RESENHA TIFFIN, John. RAJASINGHAM, Lalita. A universidade virtual e global Tradução: Vinícius Figueira Porto Alegre, Artmed, 2007
87 Dr. Jerônimo Freire Vice-diretor de Ensino da Faculdade de Ciências Empresariais e Estudos Costeiros de Natal FACEN, campus Prudente de Morais, Natal, RN. Doutorando em Educação pela PPGED/UFRN.
O livro A universidade virtual e global de John Tiffin e Lalita Rajasingham, publicado na versão portuguesa e lançado na Conferência Mundial de EAD (ICDE setembro de 2006), no Rio de Janeiro, é mais uma obra que trata do fenômeno das escolas e universidades “virtuais”. De leitura agradável, seus autores discutem o impacto das novas tecnologias da era da globalização nas velhas instituições e metodologias de ensino superior. A obra não é um estudo de caso de determinada instituição real. Não apresenta uma revisão de literatura sobre diversos casos, que possa servir como base para o estudo acadêmico do fenômeno e da formulação deprincípios gerais que expliquem o sucesso e fracasso de alguns empreendimentos nessa área; e, principalmente, não apresenta nenhuma receita mágica de como construir uma universidade virtual e global. O texto expõe os argumentos dos pesquisadores com base em fatos, descrevendo e analisando algumas características principais de uma universidade Revista Técnica IPEP, São Paulo, SP, v. 7, n. 1,p. 87-91, jan./jun. 2007
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virtual, operando on-line em uma escala planetária. É de fato um texto com argumentos fortes para a internacionalização do ensino superior. De acordo com a Organização Mundial do Comércio, a educação universitária é um serviço de informação que pode ser comercializado globalmente. Nesse sentido, Tiffin e Rajasingham defendem suas teses, distribuídas em nove capítulos, cujo argumento maior sustenta uma educação superior mais universal, fruto das novas tecnologias de comunicação e informação, libertando dessa forma a tradicional aprendizagem ligada às variáveis tempo e espaço. O texto é atual, e o livro tem como público-alvo professores, estudantes, mas principalmente gestores dos estabelecimentos de ensino superior. Na introdução observamos uma frase que julgamos ser verdadeira embora ainda não cristalizada na literatura: “A sociedade da informação está tornando-se uma sociedade do conhecimento”. E nesse sentido um sistema educacional se faz
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necessário. O que nos chama a atenção é o fato de que o autor não cita em nenhum ponto do livro a obra de Manuel Castells, A sociedade em rede, fonte de informações valiosas para caracterizar uma instituição com foco nas tecnologias de informação e comunicação no século XXI. Esta resenha, portanto, tem a intenção de ilustrar os pontos considerados importantes para uma discussão com o leitor que deseje futuramente ler o livro. Na leitura do texto, historicamente, podemos observar que as sociedades industriais se tornaram possíveis com a educação de níveis fundamental e médio universais. Uma sociedade do conhecimento precisa de educação superior que esteja disponível para quaisquer pessoas ao longo da vida adulta, e que estas desenvolvam habilidades cognitivas e profissionais necessárias para a sobrevivência em um mundo orientado para a tecnologia. O capítulo 1 descreve a evolução da instituição universitária, identificando o paradigma de cada uma em sua época. Nesse capítulo encontramos os referenciais para a passagem de uma universidade tradicional para uma universidade virtual e global. Destacamos, nesse sentido, a Universidade Medieval, na qual o conhecimento se baseava na vontade de Deus e estava revelado na Bíblia, em sua versão latina. Por outro lado, na Universidade Moderna, o conhecimento se baseia nos textos de autores que tenham autoridade e sejam amplamente referenciados, que racionalizam com base em fundamentos lógicos aceitos e se intertextualizam em uma comunidade de colegas para desenvolver corpus de conhecimento, escritos preferencialmente na língua do Estado que Revista Técnica IPEP, São Paulo, SP, v. 7, n. 1,p. 87-91, jan./jun. 2007
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sustenta a universidade. A Universidade Moderna, que surgiu durante o Iluminismo para atender às necessidades do estado nacional por meio da aplicação do racionalismo científico, ainda está viva. No entanto, os autores afirmam que o paradigma filosófico do que se ensinava e pesquisava mudou da teologia para o cientificismo racional, na medida em que a universidade se adaptava à mudança epistêmica do medieval para o moderno; mas a forma institucional da universidade permaneceu relativamente constante. O que se ensina mudou, mas o modo como se ensina permaneceu o mesmo. Uma questão com a qual deparamos ao projetar uma universidade virtual e global para o futuro é: dentro do paradigma da universidade como instituição, ela terá continuidade? Os sistemas educacionais tradicionais são de um tipo especial de sistema de comunicação em que há quatro fatores fundamentais: professores, alunos, conhecimento e problemas. O núcleo do processo comunicativo é a interação do professor com os alunos a fim de ajudá-los a aplicar o conhecimento aos problemas. Nos sistemas educacionais convencionais, as tecnologias que fazem o sistema de comunicação baseiam-se no transporte da informação e no local onde ocorre o processo de ensino-aprendizagem. Os professores e alunos viajam pelas rodovias ou ferrovias para se encontrar em uma sala de aula. Carregam consigo o conhecimento e os problemas que estão em suas cabeças, nos livros ou cadernos. O conhecimento também está presente nas bibliotecas. Nos capítulos de 3 a 7, o livro aborda os aspectos relacionados à mediação entre alunos, professores, conhecimento e problemas em uma universidade virtual e global. A diferença radical entre a universidade virtual e todas as universidades anteriores é que alunos, professores, conhecimento e problemas se reúnem como bits de informação, e não como substância atômica. As telecomunicações e os computadores substituem as estradas e os prédios. O capítulo 3 examina os processos fundamentais de comunicação envolvidos no ensino universitário. Esses processos são interativos, e os alunos de hoje têm uma participação maior neles, mas é ainda sobre o professor que recai a responsabilidade principal por iniciar o ensino. Isso quer dizer que um professor universitário deve ser capaz de projetar e administrar o ensino; explicar e demonstrar como o conhecimento se aplica aos problemas; estabelecer tarefas, testes e exames que permitam aos alunos a prática do sintagma; avaliar o desempenho do aluno e dar uma resposta a esse desempenho para melhorá-lo; motivar os alunos, envolvendo-os em uma interação conhecimento-problema; apresentar os alunos à
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comunidade de conhecimento no paradigma da disciplina e ajudá-los a pesquisar, contextualizar e refletir sobre a maneira como aprendem. O capítulo 4 sugere a presença dos JITAITs (Just in Time Intelligent Tutors), sistemas automatizados capazes de realizar as atividades mortificantes e repetitivas do ensino
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consistem em verificar as mesmas respostas para as mesmas perguntas, ou em controlar os aspectos administrativos do ensino. A Internet tornou possível unir alunos, professores, pesquisadores, conhecimento e problemas por meio dos sistemas telefônicos e dos computadores. Essa é a base da universidade virtual. O capítulo 8 trata do currículo para uma universidade virtual e global, que atenda à questão da própria globalização como base para retornar ao ideal de uma universidade que lide com o universo do conhecimento. Na opinião dos autores, esse currículo deve ser ensinado em um contexto que estimule o ensino em profundidade, sendo necessário para isso um campus
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virtual que possa encantar da mesma forma que Oxford fazia no passado. São perfeitamente claras as informações dos autores no que diz respeito ao futuro das instituições de ensino de nível superior, considerando seu papel na sociedade e principalmente sua maneira prática de, enquanto empresa, servir ao aluno. No entanto, a proposta lançada no livro da universidade virtual e global não trata de aspectos já discutidos em fóruns internacionais (Declaração de Bolonha em 1999). Nesse sentido, já é de conhecimento público a acentuada competição internacional e reconhecido o caminho para alguma forma de globalização das economias e das sociedades humanas. Desse modo, a maioria dos países europeus está introduzindo reformas em seus sistemas de ensino superior com os objetivos de (1) aumentar a eficácia do ensino/aprendizagem; (2) melhorar a produção de ciência, tecnologia, cultura e arte em seus países; (3) aumentar a atratividade da Europa como destino; (4) conseguir ganhos de eficiência num contexto de reestruturação econômica de participação crescente de jovens e adultos no ensino superior; (5) garantir a consolidação do mercado de trabalho europeu e (6) aumentar a produtividade de seu trabalho. Nesses fóruns são discutidos também os problemas da estrutura de graus e da organização curricular, pretendendo-se dar mais atenção ao paradigma da aprendizagem. Para concluir esta resenha, lançamos a pergunta: qual será a missão civilizadora das universidades globais e virtuais e a quem elas servirão? Tiffin e Rajasingham concluem o livro com um parágrafo que, além de suscitar discussão, Revista Técnica IPEP, São Paulo, SP, v. 7, n. 1,p. 87-91, jan./jun. 2007
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põe-nos diante de reflexões oportunas e pertinentes. Dizem os autores: os territórios a serem explorados e reclamados são os mundos virtuais dentro de nós e aqueles localizados nas florestas crescentes da tecnologia da informação e comunicação. O que precisa de civilização é o que conhecemos hoje como globalização. Os profissionais que uma universidade virtual e global produzirá são aqueles que trabalharão em âmbito global. Os indivíduos que deve inspirar são os que buscam um insight que esteja além do aprisionamento inerente aos paradigmas nacional, cultural, lingüístico e de pesquisa. A busca, como sempre na universidade, é por sabedoria na busca da verdade.
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