10 minute read
Sinpro – Página
INFORME
Nem heróis nem sacerdotes, somos médicos
Advertisement
Gutemberg Fialho (*)
No dia 18, comemoramos o Dia do Médico, data em que enaltecemos a dedicação, a abnegação, o comprometimento e o empenho desses profissionais no que há de mais caro a todos nós: a defesa da vida. Especialmente nestes tempos de pandemia, médicos, enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem e outros profissionais de saúde foram chamados de heróis.
Isoladas em suas casas nos momentos de maior restrição, pessoas ao redor do mundo foram para as janelas aplaudi-los. Governantes de todo o planeta cobriram de elogios os médicos e demais profissionais de saúde. No Brasil e aqui no Distrito Federal, esse reconhecimento ficou em discurso. Nem ao menos o pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo pela exposição à contaminação pelo coronavírus saiu do papel.
Dois dias após o Dia do Médico, fui ao Hospital Regional do Gama. Na verdade, foi um retorno, pouco mais de dois meses depois de uma vistoria após a qual me vi obrigado a solicitar ao Conselho Regional de Medicina que fizesse a interdição ética no atendimento da clínica médica daquela unidade de saúde. A suspensão da prestação de assistência à saúde da população é uma medida extrema e a última coisa que queremos ver acontecer, em especial sendo médicos.
Na sala vermelha da emergência do HRG, encontrei a colega de plantão, responsável pelos pacientes que se apinhavam no ambiente onde era até difícil transitar. Oito leitos estavam ocupados. Tinha até uma criança de colo (o local é para atendimento a adultos) que sofrera uma convulsão. Mesmo não sendo pediatra, ela estabilizou a criança para que pudesse ser removida para a pediatria do Hospital de Santa Maria. Ela não deixaria o bebê e a mãe sem socorro.
Na parede, próximo da cabeça da colega, havia uma plaquinha com a frase “não somos heróis”. De fato, a função do médico e dos demais profissionais de saúde não é ser herói, tampouco sacerdote ou milagreiro. A prática da medicina é uma atividade profissional baseada em ciência, técnica e evidências.
Mas a realidade que cerca o médico que trabalha no serviço público, e aquela médica, especificamente, é de falta de estrutura física e equipamentos adequados, de medicamentos, de exames e de apoio institucional para executar seu trabalho da forma como deveria e que todo médico almeja: o que chamamos “estado da arte”, ou seja, quando dominamos a técnica e temos os meios para dar ao paciente o melhor tratamento que podemos.
O problema no Hospital do Gama que motivou o pedido de interdição ética é a falta de médicos, clínicos e emergencistas, para minimamente preencher as escalas em todos os turnos de trabalho. Por isso, pacientes internados ficam um, dois ou mais dias sem serem vistos por médicos, sem ter verificada a prescrição médica, os pedidos de exames necessários para serem encaminhados para cirurgia ou até para receberem alta.
O resultado disso é desastroso: desde aumento de custos para o Sistema Único de Saúde até o aumento do risco de óbitos. Mortes evitáveis ocorrem por causa disso e, de diversas formas, isso recai sobre os médicos e demais profissionais – por implicações éticas, administrativas e legais, mas também emocionais e psicológicas, no nível pessoal. Não ter a condição de dar a assistência adequada e merecida ao paciente é um martírio para nós.
E o exercício profissional de ninguém deve ser assim. Enquanto médico, humanista, cidadão e sindicalista, minha luta é para mudar essa realidade, para que o médico e demais profissionais da saúde tenham os meios para realizar seu potencial,
Dr. Gutemberg Fialho
Médico e advogado Presidente da Federação Nacional dos Médicos e do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal
sua missão e a plenitude do prazer de exercer sua atividade, que é curar, cuidar, evitar ou mitigar a dor dos pacientes.
O que esperamos do Poder Público, que administra os recursos da sociedade para a prestação de assistência à saúde, é que nos dê os meios para realizar, o nosso trabalho. Não nos chamem de heróis, não nos cobrem o sacerdócio nem nos exijam milagres. Só nos dêem os meios para fazer o nosso trabalho da melhor forma possível.
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasília Capital
Informe
Feminicídio cresce no DF com desmonte das políticas para a mulher
Sinpro-DF
A pandemia do novo coronavírus parece ter banalizado ainda mais as agressões e os assassinatos de mulheres no Distrito Federal e no País. As estatísticas, que são altas e mantêm o Brasil no quinto lugar no ranking mundial de violência contra as mulheres, cresceram muito e preocupam responsáveis comprometidos com a segurança pública e famílias de pessoas em situação de vulnerabilidade e mobilizam os movimentos de defesa da vida das mulheres.
Estudos realizados pelo Fórum Nacional de Segurança Pública em 2021 mostram que, de fato, a pandemia da covid-19 piorou a violência doméstica e familiar no Brasil. Este ano, em apenas 10 meses, o DF registrou o assassinato de duas mulheres a cada mês. Ou seja, de janeiro a outubro de 2021, houve 20 vítimas de feminicídio. Só dos dias 16 a 18 de outubro, três feminicídios foram registrados, aumentando para 53% esse tipo de ocorrência no DF.
A violência contra a mulher aumentou em todo o País. No dia 18, o Instituto de Segurança Pública (ISP), do Rio de Janeiro, divulgou o Dossiê Mulher 2021, no qual revela que 98 mil mulheres foram vítimas de violência doméstica e familiar no estado em 2021 – cerca de 270 casos por dia e 11 vítimas por hora. Segundo o documento, 78 mulheres foram vítimas de feminicídio e em 15 deles os filhos presenciaram os crimes.
Levantamento da Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul indica alta de 225% no número de feminicídios de agosto de 2020 a agosto de 2021. No acumulado desde janeiro, houve aumento de 26% entre 2020 e 2021. Foram 57 feminicídios nos primeiros oito meses de 2020, contra 72 no mesmo período deste ano. Além disso, houve 20,9 mil ameaças, 11,2 mil casos de lesão corporal e 1,2 mil estupros no ano.
O Diagnóstico de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, divulgado pela Polícia Civil de Minas Gerais em agosto deste ano, revelou que 90% das vítimas de feminicídio no estado, de 2019 a 2021, não tinham medida protetiva. O documento indica que entre 2017 e 2021, 12 mulheres foram mortas por mês; que 69% das vítimas eram negras; que o número de casos de violência doméstica do primeiro semestre de 2021 foi maior do que o de 2020 no mesmo período, dentre outros dados.
Os estudos constatam que os feminicídios têm aumentado entre mulheres negras. No DF, o mais recente foi contra a dirigente sindical Cilma da Cruz Galvão, 51 anos, assassinada a facadas pelo namorado, no início deste mês, em sua própria residência. Ela era diretora de Políticas para as Mulheres e Combate ao Racismo do Sindicato de Serviços Terceirizáveis (Sindiserviços-DF).
No dia seguinte, o grupo de mulheres que se intitula “Levante Feminista contra o Feminicídio no DF” realizou um protesto contra a morte da sindicalista e das demais vítimas desse crime. No dia 19, o Levante Feminista apresentou uma petição a ser entregue ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) pedindo a instauração de procedimentos para apurar a responsabilidade do Governo do Distrito Federal por omissão na adoção de políticas públicas para o enfrentamento dos feminicídios, “cujo número, no primeiro semestre deste ano, foi 100% maior do que o do mesmo período em 2020”, diz a petição.
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasília Capital
Ordem de despejo
Um mês depois de inaugurado, o Espaço Cerrado, no Parque da Cidade, recebe notificação para desocupar o quiosque
José Silva Jr.
Idealizado pelo Instituto de Desenvolvimento Ambiental e Sustentabilidade Arvoredo, o Espaço Cerrado, que funciona no Parque da Cidade, recebeu notificação de despejo um mês depois de inaugurado.
Segundo a Secretaria de Esportes do GDF, o quiosque onde ele está instalado é destinado “à exploração comercial na modalidade restaurante, de acordo com o Plano de Uso e Ocupação do Parque da Cidade Dona Sarah Kubitschek”.
Na notificação encaminhada ao Instituto Arvoredo, a Secretaria acusa a entidade responsável pelo Espaço Cerrado de estar irregularmente ali. No mesmo documento, a Pasta informa sobre a destinação do ambiente.
No trecho da notificação da Secretaria consta: “processo
Secretaria de Esportes quer que o projeto saia do Parque da Cidade porque o quiosque, ocupado pelo Instituto, deveria ser um comércio.
em curso, que trata de elaboração, pela área técnica, de certame licitatório para a estrutura mencionada, observando a sua destinação”. E pede imediata reintegração do espaço.
AUTORIZAÇÃO – “Tendo em vista os ofícios 0008-20 e 00107/2021 ARV, oriundo desse Instituto, por meio dos quais solicita estrutura física no Parque da Cidade Dona Sarah Kubitschek, por prazo de vigência de 15 (quinze) anos, objetivando a implementação do Espaço Cerrado e execução das demais atividades relacionadas ao estatuto da entidade, informamos o que segue: a ocupação se apresenta de forma irregular, de modo que a entidade ocupa antecipadamente o imóvel sem a devida autorização”, destaca a Secretaria no documento do qual o Brasília Capital teve acesso.
O presidente do Instituto Arvoredo, Umberto Lúcio, no entanto, nega que tenha instalado seu projeto sem autorização. “Tivemos autorização via WhatsApp da Secretaria para a gente ocupar o espaço enquanto o processo estivesse tramitando”.
Realização de um sonho
em administração e gestão pública, Umberto Lúcio conta que o projeto é “a realização de um sonho de vida”. O Espaço Cerrado é uma fonte de informação sobre a vegetação típica do Centro-Oeste para frequentadores e visitantes, principalmente estudantes.
O centro de convivência ambiental no Parque da Cidade recebe gente de todas as faixas etárias. Em apenas um mês, passaram por lá mais de mil pessoas. O objetivo do projeto é mostrar, de forma didática, a importância do Cerrado e do seu bioma.
Logo na entrada, o visitante se depara com painéis que contam um pouco da história e fala da importância e peculiaridades do Cerrado. Num, sob o título de O Cerrado é insubstituível, a pessoa vai saber que as árvores são como esponjas gigantes: acumulam água durante a chuva e a depositam em reservas subterrâneas para utilizá-la no período da seca.
Do lado de fora, há espaço voltado para a criançada e para os jovens e apreciadores da arte e luta. De um lado, um tabuleiro gigante de xadrez chama a atenção. Foi ele que atraiu Gustavo Rodrigues, 36 anos, morador do Guará, ao lugar. “Frequento o Parque há muitos anos. Este espaço é muito gostoso. Dá para interagir com as crianças”, destacou. “Mal inaugurou e já vão tirá-lo?”, surpreendeu-se o militar.
Ordem de despejo
FOTOS: ANTÔNIO SABINO
Bar do Barulho
Antes de ser ocupado pelo Espaço Cerrado, o quiosque situado nos fundos do Kartódromo do Parque era destinado ao Bar do Barulho, um ambiente voltado ao público LGBT. No local, eram consumidos todos os tipos de bebida e funcionava até à noite. Às vezes, adentrava a madrugada.
Ao acumular casos de violência, o Governo do Distrito Federal resolveu cancelar a permissão dos proprietários do Bar do Barulho. Um dos casos mais frequentes era a exploração de adolescentes nas redondezas do ambiente, o que pesou na decisão do GDF.
Instrutor de futevôlei, Luciano tem permissão para uso de uma quadra de areia localizada a poucos metros do Espaço Cerrado. Há 16 anos no lugar, ele conta que não foi boa a experiência com o antigo vizinho, quando ali era destinado para a venda de bebidas alcoólicas e não para a distribuição gratuita de informações sobre a nossa flora, como é hoje. “Praticamente todos os dias eu tinha de tirar areia com urina por toda a quadra, além de garrafas e latinhas”, recorda.
A reportagem procurou a Secretaria de Esportes, responsável pela administração do Parque da Cidade, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição. Enquanto isso, o barulho do despejo já ecoa na cabeça de Umberto Lúcio.