A INDUMENTARIA DE EPOCA E A ARTE DE
NO CINEMA BRASILEIRO
JEFFERSON RIB
A INDUMENTARIA DE EPOCA E A ARTE DE
NO CINEMA BRASILEIRO jefferson rib JEFFERSON RIB ORIENTACAO: LIDIA KOSOVKI Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas do Centro de Letras e Artes da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, como requisito parcial para obtenção do grau de mestre em artes cênicas. Orientação: Profª. Drª Lidia Kosovki
Rio de Janeiro 2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - UNIRIO Centro de Letras e Artes - CLA Programa de Pós-Gradruação em Artes Cênicas - PPGAC “A INDUMENTÁRIA DE ÉPOCA E A ARTE DE LUIZ CARLOS RIPPER NO CINEMA BRASILEIRO” por JEFFERSON RIBEIRO PEIXOTO Dissertação de Mestrado BANCA EXAMINADORA Profª. Drª. Lidia Kosovski - Orientadora Profª. Drª. Maria Cristina Volpi Nacif (UFRJ) Profª. Drª. Doris Rollemberg Cruz (UNIRIO) Profª. Drª. Angela de Castro Reis (UNIRIO) A banca considerou a dissertação: APROVADA Rio de Janeiro, RJ, em 05 de outubro de 2015 Av. Pasteur, 436 - Urca - RJ CEP: 22.290-240 Tel.: (21) 2542-2565 http://www2.unirio.br/unirio/cla/ppgcla/ppgac/ clappgac@gmail.com
P379 PEIXOTO, Jefferson Ribeiro. A indumentária de época e a arte de Luiz Carlos Ripper no cinema brasileiro / Jefferson Ribeiro Peixoto, 2015 216f.; 30cm Orientadora: Lidia Kosovski Dissertação (Mestrado em Artes Cênicas) - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015. 1. Ripper, Luiz Carlos, 1943-1996 - Crítica e interpretação. 2. Vestuário na arte. 3. Trajes. 4. Cinema brasileiro. I. Kosovski, Lidia. II. Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Centro de Letras e Artes. Curso de Mestrado em Artes Cênicos. III. Título. CDD - 704.949391
À minha mãe, ao meu pai e ao meu irmão, pelo amor mais real e verdadeiro.
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao universo e à vida; Agradeço à minha querida orientadora Profa. Lidia Kosovski. Obrigado por me ajudar a percorrer os caminhos que resultaram nesta dissertação. Obrigado por respeitar minhas escolhas, pelas conversas, pela confiança, por sua amizade, por doar seu tempo e compartilhar seus conhecimentos e sabedoria. Que a vida continue a nos unir. Agradeço à CAPES pela concessão da bolsa e suporte dado à pesquisa. Agradeço à banca examinadora pela leitura atenciosa. Obrigado, Profa. Doris Rollemberg, pelo apoio e carinho, que me acompanham desde os primeiros semestres da graduação e me fizeram “permanecer no bonde”, seguinte em frente. Obrigado, Profa. Angela Reis, inspiração acadêmica e de vida, que certa vez disse que eu deveria publicar um trabalho de conclusão de curso e plantou uma semente, mesmo sem saber. Obrigado, Profa. Maria Cristina Volpi Nacif, por aceitar o convite e vindouras contribuições. Agradeço também aos integrantes suplentes, à Profa. Zalinda Cartaxo, por todo aprendizado que me proporciona desde Artes Plásticas I, e ao Prof. Pedro Modesto.
Agradeço ao Ney Madeira, por integrar a banca de qualificação. Agradeço à Beth Filipeck e suas aulas inspiradoras, que mudaram meu olhar sobre a indumentária e a arte do figurino. Agradeço à Heloisa Lyra Bulcão, pelo presente precioso e essencial para as páginas seguintes e pela ajuda com as imagens na reta final. Agradeço à Aline Ribeiro e à Julia Stadler, pelos almoços orgânicos, cafés, revisão de texto e todo o apoio. Agradeço ao Bruno Ribeiro e Barbara Meinicke, pelas cervejas (boas e ruins), pela amizade e pelo grande suporte material. Agradeço à Dariana Abreu, por existir e por todo o resto. Agradeço aos amigos queridos que ajudaram na revisão, discutiram ideias ou contribuíram de alguma forma. Leonardo de Morais, Débora Oelsner, Matheus Rufino, Thulio Gomes, Suellen Ribeiro. Vocês têm meu amor e gratidão.
Esta dissertação propõe uma reflexão acerca da indumentária de época no contexto do cinema brasileiro. Percebe-a como possível objeto de afirmação ideológica de sua conjuntura cinematográfica e, ao mesmo tempo, signo cênico a contribuir para a significação da narrativa fílmica. Assume o figurinista, uma vez integrado ao filme histórico, como um artista que, através das propriedades formais da indumentária, representa visualmente o passado, moldando-o sob condições técnicas específicas e perspectivas do presente. É um artista, portanto, seminal no desenvolvimento de um imaginário nacional, que tem na arte cinematográfica seu principal meio de consolidação.
O trabalho tem como recorte a filmografia de Luiz Carlos Ripper (1943-1996), cenógrafo e figurinista em atividade no âmbito cinematográfico do final da década de 1960 até meados de 1980. Atribui destaque especial aos filmes Azyllo Muito Louco (1970), de Nelson Pereira dos Santos, Xica da Silva (1976) e Quilombo (1984), ambos de Cacá Diegues, dos quais o estudo compreende a representação histórica de Ripper como uma forma autoral de pensar e expressar o passado do Brasil. Dada a potência estética de sua indumentária de época, alcançada pela manipulação de formas, cores, materiais e texturas, o artista rompe convenções representativas e discursos históricos oficiais.
palavras-chaves | Luiz Carlos Ripper (1943-1996). Vestuário na arte. Trajes. Cinema brasileiro.
RESUMO/ABS
The present thesis intends to reflect over period costume design in the context of Brazilian cinema. Period costume design is perceived as a possible object of ideological statement about its cinematic conjuncture and, simultaneously, as a scenic sign to contribute to a sense of filmic narrative. The costume designer is, once integrated to the historical movie, seen as an artist that, by means of the formal properties of dressing, represents the past visually, molding it under specific technical conditions and perspectives of the present. Thus, costume designers are fundamental artist in the development of a national imaginary, which has cinematic art as its main form of unification.
The study focuses on the filmography of Luiz Carlos Ripper (1943–1996), set and costume designer in Brazilian cinema from the end of 1960s to mid 1980s. It highlights in a special way the movies The Alienist (1970), directed by Nelson Pereira dos Santos, Xica da Silva (1976) and Quilombo (1984), both directed by Cacå Diegues, from which the study comprises Ripper’s historical representation as an authorial form of thinking and expressing Brazilian past. Given the aesthetic power of his period costumes, created by the manipulation of forms, colors, materials and textures, the artist disrupts representative conventions and official historical speeches.
key words | Luiz Carlos Ripper (1943-1996). Costume design. Clothing. Brazilian cinema.
BSTRACT
SUMARIO
INTRODUÇÃO
1
27
INDUMENTÁRIAS, HISTÓRIAS E CINEMAS BRASILEIROS 35
2
LUIZ CARLOS RIPPER E O CINEMA BRASILEIRO 76
1.1 COSTURANDO IDEIAS: INDUMENTÁRIA, MODA, FIGURINO, FIGURINO REALISTA E FIGURINO DE ÉPOCA
38
1.2 CINEMAS BRASILEIROS QUE REVELARAM ÉPOCAS – OU VICE-VERSA 46
1.2.1. INCE e Humberto Mauro: uma imagem didática? 46 1.2.2. Vera Cruz: um figurino industrial? 57 1.2.3. Cinema Novo: um novo figurino? 63 1.2.4. Independência ou Morte: um caso emblemático? 68
2.1 OS FILMES DE ÉPOCA DE RIPPER
78
2.1.1. O rural: São Bernardo 78 2.1.2. O cangaço: Vingança dos 12 e Faustão 86 2.1.3. Os tropicalistas: Brasil Ano 2000 e Os herdeiros 2.1.4. Os históricos: Azyllo Muito Louco, Pindorama, Xica da Silva e Quilombo 97
90
2.2 QUESTÕES DE UM ARTISTA: UMA NOVA VISUALIDADE 2.2.1. “Maravilha de um mundo desconhecido”: um figurinista-pesquisado 117 2.2.2. “Três mil metros de algodão azul claro”: construindo épocas no cinema tupiniquim
3
A NARRATIVA HISTÓRICA E VISUAL DE RIPPER 133
3.1 A ALEGORIA DE AZYLLO MUITO LOUCO 3.2 A FESTA DE XICA DA SILVA 3.1 O ÉPICO QUILOMBO
CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS
203
200
180
147
134
124
105
INTRODUCA
AO
A imagem de Zezé Motta como Xica da Silva pelas ruas do Arraial do Tijuco, atual Diamantina-MG, recém-alforriada e incontrolavelmente alegre, em um caminhar saltitante e eufórico correspondido por suas mucamas. A música de Jorge Ben – “Xica da / Xica da / Xica da / Xica da Silva, a negra” – acompanha a cena e virou uma espécie de hino que compõe o imaginário sobre a personagem. Imaginário que o filme de Cacá Diegues em 1976 ajudou a construir – até então, o desfile campeão e revolucionário da escola de samba Acadêmicos do Salgueiro, na Avenida Presidente Vargas em 1963, era a principal referência imagética na construção popular da personagem. Na cena do filme, a liberdade de Xica se reflete no dourado do vestido e da peruca; ela, junto a sua comitiva de escravos, forma uma mancha luminosa no espaço da cidade, contrastando com a sobriedade e escuridão do traje dos transeuntes nas ruas mineiras de pedra. Xica da Silva, bem provável, é o trabalho mais popular de Luiz Carlos Mendes Ripper (1943-1996). A indumentária do Brasil do século XVIII recebe cores e formas e plumas e brilhos que, somados à força e iconicidade da personagem-título, garantem instantes representativos não somente da proposta bem -humorada desta narrativa2 histórica, mas do papel do figurinista como integrante determinante na construção da imagem de um tempo e de um país. E talvez seja nessas interferências decisivas sobre certa familiaridade imagética de um tempo/lugar que reside a potência do trabalho do artista, o qual esta dissertação deseja refletir e elucidar a partir de sua representação singular do passado do Brasil através da indumentária no cinema nacional. Ripper, artista carioca, traçou ao longo de sua vida extensa carreira no teatro e no cinema. Nas artes cênicas, procurou romper a rigidez do palco italiano: na montagem de Hoje é dia de Rock (1971), direção de Rubens Corrêa, “trabalhando [...] a totalidade do espaço, libertou-o da ilustração, da ambientação como um retrato” (CRUZ, 2002, 85) através de uma cenografia que reconfigurava a forma do Teatro Ipanema; um extenso corredor, área da encenação, dividia o público em duas seções. Já em 1974, Ripper assina direção, cenografia e figurino de Avatar e encena o texto de Paulo Afonso Grisolli na Sala Corpo e Som do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro em uma ambientação constituída por elementos da