V.6, N.1, FEV.2013 - ISSN 1984-3577
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S達o Paulo, v. 6, n. 1, fev. 2013
2013 Intertox Periódico científico de acesso aberto, quadrimestral e arbitrado meses: (2) fevereiro, (6) junho e (10) outubro. Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida desde que citada a fonte. As opiniões e informações veiculadas nos artigos são de inteira e exclusiva responsabilidade dos respectivos autores, não representando posturas oficiais da empresa Intertox Ltda. Seções Artigo Original; Artigo de Atualização; Comunicação Breve; Ensaio; Nota de Atualização e Revisão; Notas Idiomas de Publicação Português e Inglês Contribuições devem ser enviadas para <m.flynn@intertox.com.br>. Disponível em: <http://revinter.intertox.com.br>. Normalização e Produção Web site Henry Douglas Capa Henry Douglas Projeto Gráfico Henry Douglas RevInter – Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade. / InterTox uma empresa do conhecimento. – v. 6, n. 1, (fev. 2013).- São Paulo: Intertox. 2013. Quadrimestral ISSN: 1984-3577 1. Ciências Toxicológicas. 2. Risco Químico. 3. Sustentabilidade Socioambiental. I. InterTox uma empresa do conhecimento. Biblioteca InterTox II. Título.
1. Ciências Toxicológicas. 2. Risco Químico. 3. Sustentabilidade Socioambiental. I. InterTox uma empresa do conhecimento. Biblioteca InterTox II. Título. Rua Turiassú, 390 - cj. 95 - Perdizes - 05005-000 - São Paulo - SP – Brasil Tel.: 55 11 3872-8970
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Expediente Editor(a) Maurea Nicoletti Flynn Doutora em Oceanografia (USP) Com Especialização Ecologia Comitê Científico (2011-2013) Irene Videira Lima Doutora em Toxicologia (USP), Perita Criminal Toxicologista do IML-SP por 22 anos. Marcus E. M. da Matta Doutor em Ciência pela Faculdade de Medicina USP. Especialista em Gestão Ambiental (USP). Engenheiro Ambiental e Turismólogo. Moysés Chasin Farmacêutico-bioquímico pela UNESP-SP especializado em Laboratório de Análises Clínicas e Toxicológicas e de Saúde Pública. Ex-Perito Criminal Toxicologista de classe especial e Diretor no Serviço Técnico de Toxicologia Forense do Instituto Médico Legal da SSP/São Paulo. Diretor executivo da InterTox desde 1999. Ricardo Baroud Farmacêutico-Bioquímico Toxicólogo, Editor Científico da PLURAIS Revista Multidisciplinar da UNEB e da TECBAHIA Revista Baiana de Tecnologia.
Conselho Editorial Científico (2011-2013) Alice A. da Matta Chasin Doutora em Toxicologia (USP) Eduardo Athayde Coordenador no Brasil do WWI - World Watch Institute Eustáquio Linhares Borges Mestre em Toxicologia (USP), ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Toxicologia, exProfessor Adjunto de Toxicologia da UFBA. Fausto Antonio de Azevedo Mestre em Toxicologia USP, ex-Diretor Geral do Centro de Recursos Ambientais do CRA-BA, ex-Presidente do CEPED-BA, ex-Subsecretário do Planejamento, Ciência e Tecnologia do Estado da Bahia. Isarita Martins Doutora e Mestre em Toxicologia e Análises Toxicológicas (USP), Pós-doutorado em Química Analítica (UNICAMP), FarmacêuticaBioquímica Universidade Federal de Alfenas MG. João S. Furtado Doutor em Ciências (USP), Pós-doutorado (Universidade da Carolina do Norte, Chapel Hill, NC, EUA). José Armando-Jr Doutor em Ciências (Biologia Vegetal) (USP), Mestre (UNICAMP), Biólogo (USF). Sylvio de Queiroz Mattoso Doutor em Engenharia (USP), ex-Presidente do CEPED-BA.
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Sumário TOXICOLOGIA Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. A cocaína e sua adulteração.
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Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes – MG 29 ECOLOGIA DO ESTRESSE / ECOTOXICOLOGIA Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP
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Alometrias em toda parte
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SOCIEDADE Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental
102
SUSTENTABILIDADE Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. 115 NOTAS A importância de se aliar a tecnologia à segurança química
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Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. Gilberto Santos Cerqueira1; Samara Andrade Félix2; Rayanne de Sousa Barbosa2, Maria Geane Lopes França2; Renata Costa da Silva3; José Joceilson Cruz de Assis4; Conceição da Silva Martins1; Rivelilson Mendes de Freitas5 1 Universidade Federal do Ceará; 2 Faculdade Vale; 3 Programa de Pós-Graduação em Saúde Ambiente e Trabalho da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia; Universidade Federal do Ceará; 4 Faculdade de Medicina Nova Esperança; 5 Departamento de Ciências Farmacêuticas da Universidade Federal do Piauí. E-mail: giufarmacia@hotmail.com
Resumo A exposição ocupacional a gasolina é um problema de saúde pública, devido aos seus efeitos carcinogênicos e ototóxicos. Esta pesquisa avaliou a exposição ocupacional a gasolina em frentistas de um município do nordeste brasileiro. Foi realizado um estudo analítico transversal com abordagem quantitativa com uma amostra de 34 frentistas de município da região centro sul do Ceará. A partir da análise dos resultados observou-se que 100% da amostra eram do sexo masculino e possuíam exposição ocupacional a gasolina. A maior parte tinha de 10,47± 5,67 horas de trabalho diárias, 91,7% não utilizavam os equipamentos de proteção individual. As queixas mais freqüentes foram anorexia (58,8%) e náuseas e vômitos (50%). Diante do exposto, constatou-se que a há um padrão de exposição ocupacional relacionado ao não uso de equipamento de proteção individual (EPI), observando-se dessa forma que há necessidade de realização de campanha de segurança no trabalho com objetivo de aumentar a adesão ao uso do EPI. Palavras-chave: Solventes. Exposição ocupacional. Medicina. Fatores de Risco. Riscos Ocupacionais. Toxicologia
CERQUEIRA,Gilberto Santos; FÉLIX, Samara Andrade; BARBOSA, Rayanne de Sousa; FRANÇA, Maria Geane Lopes; SILVA, Renata Costa da; ASSIS, José Joceilson Cruz de; MARTINS, Conceição da Silva; FREITAS, Rivelilson Mendes de. Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 05-14, fev. 2013.
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Abstract Occupational exposure to gasoline is a public health problem due to its carcinogenic effects and ototoxic. This study evaluated occupational exposure to petrol attendants in a northeastern Brazilian city. We conducted a cross-sectional study with a quantitative approach with a sample of 35 attendants of the south center of the municipality of Ceará. From the analysis of the results showed that 100% of the sample was male and had occupational exposure to gasoline. The majority was of 10.47 ± 5.67 hours of work daily, 91.7% did not use the personal protective equipment. The most frequent complaints were anorexia (58.8%) and nausea and vomiting (50%). Given the above, it was found that there is a pattern of occupational exposure related to non-use of personal protective equipment (PPE), observing thus there is a need to conduct campaign work safety aiming to increase membership the use of personal protective equipment. Keywords: Solvents. Occupational Exposure. Medicine. Risk Factors. Occupational Risks. Toxicology Introdução No Brasil a exposição ocupacional aos solventes orgânicos é um problema de saúde pública, sem notificação e negligenciados pelos administradores de postos de combustíveis (CERQUEIRA et al., 2010). A exposição ocupacional a solventes orgânicos é entendida como a possibilidade de contato com desses fluidos com pele, mucosa ou através do sistema respiratório no ambiente de trabalho. Substâncias químicas, como solventes orgânicos, estão presentes em diversas áreas laborais e podem acarretar danos à saúde do trabalhador, pois têm características tóxicas variadas, que podem causar câncer, dermatite, leucemia e ototoxidade (TOCHETTO et al., 2012). Os solventes orgânicos são produtos químicos que contêm pelo menos um átomo de carbono e um átomo de hidrogênio, são lipofílicos e tem uma elevada afinidade com os tecidos ricos em lipídios, como o tecido cerebral. Eles são conhecidos por serem substâncias neurotóxicas que são prejudiciais ao SNC (sistema nervoso central), causando danos ao tronco encefálico, cerebelo e córtex cerebral (MOLLER et al., 1990). Dentre os solventes orgânicos encontramos o benzeno o principal componente da gasolina. O benzeno apresenta-se como um líquido incolor de aroma característico é um dos constituintes da gasolina. Entretanto seu vapor não deve ser aspirado já que o mesmo possui componentes tóxicos, altamente carcinogênicos podendo ser o causador de diversos tipos de cânceres, como leucemia (GILLI et al., 1996). CERQUEIRA,Gilberto Santos; FÉLIX, Samara Andrade; BARBOSA, Rayanne de Sousa; FRANÇA, Maria Geane Lopes; SILVA, Renata Costa da; ASSIS, José Joceilson Cruz de; MARTINS, Conceição da Silva; FREITAS, Rivelilson Mendes de. Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 05-14, fev. 2013.
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Devido ao alto poder de toxicidade, a ação do benzeno independe do meio de contato. Porém a principal via de introdução do mesmo no organismo se dar pelas vias aéreas superiores, ou seja, pela inalação de seus vapores (WHO, 1996). Estima-se que em todo o mundo cerca de dois milhões de trabalhadores estejam expostos ocupacionalmente ao benzeno a cada ano. Contudo para que esse índice seja controlado de forma significativa, estratégias de saúde têm sido implantadas para uma melhoria na qualidade de vida dos trabalhadores (SCHERER et al., 1995). A exposição ao benzeno no ambiente ocupacional está diretamente relacionada à falta de compromisso e obediência das normas de segurança de trabalho, informações deficientes, supervisionamento inadequado, falta de treinamento, processos de trabalhos ultrapassados e acima de tudo ausência ou uso indevido de equipamentos de proteção (PEZZAGNO, 1995). O grande poder carcinogênico que o Benzeno pode ocasionar para a saúde da espécie humana deve ser vista com olhos clínicos, não somente aos trabalhadores expostos ocupacionalmente, mas também a população de um modo geral. Além disso, é de suma importância a avaliação do aparecimento dos primeiros sinais e sintomas decorrentes da exposição ao poluente tóxico, devido os mesmos só ocorrerem vários anos após o afastamento dos trabalhadores da fonte de exposição. Isto merece uma enorme atenção por parte das instituições de saúde pública. No sentido de assim fortalecer a prevenção dos riscos, com a população de um modo geral (WHO, 1996). Na literatura há diversos trabalhos demonstram a problemática da exposição ocupacional, porém estudos relatando a exposição ocupacional a gasolina no nordeste brasileiro são escassos (CERQUEIRA et al., 2010), aliado ao fato que houve uma banalização do uso de equipamento de proteção individual entre os frentistas, ainda sim que muitos sofrem com ototoxicidade devido a exposição ocupacional ao principal componente da gasolina o benzeno. Assim, o objetivo desse trabalho foi investigar a exposição ocupacional a gasolina em frentista de um município do nordeste brasileiro. Metodologia Foi realizado um estudo analítico, transversal com abordagem quantitativa com frentista de postos de combustíveis do município de Icó, Ceará do centro sul do Ceará. Para se calcular o tamanho da amostra, utilizou-se a população total de 50 frentistas distribuídos em postos de combustíveis na zona urbana e na adjacência da BR 116. Dessa maneira, foi obtida, inicialmente, como amostra ideal para o desenvolvimento deste estudo, um grupo de 34 indivíduos. Os voluntários foram selecionados obedecendo aos seguintes critérios de inclusão: ser maior de 18 anos e estar trabalhando regularmente a mais CERQUEIRA,Gilberto Santos; FÉLIX, Samara Andrade; BARBOSA, Rayanne de Sousa; FRANÇA, Maria Geane Lopes; SILVA, Renata Costa da; ASSIS, José Joceilson Cruz de; MARTINS, Conceição da Silva; FREITAS, Rivelilson Mendes de. Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 05-14, fev. 2013.
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de seis meses. O instrumento utilizado para a coleta de dados foi um questionário semi-estruturado, contendo questões de fácil compreensão, e previamente testado e baseado nos estudos de Freitas e colaboradores (2007) e modificado por Cerqueira et al., 2010. Para a aplicação do questionário foram selecionados e treinados três acadêmicos do Curso de Enfermagem De Uma instituição de ensino superior. Para a entrevista individual foi obtido consentimento prévio por escrito de todos os participantes do estudo. A coleta de dados foi realizada de agosto a dezembro de 2012 pelos alunos selecionados e treinados, sob supervisão de um professor. Paralelamente, foi utilizada a metodologia "bola de neve" em que os primeiros entrevistados indicam outros, que por sua vez indicam outros, e assim sucessivamente (BIERNACKI e WALDORF, 1981), tomando por base para facilitar a identificação dos frentistas que estavam de folga ou férias ou trabalhavam em turno diferentes. O questionário foi aplicado diretamente aos frentistas após esclarecimentos e orientações básicas sobre os objetivos da pesquisa em questão, ficando o universitário livre para decidir sobre sua participação; o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi assinado. Antes da aplicação, os indivíduos foram instruídos sobre a natureza voluntária do estudo e lhes foi garantido o sigilo, pelo anonimato. Para tanto foi apresentado a cada participante um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido de acordo com a Resolução 196/96 (BRASIL, 1996). A análise dos dados foi do tipo descritivo, a fim de identificar a prevalência do consumo de álcool. Foi utilizado para organização do banco de dados o programa de computador “Excel” versão 2003 e como instrumento de análise estatística o aplicativo Graph Pad Prisma versão 5.0. Esse estudo foi conduzido conforme os princípios da Declaração de Helsinki e não possui conflito de interesse. Resultados e Discussão Verificou-se que a maioria dos participantes era do sexo masculino (100%), com faixa etária predominante entre 25 a 35 anos (28%), com idade média de 27,74±6,639 anos (Tabela I), em sua grande maioria com ensino médio completo (32,33%) e com renda de 1 a 2 salários mínimos (79,4%). Tabela I. Estatística descritiva da idade dos entrevistados. Horas Média ±DP Mediana Dados dos Entrevistados 27,74±6,639 28
Max 50
Min 18
Valores representam a média ± erro padrão da média.
CERQUEIRA,Gilberto Santos; FÉLIX, Samara Andrade; BARBOSA, Rayanne de Sousa; FRANÇA, Maria Geane Lopes; SILVA, Renata Costa da; ASSIS, José Joceilson Cruz de; MARTINS, Conceição da Silva; FREITAS, Rivelilson Mendes de. Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 05-14, fev. 2013.
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Constatou-se que todos os trabalhadores entrevistados estavam expostos a gasolina (100%). Observou-se ainda que 91,7% dos frentistas não utilizam o equipamento de proteção individual, enquanto que 8,8% dos entrevistados utilizam (Tabela II). Tabela II. Frentista que utilizam equipamento de proteção individual. Sexo
Uso de EPI Sim
Masculino
n 3
Não % 8,8
n 31
% 91,17
Nossos dados corroboram com o de outros estudos, que demonstram baixa utilização de equipamento de proteção individual entre trabalhadores (RECENA; CALDAS, 2008; CERQUEIRA et al., 2010; MARTINS et al., 2012). Outra recomendação para diminuir a exposição ocupacional é promover o uso de EPI adequado à situação de risco, principalmente nas emergências de saúde pública em que não se conhece a causa do problema investigado, e, também, ações educacionais que ajudem os trabalhadores locais a desenvolverem habilidades para a percepção do risco com potencial dano à sua saúde ou à de terceiros, quando do manejo e armazenamento de agrotóxicos. Essas medidas de saúde pública teriam como finalidade minimizar a incidência de casos de intoxicação e problemas decorrentes e, também, prevenir surtos ocasionados por substâncias químicas, como as investigadas neste estudo (MOTA et al., 2011). No que concernem as manifestações clínicas devido à exposição ocupacionais gasolina verificou-se que 58,8% dos entrevistados apresentaram anorexia, 50% distúrbios gastrointestinais como náuseas e vômitos, além de sintomas que caracterizam a anemia como algia em membros inferiores (MMII), tontura e astenia. Muitos dos sintomas supracitados estão relacionados com a anemia, provocada pelos solventes em questão, como cefaléia, algia em membros inferiores, náuseas e tontura. Vários são os agentes causais implicados no aparecimento da anemia aplástica. Estão incluídos nesse grupo agentes químicos, físicos e infecciosos. Dentre os agentes químicos que regularmente produzem a depressão medular estão os derivados de benzeno que é um componente presente nos combustíveis (YOUNG e ALTER, 1994; ANDRADE FILHO et al., 2001; FONSECA e PAQUINI, 2002). Alguns trabalhos sugerem que processos agudos, como cefaléia, náusea, irritação nasal e ocular, podem estar associados à exposição à gasolina contendo MTBE (JOHANSON et al. 1995; NIHLEN et al., 1998). Além disso, recentes estudos demonstraram que mínimos efeitos não CERQUEIRA,Gilberto Santos; FÉLIX, Samara Andrade; BARBOSA, Rayanne de Sousa; FRANÇA, Maria Geane Lopes; SILVA, Renata Costa da; ASSIS, José Joceilson Cruz de; MARTINS, Conceição da Silva; FREITAS, Rivelilson Mendes de. Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 05-14, fev. 2013.
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significativos foram observados: alteração na freqüência do piscar de olhos, hiperemia, alteração do tempo de ruptura do filme lacrimal ou lesão corneana em indivíduos expostos a gasolina. Estudos realizados na índia com crianças viciadas em cheirar gasolina, notaram os seguintes sinais de toxicidade, irritabilidade excessiva, retardo psicomotor, boca seca, distúrbio do sono e diminuição da lágrima (SHAH et al.,1999). Efeitos agudos, como cefaléia, náuseas, vertigem, irritação ocular e nasal, foram citados em trabalhadores expostos à gasolina (NIHLEN et al., 1998; SCHEEPERS e BOS, 1992). Tabela 3. Manifestações clínicas devido a exposição ocupacional a gasolina. Manifestação N Anorexia 20 Náuseas e vômitos 17 Cefaléia 24 Tontura 03 Dermatite 04 Astenia 02 Algia em MMII 07 Sensação de plenitude gástrica 01 Prurido 02 Total
34
% 58,8 50 70,5 8,8 11,7 5,8 20,5 2,9 5,8 100
Segundo Sartor et al., (2007), entre os agentes ocupacionais, o único carcinógeno estabelecido para câncer de laringe é a exposição a névoas de ácidos inorgânicos fortes. Tintas e gases de combustão de gasolina e diesel aparecem como agentes ocupacionais que aumentam o risco para o câncer de laringe (BROWN et al., 1988) ) Outros estudos sugerem que a exposição a gasolina pode causar danos na porção central do sistema auditivo ou no tronco encefálico induzidos por solventes orgânicos presentes na gasolina (TOCHETTO et al., 2012). Em relação ao tempo de exposição ocupacional, verificou-se que a média de exposição ocupacional a gasolina era de 10,47± 5,67 horas já que vários trabalhadores possuíam uma jornada de 12 horas. A média de exposição em anos foi de 6,85± 6,28 anos (Tabela III). Em trabalhos descritos na literatura, foram mencionadas alterações metabólicas e funcionais ocasionados pela exposição à gasolina, óleo diesel e álcool, em diferentes sistemas biológicos apresentados ao organismo, como respiratório, hepático, reprodutor, nervoso, renal, hematológicos, ópticos, imunológicos, de desenvolvimento, e outros, podendo até a levar ao câncer e a morte. Quando o contato é realizado por via oral, os efeitos mais encontrados são os cardiovasculares, respiratórios, gastrintestinais, hematológicos, hepáticos, renais, neurológicos, câncer, até mesmo a morte. Já com relação à via dérmica, os danos observados foram às dermatites, CERQUEIRA,Gilberto Santos; FÉLIX, Samara Andrade; BARBOSA, Rayanne de Sousa; FRANÇA, Maria Geane Lopes; SILVA, Renata Costa da; ASSIS, José Joceilson Cruz de; MARTINS, Conceição da Silva; FREITAS, Rivelilson Mendes de. Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 05-14, fev. 2013.
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escamação e hepáticos, enquanto que por via respiratória, os efeitos se mostram mais prejudiciais à saúde, podendo gerar efeitos respiratórios, hematológicos, musculoesqueléticos, oculares, imunológicos, neurológicos, reprodutivos, de desenvolvimento, genotóxicos, câncer e morte (DAMBROS, 2012). Tabela III. Dados em relação ao tempo de a exposição ocupacional Tempo de profissão (anos) Tempo de exposição (horas) 6,85± 6,28 10,47± 5,67 Valores representam a média ± erro padrão da média.
Verificou-se que os trabalhadores além da exposição à gasolina possuíam exposição a detergentes e sabões provenientes dos lava-jatos 73,5%, a radiação solar 70,5% e a ruídos de motores dos carros, motos e meio ambientes 64,7% (Figura 1). Indivíduos expostos a ruído e solventes (BERNARDI, 2007; BOTELHO et al., 2009) e trabalhadores expostos a ruído e tolueno (CHANG et al., 2006) apresentaram maior prevalência de perda auditiva neurossensorial, quando comparados a outros grupos (BERNARDI, 2007). 76 73,5
74 72
70,5
70 68 66
64,7
64 62 60 Ruídos
Radiação
Sabão e detergente
Figura 1. Outros tipos de exposição no ambiente de trabalho.
Considerações Finais Constatou-se que as maiorias dos entrevistados apresentavam uma situação de risco tóxico pela exposição aos vapores dos combustíveis, ruídos e outros produtos químicos presentes nos postos de combustíveis manipulados em associação como o não uso dos EPIs e outras medidas CERQUEIRA,Gilberto Santos; FÉLIX, Samara Andrade; BARBOSA, Rayanne de Sousa; FRANÇA, Maria Geane Lopes; SILVA, Renata Costa da; ASSIS, José Joceilson Cruz de; MARTINS, Conceição da Silva; FREITAS, Rivelilson Mendes de. Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 05-14, fev. 2013.
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preventivas. Tanto é que um percentual considerável dos entrevistados relata sintomas que podem estar diretamente relacionados com a exposição ocupacional, pelo que se sabe dos possíveis efeitos tóxicos dos ingredientes de gasolina e álcool. Constatou-se que há um padrão de exposição ocupacional relacionado ao não uso de equipamento de proteção individual (EPI), observando-se dessa forma que há necessidade de realização de campanha de segurança no trabalho com objetivo de aumentar a adesão ao uso do EPI. Referências ANDRADE FILHO A, CAMPOLINA D e DIAS MB. Toxicologia na Prática Clínica. Minas Gerais: Folium, 2001. BERNARDI APA. Exposição ocupacional a ruído e solventes e alterações auditivas periféricas e centrais. Tese (Doutorado em Saúde Pública): Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2007. BIERNARCKI P e WALDORF D. Snowball sampling-problems and techniques of chain referral sampling. Sociological Methods and Research 10:141-163. 1981. BOTELHO CT, PAZ APML, GONÇALVES AM e FROTA S. Estudo comparativo de exames audiométricos de metalúrgicos expostos a ruído e ruído associado a produtos químicos. Rev. Bras. Otorrinolaringol. 2009;75(1):51-7. BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão de Ética em Pesquisa em Seres Humanos. Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996. Diretrizes e Normas Regulamentadoras Envolvendo Seres Humanos. Brasília (DF), 1996. BROWN LM, MASON JT, PICKLE WL, STEWART PA, BUFFLER PA e BURAU K. Occupational risk factors for laryngeal cancer on the Texas Gulf Coast. Cancer Res 1988; 48:1960-4. CERQUEIRA GS, ARRUDA VR, FREITAS APF, OLIVEIRA TL, VASCONCELOS TC e MARIZ SR. Dados da exposição ocupacional aos agrotóxicos em um grupo assistido por uma unidade básica de saúde na cidade de cajazeiras, PB. Rev. Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v.3, n.1 Nov/Fev, 2010. CERQUEIRA,Gilberto Santos; FÉLIX, Samara Andrade; BARBOSA, Rayanne de Sousa; FRANÇA, Maria Geane Lopes; SILVA, Renata Costa da; ASSIS, José Joceilson Cruz de; MARTINS, Conceição da Silva; FREITAS, Rivelilson Mendes de. Exposição Ocupacional a Gasolina: Um Estudo Transversal. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 05-14, fev. 2013.
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A cocaína e sua adulteração. Luis Fernando Martins Oliveira Delegado da Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Sul, Pós Graduado no Curso de Especialização em Toxicologia Forense, Feevale, Novo Hamburgo, RS, Brasil. Email: fernando-oliveira@pc.rs.gov.br
Sandrine Comparsi Wagner Professora Doutora, Pós Graduação em Toxicologia Forense, Universidade Feevale, Novo Hamburgo, RS, Brasil
OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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Resumo A cocaína consumida no Brasil, diferente da destinada à Europa ou América do Norte, está longe de possuir alto grau de pureza. Explica-se o fato em razão da existência de pequenos laboratórios de transformação/adulteração da droga em território nacional, realizada pelos traficantes que fazem a distribuição ao consumidor final e também pela existência de rotas de tráfico interestadual que conferem algumas características comuns à droga de diferentes regiões geográficas. O presente trabalho teve por objetivo o de analisar a cocaína e o seu processo de adulteração com a adição de produtos adulterantes e diluentes, utilizando substâncias químicas contaminantes para modificar-lhe a forma ou aumentar o volume da substância e, por consequência, os lucros dos traficantes. Além disso, pretende mostrar a importância de identificar corretamente, nos laboratórios, os produtos utilizados para esses fins, de forma a ampliar o trabalho investigativo policial no que tange ao crime de tráfico de drogas, focando as investigações não somente no importador das substâncias entorpecentes, mas também nos responsáveis pela logística de fornecer os nominados produtos. Dessa forma, determinar a natureza dos eventuais contaminantes significa deduzir quais foram os produtos químicos utilizados na preparação daquela amostra da droga, bem como a detecção e identificação de adulterantes e diluentes que podem fornecer óbvios e importantes subsídios em trabalhos de investigação policial. Palavras-Chave: Cocaína; Adulteração; Adulterante; Diluente. Abstract Cocaine consumed in Brazil, unlike the cocaine destined to Europe and North America, is far from being highly pure. This happens because there are small laboratories that transform/adulterate the drug on national territory, this operation is conducted by drug dealers who distribute it to the final consumer and also due to the existence of interstate drug trade routes that confer some common characteristics to the drug from different geographic regions. This paper aimed at analyzing the cocaine and its adulteration process with the addition of adulterants and diluents, through the use of chemical contaminants to alter the shape or increase the volume of the substance and, consequently, the profit of drug dealers. Furthermore, it intends to show the importance of properly identifying, in laboratories, the products used for these purposes, in order to expand the investigative work done by the police regarding illegal drug trade crimes, by focusing the investigations not only on the importers of narcotic substances, but also on those responsible for the logistics of distributing the abovementioned products. Thus, establishing the nature of the eventual contaminants means OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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deducing which were the chemical products used in the preparation of such drug sample, as well as detecting and identifying the adulterants and diluents that may provide obvious and important subsidies to police investigations. Key words: Cocaine; Adulteration; Adulterant; Diluent Introdução A cocaína, anestésico local e estimulante do sistema nervoso central (SNC), é um dos principais alcalóides1 extraídos das folhas de plantas do gênero Erytroxylum. Embora haja mais de 250 espécies e variedades desse vegetal, apenas uma pequena parcela fornece quantidades consideráveis da referida substância. Ao contrário de muitos outros vegetais capazes de produzir substâncias psicoativas, cujas regiões de cultivo espalham-se inespecificamente ao redor do globo terrestre, as variedades de Erytroxylum são encontradas, quase que exclusivamente nas regiões andinas da América do Sul (principalmente da Colômbia, Peru, Bolívia e Equador), Índia e África (CASALE e KLEIN, 1993). A cocaína é ilegal em vários países do mundo. No entanto, a planta da coca é cultivada legalmente em volumes controlados em alguns países da América do Sul para fins industriais e farmacêuticos. Nestes, as folhas de coca são legais, porém o processo de refino da cocaína é proibido. O Relatório Mundial sobre Drogas, publicado pelo Escritório contra Drogas e Crimes das Nações Unidas – UNODC em 2010, mostra que o Brasil e Argentina constituem os maiores mercados de cocaína da América do Sul em termos absolutos, com mais de 900 mil e 600 mil usuários, respectivamente. Conforme o relatório da ONU, os traficantes colombianos produziram, nos últimos anos, a maior parte da cocaína do mundo entre 2000 e 2009, mesmo considerando o fato de que a área sob o cultivo de coca na Colômbia tenha diminuído 58%, principalmente devido à erradicação. No mesmo período, o cultivo de coca aumentou 38% no Peru e mais do que dobrou na Bolívia (112%), acompanhado do fato de que esses dois países aumentaram suas próprias capacidades de produzir cocaína (UNITED NATIONS, 2010). Tradicionalmente, a maior parte da cocaína produzida na América do Sul deixa o continente por mar ou pelo ar, com destino à América do Norte, África e Europa. Porém, com o aumento das apreensões, combinado com mudanças na demanda do mercado, houve o aumento da importância dos países de trânsito, entre eles especialmente o Brasil. Com o uso crescente do Alcalóide é uma substância de caráter básico derivado principalmente de plantas que contém em sua fórmula basicamente nitrogênio, oxigênio, hidrogênio e carbono. OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua 1
adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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território de nosso país por grupos organizados de tráfico internacional de drogas, também aumentou a quantidade de cocaína disponível para os traficantes de drogas brasileiros, fazendo com que esses criminosos invistam na montagem e aparelhamento de laboratórios artesanais clandestinos para aumentar a quantidade de droga adquirida e, por conseguinte, o lucro. Diante desta realidade, vem a importância de se precisar especificamente quais os produtos ou substâncias que estão sendo utilizados na preparação e adulteração da cocaína, que está disponível aos usuários de drogas brasileiros. Com isso, visa-se um direcionamento da repressão não somente à substância, mas também a outras substâncias lícitas, controladas ou não, que são utilizadas neste processo, podendo até mesmo viabilizar uma alteração da legislação quanto ao controle mais rígido ou proibição de venda e comercialização destas substâncias. Origem da Cocaína - Breve Histórico A cocaína (COC) é o principal alcalóide encontrado nas folhas do vegetal Erytroxylum, que é vulgarmente conhecido como coca. Trata-se de um arbusto ramificado originário da zona tropical dos Andes da América do Sul, que pode chegar a medir cerca de dois a três metros de altura, com folhas ovais e elípticas de borda lisa. Dentre as principais fontes de cocaína do gênero Erytroxylum, destacam-se as espécies Erytroxylum coca e Erytroxylum novagranatense (CASALE e KLEIN, 1993). A Erytroxylum coca constitui a principal fonte da produção ilícita de cocaína. As folhas, após maceração, são convertidas em pasta de coca, que constitui a forma de tráfico e que é, eventualmente, utilizada para produzir o cloridrato de cocaína. Estima-se que com 100 Kg de folhas de coca originam-se 1.000 g de pasta de coca e 800 g do respectivo cloridrato. A Erytroxylum novogranatense é cultivada legalmente e sua produção destina-se à indústria farmacêutica, onde a cocaína é utilizada como anestésico local, ou à indústria alimentícia, como constituinte de chás. A cocaína é considerada como o mais potente estimulante central de ocorrência natural, agindo no Sistema Nervoso Central (SNC), razão pela qual é considerada como fármaco de abuso. Seu uso remonta às populações pré-incas que, segundo achados arqueológicos, já utilizavam o mascamento das folhas de coca em cerimônias religiosas. A prática de se fumar folhas de coca com finalidades religiosas e terapêuticas, entretanto, data de mais de 5.000 anos (OGA et al., 2008). O Brasil, que também possui condições climáticas favoráveis ao plantio de espécies de Erytroxylum, não figura entre os países produtores de cocaína. A variedade chamada Epadu, Ipadu ou Padu, cultivada por indígenas na região Norte do País, apresenta baixíssimos teores de cocaína, OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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razão pela qual o extrativismo ilícito dessa substância é considerado inviável e praticamente não ocorre (VARGAS, 2001). Embora as evidências arqueológicas atestem o uso da planta pelos povos andinos há milhares de anos, o interesse generalizado pela cocaína tem início na metade do século XIX. Os primeiros estudos científicos da cocaína iniciaram-se com o pedagogo e químico alemão Friedrich Wöehler (1800-1882), que extraía a cocaína das folhas de coca junto com outros alcalóides presentes. Em 1859, outro químico alemão, Albert Niemann (1824-1884), isolou e caracterizou a cocaína das folhas de coca. No final do século XIX, o psicanalista Sigmund Freud (1856-1939) receitava essa droga aos seus pacientes para o tratamento de depressão e dependência à morfina. Após observar os seus efeitos adversos, Freud passou a chamar a cocaína de “terceiro flagelo”, depois do álcool e da heroína (PASSAGLI, 2007). Na mesma época nos Estados Unidos, a cocaína fazia parte de diversas formulações farmacêuticas de uso livre, como elixires e tônicos, além de até o ano de 1903 ser ingrediente de conhecida bebida não alcoólica, a Coca-Cola. Em 1891, o aumento do uso levou aos relatos sobre intoxicações relacionadas à cocaína, incluindo algumas mortes que, de fato, contribuíram para a sua proibição pelo The Harrison Narcotics Act em 1914, quando a catalogou com as mesmas proibições e penalidades imputadas à morfina (OGA et al., 2008). O uso não médico tornou-se mais frequente a partir da década de 1970, havendo um recrudescimento no abuso da droga e, consequentemente, chegando a patamares incontroláveis dos dias atuais. Desde a década de 1980, a cocaína tornou-se um estimulante relativamente inócuo e eminentemente urbano, principalmente em razão do barateamento do seu preço – reflexo do aumento da produção e, consequentemente, da oferta do produto, sendo atualmente objeto de comercialização de várias organizações criminosas de todo o mundo (ISENSCHMID e LEVINE, 2001). Processo de produção ilícita da cocaína A cocaína pode ser obtida por métodos sintéticos ou a partir de sua fonte natural (folhas de coca), sendo que esta última compreende uma série de etapas/procedimentos relativamente simples até a obtenção da droga. De suas folhas (comumente referidas como “folhas de coca”, independentemente da espécie que lhes deu origem), por meio de processos de extração com solventes orgânicos apropriados, podem ser obtidos teores que variam de 0,5 a 1,5% (em peso) em alcalóides totais (cerca de 20 substâncias químicas diferentes), dos quais aproximadamente 75% são correspondentes à cocaína (MOORE et al.., 1993). Dentre os métodos sintéticos, dois deles (cujas descrições detalhadas encontram-se em livros e periódicos especializados internacionais) merecem destaque especial por apresentarem bons rendimentos reacionais, a saber: OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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através de (trans)esterificações sucessivas, partindo-se de ecgonina2; por meio de reação de Mannich.
Ambos os processos são perfeitamente factíveis e até mesmo utilizados em alguns dos procedimentos lícitos de preparação do referido alcalóide. Porém, devido a questões de caráter técnico e econômico, não são usuais em práticas ilícitas. A rota sintética que envolve a reação de Mannich seguida de redução catalítica, por exemplo, possui etapas reacionais que exigem aparatos complexos e relativamente dispendiosos. Esses fatores, pelo menos a princípio, inibem sua aplicação em práticas criminosas (CASALE e KLEIN, 1993). No entanto, a obtenção de cocaína diretamente de suas fontes naturais é bastante simples e segue, resumidamente, duas etapas principais:
Processo de extração com imersão das folhas de coca em solvente orgânico ou solução ácida;
Processos de purificação/interconversão.
A primeira etapa é chamada de extração e, apesar de existirem algumas variantes de processo, as diferentes metodologias consistem, basicamente, em imergir e macerar as folhas de coca num determinado tipo de solvente orgânico (e.g. querosene, óleo diesel, gasolina, etc.), ou solução ácida (ácido sulfúrico), fazendo com que ocorra uma transferência de componentes químicos das folhas para o meio líquido (solvente). Após certo período de tempo, as folhas são removidas por filtração e a solução restante é tratada quimicamente para se produzir a pasta base de cocaína (mistura de diversas substâncias orgânicas e inorgânicas incluindo a cocaína e demais alcalóides). A partir desta, quaisquer outras formas de apresentação da droga (cocaína base, cloridrato de cocaína, crack e “merla”) podem ser facilmente produzidas empregando-se reações químicas de purificação e/ou processos de interconversões (CASALE e KLEIN, 1993). A figura 1 apresenta o fluxograma que descreve as etapas de produção da pasta de
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Ecgonina é um alcalóide com estrutura similar à cocaína que também se encontra
nas folhas de coca.
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cocaína e a figura 2 apresenta o fluxograma dos processos de interconversão da cocaína. Nesse ponto, é importante ressaltar que diferentes formas de apresentação não significam drogas diferentes. Assim, ao contrário do que é veiculado com frequência em alguns meios de comunicação, crack não é subproduto da cocaína. Primeiro, porque se trata da própria cocaína na forma de “pedras” e, em segundo lugar, porque o termo “subproduto” é utilizado tecnicamente para designar uma substância de importância secundária gerada em determinado processo químico. Assim sendo, vemos que é um grave erro classificar a droga dessa maneira (VARGAS, 2001).
Figura 1: Fluxograma das etapas de produção da pasta base de cocaína. Fonte: CASALE e KLEIN, 1993.
Procedimento de adulteração da droga Desde a extração das folhas de coca, a cocaína passa por uma série de processos até chegar ao mercado consumidor. Após a obtenção da pasta base, OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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cada um dos eventuais intermediários envolvidos nas rotas de distribuição pode alterar a droga de duas maneiras principais (MOORE et al., 1993): 1. Modificando-lhe a forma de apresentação através de transformações químicas (por exemplo, convertendo a pasta base em cocaína base, utilizando produtos químicos, assim determinados contaminantes); 2. Adicionando-lhe substâncias diversas, adulterantes e diluentes, a fim de aumentar o volume do produto (e, consequentemente, os lucros obtidos em sua comercialização). O primeiro tipo de alteração, ou seja, interconversão de formas de apresentação da cocaína envolve a utilização de substâncias químicas diversas, tais como solventes, ácidos inorgânicos, substâncias alcalinizantes e agentes oxidantes. Durante as diferentes fases do processo, bem como nas etapas de purificação da droga, boa parte dessas substâncias é eliminada. Alguns traços, porém, mantêm-se (juntamente com impurezas naturais oriundas das folhas de coca – outros alcalóides ou microorganismos) absorvidos ou ocluídos em seus cristais. Esses resíduos de agentes químicos (introduzidos nas etapas do processamento da droga) são chamados contaminantes e seus teores são fortemente dependentes de características de manipulação. Determinar a natureza dos eventuais contaminantes significa deduzir quais foram os produtos químicos utilizados na preparação daquela amostra de droga. Essas informações permitem, por exemplo, que as listas de insumos químicos potencialmente aplicáveis em processos de elaboração de substâncias entorpecentes/psicotrópicas mantenham-se constantemente atualizadas. Se em determinado momento a detecção de traços de um solvente ou reagente “X” torna-se uma rotina sobre tal substância, devem incidir todos os mecanismos de controle usuais. O segundo tipo de modificação que um intermediário pode efetuar em amostras de cocaína é adicionar-lhe aditivos. Esses aditivos podem ser de duas espécies: adulterantes ou diluentes. Os adulterantes consistem em substâncias não só com o aspecto, mas com alguma atividade farmacológica similar à da droga, tais como lidocaína, benzocaína, cafeína e anfetaminas. Já os diluentes são substâncias sem quaisquer atividades farmacológicas. Trata-se de compostos com características visuais próximas às da cocaína, tais como sulfato de magnésio, bicarbonato de sódio, amido e açúcares, entre outros, utilizados com a finalidade exclusiva de aumentar-lhe o volume (PASSAGLI, 2007). A detecção e identificação de adulterantes e diluentes podem fornecer subsídios importantes em trabalhos de investigação e constituem o perfil OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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químico de uma determinada droga de rua. Por exemplo, podem-se conseguir informações a respeito de atividades relacionadas ao tráfico de drogas por meio de simples consultas a empresas fornecedoras de fármacos, ou de outras substâncias frequentemente encontradas em amostras de cocaína. Além disso, com uma série de ressalvas que não cabem ser discutidas no momento, é possível estabelecer o tipo de associação entre cocaína/adulterante e/ou diluente e regiões geográficas. Ou seja, a presença de certas substâncias em amostras de cocaína pode indicar a região na qual aquele material fora elaborado (VARGAS, 2001).
Figura 2: Fluxograma dos processos de interconversão da cocaína. Fonte: VARGAS, 2001.
Apreensões de Drogas no Estado do Rio Grande do Sul Em nosso país, a cocaína raramente tem sido objeto de tráfico na sua forma pura. No período compreendido entre os anos de 2005 e 20103, em números absolutos, foram apreendidos 758 quilos de cocaína pelas polícias estaduais no Estado do Rio Grande do Sul. No mesmo período, foram apreendidos 740 quilos de substâncias outras, que são utilizadas como adulterantes ou diluentes. A tabela 1 apresenta a lista das drogas Dados tabulados até 30 de Novembro de 2010. OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua 3
adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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apreendidas no Estado do Rio Grande do Sul, bem como o período e a quantidade de adulterantes/diluentes. Considerando a constatação de expressiva quantidade dessas substâncias apreendidas, é importante que, em casos de apreensão desses produtos, as Autoridades Policiais requisitem exames laboratoriais para que os laudos periciais identifiquem e determinem o tipo de substância apreendida (lidocaína, benzocaína e cafeína, entre outros) e em que tipo de substância cada produto é mais comumente utilizado para adulterar ou diluir cada tipo de droga (cloridrato de cocaína, crack e merla, entre outros). Com o resultado dos exames periciais, as Autoridades Policiais poderão direcionar os trabalhos investigativos de maneira não somente a identificar autores e rotas de tráfico de drogas, mas também de produtos e/ou substâncias utilizados nos pequenos laboratórios artesanais localizados no Brasil. Tabela 1: Lista e quantidade de drogas e adulterantes/diluentes apreendidas no Estado do Rio Grande do Sul entre 2005 e 20103. MACONHAa,d 2005 2006 2007 2008 2009 2010
5.327.595,28 1.514.204,79 3.430.393,22 3.931.717,81 4.506.007,90 2.034.140,15
COCAÍNAa,d 34.788,68 55.444,26 88.118,61 138.955,36 181.652,76 259.589,43
CRACKa,d 27.832,29 62.611,56 121.268,62 150.099,48 266.775,34 280.814,61
ECSTASYb,d
LSDc,d
40 1035 90 1027 1450 352
0 0 209 352 135 894
ADULTERANTE/ DILUENTEa,d,e 30.027,90 11.840,68 298.359,02 93.237,16 85.981,90 221.201,27
a:
peso em gramas; b: número de comprimidos; c: número de micropontos ou doses; d: A identificação foi realizada através de análise macroscópica; e: lidocaína, benzocaína, cafeína, anfetaminas, sulfato de magnésio, bicarbonato de sódio, amido e açúcares, entre outros. Fonte: Polícia Civil-RS
Como parte da investigação policial, todas as substâncias suspeitas de serem ou conterem o alcalóide cocaína, que são remetidas para exames em laboratórios de toxicologia ou laboratórios especializados em química forense, passam por uma série de testes para que sejam determinadas as suas naturezas e identificações. O conjunto dos resultados obtidos nas diversas análises realizadas forma a convicção do analista que, dentro dos prazos estabelecidos por lei, emite o competente laudo pericial. Esses exames enfocam primordialmente a detecção e identificação da substância questionada e sua forma de apresentação, pois a legislação em vigor não exige a determinação do grau de pureza da droga apreendida. Esta última análise somente é feita em casos específicos quando assim solicitados pelas Autoridades Policiais, ou por membros do Poder Judiciário e Ministério Público. OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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Para a realização de um procedimento adequado de amostragem, principalmente no que tange a uniformidade na coleta de amostras em quantidades variáveis de drogas apreendidas a serem submetidas a exame pericial, as amostras devem ser colhidas de forma a representar a totalidade da substância de onde foram retiradas. Para tanto, recomenda-se a orientação da Organização das Nações Unidas (ONU) através dos métodos indicados para análise de cocaína (UNITED NATIONS, 1986). A Legislação sobre Drogas e Produtos Químicos No Brasil, de acordo com a Lei nº 11.343/2006, que instituiu o Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas, “consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”. A classificação das substâncias é dada pela Portaria nº 344 da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, datada de 12 de Maio de 1998. A planta Erytroxylum coca consta na Lista E, onde está a relação de plantas que podem originar substâncias entorpecentes e/ou psicotrópicas, e a cocaína, substância classificada como entorpecente de uso proscrito, consta na Lista F 1, ambas da respectiva Portaria. Com relação aos produtos químicos e insumos utilizados com frequência na produção ilícita de drogas, o Brasil aderiu a Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas, realizado em Viena em 1988, reconhecendo que o tráfico ilícito de drogas é uma atividade criminosa de abrangência internacional, com especial atenção ao artigo 12 que trata destas substâncias utilizadas na produção da droga4. O cumprimento ao artigo 12 da Convenção de Viena, no Brasil, faz-se com base na Lei nº 10.357/2001, a qual estabelece normas de controle e fiscalização sobre produtos químicos que direta ou indiretamente possam ser destinados à elaboração ilícita de substâncias entorpecentes ou psicotrópicas. Assim sendo, em complementação a esta norma, o Ministério da Justiça publicou a Portaria nº 1.274/2003, na qual relacionou diversos produtos químicos (Listas I – IV do Anexo I da Portaria), dentre os quais, precursores, solventes, reagentes diversos e adulterantes ou diluentes usados ilicitamente, tendo como parâmetro a frequência com que esses produtos químicos vêm sendo encontrados em laboratórios clandestinos de fabricação ilícita de drogas ou identificados nas amostras de drogas apreendidas.
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Decreto n 154 de 26 de Junho de 1991 que Promulga a Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas. OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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Considerações finais A cocaína consumida no território brasileiro tem características físicas e químicas regionalizadas, em que se constata um maior grau de pureza na droga apreendida nos Estados e cidades limítrofes com os Países produtores da cocaína e seus derivados. Assim, verifica-se que quanto mais distante das regiões de produção e, portanto, mais próximo das regiões onde existe um alto índice de consumidores, a droga é adulterada das mais diversas formas, a fim de aumentar o volume e o lucro financeiro com o tráfico ilícito. As análises de rotina mais utilizadas em Laboratórios de Toxicologia ou laboratórios especializados em Química Forense baseiam-se em diversos testes químicos, cromatografia em camada delgada (CCD) e se, disponíveis, outras técnicas instrumentais (e.g. cromatografia em fase gasosa, CG). Essas análises enfocam, primordialmente, a detecção, identificação e forma de apresentação da substância questionada. Em geral, as informações obtidas nestes processos são suficientes para cumprir os objetivos, criar a convicção e responder aos quesitos formulados, conforme exigência da legislação em vigor para, dessa forma, materializar o delito investigado. O ordenamento jurídico brasileiro, no que tange ao processo criminal, não exige o questionamento quanto ao grau de pureza da droga, bem como da identificação e quantificação de substâncias adulterantes/diluentes nas amostras de drogas apreendidas (este procedimento somente é adotado em solicitações específicas). No entanto, o aspecto mais interessante a respeito das análises de cocaína consiste em possibilitar comparações precisas e inequívocas entre amostras obtidas em diferentes apreensões. Através do conjunto de características reunidas nos procedimentos de análises profundas, é possível afirmar se elas são idênticas, ou se tiveram origem num mesmo lote de produção, além de atestar qual substância lícita está sendo encontrada em maior quantidade nas porções de drogas apreendidas. Portanto, para iniciar ou mesmo dar sequência a procedimentos investigativos de maior abrangência, é interessante, em algumas ocasiões, ampliar a quantidade de informações a serem extraídas de uma determinada análise de rotina. A aplicação de análises mais detalhadas, por meio de técnicas instrumentais de alta sensibilidade, permite, por exemplo, avaliar quais foram os produtos químicos empregados no preparo da droga, quais os adulterantes/diluentes utilizados, quais os contaminantes presentes, etc. Essas informações originam subsídios de fundamental importância em trabalhos de inteligência, e o conjunto de metodologias e procedimentos capazes de reunir tais características consiste em estabelecer um perfil analítico completo da droga, ou seja, reunir todas as suas peculiaridades visuais e químicas. Desta maneira, estes procedimentos diferem consideravelmente das análises de rotina, uma vez que exige que a cocaína seja isolada e submetida a uma série de exames adicionais. Aliado a isso, está a exigência de possuir OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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um sistema eficiente de intercomunicação entre os órgãos encarregados de proceder as análises necessárias com os órgãos responsáveis pela investigação sobre o comércio ilícito da substância, bem como manter um banco de dados que centralize e compare tais informações. A referida comparação de amostras permite, por exemplo, identificar tipos de substâncias lícitas (adulterantes/diluentes) mais utilizadas no processo de adulteração da cocaína, assim como identificar o tráfico ou cadeias de distribuição destas substâncias. Referencias Bibliográficas Arbex Jr., J. Narcotráfico. Um jogo de poder nas Américas. Coleção Polêmica. São Paulo. Moderna, 1993. Casale, J.F. e Klein, R.F.X. Illicit production of cocaine. Forensic Science Review, vol. 5, p. 95-107, 1993. Chiarotti, M. e Fucci, N. Comparative analyses of heroin and cocaine seizures. Journal of Chromatography B, vol. 733, p. 127-136, 1999. Isenschmid, D e Levine, B. Cocaine. In The Clinical Toxicology Laboratory – Contemporary Practice of Poisoning Evaluation; Shaw, L. M, Ed.; AACC Press: Washington, DC 2001; cap. 7. Brasil. Anvisa. Portaria n.º 344, de 12 de maio de 1998. Brasil. Ministério da Justiça. Portaria n.º 1274, 25 de agosto de 2003. Brasil. Presidência da República. Decreto n.º 154 de 26 de junho de 1991. Brasil. Presidência da República. Lei n.º 10.357, de 27 de dezembro de 2001. Brasil. Presidência da República. Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. Brasil. Ministério da Justiça. Departamento de Polícia Federal. Manual de Polícia de Repressão a Entorpecentes. Brasília, 1985. Lebelle, M.; Callahans, S; Latham, D.; Lauriault, G. e Savard, C. Comparison of illicit cocaine by determination of minor components. Journal of Forensic Sciences, vol. 36, p. 1102-1120, 1991. Lukaszewski, T. e Jeffery, W. K. Impurities and artifacts of illicit cocaine. Journal of Forensic Sciences, vol.25, p. 499-507, 1980. OLIVERIA, Luis Fernando Martins; WAGNER, Sandrine Comparsi. A cocaína e sua adulteração. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 15-28, fev. 2013.
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Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes MG. Ludmila von Rondow A. B. Pandolpho Mestranda em Engenharia Ambiental – Universidade Federal de Ouro Preto E-mail: ludmila@vonrandow.com
Andrea Grabe Guimarães Farmacêutica,
UFMG;
Doutora
em
Farmacologia
Cardiovascular, FIOCRUZ; Docente de disciplinas da área de farmacologia UFOP. E-mail: grabe@ef.ufop.br
Rosângela Barbosa de Deus Farmacêutica,
UFMG;
Doutora
em
Microbiologia
e
Imunologia, UFMG. Docente das disciplinas Toxicologia e Toxicologia Ocupacional. E-mail: rbdeus@ef.ufop.br
PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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Antônio Galvão do Nascimento Biólogo, UFV; Doutor em Microbiologia Agrícola, UFV; Docente de disciplinas da área de microbiologia UFV. E-mail: agnascimento@ufv.br
Vera Lúcia de Miranda Guarda Farmacêutica, UFOP; Doutora em Ciências Farmacêuticas, Université de Grenoble I (Scientifique Et Medicale - Joseph Fourier).
Docente
do
Departamento
de
Farmácia
da
Universidade Federal de Ouro Preto. Coordenadora do NuCát - Núcleo da Cátedra UNESCO- água, mulheres e desenvolvimento estabelecido pela Resolução CEPE- UFOP – 7.420. E-mail: vera.guarda@gmail.com – nicole@ef.ufop.br
PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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Resumo Uma das consequências da utilização dos recursos hídricos em atividades desenvolvidas pelo homem é a crescente eutrofização dos ambientes aquáticos, causando o enriquecimento desses ecossistemas. Estudos toxicológicos do fitoplâncton atestam a qualidade e possibilitam o monitoramento das águas principalmente, aquelas ligadas diretamente à saúde humana. O enriquecimento da água dos pesque-pagues com nutrientes, principalmente nitrogênio e fósforo, favorecem a floração de cianobactérias. Estas florações podem acarretar alterações na qualidade da água, devido liberação de cianotoxinas e de outros compostos que modificam suas características organolépticas, além do aumento da matéria orgânica. Nesse trabalho, foi feito o monitoramento da presença de cianobactérias em pesque-pagues de seis municípios da região dos Inconfidentes, Minas Gerais, Brasil, com a finalidade de avaliar a toxicidade potencial dos gêneros de cianobactérias encontrados. No período de março de 2008 a janeiro de 2009, foram coletadas 88 amostras e os gêneros de cianobactérias foram identificados segundo a chave de Bicudo & Menezes (2005). Além de Chlorophytas, cinco gêneros de cianobactérias foram encontrados nos tanques, Phormidium sp, Geithlerinema sp., Anabaena sp., Nostoc sp., Microcystis aeruginosa, todos com potencial para produção de cianotoxinas. Os parâmetros físico-químicos pH, temperatura e condutividade foram determinados in loci, e seus resultados mostraram-se favoráveis à presença de algas, principalmente as clorofíceas. Os ensaios de toxicidade aguda e crônica foram realizados administrando os extratos brutos de Microcystis e Phormidium, em camundongos, pela via oral. Estes ensaios mostraram que a Microcystis obtida nos tanques de pesque-pagues produziu cianotoxinas. Quanto ao gênero Phormidium ou não houve produção de toxinas ou a dose utilizada no ensaio foi pequena para obtenção da resposta toxicológica, pois os sintomas de intoxicação observados não foram intensos. Palavras-chaves: Pesque-pague; cianobactérias; toxicidade; Microcystis; Phormidium
Abstract One of the consequences of the use of water resources in activities developed by man has been the increasing eutrophication of aquatic environments, PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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causing the artificial enrichment of these ecosystems. Toxicological studies of phytoplankton attest to the quality and enable the monitoring of waters mainly those linked directly to human health. The enrichment of water from fish-pay establishments with nutrients, primarily nitrogen and phosphorus favor the blooming of cyanobacteria. These blooms can cause changes in the water quality due to the liberation into the body of water cyanotoxins and other compounds which modify its organoleptic characteristics, in addition to the increase in organic matter. This work was done to monitor the presence of cyanobacteria in fish-pay establishments of six municipalities in the region of the Inconfidentes, Minas Gerais, Brazil, in order to evaluate the potential toxicity of cyanobacteria found. From march 2008 to january 2009, 88 samples were collected and cyanobacteria were identified according to the key Bicudo & Menezes (2005). Besides Chlorophytas, five genres of cyanobacteria were found in the tanks, Phormidium sp, sp Geithlerinema., Anabaena sp., Nostoc sp., Microcystis aeruginosa, all with the potential to produce cyanotoxins. The physic-chemistry parameters pH, temperature and conductivity were determined in loci and the results shows the conditions were favorable to the presence of algae, mainly chlorophytes. The acute and chronic toxicity tests were performed administered through oral of crude extracts of Microcystis and Phormidium orally. These tests showed that Microcystis obtained produced cyanotoxins. As the cyanobacteria of the genera Phormidium no toxin production or the dose used in the trial was small for obtaining toxicological response, because the symptoms of intoxication were not observed intense. Keywords: fish-pay establishments; cyanobacterial; toxicity; Microcystis, Phormidium Introdução As cianobactérias são consideradas microalgas procariontes, possuem pigmentos fotossintéticos, clorofila-a, e ficocianina, responsável pela coloração azulada, sendo, conhecidas como algas azuis (WHITTON e POTTS, 2000). Estes organismos são importantes componentes do fitoplâncton de águas continentais com ampla distribuição geográfica habitando diferentes ecossistemas, como lagos de regiões tropicais e temperadas, rios e estuários (OLIVER e GANF, 2000). É o grupo mais encontrado quando ocorrem florações em ambientes eutrofizados (BOUVY et al., 1999, CALIJURI et al., 2006). Além destes, as cianobactérias também podem estar presentes nas lagoas de estabilização (VASCONCELOS e PEREIRA, 2001). Estas lagoas correspondem a ambientes eutróficos artificiais, pois são tanques construídos pelo homem, com a finalidade do PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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tratamento biológico dos esgotos provenientes de áreas urbanas e estabelecimentos comerciais e domésticos, para o seu posterior lançamento no corpo aquático receptor (KELLNER e PIRES, 1998). Os fatores primários que determinam a dominância das cianobactérias são a temperatura da água, o regime de luz subaquático e a zona de mistura da coluna de água (DOKULIL e TEUBNER, 2000). Estes organismos são utilizados como excelentes bioindicadores da qualidade das águas (SANT’ANNA et al., 2006). O conhecimento das algas e cianobactérias, como potenciais bioindicadores da qualidade da água é extremamente interessante devido à rápida resposta das mesmas às mudanças ambientais (MARGALEF, 1983). WETZEL (1993) destacou que a composição qualitativa e quantitativa da comunidade fitoplanctônica e suas variações espaciais e temporais refletem as interações entre os componentes e também o efeito das variáveis ambientais sobre a mesma, sendo influenciada, principalmente, pela concentração de nutrientes inorgânicos, penetração de luz, temperatura, pH e condutividade elétrica da água. Alguns gêneros de cianobactérias formadores de florações possuem a capacidade de produzir toxinas e por isso constituem um grupo diferenciado dentro da comunidade fitoplanctônica (AZEVEDO, 1998; CALIJURI et al., 2006; SANT’ANNA et al., 2006). Sendo assim, a ocorrência destes organismos em reservatórios é de preocupação constante para a saúde pública e para pesquisadores e estudiosos mundiais (AZEVEDO, 1998; LELKÓVA et al., 2008). As cianotoxinas são toxinas produzidas por algumas espécies de cianobactérias em corpos d’água doce ou salgada, e são classificadas como hepatotoxinas (microcistina e nodularina), neurotoxinas (anatoxina-a, anatoxina-as, homoanatoxina-a e saxitoxina), citotoxinas (cilindrospermopsina) e dermatotoxinas (lingbiatoxina) e outras ainda podem ser irritantes ao contato, consideradas como endotoxinas pirogênicas, como aquelas das bactérias Gram negativas. As altas concentrações de cianotoxinas afetam primeiramente as comunidades aquáticas e, posteriormente, as demais comunidades que se alimentam de indivíduos aquáticos contaminados. As florações de cianobactérias tóxicas podem provocar a mortandade de peixes e outros animais, incluindo o homem, que consome a água ou organismos contaminados (MINISTERIO DA SAÚDE, 2003; FERRÃO-FILHO, 2009). Diversas cianotoxinas têm importância para a saúde pública. Estas toxinas, quando presentes na água utilizada para abastecimento doméstico, para a pesca ou lazer (pesque-pagues), podem atingir as populações humanas e provocar efeitos adversos, como gastroenterite, hepato-enterite e outras doenças do fígado, rins, câncer, irritações na pele, alergias, conjuntivite, problemas com a visão, fraqueza muscular, problemas respiratórios, asfixia, convulsões e morte, dependendo do tipo da toxina, da PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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concentração e da via de contato (MINISTERIO DA SAÚDE, 2003; FERRÃO-FILHO, 2009). O número de estudos sobre a eficiente remoção dessas cianotoxinas pelos processos de tratamento da água ainda é reduzido. As técnicas de detecção de cianotoxinas ainda não são muito difundidas na prática do monitoramento de águas de abastecimento e para recreação. Assim, a avaliação da exposição humana as cianotoxinas pelo consumo da água ainda é bastante deficiente. Além disso, em regiões abastecidas por mananciais de superfície que apresentam florações de cianobactérias tóxicas, a real exposição a essas toxinas irá depender do método de captação, da sequência do tratamento da água e do controle operacional do sistema de abastecimento (MINISTERIO DA SAÚDE, 2003). Assumindo-se que a qualidade da água é um fator limitante para o desenvolvimento social e econômico do país, verifica-se que várias lacunas precisam ser preenchidas para que se possa garantir, de forma segura e confiável, a qualidade da água em mananciais e em sistemas de abastecimento público (LORENZI, 2004). O pesque-pague é um local onde se pratica pesca esportiva ou por hobby. São lagos artificiais ou naturais, onde os alevinos são criados com ração para que seu desenvolvimento seja rápido e o ganho de peso dos animais seja em curto tempo. Devido ao acumulo da ração que é utilizada para alimentação dos peixes nos tanques, há um aumento na concentração de nutrientes disponibilizados na água, fazendo com que as cianobactérias presentes no corpo d’ água se proliferem, causando danos ao restante da cadeia alimentar. O foco desde estudo foi a Região dos Inconfidentes – MG, em especial as cidades de Ouro Preto, Mariana, Itabirito, Ponte Nova, Tiradentes e São Brás do Suaçuí, devido ao alto número de pesque-pagues que surgiram em pouco tempo e à enorme concentração de corpos d’água eutrofizados nesta região. Dessa forma, buscou-se avaliar a qualidade das águas de tanques de pesque-pagues por meio do monitoramento das cianobactérias, devido à potencialidade das mesmas produzirem toxinas. Estudos toxicológicos experimentais são ferramentas importantes na avaliação dos riscos dessas toxinas para a população humana. No entanto, a grande maioria das informações sobre cianotoxinas ainda é obtida em estudos de intoxicação aguda, mas a intoxicação crônica certamente é mais frequente, representando sérios riscos à população e deve merecer, assim, uma maior atenção das pesquisas científicas neste campo (SOARES, 2009). Material e Métodos Área do Estudo
PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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Os pesque-pagues foram escolhidos aleatoriamente, por meio de sorteio. Após a autorização dos proprietários, as coletas foram realizadas, nos municípios de Ponte Nova, Mariana, Ouro Preto, Itabirito, São Brás do Suaçuí e dois pontos de coleta em Tiradentes, como ilustra a Figura 1.
Figura 1. A) Mapa de Minas Gerais, com cidades, rios e áreas de preservação ambiental; B) Mapa de Minas Gerais, com algumas cidades quem compõem a área em estudo. Fonte: www.mapsgoogle.com.br
Coletas e Fixação das Amostras As coletas foram feitas utilizando-se rede de plâncton (20µm de abertura de malha) ou simplesmente pela passagem do frasco aberto na lâmina d’água. A rede foi passada várias vezes sobre a superfície, com o arraste horizontal de aproximadamente três metros da região mediana para a marginal dos tanques. No total, 88 amostras foram coletadas, abrangendo os períodos de chuva e de seca, no período de março de 2008 a janeiro de 2009, sendo estas realizadas mensalmente em todos os pontos. Dentre as amostras coletadas algumas foram fixadas in situ com solução de Transeau, solução de FAA (Formalina, álcool etílico, ácido acético glacial), e Lugol, todas na proporção de 1:1, e armazenadas em frascos de vidro padronizados tipo penicilina, com 2mL cada, envolvidos com papel laminado. Outras amostras foram acondicionadas em frascos de vidro de 500mL, sem a adição de soluções de fixação, para posterior observação de material vivo e de seu isolamento. Identificação e Sistema de Classificação PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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Cinco lâminas por amostra foram observadas, em microscópio óptico, e as cianobactérias foram identificadas utilizando-se das chaves de identificação “Gêneros de algas de águas continentais do Brasil: chave para identificação e descrições” de acordo com BICUDO e MENEZES (2005). Para destacar a presença da bainha mucilaginosa ou mucilagem foram preparadas lâminas com corante Nanquim. O sistema adotado para a classificação no nível de Classe foi o de HOEK et al., (1995). Para as Ordens dentro da Classe foi adotado o sistema de SANT’ANNA e AZEVEDO (2004, 2006). Isolamento dos Gêneros As cianobactérias identificadas em cada uma das amostras foram isoladas utilizando meio de cultivo ASM–1(AGUIAR; AZEVEDO 1992), BG– 11 (ALLEN, 1968) com nitrogênio e BG–11 sem nitrogênio líquido ou agregado ao Ágar-ágar. Outra técnica de isolamento utilizada foi a micro-pipetagem sucessiva, onde ocorreu a captura de filamentos das cianobactérias isoladamente ou de colônias, evitando que outras microalgas cresçam no meio de cultivo, e prevaleçam sobre as cianobactérias. O indivíduo isolado era transferido para placas de Petri ou Erlenmeyer de 250mL, contendo meio de cultivo para obter biomassa suficiente para a obtenção dos extratos utilizados nos ensaios in vivo. Obtenção do Extrato para os Ensaios In Vivo As culturas de cianobactérias isoladas foram semeadas em meio de cultivo com temperatura controlada em 19ºC e fotoperíodo de 16 horas luz/8 horas escuro, sendo mantidas durante 45 dias, com a finalidade de obter grandes quantidades de biomassa e desta forma, obter quantidades suficientes de cianotoxinas para a realização dos ensaios biológicos. As culturas foram centrifugadas a 20.000 rpm a 19ºC, por 30min. Após a primeira centrifugação, o sedimento foi ressuspendido em água destilada estéril, homogeneizado em agitador tipo vortex e, novamente centrifugado nas mesmas condições anteriores. Após várias etapas de lavagem e centrifugação, o sedimento mantido em banho de gelo foi rompido por sonicação. Para a lise das células de Phormidium, foi necessária a introdução de pérolas de vidro no tubo contendo o sedimento da cultura. Os extratos obtidos foram mantidos em tubos esterilizados e armazenados em freezer em temperatura abaixo de 0°C, até sua utilização. Avaliação da Toxicidade Geral In Vivo PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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Os experimentos abaixo descritos foram realizados segundo os critérios institucionais e nacionais de ética que normalizam e protegem a utilização de animais de laboratórios em estudos com finalidades científicas e estão em acordo com o Comitê de Ética da UFOP. A administração oral dos extratos brutos de cianobactérias foi realizada nos camundongos em diferentes concentrações (0, 5, 10, 50 e 100mg/kg de peso corpóreo). O monitoramento dos indivíduos foi feito por um período de doze horas, com observação a cada hora, a fim de observar os primeiros sintomas de intoxicação. Decorridas às doze horas iniciais, o monitoramento passou a ser realizado a cada doze horas. Foram utilizados camundongos machos pesando entre 26,5 a 29g provenientes do biotério central da UFOP, mantidos em ciclo claro/escuro e estes receberam ração e água ad libitum. Para a avaliação das toxicidades aguda e crônica foram utilizados, 100 animais divididos em 10 grupos. Nos ensaios de toxicidade aguda os animais receberam única administração por via oral das doses de extrato nas concentrações de (5, 10, 50, ou 100mg/kg) e de água destilada para os animais controle. Na avaliação da toxicidade crônica, outro grupo de 100 animais recebeu por via oral, por 72 horas, doses de extrato nas concentrações de (5, 10, 50, ou 100mg/kg) e de água destilada para os animais controle, sendo as doses administradas a cada hora por quatro horas a cada dia. Após a administração do extrato, os camundongos foram observados por 72 horas para verificação da ocorrência de sinais indicativos de toxicidade geral in vivo, como vômitos, baixa atividade física, aumento da ingestão de água, convulsão e em alguns casos óbito. Nas primeiras 12 horas, as observações foram documentadas em intervalos de uma hora, e após esse período em intervalos de 12 horas. Resultados e Discussão Os pesque-pagues sorteados, suas respectivas localizações e os principais fitoplânctons encontrados, de acordo com a chave de identificação de BICUDO e MENEZES (2005) estão apresentados na Tabela I. Tabela 1. Pesque-pagues sorteados, suas respectivas localizações e os principais fitoplânctons encontrados, Região dos Inconfidentes – MG
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Cinco gêneros de cianobactérias foram encontrados nos tanques, dentre os quais quatro são produtores de toxinas constantemente e, apenas um é potencialmente tóxico (Phormidium sp). No tanque do pesque-pague em Mariana ocorreu morte súbita dos peixes e o proprietário o desativou. Em Itabirito, o proprietário se desfez do tanque. Assim, não foi possível dar continuidade ao estudo nestas cidades. Os parâmetros físico-químicos analisados são compatíveis com as condições de sobrevivência e reprodução das cianobactérias, uma vez que estas condições são semelhantes às observadas no cultivo em laboratório. Também, é possível observar que não há grandes variações de temperatura e que a ausência de cianobactérias em determinados tanques é independente de fatores físico-químicos: temperatura, pH ou condutividade elétrica, conforme demonstram os resultados apresentados na Tabela II. Cinco gêneros de cianobactérias foram encontrados nos tanques, dentre os quais quatro são produtores de toxinas constantemente e, apenas um é potencialmente tóxico (Phormidium sp). No tanque do pesque-pague em Mariana ocorreu morte súbita dos peixes e o proprietário o desativou. Em Itabirito, o proprietário se desfez do tanque. Assim, não foi possível dar continuidade ao estudo nestas cidades. Os parâmetros físico-químicos analisados são compatíveis com as condições de sobrevivência e reprodução das cianobactérias, uma vez que estas condições são semelhantes às observadas no cultivo em laboratório. Também, é possível observar que não há grandes variações de temperatura e que a ausência de cianobactérias em determinados tanques é independente de fatores físico-químicos: temperatura, pH ou condutividade elétrica, conforme demonstram os resultados apresentados na Tabela II.
PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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Tabela II. Valores médios dos resultados dos parâmetros físico-químicos dos tanques de pesque-pagues da Região dos Inconfidentes – MG
Nos tanques avaliados não foi detectada a presença de macrófitas ou qualquer tipo de planta aquática, que tenha sido possível sua visualização, porém em algumas coletas, a presença de florações de cianobactérias foi observada. O material coletado representava apenas o fitoplâncton, o que leva a inferir um grande grau de eutrofização, devido ao aumento do número de indivíduos de algumas espécies de microalgas, pois o alto teor de poluentes na água favorece a sua proliferação. Culturas Utilizadas no Ensaio Toxicológico As culturas de cianobactérias utilizadas nos ensaios toxicológicos foram de Microcystis e Phormidium. O difícil manuseio para isolamento e a competição com microalgas eucarióticas fez com que as cianobactérias Nostoc, Geithlerinema e a Anabaena se perdessem durante o processo de isolamento, devido à alta densidade de clorofíceas presentes nas amostras. Avaliação da Toxicidade Geral In Vivo dos extratos de microcystis e phormidium Para as doses de 5 e 10mg/kg de peso corporal, do extrato de Microcystis sp, nenhum indivíduo apresentou sintomas que indicasse intoxicação. Para a dose de 50mg/kg, no período de 0 a 12 horas após a administração oral do extrato, 6 animais apresentaram vômitos, sem alteração da locomoção, mantendo comportamento normal comparado ao PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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período antes da administração do extrato. Após 12 horas, nenhum sinal ou sintoma foi observado. Na concentração de 100mg/kg, no período de 0 a 12 horas, cinco animais apresentaram vômitos e redução da locomoção, estes sinais se intensificaram no período de 12 a 36 horas após a administração do extrato, prevalecendo os vômitos no período de 24 a 36 horas. Tais sintomas são característicos da intoxicação alimentar devido às alterações no trato gastrointestinal e o próprio organismo tende a reverter o processo de intoxicação. A sintomatologia discreta de intoxicação pode ser devida à baixa concentração utilizada ou que efeitos mais intensos e/ou letalidade nos indivíduos apresentem-se com o acúmulo de doses. Nas doses de 5, 10 e 50mg/kg de peso corpóreo, do extrato de Phormidium, não foram observados nenhum tipo de estereotipia ou sintoma que indicasse a intoxicação. Por outro lado, com a dose de 100mg/kg de peso corpóreo 4 indivíduos apresentaram redução da atividade física e vômitos no período de 0 a 5 horas, prevalecendo os vômitos no período de 3 a 5 horas após a administração do extrato. Após o período de 5 horas observou-se que esses, ao ingerirem água ao longo de algum tempo se restabeleceram e voltaram a ter comportamento normal comparado ao período anterior a administração do extrato (AZEVEDO, 1998; LEAL e SOARES, 2004). Após a administração de múltiplas doses dos extratos de Phormidium e Microcystis, também foram observadas redução da locomoção e vômitos, nas primeiras 24 horas, embora outros sinais de intoxicação como diarréia, prostração, hemorragias fossem esperados, pois estes sintomas encontramse descritos na literatura para animais domésticos e seres humanos, (CARMICHAEL e SCHWARTZ, 1984; BEASLEY et al., 1989; LEAL e SOARES, 2004). O tipo mais comum de intoxicação envolvendo cianobactérias é causado por hepatotoxinas, que apresentam uma ação mais lenta, causando a morte entre poucas horas e poucos dias, em decorrência de hemorragia intra-hepática e choque hipovolêmico. Os sinais observados após ingestão dessas hepatotoxinas são prostração, anorexia, vômitos, dor abdominal e diarreia (CARMICHAEL e SCHWARTZ, 1984; BEASLEY et al., 1989). Com a continuidade da administração dos extratos, os sinais se intensificaram, reduzindo ainda mais a locomoção espontânea e aumentando os vômitos, culminando com o óbito quase imediato de dois animais após a 8ª dose do extrato de Microcystis. No período de 48 a 72 horas, quando novas doses do extrato de Microcystis foram administradas outros 4 animais vieram a óbito após a 10ª dose sucessiva, apresentando desta forma 60% de letalidade para este extrato quando administrado por via oral, após dose média de 900mg/kg. Os animais que receberam extrato de Phormidium apresentaram os mesmos sintomas observados para dose única, porém de maneira mais PANDOLPHO, Ludmila von Rondow A. B; GUIMARÃES, Andrea Grabe; DEUS, Rosângela Barbosa de; NASCIMENTO, Antônio Galvão do; GUARDA, Vera Lúcia de Miranda. Identificação e teste de toxicidade "in vivo" do extrato bruto de cianobactérias em pesque-pagues da região dos Inconfidentes - MG. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 29-44, fev. 2013.
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intensa, sem, no entanto levar ao óbito. Os resultados sugerem que Phormidium não produziu toxina ou a dose utilizada no ensaio foi pequena para tal resposta toxicológica, pois os sintomas de intoxicação não foram intensos e tampouco ocorreu a morte de camundongos. Cálculo da DL50 Para o extrato de Phormidium, não foi possível realizar o cálculo a dose de letalidade, pois não houve morte de indivíduos, mesmo sendo submetidos a doses diárias de extrato bruto apenas se observou sintomas de intoxicação alimentar: vômitos, baixa atividade física e inchaço abdominal. No extrato de Microcystis, observou-se a morte de dois camundongos após a 8ª dose de extrato bruto e quatro mortes após a 10ª dose de extrato, podendo, assim, sugerir que uma dose de letalidade (DL50) foi atingida com a média de 9 doses de concentração de 100mg/Kg de peso corpóreo cada. Também se verificou que os indivíduos que receberam o extrato bruto de Microcystis tiveram uma taxa de letalidade de 60% dos indivíduos com dose acumulada de 900mg/Kg de peso corpóreo (9 doses de 100mg/Kg de peso corpóreo) para cada camundongo. Conclusões A ocorrência de cianobactérias produtoras de cianotoxinas nos pesquepagues da Região dos Inconfidentes foi evidenciada. Os parâmetros físicoquímicos mensurados favorecem a sua proliferação. Analisando os resultados obtidos pode-se concluir que Microcystis sp obtida dos tanques de pesque-pague produziu toxina após ser isolada e mantida em laboratório sob condições controladas, pois durante os ensaios de intoxicação aguda foi constatado que os organismos tendem a reverter às condições da intoxicação e dessa forma metabolizar a toxina supondo assim que a toxina presente no extrato seja hepatotóxica. Os ensaios in vivo mostraram que o gênero Microcystis pode induzir à intoxicação relevante, enquanto o extrato de Phormidium induz a sinais menos intensos de intoxicação, mesmo nas maiores doses avaliadas. Pelas características dos sintomas apresentados, pode-se inferir que a toxina presente no extrato é do tipo hepatotóxica. Agradecimentos: Este estudo contou com apoio da FAPEMIG Referências
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Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. Paula Mathias Paulino Bolta Bióloga formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Gerenciamento Ambiental pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz – ESALQ/USP. Atualmente trabalha como Monitora Ambiental da APA Marinha do Litoral Norte. E-mail: paulampb@uol.com.br
Maurea Nicoletti Flynn Bióloga formada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestrado
e
doutorado
em
Oceanografia
Biológica
pela
Universidade de São Paulo e pós-doutorado em ecologia aplicada e experimental pelo programa recém doutor do CNPq, Universidade de São Paulo. Foi coordenador do Curso de Engenharia Ambiental das Faculdades Oswaldo Cruz e Coordenadora de Pesquisas na Escola Superior de Química das Faculdades Oswaldo Cruz. Professor adjunto do curso de graduação em Ciências Biológicas e de
pós-graduação
em
Biodiversidade
da
Universidade
Presbiteriana Mackenzie. Tem experiência nas áreas de Ecologia Bêntica,
Ecologia
Experimental,
Dinâmica
Populacional
e
Biodiversidade. E-mail: m.flynn@intertox.com.br
Resumo BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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O aumento da interferência humana nas áreas marinhas costeiras fez com que muitos países desenvolvessem e implantassem novas legislações para a proteção e recuperação dos mares. Estas leis procuram regular a atividade humana de maneira que esta seja sustentável, permitindo que as águas costeiras marinhas continuem limpas e produtivas e o ambiente integro. Entende-se por integridade ambiental a estabilidade ecológica e física dos ecossistemas. Atualmente está disponível uma série de índices de integridade ambiental, dos quais se destaca o Índice Biótico Marinho – AMBI (AZTI’s Marine Biotic Index). O objetivo do presente trabalho é demonstrar a aplicabilidade do índice AMBI como ferramenta para gestão de ambientes costeiros brasileiros, validando-o com o banco de dados descrito na tese de livre docência de TOMMASI (1979). Em sua tese, TOMMASI realizou um extenso estudo sobre a Baixada Santista levantando dados em relação à fauna marinha, como poliquetas e também pesquisou sobre parâmetros físicos e químicos da região. Ao compararmos os dados levantados por TOMMASI, sobre a região da Baixada Santista, quanto aos poluentes e aos poliquetas, bioindicadores, pode-se aplicar o índice AMBI e comparar-se a validação do índice AMBI com a descrição feita pelo autor. O levantamento de dados feitos por TOMMASI, em sua tese de livre docência, e a aplicação do índice AMBI utilizando os dados referentes aos poliquetas, pode-se averiguar a situação ecológica da região. Através da divisão da Baixa Santistas em estações ecológicas feita por Tommasi e com a aplicação de AMBI pode-se notar que a região de 1 a 12 possui alto teor de pesticida apresentando um status ecológico moderado a ruim. A região 13 a 18, com status ecológico ruim, muito ruim e moderado. Já a região leste da baía de Santos apresentou status ecológico bom a moderado; região oeste da baía de Santos, status ecológico ruim a moderado, com maior teor de mercúrio e pesticidas. A região da baía de São Vicente com status ecológico ótimo a moderado. O índice AMBI, mostrou-se ser uma ferramenta de fácil aplicação e através do mesmo, conseguiu-se justificar a descrição feita por TOMMASI à classificação dada pelo AMBI. Palavras-chave: Índice Biótico Marinho, Bioindicadores, Gestão Ambiental.
Abstract The increasing human interference in coastal marine areas has caused many countries to develop and implant new laws for the protection and recovery of the seas. These laws seek to regulate human activity in a manner of becoming sustainable, allowing coastal waters remain clean and productive and integrity of the environmental. Environmental integrity is well known by the physical and BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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ecological stability of ecosystems. Currently available are a series of indices of environmental integrity, among which the Marine Biotic Index - AMBI (AZTI's Marine Biotic Index). The objective of this study is to demonstrate the applicability of the AMBI index as a tool for managing Brazilian coastal environments by validating it with the database described in the thesis of free teaching TOMMASI (1979). In his thesis, TOMMASI conducted an extensive study on Santos collecting data in relation to marine fauna such as polychaetes and also researched chemical and physical parameters of the region. When comparing the data collected by TOMMASI on the region of Santos, with the pollutants and polychaetes, biomarkers, we can apply the AMBI index and compare up to validate the AMBI index with the description given by the author. The survey made by TOMMASI, in his thesis for teaching, and application of the AMBI index using data for polychaetes, one can ascertain the ecological situation of the region. By dividing the ecological stations in baixada santista made by Tommasi and applying AMBI may be noted that the region of 1 to 12 has high content of pesticide having a moderate to bad environmental status. The region 13 to 18, with ecological status bad, very bad and moderate. Already the eastern bay of Santos showed good to moderate ecological status; western Bay of Santos, bad ecological status to moderate, with higher levels of mercury and pesticides. The Bay region of San Vicente with good ecological status to moderate. The AMBI index, proved to be a tool for easy application and through it, we were able to justify the description by TOMMASI the classification given by AMBI. Keywords: Marine Biotic Index, Bioindicators, Environmental Management. Introdução Conforme conceituada pelo art. 1° da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, poluição marinha é (...) a introdução do homem, direta ou indiretamente, de substâncias ou de energia no meio marinho, incluindo os estuários, sempre que a mesma provoque ou possa vir a provocar efeitos nocivos, tais como danos aos recursos vivos e à vida marinha, riscos à saúde do homem, entraves às atividades marinhas, incluindo a pesca e outras utilizações legítimas do mar, alteração da qualidade da água do mar, no que se refere à sua utilização. O aumento da interferência humana nas áreas marinhas costeiras fez com que muitos países desenvolvessem e implantassem novas legislações para a proteção e recuperação dos mares. No plano internacional, a mobilização para a preservação dos oceanos originou-se na Conferência de Bruxelas, de 1969, resultando na Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil por Danos Causados por Poluição por Óleo (CLC/69). Em 1972, foi realizada a Conferência de Estocolmo, da qual resultou a Declaração das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, que dentre outros princípios ressalta a importância da preservação dos recursos marinhos, criando para os Estados a obrigação de prevenir a poluição dos mares por substâncias potencialmente nocivas ao homem e ao ecossistema marinho. No mesmo ano, em 29 de dezembro, em Londres, ocorreu a Convenção sobre BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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Prevenção da Poluição Marinha por alijamento de resíduos e outras matérias, visando prevenir a poluição marinha por resíduos industriais e químicos e prevê uma ação internacional para controlar a contaminação do mar (CUNHA, 2006). Em âmbito nacional, a Lei nº 9.966, de 28 de abril de 2000, dispõe sobre a prevenção, o controle e a fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional e dá outras providências e estabelece nos parágrafos 1º e 2º de seu artigo 16: Art. 16. § 1o Os esgotos sanitários e as águas servidas de navios, plataformas e suas instalações de apoio equiparam-se, em termos de critérios e condições para lançamento, às substâncias classificadas na categoria "C", definida no art. 4o desta Lei. § 2o Os lançamentos de que trata o parágrafo anterior deverão atender também às condições e aos regulamentos impostos pela legislação de vigilância sanitária. Já o Decreto nº 4.136, de 20 de fevereiro de 2002, dispõe sobre a especificação das sanções aplicáveis às infrações as regras de prevenção, controle e fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional, prevista na Lei nº 9.966, de 28 de abril de 2000, e dá outras providências, e estabelece em seu artigo 50: Art. 50. As penalidades serão aplicadas mediante procedimento administrativo próprio de cada autoridade competente, que se inicia com o ato de infração, assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo da aplicação pela autoridade sanitária competente do disposto na legislação específica. Existem ainda as leis que discorrem a respeito de materiais dragados. A Lei nº 10.165 de 27 de dezembro de 2000 dispõe que dragagens e derrocamentos em corpos de água são serviços de utilidade classificados como atividades de nível médio de potencial de poluição (PP) e grau de utilização (GU) de recursos naturais. A Resolução CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) 237/1997, dispõe que dragagens e derrocamentos estão dentre as atividades que necessitam de licenciamento ambiental. O CONAMA aprovou, em 2004, uma Resolução (Resolução CONAMA 344/2004) estabelecendo diretrizes e procedimentos mínimos para a avaliação de material dragado em águas brasileiras, com o objetivo de subsidiar a atuação dos órgãos ambientais no licenciamento ambiental das atividades de dragagem, definindo os locais para a disposição final a partir dos níveis de contaminação dos sedimentos. A Resolução CONAMA 344/2004, visa ao gerenciamento da disposição do material dragado em águas jurisdicionais brasileiras. A resolução abrange portos, rios, lagoas, canais e áreas marítimas, estabelecendo normas para a análise de sedimento antes da realização de dragagem na implantação e operação de portos e terminais portuários. Ainda de acordo com a resolução, todo material resultante da dragagem deverá ser disposto em locais onde possam permanecer por tempo indeterminado, em seu estado natural ou transformado em material adequado a essa permanência (OLIVEIRA, 2008). BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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A motivação do Brasil em adotar uma resolução deste porte, foi decorrente da Convenção de Londres (1972), promulgada pelo Decreto nº 87.566/1982; da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (1982), ratificada em 1988 e declarada em vigor pelo Decreto nº 1.530/1995, além da própria questão ambiental envolvendo dragagem e a disposição do material dragado (OLIVEIRA, 2008). Estas regulamentações procuram reger a atividade humana de maneira que esta seja sustentável, permitindo que as águas costeiras marinhas continuem limpas e produtivas e o ambiente integro. Entende-se por integridade ambiental a estabilidade ecológica e física dos ecossistemas. Este conceito, entretanto é de difícil aplicabilidade prática e métodos integrativos têm sido propostos para avaliá-lo. Os métodos integrativos se baseiam em respostas de espécies bioindicadoras com sensibilidades diferenciadas a determinados poluentes. Assim, índices podem ser criados especificamente para detecção de derramamento de óleo, poluição orgânica, alteração de pH, entre outros (WASHINGTON, 1984) e apresentam como vantagem a possibilidade da análise dos impactos ambientais em nível de organização macro sistêmica por meio da alteração da organização estrutural e funcional das comunidades biológicas (BUSS et al.; 2003). Borja et al. (2008, 2011) fizeram uma extensiva revisão das metodologias integrativas usadas globalmente para avaliar integridade ecológica de estuários e regiões costeiras. Segundo Johnson et al. (1993), um bioindicador deve possuir as seguintes características: ser taxonomicamente bem definido e facilmente reconhecível, inclusive, por não especialistas; apresentar ampla distribuição geográfica; ser abundante ou de fácil coleta; apresentar baixa variabilidade genética e ecológica; preferencialmente possuir tamanho grande; apresentar baixa mobilidade e ciclo de vida longo; dispor de características ecológicas bem conhecidas e ter possibilidade de uso em estudos laboratoriais. A comunidade bentônica engloba os bioindicadores mais usados na avaliação da integridade ambiental e para esta uma variedade de ferramentas e índices foi desenvolvida ultimamente (ver DÍAZ et al., 2004; PINTO et al., 2009). Os invertebrados bentônicos são fundamentais para os ecossistemas aquáticos por se situarem na base das teias tróficas e apresentarem uma gama de características que os torna organismos sentinelas de diferentes perturbações ambientais (PINTO, 2009). Por habitar quase a totalidade dos ambientes marinhos, a presença de determinadas espécies de poliquetas bentônicos pode descrever condições peculiares do habitat, tornando-os ótimos indicadores do tipo e do grau de poluição de uma determinada área (PÉRÈS, 1976; REISH, 1979; PEARSON & ROSENBERG, 1978; ELIAS et al., 2003; DEL-PILAR-RUSO et al. 2009, HADLICH 2010; AMARAL et al.; 2011). Estas características propiciaram o desenvolvimento de biocritério para confecção de índices integrados de avaliação de integridade ambiental baseados na previsibilidade das respostas desses organismos às alterações ambientais (BELAN, 2003). Esta previsibilidade tem como base o paradigma de Pearson e Rosenberg que estabelece que poliquetas BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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respondam as melhorias da qualidade do meio seguindo, de forma progressiva, três passos: aumento na abundância, aumento na diversidade específica e, alteração de espécies dominantes, de tolerantes para sensíveis às perturbações (PINTO, 2009). O desenvolvimento de um biocritério deve seguir um caminho lógico (BORJA et al., 2004a; BORJA et al., 2012) que inclui: (1) a definição de critérios para áreas degradadas e integras baseados em critérios não biológicos tais como concentração de poluentes no sedimento ou de oxigênio dissolvido na água de fundo; (2) identificação de medida biológica que difira entre áreas degradadas e integras; (3) ajuste das respostas a diferenças de habitat, se necessário; (4) integração das medidas biológicas eleitas em um índice; e (5) validação do índice usando um banco de dados. Tradicionalmente, os programas de gerenciamento de águas costeiras fazem uso de indicadores baseados em variáveis físicas e químicas da água e em métricas da biota. Indicadores são utilizados pelas agências ambientais competentes para análise do nível de qualidade ambiental, que baseadas em leis ambientais específicas, determinam ações. Entretanto a análise de mudanças da biota, frequentemente das comunidades bênticas, através de métodos estatísticos univariados e multivariados, ferramentas usualmente empregadas em avaliações de integridade biológica frente a alterações ambientais, apresenta resultados difíceis de serem interpretados por gestores. As métricas de biota se baseiam na derivação de uma série de valores contínuos relativos às proporções de grupos ecológicos definidos pela sensibilidade apresentada pelas espécies consideradas à poluição. Grupos podem ser definidos pela caracterização das espécies como sensíveis, indiferentes e tolerantes às perturbações (BORJA et al., 2000). Borja et al., (2000), recentemente propuseram a adoção do Índice Biótico Marinho (AMBI), do AZTIs (www.azti.es), utilizando organismos bentônicos como bioindicadores. Estes autores exploraram a resposta de comunidades de fundos inconsolidados às mudanças naturais e induzidas na qualidade da água. Essa abordagem tem integrado as condições ambientes a longo prazo de ambientes estuarinos e costeiros em vários países europeus. O AMBI baseia-se essencialmente na distribuição de cinco grupos ecológicos de macrofauna de fundos inconsolidados (GRALL & GLE’MAREC, 1997), que em relação à sua sensibilidade apresentam um gradiente de tensão crescente. Essa abordagem tem a vantagem de ser simples, em termos de cálculos, por basear-se em uma fórmula que permite a derivação de um coeficiente, o AMBI (BORJA, et al., 2003, 2004) permitindo um fácil entendimento por parte de gestores ambientais. O AMBI é mais eficiente quando avaliado conjuntamente com os índices estruturais de diversidade e riqueza específica, constituindo o AMBI Multivariado (M-AMBI) (MUXIKA et al.; 2007). Através deste método se obtém o grau de Qualidade Ecológica (Ecological Quality Ratio) (EQR), uma medida da integridade ambiental. O objetivo do presente trabalho é demonstrar a aplicabilidade do índice MAMBI como ferramenta para gestão de ambientes costeiros brasileiros, validando-o através da analise do extenso banco de dados disponível em Tommasi BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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(1979) sobre o macrobentos da região estuarina de Santos. Região impactada pelas atividades portuárias do porto de Santos e da Cosipa, que afetam diretamente o sistema estuarino santista formado por um complexo de manguezais, canais, rios, alagados e bancos de lodo limitados ao norte pelo município de Bertioga (bacia do rio Itapanhaú) e ao sul por Praia Grande e São Vicente (bacias dos rios, Branco, Mariana e Piabaçu). Poliquetas como bioindicadores marinhos Como já supracitado, os invertebrados bentônicos são de extrema importância para os ecossistemas aquáticos, sendo muito utilizados como bioindicadores (PÉRÈS, 1976; REISH, 1979; PEARSON & ROSENBERG, 1978; ELIAS et al., 2003; DEL-PILAR-RUSO et al. 2009, HADLICH 2010; AMARAL et al.; 2011). Um exemplo de invertebrado bentônico amplamente utilizado como bioindicador e, utilizado nos estudos para o cálculo de AMBI são os poliquetas. Poliquetas são invertebrados vermiformes segmentados do filo Annelida, sendo animais predominantemente marinhos, de vida livre. São poucas as espécies que toleram a água salobra e a água doce. A grande maioria é bentônica, ocupando a zona da maré até as grandes profundidades oceânicas. Algumas espécies são exclusivamente pelágicas e estão agrupadas em apenas 6 famílias (AMARAL & NONATO, 1996). Este grupo é importante sob vários aspectos. Em relação ao balanço energético, o grupo constitui fonte de alimento para muitos organismos marinhos, inclusive para peixes. Por ter habitar quase a totalidade marinha, a sua presença de determinadas espécies de poliquetas pode descrever condições peculiares do habitat, fazendo dos poliquetas ótimos indicadores do tipo e do grau de poluição de uma determinada área. Podem-se ter exemplos deste fato através dos trabalhos de Pérès (1976) e Reish (1979). Índice Biótico de Ambiente Marinho (AMBI): bases e aplicações Com o aumento crescente da degradação das águas costeiras e estuarinas, o Parlamento Europeu apresentou a Directiva Quadro da Água (DQA) que aborda a qualidade ecológica da água e gestão sustentável dos sistemas aquáticos, qualitativa e quantitativamente. A DQA tem por objetivo a prevenção, a proteção e a melhoria das qualidades ambientais, e pretende até o ano de 2015, atingir bons níveis de qualidade biológica em todas as águas européias. Uma das ferramentas previstas na DQA consiste em análises biológicas com base em comunidades de macroinvertebrados bentônicos. Estas análises biológicas podem ser utilizadas em diagnóstico, avaliação, monitoramento e investigação ambiental. O índice AMBI engloba aspectos previstos na DQA, entre eles presença de espécies bioindicadoras de zonas poluídas ou não poluídas, a Razão de Qualidade Ecológica (Ecological Quality Ratio - EQR) e oferece uma classificação a respeito BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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da poluição ou perturbação de um local em particular pela qualidade de sua comunidade bentônica (GRALL & GLE’MAREC, 1997). O AMBI baseia-se em modelos ecológicos, tais como aqueles de Gle'marec (1997) e Hily (1981,1984). As bases teóricas são as estratégias adaptativas ecológicas (R,K eT) e sucessão ecológica em ambientes estressados (BELLAN, 1967; PEARSON & ROSENBERG, 1978; SALEN-PICARD, 1983). Os conceitos que norteiam o índice AMBI incluem: a classificação das espécies em cinco grupos ecológicos (GE) (LEPPAKOSKI, 1975; GLE'MAREC & HILY, 1981); a introdução da escala de 0 a 7, com base em Hily et al.,(1986) e Majeed (1987), mais tarde aperfeiçoada, permitindo a derivação de valores contínuos (BORJA et al., 2000); o estabelecimento de limiares na escala do AMBI a partir das proporções encontradas dos cinco grupos ecológicos (BORJA et al.; 2000) e coincidentes com a qualidade de comunidades bentônicas proposta por GRALL & GLE’MAREC (1997) (REISH, 1959; BELLAN, 1967; PEARSON & ROSENBERG,1976; MUNIS et al, 2005). As áreas geográficas onde o índice AMBI já foi aplicado incluem: Oceano Atlântico, Mar Báltico, Mar Mediterrâneo, Mar do Norte, Mar da Noruega na Europa, além de Hong Kong, Uruguai e Brasil (MUXIKA et al, 2005). Com a aplicação generalizada percebeu-se distorções de interpretação (BORJA et al., 2004a) que foram corrigidas com a aplicação do AMBI em associação com as métricas diversidade de Shannon e Riqueza específica, em uma abordagem multimétrica (M-AMBI). O M-AMBI tem sido aplicado na avaliação do “Ecological Status”, sob o “European Water Framework Directive (WFD)” (BORJA et al., 2003b, 2004a, 2004b). Para se iniciar um estudo de avaliação da integridade ambiental de um local com o M-AMBI é preciso primeiramente ter um histórico referente ao local para que possamos desta forma, comparar a situação atual com a situação de referência. As condições de referência são definidas a partir de dados: referentes a locais fisicamente iguais, eco-região e tipo de habitat similar; apresentem condições minimamente perturbadas ou não perturbadas, ou seja, ausência de/ou pouco impacto humano na região estudada; o local deve fornecer dados de variabilidade da comunidade biológica e a qualidade do habitat devido a fatores naturais e climáticos. Porém, não é sempre que as abordagens tradicionais são aplicáveis para se tornar uma condição de referência (como áreas cristalinas, hindcasting, modelagem), nestes casos, é necessária a aplicação de conceitos alternativos, como se segue: a) Condições de referência utilizando áreas inexploradas ou áreas menos perturbadas: este é o principal método recomendado pela European WFD e também pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos. No entanto, sabe-se que habitats marinhos e estuarinos totalmente inexplorados são raros. Por isso, os gestores de recursos devem decidir sobre um aceitável nível de perturbação para representarem uma referência (GIBSON et al., 2000); b) Condições de referência histórica (hindcasting): condições que são definidas em relação ao que é considerado sem impacto algum através de BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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informações históricas sobre o local de estudo (CIS, 2003). O maior problema enfrentado nesta metodologia é determinar a data-base, para servir de referência ao estudo. Por exemplo, qualquer área de estudo pode ser comparada em relação à um tempo em que não havia população, porém não seria uma comparação sensata a ser feita. Outra dificuldade deste método é o fato das próprias mudanças climáticas que ocorrem ao longo dos anos (GRÉMARE et al, 1998;. TUNBERG & NELSON, 1998; HAGBERG & TUNBERG, 2000; DIPPNER & IKAUNIECE, 2001). Neste caso, a utilização de hindcasting pode ser altamente enganosa a menos que: (i) As causas das oscilações cíclicas estejam bem estabelecidas; (ii) As condições de referências estejam disponíveis para todo o ciclo de oscilação; (iii) O posicionamento do tempo da condição de referência quanto o considerado são estritamente idênticos. Com o objetivo de facilitar o trabalho com o software AMBI, que está disponível gratuitamente em AZTI, na página da web (http://www.azti.es), algumas precauções devem ser levadas em consideração para que não ocorram interpretações errôneas (BORJA & MUXIKA, 2005). As precauções envolvem a análise de registros históricos, a influência da mudança climática e o escrutínio do banco de dados. Embora o AMBI seja particularmente útil na detecção de gradientes de impacto, a sua eficiência é reduzida quando há presente um número de taxa muito baixo (1-3) e/ou um número de indivíduos muito baixo. Para os problemas associados ao uso do AMBI, ver Borja et al., 2004 e Muxika et al.,2005. Os autores que utilizam este software para publicarem suas pesquisas devem sempre verificar a última lista de espécies disponível, contendo o grupo ecológico de cada uma das espécies. Além disso, eles devem mencionar, em suas contribuições, a versão do software e a versão da lista de espécies usada. Esta observação é feita, porque em alguns casos, o grupo ecológico para uma espécie particular poderia ser alterado, seguindo as indicações dos especialistas ou informações recentes disponibilizadas (BORJA & MUXIKA, 2005). Assim, quando se utiliza o AMBI, algumas regras devem ser seguidas: Nunca usar o software AMBI com dados de comunidades de substrato consolidado já que se destina somente a comunidades de fundos inconsolidados; Remover a partir do arquivo inicial todos os taxa de invertebrados nãobentônicos (como por exemplo, peixes, algas); Remover todos os táxons de água doce (por exemplo, Cladocera); Em salinidade maior que 10, remover insetos; Remover taxa de epifauna (por exemplo, Bryozoa); Remover taxa planctônico (por exemplo, Crangonidae); Nunca utilizar níveis taxonômicos elevados (por exemplo, Bivalvia, Gastropoda) e exceto os incluídos na lista de espécies (por exemplo, Nemertea). Normalmente, descobre-se que menos de 10% dos indivíduos por amostra não apresentam atribuição quanto ao grupo ecológico que pertencem. Quando a percentagem é alta (< 20%), os resultados devem ser avaliados com cuidado. A BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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fim de evitar resultados ambíguos, é preferível calcular os valores para cada réplica. A ausência de fauna em algumas repetições deve ser considerada como um sinal de perturbação elevada; consequentemente esta é mais bem contabilizada através da utilização do valor médio de AMBI a partir das repetições (BORJA & MUXIKA, 2005). A atribuição das espécies para determinado grupo ecológico requer consenso entre a comunidade científica (BORJA et al.,2004b). Como tal, tenta-se melhorar e atualizar continuamente a lista de espécies juntamente com os especialistas da “UK Environment Agency” e outros, do mesmo modo, respondendo também às sugestões e vários autores. Por isso, recomenda-se utilizar sempre a última versão da lista de espécies (BORJA & MUXIKA, 2005). Gestão Portuária e Conflitos ambientais A política ambiental brasileira apresenta um tratamento técnico e normativo à seus diversos temas, porém, ainda é falha na incorporação de um repertório satisfatório de procedimentos para a resolução de conflitos de forma negociada (LEIS, 1999). Um exemplo disso é o tempo extremamente longo que tomam as decisões da burocracia ambiental sobre pedidos de licença. Ilustrando tal situação, é conhecido o apelo feito pelo então ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, em visita ao porto de Santos, para que houvesse um pacto entre a autoridade portuária e o órgão ambiental de controle para que as pendências em relação aos regulamentos ambientais não atrapalhassem os investimentos. Os portos brasileiros não apresentam grandes políticas ambientais. Ao mesmo tempo em que os objetivos de incremento do comércio exterior dão urgência a investimentos de melhoria, obras nas vias de acesso, dragagens, projetos de expansão das instalações, se deparam com a falta de regularização ambiental. O Rio Grande é o único porto, dos 11 que estão na Agenda Portos do Governo Federal para receber aporte de recursos, que conta com uma licença de operação junto ao Instituto de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) (CUNHA, 2006). Atualmente, a diretriz fundadora do movimento de política ambiental portuária é a Agenda ambiental portuária, documento oriundo da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), realizado no final dos anos 90. Neste documento constam exemplos dos potenciais impactos que os portos ocasionam como os resultados das atividades de dragagem para aprofundamento ou manutenção dos canais de navegação, as mudanças de linha de costa como consequências de obras de implantação de infraestrutura, a supressão de ecossistemas, geração de resíduos, contaminação de efluentes, acidentes ambientais entre outros (CIRM, 1998). O documento da CIRM fornece parâmetros para o comportamento ambiental dos portos e prevê novas funções de coordenação nesse campo para as autoridades portuárias. A Agenda Ambiental Portuária representou a articulação entre o programa de gerenciamento costeiro e a Política Federal, que desde 1980 constrói as bases para uma ação de ordenamento da ocupação da costa e a política de BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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modernização dos portos brasileiros, que sob a égide da integração das economias em escala global e suas demandas por velocidade no trânsito de mercadorias, redefiniu as relações entre poderes públicos e agentes privados nos portos e alterou profundamente as relações de trabalho, respondendo entre outros fatores às mudanças tecnológicas da era do contêiner (JUNQUEIRA, 2002). Os estuários são áreas de grande produtividade biológica, tendo um papel central na cadeia alimentar marinha. São espaços de reprodução e crescimento de várias espécies, e dos quais depende a produção pesqueira em grandes regiões (CUNHA, 2006). O reconhecimento da importância ecológica deste e de outros ecossistemas costeiros para a renovação dos recursos do mar faz com que a política ambiental os dedique especial atenção. Embora fortemente alterada pela atividade portuária e pela poluição industrial proveniente de Cubatão, a região estuarina de Santos é uma área importante do ponto de vista da biodiversidade, principalmente nas porções bem mais conservadas nas proximidades de Bertioga, ocorrendo grande número de espécies de avifauna (RODRIGUES et al., 1996). O grande aporte de sedimentos nos canais do estuário demanda dos portos uma atividade periódica de dragagem de manutenção. O monitoramento ambiental feito ao longo dos anos constata uma contaminação no material dragado, levando a Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental (CETESB) a tomar medidas de controle ambiental em relação às atividades de dragagem. As restrições mais severas ocorrem em relação à bacia de evolução da Copisa, onde os sedimentos dragados apresentam hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, metais pesados e compostos fenólicos (CETESB, 2000). Em 2004 foram estabelecidos parâmetros para disposição de material dragado por resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), a CONAMA 344/2004, como já supracitado. 2. Estudo de caso para validação do M-AMBI Os dados utilizados são parte de tese de livre docência apresentada ao Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo. TOMMASI, Luiz Roberto. 1979. Considerações ecológicas sobre o sistema estuarino de Santos (SP). Tese de Livre Docência. Inst. Oceanogr., S. Paulo, 487p. As coletas de dados foram realizada estacionalmente com um pegador tipo “van Veen”, com capacidade de 12 l e área de 0,1m², entre dezembro/1974 e julho/1975 no Estuário de Santos, baía de Santos e de São Vicente em 42 estações subdivididas em zonas, determinadas pelo autor a partir de critérios de similaridades hidrológicas, sedimentares e faunísticas, concluindo o que consta abaixo: 1. Zona Interna do Canal de Santos (estações de 1 a 12); 2. Zona Inicial do Canal de Santos (estações 13 a 18); 3. Zona Oeste da Baía de Santos (estações 24, 25, 28, C, 33, 34, 35, 36, D, 40, 42, situadas a oeste do meridiano 46º20’42”); 4. Zona Leste da Baía de Santos (estações 19, 20, 21, 22, 23, 29, 30, 31, 32, B, 37, 38, 39, situadas a leste do meridiano 46º20’42”); 5. Zona da Baía de São Vicente (estações 26, 27). BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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Para a triagem dos organismos, os sedimentos foram lavados em peneira, com malhas subseqüentes de 2 e 0,5mm. Animais fragmentados, em especial poliquetas, foram contados ou pelo número de cabeças ou de caudas, considerando-se, para cada amostra, apenas a extremidade presente em maior número. A posição das estações de coletas foi fixada utilizando referências em terra, no Canal de Santos e na Baía de São Vicente, e por sextante e ecobatímetro, na Baía de Santos. Em cada estação, durante as coletas, o barco ficou ancorado. Como base de referência foi utilizada a carta náutica nº 1701, da Diretoria de Hidrografia de Navegação (Figura 1). O mapa apresentado no estudo, feito por Tommasi, indicando os pontos de coleta (Figura 2).
Figura 1: Carta náutica nº 1701. Diretoria de Hidrografia de Navegação. (Fonte: http://www.mar.mil.br/).
BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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Figura 2. – Representação original dos pontos de coleta amostrados no trabalho de Tommasi, 1979.
2. 2. Aplicação do índice M-AMBI na base de dados Os dados aqui utilizados para aplicação do índice M-AMBI são referentes aos poliquetas, grupo mais bem identificado à nível específico, com maior diversidade e riqueza e amplamente utilizados como bioindicadores de integridade ambiental. Foi feita a classificação de cada espécie quanto ao grupo ecológico que pertence e a seguir buscou-se a derivação de uma série de valores contínuos baseados nas proporções dos 5 grupos ecológicos (EG) presentes nos quais as espécies bênticas foram alocadas:
Sendo EG I as espécies sensíveis a perturbações, II as indiferentes às perturbações, III as tolerantes às perturbações, IV as oportunistas de segunda ordem, e V as oportunistas de primeira ordem. A tabela de dados brutos que foi inserida no programa AMBI foi retirada diretamente da fonte. Nesta planilha foram consideradas 34 espécies de poliquetas e 40 estações, sendo considerados os períodos de verão e inverno (tabela 1). Cada espécie foi atribuída a determinado grupo ecológico (EG). Tabela 1: Espécies de poliquetas identificados por Tommasi (1979) e utilizados no software AZTI, para aplicação dos indicadores de AMBI e M-AMBI (Fonte: AMARAL et al., 2012
BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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A classificação das estações de verão está apresentada na figura 3, onde se pode perceber que a grande maioria delas se encontra classificada como levemente BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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perturbadas, mas havendo, principalmente nas porções estuarinas mais internas a presença de estações extremamente perturbadas.
Figura 3. Distribuição das estações de verão de Tommasi 1979, classificadas quanto ao grau de perturbação sofrido.
A proporção de espécies classificadas nas categorias ecológicas I, II, III, IV e V estão apresentadas para cada estação de verão no histograma abaixo (Figura 4). Há a presença marcante de espécies IV oportunistas de segunda ordem, assim como também espécies indiferentes à poluição, GE II.
BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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Figura 4. Histograma mostrando a proporção de espécies de cada grupo ecológico para cada estação de amostragem do verão de Tommasi 1979.
A classificação das estações de inverno está apresentada na figura 5 onde se pode perceber uma maior amplitude de estações quando consideradas em relação a qualidade das águas, algumas classificadas como não perturbadas, outras levemente perturbadas, moderadamente e algumas extremamente perturbadas.
BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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Figura 5. Distribuição das estações de inverno de Tommasi 1979, classificadas quanto ao grau de perturbação sofrido.
A proporção de espécies classificadas nas categorias ecológicas I, II, III, IV e V estão apresentadas para cada estação de inverno no histograma abaixo (Figura 6). Há a presença marcante de espécies IV e V oportunistas, além das espécies I e II indicando locais menos perturbados.
BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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Figura 6. Histograma mostrando a proporção de espécies de cada grupo ecológico para cada estação de amostragem do inverno de Tommasi, 1979.
Através de uma análise fatorial aplicando-se os índices de diversidade, o biótico (AMBI) e o da riqueza específica, considerando-se os períodos de inverno e verão conjuntamente, observa-se uma tendência das estações apresentarem um status ecológico ruim (Figura 7).
Figura 7: Análise fatorial determinando o status ecológico das estações de coleta de Tommasi 1979. BAD – Baixo; HIGH – Alto.
Depois do cálculo de AMBI, o M-AMBI foi obtido através da integração dos índices AMBI, Diversidade de Shannon e Riqueza específica, identificando-se o Status Ecológico (Ecological Quality Ratio) (EQR), que expressa à relação entre os valores observados e valores de referência. Os valores limites para o Sistema Ecológico (Status) de classificação serão: ‘Ótimo’, >0.85; ‘Bom’, 0.55 – 0.85; ‘Moderado’, 0.39 – <0.55; ‘Ruim’, 0.20 – <0.39; e ‘Muito Ruim’, <0.20, e estão apresentados para verão (Tabela 2 e Figura 8) e inverno (Tabela 3 e Figura 9). Tabela 2: Dados gerados pelo software AMBI através da aplicação em dados de poliqueta bênticos coletados no período do verão (Tommasi, 1979).
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Figura 8: Esquema ilustrando as regiões da Baixada Santista segundo classificação AMBI no período de verão (Fonte dos dados brutos: TOMMASI, 1979).
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As regiões foram divididas de acordo com a classificação M-AMBI. Nota-se que as estações 1 a 12 e de 13 a 18 foram classificadas com status ecológico entre ruim e muito ruim, (vermelho); a estação 14, 21, 27, 28, 34, 35, e 39 foram classificadas com status ecológico moderado (verde) e as estações 32, 38, 36, 41, 42, 37, 18,19, 30, 22, 24, 26, foram classificadas com status bom e ótimo (azul).
Tabela 3. Dados gerados pelo software AMBI através da aplicação em dados de poliqueta bênticos coletados no período do inverno (Tommasi, 1979).
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Figura 9. Esquema ilustrando a região da Baixada Santista segundo a classificação AMBI no período de inverno (Fonte dos dados brutos: TOMMASI, 1979).
As regiões foram divididas de acordo com a classificação M-AMBI. Nota-se que as estações de 1 a 12, 14, 16, 39, 23,24, 28, 25, 41, 34, foram classificadas com status ecológico predominantemente ruim e muito ruim (vermelho); as regiões 13, 15, 26, 27, 42, 29, 30, 33, 36, 38, 31, foram consideradas como com status moderado (verde) e as estações 22, 21, 20,18, 40 e 35 foram classificadas com status entre bom e ótimo (azul). Resultados
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Caracterização da área pela análise dos resultados. Comparação entre a interpretação dada em Tommasi (1979) e pela aplicação do M-AMBI para a mesma base de dados. Tommasi (1979), a partir de critérios hidrológicos, sedimentares e faunísticos, concluiu que a área investigada se apresenta divida em regiões como se segue: Zona Interna do Canal de Santos (estações de 1 a 12); Zona Inicial do Canal de Santos (estações 13 a 18); Zona Oeste da Baía de Santos (estações 24, 25, 28, 33, 34, 35, 36, 40, 42, situadas a oeste do meridiano 46º20’42”); Zona Leste da Baía de Santos (estações 19, 20, 21, 22, 23, 29, 30, 31, 32, 37, 38, 39, situadas a leste do meridiano 46º20’42”) e Zona da Baía de São Vicente (estações 26, 27). A Zona Interna do Canal de Santos (estações de 1 a 12) e a Zona Inicial do Canal de Santos (estações 13 a 18) foram regiões que registraram os menores valores de densidade, número de espécies e diversidade, com dominância de espécies características de ambientes degradados como o poliqueto Paraprionospio pinnata e espécies das famílias Cirratulidae e Capitellidae. Essas regiões, segundo Tommasi (1979), apresentam segundo maior concentração de BHC, DDT, DIELDRIN e ENDOSULFAN (µ/L), além de uma variação vertical mais acentuada na salinidade da água, aporte de maior quantidade de poluente industrial e alta concentração de mercúrio nos sedimentos. O M-AMBI parece refletir apropriadamente a maior concentração de pesticidas no local. Nota-se que no período de verão, a região das Estações 1 a 12 e de 13 a 18 estão classificadas pelo M-AMBI como ambientes com status ecológico bastante prejudicado, chegando, por exemplo, a ter 100% de indivíduos do grupo ecológico V, como no caso da estação 3, formado por espécies extremamente resistentes a degradação ambiental. São espécies consideradas oportunistas de primeira ordem, que proliferam em ambientes bem perturbados. No inverno, a estação 1 a 12 também obteve a classificação de ambiente com status ecológico bastante ruim e as estações 13 a 18, apresentaram status ecológico entre ruim e moderado. Segundo Tommasi (1979), vários gêneros como Capitella sp., Dorvillea sp., Polydora sp., Tellina sp. e Prionospio sp., são bem conhecidos de áreas poluídas como de Los Angeles/Long Beach (EUA). Exemplificando, Capitella sp. ocorreu da estação 1 à Baía de São Vicente, áreas com manchas de poluição. Nota-se que através do AMBI, a área da estação 1 à 18, possui microrregiões com trechos que foram classificados entre ruim, muito ruim e moderado. A região das estações 1 a 18 é a região correspondente ao Porto de Santos e está sujeita a continua dragagem. A região recebe águas do rio Cubatão. Portanto, as áreas mais internas do Canal, principalmente as próximas ao Canal de Piaçaguera apresentam espécies classificados como altamente resistentes a áreas degradadas (tipo IV e V). Além das anteriormente apontadas por Tommasi (1979) pode-se citar também a ocorrência do poliqueta carnívoro Glycinde multidens também juntamente com os poliquetos da família Trochochaeta, espécies classificadas como grupo ecológico III, de transição para ambiente impactado. BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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A Zona Leste da Baía de Santos (estações 19, 20, 21, 22, 23, 29, 30, 31, 32, B, 37, 38, 39, situadas a leste do meridiano 46º20’42”) e a Zona Oeste da Baía de Santos (estações 24, 25, 28, C, 33, 34, 35, 36, D, 40, 42, situadas a oeste do meridiano 46º20’42”) apresentaram uma acentuada diferença em qualidade no mesmo período e também entre os períodos de verão e inverno. No verão, praticamente toda a Zona Leste foi classificada com bom status ecológico e a Zona Oeste principalmente como moderado. No inverno, tanto a Zona Leste quanto a Zona Oeste apresentam uma piora na integridade ambiental, com a região leste apresentando status predominantemente moderado e a oeste ruim. De um modo geral, a Zona Oeste da Baía de Santos apresenta-se mais poluída do que a Zona Leste devido a grande quantidade de mercúrio na água (0,80 µ/L se comparado com os 0.20 µ/L na Zona Leste). Os altos teores de mercúrio encontrado na Zona Oeste são provavelmente devido ao despejo de lodo dragado do Canal de Santos nessa região. Também foi constatado que o teor de pesticidas BHC, DDT, DIELDRIN e ENDOSULFAN (µ/L) é maior na Zona Oeste (TOMMASI, 1979). Nos pontos de coleta referentes à saída do Canal do Porto de Santos, região leste mais próximo da baía, o poliqueto da família Ohuphidae, Kinbergonuphis orenzansi são o de maior contribuição relativa. Nos pontos de coleta mais interiores do Canal do Porto de Santos, o poliqueto carnívoro Glycinde multidens divide a dominância com Kinbergonuphis orenzansi. Ambas as espécies classificadas como de equilíbrio (tipo III), o que se traduz na diagnose dos sítios como ligeiramente degradados. Estes ambientes foram classificados como ligeiramente a moderadamente impactados. Através do índice AMBI, pode-se notar que a região leste é menos poluída que o lado oeste da Baixada Santista. Isso pode ser justificado pela presença da cunha salina existente especialmente na zona leste da Baía de Santos e que penetra pelo fundo do Canal de Santos. Este é um sistema dinâmico, tanto do ponto de vista físico, químico, geológico como biológico e que sofre uma contínua e variada interferência humana. A presença da cunha salina garante uma contínua renovação da água no fundo de todo sistema estuarino permitindo a ocorrência de espécies bentônicas marinhas até o seu interior e mantém uma pronunciada estratificação vertical da coluna d’água. A região mais interior do Canal de Santos, abrangendo as estações 1 a 12 é a que apresenta uma variação vertical mais acentuada da salinidade da água e a que recebe mais poluente, como o mercúrio e pesticidas. Estas características fazem com que as populações planctônicas e bentônicas sejam mais pobres do que as demais regiões. Uma espécie de poliqueta que evidencia essa região como sendo a mais poluída é a Capitella capitata (TOMMASI, 1979). A Zona da Baía de São Vicente (estações 26, 27) foi classificada, segundo os critérios de M-AMBI, entre ótimo e moderado. Nota-se através da tabela 4.2.3, durante o período de verão, a estação 27 apresentou indivíduos de todos os Grupos Ecológicos (GE), exceto do grupo V, com maior índice de GE II (92,1%), ou seja, espécies de equilíbrio. Durante o período de inverno, o predomínio de espécies do GE II (72,5%) permanece. Já a estação 26, apresentou uma intersecção entre moderado e ótimo. Durante o verão, houve o predomínio do GE BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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II (40,9%) e durante o inverno, GEIII (54,5%). A maior representatividade do grupo ecológico III indica uma piora nas condições ambientais no período de inverno. Em relação aos pesticidas (BHC, DDT, DIELDRIN e ENDOSULFAN) a baía de São Vicente apresentou as menores concentrações. Discussão Através de extenso trabalho, Tommasi (1979) obteve uma visão da Baixada Santista em relação à sua integridade ambiental analisando aspectos como temperatura, salinidade, sedimento, teor de mercúrio, pesticidas, níveis de fosfato, nitrato, sulfetos e comunidade bêntica, encontrando relação inversa entre a concentração de mercúrio e pesticidas e a integridade do ambiente, medida pela riqueza e diversidade das comunidades bênticas. A diagnose elaborada para a região por Tommasi foi validada pelo índice M-AMBI. O índice M-AMBI parece servir como uma ferramenta simples e eficiente para se diagnosticar a situação do local de interesse, através do levantamento de espécies de poliquetas, servindo como bioindicadores, a identificação desses organismos em nível de gênero ou espécie e a aplicação do software disponível no site AZTI (www.azti.es) pode-se obter a integridade ambiental da região. Através do diagnóstico gerado pelo software, tendo como classificação os parâmetros “muito ruim, ruim, moderado, bom e ótimo”, gestores ambientais, profissionais que não recebem durante a sua graduação um entendimento tão específico sobre organismos bioindicadores, taxonomia animal e ecologia/dinâmica de ecossistemas aquáticos, são capazes de interpretar a situação da região e tomarem as devidas providências pertinentes ao problema em questão. No trabalho realizado por MUNIS et al (2005), ficou evidente que para uma boa interpretação do índice é necessário ter um referencial da área estudada para ter-se um ponto de referência inicial para obter-se uma comparação. O trabalho mostrou também a dificuldade em realizar esse tipo de estudo em países em que os trabalhos científicos existentes não contemplam todas as informações necessárias para aplicar o AMBI com certa confiabilidade para se ter precisão nos resultados. É importante evidenciar que a única legislação que se tem em relação ao ambiente sedimentar, a resolução CONAMA 344/2004 se aplica somente as demandas quanto a análise e disposição de material dragado, entretanto, há especialistas que defendem algumas revisões nesta resolução. A resolução não abrange a origem da contaminação e também não permite a identificação desta contaminação. É necessário que se crie mecanismos jurídicos para regulamentar a qualidade do meio visando a integridade e qualidade do sedimento marinho, favorecendo assim, a biodiversidade aquática. O monitoramento de áreas de disposição de material dragado é realizado por vários países e é parte integrante da gestão da atividade portuária. Diferentes abordagens para o estabelecimento de critérios de qualidade para sedimento vêm sendo utilizadas (ALVAREZ-GUERRA et al., 2007a). BOLTA, Paula Mathias Paulino; FLYNN, Maurea Nicoletti. Índice M-AMBI como ferramenta para diagnosticar a integridade ambiental costeira, aplicado a Baixada Santista- SP. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 45-77, out. 2013.
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Independentemente da forma como cada país deriva seus critérios de qualidade, estes são necessários para acompanhar e orientar decisões sobre a qualidade do sedimento de locais de interesse e para garantir a proteção do ecossistema aquático. Critérios de qualidade de sedimentos vêm sendo discutidos no Brasil (MOZETO et al., 2006), porém ainda não estão contemplados nas regulamentações brasileiras. A resolução que dispõe sobre a gestão dos recursos hídricos superficiais, CONAMA 357 de 2005, indica a necessidade de se considerar os sedimentos na avaliação da qualidade ambiental, porém somente lista padrões de qualidade para águas. Conclusão Como foram abordados no trabalho, índices de integridade ambiental são de fundamental importância para que se possa ter uma avaliação a respeito da qualidade ambiental do meio estudado. A tese de livre docência feita por TOMMASI, em 1979, serve de referência para compararmos a atual situação ambiental em que se encontra a região do Porto de Santos. A aplicação do índice M-AMBI, evidenciou-se ter uma correlação positiva com as descrições feitas pelo autor supracitado referente ao meio ambiente estudado. Portanto, a aplicação do índice M-AMBI demonstrou ser uma ferramenta prática para um gestor ambiental, que mesmo sem ter o entendimento técnico de um especialista em bioindicadores, no caso os poliquetas, é capaz de interpretar os dados e tomar as devidas providências necessárias para determinado caso. Referências ALVAREZ-GUERRA, M.; VIGURI, J. R.; CASADO-MARTÍNEZ, M. C. & DELVALLS, T. Á. Sediment Quality Assessment and Dredged Material Management in Spain: Part II, Analysis of Action Levels for Dredged Material Management and Application to the Bay of Cádiz. Integrated Environmental Assessment and Management. v 3, n 4, pp. 539-551, SETAC, 2007a. ALVAREZ-GUERRA, M.; VIGURI, J. R.; CASADO-MARTÍNEZ, M. C. & DELVALLS, T. Á. Sediment Quality Assessment and Dredged Material Management in Spain: Part I, Application of Sediment Quality Guidelines in the Bay of Santander. Integrated Environmental Assessment and Management, SETAC, v.3, no. 4, p. 529-538, 2007b. AMARAL, A.C & NONATO E.F. Annelida Polychaeta. Características, glossário e chaves para famílias e gêneros da costa brasileira. Editora Unicamp. 1996.
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Alometrias em toda parte. William Roberto Luiz Silva Pereira Bacharel
e
Universidade
Licenciado
em
Presbiteriana
Ciências
Biológicas
Mackenzie.
pela
Publicações
científicas em Ecologia Teórica e Aplicada. Especialista em Matemática
Aplicada
à
Biologia
(Biomodelagem).
Participação técnica no Guia para o Inventário Nacional de Bifenilas
Policloradas
(PCB)
e
em
Mecanismos
de
Transposição para Ictiofauna. Assessor técnico na Bio.Sensu. Email: william_roberto_luiz@hotmail.com
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Resumo Uma relação de escala surge quando uma variável pode ser explicada em função de outra através de uma lei de potência na forma Y = axb. Uma relação alométrica surge quando uma dada variável biológica é explicada por uma lei de potência, mas dessa vez essa variável torna-se função da massa corporal do organismo, ou seja, Y = amb (mas para essa última definição há exceções). Tanto as relações de escala quanto as relações alométricas ocorrem em diversos níveis de organização biológica, desde metabólicas e fisiológicas até ecossistêmicas. Atualmente esse campo é intensamente debatido: de um lado os teóricos se esforçam para explicar porque certas alometrias sempre tendem a revelar valores característicos para o expoente e os mecanismos que os determinam; de outro estão os pesquisadores que descrevem novas alometrias a partir de experimentos cuidadosamente controlados, cujos resultados fortalecem ou enfraquecem a fundamentação teórica edificada pelo primeiro grupo. É difícil acompanhar todo o desenvolvimento gerado nesse campo interessantíssimo da biologia, dado a imensa quantidade de conhecimento gerado até os dias atuais. Portanto, o intuito desse artigo é conduzir o leitor desde o surgimento desse conceito, apontando alguns setores da biologia que fazem uso das relações de escala e das relações alométricas, apresentando alguns avanços e aplicações práticas. Palavras-chave: alometrias, relações de escala biológicas, leis de potência.
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Abstract A scaling relationship emerges when a variable can be explained in function to another by a power-law Y = axb. An allometric scaling emerges when a given biological variable can be explained in a power-law Y = amb, but in this case, the variable becomes function of organism’s body mass (but to the last one there are exceptions). Both the scaling relationship and allometric scaling rise in several levels of biological organization, since metabolical and physiological to the ecosystemic approach. Currently this field is intensely debated: in one side theoreticals make an effort to explain why some allometries lay down in characteristics values to the exponents and the mechanisms that define the values; in the other side there are experts who describre new allometries from carefully controlled experiments, whose results strengthen or weaken theoretical arguments. It’s too hard to follow all the development in this intriguing biological field, given the large knowledge generated until nowadays. Then, the propose of this article is to guide the reader since the initial investigations of the allometric concept, pointing some biological fields that scaling relationship and allometric scaling are studied and applied, pointing some advances and pratical applications. Key-words: allometric scaling, biological scaling relationships, power-laws.
Introdução Julian Huxley e Georges Teissier cunharam o termo “alometria” em 1936, acreditando que o uso desse termo evitaria confusão no campo do PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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crescimento relativo. Eles ainda se apoiaram nos símbolos para serem usados na fórmula algébrica de crescimento alométrico: Y = axb Ocorreram três fases de desenvolvimento da teoria das alometrias: por volta de 1924 as várias linhas de pesquisa em diferentes áreas da biologia convergiam para a lei do crescimento diferencial constante. Após 1924 o conceito de alometria e sua terminologia foram inventados; e após 1945, quando os biólogos, especialmente os biólogos evolucionistas, supuseram que o termo e a equação de alometria estavam equivocados (GAYON, 2000). Em 1988 a definição de alometria já estava estabelecida, mas restrita a designar as mudanças nas dimensões relativas das partes de um organismo correlacionadas com mudanças no seu tamanho total, ou mais concisamente, entre mudanças de forma e tamanho. Em 2000 já existiam quatro conceitos de alometria: alometria ontogenética, referente ao crescimento relativo de um indivíduo; alometria filogenética, referente as razões de crescimento diferencial constantes em linhagens; alometria intraespecífica, referente a indivíduos adultos dentro de uma espécies ou a uma dada população local; alometria interespecífica, referente a algum tipo de fenômeno entre espécies relacionadas. Em 2002 o conceito de alometria já estava mais que estabelecido, e a função-potência sugerida por Huxley & Teissier é usada para descrever três classes de fenômenos ecológicos (BROWN et al., 2002): A primeira classe inclui as leis de potência cujas constantes exibem uma amplitude limitada de valores, principalmente os valores do expoente de escala (b), que são geralmente múltiplos de um número. Por exemplo, fenômenos que exibem um expoente de escala da geometria Euclidiana têm expoentes que são múltiplos de 1/3, quando a variável independente é a massa (M) ou volume (V), ou seja, as dimensões lineares escalam com V1/3 e a área superficial escala com V2/3. Alometrias biológicas, em contraste, são as escala de tratos em relação à massa corporal, M, e as leis de potência tendem a ter expoentes que são múltiplos de ¼: a taxa metabólica de organismos escalam com M3/4; o tempo de desenvolvimento, tempo de vida e outros tempos biológicos escalam com M1/4; e a taxa cardíaca, taxa máxima de crescimento populacional e outras taxas escalam com M1/4;
A segunda classe de leis de potência ecológicas não é tão restrita, pois as equações empíricas revelam uma grande amplitude de valores para a constante e para o expoente. Um exemplo é a lei de potência de Taylor que relaciona a variância e a média de séries temporais das densidades populacionais de determinada espécie de inseto em sítios múltiplos e espacialmente separado (existe também a lei de potência de Taylor que é usada para medir o grau de agregação populacional, que revela valores bem diversos). Essa variabilidade de valores
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oferece poucas pistas para mecanismos físicos e biológicos específicos. A possibilidade da maior parte da variação ser relacionada a um processo chave existe, o qual pode ser caracterizado em termos de um parâmetro ou combinação de parâmetros; A terceira classe de relações de escala alométrica ecológica pode não representar exemplos de comportamento escala auto-similar através de uma grande amplitude de escalas. Exemplos podem incluir a relação espécie-área e espécie-tempo e a distribuição de abundância ou massas corporais entre espécies de uma comunidade biológica. Há pesquisadores que afirmam que essas relações não são auto-similares em ordens de magnitudes maiores. Derivando uma lei de potência a partir de premissas gerais Uma variável qualquer, que podemos chamar de y, pode ser derivada em relação ao tempo, ou seja, dy/dt, da mesma maneira que outra variável, x, também pode ser derivada em relação ao tempo, ou seja, dx/dt. Essas duas variáveis podem acontecer ao mesmo tempo num dado sistema (seja num objeto que se transforma ao longo do tempo, num fenômeno natural, num sistema artificial, etc.) e possivelmente haveria uma equação que descrevesse a variação dessas variáveis em relação ao tempo. Derivações rápidas da equação geral da alometria podem ser conferidas no quadro 1. Com isso podemos ver que uma lei de potência surge quando duas variáveis guardam uma relação entre si que é garantida por um fator de transformação b. Se essa relação existe, a variável tempo é eliminada, pois ambas as variáveis estão ocorrendo ao mesmo tempo durante a realização de ambos os fenômenos. Portanto, uma alometria só ocorre quando duas variáveis se inter-relacionam através de um expoente que promove o intercâmbio entre ambas, e essa inter-relação é garantida por uma lei de potência. Diante dos infindáveis fenômenos que ocorrem nos sistemas naturais e artificiais, é tentador afirmar que pode existir um número infindável de alometrias. Basta apenas relacionar duas variáveis: se elas puderem ser descritas através de uma lei de potência, pronto (e satisfazendo alguns critérios estatísticos), mais uma relação de escala foi descoberta! E se for função da massa corporal de organismos vivos, ela irá pertencer ao grupo das relações alométricas biológicas.
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Quadro 1. Derivação da lei de potência usada por Huxley & Teissier (1936) para fundamentar a Teoria das Alometrias. A direita está a derivação onde é demonstrada a Lei da Superfície de Rubner.
Na tabela seguinte estão descritas mais de 20 alometrias (Tabela I) dentro das ciências biológicas, principalmente na fisiologia animal e na ecologia. Mas essa lista é pequena diante do total já descrito em todos os setores relacionados à ciência da vida somados as diversas leis de potência existentes na física (lei de Stroke, por exemplo), economia (lei de Pareto, por exemplo), lingüística (lei de Mandelbrot-Zipf, por exemplo), na matemática (fractais, por exemplo), na estatística (análise R/S, por exemplo), etc. Ainda faltou cobrir todas as alometrias relacionadas à fisiologia e ecologia vegetal, que também compreende uma lista extensa. Até o estabelecimento do conceito de alometria (a partir de Huxley, 1936), como os biólogos atuavam nessa frente de pesquisa? CHAMP (1924), um fisiologista, escreveu o livro chamado Sexuality and Hormones e criou o termo “crescimento desarmônico”, onde clamou ter descoberto a lei que descreve o tamanho relativo de uma característica sexual em função do tamanho corporal. Na sua descoberta, ele descreveu a seguinte lei de potência: V = aM2 sendo V a medida da característica sexual secundária e M a massa corporal. Para o estudo o autor considerou o tamanho do chifre do besouro macho Dynastes, mostrando que se o peso aumenta duas vezes, o tamanho do chifre aumenta quatro vezes. FULTON (1902) explorou a relação entre comprimento e peso de um número diferente de espécies de peixes. Em 1904 ele publicou estudos de PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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crescimentos de peixes relacionando o comprimento, volume e peso, e afirmou que “de acordo com uma lei bem conhecida, que preconiza que o volume de corpos de formas similares com mesma gravidade específica varia diretamente com o cubo da dimensão correspondente – lei apresentada por Herbert Spencer no seu Principles of Biology – um peixe que duplique seu comprimento deve aumentar seu peso em oito vezes”. KEYS (1928) também cita a lei cúbica de Herbert Spences, afirmando que a relação peso-comprimento poderia ser expressa assim: o peso é igual ao cubo do comprimento vezes uma constante: M = aL3 Mas diante da grande variabilidade encontrada nos experimentos, o autor afirmou que essa relação não dava uma descrição correta da relação peso-comprimento, propondo uma fórmula mais geral M = aLb A aceitação do conceito de alometria nos diferentes campos da biologia Biologia da pesca – Relação peso-comprimento – Lei de Fulton Após FULTON (1902), a relação peso-comprimento foi rapidamente estabelecida na biologia da pesca, principalmente depois de LE CREN (1951). Muitos trabalhos descreveram relações peso-comprimento para uma infinidade de espécies de peixes e isso permitiu a realização por Froese (2006) de uma meta-análise. Como dito anteriormente, a relação peso-comprimento M = aL3 foi generalizada para M = aLb. Os valores de b são normalmente distribuídos com média b = 3 (FROESE, 2006). Quando b = 3 é dito que o peixe cresce isometricamente em relação ao tamanho; quando b > 3 o peixe tem crescimento alométrico positivo e quando b < 3 é alométrico negativo. Os valores de b podem ir de 1,96 < b < 3,94. O coeficiente a é entendido na biologia da pesca como fator de condição. Os valores para log a tem distribuição log-normal e podem ir de 0,0001 < a < 0,273. Froese (2006) forneceu uma interpretação biológica para a quando b ≈ 3: quando a = 0,001 o peixe tem forma de enguia (alongada); quando a = 0,01, o peixe tem forma fusiforme; quando a = 0,1, o peixe tem forma esférica. Tabela I. Lista não exaustiva de diversas relações de escala e relações alométricas descritas na literatura biológica, incluindo o principal trabalho de HUXLEY & TEISSIER (1936) que estabeleceu um marco no desenvolvimento do tema.
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Numa tentativa de aplicar a relação peso-comprimento e utilizar os parâmetros como indicadores de impacto ambiental, ARAÚJO e colaboradores (2011) estudaram três populações do peixe Mugil curema: uma em ambiente de preservação ambiental, uma em região com altas concentrações de compostos mutagênicos e outra em área com concentrações PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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de compostos mutagênicos pouco elevados. Os parâmetros foram revelados e a população da região com maiores concentrações de compostos mutagênicos teve o expoente afastado da isometria (b = 2,77), enquanto no ambiente preservado (b = 2,97) e naquele com concentrações menores (b = 2,93) os expoentes ficaram mais próximos da isometria, sugerindo que o expoente poderia ser um bioindicador efetivo. Porém pouco se sabe sobre os mecanismos que determinam a sua variabilidade. Bioenergética – Lei de Rubner e Lei Kleiber RUBNER (1883) mediu a taxa metabólica basal de cães de vários tamanhos, notando que a taxa metabólica específica, definida como a taxa metabólica por unidade de massa corporal, era maior em cães menores e menores em cães maiores. Supôs que isso poderia ser atribuído ao fato de um animal menor ter uma área corporal maior em relação a massa, quando comparado a um animal maior. Como cães têm temperatura corporal constante eles devem, no mínimo, produzir calor metabólico na mesma proporção que o perdem na superfície. Ao medir a produção de calor por metro quadrado de superfície corporal, Rubner encontrou valores em torno de 1000 kcal/m2 por dia em cães grandes e pequenos, fornecendo apoio para sua teoria de que a taxa metabólica basal deveria ser governada pela razão superfície/volume S/V ~ M 2/3 necessária para manter o animal aquecido. De posse dessas evidências Rubner definiu as premissas: animais homeotermos tendem a perder calor para o ambiente; a perda de calor é proporcional a superfície corporal do animal; pequenos animais homeotermos com grandes áreas superficiais em relação ao volume perdem calor mais rapidamente; e um aumento no processo metabólico é necessário para que pequenos animais homeotermos possam manter a temperatura corporal. Facilmente podemos chegar na alometria de Rubner, partindo de premissas geométricas (ver Quadro 1). KLEIBER (1932) publicou o artigo “Body size and metabolism”, que incluiu um gráfico com o logaritmo do tamanho corporal de mamíferos (de ratos até gado) contra o logaritmo da sua taxa metabólica basal (basal metabolic rate, BMR), encontrando: BRM = 3,52M0,74 Em 1961, no livro The Fire of Life, Kleiber usou medidas de mamíferos (ratos até elefantes) aparecendo BRM = 3,40M0,75 BMR é medido em watts. Essa é uma das mais conhecidas generalizações na bionenergética, com centenas de BMRs disponíveis para animais de sangue frio (ectotérmicos) e de sangue quente (endotérmicos). WEST (1999) previu a taxa metabólica de organismos com 20 ordens de magnitude usando a fórmula de Kleiber. Mais tarde, WEST e colaboradores (2002) verificaram que a mesma relação de escala de M3/4 PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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cobria 27 ordens de magnitude, revelando a taxa metabólica de uma única célula de determinado mamífero, de uma mitocôndria isolada, de seu complexo respiratório e de uma molécula citocromo-oxidase. Ou seja, a taxa metabólica realizada por uma única molécula biológica até o maior mamífero terrestre existente (elefante) e quem sabe até o maior ser vivo da terra (baleia-azul), respeita uma mesma regra de escala universal. Quando os dados são estendidos para organismos de sangue frio e organismos unicelulares, a mesma dependência de ¾ é manifestada, porém a constante de normalização pode variar (SMIL, 2000). Com todas essas evidências, essa alometria ficou conhecida como lei de Kleiber, que atualizada pode ser descrita BRM(M) = aMesp3/4 Porém, físicos e biólogos queriam saber como o expoente ¾, gerado a partir de conceitos da geometria Fractal ou geometria da auto-similaridade, surgia em detrimento do expoente 2/3, gerado a partir premissas geométricas Euclidianas. Note que de KLEIBER (1932) até WEST e colaboradores (1997) passaram-se 65 anos. A teoria das Geometrias Fractais ou Geometrias Auto-Similares foi estabelecida por MANDELBROT (1983), necessária para fomentar as derivações de WEST e colaboradores, e que coincidentemente, também se aproveita das leis de potência para o cálculo das Dimensões Fractais. O que motivou WEST e colaboradores (1997) a desenvolver uma teoria geral das alometrias foi a maneira com que as redes de distribuição de recursos se organizam em diferentes sistemas fisiológicos (sistema circulatório, sistema respiratório em animais e sistema vascular nas plantas). O sistema circulatório (ou sistema cardiovascular) é um sistema orgânico que move substâncias para as células e substâncias produzidas pelas células. Os principais componentes do sistema são o coração, o sangue e os vasos sanguíneos (aorta, artéria, arteríolas e capilares). A rede possui diversas ramificações, da aorta (ramificação 0) até os capilares (ramificação N). Essas são as premissas iniciais que levam a derivação do expoente de ¾. Para a derivação completa, ver WEST e colaboradores (1997) e WEST (1999). Sistema respiratório e cardiovascular – alometrias particulares Os fisiologistas relacionaram diversas variáveis biológicas com a massa corporal. Ao defender a teoria universal que descreve como materiais essenciais são transportados através de redes fractais de preenchimento de espaços através de redes ramificantes e que prevê todos os expoentes relacionados ao transporte, WEST e colaboradores (1997) disponibilizaram essas alometrias encontradas na fisiologia do sistema cardiovascular e respiratório de mamíferos, todas relacionadas com a massa corporal (Tabela II). PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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Ecologia comportamental - Agregação populacional – Lei de Taylor A lei de potência de Taylor (TAYLOR, 1961) foi descrita a partir de algumas constatações advindas da estatística. Ela foi usada pela primeira vez por SMITH (1938) e surge ao relacionar dados empíricos de densidades populacionais. Por exemplo, é definido num desenho amostral que serão feitas 10 amostras de organismos dentro de um volume de solo prédeterminado, a cada semana num dado ambiente, por 7 semanas: portanto, teremos 7 grupos com 10 amostras em cada grupo. Depois de contabilizados os organismos em cada amostra, a média e a variância em cada grupo de 10 amostras são calculadas. Esses valores são colocados num gráfico. Empiricamente surge a seguinte lei de potência: Si2 = aMib 2 onde S é a variância de um dado grupo de amostras i e M a média desse mesmo grupo de amostras i. Ao plotar a variância contra a média surge uma relação de escala com um valor de b característico. Estatisticamente b mede a maneira que a variância muda com a média: a variância é dependente da densidade exceto quando b = 1. Porém os valores de b descrevem a maneira que os organismos estão distribuídos espacialmente no ambiente, quer seja de maneira aleatória (quando b = 1) até a disposição totalmente agregada (quando b = 2). Quando b = 0, a distribuição espacial dos organismos é regular.
Tabela II. Alometrias descritas no nível fisiológico com seus expoentes característicos. A teoria de WEST e colaboradores (1997) previram todos esses expoentes, com boa aproximação aos dados experimentais.
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A lei de potência de Taylor foi aplicada em algumas espécies de invertebrados da comunidade macrobêntica de regiões entre-marés (FLYNN & PEREIRA, 2009) (Figura 1). Esses ambientes são conhecidos como marismas (salt marshes), com a predominância de uma única espécie de planta, o capim-marinho (Spartina alterniflora). O ambiente de marisma pode ser classificado em marisma alto (upper marsh) e marisma baixo (lower marsh) pelo grau de exposição às marés. Alguns organismos podem ser encontrados em ambos os ambientes. Foi encontrado os valores de agregação para essas espécies, que coincidiram tanto em marisma alto como em marisma baixo, além de coincidir com a biologia das espécies. Por exemplo, os oligoquetos infaunais Nereis oligohalina e Isolda pulchella apresentaram b ≈ 2, e seu modo de vida consiste em se manter no sedimento junto as raízes do capim-marinho. Já o organismo epifaunal Sphaeromopsis mourei apresentou b ≈ 1. Os coeficientes variaram em função do grau de exposição às marés, o que permitiu que fosse criado um índice de estresse ambiental: os maiores valores de a foram associados ao menor sofrimento associado ao maior período de imersão e o aumento de fornecimento de nutrientes trazidos pelas águas.
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Figura 1. Esquerda: plotagem log-log da média e variância das abundâncias populacionais em marisma baixo (gráfico acima) e em marisma alto (gráfico abaixo) para as cinco principais espécies da macrofauna associada ao banco de capim-marinho Spartina alterniflora, que compreende o ecossistema de marisma (direita). No centro estão tabelados os valores para o índice de agregação (b) e o coeficiente (a), esse último denominado por FLYNN & PEREIRA (2009) como índice de estresse ambiental, associado ao grau de exposição às marés. A figura logo abaixo da tabela é uma representação artística do que seriam ambientes de marisma, alto e baixo.
Macroecologia - Relação espécie-área – Lei de Arrhenius ARRHENIUS (1921) fez a seguinte experiência: contabilizou o número de espécies de plantas (S) contra uma área de amostragem (A) para uma série de amostras de diferentes tamanhos. Surpreendentemente, apareceu a seguinte regra: S = cAz A forma fundamental dessa lei mostra que o número total de espécies aumenta com a área. Esse aumento acontece por dois motivos: quanto mais indivíduos são amostrados, a chance de se encontrar uma espécie adicional aumenta, principalmente se as espécies não estão aleatoriamente distribuídas; e uma grande área é apresenta provavelmente maior heterogeneidade ambiental, portanto, contem espécies adicionais que diferem em seus nichos. Anos depois, e diante de diversas constatações, SCHOENER (1976) chamou-a de “uma das poucas leis genuínas da ecologia de comunidades”. Os valores de z se concentram em torno de z = ¼ = 0,25. (Alguns exemplos podem ser conferidos na figura 2. SCHEINER (2003) reconheceu seis tipos de curvas para descrever a relação espécie-área, que podem ser construídas a partir de quatro esquemas de amostragem: (a) quadrats estritamente aninhados; (b) quadrats arranjados num grid contínuo; (c) quadrats arranjados em grids PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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regulares, mas não contíguos; (d) ou em áreas em que variam de tamanho, como ilhas ou fragmentos florestais.
Figura 2. Alguns exemplos de plotagens log-log da riqueza de espécies contra a área, revelando o expoente da relação espécie-área. Não importa o táxon e nem a região, a relação tende a ser respeitada, com maior ou menor coeficiente de determinação e alguma variabilidade no expoente. O último gráfico não apresenta os dados logaritmizados. Dados para Ilhas Caribenhas: WRIGHT (1981); Estados Unidos: JOHNSON et al. (1968); Península da Flórida, Estados Unidos: PECK et al. (2005); Ilha de Sunda (?); Reserva Florestal de Linhares, Brasil: ROLIM & NASCIMENTO (1997).
Numa meta-análise, DRAKARE et al. (2006) obtiveram os expoentes (z) e os coeficientes de correlação (R2) para 794 relações espécie-área publicadas na literatura. O valor médio para a inclinação foi de z = 0,27, variando entre 0 < z < 1, com o valor médio da qualidade do ajustamento de R2 = 0,718. Diversas variáveis foram consideradas ao classificar as diferentes relações espécies-áreas, dado a diferenças substanciais nos estudos realizados em arquipélagos e continentes, bem como entre habitats, diferentes graus de conectividade. Os valores foram testados considerando o ecossistema terrestre e aquático (o fator do domínio) e foram testadas diferenças entre tipos de ecossistema (habitat, contraste, ilhas, continentes florestados, continentes não-florestados, lagos, riachos e oceanos). Os “domínios” refletem as diferenças nas origens fisiológicas e evolutivas das espécies em ambientes terrestres e aquáticos bem como os contrastes na complexidade espacial entre esses ecossistemas maiores. “Habitats” focam as diferenças potenciais que surgem a partir de diferentes complexidades espaciais e isolamento. Os autores esperaram encontrar diferenças significantes. Os resultados mostraram que as diferenças encontradas no expoente foram mínimas entre os domínios terrestres e aquáticos, porém foram encontradas variações significantes entre diferentes habitats, tanto PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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para o expoente quanto para o coeficiente de correlação. A discussão é extensa é pode ser conferida em DRAKARE et al. (2006). Existe uma inter-relação entre a relação espécie-área e mais duas leis de escala ecológicas: a freqüência de espécies versus o comprimento da espécie e a massa corpórea máxima versus a área. SOUTHWOOD e colaboradores (2006) mostraram que resultados empíricos relacionando a massa corpórea máxima de vertebrados terrestres com a raiz quadrada da área se adaptam as expectativas teóricas dadas pelas duas leis citadas. Além disso, o expoente que surge ao relacionar o comprimento das espécies versus a freqüência de espécies sugere uma dimensão para o espaço de nicho para comunidades de vertebrados de D ≈ 3/2 e esse valor associado à lei de potência para tamanho corpóreo máximo versus a área, dão origem ao expoente canônico da relação espécie-área z ≈ ¼. Dinâmica populacional - Taxa intrínseca de crescimento – Lei de Fenchel Toda população biológica possui a capacidade natural de crescer e essa lei é formulada da seguinte maneira: uma população irá crescer (ou declinar) exponencialmente desde que toda a interferência sentida pelos indivíduos permanecer constante ao longo do tempo. Sua formulação é muito antiga e nasceu do demográfo Thomas Malthus (MALTHUS, 1798). Parte da equação diferencial (1) dN/dt = rN = (b – d)N cuja solução é uma função exponencial na forma (2) N(t) = N(0)ert = N(0)=e(b-d)t Essas equações podem ser traduzidas da seguinte maneira. A forma diferencial diz que a taxa de crescimento da população N em função do tempo (lado esquerdo da equação 1) diz que a taxa de crescimento populacional (r) regula o crescimento dessa população e essa mesma taxa se traduz num balanço entre a taxa de indivíduos que nascem (b) e a taxa de indivíduos que morrem (d). A solução da equação (1) é apresentada na equação 2, informando que o crescimento dessa população acontece na forma exponencial, possuindo uma variável (o tempo t) e dois parâmetros (r e N(0)). Quem determinará o quanto a população irá crescer/diminuir dentro de um intervalo de tempo será a taxa de crescimento (r). Para uma população crescer, ela dependerá de uma população inicial (N(0)). Nunca crescerá se N(0) = 0 (condição de extinção), pois não há indivíduos para reprodução. Teoricamente toda população isolada cresceria num ambiente estável e livre de interferências ambientais somente quando N(0) = 2, uma população compreendida por um único macho e uma única fêmea. Porém existem organismos que se reproduzem por fissão binária, por exemplo. Darwin usou os princípios dessa equação para formular a teoria da Seleção Natural. O próprio Malthus chegou a conclusões que ajudaram no PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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desenvolvimento da Sociologia e da Economia. Sua modelagem muito fácil faz parte de muitos cursos de introdução ao cálculo diferencial e integral e é a porta de entrada para conceitos relacionados à dinâmica de populações, como veremos. FENCHEL (1974) mostrou que r não está relacionado apenas com o balanço entre nascimentos e mortes. Ao relacionar r com o tamanho corporal de diversos seres vivos, de diferentes espécies, encontrou uma relação alométrica muito interessante, onde a taxa intrínseca diminuía conforme o tamanho corporal aumentava. Designou rmax, pois essas taxas foram obtidas a partir de experimentos controlados, onde se garantia as condições necessárias para que houvesse um crescimento populacional explosivo (ou seja, minimizou a quantidade de baixas no contingente). Fenchel encontrou valores que puderam ser aproximados a seguinte lei de escala: rmax = aM-1/4 Deduz-se que rmax raramente acontece na natureza, dados os diversos fatores biológicos que regulam e/ou controlam as populações naturais. Os valores para o expoente ficaram muito próximos de -0,25, porém o coeficiente variou para os diferentes grupos estudados (fagos, bactérias, protozoários, homeotermos metazoários e homeotermos). BLUEWEISS e colaboradores (1978) usaram os dados de Fenchel para populações cultivadas em laboratório, atingindo um amplo espectro de táxons, encontrando rmax = 1,6M-0,26. O expoente se manteve muito próximo de b = 0,25 = -1/4. REISS & SCHMID-ARAYA (2010) calcularam e compararam o potencial de crescimento de organismos que realizam fissão binária, de várias espécies mantidas em cultura (das ordens Ciliata, Turbellaria, Rotifera, Nematoda, Oligochaeta, Cyclopoida, Harpacticoida, Ostracoda e Cladocera), além de dados de outras espécies disponíveis na bibliografia, resultando num total de 100 espécies. Assumindo que as taxas usadas no trabalho representam a taxa de crescimento potencial inerente de culturas e que o crescimento populacional é exponencial, e fornecendo o valor de rotatividade de biomassa por dia. Após estimar a massa corporal média e a taxa de crescimento para cada uma das espécies, os valores foram plotados num gráfico log-log. A equação gerada foi: log(rmax) = -0,29log(M) – 1,38 ou na forma usual rmax = 0,041M-0,29 MASSARO (2006) acompanhou o crescimento populacional de Hydra viridissima, o principal representante do filo Cnidaria de água doce. A espécie foi cultivada em laboratório, em 9 experimentos diferentes (figura 3). Se considerarmos que o grupo Ciliata tem massa individual média de M = 0,038 ± 0,238 μg C (REISS & SCHMID-ARAYA, 2010) e inclui a espécie H. viridissima, aplicando na relação rmax = 0,041M-0,29, encontraremos rmax(H. viridissima) = 0,1058/dia, valor diferente daquele encontrado por MASSARO (2006) rmax(H. viridissima) = 0,047/dia. Porém PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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a massa corporal média para esse grupo apresentou uma grande variação. Se considerarmos a amplitude máxima de variação, ou seja, M = 0,038 + 0,238 = 0,276 μg C e aplicarmos novamente na lei de potência, surge rmax(H. viridissima) = 0,059/dia, se aproximando do valor médio encontrado por MASSARO (2006). No experimento 2 de Massaro, surgiu rmax(H. viridissima) = 0,061/dia. Portanto, a lei de Fenchel realmente prevê a taxa máxima de crescimento natural conhecendo a massa corporal média do organismo, apresentando, no entanto, grande variação dos valores.
Figura 3. Crescimento exponencial de Hydra viridissima em experimentos controlados, revelando rmax. Note que houve variação nos valores, sendo que foi sugerido para espécie rmax = 0,047 ± 0,009. Adaptado de Massaro (2006).
Recentemente os pesquisadores procuram pelos mecanismos que permeiam o surgimento de rmax e a lei de Fenchel. Além da taxa máxima ser função da massa corporal, é função também da temperatura, sendo que esse último determinante está intimamente associado ao fornecimento de energia necessário para disparar reações metabólicas de transformação de energia e biossíntese. A biossíntese reflete na taxa metabólica, e esta é dependente da massa corporal (SAVAGE et al., 2004). A Lei de Fenchel e os achados de SAVAGE e colaboradores (2004) participam primariamente na ecologia e evolução das espécies porque rmax controla a habilidade da população se recuperar de um impacto, de expandir para habitats ainda não ocupados e de competir com outras espécies (ANDERSON-TEIXEIRA et al., 2009). A taxa intrínseca parece realmente fornecer à espécie habilidade de se recuperar de um estresse de origem biótica causado pelos efeitos da competição interespecífica. No litoral sul de São Paulo, Brasil, os crustáceos PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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anfípodes Hyale nigra, Caprella penantis e C. danileviskii foram monitoradas junto às demais espécies que compreendem a comunidade associada à alga Bryocladia thrysigera (VALERIO-BERARDO & FLYNN, 2002). C. penantis e C. danileviskii quando isoladas no ambiente, apresentam r = 0,04/dia e r = 0,05/dia, respectivamente. Durante o processo competitivo, quando as densidades dos dois caprelídeos se encontraram baixas, H.nigra realizou um início de crescimento exponencial, que curiosamente também revelou r = 0,05/dia (FLYNN & PEREIRA, 2012, no prelo). Os autores não verificaram se essas taxas correspondem à taxa máxima. Entretanto, as ótimas condições ambientais e bióticas onde os caprelídeos monitorados realizaram crescimento exponencial, a habilidade de H. nigra se recuperar de um período de interferência competitiva e a convergência dos resultados levam a crer que os r’s calculados se encontravam próximos de rmax. Dinâmica Populacional - Densidades populacionais – Lei de Damuth Os conceitos da dinâmica de populações de abundância populacional e massa corporal incentivaram Damuth (1981) a relacionar essas duas variáveis. Damuth compilou densidades populacionais estacionárias (algo próximo da capacidade suporte K) de várias espécies de mamíferos herbívoros (consumidores primários), e relacionou a densidade populacional média de cada espécie com a massa corporal média dos indivíduos da espécie correspondente, encontrado uma relação alométrica importante: N(Mmédia) = cMespécie-3/4 Esse resultado significativo mostra que é possível prever a densidade populacional média que uma espécie pode realizar no equilíbrio (ou seja, na capacidade-suporte) se conhecermos a massa corporal média que uma espécie tem, ou em outras palavras, a densidade populacional média no equilíbrio é função da massa corporal média. A densidade populacional decai à medida que a massa corporal aumenta, seguindo uma taxa de decaimento constante (de -0,75 ou -3/4). Essa descoberta levou Damuth a supor que existam mais regras gerais que determinem a estrutura de comunidades biológicas. Em 1987 Damuth foi além e fez a mesma relação incluindo outros mamíferos (564 no total de espécies estudadas, sendo N medido em indivíduos/km2 e massa M medida em g, de ratos até elefante), chegando ao resultado de N(Mmédia) = 104Mespécie-0,76 O expoente ficou muito próximo de b = -0,75 = -3/4. Comentários PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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Nesse breve levantamento podemos verificar que as alometrias levaram um longo tempo para se estabelecer e que foram investigadas por mais de um século. À medida que as diferentes áreas da biologia se desenvolviam, lentamente as relações de escala apareciam diante dos pesquisadores, revelando que a natureza guardava uma propriedade até então desconhecida na sua integridade, manifestada através das leis de potência. Para muitos a natureza é complexa demais para ser entendida, mas paradoxalmente, existem regras muito claras e simples que a natureza tende a respeitar. Óbvio que existe grande variabilidade, originada de diversas fontes que promovem variações genéticas, fisiológicas, evolutivas, ambientais, entre outras, que podem explicar os desvios que surgem nessas relações. Mas, mesmo assim, parece que existe um “manual” de organização, contido nos diferentes níveis de organização natural e uma das indicações contida nesse manual é que a realização de um fenômeno dependa essencialmente do funcionamento e realização de outro, determinado por um fator de transformação (seguindo Huxley & Teissier) ou por um expoente característico (seguindo os demais pesquisadores). Se as alometrias surgiram naturalmente apontando uma maneira possível de descrever e entender as inter-relações entre os mais diversos fenômenos naturais, parece que há muita coisa ainda a ser descoberta. Basta apenas combinar as variáveis certas. E além do mais, a combinação de alometrias leva a outras, como a Regra da Equivalência Energética, demonstrada por DAMUTH (1987) ou a Teoria Metabólica da Ecologia, edificada por BROWN e colaboradores (2004). O campo das alometrias está em pleno desenvolvimento, envolvendo muito debate entre ecólogos, fisiologista, botânicos, físicos, matemáticos, bioquímicos, etc. Portanto, é um setor da biologia muito interessante e com potencial enorme para resolver problemas de aplicação prática. Referências bibliograficas ANDERSON-TEIXEIRA, K. J.; SAVAGE, V .M; ALLEN, A. P.; GILLOOLY, J. F. Allometry and metabolic scaling in ecology. In: Encyclopedia of Life Sciences (ELS). John Wiley & Sons, Ltd: Chichester, p. 1-9. 2009. ARAÚJO, C. C.; FLYNN, M. N.; PEREIRA, W. R. L. S. Fator de condição e relação peso-comprimento de Mugil curema Valenciennes, 1836 (Pisces, Mugilidae) como indicadores de estresse ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 4, n. 3, p. 5164, 2011. ARRHENIUS, O. Species and area. Journal of Ecology, v. 9, p. 95-99, 1921. PEREIRA, William Roberto Luiz Silva. Alometrias em toda parte. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 78-101, fev. 2013.
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Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. Fausto Antonio de Azevedo Farmacêutico-Bioquímico,
USP;
Especialista em
Saúde
Pública, USP; Mestre em Análises Toxicológicas USP; exCoordenador de Toxicologia da CETESB-SP; ex-Professor Titular de Toxicologia da PUC-Campinas; ex-Diretor Geral do Centro de Recursos Ambientais CRA-BA; ex-Gerente de Vigilância Sanitária da Secretaria da Saúde-BA;
ex-
Presidente
do
do
CEPED-BA,
ex-Subsecretário
Planejamento, Ciência e Tecnologia do Estado da Bahia, exSuperintendente de Planejamento Estratégico do Estado da Bahia. Professor e co-Coordenador do curso de pós-graduação em Ciências Toxicológicas das Faculdades Oswaldo Cruz, São Paulo. Diretor da Intertox.
AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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Vivemos a perda; vivemos o corte; vivemos a separação, a subtração; vivemos a castração – e quando esta não é bem resolvida na formação de nosso aparelho psíquico, corremos o risco de adquirir – para conviver – diversas (e sérias) psicopatologias. Separamo-nos do útero materno no nascimento; separamo-nos dos pais (?) no Édipo; separamo-nos da família na adolescência (para que possamos ser outro) – separamo-nos de nós em cada perda (ainda elas sirvam, ao menos isso, para nos projetar no fundo de nós mesmos, à busca do entendimento...). Para viver, sobrevive aquele que aceita a castração. Viver é exaltar a própria castração – e, assim, que o ideal possa ser então, pelo menos, o de uma bela voz, como nos castrati (há um perigo nessa afirmação). Todavia, a saga das perdas não cessa aí, pelos percursos de nossa interioridade: devemos contabilizar ainda aquelas que acontecem no ambiente de ‘nossa’ exterioridade. Escreveu Solange Farkas na Apresentação da exposição Isaac Juliene: Geopoéticasi: Desaparecimentos ecoam como perdas inestimáveis em nós. A percepção de que povos, línguas, animais, paisagens, valores, modos de vida e identidades naturais estejam, aos poucos, sumindo (ou se tornando invisíveis) amplia nossas sensações de que algum empobrecimento em nossa humanidade sorrateiramente se instala em nosso espírito. Registrar o que não pode mais existir por si, como um indício vital do poder da alteridade, ou está imperceptível aos olhos de muitos, numa cegueira social apagando as sensíveis invisibilidades do que nos é essencialmente subjetivo, é também função da arte. É nela que, ao propiciar o reconhecimento de maneiras distintas de ver e de se colocar no mundo, configurando um traço distintivo da experiência humana, descobrimos uma seara aberta às possibilidades de encontros e à promoção de diálogos.
Perdemos fora, o tempo todo também, e o interessante no parágrafo acima é a autora introduzir a dimensão da Estética como registro do já inexistente no mundo objetivo de cada qual (campo objetivo do mim eu) e, quiçá, como um antídoto à dor mais aguda, uma forma de compensação nostálgica talvez. Lembramo-nos aqui do filósofo Henry Bergson, que em suas palavras nos adverte de que a necessidade prática de atender à sobrevivência está posta em todos nós; trata-se de uma disposição humana natural, biológica segundo a teoria da evolução. A Filosofia busca explicar o porquê das categorias que possibilitaram a sobrevivência. Bergson trará a questão da intuiçãoii, que seria anterior às categorias e poderia nos colocar AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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em contato direto com aquela necessidade. Para ele, no entanto, há duas importantes exceções, em relação à grande maioria das pessoas, quanto à forma geral de como vemos e entendemos a realidade: o artista e o místico: o artista vê o mundo de forma diferente dos demais, de uma forma não racional, emocional, estética, intuitiva. Qual o grau de coincidência entre essa (nossa) intuição e as forças e dinâmicas que operam em nosso inconsciente: aí está um terreno a ser explorado. Françoise Doltoiii, no Prefácio da fundamental obra de Maud Mannoni, A primeira entrevista em Psicanálise, aborda tudo o que compõe a Psicanálise e sua técnica. Escreve ela que sua intenção no texto foi desenvolver questões essenciais aportadas pelo livro, como: (i) Especificidade da Psicanálise; (ii) Especificidade do psicanalista clínico; (iii) As relações dinâmicas inconscientes pais-filhos, o seu valor estruturante sadio ou patogênico; (iv) A profilaxia mental de relações familiares patogênicas; (v) Substituição dos papéis na situação triangular pai-mãefilho; (vi) O complexo de Édipo e sua resolução. Patogenia ou profilaxia mental dos seus distúrbios; (vii) A sociedade (a escola). O seu papel patogênico ou profilático. Sigo com ela, construindo um paralelismo entre sua escrita e minha preocupação psico-ambiental. 1. Na Especificidade da Psicanálise um ponto, dentre os muitos, prende minha atenção. Diz a autora: (...) A Psicanálise é e continua a ser o ponto de impacto de um humanismo que se vem enriquecendo desde Freud com a descoberta de processos inconscientes agindo sem que o sujeito o saiba e limitando a sua liberdade. Esses processos inconscientes fortalecem-se muitas vezes com o fato de que criam raízes em processos primordiais da eclosão da personalidade, ela mesma sustentada pela função da linguagem, modo de relação inter-humano axial à organização da pessoa humana.
Curioso pensarmos a Psicanálise como um humanismo, não que não o seja, mas porque uma vez que ela deu à luz o inconsciente e mostrou que este “age sem que o sujeito o saiba e limita sua liberdade”, constata-se que aquela presunção humanista que colocava os humanos na posição idealizada principal de uma escala de importância em relação a tudo, como que donos de sua vontade e liberdade, cai por terra. Cai por terra, inclusive, o mito da racionalidade porque, se bem tenhamos de fato a capacidade racional que nos distingue dos demais, portamos também um irracional inadministrável representado pelo inconsciente. Mesmo o significado filosófico essencial da palavra humanismo, de contraposição ao apelo ao sobrenatural ou a uma autoridade superior, fica maculado, haja vista que há nesse inconsciente qualquer coisa que se assemelha a um sobrenatural, ao tempo em que ele não deixa de atuar sobre nós qual fosse uma autoridade superior. AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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Talvez venha a calhar uma referência a Gaston Bachelard e seu livro O novo espírito científicoiv [Le nouvel esprit scientifique (1934)]. O contexto é o da revolução científica promovida em 1905 pela Teoria da Relatividade de Einstein. O trabalho de Bachelard foi estudar o significado epistemológico desta ciência então nascente, para dar a ela uma filosofia compatível com a sua novidade. É partindo deste objetivo que ele formula suas principais proposições para a filosofia das ciências: a historicidade da epistemologia e a relatividade do objeto. Em resumo, a nova ciência relativista rompe com as ciências anteriores em termos epistemológicos e a sua metodologia já não pode ser empirista, pois seu objeto encontra-se em relação, e não é mais absoluto. Isso se aplica à Psicanálise como ciência, desejo tão caro para Freud: o de estabelecer sua descoberta no campo científico. Bem, desinflar nosso narcisismo humanista, instalando em nós próprios uma “zona obscura” (portanto uma zona ainda não iluminada), somente acessível, e por mercê de muito trabalho, pela Psicanálise e, ao mesmo tempo, questionar o paradigma científico do absoluto (imperante desde Descartes e Hume) por conta da relativização do objeto, acaba por nos trazer algum alento para que possamos ousar assumir uma postura mais humilde e necessária no nosso relacionamento com a Natureza. Já nem somos aquele que pode/deve dominar a Natureza (fórmula baconiana) nem somos aquele para quem conhecer é medir e quantificar (cânone de Galileu): quem mede o inconsciente? Quem quantifica, de fato, as relações ecológicas? 2. Em A especificidade do psicanalista clínico, a sua escuta vou buscar a idéia de que a Psicanálise é um método de dizer tudo a quem tudo escuta. Esta frase aparentemente simples reúne, de fato, duas dimensões gigantescas: de um lado aquele que diz e que é uma subjetividade, uma singularidade (o paciente, psicanalisando, analisando, analisante) e de outro lado aquele que escuta – e que é outra subjetividade, outra singularidade (o analista, psicanalista). Vale a pena invocar aqui o que Emmanuel Lévinas nos ensina a respeito do dito e do dizerv. O dito é a linguagem já bem definida, consolidada, e o dizer, é o ato da fala, com a linguagem se constituindo (enquanto se fala). No dizer há o elemento constituinte da linguagem e é nele que a linguagem se faz, se cria, cria significações. Gênese da significação: há uma relação estreita entre intersubjetividade e fala. Disso tudo surgirá a inter-locução. Assim, o “dito” se opõe ao “dizer”, o que mantém analogia com o ser e o processo, velho binômio de toda a filosofia. No caso da linguagem, Lévinas procura opor o dito (que é a linguagem como que totalizada) à palavra em ato, que é o dizer. Entende que nunca deveríamos adotar o discurso (que é a fala cristalizada), mas sim dizer que o dizer está em curso. Para ele, a fala em curso com o outro é a resposta AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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(responder, co-responder) àquele cuja simples presença/existência me interpela/suscita; enfim, é a responsabilidade [estar diante do outro sempre respondendo, falando; o silêncio é para estar diante de Deus (retorno a Descartes); estar diante do outro é falar. O analisando fala e precisa ser escutado desde a dimensão do dizer e não do dito. Enquanto fala ele se mostra, se constrói num dizer vivo e, assim, legitima a presença/existência do outro, o analista. Este (que por óbvio também fala, e deve falar, mas “do lugar” do analista, porque se não falasse em absoluto não constituiria o outro e então não haveria análise) tem para si reservado – mais do que tudo e do que para todos – o papel da escuta. A habilidade da escuta. A perícia da escuta. E isto é algo que precisa ser desenvolvido e permanentemente aperfeiçoado. Mas não podemos ficar nisso, como se o processo só existisse nos limites desses dois pólos, materializados por dois seres humanos em interação. Mais importante é o intangível que está no ar, que circula entre ambos e que é sustentado pela linguagem, pela fala, pelo dizer do analisando. Este intangível pode ser esquematizado pelo binômio interativo dizer-escutar. A psicanálise, deveras, trata de um corpo trazido pela palavra: quando o bebê vem ao mundo ele já foi precedido pela palavra, e a isso o psicanalista não pode acrescentar um novo dizer. A interpretação (do analista) não acrescenta, ele deve apenas abrir a via para que o dizer do analisando continue, prospere. Falamos porque disso temos necessidade e desejo. Escutamos porque amamos. Quem não sabe falar pode não existir. Quem não sabe amar não consegue escutar. Nesse aspecto a tarefa do psicanalista é a de um apostolado vocacional do amor. Amor ao próximo. Amor ao outro, ao verdadeiramente outro, um outro sim, mas inteiro, total e definitivo, no sentido levinasiano. Transporto tais comentários para a (minha) causa ambiental. De um lado estamos todos nós, duplamente assinalados, como psicanalistas e como psicanalisandos. Do outro lado, o planeta, a casa (única), a morada não conquistada – mas recebida, aquela que tanto é mãe de todos quanto agora se tornou filha diante da capacidade de intervenção/transformação/destruição que conquistamos. Quem fala e quem escuta? Desde pronto, muito claramente podemos perceber que ela está a falar, mas nós (como coletivo) nada estamos a escutar! Há que se ter vontade honesta de escutar, não interpretar, não interferir, não reconduzir a história do outro: é o outro que tem a dizer, é de sua singularidade o que temos a ouvir para aprender. Nossos dispositivos interiores não apreenderam o outro antes, como um conhecimento a priori, para que possamos sabê-lo sem ouvilo, diagnosticá-lo sem escutá-lo, identificado ele a nós. No entanto, se fôssemos o psicanalista do Planeta desde há muito já teríamos perpetrado a AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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mais grave falta de ética, posto que não o escutamos, não sabemos como escutá-lo, parece mesmo que não queremos escutá-lo. E o mais interessante, repita-se, é que a história é só dele – nós não a temos; a narrativa é dele, o fenômeno é dele, a estrutura é dele, o setting é dele (até isso!), o sofrimento real que ele ostenta hoje é dele, porém continuamos a agir como se nada estivesse a acontecer. Portanto, do ponto de vista moral, estamos cometendo um crime; do ponto de vista ético, comprovamos cabal insensibilidade, e do ponto de vista diagnóstico, o que me parece é tratar-se de um quadro psicótico delirante (o do suposto psicanalista), uma vez que parecemos ver uma realidade cor-de-rosa que, se existiu, já não existe. Mas nessa nossa relação com a Terra podemos nos ver também no lugar do analisando, ela a eterna analista. E aí o que se passa? Bem, assumindo como bastante razoável, quase certo, que temos todos nossa psicopatologia de cada qual, não conseguimos nos tratar pelo simples fato de que não sabemos realizar a transferência. Tão intoxicados de nossa presunção racional vamos, tão afetados por nosso narcisismo específico – iluminista e cientificista, tão superiores à essência de nossa própria origem, tão artificializados em relação à nossa própria substância, que já não nos cabe mais a transferência: iluminamos os porões da mente e nada resta a transferir... Dolto ensina: A transferência é a relação imaginária, ao mesmo tempo consciente e inconsciente, do psicanalisado solicitante em face do psicanalista testemunha, que não responde e aceita os efeitos da historia do sujeito que subsistem através de seus infortúnios patogênicos Essa transferência é o meio especifico do tratamento psicanalítico. A sua instalação, a sua evolução e o seu desaparecimento final constituem a característica de cada tratamento.
Relação imaginária lê-se acima. Definitivamente não creio que o ser humano hoje, em seu comportamento total, perceba ter ou estabeleça qualquer relação imaginária, ou mesmo imagine qualquer relação com seu planeta. E sem a relação imaginária não há transferência que se sustente. E sem transferência não voltam as cenas mais primitivas e marcantes da infância, da formação, os traços mnemos definidores que poderão surgir na livre associação, nos atos falhos, e o psicanalista de escuta atenta não os deixará escapar. Contudo, nessa minha desmesurada analogia, seria possível darmos asas à imaginação e pensar: muito bem, admitamos que a humanidade nasceu no/do planeta, num parto dado pela evolução natural, saiu assim de um cômodo útero potencial para a realidade sofrida de uma terra de frio e calor, seca e dilúvio, promessas mas trabalho, e depois disso evoluiu em direção à sua adolescência, desenvolvendo um modo de ser científico que quase a libertou de sua família... quase... Mas aí se deu uma contradição porque, de fato, ficamos na vontade e no comportamento da liberdade, da ruptura em relação à família original, mas não a praticamos AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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jamais, pois nunca fomos morar em outra casa... Quando iremos? Que tal Marte, ou Júpiter glorioso? Restamos por parecer esses “jovens” de agora, algo como yuppies morando na casa dos pais. Enfim, o desejável, e já a tempo, é que, inspirados no trabalho do psicanalista, possamos passar a ouvir o planeta em suas falas, suas dores, suas crises (como a climática), suas perdas definitivas (como a extinção de espécies), suas repetições (como os furacões), suas somatizações (como a desertificação) e busquemos, com intervenções sutis e precisas, vivamente interessados que estamos na cura, auxiliá-lo a reencontrar seu caminho sem titubeios e desvios. E motivados pelo esforço do paciente consciente, consigamos nos anelar à Terra, transferindo-lhe, simbolicamente, nossos desejos mais intensos de vida e de prazer, mas o prazer que decorre da comunhão entre iguais e não da usurpação do que não é nosso. 3. Em As relações dinâmicas inconscientes pais-filhos, o seu valor estruturante sadio ou patogênico, logo ao primeiro parágrafo tem-se a frase “Naquele ponto em que a linguagem termina, é o comportamento que continua a falar, e quando se trata de crianças perturbadas, é a criança que, pelos seus sintomas, encarna e presentifica as conseqüências de um conflito vivo, familiar ou conjugal, camuflado e aceito por seus pais.” O comportamento fala! Nunca soubemos entender, realmente falando, a linguagem do planeta. Talvez apenas os artistas e os místicos a tenham pressentido. A Ciência tem tentado explicá-la, o que é bastante diferente de entender. Restou a ele, então, o comportamento. E o comportamento ambiental tem falado muito nas últimas décadas, basta que acompanhemos todas as publicações sérias e críveis das próprias... ciências! Em particular, as ciências ambientais. As referências vão aos milhares! Comportamento aqui equivale a sintomas. É isso o que o planeta tem evidenciado. E qual terá sido o conflito vivo, familiar ou conjugal, camuflado e aceito por seus pais? Ocorre pensar que o planeta de hoje, século XXI, não é mais, por óbvio, o de antes da chegada do primeiríssimo representante dos Homo sapiens. Esse que temos hoje parece o rebento incestuoso do acasalamento entre uma Mãe Terra e o gênero Homo. E o incesto, como era de se esperar, traumatizou, deixou marcas profundas não superadas, que agora se sintomatizam nos desequilíbrios ambientais. Houve a mácula do incesto, mas houve também, sem dúvida, a violência de uma deseducação praticada pelo pai Homo, que, no auge de sua prepotência, foi autoritário e tirânico, explorando ao máximo a criança a quem gerara. 4. No final do último parágrafo de A profilaxia mental de relações familiares patogênicas – Dolto se refere ao dano que pode sobrevir do nãodito, os acontecimentos realmente acontecidos que envolvem a criança e sua história, mas que passam não revelados, camuflados, desditos, isto é, “todas as situações em que a criança é envolvida e cuja divulgação lhe é interditada AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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ou, pior ainda, cuja realidade lhe é escondida, os quais, não obstante, ela sofre...” Pela falta de palavras (dos pais ou dos que ocupam a imago parental) a criança é posta fora de sua própria história, é despertencida de si, de sua autenticidade, de sua veracidade. O erro reside em ocultar a verdade, seja por temor e miopia, seja por uma suposta e inadequada atitude de “proteção”. Pois eis o que nós fazemos, como sociedade humana, na insistente e inexplicável ocultação da verdade sobre nossa história no planeta. Dolto dizia: “Assim ocorre com os acidentes, mortes, doenças, crises de cólera, de embriaguez, destemperos da conduta que provocam a intervenção da justiça, cenas domésticas, separações, divórcios...”, todo um inventário de possibilidades negativas, mas completamente reais, que podem atingir a vida de qualquer um de nós. Digo eu: assim ocorrem no planeta, dentre outros, desmatamentos, desertificações, erosões, contaminações químicas, contaminações radiativas, chuvas ácidas, efeito estufa, mudanças climáticas, elevação da temperatura, degelos, mortandades, extinções de espécies, todo um real inventário de danos ambientais que têm relação, mais ou menos intensa, com as atividades antrópicas, mas disso não se fala na grande platéia mundial, isso é ocultado, distorcido, minimizado (às vezes, em que pese o absurdo e a insensatez, até ridicularizado). Isso é falado apenas no setting dos especialistas preocupados e suas instituições científicas e/ou nas ONG. Ocorre que, novamente o pari passu, neste setting já está um paciente, e a partir de sua psicanálise será preciso que, antes, ela, a Terra, deixe de “sentir-se estranha, objeto de um mal-estar mágico”, e depois os progenitores de seus danos, que somos nós mesmos, encontremos capacidade, coragem e saúde para falar dos problemas, posto que falar é o primeiro ato do processo de cura, aquilo que necessita vir antes de qualquer outra terapêutica. 5. Pelas últimas linhas de Substituição dos papéis na situação triangular pai-mãe-filho, Dolto, novamente, enfatiza a importância de se falar e dizer a verdade a quem pode ouvir: “O ser humano somente pode superar a sua infância para encontrar a sua unidade dinâmica e sexual de pessoa social responsável libertando-se mediante um dizer a verdade a respeito de si mesmo a quem pode ouvir.” Eu também gostaria de enfatizar: a humanidade só superará a adolescência destrutiva em que se encontra para atingir sua maturidade sapiencial, amalgamando-se ao planeta para dele viver fazendo-o viver, libertando-se seja de sua arrogância tecnológica seja de sua obliteração narcísica mediante um dizer e um aceitar a verdade de si – e que deverá ser dito a si mesmo e por si mesmo entendido e aceito. Eis aí uma oportunidade ímpar para uma auto-análise, ao estilo e fibra do velho psicanalista de Viena... Ainda naquelas últimas linhas Dolto afirma que tal dizer o instala, instala o homem “em sua estrutura de criatura humana verídica”, cuja AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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imagem, o símbolo de uma face de ser responsável, se referencia ao face-aface com seus progenitores e pelo nome que recebeu no nascimento. Fica impossível que não se pense em Lévinas, na relação do eu com outrem, na face do outro. A face do outro é uma presença que ele me solicita sem mediação cognitiva, portanto é ética. Seria possível, pergunta Lévinas, a experiência de conhecer o outro sem a redução cartesiana do outro a si mesmo? A resposta é que só seria possível na experiência moral. Lévinas entende a moralidade como preliminar a todas as formas de conhecimento do outro. Essa radicalidade na posição em relação ao outro será o que Lévinas chamará de face-a-face. Diz ele que a superação do solipsismo só se dá na significação moral, a qual só pode vir da “posição” de um de-posto, desconstituído de si, podendo olhar o outro não a partir de uma experiência constitutiva. Lévinas entende que a busca tem que ser do outro, é radical, o eu tem que ficar face-a-face com o outro, abandonando sua situação subjetiva, conferindo ao outro uma significação moral e não cognitiva. Esse face-a-face é menos o que nós vemos do que aquilo que apreendemos do outro, não um olhar físico vendo o outro, mas percebê-lo pela subjetividade do olhar; por (inter)mediação da visão passar o outro para minha alma; não se trata de uma apreensão do outro, de seu rosto físico, mas do significado dele, da experiência dele, de sua alteridade. A face do outro não é objeto, como poderia ser seu rosto físico. Ela é metafórica, é a significação da alteridade: eu não vou ver o que o outro é, mas entrarei em contato com o que ele significa eticamente. Portanto, esse face-a-face é uma tentativa de escapar da ontologia. A significação corresponde à ética. O face-a-face é, então, uma alegoria da visão ética. Nele uma face assume a responsabilidade (sou eu) e a outra é a responsabilidade assumida (por mim). Qual é, pois, minha face para a face do Planeta Terra? Qual é a face dele que capto não cognitivamente por meu ser ontológico, mas eticamente, intuitivamente, por meu ser psíquico? O que e como eu posso dizer de minha história que me instale numa condição verídica dando minha face a ser vista? É esse meu exercício psicanalítico e é de tal ordem que eu mesmo precisarei treinar minha escuta, uma vez que o que a face do mundo me responderá ela o fará pelo vento, pelo ruído do mar, pelo canto das aves (que para regozijo da sensível Rachel Carson não estarão silenciosas!). 6. Em O complexo de Édipo e sua resolução, patogenia ou profilaxia mental dos seus distúrbios pincemos, inicialmente, a citação: “Todas as palavras neurotizantes vêm das mentiras que impedem os fatos reais de conter os frutos da aceitação, a partir da situação real.” O que é uma situação real e o que devemos aceitar? Devemos aceitar a chamada castração, que significa a impossibilidade de realizar o primeiro desejo – o de possuir a mãe ou o pai. Aceito, assumido, tal fato, a partir do imperativo do tabu do incesto, em que pese o fosso para sempre aberto e eternamente pulsante do desejo não realizado, podemos nos deslocar para o mundo AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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exterior, exterior aos primeiros laços, os parentais, e alçar uma vida social com outros – o outro diferente de mim em ser e história –, o que tanto é uma conquista da sobrevivência psíquica daquele indivíduo quanto é uma conquista da sobrevivência biológica de sua espécie. Ademais, ao aceitar um não de tamanha magnitude, renunciando a desejo tão único e incisivo, eu aprendo e estou preparado para outras perdas e renúncias que a vida me exigirá e que parecerão sempre menores, o fato com o qual abrimos este texto. Então para que serve o Édipo? Para libertar o menino e a menina do amor/desejo (erótico) pelos seus pais, condição, como antes aludido, de saúde mental, social e biológica. E esse tal amor/desejo antes do Édipo, para que serviu? Para garantia de sobrevivência biológica e psíquica. E assim caminha a humanidade ou la nave va... Portanto, o que seria de se esperar e desejar, é que o complexovontade de Super Homem não pode passar de literatura ou de historinha, posto que somos limitados, padecemos de limites, não podemos tudo, não possuímos a onipotência e a remanescência de uma tal ilusão é algo da ordem do infantil, do não amadurecido, exatamente não amadurecido por conta de um Édipo mal resolvido. Como humanidade (a tal que caminha) assim parece que nos comportamos, como um adulto aprisionado num Édipo não resolvido e queremos exercer um poder total sobre a (mãe) natureza e – pasme-se – sobre nosso próprio futuro tangido por um cutelo chamado progresso ou progressismo. Mas afinal, o que é progresso? Nem somos nem seremos onipotentes nem oniscientes, temos e devemos assumir nossos limites, limites (bio) lógicos, morais e éticos: como filhos da Natureza não podemos nos tornar seus algozes, seus recriadores inconseqüentes, seja na apropriação absurda dos recursos naturais (absurda porque hoje quase que exclusivamente a serviço de um modo talvez supérfluo de viver), seja na manipulação genética, seja na manipulação do clima, seja na contaminação cósmica. Mais para frente, ainda nesse tópico, já próximo ao final, lemos: “Muitas famílias vivem num estado de simbiose mórbida. Sem a psicanálise do membro indutor dominante, a neurose familiar não é modificável.” Dolto se refere ao fato de que, para que haja o sucesso pretendido na intervenção psicanalítica, não basta que se trate a criança que evidencia problemas ou perturbações, posto que ela pode representar tão somente um elo (o final em se tratando dela própria) de uma cadeia de eventos familiares neurotizantes que remonta não só a seus pais, mas a avós e bisavós, passando, às vezes, por irmãos e tios, numa sequência negativa de Édipos malfeitos. Portanto, o distúrbio (?) na criança seria apenas o diagnóstico imediato de causas mediatas que alcançam a gerações. Assim, é bastante oportuno que tal membro indutor dominante possa ser, ele também, psicanalizado. O mesmo se aplicaria, em escala de sociedades, para os governos e/ou as elites, posto que, no mais das vezes, é nesses segmentos que se detecta com clareza o AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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epicentro irradiador das forças neurotizantes que acabam perpassando toda a sociedade, como, por exemplo, a obsessão progressista, produtivista, consumista, a falsidade, o engodo, a usurpação. 7. Em A sociedade (a escola), o seu papel educacional patogênico ou profilático tem-se que, instantaneamente, concordar com Dolto na abertura da análise que faz: é muito provável que a escola de hoje (modelo cientificista e meramente informacional), sobretudo nos primeiros anos da escolaridade, mais desajude do que contribua para a formação de adultos saudáveis. O que mais se percebe é que a escola atual, aplicada às crianças ainda em seus primeiros anos de vida, tende a ser, somente isso, um regime para adaptação delas à vida que deverão praticar depois de crescidas, plenamente sincronizada ao regime vigente. A escola atual quer informar o intelecto antes de apoiar a formação do psíquico e intenta implantar na memória do aluno coleções de informações antes de estimular sua criatividade e seu questionamento. Não estamos a construir uma sociedade de pensantes, mas sim de operantes. E, por essa via, se a fábrica constrói indivíduos funcionais (será?), deixa de auxiliar na produção de indivíduos humanos. A escola, então, tende a engendrar (causa ou acentua) problemas psíquicos, dificultando a expressão do eu (exigência vital) e alienando-o a valores de rebanho. Ora, mas é isso mesmo que interessa ao Grande Sistema: interessa-lhe a contínua produção de multidões não-pensantes (não-críticas), ajustadas às suas regras e que guardem poder-necessidade de consumo, seja de itens de produção seja de comportamentos. Na medida em que a escola atual não promove a inserção social do aluno, pela nãoexpressão permitida/incentivada de seu eu, falseando “o sentido da verdade do sujeito em sociedade”, vamos correndo o risco cada vez maior de uma sociedade de desinteresse e de incapacidade total de percepção do outro, porque nem a mim mesmo pude um dia perceber e construir. Se não pude expressar minha linguagem (aquela que veicula meus desejos e minha criatividade) antes de ser forçado a internalizar a gramática de minha língua, parece restar que temos criado uma sociedade de mudos ainda que de falante psitacismo. Ademais, como na escola à criança não lhe é ensinado como ser escutada, ela pode aprender então que não escutar é a moda. Aí temos, portanto, uma nova categoria para o sapiens humano: a daqueles que são mudos que falam e não-surdos que não escutam. E a batalha que travam as crianças que ainda resistem (as disléxicas, as discalcúlicas, as retardadas escolares, cujos pais “por angústia do ‘futuro’, querem impor a lepra dos deveres obrigados, das lições engolidas, vangloriam-se das boas colocações da criança, sentem-se deprimidos com as suas notas más), luta caracterizada por manifestações sintomáticas, que é o recurso que resta ao pequenino ou à pequenina, faz-me pensar exatamente no mesmo tipo de luta que hoje a criança Terra (criança porque não se trata mais, como já salientei, daquela Senhora Circunspecta e Longeva que um AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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dia pariu a humanidade sua filha), produto da fecundação da Terra Mãe pelo Homo sapiens, trava, exibindo-nos seus sintomas disléxicos (ela já perdeu a linguagem das estações), discalcúlicos (ela já tem dificuldades em calcular a temperatura de referência para cada estação) e de retardo escolar (sua graduação florestal, por exemplo, já está muito aquém de seu real potencial para isso). Finalmente, perto da última página de seu portentoso Prefácio, Françoise Dolto nos traz uma reflexão que a mim é muito cara e incentivadora, e que tenho procurado colecionar de alguns psicanalistas pensadores que a compartilham. Ela diz: Se o papel do psicanalista é permitir a um sujeito neurótico ou doente mental encontrar o seu sentido, é também papel seu dar um grito de alarme diante da carência pública educacional, dos métodos e instituições escolares frequentemente patogênicos, em face das carências e do papel patogênico individuais de muitos pais do mundo dito civilizado. A civilização é um estado que só se mantém pelo valor de cada um de seus membros e pelo intercâmbio criativo entre eles. Não é necessário que o preço da civilização seja a existência de psicoses e neuroses devastadoras cada vez mais precoces. Um imenso trabalho de profilaxia mental deve organizar-se e isso não é função dos psicanalistas clínicos; esse trabalho, porém, não pode organizar-se sem a nova luz que a Psicanálise traz para o mundo civilizado. (Grifos meus.)
Permito-me parafrasear a autora escrevendo: é também papel seu (do psicanalista) dar um grito de alarme diante da carência pública dos métodos e instituições ambientais, frequentemente patogênicos para o planeta e para a humanidade. Reeducar ambientalmente o ser humano é um trabalho que “não pode organizar-se sem a nova luz que a Psicanálise traz para o mundo civilizado”. Para encerrar retornemos ao início do Prefácio de Dolto. Ela redige: (...) A psicotécnica está hoje de tal forma difundida que não existe, por assim dizer, nenhuma criança das grandes cidades que, no curso da sua escolaridade, deixe de ser submetida a alguns testes individuais ou coletivos. Aplicam-se testes aos recrutas, aos empregados de grandes empresas; os jornais e revistas chegam ao ponto de oferecer aos seus leitores a possibilidade de fazer um juízo acerca de si mesmos por intermédio de uma série de testes padrões imprecisos, e que, com maior ou menor seriedade, difundiram entre o grande público noções de psicologia. E a Psicanálise?
AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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Pois aí está: que bom seria se possível fosse um “teste” psicanalítico (jamais o confundindo ou assemelhando às demais psicotécnicas), que cada um precisasse responder ao nascer, aplicado a cada um de nós para conhecer de suas reais e futuras aptidões (competências) para poder viver no Planeta Terra. Interessante (ou engraçado? – mas na verdade seria: que sem graça!) que fazemos teste para tudo, como se vê, porém, só não praticamos o mais essencial de todos, que é aquele para aferir qual o grau de preparo que possuímos para exercitar nossa vida no planetinha azul – afinal viver na Terra implica numa elevada dose de inteligência para tanto e numa competente capacidade de assumir castrações! Catálogo da exposição e site http://www.videobrasil.org.br/isaacjulien/#!sec=1 i
BERGSON, Henry. Ensaio sobre os dados imediatos da consciência (J. S. Gama, Trad.). Lisboa: Edições 70, 1988. [Obra nº 16 da Col. Textos Filosóficos.] (Original publicado em 1889: Essais sur les données immédiates de la conscience,1889.) ii
DOLTO, Françoise. Prefácio. In: MANNONI, Maud. A primeira entrevista em Psicanálise. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. 118 p. iii
BACHELARD, Gaston. O novo espírito científico. Lisboa: Edições 70, 1996. iv
LÉVINAS, Emmanuel. Entre nós - ensaios sobre a alteridade. São Paulo: Ed. Vozes, 2ª. ed., 2005. 271 p.; e LÉVINAS, Emmanuel. Totalidade e infinito. Lisboa: Edições 70, 2011. 310 p. v
AZEVEDO, Fausto Antonio de. Intoxicação narcísica: uma psicopatologia a serviço da crise ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 102-114, fev. 2013.
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Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. Fabiana Dondé Menegat Bióloga
pela
Universidade
de
Caxias
do
Sul/RS;
Farmacêutica pela Universidade Anhembi Morumbi/SP. Especialista em Análises Clínicas e Toxicológicas pela Faculdade Oswaldo Cruz/SP. E-mail: fabianadonde@gmail.com
Alice Aparecida da Matta Chasin Farmacêutica-bioquímica
pela
FCF/UNESP;
Doutora
e
Mestre em Toxicologia pela FCF/USP; Professora Titular de Toxicologia e Coordenadora da área da Saúde do Centro de Pó-Graduação das Faculdades Oswaldo Cruz
MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
RevInter Artigo Original ISBN 1984-3577
Resumo O trabalho é um dos elementos que mais interferem nas condições e na qualidade de vida do homem. Práticas inadequadas em ambientes de trabalho geram impacto negativo sob a saúde física e emocional dos trabalhadores, o que acaba refletindo na saúde funcional e financeira das empresas. Legislações, normas, políticas empresariais e guias de boas práticas visam minimizar os riscos ocupacionais, promovendo e protegendo à saúde dos trabalhadores. É conhecido o fato de que os profissionais da área da saúde estão, particularmente, sujeitos ao estresse ocupacional devido à natureza de seus trabalhos. A Norma Regulamentadora 32 (NR–32), do Ministério do Trabalho e Emprego, busca assegurar a proteção desses trabalhadores, promovendo a qualidade de vida. A NR–32 é importante no cenário brasileiro, pois não existe outra legislação específica que trate das questões de segurança e saúde no trabalho para trabalhadores do setor da saúde. No entanto, em seu texto encontram-se alguns aspectos com poucas informações e/ou descrições, o que pode deixar brechas para possíveis más interpretações ou erros na execução da mesma. Palavras-Chave: Risco Ocupacional. Área da Saúde. NR–32. Segurança. Proteção. Abstract Work is one of the factors that most intervene with the conditions and life’s quality of people. Inadequate practices in the workplace generate negative impact on the physical and emotional health of workers, which reflects in the functional and financial health of companies. Good work practices guidelines, laws, standards and good policies in workplaces aim to minimize the occupational risks, promoting and protecting the health of the workers. It is well known that professionals of health are particularly susceptible to the occupational stress due to the nature of their work. The Regulatory Standard 32 (NR-32), from Ministério do Trabalho e Emprego of Brazil, seeks to assure the protection of these workers, promoting the life quality. The NR-32 is important in the Brazilian scene, therefore another specific legislation does not exist that deals with the questions of safety and health at work for health sector employees. However according to its text there are some aspects with lack of information and/or descriptions that can leave gaps for possible misinterpretations or errors in its implementation. Keywords: Occupational Risk. Area Health NR-32. Security. Protection.
MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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Introdução O trabalho é um dos elementos que mais interferem nas condições e qualidade de vida do homem e, portanto, na sua saúde. Muitas das lutas travadas por direitos trabalhistas que ocorreram no último século estão ligadas às demandas dos trabalhadores por um ambiente de trabalho saudável e a própria existência de doenças profissionais. Assim, enfermidades ligadas à atividade produtiva já eram reconhecidas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) desde o início do século XX (CAVALCANTE et al., 2008; NEV CIDADÃO, 2009). Com o passar dos anos, o processo saúde x trabalho passou a ser analisado não somente como um simples indicador do impacto do trabalho sobre os trabalhadores, mas como conseqüência da relação de produção, determinada histórica e socialmente pela dialética entre capital e trabalho. Atualmente, condições de ambiente, saúde e segurança no trabalho são essenciais para a qualidade de vida dos homens e o direito de cidadania (CAVALCANTE et al., 2008). No Brasil, a saúde do trabalhador constitui uma área da Saúde Pública que tem como objetivos a promoção e a proteção da saúde dos mesmos por meio do desenvolvimento de ações de vigilância dos riscos presentes nos ambientes e condições de trabalho, dos agravos à saúde do trabalhador, a organização e prestação da assistência aos trabalhadores compreendendo procedimentos de diagnóstico, tratamento e reabilitação de forma integrada, no Sistema Único de Saúde (SUS) (BRASIL, 2001). A inspeção ou fiscalização do trabalho tem como função garantir a correta e eficiente aplicação das leis aos contratos trabalhistas, passando a ter efetiva importância a partir da promulgação da Convenção n.º 81 da OIT, de 1956. Dados os parâmetros gerais da OIT, o escopo de atuação da fiscalização do trabalho varia de país para país, dependendo da legislação em vigor, da competência e do campo de aplicação da lei (SIMÃO, 2009). No âmbito nacional competente ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) coordenar, orientar, controlar e supervisionar as atividades relacionadas com a segurança e saúde no trabalho, inclusive a fiscalização do cumprimento dos preceitos legais e regulamentares. No plano estadual, essa fiscalização é executada pelas Delegacias Regionais do Trabalho (DRTs) (DIAS & MIRANDA, 2004). Além da regulação, das normas e guias de boas práticas, são utilizados inspeções e penalidades, treinamentos e cursos que promovem o aprimoramento do desempenho das empresas na prática de proteção dos trabalhadores. O MTE exige que todas as empresas com trabalhadores avaliem regularmente os riscos do ambiente de trabalho e a saúde de seus trabalhadores, sendo que os resultados dessas avaliações devem subsidiar os programas de prevenção (CHAVES et al., 2009). MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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Em 1978, pela Portaria nº. 3.214, de 08 de junho, editada pelo MT, aprovou-se as 28 Normas Regulamentadoras (NRs) do Capítulo V Título II, da CLT, relativas à Segurança e Medicina do Trabalho. Estas NRs são de observância obrigatória pelas empresas privadas e públicas e pelos órgãos públicos de administração direta e indireta, bem como pelos órgãos dos poderes legislativo e judiciário que possuam empregados regidos pela Consolidação das Leis de Trabalho (CLT) (BEJGEL & BARROSO, 2001). A legislação brasileira que trata da segurança e da saúde no trabalho passou a adotar um novo enfoque, a partir do final de 1994, ao estabelecer a obrigatoriedade das empresas elaborarem e implantarem dois programas: um ambiental (NR–09), o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), e outro médico (NR–07), o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) (DIAS & MIRANDA, 2004). Paralelamente, outras NRs foram contribuíndo para que a saúde do trabalhador fosse preservada, entre elas a NR–15, já que esta relaciona-se com a exposição aos agentes insalubres encontrados na atividade laboral, referindo ao grau de insalubridade existente no ambiente. Atividades ou operações insalubres são aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho expõem os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados pela legislação em razão da sua natureza, intensidade e tempo de exposição aos seus efeitos (BRASIL, 1978; FAGUNDES, 2009; OGA et al., 2008; SESI, 2009). Cabe às indústrias e empresas elaborar os programas e o laudo pericial, através de um Médico do Trabalho ou Engenheiro de Segurança do Trabalho, juntamente com a Comissão Interna de Prevenção a Acidentes (CIPA) e os trabalhadores (CHAVES et al., 2009; SESI, 2009). Em estabelecimentos da área da saúde, a legislação é aplicada da mesma forma fazendo cumprir o que está descrito nas NRs vigentes, assim como ocorre em empresas e indústrias (BRASIL, 2005). Desde a década de 80, os profissionais que atuam na promoção da saúde, motivados pelo surgimento da epidemia da AIDS, começaram a discutir sobre os riscos ocupacionais relacionados à suas atividades profissionais. Profissionais ligados às áreas de laboratório, desde a década de 40, já demonstravam preocupação com a existência do risco ocupacional em função da manipulação de microrganismos e materiais biológicos no ambiente de trabalho (BEJGEL & BARROSO, 2001). Segundo FAGUNDES (2009), com base em dados do Committee on Quality of Health Care in America, no mundo a área de saúde é a oitava no ranking dos setores de maior índice de mortes. São registradas cerca de noventa e oito mil mortes em hospitais a cada ano de profissionais da saúde. Apesar da incidência de doenças ocupacionais entre profissionais da saúde até 1995 não existiam normativas ou leis que protegessem especificamente esses profissionais. Em 1995, pela Lei n.º 8.974/95, foi criada a Legislação de Biossegurança, porém que abordava apenas aspectos relacionados a Engenharia Genética e Manipulação de Organismos MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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Geneticamente Modificados, não fazendo consideração a outras áreas (BEJGEL & BARROSO, 2001). As normatizações existentes encontravam-se esparsas, reunidas em diversas outras NR e resoluções, não sendo específicas para a área da saúde. Dentre as NR mais utilizadas para área da saúde estavam a NR-7, NR-9 e NR-15 (BEJGEL & BARROSO, 2001; BRASIL, 1978; ROBAZZI & MARZIALE, 2004). Ao final da década de 90, começou ser elaborada a Normativa 32, que estabelece diretrizes básicas para a implementação de medidas de proteção em relação à segurança e à saúde dos trabalhadores da área da saúde, bem como daqueles que exercem atividades de promoção e assistência à saúde em geral. Uma das vantagens desta NR é estabelecer diretrizes relacionadas aos diversos riscos associados à atividade (FAGUNDES, 2009). Assim, a Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho em Estabelecimentos de Saúde, denominada NR–32, aprovada pela Portaria nº. 485 de 11 de novembro de 2005, foi criada de forma a assegurar a segurança necessária no desenvolvimento das atividades especificamente dos profissionais que atuam na área da saúde, visando minimizar riscos e proporcionar um ambiente de trabalho mais saudável, preservando a saúde dos trabalhadores. Na normativa encontram-se assuntos como riscos biológicos e químicos, radiações ionizantes, resíduos (descarte), conforto em refeitórios, lavanderia, limpeza, conservação do ambiente e capacitação profissional. Também cuida de orientar os profissionais sobre os riscos diários e prevenção de acidentes, através da capacitação inicial, contínua e sempre que houver mudança do local de trabalho (BRASIL, 2005). O Brasil é o primeiro país do mundo a ter uma norma de ampla abrangência voltada para os trabalhadores da saúde. Dessa forma, a NR–32 é considerada de extrema importância no cenário brasileiro, como legislação federal específica que trata das questões de segurança e saúde no trabalho, no setor da saúde (FAGUNDES, 2009; ROBAZZI & MARZIALE, 2004). Em seu texto, a NR-32, faz referências a outras normativas do MTE, até então utilizadas exclusivamente, estabelecendo ações a serem tomadas desde o planejamento até a concretização de trabalhos, segurança e prevenção de acidentes e doenças ocupacionais (BRASIL, 2005). A seguir abordaremos as normas citadas no que tange aos conteúdos e ao caráter mandatório. Norma Regulamentadora 7 (NR–7) A NR–7 estabelece em seu texto a obrigatoriedade da elaboração de um programa médico com caráter de prevenção, rastreamento e diagnóstico precoce dos agravos à saúde relacionados ao trabalho (DIAS & MIRANDA, 2004). Segundo as orientações da NR–7 (BRASIL, 1978), todas as empresas, independente do número de empregados ou do grau de risco de suas MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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atividades, são obrigadas a elaborar e implementar o PCMSO, que deve ser planejado e implantado com base nos riscos à saúde dos trabalhadores, especialmente os riscos identificados nas avaliações previstas no PPRA. Assim, o nível de complexidade do PCMSO depende basicamente dos riscos existentes em cada empresa, das exigências físicas e psíquicas das atividades desenvolvidas e das características biopsicofisiológicas de cada população trabalhadora. A norma estabelece as diretrizes gerais e os parâmetros mínimos a serem observados na execução do programa, podendo os mesmos, entretanto, ser ampliados pela negociação coletiva de trabalho (DIAS & MIRANDA, 2004). Com base no reconhecimento dos riscos, deve ser estabelecido um conjunto de exames clínicos e complementares específicos para cada grupo de trabalhadores da empresa, utilizando-se de conhecimentos científicos atualizados e em conformidade com a prática médica (BRASIL, 1978; DIAS & MIRANDA, 2004). O PCMSO deve ser coordenado por um médico, especialista em medicina do trabalho. A execução pode ser feito pelo mesmo ou indicado por ele a outro profissional médico habilitado (BRASIL, 1978). Ao empregador, por sua vez, compete garantir a elaboração e efetiva implementação do PCMSO, tanto quanto zelar por sua eficácia (BRASIL, 1978). A NR–7 estabelece, ainda, que o programa deva obedecer a um planejamento em que estejam previstas as ações de saúde a ser executadas durante o ano, devendo estas ser objeto de relatório anual. O relatório anual deverá discriminar, por setores da empresa, o número e a natureza dos exames médicos, incluindo avaliações clínicas e exames complementares, estatísticas de resultados anormais, assim como o planejamento para o ano seguinte. Esses dados ficam arquivados no local de trabalho, à disposição da fiscalização do trabalho (BRASIL, 1978; DIAS & MIRANDA, 2004). Norma Regulamentadora 9 (NR–9) A NR-9 estabelece a obrigatoriedade da elaboração de um PPRA no trabalho e a implementação por parte de todos os empregadores e instituições que admitam trabalhadores como empregados, visando a preservação da saúde e a integridade dos trabalhadores, por meio da antecipação, reconhecimento, avaliação e, consequentemente, controle da ocorrência de riscos ambientais existentes ou que venham a existir no ambiente de trabalho, tendo em consideração a proteção do meio ambiente e dos recursos naturais, complementando o PPRA (BRASIL, 1978; FAGUNDES, 2009). Essa norma apresenta um caráter multidisciplinar, sendo considerada essencialmente um programa de higiene ocupacional que deve ser implementado nas empresas de forma articulada com o programa médico (PCMSO) (DIAS & MIRANDA, 2004). MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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Segundo orientações da NR–9, todas as empresas, independente do número de empregados ou do grau de risco de suas atividades, estão obrigadas a elaborar e implementar o PPRA, que tem como objetivo a prevenção e o controle da exposição ocupacional aos riscos ambientais, isto é, a prevenção e o controle dos riscos químicos, físicos e biológicos presentes nos locais de trabalho (BRASIL, 1978; DIAS & MIRANDA, 2004). A norma detalha as etapas a serem cumpridas no desenvolvimento do programa, os itens que compõem a etapa do reconhecimento dos riscos, os limites de tolerância adotados na etapa de avaliação e os conceitos que envolvem as medidas de controle. Estabelece, ainda, a obrigatoriedade da existência de um cronograma que indique claramente os prazos para o desenvolvimento das diversas etapas e para o cumprimento das metas estabelecidas (DIAS & MIRANDA, 2004). A elaboração, implementação e avaliação do PPRA podem ser feitas por qualquer pessoa, ou equipe de pessoas que, a critério do empregador, sejam capazes de desenvolver o disposto na norma. Além disso, cabe à própria empresa estabelecer as estratégias e as metodologias que serão utilizadas para o desenvolvimento das ações, bem como a forma de registro, manutenção e divulgação dos dados gerados no desenvolvimento do programa (BRASIL, 1978; DIAS & MIRANDA, 2004). A norma estabelece que a empresa deve adotar mecanismos de avaliação que permitam verificar o cumprimento das etapas, das ações e das metas previstas (DIAS & MIRANDA, 2004). A NR-9 garante aos trabalhadores o direito à informação e à participação no planejamento e no acompanhamento da execução do programa (BRASIL, 1978). Por último, a normativa ressalta em seu texto a importância, na realização do exercício laboral, do uso de EPIs adequados, como recurso utilizado para minimizar os riscos que estão expostos os trabalhadores (FAGUNDES, 2009). Norma Regulamentadora 15 (NR–15) A NR-15 relaciona em seu texto as atividades e operações insalubres nas quais os trabalhadores podem estar expostos durante sua atuação profissional (BRASIL, 1978). A insalubridade é uma gratificação instituída pela lei que visa compensar a possibilidade de dano à vida ou à saúde daqueles que executam determinados trabalhos classificados como insalubres e/ou perigosos (BEJGEL & BARROSO, 2001). Segundo a NR–15, a insalubridade é comprovada por laudo técnico de engenheiro de segurança do trabalho ou médico do trabalho, devidamente habilitado, que fixa o adicional devido aos empregados expostos à insalubridade quando impraticável sua eliminação ou neutralização. MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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As empresas e sindicatos das categorias profissionais, também, podem requerer ao MTE, através das DRTs, a realização de perícia em estabelecimento ou setor, com o objetivo de caracterizar e classificar ou determinar atividade insalubre. Nas perícias requeridas às DRT, desde que comprovada a insalubridade, o perito do MT indicará o adicional devido (BRASIL, 1978). Norma Regulamentadora 32 (NR–32) A NR–32 relaciona em seu texto as diretrizes básicas na implementação de medidas de proteção à segurança e à saúde dos trabalhadores nos serviços de saúde, assim como daqueles que exercem atividades de promoção e assistência à saúde em geral. A definição de serviço de saúde incorpora o conceito de edificação. Assim, todos os trabalhadores que exerçam atividades nessas edificações, relacionadas ou não com a promoção e assistência à saúde, são abrangidos por esta norma. (BRASIL, 2008) Os fatores de riscos biológicos, químicos, físicos e ergonômicos presentes em ambientes que prestam serviços de saúde, caracterizadores da insalubridade e da periculosidade deste setor, são abordados nesta norma de forma a complementar as normas já existentes. Riscos Biológicos A exposição ocupacional a agentes biológicos decorre da presença destes no ambiente de trabalho, podendo ser esta exposição derivada da atividade laboral do trabalhador: quando há utilização ou manipulação do agente biológico como objeto principal do trabalho ou há exposição sem que essa implique na manipulação direta do agente biológico como objeto principal do trabalho, como é o caso do atendimento em saúde, laboratórios clínicos (com exceção da microbiologia), consultórios médicos e odontológicos, limpeza e lavanderia em serviços de saúde. A diferenciação desses dois tipos de exposição é importante porque condicionam o método de análise dos riscos e, consequentemente, as medidas de proteção a serem adotadas. (BRASIL, 2008) Segundo a NR–32 (BRASIL, 2005), em relação aos agentes biológicos, os estabelecimentos devem ter suas ações embasadas no PPRA (NR–9) e PCMSO (NR–7), que neste caso, possuem em seus textos alguns adendos que focam a norma especificamente para áreas da saúde. A normativa preocupa-se com a correta realização PCMSO e do PPRA, instrumentos necessários à prevenção de riscos e acidentes nas empresas, que devem ser realizados periodicamente, e atualizados, na medida em que a empresa adota as medidas recomendadas pelos programas. MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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O PPRA, neste caso, deve conter na fase reconhecimento à identificação dos riscos biológicos mais prováveis em função da localização geográfica e da característica do serviço de saúde e seus setores e a avaliação do local de trabalho e do trabalhador considerando a finalidade e descrição do trabalho, organização, procedimentos entre outros. Segundo BRASIL (2008), a identificação dos riscos biológicos deve seguir metodologia qualitativa, devendo ser considerados os agentes epidemiologicamente mais frequentes, tendo em vista o perfil epidemiológico da região, do próprio serviço e dos trabalhadores do serviço de saúde. A NR–32 sugere que o PPRA deva ser reavaliado anualmente, sempre que se produzam mudanças nas condições de trabalho ou quando a análise de acidentes ou incidentes constatarem a ineficácia dos procedimentos de prevenção definidos no PPRA (BRASIL, 2005). O PCMSO, segundo a NR–32 (BRASIL, 2005), além do que está disposto na NR–07, deve ter uma complementação para adaptação a área da saúde no que diz respeito aos riscos biológicos e a possibilidade de exposição acidental a esses agentes. A elaboração e implementação do PCMSO, portanto, devem estar embasadas na identificação dos riscos à saúde dos trabalhadores prevista no PPRA. Ainda junto a esta seção a norma discorre sobre medidas de proteção a serem adotadas pelos serviços. Assim, com base nos resultados da avaliação, segundo o previsto no PPRA, cada estabelecimento deverá propor medidas para controle de riscos (BRASIL, 2005). Segundo BRASIL (2008), as medidas para o controle de riscos podem estar relacionadas à: Medidas de controle de riscos na fonte: eliminar ou reduzir a presença dos agentes biológicos; Medidas para o controle de riscos na trajetória entre a fonte de exposição e o receptor ou hospedeiro: prevenir ou diminuir a disseminação dos agentes biológicos ou reduzir a concentração desses agentes no ambiente de trabalho; Medidas de proteção individual: uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs). A norma assegura, ainda, que os empregadores são obrigados a fornecer os EPIs adequados ao risco que o profissional está exposto e a realizar no momento da admissão do funcionário e de forma periódica, programas de treinamento dos profissionais quanto à correta utilização. A adequação desses equipamentos deve levar em consideração não somente a eficiência necessária para o controle do risco da exposição, mas também o conforto oferecido ao profissional, pois se há desconforto no uso do equipamento, existe maior possibilidade do profissional deixar de incorporálo no uso rotineiro (FAGUNDES, 2009). Uma das particularidades desta normativa, que a torna específica a setores da saúde, é a questão da vacinação dos trabalhadores. Segundo NR– 32 (BRASIL, 2005), todo trabalhador de serviço de saúde deve receber, MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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gratuitamente, imunização contra tétano, difteria, hepatite B e os estabelecidos no PCMSO (conforme risco ocupacional) do estabelecimento, com base nas orientações do MS. Riscos Químicos Os trabalhadores da saúde estão expostos à enorme variedade de produtos tóxicos: anestésicos, esterilizantes, desinfetantes, solventes, agentes de limpeza, anti-sépticos, detergentes, quimioterápicos, medicamentos diversos, entre outros. Segundo a NR–32 (BRASIL, 2005), no PPRA dos estabelecimentos de saúde deve constar um inventário de todos os produtos químicos, inclusive intermediários e resíduos, com indicação dos que implicam em riscos à segurança e saúde do trabalhador. As fichas descritivas dos produtos químicos são utilizadas na elaboração e implementação do PCMSO, cabendo ao empregador capacitar de forma continuada os trabalhadores para utilização segura desses produtos. (BRASIL, 2005) A normativa cita em seu texto, em relação aos riscos químicos, medidas de proteção a serem adotadas no caso da utilização de gases medicinais e medicamentos e drogas de risco - gases e vapores anestésicos e quimioterápicos antineoplásicos (BRASIL, 2005). Riscos Físicos Os agentes físicos compreendem: Radiações ionizantes: raios-X, raios , raios , partículas , prótons e nêutrons; Radiações não ionizantes: ultravioleta (UV), raios visíveis (luz solar ou artificial), infravermelho, microondas, freqüência de rádio, raios laser; Variações atmosféricas: calor, frio, e pressão atmosférica; Vibrações oscilatórias: ruído e vibrações. A OIT considera radiações ionizantes ruído, temperatura e eletricidade como principais fatores de risco físico para os trabalhadores de saúde (FAGUNDES, 2009) A NR–32 (BRASIL, 2005) traz exigências em relação a riscos físicos que complementam normas específicas da CNEN, Agência de Vigilância Sanitária (ANVISA) e do MS. Em relação a radiações ionizantes, a norma exige um Plano de Proteção Radiológica (PPR) aprovado pela CNEN e, para serviços de radiodiagnóstico, aprovado pela ANVISA. Esse plano deve fazer parte do PPRA e PCMSO. Em seu texto deve conter informações referentes à monitorização individual e de áreas, medidas para casos de acidentes ou incidentes e, principalmente, as ações que deve ser tomadas por empregadores e trabalhadores para a eficácia do mesmo (BRASIL, 2005). MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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A normativa cita em seu texto, em relação aos riscos físicos, medidas de proteção a serem adotadas em serviços de Medicina Nucelar, Radioterapia, Radiodiagnóstico Médico e Radiodiagnóstico Odontológico (BRASIL, 2005). Riscos Ergonômicos Segundo FAGUNDES (2009), a ergonomia é a ciência que estuda a adaptação do ser humano ao trabalho procurando adaptar as condições de trabalho às características físicas e limitações individuais do ser humano. E afirma que as pessoas são diferentes em altura, estruturas ósseas e musculares, algumas são mais fortes e com capacidade diferenciada para suportar o stress físico e mental. Estes fatos básicos não podem ser alterados e devem ser utilizados como base para o planejamento das condições de trabalho. A NR–32 (BRASIL, 2005) quanto aos riscos ergonômicos, relata apenas em suas disposições gerais que os postos de trabalho devem ser organizados de forma a evitar deslocamentos e esforços adicionais aos trabalhadores. A normativa dispõe, ainda, que o transporte de materiais que comprometem a segurança e a saúde do trabalhador deve ser efetuado com auxílio de meios mecânicos ou eletromecânicos. Fiscalização Em 1947, OIT editou sua Convenção 81, regulando a inspeção do trabalho em países como Brasil, Argentina e México, permitindo a elaboração do desenho dos sistemas nacionais de inspeção e vigilância do trabalho. No caso do Brasil, esse sistema inclui três agentes principais: 1) o poder público, por meio do MTE, no exercício de seu poder fiscalizador e do Ministério Público do Trabalho, no manejo das ações civis públicas para defesa de interesses coletivos; 2) os sindicatos de trabalhadores e entidades da sociedade civil; 3) a Justiça do Trabalho, quando manda reparar lesão a direitos trabalhistas (CARDOSO & LAGE, 2005). Em 1988, com a promulgação da Constituição da República, foi atribuída à União competência de "organizar, manter e executar a inspeção do trabalho" (art. 21, XXIV), competência esta que não era contemplada na constituição anteriormente. Com isso, o governo federal reestruturou o sistema de inspeção do trabalho e diversas medidas legislativas foram adotadas nesse sentido, tais como a reorganização do MTE, que pela Lei nº 8.028, que detém a competência para fiscalização do trabalho (art. 19, VII, alínea a) (MACHADO, 2006). Desse modo, a fiscalização das condições para o exercício das profissões é de competência privativa da União, entretanto o poder estatal designou esta função, também, aos Conselhos de Classe Trabalhista, cabendo a estes fiscalizar seus profissionais verificando se os mesmos estão MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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habilitados e/ou capacitados a atuar nas áreas específicas (CARDOSO & LAGE, 2005). Ao tratarmos de estabelecimentos de serviços de saúde estes são fiscalizados pelo MTE, Conselhos de Classe Trabalhista e pela ANVISA. A ANVISA, através das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, realiza inspeções de regulamentação, controle e fiscalização sanitária dos serviços que envolvem risco à saúde pública. As edificações dos serviços de saúde que atendem exigências da RDC 50, de 21 de fevereiro de 2002, também são de competência da ANVISA (ANVISA; BRASIL, 2002). Assim, a NR–32 regulamenta a fiscalização dos serviços de saúde pelos órgãos responsáveis. Entretanto, a observância das disposições regulamentares constantes dessa normativa, não desobriga os estabelecimentos do cumprimento de outras disposições que estão incluídas em códigos ou regulamentos sanitários dos Estados, Municípios e Federal, e outras oriundas de convenções e acordos coletivos de trabalho, ou constantes nas demais NR’s e legislação federal pertinente à matéria (BRASIL, 2005; FAGUNDES, 2005). Discussão A saúde do trabalhador é uma área de amplos estudos com objetivo de intervir nas relações entre o trabalho, saúde e doença. Com isso, busca-se promover a proteção da saúde do trabalhador com o desenvolvimento de ações de vigilância dos riscos presentes nos ambientes e condições de trabalho, dos agravos à saúde e a prestação da assistência adequada aos trabalhadores. A eliminação ou a redução da exposição às condições de risco e a melhoria dos ambientes de trabalho para promoção e proteção da saúde do trabalhador constituem um desafio exigindo soluções técnicas, às vezes complexas e de elevado custo. Em certos casos, medidas simples e pouco onerosas podem ser implantadas, com impactos positivos e protetores para a saúde. Aprovada pela Portaria n.º 485 de 11 de novembro de 2005, a NR–32, vem provocando mudanças nos estabelecimentos de saúde quanto à busca de um ambiente de trabalho que proporciona bem estar, minimização de riscos potenciais a saúde, diminuição do número de afastamentos por acidentes do trabalho e redução de mortabilidade dos trabalhadores. Com a NR – 32, o PPRA e o PCMSO passaram a ter características próprias do setor da saúde. Um exemplo disso é a vacinação de trabalhadores, até então opcional, que passa a ser obrigatória e deve constar no cronograma do PCMSO. A questão do risco biológico é outro tema bem discutido pela norma que exige a identificação dos prováveis agentes biológicos de exposição ocupacional que devem constar no PPRA. Anexa à norma, encontra-se a classificação dos agentes em grau de risco, com uma extensa listagem de agentes biológicos, que auxiliam as empresas na elaboração de seus PPRA e MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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PCMSO. Neste âmbito, a norma dispõe, também, sobre a necessidade da capacitação inicial e continuada aos profissionais da saúde. Em relação ao risco químico, a norma exige que no PPRA exista um inventário dos produtos químicos utilizados no local com ficha descritiva das características e a forma de utilização dos mesmos. Isso é importante para que a empresa possa prever os possíveis riscos à segurança e saúde do trabalhador e ao meio ambiente, propor medidas de proteção individual e coletiva, indicar condições e local de estocagem dos produtos e procedimentos a serem tomados em situações de emergência. A norma é falha quando não apresenta nenhuma listagem contendo informações básicas de produtos químicos, que possa auxiliar os estabelecimentos na elaboração de seus PPRA e PCMSO. O que existe em outra normativa, no caso na NR–15, e que pode auxiliar de alguma forma as empresas são algumas listagens contendo alguns produtos e substâncias químicas, porém não sendo nada específico para área. O texto da normativa, ainda em relação ao risco químico, é muito incisivo quando trata de quimioterápicos antineoplásicos que eram manuseados, anteriormente, sem nenhuma legislação específica. A norma traz informações sobre os locais de manipulação, procedimentos, ações em casos de acidentes ambientas ou pessoais e da capacitação dos profissionais envolvidos. O texto apresenta-se incompleto, no caso dos quimioterápicos antineoplásicos, em relação a itens importantes como uso de EPI’s, vestuário e dispositivos necessários para a manutenção da biossegurança no manuseio dos mesmos. Assim como quimioterápicos antineoplásicos, produtos químicos como antibióticos, modificadores de resposta biológica, corantes, saneantes e desinfetantes, também não apresentam legislação específica, porém não se apresentam descritos no texto da norma. A NR–32 reforça, em relação ao risco físico, a importância dos treinamentos e capacitações tanto aos profissionais que realizam operações utilizando radiações ionizantes quanto aos profissionais que fazem outras atividades relacionadas, como limpeza e manutenção de equipamentos. Em relação à biossegurança, a norma orienta sobre o uso dos EPI’s tradicionais e prevê o uso de equipamentos de monitoração de área e contaminação superficial, como canetas dosimétricas ou filmes do tipo TLD. Com relação ao risco ergonômico dos trabalhadores, não há uma descrição especial para esse assunto. As exigências existentes na norma, que podem se encaixar neste tipo de risco, encontram-se esparsas pelo texto, não sendo específicas aos diferentes setores (hospitais, laboratórios, farmácias) nem a diferentes atuações profissionais (enfermeiros, médicos, farmacêuticos, dentistas). Informações sobre refeitórios, lavanderias, limpeza e conservação e manutenção de máquinas e equipamentos são complementos para o correto funcionamento dos ambientes de trabalho e, consequentemente, da saúde dos trabalhadores. MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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Pela avaliação do texto da NR – 32, pode-se resumir a mesma na palavra prevenção, já que seu principal objetivo parece ser eliminar o risco de acidentes de trabalho. E se o risco não puder ser eliminado, deve ser controlado, avaliado e administrado. A informação e conscientização dos profissionais da saúde quanto ao risco inerente as suas atividades e das instituições quanto ao seu papel diante de seus trabalhadores e da sociedade é que farão essa normativa funcionar efetivamente. Sem esquecer que ajustes no texto da normativa fariam-na ficar mais específica e atender as reais necessidades dos trabalhadores de serviços de saúde. A questão da fiscalização pelos órgãos responsáveis pelos estabelecimentos de saúde é outra questão a ser discutida quando falamos na aplicabilidade na normativa. Sabe-se que relacionado à área da saúde fiscalizações são feitas pelo MTE, Conselhos de Classes Profissionais e ANVISA que pode representada pelas secretarias estaduais e municipais de saúde. O que acontece na prática é que a fiscalização nos estabelecimentos de saúde acaba sendo mais relacionada à parte estrutural e funcional de atendimento aos clientes, enquanto a atuação dos profissionais não é colocada dentro das prioridades das ações de vigilância. Apesar dos dados do MTE revelarem que vem aumentando anualmente as ações de inspeção de segurança e saúde no trabalho para trabalhadores da área da saúde, essas ações ainda se fazem insuficientes. Cabe a esse órgão uma maior atuação junto aos estabelecimentos para possam garantir a aplicabilidade das legislações vigentes. Como exemplo a ser seguido pode-se citar o setor da indústria que com a organização das empresas na aplicabilidade das leis e normas e com a forte atuação do MTE vem mostrando êxitos na busca de um ambiente de trabalho que prima pela segurança e saúde de seus trabalhadores, sem esquecer da qualidade de serviços e da produtividade. Conclui-se, então, a importância da integração dos profissionais de serviços de saúde e das instituições (empregadores) interligando conhecimentos e práticas para uma correta utilização dos recursos existentes, compartilhando os conhecimentos adquiridos, na tentativa de melhorá-los e ampliá-los, trazendo questões do cotidiano e do saber profissional, na busca de ambientes de trabalho que prime não só pela qualidade de serviços e sim pela qualidade de vida de todos seus profissionais. Referências BEJGEL, I.; BARROSO. E. W. J. O trabalhador do Setor Saúde, a Legislação e seus Direitos Sociais. Boletim de Pneumologia Sanitária.Rio de Janeiro, v.9, n.2, jul./dez., 2001. ISSN 0103-460X. MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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BRASIL. AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA – ANVISA. Institucional – Competências Gerais e Específicas da ANVISA. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/Institucional/anvisa/comp.htm>. Acesso: 10 out. 2009. _______. Constituição da República Federativa do Brasil. D.O.U, Brasília, DF, 05/10/1988. _______. MINISTÉRIO DA SAÚDE. SECRETARIA DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INSUMOS ESTRATÉGICOS. Diretrizes Gerais para o Trabalho em Contenção com Material Biológico. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. _______. MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL. Representação no Brasil da OPAS/OMS. Doenças Relacionadas ao trabalho: manual de procedimentos para serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde do Brasil, 2001. _______. MINISTÉRIO DO TRABALHO (MT). Normas Regulamentadoras – NR – do Capítulo V, Título II, da Consolidação das Leis do Trabalho relativas à Segurança e Medicina do Trabalho. Aprovada pela Portaria MTB n.º 3.214, de 08 de junho de 1978. D.O.U. 06/07/1978. _______. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE) – SECRETARIA DE INSPEÇÃO DO TRABALHO (SIT). Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho em Estabelecimentos de Saúde (NR – 32). Aprovada pela Portaria nº. 485, de 11 de novembro de 2005. D.O.U. 16/11/2005. Brasília: MTE, SIT, 2008. _______. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE). Riscos Biológicos – Guia Técnico – Os Riscos Biológicos no Âmbito da Norma Regulamentadora N.º 32. Brasília: MTE, 2008. _______. MINSTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. SISTEMA FEDERAL DE INSPEÇÃO DO TRABALHO. Estatísticas – Segurança e Saúde no Trabalho. Disponível em: <http://www.mte.gov.br/seg_sau/default.asp>. Acesso em 10 out. 2009. CAVALCANTE, C. A. A.; NÓBREGA, J. A. B.; ENDERS, B. C.; MEDEIROS, S. M. Promoção da saúde e trabalho: um ensaio analítico. Revista Eletrônica de Enfermagem. Porto Alegre, v.10, n.1, p.241-248, 2008. Disponível em: <http://www.fen.ufg.br/revista/v10/n1/v10n1a23.htm>. Acesso em: 29 jul. 2009. MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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SIMÃO, A. R. A. Sistema de Vigilância e Fiscalização do Trabalho no Brasil: Efeitos Sobre a Expansão do Emprego Formal no Período 1999-2007. Desafios do Desenvolvimento - Instituto de Pesquisa Econômicas Aplicadas (IPEA). Brasília, n.50, p.19, 2009. Disponível em: <http://desafios.ipea.gov.br/sites/000/2/boletim_mercado_de_trabalho/mt39/0 3_NT2Anna%20Simao.pdf>. Acesso em: 07 set. 2009.
MENEGAT, Fabiana Dondé; CHASIN, Alice Aparecida da Matta. Estudo Comparativo das Normas Regulamentadoras da Relação entre Trabalho, Saúde e Doença, em Serviços de Saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 115-131, fev. 2013.
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A importância de se aliar a tecnologia à segurança química. Luisa Villar da Trindade Cursando Farmácia e Bioquímica pelas Faculdades Oswaldo Cruz. Experiência na classificação de perigo de produtos químicos (sistemas GHS, Comunidade Européia, Diagrama de Hommel, transporte, etc) e elaboração de documentos de Segurança (Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos -FISPQ-, Ficha de Emergência e rótulo).
Michelle Broglia Diaz Mestranda no Programa de Pós Graduação strictu senso “Trabalho, Saúde e Ambiente”, pelo Ministério do Trabalho e Emprego – FUNDACENTRO. Farmacêutica com habilitação na área industrial pelo Centro Universitário São Camilo em 2003 (Campus Ipiranga em São Paulo/SP). Especializada em Homeopatia pela FACISIBEHE em 2009 (São Paulo/SP). Técnica em Química pelo Colégio Benjamin Constant em 1998. (São Paulo/SP). Experiência profissional através de estágios e trabalhos efetivos em hospitais, clínicas, drogarias, farmácias com manipulação,
consultoria
em
toxicologia.
Estágio
em
produção industrial e na área assistencial hospitalar junto à equipes muldisciplinares pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo..
TRINDADE, Luisa Villar da; DIAZ, Michelle Broglia. A importância de se aliar a tecnologia à segurança química. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 132-135, fev. 2013.
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As mudanças no cenário mundial que aconteceram principalmente com a Revolução Industrial no século XVIII, na Inglaterra, trouxeram o desenvolvimento da tecnologia que surgiu como apoio às necessidades práticas da vida. E isso se alastrou em diversos níveis da sociedade, definindo e permeando muitas das nossas relações. O termo tecnologia vem do grego “tekhne” que significa “técnica, arte, oficio” e o sufixo “logia”, que significa “estudo”. Assim, tecnologia é um produto da ciência e da engenharia envolvendo um conjunto de instrumentos, métodos e técnicas que visam à resolução de problemas. Nesse mesmo contexto, os produtos químicos se tornaram essenciais em nossas vidas, fazendo parte, direta ou indiretamente, da produção de alimentos e medicamentos que mantêm nosso estilo de vida moderno. Nascendo daí a necessidade da padronização para a gestão química segura, principalmente nos locais de trabalho nos setores agrícola, de produção industrial, de armazenamento, de distribuição, de transporte e, inclusive, para o próprio comércio e consumo. A fim de harmonizar vários sistemas de classificação química e, finalmente, fornecer ferramentas consistentes de comunicação de perigos químicos em todo o mundo, foi aprovado o Sistema Globalmente Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos (GHS). Esse conceito foi desenvolvido inicialmente como resultado da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento – CNUMAD (Capítulo 19 - Agenda 21), realizada em 1992, no Rio de Janeiro. A Conferência recomendou um sistema global harmonizado para a classificação e rotulagem de produtos químicos, incluindo fichas de informações de segurança e símbolos compreensíveis que deveriam estar disponíveis, se possível, até o ano 2000. Ele foi adotado mais tarde, em 2002, pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas e foi aprovado pelo CMDS (Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Sustentável), com o objetivo de execução em 2008. O UNITAR (Instituto das Nações Unidas de Treinamento e Pesquisa) e a OIT (Organização Internacional do Trabalho) foram nomeados como os pontos focais para ajudar os países em desenvolvimento a implementar o GHS (UNITAR / ILO, 2005; SILK, 2003). Vários países participaram do projeto piloto. Os países membros da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico - APEC, também decidiram estabelecer o GHS antes de 2006, de forma voluntária (SU, 2003). O GHS objetiva fornecer comunicação de risco global fácil e internacionalmente compreensível. O sistema procura abranger todas as substâncias químicas, incluindo substâncias puras e mistas, e exige a TRINDADE, Luisa Villar da; DIAZ, Michelle Broglia. A importância de se aliar a tecnologia à segurança química. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 132-135, fev. 2013.
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rotulagem de perigo das mesmas, fornecida nos locais de trabalho para incluir informações sobre como evitar danos agudos e crônicos para a saúde humana e ao meio ambiente. Tem também o objetivo de facilitar o comércio internacional e, simultaneamente, alertar contra os danos decorrentes de transporte de substâncias perigosas. Compreende um total de 27 categorias de perigo. A base utilizada em que se diferenciam cada perigo é definida em detalhes por um documento de informações de segurança, contendo 16 itens, denominado FISPQ – Ficha de Informações de Segurança de Perigos Químicos. Além da identificação de produtos químicos e dos fornecedores, a rotulagem do GHS inclui os pictogramas de perigo, palavras de advertência, frases de perigo e frases de precaução para prevenção, resposta à emergência, armazenamento e disposição. O público-alvo do GHS envolve trabalhadores, consumidores, transportadores e equipes de emergência. O sistema deveria ser adotado internacionalmente e substituiria as leis e regulamentos relevantes usados em diferentes países (ILO, 2003). A INTERTOX, com equipe especializada, reuniu o conhecimento, a tecnologia e a necessidade num software denominado SafetyChem®, desenvolvido com o intuito de proporcionar qualidade, rapidez, praticidade e harmonização no desenvolvimento de documentos para produtos, tais como:
FISPQ (FICHA DE INFORMAÇÃO DE SEGURANÇA DE PRODUTOS QUÍMICOS), FICHA DE EMERGÊNCIA, FICHA DE COMUNICAÇÃO DE PERIGOS e RÓTULOS
O software serve, portanto, como uma ferramenta essencial para comunicação e gerenciamento do risco toxicológico e químico. Referências ABIQUIM - Associação Brasileira da Indústria Química. Departamento de Assuntos Técnicos. O que é o GHS? Sistema harmonizado globalmente para a classificação e rotulagem de produtos químicos. São Paulo: ABIQUIM/DETEC, 2005. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/reblas/reblas_public_manual_ghs.pdf ILO, International Labour Organization, 2003. Globally Harmonized System of Classification and Labeling of Chemicals (GHS), Geneva. NR 26 – Norma Regulamentadora nº26 - Sinalização de Segurança. Publicação. D.O.U.. Portaria GM n.º 3.214, de 08 de junho de 1978. 06/07/78. Portaria SIT n.º 229, de 24 de maio de 2011. Disponível em: TRINDADE, Luisa Villar da; DIAZ, Michelle Broglia. A importância de se aliar a tecnologia à segurança química. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 132-135, fev. 2013.
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http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A31190C1601312A0E15B61810/ nr_26.pdf Sistema Global Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos (GHS). Disponível em: http://www.mte.gov.br/rel_internacionais/sitemaGlobalGHS.pdf SU, T.S., 2003. The hazard communication program in Chinese Taipei. In: APEC Chemical dialogue – Seminar on Globally Harmonized System. Sep. 2003, Taipei.
TRINDADE, Luisa Villar da; DIAZ, Michelle Broglia. A importância de se aliar a tecnologia à segurança química. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 6, n. 1, p. 132-135, fev. 2013.