Cosmologia-Crônica de um universo revirado II - o codificador

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Crônica de um universo revirado – II O Codificador

J.R. Silva Bittencourt


Crônica de um universo revirado-II O Codificador A supervalorização emprestada ao Efeito Doppler nos dias de hoje denota que consideramos a radiação cósmica de fundo, sintetizada na palavra “luz”, como sendo a mensageira dos eventos que repousariam no nosso passado, como é o caso do big bang. O problema é que também se considera, como já foi citado no artigo anterior, que a luz e o espaço seriam uma coisa só. Assim, se seguíssemos o mensageiro na direção do nosso passado alcançaríamos algum lugar do espaço em que um evento astronômico qualquer teria ocorrido. É o caso, por exemplo, da explosão de uma supernova. A incerteza da posição das fontes de luz condena essa forma de se avaliar o conjunto luz-espaço. Mas, compreende-se que a atitude é justificável. Então, fiquei pensando em como apresentar uma solução para o problema, e não a encontrei até o momento em que parei de buscá-la do lado “de fora”. Isto é, até considerar seriamente a hipótese de o tempo ser uma espécie de movimento intrínseco, ou que estaria contido em mim mesmo (e em todos os demais observadores isolados) por um princípio de exclusão de acesso direto ao futuro. A


palavra “futuro”, no caso, engloba todo o processo que teria permitido o funcionamento da nossa memória, ou seja, a “codificação” anterior das mensagens transportadas pela luz das estrelas, até o seu espalhamento final. Concluí que se a luz fosse apenas a mensageira do espaço, o próprio espaço deveria estar envolvido com a codificação dessas mensagens. Atuando como um codificador, ele teria perdido a capacidade para comunicar de forma direta as alterações da sua geometria, como seria o caso da sua curvatura. O espaço em si não nos diz nada; ele manda o recado por alguém. A luz, em seu estado natural, é invisível para nós diretamente, precisando sofrer um processo de condensação (quantização) no nível subatômico da matéria. Esse processo de empacotamento confere à luz das estrelas o aspecto de uma nuvem de poeira cósmica, o que a tornaria apta a ser capturada pelos nossos sentidos limitados. Da sua parte, o efeito Doppler nos mostra uma luz que já teria se espalhado, na Terra, depois de um processo de empacotamento que não demandaria tempo mensurável. Mesmo assim, o Doppler nos mostra um instantâneo do nosso próprio passado. Ainda que houvesse um tempo necessário para a condensação da luz (quantização), os nossos melhores métodos


experimentais têm se mostrado incapazes de medi-lo diretamente. Isso teria confundido totalmente a nossa avaliação atual, justificando o pensamento de que teria havido uma fusão aparente entre a radiação cósmica e o espaço. Supõe-se que, ao reter o tempo, a quantização da energia pudesse ser capaz de simular uma curvatura no espaço. Se o processo demandasse tempo, seria de se esperar que a luz e o espaço resultassem separados entre si. No entanto, a quantização da energia também poderia ter “polarizado” a luz no nível subatômico dos seus átomos, colocando num extremo a faixa de luz de maior energia, e no outro a faixa menos energética. Costuma-se exemplificar essa polarização utilizando os limites da faixa de luz visível: num polo estaria o ultravioleta e, no outro, o infravermelho. Neste caso, polarizar a luz na ausência de tempo mensurável iria resultar num nivelamento energético por unir esses extremos, seja de forma aparente ou não. A consequência é que, mesmo na presença de uma curvatura do espaço, o seu mensageiro iria nos dizer, com atraso e através do Doppler, que esse espaço continuaria plano ou, o que é mais correto pensar-se, que o espaço teria assumido uma tendência a se tornar plano. Essa tendência teria que ter ficado suspensa ao infinito, visando


preservar a incerteza da posição ou velocidade das partículas subatômicas. O problema teria ficado restrito à nossa incapacidade para medir o tempo a partir de certos níveis da sua contração, naquele nível microscópico. Sem a mensurabilidade do tempo não há movimento e as partículas deixam de existir, mesmo estando lá, pois não podemos nos lembrar delas. Então, tudo o que teria ocorrido durante o processo de empacotamento da luz não iria fazer parte da nossa realidade física, o que justificaria o pensamento inicial de que a luz e o espaço formariam um todo ou uma coisa só, mesmo estando separados entre si pela quantização. A consequência direta do nivelamento energético promovido pela polarização da luz, seja ele real ou aparente, seria o de ter feito migrar o marco zero do tempo, de cada uma das estrelas que iluminam o céu noturno, para a posição do observador isolado que as rastreia. Isto é, não seria mais possível deslocar esse marco para fora da posição do observador dizendo, por exemplo, que “se marco zero do tempo fosse colocado na posição de Beta Andrômeda, a luz que ela emite para o espaço precisaria de 75 anos para nos alcançar”. Para fazermos esse tipo de afirmação, teríamos que contar com a presença de outro observador isolado junto àquela estrela. Na


verdade, quando se trata do nosso ponto de vista, a luz de Beta Andrômeda sempre esteve ao nosso lado. Esse problema teria sido imposto ao observador apenas, e não para todo o restante do universo. Nesta forma de interpretação da realidade e pelo menos para mim, fica difícil não notar certa “intencionalidade” manifesta, pois teríamos sido colocados na condição de verdadeiros prisioneiros do tempo, exilados em alguma dimensão do nosso próprio passado. Pior, não temos como sair do espaço-tempo, para saber se há alguma coisa do lado “de fora” dele. Outra questão ligada ao efeito Doppler é a de que ele faria parte, como já se viu anteriormente, de um “pacote” de informações que nós veríamos desdobrado instantaneamente, e fora do seu próprio tempo. O Doppler, disso ninguém tem dúvida, é coisa do passado. Neste caso, ele deve estar desbancando eventos que deveriam estar acontecendo em tempo real, ou cujas informações ainda estariam sendo incubadas. O nosso exílio no espaço-tempo, como se nota, é informativo. O efeito Doppler está relacionado apenas à luz e ao movimento harmônico que ela executa, e não teria relação direta com o espaço. Isso ficou materializado na incerteza da posição ou da


velocidade das fontes de luz distantes. Por isso, vale relembrar que a luz executaria um movimento harmônico composto por duas fases, em que atuariam forças conservativas. Na primeira delas, haveria um predomínio da energia potencial elástica sobre a energia cinética, resultando em desaceleração. Se comparássemos a luz com um elástico, essa fase equivaleria à do seu esticamento. Ela corresponderia, também, à fase atemporal de quantização e de polarização da luz, em que o tempo perderia as suas características de mensurabilidade. Por isso, essa fase deixaria de existir para nós, porque não poderia ser lembrada. Mesmo assim, ela estaria por trás da nossa análise equivocada em relação ao espaço, segundo a qual ele e a radiação cósmica formariam uma coisa só. A segunda fase do movimento harmônico da luz viria acompanhada de aceleração, com o envolvimento de forças positivas (de restauração). No caso do elástico, a aceleração surge quando você o deixa livre para relaxar. Entende-se que, por considerarmos apenas o todo formado pelo espaço e pela luz e não as partes isoladamente, a nossa reação natural seria justapor os efeitos das duas fases. O Doppler, representando a primeira fase do MHS, surgiria acompanhado da aceleração do


movimento das galáxias, característica da fase secundária de restauração da força (gravidade). Se o espaço e a luz se fundissem de forma aparente, mesmo estando separados pela quantização da energia, o efeito Doppler migraria da primeira para a segunda fase do MHS da radiação cósmica, tornando o espalhamento da luz contínuo e permitindo, ao observador, o acesso final às informações que necessita. A partir daí, a nossa memória poderia atuar sem solução de continuidade devido à inversão (aparentemente contínua) no sentido da seta do tempo, promovida pela exclusão de acesso direto a uma das fases do MHS. Isso teria confundido a nossa avaliação em relação ao sentido das forças atuantes no espaço-tempo. A antigravidade, por exemplo, teria se transformado numa força fictícia, por estar envolvida com a fase de esticamento do elástico. A aceleração uniforme, que se nota para as galáxias em expansão, seria uma característica da fase de relaxamento do elástico, mas o Doppler nos mostra esse elástico em plena fase do seu esticamento, como se a expansão estivesse acontecendo em tempo real. Poder-se-ia dizer que a polarização da luz, durante o esticamento do conjunto luz-espaço (fase expansionária do universo), atuaria à semelhança


de um imenso apagador de informações. No entanto, como elas continuariam lá, seria mais correto pensar-se que o espaço estaria apenas codificando essas informações na própria luz, retendo simultaneamente o tempo envolvido no processo. Isso nos permitiria entender como, depois do espalhamento da luz das estrelas na Terra, quando a seta do tempo se inverte e aponta aparentemente para o nosso passado, a nossa avaliação de toda a abóbada celeste é feita, pela nossa memória, de forma instantânea e aparentemente contínua. No nosso espaço-tempo, o que não pode ser lembrado não existe.

Santa Maria, RS, 06/02/2018.


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