Nº 30 | Janeiro de 2011 | Distribuição Gratuita aos Sócios
Associação Nacional de Professores de Educação Visual e Tecnológica
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FORMAR
ficha técnica Director Directora Adjunta
Projecto Gráfico Colaboração Gráfica Ilustrações Paginação Execução e Produção Digital
José Alberto Rodrigues jarodrigues@gmail.com Sónia Paula Santos soniapmsantos@gmail.com Gil Maia Sara Bento Botelho Capa, Ficha técnica e Sumário: Martin Jarrie Paulo Fernandes (Colaboração Marta Freitas) nts
Administração
APEVT - Associação Nacional de Professores de Educação Visual e Tecnológica Largo de Noeda - EB 1 nº. 14 u 4300-352 Porto u % + Fax 225102547 e-mail: apevt@esoterica.pt u website: www.apevt.pt
Depósito Legal
103793/96
ISSN
156322-65878
editorial Estimados Associados, Colegas, Estamos em Janeiro de 2011, momento em que já não vamos a tempo de vos desejar um Feliz Natal mas, ainda no limite para vos endereçar os votos de um próspero Ano Novo de 2011, com saúde, paz e muitos sucessos pessoais e profissionais! Os tempos que vivemos são difíceis, muito duros e que exigem de nós atenção extrema e esforços redobrados na defesa da EVT no currículo e, essencialmente, na LUTA e defesa do par pedagógico a leccionar a NOSSA disciplina. Como é do vosso conhecimento, em final de Novembro de 2010, em Conselho de Ministros foi aprovado um projecto de Decreto-Lei que se veio a conhecer a 7 de Dezembro e que, reduzida a uma mera alínea, altera o DecretoLei nº. 6/2001 e que refere que “a leccionação da disciplina de Educação Visual e Tecnológica compete a um professor”, propondo-se assim acabar com o modelo de docência em par pedagógico. Desde logo a APEVT pediu audiência ao Ministério da Educação, aos diversos grupos parlamentares e prepara a realização de um encontro nacional já dia 15 de Janeiro para o qual já recebemos mais de 500 inscrições. Estamos atentos. Publicaremos o nosso manifesto e daremos a conhecer a nossa moção estratégica. Estamos certos que vamos fazer ouvir a nossa voz e alertar toda a sociedade para esta medida que nada tem de educativa, apenas economicista. Mesmo em tempos de crise severa, devemos ser lúcidos e perceber que mesmo em crise, em educação, há investimento, nunca desperdício. Especialmente no que toca à defesa do par pedagógico em EVT. Estamos também a preparar um número especial da inFORMAR para dar “ecos” de toda esta LUTA! Quanto a esta edição da inFORMAR, a 30, contamos com dois artigos de José Alberto Rodrigues e António Moreira incidindo os mesmos sobre o EVTdigital e o EVTux e a integração das ferramentas digitais na disciplina de EVT. Temos ainda o belíssimo contributo e uma excelente prática educativa da colega Flor Gomes intitulado “Pintar a Cidadania”. Já Paulo Fernandes e João Caetano incidem as suas abordagens na formação de professores numa dimensão reflexiva (no primeiro caso) e na Colecção Carrocel, com ilustrações feitas por crianças, para crianças (no segundo caso). E no auge desta LUTA da EVT, Ricardo Reis Pereira deixa-nos um testemunho que teve o cuidado de realizar e dar a conhecer a toda a sua escola. No caso, “A validade da EVT nas práticas educativas e no contexto social do século XXI – Uma sinopse para a comunidade escolar”, é um trabalho de reflexão e análise interessante que devem ler (e até dar a conhecer). Terminamos este número com três artigos no âmbito da parceria que temos com a ESE do Porto. São artigos colectivos e que abordam os mecanismos em EVT, os brinquedos ópticos e uma “caixa de retratos”. Abordagens e recursos educativos com extremo interesse para analisarem e, caso considerem, possam aplicar a outros contextos educativos. Para já, desejamos-vos boas leituras e teremos novo encontro nacional em final de Maio deste ano, em Santa Maria da Feira e, como devem estar recordados, este ano a coincidir com as eleições para os órgãos sociais da APEVT. Nessa altura, esperamos já contar com a próxima edição da inFORMAR adiantada, a número 31 e que será dedicada às práticas educativas em EVT e à resenha desta LUTA em defesa do par pedagógico em EVT. Saudações a todas e todos os colegas! José Alberto Rodrigues página
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Divulgar, partilhar e disseminar a integração de ferramentas digitais na disciplina de EVT com o EVTdigital
José Alberto Rodrigues jarodrigues@ua.pt António Moreira moreira@ua.pt
Resumo Com a implementação do Plano Tecnológico da Educação em Portugal e consequente apetrechamento das Escolas com recursos tecnológicos avançados, surge agora a necessidade de criar condições favoráveis para a efetiva integração das ferramentas digitais no currículo, possibilitando aos docentes informação e formação para a plena utilização destes recursos. Decorrente das características singulares da disciplina de Educação Visual e Tecnológica e da investigação que atualmente realizamos, surge o espaço chamado EVTdigital que se constitui como um blogue para divulgação de ferramentas digitais a explorar nesta disciplina e, também, um repositório de manuais para exploração dessas ferramentas digitais baseadas na Web, Web 2.0 e Software livre/gratuito, nesta disciplina do currículo. Seis meses após a criação do EVTdigital, este espaço começa a constituir-se como uma referência para os docentes que pretendem integrar nas suas atividades letivas as ferramentas digitais que regularmente são divulgadas e publicados manuais de apoio das mesmas. As oficinas de formação e workshops que ao longo deste tempo foram realizadas em várias escolas demonstram a capacidade de aceitação de introdução das ferramentas digitais no currículo da disciplina de EVT, isto acompanhado de indicadores que demonstram o sucesso da exploração destas ferramentas em contexto de sala de aula. Palavras-chave: Currículo, Educação, Educação Visual e Tecnológica, EVTdigital, Ferramentas Digitais.
Projecto financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (SFRH/ BD/66530/2009), co-financiado pelo Fundo Social Europeu (FSE). CIDTFF - Centro de Investigação Didáctica e Tecnologia na Formação de Formadores – Universidade de Aveiro.
1. Introdução Tendo como ponto de partida a integração das ferramentas digitais no currículo da disciplina de Educação Visual e Tecnológica (EVT), ferramentas essas baseadas na Web, Web 2.0 e Software Livre (considerámos também ferramentas de utilização livre), decidimos criar um espaço que se constituísse como um local privilegiado e de referência para os docentes da disciplina em questão, servindo para a divulgação, disseminação e publicação de manuais dessas ferramentas digitais passíveis de serem utilizadas em contexto de sala de aula para a abordagem dos diversos conteúdos e áreas de exploração da EVT. A esse espaço, criado em finais de 2009, chamámos EVTdigital . A pertinência deste artigo e a construção deste es4
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paço de partilha surge da necessidade que sentimos de divulgar junto da comunidade de professores de EVT, da comunidade científica em geral e, em particular, de todos aqueles que se interessam pela integração das tecnologias na educação, da possibilidade que existe em utilizar num contexto disciplinar específico um conjunto alargado de ferramentas digitais que estão disponíveis gratuitamente para a abordagem de conceitos essenciais desta disciplina. Pretendemos saber quais as ferramentas da Web, Web 2.0 e Software Livre que se adequam a este contexto educativo e, principalmente, aquelas que podem apoiar e contribuir de forma conjugada e articulada com os recursos e tecnologias usuais da disciplina, para o ensino e aprendizagem dos diversos conteúdos e áreas de exploração do currículo da EVT, integrados em diversas Unidades de Trabalho da disciplina; e que ferramentas adotar para cada conteúdo/área de exploração, que vantagens, contributos e potencialidades educativas poderão ter para a aprendizagem dos alunos, em contexto educativo de EVT, numa perspetiva de integração efetiva dessas mesmas ferramentas digitais no currículo e programa da disciplina. Assim, este espaço do EVTdigital alicerça-se numa perspetiva de construção colaborativa do saber, de uma comunidade de prática de professores que trabalha a integração das ferramentas digitais na disciplina de EVT. Com clareza e rigor, este espaço página
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fundamenta-se pela necessidade de partilha com a comunidade educativa dos professores de EVT de um número elevado de recursos educativos, quer listando as ferramentas digitais e categorizando-as, fornecendo manuais de apoio para o trabalho com as mesmas, constituindo-se como a abertura da investigação, enquanto está a decorrer, a todos os docentes que queiram comungar da partilha e trabalho com estas ferramentas, integrando-as na disciplina para abordagem dos conteúdos e áreas de exploração da mesma. Com a implementação do Plano Tecnológico da Educação (PTE), as escolas do ensino básico e secundário foram apetrechadas de novos equipamentos e de uma rede de fibra ótica que irão permitir a toda a comunidade educativa desenvolver projetos sustentados de integração das TIC no currículo que, numa perspetiva pessoal, passarão a ter uma preponderância maior na mudança de práticas letivas e diversificação de estratégias de ensino e aprendizagem, não como antes, apenas utilizando as TIC como competência transversal (DEB, 2001), mas como efetiva assumpção destas ferramentas por cada área disciplinar. “Com a modernização tecnológica, a escola dará um salto qualitativo e abrir-se-á a várias áreas do saber. De acordo com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 137/2007 (referente ao Plano Tecnológico da Educação), a escola será assim o centro de uma rede de projetos direcionados para o que realmente importa: aprender e ensinar mais e melhor, os professores e os alunos” (DR N.º 180 – 1.ª série, 18/09/2007). E é neste contexto atual que as TIC devem ocupar cada vez mais um lugar de grande relevo e particular destaque como contributo para o processo de ensino e aprendizagem. Contudo, deveremos, como professores e educadores, ter um certo cuidado na seleção e utilização desses recursos, não caindo no erro de os utilizar indistintamente e para qualquer situação em contexto letivo. A sua criteriosa análise e seleção deverá ser pensada e posteriormente usada como uma mais-valia e não como um mero recurso adicional que não se revelará relevante para as aprendizagens. Neste campo, incluem-se no presente estudo as ferramentas que nesta primeira década do século XXI têm surgido, decorrentes da Web e Web 2.0 e, ainda, na aposta cada vez maior no software livre (ou de
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utilização livre). Com a criação do espaço EVTdigital propomo-nos catalogar, organizar e criar as condições necessárias para que os docentes de EVT possam, com grande assertividade, pesquisar e selecionar as ferramentas mais adequadas para determinada necessidade ou problema a resolver, com os seus alunos, na sala de aula. 2. Finalidades e Objetivos A principal finalidade deste estudo será saber até que ponto as TIC, suportadas pela Web, Web 2.0 e software livre facilitam e promovem a aprendizagem de diversos conteúdos programáticos e áreas de exploração em contexto educativo de EVT, baseados nas seguintes questões investigativas: - Quais as ferramentas da Web, Web 2.0 e software livre que se podem integrar em contexto de EVT para a abordagem dos conteúdos e áreas de exploração desta disciplina? - Que posicionamento têm os alunos e professores (investigadores participantes) perante a integração sustentada destas ferramentas no seu quotidiano escolar? - Que alterações curriculares e ao nível da formação de professores devem ser feitas para a integração efetiva destas ferramentas digitais em contexto de EVT? Temos como objetivos fundamentais desta investigação: Saber que ferramentas suportadas pela Web, Web 2.0 e software livre podem integrar o currículo da disciplina de EVT; Identificar as principais vantagens e desvantagens da integração destas ferramentas em contexto de EVT; Inferir do posicionamento e posturas dos alunos perante a integração curricular das ferramentas digitais em EVT e; Identificar as alterações curriculares a perspetivar para a revisão curricular de EVT, para integração das ferramentas digitais (que conteúdos e áreas de exploração podem integrar ferramentas digitais). 3. Enquadramento Teórico O fator que orientou o desenvolvimento desta investigação foi a EVT ser diferente das restantes disciplinas do Currículo Nacional do Ensino Básico (CNEB). A abordagem de problemas diversos, por vários professores, em várias turmas, integrando ferramentas Web, Web 2.0 e Software livre para a abordagem dos conteúdos de EVT pode constituir uma mais-valia num mundo digital. Como defendemos anteriormente (Rodrigues, 2005), a utilização dos suportes tradicionais da disciplina articulados com ferramentas digitais é mais enriquecedora e significativa, tanto pela natureza 6
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da disciplina e riqueza da multiplicidade de aprendizagens, como pela diversificação de experiências e prazer da descoberta. Julgamos pertinente e fundamental defender uma utilização conjugada e articulada destes dois suportes. O contributo fundamental do CNEB em EVT é a utilização das TIC como recurso/estratégia cognitiva de aprendizagem. A utilização das TIC como ferramenta/recurso na sala de aula é entendida como área transversal. Os alunos devem contactar por formas diversificadas com estes recursos. O professor de EVT deverá englobar estratégias conducentes à rentabilização das TIC no processo de aprendizagem dos alunos, mas de forma consubstanciada em ferramentas específicas. O rápido desenvolvimento das ferramentas Web 2.0 e a passagem da Internet de meio de transmissão de informação para plataforma de colaboração, transformação, criação/partilha de conteúdos (Downes, 2005), alterou a forma como se acede à informação/conhecimento e os processos de comunicação aluno-aluno e aluno-professor (Siemens, 2008). O modelo tradicional centrado no docente esbate-se dando lugar a abordagens caracterizadas por abertura, participação e colaboração (Downes, 2008). Com a Internet, os alunos têm que assumir um papel ativo pois há um inúmero conjunto de opções que são chamados a assumir, desde a escolha de temas a percursos a seguir. página
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Em contexto de EVT, também o professor pode utilizar variados recursos para os auxiliar na abordagem aos conteúdos e áreas de exploração do currículo, ajudando os alunos a desenvolver competências essenciais e motivá-los para as atividades a realizar. Walling (2000) salienta que os computadores ligados à Internet na sala de aula de arte enriquecem as experiências no domínio das artes visuais, um valioso recurso para o professor. A perspetiva de integração das TIC em contexto educativo é reforçada pelo surgimento de recursos Web, Web 2.0 e software livre, novos estímulos à aprendizagem de conceitos ligados à expressão plástica, educação artística e EVT. A prática docente deverá ser revista, adotando uma filosofia de cultivo dos modos de expressão, acentuando a importância do ensino de variadas técnicas e meios de expressão (Rocha, 1999, p. 46), que reconheça que o media fundamental de expressão, nas salas de aula, deixou de ser constituído apenas por materiais impressos. É nesta perspetiva de integração das TIC em contexto de EVT que reside este estudo. Permitindo a disciplina uma multiplicidade de estratégias para a abordagem dos conteúdos em várias áreas de exploração, a integração destas ferramentas revela-se excecional no domínio da expressão, criatividade, trabalho colaborativo e multiplicidade/diversidade de aprendizagens proporcionadas. 4. Metodologia No paradigma investigativo da Investigação-Ação escolhemos as modalidades Prática e Crítica. Considerámos esta opção a mais adequada, uma vez que, ao introduzir as ferramentas digitais no currículo da disciplina de EVT, trabalhando com uma equipa de professores e seus alunos, nas suas turmas, verificando o sucesso de implementação dessas ferramentas e respondendo às nossas questões investigativas (Zuber-Skerritt, 1996), proporemos uma revisão curricular que inclua estas ferramentas. Os professores participantes no estudo assumem uma relação de cooperação com o professor-investigador, ajudando-o a planificar estratégias de mudança ou a detetar problemas e refletir sobre o impacto das mudanças efetivadas (Sousa et al., 2008).
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A opção por este modelo, articulado com a modalidade emancipadora ou crítica de investigação-ação, justifica-se pela necessidade de ir além da ação pedagógica, procurando intervir nos procedimentos de transformação do sistema. Este tipo de investigação-ação procurará viabilizar a implementação de soluções para a melhoria da ação e prática educativa em contexto de EVT. Dos pressupostos a que nos propusemos com este plano de investigação, a opção por uma investigação-ação crítica segue um ciclo de colaboração entre participantes e investigadores (reflexão planeamento - ação - observação -nova reflexão - novo planeamento) e assim por diante (Davis, 2008), de características colaborativas, incluindo vários professores interessados na abordagem e exploração de ferramentas digitais com os seus alunos em EVT. Para a investigação em curso utilizámos três tipos de técnicas de recolha de dados: Observação - centrada na perspetiva do investigador; Conversação - centrada na perspetiva dos participantes, enquadrando-se num ambiente de diálogo, colaboração e interação; Análise documental - à semelhança da observação, também se centra no investigador, mas implica uma atividade de pesquisa e leitura de documentos escritos que se constituem como fonte de informação. Relativamente às técnicas baseadas na observação, o investigador não adotará uma postura participante, mas serão recolhidos os dados da observação participante dos professores envolvidos no estudo. As notas serão importantes pela sua flexibilidade e adaptação constantes, enquanto que o diário de investigação servirá para recolher observações, reflexões, interpretações, hipóteses de explicação de situações ocorridas. Será também dado grande relevo às técnicas baseadas na conversação, sendo que utilizaremos a entrevista. A Técnica de Grupo Nominal (em que a componente escrita é designada por Técnica de Delphi) terá a vantagem de não exigir a presença simultânea, num mesmo local, de todos os intervenientes, mas poderá acrescentar significativamente o trabalho do líder da equipa, no sentido de orientação e condução das atividades. Assim, esta técnica desenvolver-se-á em três fases: A análise de documentos, quer se trate de documentos oficiais – artigos de jornais e revistas, registos de organismos públicos, legislação, horários, atas de reuniões, planificações, registos de avaliação, ofícios, manuais, fichas de trabalho, enunciados de exames, etc. – ou pessoais – diários, anotações pessoais, trocas de mensagens –, são de grande importância em qualquer tipo de investigação, Por um lado, porque os documentos se constituem como fonte de informação relevante. Por outro, os documentos pessoais, quando utilizados na I-A, são fontes valiosas de registos nar8
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rativos de experiências e pormenores muitas vezes não considerados importantes numa primeira análise. Ao constituírem-se, também, como diários, fornecem dados sobre a experiência pessoal, permitindo a recolha de reflexões sobre acontecimentos em contexto de sala de aula, de uma forma regular e continuada. Para se perceber melhor as diversas fases do estudo, observe-se o quadro 1. MOMENTOS DE IMPLEMENTAÇÃO DO ESTUDO
QUESTÕES INVESTIGATIVAS e OBJETIVOS DO ESTUDO
INSTRUMENTOS
- Quais as ferramentas da Web, Web 2.0 e software livre que se podem integrar em contexto de EVT para a abordagem dos conteúdos e áreas de exploração desta disciplina? - Quais as principais vantagens e desvantagens da integração destas ferramentas em contexto de EVT?
- Análise documental e exploração em contexto de formação, pelos professores e investigador. Recensão, listagem e categorização das ferramentas digitais. - Análise e discussão em grupo de trabalho, através de entrevistas e após a implementação da fase experimental do estudo.
- Segunda fase de aplicação, entre Janeiro e Junho de 2011.
- Que posicionamento têm os alunos e professores (investigadores participantes) perante a integração sustentada destas ferramentas no seu quotidiano escolar?
- Avaliação de todas as ferramentas digitais listadas, a partir das grelhas de avaliação de software educativo (adaptadas do SACAUSEF) e avaliação descritiva em contexto – aplicação de algumas ferramentas, para validação, em contexto de EVT.
- Terceira fase, entre Julho de 2011 e Junho de 2012.
- Que alterações curriculares e ao nível da - Análise documental e entrevistas aos profesformação de professores devem ser feitas sores colaboradores no estudo e análise dos para a integração efetiva destas ferramentas inquéritos realizados. digitais em contexto de EVT? - Resultados obtidos, decorrente da avaliação - Saber que ferramentas suportadas pela Web, de todas as ferramentas listadas. Web 2.0 e software livre podem integrar o currículo da disciplina de EVT; - A partir dos dados obtidos da implementação do estudo em contexto de sala de aula, - Reconhecer quais as principais vantagens e com avaliação descritiva, em contexto. desvantagens da integração destas ferramentas em contexto de EVT; - A partir dos dados obtidos através do inquérito por questionário realizado pelos alu- Inferir do posicionamento e posturas dos nos das diversas turmas. alunos perante a integração curricular das ferramentas digitais em EVT; - Decorrente da análise de conteúdo e análise documental fornecida e das entrevistas reali- Saber quais as alterações curriculares a zadas aos docentes colaboradores no estudo. perspetivar para a revisão curricular de EVT, para integração das ferramentas digitais: que - Análise global para proposta final, com inconteúdos e áreas de exploração podem inte- clusão das ferramentas digitais no currículo e grar ferramentas digitais e; possíveis alterações a efetuar a vários níveis no ensino da EVT e formação de professo- Perspetivar modelos de formação de pro- res. fessores para colmatar lacunas na formação contínua e adequar novos modelos de ensino e aprendizagem suportados pelas ferramentas digitais.
- Primeira fase: no ano letivo 2009/2010. (Paralelamente, criação de uma comunidade online para partilha e divulgação das ferramentas e publicação de manuais)
Quadro 1 – Fases da Investigação página
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5. Desenvolvimento do Projeto O espaço do EVTdigital tem um ano de implementação e, até ao momento, congregando um grupo de trabalho com colaboradores, docentes da disciplina de EVT, foram analisadas e selecionadas cerca de quatrocentas ferramentas digitais passíveis de ser utilizadas em contexto de EVT. Decorrente das propostas apresentadas e para disseminação deste projeto, criámos então o EVTdigital, onde regularmente fazemos a divulgação das ferramentas digitais consideradas pertinentes para explorar em EVT, dando apoio a todos os docentes que o pretendam. Também elaborámos manuais e guias de apoio à utilização dessas ferramentas. Assim, temos já publicados 268 manuais e contamos até Julho de 2010 ter mais de 300 que serão publicados, por categorias, em formato de e-book. A escolha do formato para publicação destes manuais foi discutida com todos os professores participantes no estudo. Apesar de existirem propostas para a realização dos manuais em suporte multimédia, com tutoriais (vídeo) e outras funcionalidades, optámos, pelo menos nesta fase, pela solução mais simples que seria a utilização do processador de texto pois era a ferramenta que reunia maior consenso e, também facilidade de utilização por parte de todos os professores. As perspetivas de evolução futura apontam para a possibilidade de adaptação desses manuais (pelo menos os das ferramentas com maior utilização) para outro suporte multimédia. No decorrer do ano letivo 2010/2011 implementaremos a segunda fase do estudo em que será solicitada aos docentes a utilização destas ferramentas em contexto educativo de EVT e apresentação de resultados de aplicação das mesmas através do preenchimento de um questionário próprio. Esta fase será alargada a todos os docentes de EVT que queiram participar, não obstante o grupo de trabalho constituído já ter aplicado muitas das ferramentas no presente ano letivo, nomeadamente para aferir da sua importância e aplicabilidade em contexto. 6. Resultados Provisórios A experiência no terreno diz-nos que, numa abordagem didática e metodológica centrada na resolução de problemas, os alunos desta faixa etária conseguem aprendizagens visivelmente mais importantes quando há uma contextualização dos conteúdos programáticos da disciplina aplicados às ferramentas digitais. A pluralidade de situações e a possível inter e pluridisciplinaridade das temáticas permite aos alunos o exercício de uma flexibilidade cognitiva importante, preparando-os para um reforço da autonomia e aplicação dos conhecimentos adquiridos em novas situações/ problemas. Este estudo permitirá, no final, aferir este aspeto quanto à 10
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aprendizagem dos diversos conteúdos e áreas de exploração da disciplina de EVT, não só utilizando um suporte “tradicional”, mas a integração efetiva de várias ferramentas digitais. Apesar de ainda nos encontrarmos numa fase intermédia de implementação do estudo, podemos considerar que os primeiros resultados que obtivemos, decorrentes da aplicação de muitas das ferramentas digitais selecionadas pelo grupo de docentes colaboradores, é extremamente positiva. As entrevistas realizadas e a análise efetuada da interação dos alunos com as ferramentas, a motivação dos alunos e a utilização articulada de dois suportes em EVT (o “tradicional” e o digital), levaram mesmo a não restringir o acesso a quaisquer ferramentas que fossem consideradas importantes, mesmo que dentro de uma mesma categoria. Extremamente positivo é o facto do EVTdigital, construído num princípio de disseminação do estudo, receber regularmente propostas para intervir em workshops, oficinas e seminários em várias Escolas, facto que nos deixa muito entusiasmados com possíveis resultados futuros. Acrescente-se que em pouco mais de um ano o EVTdigital ultrapassou já os 52 mil acessos. A utilização das TIC como ferramenta e recurso na sala de aula é entendida no CNEB como uma área transversal. Os alunos, na sua aprendizagem, devem contactar por formas diversificadas com estes recursos. O professor, e página
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neste caso o de EVT, deverá, nas suas planificações, englobar estratégias conducentes à rentabilização das TIC no processo de aprendizagem e formação geral dos alunos, mas, na nossa opinião, neste momento já de forma consubstanciada em ferramentas específicas para a abordagem de conteúdos e áreas de exploração próprias da disciplina. Acreditamos que o EVTdigital e o trabalho que até agora foi desenvolvido tem contribuído para uma nova forma de abordar a disciplina e, sobretudo, para diversificar estratégias e aplicar novas práticas letivas com recurso às TIC. 7. Perspetivas de Evolução No final desta investigação, deveremos saber concretamente se as ferramentas Web, Web 2.0 e software livre facilitam e promovem a aprendizagem de diversos conteúdos programáticos e áreas de exploração em contexto educativo de EVT e de que modo esta investigação contribuiu para integrar de forma sustentada estas ferramentas digitais no currículo da disciplina. Deveremos ainda saber e afirmar com clareza quais as ferramentas da Web, Web 2.0 e software livre que se devem propor para integrar em contexto curricular de EVT para a abordagem dos conteúdos e áreas de exploração desta disciplina, enunciando as suas principais vantagens e qual o posicionamento dos alunos e professores perante a integração sustentada destas ferramentas no seu quotidiano escolar. Por fim, não queremos ainda deixar de, com segurança, e a partir dos dados que se obtiverem da investigação, além de propor as alterações (revisões) curriculares e programáticas de EVT, perspetivar qual (e que tipo) de formação de professores deve ser feita para a integração efetiva destas ferramentas digitais em contexto de EVT. Neste momento, salienta-se ainda a importância de saber como os alunos trabalham com ambos os suportes em contexto de EVT e como interagem com os suportes e ferramentas digitais, perspetivando-se novas abordagens didáticas neste domínio do conhecimento. Futuramente será de todo importante perceber até que ponto e de que forma os intervenientes neste estudo poderão contribuir para uma nova perspetiva didática da EVT.
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8. Referências DAVIS, C.S. (2008). Critical Action Research. The Sage Encyclopedia of Qualitative Research Methods. SAGE Publications. Consultado em 10 Abril 2009 em http://www.sage-ereference.com/research/Article_n78. html DEB. (2001). Currículo Nacional do Ensino Básico: Competências Essenciais. Lisboa: DEB – Ministério da Educação. DOWNES, S. (2005). An introduction to Connective Knowledge. Stephen’s Web. Consultado em 21 Junho 2009 em http://www.downes. ca/cgi-bin/page.cgi?post=33034 DOWNES, S. (2008). The Future of Online Learning: Ten Years On. Half an Hour blog. Consultado em 29 Junho 2009 em http://halfanhour.blogspot.com/2008/11/future-of-onlinelearning-ten-years-on_16.html Resolução do Conselho de Ministros n.º 137/2007 de 18 de Setembro. Diário da República n.º 180 – 1ª série. Ministério da Educação. Lisboa. ROCHA, M. (1999). Educação em Arte: Conceitos e Fundamentos. InFormar, 12, 46-49. RODRIGUES, J.A. (2005). Brinquedos Ópticos e Animatrope em contexto de EVT, (Tese de Mestrado). Aveiro: Universidade de Aveiro. SIEMENS, G. (2008). Collective or Connective Inteligence. Connectivism blog. Consultado em 12 Junho 2009 em http://connectivism.ca/ blog/2008/02/ SOUSA, A., DIAS, A., BESSA, F., FERREIRA, M. e VIEIRA, S. (2008). Investigação-Acção: metodologia preferencial nas práticas educativas. Consultado em 1 Abril 2009 em http://faadsaze.googlepages.com/Investigao-Aco_faadsaze.pdf WALLING, D.R. (2000). Rethinking How Art Is Taught - A Critical Convergence. California: Corwin Press. ZUBER-SKERRITT, O. (1996). New Directions in Action Research. Falmer Press London. Consultado em 1 Abril 2009 em http://www.questia. com/PM.qst?a=o&d=103466421
“O texto deste artigo respeita a grafia estabelecida pelo acordo ortográfico” 12
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Formação de professores numa dimensão reflexiva
Paulo Fernandes paulopof@gmail.com
Resumo Vários estudos sobre a formação de professores têm vindo a valorizar a importância de uma dimensão reflexiva, como forma de desenvolver a consciencialização da acção docente, para uma sucessiva construção da identidade profissional. A escola actual supõe saber enfrentar e resolver problemáticas cada vez mais complexas e uma prática reflexiva pode ajudar o professor a superar desculpas vazias e externas. Porque os saberes desta profissão não estão só nos livros, há que aliar a parte teórica à parte vivencial através de uma reflexão das e sobre as práticas, que ajude o professor a reajustar-se e a construir uma prática pedagógica consciente e objectiva. Propõe-se deste modo a escrita de um diário, como instrumento de pesquisa e desenvolvimento profissional, na medida em que possibilita um distanciamento sobre as acções e a oportunidade de uma prática reflexiva. Palavras Chave: Formação de professores; professor reflexivo, diário de aula. 1. Formação de professores: Inicial e Contínua
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Este artigo corresponde ao capítulo I do Relatório de Mestrado em Ensino de Artes Visuais, apresentado em 2010 na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação e Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, intitulado “A Visita de Estudo como estratégia possível para a promoção de aprendizagens significativas em Artes Visuais”. página
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“Todo o professor do ensino fundamental pode ser – deve ser – um pesquisador sobre seu próprio ensino. Alguém que questiona permanentemente os saberes que ensina. Alguém que escapa ao mesmo tempo, à preguiça expositiva e ao enquistamento repetitivo. Formar-se, em formação inicial e continuada, não significa outra coisa: pesquisar, construir, analisar, confrontar, com colegas e com especialistas, situações de aprendizagem” (Meirieu, 2006:44) A construção e o desenvolvimento da identidade profissional do professor começam na sua formação. É aí que se poderão reunir uma série de competências para o exercício desta
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função ou a afirmação do que é específico na acção docente, tais como o conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valores. Nóvoa (1992) afirma que é na formação que se produz a profissão docente e que esta pode desempenhar um papel importante na configuração de uma ‘nova’ profissionalidade docente. Perrenoud (2002) defende a formação como um propulsor para elevar o nível de competência da profissão, aumentando os saberes científicos e pedagógicos e o savoir-faire2, podendo também transformar a identidade do professor e sua relação com o saber, com a aprendizagem, com os programas; a sua visão da cooperação e o seu juízo ético. Deste modo a formação desenvolve no professor um conjunto de saberes teóricos, metodológicos e saberes de acção que concedem ao profissional autoridade e autonomia na sua profissão. A formação de professores tem assim um papel fundamental para desempenho profissional. Seja ela na formação inicial, que dá as bases para o seu exercício, mas sobretudo numa formação contínua que permite o preenchimento de lacunas deixadas pela formação inicial, bem como um alargamento e actualização de conceitos. É neste sentido que afirmo a imprescindibilidade de uma movimentação permanentemente inquieta, de envolvimento e investimento pessoal numa formação continuada em saberes científicos e pedagógicos, que permitam ao professor dar respostas adequadas às mutáveis exigências do avanço natural dos tempos.
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O “savoir-faire” referido por Perrenoud, refere-se não a um saber fazer numa tradução directa, mas a “uma disposição interiorizada, construída, por vezes laboriosamente, que nos dá o domínio prático da acção” (2002:85).
A Lei de Bases do Sistema Educativo Português (lei n. 46/86 de 14 de Outubro, alterada pela lei 49/2005 de 30 de Agosto) define a formação de professores como um dos vectores fundamentais da educação que se quer em Portugal, conferindo no seu texto uma formação contínua “que complemente e actualize a formação inicial numa perspectiva de educação permanente”. No artigo 38º da mesma Lei, totalmente destinado à formação contínua, reconhece-se a todos os educadores, professores e outros profissionais da educação o direito à formação contínua, de modo a assegurar o complemento, aprofundamento e actualização de conhecimentos e de competências profissionais. Refere-se ainda que essa formação deve ser assegurada predominantemente pelas respectivas instituições de formação inicial, neste caso em escolas do ensino superior. O Decreto-lei n.º 344/89 de 11 de Outubro, que estabelece o ordenamento jurídico da formação de professores dos Ensinos Básico e Secundário, refere no seu artigo 25º que a formação contínua constitui um direito e um dever dos professores visando promover a actualização e aperfeiçoamento da actividade profissional, bem como a investigação aplicada e 14
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a divulgação da inovação educacional, definindo em seguida (artigo 26º, nº1) os objectivos fundamentais: a) Melhorar a competência profissional dos docentes nos vários domínios da sua actividade; b) Incentivar os docentes a participar activamente na inovação educacional e na melhoria da qualidade da educação e do ensino; c) Adquirir novas competências relativas à especialização exigida pela diferenciação e modernização do sistema educativo. Também neste artigo mas no ponto 4 podemos ler que “a formação contínua constitui ainda condição de progressão na carreira”, transformando-a assim num dever que remete mais para um procedimento de secretaria do que um dever ético e de uma vontade implícita. Situação esta que tem transformado e artificializado a formação contínua num processo burocrático, com acções de formação que têm como único fim o amealhar de créditos para a respectiva subida de escalão e o correspondente aumento de ordenado. Pede-se assim uma formação continuada que saia desses moldes, que emane de uma vontade para um projecto pedagógico próprio, ligado à construção da sua identidade profissional e vinculado a uma efectiva construção de saberes profissionais.
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2. A dimensão reflexiva na formação do professor “A reflexão é, na actualidade, o conceito mais utilizado por investigadores, formadores de professores e educadores diversos, para se referirem às novas tendências da formação de professores. A sua popularidade é tão grande que se torna difícil encontrar referências escritas sobre propostas de formação de professores que, de algum modo, não incluam este conceito como elemento estruturador” (Garcia, in Nóvoa 1992:59) Nas últimas décadas, tem sobressaído um modelo de formação de professores assente numa forte dimensão reflexiva, que segundo Nóvoa (1992:25) estimula uma perspectiva crítico-reflexiva, fornece aos professores os meios de um pensamento autónomo e facilita as dinâmicas de auto-formação participada, assumindo os professores como produtores da sua profissão. Surge portanto o paradigma do professor reflexivo como o professor preparado para reflectir e para “assumir uma responsabilidade política e ética” (Perrenoud, 2002:54), de forma desenvolver principalmente o saber-analisar. O termo reflexão aponta para um pensamento atento e distante da acção, que nos remete para alguém que pretende rever, equacionar e melhorar a sua acção. Esta perspectiva é defendida a partir de fins do século XIX por Dewey, ligando-a à educação, em que sugere um ensino reflexivo, através de um exame activo, persistente e cuidadoso que questione as acções produzidas à luz dos fundamentos que as sustentam e das conclusões para que tendem. Donald Schön situou a reflexão a partir da análise e interpretação da própria prática do professor, propondo e distinguindo os conceitos de “reflexão na acção”, “reflexão sobre a acção” e “reflexão sobre a reflexão na acção”, defendendo que a reflexão acontece num processo dialogante entre as convicções e as acções. A “reflexão-na-acção” ocorre durante a prática manifestando-se no saber fazer, enquanto que a “reflexão sobre a acção” ocorre num momento posterior à
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prática onde se consciencializa o conhecimento que já se trazia, se procuram as falsas convicções e se reformula o pensamento. Sugere ainda a “reflexão sobre a reflexão na acção”, que situa no olhar retrospectivo da acção, reflectindo sobre a reflexão feita no momento da acção, considerando já os contextos em que ocorreram. Schon poderá ter sido o primeiro a destacar o conhecimento específico que o professor constrói através da sua própria prática. Referindo-se às competências profissionais circunscritas a um cenário específico, incerto e de conflito, conduzido e formalizado pela própria prática sendo sempre pessoal e implícito. Compreendemos assim que a reflexão levada a cabo pelo professor durante e após as suas práticas, conduzem-no à produção de um conhecimento específico que não poderá ser aprendido através dos livros. Trata-se do conhecimento próprio e específico da profissão, que agrega os conhecimentos disciplinares ou científicos, aos conhecimentos pedagógicos, juntando a estes o conhecimento profissional que é feito na prática, na experiência e na reflexão sobre elas. Esta reflexão sobre a prática permite ver uma perspectiva dos professores como profissionais produtores de saber e de saber-fazer, pelo que se constitui como um elemento fundamental para a sua autonomia e para o seu desenvolvimento profissional, deslocando a formação de um ponto de vista excessivamente centrado nas dimensões académicas para um outro direccionado para o terreno profissional. O professor reflexivo é aquele que pensa as suas práticas e que adopta mecanismos que estimulem essa reflexão. Perrenoud (2002) propõe a análise das práticas como um dispositivo que estimule a prática reflexiva no professor defendendo que ao analisar as práticas, o professor enfrenta o desafio para a interpretação das mesmas, implicando uma explicação e um envolvimento num sentido de racionalização. E recorre a René Barbier para definir as práticas como saberes de acção, ou seja, as práticas não são simples adaptações dos conhecimentos às realidades e aos contextos, mas antes um meio de reaprender de outra forma e de assimilar os conhecimentos anteriores através da sua mobilização na acção. Acima de tudo, o profissional reflexivo deve ser capaz de controlar a sua evolução, construindo competências e saberes novos ou mais profundos a partir das suas aquisições e da sua experiência. Mas só o facto de ter passado por êxitos e fracassos não chega. Na verdade, o quotidiano de qualquer pessoa é preenchido por pensamentos e reflexões constantes e a realidade do professor não é excepção. Po16
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der-se-ia então dizer que o professor, como qualquer outro ser humano, é naturalmente reflexivo, não necessitando desta prática ser impulsionada pela formação de professores. Porém é preciso alertar para a diferença entre uma reflexão normal, que qualquer um de nós faz como seres racionais e ponderados, da dimensão reflexiva que se pretende para o professor, argumentando que este só se torna reflexivo se adoptar uma atitude diferente e consciente. Uma verdadeira dimensão reflexiva implica uma prática reflexiva que só acontece quando o professor adopta uma postura reflexiva permanente, sempre inscrita numa relação analítica de conversação com a acção. Uma prática que envolve um questionamento constante, persistente e atento, ponderando as consequências das práticas adoptadas. A adopção de uma postura reflexiva leva por isso o professor a uma “(re) construção permanente de uma identidade pessoal” (Nóvoa,1992:25) constituindo-se como “um meio para uma mudança pessoal” (Perrenoud, 2002:121). Não existe porém um método que nos permita sistematizar essa prática reflexiva, aquilo que Perrenoud (2002) apelida de ”ilusão metodológica”, ou seja, a ideia falsa de que poderá existir um conjunto de procedimentos determinados e regras de método, as quais permitiriam uma elaboração controlada desta prática. Embora se procure resolver problemas através página
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de uma análise holística da situação, requer-se também uma parte intuitiva e emocional por parte do professor. O ensino não é uma prática exclusivamente de pesquisa, na medida em que é exercida em condições de tomadas de decisão em curtos espaços de tempo e o valor do saber é medido mais pela sua eficácia pragmática do que pela coerência teórica. Assim a principal regulação da prática docente provém da reflexão do próprio profissional, desde que ele seja capaz de propor questões, de aprender a partir da experiência, de inovar, observar, ajustar progressivamente sua acção às reacções previsíveis dos outros. O profissional reflexivo é alguém que analisa regularmente as suas acções, sendo a reflexão uma expressão da sua consciência profissional. Ele reflecte sobre a sua relação com o saber e o saber-fazer próprios da sua profissão; sobre os intervenientes no processo de aprendizagem; sobre as relações de poder que se estabelecem na sua profissão; sobre a escola e as instituições com quem lida; sobre o tempo e o espaço em que estas relações estão a acontecer; e sobre a sua forma de superar limites ou de se tornar mais eficaz. Um outro aspecto importante é que o professor ao reflectir as suas práticas aceita fazer parte do problema. Porque uma análise das práticas não anda à procura de culpas ou desculpas para os fracassos ou insucessos. O que importa é uma problematização da situação, que o leve a novos entendimentos, possibilitando no futuro novas estratégias de acção. Um professor que não abraça esta vertente reflexiva sobre o ensino, corre o risco de actuar de acordo com uma rotina, aceitando uma realidade instituída com soluções definidas por outros, ao invés de procurar soluções próprias, de acordo com as suas convicções, experiência, imagens e valores, num processo contínuo de investigação-acção. Uma vertente reflexiva que não pode ser solitária. Deve ser realizada em conjunto com os pares e com os formadores, porque o diálogo e o trabalho em equipa é fundamental para consolidar saberes emergentes da prática profissional e que rompa com o isolamento do professor. A reflexão tem vindo, como vimos, a ser defendida como uma forma do professor desenvolver a sua autonomia, den-
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tro de uma consciência e de um conhecimento profissional, que lhe permite tomadas de decisão, assumindo a sua total profissionalidade. Paralelamente, esta dimensão reflexiva só faz sentido se ela incidir sobre uma análise das práticas por parte do próprio professor, num processo de conversação permanente, emancipando-se profissionalmente, que o faça sair das rotinas, dentro de um processo de investigação-acção. Porque o professor reflexivo preocupa-se não só com a matéria que tem de ensinar aos alunos, mas também na forma como os alunos aprendem, obriga-se a criar condições para que as aprendizagens aconteçam. Ao reflectirem sobre as práticas, os professores desencadeiam novas formas de pensar, de compreender e de agir, conquistando maior lucidez sobre elas. Uma reflexão sobre a prática é sempre superior à simples ocorrência, porque proporciona oportunidades para o seu desenvolvimento até uma consciencialização sobre o que é ser professor. 3. O diário de aula como instrumento de reflexão A arte (do professor) é ter como referência a experiência para depois sair desse âmbito, afastar-se progressivamente do “muro das lamentações” ou da simpatia recíproca, construindo conceitos e saberes partindo das situações e das práticas relatadas. Perrenoud, 2002:180 Da necessidade dos programas de formação de professores adoptarem uma concepção de formação baseada numa dimensão reflexiva indissociável da acção dos professores, sugere-se o diário de aula como instrumento que promova uma capacidade destes reflectirem sobre a sua prática. “Certamente sua capacidade de penetração nos campos subjectivos e individuais, a função de empowerment metodológico que exerce sobre os professores (…), sua elasticidade e sua fácil complementação com outras técnicas o transformam em um instrumento útil e eficaz no processo de formação dos professores”. (Zabalza 2004:14). Os diários de aula são definidos por Zabalza (2004:13) (ver também Holly, in Nóvoa, 1992) como documentos em que os professores anotam as suas impressões sobre o que vai acontecendo nas suas aulas, defendendo que não tendo que ser uma escrita diária, deve pelo menos manter uma linha de continuidade na sua redacção. Além de que as informações reco18
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lhidas não se devem cingir ao espaço físico da sala de aula, alargando-se a outros âmbitos da actividade docente e a outros espaços de aprendizagem. Escrever um diário é como travar um diálogo connosco, um meio de expressão de vivências e emoções, uma forma de descarregar tensões internas acumuladas. Com ele racionaliza-se a vivência ao escrevê-la, associando à escrita a actividade reflectiva, e o que tinha uma natureza emocional passa a ter, a partir desse ponto, uma natureza cognitiva. Permite também visualizar situações que frequentemente se encontram ocultas à percepção quando se está envolvido nas acções quotidianas e preserva a memória dos factos de uma distorção que o tempo inevitavelmente introduz. Com o diário consegue-se facilmente perceber aquilo que os professores pensam durante o processo de planificação e operacionalização do seu trabalho. Desta forma e perante as informações recolhidas no diário, podemos racionalizar sobre tudo o que é descrito, reconstituindo mentalmente a actividade, conferindo-lhe em seguida um sentido. Assim, constituiu-se facilmente como um recurso de reflexão e lucidez profissional, pois reconstrói a experiência, dando a possibilidade de distanciamento e análise, podendo posteriormente partilhá-la e analisála juntamente com os seus pares. Um recurso para chegar aos dilemas práticos da profissão, para avaliar e reajustar processos didácticos e por isso contribuir para um desenvolvimento página
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profissional permanente, através de um comportamento auto-analítico. A leitura do conteúdo do diário facilita a construção de uma percepção mais fiel e completa da sua acção. Porém essa escrita deve ultrapassar o simples relato do acontecimento, completando-a com uma análise das causas que o motivaram, bem como das suas consequências. Deste modo, uma escrita sobre as suas acções é um recurso que permite aos professores transformarem-se em investigadores de si próprios, exercendo uma verdadeira prática reflectiva, pois ao escrever ganha-se consciência sobre elas. Este processo contribui para aquilo que Zabalza (2004) denomina de uma espécie de “círculo de melhoria” que possibilita a revisão e melhoria da nossa actividade como professores. Que consciencializa os professores através de uma análise da informação até à previsão da necessidade de mudanças, a experimentação de mudanças e a consolidação de um novo estilo pessoal de actuação. Iniciando-se a partir deste ponto, um novo ciclo. Referências Lei de Bases do Sistema Educativo: lei n. 46/86 de 14 de Outubro, alterada pela lei 49/2005 de 30 de Agosto. Decreto-Lei n.344/89 de 11 de Outubro, que estabelece o ordenamento jurídico da formação de professores dos ensinos básico e secundário MEIRIEU, Philippe (2006). Carta a um jovem professor. Trad. Fátima Murad. Artmed, Porto Alegre. NÓVOA, António (org.) (1991). Profissão Professor. Porto Editora. NÓVOA, António (Org.) (1992). Os professores e sua formação. Dom Quixote, Lisboa. PERRENOUD, Philippe (2002). A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: Profissionalização e razão pedagógicas; Trad. Cláudia Schiling. Artmed Editora. Porto Alegre. ZABALZA, Miguel A. (2004). Diários de Aula: um instrumento de pesquisa e desenvolvimento profissional. Trad. Ernani Rosa. Artmed, Porto Alegre.
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EVTux: : uma distribuição de Linux para a disciplina de EVT
José Alberto Rodrigues jarodrigues@ua.pt António Moreira moreira@ua.pt
Resumo O EVTux é uma distribuição de Linux que tem por base o trabalho de investigação que desenvolvemos sobre a integração de ferramentas digitais na disciplina de Educação Visual e Tecnológica, intitulado “Ferramentas Web, Web 2.0 e Software Livre em EVT”. Após quinze meses de estudo e desenvolvimento do projecto com um grupo de cerca de cinquenta colaboradores, todos docentes desta disciplina, recensearam-se quase quatrocentas ferramentas digitais passíveis de integração em contexto de Educação Visual e Tecnológica. Dessa listagem surgiu a posterior catalogação e categorização das ferramentas, tendo em conta os conteúdos e áreas de exploração da disciplina. O EVTux tem pré instaladas todas as aplicações para Linux bem como integradas no browser as ferramentas digitais que não necessitam de instalação e correm directamente a partir da Web, para além dos mais de trezentos manuais de apoio à utilização dessas ferramentas. Disponível em dual boot ou versão live, o EVTux constitui-se como um poderoso recurso que agrega todo o trabalho do EVTdigital, podendo ser uma ferramenta de eleição para os docentes desta disciplina utilizarem em contexto de sala de aula. Palavras-chave: Currículo, Educação, Educação Visual e Tecnológica, EVTdigital, EVTux.
Abstract EVTux is a Linux distribution that is based on the research work we have developed regarding the integration of digital tools in the disciplinary area of Visual Arts and Technology Education, titled “Web, Web 2.0 Tools and Free Software in EVT”. After fifteen months of study and project development carried out by a group of around fifty collaborators, all teachers of this curricular subject, nearly four hundred digital tools that can be used in the context of Visual Arts and Technology Education were listed. On completion of the listing, cataloging and categorization of the tools was conducted taking into consideration the contents and explora1 Projecto financiado pela Fundação tion areas of the subject area. para a Ciência e a Tecnologia (SFRH/ BD/66530/2009), co-financiado pelo EVTux offers all the applications for Linux already preinstalled. The Fundo Social Europeu (FSE). digital tools that require no installation and run directly from the Web 20
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are also integrated in the browser. In addition, there are more than three hundred manuals for assistance in the use of these tools. Available in dual boot or live version, EVTux presents itself as a powerful resource that aggregates all the work of EVTdigital and may become the tool of reference for teachers of this curricular area for use in the context of their classrooms. Keywords: Curriculum, Education, Visual Arts and Technology Education, EVTdigital, EVTux. Introdução Decorrente da investigação que actualmente desenvolvemos no âmbito do Programa Doutoral em Multimédia em Educação da Universidade de Aveiro intitulado “Ferramentas Web, Web 2.0 e Software Livre em EVT”, foram recenseadas e catalogadas cerca de quatrocentas ferramentas digitais passíveis de utilização em contexto de Educação Visual e Tecnológica (EVT), disciplina do 2º Ciclo do Ensino Básico, para abordagem dos diversos conteúdos e áreas de exploração da mesma, integrados em múltiplas Unidades de Trabalho desenvolvidas pelos professores com os seus alunos. O trabalho desenvolvido no âmbito desta investigação e disseminado através do espaço da Internet que é o EVTdigital permitiu a concepção de novos rumos e perspectivas sobre este trabalho. A concepção desta dispágina
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tribuição alicerça-se no princípio de que as Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) devem ocupar cada vez mais um lugar de grande relevo e particular destaque como contributo para o processo de ensino e aprendizagem. Contudo, deveremos, como professores e educadores, ter um certo cuidado na selecção e utilização desses recursos, não caindo no erro de os utilizar indistintamente e para qualquer situação em contexto lectivo. Com o EVTux e como a análise e selecção dessas ferramentas deve ser criteriosa, poderá esta distribuição ser usada como uma mais-valia e não como um mero recurso adicional que não se revelará relevante para as aprendizagens. Incluem-se no presente estudo as ferramentas que nesta primeira década do século XXI têm surgido, decorrentes da Web e Web 2.0 e, ainda, na aposta cada vez maior no software livre e/ou gratuito. Com a criação do EVTux propomo-nos compilar uma distribuição live ou dual boot que pudesse catalogar, organizar e criar as condições necessárias para que os docentes de EVT possam, com grande assertividade, utilizar as ferramentas mais adequadas para determinada necessidade ou problema a resolver, com os seus alunos, na sala de aula.
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Finalidades e Objectivos A principal finalidade do EVTux será promover e facilitar o uso das ferramentas digitais na disciplina de EVT. Agregando numa distribuição baseada em Linux a maioria das ferramentas listadas neste estudo e com potencial pedagógico para utilização em contexto de EVT, permitirá promover a selecção das ferramentas mais adequadas a cada contexto de ensino e facilitará a aprendizagem de diversos conteúdos programáticos e áreas de exploração em contexto educativo de EVT. Como objectivos fundamentais do EVTux temos: • Facilitar a análise e selecção das ferramentas digitais a explorar em contexto de EVT; • Agregar numa distribuição livre todas as ferramentas e recursos digitais para a disciplina de EVT; • Permitir a criação de um recurso simplificado da utilização das TIC nesta disciplina; • Disseminar pelos professores e alunos uma distribuição livre que possibilite a exploração de recursos digitais gratuitos para a disciplina de EVT; • Fomentar uma cultura ética e de responsabilidade para a utilização de recursos livres ou gratuitos em detrimento de software proprietário, muitas vezes demasiado caro.
DVD da distribuição do EVTux
Enquadramento Teórico A criação do EVTux nasceu fruto da necessidade de agregar num só “espaço” todas as ferramentas que foram primeiramente analisadas e catalogadas no estudo que desenvolvemos e, posteriormente, disseminadas através do EVTdigital. No entanto, surgiu a necessidade de ir um pouco mais além e congregar (e agregar) todas estas ferramentas num suporte acessível, gratuito e de fácil utilização quer por alunos quer por professores. Porque a disciplina de EVT é diferente das restantes disciplinas do Currículo Nacional do Ensino Básico (CNEB) e porque a abordagem de problemas diversos, por vários professores, em várias turmas, é o mote das aprendizagens, se a isso integrarmos e aliarmos as ferramentas Web, Web 2.0 e Software livre para a abordagem dos conteúdos e áreas de exploração da disciplina, podemos constituir uma mais-valia num mundo digital e para a aprendizagem dos alunos. A utilização dos suportes tradicionais da disciplina articulados com ferramentas digitais é mais enriquecedora e significativa, tanto pela natureza da disciplina e riqueza da multiplicidade de aprendizagens, como pela diversificação de experiências e prazer da descoberta (Rodrigues, 2005). Julgamos pertinente e 22
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fundamental defender uma utilização conjugada e articulada destes dois suportes e, para tal, o EVTux poderá proporcionar essa facilitação no que à utilização das ferramentas digitais diz respeito. O contributo fundamental do EVTux na EVT é a utilização das TIC como recurso/estratégia cognitiva de aprendizagem. A utilização das TIC como ferramenta/recurso na sala de aula é entendida como área transversal. Os alunos devem contactar com estes recursos por formas diversificadas. O professor de EVT deverá englobar estratégias conducentes à rentabilização das TIC no processo de aprendizagem dos alunos, mas de forma consubstanciada em ferramentas específicas que, no caso desta distribuição, facilitará a análise e selecção das ferramentas mais adequadas a cada contexto específico. Também o rápido desenvolvimento das ferramentas Web 2.0 e a passagem da Internet de meio de transmissão de informação para plataforma de colaboração, transformação, criação/partilha de conteúdos (Downes, 2005), alterou a forma como se acede à informação/conhecimento e os processos de comunicação aluno-aluno e aluno-professor (Siemens, 2008). A isso não podemos ficar alheios e, sabemos pela prática, enquanto professores, que facilmente os recursos e as ferramentas digitais sofrem alterações permanentes, tendo o professor dificuldade em acompanhar essa evolução e, com mais dificuldade ainda, página
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ter acesso a uma listagem de recursos passíveis de serem utilizados e a manuais que suportem a sua utilização. O EVTux tenta colmatar esta dificuldade e pode mesmo dar lugar ao esbatimento de um modelo tradicional centrado no docente dando lugar a abordagens caracterizadas por abertura, participação e colaboração (Downes, 2008). Com a Internet, os alunos assumem também um papel mais activo pois há um inúmero conjunto de opções que são chamados a assumir, desde a escolha de temas a percursos a seguir. Neste caso, também a capacidade de seleccionar no EVTux a ferramenta mais adequada para um determinado trabalho ou para um determinado fim. Em contexto de EVT, também o professor pode utilizar variados recursos para auxiliar na abordagem aos conteúdos e áreas de exploração do currículo, ajudando os alunos a desenvolver competências essenciais e motivá-los para as actividades a realizar, uma das premissas que norteou a elaboração do EVTux. Walling (2000) salienta mesmo que os computadores ligados à Internet na sala de aula de arte enriquecem as experiências no domínio das artes visuais, um valioso recurso para o professor. A perspectiva de integração das TIC em contexto educativo é reforçada pelo surgimento de recursos Web, Web 2.0 e software livre, novos estímulos à aprendizagem de conceitos ligados à expressão plástica, educação artística e EVT. É nesta perspectiva de integração das TIC em contexto de EVT que reside este estudo, a génese do EVTux. Permitindo a disciplina uma multiplicidade de estratégias para a abordagem dos conteúdos em várias áreas de exploração, a integração destas ferramentas revela-se excepcional no domínio da expressão, criatividade, trabalho colaborativo e multiplicidade/diversidade de aprendizagens proporcionadas que agora podem ser simplificadas com o EVTux. Metodologia Ao longo de quinze meses de desenvolvimento da investigação sobre “Ferramentas Web, Web 2.0 e Software livre em EVT”, mais de cinquenta docentes desta disciplina participaram no estudo, quer pesquisando, quer analisando, reflectindo e recenseando as ferramentas digitais existentes que
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pudessem ser integradas num contexto de ensino e aprendizagem para a disciplina de EVT. Ferramentas essas que, em determinados contextos, pudessem servir de apoio aos docentes e alunos para a abordagem a múltiplos conteúdos e áreas de exploração da disciplina. A partir da listagem das quase quatro centenas de ferramentas digitais nasceu a problemática centrada no campo da sua utilização simplificada e, no caso, que pudesse ser de fácil utilização por cada professor de EVT. Neste contexto, surgiu a ideia da concepção de uma distribuição de Linux à qual chamámos EVTux, baseada em Ubuntu e que poderá ser instalada em qualquer computador em dual boot ou correr em modo live (sem necessidade de instalação), permitindo a qualquer utilizador ter uma distribuição que tenha já pré instaladas todas as ferramentas digitais baseadas em software para sistema operativo Linux e, nos marcadores do browser da Internet utilizado nessa distribuição, o acesso directo a ferramentas digitais online a partir da catalogação previamente realizada no espaço do EVTdigital.
Ficha Técnica do EVTux
Desenvolvimento do Projecto Conceptualmente, depois de listadas todas as ferramentas digitais, aquelas que eram baseadas em software livre para Linux foram pré instaladas e todas as baseadas na web e web 2.0 foram adicionadas aos marcadores do browser seleccionado para esta distribuição, divididas nestas 35 categorias: 3D, Animação, Apresentações, Arquitectura e Espaços, Avatares e Caricaturas, Banda desenhada e Cartoons/Comics, CAD, Caleidoscópios, Cartazes, Colagens, Construções, Desenho, Desenho colaborativo online, Desenho de figura humana, Desenho e Ilustração, Desenho e twitter, Desenho vectorial, Edição vídeo, Fotografia e edição de imagem, Geometria, Graffitis, Impressão, Logótipos, Luz/Cor, Módulos e padrões, Mecanismos, memórias descritivas e cronologias, Museus, Origami e kirigami, Paginação, Paper toys e automatas, Pintura, Storyboards, Suites, Tipografia e fontes. Prevê-se já para o ano lectivo de 2011/2012 que os docentes da disciplina de Educação Visual e Tecnológica – mas também outros docentes e públicos – possam ter acesso a partir do EVTux a uma distribuição que incluirá, sem grande esforço de pesquisa, cerca de 400 ferramentas digitais e respectivos manuais de utilização, potenciando-se e simplificandose assim a utilização das ferramentas digitais para esta área curricular específica.
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Estado de desenvolvimento O protótipo do EVTux está em desenvolvimento e previsivelmente deverá estar concluído em Março de 2011 para se iniciarem os primeiros testes, esperando-se que a versão final seja apresentada publicamente no mês de Maio de 2011, após o que será disponibilizado online para download e lançada uma edição em DVD. Conclusões O EVTux permitirá a qualquer utilizador aceder a qualquer ferramenta catalogada no âmbito do estudo que desenvolvemos de forma prática e simples, constituindo uma mais-valia especialmente relevante na simplificação de acesso a estas ferramentas, incluindo-se também a possibilidade de visualização imediata dos quase trezentos manuais já publicados e incluídos nesta distribuição. Estamos certos de que esta estratégia permitirá disseminar o conceito de
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software livre e de utilização de recursos digitais baseados no conceito de gratuitidade e, principalmente, facilitar a pesquisa, análise e selecção das ferramentas mais adequadas a cada contexto específico decorrente das situações de ensino e aprendizagem na disciplina de EVT. Referências Bibliográficas Downes, S. (2005). An introduction to Connective Knowledge. Stephen’s Web. Acedido em Junho, 21, 2009, de http:// www.downes.ca/cgi-bin/page.cgi?post=33034 Downes, S. (2008). The Future of Online Learning: Ten Years On. Half an Hour blog. Acedido em Junho, 29, 2009, de http://halfanhour.blogspot.com/2008/11/future-of-onlinelearning-ten-years-on_16.html Rocha, M. (1999). Educação em Arte: Conceitos e Fundamentos. InFormar, 12, 46-49. Rodrigues, J.A. (2005). Brinquedos Ópticos e Animatrope em contexto de EVT, (Tese de Mestrado). Aveiro: Universidade de Aveiro. Siemens, G. (2008). Collective or Connective Inteligence. Connectivism blog. Acedido em Junho, 12, 2009, de http:// connectivism.ca/blog/2008/02/ Walling, D.R. (2000). Rethinking How Art Is Taught - A Critical Convergence. California: Corwin Press.
Colecção Carrocel: 1 um caso de ilustração feita por crianças e para crianças
João Caetano joao.caetano@ua.pt
Resumo Partindo de um projecto pioneiro para a definição de um novo conceito de ficção literária destinada aos mais novos, este artigo propõe-se realizar um breve enquadramento histórico sobre a didáctica do desenho nas escolas portuguesas nessa altura, destacando a importância da educação artística no desenvolvimento do potencial criativo das crianças. Já na segunda metade do século passado este projecto foi precursor de um avanço decisivo, quer do ponto de vista literário quer artístico. Palavras-chave: Literatura infantil, Ilustração, Desenho, Linguagem gráfica, Expressão plástica, Educação criadora. 1. A Colecção Carrocel surgiu nos primeiros anos da década de 60 do século passado, pela mão e o génio de dois vultos maiores das letras e das artes ligados ao ensino e à literatura para as crianças: Lília da Fonseca (1916-1991) e M. Calvet de Magalhães (1913-1974). Este projecto, cujos propósitos se encontram expressos no preâmbulo de abertura aos livros da Série Corrente, na “Explicação aos pais, à crítica e aos educadores”2, procura desde logo trazer à reflexão questões prementes e de grande actualidade, relacionadas com a literatura para a infância e a importância da expressão plástica na formação geral dos mais jovens. Para estes dois pedagogos, a ficção literária destinada à infância e juventude encontrava-se num impasse e era preciso dar-lhe um novo rumo. A que existia mantinha-se dividida entre duas vertentes que não podiam oferecer soluções de futuro: uma, porque continuava a repisar os modelos temáticos dos grandes autores clássicos (com o inevitável risco de esvaziamento criativo que isso acarretava) e outra, porque se rendera ao consumo de um produto considerado de menor valor literário – a banda desenhada – e que chegava em doses maciças do outro lado do Atlântico3. Tornava-se claro para ambos que “nem uma nem outra espécie de literatura servem a educação” e a presente iniciativa editorial, concebida “sob a égide dos princípios da Associação Portuguesa para a Educação pela Arte”, tomara exactamente a dimensão educativa dos livros infanto-juvenis como um valor supremo que devia ser defendido por todos os meios. Persistir na adopção de modelos temáticos que escapavam à actualidade 26
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(e, de certo modo, também à realidade) parecia ser tão nocivo quanto ceder à tentação dos produtos que traziam o rótulo do pronto a consumir e da falta de qualidade. Que fazer então? Na opinião destes autores, afigura-se uma saída possível: focar a atenção nos dados do presente, na ciência, na tecnologia, na vida social, trazendo esses elementos para o centro das preocupações temáticas de escritores e artistas, de forma a que o maravilhoso e o poético pudessem voltar a habitar o coração de uma literatura cuja finalidade deveria ser a promoção da paz, da igualdade e da fraternidade entre os homens. O conteúdo temático parecia ter sido encontrado, conforme se depreende ainda das suas palavras: “Das épocas transactas poderemos, sim, contar-lhe a história do homem contra os elementos, contra a ignorância, contra as prepotências, contra a escravidão, para que de etapa em etapa, de descoberta em descoberta, de triunfo em triunfo, tivesse podido dar a volta a um botão e fazer luz, dar a volta a outro e trazer através do espaço o som e a imagem, tivesse podido acender estrelas, criar satélites artificiais, ver a outra face da lua; contar-lhe as possibilidades dos novos tempos em que a guerra é condenada como uma ignomínia para que mais alto se acenda a estrela página
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do amor e beleza que fará dos homens os novos semideuses de um mundo de paz, de igualdade cívica, de fraternidade e compreensão humana. A gesta de poesia e de sonho dos tempos modernos e que cabe muito no novo conceito do maravilhoso para a ficção dos contos para as crianças.” Questões relacionadas com uma certa realidade social, de cariz predominantemente rural, aparecem implícitas logo nos primeiros números da “Série Corrente”. No conto O clube das três aldeias, domina a problemática da falta de escolas no interior rural, enquanto em Nasceu um menino numa floresta é a dimensão religiosa e o plano dos valores morais (o não ser vaidoso, o nunca mentir, etc) que prevalecem em toda a narrativa. A dimensão lúdica da brincadeira e a valorização do trabalho são outros aspectos explorados nestes textos, com especial ênfase no conto O Grande Acontecimento. O teatro e a poesia também inspiraram alguns títulos da colecção. No entanto, foi a série A - “Histórias de Animais” da autoria de Lília da Fonseca, aquela que maior popularidade alcançou (figura 1), tendo sido publicados nesse segmento pelo menos oito títulos, alguns dos quais com ilustrações dos alunos da Escola Técnica Elementar Francisco Arruda, em Lisboa4.
Figura 1- Capa e ilustração de O livro da Mariazinha, colecção Histórias de Animais.
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De facto, se já existia um corpo temático suficientemente consistente para se dar início à colecção, faltava ainda encontrar a “roupagem estética” mais adequada para o vestir. É aqui que entra o potencial de artista e de professor de Calvet de Magalhães (cujo espírito sensível e metódico fez escola) e não apenas durante os dezoito anos em que esteve à frente dos destinos da referida instituição5. A solução parecia estar naquilo que o professor que mais prezava e que melhor conhecia: o talento dos seus alunos. Como vimos, muitos destes livrinhos foram ilustrados pelos alunos da escola, um ou outro por outro ilustrador ou pelo próprio Calvet de Magalhães. Não será errado dizer que essa tarefa deve ter acontecido num ambiente de grande liberdade criativa mas que nunca dispensou o rigor na execução nem a disciplina de trabalho. Efectivamente, o sentido crítico e de responsabilidade eram valores que o professor procurava incutir nos seus alunos. Um desses seus alunos ainda hoje recorda: “Era uma das preocupações de Calvet de Magalhães: dar voz às crianças, obrigá-las a tomar posição crítica em relação ao mundo, despertar-lhes a curiosidade intelectual.”6 Esta ideia em defesa dos valores do empenho e do desenvolvimento artístico e pessoal, encontramo-la, ainda, no final do já citado texto de apresentação da colecção: “Cingida aos objectivos de renovação e arejamento da literatura de ficção para crianças que a Colecção Carrocel ambiciona atingir, temos a disposição de fortalecer e encorajar o desenvolvimento da educação artística e criadora da expressão plástica infantil.” A presença do real e do imaginário é uma marca distintiva da Colecção Carrocel. As duas dimensões interligam-se, não significando com isso nenhuma perturbação discursiva entre ambas nem a perda de “estatura” de uma em relação a outra. As histórias fluem entre o quotidiano palpável e um certo universo de fantasia, como acontece em Os companheiros do Bonifácio, em que uma série de animais são convidados a entrar num diálogo em pé de igualdade com os humanos. Mas são as ilustrações que melhor combinam esses dois mundos. A combinação de cores (normalmente duas, concordantes ou dissonantes) que se altera à medida que o livro avança e o recurso a composições muito variadas, são elementos formais que ajudam a abrir o espaço do imaginário no interior destes contos. Veremos seguidamente alguns recursos formais e técnicos que nos ajudam o diálogo entre o real e o fantástico, responsável por um claro tom de modernidade estética que perpassa neste projecto. Em primeiro lugar, o invulgar formato quadrado dos livros da “Série Corrente”, cujas capas apa28
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recem divididas horizontalmente a meio, em duas faixas portanto: uma, colorida, recebe a ilustração; a outra, com fundo branco a estender-se pela contracapa, é destinada ao título, ao nome do autor e, na contracapa, ao logótipo e relação de obras da colecção. A técnica usada nos desenhos é também pouco usual na dita “ilustração adulta”, mas muito comum nos exercícios de expressão plástica que se fazem, especialmente, nos primeiros anos da escola: a linogravura.7 Nesta técnica, a imagem é obtida por meio do uso de goivas que escavam linhas (o desenho) sobre uma superfície sintética mais ou menos rígida. Nas partes escavadas não entra a tinta, que apenas se espalha com um rolo na parte lisa da superfície plana. Uma cartolina colorida recebe essa tinta por força da pressão exercida sobre a placa de linóleo. Assim, a cor de fundo da imagem provém da tinta usada na placa e a cor das linhas do desenho não é senão a cor do papel usado. A possibilidade de jogar com as cores é muito variada e depende da gama de tintas para linóleo e das cartolinas usadas. Nalguns destes desenhos podemos ver combinações de diferentes tons da mesma cor ou cores de intensidade aproximada (figura 2) ou, pelo contrário, o uso de duas cores muito contrastantes (figura 3). A aparência de largas pinceladas é um efeito visual que resulta do escavar da goiva sobre o suporte, recordando-nos o trabalho dos expressionistas do “Der página
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Brücke” ou certas composições de Matisse, onde o espaço tridimensional (natural) tende a esbater-se sobre o plano bidimensional (pictórico).
Figura 2 – O tambor da paz, p.31
Figura 3 – Os companheiros do Bonifácio, p.23
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A ambiguidade visual que se obtém com este tipo de técnica deriva não apenas da justaposição de cores que possuem diferentes valores cromáticos (enquanto umas dão a sensação de se afastarem, outras comportam-se de modo inverso), mas também da supressão da perspectiva real ou pela alteração das relações de escala entre os objectos representados (figura 4). Deste modo, a imagem torna-se ambígua e colide com os nossos padrões de percepção tornando a sua leitura mais difícil. É a tradicional questão da forma (que se aproxima) e do fundo (que se afasta). No espaço tridimensional/ real, sabemos distinguir esses dois campos, mas no espaço bidimensional/plástico torna-se difícil saber qual é um e qual é outro; o que está mais perto e o que está mais distante.
Figura 4 – Os companheiros do Bonifácio, p.35
No entanto, isso surge naturalmente no desenho infantil. A criança está habituada a lidar com um espaço de representação flutuante e que se espalha mais de cima para baixo do que de trás para a frente. Basta então que ela retire uma linha por baixo dos pés duma figura para que essa figura fique solta num espaço e pouco nos diga da distância a que nos encontramos dela. Ou basta alterar a posição relativa ou o tamanho de certas figuras para que se chegue a igual indefinição. 30
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Toda esta fonte de recursos é explorada nos desenhos que fazem parte desta colecção de livros e que, como o próprio Calvet de Magalhães nos lembra, são obra de crianças e não de ilustradores: “Quando se utilizam desenhos de crianças para ilustrar contos não se pretende fazer das crianças ilustradoras de livros mas de fortalecer e encorajar o desenvolvimento da educação artística, a capacidade criadora da expressão plástica infantil. (…) São pois desenhos infantis aproveitados para enriquecer livros e não crianças feitas ilustradoras de livros.”8 Mais do que uma aproximação fiel ao texto e aos elementos do mundo real nele contidos – representação de animais, de casas, paisagens, condições climáticas as ilustrações valem enquanto objectos autónomos, cujo conteúdo discorre segundo uma narrativa própria. De facto, não estamos à espera de reconhecer em todas as imagens as peripécias que perpassam ao longo da narrativa textual. Exceptuando o conto O tesouro das ilhas selvagens de Manuela de Azevedo9, em que as legendas colocadas ao lado das ilustrações procuram esclarecer do conteúdo das mesmas, o valor da imagem neste projecto deve ser tomado como um valor em si mesmo, tanpágina
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to mais importante quanto se trata de um projecto escolar desenvolvido por crianças entre os onze e os treze anos. Só por isso, vale a pena enaltecer as qualidades pedagógicas e artísticas da iniciativa. 2.
Há muito que a questão da criatividade e da expressão criadora das crianças é matéria de estudo de especialistas e pedagogos. Bastará lembrar os contributos inultrapassáveis de Arno Stern no domínio da valorização da expressão livre e da educação artística10. De acordo com este autor, o trabalho desenvolvido pela criança em contexto de completa liberdade de expressão deve ser incondicionalmente apoiado, pois tal prática “não leva a um primitivismo artificial (…), mas desenvolve o que há de mais humano em cada ser”(1978:142). Neste sentido, as formas de expressão que na criança se manifestam sempre de uma maneira genuína e espontânea, devem ser estimuladas sem reservas nem constrangimentos. Curiosamente, encontramos fortes elos de ligação entre a liberdade de expressão das crianças e certas inovações operadas nas artes plásticas, a partir das primeiras décadas do século XX11. Mas o projecto editorial sobre o qual incide o nosso estudo, resulta não só do potencial criativo das crianças nele envolvidas, mas também da orientação técnica e artística do professor Calvet de Magalhães e do ensino do desenho em contexto escolar. As ilustrações que estas crianças fizeram para os livros da Colecção Carrocel são o resultado das aulas e estão intimamente ligadas a essa realidade. Por essa razão especial, gostaríamos de referir ainda que, duma forma sucinta, o trajecto histórico que tem seguido o ensino do desenho nas escolas portuguesas. Aproveitando os sucessivos ajustes e reajustes que foram feitos nos programas oficiais de desenho, pelo menos desde 1929 , com implicações tanto no ensino
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primário como no ciclo preparatório, Calvet de Magalhães pôs em prática um método de ensino que se apoiava precisamente no primado da expressão livre. Para Calvet de Magalhães, o aluno devia expressar-se livremente sujeitando-se o menos possível ao crivo do professor, a quem competia apenas a tarefa de o ajudar no sentido de este superar momentos de hesitação. O objectivo da educação criadora devia ser, pois, o de levar as crianças pelos caminhos da arte, dotá-las de gosto estético e fazer com que elas sejam “capazes de dar expressão à sua vida moral.” Em Calvet, como em Stern, esse objectivo só podia ser alcançado se o professor fosse capaz de despertar nas crianças as faculdades criadoras que lhes são inatas, levando-as a florescer gradualmente. Ora, todo este ideário cabia inteiramente no conceito de “desenho livre”, mas esta rubrica só muito tarde entra nos programas de desenho com real eficácia. No Compêndio de Desenho para o Ciclo Preparatório do Ensino Técnico, de Rogério de Andrade, o “desenho livre” surge com a designação “desenho subjectivo espontâneo”, rubrica que no referido manual antecede o “desenho objectivo interpretativo” . Mas no início da década de 40, o ensino da disciplina de desenho continuava a apoiar-se em dois pilares que se manterão inabaláveis nas décadas seguintes: “o desenho linear” e o “desenho rigoroso”. Em termos práticos, o aluno devia dominar o primeiro tópico para alcançar o segundo. Na sala de aula, os modelos que serviam de base à representação eram normalmente os sólidos geométricos que vinham desenhados no livro e o tempo dado ao desenho à vista a partir do real era muito residual. Imperava a exigência da cópia primorosa e da representação fidedigna daqueles modelos bidimensionais. O que se considerava “desenho livre” ficava de facto para quando se estava livre para desenhar à vontade, ou seja, em casa ou fora das horas escolares. No entanto, o desenho começava a ser entendido como uma “linguagem gráfica” autónoma, que precedia a escrita, embora com ela tenha estabelecido muitas formas de cumplicidade – basta pensar nos exercícios de caligrafia. Por outro lado, a criança começava a experimentar na escola outras formas de expressão que também incluem na sua génese a componente gestual: a mímica, a modelação, o teatro e a dança. Muitas destas dimensões estão contidas no pro32
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jecto do Colecção Carrocel, uma vez que aí coabitaram harmoniosamente áreas tão distintas como a ficção, a poesia, a ilustração, a expressão plástica e mesmo o teatro. Em 1952, o Ministério de Educação Nacional estabelecia um conjunto de linhas orientadoras destinadas ao ensino nas Escolas Técnicas e Profissionais, o que trouxe implicações muito positivas no ensino das disciplinas práticas, nomeadamente aquelas que tratam com a expressão artística. Naquelas normas, reconhecia-se a importância da articulação de saberes entre as diferentes disciplinas, em oposição a um modelo organizado de forma horizontal que transformava cada disciplina numa ilha onde o conhecimento se virava sobre si próprio e se movia em circuito fechado. Fixavase a ideia de que o ensino é mais do que um processo de assimilação de matérias dadas de forma avulsa e o verdadeiro objectivo da educação deve ser a integração (e projecção) do indivíduo no social. A criança não é um mero receptáculo de informação que se vai enchendo com o tempo e à vez, mas um agente activo dentro de um meio igualmente sujeito a alterações permanentes. A sabedoria, o equilíbrio pessoal, a autopágina
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realização, o gosto estético, são domínios afectos aos fins últimos da educação. Fala-se então a uma só voz em conhecimento, sentimento e expressão, sendo que esta última dimensão parece muitas vezes surgir para testar e validar das outras duas. Talvez possamos pensar assim a propósito desta singular colecção de livros ilustrados para a infância e juventude. Por fim, uma nota de satisfação por sabermos que iniciativas desta natureza não foram abandonadas e que projectos novos continuam a ser implementados num esforço concertado entre Escolas e diversos organismos, públicos e privados. Casos bem sucedidos como a edição de As fadas, de Antero de Quental, com ilustrações de alunos das Escolas E.B. 2/3 de Vila do Conde ou a colecção De Mão em Mão, do Agrupamento de Escolas de Milheiros de Poiares, que desde 2005 publica anualmente um livro ilustrado por alunos e ilustradores convidados, fazem-nos acreditar que, de facto, os desenhos que repousam em todos estes livrinhos ilustrados continuam a ser, tal como dizia o saudoso Calvet de Magalhães, “ milagres da infância, que Deus inscreveu na palma da mão de cada um.” Bibliografia
ABRANTES, António de Almeida (1964). O Ensino Activo e a Prática do Desenho, Cadernos de Divulgação Didáctica, nº3, Publicações Imbondeiro, Sá da Bandeira, Angola, (1964). ABREU, Maria Helena P.; MIRANDA, F. Pessegueiro (n.d.). Compêndio de Desenho para o 2º ciclo dos liceus, Porto Editora, Lda, Porto, (n.d.). ABREU, Rodolfo A. (1960). Em defesa do desenho expressivo da criança, Edição do autor, distribuído pela Livraria Divulgação, Porto, (1960). BASTOS, Glória (1999). Literatura infantil e juvenil, Universidade Aberta, Lisboa, 1999.
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BRITO, José (Org.) (1999). Da literatura popular à literatura infantil, C.F.C.F (Centro de Formação Concelhio do Fundão), 1999. COUTO, João (1951). Serviço de Educação Artística, Instituto para a Alta Cultura, Lisboa, 1951. LIMA, Fernando C. Pires (n.d.). 15 contos que nunca ouviste, Edições Sousa & Almeida, Porto, (n.d.). MAGALHÃES, M. M. Calvet de (1960). Educação pela Arte, obra publicada pela Direcção da International Society for Education Through Art (INSEA), Lisboa, 1960. PEREIRA, José (1935). O desenho infantil e o ensino do desenho na escola primária, Obra subsidiada pela Junta de Educação Nacional, Imprensa Nacional, Lisboa, 1935. STERN. A. (1978). Iniciação à educação criadora. Socicultur - Divulgação Cultural, Lda, Lisboa, 1978. 1
Projecto financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (SFRH/BD/61086/2009), co-financiado pelo Fundo Social Europeu (FSE). 2
Esta pequena advertência surge isolada na página da direita (normalmente reservada ao frontispício), o que nos diz da importância deste texto introdutório. 3
Nunca será demais lembrar que à luz da política cultural do Estado Novo, então em plena expansão interna mas fortemente criticado no exterior, este género de cultura de massas, de feição urbana e popular, devia ser indefectivelmente combatida. 4 Nomeadamente, O livro da Stelinha, O livro do Adelininho e O Livro da Mariazinha, respectivamente, os números II, IV e V. Neste último (e só neste) são mencionados os nomes dos quatro alunos que realizaram os desenhos. Curioso notar que alguns livros da “Série Corrente” referem terem sido ilustrados por alunas e não por alunos, como é o caso de O clube das três aldeias, Nasceu um menino na floresta, O grande acontecimento e O tambor da paz. 5
Calvet exerceu as funções de Director na referida escola entre 1956 e 1974, ano da sua morte. Nessa instituição, instigou gerações inteiras de alunos a desenvolveram as suas capacidades no domínio da criação plástica e da sensibilidade estética. 6
In Coisas terríveis que acontecem no país dos brandos costumes, publicado no blogue “Combustões”, em 15 de Outubro de 2010. 7 Processo de gravura através da utilização de uma placa de linóleo, goivas, rolos e outros acessórios. Neste processo de gravação, a imagem obtida encontra-se invertida relativamente ao desenho inicial. 8
Nota final de Calvet de Magalhães em 15 contos que nunca ouviste…, ilustrado por alunos da Escola Técnica Francisco Arruda, Livraria Sousa & Almeida, Porto, n.d. 34
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O primeiro número da Série F - “Viagens aventurosas”, publicado em Dezembro de 1964. Junto à identificação dos alunos que ilustraram este livro é feito o seguinte esclarecimento: “As gravuras representam somente os temas escolhidos, pelos alunos, da leitura expressiva efectuada.” 10
Ou educação criadora, como ele próprio preferia chamar quando se referia ao trabalho das crianças nos ateliers de expressão livre. No seu entender, o potencial criador da criança antecede o impulso artístico, de que ela só terá consciência e domínio muito mais tarde, quando tiver passado por uma experiência estética mais profunda ou resultante de uma formação académica. Calvet de Magalhães segue uma linha de pensamento semelhante e lembra que são vários os estudos que “provam que a criança não tenta alcançar as qualidades artísticas, que aliás ignora.” (1960:5) 11
Neste período, a vida artística nas principais capitais europeias é um borbulhar constante de criatividade e experimentação, e os artistas parecem rendidos à vontade extrema (quase infantil) de romper com todos os formalismos e constrangimentos estéticos que dalguma forma pudessem cercear o seu furor criativo. Curiosamente, este gesto aproxima-se muito da pureza instintiva que caracteriza a atitude da criança em termos expressivos. 12
O decreto nº16730, de 13 de Abril de 1929 determina que o desenho passe a ser ensinado na 4ªclasse. Oito anos depois, o “desenho de ilustração” consta do programa da 3ª classe, conforme determina o decreto nº27603. Paralelamente, tem início nesse mesmo ano de escolaridade o ensino de modelação. O desenho torna-se, então, obrigatório nas escolas e objecto de exame no final do curso (decreto nº18413, de 2 de Junho de 1930), através de uma prova que consta do seguinte: “Cópia do natural, de um desenho simples”. 13 Rubricas indicadas no “Programa de desenho do ciclo preparatório”, publicado no Diário do Governo nº138, 1ª série, através do decreto nº36356, de 18/6/1947, que depois foi actualizado pelo decreto nº13800, de 12/1/1954. Além destas duas categorias, ainda havia o “desenho subjectivo decorativo”, o “desenho geométrico” e os “trabalhos manuais”. Com a chegada do livro único ainda no ano de 1954, o programa de desenho resume-se a três rubricas essenciais: “desenho à vista”, “composição decorativa” e “desenho geométrico”. 14 Esta terminologia surge pela primeira vez no decreto nº27603, de 1937. Nele se estabelece que o desenho é um complemento da escrita e que só consegue desenhar bem quem desenhe muito, tal como só alcança um domínio apurado da escrita quem escreva muito.
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A validade da EVT nas práticas educativas e no contexto social do século XXI – Uma sinopse para a comunidade escolar
Ricardo Reis Pereira reisricard@gmail.com
Porque a vivência é um dever e o conhecimento artístico é um direito. Porque a pedagogia não pode ficar refém da economia. Porque a sociedade intercala os seus passos com alguma orfandade nos valores. Porque existem mitos sobre os jeitos. Porque a educação, nos seus diversos domínios, constitui um direito universal, que deve ser reconhecido pela sua importância no desenvolvimento da sociedade, no quebrar de barreiras e na obtenção do conhecimento teórico e prático... Este texto pretende mostrar a importância da EVT no percurso escolar das nossas crianças e jovens e o seu relevo na transmissão de competências pró-activas numa sociedade apelidada de consumo, globalizada, tecnológica e competitiva. O sistema de ensino e os planos na educação devem assentar numa resposta às necessidades actuais, num olhar de futuro e em permissas que contribuam para a plena, íntegra e efectiva formação de cidadãos detentores de conhecimentos que possibilitem a satisfação pessoal, a qualidade social e a evolução. A educação não pode apenas estar assente num discurso em que áreas, competências e conteúdos aparecem isolados e desprovidos de significados e em que o que realmente interessa são os números e as estatísticas. É preciso que a educação tenha qualidade, que propicie confiança, que traduza o esforço diário dos seus agentes e que seja o baluarte de uma sociedade democrática onde resida, sobretudo, a solidariedade e a competência. No sentido de uma escola exigente e com qualidade, a EVT desempenha um papel preponderante na educação integral nos domínios do saber, do saber ser e do saber fazer. Enquanto disciplina da área das expressões no currículo nacional do segundo ciclo do ensino básico, a EVT não é só “aquela aula em que se fazem desenhos”, é aquela onde se desenvolve a percepção. Não é uma disciplina menos importante, é uma disciplina nuclear para o conhecimento e para o desenvolvimento pessoal e social. É uma disciplina sem receitas, sem dias habituais, mas de saberes fulcrais. A EVT não é uma disciplina figurante nas escolas, é a personagem principal de um conjunto de medidas e práticas essenciais, onde podemos salientar a inclusão, o carácter oficinal (activo e prático) e a qualidade/dinâmica nos processos de aprendizagem e vivência para o desenvolvimento global do aluno. Como disciplina integradora de diferentes saberes, a sua versatilidade é sentida no espaço aula, o espaço da partida para a descoberta. O seu espírito de abertura prende-se com a planificação de actividades de acordo com as necessidades, aspirações 36
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e motivações dos alunos e da comunidade escolar. A sua génese foca a compreensão, participação e transformação do mundo que rodeia os alunos. Tratando-se de uma das disciplinas mais completas e atractivas ao longo do segundo ciclo do ensino básico, perspectiva o desenvolvimento de capacidades de forma equilibrada, o despertar da criatividade, a valorização do rigor e uma resposta real à vontade de conhecer, expressar e construir – desejos tão vincados nesta fase etária quanto necessários na contemporaneidade. Vivemos numa era de (r)evoluções humanas, sociais e tecnológicas que desenham e apagam – num ritmo competitivo e decidido - o espaço ambiental e social que habitamos. É precisamente preparada para o plano da mudança e da acção que a disciplina se estrutura, objectivando o reconhecimento do papel do aluno enquanto futuro agente modificador, criador e interventivo para uma vivência harmoniosa, crítica e responsável. Associados à mudança ou à necessidade de agir, os métodos usados no decorrer das actividades (método de resolução de problemas/método de projecto) surgem como pólo ordenador do conhecimento. A investigação, projectos e aplicação, por sua vez, surgem como base para o entendimento dos objectos/materiais (computador, ferramentas, máquinas, matéria-prima, brinquedos…) e imagens (televisão, fotografia, publicidade…) que povoam, respectivamente, página
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o quotidiano das palmas das mãos e do centro da retina dos alunos. Na essência da disciplina mora o reconhecimento de métodos de trabalho e projecto de objectos, utilizando diferentes técnicas e materiais, atendendo à tecnologia, à ciência e à arte, numa união entre o trabalho manual e intelectual. A importância da EVT situa-se também na capacidade de transportar sensações/experiências de aprendizagem para a racionalidade/compreensão – “Porque é assim? Fazer para quê? Pode ser de outra forma?”- Um espírito criativo, crítico e curioso, fundamental na sociedade actual. Ao criar, ao analisar, ao intervir, os alunos tornam-se mais conscientes das suas capacidades e dos limites, adquirem o contínuo exercício da construção de uma identidade sábia. A EVT é integradora de todas as disciplinas. Nela reside a promoção de actividades práticas com, designadamente: expressão pessoal e colectiva, contacto com arte, natureza e património, intervenção em espaços, experimentações técnicas, unidades de trabalho transversais (contributo fulcral para uma efectiva articulação disciplinar). Para as características específicas da disciplina - propiciadoras de um forte desenvolvimento nos domínios do rigor, segurança e competência prática - e para o ambiente didácticopedagógico, contribui a riqueza do regime de par pedagógico. Dois professores necessários para um acompanhamento frequente, atento e co-participativo na resolução dos problemas com os alunos, em aulas eminentemente práticas) fazem o acompanhamento frequentemente atento e individualizado
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de aulas eminentemente práticas. Uma docência colaborativa no recurso ao conhecimento, uso e aplicação de materiais, utensílios e ferramentas, cujo manuseamento requer conhecimentos específicos e cuidados redobrados. A partir de momentos onde prolifera uma aprendizagem equilibrada desencadeada pelo diálogo, a partilha e a aprendizagem cooperativa, resultam trabalhos práticos cujo objectivo é dado fundamentalmente ao processo de aprendizagem e que culminam em resultados materializados em aprendizagens significativas e em produtos. O processo de ensino-aprendizagem na tecnologia, sob a ciência ou para a arte, requer pensamento, esforço, método e empenho e não são um elitismo ou um universo fechado a jeitos ou dons. Os alunos são estimulados a pesquisar, a transformar, a conhecer, a avaliar, a recordar, a expressar, numa experiência para o conhecimento. Não se pretendem potenciar futuros artistas, mas sim, futuros cidadãos activos, críticos e com a consciência enraizada de valores para a conservação e valorização de espaços exteriores e de tempos interiores, isto é, da urbanidade, do património ou da natureza e do próprio ser humano – Que em dias de egoísmo, desestruturação e passividade, precisa reafirmar os valores da partilha, da união e da inovação. A pertinência dos campos sobre os quais a disciplina deposita (pre)ocupações é deveras coerente numa sociedade em constante mudança. O ambiente, a comunidade e o equipamento constituem terrenos prósperos no cultivo da exploração integrada de problemas estéticos, científicos e técnicos. Aprender a ver, a construir e a ser, não passa unicamente por adquirir habilidades de expressão pessoal, não passa por reproduzir algo estabelecido, mas acontece sim, através da compreensão das imagens do mundo (formas, cores, mensagens), do conhecimento histórico e cultural (património, humanidade), da obtenção de atitudes próprias e pró-activas perante os desafios e da construção de algo novo. A dinâmica desta disciplina é parte integrante da imagem da escola e na relação com a comunidade. É parte fundamental da educação patrimonial, cultural e artística subjacente ao mundo, ao país e, sobretudo, a cada realidade social local. A EVT representa um contributo inquestionável para a vida das escolas, quer nos projectos que desenvolve (comemorações, tradições, concursos, requalificação de espaços, dinâmicas com outras disciplinas, etc.), quer nas parcerias (orgãos autárquicos, museus, serviços educativos, empresas, etc.) ao promover o contacto com as artes, materiais e iniciativas. A escola não instrui somente para ler e escrever, contar e somar, conviver. A escola contribui para o desenvolvimento das múltiplas inteligências (lógico-matemática, linguística, interpessoal, visu38
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al-espacial, corporal, etc.) A alfabetização nas artes e na tecnologia (não entendida apenas pela era digital, equívoco actualmente generalizado) é uma necessidade e reveste-se da mesma importância de outras áreas do conhecimento. A aquisição de aprendizagens específicas nos domínios artístico e tecnológico é fundamental para relacionar e compreender épocas, identificar e usar instrumentos, apreciar e criticar manifestações culturais, projectar e produzir objectos, conhecer e aplicar ferramentas, construir. A escola tem um papel promotor, divulgador e instructor: proporcionar o conhecimento para as artes e para a tecnologia. São aprendizagens essenciais e nucleares. Por tudo isto, a Educação Visual e Tecnológica e o par pedagógico que a lecciona, proporcionam competências básicas nas áreas artística e tecnológica, com qualidade no ensino e nas aprendizagens, para que os nos-
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sos alunos/filhos/cidadãos possam, essencialmente: Adquirir a linguagem e o conhecimento específico das artes visuais e da tecnologia; Compreender e criticar as solicitações da sociedade de consumo; Desenvolver competências para a fruição, a criação e a intervenção nos aspectos visuais e tecnológicos do envolvimento; Desenvolver o exercício do pensamento/acção numa atitude, integrando o trabalho manual com o trabalho intelectual; Reflectir sobre as operações técnicas e explorações plásticas e compreender os fenómenos de transformação e criação; Estruturar os valores, os interesses e os comportamentos em função de uma atitude de abertura crítica, compreensiva e interveniente. Bibliografia DGEBS (1991 a). Organização Curricular e Programas do 2º Ciclo do Ensino Básico, Vol. I, Lisboa: Ministério da Educação. DGEBS (1991 b). Programa de Educação Visual e Tecnológica: Plano de Organização do Ensino-Aprendizagem, Vol. II, Lisboa: Ministério da Educação.
“Pintar a Cidadania” Projecto pedagógico com uma turma de 5º ano de escolaridade
Maria Flor Gomes gomesflor@gmail.com
Resumo Apresento o resultado de uma investigação / acção realizada na minha actividade profissional de professora de Educação Visual e Tecnológica na Escola EB2,3 de António Feijó em Ponte de Lima, que se intitulou Pintar a Cidadania. Escolhi para trabalhar com os meus alunos o tema Cidadania, por verificar que é um tema muito debatido actualmente, através dos meios de comunicação, no meio político e nas escolas. Acreditei que trabalhando este tema teoricamente nas aulas de Formação Cívica, poderia dar aos alunos, novos conhecimentos e conceitos dos valores e direitos humanos, a fim de os preparar para a parte criativa de pintura nas aulas de Educação Visual e Tecnológica (EVT). Os objectivos deste projecto foram de carácter pedagógico, uma vez que todos eles foram trabalhados ao longo das aulas. Utilizei também a minha experiência de pintora, para motivar os alunos e para eles se sentirem mais perto de uma realidade. A metodologia que adoptei para a realização deste trabalho foi uma investigação acção. A investigação – acção, foi desenvolvida com uma turma de 5º ano, com 22 alunos, crianças de 10 anos de idade, de nível sócio económico e social médio. Tive a oportunidade para analisar, o trabalho e o envolvimento das crianças ao longo do projecto. Observei como o conceito surgiu nas representações pictóricas das crianças. A sensibilização para o tema, foi através de imagens e textos. Outras formas também foram utilizadas, como leitura de jornais e revistas, pesquisa na internet, exercícios práticos e diálogos de partilha de experiências em sala de aula. Seguiram-se exercícios de desenho, de valores humanos ao estilo de cinco pintores contemporâneos e depois de seleccionado o preferido passou-se à pintura em tela com tinta acrílica. O resultado final, foi uma Exposição de 22 telas na Escola Superior de Educação de Viana do Castelo. Palavras chave: Cidadania, Interdisciplinaridade, Pintura e Valores Humanos. Abstract I present the result of an action research conducted in my occupation as a teacher of Visual and Technological Education in School EB2, 3 An40
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tónio Feijó in Ponte de Lima, which was titled Painting Citizenship. I chose to work with my students the theme of Citizenship, to see that is an issue much debated today by the media, the political environment and schools. Believed that this issue theoretically working for teaching Civics, could give students new knowledge and concepts of values and human rights in order to prepare them for the creative part of painting classes in Visual and Technological Education (EVT). The objectives of this project were educational in nature, since they were all worked during the lessons. Also used my experience as a painter, to motivate students and for them to feel closer to a reality. The methodology I adopted for this work was an investigation action. Research - Action, was developed with a group of 5th year with 22 students, children 10 years of age, socio economic and social medium. I had the opportunity to review the work and the involvement of children throughout the project. I watched how the concept originated in pictorial representations of the children. Awareness of the issue was through images and text. Other forms were also used, such as reading newspapers and magazines, internet research, practical exercises and dialogues to share experiences in the classroom. There followed years of design, human values to the style of five contemporary painters and after selecting the favorite went to the paint on canvas with acrylic paint. página
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The end result was an exhibition of 22 paintings in the School of Education of Viana do Castelo. Keywords: Citizenship, Interdisciplinary, Painting and Human Values. Introdução Este relatório apresenta a descrição do projecto “Pintar a Cidadania”, que foi realizado na Escola EB2,3 de António Feijó, Ponte de Lima, com uma turma do 5º ano, nas aulas de Formação Cívica, Área de Projecto, Educação Visual e Tecnológica e foi apresentado numa exposição na Escola Superior de Educação de Viana do Castelo, no dia 22 de Janeiro de 2010. Escolhi para trabalhar com os meus alunos o tema Cidadania, por verificar que é um tema muito falado na sociedade, através dos meios de comunicação, no meio político, nas escolas, etc… mas nem sempre os alunos percebem o que é exactamente este tema e o que nele está inerente. Senti que trabalhando este tema teoricamente nas aulas de Formação Cívica, poderia dar aos alunos, novos conhecimentos e conceitos dos valores e direitos humanos, a fim de os preparar para a parte criativa de pintura nas aulas de Educação Visual e Tecnológica. Nas aulas de Área de Projecto, foi feita a ponte entre Formação Cívica e EVT, trabalhando os valores humanos através da música visto que o Professor de Educação Musical foi o meu par pedagógico e aceitou o desafio de trabalhar o tema com a turma A grande motivação que encontrei, foi o entusiasmo dos Encarregados de Educação, quando no início do ano lectivo lhes apresentei o projecto e que aderiram e confiaram de imediato. A partir daí, todos os alunos se empenharam muito e foi uma experiência muito gratificante. O projecto foi na mesma altura apresentado ao Conselho de turma e este também aderiu ao projecto, tendo todos os professores participado na pintura de uma tela, assim como três professoras de Conselho de turma se voluntariaram a organizar uma visita solidária ao lar de idosos na época de Natal, levando gorros cachecóis e luvas para oferecer aos idosos. Os objectivos deste projecto foram de carácter pedagógico,
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uma vez que todos eles foram trabalhados ao longo das aulas. Utilizei a minha experiência de pintora e o meu trabalho pessoal de pintura, para motivar os alunos e para eles se sentirem mais perto de uma realidade. Descrição detalhada do Projecto: Objectivos: - Sensibilizar alunos, Encarregados de Educação e professores do Conselho de Turma, para trabalhar em conjunto no projecto; - Motivar os alunos para a investigação e pesquisa sobre os direitos humanos e valores humanos; - Fazer os alunos sentir, o que representam os valores, através de histórias de vida e exemplos das suas vivencias diárias; - Motivar os alunos para a investigação e pesquisa de cinco artistas contemporâneos; Envolvimento pessoal e artístico “Arte é a forma de transcendência do ser humano na terra, é por aí que se consegue a sublimação de cada um de nós e se atinge o máximo da expressão de cada um de nós”. ( Lúcio,L.2008). Esta frase de Laborinho Lúcio foi referida na apresentação do seu livro, Educação Arte e Cidadania em Paredes no mês de Maio de 2008. Concordando e considerando eu, que as Artes Visuais, são um meio de excelência, para o desenvolvimento integral do ser humano, usei a arte neste projecto para levar os alunos a melhor interiorizarem os conceitos de Cidadania e valores humanos. Para o desenvolvimento desta Unidade Didáctica com os alunos, e com a sugestão dos meus professores, resolvi usar a minha experiência pessoal artística de pintura, assim como os meus trabalhos, além de lhes apresentar outros pintores contemporâneos, sendo eles: Picasso, Miró, José de Guimarães e Paula Rego. Foram escolhidos estes artistas porque me pareceram os mais adequados para atingir os meus objectivos. Picasso escolhi-o por ser, um nome muito conhecido e pela variedade da sua obra, mas especialmente pela figuração cubista muito apreciada pelas crianças. A escolha de Miró teve a ver com a linguagem poética das formas e cores de um onírico quase infantil que é também muito apreciado nesta faixa etária. Quanto à escolha de José de Guimarães, foi por ser um pintor português, que ainda é vivo, que usa as figuras esquemáticas carregadas de simbologia e leva as crianças a imaginar. A escolha de Paula Rego foi também por ser portuguesa e ainda viva. A sua pintura narrativa realista, aborda histórias pessoais e da literatura 42
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infantil, que é sempre um mote para os alunos se entusiasmarem, assim como as suas imagens monstruosas, gordas, com corpos de animais que os levam a usar o seu imaginário, desenvolvendo também a sua criatividade. Considerei estas escolhas as mais indicadas, pois pela sua diversidade de estilos, poderiam contribuir para o aumento do reportório gráfico, plástico, criativo e histórico (história da arte) dos meus alunos. Cada artista foi apresentado aos alunos, através de Power Points, devidamente preparados, com a biografia e obra de cada artista. Foi para os alunos, uma surpresa muito grande, quando lhes apresentei o meu trabalho pessoal, nos mesmos moldes dos outros artistas e também um grande entusiasmo porque sentiram que estavam perto de uma pintora e o trabalho não seria assim tão difícil pois teriam o meu apoio. Além de serem apresentados aos alunos os artistas (pintores), foram trabalhados com eles muitos conceitos de valores humanos como: Solidariedade, Paz, Liberdade, Amizade, Amor, Tolerância, União entre os povos etc… levando os alunos a ilustrar esses valores ao estilo dos artistas. Seguindo os seguintes passos: - Distinguir as obras e os estilos dos artistas; - Desenhar ao estilo de cada artista os valores da Solidariedade, Paz, Liberdade, Amizade, Amor, Tolerância; União entre os povos, etc… página
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- Seleccionar o desenho que caracterizar melhor o artista e o valor; - Escrever o que representa a sua imagem e o que sentiu ao desenhar; - Reproduzir o desenho seleccionado para uma tela; - Pintar a tela com tinta acrílica, seguindo as instruções dadas pelos professores; - Cantar em público uma canção sobre Amizade intitulada “Amigos para sempre” Envolvência pedagógica em contexto escolar Este projecto teve uma grande envolvência pedagogia, uma vez que envolveu alunos, Encarregados de Educação e os professores do Conselho de Turma. Os Encarregados de Educação foram muito presentes ao longo de todo o processo de trabalho, manifestaram sempre curiosidade em saber resultados e em ajudar no que estivesse ao alcance deles, que neste caso foi mais a ajuda monetária para adquirir os materiais de pintura. Os professores do Conselho de turma, envolveramse no projecto, colaborando na pintura de uma tela, onde foram desenhadas figuras criadas pelos alunos ao estilo de cada artista. Ou seja, a tela dos professores teve trabalho também dos alunos. O professor de Educação Musical, nas aulas de Área de Projecto ensaiou a canção”Amigos para sempre” à turma, para apresentar na inauguração da exposição. As professoras de Língua Portuguesa, Inglês e História e Geografia de Portugal, organizaram uma visita a um lar de idosos, na época de Natal, para os alunos lhes oferecerem uma canção de Natal em Inglês, cachecóis, luvas e gorros. (figs.1, 2, 3 e 4).
Figura 1
Figura 2
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Figura 3
Figura 3
Calendarização das várias fases Este projecto iniciou no mês de Outubro de 2009, depois de ter sido apresentado ao Director da Escola EB2,3 de António Feijó, de Ponte de Lima, aos Encarregados de Educação e Conselho de Turma. Abriu nas aulas de Formação Cívica e Área de Projecto e a partir de Dezembro em Educação Visual e Tecnológica, tendo concluído em 20 de Janeiro de 2010 e tornado público em 22 de Janeiro de 2010 às 18h. Nos meses de Outubro e Novembro, foram apresentados e trabalhados em texto e em desenho os conceitos de Cidadania, Direitos Humanos, valores humanos, No mês de Dezembro, seleccionou-se e passou-se o desenho para a tela, aprenderam-se técnicas de pintura em acrílico, iniciou-se a pintura da tela em acrílico. Visitou-se o lar de idosos. No mês de Janeiro, concluiu-se a pintura da tela, montou-se a Exposição na ESEVC no dia 22 de Janeiro de 2010 e inaugurou-se a mesma às 18h., cantando a canção “Amigos para sempre”. Produção Exposição de pintura “Pintar a Cidadania”, na ESEVC, no dia 22 de Janeiro de 2010, às 18horas. Esta exposição foi composta por 22 telas pintadas pelos alunos da turma e cada tela era acompanhada por um cartão onde estava escrita a explicação da pintura pelo autor. Estava exposta também uma tela, pintada pelos professores do Conselho de Turma, assim como um painel explicativo da exposição criado por mim. Conclusão Considero que este projecto, devido ao envolvimento de tantos intervenientes foi pluridisciplinar, foram trabalhados com os alunos vários 44
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conceitos de várias disciplinas e interdisciplinar, porque se conseguiu trabalhar os mesmos conteúdos em várias disciplinas, havendo sempre diálogos e comunicação entre professores, o que fez com que se fizessem acertos de interesses comuns, resultando muito bem. Inicialmente tive algum receio de o implementar, visto que era uma turma nova que recebi, não conhecendo nem alunos nem Encarregados de Educação. Por outro lado, tive receio de que os alunos de 10 anos, sem nunca terem tido Educação Visual e Tecnológica poderiam não ser capazes de corresponder aos objectivos por mim definidos e tive também receio de não ser apoiada pelo Conselho de Turma. Desde o início, todos os intervenientes se disponibilizaram para colaborar com muito entusiasmo e isso deu-me força e coragem para levar o projecto até ao fim como estava programado de início. Os alunos do 5º1 sentiram-se felizes com o projecto realizado e sentem-se orgulhosos dizendo que sabem ser “bons cidadãos”. Esta colecção de quadros, a pedido dos pais dos alunos e Director da Escola EB2,3 de António Feijó, foram expostos durante o mês de Abril de 2010, na Biblioteca Municipal de Ponte de Lima, a fim de ser visitada por todas as Escolas do Concelho de Ponte de Lima.
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Figura 5
Figura 6
À Descoberta de Mecanismos
Anete Fernandes anetecfernandes@gmail.com Cláudia Alves c.claudia.alves@gmail.com Jorge Adão ginhopena@hotmail.com
Resumo O presente artigo constitui uma investigação, análise e reflexão sobre a construção de um recurso pedagógico, para aplicação em contexto de sala de aula na disciplina de Educação Visual e Tecnológica. Foi trabalhada a Área de Exploração - Mecanismos - sendo que a principal preocupação na construção deste recurso, é proporcionar aos alunos uma abordagem experimental e exploratória de engenhos cinéticos do seu quotidiano. Esta ferramenta didáctica é erigida por um complexo de metal e madeira, onde estão patentes vários mecanismos, máquinas simples, janelas, sons, movimentos, elásticos, correntes e correias. Este recurso propicia ao professor em contexto sala de aula, uma mais-valia, pelo facto de poder expôr aos alunos uma experiência factual onde poderão interagir e até montar/desmontar o próprio recurso. Palavras-Chave: movimento, mecanismos, cinética, interacção, exploração. Abstract This article embeds the study, analysis and reflection around the construction of a pedagogic resource to be used in the classroom, specifically in Visual and Technological Education tutorials. The focus is in the Exploration Area - Mechanisms - where the main concern when constructing this resource is to provide the students with an experimental and exploratory approach to everyday kinetics devices. This educational tool is constructed by a complex of metal and wood, where are patents several mechanisms, simple machines, windows, sounds, movements, elastics, chains and belts. This feature provides the teacher in classroom, an asset, because it may expose to students, an actual experience where they can interact and to assemble / disassemble the resource itself. Keywords: movement, mechanisms, kinetic, interaction, exploration. 1. INTRODUÇÃO No campo de acção da unidade curricular, Oficina de Recursos Pedagógicos, do curso de Mestrado em Ensino de Educação Visual e Tecnoló46
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gica, ministrado pela Escola Superior de Educação do Porto foi proposta a criação e produção de materiais/ recursos educativos, ao que a resposta foi o recurso À Descoberta de Mecanismos, que se destina à faixa etária dos dez aos doze anos - 2º ciclo do ensino básico. A definição do conceito de mecanismos remete ao pensamento de algo complexo, sentido numa primeira abordagem como reaccional entre movimento e construção de máquinas. Sendo uma área muito auspiciosa nas abordagens possíveis, no contexto sala de aula, pretende-se despertar situações de curiosidade, de magia e a motivação dos alunos na exploração dos mecanismos. Aspira-se a uma abordagem à temática de forma estimulante e dinâmica, com recurso a uma série de estratégias pensadas com o objectivo de cativar a atenção dos alunos no sentido de aprofundarem o seu conhecimento como um todo abrangente. A estratégia cogitada passa por fazer com que os alunos, ao explorarem/ investigarem este recurso de forma livre e espontânea, possam ser conduzidos a tirar ilações sobre os diferentes mecanismos aqui expostos e assim construam a sua aprendizagem. Pretende-se através da exploração desta área e dos conteúdos subjacentes, que os alunos tomem consciência das implicações mecânicas e técnicas que se encontram no seu quotidiano, percebendo assim que relacionados com todos os movimentos estão aspágina
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sociadas máquinas simples e um ou mais mecanismos que executam determinadas funções. 2. METODOLOGIA Os mecanismos, preconizados no recurso À Descoberta de Mecanismos, foram o tema escolhido para a realização deste trabalho. Inicialmente foi feita uma pesquisa alargada com base nas indicações do Ministério de Educação, nomeadamente o Programa da disciplina de Educação Visual e Tecnológica e o Currículo Nacional do Ensino Básico. A segunda fase implicou uma investigação na Internet, em manuais escolares de várias editoras e autores diversificados que incidiu numa análise cuidada e selecção da informação recolhida. O principal objectivo na realização deste recurso foi o facto de este poder ser aplicado pelo professor em contexto de sala de aula, para proporcionar aos alunos a exploração sensorial de variados engenhos cinéticos, facilitando a compreensão das funções dos mecanismos e máquinas simples e permitir aos mesmos a análise de forças e movimentos. 3. ENQUADRAMENTO TEÓRICO A abordagem às Artes Visuais no 2º ciclo da Educação Básica faz-se através da Educação Visual e Tecnológica, que conjuntamente com outras disciplinas, desempenha um papel essencial na construção da identidade pessoal e social do aluno. “(...) Cabe à Educação Visual e Tecnológica promover a exploração integrada de problemas estéticos, científicos e técnicos com vista ao desenvolvimento de competências para a fruição, a criação e a intervenção nos aspectos visuais e tecnológicos do envolvimento”. (DGEBS, 1991a, p. 195) Acreditando numa interpretação construtivista da aprendizagem, que exige uma intervenção construtivista didáctico pedagógica, cuja ideia directriz consiste em criar as condições adequadas para os esquemas de conhecimento construídos pelos alunos, através de variadas experiências, realizamos o recurso À Descoberta de Mecanismos que propicia aos alunos do 2º Ciclo diversas experiências de aprendizagem. Este recurso foi desenvolvido com base no Programa de Educação Visual e Tecnológica: Volumes I e II, nas suas indica-
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Figura 1 - Estrutura base (placas móveis e placa amovivel)
Figura 2- Estrutura base (abertura de placas móveis)
ções metodológicas e tendo como área de exploração, os Mecanismos. Para a operacionalização deste recurso, e a partir dos conteúdos Movimento e Mecanismos, foi fundamental determinar quais as competências essenciais, finalidades e objectivos a atingir pelos alunos ao longo deste ciclo de ensino básico. Assim, e seleccionando o conteúdo Movimento e Mecanismos, no documento Currículo Nacional do Ensino Básico - Competências Essenciais - Educação Artística (DEB, 2001, p. 202), o aluno deve desenvolver, as seguintes competências tecnológicas: “- Aptidão para verificar que não existe movimento sem estrutura, - Aptidão para identificar as partes fixas e as partes móveis de um objecto ou sistema técnico, - Identificar os principais operadores técnicos utilizados nos mecanismos, - Analisar estruturas com movimento procedentes de diferentes momentos da história, -Reconhecer alguns mecanismos elementares que transformam ou transmitem o movimento.” Onde se incluem, igualmente as seguintes competências específicas: “- Identificar os elementos de uma estrutura móvel, - Identificar os elementos e uniões desmontáveis, -Conhecer as duas grandes famílias de movimento - movimento circular e movimento rectilíneo, -Reconhecer e identificar processos de transmissão de movimento circular e movimento rectilíneo, - Conhecer e identificar processos de transmissão com transformação do movimento, - Construir mecanismos simples que utilizem os operadores mecânicos do movimento”. No Programa de Educação Visual e Tecnológica -Organização Curricular e Programas -Volume I, e fazendo um paralelo com o recurso desenvolvido, surgem as seguintes finalidades e objectivos (DGEBS, 1991a, pp. 198- 199): “- Desenvolver a percepção, sendo sensível às qualidades do envolvimento, dos objectos e dos materiais (qualidades formais, qualidades expressivas e qualidades físicas), mobilizando para isso todos os sentidos; - Desenvolver aptidões técnicas e manuais (usar utensílios, ferramentas e equipamentos em função dos fins para os quais foram concebidos e fabricados).” Para a área de exploração, os Mecanismos, que “trata de sistemas destinados a produzir movimento para obter determinados resultados” (DGE48
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Figura 3- Estrutura base (descoberta de janelas)
Figura 7 - Fechadura, campainha, roldana e rodas
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BS, 1991b, p. 33), seleccionamos os seguintes conteúdos básicos: - Energia - tendo em conta fenómenos de transformação energética: mecânica do movimento (cinética); - Espaço - tendo em conta a posição e organização dos objectos no espaço; - Estrutura - compreendendo a estrutura das formas e materiais; - Forma - compreendendo a relação entre as formas e os factores que as condicionam; - Movimento - onde se pretende que os alunos compreendam os tipos de movimento, a produção de movimento e a sua representação. 4. CARACTERIZAÇÃO DO RECURSO É axiomático que os alunos desenvolvem capacidades de atribuição de significados e de criação a partir de um objecto, sendo que “os objectos comunicam de um modo imediato e directo, visualmente e implicando outros sentidos” (HesKett, 2005, p. 56). Neste recurso foi procurada a transmissão da gnose na correlação entre objecto, engenho cinético e exploração sensorial. À Descoberta de Mecanismos é caracterizado por duas placas de madeira folheada de 400 mm X 400 mm, desmontáveis, que se unem com quatro parafusos, porcas e anilhas. A estrutura base (as duas placas quadradas atrás mencionadas) possui 7 placas móveis situadas no seu exterior (2 delas amovíveis que funcionam como carrinhos). Abrindo estas placas acede-se a janelas que permitem a descoberta óptica e interacção com máquinas simples, assim como a observação em diferentes ângulos, de distintas peças e mecanismos e a análise da transmissão de movimento. As placas móveis também proporcionam jogos de procura e descoberta entre os diferentes objectos, ou seja, para descobrir janelas ou aceder a certos mecanismos o aluno deve procurar chaves ou desencaixar peças (exemplos: a procura da chave para abrir a placa móvel e aceder a uma janela, desenroscar o peão para o pôr a rolar, desmontar as anilhas e porcas da estrutura base para aceder aos dois carrinhos com rodas). As diferentes resistências entre os materiais, madeira folhea-
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da e o metal zincado de variadas espessuras, além de permitirem a diversificação dos gestos e das acções, ritmos, sons e diferentes experimentações, conferem ao recurso uma grande durabilidade e resistência. Todas as experiências referidas anteriormente executam- se através de um amplo conjunto de engenhos cinéticos/peças tridimensionais fixados e encaixados nas placas de madeira. As escolhas específicas dos engenhos/ peças, justificam-se no facto de os alunos reconhecerem estes “objectos” (campainha da bicicleta, corrente de motocicleta, peão, fechadura, aloquete, fecho de borboleta, fecho de mala, fecho roler, dobradiças, molas, chaves, corrente, rodas dentadas, roldanas e rodízios) como presentes no seu quotidiano e na sua cognição. Os mesmos atribuem finalidades únicas e simples a estes “objectos”, mas através de uma observação mais adequada e aprofundada, aliada à exploração sensorial, identificarão mecanismos prossecutores de movimento, atrito, relações físicas, cinéticas e mecânicas. Figura 4 - Estrutura base (carrinho desmontável)
Figura 5 e 6 - Fecho, aloquete e correntes
4.1. EXPLORAÇÃO SENSORIAL DO RECURSO À DESCOBERTA DE MECANISMOS Pretende-se na exploração activa de À Descoberta de Mecanismos, que os alunos vejam: através das janelas; toquem: os diferentes materiais, texturas, peças e mecanismos; ouçam: os sons metálicos transmitidos no toque e movimento das diferentes peças, máquinas simples e mecanismos; e experienciem as interacções entre os elásticos, correntes, correia, peças, máquinas simples e mecanismos e também que desmontem/montem mecanismos e mesmo o recurso em si. É fornecida aos alunos a oportunidade de uma experiência concreta e contextualmente significativa na unidade de mecanismos, de como estes se movimentam e interagem e através da qual eles podem levantar as suas próprias questões e construir os seus próprios modelos conceitos e projectos. “A imagem mental, nascida da reflexão e da observação conduz à acção.” (Brassart & Rouquet, 1977, p. 145) Nas palavras de Frega “o sujeito (aluno) estabelece um sentido de ordem a partir de códigos que já tem internalizados e que lhe permitem a análise do conteúdo em correlação das expressões várias com que se nutriu (…) para produzir criação gerada pela transformação dos elementos.” (Frega, 2006, p. 37) 4.2. MÁQUINAS SIMPLES E MECANISMOS PRESENTES NO RECURSO É relevante que os alunos tenham consciência de que a construção de uma máquina advém da necessidade de desempenho de uma tarefa. As 50
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Figuras 8 e 9- Acesso a mecanismos através das janelas
Figuras 10 e 11- Mecanismos: exemplos de máquinas simples
primeiras máquinas eram muito simples. Máquinas simples são dispositivos que, apesar da sua simplicidade, trouxeram grandes avanços para a humanidade e se tornaram base para todas as demais máquinas criadas ao longo da história. Não utilizam qualquer combustível como fonte de energia. Nestas máquinas intervêm duas forças: a força a realizar pelo homem, designada potente e a força resistente que é a resistência a vencer. Caracterizam-se por reduzir a quantidade de esforço, transmitindo e transformando movimento. Nas placas de madeiras do recurso, foram aplicados parafusos, roldanas fixas, alavancas interfixas e molas. Estas máquinas simples permitem ao aluno uma exploração simplificada, onde este terá claramente a percepção de como estas máquinas funcionam e ao interagir com as mesmas, entenderá alguns dos princípios da montagem e construção de máquinas ou mecanismos mais complexos. Torna-se vital a observação e entendimento dos mecanismos, sendo melhor aliar a estas acções a experimentação concreta do sentir táctil. Este facto categoriza como necessária a inclusão de variados mecanismos no recurso. Neste, os alunos podem observar e manipular o funcionamento do mecanismo articulado: dobradiça que lhes permite a abertura de placas móveis e os variados operadores mecânicos que desempenham diferentes funções como peças individuais ou inseridos em diversos mecanismos. Estes estão integrados nos quatro lados das placas de madeira (no interior e exterior do recurso), e são os seguintes: rodas, rodas dentadas (engrenagens), rodas de fricção, rodas dentadas e corrente e sistema de cremalheira. À excepção de algumas rodas de borracha, todos estes componentes são de metal. 4.3. MOVIMENTO, SISTEMAS DE TRANSMISSÃO, TRANSFORMAÇÕES E TIPOS EXPERÊNCIÁVEIS NO RECURSO Denomina-se mecanismo a um conjunto de elementos rígidos, móveis, uns relativamente a outros, unidos entre si mediante diferentes tipos de junções, cujo propósito é a transmissão de movimentos e forças. O movimento é a variação de posição de um corpo relativamente a um ponto chamado referencial, este é categorizado
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pela sua trajectória e velocidade. Alguns dos mecanismos do recurso pedagógico, contém peças que transmitem movimento e outras transformam-no. São os denominados sistemas de transmissão. Aqui os alunos são levados a experimentar e observar os diferentes tipos de movimento. Ao longo da sua observação os alunos podem mover os mecanismos para inverter sentido e direcção e podem aumentar e reduzir a velocidade das peças. Estes actos são permitidos dado a existência dos seguintes sistemas de transmissão: parafuso, porca e anilhas; transmissão por engrenagem, transmissão por corrente, mudança de sentido de movimento, transmissão por rotação, transformação de movimento circular em movimento rectilíneo e vice-versa. As peças podem estar em posições fixas, demonstrando inércia, mas os alunos com a sua acção táctil podem movimentar as peças em posições relativas e constantes, podendo analisar as trajectórias dos diferentes tipos de movimento: rectilíneo, curvilíneo e oscilatório. Figura 12- Máquinas simples: alavanca interfixa; Mecanismos: engrenagens
Figura 13 - Fecho de rolar
4.4. ELEMENTOS DE LIGAÇÃO E TRANSMISSORES DE ENERGIA PRESENTES NA INTERACÇÃO DO RECURSO Neste recurso existem elementos de ligação que não constituem mecanismos, no entanto permitem movimentos e a interacção entre peças e mecanismos. Estes permitem interligar os mecanismos com máquinas simples, possibilitando elevar cargas e criar movimento, promovendo energias cinéticas e são elementos de extrema relevância para estimular a curiosidade do aluno na sua descoberta. Para executar esta função motivacional foram escolhidos o elástico e a corrente metálica. A borracha esticada do elástico armazena energia, esta pode ser utilizada pelo aluno para movimentar peças ou elevar cargas, está principalmente associada às roldanas fixas. A corrente metálica (consiste numa série de elos, pequenas esferas, unidos entre si) e dinamiza a movimentação de roldanas e a descoberta de uma janela inserida numa das placas base. Estes elementos de ligação encontram-se situados na parte interior e exterior das placas de madeira. 4.5. FORÇAS, ENERGIAS E FENÓMENOS A OBSERVAR NA À DESCOBERTA DE MECANISMOS Os alunos, através da sua observação e acção sobre o recurso concluirão que numa fase inicial não há movimento sem estrutura. Mais tarde questionarão que tipo de movimentos executam os engenhos que observam, e numa fase final, deverão colocar dúvidas sobre as forças, energias e velocidades demonstradas ao longo da exploração. 52
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Figura 14 - Rodas dentadas
Figura 15 - Vista geral dos sistemas de transmissão do movimento
Figuras 16 e 17 - Campainha de bicicleta (mecanismo interior)
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Considera-se que neste recurso não sejam amplificados ao extremo os conceitos de cálculos de força, atrito e velocidade (abordados em Educação Tecnológica e Ciências Físico - químicas no 3º ciclo) uma vez que se consideram demasiado complexos para a faixa etária em questão. Os mecanismos aqui apresentados demonstram combinações de movimentos relativos de rotação e translação. Nestas acções combinatórias podem ser observados conceitos como centro de gravidade, momento de inércia, velocidade angular e atrito. As forças e energias que alteram o estado de repouso ou movimentos dos corpos observáveis são as seguintes: Força - surge quando as cargas estão em movimento, por exemplo quando o parafuso é elevado pela roldana. Força centrífuga - esta força é aplicável pondo o peão em movimento. Força gravitacional - esta força é observável, por exemplo, nas chaves penduradas ou no elástico com parafuso pendurado na roldana. Energia cinética - é a quantidade de trabalho que teve que ser realizado para mover objectos como as engrenagens, a campainha da bicicleta a tocar ou a corrente sendo movimentada pelas rodas dentadas. Energia mecânica - é a energia que pode ser transferida por meio de força, igualmente observável nas engrenagens em movimento, na campainha da bicicleta a tocar ou na corrente sendo movimentada pelas rodas dentadas. 5. APLICAÇÃO DO RECURSO EM CONTEXTO EDUCATIVO A actividade de exploração deste recurso é desafiadora. Aliando a aprendizagem ao sentir e à descoberta, este recurso desencadeia o questionamento, o diálogo, a pesquisa, a definição de acções e promove: - a motivação da compreensão e análise de máquinas e mecanismos simples existentes no quotidiano de modo a reproduzir o seu funcionamento: - a capacidade de visualizar ideias através de elementos; - o desenvolvimento intelectual e sensorial dos alunos e dos alunos de necessidades educativas especiais; - a interdisciplinaridade, através da integração de conceitos de diversas disciplinas e áreas, tais como: Educação Visual e
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Figura 18 e 19- Sistemas de transmissão do movimento
Tecnológica, Matemática, Electricidade, Electrónica, Cinética, Mecânica, Ciências Físico - Químicas, Geometria e História; - a identificação de situações problema; - a capacidade de planificar e criar uma realização técnica tridimensional; - a criatividade na concepção dos projectos; - a evolução do raciocínio e da lógica na construção de mecanismos simples. Como tal, a sua aplicação é múltipla. No entanto como primeira abordagem, define-se a seguinte: O professor, na procura do desenvolvimento das competências inseridas no conteúdo Movimento e Mecanismos, poderá iniciar as suas práticas solicitando aos alunos a experimentação. Aqui surge a oportunidade de interagir com o recurso e a total liberdade para abrir janelas, fechar placas móveis, movimentar carrinhos, criar movimento entre engrenagens, correia e correntes, abrir fechaduras, encontrar mecanismos, entre outros. O professor poderá questionar os alunos com algumas questões: - Que objectos que estão aqui presentes existem em vossa casa? Como se denominam? - Se não se lembram deles em vossa casa, onde é que os viram? - Sabem como funcionam estes objectos? - Quais as máquinas simples que identificam? - O que é uma máquina simples? - Que máquina simples permitiu a elevação de uma carga? - O que é um mecanismo? - Quais foram os mecanismos que identificaram? - O que é o movimento? - Que tipos de movimento existem? Identifiquem-nos no recurso. - Que mecanismos é que efectuam transmissão de movimento? - Há movimento sem estrutura? - O que é a energia? - O que é a inércia? - Porque é que os objectos que estão pendurados estão sempre na direcção do chão? Parece óbvio, que as respostas a estas questões aliadas à exploração sensorial, experienciada individualmente por cada aluno, traçarão o caminho para o desenvolvimento e construção de outros projectos de mecanismos simples na disciplina de Educação Visual e Tecnológica. Também como exemplo de aplicação sugerimos a construção de jogos 54
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e brinquedos didácticos ou de lazer, para a animação de diferentes espaços físicos. Podem ser construídos, a título de exemplo, brinquedos inspirados nos meios de transporte aéreos, terrestres e aquáticos ou brinquedos simples induzidos em brinquedos tradicionais, utilizando diferentes mecanismos e materiais, onde poderá predominar a reciclagem e a reutilização. Será pertinente fazer uma pesquisa pelos sites referidos em “PÁGINAS WEB CONSULTADAS” do presente artigo. Este recurso ao ser delineado com aplicações de movimento e mecânica simples, apresenta inúmeras potencialidades. Alargando horizontes, poderia evoluir com elementos electrónicos e tecnológicos definindo a construção de projectos de robótica destinados ao desenvolvimento das competências em Educação Tecnológica no 3º ciclo.
Figura 20- Elementos de ligação e transmissão de energia
Figura 21- Corrente metálica situada no exterior da placa móvel
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6. CONCLUSÃO As máquinas simples são usadas há milhares de anos, no entanto, continuam como base de máquinas complexas desenvolvidas nos nossos dias. É de extrema importância que os alunos atribuam significados à sua cultura e meio físico, não se podendo caminhar directamente no mundo tecnológico sem antes ter um entendimento técnico e mecânico de algumas das realidades práticas anteriores e mesmo actuais. O recurso aqui apresentado é disso exemplo. Ao centrar o ensino no aluno e nas suas questões permitindo-o desenvolver a sua aprendizagem, não se pode negligenciar as experiências activas em sala de aula. A experimentação, basilar para o desenvolvimento da criatividade, o desenvolvimento dos sentidos e a auto-descoberta, são factores cruciais para o desenvolvimento de competências do ser humano. Usar estas mais-valias em sala de aula atribuindolhes sentidos dentro do currículo, é claramente caminhar para um ensino de Educação Visual e Tecnológica que estabelece práticas dinâmicas de sucesso. A concepção desta ferramenta assume-se como extremamente completa para a abordagem aos conteúdos mais práticos e talvez mais complexos em Educação Visual e Tecnológica. Compreender os mecanismos a partir de textos e imagens não é impossível mas assume uma complexidade avultada e
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uma eficiência muito mais pobre. A acessibilidade a este recurso permite absorver simultaneamente estímulos e informações que de outra forma seriam bem mais complicadas de assimilar. Potencia positivamente a aprendizagem do aluno e é no sentido do caminho da descoberta que surgiu o recurso À Descoberta de Mecanismos, seguindo a sua curiosidade, sendo orientado se necessário o aluno, manipulando, interrogando e interrogando-se, exprimindo a sua opinião, estará a desenvolver-se intelectualmente. O recurso construído procura ser mais um estímulo para a apreensão do mundo quotidiano.
Figura 22- O parafuso elevado pela roldana
Figura 23- Vista geral de forças e energias
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http://robives.com/ http://www.thelivingweb.net/kinetic_toys_sculpture.html http://www.virginiomoutinho.com/ GLOSSÁRIO
Forças e Fenómenos Físicos: Atrito - é a resistência que todos os corpos que se opõem criam ao moverem-se uns sobre os outros. Centro de gravidade - é o ponto onde pode ser considerada a aplicação da força de gravidade de todo o corpo formado por um conjunto de partículas. Essas partículas são atraídas para a Terra, cada qual com sua força - peso. Centro de gravidade, portanto, é o ponto onde se pode equilibrar todas essas forças de atracção. Energia cinética - é a quantidade de trabalho que teve que ser realizado sobre um objecto para modificar a sua velocidade (seja a partir do repouso - velocidade zero - seja a partir de uma velocidade inicial). Energia mecânica - é a energia que pode ser transferida por meio de força. A energia mecânica total de um sistema é a soma da energia potencial com a energia cinética. Força - é aquilo que pode alterar o estado de repouso ou de movimento de um corpo. Força centrífuga - esta actua radialmente a partir do centro de rotação determinado pela partícula no sistema girante, ou seja, é paralela ao plano determinado pelo eixo de rotação, mais especificamente pelo vector velocidade angular e pelo raio que une o objecto ao centro do referencial girante, sendo sempre perpendicular a este eixo de rotação. Força gravitacional - a queda dos objectos em direcção ao centro da Terra é depágina
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vida a esta força. Inércia - é uma propriedade física da matéria. Um corpo não submetido à acção de forças ou submetido a um conjunto de forças de resultante nula; nesta condição esse corpo não sofre variação de velocidade. Isto significa que, se está parado, permanece parado. Velocidade angular - de um corpo rígido descreve a taxa com que a sua orientação muda. É definida nos termos da derivação da orientação com respeito ao tempo. Máquinas simples: Alavanca - a alavanca permite transformar em força pequena numa grande força, são constituídas por fulcro, carga, esforço e braço. Alavanca interfixa - neste tipo de alavanca o fulcro situa-se entre a força potente e a força resistente. Mola - é um objecto elástico flexível usado para armazenar a energia mecânica. Mola helicoidal - é uma mola de torção, porque o fio mantém-se torcido quando a mola é comprimida ou esticada. Mola de torção - consiste num fio enrolado em forma helicoidal apresentando em suas extremidades hastes que podem ser rectas, curvas, com dobras para dentro ou para fora. Mola de tração - mola em forma helicoidal, apresenta ganchos nas extremidades dos mais variados tipos. Podem ser cilíndricas ou bicónicas. Parafuso (rosca) - este diminui a distância de deslocação de um peso e aumenta a força. Roldana - é constituída por uma roda com calha na sua extremidade, da qual passa um cabo que permite, através da aplicação de uma força, elevar cargas. A roldana simples não facilita a elevação da carga, simplesmente muda a direcção em que se aplica a força. Roldana fixa - nesta a roda é fixada a um suporte. O fulcro é o centro da roda, uma das extremidades é esforço e a outra é a carga. Os braços correspondem ao raio da roda. Numa roldana fixa, a força do esforço e a força da carga são aproximadamente as mesmas. Mecanismos Articulados: Dobradiça - é um mecanismo com articulação que permite o movimento ao longo de um ângulo recto. Operadores Mecânicos: Engrenagens - pares de rodas dentadas que transmitem força e movimento. Roda - é um elemento fundamental em máquinas do quotidiano humano, de acordo com a função que desempenha pode ser fabricada em diversos materiais. Roda dentada - é uma roda com dentes moldados para permitirem uma transmissão suave, sem atrito. A sua função é engrenar uma
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roda dentada para transmitir movimento e vice-versa. Existem rodas dentadas rectas, cónicas e helicoidais. Roda e correia - a correia transmite o movimento rotatório de uma roda para a outra. Sistema usado quando entre os eixos não é possível utilizar engrenagens. Pode mudar o sentido, o plano e a direcção consoante a maneira como se desloca a correia. Roda de fricção - a transmissão de movimento entre as duas rodas faz-se devido ao atrito provocado pelo contacto das superfícies. Sistema usado nas transmissões que comportam pequenas forças. Sistema de cremalheira - é constituído por uma barra dentada rectilínea (cremalheira) engrenada numa roda dentada. Transforma o movimento circular em rectilíneo e muda o plano de rotação. Sistemas de transmissão: Engrenagens - consiste em duas ou mais rodas dentadas cujos dentes engrenam uns nos outros de tal modo que uma das rodas faz movimentar as outras. Mudança de sentido de movimento - é efectuada entre rodas dentadas e entre rodas e correia. Parafuso, porca e anilhas - este sistema permite o movimento circular em movimento rectilíneo. Rodas dentadas e corrente – utilizam-se as rodas dentadas e corrente quando a distância entre os eixos não permite que as rodas estejam directamente ligadas e quando o movimento tem de suportar um grande esforço sem as rodas deslizarem. Sistemas de transmissão - permitem aumentar e reduzir a velocidade, inverter o sentido e a direcção do movimento. Transformação de movimento circular em movimento rectilíneo e vice-versa - é efectuado com roda e cremalheira. Transmissão por correia - movimento realizado por rodas e correia incorporada. Transmissão por corrente - movimento realizado por rodas dentadas e corrente incorporada. Transmissão por engrenagem - movimento realizado por rodas dentadas. Transmissão por rotação - é efectuada por rodas dentadas. Tipos de Movimento: Curvilíneo - a característica fundamental deste tipo de movimento é a sua circularidade. Oscilatório - é um tipo de movimento em que a direcção do objecto muda periodicamente de sentido (vaivém), e simultaneamente descreve um arco. Rectilíneo - é um movimento linear, quando o objecto se desloca em linha recta.
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CAIXA DE RETRATOS
Maria Ferreira maria.mfe@gmail.com Paula Magalhães paula_sanches_magalhaes@hotmail.com Sofia Lages sofialages@gmail.com
Resumo O presente artigo insere-se na proposta de trabalho de grupo da Unidade Curricular de Oficina de Recursos de Apoio Pedagógico do Mestrado em Ensino de Educação Visual e Tecnológica da Escola Superior de Educação do Porto. Tem como propósito a apresentação de um recurso didáctico pedagógico sobre o tema Rosto que pretende ser utilizado em contexto escolar, no âmbito da disciplina de Educação Visual e Tecnológica, do 2º ciclo do Ensino Básico. Este recurso introduz a Obra de Arte na disciplina através do método combinatório promovendo a intervenção e interacção dos alunos. Palavras-chave: Educação Visual e Tecnológica, Obra de Arte, Rosto, Método Combinatório, Recurso Pedagógico. Abstract: This article presents a pedagogical resource to be used by K12 students on the classroom context of Visual Arts Education and Technologies. This resource introduces the work of art through the combinatorial method in order to present a possible approach on exploring the portrait. Keywords: Visual Arts and Education Technologies, Pedagogical Resources. 1. INTRODUÇÃO A criação e construção da Caixa de Retratos, teve como ponto de partida a problemática da abordagem do Rosto na sala de aula. Deste modo, apresenta uma sugestão de construção do rosto baseada no método combinatório exemplificado através do Retrato na Obra de Arte. Estes exemplos permitem identificar diversas expressões estimulando a aproximação à História da arte e a descoberta de diferentes soluções.
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Figura 1. Método Combinatório
2. METODOLOGIA PARA CONSTRUÇÃO DO RECURSO Para a realização deste trabalho procurámos reunir um leque variado de exemplos de representações do rosto ao longo da história da arte. As 15 imagens foram impressas em PVC de 3 mm, material leve e apropriado para a idade em questão, bem como para uma utilização frequente. Seguiu-se a divisão em quatro partes iguais e essenciais para o reconhecimento da forma, de maneira a permitir um jogo entre as diferentes partes compondo novas representações. As imagens utilizadas constam na Folha de Referências, uma peça base com as obras de arte completas e legendadas. Considerando o número de alunos de uma turma, adicionámos a este jogo 27 conjuntos de peças brancas, reutilizáveis, e um conjunto de canetas para desenhar nas mesmas. Uma vez que recorremos ao auto-retrato juntámos ainda um conjunto de peças espelhadas, permitindo a interacção visual. Todas as peças são magnéticas, de modo que o professor e os alunos podem jogá-las no quadro interactivo ou noutra superfície magnética. Todo os material é guardado na “Caixa de Retratos”. 3. ENQUADRAMENTO TEÓRICO “A vista chega antes das palavras. A criança olha e vê antes de falar.” (Berger, 2005, p.9).
Figura 2. Folhas de Referência
Aquilo que sabemos ou aquilo que julgamos afecta o modo como vemos as coisas. A nossa visão está em constante actividade, sempre em movimento, sempre a captar coisas num círculo à nossa volta, constituindo aquilo que nos é presente, tal como somos. Pouco depois de adquirirmos a capacidade de ver, adquirimos a consciência de que também podemos 60
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ser vistos. Os olhos do outro combinam-se com os nossos para dar credibilidade ao mundo visível. Todas as imagens corporizam um modo de ver. A Obra de Arte traduz esse exercício apresentando perspectivas inovadoras e sensíveis ao seu tempo. O Retrato é um dos temas mais comuns na História da Arte porque alia a esse olhar uma tentativa de eternizar a pessoa representada. O mesmo acontece com o Auto-Retrato, sendo que este representa um modo de ver sobre si próprio. Se um retrato não se demite do olhar sobre aquele que é retratado, o auto-retrato será um olhar comprometido sobre si mesmo, numa dinâmica de auto-aprendizagem conduzida pelo trabalho em progresso. No auto-retrato reflecte-se a imagem do artista, a imagem do seu mundo, da sua época e dos seus valores. A História encontra assim na História da Arte uma espécie de álbum de fotografias, um registo pleno de registos mais ou menos pessoais e tantas vezes auto-biográficos, representantes do tempo e dos lugares, hoje base de uma identidade global.
Figura 3a. Busto Nefertiti 1345 a.c; 3b. Albrecht Durer, Auto-retrato 1500; 3c. Paul Klee, Senecio 1922
Figura 3a e 3b. Caixa de retratos
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“A familiaridade com a obra de arte e as experimentações plásticas facilitam o desenvolvimento de atitudes analíticas. À medida que a criança conhece as diferenças e observa os pormenores das obras, discrimina estímulos variados, associa ideias e ensaia respostas. Este processo possibilita a fluidez do pensamento, exercita a sensibilidade estética e desperta a vontade de comunicar expressivamente no âmbito das artes plásticas.” (Gonçalves, Fróis e Marques, 2002, p. 16).
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3.1 O Rosto no Programa da Educação Visual e Tecnológica
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As “competências específicas definidas” no Programa de Educação Visual e Tecnológica do 2º ciclo, no que diz respeito ao estudo do Rosto são: ELEMENTOS DA FORMA: - Reconhecer as proporções e noções de antropometria na representação da figura humana; - Compreender as posições relativas entre o observador e os objectos percepcionados; - Reconhecer processos de representação do espaço a duas dimensões: sobreposição, tamanho relativo dos objectos, luz/cor e perspectiva linear; - Utilizar elementos definidores da forma – ponto, linha, plano, volume, luz/cor, textura e estrutura – nas experimentações plásticas; - Compreender a estrutura das formas percepcionadas, relacionando as partes com o todo e entre si. (DEB, 2001, p.159, 160) “A Educação Visual e Tecnológica promoverá, pois, a articulação dos aspectos históricos, físicos, económicos, de cada situação estudada, com a compreensão, a criação e a intervenção nos domínios da tecnologia. E da estética através de um processo integrado em que a reflexão sobre as operações e a compreensão dos fenómenos são motores da criatividade” (DGEBS, 1991a, p.195) Neste sentido, a “Caixa de Retratos” procura oferecer um exercício que alia à compreensão da história e da obra de arte uma sugestão de construção do retrato, de forma individual e cooperativa, explorando soluções ou pontos de partida. Relativamente ao plano de organização do ensino aprendizagem este recurso didáctico – pedagógico, aborda as seguintes unidades de trabalho: COMUNICAÇÃO: - Problemática dos sentidos - Construir o hábito de escuta do outro, para tomar em conta as suas razões quando justificadas; - Imagem na comunicação - Tomar consciência de que a imagem é um produto fabricado em ordem a determinadas intenções e não um equivalente do real. (DGEBS, 1991b, p. 19) FORMA: - Elementos da forma - Identificar os elementos que definem ou caracterizam uma forma: luz/cor, linha, superfície, volume, textura, estrutura; relacionar as partes com o todo e entre si (proporções). (DGEBS, 1991b, p.23) O recurso responde aos Objectivos Gerais do Programa, destacando-se a 63
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Área de Exploração Desenho, reconhecendo que “É importante valorizar o traço espontâneo e que os alunos se apercebam de que o próprio exercício lhes irá permitir dominar progressivamente à mão.” (DGEBS, 1991 b, p.31) 4. PERSPECTIVAS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA “ O rosto é uma das nossas principais formas de identidade. Através do rosto comunicamos e exprimimos muitas das nossas emoções e sentimentos. Observar com atenção as particularidades do rosto humano permite apercebermo-nos melhor das características físicas de cada um de nós.” (Porfírio, 2000/2001, p.18). O rosto é uma parte do corpo que conhecemos bem, observamos diariamente, nos outros ou frente ao espelho, os seus vários elementos (olhos, nariz, boca, sobrancelhas…). O aluno vai aprender como se organizam esses elementos e perceber as suas proporções, para mais tarde poder interpretar e desenhar. É importante reconhecer que há rostos de muitas formas, mais arredondadas, mais compridas, mais quadradas… e pensar que os rostos mostram expressões, tristeza, alegria, indiferença, sonho, agressividade, espanto, etc. Os olhos e a boca são os elementos mais significativos da expressão de um rosto, a forma como são desenhados são um excelente indicador dos estados emocionais.
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Pretende-se com este recurso apresentar uma multiplicidade de opções de construção do rosto e assim promover a resolução de problemas e tomadas de decisões. Deste modo, a aquisição do conhecimento é feita de forma dinâmica, baseando-se na curiosidade e descoberta, trabalhadas de forma autónoma e cooperativa. O aluno descobrirá através de um pensamento analítico e intuitivo, através de actividades de exploração e de pesquisa, focando o papel determinante que ele próprio tem no processo de aprendizagem. Segundo Sprinthall e Sprinthall (1993) “A aprendizagem pela descoberta é mais conceptual e sucessivos estudos têm demonstrado que a aprendizagem conceptual tem consequências mais duráveis que as actividades não conceptuais. A retenção conceptual promove sentimentos mais fortes de auto-estima por parte do aluno.” (p.242) Utilizando este recurso, o professor exerce um papel orientador na aprendizagem apresentando os conteúdos como problemas de forma a promover a curiosidade, a observação, a colocação de hipóteses e a resolução de problemas, sem nunca esquecer as características individuais dos seus alunos. O método de resolução de problemas tem-se revelado uma estratégia activa, essencial para atingir as metas a que esta fase da escolaridade se propõe, colocando o aluno em situação de interacção com o meio envolvente e com os outros, construindo o seu próprio conhecimento. “Os professores podem proporcionar as condições sob as quais a aprendizagem pela descoberta é alimentada e se desenvolve. Uma das formas de o conseguir é levar os alunos a adivinhar as respostas e explicar-lhes que estão a adivinhar. Os alunos podem, então, analisar a resposta do professor. Prova-se, assim, aos alunos que a exploração pode ser tanto recompensadora como segura e que constitui uma técnica valiosa para construir nos alunos hábitos de descoberta para a vida inteira.” (Sprinthall e Sprinthall, 1993, p.242) As peças magnéticas permitem a exploração do recurso no quadro interactivo ou quadro magnético. O professor ou o aluno expõe, explora, exemplifica ou experimenta o recurso em grande grupo, (grupo turma). A existência de um conjunto de peças brancas por aluno, promove o trabalho autónomo ou em colaboração com um par (retrato e auto-retrato). A promoção deste tipo de trabalho fomenta a participação e estimula a cooperação. O conjunto de peças espelhadas promove a interacção visual permitindo a integração do reflexo do rosto do aluno noutras combinações.
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5. CONCLUSÃO “As artes são elementos indispensáveis no desenvolvimento da expressão pessoal, social e cultural do aluno. São formas de saber que articulam imaginação, razão e emoção. Elas perpassam, as vidas das pessoas, trazendo novas perspectivas, formas e densidades ao ambiente e à sociedade em que vive. A vivencia artística influencia o modo como se aprende, como se comunica e como se interpretam os significados do quotidiapágina
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no.” (DEB 2001, p.49) Pretendemos com este recurso desenvolver uma acção especializada, accionando e organizando um conjunto variado de dispositivos que promovam activamente a aprendizagem dos alunos, embora não a possamos garantir em absoluto, já que o aluno terá de desenvolver os correspondentes procedimentos de apropriação. Pretendemos abrir horizontes, mostrando exemplos ao longo da história, estabelecendo assim, pontes de diálogo, que permitem educar a sensibilidade através da experimentação. Para o aluno conseguir desenhar, representar, transformar, primeiro é necessário saber observar… As experiencias de observação permitem à criança desenvolver o conhecimento
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do mundo que o rodeia, o real e o imaginário. O aluno, orientado pelo professor (se necessário), vai manipular a Caixa de Retratos, interrogando-se e interrogando, num constante diálogo entre impressão e expressão. Em síntese, a Caixa de Retratos pretende promover a partilha das decisões pedagógicas e a co-responsabilização na gestão do processo de aprendizagem. Traduz uma abordagem alternativa à problemática do rosto explorando as competências e conteúdos inerentes à mesma. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS BERGER, John. (2005). Modos de Ver. Editorial Gustavo Gili, SA: Barcelona DEB (2001). Currículo Nacional do Ensino Básico – Competências Essenciais. Lisboa: Ministério da Educação DGEBS (1991a). Organização Curricular e Programas do 2º ciclo do Ensino Básico. Vol. I. Lisboa: Ministério da Educação. DGEBS (1991b). Programa de Educação Visual e Tecnológica: Plano de Organização do Ensino-Aprendizagem, Vol. II, Lisboa: Ministério da Educação. GONÇALVES, Fróis e Marques. (2002). Primeiro Olhar. Fundação Calouste Gulbenkian: Lisboa PORFÍRIO, Manuel. (2000/2001). Educação Visual & Tecnológica. ASA: Rio Tinto SPRINTHALL, A. e SPRINTHALL, C. (1993). Psicologia Educacional. McGraw-Hill: Portugal
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Animação: do velho se fez novo
Antónia Alves alvesantonia@sapo.pt Emília Cruz silvacruz2005@gmail.com Marta Abreu marta_abreu3@msn.com
Resumo: No sentido de motivar os alunos para o princí-pio básico da Animação é importante recorrer a materiais acessíveis, manipuláveis, que despertem a sua curiosida-de, que desenvolvam competências como a sensibilidade estética e proporcionem aos alunos, simultaneamente, conhecimentos técnicos e destreza manual. O projecto Do Velho se fez Novo parte da área de exploração da Anima-ção e consiste na construção de um brinquedo óptico, nomeadamente, o zootrope , a ser explorado por professo-res e alunos no âmbito da disciplina de EVT. Na sua exe-cução, os alunos terão oportunidade de adquirir e desen-volver diversas competências sobretudo ao nível de con-teúdos como Geometria, Materiais, Movimento e Traba-lho. Este projecto tem ainda a particularidade de possibili-tar a reutilização de materiais e equipamentos, muitas vezes, disponíveis e subaproveitados nas escolas. Palavras-Chave: Animação, Brinquedos-ópticos, Movi-mento, Educação Visual e Tecnológica, Zootrope. Abstract: If you intend to motivate students to Animation basics it is important to employ accessible and manipulable materials which arouse curiosity. At the same time these resources should develop certain skills, such as aesthetic sensitivity and, simultaneously, provide students technical knowledge and manual dexterity. The project The old became new is based on the exploration of Animation and consists of building an optical toy, namely a zootrope, which will be developed by teachers and students in Visual and Technological Education classes. In its execution, students will be able to acquire and develop several skills, especially concerning contents such as Geometry, Materials, Motion and Work. This project has also got the peculiarity of making it possible to reuse materials and equipments which are often available and underutilized in our schools.
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Keywords: Animation, Optical-toys, Motion, Visual and Technological Education, Zootrope. 1. INTRODUÇÃO O presente artigo acerca do projecto Do Velho se fez Novo surge no âmbito da disciplina de Oficina de Recursos de Apoio Pedagógico do Curso de Mestrado de Educação Visual e Tecnológica no Ensino Básico, da Escola Supe-rior da Educação do Porto. O produto do projecto refere-se a um recurso que é proposto como um instrumento de grande potencialidade para a exploração de diversos con-teúdos na disciplina de Educação Visual e Tecnológica, do segundo ciclo do ensino básico. A construção do Zoo-trope é um processo acessível que proporciona a oportu-nidade de trabalhar o princípio básico da Animação, criando mecanismos com recurso à reciclagem e reutiliza-ção de materiais. O principal objectivo é demonstrar, passo a passo, como construir um zootrope, apresentando e sugerindo mate-riais de fácil acesso, bem como, apontar propostas de actividades passíveis de serem trabalhadas a partir deste recurso.
Figura1. Zootrope
2. METODOLOGIA O desenvolvimento do projecto Do Velho se fez Novo nasceu a partir da investigação, recolha e análise de brin-quedos ópticos já existentes, cuja pesquisa foi efectuada através da recolha de informação em suporte digital e manuseamento de alguns exemplares. A ferramenta mais utilizada foi o motor de busca da Internet a partir de pala-vras-chave, tais como: brinquedos ópticos, ilusão óptica, animação, movimento e zootrope. A selecção da informação teve em conta os seguintes critérios: o grau de pertinência, ilustração de conteúdos, fidelização de informação e contributo informativo. As imagens a usar nas tiras de animação foram concebi-das a partir de trabalhos de alunos e manipuladas digital-mente de forma a montar a tira cinematográfica. Todos os restantes materiais usados no Zootrope são excedentários de construções anteriores, executadas nas aulas de EVT. As propostas de exploração de conteúdos tiveram por base o programa do ministério da Educação. 3. ENQUADRAMENTO TEÓRICO De acordo com Costa (2005) “desde as pinturas parietais da pré-história é possível perceber a tentativa dos homens primitivos para compreender o movimento ou a percepção visual deste através da utilização de alguns 68
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recursos para representar a acção continua dos homens e da natureza.” É certo que o fascínio do Homem pelo processo de trans-formação de imagens estáticas em movimento vem já de há longos anos. Muito antes de nascer o cinema, tal como o conhecemos, já existiam, desde a antiguidade, algumas produções bem sucedidas. Os gregos já exploravam o princípio da câmara escura que consistia em deixar passar a luz, através de um pequeno orifício, numa sala escura, projectando a imagem de forma invertida. Conceito ainda hoje usado no âmbito da fotografia, mãe por excelência do cinema.
No séc. XIX, principalmente na Europa, investiu-se na criação de objectos que viriam a ser os primórdios do cinema, sobretudo, cinema de animação. Eram objectos que se serviam de truques de magia e ilusões de óptica criados com a finalidade de entreter e divertir o público. No entanto, permitiram também comprovar a existência de uma capacidade do olho humano: a persistência das imagens na retina. Este fenómeno refere--se à reacção química dada nos cones sensíveis à luz que ocorre na retina ocular, durante uma pequeníssima fracção de segundo e que transmite ao cérebro a informação como imagem. Esta capacidade é fundamental para a existência e evolução do cinema. Neste sentido, o Thaumatrope teve um papel fundamental na medida em que, foi atra-vés dele, que se comprovou o fenómeno. A partir deste, muitos outros brinquedos ópticos surgiram, nomeada-mente, o zootrope. Por alguns, traduzido por «roda da vida», é um brinquedo que em muito aponta para a animação. Explorado no séc. XIX pelo inglês William Horner, todavia, foi com o francês Pierre Devignes, que se finalizou e nomeou. O Zootrope consiste num cilindro que gira em torno de um eixo vertical. Dentro desse cilindro encontram-se figuras (desenhos), semelhantes a uma película cinematográfica, que são observadas pelo espectador a partir de fendas equidistan-tes, rasgadas no cilindro, ficando cada desenho em corres-pondência com o intervalo de duas fendas consecutivas. Produzindo assim a ilusão do movimento. Figura 2. As primeiras fotografias realizadas sobre o movimento, por Eadweard Muybridge (18301904)
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Figura 3. Materiais reutilizados usados na construção do zootrope
Figura 4. Estrutura da base
Figura 5. Pormenor da base
4. RECURSO EDUCATIVO Embora pareçam antigos, a construção destes brinquedos ópticos podem ser amplamente potencializados pelo uso da tecnologia hoje disponível. No que respeita ao zootro-pe especificamente, torna-se muito mais fácil montar uma série de imagens (desenhos) no computador e depois imprimi-los do que fazê-lo à mão. Para isso, poder-se-á usar, por exemplo, um software de design onde facilmente se definem os espaços equidistantes e se enquadram as imagens. Até porque, é fundamental, para o bom funcio-namento do brinquedo, que a estrutura principal da ima-gem seja constante. Para construir este zootrope, começámos por estruturar uma base, à custa de uma placa de madeira (ou material similar), adaptámos-lhe uma manivela, um tubo de metal, um elástico (material de desgaste) e tampas de miniaturas de gel. De seguida, construímos o tambor a partir de uma tampa circular de uma caixa de biscoitos, na qual se fez um furo no ponto central. Nessa tampa circular encaixamos uma tira de cartolina, que foi cortada com dez fendas espaça-das de forma equidistante, para que se possam ver as imagens, que formarão a animação. Concluiu-se a construção do zootrope montando sobre a base dois eixos: um que foi ligado ao tambor, para auxi-liar a sua rotação; outro, sobre o qual se construiu uma manivela, e que foi ligado ao eixo sob o tambor com um elástico, que serve como “correia de transmissão”. 4.1 Exploração do recurso Para uma aprendizagem global, tão importante nos dias de hoje, é urgente incutir nos alunos valores éticos e morais como um pilar fundamental à sociedade. Reci-clar é, na actualidade, extremamente importante dada a situação preocupante em que se encontra o planeta. Promover a política dos 4 R’s (reduzir, reutilizar, reci-clar e reinventar), como uma prática necessária ao bem-estar de todos, é fundamental para garantir o futu-ro. Todos nós somos responsáveis pelo desenvolvimen-to, aqui, a consciência cívica no outro, e a escola, desempenha aqui um papel primordial. Reciclar permi-te explorar diversos materiais, técnicas e expressões. Reaproveitar embalagens de produtos que consumimos diariamente é contribuir para a preservação do ambien-te e para a diminuição de gastos de energia. Procura-mos, que os alunos passem a ter consciência crítica como consumidores, motivá-los para que seleccionem os produtos que consomem e desenvolvam hábitos de reutilização, pois, reciclando, podemos produzir objec-tos novos e originais, sem que com isso tenhamos gas-tos adicio70
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nais. Embalagens de metal, de cartão e de plástico são materiais de uso doméstico a que qualquer criança tem acesso. Na própria escola acumulamse materiais e equipamentos passíveis de serem utilizados na construção do mecanismo que propomos. Desta forma, damos resposta ao problema a que nos propu-semos - dar uma nova vida a materiais e equipamentos em desuso, como forma de contribuir para um planeta melhor.
Figura 6. Tambor
Figura 8. Tira de desenhos com ranhura
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Figura 7. Estrutura final
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4.2 Aplicação em contexto da EVT Procuramos com este trabalho motivar os alunos para uma aprendizagem sobre a origem do cinema. Através da construção do zootrope, eles passam a conhecer uma, de entre muitas outras formas de fazer animação. No entanto, procuramos que este mecanismo incuta a necessidade nos alunos por quererem saber mais sobre Animação e os mecanismos com ela relacionados. É importante ainda salientar que, ao realizarem, passo a passo, todo o processo de construção, os alunos estão a concretizar aprendizagens verdadeiramente significati-vas: aprender a aplicar os conhecimentos de Geometria como resposta a uma necessidade e não apenas como mero exercício; compreender a importância de selec-cionar materiais de acordo com as suas características; reconhecem as suas fragilidades e aplicam as suas potencialidades. Desenvolver a criatividade e capaci-dade de resolver problemas são os grandes objectivos a atingir. Seguem-se algumas imagens da actividade em contexto de sala de aula.
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5. CONCLUSÃO Para a construção deste modelo didáctico, foi necessária uma dedicação de muitas horas. Muitas experimentações foram realizadas e algumas tentativas saíram falhadas. Algumas vezes, foi preciso recomeçar, porque o que nos parecia estar certo, em determinada altura, no momento da verificação, os resultados não eram os esperados. Está-vamos a tactear numa tarefa relativamente à qual éramos inexperientes e era preciso avançar página
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por tentativas. Por isso, os resultados positivos não foram imediatos. Contu-do, a pouco e pouco a obra nasceu e foi-se desenvolven-do, fruto de uma vontade, persistência, motivação e curio-sidade dos alunos. Estes sentimentos levam-nos à desco-berta e alimentam as suas capacidades de criarem e recria-rem novos modelos. Como defende Luckesi (2002, p. 24) A actividade lúdica é aquela que propicia a ‘plenitude da experiência’. Não se trata apenas de diversão, mas antes de incentivo à plena dedicação do aluno. Este tipo de actividade promove um envolvimento completo e poten-cia a aquisição de aprendizagens verdadeiramente signifi-cativas. Ao longo das várias sessões de trabalho via¬ se aguçada a curiosidade dos alunos relativamente ao mundo da anima-
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ção, despertada através deste instrumento pedagógico, em contexto de sala de aula. Ele veio também servir como meio incentivador para desenvolver conhecimentos no âmbito da Animação e do mundo da imagem animada. Todos os alunos intervenientes aderiram entusiasticamen-te ao projecto, tendo até, manifestado o desejo de cons-truírem outros brinquedos ópticos. Eles foram, a pouco e pouco interiorizando a ideia de que, sem grande esforço, nada se pode alcançar na vida e que vale sempre a pena não desistir de uma tarefa, quando ela nos parece impos-sível de concretizar. Estes argumentos levam-me a concluir que valeu a pena o esforço, porque os objectivos foram totalmente alcança-dos. Ficou a germinar, nos alunos, a semente da motivação para outras experiências semelhantes. Poderosa lingua-gem que é a animação, sucesso entre as crianças, deve-se caracterizar uma didáctica eficiente capaz de despertar o senso crítico e ainda auxiliar o professor no conteúdo programático. (autor desconhecido). Referencias Bibliográficas Faleiro, A. e Gomes, C. (2004). Gesto e Imagem, Educa-ção Visual e Tecnológica 5.º/6.ºano.1ª Edição, Porto edi-tora. Luckesi, Cipriano C. (2002). Ludicidade e Actividades Lúdicas: Uma Abordagem a Partir da Experiência Interna. In, Porto, Benardete S. (Org). Ludicidade: O Que É Isso Mesmo? Salvador: UFBA, 2002 http://www.apevt.pt/recursos_galerias_video.htm http://www.cienciamao.usp.br/tudo/busca.php?key=ilusoes%20de%20 otica%20-%20zootropio http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/2266-6.pdf http://imagem-aimagem.blogspot.com/2008/02/histria-zootrope.html h t t p : / / w w w. i n v i v o . f i o c r u z . b r / c g i / c g i l u a . e x e / s y s / s t a r t . htm?infoid=866&sid=7 http://oficinadocj.wordpress.com/zootropio/ http://www.google.pt/images?um=1&hl=pt-pt&client=firefoxa&rls=org.mozilla:en-US:official&channel=s&q=Eadweard+Muybridge &ie=UTF-8&source=univ&sa=X&ei=0gNrTdnoE86WhQe8-pWiDw& ved=0CC0QsAQ&biw=1280&bih=618 http://tecnologia-e-cinema.com/2010/08/o-fascinio-pelo-movimento/
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sumário 2
Ficha Técnica
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Editorial
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Divulgar, partilhar e disseminar a integração de ferramentas digitais na disciplina de EVT com o EVTdigital JOSÉ ALBERTO RODRIGUES ANTÓNIO MOREIRA
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Formação de professores numa dimensão reflexiva PAULO FERNANDES
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EVTux: : uma distribuição de Linux para a disciplina de EVT JOSÉ ALBERTO RODRIGUES ANTÓNIO MOREIRA
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Colecção Carrocel: um caso de ilustração feita por crianças e para crianças JOÃO CAETANO
36 A validade da EVT nas práticas educativas e no contexto social do século XXI – Uma sinopse para a comunidade escolar RICARDO REIS PEREIRA 40 “Pintar a Cidadania” MARIA FLOR GOMES 46 À Descoberta de Mecanismos ANETE FERNANDES CLÁUDIA ALVES JORGE ADÃO 59 Caixa de retratos MARIA FERREIRA PAULA MAGALHÃES SOFIA LAGES 67 Animação: Do Velho se fez Novo ANTÓNIA ALVES EMILIA CRUZ MARTA ABREU 75 Sumário
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