CAPA
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Prefeitura Municipal de Alagoa Grande
O MUNICÍPIO DE ALAGOA GRANDE regozija-se pela data de hoje e homenageia o seu genial filho JACKSON DO PANDEIRO (José Gomes Filho) na passagem do Centenário de seu nascimento, quando todo o Brasil, reverenciando a sua memória, lembra os grandes sucessos que fizeram dele O REI DO RITMO e reconhece em sua pessoa uma das maiores figuras da música popular brasileira.
Alagoa Grande, 31 de agosto de 2019 Prefeitura Municipal de Alagoa Grande
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ISSN: 2357-8335
CARTA AO LEITOR
SUMÁRIO
O Brasil, notadamente o Nordeste, está a comemorar este ano a passagem do centenário de nascimento de José Gomes Filho, que outro não é senão Jackson do Pandeiro, o endiabrado intérprete de centenas de composições, muitas das quais se tornaram verdadeiros sucessos no âmbito da música popular brasileira. O Brasil vive cheio de fenômenos, em todos os setores da vida nacional. No futebol, na música, na política, na literatura, nas artes, sempre desponta alguém que, atingindo os píncaros de sua atividade laboral ou artística é logo alçado à condição de fenômeno, obtendo da mídia uma consagração... fenomenal. O jogador Ronaldo chegou a um ponto tal que passou a encarnar a própria condição de fenômeno, isto é, não mais se dizia ser ele um fenômeno do futebol ou do esporte, mas, sim, propriamente, ele era O Fenômeno, sem necessidade de designar-lhe o nome. Dizia-se simplesmente, o Fenômeno vai jogar, o Fenômeno será escalado, o Fenômeno vai para o futebol europeu etc. etc. O escritor Paulo Coelho foi outro brasileiro que chegou às culminâncias, não da literatura, mas da vendagem de livros, jamais alcançado por nenhum outro escrevinhador pátrio. O Ex-Presidente Lula foi mais um brasileiro merecedor da condição de fenômeno. Quem diria que um mero metalúrgico, nos anos setenta do século passado, pudesse alçar-se, no terceiro milênio, à curul presidencial da República, chegando a merecer do Presidente Obama o epíteto de “O Cara” e obtendo do povo brasileiro a esperança de melhores dias? Pouco depois, porém, deixando-se levar por maus ventos, o fenômeno lulista deu no que deu... Várias outras personalidades nacionais poderiam ser mencionadas como fenômenos, porém, em nenhuma delas a condição calha tão bem quanto na figura de José Gomes Filho, o JACKSON DO PANDEIRO, cujos cem anos são, agora, comemorados. Como bem diz o seu biógrafo maior, Fernando Moura, Jackson tinha tudo para não dar certo, mas deu... . “...era negro, pobre, analfabeto, de uma região pobre, feinho, franzino. Era para ser mais um desafortunado da vida, como tantos outros milhões de nordestinos”, afirma. No entanto, Jackson, mudando-se para Campina Grande, depois para o Recife, em seguida para o Rio de Janeiro, foi subindo, degrau por degrau, a escada que o faria galgar um lugar de destaque na música popular brasileira, exercendo influências, fazendo seguidores, atraindo fãs, estimulando cantores, compondo, musicando, cantando, gravando, dando nuanças novas ao xote, ao baião, ao frevo, ao xaxado, ao coco, à embolada, emprestando a todos esses gêneros, próprios de sua região, uma unidade rítmica, que o fez reconhecido como o Rei do Ritmo, principalmente pela maneira única como interpretava o forró, manejando o pandeiro, variando o timbre vocálico, nos agudos e nos graves, manifestados nos requebros e pulos de guariba, assumindo, enfim, a condição de o maior fenômeno da música popular brasileira. A revista GENIUS, veículo cultural por excelência, não poderia ficar alheia à festa dos cem anos do REI DO RITMO, a quem se poderia emprestar também a condição de NOTÁVEL ou de GÊNIO, e por isso lança esta edição especial, comemorativa à data.
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ZÉ JACK
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QUANDO JACKSON DO PANDEIRO TOCOU NA CASA DE TOTA
07
O QUIPROQUÓ ENTRE JACKSON DO PANDEIRO E GONZAGÃO
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JACKSON BRASILEIRO
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TINHA TUDO PARA NÃO DAR CERTO, MAS DEU
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JACKSON DO PANDEIRO UM OLHAR VANGUARDISTA
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JACKSON ENTRE FLORES E ANJOS
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SUCESSOS DE JACKSON
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DOIS CANTORES DO SERTÃO: JOÃO GUIMARÃES ROSA E JACKSON DO PANDEIRO
Onaldo Queiroga
Sander Brown
Marcelo Soares
José Medeiros
Entrevista de Fernando Moura a Rosa Aguiar
Sandrinho Dupan
Entrevista de Neuza a Érico Sátiro
Equipe GENIUS
Flávio Sátiro Fernandes
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FATOS E CURIOSIDADES DA VIDA E DA OBRA DE JACKSON DO PANDEIRO
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CHICLETE COM BANANA – A “CRÍTICA À INVASÃO DA MÚSICA ESTRANGEIRA” E A “DEFESA DA MÚSICA BRASILEIRA”
Boa leitura a todos!
Érico Dutra Sátiro Fernandes
Claudio Henrique Altieri Campos
Julho/Agosto/2019 - Ano VI Nº 38 Uma publicação de LAN EDIÇÃO E COMERCIO DE PERIÓDICOS LTDA. Diretor e Editor: Flávio Sátiro Fernandes (SRTE-PB 0001980/PB) Diagramação e arte: João Damasceno (DRT-3902) Tiragem: 1.000 exemplares Redação: Av. Epitácio Pessoa, 1251- Sala 807 – 8º andar Bairro dos Estados - João Pessoa-PB - CEP: 58.030-001 Telefones: (83) 99981.2335 E-mail: flaviosatiro@uol.com.br Impresso nas oficinas gráficas de A União Superintendência de Imprensa e Editora CARTAS E LIVROS PARA O ENDEREÇO OU E-MAIL ACIMA
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CAMINHO DA ROÇA – A MÚSICA DE “SÃO JOÃO” NA OBRA DE JACKSON Claudio Henrique Altieri Campos
Capa: Equipe GENIUS ISSN: 2357-8335
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COLABORAM NESTE NÚMERO: 4
CLAUDIO HENRIQUE ALTIERI CAMPOS [Chiclete com banana – A “crítica à invasão da música estrangeira” e a “defesa da música brasileira”][Caminho da roça – A música de “São João” na obra de Jackson] Mestrado em Artes/Musicologia. Doutorado em Música/Etnomusicologia. Pesquisador Acadêmico.
NEUZA FLORES DOS ANJOS [Entrevista a Érico Sátiro] Natural da Bahia, casou-se com Jackson do Pandeiro depois que este separou-se de Almira Castilho. Neuza passou a acompanhá-lo em shows e apresentações, inclusive como intérprete de vários de seus sucessos. Reside atualmente em João Pessoa.
ÉRICO DUTRA SÁTIRO FERNANDES [Entrevista com Neuza Flores dos Anjos] [Fatos e curiosidades da vida e da obra de Jackson do Pandeiro] Pesquisador musical, notadamente em torno do gênero forró. Grande conhecedor da obra discográfica de Jackson do Pandeiro. ( GENIUS 27)
ONALDO QUEIROGA [Zé Jack] Magistrado, ocupando, atualmente, a 5ª Vara Cível da Capital. No âmbito cultural, é autor de várias obras relacionadas com a música popular brasileira, notadamente a música regional, notadamente a de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião. Publicou, dentre outros, Monólogos do Meu Tempo, Esquinas da Vida, O Rei do Baião.
FERNANDO MOURA [Entrevista a Rosa Aguiar] Paulistano, radicado na Paraíba, Fernando Moura é escritor, folclorista, jornalista e compositor. Escreveu e editou nos principais jornais e revistas paraibanos, desde 1979, quando iniciou a carreira, como repórter do Jornal O Norte. Mais recentemente, foi Diretor do jornal A UNIÃO. Elaborou com Antônio Vicente Filho o livro Jackson do Pandeiro, o Rei do Ritmo, uma biografia do exímio pandeirista e ritmista. FLÁVIO SÁTIRO FERNANDES [Dois cantores do sertão: Guimarães Rosa e Jackson do Pandeiro] Escritor, jornalista, ensaísta, romancista, poeta, membro da Academia Paraibana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano. Diretor e Editor desta revista. JOSÉ MEDEIROS [Jackson Brasileiro] Doutor em Ciência e Engenharia de Materiais pela UFPb (2019), mestre em Administração Pública com ênfase em Criminalística (2012) pela EBAPE/FGV, mestre em Engenharia de Produção (2003) e graduado em Engenharia Civil (2000) pela UFPB. Perito Criminal com ênfase na área de Engenharia. Autor de capítulos de livros e folhetos de literatura de cordel relacionados às Ciências Forenses. MARCELO SOARES [O quiproquó entre Jackson do Pandeiro e Gonzagão] Poeta cordelista e artista plástico, militando com pintura, desenho, xilogravura e outras manifestações plásticas. É membro da Academia Brasileira de Cordel, Pernambuco. Entre outros cordéis, é autor de 7 dias de forró no reino da bicharada, A agonia e a morte do Santo Frei Damião, A aparição do anjo cangaceiro no sertão, A briga de duas quengas por causa de um pé de côco.
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ROSA DALVA AGUIAR [Entrevista com Fernando Moura] Jornalista, atuando por vários anos em diferentes órgãos da imprensa local. Possui graduação em Comunicação Social pela Universidade Federal da Paraíba (1990). Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em Jornalismo e assessoria de imprensa. Possui especialização em Redação Jornalística pela Universidade Potiguar (2010) Atua na TV da Universidade Federal da Paraíba. Mestrado em Jornalismo Profissional pela UFPB. É autora da dissertação Manual de relacionamento de magistrados com a imprensa.
SANDER BROWN (Sanderli J. Silva Segundo) [Quando Jackson do Pandeiro tocou na casa de Tota] Fundador & CEO na empresa Biblioteca Virtual Paul Otlet. Estudou Mestrado em Ciência da Informação na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Estudou MBA Comunicação e Marketing em Mídias Digitais na Faculdade Estácio. Poeta popular. Membro da Academia Paraibana de Literatura de Cordel, onde ocupa a Cadeira n. 17.
SANDRINHO DUPAN (Alessandro dos Santos Silva) [Jackson do Pandeiro – Um olhar vanguardista] Músico, produtor cultural, compositor, começou sua carreira por volta do ano 2000, depois de ter aprendido pife (pífano), violão e pandeiro. Ajudou na organização, produção e gravação de vários CDs, assim como na construção de diversos eventos e shows musicais em Campina Grande. É um batalhador pela identidade cada vez mais firme do forró, livrando-o do desaparecimento diante das arremetidas de ritmos estranhos.
TEM MUITO ZÉ MAS ESTE É ÚNICO
ZÉ JACK Onaldo Queiroga Existem muitos “Zés” nesse mundo de meu Deus. Na Paraíba, nem se fala. Mas um sempre foi único e para sempre lembrado será. José Gomes Filho, nascido em 31 de agosto de 1919, na cidade de Alagoa Grande. Dizem que quando nasceu, o seu chorar já entoou um som diferente. O menino, apesar da infância difícil, do trabalho movido pelo cabo da enxada, da fome que o circundava, nunca perdeu o espírito de criança levada e traquina. O moleque se encantava com a passagem do trem. Educava os ouvidos com o ritmo do coco que sua mãe tão bem entoava. Brincava de mocinho e, para tanto, tinha que ter o seu próprio nome artístico. Assim, o José virou Zé Jack, inspirado em Jack Perry, aquele dos faroestes dos tempos do cinema mudo. Rapazote, deixa sua terra natal para morar em Campina Grande. Começa a tocar bateria, tamborim, ganzá, reco-reco e por fim pandeiro, instrumento que o fascinou e lhe permitiu trocar de nome artístico mais uma vez. Agora já o chamavam de Jack do Pandeiro, eram os tempos da Rádio Borborema. Depois da morte de sua mãe assume de fez o pandeiro, que soava pras bandas da Rádio Tabajara em companhia de Rosil Cavalcante, formando a dupla “café com leite”. Depois, o som aportou nas margens do Capibaribe. E lá estava o Jack na Rádio Jornal do Comércio do Recife. Foi ali, como ele bem dizia: “...então me botaram mais um “s-o-n” para acabar de ajustar o negócio. Então ficou Jackson do Pandeiro.” Descoberto por Nozinho, regente da Orquestra da Rádio Tabajara, passou, então, a se apresentar com os melhores músicos do rádio. Foi a partir dai que o pandeiro voou para conquistar o mundo e transformar Zé Jack no rei do ritmo e da levada. Sem qualquer recurso tecnológico, conseguia executar extraordinariamente uma variação de ritmos, que, como ontem, até hoje impressiona, silencia e faz escola. Pernambuco lhe daria, ainda, o seu grande amor e a parceira definitiva - Almira Castilho. Com ela, formou uma das mais sensuais duplas artísticas do Brasil. Seu primeiro sucesso foi
Sebastiana, música de Rosil Cavalcante. Com Gordurinha vieram muitos outros sucessos, principalmente o “Chiclete com Banana”. Em 1958, estrelou no cinema o filme “Minha Sogra é da Polícia”. Consagrado no sudeste, o gênio sempre foi simples e ingênuo, por isso Alceu Valença o comparava a Garrincha. Em 13 de novembro de 1972 o SESC, São Paulo, realizou uma entrevista com Jackson no programa denominado MPB Especial, o qual teve como entrevistador Fernando Faro e direção geral de Pelão. Naquela oportunidade Jackson se fez acompanhar de Severo na sanfona, Geraldo Gomes no Zabumba e João Gomes no triângulo. Foi um momento ímpar, pois ele contou toda sua trajetória de vida. Suas tristezas, desencantos, alegrias e esperanças. Indagado onde nascera, com seu jeito simples, de pronto, respondeu: “Eu sou da Paraíba, meu camarada. Muita gente pensa que eu sou pernambucano, outros pensam que sou baiano. Sabe como é, todo crioulo pensa logo que é da Bahia. Não sou. Eu sou da Paraíba, de Alagoa Grande....” Em seguida, Fernando Faro quis saber sobre sua cidade. Jackson, sem cerimônia, lhe disse: “A minha cidade, rapaz, não sei se melhorou, não. Eu acho que faz mais de 900 anos que eu saí de lá. Mas eu até gostava de lá, entende, nego véio? Porque tinha o trem, que nas outras vizinhas não tinha, tinha as lagoas para a gente pescar. Também passei uma fome da bexiga lá, por isso não quero voltar lá. Tinha que trabalhar na enxada. Era o que tinha lá em Alagoa Grande, outra coisa mais não tem. Aí eu fui para Campina Grande, onde já melhorou a situação...” Na verdade, Jackson do Pandeiro era um homem do povo, um nordestino que, como muitos outros, rumou para o sul do país. Um retirante que consigo levou um dom artístico. Partiu nas asas do seu pandeiro, conquistou a Rainha da Borborema, Recife, São Paulo, Rio de Janeiro e o mundo. É triste, mas não podemos omitir o fato de que foi com a chegada da Jovem Guarda, e, mesmo com a tentativa de resgate por parte da tropicália, que veio o declínio. Ele passou por
dificuldades financeiras até falecer em 1982. Costumava dizer: “Todo mundo diz que gosta de mim, todo mundo diz que sou sensacional, maravilhoso, autêntico, mas eu continuo quebrando a cabeça para arranjar trabalho. Que diabo é isso?” O fato é que o pequeno grande homem de Alagoa Grande era extraordinariamente simples, puro e de uma riqueza cultural inesgotável. Zé Jack ao mostrar ao mundo o seu talento, elevou, ao mesmo tempo, seu torrão natal. Mas, e nós paraibanos, o que já fizemos ou estamos fazendo por esse legendário irmão? Um dia desses, indagaram-me: há na Paraíba um museu, um memorial, um busto, uma rua, uma avenida, uma praça em homenagem a Jackson? Temos que ser justos: na sua cidade natal, hoje há um museu que abriga um acervo enorme sobre Jackson do Pandeiro. Quando chegamos na cidade de Alagoa Grande, logo avistamos um imenso portal, um pandeiro enorme suspenso no ar, anunciando que ali é a terra do Rei do Ritmo. Todavia, é preciso muito mais, pois é pouco, principalmente se fizermos um paralelo com Luiz Gonzaga, já que o Estado de Pernambuco além de conceder ao “Lua” o título de Pernambucano do Século XX, lá rodovias, restaurantes, praças receberam o seu nome, quando não de suas músicas. Exu, sua terra mantém anualmente, no Parque Aza Branca, duas datas comemorativas no seu calendário para homenagear o nascimento e a eternidade do seu filho ilustre. Em Serrita, no terceiro domingo de julho, temos a Missa do Vaqueiro. Caruaru criou um museu dedicado à sua memória. Por isso, por que a Paraíba não pode ser mais gentil e justa no reconhecimento do mérito de seus filhos, que muito fizeram por essa terra. O certo é que Zé Jack não morreu. O seu som ainda hoje inspira a sonoridade do Cascabulho, Mestre Ambrósio, Alceu Valença, Zeca Baleiro, Lenine, Hermeto Pascoal, Elba Ramalho, Beto Brito, João Bosco, Tom Zé, Escurinho e muitos outros. Viva Jackson do Pandeiro!!!! g ISSN: 2357-8335
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CORDEL PARA JACKSON QUANDO JACKSON DO PANDEIRO TOCOU NA CASA DE TOTA Sander Brown Desde muito pequenino Jackson era um afoito Batucava nas panelas, Pintava o sete, o oito Cantava, assobiava E se enchia de biscoito
O xaxado tava solto Quando Zé, o boiadeiro Fez um forte desafio - Quero ver se és ligeiro, Faça um improviso agora Com Zezim, o cervejeiro.
Jackson aproveitou O desfecho e o pandeirão - Viva o Seu Cabo Tenório inspetor de quarteirão! - É o cabra mais valente das terras do Boqueirão!
Era moleque prodígio Aprendia escutando Viu o cego Ananias Cantar coco, batucando Não pensou nem duas vezes, Foi logo lhe imitando
- Vige como aqui tem Zé. Começou dizendo assim - Zé de baixo, Zé de riba; - Deus me livre, ai de mim Seu xingar a mãe de Zé, São mil Zéis pra dar-me fim.
Aí o Cabo endoidou Dançou coco, dançou samba Caiu nas graças do povo Virou verdadeiro “Bamba” Josefa disse animada: - Cabra macho do caramba
Ananias disse assim: - Não venha me amolar Pois, existe muita treva que eu preciso iluminar. - Não tenho tempo sobrando nem quero lhe ensinar
O povo comemorou - Jackson é bom demais! - Não tem como ficar quieto! - Vai homem, batuque mais! Só Amâncio não curtia Já não aguentava mais
Quando apareceu “Teixeira” (do Forró em Limoeiro) “Dona Zezé” se empolgou Agarando o pistoleiro: - Separa “Morena Bela” Pra tocar por derradeiro?
Jackson não perdoou O cego desengonçado Deu-lhe ginga na cintura Um pandeiro aprumado Duas doses de pirraça E um gogó bem afinado
Jorge Amâncio bebeu todas Que até o senso perdeu Tota que era o anfitrião Chutou o balde, se excedeu Jorge não gostou foi nada Do conselho que lhe deu
Nisso Tota disse: Não” - Faça uma pausa, bacana. - Pois em vou servir agora Um “chiclete com banana” e assim ninguém reclama. - Traga a janta Dona Ana!
Quando o menino cantou Ananias se encheu Apurou bem o ouvido Na batida que ele deu - Fique aqui perto de mim mas, o apurado é meu
O batuque era animado Mas o sangue tava quente Cabo Tenório tentou Acalmar o inconsequente: - Jorge, calma meu compare Se controle, se aguente. - Você é um cabra frouxo. Disse Jorge endiabrado - Cala a boca! (tome um soco) não me chame de tarado! - Eu estou me divertindo, Cabinho mal-amanhado!
Não se aperreie, compadre! Jackson falou confuso - Se é samba que eles querem sua janta eu recuso. - Vamos tocar sem parar desse jeito eu não abuso.
Foi aquele remelexo Zé do Peixe se inspirou Chamou por Sebastiana Que facinho se instigou Dançou meio avacalhado mas, o apurado entrou
Nisso a música parou Cabo “balançou a mão” Sem dizer nem mais um piu Empunhou bem um facão Jorge Amâncio fez carreira Mais ligeiro que um cão
E vendo aquela alegria Biu das cabras pensou bem - Vou contratar o menino, Sebastiana também, rumo à festa da santinha no sítio de Gurinhém.
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Jackson pegou a fama “Rei do toque ritmado” A pancada no pandeiro Lhe tornou um renomado Músico paraibano Ritmista eternizado. g
CORDEL PARA JACKSON O QUIPROQUÓ ENTRE JACKSON DO PANDEIRO E GONZAGÃO Ilustração de Jô Oliveira
Marcelo Soares
Salve Jackson do Pandeiro Nascido na Paraíba Lá em Alagoa Grande Terra de gente de fibra. Forrozeiro de primeira Que dançava gafieira Pulando que nem guariba. Cantor e compositor De forró, porém no samba Xaxado, xote e baião Mandava bem, era um bamba! Foi um grande pandeirista Consagrado como artista Entre a corda e a caçamba. E muito embora cantasse Forró e baião na feira Jackson nas horas vagas Gostava de gafieira Ia a Jacarepaguá Passava a semana lá Metido na pagodeira. Jackson sempre preferia Falar em suas cantigas Das coisas do dia-a-dia As discussões e as brigas... Mas coitado, quem diria Um dia se meteria Em uma dessas intrigas. Nas andanças pelo mundo Em meio a outros cantores Jackson era o preferido Entre os apresentadores No lugar em que cantava, Seu carisma conquistava Muitos admiradores.
As cantigas que gravou Nem ele sabia quantas Parcerias, nem se fala. Não se sabe, foram tantas! E nisso ele nem pensou Até que um dia gravou Uma música de Zé Dantas.
Jackson e Gonzagão Durante anos e anos Foram rivais cordiais E reinaram soberanos Quem dos dois era melhor Ou até mesmo o maior Não estava nos seus planos.
Zé Dantas foi um dos grandes Parceiros de Gonzagão O grande Luiz Gonzaga Famoso Rei do Baião A quem Jackson respeitou Falou bem e divulgou E tinha admiração.
Em mil novecentos e Cinquenta e cinco, olha tu! Jackson grava de Zé Dantas “Forró em Caruaru” Cantiga muito engraçada Onde uma dona danada Provocou um sururu. ISSN: 2357-8335
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Um dia lá se foi Jackson Para cantar num evento “Festa de Bodas de ouro” Do famoso casamento Do Coronel Zé Romão, Homem brabo do sertão, E encontrou Mané Bento.
Um cego gritou: -Socorro! Um outro disse: -Cuidado! Pra não roubarem o bisaco Do cego que é aleijado! Cego dançando forró Eu mesmo não tenho dó! É bom que seja roubado!
Gonzagão disse: -“Seu Jackson Tá armado o buruçu Gravei há tempos atrás ‘O Forró de Zé Tatu’ E nessa cantiga eu digo Sem ter medo, meu amigo Que o frouxo aqui és tu
Mané Bento era um amigo Dos tempos de mocidade Jackson, por admirá-lo. O tratava por cumpade Então foram se sentar, Contar causos, prosear, Para matar a saudade.
Nisso deram um empurrão Nas costas do sanfoneiro Que o pobre arreganhou-se Em cima do zabumbeiro Uma tauba de angelim Resvalou no meu fucim Quase furou meu pandeiro.
Já que andas espalhando Por aí, seu lazarento, Que matastes dois soldados Quatro cabo e um sargento A razão ninguém me tira Cantar e contar mentira É um grande atrevimento.”
Vem conversa e vai conversa Prosa boa pra chuchu! Jackson contou que gravara ‘Forró em Caruaru’ E diz no mesmo momento -“Meu cumpade Mané Bento ali só faltava tu!
Nisso um sargento gritou: O pau comia no centro Naquele grande forró Um velho correu gritando Vou sair do caritó! -Quero saber quem mamou Na Nega De Um Peito Só.
Jackson disse: “Gonzagão Você sabe como eu sou ‘Forró em Caruaru’ Um amigo me ofertou Foi seu parceiro Zé Dantas Que cantigas já fez tantas Que eu gravei e agradou.
Me chamaram pra tocar No forró de Sá Joaninha Uma coroa arrochada Igualmente um trem na linha E lá naquele forró Quase perdi o gogó Cantando a noite todinha!
Uma velha que gostava De cerveja caracu Dizia –“Eu quero um coroa Que faça gulu-gulu” No meio daquele evento Meu compadre Mané Bento Ali só faltava tu.
É melhor que você cale Sua boca de Ticaca Ou corra desembestado Para não entrar na faca Deixe logo de esparro Corto-lhe o fato e amarro Na ponta de uma estaca.”
O forró ‘tava animado Sem nada de sururu Mas uma dona danada De lá de Tacaratu Se engraçou de Jesuíno Meu irmão, cabra ladino, E começou o angu!
Nessa mesma ocasião Foi entrando o Delegado Brabo que só um siri, Me disse: -Cabra safado Agora é a sua vez Você vai para o xadrez, Foi pego dançando armado.
-“Homem, deixe de ser besta” Disse logo Gonzagão -“Pois saiba que estou brincando Não gosto de confusão” Mané Bento, achando graça Trouxe um copo de cachaça Nessa mesma ocasião.
Eu disse: - Seu delegado Eu sou um homem de bem Fui convidado pra festa Não faço mal a ninguém Solte dona Sá Joaninha Essa pobre coitadinha É dona do xenhenhém.”
Jackson logo sossegou Tomou um copo também Gonzagão pôs-se a cantar ‘A Cantiga do Vem-Vem’ Daí então Mané Bento Trouxe as filhas lá de dentro Pra dançar o xenhenhém.
Nessa hora o rei do ritmo Ficou meio abestalhado Sem saber o que fazia, Porque quando olhou de lado Avistou Luiz Gonzaga E resmungou: - Essa praga Não me deixa sossegado.
Reza a lenda que esses dois Não brigaram nunca mais E muito embora até fossem Oponentes e rivais Grande sucesso fizeram Sobretudo porque eram Companheiros cordiais. g
Porém um cabra de peia Empunhou logo um punhal Assoprou o candeeiro Sá Joaninha passou mal Quando a briga começou A polícia já chegou Foi logo metendo o pau. Eu olhei lá pra cozinha Brigavam mais de trezentos A polícia nessa hora Já foi prendendo os briguentos Contei de olhos fechados Sessenta e nove soldados Cinco cabos, dez sargentos. O povo se espremia Era grande o vai-não-vai Quase furou meu pandeiro. Quem está fora não entra Quem está dentro não sai Eu fui cantar um baião Mas me deram um trupicão Que quase que a calça cai.
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O compadre Mané Bento Cochichou: - Olho na mira Respeite o Rei do Baião E deixe de ziquizira Dois soldados, nesse evento, Quatro cabo e um sargento Morreram nessa mentira?” ISSN: 2357-8335
CORDEL PARA JACKSON Xilogravura do artista E. L. (Erick Lima), de Natal
JACKSON BRASILEIRO José Medeiros
Veio lá do interior Um pequenino gigante... Filho de Alagoa Grande, Carregava em seu semblante A alegria de um povo E ritmo a todo instante
De Campina pra Capital... A convite de Nozinho, Regente da Tabajara, Na rádio fez seu caminho E entre grandes parcerias Nunca mais tocou sozinho.
Filho de dona Flora Do Coco, modesta artista, José Gomes carregava O sangue de uma coquista, A pisada do forró E o gingado de um sambista.
Da bela João Pessoa Pra Recife ele partiu E lá Jackson virou... E todo mundo curtiu! Sua ginga foi bater Na capital do Brasil.
De Alagoa pra Campina... Como um simples bolacheiro, Que tocava bateria E tamborim o ano inteiro, Foi acabar se tornando um Fenômeno do pandeiro?
Nas paragens sudestinas, Lá no Rio de Janeiro, Sua fama pipocou, Já que com o seu pandeiro Jackson mais que encantou ⁃ O Jackson brasileiro!
Pra ele tudo era coco E com um pandeiro na mão Começou a virar lenda, Descobriu sua vocação... Impossível estar parado Com seu toque no salão.
Ora “Casaca de couro”, Ora com “Sebastiana”, Foi sucesso atrás do outro, Seu ritmo era bacana, Até atingir o auge Com “Chiclete com Banana”.
E ao artista era preciso Um apelido inventar, Pois “Seu Zé” na Paraíba Havia em todo lugar. Baseado em um faroeste “Jack” foi pandeiriar.
Tempos difíceis vieram... O samba mudou o tom. Sua música ecoava, Mas parecia sem som, Deixando o homem esquecido, Aquele artista tão bom... A sua vida amorosa Também sofreu um revés. Veio uma separação
Que balançou os seus pés, Mas, depois, um novo amor Resgatou os arrasta-pés. Só que depois de uma onda Vem outra pra se surfar E aquela da Tropicália Vem a Jackson resgatar, Reconhecendo o cantor Como um artista singular. De carreira retomada, Jackson foi melhor tratado. Influenciou um monte: Tem cantor de todo lado Dizendo que “rei do ritmo” É seu título sagrado! Depois de uma cantoria Seu pandeiro sossegou... Faleceu em oitenta e dois E à Paraíba voltou. Está em Alagoa Grande Onde tudo começou. É inegável o legado Desse artista brasileiro. Um símbolo da alegria, Um gênio de tom certeiro Viva, viva, viva, viva Viva Jackson do Pandeiro!!! E essa foi a história De um conterrâneo de fé. Contada em simples versos, Com rimas sem quebrar pé. E o danado é que o poeta Também tem nome de Zé!!!
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ENTREVISTA TINHA TUDO PARA NÃO DAR CERTO, MAS DEU Entrevista a Rosa Aguiar
Especialmente para a revista GENIUS
O jornalista, escritor e compositor Fernando Moura foi o entrevistado da jornalista Rosa Aguiar, especialmente para a revista GENIUS. Autor da biografia “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”, juntamente com Antônio Vicente Filho, Fernando Moura é apontado como o maior conhecedor da vida e da obra de Jackson. Herdou da família objetos preciosos do músico e até os restos mortais do rei do ritmo foram enviados para o seu endereço. Na entrevista, Fernando Moura analisa como esse paraibano de Alagoa Grande se tornou um ícone e contribuiu para a construção da Música Popular Brasileira. “...era negro, pobre, analfabeto, de uma região pobre, feinho, franzino. Era para ser mais um desafortunado da vida, como tantos outros milhões de nordestinos”, afirma. Fernando Moura também fala da baixa estima do paraibano. “...a gente só fala em Zé Pereira, na guerra de Princesa, nos conflitos dos anos 1930. Não fala em Canhoto da Paraíba, uma das coisas mais preciosas. Ainda hoje atrapalha, isso de perrepistas e liberais.” O biógrafo de Jackson do Pandeiro está coordenando uma comissão do Governo do Estado que está promovendo ações em torno das comemorações do centenário de Jackson do Pandeiro, que inclui uma grande programação. “O papel do poder público para estimular, incentivar e traçar políticas públicas é fundamental. O decreto do “Ano Cultural Jackson” facilitou muito.” Rosa Aguiar: Você hoje é o pesquisador que mais conhece a vida e a obra de Jackson do Pandeiro. Como surgiu seu interesse por ele?
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FERNANDO MOURA: A minha ideia inicial era mapear a música da Paraíba. Foi quando eu vi que todos os entrevistados faziam referência a Jackson do Pandeiro. Eu fui, então, pesquisar sobre Jackson e vi que não existia nada sobre ele. Isso foi no início dos anos 1990. Eu resolvi montar uma equipe, elaborei um projeto junto a Editora 34, que conseguiu financiamento da Lei Rouanet. Eu estava desenvolvendo uma pesquisa bem incipiente, bem primária, uma foto aqui, um depoimento acolá, o parceiro que eu tinha estabelecido na ocasião fazia umas entrevistas com pessoal desse universo quando iam no Jornal, porque ele era do “Segundo Caderno”, enfim, só que quando houve um investimento maior, permitiu que a pesquisa ampliasse para outros Estados. Aonde a gente sabia que ele circulou, fomos buscar informações. No Rio de Janeiro, por exemplo, eu passei um mês, indo de pessoa em pessoa, Brasília, São Paulo, Recife, Alagoa Grande, muitas vezes, Belo Horizonte. Rosa Aguiar: Você ficou muito próximo da família e eles te doaram documentos, objetos e até letras de música, o que resultou em dois museus muito importantes. Como foi isso? FERNANDO MOURA: A família foi essencial, fundamental para minha pesquisa. Eu fiquei como guardião do material de Jackson durante muito tempo, mas isso estava me queimando as mãos, imagina ficar com isso..., eu fiquei com o que sobrou: dois pandeiros, vários chapéus, algumas roupas, documentos, fotografias, recortes de jornais, letras de músicas, anotações, e tudo isso compôs o universo documental para a biografia, que foi lançada em 2001. Antes da biografia ser lançada, o prefeito de Alagoa Grande, Hildon Régis Filho, me procurou para elaborar um projeto para montar um
museu em torno de Jackson, em Alagoa Grande. A iniciativa primeira foi dele, e fui incorporando o que tinha, o que ganhou uma intensidade maior, deu substância ao projeto. Ele conseguiu financiamento no Ministério do Turismo e, mesmo assim, demorou oito anos. Os restos mortais de Jackson estão lá, ele tinha sido enterrado no Cemitério do Caju, no Rio, e conseguimos, depois de um ano de muita burocracia, trazer para cá. Rosa Aguiar: Foi muito importante trazer os restos mortais de Jackson do Pandeiro de volta para a Paraíba... FERNANDO MOURA: Ele chegou em Alagoa Grande no dia da inauguração do Memorial. Ele saiu a pé de Alagoa Grande, e voltou de Sedex. Isso dá um cordel, né, não? (risos) Tem um fato curioso nisso. A gente sabia que ele ia chegar e o endereço dado foi o meu, daqui de casa, em João Pessoa. Silvana, minha esposa, ficou esperando os restos mortais para levar com Neusa, viúva de Jackson, para Alagoa Grande, para a inauguração do museu. A caixa do Sedex ia no banco de trás, e brincando, Silvana disse: - “Neusa, você vai aí atrás, com Jackson”. Ela ficou com medo, e começou a se emocionar, aquela coisa toda... Em resumo: Jackson veio na mala do carro. Eu estava em Alagoa Grande e fui esperar antes, na estrada, e botei no meu carro, sem ser na mala, para ser um pouco mais solene a chegada. Isso foi em 2008, já são dez anos. Rosa Aguiar: O Memorial Jackson do Pandeiro é um importante atrativo turístico em Alagoa Grande. FERNANDO MOURA: O museu tem uma visitação incrível. Visitação de museu no interior é muito sazonal. Lá é permanente. O secretário de Cultura de Alagoa Grande, Marcelo Felix, me falou que eles estão esperando a visitação de 120 mil pessoas,
até agosto. É um número bem expressivo, impressionante. Zuza Homem de Mello, um dos maiores pesquisadores musicais do Brasil, e que fala no livro sobre Jackson, me disse que todo ano ele vai para os Estados Unidos pesquisar sobre jazz, mas vai para as pequenas cidades americanas, onde encontra as figuras que não estão nos grandes centros. Uma personalidade da cidade que é ressaltada, e que cria uma circulação cultural e econômica em torno dele. É o que acontece hoje em Alagoa Grande: tem Pousada do Pandeiro, grupos de folclore, de música, até de rock, como os Jacksons Envenenados, por exemplo. O Robério, líder da banda, dá palestras sobre Jackson. Rosa Aguiar: Às vezes é necessário descontruir algumas inverdades para a valorização de nossos personagens. Isso aconteceu com Jackson? FERNANDO MOURA: Quando comecei essa pesquisa lá em Alagoa Grande, a geração nova não conhecia Jackson, e os antigos o rejeitavam, achando que ele rejeitava Alagoa Grande. Eu fui de escola em escola, com uma televisão e um aparelho de VHS, cedidos pela Prefeitura, mostrando um vídeo onde ele falava que era da Paraíba e de Alagoa Grande. Ele nunca rejeitou Alagoa Grande, mas como ele passou muita fome lá, não teve uma proximidade muito grande depois, mas isso também ajudou a ser quem ele foi. Rosa Aguiar: O Museu de Arte Popular da Paraíba, em Campina Grande, também foi fruto desse resgate de Jackson, não é verdade? FERNANDO MOURA: O Museu de Arte Popular, também conhecido como Museu dos Três Pandeiros, foi criado para receber o restante do acervo de Jackson e grande parte que foi digitalizada. O material de Campina Grande, incluindo um violão, um pandeiro, documentos e fotos, precisava de um espaço para ser acomodado. Foi quando foi proposto a Niemeyer desenhar o museu. Quando ele soube que era o museu para homenagear Jackson, fez no formato dos pandeiros.Tem ainda o filme de Marcus Vilar e Cacá Teixeira, “Jackson – Na batida do pandeiro”, há 15 anos trabalhamos nisso. O filme tá pronto. Falta apenas definir umas coisas burocráticas e deverá ser lançado, até julho. Fiz plaquetes sobre Jackson e um livro em quadrinhos para o público infanto-juvenil. Participei de um grande projeto sobre Jackson do Sesc Santander, de São Paulo, em 2010, comemorando os noventa anos. Foi o maior investimento em torno de Jackson, fora da Paraíba, algo em torno de 600 mil reais, e incluiu shows e exposições em diversos Estados. Passei um ano trabalhando nesse projeto.
Fernando Moura em entrevista a Rosa Dalva
Rosa Aguiar: A Paraíba tem um nome como Jackson do Pandeiro mas sofre da famosa baixa estima. Como você analisa isso? FERNANDO MOURA: Pernambuco sabe a sua origem, inclusive na área musical. Todo mundo fala em Luiz Gonzaga, e a gente não sabe muito sobre isso. Jackson poderia ser um gatilho para despertar a nossa autoestima. Ainda não há um estudo adensado sobre isso, mas eu tenho duas teorias: a nossa diversidade artística é tanta, nosso balaio, que dilui. Se você pegar a música, temos dezenas de nomes de peso, nas artes plásticas, na poesia, teatro, literatura, cinema, tudo nas artes a Paraíba tem em grande quantidade e isso, de certa forma, banaliza um pouco, dilui. Aliado vem o desconhecimento. Só agora as pessoas estão despertando para Jackson do Pandeiro. As pessoas vivenciaram isso, mas esqueceram. É preciso relembrar, é preciso mostrar, provocar. Isso que tem sido feito, nos últimos 15 anos, é para isso. Temos Marinês, Canhoto da Paraíba, e a gente só fala em Zé Pereira, na guerra de Princesa, nos conflitos do anos 1930. Não fala em Canhoto da Paraíba, uma das coisas mais preciosas. Ainda hoje atrapalha isso de perrepistas e liberais. O papel do poder público para estimular, incentivar e traçar políticas públicas é fundamental. O decreto do “Ano Cultural Jackson” facilitou muito. A meninada teve acesso, pode até não gostar, mas sabe quem é e sua importância, o que aconteceu esse ano. Na época da pesquisa conheci uma criança com cinco anos de idade que cantava todas as músicas de Jackson. Fiz até uma dedicatória para ele no livro, isso foi estimulante.
Rosa Aguiar: O que mais te chamou a atenção ao pesquisar Jackson do Pandeiro? FERNANDO MOURA: Eu me surpreendi em diversos aspectos pesquisando Jackson. Primeiro pela importância que ele tem, não eu dizendo, mas os artistas. Gal regravou “Sebastiana” em 1969, Chico Buarque gravou “Lágrima”, em 1969, Gil, em 1972, quando ele voltou do exílio, tem três músicas no disco dele e que serviu para Gil se firmar como ícone regional. Outra surpresa foi o humor na música de Jackson. Até a violência, a valentia, a pabulagem, está muito presente, de forma caricata. Tem mulheres que fazem o papel de homem, tem até uma que fez uma operação e virou homem. Talvez tenha sido a primeira pessoa que abordou a mudança de gênero, em 1961. Jackson cantava a mesma música, por exemplo, “Chiclete com Banana”, regravada diversas vezes, mas de forma diferente, o sincopado, a divisão que ele fazia, e que ele levou para todo o seu repertório. E criou uma escola. A própria Marinês admitiu que herdou dele. Jacinto Silva, Genival Lacerda, João Bosco, Geraldo Azevedo, Alceu, e por aí vai. Ele fez uma escola, com adeptos, mas igual ao que ele fez, não existiu. Ele acelerou o frevo pernambucano, que não era como é hoje. Rosa Aguiar: Ele tinha tudo para não dar certo, mas deu. Por que? FERNANDO MOURA: Sim, era negro, pobre, analfabeto, de uma região pobre, feinho, franzino. Era para ser mais um desafortunado da vida, como tantos outros milhões de nordestinos. Por que não foi? Primeiro, ISSN: 2357-8335
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porque a música estava incutida nele e teve uma determinação incomum, enorme. Cuidou da família até o fim da vida, e isso fez a família ficar perto, criar as defesas que ele precisava, além da habilidade na voz e no manuseio do pandeiro. Wilson das Neves, grande nome, baterista de Chico Buarque e tantas estrelas da MPB, disse que quando Jackson chegava com o pandeiro, virava o centro rítmico da gravação. Naturalmente as pessoas canalizam a atenção para ele. Rosa Aguiar: O Governo do Estado está muito envolvido nas comemorações dos cem anos de nascimento de Jackson do Pandeiro. O que está sendo feito efetivamente? FERNANDO MOURA: No ano passado, no Governo de Ricardo Coutinho, foi lançado um decreto estabelecendo 2019 como o “Ano Cultural Jackson do Pandeiro”, para que ele fosse estudado nas escolas e nos espaços de arte, cultura e educação, do próprio Estado e, com base nesse decreto, o novo governo de João Azevedo resolveu criar uma comissão, formada pela Secretaria de Cultura, de Educação, Funesc, PBTUR, Secom, Secretaria de Governo e UEPB, que são os integrantes que tem ações desenvolvidas em torno de Jackson por conta do centenário, mas que estavam, cada um, desenvolvendo nos seus espaços, e essa comissão tem justamente esse objetivo de organizar um calendário, orientar, servir de base de referência, prestar consultoria, fazer indicações, e eu estou coordenando essa comissão por conta desse meu trabalho de 25 anos em torno de Jackson. A ideia é que, além das iniciativas de cada secretaria, a gente absorva iniciativas de outros órgãos, pessoas, empresas, prefeituras, aquelas que quiserem
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se incorporar nesse processo para “vender” para fora do Estado também, algo denso: a Paraíba inteira discutindo, vivenciando, homenageando Jackson do Pandeiro em todas as suas áreas e etapas, cada um com sua responsabilidade de produção operacional, mas dentro de uma configuração conceitual sobre Jackson do Pandeiro. Estamos fechando toda a programação. O próprio governador enviou correspondência às prefeituras para que nos informem sobre os festejos, o que vão realizar. Rosa Aguiar: Vem aí o Festival de Artes Jackson do Pandeiro, em julho, na Fundação Espaço Cultural. Como será? FERNANDO MOURA: Pois é, o Festival de Artes Jackson do Pandeiro, cujo edital já foi lançado, está em processo de seleção da programação inscrita, e acontecerá de 25 a 28 de julho, exatamente para que a gente pudesse reunir pessoas relevantes no universo de Jackson, nas áreas de música, teatro, dança, cinema, literatura, circo, várias vertentes artísticas, em torno de Jackson. Agosto também será um mês intenso, e o que já foi definido é que serão implantados três monumentos em homenagem a ele: um em João Pessoa, um em Campina Grande e outro em Alagoa Grande. Estamos buscando parceiros na área privada. Serão marcos simbólicos de concreto e ferro, e serão monumentos de referência, para visitar e fotografar. Em Campina Grande ficará no Parque Bodocongó, às margens do açude, por que ele cantou muito Bodocongó. Em João Pessoa ainda estamos definindo, mas poderá ser perto da antiga Central de Polícia, onde ele morou, e onde será a Escola de Artes Jackson do Pandeiro. Há uma proposta para
se colocar também na Rádio Tabajara, onde ele atuou. Ainda vamos definir. Em Alagoa Grande vamos definir junto com as autoridades de lá, poderá ser na Lagoa do Paó ou no Pátio em frente ao Teatro Santa Ignez. A UEPB, através do Museu dos Três Pandeiros, fará uma grande exposição de música, arte e cordel, nas três áreas, todas em homenagem a Jackson. Rosa Aguiar: Está havendo uma movimentação para o registro do forró como bem cultural. Como você analisa a pouca valorização do forró tradicional? FERNANDO MOURA: Muito triste ter chegado a esse ponto, mas feliz para chamar a atenção das pessoas que existe uma outra opção. O mercado determina uma coisa mas há outra opção. Nos anos 70, quando houve uma invasão da música estrangeira, e música de qualidade, o forró tradicional não desapareceu por causa do interior, porque a população esteve ao lado deles, houve uma resistência. No momento em que conhece, o povo passa a ter, ao menos, outra opção. Hoje só temos a opção do mercado. Dizem que o povo não gosta. Não gosta porque não escuta, não conhece. Os programas de forró são quase todos, na madrugada. Temos que formar novos públicos. Temos que ter o forró autêntico, de matriz, na vitrine também. Pode ter o show espetáculo de não sei quem, mas tem que ter o outro, o forró pé de serra, também. A internet tem ajudado. A gente imaginou que o cordel ia morrer. Mas com a internet, o cordel foi disseminado ao ponto de surgir novos poetas. Existe a possibilidade de você ouvir o que desejar, pode ser esse canal de reorganização mercadológica. g
SEMPRE AVANTE JACKSON DO PANDEIRO UM OLHAR VANGUARDISTA Sandrinho Dupan Jackson do Pandeiro, além de exímio ritmista e excelente cantor, era um vanguardista, estando à frente dos aspectos que cercam o imaginário coletivo sobre sua imagem. Foi pioneiro, por exemplo, na abordagem de temas extremamente contemporâneos, como igualdade de direitos entre homens e mulheres, mudança de sexo e direito dos negros, sendo também um crítico à invasão da música estrangeira no Brasil, entre outros pontos. No seu maior sucesso, a música Chiclete com Banana, um samba composto por Gordurinha e Almira Castilho, gravado em 1959, pela gravadora Columbia, ele faz uma critica ao movimento da jovem guarda que está chegando no Brasil, porém, uma crítica pacífica, onde diz: “… Eu só boto bebop no meu samba Quando Tio Sam tocar um tamborim Quando ele pegar no pandeiro e no zabumba Quando ele aprender que o samba não é rumba...” Ou seja, eu só toco a música deles quando ao menos eles entenderem a diferença entre a minha e a música do caribe. Uma observação importante é que essa música veio explodir nas paradas de sucesso no início dos anos 70 com a turma da Tropicália dando uma impulsionada. Quando ninguém no Brasil falava em transexualidade, Jackson, no ano de 1961, no disco Ritmo, Melodia e a Personalidade de Jackson do Pandeiro, pela Philips, gravou um forró composto por ele e Elias Soares chamado A mulher que virou homem, abordando um tema nada atual à época, mas que está na moda no dias de hoje. Nos anos 60 era uma coisa fora do normal, e lá estava ele falando sobre o tema da moda de hoje. Trecho da canção: “...Quando eu pergunto o que é isso Joana Ela responde, você se engana
Eu era Joana antes da operação Mas, de hoje em diante, o meu nome é João...” No final dos anos 90, Gabriel - O pensador regravou essa canção no disco Jackson do Pandeiro revisto e ampliado. Anos à frente, a reivindicação seria outra, a luta por direitos iguais entre homens e mulheres na canção Tem pouca diferença, um xote de Durval Vieira, gravado em 1981 no Lp Isso é que é forró, pela Polifar-Polygram, música que teve grande destaque nacional na voz de Gal Costa e Luiz Gonzaga. Jackson falava que a diferença entre homens e mulheres eram apenas pequenos detalhes anatômicos, como barba, cabelo no peito e de resto nada mais. A música diz: “... Que diferença da mulher o homem tem? Espera aí que eu vou dizer, meu bem É que o homem tem cabelo no peito Tem o queixo cabeludo E a mulher não tem...” Abordando temas diversos, Jackson foi muito além do humor suave que cercava sua música. Ele era adepto do candomblé e, em uma de suas canções, intitulada 13 de Maio, que fala de Preto velho, eu sempre ouvia como se ele estivesse apenas se referindo à religião dele, porém, quando me dei conta que 13 de maio é o dia da abolição da escravatura no Brasil, foi que notei que o preto velho em questão era sobretudo uma metáfora sobre o sofrimento dos negros no Brasil. A letra diz: “...Quando raiou O sol da liberdade O preto cantou Preto não sofreu mais humilhação Porque o treze de maio chegou...” Infelizmente, o preto velho ainda sofreu
muita humilhação, mas a canção tem uma bela mensagem. A música 13 de maio foi lançada em 1976, no Lp Alegria, minha gente, pela gravadora Alvorada/Chantecler, autoria de Jackson e Nivaldo Lima. Jackson também foi um cronista do seu cotidiano, e isso está muito ligado à sua música, quando, por exemplo, ele narra vários lugares de Campina Grande-PB na canção Forró de Zé lagoa, quando diz: “...Seu Zé Melado do Catô toma a primeira E começa a brincadeira com respeito e com moral Tem mulher boa do bairro de Zé Pinheiro Tem uns cabras do Ligeiro tudo armado de punhal...” assim como em Forró em Campina, Lei da compensação, Bodocongó, músicas que falam do universo de Campina Grande. Na sua fase em Recife-PE cantou as cores dos clubes pernambucanos, na música 1x1 e disse assim: “...É encarnado branco e preto É encarnado e branco É encarnado preto e branco É encarnado e preto…” referindo-se ao Santa Cruz, Naútico e Sport, clubes de futebol de Recife-PE. Na fase de moradia no Rio de Janeiro, tem Forró na gafieira e Xote de Copacabana, que diz: “...Ainda me lembro que eu fui à Copacabana E passei mais de uma semana sem poder me controlar Com ar de doido que parecia estar vendo Aquelas moças correndo de maiô à beira-mar...” Em resumo, Jackson era um cronista do seu cotidiano, estava sempre atento as coisas que o cercavam e cantou o seu universo. g ISSN: 2357-8335
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ENTREVISTA JACKSON ENTRE FLORES E ANJOS Através do nosso colaborador Érico Dutra Sátiro Fernandes uma entrevista especial para GENIUS foi concedida por Neusa Flores dos Anjos, companheira de Jackson do Pandeiro, até o seu falecimento, natural de Itororó, cidade localizada no sul da Bahia, e hoje residente em João Pessoa. 29 de maio de 1967. Foi nessa data que a vida da baiana Neusa Flores dos Anjos mudou radicalmente. Nascida em 11 de agosto de 1942 na pequena Itororó, cidade localizada no sul da Bahia, de onde não tem lembranças, Neusa mudou-se ainda pequena com sua família para o interior de São Paulo, onde seus pais, Seu Laurindo e Dona Adélia, tentariam uma vida melhor. Sexto de um total de sete filhos (quatro mulheres e três homens), ela se recorda das dificuldades enfrentadas pela família àquela época: “Era duro, eu era de uma família muito humilde. Meu pai foi trabalhar na lavoura em troca, praticamente, de comida para a gente. Era uma época muito difícil.” Após um tempo, uma de suas irmãs foi trabalhar em São Paulo (capital) e aos poucos foi levando, um a um, os irmãos e os pais. Na capital, todos começaram a trabalhar para ajudar no sustento da família. “Até eu, com 14 anos, comecei a trabalhar em uma firma. Somente minha mãe ficava em casa cuidando das coisas. A vida deu uma melhorada”, conta Neusa. E assim ela foi se virando, trabalhando em vários empregos, até o dia 29 de maio de 1967, quando foi embora para o Rio de Janeiro para viver ao lado de Jackson do Pandeiro, seu marido até 1982, quando o Rei do Ritmo faleceu. Em uma manhã chuvosa de sábado, em seu simpático apartamento de 3 quartos no bairro Jardim Cidade Universitária, em João Pessoa/PB, onde reside com José Clementino Feitosa, conhecido como Zezé, seu com-
panheiro há 10 anos, Neusa Flores, com a simpatia e carisma que lhe são característicos, concedeu esta entrevista exclusiva para a Revista GENIUS. ÉRICO – Antes de conhecer Jackson do Pandeiro pessoalmente, você já era uma fã dele? Já gostava do forró? NEUZA – Quando eu morava no interior de São Paulo, eu não conhecia forró, pois lá se tocava mais música sertaneja, mas quando fui para a capital e ouvi Jackson do Pandeiro, eu me apaixonei pela voz dele, nem conhecia a pessoa. Era uma voz muito diferente, aqueles graves dele, aquilo me encantou demais. ÉRICO – E como vocês se conheceram? NEUZA – Jackson do Pandeiro foi a São Paulo fazer uma de suas últimas apresentações com Almira Castilho, de quem estava se separando – e disso eu não sabia. Era no forró de Pedro Sertanejo, em um domingo à noite, e eu nem gostava de sair aos domingos, pois teria que trabalhar cedo na segunda-feira, mas mesmo assim combinei de ir com uma amiga. Chegando lá, na parte superior, onde funcionava um bar, encontrei Jackson e Almira em uma mesa, sentados, tomando um conhaque – lembro como se fosse hoje. Eu queria tanto conhecê-los que fui lá e me apresentei: “Meu nome é Neusa Flores, sou uma fã e vim aqui só pra conhecer vocês”. Jackson me deu um abraço, eu apertei a mão de Almira, abracei-a também, e ele ainda me convidou para tomar uma bebida. Agradeci, pedi licença e fui sentar em outra mesa com minha amiga. Após o término do show, olhei no relógio, fiquei
preocupada com a hora e já estava indo embora quando apareceu Ary Lobo, também cantor de forró, dizendo que Jackson estava me chamando. Eu estranhei e perguntei para Ary Lobo: “E Almira? Almira não é a esposa dele?”. Ele apenas me respondeu que Jackson do Pandeiro estava ali me esperando. Então eu fui ao encontro de Jackson, que logo me convidou para jantar, mas eu expliquei que não poderia porque teria que trabalhar cedo e também porque meus pais estavam me esperando, pois não tinha costume de chegar tarde em casa. Além disso, eu perguntei: “E você não é casado? Cadê Almira?”. Ele me respondeu: “Morena, você não lê jornal não?”. Eu disse: “Seu Jackson, você já viu quem trabalha em uma metalúrgica ter tempo para ler jornal?”. Pois bem, ele me explicou que tinha se separado de Almira e me convenceu a jantar e deixar minha preocupação com o emprego de lado. Fomos a um restaurante próximo e ficamos lá, ele tomando aguardente, tocando violão, e nisso o tempo foi passando. Quando já era perto de umas quatro da manhã, falei que precisava pegar um ônibus para ir embora e ele se ofereceu para me deixar em casa. Chegando lá, meus pais já estavam preocupados, mas nós descemos, eu apresentei Jackson a eles, que também eram fãs, e minha mãe foi logo se encantando, fazendo café, mandando comprar pão, aquela puxação de saco, né? E Jackson ali, gostando. Ficamos a manhã toda e, após o almoço, Jackson pediu aos meus pais autorização para eu ir embora com ele para o Rio de Janeiro. Minha mãe respondeu: “Se for para o bem dela, que Deus abençoe vocês”. Meu pai disse a mesma coisa. Mas eu perguntei a Jackson:
Fundou o selo Cantagalo e era pai do consagrado músico Oswaldinho do Acordeon. Mesmo após o início do processo de separação, Jackson e Almira ainda atuaram juntos algumas vezes. Jackson teve 3 uniões em sua vida: uma rápida e turbulenta com Maria da Penha Filgueiras, em 1938, ainda em Campina Grande; com Almira Castilho, de 1954 até o início de 1967, e Neusa Flores, de 1967 a 1982. 3 “Chiclete com Banana” (Gordurinha/Almira Castilho), sucesso gravado por Jackson do Pandeiro em 1959, foi regravada por Gilberto Gil em 1972 no LP “Expresso 2222”. 1 2
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“E eu? Você não perguntou a mim. Eu tenho meu emprego, não posso ir”. Mais uma vez ele me convenceu a parar de pensar no meu emprego, dizendo que no trabalho é assim, de uma hora pra outra eles mandam embora. Eu realmente pensei: “Minha vida não é muito boa aqui, não custa tentar”. Aí fui embora com ele, no mesmo dia. Foi em 29 de maio de 1967, eu tinha 24 anos. Isso não me sai da memória. E vivemos felizes, sabe? ÉRICO – E chegando ao Rio, como foi o início lá? NEUZA – Quando chegamos, como Jackson dividia a casa com a irmã dele, Severina, falou pra ela que eu era uma pessoa que ele tinha levado pra ajudá-la na casa – risos. “Jackson, conta essa estória direito...”, Severina disse. Isso chegou nos ouvidos de Almira rapidinho, que entendeu tudo: “Que nada, ele não levou pra ajudar ninguém não. É mulher que ele levou pra ele mesmo!”, teria dito. Almira era esperta, ela entendeu logo, mas também ficou com aquela ciumeira, porque eu era novinha, bonitinha. Depois Jackson contou toda a verdade e disse que inventou aquilo apenas porque ainda estava em processo de separação com Almira. ÉRICO – Quando vocês começaram a se relacionar, ele já não estava mais no auge da popularidade. Era realmente uma fase ruim na carreira? NEUZA – Eu peguei um tempo ruim e uma parte boa. Houve uma fase dura mesmo, em que as músicas sumiram, alguns artistas nordestinos tiveram até que vender seus instrumentos para sobreviver. Jackson ainda aparecia em programas de tv, ia a forrós, viagens de vez em quando, mas era mais escasso, era mais difícil, já não era como antes. A parte boa retornou nos anos 70, na época em que Gilberto Gil gravou “Chiclete com Banana”. A partir daí o negócio deu uma clareada, aquela música levantou. Mas na verdade pra mim sempre foi tudo bom, eu estava ao lado dele nas horas ruins e boas, isso que é o importante, né não? ÉRICO – Você chegou a se apresentar nos shows com Jackson do Pandeiro, tocar, fazer parte do coro, compor. Como foi que ele a iniciou na música? NEUZA – Demorou um pouco porque eu não tinha prática, não era do meio. Mas ele foi me lapidando em casa, ensaiando.
Neusa Flores dos Anjo
Quando viu que eu estava afinadinha, chegando onde ele queria, ele me colocou para participar do coro. Foi no início dos anos 70. Eu participei das gravações e das apresentações. Acho que uma das primeiras foi no programa da TV Cultura. ÉRICO – E os instrumentos? Você chegou a tocar agogô, não foi? NEUZA – Foi, toquei somente agogô, mas foi uma história interessante. Quando nós acompanhamos Alceu Valença em um festival, durante os ensaios, em casa, Alceu sugeriu a Jackson para que eu tocasse um instrumento. Eu era péssima em instrumentos, mas Alceu disse pra eu tocar agogô porque era mais fácil. Foi aí que eu fui me desinibindo mais. ÉRICO – Certa vez Jackson a elogiou publicamente, em uma matéria jornalística, falando bem de sua voz e afirmando que você era melhor que Almira em dueto... NEUZA – Eu tinha a voz muito afinada. Ele ficou admirado na primeira vez que eu fui fazer coro com ele em casa. Ele estava cantando uma música e eu entrei para fazer dueto, ele ficou admirado com o que ouviu. Pra quem não cantava, né? Ele me elogiava em tudo, dizia que eu era tudo na vida dele.
ÉRICO – Você tem 3 músicas compostas sob o pseudônimo de Mascotte, duas delas gravadas por Jackson. De onde surgiu esse nome? NEUZA – Risos. Esse Mascotte foi Jackson mesmo que colocou. Ele não queria colocar Neusa, então, como no conjunto só tinha homens, disse que eu era a mascotinha. Aí colocou Mascotte. ÉRICO – E como foi sua participação nessas composições? NEUZA – A primeira foi “Dá licença”. Jackson gostava muito de candomblé, e essa era uma música de terreiro que minha mãe cantava. Então eu cantarolava em casa: “Dá licença aí, dá licença aí...”. Pausa - Neusa se emociona ao lembrar de sua mãe e Jackson. Ele começou a escutar, prestou bem atenção, pegou o violão e começou a tirar o tom. Eu não sabia a letra toda, mas ele começou a pesquisar os nomes – Jackson tinha um dicionário de candomblé – mudou umas coisas e completou a letra. “Xodó no forró” foi uma música que Durval Vieira fez e levou pra Jackson gravar. Durval ia lá em casa ensaiar, mostrar músicas. Um dia ele levou essa, meu marido gostou e Durval ofereceu a parceria, registrando o nome de Mascotte. Já “Forrofofó” foi minha autoria sim. Eu queria fazer um forró e estava em casa sozinha, então comecei a cantar. De repente
Programa MPB Especial, dirigido por Fernando Faro, gravado em 1972 pela TV Cultura. Em 2012, o vídeo do programa com Jackson do Pandeiro, composto de entrevista e apresentações musicais, foi lançado em dvd pelo selo Discobertas. 5 Jornal Diário de Notícias, Rio de Janeiro/RJ, 1973, edição 15536. 6 “Dá licença” (Jackson do Pandeiro/Mascotte) foi lançada por Jackson do Pandeiro em 1978, no LP “Alegria minha gente”. 7 “Xodó no forró” (Durval Vieira/Mascotte), música em homenagem a Dominguinhos, foi lançada por Jackson em 1978, no LP “Alegria minha gente”. 8 Cantor e compositor alagoano, falecido em 2014, foi o autor de centenas de músicas do forró, principalmente de duplo sentido, gravadas por nomes como Genival Lacerda, Clemilda, Sandro Becker e outros. Um dos seus maiores sucessos foi “Tem pouca diferença”, gravada por Jackson do Pandeiro em 1981 e regravada por Gal Costa, com participação de Luiz Gonzaga, em 1984. 9 “Forrofofó” (Italúcia/Mascotte) foi gravada por Marinalva no LP “Tardes Nordestinas”, de 1978. 10 Cantora e compositora pernambucana, era irmã da famosa “rainha do xaxado” Marinês. Gravou dezenas de Lps de forró, falecendo em 2008. 4
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chegou a compositora Italúcia e começou a me ajudar: “Coloca essa palavra, aqui, troca essa ali...”. O título e a melodia foram eu que fiz. Marinalva, que também frequentava muito nossa casa, ouviu a música e me pediu para gravar.
e fumava muito, não costumava se cuidar não. Como gostava muito de música, acabava deixando a saúde em segundo plano. Quem cuidava da diabetes dele era eu. Na última viagem que ele fez, eu não fui e a coisa engrossou. Ele, por exemplo, gostava muito de café e quando parava nos locais para tomar, eu tinha que ir na cozinha pedir para não colocarem açúcar. Se eu não estivesse, ele tomava com açúcar mesmo, do jeito dele.
ÉRICO – E “Chegou a hora da fogueira”, que você gravou solo? NEUZA – De Lamartine Babo, né? Foi a única que eu cantei sozinha. Jackson quis me meter nessa gravação. Saiu direitinho, mas eu fiquei muito nervosa, com um medo danado de errar. O instrumental foi do Conjunto Borborema. Depois não surgiram outras oportunidades. ÉRICO – Com quem Jackson tinha mais amizade no meio artístico, na época em que você viveu com ele? NEUZA – Olha, Jackson era muito querido no meio artístico, praticamente todos gostavam dele. Quase não tinha inimigos, apenas não se dava muito com Jorge Veiga, eram como gato e rato. Já Luiz Gonzaga ele nem gostava nem desgostava. Mas Clara Nunes ia lá em casa, Baby Consuelo ia também. Ele também tinha amizade com Raul Seixas, todo mundo gostava de Jackson, era muito humilde. Também ajudou muita gente, como Zé Calixto, Antônio Barros, Genival Lacerda, Bezerra da Silva. Nós que gravamos o primeiro disco de Bezerra da Silva. ÉRICO – O que Jackson mais gostava de escutar em casa? NEUZA – Ele escutava praticamente apenas forró, cantava umas coisas de Luiz Gonzaga, mas até Jorge Veiga ele adorava ouvir também. Aquelas músicas românticas de Orlando Silva ele gostava, cantava com o violão, Jackson era um pouco romântico também, viu? Só que pra cantar, ele gostava mesmo era do forró. ÉRICO – E aquela fase em que vocês participaram do Universo em Desencanto, como foi? NEUZA – Foi em uma época que o compositor Sebastião Batista era de lá e nos convidou para conhecer. Ele chegou pra Jackson e falou: “Jackson, eu conheci um ensinamento muito bom e gostaria que você também fosse conhecer, é em Belfort Roxo”. Lá, Jackson conheceu o fundador, Manoel Jacinto, e começou a frequentar e se aperfeiçoar. Daqui a pouco apareceram artistas como Tim Maia, Procópio Ferreira, Lady Francisco, de quem peguei
grande amizade, e outros. Íamos semanalmente lá, saíamos à rua, todos de branco, com aquele emblema do Universo em Desencanto. Nós lemos o livro, cada um tinha o seu. Ficamos uns quatro a cinco anos, aproximadamente, frequentando. ÉRICO – O que os fez abandonar essa filosofia? NEUZA – Como em todas as religiões, sempre tem umas coisinhas que a gente vai desgostando. Acho que Jackson viu alguma coisa que não gostou e começou a se afastar aos poucos. Se teve algum motivo específico, eu não me lembro. Jackson também não falou. ÉRICO– E o dia a dia de Jackson do Pandeiro? Quais eram as atividades? NEUZA – O hobby dele era ficar em casa tocando seu violãozinho, sentado em um tamborete. Também adorava ficar desmontando e refazendo os pandeiros. Tirava os guizos, as tarraxas e encourava o pandeiro de novo. Às vezes, quando Cícero comprava um zabumba, levava direto pra ele ouvir: “Nego véi, não gostei desse som, vamos comprar outro couro pra esse zabumba”, dizia Jackson para o irmão. Comprava a pele e refazia o zabumba. Era desse tipo de coisa que ele gostava. Não era muito de sair, era caseiro. ÉRICO – Jackson faleceu muito cedo, com 62 anos, quando já tinha alguns problemas de saúde. Ele não costumava se cuidar? NEUZA – Ele tinha diabetes, pressão alta
ÉRICO– Depois do falecimento dele, como ficou sua vida? NEUZA – Mudou tudo de novo, pra pior. Eu era dependente dele e passei a não ter aquela ajuda que eu tinha, nem apoio. Passei por um baque desse e não tive apoio, fiquei sem chão. Voltei pra São Paulo sem nada, minha irmã foi me buscar, não tive ânimo pra trabalhar, mas tinha que me virar. De 1982 a 2005 eu fiquei em São Paulo sempre com uma ocupação, trabalhando em firmas, com o que aparecia. Quando eu trabalhava nas firmas, as coisas não eram tão ruins, mas quando eu passei a trabalhar de diarista a situação piorou, porque não tinha nada fixo. Eu cheguei a perder a vontade de viver. Pausa – emociona-se novamente. Depois minha cunhada me ajudou e me chamou para morar com ela e sair daquela situação. Morei também com minha irmã. Fui arrumando uns trabalhos e assim fui vivendo, até que Fernando Moura me achou em Mauá e passou a se comunicar comigo sobre o livro que estava escrevendo. Consegui me aposentar e depois recebi a notícia de que o Governo da Paraíba poderia me conceder uma pensão vitalícia, desde que eu passasse a residir aqui. Eu não tinha nem dinheiro pra passagem, mas deram um jeito e foram me buscar. A partir daí as coisas melhoraram, peguei amizade com muita gente em João Pessoa, estou aqui há 14 anos. Fernando Moura me ajudou bastante também. Hoje estou feliz. ÉRICO – Você acha, atualmente, que Jackson do Pandeiro tem o seu verdadeiro valor reconhecido? Quais as expectativas para o centenário? NEUZA – Eu acho que é reconhecido sim, mas esse reconhecimento foi muito tardio, no meu entender deveria ter sido há muito tempo. Mas, como se diz, está de bom tamanho. Quanto ao centenário, pelo que vi, ele está sendo muito homenageado e espero que continue assim. Estou achando bom. g
“Chegou a hora da fogueira” (Lamartine Babo) foi gravada por Neusa Flores em 1976. no LP “Mutirão”. O Conjunto Borborema acompanhava Jackson do Pandeiro em suas gravações e apresentações, tendo como base os músicos Cícero (zabumba) e Tinda (triângulo), irmãos de Jackson, e Severo (acordeon), além de outros que fizeram parte de sua formação ao longo dos anos, como o paraibano Manoel Serafim (pandeiro). 13 Sambista carioca, falecido em 1979, conhecido como “caricaturista do samba”, foi uma das influências musicais de Jackson do Pandeiro. 14 LP “O Rei do Coco”, lançado em 1975 por Bezerra da Silva, teve como diretor musical Jackson do Pandeiro. 15 Espécie de doutrina ou filosofia, também conhecida como Cultura Racional, criada por Manoel Jacinto Coelho, que pregava conhecimentos ditados por um ser extraterreno, o “Racional Superior”. 16 Geraldo Gomes, mais conhecido como Cícero, era o irmão mais novo de Jackson do Pandeiro. Acompanhava o irmão tocando zabumba no Conjunto Borborema. 17 Jornalista e escritor, autor da biografia “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”, em parceria com Antônio Vicente, lançada em 2001. 11
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SUCESSOS DE JACKSON A Mulher do Aníbal
Genival Macedo/Nestor Paiva Ôi que briga é aquela que tem acolá? É a mulher do Anibal e Zé do Angá (2x) Numa brincadeira lá no brejo véio A mulher do Anibal foi pra lá dançar Vocês não sabe o que aconteceu O Zé, inxirido, quis lhe conquistar Que briga é aquela que tem acolá? É a mulher do Anibal e Zé do Angá (2x) De madrugada ao terminar da festa Era gente à beça a se retirar No meio da estrada o pau tava comendo Era a mulher do Aníbal e Zé do Angá Que briga é aquela que tem acolá? É a mulher do Anibal e Zé do Angá (2x) Perguntei:”Por que brigam vocês dois agora?” Diz ela: “este cabra quis me conquistar Então fui obrigada a quebrar-lhe a cara Pra mulher de homem, saber respeitar” Que briga é aquela que tem acolá? É a mulher do Anibal e Zé do Angá (2x) O dotô Xumara, subdelegado Veio vexado ver o ocorrido Quando chegou no local da luta O Zé do Angá havia morrido. Que briga é aquela que tem acolá? É a mulher do Anibal e Zé do Angá (Repetido)
Bodocongó
Cícero Nunes/Humberto Teixeira Eu fui feliz lá no Bodocongó Com meu barquinho, de um remo só Quando era lua, com meu bem, remava a toa Ai, ai, ai que vida boa lá no meu Bodocongó (Repete) Bodocongó, bodó, Bodocongó Meus canário verde, ai meus curió Bodocongó, bodó, Bodocongó Minha Campina Grande Eu vivo aqui tão só! (Repete)
Cabo Tenório Rosil Cavalcanti
O Cabo Tenório é o maior inspetor de quarteirão Cabo Tenório é o maior inspetor de quarteirão O Cabo era bamba, disposto danado Bem considerado no seu batalhão Amigo do praça, do subtenente De toda a patente de titulo e galão Zangado era doido, ficava valente Virava serpente de punhal na mão Mas ficava manso e a briga acabava se o povo gritasse lhe dando razão e dissesse: Cabo Tenório é o maior inspetor de quarteirão Cabo Tenório é o maior inspetor de quarteirão
Olha na casa de Tota fizeram um forró Tenório foi só dançar e beber Os cabras de lá quiseram lhe bater Tenório gritou - vixe, vai ter confusão Balançou a mão, deu murro e bufete Tomou canivete, peixeira e facão Os brabos correram quem ficou presente Gritava contente no mei do salão e dizia Cabo Tenório é o maior inspetor de quarteirão. (Isto é que é ser um homem bom)
Cantiga da perua
Elias Soares/Jackson do Pandeiro É de pió a pió É de pió a pió A cantiga da perua é uma só (Repete) Andam dizendo Que o progresso vai chegar Que a coisa vai melhorar Quando o homem for pra lua Mas a verdade crua É que a situação da vida Tá ficando parecida A cantiga da perua É de pió a pió É de pió a pió A cantiga da perua é uma só (repete) De tudo isso O que mais me inquizila É o sujeito entrá na fila Pra comprá o que não tem Vai chegar tempo Que a nossa rapaziada Pra falar com a namorada Entra na fila também.
Cantiga do sapo
Buco do Pandeiro/Jackson do Pandeiro É assim que o sapo canta na lagoa Sua toada improvisada em dez pés É assim que o sapo canta na lagoa Sua toada improvisada em dez pés - Tião / Oi! - Foste?/- Fui! - Compraste?/- Comprei! - Pagaste?/- Paguei! - Me diz quanto foi? - Foi quinhento réis É tão gostoso morar lá na roça Numa palhoça perto da beira do rio Quando a chuva cai o sapo fica contente Que até alegra a gente com o seu desafio - Tião/- Oi! - Foste?/- Fui! - Compraste?/- Comprei! - Pagaste?/- Paguei! - Me diz quanto foi? - Foi quinhento réis
Casaca de couro
Rui de Morais e Silva Xô, xô, xô, xô Casaca de couro Cantando as duas na teia Cantando as duas na teia. Parece um arapuá Cheio de vara e algodão O ninho de uma casaca Não parece ninho não Parece mais os parceiros Dos “pajaú” do sertão. Xô, xô, xô, xô Casaca de couro Cantando as duas na teia Cantando as duas na teia. Em riba do pé de turco Tem um ninho de graveto Tem garrancho de jurema Tem pau branco, tem pau preto Tem lenha que dá pra facho Tem vara que dá espeto. Xô, xô, xô, xô Casaca de couro Cantando as duas na teia Cantando as duas na teia. Uma grita, outra responde Uma baixa, outra também Parece mulher pilando Pro mode fazer xerém Subindo e descendo as asas Como os seios do meu bem. Xô, xô, xô, xô Casaca de couro Cantando as duas na teia Cantando as duas na teia. Eu nunca vi desafio Mais bonito, mais iguá Duas casacas de couro Quando começa a cantar Parece dois violeiros Num galope à beira-mar.
Chiclete com banana
Almira Castilho/Gordurinha/Jackson do Pandeiro Eu só boto bebop no meu samba Quando Tio Sam tocar um tamborim Quando ele pegar No pandeiro e no zabumba. Quando ele aprender Que o samba não é rumba. Aí eu vou misturar Miami com Copacabana. Chiclete eu misturo com banana, E o meu samba vai ficar assim: Tururururururi bop-bebop-bebop Tururururururi bop-bebop-bebop ISSN: 2357-8335
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Tururururururi bop-bebop-bebop Eu quero ver a confusão Tururururururi bop-bebop-bebop Tururururururi bop-bebop-bebop Tururururururi bop-bebop-bebop É o samba-rock, meu irmão É, mas em compensação, Eu quero ver um boogie-woogie De pandeiro e violão. Eu quero ver o Tio Sam De frigideira Numa batucada brasileira.
Zé de baixo, Zé de riba Tesconjuro com tanto Zé Como tem Zé lá na Paraíba. Lá na feira é só Zé que faz fervura Tem mais Zé do que coco catolé Só de Zé tem uns cem na Prefeitura Outros cem no comércio tem de Zé Tanto Zé desse jeito é um estrago Eu só sei que tem Zé de dar com o pé Faz lembrar a gagueira de um gago Que aqui se danou a dizer Zé.
Coco do Norte Rosil Cavalcanti
Oi responda esse coco com palma de mão Isso é coco do Norte, nunca foi baião. No coco do Norte tem caracaxá Zabumba, ganzá, poeira do chão Coqueiro fazendo improvisação Compadre e comadre seguro na mão Batendo umbigada com palma de mão. Oi responda esse coco com palma de mão Isso é coco do Norte, nunca foi baião. Tem coco praieiro na terra batida Que é dança querida na beira do mar O vento a soprar, a onda quebrando A lua espiando com satisfação Isso assim é coco, nunca foi baião Oi responda esse coco com palma de mão Isso é coco do Norte, nunca foi baião. No coco do Norte tem Pedro, tem Joca Tem Dida, tem Noca, tem Paulo, tem João Tem Chica Cancão, Didi, Sebastiana Dedé e Joana na palma da mão Isso assim é coco nunca foi baião. Oi responda esse coco com palma de mão Isso é coco do Norte, nunca foi baião.
Coco social
Ele é pernambucano, do canavial Veio pro salão, é social. (coro-repete) Madame na boate fica solfejando Ao som da champanhota diz: o coco é bom! O musicista toca sem sair do tom Toda gente bem fica admirando Disse o criminalista: esse coco mata! É super bizantino diz o general Jacinto de Thormes na pena não dorme E diz o coco é bom, é social. (bis) Ele é pernambucano, do canavial... Veio pro salão, é social. (coro-repete) O diplomata canta baixo na surdina O financista gosta e faz anotação Banqueiro financia, pois vale um milhão Diz a dama de preto, é dança granfina Jurista de renome aconselha o povo O almirante diz: ele é nacional Ibrahim Sued esforço não mede E diz o coco é bom, é social. (bis) Ele é pernambucano, do canavial Veio pro salão, é social. (coro-repete)
Como tem Zé na Paraíba Catulo de Paula
Vige como tem Zé | julho/agosto/2019
Num forró que eu fui em Cajazeira O cacete cantou e fêz banzé Pois um bebo no meio da bebedeira Falou mal e xingou a mãe dum Zé Como tinha só Zé nesse zunzum Houve logo tamanho rapapé Mãe de Zé era a mãe de cada um No salão brigou tudo que era Zé... Vige como tem Zé Zé de baixo, Zé de riba Tesconjuro com tanto Zé Como tem Zé lá na Paraíba. É Zé João, Zé Pilão e Zé Maleta Zé Negào, Zé da Cota, Zé Quelé Todo mundo só tem uma receita Quando quer ter um filho só tem Zé E com essa franqueza que eu uso Eu repito e se zangue quem quiser Tanto Zé desse jeito é um abuso Mas o diabo é que eu me chamo Zé...
Cumpadre João
Jackson do Pandeiro/Rosil Cavalcanti
Rosil Cavalcanti
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Vige como tem Zé Zé de baixo, Zé de riba Tesconjuro com tanto Zé Como tem Zé lá na Paraíba.
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Vocês sabem quem sou eu? - É o Cumpadre João! (2x) Lá na Paraíba briguei em Princesa Minha natureza não sofreu abalo Briguei em São Paulo na Revolução Ajudei os paulista quatrocentão Cheguei em Caxias nos dia de feira Me fiz na peixeira em home valentão Olha vocês sabem quem sou eu? - É o Cumpadre João! (2x) No meu Pernambuco já fui num forró Fiz trança, dei nó, lá no Ribeirão De punhal na mão, lá em Limoeiro Botei cangaceiro pra baixo do chão No Rio eu já fui malandro em favela Mulata donzela me beija na mão Vocês sabem quem sou eu? - É o Cumpadre João! (2x) Eu já fui boiadeiro, depois motorista Correndo na pista era assombração Fui bom no balão, fui craque decente Meu tijolo quente queimou muita mão Granfino sarado, já fui em salão Já fui empregado e hoje sou patrão.
Olha vocês sabem quem sou eu? - É o Cumpadre João! (2x)
17 na corrente
Edgar Ferreira/Manoel Firmino Alves Macaco não é valente Dança aí 17 na corrente. Uma viagem que fiz pelo Amazonas Num arvoredo eu parei pra descansar Me jogaram uma pedra no lugar Eu olhei, não vi nada ali perto Com distância de 10 ou 12 metros Um guariba surgiu na minha frente Com coragem enfrentei o descontente Venci na luta e a ele eduquei Minha ordem pra ele é uma lei, Dança aí 17 na corrente... Macaco não é valente Dança aí 17 na corrente. Tendo eu dominado este vivente Hoje ele vive amarrado pelo meio Eu trabalho com ele e não receio Dança aí 17 na corrente. Macaco não é valente Dança aí 17 na corrente. Ele hoje é bastante educado Fuma, toca e sabe até dançar Já faz pose e tem ginga no andar E conversa comigo por aceno Faz careta e fica se mordendo Se uma loura passar e não falar Ele diz que o dia é de azar E reclama por não estar decente Já não briga e respeita toda gente Dança aí 17 na corrente. Macaco não é valente Dança aí 17 na corrente.
Forró do Zé Lagoa Rosil Cavalcanti
Se você não viu, vá ver que coisa boa Em Campina Grande o forró de Zé Lagoa (2x) As oito horas Zé do Beco, o sanfoneiro Acende o candeeiro, dá as ordem a Juvenal Seu Zé Melado do Catô toma a primeira E começa a brincadeira com respeito e com moral Tem mulher boa do bairro de Zé Pinheiro Tem uns cabras do Ligeiro tudo armado de punhal Num reservado se vende boa cachaça Mariquinha dá de graça tira-gosto especial Se você não viu, vá ver que coisa boa Em Campina Grande o forró de Zé Lagoa (2x) As dez e meia corre gente no terreiro Se não é cabo Vaqueiro é o cabo Boca-Mole Revista o povo e toma um saco de peixeira Prende mulher ruaceira vai lá dentro e toma um gole Mete o cacete com mais de nove soldados Cabra frouxo e amedrontado lá no canto nem se bole E Zé Lagoa que era o dono do forró
Não fez trança nem deu nó, apanhou que ficou mole Se você não viu, vá ver que coisa boa Em Campina Grande o forró de Zé Lagoa (2x)
Forró em Campina Rosil Cavalcanti
Cantando meu forró vem na lembrança O meu tempo de criança que me faz chorar. (2X) Ó linda flor, linda morena Campina Grande, minha Borborema. Me lembro de Maria Pororoca De Josefa Tiburtino, e de Carminha Vilar. Bodocongó, Alto Branco e Zé Pinheiro Aprendi tocar pandeiro nos forrós de lá.
Forró em Limoeiro Edgar Ferreira
Eu fui pra Limoeiro E gostei do forró de lá. Eu vi um caboclo brejeiro Tocando a sanfona, entrei no fuá. (Repete) No mei do forró houve um tereré Disse o Mano Zé, aguenta o pagode Todo mundo pode, gritou o Teixeira Quem não tem peixeira briga no pé. Eu fui pra Limoeiro E gostei do forró de lá. Eu vi um caboclo brejeiro Tocando a sanfona, entrei no fuá. (Repete) Foi quando eu vi a Dona Zezé A mulher que é, que topa parada De saia amarrada fazer o cocó E dizer: eu brigo com cabra canalha Puxou da navalha e entrou no forró. Eu fui pra Limoeiro E gostei do forró de lá. Eu vi um caboclo brejeiro Tocando a sanfona, entrei no fuá. (Repete) Eu que sou do morro, não choro, não corro, Não peço socorro quando há chuá Gosto de sambar na ponta da faca Sou nego de raça e não quero apanhar.
O canto da ema
Alventino Cavalcante / D. Ayres Viana / João Do Vale A ema gemeu No tronco do juremá (2x) Foi um sinal bem triste, morena Fiquei a imaginar Será que é o nosso amor, morena Que vai se acabar? Você bem sabe Que a ema quando canta Vem trazendo no seu canto Um bucado de azar Eu tenho medo Pois acho que é muito cedo
Muito cedo, meu benzinho Para esse amor se acabar Vem morena (vem, vem ,vem) Me beijar (me beijar) Dá-me um beijo (dá-me um beijo) Pra esse medo (se acabar)
Morena bela
Juarez Santiago/Onildo Almeida Morena bela, eu era, eu sou Bela morena, eu serei o seu amor (coro repete) No jardim da minha casa, Um pé de rosa vou plantar Só não caso com você Se Papai do Céu não deixar (coro repete) Morena bela, eu era, eu sou Bela morena, eu serei o seu amor (coro repete) Eu vou guardar uma rosa Parecida com você, Só pra matar a saudade No dia que eu não lhe ver (coro repete)
Moxotó
José Gomes/Rosil Cavalcanti Você precisa conhecer uma terra boa Você devia conhecer o Moxotó Pra ver um cabra entrar no mato encourado Derrubar touro montado, pegar cobra e dar um nó. Lá tem vaqueiro que emboca no carquejo Quebrando arapiraca... tem sim senhor. Tem caçador que pega onça de mão E sangra de faca... tem sim senhor. Tem fazendeiro que morre e não sabe Quantas reses tem... E tem morena, de fala doce e amena Que outra terra não tem... isso também tem.
Na base da chinela
Jackson do Pandeiro/Rosil Cavalcanti Eu fui dançar um baile na casa da Gabriela Nunca vi coisa tão boa Foi na base da chinela O sujeito ia chegando tirava logo o sapato Se tivesse de botina sola grossa bico chato Entrava pra dançar no baile da Gabriela Tirando meia e sapato Calçando um par de chinela O baile estava animado só na base da chinela Toda turma disputava dançar com a Gabriela Requebrar naquela base no salão só tinha ela Todos convidados riam Gostando da base dela Jogaram no salão pimenta bem machucada O baile da Gabriela acabou com chinelada Home numa pisada dessa eu vou Até amanhecer dia Só nessa base a chinelinha no chão
Quem não chora não mama
Paquito/Romeu Gentil
Você chora, chora de barriga cheia, Tire o dinheiro que está na meia. Ai, seu Gama... Quem não chora, quem não chora não mama! Não paga um café pra ninguém, Quando viaja é só de trem. (Ai, seu Gama... Quem não chora, quem não chora não mama!)
Rosa
Ruy de Morais e Silva Rosa, rosa, vem ô rosa Estou chamando por você Eu vivo lhe procurando Você faz que não me vê Eu vivo lhe procurando E nem sinal de você Rosa danada Minha morena faceira Minha flor de quixabeira Não posso mais esperar Fique sabendo Se casar com outro homem O tinhoso me consome Mas eu lhe meto o punhá Comprei um papel florado Um envelope pra mandar dizer (2x) Numa carta bem escrita O que sinto por você A carta está demorando Porque não sei escrever Rosa danada Minha morena faceira Minha flor de quixabeira Não posso mais esperar Fique sabendo Se casar com outro homem O tinhoso me consome Mas eu lhe meto o punhá A coisa pior da vida É querer bem a muié (2x) A gente deita na rede Maginando por que é Com tantas no mei do mundo Só uma é que a gente quer Rosa, rosa, vem ô rosa Estou chamando por você Eu vivo lhe procurando Você faz que não me vê Eu vivo lhe procurando E nem sinal de você Rosa danada Minha morena faceira Minha flor de quixabeira Não posso mais esperar Fique sabendo Se casar com outro homem O tinhoso me consome Mas eu lhe meto o punhá
São João chegou
Alvaiade/Jackson do Pandeiro Pegue aqui na minha mão E vamos pular, meu amor (Ô, Ô, Ô, Ô, Ô) ISSN: 2357-8335
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São João chegou É nesta onda que eu vou! Pegue aqui na minha mão E vamos pular, meu amor (Ô, Ô, Ô, Ô, Ô) São João chegou É nesta onda que eu vou! Palmas, meu povo, São João chegou (Ô, Ô, Ô, Ô) É nesta onda que eu vou! Palmas, meu povo, São João chegou (Ô, Ô, Ô, Ô) É nesta onda que eu vou!
Sebastiana
Rosil Cavalcanti Convidei a comadre Sebastiana Pra dançar e xaxar na Paraíba Ela veio com uma dança diferente E pulava que só uma guariba E gritava: A, E, I, O, U, YPSILONE E gritava: A, E, I, O, U, YPSILONE Já cansada no meio da brincadeira E dançando fora do compasso Segurei Sebastiana pelo braço E gritei, não faça sujeira O xaxado esquentou na gafieira E Sebastiana não deu mais fracasso E gritava: A, E, I, O, U, YPSILONE E gritava: A, E, I, O, U, YPSILONE
Tem pouca diferença Durval Vieira
Que diferença da mulher o home tem? Espere aí que eu vou dizer, meu bem É que o home tem cabelo no peito Tem um queixo cabeludo e a mulher não tem No paraíso, um dia de manhã Adão comeu maçã e Eva também comeu Então ficou Adão sem nada e Eva sem nada Se Adão deu mancada Eva também deu Mulher tem duas perna, tem dois braço Duas coxa, um nariz e uma boca E tem muita inteligência O bicho homem Também tem do mesmo jeito Se for reparar direito Tem pouquinha diferença [Breque] Eu acho que a diferença está é no sapato! Bom, eu também não sou homem... Sou é maaaaacho!
Tum, tum, Tum
Ary Monteiro/Christóvao de Alencar No tempo que eu era só E não tinha amor nenhum Meu coração batia mansinho: Tum... tum... tum... (coro repete) Depois veio você O meu amor número um E o meu coração Pôs-se a bater Tum-tum-tum, tum-tum-tum...
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Um a Um
Vou gargalhar
Esse jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) Ah olhe o Jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) O meu clube tem time de primeira Sua linha atacante é artilheira A linha média é tal qual uma barreira O center-forward corre bem na dianteira A defesa é segura e tem rojão E o goleiro é igual um paredão Esse jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) Mato um mais o Jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) É encarnado e branco e preto É encarnado e branco É encarnado e preto e branco É encarnado e preto É encarnado e branco e preto É encarnado e branco É encarnado e preto e branco É encarnado e preto O meu clube jogando, eu aposto Quer jogar, um empate é pra você Eu dou usura a quem aparecer Um empate pra mim já é derrota Mas confio nos craques da pelota E o meu clube só joga é pra vencer O meu clube tem time de primeira Sua linha atacante é artilheira A linha média é tal qual uma barreira O center-forward corre bem na dianteira A defesa é segura e tem rojão E o goleiro é igual um paredão Esse jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) Mato um mais o Jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) É encarnado e branco e preto (repete) Esse jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) Mato um mais o Jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) Mas rapaz uma coisa dessa tambêm tá demais O juiz ladrão rapaz Eu vi com esses dois olhos que a terra há de comer Quando ele pegou o rapaz pelo calção O rapaz ficou sem calção Ah olho o jogo não pode ser um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum) Mato um mais o Jogo não é um a um (se o meu clube perder é zum-zum-zum)
Quem disse que a escola não sai não tem cabeça pra pensar (2x)
Edgar Ferreira
Edgar Ferreira
A escola vai sair o povo da vila vai sambar vou gargalhar quá qúá quá quá!(2x) Porém a vila vai ver a nossa apresentação você errou sem querer, coração sua profecia vai fracassar e eu vou gargalhar quá qúá quá quá!
Xodó De Motorista Jackson do Pandeiro
Não há quem resista Ser motorista sem ter um amor Me falte gasolina Mais não me falte uma menina Que eu morro de dor Eu vou pra todo canto desse meu Brasil Ninguém nunca viu eu viajar sozinho Eu só viajo no quentinho da minha cabina O cheiro de uma menina encurta o meu caminho Eu só viajo agarradinho Ainda hoje eu vou, eu vou falar com ela Lá na cancela tenho outra em vista Só sei andar com o meu xodó de lado Não sou culpado de ser motorista
Xote de Copacabana José Gomes
Eu vou voltar queu não aguento O Rio de Janeiro não me sai do pensamento Eu vou voltar queu não aguento O Rio de Janeiro não me sai do pensamento Quando me lembro que fui a Copacabana E passei mais de uma semana sem poder me controlar Com ar de doido que parecia estar vendo Aquelas moças correndo de maiô à beira-mar Eu vou voltar que eu não aguento O Rio de Janeiro não me sai do pensamento Eu vou voltar que não aguento O Rio de Janeiro não me sai do pensamento As mulheres na areia Se deita de todo o jeito Que o coração do sujeito Chega a mudar a pancada E muitas delas vestem Um tal de biquini Se o cabra não se previne Dá uma confusão danada
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O SERTÃO EM PROSA E VERSO DOIS CANTORES DO SERTÃO: JOÃO GUIMARÃES ROSA E JACKSON DO PANDEIRO Flávio Sátiro Fernandes O sertão é aqui. O sertão é ali. O sertão é cá e lá. O sertão é acolá. O sertão está em toda a parte, disse Rosa, com sabedoria. Ao descer a Borborema, o viajante se depara com a vastidão. É por ela que se espraia o sertão. O Seridó é dito sertão. Quem vai negar que o aqui dos que moram ali, no Sabugi seja sertão? As terras de Espinharas são terras de sertão. Para quem mora no Moxotó, o aqui deles é também sertão. E o Pajeú o que é, senão sertão? No Cariri, seja novo, seja velho, seus moradores são se dizentes do sertão. O acolá dos que moram no Quixeramobim quando se chega lá é sertão. Quem ignora que as vastas terras que o Velho Chico banha, desde que nasce, são sertões? O sertão verdadeiro se estende pelos Estados do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Minas Gerais. E o glorioso rio quer molhar todos. O sertão tem história. O sertão tem seus bichos. O sertão tem seus pés de pau. O sertão tem suas meizinhas, suas folhas de fazer chás, para curar doença de menino, meningite, diarreia, difteria, crupe, e de adultos, defruço, enxaqueca. O sertão tem seus pássaros que todos os dias acordam o sol. O sertão tem seus santos, suas devoções. Além dos que fazem a Santíssima Trindade: São José, que traz chuva e bom inverno, assegurando uma boa safra; Santo Antônio, o santo casamenteiro; São João e São Pedro, festejados com fogueira, fogos e comidas típicas; Maria, Mãe de Deus, cultuada sob diferentes invocações. O sertão tem seu território povoado de milhares de oragos, tantas são as suas cidades, as suas paróquias, as suas capelas. Além deles, o sertão tem venerações regionais, surgidas de diversos fatos e em seus vastos domínios. O sertão tem seus fastos, suas lendas, seus mitos, suas estórias. O sertão tem cabra da peste, gente braba, exímia no manejo da faca e da capoeira. O sertão tem mulher valente, mulher braba, mulher macho, disposta. Paradoxalmente, não existe mulher mais fascinante, terna, carinhosa, feminina, do que a mulher do sertão. Além disso, a mulher do sertão é boa parideira ou, melhor, já foi, porque, hoje, os dias são outros e as mulheres do sertão têm um ou, no máximo, dois filhos. As dificuldades atuais e as modernidades da vida restringiram as délivrances. Mas, nos tempos de antanho, mulher do sertão que se prezava tinha, no mínimo, dez filhos. O sertão tem fazendeiros de cujas terras pode-se dizer, parafraseando Camões, que o sol, logo em nascendo, as vê primeiro, vê-as também no meio do hemisfério e, quando desce, as deixa derradeiro. Muitos morrem sem saber quantas rezes tem, criadas na solta, pela vastidão de suas terras. O sertão tem suas alegrias, suas festas e seus ritmos próprios: o xote, o xaxado, o baião, o coco, a embolada, o frevo. O sertão
tem seus prosadores, seus romancistas, seus poetas. O sertão tem sua literatura própria, a literatura de cordel, simples como os cordões que lhe sugeriram o nome e nos quais eram pendurados nas feiras semanais os folhetos com que se editavam os “versos de feira”, para conhecimento dos pretensos leitores, mas, ao mesmo tempo, profunda e expressiva, a tal ponto de fazer surgir o gênio negro de Inácio da Catingueira, analfabeto, que enfrentou seu rival Romano do Teixeira, letrado, vencendo-o no repente, ao som de uma viola, em uma noite sertaneja, nos Patos de Espinharas. Esse negro genial, no dizer de Firmino Leite, “teve um destino de pássaro: viveu cativo e morreu cantando”. O sertão é tudo isso e viver em meio ao aranzel que é o sertão, sem dúvida, confirma o que diz a sentença rosiana: Viver é negócio muito perigoso. O sertão tem seus contos, seus cantos, seus heróis, seus santos, seus perigos, suas glórias, tudo, enfim, que faz o sertão ser tão o que é. O sertão tem muitos cantores que o definem, o exaltam, o descrevem. Uns o fazem em prosa, outros em versos, outros mais em melodias nas quais se inserem letras, compondo canções que bem dizem da paisagem do sertão, seu luar poético, seu sol abrasador, suas noites acolhedoras. O sertão tem dois cantores que dizem e cantam tudo aquilo a que me referi acima, quando em suas produções se voltam para o objeto destas linhas. Um, menciona o que é o sertão fazendo-o em prosa, através de uma das mais importantes obras da literatura de língua portuguesa que é Grande Sertão: Veredas. Seu autor, João Guimarães Rosa, retrata o sertão em cores bem vivas, dissecando-o em múltiplos aspectos e variegadas veredas, criando conceitos, definições e personagens que exemplificam os vários pontos que acima mencionei. De uma criatividade ímpar, ele, mais do que criou, renovou, melhor dizendo, revolucionou o idioma, manejando, de forma diferente, a sintaxe, a morfologia, a semântica, de modo a dar nova feição à língua nacional. Médico, diplomata, poliglota, romancista e contista, foi, sem dúvida, um dos maiores nomes da literatura brasileira e internacional. O outro, através da música foi também um inovador. Criou, renovou ou, melhor dizendo, revolucionou a música popular brasileira e através dela cantou o sertão. Aliás, mais do que à música popular, ele revolucionou a si próprio. Segundo o seu biógrafo, Fernando Moura, tinha tudo para não dar certo: . “...era negro, pobre, analfabeto, de uma região pobre, feinho, franzino. Era para ser mais um desafortunado da vida, como tantos outros milhões de nordestinos”. Tinha tudo para não dar certo, mas deu... completa o biógrafo. Nascido em Alagoa Grande, interior da Paraíba, mudou-
-se para Campina Grande, onde começou a atuar no rádio. A propósito, essa sua transferência para Campina Grande, fez-se de maneira emblemática, pois, deu-se a pé. Ele, futuro Rei do Ritmo, sua mãe e irmãos, todos a pé, levaram quatro dias para alcançar a Rainha da Borborema. Ganhou na longa caminhada a energia, a disposição, o vigor com que enfrentou os contratempos com que se defrontou ao longo da vida. Foi embora de sua terra a pé e quando voltou veio de Sedex... Depois de uma breve passagem por João Pessoa, cantando na Rádio Tabajara, transferiu-se para o Recife, onde atuou na Rádio Jornal do Commércio e, depois, para o Rio de Janeiro. Assim, de degrau em degrau, foi subindo a escada no rumo de um lugar destacado na música popular brasileira, em que exerceu influências, estimulou cantores, fez seguidores, atraiu fãs, cantou, compôs, musicou, gravou e, como Guimarães Rosa em relação à linguagem, deu nuanças novas ao xote, ao baião, ao frevo, ao xaxado, ao coco, à embolada, impondo a todos esses gêneros do sertão uma unidade rítmica, que o fez reconhecido como o Rei do Ritmo, ganhando notoriedade pela maneira própria como interpretava o forró, manejando o pandeiro, variando os tons de voz, em agudos e graves, acompanhando seus arranjos não só com o pandeiro, mas também com a voz, nas improvisações, nas variações e com requebros e pulos de macaco guariba. Por tudo isso, Jackson do Pandeiro, batizado José Gomes Filho, foi o maior fenômeno da música popular brasileira. João Guimarães Rosa, cuja obra é por demais conhecida e estudada, tem sido objeto de dezenas de teses, dissertações e monografias. Através delas procura-se devassar em seus mais profundos meandros a forma como o autor mineiro visualizou o sertão, com referências à sua fauna, flora, gente, vida religiosa, costumes, com isso construindo o grande monumento da literatura brasileira que é Grande sertão: veredas. Jackson do Pandeiro, por sua vez, tem merecido estudos e análises que se traduzem em trabalhos acadêmicos, não no número, evidentemente, com que tem sido agraciado o autor de Corpo de Baile, mas numa escala que mostra vir o paraibano atraindo o interesse dos que se dedicam às artes, notadamente a musical, em seus diferentes aspectos. Qual dos dois foi o maior? Povo prascóvio, diria Guimarães Rosa, espantado: Isso é pergunta que se faça? O Professor Oliveira, lá em Patos do Major Miguel, exclamaria: Isso é pergunta de beócio. Há grandezas que não podem ser comparadas. É o caso. Cada um deles foi gigante em seu reino. g
“Nos baús da memória”, in Letras do Sertão, Ano 7, nº 19, Março/1960. É o que revela Fernando Moura, biógrafo de Jackson, ao dizer, em entrevista à jornalista Rosa Aguiar, para a revista GENIUS, que os restos morais do Rei do Ritmo foram transportados pelo Correio, em uma caixa e entregues no seu endereço, em João Pessoa, trasladados, em seguida, para o Memorial Jackson do Pandeiro, em Alagoa Grande, onde estão guardados. 1 2
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DE ALAGOA GRANDE AO RIO DE JANEIRO FATOS E CURIOSIDADES DA VIDA E DA OBRA DE JACKSON DO PANDEIRO Érico Dutra Sátiro Fernandes
1. Abraço de tamanduá
gravada por Jackson em 1962), sendo gravado e muito provavelmente lançado pela Continentalem 1966, e relançado em 1970, aproveitando que a letra não mencionava nomes de atletas, local ou data. O único trecho da composição que ficou extemporâneo foi a citação de “80 milhões”, em referência à população brasileira, já que, em 1970, o censo demográfico nacional apresentava números superiores a 90 milhões. A dúvida que permanece é em relação ao motivo de o compacto “Frevo do Tri”/”Garota de Botafogo” ter se tornado tão raro. Ou o disco teve um grande fracasso de vendas, por conta de ter sido distribuído após a eliminação do Brasil no torneio, ou então foi produzido e teve sua comercialização cancelada, ficando as unidades fabricadas nas mãos de poucos fãs.
Na noite de 16 de janeiro de 1960, Jackson do Pandeiro faria um show, juntamente com Almira Castilho, no Texas Bar, no Rio de Janeiro. Antes da apresentação, foram jantar em um restaurante na av. Rio Branco, onde tudo corria tranquilo até que, ao levantar-se para ir embora, Jackson foi abordado por dois fãs que o cumprimentaram de maneira tão efusiva, que um deles começou a abraçar o artista e levantá-lo várias vezes, apertadamente. Resultado: uma costela quebrada, show no Texas Bar suspenso e a perda do cachê de 10.000 cruzeiros pelo cancelamento da apresentação. Apesar do incidente, Jackson posou para fotos com seu habitual bom humor, usando um cartaz que dizia: “Cuidado! Não me abrace. Estou com uma costela quebrada de abraços de um fan”.
3. Censurado!
2. Tri adiado Quando a seleção brasileira de futebol conquistou seu terceiro título mundial em 1970, no México, a gravadora Continental lançou um compacto simples contendo a canção “Frevo do Tri” (Braz Marques/Álvaro Castilho), interpretada por Jackson do Pandeiro, para enaltecer a espetacular proeza do time canarinho, além da música “O caneco é nosso”, cantada pelo Coral 70. Esse compacto, ainda hoje, é facilmente encontrado à venda em sites da internet e era considerado, até pouco tempo, o disco de lançamento do “Frevo do Tri”. Ocorre que Jackson foi artista da Continental apenas no ano de 1966, estando, em 1970, na gravadora Philips. O fato de sair uma música inédita do Rei do Ritmo pela Continental, em 1970, causava uma certa estranheza. Duasevidências encontradas pelos pesquisadores, então, clarearam melhor a questão. A primeira veio de uma matéria do Jornal do Brasil, de 1966, que informava o
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prejuízo do mercado fonográfico nacional com a precoce eliminação da seleção brasileira na Copa do Mundo daquele ano, a exemplo da gravadora Continental, que já havia preparado o lançamento do “Frevo do Tri”. A mais importante, entretanto, veio através da “descoberta”, por parte do pesquisador Jocelino Tomaz de Lima, de uma música perdida de Jackson: “Garota de Botafogo” (Álvaro Castilho/De Castro). O compacto dessa canção também é da Continental e contém, no lado A, justamente o “Frevo do Tri”. Embora o selo não traga o ano da gravação, tudo leva a crer (formato do selo, nº do disco etc.) que esse compacto, além de ter sido gravado em 1966, também foi lançado nesse mesmo ano. Dessa forma, é certo que o “Frevo do Tri” foi criado para enaltecer uma eventual conquista brasileira na Copa da Inglaterra (tentando repetir o sucesso do “Frevo do Bi”, de Braz Marques/Diógenes Bezerra,
Também em 66, com repertório bastante diversificado, Jackson gravou “O cabra da peste”, um dos melhores discos de sua carreira, trazendo canções magníficas como “Capoeira mata um” (Álvaro Castilho/De Castro), “A ordem é samba” (Jackson do Pandeiro/Severino Ramos) e “Forró quentinho” (Almira Castilho), apesar do período de ostracismo pelo qual vivia o Rei do Ritmo e o próprio gênero do forró. “Polícia feminina” (Severino Ramos/José Pereira), uma das faixas do álbum, porém, acabou sendo alvo da censura proporcionada pelo regime militar, que determinou sua retirada do disco a partir da segunda tiragem. A perseguição da censura aos artistas nordestinos do forró, que não costumavam gravar canções de protesto, tornou-se mais comum nos anos 70, com a explosão das músicas de duplo sentido. Não era o caso, entretanto, de “Polícia Feminina”, censurada por pura bobagem. Confiram a letra da canção e tirem suas conclusões: Saí do cinema
son cantando “Revendo amigos” (Jards Macalé/ Waly Salomão), gravada especialmente para a ocasião. A trilha dessa película também contém a música “Sim ou não”, interpretada pelo próprio autor, Geraldo Gomes Mourão, o Cícero, irmão de Jackson do Pandeiro (que faz a segunda voz na canção). Outras produções em que Jackson teve canções incluídas na trilha sonora:
De braço com Rosalina Quando ouvi um “siu” Era uma polícia feminina Pediu meus documentos Perguntou onde eu morava Se era solteiro ou casado E onde eu trabalhava Mandou a garota embora E eu fiquei detido Eu fiquei desconfiado e muito constrangido Falou que era dona daquela jurisdição E eu continuava preso no seu coração Só depois de meia-noite veio me libertar Porque a fiscal da turma tinha que passar Gostei do bate papo, qualquer dia eu vou voltar Porque marcamos um encontro lá em Paquetá
4. Jackson no cinema Entre os anos de 1956 a 1962, período em que gozou de grande popularidade, Jackson do Pandeiro participou de diversas produções cinematográficas, apresentando, em sua grande maioria, números musicais. O único filme em que integrou o elenco como ator foi a comédia “Minha sogra é da polícia”, de 1958, onde interpretou o cômico personagem Biriba, atuando ao lado de nomes como Violeta Ferraz, Wilza Carla e Costinha. Nas demais produções Jackson apresentava quadros musicais, participando também de um documentário sobre a noite do Rio de Janeiro. Abaixo, a relação de filmes e canções apresentadas pelo cantor paraibano em cada um: 1956 – “Tira a mão daí” – música “No quebradinho” (Marçal Araújo/José dos Prazeres); 1958 – “Minha sogra é da polícia” – Jackson do Pandeiro interpreta o personagem Biriba; 1958 – “O batedor de carteiras” – música “Querer e não poder” (Aparecida, Jackson e Jorge de Castro);
Cartaz do filme “Minha sogra é da polícia”
1959 – “Cala a boca Etelvina” – número músical intitulado “Fantasia Nordestina”, onde Jackson canta a música “Baião” (Luiz Gonzaga/Humberto Teixeira); 1959 – “Aí vem a alegria” – canção “Vou buscar Maria” (Jackson/Severino Ramos); 1960 – “Pequeno por fora” – canção “De araraê” ((Jackson/José Batista); 1961 – “O viúvo alegre” – música “Minha marcação” (Jackson/Alventino Cavalcanti/Uzias Silva); 1962 – “O bom mesmo é carnaval” - música “Vou ter um troço” (Arnô Provenzano/ Jackson/Otolino Lopes); 1962 – “Rio à noite – A capital do samba” – documentário sobre a vida noturna carioca. Além dos filmes já citados, Jackson do Pandeiro também participou da trilha sonora de vários outros. O mais importante deles, para a obra do Rei do Ritmo, foi o premiado “O amuleto de Ogum” (1974), que se encerra ao som de Jack-
1975 - “Pedro Bó, o caçador de cangaceiros”, com a música “Coco do Norte” (Rosil Cavalcanti); 1985 - “Bajado: um artista de Olinda”, com a música “Sou eu o teu amor” (Alceu Valença/Carlos Fernando), em dueto com Gilberto Gil; 2002 - “Deus é brasileiro” (2002), com “O canto da ema” (João do Vale/Alventino Cavalcanti/Ayres Viana); 2003 - “Benjamim” (2003), com “Sebastiana” (Rosil Cavalcanti); 2003 - “Raízes do Brasil II”, com “Ele disse” (Edgar Ferreira); 2003 - “Pelé eterno”, com “O Rei Pelé” (Jackson do Pandeiro/Sebastião Batista); Em 1978, Jackson do Pandeiro foi também tema de um pequeno documentário, um cineclipe intitulado “A brasa do norte”, dirigido por Ivan Cardoso. Já em novelas, teve a canção “A feira” (Nonato Buzar/Mônica Silveira) incluída na trilha de “Pigmalião 70”, exibida pela rede Globo em 1970.
5. Briga em Recife Uma temática comum nas letras do repertório de Jackson do Pandeiro era a narração de brigas, confusões e causos de valentões. “O desordeiro” (Maruim), “Lei da compensação” (Rosil Cavalcanti), “A mulher do Aníbal” (Genival Macedo/Nestor de Paula), “Cabo Tenório” (Rosil Cavalcanti), “Forró de Surubim” (José Batista/Antônio Barros),
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“À base de bala” (Maruim/Oscar Moss) e “Forró em Caruaru” (Zé Dantas) são alguns exemplos. Na vida de Jackson também houve um fato que poderia virar letra de forró. Contratado em 1955 para fazer uma apresentação na residência de Eládio de Barros Carvalho, ex-presidente do Clube Náutico Capibaribe, no bairro da Tamarineira, em Recife/PE, onde vários atletas e dirigentes do time realizavam uma comemoração, Jackson foi tirar satisfação na festa com Guerra de Holanda, cronista do periódico Folha da Manhã, que soltava pilhérias para sua esposa Almira, chegando ao ponto, inclusive, de passar a conhecida “mão boba” na artista. Um jogador do Náutico tomou as dores do jornalista e passou a discutir com Jackson. Foi o suficiente para vários atletas da equipe partirem para cima do indefeso cantor com chutes, socos e cadeiradas. Jackson e Almira tiveram que se retirar às pressas do local, ele com o rosto ensanguentado e com séria lesão em um dos olhos, que quase o deixou cego, e ela com a roupa rasgada pelas agressões. Posteriormente, Jackson atribuiu ao fato um dos motivos que o fizeram deixar Recife definitivamente, magoado com a falta de providências por parte das autoridades.
6. Universo em desencanto Em sua música, Jackson do Pandeiro explorou a religião em vários momentos. Canções natalinas, homenagens a santos, músicas sobre o candomblé, tudo isso faz parte do repertório jacksoniano. De todas, talvez a mais polêmica seja a fase em que o paraibano foi adepto do Universo em Desencanto, também conhecido como Cultura Racional, espécie de doutrina criada e pregada por Manoel Jacinto Coelho, autor do livro que detalhava os princípios da teoria, segundo ele, ditados por um ser extraterreno, o “Racional Superior”. A obra, inclusive, chegou a figurar entre as mais vendidas no país nos anos 70, e a filosofia virou tema de um documentário semanal televisivo, apresentado pelo músico e produtor João Roberto Kelly, durante vários anos daquela década. Lady Francisco, Procópio Ferreira, Lúcio Mauro e, principalmente, Tim Maia, além de Jackson, foram nomes conhecidos que integraram a seita – Manoel Jacinto costumava dizer que a Cultura Racional não era seita, filosofia ou religião, mas sim um “conhecimento das origens da humanidade”. Enquanto Tim Maia chegou a gravar dois discos inteiramente dedicados à divulgação do Universo em Desencanto, Jackson do Pandeiro lançou apenas 4 músicas sobre o tema, entre 1974 e 1978: “Mundo de paz e amor” (Zito de Souza/Alexandre Alves), “Acorda meu povo” (João Cruz), “Alegria minha gente” e “A luz do saber” (as duas
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de autoria de João Lemos). Em comum com Tim Maia, a excelente qualidade no balanço e no instrumental das canções. O Rei do Ritmo permaneceu ligado à doutrina até o final dos anos 70, quando foi, aos poucos, deixando de frequentar a comunidade sem, aparentemente, um motivo específico.
7. Polêmica com Flávio Cavalcanti
dar meu nome, pedi a rescisão de nosso contrato (junto com Almira) com os Associados”, declarou Jackson. Após o episódio, Flávio Cavalcanti reconheceu o erro, admitindo-o como um mal entendido e pedindo explicações ao diretor da “Modinhas Populares” sobre os critérios utilizados para a publicação de uma canção naquela revista. Eis a letra de “Hotel do Zeferino” (Rosil Cavalcanti):
Em 1957, o apresentador e jornalista FláO hotel do Zeferino vio Cavalcanti comandava na TV Tupi o proNão há cristão que aguente grama Um instante, Maestro!, onde um dos quadros consistia na quebra simbólica de um disco quando uma música era considerada ruim. Em um desses programas, Flávio avaliou a composição “Hotel do Zeferino”, de autoria de Rosil Cavalcanti, atribuindo sua gravação a Jackson do Pandeiro, seu colega nas Emissoras Associadas. No periódico Diário Carioca, onde possuía uma coluna, Flávio Cavalcanti publicou a letra da música e escreveu as seguintes palavras sobre a composição: “...isto aqui é uma coisa que se chama “Hotel do Zeferino”, que o sr. Jackson do Pandeiro, Jackson do Pandeiro “atravessado na garganta” com Flávio Cavalcanti.Foto: dos Associadas, gravou em dis- Revista do Rádio, 1957, ed. 00413. cos Copacabana (…) É preciso rasgar coisas assim. Em nome da música popular brasileira. É preciso rasgar Tudo é fraco tudo é frio partituras que contenham letras assim. E nesSó a mulher dele é quente se papel rasgado, e nesse disco quebrado, fica uma desforra da boa, da incomparável músiO freguês pede um filé ca brasileira.” Só vem carne de pescoço O problema é que Jackson do Pandeiro E se pede feijoada não havia gravado a canção, embora realmenNinguém gosta, ninguém quer te tenha recebido a letra junto com outra dezeA comida é ruim demais na de canções enviadas por Rosil Cavalcanti. De bom só tem a mulher Era costume do compositor enviá-las ao amiZeferino sabe tudo, bota a mulher pra servir go sempre que compunha. As composições foSe a turma dá gorjeta, Zeferino só faz rir ram, então, encaminhadas à Copacabana para O hotel faz bom negócio, e o lucro tá na vista que providenciassem a liberação, ganhando Só porque a mulher dele é bonita e vigarista tempo com o processo. Uma funcionária da gravadora adiantou-se e liberou as letras para a revista “Modinhas Populares”, que publicou a composição como se já estivesse gravada 8. Discografia por Jackson. O cantor paraibano, ao saber das críticas de Flávio Cavalcanti a sua pessoa por Ao longo de sua carreira, Jackson do conta dessa música, defendeu-se no programa Pandeiro gravou mais de 430 canções, conem que atuava pela própria TV Tupi, “Festa no tidas em 29 Lps de carreira e centenas de Arraial”, com palavras pouco amistosas ao seu outros discos, entre compactos, 78rpm e cocolega. A contenda resultou em uma suspen- letâneas diversas. Ainda não se pode chegar são de Jackson nos Associados, culminando a número exato de gravações em razão de com o seu pedido de rescisão. “Fiquei frio de haver registros impressos de canções atriraiva e de vergonha, pois sempre me orgulhei buídas a Jackson cujos áudios não foram de ter um repertório limpo e faço questão disso localizados. Além disso, não há uma homoprincipalmente: manter meu repertório limpo geneidade nos critérios adotados entre os e elevado. Em vista disso, e como a Tupi não pesquisadores para se incluir uma gravação tomava qualquer providência para salvaguar- na lista. Inaldo Medeiros, autor do livro “A
musicalidade de Jackson do Pandeiro” (Editora IGP, 2011), que tem como foco a discografia do artista, optou por deixar de fora da relação das músicas a canção Tarima (Nivaldo Lima/José Gomes) apenas porque a primeira voz é executada por Almira Castilho. Da mesma forma, a música Chico Bendengó (Ayres Viana/Uzias Da Silva/Alventino Cavalcanti). Há que se destacar ainda que Jackson do Pandeiro também cantou em discos de outros artistas, como Abdias, quando fez a voz principal de “Forró do Regatão” (Araponga do Rojão/Antônio Bispo) no LP “Forroriando”, de 1973. Outro aspecto a se considerar é em relação aos registros de canções executadas por ele em vídeo, como filmes ou programas televisivos, sem a respectiva gravação em disco. Após grande período de descaso do mercado fonográfico, boa parte do acervo jacksoniano foi relançado em cd, principalmente através do box “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”, produzido por Rodrigo Faour e lançado em 2016 com 235 faixas do artista em ótima qualidade sonora. Por questões de direitos autorais, porém, apenas 2 álbuns foram reeditados na íntegra nessa caixa: “Aqui tô eu” (1970) e “Isso é que é forró” (1981). Outro box disponível é o “Jackson do Pandeiro – Anos 60”, que trouxe para o cd 3 lps completos (“O cabra da peste”, de 1966, “A braza do Norte” - brasa grafada com “z” mesmo, de 1967, e “É sucesso”, de 1968), além de uma coletânea com raridades. O problema dessa caixa está na baixa qualidade do áudio da maioria das canções. Outros lps de Jackson que possuem edição em cd são “Forró do Jackson” (1958), “Jackson do Pandeiro” (1959) e a coletânea “Sua Majestade o Rei do Ritmo” (1960). O restante são seleções organizadas e lançadas após seu falecimento. A
maior lacuna em compact-disc se refere aos álbuns gravados na década de 70. Praticamente tudo da obra de Jackson que foi disponibilizado em cds também está disponível em plataformas de streaming, como Deezer, Spotify, Apple Music etc.
Livro “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”
9. Bibliografia sobre o Rei do Ritmo Ao se falar em obras escritas sobre Jackson do Pandeiro, a primeira memória remete, claro, à principal delas: a biografia “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”, escrita pelos jornalistas Fernando Moura e Antônio Vicente e lançada pela Editora 34
em 2001. Fruto de um trabalho de aproximadamente 10 anos de pesquisas, a obra disseca, com uma narrativa brilhante, a vida do artista paraibano desde sua infância em Alagoa Grande até o falecimento em Brasília, no ano de 1982. Além disso, em tempos onde as fontes de pesquisa sobre Jackson na internet ainda eram escassas, apresentou uma discografia quase que completa do músico, que serviu de base para que outros pesquisadores pudessem se debruçar e aprofundar seus estudos sobre o legado fonográfico do renomado pandeirista. Enfim, é leitura obrigatória não somente para quem busca saber um pouco mais sobre a vida e obra de Jackson do Pandeiro, mas também para todos que apreciam a boa música brasileira. Além da biografia citada, Fernando Moura foi o responsável, no ano 2000, pelo texto e edição do suplemento de nº 32 da série “Paraíba – Nomes do Século”, da Editora A União, que teve como tema o Rei do Ritmo. Jackson do Pandeiro também foi o personagem de outras obras: - “A musicalidade de Jackson do Pandeiro”: de autoria de Inaldo Soares, foi lançado pela editora IGP no ano de 2011. O livro tem como foco a discografia de Jackson, elencando, em ordens cronológica e alfabética, os discos e canções gravados pelo músico paraibano; - “Jackson do Pandeiro em quadrinhos”: com roteiro de Fernando Moura e ilustrações de Megaron Xavier, faz parte do vol. 9 da série Primeiras Leituras, da Patmos Editora. Lançada em 2016, a publicação é voltada principalmente ao público infanto-juvenil, narrando, de forma didática e ilustrada, a trajetória de Jackson do Pandeiro; - “Coleção Folha Raízes da Música Po-
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pular Brasileira – Jackson do Pandeiro”: com texto do jornalista, radialista, crítico e poeta mineiro Kiko Ferreira, o livreto da Editora MEDIAfashion faz parte do fascículo 15 da coleção da Folha de São Paulo, incluindo um cd com 14 faixas do repertório de Jackson, interpretadas por ele e por outros nomes da MPB; - “100 fatos dos 100 anos de Jackson do Pandeiro”: publicado na Paraíba em junho de 2019 pelo ativista cultural Jocelino Tomaz de Lima, em comemoração ao centenário de Jackson do Pandeiro, o livreto descreve, como o próprio título já diz, cem fatos da vida e obra do Rei do Ritmo, em ordem cronológica. Tema constante de obras da literatura de cordel, Jackson também foi abordado academicamente, servindo, por exemplo, como tese para o Doutorado em Música de Cláudio Henrique Altieri de Campos, pela UNESP, em 2017, e como dissertação para o Mestrado em História de Manuela Fonseca Ramos, pela UFPB, em 2012. Como discos também são grandes fontes de informações, inseridas principalmente em seus encartes, vale destacar o livreto de 19 páginas, escrito por Rodrigo Faour, contido no box “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”, lançado pela Universal Music em 2016. Já os livros a seguir são exemplos de algumas publicações que não têm como abordagem central o paraibano de Alagoa Grande, mas possuem capítulos ou partes dedicados a ele: - “A canção no tempo – 85 anos de músicas brasileiras – volume 1: 1901-1957 (Severiano, Jairo; Mello; Zuza Homem De. Editora 34, 1997); - “A canção no tempo – 85 anos de músicas brasileiras – volume 2: 1958-1985 (Severiano, Jairo; Mello; Zuza Homem De. Editora 34, 1998); - “A música brasileira deste século por seus autores e intérpretes (volume 1)” (Botezelli, J. C. Pelão; Arley, Pereira. SESC, 2000);
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- “Os 100 melhores CDs da MPB (Domingues, André. Sá Editora, 2004); - “Forró de cabo a rabo” (Anísio, Ricardo. Editora Bagaço, 2012); - “O fole roncou: uma história do forró” (Marcelo, Carlos; Rodrigues, Rosualdo. Zahar, 2013); - “101 canções que tocaram o Brasil” (Motta, Nelson. Estação Brasil, 2016).
10. Homenagens em discos e canções O maior legado de Jackson do Pandeiro, além de seus discos e gravações, claro, foi a influência que exerceu e ainda exerce sobre os artistas de diversos gêneros da música brasileira. A divisão vocal, o ritmo, a desenvoltura e personalidade com que passeava pelos mais variados estilos da nossa música serviram de espelho e inspiração para inúmeros músicos. Nomes como Jacinto Silva, Gilberto Gil, Chico Buarque, Genival Lacerda, Alceu Valença, João Bosco, Jarbas Mariz, Zé Ramalho, Elba Ramalho, Gal Costa, Silvério Pessoa, Biliu de Campina, Tom Zé, Fuba de Taperoá declararam publicamente sua admiração pelo Rei do Ritmo e buscaram incorporar em suas discografias elementos característicos do cantor paraibano. Até mesmo artistas de outros gêneros, como Marcos Valle, representante da bossa nova, e a turma da Nação Zumbi e Herbert Viana, nomes do rock nacional, também reverenciaram Jackson. O cd “Jackson do Pandeiro revisto e sampleado”, que trouxe regravações por nomes O Rappa, Gabriel O Pensador, Fernanda Abreu e The Funk Fuckers, é um exemplo clássico disso. Tamanha exaltação resultou em diversos discos e canções gravados em homenagem a Jackson do Pandeiro ao longo dos anos. Para este 2019, quando se comemora o centenário de nascimento de Jackson, esperava-se a gravação de vários álbuns em sua homenagem, porém, até o mês de julho, não
se teve notícia de nenhum lançamento importante. É verdade que os lançamentos fonográficos atuais não dão mais aos músicos o mesmo retorno financeiro de outras épocas, em razão das mudanças nos modos de consumo musical, porém, o principal motivo da falta desses tributos só pode ser um: cantar igual ou próximo ao Rei do Ritmo não é para qualquer um! A seguir, alguns discos já lançados em anos anteriores em tributo a Jackson do Pandeiro ou explorando seu repertório: - “Tributo a Jackson e Rosil”, de Biliu de Campina (1989); - “Forró que não acaba mais – Tributo a Luiz Gonzaga & Jackson do Pandeiro”, Banda Umbuzada (1994); - “Revivendo Jackson do Pandeiro”, de Fuba de Taperoá (1995); - “Mastruz com Leite no forró do Jackson do Pandeiro”, com Mastruz com Leite (1996); - “Marcos Farias interpreta Luiz Gonzaga, Dominguinhos e Jackson do Pandeiro”, de Marcos Farias (1998). - “Tributo a Jackson do Pandeiro”, de Genival Lacerda (1998); - “Jackson do Pandeiro revisto e sampleado”, coletânea com vários artistas (1998); - “Carmélia Alves abraça Jackson do Pandeiro e Gordurinha”, de Carmélia Alves (1999) - “Forró do gogó ao mocotó”, por Jarbas Mariz (2000); - “Techno Roots”, por Marco Bosco (2001); - “Revivendo Jackson do Pandeiro”, de Kojak do Forró (2003); - “Homenagem a Jackson do Pandeiro”, coletânea com vários artistas ao vivo no Canto da Ema (2003); - “Batidas urbanas – Projeto Micróbio do Frevo”, de Silvério Pessoa (2005); - “Forró pras crianças”, coletânea com vários artistas (2006);
- “Ceguêra no samba”, de Ceguêra de nó (2007); - “Revivendo Jackson do Pandeiro”, com Alberto Jackson (2008); - “Jackson, pra você tiro o chapéu!”, por Arlindo Moita (2010); - “Tributo a Jackson do Pandeiro – Ao vivo!”, de Nandinho do Pandeiro (2010); - “Zé Ramalho canta Jackson do Pandeiro”, de Zé Ramalho (2010); -“Quinteto Violado canta Adoniran Barbosa & Jackson do Pandeiro”, de Quinteto Violado (2010); -“Cabeça feita – Silvério Pessoa canta Jackson do Pandeiro”, por Silvério Pessoa (2015); Abaixo, algumas canções compostas e gravadas em homenagem a Jackson (intérpretes em negrito): - “A imagem do Rei” (João Correia/Haroldo Francisco/Kavaliere), por Kojak do Forró (cd “Catitu fora da manada é comida de onça”); - “Assim diria Jackson do Pandeiro” (Antônio José), por Antônio José (cd “Assim diria Jackson do Pandeiro, 2008); - “Bate um balaio ou Rockson do Pandeiro” (João Bosco), por João Bosco (LP Gagabirô, 1984); - “Canário da Borborema” (Bráulio de Castro/Carlos Magno), por Petrúcio Amorim (cd “Fim de tarde”, 1998) e Bráulio de Castro (coletânea “Pernambucaneando”, 2018); - “De pandeiro na mão” (Aracílio Araújo), por Aracílio Araújo (cd “Forró sem fronteiras vol. 5”) e Silveirinha (cd “Tocando e Cantando”); - “Forró pra Zé Jack” (Cláudio Rabeca/ Bozó 7 Cordas), com Cláudio Rabeca (cd “Rabeca brasileira”, 2019);
- “Homenagem a Jackson do Pandeiro” (Dominguinhos), por Dominguinhos (lp “Apôs tá certo, 1979); - “Influência de Jackson” (Guinga/Aldir Blanc), por Leila Pinheiro (cd “Na ponta da língua”, 1998), Marcus Tardelli (cd “Unha e carne”, 2006) e Khrystal (cd “Coisa de preto, 2007); - “Jack Som” (Marco Bosco/Marcelo Dino/Jackson do Pandeiro), por Marco Bosco (cd “Techno Roots, 2001); - “Jack Soul Brasileiro” (Lenine), por Lenine (cd “Na Pressão”, 1999) e Fernanda Abreu c/ participação de Lenine (cd “Raio X”, 1997); - “Jackson no forró” (Severo), por Severo (cd “Severo e Teresa Rios – No forró eu e ela”, 1986); - “Jackson, o Rei do Pandeiro” (João Biano), por Banda de Pífanos de Caruaru (cd “No século XXI, no Pátio do Forró”, 2003). - “Memória de um pandeiro” (Arimatéia Pyauí), por Arimatéia Pyauí (coletânea Forró Fest 10 anos); - “Mr. do Pandeiro”, adaptação de Bráulio Tavares para “Mr. Tambourine Man” (Bob Dylan), por Zé Ramalho (cd “Zé Ramalho canta Bob Dylan”, 2008); - “Para Jackson e Almira” (Guinga/Simone Guimarães), por Guinga (cd “Noturno Copacabana, 2003) - “Pro Jackson do Pandeiro” (Cléber Almeida), por Trio Macaíba (cd “Na trilha do pé de serra”, 2013); - “Saudades do Jackson do Pandeiro” (Bedeu/Luis Vagner), por Bedeu (lp/cd “Iluminado”, 1993), Oswaldinho (cd “Lição de casa”, 2009), entre outros. - “Tributo a Jackson do Pandeiro” (Fernando Sanxo/Sebastião Batista), por Manhoso (lp “Camelódromo, 1985);
- “Tributo a Jackson do Pandeiro” (Ailton Almeida da Silva/João Jailso Teixeira), por Trio Juazeiro (LP “A volta do Trio Juazeiro, 1993); - “Tributo a Jackson do Pandeiro” (Biliu de Campina/Assis do Cavaco), por Biliu de Campina (LP “Tributo a Jackson e Rosil”, 1989) e Fuba de Taperoá (cd “Revivendo Jackson do Pandeiro”, 1995); - “Tributo a Jackson do Pandeiro” (Olinto Potiguar), por Olinto Potiguar (cd “O povo quer forró”, 1996); - “Viva Jackson do Pandeiro” (Hermeto Pascoal), por Hermeto Pascoal (cd “Eu e eles”, 1999).
Fontes consultadas: Moura, Fernando; Vicente, Antônio. Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo. Editora 34, 2001, 1ª edição. Soares, Inaldo. A musicalidade de Jackson do Pandeiro. Editora IGP, 2011, 1ª edição. Marcelo, Carlos; Rodrigues, Rosualdo. O fole roncou – Uma história do forró. Zahar, 2012, 1ª edição. Arquivos da hemeroteca digital da Biblioteca Nacional relativos aos seguintes periódicos: Revista do Rádio, Radiolândia, Jornal do Brasil, Diário Carioca, Diário de Notícias, O Fluminense, O Jornal, Correio Brasiliense, Diário da Noite, Correio da Manhã. g dicionariompb.com.br discosdobrasil.com.br forroemvinil.com immub.org cinemateca.org.br
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JACKSON DO PANDEIRO, A MÚSICA ESTRANGEIRA E A MÚSICA BRASILEIRA
CHICLETE COM BANANA – A “CRÍTICA À INVASÃO DA MÚSICA ESTRANGEIRA” E A “DEFESA DA MÚSICA BRASILEIRA”(*) Claudio Henrique Altieri Campos Um dos primeiros sinais da constatação de Jackson de que o mundo já não era o mesmo dos tempos em que começou a fazer sucesso transparece na música Chiclete com Banana, registrada como composição de Gordurinha e Almira Castilho1. Quando foi lançada, em 1959, a música não se destacou muito entre as demais do seu repertório, mas sua condição e reconhecimento foram mudando com o tempo, a ponto de se tornar, provavelmente, o maior sucesso de toda sua carreira, sendo regravada por diversos artistas2. Chiclete com Banana é classificada como samba no selo do disco compacto em que foi lançada. Porém, o arranjo desta primeira versão da música promove uma mistura entre elementos do samba e do rock, com um pouco do jazz das big bands, demonstrando o caráter híbrido, liminar e de mediação, inerente à música, e que é apontado metaforicamente já em seu título. A música é, portanto, uma espécie de samba-rock, como citado em sua letra. O texto da canção é o seguinte: Jackson: Eu só boto bebop no meu samba Quando o Tio Sam tocar um tamborim Quando ele pegar no pandeiro e no zabumba Quando ele aprender que o samba não é rumba. Aí eu vou misturar Miami com Copacabana Chiclete eu misturo com banana E o meu samba vai ficar assim: Coro: Tchuru-ru-ru-ru-ru-ru bapt, bapt,bapt Tchuru-ru-ru-ru-ru-ru bapt, bapt,bapt
Tchuru-ru-ru-ru-ru-ru bapt, bapt,bapt Jackson: Eu quero ver a confusão! Coro: Tchuru-ru-ru-ru-ru-ru bapt, bapt,bapt Tchuru-ru-ru-ru-ru-ru bapt, bapt,bapt Tchuru-ru-ru-ru-ru-ru bapt, bapt,bapt Jackson: É um samba-rock meu irmão! Jackson: É, mas em compensação, Eu quero ver o boogie-woogie de pandeiro e violão. Quero ver o “Tio Sam” de frigideira Numa batucada brasileira. 120 No plano do texto, é colocada uma condição pelo personagem, que enuncia a canção em primeira pessoa, para que ele aceite misturar o bebop3 com o samba. Por trás desta condição está implícito que ele só passará a considerar o valor positivo dos gêneros norte-americanos quando houver reciprocidade de aceitação e reconhecimento pelo povo dos EUA – representado pela figura do “Tio Sam” –, com relação ao samba. Neste sentido, não é necessário nos estendermos na discussão. A letra é bastante explícita sobre esta situação. Porém, no plano musical – do ritmo, melodia e harmonia – o caso é outro. A mistura de elementos musicais característicos das matrizes culturais norte-americana e brasileira está presente desde o início, sem esperar a realização de qualquer condição que a letra da música diz exigir. Já na introdução, pode-se ouvir um naipe de metais, que antecipa e simula o “Bapt, Bapt, Bapt / Tchuru-ru-ru-ru-ru” cantado no refrão, acompanhado por um contrabaixo enfatizando o arpejo dos acordes, principalmente os
maiores com sétima menor, em um padrão que ficou característico das linhas de baixo no blues e no rock dos anos 1960 – como na execução da mão esquerda do piano no boogie-woogie –, muito próximo também à condução conhecida como walking bass, típica do jazz. Pode-se ouvir também uma bateria, instrumentos de percussão como pandeiro e agogô – comumente identificados com a música popular brasileira –, além de violão e acordeom. Os padrões rítmicos da percussão, incluindo a bateria, seguem por toda a música com a condução de samba. Já os sopros e o contrabaixo, quando colocados concomitantemente a estes, nas seções instrumentais e durante o refrão, executam os elementos idiomáticos de rock/boogie-woogie, promovendo a sobreposição entre os gêneros musicais (samba + rock = samba-rock). É no mínimo curioso que um artista que ficou marcado na memória da música popular brasileira principalmente como “forrozeiro”, tenha como maior sucesso da carreira uma música que mistura samba e rock. Este é mais um indício da condição liminar/liminóide que marca a identidade artística/cultural de Jackson, mediando estes gêneros musicais de diferentes matrizes culturais – entre “Norte” e “Sul”, mas aqui, o “Norte” representa os EUA, com o rock, enquanto o “Sul” é o Brasil, com o samba. Chiclete com Banana é também o primeiro grande exemplo do discurso que Jackson passou a adotar quando se referia à condição do mercado musical brasileiro após a chegada do rock. Desde este momento, no final da década de 1950, até o fim de sua vida, Jackson passou a enfatizar em suas entrevistas e depoimentos, assim como em
Mas que, de acordo com depoimento deixado pela própria Almira (ver MOURA, VICENTE, 2001, p. 268 e 269), teve também a participação de Jackson do Pandeiro na composição. Entre estes, Gilberto Gil, que regravou Chiclete com Banana em seu LP Expresso 2222, de 1972, contribuindo para reavivar o nome de Jackson do Pandeiro para o público da época. 3 O bebop é um estilo do jazz norte-americano, desenvolvido na década de 1940, por músicos como Charlie Parker, Dizzy Gillespie, Thelonious Monk, entre muitos outros. É um estilo associado ao formato de “concerto”, desligado da dança, e que privilegia o virtuosismo de seus executantes, com músicas tocadas em andamentos rápidos e, em geral, com harmonias complexas. Para mais informações, ver BERENDT, Joachim E. O jazz – do rag ao rock. Trad. de Júlio Medaglia. São Paulo, Editora Perspectiva, 1975. 1 2
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sua produção musical, um discurso que ele considerava como uma “defesa da música brasileira”, por meio de uma crítica obstinada ao que, também para ele, se caracterizava como uma “invasão da música estrangeira”. Isso transparece na declaração de Jackson citada anteriormente, onde deixa claro que não apenas ele foi afetado pela condição do mercado musical, ao generalizar que “Deram um sumiço a toda a música brasileira!”. Afinal, quem ou o quê é que deu “um sumiço” e, ainda, qual é “toda a música brasileira” a que ele se refere? Para Jackson, esta “invasão” se materializava principalmente no rock norte-americano e nos artistas brasileiros que o adotaram – que ele chamava de “os cabeludos” –, no que ficou conhecido, no Brasil, como o rock “iêiê-iê”, durante os anos 1960. Em sua perspectiva, parece que foi o rock e seus adeptos que levaram a cabo a ação de “dar um sumiço” à música brasileira. Mas a generalização de Jackson é muito grande neste sentido. Na verdade, eram segmentos específicos do mercado, relacionados principalmente aos setores, gêneros e estilos que começavam a ser identificados com uma ideia de “passado”, que estavam em declínio de público. Gêneros como o samba canção, ou mesmo o samba com acompanhamento orquestral – típico da “Era do Rádio” –, as valsas, serestas, baiões, dos cantores de vozes potentes estavam ficando “fora de moda”. Junto a isso, o segmento de “música regional” começava a perder o alcance de um público “nacional” para se fixar em grupos de fãs específicos, muito ligados ao discurso da “tradição” e até da preservação do “folclore”. Confunde-se, deste modo, fatores de ordem artística/estética, com outros de caráter social, histórico, cultural e, principalmente, mercadológico. Desta forma, se percebe nesta discussão os ecos – mas não se pode afirmar uma influência ou envolvimento diretos – de discursos colocados desde os primeiros folcloristas brasileiros, na virada do século XIX para XX, como Silvio Romero, passando por Mário de Andrade (que não era folclorista, mas flertou com seus métodos), até chegar a Edison Carneiro e seus contemporâneos do I Congresso Brasileiro de Folclore, realizado em 1951; ou o problema da dependência norteamericana no pós-segunda guerra, com as ideias de “imperialismo” e “alienação”, discutidas pelos intelectuais do ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros, 1955 – 131 1964); e mesmo as noções de “cultura popular” que foram adotadas pelos CPCs (Centro Popular de Cultura), nos anos 1960. Todos estes ti-
veram suas maneiras próprias de recorrer à “tradição”, à “cultura popular”, à “identidade brasileira”, ao “regional” em sua relação com o “nacional”, de acordo com seus objetivos específicos4122. Um trecho do depoimento de Jackson, dado à Beatriz Santacruz nos anos 1970 e transcrito por Moura e Vicente, aponta para a relação que o artista fazia entre a “invasão da música estrangeira” e a defesa de mercado para a música brasileira, inclusive com o apelo ao “folclore”: Em nosso país, o músico nunca tem vez. Trabalha muito, ganha pouco. (...) O desemprego em massa de artistas de valor é consequência da falta de divulgação de nossa música. As rádios insistem nos sucessos estrangeiros. O resultado é que o povo se desacostuma em ouvir seu próprio ritmo, só querendo saber do tal do iê-iê-iê. E do modo que vai, o Brasil acaba virando um país sem folclore. (JACKSON DO PANDEIRO, apud MOURA e VICENTE, 2001, p. 281 – grifo meu). A operação simbólica que Jackson realizou, ao identificar sua música popular mediatizada à noção de folclore parece indicar que os temas dos folcloristas, isebianos e dos CPCs, mesmo com suas divergências, de algum modo, chegaram até ele, e Jackson invocava estes discursos neste momento de dificuldade para reivindicar um espaço no mercado musical brasileiro para ele e seus companheiros de classe artística/musical que vinham amargando anos difíceis, com pouca atenção dos meios de comunicação social e das indústrias de entretenimento. Desta forma, para além de uma reivindicação estética ou artística, ao que parece, Jackson estava em meio a uma luta no mercado musical, onde o rock surgia como um gênero que lhe tomava os espaços e oportunidades, impondo-se de forma hegemônica, relegando-o e a “toda a música brasileira” a um papel subalterno neste campo de disputa cultural e econômica. Em 1962, Jackson participou do LP Goal! Do Brasil – O Brasil no VII Campeonato de Futebol – CHILE 1962, com a música Frevo do Bi, de Braz Marques e Diógenes Bezerra. Em entrevista concedida ao jornal Última Hora, em 1972, ele indicou, mais uma vez, considerar ter sido esse o período em que sua popularidade começou a diminuir entre o público brasileiro, apesar de sua memória equivocar-se em alguns detalhes, como demonstram Moura e Vicente (2001, p. 275-276). Quando questionado sobre este tema, pelo entrevistador do jornal, Jackson respondeu:
Não sei, mas tenho a impressão de que foi na Copa de 62. Eu tinha uma música que previa todo o sucesso da Copa do Mundo. Chamavase “Escrete de Ouro” (sic). Um disco profético, até os gols de Pelé estavam lá. Pois bem, o Brasil ganhou, foi aquele carnaval, o disco (meu de parceria com Maruim) devia ter vendido muito. Não vendeu. Encalhou. Por quê? Tenho a impressão de que foi aí que o iê-iê-iê começou a travar o “Escrete de Ouro” e o meu trabalho de artista... (JACKSON DO PANDEIRO, apud MOURA, VICENTE, 2001, p. 275 – grifo meu) Moura e Vicente indicam duas contradições neste depoimento de Jackson: a primeira, futebolística, seria em relação aos “gols de Pelé”, já que este marcou apenas uma vez, no jogo de estreia da equipe brasileira, lesionando-se na segunda partida e não mais participando do torneio; e, a segunda, em relação ao nome da música, que deveria ser, na realidade, o Frevo do Bi e não Scratch de Ouro, de Maruim e Oscar Moss, que só seria lançada em 1963. Entretanto, apesar destas discrepâncias de memória, o mais relevante desta afirmação de Jackson é o fato dele outra vez apontar como causa de sua queda de popularidade e, principalmente, de começar a “travar” seu “trabalho de artista”, o rock “iê-iê-iê”. O posicionamento de Jackson, de enfrentamento ao fenômeno que ele designava como a “invasão da música estrangeira”, abordado de forma bem humorada em Chiclete com Banana, se manifestava nesta declaração direcionado à sua vertente “abrasileirada”. O rock, que se espalhou por várias partes do planeta desde a segunda metade da década de 1950, encontrou ressonância em grande parte do público brasileiro na virada dos anos 1950 para 1960, principalmente entre a juventude da época. O rótulo “iê-iê-iê”, uma corruptela do “yeah, yeah, yeah!”, cantado na música She Loves You, dos Beatles, foi associado ao gênero e aos artistas que o assumiram, no Brasil, com a subsequente projeção de Roberto Carlos ao posto de novo ídolo da música de entretenimento no país. As tardes de domingo, que já haviam sido alegradas com a música e as mungangas de Jackson, em seu programa na TV Tupi, logo passaram a ser dominadas por Roberto Carlos, na companhia de Erasmo Carlos e Wanderléa, que apresentaram, a partir de 1965, o programa Jovem Guarda, na TV Record, aproximando-se do público jovem que ansiava por uma identidade própria, distinta daquelas de gerações anteriores.
Para mais informações sobre isso, ver ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Brasiliense, 2012.
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No ano de 1963, em outra investida contra a “invasão da música estrangeira”, Jackson lançou um disco compacto, pela Philips, com a música Twist Não, um samba-rock de Roberto Faissal e João Grilo, em que cantava: “Twist, outra americanada/ Zuada de guitarra e violão/ Twist, dança tão rebolativa / Se a gente não for viva/ Fica com a ‘carça’ na mão”, com o coro corroborando cantando: “Ê, Twist, sai daqui! Ê, Twist, vai pra lá!/ Ê, Twist, sai daqui! Ê, Twist, vai pra lá!”. Assim como aconteceu em Chiclete com Banana, os elementos musicais presentes em Twist Não contradizem o conteúdo do texto da letra da canção, como se pode notar no ritmo – acentuadamente marcado pela bateria –, na melodia, na harmonia e na instrumentação – com solos de saxofone muito característicos da sonoridade do rock dos anos 1960. Desta maneira, enquanto os elementos “puramente” musicais promovem uma mistura entre o samba e o rock, com destaque para este último, a parte textual/verbal vai no sentido oposto, criticando o gênero estrangeiro e inclusive bradando para que ele se afaste. A outra música gravada neste disco compacto é o samba Ginga da Mulata, de João Mello5, em que o gênero musical é exaltado e sua performance incentivada – em uma atitude diametralmente oposta à que é adotada em Twist Não –, como se percebe já em seus primeiros versos: “Bate, bate, bate, tamborim/ Bate, bate, bate, sem parar/ Bate, bate, bate, tamborim/ Que a mulata entrou no samba/ Com vonta-
de de sambar”. Esta música não teve grande destaque na produção fonográfica de Jackson, mas, se pensarmos neste disco compacto como um enunciado musical/artístico6, isto é, como uma obra “inteira” em diálogo com seus ouvintes e com outras obras – músicas e discos – que circulam no campo da música popular brasileira, podemos entender que o conjunto das duas músicas tinha um mesmo objetivo, que caracterizava uma das preocupações principais do artista neste momento de sua carreira: destacar seu posicionamento, ao mesmo tempo, contrário ao que ele considerava uma “invasão da música estrangeira”, e favorável à “defesa” das manifestações musicais “genuinamente” brasileiras. Em outras músicas do repertório de Jackson, como Xodó de Sanfoneiro (de Gerson Filho e João Silva) e Iê-Iê-Iê no Cariri (de Maruim), além das já observadas, está presente este tipo de crítica. Contudo, em Amigo do Norte126, música de Jackson e de Waldemar Lima, lançada em 1977 no LP Jackson do Pandeiro – Um Nordestino Alegre, pela Chantecler, ele resolveu, depois de muito tempo, contemporizar suas desavenças ao fazer uma brincadeira bem humorada comparando-se ao “amigo norteamericano”: Eu tenho um amigo americano do norte/ Eu sou americano do sul. Ele gosta de lagosta/ Eu gosto de sururu Ele adora Nova York/ E eu adoro Aracajú. É... a nossa amizade/ É independente
Ele com o seu povo/ E eu aqui com a minha gente. O meu amigo é rico/ De capital e saber Eu também sou rico/ Comecei a desenvolver. Nesta canção, mais uma vez, misturam-se explicitamente elementos da música brasileira e da música norte-americana. Entre as brincadeiras que Jackson realiza durante a performance está um diálogo entre ele e o “amigo do norte”: Jackson: Como é, “esse menino”? Gostasse? “Amigo do Norte”: Yes, my friend Jackson! Wonderful! Your samba is “marvilhosso”! A presença desta música em um LP lançado por Jackson em 1977, portanto muito depois de Chiclete com Banana, de 1959, demonstra como este tema das relações entre ele, a música brasileira e a música norte-americana atravessaram boa parte de sua trajetória artística. g Excerto da Tese JACKSON DO PANDEIRO E A MÚSICA POPULAR BRASILEIRA: LIMINARIDADE, MÚSICA E MEDIAÇÃO, apresentada ao Programa de PósGraduação em Música do Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista – UNESP, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Música. Área de Concentração: Música – Relações Interdisciplinares. Linha de Pesquisa: Música, Epistemologia e Cultura. Pesquisa desenvolvida com o apoio da CAPES. Orientador: Prof. Dr. Carlos Eduardo Di Stasi (*)
As duas músicas, Twist Não e Ginga da Mulata, estão também no LP Forró do Zé Lagoa, de Jackson do Pandeiro, lançado pela Philips, no mesmo ano de 1963. Derivo a ideia de enunciado artístico/musical do conceito de enunciado apresentado por M. Bakhtin (2003). Para o autor, um romance, um poema, uma obra literária, podem ser considerados, em seu conjunto, como enunciados plenos. No mesmo sentido, considero que uma canção, ou disco/álbum musical podem ser entendidos como enunciados musicais plenos, em diálogo com seus ouvintes e com outras obras que com ela estabelecem alguma relação. Para mais informações sobre o conceito bakhtiniano de enunciado, ver BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. In: Estética da Criação Verbal, pp. 261 a 306. Trad. do russo por Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2003; e, BRAIT, Beth; MELO, Rosineide de. Enunciado / enunciado concreto / enunciação. In: Bakhtin – conceitos-chave. BRAIT, Beth (org.). São Paulo: Editora Contexto, 2005.
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OS FESTEJOS DE SÃO JOÃO NO NORDESTE
CAMINHO DA ROÇA – A MÚSICA DE “SÃO JOÃO” NA OBRA DE JACKSON
(*)
Claudio Henrique Altieri Campos Retomemos por um momento parte da declaração de Jackson sobre sua situação no mercado musical em 1972: Deram um sumiço em Jackson do Pandeiro, há... de dez a doze anos passados, certo? Ah... Jackson do Pandeiro, só, não! Deram um sumiço a toda a música brasileira! Certo? Deram um sumiço. Tanto é que a gente grava... por exemplo, eu gravo todo ano! Todo ano tem música nova minha na praça, graças à Deus... todo ano eu gravo! São João, Carnaval, e mais um long play todo ano! (JACKSON DO PANDEIRO – MPB Especial [1972], 2012, 27min00seg – grifo meu)1. Reclamando mais visibilidade para sua produção musical, Jackson afirmou que àquela época, no início dos anos 1970, ele continuava ativo, gravando um LP por ano, mais as músicas para o Carnaval – conforme já observamos em capítulo anterior – e também para o período do “São João”. Vamos nos voltar para este tema que foi muito importante para Jackson, principalmente nos anos em que sua popularidade diminuiu, desde a década de 1960. Nesta declaração, ele chamou a atenção para duas das ocasiões festivas populares mais relevantes no Brasil: o Carnaval e as festas juninas, popularmente chamadas de “São João”. Ambos os eventos eram e continuam sendo muito importantes para a cultura popular brasileira, mas também para o mercado de entretenimento em todo o país, incluindo a indústria fonográfica, os produtores de shows e todos os envolvidos com suas estruturas e promoções.
Entre estes, estão muitos artistas/músicos, que oferecem seus trabalhos em apresentações “ao vivo” e nos meios de comunicação social, bem como por meio de suas gravações em discos, CDs, DVDs, etc. E, desde ao menos os anos 1960 – coincidindo com o período em que sua projeção começava a decrescer –, Jackson do Pandeiro voltou-se de forma sistemática para este mercado das festas juninas, procurando ocupar mais um espaço de trabalho que lhe desse visibilidade e oportunidades de retorno financeiro. As festas juninas estão relacionadas aos dias em que se homenageiam três santos católicos: Santo Antônio (13 de Junho), São João Batista (24 de Junho) e São Pedro (29 de Junho). Entre as três datas de festas juninas, a mais prestigiada, no Brasil, é a da festa de São João, principalmente na noite de sua véspera, de onde advém a generalização do modo popular de se referir ao período como “São João”. A tradição de se comemorar estes festejos chegou ao Brasil por meio dos colonizadores portugueses. É reconhecida também a ligação destas festas com o período do solstício de verão europeu, remontando a rituais pré-cristãos – “pagãos” para os cristãos – de colheita e/ou fertilidade, que foram adaptados pela Igreja Católica durante a Idade Média, de modo a ajustá-los às festas de seus santos e mártires. O “contraponto”, em termos de festividades religiosas cristãs, se dá com as festas natalinas – que comemoram o nascimento de Jesus Cristo, em data simbólica –, que coincidem com o solstício de inverno europeu, no mês de dezembro. Os festejos juninos são muito difundidos por todo o Brasil, apresentando
forte associação com culturas rurais, como se nota, por exemplo, na quadrilha caipira, praticada nos Estados do Sudeste, como São Paulo e Minas Gerais. Alberto Ikeda lembra que A quadrilha nos chegou da França (quadrille), através dos portugueses, no início do século XIX. Sua forma original, porém, não é a que se conhece hoje, a nossa popular quadrilha caipira. Inicialmente, foi dança palaciana, praticada pelas elites, em qualquer tipo de festividade, inclusive no carnaval, com coreografia dividida e marcada em cinco partes. No século XIX, e ainda atualmente em algumas regiões, a quadrilha é também conhecida como contradança, derivada dos termos quadrilha de contradança. (IKEDA, 2011, p. 30) Nos Estados do Nordeste, o “São João” é um dos períodos festivos de maior popularidade. Em algumas cidades, chega a rivalizar ou até mesmo superar o Carnaval neste aspecto. São muito conhecidas as festas de “São João” em cidades como, por exemplo, Campina Grande /PB e Caruaru/PE, que disputam atualmente o posto de “maior São João do Brasil”, reunindo milhares de pessoas em cada uma. Um aspecto relevante é que a comemoração do “São João” passou a ser associada à ideia de “tradição” na cultura popular nordestina e é hoje objeto de disputas no campo cultural/simbólico e no mercado do turismo e do entretenimento, entre os adeptos de formas culturais “tradicionais” – como são classificadas, entre outras, as músicas de artistas como Luiz
JACKSON do Pandeiro – MPB Especial [1972]. Direção original: Fernando Faro. Direção do DVD: Marcelo Fróes. [S.I.]: Discobertas, 2012. 1 DVD (50min).
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Gonzaga e Jackson do Pandeiro, em uma provável associação ao que Renato Ortiz (1988, 1994) denomina de moderna tradição – e os que preferem artistas contemporâneos de sucesso, como Wesley Safadão ou bandas do chamado forró eletrônico. A discussão desta disputa não é objeto deste estudo, mas a inclusão de Jackson do Pandeiro entre os nomes referenciais do campo ligado à “tradição da cultura nordestina” é exemplo de como sua imagem e sua música são tomados por esta parte representativa da cultura brasileira. A imagem de Jackson ligada ao “São João” começou a ser construída desde muito tempo, principalmente com suas gravações e shows dedicados exclusivamente a estas festividades. O primeiro disco gravado por ele que tem em seu título algo relacionado às festas juninas é Em Volta da Fogueira, de 1961, pela Philips. Em 1962, participou do LP São João Alegre, Philips, com três músicas, dentre as quais se destaca Na Base da Chinela, de Jackson e Rosil Cavalcanti. O texto da contracapa do disco apresenta Jackson do Pandeiro e Almira como nomes consagrados do elenco da gravadora, ao lado do sanfoneiro de oito baixos Zé Calixto e da dupla Jararaca e Ratinho. Em 1963, Jackson e Almira gravaram o LP Caminho da Roça, Philips, outra vez ao lado de Zé Calixto. A gravadora, na contracapa do disco, recorreu ao discurso da 136 144 autenticidade, relacionado à ideia de “tradição”, para adjetivar as festas juninas e seguir elogiando Jackson do Pandeiro como um dos “melhores do gênero”, como se vê no trecho transcrito:
PANDEIRO o mais completo artista do gênero3. (grifos meus)
Tipicamente apresentada e dentro do espírito autêntico das nossas “festanças” do interior, a música junina ocupa um lugar de real destaque na história da música popular brasileira. Este disco antes de mais nada, nos apresenta um desfile de composições inéditas dedicadas às festas do mês de junho. Seus intérpretes somam-se aos melhores do gênero. Tanto o cantor como o instrumentista. Desnecessário será falarmos de JACKSON DO
Seguindo na mesma direção, no ano seguinte (1964), a Philips lançou outro LP destinado aos festejos juninos, intitulado São João no Brejo – Jackson do Pandeiro e Almira, Alventino Cavalcante, Zé Calixto, Borrachinha. O disco não tem separação entre as faixas e procura simular uma festa junina “ao vivo”, com Jackson conduzindo o evento. No texto da contracapa do LP encontramos a justificativa para a escolha deste formato: “Procuramos dar autenticidade ao ambiente”4. Foi, portanto, uma decisão deliberada para imitar, no formato de high fidelity (TURINO, 2008), uma festa que mistura presentional performance – dos músicos – e participatory performance, nas danças e na interação com os músicos. O discurso da autenticidade foi novamente utilizado, procurando legitimar o repertório e o formato em que o disco foi produzido. Ao iniciar a reprodução, antes da primeira música, surge Jackson anunciando em voz alta: “Atenção pessoal! Chegou os tocadô! Puxa a concertina que vai começá o arrastapé!”, ao que o “público” responde prontamente com aplausos e vivas. E tem início a festa simulada no disco. Jackson não é apenas um cantor nes-
Este tema é estudado de forma aprofundada em TROTTA, Felipe. No Ceará não tem disso não: nordestinidade e macheza no forró contemporâneo. Rio de Janeiro: Folio Digital: Letra e Imagem, 2014 Caminho da Roça – Jackson do Pandeiro, Almira e Zé Calixto. Contracapa. Rio de Janeiro: Philips, 1963. Disco. P 632141 L. 4 São João no Brejo – Jackson do Pandeiro e Almira, Alventino Cavalcante, Zé Calixto, Borrachinha. Contracapa. Rio de Janeiro: Philips, 1964. Disco. P 632700 L. 2 3
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te LP, mas participa como uma espécie de “ator” usando somente a voz, como faziam os atores e atrizes das rádionovelas. Entre cada número musical, dele ou de outro artista participante, volta Jackson com seus comentários ou histórias criando um pequeno enredo para a festa. Por exemplo, logo na primeira música, Queima a sola do pé, instrumental, com solo de Zé Calixto em sua sanfona 8 baixos, passada aproximadamente metade do número musical, Jackson começa a conversar com uma “participante” da festa, dizendo estar preocupado, que havia muita gente armada e que eles precisavam tomar uma atitude, desarmando os presentes para que a festa corresse com tranquilidade. Neste LP, Jackson gravou o coco Véspera e Dia de São João, que, como apontado anteriormente, ele e Maruim adaptaram a partir de suas lembranças sobre o repertório cantado por sua mãe, Flora Mourão. Seguindo a proposta do disco, ele faz uma apresentação prévia à música: “Atenção pessoá! Tira o sapato do pé e forma a roda, que eu agora vou aproveitar [...] pra eu fazê um coquinho pra vocês! Certo?!”. Com a afirmação “forma a roda”, fica esclarecido que este coco era mesmo da modalidade ligada à dança, o coco de roda. Antes da última música do disco, Viva São João, de Jackson e Buco do Pandeiro, ele avisa que “como são 5h30 da manhã” vai pedir para a “Zefa” devolver as facas e revólveres do pessoal que havia sido desarmado no início da festa, mas que ele vai continuar cantando. Ao final da música, encerrando o disco, Jackson brada: “Viva São João!” e o “público” responde: “Viva!”. Jackson termina o disco: “Até para o ano pessoal!”. O texto da contracapa do LP São João no Brejo é interessante por apresentar todo um discurso ligado às ideias de “tradição”, “autenticidade”, às relações entre o “nacional” e o “regional”, além de opiniões sobre “o caipira” carioca e o “matuto” nordestino. Vejamos alguns trechos: A tradicional festa de São João, coloca-
-se na vanguarda dos melhores folguedos nacionais. Especialmente no norte e nordeste, onde as condições de vida do homem, principalmente dos habitantes das cidadezinhas do interior, fornecem as melhores situações e ambientes para tais comemorações. É verdade que nos grandes centros, também se festeja a data do santo querido, embora sem a originalidade característica. Assim é que ‘o caipira’ carioca, fixando o problema no Rio de Janeiro, deixa muito a desejar, comparando-se com o desajeitado e espirituoso matuto daquelas regiões citadas. Este nasce, vive e participa diretamente das tristezas e alegrias da sua gente. Os festejos juninos, surgem ali naturalmente sem qualquer preparação prévia. Exclui-se esta necessidade. O mês de junho é, como outro qualquer do ano, pleno de trabalho, como todos os meses. Quando chega o dia 23 de junho, véspera de São João, aí sim. Todo morador de arraial, fazenda ou vila, adquire uma consciência festiva. E então começa o pagode. É um samba aqui e outro ali. A sanfona ataca. A zabumba, acompanhada dos mais diversos instrumentos de ritmo: afoché, ganzá, pandeiro, etc... faz-se presente. Comparece também o incomparável ‘pife’, gaita feita de bambu, cujo som se assemelha ao pífano (nome certo do instrumento, que o originou). 5 (grifos meus) Escrito em um estilo que lembra o de discursos folcloristas, o texto afirma uma espontaneidade dos festejos juninos nas regiões Norte e Nordeste do Brasil como se estes tivessem uma causa “natural”: “surgem ali naturalmente, sem qualquer preparação prévia”. E ainda reproduz uma imagem sobre o “matuto” como “desajeitado”, parecendo ecoar os discursos sobre o “caipira” caracterizado no personagem do “Jeca Tatu”, muito difundida, por exemplo, nas histórias de Monteiro Lobato, que tinha uma carga negativa forte, associada à preguiça e à indolência. Mas, para o autor do texto, este “matuto” nordestino teria uma vantagem sobre o “caipira carioca”, uma vez que este último pres-
cindiria da “originalidade característica” do outro. Este texto, portanto, reúne uma série de ideias que a gravadora Philips devia considerar como relativas ao senso comum da época, espelhando parte do imaginário social e cultural do período. Ele apresentava algumas informações, quase que didaticamente, mas devia ter como primeira função vender o produto. Então, após toda esta “aula” sobre os temas citados, a gravadora precisava relacionar seus artistas a todo este quadro dos festejos juninos: “Os artistas são nomes sobejamente conhecidos: Jackson do Pandeiro & Almira, excelentes no gênero. Insuperáveis mesmo.”6 (grifos meus) Jackson continuou gravando discos ou participando de coletâneas com foco no “São João” até o fim de sua carreira7, confirmando a importância desta área do mercado musical em sua trajetória artística e contribuindo para a construção de sua imagem como ícone da música “nordestina tradicional”. Também neste aspecto, se percebe a condição liminar/liminoide da identidade cultural/artística de Jackson, realizando a mediação entre formas de cultura popular tradicional – como os festejos juninos – e a música popular mediatizada. Neste sentido, Jackson do Pandeiro, assim como Luiz Gonzaga, entre outros artistas, contribuiu para a construção e consolidação de um mercado musical e de eventos festivos, com repercussão para além da indústria fonográfica, com grande impacto no turismo e na economia de muitas cidades, principalmente na região Nordeste do Brasil, para onde se deslocam todos os anos, muitos dos músicos ligados à “cultura nordestina” em busca de trabalho nte o período do “São João”8.. g Excerto da Tese JACKSON DO PANDEIRO E A MÚSICA POPULAR BRASILEIRA: LIMINARIDADE, MÚSICA E MEDIAÇÃO, apresentada ao Programa de PósGraduação em Música do Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista –UNESP, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Música, sob orientação do Prof. Dr. . Carlos Eduardo Di Stasi. (*)
BIBLIOGRAFIA PELA ORDEM DAS REFERÊNCIAS IKEDA, Alberto Tsuyoshi. Forró: dança e música do povo. In: Folias de reis, sambas do povo. São José dos Campos: CECP; FCCR, 2011. TURINO, Thomas Music as social life: the politics of participation. Chicago: The University os Chicago Press, 2008. São João no Brejo – Jackson do Pandeiro e Almira, Alventino Cavalcante, Zé Calixto, Borrachinha. Contracapa. Rio de Janeiro: Philips, 1964. Disco. P 632700 L. São João no Brejo – Jackson do Pandeiro e Almira, Alventino Cavalcante, Zé Calixto, Borrachinha. Contracapa. Rio de Janeiro: Philips, 1964. Disco. P 632700 L. 7 São João no Brejo – Jackson do Pandeiro e Almira, Alventino Cavalcante, Zé Calixto, Borrachinha. Contracapa. Rio de Janeiro: Philips, 1964. Disco. P 632700 L. 141 São João no Brejo – Jackson do Pandeiro e Almira, Alventino Cavalcante, Zé Calixto, Borrachinha. Contracapa. Rio de Janeiro: Philips, 1964. Disco. P 632700 L. 142 Entre eles: São João no Brejo Nº 2, Philips, 1965; Suplemento Especial de São João Vol. 1, Cantagalo (Coletânea), 1968; Suplemento Especial de São João Vol. 2, Cantagalo (Coletânea), 1968; O Fino da Roça, Fontana/Philips, 1969; O Fino da Roça Nº 2, Fontana/Philips, 1970; Quermesse, Phonogram (Coletânea), 1972; Pau de Sebo Vol. VII, CBS (Coletânea), 1973; Pau de Sebo Vol. VIII, CBS (Coletânea), 1974; Canjica, Pamonha e Rojão, Chantecler/Alvorada (Coletânea), 1977; O Fino do Fino da Roça, Sinter/Polygram (Coletânea), 1979; e, São João Autêntico de Jackson do Pandeiro, Sinter/Polygram, 1980. 8 Sobre este tema, ver ALVES, Elder P. M., A economia simbólica da cultura popular sertanejo-nordestina. Maceió: EDUFAL, 2011 5 6
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COLABORADORES A. J. Pereira da Silva (In Memoriam) – 9, 11, 32 Abelardo Jurema Filho – 5, 11 Adalberto Paranhos - 34 Adalberto Targino – 25, 37 Adelmar Tavares - 32 Adylla Rocha Rabello – EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014 Afonso Arinos (In Memoriam) – 12 Afonso Arinos de Melo Franco (In Memoriam) - 30 Ailton Elisiário – 25, 29, 30, 35, 37 Alceu Amoroso Lima (In Memoriam) – 15 Alcides Carneiro (In Memoriam) - EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015, 32 Alcir de Vasconcelos Alvarez Rodrigues – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Aldo Di Cillo Pagotto (D.) – 8 Aldo Lopes Dinucci – 9 Alessandra Torres – 9 Alexandre Costa de Luna Freire – 1, 37 Aline Passos - 21 Aluísio de Azevedo (In Memoriam) – 13 Aníbal Freire (In Memoriam) - 24 Álvaro Cardoso Gomes – 5 Américo Falcão (In Memoriam) – 9 Ana Isabel Sousa Leão Andrade – 15 André Agra Gomes de Lira – 1 André Lucena - 32 Andrès Von Dessauer – 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 16, 21, 22, 23, 24, 25,26, 27, 29, 30, 32, 33 Ângela Bezerra de Castro – 1, 11, 25, 29, 32, 36 , 37 Ângela Cassia Costaldello - 32 Ângela Maria Rubel Fanini – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Anna Maria Lyra e César – 6 Anníbal Bonavides (In Memoriam) – 8 Anton Tchecov (In Memoriam) - 30 Antônio Mariano de Lima – 4 Antônio Parreiras (In Memoriam) - 28 Ariano Suassuna (In Memoriam) – 14 Arthur Vivacqua Correa Mayer – 35 Ascendino Leite, 37 Assis Chateaubriand (In Memoriam) – 12 Astênio César Fernandes – EE/Augusto dos Anjos/Novembro/2014, 8 Augusto dos Anjos (In Memoriam) – EE/Augusto dos Anjos/Novembro/2014 Aurélio de Lyra Tavares (In Memoriam) – 13 Austregésilo de Atahyde (In Memoriam) – 23 Auxiliadora Borba - 33 Bartyra Soares - 29 Berilo Ramos Borba – 3 Bertholdo Sátyro e Sousa - 34 Boaz Vasconcelos Lopes – 7 Camila Frésca – 5 Carlos Alberto de Azevedo– 4, 6, 11 Carlos Alberto Jales – 2, 12, 14, 16, 23, 25 Carlos Bezerra de Lima Júnior, 36 Carlos Lacerda (In Memoriam) – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Carlos Meira Trigueiro – 2, 5, 35 Carlos Pessoa de Aquino – 5 Celso Furtado - 16 Coriolano de Medeiros (In Memoriam) – 27 Chico Pereira - 16 Chico Viana – 1, 2, 4, 6, – EE/Augusto dos Anjos/Novembro/2014, 10, 13, 14, 22, 24, 33 Ciro José Tavares – 1, 23 Cláudia Luna - 28 Cláudio José Lopes Rodrigues – 5, 6, 27 Cláudio Pedrosa Nunes – 7 Cleanto Gomes Pereira - 33 Cristiano Ramos – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Cristovam Buarque – 10 Damião Ramos Cavalcanti – 1, 11 Deusdedit de Vasconcelos Leitão - 24 Diego José Fernandes – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Diógenes da Cunha Lima – 6 Durmeval Trigueiro Mendes – 37 Durval Ferreira – 7 Eça de Queiroz (In Memoriam) – 14 Eilzo Nogueira Matos – 1, 4, 7, 13 Eliane de Alcântara Teixeira - 6 Eliane Dutra Fernandes – 8, 14, 37 Eliete de Queiroz Gurjão - 28 Elizabeth A. F. Marinheiro – 12, 37 Emmanoel Rocha Carvalho – 12 Érico Dutra Sátiro Fernandes - 1, 9, 27 Erika Derquiane Cavalcante - 24 Ernani Sátyro (In Memoriam) –EE/Augusto dos Anjos/Novembro/2014, 7, EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015, 11, 15, 16, 31, 35, 36 Esdras Gueiros (In Memoriam) - EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015 Eudes Rocha - 3 Evaldo Gonçalves de Queiroz - EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014, 8, 31, 34 Evandro da Nóbrega- 2, 4, 6, EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015, 11, 14, 15, 21, 31 Everaldo Dantas da Nóbrega – 13 Everardo Luna (In Memoriam) - EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015 Ezequiel Abásolo - 8 Fábio Franzini – 7 Fábio Túlio Filgueiras Nogueira - 30 Fabrício Santos da Costa – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Felizardo de Moura Jansen - 29 Fernando Gomes (D.) (In Memoriam) - 25 Firmino Ayres Leite (In Memoriam) - 4 Flamarion Tavares Leite – 8 Flávio Sátiro Fernandes – 1, 2, 4, 6, EE/Augusto dos Anjos/Novembro/2014, 7, 8, 9, 10, 11, 13, 14, 16, 21, 22, 23, 26, 28, 31, 33, 34, 37 Flávio Tavares – 3 Francisco Bley - 32 Francisco de Assis Cunha Metri (Chicão de Bodocongó) - 2 Francisco Gil Messias – 2, 5, 14, 34 Gerardo Rabello – 11 Gustavo Rabay Guerra – 27 Giovanna Meire Polarini – 7 Glória das Neves Dutra Escarião – 2 Gonzaga Rodrigues – 6, EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014, 11, 31, 33, 34 Guilherme Gomes da Silveira d'Avila Lins – 4, 8 Hamilton Nogueira (In Memoriam) – EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015 Hélio Jaguaribe - 33 Hélio Zenaide – EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014 Hildeberto Barbosa Filho – 11, EE José Lins do Rego/Novembro/2015, 31 Humberto Fonseca de Lucena - 23 Humberto Melo – 16 Ida Maria Steinmuller – 24, 32, 33, 36 Igor Halter Andrade – 30 Inês Virgínia Prado Soares - 23 Iranilson Buriti de Oliveira – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Itapuan Botto Targino – 3
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Ivan Bichara Sobreira - 31 Ivan Colangelo Salomão - 34 João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque (In Memoriam) – 4 João Cabral de Melo Neto (In Memoriam) – 27, 29 João Lelis de Luna Freire - 30 Joaquim de Assis Ferreira (Con.) (In Memoriam) – 6 Joaquim do Amor Divino Caneca - 28 Joaquim Osterne Carneiro – 2, 4, 7, 9, EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015, 11, 14, 25, 32, 33 Jonathan França Ribeiro – 30 José Américo de Almeida (In Memoriam) – 3, 10, EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015, 15 José Honório Rodrigues (In Memoriam) - 28 José Jackson Carneiro de Carvalho – 1 José Leite Guerra – 6 José Lins do Rego (In Memoriam) – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 José Loureiro Lopes – 16, 21 José Mário da Silva Branco – 11, 13 José Nunes – 16, 25, 36 José Octávio de Arruda Melo – 1, 3, 6, EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014, 9, 13, 15, 21, 24, 25, 28, 30, 31, 32, 33, 34, 36, 37 José Romero Araújo Cardoso – 2, 3, 10, 11 José Romildo de Sousa – 16 José Sarney – 15 Josemir Camilo de Melo – 11, 28 Josinaldo Gomes da Silva – 5, 10 Juarez Farias – 5 Juca Pontes – 7, 11, 27 Krishnamurti Goes dos Anjos – 29 Ivan Lins – 27 Linaldo Guedes – EE/Augusto dos Anjos/Novembro/2014 Lourdinha Luna – EE/Pedro Moreno Gondim/2014, 7, 13, 15, 29 Lucas Santos Jatobá – 14 Luiz Augusto da Franca Crispim (In Memoriam) – 13 Luiz Fernandes da Silva- 6 Leandro Gomes de Barros, 36 Machado de Assis (In Memoriam) – 9 Manoel Batista de Medeiros – EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014 Manuel Henrique da Silva, v. Né Marinho Manuel José de Lima (Caixa Dágua) (In Memoriam) – 13 Marcelo Conrado – 30 Marcelo Deda (In Memoriam) – 4 Márcia de Albuquerque Alves - 23 Márcio Ferreira de Sousa - 35 Marcílio Toscano Franca Filho - EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015, 23 Marcos Cavalcanti de Albuquerque – 1 Marcus Vilaça - 25 Margarida Cantarelli - EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015 Maria das Neves Alcântara de Pontes – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Maria do Socorro Silva de Aragão – 3, 10, 15 Maria José Teixeira Lopes Gomes – 5, 8 Maria Olívia Garcia R. Arruda – EE/Augusto dos Anjos/Novembro/2014 Mariane Bigio - 28 Marinalva Freire da Silva – 3, 9 Mário Glauco Di Lascio – 2 Mário Tourinho – 13, 34 Martha Mª Falcão de Carvalho e M. Santana - 22 Martinho Moreira Franco – 11, 35 Matheus de Medeiros Lacerda - EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015 Mercedes Cavalcanti (Pepita) – 4 Milton Marques Júnior – 4, 33 Moema de Mello e Silva Soares – 3 Né Marinho, 36 Neide Medeiros Santos – 3, 6, EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015, EE/José Lins do Rego/ Novembro/2015, 15, 23, 27, 32, 37 Nelson Coelho – EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014 Neno Rabello – 11 Neroaldo Pontes de Azevedo – 2 Octacílio Nóbrega de Queiroz (In Memoriam) - 6, 15 Octávio de Sá Leitão (Sênior) (In Memoriam) - 23 Octávio de Sá Leitão Filho (In Memoriam) – 16 Osvaldo Meira Trigueiro – 2, 5, 6, 7, 9, 10, 13, 25, 27, 30, 32 Oswaldo Trigueiro de Albuquerque Melo (In Memoriam) – EE/Epitácio da Silva Pessoa/ Maio/2015 Otaviana Maroja Jalles - 14 Otávio Sitônio Pinto – 7 Patrícia Sobral de Sousa - 21 Paulo Bonavides – 1, 4, 5, 9, 10, EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015, 12, 14, 15, 16, 22,23, 25, 27 Pedro Moreno Gondim (In Memoriam) – EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014 Peregrino Júnior (In Memoriam) - 22 Raimundo Nonato Batista (In Memoriam) – 3 Raúl Gustavo Ferreyra – 5 Raul de Goes (In Memoriam) - EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015 Raul Machado (In Memoriam) – 4 Regina Célia Gonçalves – 22 Regina Lyra – 24 Renan Pires Maia – 35, 36 Renato César Carneiro – 3, 6, EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014,7,9 Ricardo Vieira Coutinho – 31 Ricardo Rabinovich Berkmann – 5 Roberto Rabello – 11 Ronald de Queiroz Fernandes (In Memoriam) – 21 Ronaldo Cunha Lima (In Memoriam) – 35 Rossini Correa – 35 Rostand Medeiros – 12 Ruy de Vasconcelos Leitão – 16 Samuel Duarte (In Memoriam) – 21 Sebastião Aires de Queiroz - 33 Sérgio de Castro Pinto – 22 Serioja R. C. Mariano – 28 Severino Alves de Sousa - 28 Severino Ramalho Leite – 4, EE/Pedro Moreno Gondim/Maio/2014, 13, 15, 16, 29 Silvino Pirauá de Lima – 37 Simões Lopes Neto, 36 Socorro de Fátima Patrício Vilar – 10 Thanya Maria Pires Brandão – 4 Thiago Andrade Macedo – 30 Tiago Eloy Zaidan – 11, 13, 21, 23, 29 Thomas Bruno Oliveira – 34 Túlio Velho Barreto, 36 Vamireh Chacon - 28 Vanderley de Brito – 32, Vanessa Lopes Ribeiro – EE/José Lins do Rego/Novembro/2015 Verucci Domingos de Almeida – 5, EE/Augusto dos Anjos/Novembro/2014 Vicente de Carvalho – 16 Violeta Formiga (In Memoriam) - 21 Virgínius da Gama e Melo (In Memoriam) - EE/Epitácio Pessoa/Maio/2015 Waldir dos Santos Lima – EE/Pedro Moreno Gondim/Novembro/2014 Walter Galvão – 3, 9, 15 Wandecy Medeiros - 30 William Costa - 33 Wills Leal – 2, 7
MEMORIAL JACKSON DO PANDEIRO
Objetos pessoais do Rei do Ritmo, inclusive vários de seus chapéus
Memorial Jackson do Pandeiro, em Alagoa Grande
Documentos pessoais de Jackson e outros papéis
Ossuário em que se encontram guardados os restos mortais de Jackson do Pandeiro
Aspecto parcial das capas dos LPs de Jackson do Pandeiro
Recortes de jornais e fotos de José Gomes Filho
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CONTRA- CAPA (corel x8)
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