O enigma da velocidade da luz
J.R. Silva Bittencourt
O enigma da velocidade da luz J.R. Silva Bittencourt Um dos postulados de Albert Einstein é o de que nada pode se deslocar mais rápido no espaço do que a luz. Ele deve ter causado o maior alvoroço na comunidade científica da época, porque a afirmação se choca, num primeiro momento, com a forma instantânea com que a nossa visão abarca toda a abóbada celeste, numa noite escura e sem nuvens. Nossas antenas parabólicas e telescópios (como o Hubble) podem, igualmente, rastrear a radiação cósmica até muito próximo do big bang, e o fazem de forma instantânea. Se a luz não se desloca instantaneamente no espaço, como isso é possível? Entre as muitas hipóteses levantadas, a que mais se destaca é a de que a luz, emitida no big bang e pelas galáxias em expansão, seria formada por ondas eletromagnéticas contínuas. Imagine um novelo de lã em que uma das suas pontas estivesse colocada junto ao evento do big bang, e o fio contínuo de luz fosse desenrolado a partir dali, até nos alcançar, na Terra, nos dias de hoje. Então, seria justificável imaginar-se que tanto faz se a luz fosse seguida num sentido ou no outro. Ou seja, o big bang estaria no passado, porque teria sido de lá que a luz teria
partido. Essa tese não pôde mais ser sustentada depois do advento do efeito fotoelétrico, pois ele mostrou que o tal fio do novelo de lã, que nos ligaria diretamente ao passado, é totalmente fragmentado ou picotado. Quando introduzimos um novo elemento no contexto, representado pelo observador isolado dotado com uma memória, algumas coisas começam a fazer sentido. Esse procedimento costuma incomodar aqueles que acreditam que somente existe aquilo que pode ser medido, pois nos afastamos do lado ‘de fora’ onde as galáxias são avistadas, e passamos a nos preocupar com a forma com que a nossa consciência dá sentido aos eventos externos. Não se pode cogitar, sem provocar risos disfarçados, que o nosso cérebro pudesse ser capaz de criar a realidade. No entanto, é provável que o nosso cérebro tenha sido projetado para transportar a realidade, na forma de informações, para dentro dos domínios da nossa consciência. Quando o fizesse, subentende-se que isso jamais aconteceria em tempo real, pois precisamos de padrões e estereótipos comparativos que possam ser revisitados a qualquer momento, passando a compor a nossa memória. Reside exatamente aí, uma das maneiras de se explicar a forma instantânea com que tudo pode ser
observado à nossa volta. É difícil admitir que a nossa consciência pudesse estar atuando de forma intermitente no nosso dia a dia, simplesmente porque nada existe fora dela. É que, para podermos tecer comentários sobre qualquer coisa, dependemos da presença constante da informação. O efeito fotoelétrico é um dos esteios da mecânica quântica e nos diz, basicamente, que toda a forma de energia mensurável é quantizada ou “empacotada”. Além disso, o processo da quantização seria atemporal, já que quando um fóton atinge um elétron e o quantum se espalha ambos aparecem simultaneamente, sem que nenhum intervalo mensurável de tempo os esteja separando. Isso impede que possamos encontrar um elétron no intervalo entre dois níveis de energia subsequentes do átomo, o que gera incerteza. Como o tempo da quantização não existe ou não pode ser medido diretamente, e nós precisamos da luz espalhada para ver a partícula, torna-se irrelevante saber qual teria sido a distância percorrida anteriormente pelo fóton de luz. O princípio de rastreamento é o mesmo, quer seja utilizado por um microscopista ou por um astrônomo por trás de um telescópio. De qualquer forma, ainda persiste a nossa vaga sensação de que teria havido um ‘antes’ e um
‘depois’ do espalhamento, o que não pode ser confirmado ou desmentido. Assim, vemos que estas questões são dependentes da presença do observador, embora o universo não pareça estar muito preocupado com o que pensamos a seu respeito. As cogitações sobre os 13,7 bilhões de anos que nos separariam do big bang resultam de avaliações tardias, ou que teriam acontecido depois do espalhamento da radiação cósmica, por isso ela é denominada, apropriadamente, “radiação cósmica de fundo”. Pode-se cogitar, por exemplo, que a radiação cósmica e a luz das galáxias sempre estiveram por aqui (pelo menos do nosso ponto de vista) sem ser relevante saber se houve um deslocamento anterior da luz no espaço. De qualquer modo, a luz teria que ter sido submetida a um processo de empacotamento local, que lhe permitisse ser registrada pelos nossos sentidos. Esse empacotamento (quantização) teria provocado a separação entre a luz e o espaço, com a primeira assumindo a função de ser a mensageira das galáxias. A velocidade de 300.000 km/s, que é atribuída à radiação cósmica, seria parte desse pacote, assim como o efeito Doppler. O comportamento atual da comunidade científica reflete-se na sua maneira de avaliar distâncias e
velocidades dos astros e das estrelas. Parte-se do princípio de que a luz e o espaço formariam um todo, uma coisa só. Assim, se você seguisse a luz na direção do passado alcançaria o ponto correspondente no espaço, ocupado por uma estrela. O problema é que não podemos seguir o espaço diretamente, porque ele teria se separado da luz no exato momento do espalhamento dos fótons, o que estaria por trás do Princípio da Incerteza da posição ou da velocidade. Quando se analisa o espaço através da luz (e da radiação cósmica como um todo) ele passa a assumir o mesmo comportamento de uma tira elástica, que é o que define as fases do movimento harmônico da radiação. Quem se comportaria como um elástico seria a luz, e não o espaço. Isso teria gerado uma série de avaliações equivocadas em relação ao espaço, que agora estaria na dependência do seu mensageiro, de comportamento totalmente diverso. Quando você estica um elástico, a força aponta na direção contrária à do esticamento. Isso atribuiria uma energia negativa ao vácuo durante a fase expansionária do universo, tal como aconteceria numa implosão. As galáxias tenderiam a desacelerar. Se, por outro lado, você deixasse o elástico livre para relaxar, a força
também apontaria no sentido contrário, resultando em aceleração. Diz-se que a energia envolvida nesse sistema é conservativa, por isso, as galáxias deveriam acelerar apenas na fase de contração do universo, o que não se verifica na prática do Doppler. Conclui-se que, devido a estarmos submetidos ao império da radiação eletromagnética, haveria um princípio de exclusão entre as fases do movimento harmônico da luz: estaríamos vendo as galáxias afastando-se umas das outras, mas fora do seu próprio tempo. Sem isso, a inflação deixaria de existir porque, devido à contração complementar do tempo, nós não poderíamos nos lembrar da fase inflacionária no presente. Seria necessário que houvesse uma inversão no sentido da seta do tempo junto ao observador que, mesmo de forma aparente, passasse a apontar na direção do passado. Na verdade, seria a contração do espaço, na presença de aceleração do movimento e da dilatação do tempo, que estaria expondo a fase contrária anterior, a de expansão do universo. Por atuar a exemplo de um imenso apagador de informações, mesmo que elas continuassem lá, a expansão seguida da contração complementar do tempo teria misturado os efeitos distintos das duas fases do movimento harmônico da luz. Como a fase de
relaxamento do elástico seria a única responsável pelo acesso direto às informações (espalhamento dos fótons), a exclusão entre elas fez com que a expansão e a contração da luz (não do espaço) passassem a serem tendências, que teriam ficado suspensas na direção do infinito. Assim, justificarse-ia a hipótese de Einstein de que o universo deveria mesmo ser estático. Acrescento que isso somente seria possível em um lugar do universo sem memória, ou onde o tempo não pudesse ser medido diretamente.
Santa Maria, RS, 19/01/2018.