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Júlio Miragaya – Página

Hoje a Argentina não chora, mas sorri

Júlio Miragaya (*)

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AGÊNCIA BRASIL

Termina com o título da seleção argentina a 22ª Copa do Mundo, realizada no Catar. A Copa de 2022 foi, certamente, a mais permeada de absurdos, como as restrições à participação de mulheres e pessoas LGBT e o tratamento dispensado pela ditadura do emir Al-Thani à massa de trabalhadores imigrantes. Mas teve, provavelmente, a mais emocionante final da história. Festa em Buenos Aires e em todo o território argentino e tristeza na França.

Por aqui, os brasileiros se dividiram, parte torcendo pelo vizinho sul-americano, para quebrar a hegemonia europeia, que vinha desde 2006, e parte torcendo contra, mesmo sem nutrir muitas simpatias pela França, que nos derrotou na final de 1998 e nos eliminou em 1986 e 2006. Mas como se sente exatamente o torcedor brasileiro após o quinto insucesso consecutivo em Copas? Qual o seu sentimento?

Não há como não lembrar do cântico provocativo entoado pelos Hermanos na Copa no Brasil em 2014: “Brasil, decime qué se siente” (Brasil, me diga o que sente), lembrando o gol de Cannigia em passe genial de Maradona, que eliminou o Brasil em 1990, e as frequentes comparações entre Maradona e Pelé.

Para entender este sentimento, devemos começar por uma breve retrospectiva do desempenho do futebol brasileiro. Após a frustração em 1950, com a incrível derrota para o Uruguai no “Maracanazo”, o Brasil venceu três das quatro Copas realizadas de 1958 a 1970, período da brilhante geração de Pelé, Garrincha, Tostão & Cia, estabelecendo o sentimento de que aqui se jogava o melhor futebol do planeta. Ocorre que, após aquela geração, seguiram-se 24 anos de frustrações, período de hegemonia da Alemanha, com seu futebol pragmático, e da Argentina, comandada pelo gênio de Maradona. A autoestima do torcedor brasileiro voltou a pulsar em 1994, estendendo-se até 2002, com a obtenção de dois títulos e de um vice-campeonato, campanhas capitaneadas pela geração de Romário, Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho. Mas, a partir de então, voltaram as frustrações, e em cinco Copas consecutivas o Brasil foi eliminado nas quartas de final em quatro, e na que avançou para a semifinal, sofreu a maior derrota de sua história, o 7 a 1 para a Alemanha.

O fato é que não se ganha uma copa do mundo apenas com futebol de qualidade. Trata-se de uma competição de tiro curto, onde fatores como concentração, determinação e equilíbrio emocional contam muito. Quanto à seleção brasileira nesta copa, à parte as notórias limitações técnicas de vários jogadores e os crassos erros táticos, o que se questiona é a reduzida concentração e determinação da equipe comandada por Neymar, mais focada em ensaios de dancinhas, pinturas de cabelo e em ostentar seus ganhos milionários em jantares reluzentes.

Trata-se de ter foco, de entender que se busca um objetivo. E isto Messi e seus companheiros mostraram ter de sobra. A simbiose entre time e arquibancada evidenciou tal situação. Sorte de um país que se orgulha de seus ídolos Maradona e Messi, tratados como mitos, não apenas pelo que fizeram e fazem dentro de campo, mas também fora dele.

Não é exatamente o caso de Romário, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e Neymar, todos saídos da pobreza, e que hoje se lixam para os graves problemas do povo. Não por acaso, são todos apoiadores de um “mito de mentirinha” que cultua a tortura.

TEMPESTADE – Após a eleição de Lula, analistas da grande mídia têm dado ênfase a uma falsa questão. Criticam o presidente eleito por estar aumentando para 37 o número de ministérios, argumentando que o desejável seria algo entre 20 e 25.

Ora, a China, país com maior taxa de crescimento do mundo nos últimos 40 anos, possuía, há até pouco tempo, nada menos que 44 ministérios. Já o Canadá, um dos países com maior nível de desenvolvimento do planeta, tem 42 ministérios. De onde foi tirada a ideia de que menor número de ministérios é condição para uma melhor administração ou maior crescimento econômico? Lula não propõe aumento no número de cargos (embora isto seja necessário), mas uma melhor organização da máquina pública, com a redistribuição dos cargos.

É tempestade em copo d’água.

(*) Doutor em Desenvolvimento Econômico Sustentável, ex-presidente da Codeplan e do Conselho Federal de Economia

INFORME

Do massacre à conivência

Outubro de 2015. Professores da rede pública de ensino do Distrito Federal em greve fecharam por cerca de uma hora as saídas dos Eixos Sul e Norte. O protesto legítimo reivindicava o pagamento da última parcela do reajuste salarial conquistado em 2013. Na ocasião, câmeras de cinegrafistas profissionais e amadores flagraram a ação truculenta do Batalhão de Choque da PMDF.

Policiais cercaram um carro que participava da manifestação e retiraram o motorista, um professor, à força. O deitaram no chão com o rosto colado no asfalto e os braços para trás. Algemaram-no. Outro, antes de ser algemado, recebeu um golpe de estrangulamento conhecido como “mata-leão”, perigoso por causar a redução da circulação de sangue até o cérebro.

Muitos foram feridos pelas balas de borracha e os jatos de spray de pimenta disparados à queima roupa. A professora Meg Guimarães, ex-diretora do Sinpro-DF, foi filmada algemada, cercada de policiais, com o nariz escorrendo sangue. Ela teve lesão corporal atestada pelo Instituto Médico Legal (IML) e, desde então, tem sofrido de transtornos de ansiedade e de estresse pós-traumático. Aos meios de comunicação tradicionais, a PM disse que “o uso da força ocorreu após uma hora de negociação para a liberação da via”.

Há mais de 45 dias, apoiadores de Jair Bolsonaro acampam em frente ao Quartel General do Exército, no Setor Militar Urbano (SMU) de Brasília. A ação é criminosa, já que incita as Forças Armadas contra a sociedade civil. Consequência do ato: a Esplanada dos Ministérios, uma das principais vias do DF, foi interditada sem previsão de reabertura, impondo o desvio de quem passa por ali de ônibus ou de carro para trabalhar ou estudar.

Os bolsonaristas fizeram, na segunda-feira (12), uma noite de terror em Brasília. Tentaram invadir a sede da Polícia Federal, atearam fogo em carros de civis e em ônibus. Um veículo estacionado em um posto de gasolina ficou em chamas, com o risco de causar uma explosão do local que tem nas proximidades hotéis e um shopping. Durante os atos criminosos, foram espalhados botijões de gás de cozinha em vias do Setor Hoteleiro Norte.

Na transmissão ao vivo da ação terrorista, feita pela jornalista Juliana Castro, ouve-se de um dos apoiadores de Bolsonaro: “imagina amanhã, quando a gente voltar armado”. Resultado: durante os atos criminosos, ninguém foi preso pelas forças de segurança. A PMDF, convocada para conter as ações daqueles que, dias atrás, em outro canto do Brasil, cantavam o Hino Nacional para um pneu de trator, utilizou força tática completamente distinta daquela empregada contra professores em 2015.

O que motiva ou justifica as diferentes abordagens da Polícia Militar quando a ação se dá junto a professores das escolas públicas do DF, contra trabalhadores sem terra/sem teto, contra estudantes ou qualquer categoria da classe trabalhadora? Os exemplos indicam que as forças policiais são fundamentadas em valores avessos às pautas que guiam movimentos sociais e sindicais, como o Sinpro-DF, como a valorização da classe trabalhadora, o questionamento das ordens, o exercício do pensamento crítico, o protagonismo popular.

Para a diretora do Sinpro-DF Luciana Custódio, não há uma única conclusão do porquê da diferença de abordagem das forças de segurança. Mas é possível identificar claramente o resultado disso na sociedade.

“Supressão de direitos fundamentais, democracia aparente, tentativa de calar os setores progressistas e de conter a indignação do povo. Tudo isso se torna consequência de uma abordagem truculenta a um movimento legítimo, como foi o da categoria do magistério, em 2015. Paralelamente, quando não são tomadas atitudes de repressão necessárias para conter movimentos antidemocráticos, incentiva-se a destruição do Estado de direito, banaliza-se a barbaridade, caminha-se na direção inversa da democracia”, afirma Luciana Custódio.

REPRODUÇÃO TV

PMDF dá tratamento diferenciado aos bolsonaristas acampados no QG do Exército

A quem interessa taxar a inscrição do PAS?

Lucas Cruz (*) e Vitor Boaventura (**)

O Programa de Avaliação Seriada (PAS) é um dos vestibulares da UnB, uma das universidades mais renomadas do Brasil, local de intransigente defesa da democracia. O PAS é destinado aos estudantes do Ensino Médio. Os estudantes, sobretudo os da rede pública, todos os anos enfrentam a mesma dificuldade: as altas taxas de inscrição para o exame.

Em 2021, eles tiveram que desembolsar R$ 127. Neste ano, a taxa obrigatória foi de R$120. A avaliação do PAS é seriada. Ou seja, os estudantes fazem uma prova por ano, para cada série do ensino médio. Com isso, ao término de um ciclo de admissões, o valor a ser desembolsado alcança mais de R$ 300.

O edital dispõe algumas possibilidades de isenção para estudantes de baixa renda. No entanto, quem opta por solicitar a isenção precisa passar por procedimento de comprovação que pode constranger e criar inseguranças que poderiam ser evitadas.

Daí a proposta de se pensar uma solução global, baseada em critérios objetivos e na autodeclaração, ou mesmo no subsídio público para a realização do exame, garantindo-se que nenhum estudante tenha que pagar pelo certame.

Além disso, estudantes relatam que os prazos estabelecidos pelos editais do PAS para comprovação do direito à isenção são incompreensíveis ou inexequíveis. Em 2022, por exemplo, o estudante só sabia se a isenção fora aceita ou rejeitada dois dias antes do encerramento do prazo de inscrição.

A Secretaria de Educação do DF poderia propor algumas formas de custear a taxa de inscrição para os alunos da rede pública. Conforme dados da própria Secretaria, atualmente existem pouco mais de 80 mil estudantes no Ensino Médio da rede pública local. Se todos eles realizassem a prova do PAS, o gasto com o custeio da taxa seria de cerca de R$ 9,7 milhões.

Embora seja um custo alto, vale a pena discutir sobre a alocação dos recursos públicos – em 2021, por exemplo, o GDF gastou mais de R$ 10 milhões com o projeto ‘’Brasília Iluminada’’.

A noção de que a educação não é gasto, mas investimento, além de ser um direito assegurado a todos os cidadãos pela Constituição de 1988, aponta o caminho a ser seguido nesse debate. Manter o sistema de cobrança de taxas e a burocracia na concessão de gratuidade apenas interessa àqueles comprometidos com o aumento das desigualdades no Brasil.

Oxalá possamos ter um PAS mais inclusivo em 2023!

(*) Estudante do 3º ano do Ensino Médio da Rede Pública e vice-presidente da União dos Estudantes Secundaristas do DF (*) Advogado especializado em direito privado e administrativo-regulatório

Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasília Capital

O triste fim da Era Bolsonaro

Um período obscuro e tormentoso da nossa história. Quatro anos de desgoverno para jamais nos esquecermos

J. B. Pontes (*)

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Estamos a poucos dias do término de um dos governos corrupto e, acima de tudo, mentiroso, da história do Brasil. E o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá, sem dúvidas, grandes dificuldades para realizar o seu plano de governo, pois contará com um Congresso Nacional dominado pelo Centrão, cujos parlamentares foram eleitos por força do poder econômico que lhes proporcionou o orçamento secreto.

Felizmente, para o novo governo e para o povo brasileiro, esse período obscuro e tormentoso termina concomitantemente com o maior esquema de corrupção engendrado por Bolsonaro e seus cúmplices no Congresso – o chamado orçamento secreto. Finalmente, o Supremo Tribunal Federal decidiu, seguindo consistente relatório da ministra Rosa Weber, declarar inconstitucionais as emendas de relator, identificadas no orçamento com a sigla RP9.

E não nos esqueçamos de que, por esse ralo – orçamento secreto –, já foram desviados para as mãos de políticos corruptos, do Centrão, mais de R$ 54 bilhões. Esse esquema garantiu estabilidade política a Jair Bolsonaro, especialmente na Câmara dos Deputados, sob o comando do presidente da Casa, Artur Lira (PP-AL), cujos parlamentares do Centrão blindaram o chefe do Executivo contra mais de 140 pedidos de impeachment. Em troca, asseguraram recursos para suas bases por meio das bilionárias emendas de relator, que foram usados para obtenção de apoios políticos e compra de votos. São inúmeros os fatos obscuros e ilegais ocorridos no desgoverno Bolsonaro que devemos jamais nos esquecer. Antes, porém, é preciso relembrarmos o que era Bolsonaro e os eventos que o levaram, numa verdadeira tragédia, a ser eleito presidente.

AGÊNCIA BRASIL

Bolsonaro pregou a necessidade de um golpe para implantar uma ditadura militar neofascista

Tenente expulso do Exército

Bolsonaro foi um tenente expulso do Exército por atos de terrorismo contra a própria instituição, pena revertida por membros da extrema direita integrantes à época do Supremo Tribunal Militar. Logo depois, foi discretamente expurgado das fileiras do Exército para uma confortável reserva remunerada, sendo, em decorrência, promovido a capitão.

Como nada sabia fazer, resolveu ingressar na carreira política, sempre apoiado por uma enorme base de militares e milicianos do estado do Rio de Janeiro. Eleito deputado federal por várias legislaturas, nunca chegou a ter destaque, sempre integrando uma maioria de parlamentares sem nenhuma expressão, denominada de “baixo clero”. ADEPTO DA TORTURA – Bolsonaro começou a aparecer nas manifestações populares de 2013 e foi galgado à condição de notoriedade nas manifestações pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff, sempre expressando um discurso radical de extrema direita, explicitando ser adepto da ditadura, da tortura, defensor do extermínio dos que considerava comunistas, socialistas ou esquerdistas, e contrário aos avanços conseguidos por minorias – indígenas, quilombolas e outras.

Passou então a ser aceito e visto como alternativa de poder para as eleições de 2018 e a receber o endosso do estamento militar que o tinha rejeitado anteriormente, constituído pela oficialidade superior que se ressentia da perda do poder do período da ditadura. Assim, foi alçado à categoria de “mito”.

Boneco tosco como instrumento político

Os “liberais”, identificados com a nossa elite escravocrata, capazes de aceitar qualquer arroubo libertário em nome do mercado, aderiram com alegria ao candidato antipetista. Na verdade, os militares e a elite empresarial viram nele um boneco, bronco e tosco, mas adequado para ser usado como instrumento político. Bolsonaro foi também sendo identificado por personagens que estavam calados, abafados pela redemocratização, público que veio se assumindo e tendo cada vez mais coragem de expressar as mesmas mazelas morais e políticas dele, situação potencializada a partir da crise do governo Dilma; da decepção com o PT, que não mais era percebido como o partido da ética na política; com a erosão da militância de esquerda e o crescimento da “militância” evangélica.

Foi assim que chegamos à tragédia da vitória eleitoral de Bolsonaro em 2018, quando Lula, que mantinha uma larga vantagem nas pesquisas de intenção de votos, foi afastado da disputa eleitoral por meio de ameaças militares, expressadas pelo então comandante do Exército, General Villas Boas, e a subserviência do STF. E não nos esqueçamos da “facada fake”, que causou comoção popular e certamente influenciou na eleição dele.

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