Ciência em Pauta - 05 - outubro 2012

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V oc ê ou v e t od a h or a n a t e l e v i s ã o s ob r e c l a s s e m é d i a e s u a s d i v e r s a s d i v i s õe s . E s s a s c a t e g or i a s g e r a l m e n t e s ã o f e i t a s a p e n a s p e l a r e n d a f a m i l i a r . M a s p e s q u i s a d or e s d a U F U m os t r a m q u e h á m u i t o m a i s u n i n d o e s s e s g r u p os s oc i a i s d o q u e a p e n a s o s a l á r i o. E n t e n d a m a i s s ob r e e s s a i n t e r e s s a n t e c l a s s i f i c a ç ã o!


você sabia

Sopa de letrinhas

O termo “classe média” foi cunhado em 1785 por Thomas Gisborne para designar

demográficas e econômicas das famílias das 10 principais regiões metropolitanas do país.

ção econômica que utiliza o levantamento de características domiciliares (presença e quantidade de alguns itens domésticos de conforto e grau escolaridade do chefe de família) para diferenciar a população. O critério atribui pontos em função de cada característica, depois é feita uma correspondência entre faixas de pontuação e estratos de classificação econômica definidos por A1, A2, B1, B2, C1, C2, D, E. O CCEB é baseado no Levantamento Sócio Econômico (LSE), a pesquisa anual do IBOPE Mídia que mapeia as características sociais,

ca segundo o sistema de pontos do CCEB. A classe média emergente, dividida nas faixas C1 e C2 do CCEB, apresentam renda média familiar de aproximadamente R$927,00. Já as classes B1 e B2 possuem renda de R$ 4.684,00 e R$2.804,00, respectivamente. A classe média representa aproximadamente 59% da população brasileira. A classe alta representa 6% e a baixa, os 35% restantes. O fenômeno denominado “mobilidade social” ocorre em larga escala em países em desenvolvimento, como o Brasil.

o grupamento de profissionais liberais e comerciantes que tentava encontrar seu lugar na sociedade, entre os grandes proprietários e os trabalhadores braçais. O Critério de Classificação Econômica Brasil (CCEB) é um instrumento de segmenta-

Expediente

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Anna Vitória Rocha, Paula Nascimento e Ugo Flores

A partir de uma amostra probabilística, o estudo levanta as características físicas de cada domicílio pesquisado, os dados demográficos de todos os moradores, a posse de diversos bens, a utilização de serviços e a renda familiar, permitindo a definição da classe econômi-

Esta publicação é parte integrante do projeto de popularização da ciência – Universidade Federal de Uberlândia (UFU) / Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) Reportagens: Ana Beatriz Tuma, André Victor Moura, Anna Vitória Rocha, Paula Nascimento e Ugo Flores Edição: Ana Spannenberg (MTb 9453) Fotos: André Victor Moura e Danielle Buiatti Arte e Diagramação: Danielle Buiatti Tiragem: 2.000 exemplares (Distribuição gratuita) Informações: popciencia@ufu.br


Pesquisa analisa classe média

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Comerciários e auditores são os grupos avaliados no projeto do Instituto de Ciências Sociais da UFU

A classe média, assim como outras camadas sociais, é formada por diferentes frações: a baixa, a intermediária e a alta classe média. O comportamento político-ideológico

dessas faixas pode ser reivindicativo ou retraído, dependendo para isso, de cada momento político-econômico que se vive, tanto no país, quanto internacionalmente. A maior parte das informações sobre a classe média que se assiste na mídia é da área de Economia, que define essa classe como estrato de renda. Ou seja, se você ganha entre 400 e 1500 reais você é da classe média baixa, por exemplo. Já a visão que a Ciência Política tem para definir a classe média, refere-se a como os grupos de pessoas se inserem na sociedade, como é a profissão, as

Ana Beatriz Tuma e André Víctor Moura

fissional e o critério político-ideológico para poder compreender o comportamento dos indivíduos em diferentes momentos, ultrapassando em muito o fator renda, proposto pelos economistas Para Santiane Arias, doutora em Ciência Política da UNICAMP, analisar somente a renda por si só não nos diz nada, ou seja, é

Arquivo Pessoal

na UFU

necessário situá-lo sócio historicamente. Arias diz que “esse parâmetro tem sido vulgarmente utilizado nessas classificações sem fim (classe a, b, c, d, e...), que pouco ou nada tem a ver com a noção de classe social.” Desta forma, a classe média é heterogêna sendo formada por várias, que não são uma única classe, pois são atravessadas pelas divisões e oposições de interesses entre frações, camacaracterísticas da situação de trabalho do pro- das e categorias, explica ela. Para entender melhor, existem os profissionais liberais, os trabalhadores do serviço público e/ou privado que também podem pertencer a classe média, mas têm experiências e interesses diferentes no trabalho e adotam costumes políticos diversos. As classes médias não são uma única classe social, nem do ponto de vista econômico e nem do ponto de vista político completa a professora Arias. Santiane Arias: as classes médias não são uma única classe, nem do ponto de vista econômico, nem do político


André Víctor Moura

na UFU

O universitário Fernando Araújo explica que o que agrega os comerciários é a ideologia da ascensão social por meio do trabalho

Relação com a política

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A temática Classe Média e Política no Brasil Contemporâneo, nome que corresponde ao projeto da professora de Ciência Política da UFU, Patrícia Trópia, “parte do princípio de que a sociedade é formada por grupos, definidos por alguns autores como classes, mas nem todos os autores têm a mesma visão de classe”, afirma. O objetivo dessa pesquisa é observar como a classe média reage e se comporta diante da política. Patrícia Trópia trabalha com as frações da classe média. Para realizar a pesquisa, ela selecionou duas supostas categorias dessa classe para serem pesquisadas. De um lado, os comerciários, que são os trabalhadores do comércio, possuindo um padrão de renda extremamente baixo, sendo o segundo pior salário na hierarquia nacional e também de Uberlândia, sendo este setor o segundo maior empregador desta cidade. De outro, os auditores fiscais da Receita Federal, que possuem o maior salário do Estado, cargo para os quais os concursos são os mais concorridos do país e que exigem uma série de atributos. Esses dois polos foram escolhidos por Trópia para saber como se comportaram durante os oito anos de governo Lula, ou seja, como as políticas rebateram sobre esses setores. Algumas perguntas foram fundamentais para entender a conduta desses dois frações de trabalhadores, como: “Como é que

diante da reforma sindical e trabalhista esses profissionais se comportam? Como diante do

Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) esses setores se comportam? Como diante dos programas assistências, como Bolsa Família, se comportam?”, além de também pesquisar a política externa. Desta forma, os pesquisadores analisaram como esses grandes assuntos/eixos são interpretados pelos comerciários e auditores da Receita Federal. Com isso, aceitar ou rejeitar as políticas implementadas pelo governo têm relação com a condição de classe média baixa (comerciário) e classe média alta (auditores da Receita Federal). A pesquisa coordenada por Trópia é desenvolvida por estudantes de iniciação científica da Universidade. “A gente pesquisa o auditor individualmente e, ao mesmo tempo, a sua entidade, pois como ela se posiciona e se expressa é uma variável fundamental para fazer o trabalho de campo”. A professora diz que o mesmo é feito com os comerciários. O estudante de Ciências Sociais da UFU, Fernando Araújo, estuda os comerciários. Ele conta que essa fração da sociedade é dividida entre gerentes e vendedores. “A principal visão deles é a ideologia da ascensão social por meio do trabalho. Essa é ideia de que você trabalha e, por isso, você consegue ascender socialmente”.


André Víctor Moura

Características comuns? Apesar de todos os trabalhadores que compõe a classe média serem assalariados, de acordo com Trópia, essa não é característica suficiente para compreender essa classe. Então será que há alguma característica? A professora responde que é a meritocracia,

padrão do salário mínimo e instituiu políticas compensatórias, que, no caso dos comerciários, afetam suas vidas e cotidianos”. Já no caso dos auditores fiscais, a coordenadora diz que a avaliação deles não é predominantemente negativa, apesar de existir críticas da parte deles. Trópia exemplifica um dos motivos disso acontecer, afirmando que os auditores foram afetados pela reforma da Previdência, assim como todos os servidores públicos. “Ali, os audito-

ENTENDA MAIS Nos últimos dez anos, quase 40 milhões de brasileiros emergiram para a classe C, constituindo a chamada nova classe média, cuja renda familiar

Para Patrícia Trópia, apesar das diferenças, o que une as diferentes camadas da classe média é a “ideologia da meritocracia”

res fiscais se colocavam contra o governo Lula, pois seus interesses estavam sendo afetados”. Mas, afinal, os auditores públicos e os comerciários fazem parte da classe média? A professora responde que sim. “Os auditores, fundamentalmente, porque eles agem por mérito. Eles defendem que só pessoas especiais, que têm determinado compromisso público e perfil, que passaram por um longo processo de concurso, têm a habilidade e capacidade de exercer aquele trabalho”. No caso dos comerciários, Trópia diz que eles acreditam que não é qualquer pessoa que saiba vender e lidar com o público, que tenha esse dom, aparecendo aí também a característica da meritocracia. A ciência e a sociedade ganham com o projeto das Ciências Sociais. Isso é o que afirma o estudante Fernando Araújo. “Para a ciência, é um ganho muito grande, porque quase não se pesquisa classe média. Para a sociedade, é importante que os projetos do poder público estejam sensíveis às demandas dela”. Araújo cita como exemplo hipotético a demanda por clubes. Com o poder público sabendo disso, deve criar projetos para atender essa demanda.

média é de quase R$ gente matriculam seus fi2.300. Até 2014, são espe- lhos em escolas partirados outros dez milhões. culares, e não em escolas públicas. Essas famílias passaCada vez mais, as ram a enxergar a educação famílias da classe C emer- como um valor e a preocu-

na UFU

ideologia dessa fração da sociedade. A meritocracia é o reconhecimento da pessoa pelo mérito. A professora explica essa ideologia: “Se eu tenho mérito, eu tenho que ter mais benefícios, tenho que ser reconhecido como alguém que é superior”. Para conhecer mais sobre a classe média, Trópia diz que um dos aspectos estudados pela equipe foi fazer o levantamento de greve, de reivindicações. Dessa maneira, percebe-se a presença da meritocracia usada no discurso dos trabalhadores. “Em geral, os segmentos de classe média, na hora que vão argumentar porque o salário tem que aumentar, eles dizem: ‘porque a nossa função é fundamental para a sociedade, sem a gente a sociedade não anda’”, exemplifica. As pesquisas do grupo de Patrícia Trópia revelam que os comerciários têm, no geral, uma visão positiva das políticas do governo Lula. Isso é devido a algumas variáveis. A professora explica uma delas: “Embora a política do governo Lula, em minha opinião, não tenha satisfeito todas as expectativas sociais e populares, ela manteve o poder de compra dos salários, aumentou o

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par-se com a segurança dos filhos. É o que aponta uma pesquisa realizada pelo instituto de pesquisas Data Popular com 5.003 brasileiros em 44 municípios.


faça vc!

Quer saber onde você se encaixa?

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Ana Beatriz Tuma e André Víctor Moura


Na prática, que diferença faz?

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Lazer, educação, cultura, valores. Muitas coisas são percebidas de modo distinto a partir das classes sociais. O Ciência em Pauta entrevistou duas estudantes do ensino médio, Angélica Teixeira e Taynna Siquierolli, ambas da classe média para mostrar como isso se funciona.

CIÊNCIA EM PAUTA - Quantas pessoas moram nas suas casa? Angélica Teixeira – Cinco pessoas. Taynna Siquierolli – Três pessoas. CIÊNCIA EM PAUTA – Quantos irmãos vocês têm? Angélica – Dois. Taynna – Apenas um. CIÊNCIA EM PAUTA – Vocês viajam regularmente? Angélica e Thaynna – Aham. CIÊNCIA EM PAUTA – Para onde? Angélica – Geralmente para Ituiutaba. Taynna – Eu costumo ir para o litoral. CIÊNCIA EM PAUTA – Qual a profissão dos pais de vocês? Angélica – Minha mãe é professora da rede pública e meu pai é ajudante operacional. Taynna – Os dois são empresários. CIÊNCIA EM PAUTA – Onde vocês estudam? Angélica – Eu estudo na Escola Municipal Messias Pedreiro. Taynna – Colégio Nacional. CIÊNCIA EM PAUTA – Como vocês vão e voltam para a escola? Angélica – Eu vou de carro e volto de ônibus. Taynna – Vou e volto de carro. CIÊNCIA EM PAUTA – Quantas vezes por mês vocês vão em eventos culturais, como teatro, cinema...? Angélica – Umas duas, mais ou menos.

Taynna Siquierolli

Taynna – Acho que umas quatro.

diga aí!

Angélica Teixeira

Arquivo Pessoal

Arquivo Pessoal

Anna Vitória Rocha, Paula Nascimento e Ugo Flores

CIÊNCIA EM PAUTA – Qual o principal meio de transporte de vocês? Angélica – Carro, mas eu também uso o transporte público. Taynna – Carro.

CIÊNCIA EM PAUTA – Qual a sua atividade de lazer favorito? Angélica – Eu gosto muito de ir ao clube. Sou sócia do Caça e Pesca. Taynna – Eu vou bastante nos restaurantes que eu mais gosto. CIÊNCIA EM PAUTA – Quantos livros vocês lêem por ano? Angélica – Eu leio os oito livros que o PAAES exige. Além desses, eu leio um ou dois. Taynna – Em média uns 4 ou 5.

CIÊNCIA EM PAUTA – Vocês fazem alguma atividade extracurricular? Alguma língua, teatro, esporte...? Angélica – Eu faço curso pré-PAAES. Taynna – Inglês, espanhol, jazz, balé, natação e academia. CIÊNCIA EM PAUTA – Vocês trabalham? Angélica – Não. Taynna – Também não.

CIÊNCIA EM PAUTA – Vocês pretendem fazer algum curso superior depois do ensino médio? Angélica – Psicologia, na UFU mesmo. Taynna – Direito na FAAP.


Este jornal é parte do projeto POPULARIZAÇÃO DA CIÊNCIA / UFU Realização:


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