Senso ED ESP_01-17

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SENSOINCOMUM

Foto: Vinícius Souza

Jornal-laboratório do curso de Jornalismo - UFU - Desde 2010 - Ano 7 - Edição Especial - Janeiro/2017

Estudantes unidos contra reformas p. 6 e 7

INfluência

INstruída

INclusiva

INsight

Aprovação da PEC 55 e redução no orçamento afetam cotidiano da UFU p. 3

Em mobilização inédita, Uberlândia tem maior número de escolas ocupadas no país p. 5

Estudantes relatam casos de assédio de professores durante paralisação p. 8

Intervenções culturais promoveram debates e reflexões durante greve p. 11


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Edição especial ­ Jan. 2017

INflamada

Editorial

E a luta continua...

EXPEDIENTE Jornal‐laboratório do curso de Jornalismo da Uni‐ versidade Federal de Uber‐ lândia (UFU). Reitor: Valder Steffen Jr. / Diretora da FACED: Valéria Aparecida Dias Lacerda de Resende / Coordenador do Curso de Jornalismo: Ger‐ son de Sousa / Jornalista Responsável: Ivanise An‐ drade (DRT/MS 097). Equi‐ pe de reportagem, edição e diagramação: Ana Eliza Bar‐ reiro, Camilla de Freitas, Elaíny Carmona, Isabella Cardoso Ferreira, Iury Machado, Jhyenne Gomes, Laís Vieira, Laura Nobre, Lucas Daniel, Pedro Henrique Silva, Raphaela Augusta / Editora de arte: Elaíny Carmona / Revisão: Ivanise Andrade / Finaliza‐ ção: Danielle Buiatti sensoincomufu@gmail.com www.sensoincomum.net

A proposta do jornal Senso In‐ comum é ir além do campus da UFU de Uberlândia. Nesta edição especial sobre a greve das universidades federais em 2016, o jornal se propôs ir ainda mais além. A ideia foi mensurar o al‐ cance da greve, os motivos e his‐ tórias de quem viveu esse momento importante para a edu‐

cação brasileira. A transição 2016‐2017 foi um período cheio de mudanças e mesmo sem conseguir impedi‐las o povo e as universidades mani‐ festaram sua opinião sobre os novos rumos do Brasil. Esse pe‐ ríodo de luta uniu um conjunto de forças nas manifestações con‐ tra a PEC 55, reforma do ensino

médio, movimento escola sem partido e tantas outras mudanças que geraram desgastes e proble‐ mas para a população. Confira nesta edição retratos de quem lutou pelos direitos, o balanço da greve na UFU e nas federais de Minas Gerais e o que ainda está por vir após a aprovação da PEC.

Opinião

PM recebe manifestantes durante protesto Ana Eliza Barreiro Democracia: Governo do po‐ vo. Segundo as Ciências Huma‐ nas, o sentido é um só: Brasil, República Democrática. Entre‐ tanto, no último 29 de novembro de 2016, em votação no Congres‐ so Nacional pela PEC 55, a esco‐ lha do futuro do Brasil foi feita sob sete chaves. Após repressão violenta contra manifestação civil, o Senado aprovou em primeiro turno a PEC do teto de orçamen‐ to. A democracia foi massacrada, assim como os milhares de mani‐ festantes em Brasília. O ato contra o governo ilegíti‐ mo reuniu cidadãos de todo o país, de Roraima até o Rio Gran‐ de do Sul. Estudantes, docentes, participantes de movimentos so‐ ciais agrários ou de moradias, gritaram e marcharam pelas ruas de Niemayer contra Temer e os cortes sociais. Durante a manhã e tarde aconteceram palestras com

lideranças civis, um “aulão” no MEC sobre a PEC 55 e uma ca‐ minhada pacífica em direção ao Congresso Nacional. Mas o ato marcado para o final da tarde não pôde acontecer. A concentração foi dispersada com confrontos en‐ tre manifestantes e Polícia Militar, de uma forma que eu, com meus 20 e poucos anos, nunca havia visto. Cerca de 10 mil pessoas corre‐ ram desesperadas fugindo de bombas de gás de efeito moral, em pânico. A PM tratou adoles‐ centes como inimigos de guerra. Houve espancamentos de estu‐ dantes. Uma menina foi atingida no rosto por chutes de soldado, artistas foram atingidos por spray de pimenta, jovens vomitavam e desmaiavam enquanto corriam, muitos caídos foram atingidos por balas de borracha, alguns cães de grande porte foram soltos contra a população. Idosos re‐ lembravam os tempos da ditadu‐

ra militar enquanto tentavam sair do tumulto. Além da PM, o exército che‐ gou com a cavalaria. Os polici‐ ais avançavam em grupos que esperavam ônibus e helicópteros sobrevoavam em círculos apon‐ tando luzes sobre grupos sepa‐ rados e cansados. A ordem era assustar para acabar com as vo‐ zes de luta. Ninguém do povo foi ouvido pelos parlamentares, que decidiam “democraticamen‐ te” sobre os próximos 20 anos do país. Tudo aconteceu rápido e o absurdo podia ser observa‐ do: um cenário bélico criou um clima de pânico. A arquitetura branca e cinza transformou‐se em um quadro de contraste com o céu alaranjado da tarde e a fu‐ maça negra da revolta. Aquela Brasília das fotografias tornou‐ se um lugar frio e triste. Na confusão, muitos ficaram perdi‐ dos; outros simplesmente desa‐ pareceram.

Foto: Ana Eliza Barreiro

PM impede manifestantes de entrarem no Congresso Nacional em Brasília, durante ato de 29 de novembro


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Edição especial ­ Jan 2017

Cortes no orçamento preocupam comunidade Com a PEC 55 aprovada, UFU precisa readequar planejamento financeiro Ana Eliza Barreiro O ano de 2016 foi de mudan‐ ças bruscas. Muitas leis engaveta‐ das retornaram à discussão no Congresso. Outros projetos fo‐ ram extintos. Entre os assuntos mais polêmicos estão os que to‐ cam diretamente a geração dos próximos 20 anos. Com a PEC 55 aprovada, uma série de medi‐ das afetam o funcionamento das universidades federais e a comu‐ nidade acadêmica. As propostas de emendas cons‐ titucionais prevêem uma estagna‐ ção no teto de gastos que atingirá principalmente as classes popula‐ res. Para os estudantes universitári‐ os, docentes de instituições públicas, servidores e recém‐for‐ mados isso representa uma série de alterações no próprio cotidiano. O congelamento dos repasses em Saúde e Educação estão pre‐ vistos para 2018, quando o valor investido nessas áreas ficará con‐ gelado, e alterado apenas nas mudanças da inflação. Antes da aprovação da PEC, os gastos soci‐ ais acompanhavam o crescimento da receita. Por 20 anos, mesmo com o aumento do Produto Inter‐ no Bruto (PIB) brasileiro, o valor a ser investido nessas áreas não mudará. Segundo informações publica‐ das no Sistema Integrado de Moni‐ toramento, Execução e Controle, do Ministério da Educação (MEC), o orçamento geral previsto para instituições de ensino federais em 2017 seria de R$ 6,7 milhões, em contraste com os R$ 7,9 milhões utilizados em 2016. O MEC apontou para 2017 um corte de 20% do orçamento das universidades públicas. Na UFU, apenas em 2016, houve re‐ dução nas contas, com cerca de 7,3% a menos em relação à verba recebida em 2015. No final do ano passado, o MEC repassou R$7 milhões ao Hospital de Clí‐ nicas da UFU, destinados à com‐ pra de medicamentos, materiais

Foto: Ana Eliza Barreiro

Estudantes universitários realizam assembleia contra PEC 55 na UFU hospitalares e manutenção de bolsas, enquanto outros R$3 mi‐ lhões foram destinados à infraes‐ trutura dos campi de Monte Carmelo e Ituiutaba. Porém, tan‐ to a universidade quanto o hospi‐ tal seguem com dívidas. O HC tem gastos crescentes e este ano vai se manter com ainda mais cortes. O Instituto de Pes‐ quisa Econômica Aplicada (Ipea) fez uma nota técnica prevendo que a saúde nacional terá diminuição acumulada de investimentos de até R$ 743 bilhões, especulando rea‐ juste econômico e crescimento de 2% do PIB por ano. Dentre as propostas de gestão do novo reitor, Valder Steffen Jr., as questões econômicas prioritá‐ rias são em relação ao HC‐UFU, ao fomento de pesquisa e exten‐ são e à capacitação. Mas como utilizar recursos escassos deman‐ da planejamento, que precisa ser discutido e analisado por cada membro da comunidade acadê‐ mica, as adaptações ainda estão sendo colocadas em prática. Orçamento da Universidade A Lei Orçamentária Anual (LOA), de janeiro de 2017, desti‐ nou um total de R$1,2 bilhão à UFU, sendo R$ 293 milhões para o Hospital de Clínicas e R$ 973 milhões para os demais setores da Universidade. Segundo o balanço

de despesas feito pela UFU no fi‐ nal do ano passado, foram gastos cerca de R$ 878 milhões em 2016 apenas com manutenção. Desta forma, as previsões para despesas como maiores ofertas de bolsas de estudo, por exemplo, não são positivas, considerando‐se ainda o cancelamento de 52 des‐ tas em 2016. O gestor da Direto‐ ria de Orçamento (Diror), Miguel Angelo do Nascimento Oliveira, diz que há R$19 milhões propos‐ tos para investimentos na univer‐ sidade, o que equivale a 30% de cortes nesta área em relação ao ano passado. Oliveira acrescenta que há aumento das demandas da comunidade acadêmica, porém, o orçamento vindo do governo fe‐ deral não irá acompanhar este crescimento. De acordo com Alfredo Ale‐ xandre Ferrão, secretário da Rei‐ toria e antigo diretor da Diror, a LOA precisa ser cumprida para não haver problemas posteriores como geração de mais dívidas. “Não podemos fugir do orça‐ mento estipulado na LOA. É su‐ ficiente? Não. Mas temos que nos adequar à ela”, afirma. Para Ferrão, conseguir recur‐ sos federais adicionais será um desafio a ser enfrentado ao longo do ano. Com a PEC, em 2018 o futuro da universidade continua incerto com maiores demandas e orçamento reduzido.

Não podemos fugir do orçamento estipulado pela LOA. Temos que nos adequar. Alfredo Ferrão


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IN struída

Entrevista: "A luta é unificada" Estudante fala do movimento de ocupação das escolas de Uberlândia Isabela Cardoso Ferreira Com quase 30 escolas ocupa‐ das em Uberlândia em novembro de 2016, em protesto contra a lei da Escola sem Partido, a PEC 55 e a Reforma do Ensino, estudan‐ tes secundaristas protagonizaram um movimento inédito na cidade. Segundo informações da Superin‐ tendência Regional de Ensino, à época, mais de 23 mil alunos fi‐ caram sem aula. Em entrevista, a aluna Juliana Siqueira, que parti‐ cipou da ocupação do colégio EE Américo René Giannetti comen‐ tou sobre o movimento. SENSO INCOMUM: Como foi a relação entre as escolas ocu‐ padas? E entre as escolas e a Se‐ cretaria de Educação? Juliana Siqueira: As pautas fo‐ ram as mesmas para todos os es‐ tudantes do país, mas cada escola teve sua autonomia para fazer as atividades que achava que deve‐ ria realizar na sua ocupação. Po‐ rém, quando foi preciso tomar alguma decisão mais forte, como “vamos parar de ocupar” ou “não deixar os professores entra‐ rem mais nas escolas”, o tema foi discutido em conjunto com as de‐ mais ocupações. SI: Como funcionou a questão da segurança e alimentação nas escolas durante a ocupação?

Foto: Acervo pessoal

Juliana Siqueira fala aos estudantes da EE Américo René Giannetti Juliana: Para as ocupações acontecerem de uma maneira or‐ ganizada, os alunos se dividiram em comissões. Então nós da co‐ missão de segurança fizemos re‐ vezamentos ao longo do dia e da noite, principalmente na portaria da escola. Os estudantes tinham alguns horários para entrarem e saírem da escola, no nosso caso até às 23h. Também recebíamos a comunidade externa até as 21h, mas essas pessoas não podiam dormir lá. Quanto à alimentação, nós preparamos o nosso alimen‐ to, apesar das “cantineiras” con‐ tinuarem frequentando o René. No caso da higiene, os próprios alunos limpavam a escola. Fize‐ mos arrecadação dos produtos necessários para nós e também para as instituições das periferias.

Como somos uma escola central, o acesso da comunidade externa foi mais fácil para realizar as do‐ ações. Por isso digo que a luta foi e é unificada! Não lutamos ape‐ nas contra a PEC ou pelo René Giannetti. Eu luto pelo meu ami‐ go que está no Cannã ou São Jor‐ ge, porque sei que o objetivo dele é o mesmo que o meu. SI: Os estudantes promoveram “aulões” sobre os conteúdos do Enem, como foi essa atividade? Juliana: Sobre os “aulões”, em grande parte foram os próprios professores da escola que partici‐ param, além de muitos voluntári‐ os que se dispuseram a nos dar aula, fazendo várias oficinas. Os alunos que não apoiaram as ocu‐ pações também puderam participar.

Alunos ocupam escolas em Araguari Secundaristas aderem ao movimento que paralisou mais de mil escolas no país Raphaela Augusta Com a aprovação da PEC 55, que congela por 20 anos os inves‐ timentos na saúde e educação, Universidades Federais e escolas organizaram greves e manifesta‐ ções por todo o país. Em Aragua‐ ri, no Triângulo Mineiro, duas escolas foram ocupadas pelos es‐ tudantes, após negociação com a direção e professores. A primeira

na cidade a aderir ao movimento foi a Escola Estadual Raul Soa‐ res, ocupada no dia 23 de outu‐ bro pelos manifestantes. Segundo os alunos, que prefe‐ riram não se identificar, eles não estavam na ocupação para matar aula ou promover baderna, como muitos pais alegavam, mas para lutar por direitos e promover um ato político pela educação. Na segunda escola ocupada em

Araguari, o movimento foi peque‐ no, mas aconteceu de forma pací‐ fica e em conjunto com os professores e diretores da institui‐ ção. O grupo realizou oficinas de cartazes e faixas e participou de passeatas pelo centro da cidade. Segundo o levantamento da União Brasileira dos Estudantes Secun‐ daristas (Ubes), 1.022 escolas e 82 universidades estavam ocupadas no ano passado.


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Movimento secundarista recebeu apoio de universitários e docentes da UFU Uberlândia foi a cidade mineira com maior número de escolas mobilizadas Ana Eliza Barreiro Em 2016, o Brasil viveu um período de instabilidade política com o impeachment de Dilma Rousseff. Propostas de leis polê‐ micas, greves e manifestações país afora, além de reformas e cortes na Educação causaram re‐ voltas em universidades e escolas públicas. Inserida na agenda de luta estudantil, Uberlândia foi a cidade mineira com maior núme‐ ro de escolas ocupadas. Entre outubro e novembro do ano passado, 25 escolas estaduais e uma municipal foram ocupadas, Foto: Ana Eliza Barreiro além do Instituto Federal de Edu‐ cação, Ciência e Tecnologia do Secundaristas protestam contra PEC 55 nas ruas do centro de Uberlândia Triângulo Mineiro (IFTM), e duas escolas em Ituiutaba e Araguari. A versa e embates com pessoas ciou situações perigosas enquanto “primavera estudantil”, como fi‐ contrárias ao movimento ou esteve na ocupação da Escola To‐ nico Franco. “As ameaças eram cou conhecido o movimento, mos‐ mandatos policiais. Segundo a estudante Juliana fortes. Jogaram foguetes dentro trou que crianças e adolescentes têm capacidade crítica para opi‐ Siqueira, os objetivos dos estu‐ da escola, no telhado do local on‐ narem sobre os rumos da política dantes foram unificados no país de estávamos dormindo, picha‐ todo. “As mesmas pautas, mas ram ao redor da escola e tentaram educacional do Brasil. “O estopim para as ocupações cada escola teve autonomia para arrombar o portão. Além de pes‐ foi a PEC 55 e as medidas que conduzir sua ocupação. Porém, soas que passavam gritando ofen‐ mudam o ensino médio. Faz 20 quando havia alguma decisão sas frequentemente”, contou. Mas não houve apenas retali‐ anos que estudantes ‘gritam’ por forte a se tomar o tema era dis‐ ações. Muitos pais e professores reformas e nunca foram ouvidos. cutido em conjunto”, explicou. apoiaram a causa e ajudaram a Querem impor uma política que fornecer alimentação e ativida‐ irá tirar o pensamento crítico dos Retaliações e apoios des. Roberta Brito foi uma dessas alunos e torná‐los pessoas prepa‐ As críticas e tentativas de des‐ mães. No ano passado, sua filha radas somente para o mercado de trabalho”, reflete Juliana Siqueira, mobilização das ocupações parti‐ de 14 anos participou da ocupa‐ aluna da EE Américo René Gian‐ ram de muitos lados. O mais ção da E. E. Segismundo Pereira netti e participante do movimento significativo foi a polêmica com a e Roberta ajudou nos protestos e realização das provas do Enem. também na organização cotidia‐ secundarista em Uberlândia. Entre as pautas dos estudantes O Ministério Público Federal re‐ na, fazendo questão de dormir estavam a luta pelo direito à edu‐ comendou a saída dos ocupantes, junto com os estudantes. “Foram cação gratuita e de qualidade, após reclamações de pais e alu‐ lindas essas ocupações. Era preci‐ so a força dos pais para ajudar os ameaçadas pela PEC 55, a pro‐ nos contrários à mobilização. A solução foi mudar o lugar movimentos a se concretizarem”, posta de reforma do Ensino Mé‐ dio e a Lei Escola sem Partido. das provas. Mesmo com severas comentou. A última escola de Uberlândia Com passeatas, intervenções ar‐ ameaças de punições, os adoles‐ tísticas, aulões e palestras, os jo‐ centes reivindicaram por direitos a realizar a desocupação foi a vens marcharam em Pena favor de básicos e permaneceram firmes nas E.E. Uberlândia‐Museu, no dia Foto: Nasser uma causa: a Educação brasilei‐ escolas por um mês. Em Ituiutaba, 20 de novembro de 2016. Ainda ra. Os momentos que marcaram a E. E. Coronel Tonico Franco e assim as reformas do ensino mé‐ os atos estu‐dantis vão desde as E. E. Israel Pinheiro foram ocupa‐ dio, bem como a PEC 55, foram congresso e en‐ manifestações unificadas pelo das. Gabriel Borges, estudante do aprovadas pelo Foto:Thiago Crepaldi centro da cidade, rodas de con‐ ensino médio, contou que viven‐ traram em vigor em 2017.

Escolas ocupadas em Uberlândia E.E Ângela Teixeira E.E Antônio Luiz Bastos E.E Antônio Thomaz Ferreira de Rezende E.E Bueno Brandão E.E Cidade Industrial E.E Ederlindo Lannes E.E Felisberto Alves Carrejo E.E Frei Egídio E.E Guiomar Polivalente E.M Hilda Leão Carneiro E.E Inácio Castilho E.E Jerônimo Arantes E.E João Rezende E.E Juvenília Ferreira E.E Lourdes de carvalho E.E Leônidas Castro Serra E.E Mario Porto E.E Messias Pedreiro E.E Neusa Rezende E.E Parque São Jorge E.E Prof. José Ignácio de Sousa E.E René Gianetti E.E Segismundo Pereira E.E Sérgio Pacheco E.E Teotônio Vilela E.E Uberlândia‐Museu Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro (IFTM)


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IN capa

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A GREVE NAS FED

No estado de Minas Gerais, onze universidades e trê Jhyenne Gomes, Lais Vieira, Laura Nobre e Lucas Daniel

A ocupação acabou, mas a luta continua. Estamos abertos a discussões sobre a vida acadêmica Larissa Lana

No dia 24 de outubro de 2016, sete das 11 universidades federais mineira, deflagraram greve geral, mas foi só questão de tempo para as outras instituições apoiarem a causa. Os últimos a aderirem ao movimento foram os professores das federais de Minas Gerais (UFMG) e de Ouro Preto (UFOP). A greve não foi salarial, mas sim contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55, conheci‐ da como a PEC do Teto dos Gas‐ tos Públicos. A proposta de Novo Regime Fiscal limita, durante 20 anos, o ritmo de crescimento dos gastos da União à taxa de inflação. Após semanas de protestos, ocupações e diálogos sobre as medidas do governo federal refe‐ rentes à educação no país, as fe‐ derais de Minas, estado brasileiro com o maior número de institui‐ ções públicas de nível superior, decidiram finalizar a greve geral em dezembro.

Mobilização por MG Na UFOP, o movimento foi em defesa do caráter público das universidades federais, contra a PEC 55 e a privatização da educa‐ ção. A UFU lutou também contra a Medida Provisória do Ensino Médio (MP 746) e contra o proje‐ to de Lei Escola Sem Partido. Outras federais apoiaram os movimentos contrários às refor‐ mas trabalhista e da previdência. As universidades UFTM, UFV, UFVJM, Unifal e UFSJ também se mobilizaram para protestar contra as medidas impopulares da emenda constitucional. Por to‐ do o país, 65 federais brasileiras fizeram paralisações em apoio à greve. A mobilização nas universida‐ des mineiras perdeu força após a

Manifestantes tomam as ruas de Uberlândia em repúdio à PEC do teto de gastos aprovação da PEC 55, em 13 de dezembro de 2016, e aos poucos as federais foram sendo desocu‐ padas e as aulas retomadas. A greve foi analisada de uma ma‐ neira satisfatória por quem a acompanhou de perto. “A greve teve seu êxito no sen‐ tido de marcar a resistência con‐ tra o governo. Não conseguimos impedir a PEC 55, mas deixamos claro que somos contra. A saúde e a educação irão sofrer, os mais pobres serão mais prejudicados com essa falsa medida de conten‐ ção de gastos. O movimento foi importante para intensificar o diálogo com a população sobre como essas medidas impostas pe‐ la aprovação da PEC atingirão a todos”, comenta a professora da Faculdade de Educação da UFU, Iara Mora Longhini.

Na Zona da Mata mineira o sentimento também foi de dever cumprido. “No dia 12 de dezem‐ bro de 2016, após 47 dias de ocupação da Reitoria da Univer‐ sidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o movimento deliberou, em assembleia, por desocupar o espaço. Na conjuntura em que vi‐ vemos, é essencial a construção da unidade na luta”, afirmava um trecho da carta de desocupa‐ ção publicada pela página OCU‐ PA UFJF no Facebook. Em Viçosa, a Comissão das ocupações da UFV declarou em sua página OCUPA BERNAR‐ DÃO as dificuldades que enfren‐ taram durante o movimento. No Triângulo Mineiro, a des‐ pedida da greve foi com apoio à luta. “O movimento estudantil da UFTM tem plena consciência de


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DERAIS DE MINAS

ês institutos federais aderiram à paralisação nacional

Foto: Nadja Nobre

s e à reforma do ensino médio, propostas pelo Governo Temer. que essa ocupação foi apenas a primeira de muitas lutas que tere‐ mos, dada a atual conjuntura po‐ lítica e social do Brasil. Nesse sentido, reforçamos mais uma vez o que foi uma das palavras de or‐ dem do movimento de ocupação: não tem arrego!”, informa trecho da declaração do movimento da Universidade Federal do Triângu‐ lo Mineiro (UFTM). No Centro‐Sul do estado, a UFOP também participou do mo‐ vimento. “A ocupação acabou, mas a luta continua, estamos abertos a discussões sobre a co‐ munidade e a vida acadêmica”, enfatiza Larissa Lana, estudante da UFOP que participou do movimento OCUPA ICSA‐UFOP. Para a professora da UFU Iara Mora Longhini é preciso ter espe‐ rança e acreditar que a voz do

povo será ouvida. “A PEC pas‐ sou, mas acredito que um novo movimento está por vir, não é possível que o povo ficará calado com a possibilidade de aprovação dessas reformas da previdência e trabalhista. O presidente, os con‐ gressistas e o senadores se recusa‐ ram a ouvir os movimentos vin‐ dos das ruas. A voz do povo não foi ouvida. A mídia alternativa denunciou brilhantemente essa situação”, comentou.

Greve na UFU Em assembleias realizadas em outubro de 2016, professores, técnicos e estudantes da UFU de‐ cidiram paralisar as atividades. Mas apesar da decisão pela greve, muitos docentes de diversos cur‐ sos não aderiram e continuaram a

dar aulas durante o período. De acordo com o vice‐presidente da Associação dos Docentes da Uni‐ versidade Federal de Uberlândia (Adufu), Felipe Mendonça, cerca de 70% dos professores aderiram à greve. Alguns dos cursos que parali‐ saram totalmente durante o pe‐ ríodo, conforme a Adufu, foram Relações Internacionais, Enfer‐ magem, Jornalismo, Ciências So‐ ciais, Arquitetura e Urbanismo. Os que pararam parcialmente fo‐ ram Medicina, Economia e Direi‐ to, por exemplo. Mendonça explica que uma pequena parte dos que não aderiram era com‐ posta pelas Engenharias. Em relação aos campi de ou‐ tras cidades, ele explica que os cursos de Ituiutaba e de Monte Carmelo pararam parcialmente. Já o campus de Patos de Minas não paralisou. “Patos não parou porque as unidades não quiseram aderir à greve, e isso tem a ver com o perfil dos cursos do cam‐ pus”, disse. Em assembleia realizada no dia 1º de novembro, alunos da UFU do campus de Ituiutaba decidi‐ ram ocupar o bloco B. Segundo a aluna de Engenharia de Produção Brunna Barcellos, o processo de ocupação foi complicado porque muitos estudantes não concorda‐ vam com a proposta, alegando sofrer coerção de professores e ri‐ dicularização por parte dos orga‐ nizadores do movimento. Em Monte Carmelo, os alunos estavam mobilizados desde o pri‐ meiro semestre de 2016, quando ocuparam a reitoria para expor suas reivindicações, porém, os pedidos não foram atendidos. Em setembro, os estudantes do curso de Geologia fizeram uma nova paralisação em protesto à falta de infraestrutura e professores para o curso, mobilização que conti‐ nuou durante a greve nacional.

Cerca de 70% do professores aderiram à greve na UFU Felipe Mendonça


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INdolor

Servidores protestaram em frente ao HC-UFU Mais de 300 pessoas se reuniram em ato em defesa da saúde pública Elaíny Carmona Ato em defesa da saúde públi‐ ca e contra a PEC 55 reuniu cerca de 300 manifestantes em frente ao Hospital das Clínicas da UFU (HC‐UFU) durante as mobiliza‐ ções de 2016. Técnicos, professo‐ res, funcionários do HC e estudantes de diversos cursos se concentraram em frente ao hospi‐ tal para uma assembleia que ana‐ lisou os efeitos da proposta de emenda constitucional para a saúde pública. No final, os parti‐ cipantes deram um abraço sim‐ bólico no HC. Para Sebastião Elias da Silveira, enfermeiro do Hospital das Clíni‐ cas há 20 anos, a PEC não é uma saída para crise. “Eu acho que ela agrava. Essa proposta do governo corta recursos das atividades liga‐ das às áreas sociais para fortalecer sua política econômica”, completa. O HC é responsável pela for‐ mação de estudantes dos cursos de Enfermagem, Medicina, Nu‐ trição e Fisioterapia, que possu‐

Foto: Leticia França

Equipe técnica e médica do hospital avaliam efeitos da PEC 55 na saúde em disciplinas de estágio obrigatório dentro do hospital. Para Silveira, a PEC representa um prejuízo no seu conjunto para a educação como um todo, mas o hospital é duplamente afetado. “Ele é mantido com recursos do MEC e também com recursos do SUS e essas duas áreas são afeta‐ das”, explica. Júlio César Alvares, aluno do nono período de enfermagem, participou da mesa de debates, e em entrevista conta a sua experi‐ ência no estágio supervisionado dentro do HC: “Estava faltando

materiais, medicamentos, luvas, sacos plásticos e etc. Isso prejudi‐ ca o estágio”, avaliou. Álvares acredita que a assistên‐ cia que é oferecida aos pacientes fica fragilizada por conta da falta de recursos. “A falta de materiais impede que a gente faça o que deve ser feito, como um curativo mais complexo”, exemplifica. Por fim, foi dado um abraço simbólico ao prédio do HC, com o propósito de chamar atenção dos pacientes e demais pessoas que se encontravam nas ruas para a atual situação do hospital.

INclusiva Alunos relatam ameaças de professores da UFU Intimidações de docentes assustaram estudantes que aderiram ao movimento grevista Laís Vieira Em meio à greve, muitos estu‐ dantes que pretendiam aderir ao movimento relataram ter sofrido ameaças de professores que opta‐ ram por continuar lecionando as aulas e aplicando provas durante o semestre em curso. Uma das amea‐ ças mais recorrentes era a de que, caso os estudantes aderissem ao movimento, quando retornassem, o nível das provas seria mais alto. A aluna T* disse ao Senso In‐ comum que diversos professores de seu curso tentavam oprimir os alunos com a fala de que eles per‐ deriam o semestre. “Um dos pro‐

fessores chegou a riscar os nomes dos alunos grevistas da lista de chamada. Outro pregou um dis‐ curso dizendo que não existia greve de aluno e quem não fosse às aulas dele receberia falta e se‐ ria reprovado”, conta. Ela ainda relatou ataques de pro‐ fessores em redes sociais de alunos grevistas, além das tentativas de adiantamento de data de provas sem o consenso da turma. “Chega‐ mos a denunciar, mas não sabemos de nenhuma medida que foi toma‐ da em relação à isso”, finalizou. Outra aluna da universidade também relatou ter presenciado atitudes do tipo vindas de profes‐

sores, gerando medo em alunos que pretendiam aderir ao movi‐ mento. “Um dos professores dis‐ se: ‘Vocês têm direito a entrar de greve, mas vocês tem que saber das consequências que vai ter que repor, vai ter que fazer matéria depois de todo mundo’”. A aluna disse ainda que um ou‐ tro docente ridicularizava os alu‐ nos que aderiram ao movimento, além de fazer ameaças implícitas. “Um deles disse que aluno grevis‐ ta teria que estudar o dobro por‐ que a prova ia ser mais difícil. Dizia que aluno grevista não iria passar na matéria dele”, concluiu. *Aluna pediu para não ser identificada


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“Apesar do transtorno, trabalhamos por uma greve tranquila”, avalia diretor da Eseba Após paralisação, Escola de Educação Básica de Uberlândia repõe calendário de 2016 Camilla de Freitas e Pedro Henrique Silva Seguindo o fluxo de adesão ao movimento grevista de 2016, em andamento na UFU, a Escola de Educação Básica de Uberlândia (Eseba) também paralisou suas atividades. A Eseba é uma unida‐ de de ensino básico de aplicação da UFU, por isso também é afeta‐ da pelas decisões dos sindicatos e coletivos das categorias. Segundo André Luiz Sabino, diretor da Eseba, o período da greve dentro da escola merece muita atenção e deve ser olhado com muita cautela, já que o mo‐ vimento afetou tanto professores e técnicos quanto pais e alunos. “Todo processo de greve causa transtorno. O processo aqui se deu de forma tranquila”, afirma. Num primeiro momento, pro‐ fessores e diretores se reuniram com pais e responsáveis em uma assembleia que contou com a presença das categorias em greve, a presidente do sindicato dos professores e um economista. A

Foto: Camilla de Freitas

Diálogo entre escola e pais de alunos evitou evação, diz diretor reunião, que aconteceu no dia 21 de outubro de 2016, não tinha a intenção de contestar o movi‐ mento e sim esclarecê‐lo, apre‐ sentar as causas e fazer uma análise de conjuntura da situação da escola naquele período. Com a greve finalizada, em de‐ zembro do ano passado, a escola se dedicou até o final de março a completar o ano letivo de 2016. Para os alunos do 9º ano o percurso foi diferente. Os estu‐ dantes concluíram o Ensino Fun‐

damental ainda em 2016, com reposições no período da tarde durante os meses de novembro e dezembro. A iniciativa foi a ma‐ neira encontrada para que esses alunos tivessem seus prazos regu‐ larizados e então pudessem in‐ gressar no Ensino Médio em outras instituições sem prejuízos. Apesar da nova rotina, a aluna Ana Cláudia Matias afir‐ ma que o movimento ajudou os alunos a entender as propostas do governo.

Jornalismo UFU faz cobertura da greve Grupo de alunos viaja a Monte Carmelo e produz matérias para o jornal-laboratório Heloir Schwaickardt Usando o lema “Greve não é férias”, estudantes do quarto pe‐ ríodo do curso de jornalismo da UFU foram até o Campus Araras, em Monte Carmelo, em novem‐ bro de 2016, para apurar pautas que afetam diretamente os alunos da instituição. Eles cobriram ações concernentes à greve docente, de técnicos e dos discentes para pro‐ dução de matérias que foram pu‐ blicadas na versão impressa e também no site do Senso InCo‐ mum, jornal‐laboratório do curso. A professora e jornalista respon‐

sável pelo jornal‐laboratório, Mir‐ na Tonus, revela a importância desta atividade para os estudantes. “Em períodos como este pelo qual a universidade está passando, de paralisação, é importante que os estudantes de jornalismo apurem in loco o que está acontecendo nos campi, tendo contato com outras realidades. É uma possibilidade de exercício do jornalismo factual em momentos de crise”, diz. Ao contar sobre sua participa‐ ção na viagem, a estudante Sa‐ mantha Loren expressa que ir ao local foi importante para o seu desempenho como repórter. “A

experiência de passar um dia co‐ nhecendo a UFU de lá foi muito boa. Ver os problemas que eles têm, conhecer o espaço e conver‐ sar com a comunidade colaborou para entender o que passam e, a partir daí, tentar ajudá‐los. Acho que noticiar isso é um bom come‐ ço”, declara. O grupo formado por dez alu‐ nos e três professores passou o dia fazendo entrevistas, fotografias, comentários e investigando o campus de modo geral. Diversas salas de aula e de professores fo‐ ram visitadas, além das tentativas de acesso às estufas e laboratórios.


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Edição especial ­ Jan. 2017

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Estudantes em luta: ocupações em imagens Fotografias revelam o cotidiano dos estudantes secundaristas durante greve Elaíny Carmona

Foto: Letícia Fraça

Foto: Letícia Fraça

Estudantes se organizam em comissões para cada função dentro da escola, cuidando uns dos outros nas ocupações

Na E.E. Prof. José Ignácio de Sousa, alunos recebem apresentações culturais

Foto: Jhyenne Gomes

Em movimento: atividades esportivas como parte do cronograma de ações nas ocupações


IN sight

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Edição especial ­ Jan 2017

Alunos do curso de Teatro da UFU promovem ocupação cultural durante greve Saraus, peças teatrais e palcos abertos foram algumas das intervenções culturais Lais Vieira “A ocupação para mim mudou a minha vida mesmo, porque eu estava um pouco triste com o curso e ela veio como um gás”. Foi assim que Carla Luz, aluna do terceiro período do curso de Teatro da UFU, descreveu quais os efeitos que a ocupação cultu‐ ral, que começou no dia 24 de outubro de 2016 e durou quase três meses, tiveram sobre ela. As atividades, que eram com‐ postas por saraus, peças teatrais e palcos abertos, também foram le‐ vadas ao público externo da uni‐ versidade e trouxeram resultados positivos. Carla Luz conta que o movimento de ocupação cultural começou uma semana depois da ocupação dos secundaristas na ci‐ dade. “Pensamos: nós precisamos apoiar esses alunos de alguma for‐

ma, então vamos ocupar e pensar em atividades para produzir tanto pros secundaristas quanto para a comunidade”, explica. A aluna conta que as atividades eram pen‐ sadas de forma que todos pudessem fazê‐las, além de deixa‐ las disponíveis para pessoas que não eram da Universidade.

Participação de todos Outra aluna do curso e que tam‐ bém participou da ocupação, Lua‐ na Júlia, disse que o bloco 3M, do campus Santa Mônica, recebeu di‐ versas intervenções culturais. “Não existe algo que saibamos fazer me‐ lhor do que arte e sabemos a im‐ portância dela e da cultura na política. Então, decidimos juntar nossa arte com política e a partir daí surgiram diversas atividades, ce‐ nas, espetáculos e saraus”, contou. Para Luana Júlia, o movimen‐

to fez com que alunos de outros cursos da universidade também participassem das atividades. “Começamos com cinco alunos do Teatro, fomos para 20. Mas alunos de outros cursos vieram ocupar o 3M, como Filosofia, Bi‐ ologia, Artes Visuais, além de pessoas da comunidade”, explica. O apoio dos professores do curso foi pequeno, segundo Carla Luz. “Teve um ou dois que nos apoiaram muito, que ajudaram a buscar colchão, que doaram ali‐ mentos, mas uma presença bem ativa não teve”. Em relação ao feedback do pú‐ blico sobre as intervenções, Carla Luz avalia como neutros. “Eu fi‐ quei um pouco assustada até por‐ que achei a galera muito apática. Às vezes eles nem concordavam com a ocupação, mas não tinha uma vontade de falar sobre isso com a gente”, relembra. Por outro lado, muitas pessoas que assistiram as intervenções pediam bis, já que eram eventos incomuns na cidade.

Resultados positivos

Foto: Ana Eliza Barreiro

Alunos do curso de teatro em intervenção na Praça Clarimundo Carneiro

Além de trazer experiências re‐ lacionadas ao curso de Teatro e ao engajamento político, a ocu‐ pação também trouxe bons senti‐ mentos aos envolvidos. “Estou me sentindo muito mais forte e apoiada porque fiz amigos ali, conheci pessoas de um jeito que é bom saber que elas existem para poder trabalharmos juntos”, conta a estudante Carla Luz. Uma das montagens feitas du‐ rante a ocupação foi selecionada para se apresentar na 10ª Bienal da União Nacional dos Estudan‐ tes (UNE), em Fortaleza no Cea‐ rá. A montagem é um espetáculo intitulado “Benedites”. “Pra mim é uma coisa muito significativa e bonita de pensar que é da resis‐ tência que ela surgiu. Então, eu fico muito feliz com esse resulta‐ do”, conclui Carla Luz.

A ocupação mudou a minha vida porque eu estava triste com o curso Carla Luz


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Edição especial ­ Jan. 2017

A audácia de ensinar a pensar Ana Eliza Barreiro e Iury Machado

Somente pela educação as pessoas são bem formadas, não apenas enquanto profissionais, mas como pessoas

Alguns tem o olhar capaz de ultrapassar muros e enxergar além. Este olhar sereno marca o semblante de Gilson Aparecido dos Santos, historiador, geógrafo e professor da rede pública em Ituiutaba (MG). Durante a ocu‐ pação da E. E. Tonico Franco, ele revela suas histórias de superação através da educação, o medo fu‐ turo e por que resolveu apoiar o movimento secundarista. “As múltiplas particularidades não são respeitadas. Existe um discur‐ so único disfarçado de neutrali‐ dade”, acredita. Desenhando o passado na me‐ mória, Gilson vai recontando seus momentos e rabiscando os traços de um futuro desejado. Negro e pobre, se tornou profes‐ sor. “Um acidente de percurso”, diz aos risos. Ele se lembra que na infância era desleixado com os estudos. “Apenas pela educação as pessoas são bem‐formadas, não apenas enquanto profissio‐ nais, mas como pessoas”. Santos cresceu em um Brasil de chumbo e diz que sua geração era ensinada a obedecer. Hoje, a his‐ tória se modificou e ele se emocio‐ na ao ver a quantidade de alunos negros na universidade, questio‐ nando a política. Gilson revela que o medo de retrocessos nos di‐ reitos sociais é o que o aproxima das ocupações secundaristas. Para ele, os alunos são heróis

que defendem os interesses da maioria. Diz que os adultos pre‐ cisam respeitar os jovens e enten‐ der que eles têm capacidade crítica suficiente para se posicio‐ narem contra medidas políticas. “Estão sendo ameaçados, mas continuam aqui. Eles acreditam em algo maior”. Foi pelo teatro que Santos co‐ meçou a ver novos horizontes. O educador já foi palhaço e apren‐ deu que o sorriso é um dos pre‐ sentes mais puros que um ser humano pode receber do outro. Hoje, este sorriso está ameaçado pelo conservadorismo que leva ao discurso de ódio contra as ocupações. “Todos têm informação, acre‐ ditam saberem de tudo, mas não identificam conceitos políticos e filosóficos. Me aparecem figuras com um discurso louco em uma sociedade violenta que agradam aos que o enxergam como salva‐ dor”, explica Santos, também co‐ mentando que o jornalismo tem um papel importante na sociedade e deve andar ao lado da história. O olhar de Gilson voa longe e retorna com vivacidade ao longo da conversa. O professor mistura em si a calmaria sábia e o tempe‐ ramento de quem entende o que vem por aí. Ele luta por seus ne‐ tos que ainda virão, se preocupa com os próximos alunos. Para ele, a educação e a política sérias podem salvar quando feitas com humanidade.

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Foto: Ana Eliza Barreiro

Gilson Santos relembra sua trajetória como professor de escola pública

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