqualify the disco u r se of indigenous peoples and minimize the possible soci o - e nvi ro n m e ntal imp a c ts. What is at sta ke is not only the area which, acco rding to the engi n ee ring plans, will receive a r educed impact or an indir ect impa c t, nor is the geogr ap h i cal concept of the co n s t ruction (Si g aud: 1995; Magalhães, Bri to, Castro: 1996). Th ese are the fo rmal catego ri es, which ignore the soci o - economic dyn a m i cs resulting from a large co n s t ruction, as can be seen in va rious studies rel ated to other plants, regions or count ri es. It is impe r ative th at an analysis of the real magn i tude of the social, economic, and envi ro n m e nta l impacts be made from a jo i nt perspective, becau se what is at sta ke is a co mp l ex co mposed of five hy d roelectric power plants, including Belo Monte5.

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4 According to the IBGE, most ethnic groups live in the Amazon, that is, 170 distinct peoples with different languages and cultures. 5 The others are: Altamira (6,588 MW), Ipixuna (1,900 MW), Kakraimoro (1,490 MW), and Jarina (620 MW).


Local gro u ps are concerned wi th —p redictab l e — quality imp a c ts on the water of the river and its tri bu ta ries, in the dyn a m i cs of wate rfa l l s, lakes and islands, as well as small streams, the igarapés. Th ey advocate the ri g ht to maintain their traditions and hab i ts of using the river (for fishing, navi g ation, ri tu a l s, bathing, and as sacred places), breeding grounds for speci es of the fauna and fl o r a. For th ese gro u ps, po lluting the river means suppressing ways in which th ey work and maintain their hea l th, becau se th e re are many uses for the river, mos tly rel ated to rep roducing life. It is well to remember, though, that this pos i t i o n is not co n sensual: it is the prevailing vi ew of segm e nts of the urban and rural po p u l ation in the mu n i ci p a lities referred here, among which the ri v e rine people, fa rm e r s, some middle cl ass gro u ps, social movements and ce rtain co n fessional, pro fessional and envi ronmentalist org a n izations, bes i d es the indigenous peo p l es themsel v es. Cont r a ry to th ese people, a major po rtion of the po l i t i cal and economic el i tes is in favor of the projec t, to which th ey associ ate ideas of regional progres s, mod e rn ization, and development. On the other hand, va rious experts ask why the Belo Mo nte is to be built if it is possible to have a ch eaper ki l o watt of energy, even when we consider the real socio-envi ro n m e ntal cos ts th at are usually underes t i m ated by such enterpri ses (Fea rnside: 1998). Ho w ev e r, just when the idea of avoiding was te and red u cing ri s ks due to mishandling of the envi ro n m e nt is re i n fo rced, the national power sector d eci d es for the disco u r se of large, ext re m ely expensive ente rp ri ses, wi th impacts upon the State’s deb t, as a priority solution to generate energy.

4 PRIVATIZING LARGE DAMS IN RIVERS OF THE AMAZON In the last few years of the Ca rd oso Administration, Eletronorte hastily ap p ro v ed the Belo Mo nte pro ject at the national insta n ces, overrunning feasibility stu d i es and ign o ring governmental bod i es’ leg a l co mpete n ce to prep a re expe rt repo rts and au th o rize stu d i es. Civil soci ety advoca cy of the river has managed to postpone co mp l etion of these stu d i es: th ey are curre ntly disco ntinued by ju d i cial order issued as the result of legal action ta ken by the Federal Public Ministry at the fo rmal requ est of ci vil soci ety org a nizations. The Belo Monte project did not move on, despite the lobby of productive sectors and the 2001 e n e rgy crisis, which entailed some po l i t i cal wear of the Administration then. Ho w ever, the hy d roel ec t ri c power plant project remained in the plans of the national energy sec to r, along with another 50 oth e r such plans for the rivers of the Amazon. Acco rding to local social movement leaders, vi c to ri es have been accomplished thanks to the exp ressive engagement by the Rural and Urban Women’s Mo v e m e nt, whose mobilizations have taken the hydroelectric power generation issue as one of particular significance. Despite the arguments by social movements and other segments of civil society opposing the large d a m s, curre nt Luís Inácio Lula da Si l va Administration still pri o ri t iz es the construction of two large hy d roel ec t ric co mp l exes in the Amazon, the 8 billion dollar Belo Mo nte th at will ge n e r ate 11,180 MW and the 4.5 billion dollar Madeira River one in Rondônia th at will be divi d ed bet w een the plants of Santo Antônio and Jirau, the latter in partnership with the market. In Sep te m ber 2003, the Brazilian go v e rn m e nt co mp l eted the Pri vate-Public Program (PPP), foc u sed on the partnership wi th pri vate co mpanies to increase the amount of infr as t ru c tu re inves t m e nt. As a co u nte rp a rt, the go v e rn m e nt pro m i ses the co mpanies a daring concessions program for the operation of such sponsored projects and changes to the regulatory framework. This would enable local administ r ations to commit their budgets to 5+ yea r-long co nt r a c ts. Though these pro posals are no more than

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intentions right now as we write this paper, they reveal the government’s political guidelines and investment strategy as they intend to avail themsel v es of 65 billion reais annually (35 billion reais from the go ve rn m e nt’s own budget and another 30 billion reais from the pri vate sector) to inv est by 20076, to ta l i n g 191 billion reais bet w een 2004 and 2007. The two large hy d roel ec t ric power plants ment i o n ed abo v e have already been incl u d edin the Go v e rn m e nt’s 2004-2007 Pl u ri a n nual Plan (PPA), rel ying on the private sector that would come up with half of the resources. The largest and most outstanding project in energy sec tor is Belo Mo nte. Elet ro b r ás’s purpose is to resume feasibility studies so th at the plant sta rt operations in 2008, when a new energy deficit may occur, according to expert calculations. The first large Elet ro n o rte conso rtium being nego t i ated has state - o wn ed Furn as, Elet ro n o rte and Ches f on one side wi th 49%, and the pri vate sec tor on the other with 51%. The ev e r- gro wing idea is that of a private co rporations consortium. Equ i p m e nt manufactu rers ALSTO RN, ABB, General Elet ric and Vo l th Siemens, and building co nt r a c tors Camargo Correa and Andrade Gutierrez are actively part i cipating in the negotiations (Coimbra: 2004). The inte rest in widening the range of partners to include the electrointensives is there, sure enough. Ve ry active in the Amazon, the Vale do Rio Doce company is indicated as a “natural” partner. In March 2003, however, Washington Nova es wa rn ed that market inte res ts in the Amazon’s hydroel ec t ric potential jeopard iz ed initiat i v es to prese rve a still balanced state of ecosy s tems in his co m m e nt: “An unsuspec ted individual such as Davi Zy l be r s tajn, fo rmer direc tor of the Brazilian Pet roleum Age n cy and former son-in-law to presidentFe rnando Henrique Ca rdoso, wa rns that vi rtually all hydroel ectric po tential is being auctioned to el ec t ro i ntensive products manufactu ring comp a n i es. Whenever in need of energy for other purposes, soci ety will have to pay a lot more money since it will have to come from other sources.” I n d eed, a new market dynamics is fo rm ed where the State actively moves, adopting developmenta l strategi es. The nationalistic trend, one of a pow e rful Brazil, constitutes the line along which the offi cial disco u r se and the State’s technical rationality are org a n iz ed. Hydroel ec t ric plants have remained in the realm of the state sy s tem so far. But it is impossible to ign o re or to intend th at others ign o re th at the supply of se rvices to the national market is but one step of the pri vatizing process by transnational co mp a n i es, acco rding to the prevailing te n d e n cy this far into globalization. After all, is this not what was observ ed in other sectors such as the fi n a n cial and tel ecommu n i cations? And were elec t ric public co mp a n i es th ro u g hout the co u nt ry not pri vat iz ed in cascade in the 1990’s? In this case, the game has become a little more co mp l i cated becau se the State, hard pres sed by the lobby of hydraulic energy co mp a n i es, must es tablish a n ew regu l ato ry fr a m ework for the sec to r. The Tu c u ruí experience may have little to teach about what is likely to hap pen wi th Belo Mo nte, which will be ope r ating wi thin market logi c, under pri vate co ntrol of national or transnational co rpo r at i o n s. Fu rthermore, Elet ro n o rte is co n s i d e ring whether or not to undertake the commerci a l ization of the energy which, acco rding to preliminary calculations, would have prod u ction costs bet w een 12 and 18 dollars and would come to the consumer market around 30 dollars per MWh. The point is to know whether another energy matrix is possible. Researcher Be rgman considers national energy demands for the next few years can be met wi thout sacrificing the Xingu River, and lists the following alternatives: dep l o ying a plan to reduce los ses in the Brazilian electric system; conducting actions that wi l l reas sess the po tential of the 20+ yea r-old plants, which exist in great nu m bers throughout the count ry; gener6 Information disseminated by the media in a number of articles and stories, among which the one on the August 20, 2003, issue of the magazine ISTOÉ DINHEIRO.


ating energy from decentraliz ed sy s tems by means of small hydroelectric production units and wind power generating plants; tapping the biomass (sugar cane bagas se, or paper and pulp residues) in co-generation modes. Had th ese solutions been adopted before, argu es the author, not only would th ey have avoided the current state of affairs but also th ey would have sav ed resources. Th ey are low cost and low impact solutions that would “offer the Brazilian soci ety over 33% equivalent of the current generation cap a ci t y” (Be rgman: 2002). The qu estion is: why aren’t th ese solutions adopted? Also: what has the el ec t ric sy s tem incorporated from science and technology resea rch programs implemented in the country on ch a n ges, ri s ks, and imp a c ts resulting from hydroel ec t ric proces ses in tropical regions like the Amazon? In effec t, the diversity of mechanisms to generate quality and qu a ntity energy wi thout having to neces s a rily des t roy the water ecosy s tems and the organiz ed social and economic life on the margins of the Amazonian rivers was a major theme in the forums of deb ate that brought together resea rchers from different disci p l i n a ryand interd i sciplinary backgrounds in the 1980’s and 90’s in the country. Ho w ev e r, this intel l ec tual capital, whose acc umu l ation incl u d ed public inv es t m e nts in S&T resea rch, is still largely ign o red by the energy sector. The debate around alternative energy and large hydroel ec t ric pro jec ts has las ted more than 20 years in the country, long enough to generate an amount of knowledge in the field. Giving preference to small units and to alte rn ative so u rces of energy (wind, solar, biomass) is a po l i t i cal issue but also a manage m e nt one, becau se the 2001 energy crisis in the country showed that it is possible to give pri o rity to co n se rving energy and to el ect saving energy as a national strategic choice that could also involve other pri o ri t i essuch as red u cing social inequ a l i t i es in access to energy. Another option is to follow market strategi es, from greater production to greater sales volumes. Reco n ciling these two movements is a challenge as well as a tug-of-wa r. Amazon’s largest hy d roel ec t ric power plant, Tucuruí, has been made possible in order to expo rt energy embedded in el ectrointensive prod u c ts by foreign co rporations. Pig iron plants in the States of Pará and Maranhão are still burning native ch a rcoal; pulp and paper industri es have been rejec ted on account of their fierce environmental damages. Aluminum is produced at high energy costs; the industry represents nearly 50% of its total cost. Hydroelectric power plants have let the public authorities and local actors pick up the bill, that is, the environmental (floods, loss of biodiversity) and social (displaced po p u l at i o n s, unemployment, disse m i n ation of diseases like malari a, migration etc.) cos ts. And th at is not to mention the evidence of ta ri ff subs i d i es granted to Elet ro n o rte by the soci et y, who eventually pay s i n s tead of national and inte rnational pri vate cap i tal aluminum co mp a n i es. Paradox i ca l l y, importing co u nt ri es like Japan, US and Ca n a d a, are just the ones th at retain economic co ntrol of the globalized productive chains, including the most sophisticated aluminum byproducts. Dam ge n e r ated imp a c ts have become more and more sel f - evident. It is a co nt roversial discussion all over but the world movement against dams is an ever- i n creasing ci rcle. New actors step fo rwa rd, voici n g the reasons to counter these enterprises that, given the nature of their investments and stakes, change thousands of people’s way of life all over the planet. With support from the World Bank, the United Nations Org a n ization, and the Inte rn ational Union for the Conse rvation of Natu re, a 2000 study by th e Wo rld Commission on Dams th at brought together experts from 42 co u nt ri es and analyz ed more th a n one thousand such enterp ri ses reco m m e n d ed“extreme caution in this area”. In one ce ntu ry, dams were built in 60% of the world’s ri v e r s:more than 45 thousand dams, considering only th ose above 15 meters in height or over 3 million cubic meters of backwate r, inv o l ving inv es t m e nts of over 2 trillion dollars. And millions and millions of people—60 million, as a matter of fact—w e re displaced by th ese ente rp ri ses!

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In Brazil, th ey are mos tly co n ce nt r ated in the south and so u th east regions, adding some 80 majo r dams to the energy po te ntial largely res ponsible for the 80.55% of the el ectric power insta l l ed in th e country (Tundisi: 2003). Table 1 – Electric energy availability in the country, in terms of installed power. Type

Installed Power (MW)

Participation

Small hydroelectric units

1,485

2.02

Hydroelectric power plants

59,165

80.55

Thermal power plants

9,664

13.16

Nuclear power plants

1,966

2.68

Imports

1,150

1.57

Total

73, 449

Source: ANEL, 2000, Apud Tundisi, 2003.

Economic calculations include other uses for the rivers. Transport sector prospects point at the feasibility of exp l o ring Amazon rivers for navi g ation, a pote ntial reflected in the local 21,300 km when compared to the 16,900 km of the remaining regions of the co u nt ry, acco rding to table 2. Wate rways hav e i n creasingly been inco rpo r ated to co nt i n e ntal integr ation plans, whose re ference is the Pan-Amazonian. Table 2 – Major Brazilian waterways – Navigation uses Basins Amazonian

Main Rivers Amazonas, Negro, Madeira, Purus, Jurus, Branco, and Juruá

Extension (Km)

Tocantins and Araguaia

3,000

Jacuí, Taquari, Lagoa dos Patos, and Lagoa Mirim

1,300

Doce and Paraíba do Sul

1,000*

Mearim, Pindaré, Itapecuru, and Parnaíba

3,000

São Francisco and Grande

4,100

Paraná and Tietê

4,800

Paraguay

Paraguai and Cuiabá

2,800

Uruguay

Uruguai and Ibicuí

1,200*

Amazon

21,300

Other Regions

16,900

Brazil

38,200

Tocantins South Atlantic East Atlantic North/Northeast Atlantic São Francisco

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Paraná

Totals

Source: Cabral (1995), apud Tundisi, 2003. * Potential value.

18,300


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P

T

E

R

2

SOCIAL RIGHTS, GENDER AND WATER 1 – Enfranchising the waters

T

he Movement for the Development of the Transamazônica and the Xingu (MDTX) started in the late 1990’s, with significant participation on the part of family farmers and their organizations but n et w o rked with va rious catego ri es of urban worke r s. Mo b i l ization spread to teachers, stu d e nts, rel i gious pas toral gro u ps, and women’s org a n izations, and foc u sed on tending to the most immed i ate n eeds: imp ro ving the conditions to work and prod u ce; setting out to regu l a rize land issues at INCRA and to seek agri c u l tural funding from other State age n ci es; maintaining vi cinal and Transamazônica rel ated ro a d s; dev eloping outl ets for the produce; and org a n izing se rvi ces like transpo rtation, sch ools, health care facilities, and water supplies. The precarious situation of land plots and vicinal roads, telling pictu re of a disinte res ted State and the limits imposed by public inv estment standards for the region, refl ec ted the co u nt ry’s sce n a rio of economic recession in the 1980’s. Th at was a pe ri od when the State reduced investments in the Amazon, discontinued ongoing actions, and froze infrastructure and development pro jects th at enjo y ed pri o rity status by the Polamazõnia Program. This is also why this peri od reveals the most violence around the land issue, with squatting and advancement toward new frontiers, the presence of illegal armed “militias” (so-called pistolagem), slaying of union leaders, and generalized impunity. The MDTX put together some strategies for political representation initially by means of the unions and then of as sociations, cooperatives, and political part i es. It is in this co ntext th at the new market interes ts, mate rialized in Belo Mo nte, sta rt to become battle grounds for the 113 organizations, according to local leaderships, connected to the movement in 2003. The Movement of Rural and Urban Women, which is outlined upon the dynamics of relations with the most general movement, played an active role in all political moments, among which the one when actions against building the Xingu River dams were pri o ri t iz ed. As it was, the social pro ject was overta ken by a new concept of intervention, a new way of seeing the Transamazônica as intervention space for the purposes of regional dev el o p m e nt planning. It would more evidently inco rpo r ate the economic dimension of family fa rming by means of agro fo rest sy s tem dev el o p m e nt and mod e rnization pro jects. It a l soev o l v ed to create social, rural and urban inte rcatego ry networking fo rums. It was ahead of mobilizations and incorporated contingency analysis of economic, social and political dynamics as a dimension of local women’s movement struggles. In this perspective, building the Belo Monte is challenged by the women on account of the development model it represents. They questioned the nature of the benefits brought about by the dams as well as asked who their true national and international beneficiaries were. Consequently, they also inquired about gains and losses to the local groups.

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The documents produced by the social movements in the 1980’s and 90’s about Belo Mo nte insisted upon a democr atic discussion th at would inco rporate the as s u mption of ch oosing the possibilities for local dev el o p m e nt, wi thout which any hydroel ec t ric power plant co n s t ruction project would be rendered unfeasible. The big co ntroversy for them was rel ated to the fate of the energy and the very co mp a ny. Following up on the discussions about mu l t i l ateral free trade negotiations, local actors now fear the advancement of pri vat ization processes and the inte rests inv o l v ed in ap p ro p ri ating energy reso u rces. Their fear is not unwarranted, becau se what is at sta ke is the national public sector selling the dam to “partner” co mp a n i es th at would thus co nt rol not only the energy but also the Xingu River wate r s, at least in the area under the infl u e n ce of the dam. In effect, Tucuruí was a labo r atory on th e ap p ro p ri ation of land, though it is an energy sector state - o wn ed comp a ny. The Vale do Rio Doce co mp a ny also ap p ro p ri ated vast extensions of land in the Ca r aj ás mountain range, land th at was subtracted from the State, or public heri ta ge as such. Incorpo r ated to the co mp a ny while it was still state o wn ed, th at land was shamel essly sold to pri vate groups together wi th the ent i re ente rp ri se. Examples from other such hy d ro - i n s ta l l ations reveal proces ses of social exclusion that go beyond envi ro n m e nta l d egr a d ation around th ese large underta ki n gs. Approved in the 1st I nte r s tate Meeting on Araguaia-Tocantins and Xingu Dams held in Impe r at riz (in the State of Maranhão) on Dece m ber 9-11, 2002, and co u nte r s i gn ed by the part i ci p a nts of the 2nd Pan-Amazonian Social Fo rum held in Belém (in the State of Pará) on Ja nuary 16-19, 2003, the Waters wi thout Dams in the Am azon Basin Ca mp a i gn Charter was addressed to Pres i d e nt Lu iz Inácio Lula da Si l va, to the Ministers of Mines and Energy and of the Envi ronment, to the ch a i rman of Eletronorte, to the National Secreta ry for Human Rights, to the pres i d e nt of the Federal Se n ate and to the pres i d e nt of the Chamber of Dep u t i es. In his res po n se, the ch a i rman of Eletronorte recogn iz es the position and pro posals by the ent i t i es attending the Meeting, with regards to the commitment of preserving rivers and ecosystems, and to the respect for local populations in the Araguaia, Tocantins, and Xingu river bas i n s. He states his co n cern wi th preserving the envi ro n m e nt and wi th the pri o rity th at must be given to this area, including enviro n m e ntal and social imp a c tsof the dams, at m os p h e ric pollution ge n e r ated by th e rmal power plants, the greenhouse effect and the risks of nuclear reactors. He commits himself to taking their claims to the authorities, who in their turn have committed themselves to “setting the stage for comfort, good quality of life and envi ro n m e ntal integrity for those who suffer the eco l ogic imbalance ,” as stated by Pingu el l i Rosa. But the question remains: wouldn’t the relation between State and globalized market in Brazil be pointing at other tendencies? As we said be fo re, stu d i es for the co n s t ruction of the Belo Mo nte hy d roel ec t ric power plant in th e Xingu River have been discontinued. According to the Eletronorte CEO, the plant would bring environmental problems to the northern region in the dry period, which extends from June to November. During these six months, the plant would only be able to generate 40% of the original plan, or else it would pose risks to the Xingu River flow rate. An internal source explains that, in this case, building a thermal power generation plant attached to the hydroelectric complex would ensure energy on the transmission l i n es whenever the plant is generating 60% less than the insta l l ed cap a ci t y. But Eletronorte intends to resume the works so th at the plant beco m es operational by 2008, when another energy defi cit could ta ke place in the co u nt ry. The state - o wn ed co mp a ny’s decision is to be minority in the ente rp ri se, which


would strongly rely on the presence of private capital. The strongest corporations in the sector, originally from rich countries, have their eyes cast upon this market lead: energy! The relation between hydroelectric power plants and a market interest for water is not explicit in national debates nor in ministerial meet i n gs, though in a Bru s sels co n fe re n ce7, World Bank rep rese ntative for the Eu ro pean Union Ha l eh B ridi spo ke cl ea rly about the Bank’s inte rest to suppo rt large infrastru c tu re ente rp ri ses such as hy d roelectric power plants for the purposes of both energy generation and water related services. The Wo rld Bank has been the major so u rce of funding for large pro jects in the Amazon, fro m hy d roel ec t ric power plant to mining and infr astru c tu re, and an importa nt portion of the national fo re i gn debt is due to the funding of large ente rp ri ses like th ose. The Araguaia and Toca ntins rivers are o n ce again an alte rnative to the co u ntry’s energy crisis, wi th 14 hy d roel ectric power plants th at can jo i ntly ge n e r ate 20,000 MWh of energy. Tocantins State’s Lajeado and Cana Brava plants are curre ntl y in operation. Th e re is currently a tender process open for the Se rra Qu ebrada plant, in the wes te rn part of the Maranhão State, and the Santa Isabel plant, planned for the co n fl u e n ce bet w een the states of Maranhão, Pará and Tocantins. The movement against building the dams puts the water pred i ca m e nt into co ntext as a human ri g ht, and claims the river while advocating its continuous existence, safely from profound impacts and drastic disruption of its reproduction processes. If they came into existence, the nearly 50 dams planned for construction in the next few years are mos tly located in the Amazon. If they are pri vat ized, fo l l o wing th e c u rrent administrat i o n’s ap p a re ntly prevailing trend, th at would ce rtainly tri g ger a pri vat ization movement cascading down to other water reso u rce rel ated sec to r s, co n s i d e ring the power of worl d wide water corporations and the geopolitics that is being designed at the international level. Intent on informing the impacts of those proposed 46 hydroelectric power plant upon the Araguaia-Tocantins basin, the Campaign “Waters without Dams” is being promoted by a partnership comprising the Ca r aj ás Forum net w o rk, the national movement of those who have been affec ted by dams (MAB), the East Amazon Forum (FAOR), the International Rivers Network, and other NGOs.

2. CULTURE OF THE WATER AND THE RIVER AS A LOCAL EXPRESSION Though in the Altamira and Xingu women’s movement arguments the as soci ation between pri vatizing the services in the country and the hydroelectric power plants predicament is not so evident, the conflict and the struggle against building the Belo Monte plant arose as a result of possible local impacts that could terminate use of the river as a public space. The grounds of the conflicts revolve ultimately around different concepts of development that have to do with social and private use of the river. Privatization, as referred by Tucuruí residents displaced by the dam back in the 1980’s, had to do with the disciplining capacity of the power company over the terri to ry where the plant is located, over the reservoir area and surroundings, the latter being ch a r a c te rized as security zone. The Tocantins River example is still recalled by local residents.

7 “Water Access for All in the Light of the Millennium Development Goals: Which role for European Public and Private Actors?” Conference held on March 29, 2004.

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Historically, rivers have had vital importance in the Amazon. The power of white and black waters th at run across the region and become iri d esce nt ri v e r s— green, blue, black, mu d d y—is rel eva nt in th e material and symbolic dimension of men and women who live in this region (Diegues: 1998; Leonardi: 1999). The wate r s, indivisible and pe n et r ating terri to ri es, are spaces for fishing, for cros s i n g, for dwelling, for marsh cultures, for leisure, for the enchantment of peoples and tribes who inhabited these lands long before the Amazon was colonized. In the langu a ge of women’s gro u ps, the image of rivers, igarapés and lakes, and kn o w l ed ge of their co u r ses and seasonal ch a n ges are el e m e nts of a cultu re, exp ression of an ident i t y. Th rough a se ries of co mp l ex processes inhere nt to the ecosy s tems of tro p i cal rain fo rests, th ey can easily tell between ap p ro p riable resources and the very landscape wi th a diversity of hab i tats th at is re n ew ed wi th th e particular beauty of every season acco rding to natu re’s life cy cl es. Ad v ocacy for the land and water is thus associ ated, for the women, to the way th ey work and to their ident i t y, which have necessarily to do wi th the te rritory becau se th ey have histo ri cally lived off an economy based on bo u nt i ful local fo rest and water reso u rces. W h ether th ey live in the ci t i es or not, a part of all these social gro u ps of native po p u l ations has managed to preserve the location of their houses and sites on the banks of rivers, lakes and igarapés, or even in the vi ci n i t i esof biodiversity ri ch marsh lands. They have bro u g ht to our day and age identity traits th at involve tradition, customs and practices— food s, festivities, mu s i c, healing ri tu a l s—bes i d es ce rtain symbols like the ceramics from the Marajó Island, the miriri toys, the perfumes, the aromatic herbs, and the v egetable fi ber bas kets. All of th ese mate rial el e m e nts, deri v ed from water resources in one way or another, have been manipulated and updated in an identity and symbolic field. Networks of commercial rel ations feeding th ese ri v e rine area links with the ci t i es have reta i n ed such soci o - c u l tural traits8. Though the Transamazônica Highway has exercised a more recent occupation, relations with the forest and the river also establish their recent history. The current practice among local groups is one of social use of water streams, which is inscribed in procedures that are regulated by the culture in a more general sense. Water as a common good and the right of all! These groups have developed practices of preserving streams, igarapés, lakes and rivers. The plight to preserve the lakes in the Marajó Island or in the low Amazonas, against the adva n ce m e nt of industrial fishing companies, is an example of a much broader process. It is by all means not a process of disputing water per se (Fu rtado: 1993; Mello: 1985). But it does increase the arri val of companies th at p ri vat ize water streams as well as the land. Big mining and cattle raising and soy growing co rporations have been enhancing new forms of conflict for the privatization of fresh water sources in the region. For all these reaso n s, the women of the Transamazônicaand the Xingu ch a l l e n gewater and river use market interests to generate privatized services. The participation of leader Antônia melo in the “Seminar on the water predicament and its impacts on the life of women” held during the 2nd Wo rld Social Forum in Porto Alegre (state of Rio Grande do Sul) in January 2002, as invited by the Continental Social Alliance, has pav ed the way to focus the water pred i ca m e nt wi thin a more co mplex ap p ro a ch and to undertake it as a priority item in the women’s movement agenda for the region. However, in the previ-

8 For studies on estuary cities relations with surrounding rivers and islands, see www.ufpa.br/projetomegam.


ous years a nu m ber of mobilizations had been set fo rth, expanding the plight for water to neighboring munici p a l i t i es. In one of their March 8 cel ebrations, Altamira put together a great water advocat i n g manifes tation. A ca r avan of bo ats wi th fl a gs and fl ying banners went around the Grande Vo l ta do Xingu , the area to be covered by the Belo Monte hydroelectric power plant, in a collective hug that would reassure the image of a Xingu River without hydroelectric power plants.

3. WOMEN’S MOVEMENT AND ADVOCACY OF A XINGU RIVER WITHOUT DAMS On the 2002 Inte rnational Women’s Day, a co re theme in the Altamira region was advoca cy of th e X i n guRiver wate r s. The women have set their position against Eletronorte’s project to build the Belo Monte hydroelectric power plant. An MMTA/CC founder and current MDTX Coordinator sums up what she sees as key in the plight for water and its relation with damming the river: From now on, we intend to bring this deb ate out to the public domain. We can very well see that, by and large, soci ety is already beginning to understand this plight for water, because we were the first to come out and participate with our mobilization and se n s i t ization on March 8. This is our key fl a g, water as a public policy, as a fundamental ri g ht. We wa nt to bring this co rn e r s tone to th e governments and to the society everywhere in our region (Antonia Melo, Altamira, 2003). It is impo rtant to po i nt out th at the women’s co n ce rn wi th the water issue is inse rted in a bro a d e r u n d e r s tanding of the problem, which goes beyond the envi ro n m e ntal impact. It is a human ri g ht for every body and for the fu tu re ge n e r at i o n s, the right to a prese rved envi ro n m e nt as an Altamira leader likes to put it. There is where not only the concept of water but the concept of the river as a ri g ht to a public policy co m es to play. Every body is ent i tled to wate r— cl ea n , healthy water. Th ey also recogn ize the rel ation between water and the fo rest, between silting the rivers and th e igarapés, as well as the dynamics of deforesting processes. A woman leader externalizes her perception of the regional socio-economy and the women’s political role: In fact, the purpose is that women take up the leading role in this plight and in this discussion, wherever they are, in their municipalities, in the schools […] a h ead of this mobilization, this se n s i t ization of the soci ety around us for the advocacy of water (Tônia, Altamira, 2003). The struggle to re-democratize the country in the 1970’s eventually helped to politicize gender rela-

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tions as well, starting with the women’s movement. In the Transamazônica, women then faced the challenges of colonization, as one of their coordinators clearly stated: Ever since the Transamazônica was cut open, women have been inv o l v ed . Th ey have always been on the fro nt, together wi th the men, stru g g l i n g, building, cooking in the tents. And soon there were the big manifestations, there was the s t ri ke of the Po nte União, as it is kn o wn around here. Yes, the big manifestations! In 1984, when the women came in to discuss, that’s when the caravan to Brasília was deci d ed and set off. We were rather young back then […] but we felt the prese n ce of women claiming not only their ri g hts but also the ri g ht to plowab l e land, to a family, to sch ooling and ed u cation. From th at stri ke on, we have managed to have the largest sch ool around here, the Abraham Li n coln sch ool. Th at was acco mp l i s h ed during th at stri ke. And then the municipal hos p i tal came too, a l so as a result of th at plight, th at stri ke. (Elicé ria Fr a n co, Coordinator of the Medicilândia Women’s Movement, July 2003)

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The Women’s Decade, as institu ted by the UN in 1975 during the 1st World Confe re n ce on Women, is revered to date in the Transamazônica, in a co ntext of res i s ta n ce and struggle to survive. St re n gthened, the women sta rted to occupy specific spaces, promoting and holding meet i n gs, discussing community and family problems, discussing how to survive socially and politically in the face of so much adversity. State m e nts by Med i cilândia woman leaders indicate th at th e re were meet i n gs held in the region w h e reup to six hu n d red women got together back in the 1980’s.9 In the municipality of Vitó ria do Xingu, the women started to organize themselves, in parallel to the women in the municipalities of Medicilândia, Uruará, Placas, and Altamira. A milestone for the 1990’s is the increased number of women’s organizations and their more dynamic networks at the national, regional and local lev el s. It is during this process that the Altamira Rural and Urban Women Workers’ Movement (MMTA/CC) comes formally into being, soon to be followed by other associations and movements along the Transamazônica Highway and the Xingu River. Participation of these movements in national and international networks has allowed them to gather info rm ation and dev elop an agenda of problems th at have hel ped cl a ri fy the art i c u l ation bet w een global economy and local imp a c ts. This pe rception has led to a reco n fi gu r ation of more rece nt local actions dimensions such as th at of mate rial or sym bolic violence against women and their ri g hts to organize and exp ress th e m sel v es. The women’s movement grew as a result of a dramatic event of vi olence against children which sensitized society at the local as well as national level. It was also driven by

9 In the 1980’s in Brazil, the feminist movement is increased and it diversifies women’s insertion into social spaces—trade unions, political parties, and community associations. CUT’s creation of the Secretariat of Women is an expression of this new dynamics. This plight is a driver for State recognition of the specificity of the female condition, which is translated in the incorporation of their claims in the 1988 Federal Constitution and in the development of public policies focused on the women, such as the establishment of the Women’s Rights Councils, the development of integral health programs, the creation of the first specialized women’s precincts, among others.


the 1991 Fraternity Campaign. In the words of a founder of this movement, the influence of the Church is remarkable all along this process: [...] at th at time, I was already active in the Grassroo ts Cleri cal Commu n i t i es of the Catholic Chu rch. I was invi ted to part i ci p ate in an ed u cational meeting for the campaign in Belém so that I would come here to this region […] to become the person in charge of forwarding the information. And in the Belém meeting, about this campaign, we studied the text that spoke a lot about this issue […] of the Fraternity Campaign “Woman and Man, image of God”. It was real strong, it s po ke of the women’s situ ation of discrimination and marginality, it spo ke of social injustice, of inequalities […] so it started to open up our minds so that we could urge the women to get organized, to struggle against th ese fo rms of discrimination and inequality (Antonia Melo, MMTA/CC, July 2003). Being initially organiz ed around the Club of Mothers, a space where th ey pro m o ted trainings, meetings and think tanks, the movement now extends over a network of organizations with centers in urban areas and co m munity ce nters in vi cinal ro a d s, in the rural areas, including as soci at i o n s,as can be seen in Chart 1, containing the spatial flow chart and structure of the movement in the municipalities where the MDTX is active. Connections were dev el o ped upon the rel at i o n s h i ps wi th other net w o rks th at included unions, Church groups and associations. The dynamics was associated to the MDTX, following an agenda of the more general movement about regional development polici es on the macro lev el , but a space of identity assurance and female specificity was maintained. This capacity to deal with diverse agendas may explain the wide-ranging participation in a number of areas and realms of power within the political guidance of the more general movement and, in particular, the Transamazônica and Xingu women’s movement. However, it may be said th at the emerge n ce of the women’s movement is direc tly rel ated to the indign ation at the denial of minimal human ri g hts and to the struggle against impunity. Into l e r a n ce to gender and at the same time class differences leads to violent confrontations on a daily basis with estate owners and gunmen, underlining the red u ced value of life on the frontier. Tension, co n fl i c t, arb i t r a ri n ess against women, all in as sociation wi th phy s i cal vi o l e n ceagainst ch i l d ren and adolesce nts10 in the mu n i cipality of A l tamira were the plights in the ea rly sta ges of the women’s movement in the Tr a n s a m a z ô n i caregion. The date of March 8, 1991, when the International Women’s Day was being celebrated, became a milestone in the Transamazônica and Xingu women’s struggle becau se th ey went out to the streets for th e

10 For the women in Alta m i r a, the most cru el fa ce of this vi o l e n ce lies in mu t i l ation and death inflicted upon local young bo y s, and in the imp unity around 15 cri m es co m m i tted bet w een 1992 and 2000 that have never had suffi ci e nt inves t i g ation or whose lawsuits and trials have bee n p ro pe rly exped i ted nor have the culpri ts been punished. Th ese are pe rverted cri m es co m m i tted against Altamira ch i l d ren and adolesce nts, nationally and internationally known as the case of emasculated children, a process that is still being held back in court when it was scheduled to be tried in August 2003. Between 1989 and 1993, six boys were castrated and murdered, three were mutilated, five disappeared and another five were ki d n ap ped, to taling 19 cases. Th ey ended up in the Belém co u rts and all were wi d ely publiciz ed by the media, raising wi d es p read indignation, but only a few of the culprits were convicted.

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first time, denouncing vi o l e n ce and imp u n i t y, and they demanded ju s t i ce. Th ey bro u g ht a va ri ety of social catego ri es together all along the Transamazônica Highway. The fo l l o wing flow ch a rt (Chart 1) gives an idea of the spatial distribution of the movement and also of MDTX’s organizational structures in active municipalities. Chart 1 - MMCC structure and networking with MDTX

MDTX FVPP

FETAGRI

MMTA-CC (Altamira) MMCE-CC (Medicilândia) M.M. Anapu Women Advocates M.M. from Uruará M.M. from Vitória do Virgu M.M. from Senador José Porfírio M.M. from Pacajá M.M. from Placas M.M. from Rurópolis M.M. from Porto de Móz

Brasil Novo Women's Association Anapu Women's Association

Association of Altamira Districts

Gonzaga-Altamira sector Women's Assoc.

Placas Women's Association Placas Women's Association AMT Brasil Novo ASMUPACAJÁ EMANUELA - Porto de Móz Rurópolis Women's Association

Boa Esperança District Itapuru District

Xipaia-Altamira Indigenous Women's Association

Açaizal District Vivalândia District Assurini-Altamira Women's Association Bela Vista District

90 Sudão I District Associations of Districts in municipalities and other cities/towns of the Transamazônica and Xingu

Source: Field research, August 2003

Juruna and Cunaia Indigenous Women's Association - Altamira

Itapuassu (Travessão (Vicinal) Assurini) Women's Association


In the wa ke of reversing ch i l d ren malnutrition conditions and suppo rting pregn a nt women in th e municipality, a joint effort that brought together the Children’s Pastoral of the Catholic Church and the Mu n i cipal Secreta ri at of Hea l th, the Med i cilândia women’s movement was recogn iz ed in 1999 and it wi l l therefore push the need to legalize the feminine organization so that they can advance with their ongoing work. Int rod u cing the exp ression “women workers” in the movement was part of discussing to es tablish their cl ass positions, acco rding to movement leaders, and their commitment wi th building a fa i re r and less unequal society. In Vitória do Xingu, 1997 is a miles tone year of public recognition of th e women’s movement as the city had hosted their first local assembly the year be fo re. It thus emerges in the urban context in a region where the struggle was basically concentrated in land disputes and a plight for better technical and funding conditions for family farming. Together with other social movements, women leaders eventually incorporated new women’s groups to their emerging organization. While in the ea rly 1990’s fi g hting vi o l e n ce and struggling for ju s t i ce were the major local women’s movement banners, part i ci p ating in the development and social co nt rol of public po l i ci es would become more relevant in the latter years of that decade.

4 – WOMEN AND THE WATER PREDICAMENT: THE PARADOX OF SCARCITY & ABUNDANCE The Transamazônica and Xingu women’s plight controversially brings to light the Amazonian paradox of water abundance and want of access to quality drinking water in local homes. And this is why the women have gotten a head start advocating their right to water. A 12.3% water potential in the State of Pará, in the context of the North region which in turn holds 79.7% of the national water potential, does not mean any drinking water improvement for the local population. In th at State, only 42% of the population receive treated wate r. Drinking water supply coverage rates are low, as can be obse rv ed in 1990 data11: region of the Low Amazonas, 60.56%; Xingu, 29.68%; Toca nt i n s, 39.34%; islands, 59.65%; munici p a l i t i esof Met ro po l i tan Belém, 76.44%; and north east of the State of P a r á, 64.46%, wi th 65.05% as the av e r a gefor the State. The data rev eal th at the Xingu region has the smallest co v e r a ge wi thin the ent i re State. Public polici es rel ated wi th water supplies are vi rtually inex i s te nt in this region and it is up to the population to fend for th e m sel v es wi th water from the river, igarapés, wel l s, wate rh o l es or any other type of pro vision the fa m i l i es can avail th e m sel v es of. In the Transamazônicaand Xingu region, this matter has worsened as years go by. Of the th i rteen municipalities th at fo rm this ax i s, only three have those services and a local Pará Sanitation Company Office (COSANPA), the pertinent state age n cy. Th ose th ree munici p a l i t i esare Alta m i r a, Senador José Po rfí rio, and Vitó ria do Xingu . The mu n i cipality of Uruará has one water co l l ection and treatment unit curre ntly being built in partnership wi th the Alvorada Pro ject12, meaning th at the other mu n i ci p a l i t i eshave no such public sy s te m . For the mu n i ci p a l i t i esof Brasil Novo and Med i ci l â n d i a, since they do not have any river wi th water co ll ection cap a ci t y, as COS A NPA’s local Altamira manager sees it, the sy s tem would have to be imp l e m e nted after drilling artesian wells or collection from igarapés wi th water volume th at is exp ressive enough to

11 IBGE, Demographic Census, 1990 and 2000 12 A Federal Government project in connection with States and Municipalities.

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allow for a type of dam where water can be decanted and then go through a treatment station, which makes for even more expensive investment13. Limitations and precariousness of water supply systems impose fu rther sacri fi ces on the women in their daily plights. Water is a key el e m e nt for their every d ay l i v es, for household ch o res and for work, es pecially agri c u l tu re work. Lack of water leads them to was hing cl o th es on the banks of rivers and igarapés, often dista nt from home. Cate ring to domestic needs has histo ri cally imposed a burden on women and ch i l d ren, who are usually res ponsible for home water supply. Women play an impo rtant role in the struggle for access to water, because th e reare municipalities like Medicilândia, Pl a cas and Uruará where the already sca rce streams have been polluted due to misuse. Lack of water poses se rious problems when cate ring to major family need s. But there is another predicament connec ted to wate r, which also mobiliz es women: dri n king water supply in dry areas. De fores tation co nt ri b u tes to los ses of soil water reso u rces, red u cing the water dep th in ce rtain rivers and igarapés. Th ey feel and react to imp a c tsgenerated by the lack of dri n king water distribution servi ces in th e ci t i es; by a worsening of the hea l thcare situ ation, es pecially for ch i l d ren, who are more subjec ted to co ntamination by diseases caused by poor water quality; by the pollution of rivers and igarapés; and finally by the lack of sanitation services. At the same time, added to the situ ation of poverty and misinfo rm ation resulting from low ed u cational levels, lack of basic sanitation nea rly all over the State makes it even more difficult to fight diseases like malaria, leishmaniasis, and yellow fever, whose levels are still a big concern. One of the founders of the Vitório do Xingu women’s movement records and at the same time criticizes the sexual division on labor which, while structuring family relations as well as relations in the workplace, sets aside to women the household chore of providing water: “[...] now you see, women work, or we work as health agent, teacher, and so on. Bu t, more than th at, women have other activi t i es. Work always seem to co nce ntrate more upon women. People think that ca rrying water is syn o nymous with women, that women must carry it. So, while men don’t have to do that job, th ey co u l d n’t ca re less. In some places I see families th at can affo rd to pro vi d e running water […] but they don’t do it. Why? Because the women carry it […]” (Benedita Azevedo, Vitória do Xingu Women’s Movement, 2003)

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A n o ther inte rvi ewee, a former res i d e nt of Transamazônica’s Trecho Seco (or Dry Tract) now residing in the Vila Nova district of Medicilândia, considers the bodily remainders of the co nt i nu o u s labor of supplying to the family as a result of ineffi ci e nt municipal public po l i ci es rel ated to wate r services in the city and in the countryside: “[...] so now I am all shaken up from ca rrying water on my head to supply for the home, to lay the ground, to do everything. And the Mayor, what does the 13 This is not a iso l ate pictu re of the region. COS A NPA data show th at only three out of the 143 mu n i ci p a l i t i esin Pará had a sewer sy s tem until the latter 1990’s—Belém, Marabá, and Barcarena—an equivalent of 7.87% of the population in the capital and 0.56% in the interior of the State. (Novo Pará magazine)


Mayor do? To my mind, in Trecho Seco it should be like th i s: we need wate r, because we break our backs to get water when there is nowhere to find water in Trecho Seco, even here on the main street. Now the summer is coming, and we are going to be crying for water here… and there is no water! And the travessõ es14? The travessões have a lot of colony, especially those who live in the Trecho Seco trav es s ões. We need ed to have a water pump in th e re, so th at the people could have a shower. Coming dead tired from work and still having to walk th ree or four kilometer to get to the water […]” (Neuza do Nascimento, July 2003) In effec t, the most se rious situ ation in Med i cilândia is that of Trecho Seco, an area located in th e north of the municipality with up to 15 km without water because they cannot rely on rivers and igara pés, nor on any public se rvi ce th at ensures access to wate r. The ever-w o r sening situ ation led the social m o v e m e nts— Rural Wo rkers Union, Catholic Chu rch, Med i cilândia Women’s Mo v e m e nt, co m mu n i t y associations—to set up the Committee for Democratizing the Trecho Seco Water. The Committee has promoted parties and bingos, and received donations to invest in small dams, in acquiring pipelines and turbines, with the intention of distributing water to the families that live and work alongside the vicinal roads. It became an effective ci vil soci ety mobilization instru m e nt th at has been able to cater to th e needs of residents along four vicinal roads using this type of self-help system called mutirão. Not taking the burden off the shoulders of the State, local social movements in Medicilândia have pushed the executive power and the City Council to ensure public supply of drinking water for the communities. The houses’ nea rn ess to the river or igarapés is part of the water supply strategi es of th ese gro u ps for both domestic services and their work processes. This is why they consider that river changes resulting from the construction of dams will generate great impacts for some people’s access to and management of water. To other people, the conditions created in the rural plots of land or in the urban distri c ts would be lost to the fl ooding of the ri v e r, not to mention diseases cau sed by ch a n ges to the cultu re, the traditions, the physical and spiritual healing processes that compose their mythical universe and their forms of rep rod u cing life. In these places, women are co n s i d e red gu a rdians of a traditional knowledge th at harbors a plant and root healing system of ri tuals made from kn o w l ed ge based on what the river and th e forest have, on the movement of tides, on the reproduction of animal and vegetable species. They speak of ri s ks becau se they consider their re fe re n ce systems to be th reate n ed, their reason for claiming th e right to maintain their culture and customs. Recently, the environmental sanitation issue was given special attention on the 1st Regional Conference of the Cities held in Altamira on August 01, 2003, by the Association of Transamazônica Municip a l i t i es (AMUT) and the Belo Mo nte Conso rtium, bod i es th at agglutinate the localmu n i ci p a l i t i es, in res po n se to the call by the Ministry of the Cities. In that Confe re n ce, the Envi ro n m e ntal Sanitat i o n Wo rking Group indicated the water issue as a major pred i ca m e nt of the munici p a l i t i es in th e Transamazônica, Xingu and Santarém-Cuiabá region, most of which do not have COSANPA’s services and whose water supply has been precariously handled by local municipal governments. The impact of

14Travessões/: Literally translated as "dashes", these are small roads cutting across the Transamazônica wherein colonist families were settled.

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envi ronmental harm to human hea l th and envi ronmental education were widely disc u s sed, the latte r being understood as a major possibility of contributing to reverting the current scene of popular misinformation and unawareness. One of the recommendations, submitted to and approved by the Final Pl e n a ry of the Confe re n ce , enfo rces a position against any possibility of pri vat izing the water sector. Other pro posals about th e water issue and sanitation, none of les ser impo rta n ce in the Confe re n ce, incl u d ed: dev eloping a public water treatment and supply system that will be able to meet the population’s demand until 2006; implementing environmental sanitation and education programs; starting a process that will bring basic sani tation se rvi ces to the mu n i cipal realm; and imp l e m e nting an integr ated basins manage m e nt program with participation and control by a consortium of local groups.

5. WATER, HEALTH, AND RIGHTS OF RURAL AND URBAN WOMEN

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W h at would be the grounds or the logic of women’s struggle for water? Obse rvation of the everyd ay activities of the women in Amazonian rural areas and urban outs ki rts shows th at th ese activi t i es do not differ much from th ose of so many Latin American women. In their family gro u ps or in th e i r co m mu n i t i es, the women are the ones to supply the family wi th water and to care for water managem e nt; and, since th ey are more sensitive to water needs for most circumsta n ces in life, th ey are also the ones who suffer the most imp a c ts when water is missing, becau se of difficult access or ch a n ges to the way in which the reso u rce is managed. Th at is the case of small streams cutting across rural plots of land and calling for manage m e nt and co n servation in order to be kept alive wi th quality water. Ho w ever, water rel ated conflicts are more common and heated when a stream cuts across big fa rmlands and ca rries ch e m i cals from pastu res and cro ps to res i d e ntial areas, and th e re is also tension when ciliary forest is not prese rved. The rel ation bet w een hea l th and water quality in the Transamazônicamu n i ci p a l i t i esreached vi s i b i lity insofar as the predicament of health and sanitation services was made explicit. In the mid 1990’s, the issue of women’s health stood as an importa nt co n ce rn for the local women’s movement. Most of th e time spent by the women who live in rural areas or in urban outskirts is in search for water. Statements by some inte rvi ewees are mostly narr at i v es about the lack of water in various dry tracts of th e Transamazônica Highway. In th ose reports, there is evidence th at the women play a key role in th e everyday manage m e nt of water. Th ey are res ponsible for the rep roduction of life and this is why th e i r relation with water becomes so relevant. Though their work is taken for granted by the capitalist society as it is measured by prod u c t i vity equ ations, for th ose women the notion of a terri to ry and access to local resources are in the co re of their struggle for wate r. The meaning of water is th at of a sym bo l i c sacred good, the synthesis of life. This is why privatizing river waters for energy purposes may represent a severe impact upon the lives of the people and the entire society in that region. The debate around water is inserted in this context of access to services, together with the demands for sanitation, schools, medical care facilities, the maintenance of roads, and outlets for the agricultural produce. That is, together with the small cities that develop along the Transamazônica as new municip a l i t i esare set up, th e re has been increased qu estioning of the spaces for local power and its rel at i o n s with the social movements.


Women’s struggle and their movement’s ensured part i cipation in Altamira’s, Medicilândia’s, and Vitória do Xingu ’s Municipal Hea l th Councils are expressions of enhanced social banners embraced by the local women’s movement. Women’s hea l thconcerns go beyond the mother- child ax i s, for they are conce i v edas a whole. Therefore, women’s hea l th is not res t ri c ted to gyn eco l ogy and obs tet ri cs, which reduce women to their rep roductive capacity, and thus inco rporate attention to the issues of violence, food intake, basic sanitation, and access to dri n king water, to education, and to disease prevention and hea l th promotion. The most relevant difficulties faced by women’s movement leaders refer to three major issues. The first is rel ated to po v e rty, to the preca rious economic situ ation of families. The second one lies in the difficulty to org a n ize them, which is more sev e re in the rural areas. Las tl y, th e re are diffi c u l t i es related to the sustainability of the very women’s movement. R eg a rding the fi r s t, th e re is no specific women’s movement action to wa rds reverting this tre n d . Th e re is, though, a more global pro ject for regional development led by the MTDX, anchored mos tly on strengthening family farming and on seeking more satisfactory policies that will increase economic and social standards of the local population. The 2002 March of the Daisies incl u d ed the water issue as a pri o rity foc u s, which underl i n es ru r a l workers’ sensibility for it. Dozens of buses wi th “d a i s i es” moved on the Brasília in order to ta ke part in the manifestation; they brought along proposals that had been decided upon during the 5th State Congress of the Women’s Mo v e m e nt held in Altamira on August 8-9, 2003. Th at year’s plights were thus s u m m ed up: land re fo rm and envi ro n m e ntal defense, ent i tl e m e nt to the land, use of land and wate r, dignified minimum wages, the right to public health with integral assistance to women, against sexist violence and all forms of discrimination, against violence in the rural areas (CONTAG: 2003).

6. PARTICIPATION OF INDIGENOUS WOMEN IN PRESERVING THE XINGU RIVER Leave the Xingu River alone is the Kayapó war cry echoing along the river. That was the same cry u tte red by the Gavião people re ferring to the Toca ntins River in the ea rly 1980’s, though th ese have not succeeded in keeping the Tucuruí plant from being built. The Apinagé Indian Charter about the Serra Quebrada dam reinforces their position against the pro ject wi th legal arguments as it evokes constitu t i o nal gu a r a ntees. The ch a rter reveals what the pro ject hides when Elet ro n o rte prese nts it to the soci et y. On the other hand, acco rding to state m e nts transcri bed bel o w, Altamira indigenous women’s movement leaders outline the arguments and position co n ce rning the dam. Th ey el abo r ate on water rel ated meanings, they express the notion of impact, and mostly they provide an outlook on the changes to biodiversity. But they also show how control over the resources will be lost as a result of those changes. […] me and my hu sband, we live off the fish. So, if th at is over, then it will be hard for us to make a livi n g, becau se we don’t know anything th at will get us a job. This is our job, either working in the woods or fishing in the river. This is where we camp, this is where we stay. We settle on the bea ch, on the river banks. So, if this is over, where are we going to live? What will become of the boulders where we fish? What wi th all th at? So, if all th at goes down under the water, how are we going to work, how are we going to fish? (Fátima Juru n a, from the Juruna people)

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An indigenous resident of Altamira recogn iz es the opposing interests in economic and social pro jec ts. [...] in the summer here there are those beaches, this beauty that Altamira is all about, a post card. But if a hydroelectric power plant comes in, all this beauty will be over. Our rel atives live in their houses by the river, where there is game to hu nt, fish to catch and crops to plant. This is all going down underwater and it is going to be very bad for us. But for the rich, for those who want to set up their i n d u s t ri es here, this is going to be good for them. But for us, this is going to be bad, and the beauty of Altamira will be over. If we have a beach, they will make an artificial beach […] (Lucia Xipaia, woman from the Xipaia people). Indigenous peoples’ manifestations about the Xingu River have been repeatedly reiterated and they are reason for new net w o rks, beyond national bo rd e r s. The envi ro n m e ntal issue and the new soci o - economic dyn a m i cs th at push the occ u p ation of their land, wi th cattle raising and soy crop activi t i es, bri n gs back to them the need to reassure their identities and territorialities. “The Altamira Indigenous Wo m e n’s Movement fights whatever may destroy our nature, something we have lived a long time […] for exa mple, the Tu c u ruí hy d ro e l e c t ric power plant: why do we stand aga i n st it? Because it’s the water. We know that the water is very important for the Indians. And not only for the Indians but for the white man as well, for those who live on the banks of the river. If the plant comes about, a lot of resources are sure to come along, a lot of things, so in the beginning it is going to be good. But it is going to be difficult when the plant is finished. We know a lot of indust ries will come that will p o l l u te the ri ver and we are going to suffer the consequences because we live here in the city and we depend on the ri ve r. Wi thout the plant now, there are lots of problems here with the ri ve r, with all that pollution.” (Ad riana Xipaia, woman from the Xipaia people)

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The indigenous peoples have recently had a painful experience virtually everywhere in the country. Th o u g ht their ri g hts are suppo rted by the Constitution, which fo rbids any use of their land wi thout their co n se nt, th ey have repeatedly been left out of hy d roel ec t ric power plant pro ject decisions. This is why chiefs and indigenous leaders of the Apinagé people from the Bo t i ca, Bo n i to, Mari a zi n h a, São José, Pat izal, Cocalinho, and Bu ruti Comp rido vi l l a ges have co nv e n ed an as sembly in Toca nt i n ó polis to discuss the res u m ed construction of twenty hy d roel ec t ric power plants on the Tocantins River. Impo rtant forums have drafted letters containing the principles behind their political proposals.15

15 Two letters written by organizations during assemblies convened at Imperatriz, in the State of Maranhão, and Tocantinópolis, in the State of Tocant i n s, are atta ched hereto. They co ntain a set of ri g hts to the te rritory and to rep roducing their cultu res as rural and urban male and female worke r s, indige n o u s, ext r a c t i vi s t, ri v e rine peo p l es of the States of Pará, Maranhão, and Toca nt i n s, and th ey re i te r ate the ca mp a i gn “Waters without Dams in the Amazon Basin”.


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WATER AND FREE TRADE

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n case it is eventually built, the Belo Monte hydroelectric power plant dam to the Xingu River represents one way of privatizing the river, at least in the tracts under the private consortium of companies as co n s i d e red by the curre nt go v e rn m e nt. It will be the first time in the Amazon th at th e State hands a large hy d r aulic power ge n e r ation pro ject over to the pri vate sector. This did not hap pe n wi th the Tu c u ruí plant, under the administration of a state-own ed co mp a ny of the Eletro b r ás sy s tem, th e E l et ro n o rte Corpo r ation. And mu ch less wi th the Balbina and Samu el plants, which remain within E l et ro b r ás. But the Belo Mo nte plant will be built by means of a pro tocol th at stimu l ates rel at i o n s between the public and the private systems (the PPP, or public-private partnerships), thus justifying the enabled funding. Instead of selling, the government prefers to speak about partnering, which is logistics tu n ed in to curre nt market movements th at push to wa rd libe r a l izing servi ces in dev eloping co u nt ri es, in strict observance of worldwide increased private interest for utilities traditionally handled by the State. Though they are energy generating projects, the key thing is the river. Considering the debates and the coalition of private interests around water resource-based services, privatization of the Belo Monte p l a nt may mean a first step toward pri vat izing other reso u rces and river rel ated se rvi ces. Local gro u ps challenging the dam rely on the project’s privatizing arguments, which justify mobilizations and negotiations against building it. Damming the river means ch a n ging the envi ro n m e ntal balance and this is why the Altamira women’s plight rep rese nts a singular co n fro ntation in the histo ry of large projects in the Amazon, and certainly in Latin America, because it brings forward into the debate a predicament that was developed upon an understanding of and an alliance with urban populations, with small and mid-size family producers in rural communities, with environmentalist organizations, and with indigenous organizations. By and large, the organizations express themselves by means of the Movement for the Development of Transamazônica and Xingu (MDTX), which is the umbrella organization of po l i t i cal rep rese ntat i o n in the co n flict, to which the women’s movement is co n n ec ted. This is so becau se the energy mat rix in the Amazon has bas i cally rel i ed on exp l o ring water reso u rces from its major river basins as stimu l ated by governmental policies that find damming rivers a great solution to face the energy crisis in the count ry’s ri cher and more industrialized regions. Generating energy for expo rt purposes is the reason beh i n d the creation of long dista n ce transmission lines th at will inte rco n n ect Belo Mo nte to the co mp l ex nat i o nal system, not excluding energy exports to foreign markets. N ev e rth el es s, little has been said in the local deb ate about GATS and WTO nego t i ations to wa rds p ri vat izing the servi ces sec to r, where the inte ntion is to include water should this pro posal make it to th e WTO as inte n d ed by the lobby of multilateral age n ci es and water sec tor co rporations. In the curre nt

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state of affairs, building a hydroelectric power plant represents a form of private appropriation of tracts of the river for market purposes. And, in parallel to selling the energy, other servi ces may be bro u g ht along, thus ge n e r ating a se ri es of enterp ri ses for the globaliz ed market. This issue is raised on acco u nt of the direction taken by international negotiations and agreements based on water as an economic good. The Brazilian go v e rn m e nt remains in line wi th this deb ate, understanding water as a good th at mu s t be eco n o m i cally regu l ated, co n s i d e ring the needs in ce rtain areas of the world and the possibility of ge nerating growth, though the legal framework retains its notion of a public and inalienable good.

1. NEW REGULATORY FRAMEWORK In the past few years, a new institutional stru c tu re was created in Brazil to handle the water issue, though a national water resources management agenda has emerged since the late 1970’s. That is in line wi th the movement in other dev eloping co u nt ri es, equally pushed by market strategi es of mu l t i l ateral agencies. In his opening address to Seminar “Water, challenge for the next millennium” held in Brasília in 2000, Pres i d e nt Fernando He n ri que Ca rd oso po i nted at the impo rta n ce of creating the Nat i o n a l Water Age n cy (ANA) and the National Sy s tem for Water Reso u rce Manage m e nt (SNRH – MMA: 2001), so m ehow integr ated to the Ava n ça Brasil Program. He co n s i d e red th at th ese new institutional a rr a n ge m e nts rep rese nted a revolution in the Brazilian state stru c tu re. New institutions like the co nt ro lling regulatory National Agencies were created as part of a reform of the state apparatus, with increasing part i cipation of pri vate age nts, so m ething he sees as a ch a r a c te ristic of co nte mporary world. Th e M i n i s ter for the Envi ro n m e nt, José Sarn ey Filho, res ponsible at the time for two prel i m i n a ry MMA plans, stated among the basic assumptions that the water in rivers and reservoirs, both for consumption and red u cing effl u e nts, must be co n s i d e red as an economic good, however mu ch he el abo r ated on th e conditions of dece nt r a l iz ed management and part i ci p ation of sta keholders in the decision maki n g. He also included side by side in his discourse elements of economic and political regulation as core dimensions for the understanding of water as a primarily economic resource. The State’s regu l atory role and the effect upon ope r ation of these institutions is key, as much as the inspiration for the legal instruments that originated the ANA and the SNRH. However, co n cep ts of river bas i n and shared manage m e nt16 coexist wi th the thesis of global management of water, which is posed in the inte rnational debate and in the multilateral age n ci es, where th ese concep ts come in as complementa ry. 98

2. WATER AND FREE TRADE: GUIDELINES BY THE WTO AND OTHER MULTILATERAL AGENCIES 2003 was chosen by the UN as the International Year of Freshwater. And it is certainly not an isolated fact. In that same year, in the month of March, the 3rd World Water Forum was held in Kyoto, Japan, where the major po l i t i calagenda foc u sed on the manage m e nt of water reso u rces. The slightly alarm i s t d i scourse on world water needs was the announced justification for a more expeditious definition of

16 Along wi th other water reso u rce regu l ations th at include State Law s, the institutional miles tone guiding po l i t i cal plans and actions, CNRH ’s Act 9.433/97 is part of the fundamental pri n ci p l es for the State’s administrative re fo rm underta ken by the Brazilian government since ea rly 1995.


goals on the access to dri n king water in the planet, where the nu m ber of people curre ntly in wa nt of drinking water should be halved and the number of sanitation services doubled by 2015. Th o u g ht the UN Committee on Eco n o my, Cu l tu re and Social Ri g hts has decl a red water a hu m a n ri g ht as well as a social and cultural good still in the latter part of 2002, this inte rnational org a n izat i o n did not react to WTO prete n ses of including water in the agenda for the 5th Ministe rial Meeting in Ca ncun for one of their major treaties, the General Agreement on Trade in Services (GATS). The Eu ro pean Union is also pushing for the WTO to inco rporate water se rvi ces. This is sel f - evi d e nt, becau se the worl d ’s major co rpo r ations in this sec tor are Eu ro pean such as Vivendi and Suez (France), RWE and Aqu a mundo (Germ a ny) and Th a l es Water and Biwater (Un i ted Kingdom). Th ese co u nt ri es a re trying to es tablish the global notion of water as a common good, which will ce rtainly bear co n sequences on the creation of new spaces to challenge projects and local policies. It is impo rtant to look at the policies th at are being devel o ped by the inte rn ational age n ci es in th e co u ntl ess Summit Meet i n gs, which are infl u e n ced by States, es pecially th ose th at have big inte res ts in ensuring future markets for this resource to large corporations, like France, Canada, and United States. Concep ts and po l i t i cal demands are also being ge n e r ated in the realm of social movements, non-go v e rnmental organizations, and other social segments. There are interests and discourses beginning to come up, exp ressing diffe re nt inte rp retations th at ant i cipate fu tu re water resource rel ated co n flicts sta rting from the idea of ownership of water and other common resources. On the other hand, the interests of States, multilateral agencies and corporations outline the social and economic dyn a m i cs at the world lev el. Deep down, what is at sta ke is water se rvi ces ownership, dri ven by an economic logic that sees water as merchandise, a product to be regulated by the market. This is why the sentence sounds so ambiguous as it is often repeated in official, state and corporate forums: it is not about ownership of water but, rather, of water treatment and distribution services, as well as sani tation. Count ri es like Chile have bylaws for ownership ri g hts ensuring pri vate ownership of hea d waters. This is why they are reviewing water access rights at the same time. In 1992, driven mos tly by large economic powers and mu l t i l ateral age n ci es, a deb ate fos te red th e i d ea of water as an economic good subject to regu l ation by the market, as an economic age nt, th e reby s h o wing increased inte rest foc u sed on th at reso u rce for the purpose of intensive exp l o i tation wi thin co rpo r ate mod els (Pet rella). Ev e nts of inte rnational repe rcussion, bringing together resea rchers form all over the world, have increasingly attracted the attention of segments that are interested in the corporate org a n ization and institu t i o n a l ization of water rel ated se rvi ces. Seen from this perspective, the water sector is rather dyn a m i c.At the same time, the inte res ts of States, mu l t i l ateral age n ci es and co rporations outline political and economic actions that are being ta ken at the world lev el. Deep down, what is at s ta ke is water ava i l ability as an el e m e nt of the public realm, inalienable in natu re, for the purposes of private access and domain. What is at sta ke is water as a good for fu tu re offer to the se rvi ces market, an offer driven by a neoliberal economy that expands to the spaces of life, to the realm of life, as sustained by Habermas, this far not negotiable in the roll of market goods. President Cardoso led services liberalization negotiations with the GATS from positions that were more aggressive than th ose of any other WTO membe r, acco rding to Ellen Go u l d .17 In th at state of affa i r s, 17 In an article titled A Posição do Brasil nas Negociações do GATS, he emphasizes the role of the Government. Böel Foundation, Berlin, 2003.

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Brazil’s role in the international scenario was important to advance exemption liberalization strategies because, according to the author, “any concessions made to Brazil, on the grounds of the most favored nation cl au se, will au to m at i cally be exte n d ed to all WTO member nat i o n s. So, US and EU transnat i o n a l co mp a n i es ahead of inte rn ational trade in se rvi ces will ta ke adva nta ge from the Brazilian bargaining pos ition at GATS.” While EU members registered a “limitation to their GATS co m m i t m e nts to specify th at they do not apply to public se rvi ces at a national or local level, which may be subjec ted to public monopolies or exclusive rights given to private operators”, Brazil asks that this impediment be removed, says Gould. Well, full GATS national treat m e nt rel ated commitments call for government subs i d i es gr a nted to l ocal suppliers be made ava i l able fore i gn suppliers as well. About the economic demands, Brazil as ks the countri es to el i m i n ate all previous stu d i es in any sec tor of consign ed se rvi ces. Imp l i cat i o n s: without this limitation to their GATS commitments, go v e rn m e nts trying to influence the dev el o p m e nt of a se rvi ce fo r soci o - economic reasons would be violating the agree m e nt as th ey limited pe rmissions to supply the se rvice. About Speci fic Servi ces in a nu m ber of areas, Brazil is requ esting to tal opening to fore i gn investment that will be limited by GATS commitments. This means that the governments would not be able to nationally, regionally or locally maintain any public monopoly of se rvi ces nor to offer any be n e fit to local suppliers wi thout extending it to foreign co mpetito r s. Wherever the public sec tor offers any of th ese services, Brazil tends to pe rmit national market co mpetition wi th fore i gn private co mp a n i es. Wi th th ese precep ts, acco rding to the paper ment i o n ed, Brazil would have no limits to its GATS co m m i t m e nts and thus would not be able to make distinctions th at would encourage a type of inv es tment that may actually benefit local economies, as the subsidiaries tend to do when compared to mere branches of a foreign company. However, the actions Brazil pushed in Cancun show a certain change to i ts positions about the se rvi ces issue. Fa l e i ros18 info rms th at Brazil and other dev eloping co u nt ri es rejec ted inte rn ational co nt rol of water in the 3rd Wo rld Water Forum in Ky o to. The Ministry of Fo re i gn Affairs advocated a position against the final text of the convention, which sought to create international water co nt rol mechanisms. Likewi se, ministers from va rious Latin Ameri can countri es co n s i d e red that this inte rn ational water co nt rol would pose a problem of sovereignty over natural reso u rces, thus opposing developed nations that support large corporate interests in that sector and, in Kyoto, advocated the creation of a type of world council that would exact poor countries to invest in water supply and sanitation plus water resource management best practices. Vast mate rials prod u ced by the WTO and the World Bank show multilateral age n ci es big inte res ts in water as an economic concept. First, there is interest inv o l v ed in regulating water as an economic good of global management; second, there is interest involved in supporting private companies so they can focus their cap i tal on water rel ated se rvi ces wi th an eye on getting inv o l v ed in supply co n cessions. The age n ci es wish to move on to wa rds libe r a l izing water se rvi ces. GATS and WTO ru l es for nego t i ations are driving more and more direct investment policies to sell to developing countries a wide range of servi ces th at were traditionally a res ponsibility of the public sector. Fu rth e rm o re, basic utilities are coming under the GATS rules, which try to discipline and restrict national rules so that foreign capital may come freely into the market, doing defi n i tely away wi th national res t rictions or regulations th at protect th ose se rvi ces from fo re i gn and transnational co rpo r ate prete n ses. This is why water is rel ated to 18 See the Valor Econômico issue of March 21, 2003, broadcast by REDEPLAN.


trade agree m e nts, where it is being co n s i d e red as merch a n d ize subject to market regu l ation. It mea n s the State may no longer have control over the water in its own territory in the future.19 Th e re is also a cl ear Wo rld Bank inte nt to open up new fi elds for the pri vat ization of water. In th e p ast few months, for insta n ce, the bank made the decision to increase action to wa rd funding large infr astructure works as of 2003. It may be mere coincidence but this is all happening right at a moment when s tate - o wn ed co mp a n i es are wi th d r awing from this sec to r. On the other hand, funds for large pro jects, i n cluding hy d roel ec t ric power plants th at have been disincl i n ed since the 1980’s due to the social and environmental impacts involved, are once again available in the Bank’s funding portfolios. Among the water related arguments presented by Multilateral Agencies and the World Bank, there is acknowledgement of a world water crisis20. The theory behind a water crisis has other corollaries such as: water is scarce and must therefore have a fair price to avoid waste; southern countries are too poor, water service investments are too high, and therefore local companies cannot afford the investment. So, the Bank’s investments must have less risk. On the other hand, the European Union countries are supporting their water companies and those that wish to enter the market wi th subs i d i es to pri vat ization projec ts and assistance to dev el o p m e nt projects in developing countries as well as supporting requests by water companies to liberalize the sector in 72 countries. The US are also keen on obtaining access to the water market and gaining negotiation space in this area. D i s p u tebet w een both blocks is ever more evi d e nt. But the main argument ju s t i fying privat izat i o n of water se rvi ces is th at this is the only way to make it ava i l able to ev e ryone. Th e re is indeed lack of water in many co u nt ri es, but a crisis is also being manu fa c tu red in order to legi t i m ize the inte rest for more technical solutions by the expert market. During the 5th WTO Ministe rial Meeting in Cancun, Vandana Sh i va argu ed about social movements real co n cerns wi th the pos s i b i l i t i esof re m o ving agri c u l tu re from the org a n ization’s age n d a. Organic agriculture prese rv es the soil, acco rding to the res u l ts of economic research. So, she argu ed th at, by suppo rting organic agri c u l tu re, five times more food could be prod u ces wi thout increasing the use of water, wi thout losing the rivers and the cultu re th at goes wi th them, or wi thout looting what “is ours in order to go on and sell what we hav e”. It is always good to re m e m ber th at behind the sce n es a market dispute is be i n g waged between the US and the EU and, therefore, the biodiversity protocol that facilitates the maintenance of co mp l ex agri c u l tu re sy s tems is not inte resting for developed co u nt ri es becau se large co rpo r ations lau n ch ca mp a i gns wi th goals th at are to be met and forwa rd ed to the ent i re world. Cont r a d i c to ry environmental discourses are thus confronted that cannot hide market interests. This debate became cl ea rer wi th the manifes tations from social organizations from diffe re nt countri es and co nt i n e nts rep rese nted in Cancun21 and in the interaction of social movements and NGO networks where th ree pri o rity th e m es were es tab l i s h edas social movement strategi es: wate r, human ri g ht, and agri c u l tu re .

19 So, private water and sanitation se rvi ces inves t m e nt are not pri o ri t iz ed where th ey may be most neces s a ry, for insta n ce, in rural areas or small towns, but rather in big cities as a result of the larger density of potential consumers. 20 When mentioning water cri s i s, one usually fo rgets th at 70% of the used water goes to industrial size agri c u l tural systems and not to the small food production systems. 21 Water Forum held by the Böll Foundation after Cancun, 2003.

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N o rth Ameri can co mp a n i es exerci se a gro wing domain over world expo rt of se rvi ces. As th ey co ntrol 18.8% of the world se rvi ces market, the US expo rt twi ce and a half more than the UK, their cl osest co mpet i tor. Latin Ameri ca, in tu rn, res ponds for 4% of world expo rt of se rvi ces and Afri ca for a mere 2.2%. Only five dev el o ped nations retain 53% of the worl d ’s insurance exports; 73% of cultural and recreat i o n a l expo rts; and 74% of fi n a n cial se rvi ces exports; and th ey obtain 87% of all revenues accruing from ro ya l t y and lice n se taxes, wi th the North Ameri can co mp a n i es receiving more than half th at to tal (apud Gould: 2003). Stat i s t i csshow th at Brazil, acco rding to the au thor, impo rts many more se rvi ces than it expo rts— 11.9 billion dollars in impo rts and 6.8 billion dollars in expo rts—a situation th at can only get worse gi v e n the mod es of extensive libe r a l ization of se rvi ces th at Brazil would be seeking in the GATS nego t i ations22. A sign of large corporations’ attentive eye for water sources, wherever they are to be found, is in the recent negotiations over the Guarani aquifer. World Bank representatives met with the governments of Brazil, Arge nt i n a, Uru gu ay and Paragu ay in May 2003 in Mo ntevi d eo, and deci d ed to ca rry on with a research project on an underground water source that is the world’s largest freshwater reserve and that crosses the territories of all these countries. They named it Sustainable Development and Environmental Pro tection Project and sta rted nego t i ations to wa rd inv esting some 27 million dollars in which th e governments of Germany and the Netherlands would participate, plus the International Atomic Energy A ge n cy and the Organization of Ameri can States. As Are n cibia23 info rm s, this agree m e nt means th at s t r ategic information on the most impo rta nt underground fres hwater rese rve in the region, “a l so cons i d e red the largest in the world, will be managed by th ose who provide the funds for the pro ject. Connected to large economic groups and transnational corporations, they will master the knowledge generated for years during research development by Latin American universities.”

3 - CORPORATE DOMAIN OF WATER IN LATIN AMERICA AND BRAZIL

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All over, water is dominated by two French transnat i o n as, Suez and Vivendi, which co nt ro l two th i rds of pri vat iz ed water se rvices worldwide. The other large co rpo r ations are Sau r, Th a m es, Anglian, and IWL. In Latin Ameri ca, the major company in activity is Su e z, which ope r ates in Arge ntina and Brazil, and in nea rly all co u nt ri es th at have already pri vat iz ed water sy s te m s. The first pri vat ization in Brazil also bel o n gs to Su e z, in the mu n i cipality of Limeira24, in the State of São Paulo, and their operations can be seen in a nu m ber of ci t i es, including Manau s, in the Brazilian Amazon. Their se rvices include co l l ecting, treating and supplying drinking water. It is certainly not possible to anticipate how the situation will evolve, but it is not comfortable for the State, for the civil society, or for the company. The fo l l o wing ch a rt shows some data of the prese n ce of Suez and Vivendi-Violia in the water se rvi ces 22 Pl ease ch eck: http://www.rebrip.org. b r;www.planetapo rto a l egre . n et; www.world-psi.org; www.psiru.org; www.terceiromundo.org. b r; www.irn.org. 23 Fabiana Arencibia - fernandoramirez@igwc.org, information disseminated by Red Eco Alternativo. 24 Vivendi and Suez are the worl d ’s largest water rel ated se rvices co rpo r at i o n s, the fo rmer being the 51st and the latter the 99th in a ranking of the first 500 largest fo rtunes in the world (Fo rtu n e’s Global 500 ment i o n edMarkus Krajew s ki – GATS? What is at sta ke? BROT – www.brot-fuerdie-welt.de – distri b u ted in the Boell Fo rum of Cancun, Sep te m ber 2003). Together, they co nt rol and co l l ect 40% of water market existing qu otas. Ge rman RWE follows ri g ht after in the 3rd p l a ce, having acqu i red UK gi a nt Water Works. Other large water co rpo r ations are Bo u y gu es / S aur, US Watder and Sev e rn. Th ese co mp a n i es’ customer base regulates an ap p rox i m ate 50 million consumer market for their se rvi ces.


market in ci t i es and municipalities of Brazil. The greatest concentration is found in the southeas te rn part of the country, but privat ized water and sewer services companies can be found all over the other regions as well. Chart 2 – Privatized water services in Brazil Brazilian State

Municipality/ City

Company Name in Brazil

Foreign private company

Funding

Concession year

São Paulo

Limeira

Águas de Limeira

Suez

-

2000

Amazonas

Manaus

Águas do Amazonas

Suez

BNDES

2001

Mato Grosso do Sul

Campo Grande

Águas de Guariroba

Suez

-

-

Paraná

Curitiba

Sanepar25

Vivendi

WB-IFC Bank

2001

Mato Grosso

Centro Oeste do Mato Grosso Chapada dos Parecis

Tangará da Serra

Águas de Portugal

-

2001

Rio de Janeiro

Região dos Lagos Cabo Frio, São Pedro d´Aldeia, Iguaba Grande, Búzios and Arraial do Cabo (cinco municípios)

Prolagos26

Suez

EIB Bank

2001

103 Source: Data obtained from ABCOM and ASSEMAE, from company documents and web sites. 25 SANEPAR is a mixed eco n o my soci ety co nt ro l l edby the State Government of Paraná, whose strategic partner, as re fe rred to in offi cial doc uments, is Dominó Holding S/A, which is composed of the following corporations: Andrade Gutierrez Concessões S/A (27.5%), French-owned Vivendi Environmental S/A, Oportunity Daleth S/A, and Companhia Paranaense de Energia/COPEL. Dominó Holding S/A acquired 39.7% of SANEPAR in June 1999. Though the city of Cu ritiba co n ce nt r ates more than 30% of SANEPAR’s water and sewer se rvices co n s u mption, and this is why the concession contract is concentrated on the capital city, the company covers 342 of the 499 municipalities in the State of Paraná and, before the rights were granted to Dominó Holding, the company boasted good references on account of quality public services rendered. 26 Wi th a co n cession time span of 25 yea r s, the water and sewer services conces s i o n a i re Pro l a gos is co mposed of Águ as de Po rtugal/AdP (12.5%); Empresa Brasileira de Águas Livres/EBAL (80.0%); and Empresa Portuguesa de Águas Livres/EPAL (7.5%).


In Manaus, water treatment and distribution plus sewer services are being disputed by the population. The local government had pas sed manage m e nt of th ese se rvi ces on to the State, and it is ex a c tly th e State that starts to privatize the sector by selling the public company in 2001 as a concession to French company Suez, legally incorporated as Águas do Amazonas (“Waters of the Amazon”). A lawsuit bro u g ht against the co mp a ny seeks to suspend the 31.5% increase to water ta ri ff s, the th i rd co n secutive increase wi thout the co mp a ny’s enhancing their se rvi ces net w o rk in the same pe ri od of time. Proceeding, increased tariff charges were suspended for three months. Another lawsuit requested voiding the co ntract on the grounds of non-co mp l i a n ce wi th nea rly all cl au ses. One of the impacts of privat izing water se rvi ces can be obse rv ed here, and th at is the wea kening of insta n ces of the local power w h i ch were traditionally busy wi th supplying wate r. On the other hand, the po p u l ation do not kn o w exactly where to voice their complaints against corporate non-compliance with contract terms since the State Regulatory Agency, created by the very State, just stands still. The conclusion drawn by users in Manaus is the same that has emerged from other cases of privat iz ed public co mp a n i esin a nu m ber of co u nt ri es th roughout the world, and th at is the curre nt state m e nt about the efficiency of private services compared to those provided by the public system. Private companies are not necessarily more efficient than public companies. When it comes to funding, it eventually co m es from the public sy s tem, challenging the argu m e nt devel o ped by the Wo rld Bank when th ey emphasize how insuffi ci e nt State reso u rces are to co pe wi th the needs of better quality and broader co verage in water related services.

4 – THE WORLD BANK RESUMES FUNDING LARGE DAMS

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Si n ce the late 1980’s and th roughout the 1990’s, when the environmentalist disco u r se was at its highes t, the Wo rld Bank sto p ped funding large hy d roel ectric power plant pro jec ts in fa ce of the pres s u re exe rci sed by envi ro n m e ntal and social movements. Belo Mo nte, in the Xingu Ri v e r, was one such dam in Brazil th at was suspended due to lack of World Bank funding. But th e re have been changes and th i s institution is now in tune wi th the repo rt by the Wo rld Commission on Dams and the Jo h a n n esb u rg Summit whose reco m m e n d ation was to stimulate pri vate sector push to libe r ate the se rvi ces market. This trend pri o ri t iz es large infr as t ru c tu re projec ts. In Brazil, ongoing proces ses lead to libe r a l izing hydraulic energy trade within the GATS objectives. Furthermore, large corporate interests on dams still lie on the table, according to a Brugger 2003 research. The Camdessus Report clearly reveal their intentions to invest and change developing countries regulatory framework. Standing on two pillars, large scale projects and private sector participation, the Camdessus Report has become a key el e m e nt of pri n ciples to guide the ap p ro a ch to States. Is not mere ch a n ce th at th e World Bank trend is to support and fund large enterprises, and they have already been reinstating their funds and negotiations with other multilateral agencies for large hydraulic infrastructure projects. Neve rth el es s, it is the public sec tor th at remains a major source of funding for the water sec to r. However, this is the same source of funding, endorsed by the States, that will facilitate private sector participation and not necessarily new resources brought in by the companies. At the same time, well, we know that funding large enterprises further increases national debts and the countries’ political vulnerability before the IMF and the World Bank.


Camdessus Report and World Bank’s recommended model is to leave water supply in the hands of the private sector or, if necessary, of mixed companies (private-public). This model is being adopted by Brazil in the Belo Monte case where the participation of the State is intended but with significant prese n ce of the pri vate sector27. For the local actors, this means pri vat izing this large infr as t ru c tu re work. The pri vate -public associ ation was an alte rn ative the Lula Ad m i n i s t r ation found to resume the large hydroelectric power plants construction program in the Amazon, where Belo Monte would be the first.

5. GLOBAL MOVEMENT FOR WATER AS A PUBLIC GOOD When it co m es to wate r, the world is divi d ed between, on one side, th ose who advocate libe r at i n g the market, strengthening the globalized economy where water is an economic resource and this is why their focus is growing privatization of services that used to be provided by the public system, and on the other, civil society organizations in line with understanding water as a public good, based on ethic principles of human rights and codes of culture. But one question remains, and that is to know if large corporations are already interested in the water market from large hydroelectric power plants? Well, the hy d roel ec t ric power plant is not stri c tly a direct mode of pri vat izing water. Neverth el es s, this as sociation beco m es sel f - evi d e nt in the ongoing nego t i ations wi th the World Bank and the GATS as a result of water co rpo r ations push for large ente rp ri ses, including dikes and dams, and also as a res u l t of the push by building contractors and various providers of related services. On the other hand, having left funding of large hydroelectric projects back in the 1980’s due to civil society manifestations in many co u nt ri es all over the world and to resea rch res u l ts showing severe social and envi ronmental imp a c ts resulting from th ose large pro jects, the Wo rld Bank now bri n gs them back into their agenda, segueing negotiations about trade liberalization and the development of new funding protocols. The 1st Wo rld Social Water Fo rum held in Florence in March 2003 brought together represe ntat i v es from various countries that are interested in the debate on access to water resources as a common right and, therefore, in the realm of human rights, watching the developments of the Kyoto summit meeting. There were efforts to institutionalize a forum of proposals that could indicate policies that would bring the water issue together with proces ses for part i cipation and democr at izing access to water as everybody’s ri g ht, recogn izing the possibility of local arr a n ge m e nts that would sat i s fy ea ch country’s or region’s social, economic and environmental cri te ri a. This is a key ethic pos tu l ate becau se, like what happens with the other natural resources, access to water also reflects power structures and social inequalities, certainly encroaching in the realm of human rights. Social differences are underlined, for instance, in cities like Lima and Mexico, with regards to access to services, or in the favelas of Rio de Janeiro and São Paulo. Access to water in the ci t i es has depe n d ed upon economic conditions of local actors and their relative bargaining power within the political game in search for right to urban services. The Forum’s consensus was to propose a special session to the UN in order to discuss and approve a World Water Contract bound by the principles of the human rights, referring in this case to the right

27 Government bets on public-private partnerships to increase investment capacity of the Economy. Hugo Studart and Renato Mendes. VEM AÍ O PPP (Here Comes the PPP). (Isto É-Dinheiro – August 02, 2003) http://www.irn.org

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to access to wate r, in order to curb the movement of pri vat izing supply se rvi ces, thus reassuring th e inalienable individual ri g ht to life, where water is a key public good. The creation of an entity called Wo rld Water Au th o ri t y, at the institutional lev el, leav es an open possibility of fi l te ring argu m e nts th at will come from local experiences. In Brazil, civil society reactions to the water predicament have been organized around a number of spaces that thus constitute the Citizenship Movement for the Waters. In 1997, this movement stood to defend the development of new concepts that can cover formal and diffuse individual interests, threatened, as they saw, by the dissemination of interpretations that consider water an economic good. They u n d e r s tand advoca cy of water as a public good to be a key factor becau se it is based upon pri n ci p l es th at refer to the reproduction of life. In their agenda, there is now an item for the collective development of new practices th at will inco rpo r ate fundamental individual ri g hts to this new co ntext of an arena of globalized struggle. A review of civil, political, economic, social or cultural rights is paramount for the legal d i a l og to wa rds the ach i ev e m e nt of full ci t izenship and enfo rcing it at the local lev el. De fending use of and access to water, in this perspective, is understood as mainstream in the struggle to wa rds citizenship. Groups advocating water as a public good fa ce pri m a rily co rporate acto r s, such as Coch abamba in Bo l i via and Manila in the Ph i l i p p i n es. On one side lie the inte res ts of a globaliz ed eco n o my and busines smen, who look at pri vat ization for pro fit making and reso u rce acc u mu l ation; on the oth e r, all of th ose who see water as a common public good —the beginning of life —w h i ch th e re fo re lies in the realm of commodities that have always been part and parcel of the State agenda. How does the Amazon fit in this pri vat ization dyn a m i cs? How far do globalized decisions and a ge neralized process of neo l i beral privat ization resound at the local lev el? What role does the women’s movement play in this debate? It is important to look at IMF, WTO and World Bank strategies, and to unders tand, at the same time, co rpo r ate inte res ts on the region’s natural reso u rces. Examples are nu m e ro u s, r a n ging from mining (pri vat izing the Vale do Rio Doce co mp a ny) to log ging (Asian purch ase of Amazonian companies), through services (privatizing state-owned companies in the electric sector) and privatizing water services (Amazonas state owned company sold to the Suez Corporation). The Belo Monte hydroelectric power plant, the first owe to be built, is but an emblem of this broader process of fu rther mercant i l izing the Amazon. The co rpo r ate logic is to exploit at all cos ts, from fores ts th rough rivers to the underground and the traditional knowledge of biodiversity and active pharmaceutical principles. This privatization and appropriation process has borne exclusion and poverty to l ocal po p u l ations becau se it is based on a wea l th conce nt r ating mod el. This is why the struggle against dams in Brazil has ta ken up larger pro po rt i o n s, as the conflict re fers to models th at oppose devel o p m e nt. The imp a c ts of large hy d roel ec t ric power plants are multiple, and be fall women in particular when it comes to neoliberal policies that seek to subordinate life to market precepts. As it is, the issue resides in the realm of human rights: the right to water, quality water; the right to free rivers of common use; the ri g ht to eth n i cal te rrito ri es bel o n ging to indigenous groups th at are unavoidably connected to the Xingu and to the culture of water as an element of local identity; the right to access to water in the homes, by means net w o rks for the supply and sanitation of the ci t i es and by means of alternative safe ways in the countryside that will do away with the women’s painful job of carrying water in buckets balanced on top of their heads; the right to be able to engage in another model of development that is neither privatizing nor excluding.


Ex a c tly becau se the greatest biologi cal diversity and one of the planet’s major fresh water depos i ts are concentrated in the Amazon, not to mention large tracts of land that still retain their natural forest coverage28, the region is extremely appealing to the new worldwide interests. Reproducing biodiversity is directly connected to preserving land and water ecosystems of the flora and fauna29. But actions and strategies toward a global management of water are still restricted to State summits and multilateral age n ci es. Civil soci ety reactions to a process th at has not been wi d ely disc u s sed but bears high social relevance boom in different forums, and gain visibility such as the Citizenship Movem e nt for the Wate r s. Th ey are keen on dev eloping new practices th at can inco rpo r ate key individual rights in the context of an arena for globalized struggle. Other social movements associate in search for s t r ategi es to stand up to offi cial actions by States and Mu l t i l ateral Age n ci es, such as th ose obse rved in the past few years in Brazil. The current national debate about River Basin Councils and their management is a good ex a mple, however ill applied, of how this po l i t i cal arena is co mposed of tensions and co nflicts, holding still, though, the possibility of relying on diverse state, business or civil society actors.

6 – SOCIAL MOVEMENTS’ AND WOMEN’S ARGUMENTS Some of the argu m e nts dev el o ped by the social movements and the women’s movement to stop projects and dams on the Amazonian rivers rely on the principles of human rights. ARGUMENT 1 – For a large portion of the po p u l ation in Altamira and neighbo ring munici p a l i t i es, “privat izing a ri v e r” means usurping co m munity ri g hts rel ated to a nu m ber of se rvi ces— bo th material and sym bo l i c—p ro vi d ed by the river, which include dri n king water supplies, ofte ntimes by means of alternative uses. In this context, the women feel totally concerned about the struggle to preserve rivers without dams. ARG U M ENT 2 – Conce rning the ri g ht to water so u rces and their prese rvation, building dams evi d e ntly means passing ones’ ri g hts to oth e r s, th at is, the ri g hts move away from the hands of Xingu River banks population who have traditionally inhabited this territory. ARG U M ENT 3 – In te rms of an eco n o my of the water, th e re are co u ntl ess developments of the curre nt world trend to stru c tu re this sec to r. Let’s see: in offi cial Wo rld Bank and WTO offi cial doc u m e nts, these trends show that the interest for the water market, big business in the new millennium, extrapolates, by far, the current scene of drinking water and sanitation services. In the bulk of commitments that Brazil may eventually make, ownership is not to be refrained from going to foreign hands nor are the governments to res t rict part n e r s h i psbet w een fo re i gn inv es tors and local co mp a n i es (Gould: 2003). This is ce rtainly an open door to the multiple servi ces emerging from this market, and th at is where Wo rld Ba n k interests start to be seen as they resume their support to large projects and whose documents mention

28 B i odiversity in the Brazilian Amazon: eva l u ation and pri o rity actions for the conservation, susta i n able use and sharing of be n e fi ts. Capobianco, João Paulo R. et. all (organizers). São Paulo: Estação Liberdade: Social Environmental Institute, 2001. 29 The Brazilian part covers a 6 million km2 area that corresponds to 61% of the national territory. The planet’s existing biodiversity is located in so u th e rn co u nt ri es, including the Pan-Amazonian, the Latin Ameri can, the Central Afri can co u nt ri es as well as the island-nations of th e Asian world, regions that concentrate most of the world’s poor.

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d i kes and dams, bo th related to water strea m s. This is why our argu m e nt po i nts at not considering a hydroelectric power plant as a mere energy pro jec t. In the curre nt state of affa i r s, it is also a market pro ject for water and natural resources, th at used to be outside the merca ntile co ntext, a pro ject th at ch a n ges river conditions and appropriates it for energy purposes. Once the Xingu River water market is open, a correlation of forces in the economic game is what will determine its course. ARGUMENT 4 – Traditionally, this region is occupied by land workers, native peasants for many generations or th ose co mposing the th ro n gs of migr a nts coming in co l o n ization programs during the 1970’s. K n o w l ed geable about plants and animals, which se rve their healing sy s te m s, women workers will be directly affected by changes to the river, to its course and banks, and to free access to its headwaters and biodiversity, which have, for millennia, allowed them to cure their diseases and produce their food. On the other hand, though rain water suffices for their crops, there is a tradition of cultivated plains relying on the water regime of large and small strea m s. So, the inte ntion is to ch a n gepeas a nt sy s tems of prod u ction and to ignore these women’s knowledge, which will be altogether suppressed with the loss of access to the resources. ARGUMENT 5 – For the social organizations active in Altamira and in the Transamazônica region, ap p ro p ri ation of the Xingu River for the purposes of generating el ec t ricity should involve all of th ose who are likely to be affec ted by such decisions wi th impacts upon their curre nt social and economic organization based on water management practices that are classified in their knowledge systems about biodiversity in the Xingu. If the 1990’s have valued such traditional people’s knowledge, as it represents mankind’s cultural heritage and a wealth without which biodiversity would neither have replicated nor enhanced throughout the centuries, now all of this accumulated riches is being treated with contempt. ARGUMENT 6 – Rivers are part of basins that cut across mu n i ci p a l i t i es, states and even co u nt ri es, which means diverse cultural systems and different management of and expectations about social uses, h aving generated co mp l e m e ntariness or even co n fl i c ts, though rel evant confl i c ts in Pan-Amazonian supranational basins have not been reco rd ed this fa r. Given the very natu re of this theme, a pred i ca m e nt already lies therein which cannot be overridden as a result of immediate interests, foreign to the context of these local and national groups and their institutionalities. ARGUMENT 7 – The experi e n ce of the Tucuruí hy d roel ec t ric power plant, built and run to date by state own ed Elet ro n o rte, a part of the National Elet ro b r ás Sy s tem, is the reference upon which local po pu l ation seek suppo rt to reject the co n s t ruction of a Xingu co mp l ex of hy d roel ec t ric power plants. Th e rel ationship es tab l i s h ed bet w een the co mp a ny there and local or eth n i cal socio-economic stru c tu res has not only been authoritarian but also hierarchical. Compensation received by the populations who have been displaced from their settl e m e nts and vi l l a ges, from their ranch es and fa rm s, have been minu te. Th e land issue, for instance, and conflicts resulting from tension over land and resources has only increased this far. Also, some studies have revealed fits of depression hitting mostly women, showing though that the impacts have ge n e r a l iz ed for bo th men and women as a result of socially defi n ed responsibilities related to the process of social and cultural reproduction. ARGUMENT 8 – Though initial nego t i ations have been pro m o ted by state own ed Eletronorte, it is d e fi n ed th at the ente rp ri se will be conducted and then run by the pri vate sec to r. This bri n gs up the inte rests of national private companies that intend to associate with foreign companies in order to administrate this big business, which will become the energy system, connecting a series of other services, such


as supplying to the relative demand for water, for tourism and so on. Besides, as observed in the municipality of Tucuruí, production of local be n e fits is scarce, even when job creation and ca re for new health, sanitation and education demands are taken into consideration. These demands, that will increase as a result of greater migr ation than curre nt local cate ring cap a ci t y, will be met with taxes paid when th e enterprise starts operating. ARG U M ENT 9 – As dev el o ped wi thin a single reductionist vi ew and fo rm atted in the wa ke of profit m a king inte res ts by large co rpo r at i o n s, pri vatizing proces ses affect the lives of gro u ps and persons. Th ey change their lives and the sy s tem of ri g hts in which th ose pe r sons and gro u ps inscri be their history, wi th eth n i cally co rrect justifi cations, th at is, in behalf of social equity and envi ro n m e ntal preservation for future generations, coupling the term “sustainable development” thereto. ARG U M ENT 10 – In all situ ations shown this fa r, women and ch i l d ren are most affec ted, becau se their ri g hts are ch a n ged and so is their sy s tem of life and va l u es, in which families raise their young. And th ose ri g hts th at are ch a n ged are the basic human ri g hts, the ri g ht to life, the ri g ht to unhindered rep rod u ction, and the most elementary human rights such as the right to water, which is one of the priorities of the Declaration of the Millennium. These issues are to be fundamental in the realm of developing economic po l i ci es, at the lev el of ea ch co u nt ry, but also in dev eloping co n cepts th at will red u ce economic ambitions and ensure minimal global governance. In effect, heed l ess of the imp a c ts th at result from pri vate inte res ts and ge n e r ating ever larger foreign debts to the country in exchange for benefits to transnational corporations at the expense of the entire sy s tem of ri g hts dev el o ped th rough times, a sy s tem which translates into quality of a life th at is fully integrated with the river, these global policies will not uphold development—let alone sustainable developm e nt—but rather a co n servative and unequal mod e rn ization, bes i d es nu rtu ring social co n fl i c ts in th e region as well as potential conflicts between cultures and even countries. Sources of fresh water all over the world are the core interest of large corporations operating in this sec to r, as th ey ca l c u l ate a market po te ntial of over 30%. Wouldn’t the market be inte rested in inv es t i n g exactly in the region where this resource is most abundant in the planet? Th e re is gro wing cri t i cism against pri vat ization in ex a mp l es from Bu e n os Aires, Manila, Ja ka rta, and from the South African city of Nelspruit, including “safe markets” such as Europe (Piller: 2003).

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WOMEN’S AGENDA FOR REGIONAL DEVELOPMENT

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n insight into pri vat izing se rvi ces— i n cluding energy—and the situ ation of increased social exclusion throughout the world shows that women also suffer impacts due to their condition of fragility in the labor market. This is also a social inequality. And it reflects in the feminine agenda, which increases as these new themes come in and develops an urgency driven dynamic. The point, therefore, is to know how the macro-agenda affects the local ones30. Access to water is an impo rta nt indicator if one is to assess the social inequality and exclusion imposed upon a large portion of the population, namely those who live in urban peripheries, and which is far from being a large city pred i ca m e nt. The sca rcity issue is the same as the social exclusion one, which implies non-democratic access to services31. Another order of impact upon women is envi ro n m e ntal, considering the sensibility and the rel at i o nship built on social te rms wi th natu re and its fo rms of prese rvation, a theme th at has been wi d ely disc u s sed in the speci a l iz ed lite r atu re and plays an impo rta nt role in the deb ate about the mod el for nat i o nal development and the impasses of its socio-environmental sustainability. 1. Global agenda for women’s rights

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For 12 years now, the Women’s Movement has pushed the municipal and state powers with a list of p ro posals and reco m m e n d ations about po l i ci es th at will imp rove the conditions of life for rural and u rban families who live in the 13 mu n i ci p a l i t i es of the Transamazônica and the Xingu River. Su ch recommendations include:

30 At the same time, the issue that has been raised is how to influence the macro agenda based on the new forms of struggle that are coming up in the women’s existing local agenda. 31 The Brazilian As sociation of Un d e rground Waters has shown th at this reduction is due, loca l l y, to diso rd e rly gro wth of the ci t i es, to increased pollution of water strea m s, to the use of agro - chemicals in crop lands, to industrial cl eaning fl u s h ed into rivers and lakes, to defo res tation, to burnt oil from river and maritime navi g ation, to overall garb a ge disposed of on co as tal ci t i es and po rts, among other imp a c ts of anthropic action upon ecosystems. All economic activities need water, but care for water he, lakes, and fountains.


• Dev eloping a transparent and eg a l i ta rian system that will ensure women’s rights to public services and dri n king water in particular with home supply, considering ci t izenship attainment also through access to wate r; • Ensuring the ri g ht to regional fo rest ri ch es and to the land th at rural workers cultivate, as well as the right to the Xingu River waters that serve everybody and provide most of many people’s livelihood. • A Xingu River without dams and negotiation/pri vat ization co nt r a c ts: energy solutions for th e region must come from small projects or from the existing large Tucuruí hydroelectric power plant (the 4th in world pote ntial and energy ge n e r ation), which is located in municipalities th at are cut across by the Transamazônica Highway. • Enhancing the po te ntial of Xingu River uses in order to offer job and income opportu n i t i es to women, which are not addressed in the model of economic activity concentration by a single large company and for the single purpose of generating energy. • The right to work, with skill development programs for women. • Polici es foc u sed on paving roads and pro viding sewer sy s tems and treated water for all municipalities. • A model that is capable of encouraging appropriate development for the Transamazônica and the Xingu and in which production and nature are spared their significant part. • Lines of funds for companies th at will industri a l ize raw mate ri a l s, adding value with brands and design that are connected to the image of environmental conservation. • Exposing FTAA and WTO trade agree m e nt nego t i ations to larger fo rums (local, national, and i nte rnational). M M CC’s 5th State Congress held in Altamira August 8-10, 2003, “The Amazon Viewed by a Woman’s Ey e”, featu red the water is sue as on of its major th e m es. Th ey re i n fo rced the proposal th at another type of development is possible for the Transamazônica and the Xingu, without dams or privatization and with the development and preservation of water resources. Some of the major water related goals are to maintain hydroelectric power plant free rivers and universal water services provided by the municipal public system. Wi th the theme “Eth n i cal diversity of the Amazonian women: the whites, the Indians, and th e blacks, in their mixed fo rm s ”, the Congress opening panel featu red indigenous female rep rese ntat i v e Tuíra from the Gorotire village as guest of honor. Various segments of rural and urban women also sent their representatives, who came from different municipalities in the State of Pará. R ecogn iz ed by Indians and whites alike, Tuíra (from the Kayapó people) stated the need to hold great meetings to show the world beyond Brazilian borders that they do not wish to have hydroelectric power plants in their land becau se of the imp a c ts upon the lives of women, men, ch i l d ren, upon the rea ring of their children, upon their agricultural produce and extraction, and upon the reproduction of their cultu re. Indigenous women consider maintaining the cultural rel ation wi th river waters around and across their territories to be an inalienable right of their people. MMCC women’s proposals are in synchrony with the principles of the UN Universal Declaration of Water Rights, in that they explain: “Water is part of the planet’s heritage. Each continent, each people, each nation, each region, each city, each citizen is fully responsible in the eyes of all”

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… “the balance and the future of our planet depend on the pre s e rvation of water and its cycles, which must remain intact and working normally to ensure the continuity of life on Earth. This balance depends part i c u l a rly upon the preservation of seas and oceans, where those cycles start.

In their Confe re n ce, the women co n cl u d ed th at ch a n ges to this quality mean a suppression of human rights to conquest and ancestor territory. Their proposal points at searching for energy alternatives th at will neither vi o l ate women’s ri g hts nor cau se enviro n m e ntal damage. It is th e re fo re in line wi th the Decl a r ation adopted by the 4th Wo rld Women’s Confe re n ce held by UN in 1995 in Beijing, China, within the theme “Women: Action for Equality, Development and Peace”. Recognizing the relevance of women and upholding “conditions of equality, in all social spheres, including part i ci p ation in the decision making and access to power”, considered key to meet those principles of equality and development. The discussion on environmental sustainability is transversal. And this is why it pervades nearly all social movement themes that have to do with territory. Women discuss concepts of sustainability at the l ocal and regional lev el, pointing at strategi es of po l i t i cal org a n ization th at allow them to dev elop proposals of policies focusing on production and on participation in local decision making bodies, and that will express their demands for sanitation and networked drinking water services to the home, as a result of Water Citizenship campaign mobilizations. Thus, decision making against privatizing public goods has been a women’s movement banner for a while now. Th e re are no local stru c tu res for popular part i ci p ation in water manage m e nt this fa r. So, people participate by means of the Women’s Movement pressure in articulation with the MDTX. The issues pushed this far are sec to rial as well as regional in natu re, since th ey co nv e rge to wa rds m a cro proposals of regional dev el o p m e nt wi th social and envi ro n m e ntal res ponsibility th at focus on th e specificities of women’s rights. This is why they underline the impacts big enterprises may have on their rights, in this region where legality and respect for the institutions are rather fragile. Efforts against violence, for the ri g ht to quality sch oo l s, for ensured hea l th care and dri n king water access se rvi ces, pe rva d e the strategies for the inception of a regional dev el o p m e nt mod el th at will live with the diffe re n ces and include those segments that have been kept outside the realm of fundamental rights. Transamazônica and Xingu women’s part i cipation in these efforts have part i c u l a ri t i es th at are th e result of the place they occupy in the social and sexual division of labor, and certainly a result of production and work spaces related to the river and the forest. Such processes have proven relevant during the women’s mobilizations and in their sensitivity to the impacts of large dams upon their rights. 112

2. TRANSAMAZÔNICA AND XINGU WOMEN’S MOVEMENT AND REGIONAL DEVELOPMENT In short, the women’s movement takes place in the debate on regional development with the following propositions: • Acknowledgement of women’s multiple roles: economic, social, and cultura; • Increased part i ci p ation of women in decision making proces ses, in org a n izations represe nting ci vi l society, and in negotiation and decision making forums;


• The notion of water as a public good as well as a key and inalienable human right; • Against the implementation of large scale infrastructure projects such as mega dams that are neither ecologically nor socially sustainable; • Overcoming the existing inequality between men and women in terms of access to, management of, and rights to water resources and to drinking water; • Res pect for and pro tection of water and fo rest ri g hts and knowled ge of traditional populations, including peasants, indigenous peoples, fishermen, and others. Women’s gro u ps co n clude th at the State’s relinquishment of social se rvi ces has been co n d u cive to a reduced volume of reso u rces ava i l able to pay for th ose public se rvi ces. Corporate pressures to wa rd pri vatizing those services and increased fees have weakened social medicine as well as cooperative systems, with dwindling knowledge of traditional cures and products as a consequence. When sectors such as health, ed u cation and social sec u rity are wea ke n ed, women are most affec ted becau se they are suddenly overburd e n ed wi th tending ch i l d ren, el d e rly, and the sick. Th ose gro u ps fu rther recogn ize th at men and women are distinctly affected due to the diffe re nt i ated places th ey occupy in family and job rel ations. In short, Transamazônica and Xingu women uphold the major plights of the nationwide and worldwide women’s movement. In the perspective of political action, they consider that macroeconomic and trade po l i ci es must res pect economic, social, political, ci vil, and cultural ri g hts in general, including women’s ri g hts, in order to incre m e nt basic se rvices, to remove obs ta cl es to the participation of women, to el i m i n ate all fo rms of violence against women, to ensure ed u cation, hea l th and sanitation, bes i d es economic freedom, in the family and in the workplace. It is impo rta nt to understand and pro tect the dyn a m i cs of the ecosystems, the fo rest and the ri v e r basins in order to pro m o te equ i table human dev el o p m e nt. The rivers contri b u te to the equ i l i b rium of the ent i re Amazonian region and this is why changes to them call for a lot greater knowled ge of the river system because, further to knowing its dynamics and functions, it is necessary to consider the system as a whole, as an integr ated and well balanced macro sy s tem, wi th nu t rients th at enable reinstate m e nt of food chain cy cl es and energy flows, where human life is possible wi th its co mplex, bo th mate rial and symbolic manifestations.

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ANNEX 1 The Suez Corporation in the Amazon: privatizing water and sewer services in Manaus (State of Amazonas) Over 30 years ago, the Mu n i cipality of Manaus had gr a nted water supply and sewer treat m e nt manage m e nt to the State. State own ed co mp a ny COS AMA, in ch a rge with supplying water and sewer se rvi ces to the city of Manau s, is sold by the State Government to the largest water sec tor co rporation, a Fre n ch owned co mp a ny named SAUR. The new co mp a ny named à guas do Amazonas (Waters of the Amazon) rece i v es the assets and signs a ge n e rous co n cession contract wi th the ri g ht to exp l o re th ose servi ces to a nea rly one and a half million po p u l ation for a period of 30 years, th at can be exte n d ed for another 15. Goals Sold in 2000, if the contract is fulfilled, the company will have to have completed coverage of 99% of water se rvi ces and 35% of a sewer and co l l ection network by 2006, and half way th rough th at pe ri od results are disastrous, a mere fantasy, according to State Representative Francisco Praciano. Despite the n ew treat m e nt stations and the quality of the wate r, it is still restricted to the distri c ts where co v e r a ge used to be provided by the previous system. In three years of operations, the à guas do Amazonas comp a ny did not increase its se rvices co v e r a ge, sticking to the same 70% refe rring to the ce ntral distri c ts. Regarding the sewer system, nothing was implemented. Manaus still relies on a 5% sewer collection and a 0% sewer treat m e nt. The city’s sewer is still being directed into the water streams cri s scrossing the ci t y, and from those streams into the Negro River. Investments The company declares to having spent, in a period of three years, 6 million reais in water mains and in recovering the system as a result of equipment obsolescence. On account of that, they argue that they cannot extend the net w o rk acco rding to the co ntract sch edule nor the se rvi ces by means of drilling wel l s in the poo rest pe ripheral areas of the city, a proced u re th at the population understands as traditional and of a nearly self-service nature. Increased fees The only clau se th ey have managed to co mply wi th was the one re fe rring to the ta ri ff s, so th ey say in Manaus. In th ree years, th ree fat ta ri ff increases (the last one being 31.5% in 2003). The last increase was withheld by judicial action for four months but it eventually came into effect. Contract void There is a conflict going on and an effort being made in terms of respect for the contract. The comp a ny says the State Government rel i ed on misch i evous data to do the contract, stating th at they had a l ready deployed a water servi ces co v e r a ge of 90%, which was not true. In ch a rge of filing the claims th at sought to void the sales contract, congressman Praciano considered it was up to the company to check what they were purchasing. The problem, considered to be the main one, is the vulnerability of the pop-

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u l ation, who need to push in order to obtain a sewer net w o rk and a better water supply co v e r a ge and, notwithstanding, cannot rely on the State as mediator. Bo th the State and the Municipality wash th e i r hands, which translates into connivance with the company. The Agency that was created to inspect that does not work – another side of connivance!

ANNEX 2

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Águas sem Barragens nas Bacias Amazônicas Waters without Dams in Amazonian Basins Campaign Charter Imperatriz, December 11, 2002 I Inter-State Meeting on Dams in the Araguaia-Tocantins and Xingu, Belém, January 18, 2003 Pan-Amazonian Social Forum We, male and female rural and urban worke r s, indigenous peo p l es, extractivi s ts, ri v e rine populations of Pará, Maranhão, and Tocantins, participants in the Waters without Dams in Amazonian Basins Ca mp a i gn, in a rece nt meeting held in the city of Impe r at riz (MA), which gath e red sixt y-s ix ent i t i esand a total of 160 people, have analyzed the last Avança Brasil Program energy generation plans by the federal go v e rn m e nt in art i c u l ation with mineral exp l o i tation and grain crop pro jec ts in the AraguaiaTocantins and Xingu basin. Acco rding to Elet ro b r ás hy d roel ectric po te ntial map and Interameri ca n Dev el o p m e ntBank data (1999), 55 ente rp ri ses are planned for our basins, where 40 will be located on the Tocantins River and affluents (31 large dams and nine small ones), 10 on the Araguaia River and das Mortes River, and another five on the Xingu River. Four of them are already in operation (Tucuruí, Serra da Mesa, La geado, and Cana Brava), one is being co n s t ru c ted (Peixe - A n gi cal), four are curre ntly being licensed (Santa Isabel, Couto Magalhães, São Salvador, and Estreito) and, for 2003, 10 dams are planned for the start of the concession process (Belo Monte, Marabá, Serra Quebrada, Araguanã, Ipueiras, Tupiratins, Maranhão, To rixoréu, Novo Aco rdo, and Mirador). Beside the dams, there are other plans for th e region, or constructions already under way, that include the Araguaia-Tocantins waterway and another 10 large size projects of grain crops that will have cumulative impacts for the human population and for the environment. Taking examples from the Tucuruí HPP, in the State of Pará, and the Lageado HPP, in the State of Tocantins, the negative impacts to the Amazonian region are: – Extinction of some fi s h s peci es (suru b i n s, dourada, jaú, etc), which are the food staple for the local population due to the large qu a ntity of biomass in the water and the emerge n ce of water plants th at obs t ruct the igarapé beds; – Closing of rivers with consequent disruption of fish reproductive cycles; – Displacement of people who a re affec ted by the constructions, wi thout minimal infr astru c tu re for a dign i fi ed livel i h ood ensured to them in any way whatsoev e r; – Los ses inv o l ving cropland, livelihood, cultural identity of traditional po pulations (indigenous and riverine peoples, coconut extractors, etc); – Loss of biodiversity, of wane areas productive capacity, and consequent proliferation of mosquitoes in involved areas and surroundings; – I n creased urban peri p h e ri es and unemploym e nt, as well as violence in the urban areas; – Climate


imp a c ts, es pecially on rainfall and te mpe r ature regi m es. Even after previous expe ri e n ceof all th ose tro ubles, the mistakes remain the same. Environmental Impact Studies and Reports have been produced, or are curre ntly being dev el o ped, but th ey do not co nte mplate local part i ci p ation and prese nt technical discrep a n ci es. Th ey somet i m es rely on fragmented eva l u ations th at disreg a rd cumu l ative imp a c ts thro u g hout the basin. Other energy generation alternatives must be considered, as a matter of urgency, that will rely on cl ean so u rces such as wind, biomass and solar power. Th e re is also an urge nt need th at curre nt system losses be mended and operating dams be upgraded to their optimal potential. Given this state of a ffa i r s, ent i t i esattending the meeting re i n fo rce their commitment with the preservation of rivers and ecosy s te m s, and also wi th res pecting local po p u l ations in the Araguaia-Toca ntins and Xingu basins, and p ro pose to: (i) sta rt discussions with the go v e rn m e nt team in order th at a morato rium be proposed to o n going ente rp ri ses in the region so an as ses s m e nt of cumu l ative imp a c ts and the existing alternat i v es may be made that will indicate a possible change to the country’s energy policies and further damage to the local po p u l ations and environment can be av o i d ed; (ii) create a Congress Enquiry Commission to investigate the impacts and human as well as envi ro n m e ntal ri g hts vi o l ations ge n e r ated by the co n s t ru ction and ope r ation of hy d roel ec t ric power plants in the Amazon basin, and ta ke the necessary action; (iii) fos ter science and tech n o l ogy policies foc u sed on the resea rch of cl ean and alternative sources for energy generation. Subscribers: Fórum Carajás, Fórum da Amazônia Oriental (FAOR), MAB, Movimento pela Preservação dos rios Tocantins e Araguaia (MPTA), Mo vi m e nto pelo Dese nv o l vi m e nto da Transamazônica e Xingu ( M DTX), CO NTAG, CUT, FETAET, FETAGRI, IRN, ABO NG - N o rte, FASE, APA-TO, MEB, CENTRU, AA E, CPT, CI M I - A l tamira e Tocantins, CÁRITAS- I mpe r at riz, GTA Regional Altamira, AS M UB IP, A B IPA, CEPASP, ST Rs do Araguaia-Tocantins, Mo vi m e nto das Comu n i d a d es Indíge n as de Altamira e Povos Juruna da Volta Grande do Xingu, Povo Apinajé, Gavião, Prefeitura de Imperatriz, Associação de Pescadores da Ilha de Serra Quebrada, Dioceses de Tocantinópolis.

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ANNEX 3 Chart 1- Indigenous Peoples of Southeastern Pará, per municipality and population. Indigenous Peoples

Municipalities where they are located

Population

Parakanã

Altamira and São Félix do Xingu

248

Arara Araweté

Altamira, Medicilância and Uruará Altamira, São Félix do Xingue José Porfírio São Félix do Xingu, Cumaru do Norte

143

Altamira

128

Rurópolis, Altamira and Uruará

156

Kipaia Kuruaia

Altamira

91

Kararaô Kuben Kran Ken, Kikretum, Gorotire, Kokraimoro, Moikarakô e A´Ukre

Altamira

28

São Félix do Xingu

2866

Altamira

91

Kayapo, Mekragnoti, Kayapo (isolado)

Altamira, São Félix do Xingu

657

Panará

Altamira e Guarantã do Norte

202

Juruna

Senador José Porfírio

35

Altamira

-

Altamira e São Félix do Xingu

382

Kayapo e Kuben Kran Ken

Kayapo Mekragnoti Arara

Asurini do Xingu

Kayapo Pituiaro (isolated) Assurini do Xingu, Mekragnoti, Kayapo Total

Source: ISA – Indigenous Peoples in Brazil 1996-2000. São Paulo, ISA.

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269 82

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