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Empréstimos comprometem futuro de Alagoas

Pesquisador da Ufal diz que há risco do Estado repetir tragédia da era Suruagy

ODILON RIOS

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Especial para o EXTRA

Ogovernador Paulo Dantas (MDB) conseguiu aprovar, na Assembleia Legislativa, novo pedido de empréstimo, desta vez de R$ 1,1 bilhão (exatos R$ 1.127.602.299,24), menos com o voto do deputado Fernando Pereira (PP).

O argumento é que o dinheiro será usado no “Programa Visão Alagoas 2030”, ou seja, obras de infraestrutura rodoviária, aeroportuária e urbanização divididas em quatro programas: Alagoas de Ponta a Ponta, Minha Cidade Linda, Conecta Alagoas e Aeroporto Costa dos Corais.

Pesquisador da dívida pública e da política de empréstimos adotadas por países e estados, o professor da Ufal José Menezes Gomes diz que Alagoas corre o risco de comprometer o próprio futuro e assistir a uma crise financeira e social como a de 1997, que derrubou o então governador Divaldo Suruagy, acumulando meses de salários atrasados de servidores públicos.

“Esse foi o caminho trilhado por todos os governos que acabou levando a lei complementar 156, que renegociou todas dívidas estaduais federalizadas em 1997”, resume.

Esta lei complementar é de 2016 e institui um plano de auxílio aos estados ampliando para 20 anos o prazo de dívidas refinanciadas com a União. “Com isso tivemos a permissão para um novo ciclo de endividamento e a rolagem”, completa o professor.

É preciso lembrar que parte principal dessas dívidas se referia ao passivo vindo dos bancos estaduais. No caso de Alagoas, do Produban. Essa dívida também incluía calotes de usineiros no banco público e foi convertida em débito federal, com taxa de juros elevadíssimas e com a ocorrência de anatocismo (juros sobre juros entre entes estatais).

O Supremo Tribunal Federal (STF) já tinha dado liminar reconhecendo a ilegalidade da parte do saldo devedor que resultasse de anatocismo. Inclusive, 11 estados conseguiram liminares com a Súmula 21, do STF.

Daí houve uma guinada: os estados, ao invés de pressionarem o Supremo por uma decisão definitiva que reduziria brutalmente o montante da dívida e o desembolso dos juros, optaram por uma negociação.

“Passados vinte anos os estados voltaram a alegar calamidade financeira [como em 1997] e exigiram uma nova etapa de renegociação por mais vinte anos e a União, via Lei Complementar 156 em 2016, mais um vez exigiu a privatização das estatais restantes, especialmente as empresas de água, novamente com cerca de 80% do dinheiro vindo do BNDES. Além disso, os estados iniciaram um novo ciclo de endividamento interno e externo e incorporaram as reformas propostas pelo governo federal, atacando os servidores e os serviços públicos”, afirma.

Ao longo das décadas, os servidores públicos, das várias esferas, foram colocados como responsáveis pela expansão dos gastos públicos, quando na verdade o serviço da dívida passou a ficar cada vez com uma fatia maior do orçamento público, além de influenciar todo o funcionamento da economia.

“Usar a dívida pública como justificativa para as reformas neoliberais é parte do ritual seguido por vários governos e partidos em diversos momentos do processo de destruição dos direitos sociais nos mais variados países. A atual reforma administrativa proposta é filha tardia desse processo de estabilização da moeda, desestabi- lização das contas públicas e da economia”, conta o professor da universidade alagoana.

Pelas pesquisas de Menezes, é possível concluir que em cada momento histórico existe um encurtamento da possibilidade dos estados se endividarem e, mais à frente, alongarem a capacidade de novo endividamento.

“No Brasil, na ditadura militar, foram criados os mecanismos legais para que os estados e a União pudessem se endividar. Existia uma ideia nos Estados Unidos, que trabalhei em minha tese, que dizia que o país mais rico era também o mais endividado”, lembra.

“Esse processo está associado à própria crise do capital que busca sempre nos estados o seu grande tomador de crédito, ao mesmo tempo que os bancos se convertem também nos principais compradores de títulos da dívida pública. Assim, ganham dinheiro liberando crédito aos estados e ganham do outro lado comprando os títulos dos governos que esses governos possam pagar a eles com os juros”, diz.

A saída seria um trabalho conjunto: uma auditoria cidadã da dívida em cada Estado, com destaque aos passivos dos bancos estaduais. No caso alagoano, o Produban. Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa, no final dos anos 90, mostrou que parte do rombo do banco veio de empréstimos dos usineiros e, nos outros estados, das burguesias regionais.

“Estas burguesias detêm o poder econômico e por sua vez o poder político estadual e federal e são os mesmos que defendem a Reforma Administrativa e que já votaram a favor das reformas trabalhistas, previdenciária etc.”, finaliza o professor.

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