Nuvem Negra [set2016]

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EDIÇÃO #1

2016

JORNAL

POR MAIS LÉLIAS NA PUC CAMPANHA DÁ INÍCIO A MAPEAMENTO RACIAL DE PROFESSORES DA PUC-RIO

O PAPEL DOS COLETIVOS É NOS COLETIVOS NEGROS QUE ENCONTRAMOS O ACOLHIMENTO NEGADO PELA ESTRUTURA RACISTA UNIVERSITÁRIA

ESCREVIVÊNCIA “VAMOS USAR DA NOSSA ESCREVIVÊNCIA NÃO PARA ‘NINAR OS DA CASA GRANDE’ E SIM PARA INCOMODÁ-LOS EM SEUS SONOS INJUSTOS’’ CÓD.:160914


editorial

Chegamos! A partir de agora, nós, do Coletivo Nuvem Negra, vamos usar as páginas deste jornal para protagonizarmos nossas próprias histórias. Nascemos da necessidade de expressar nossa voz e de pautar nossas questões a partir de nós mesmos. Queremos afirmar a importância da luta antirracista nas instituições educacionais e das contribuições que intelectuais negras e negros oferecem ao desenvolvimento de diversos campos. A escritora Conceição Evaristo nos inspira a criar a editoria Escrevivência em sua homenagem. Escrevivência será um espaço para contar as experiências vividas e pensadas. É a vivência como alimento da escrita de negras e negros integrantes do coletivo. Como disse Conceição, “A nossa escrevivência não pode ser lida como histórias para ‘ninar os da casa grande’ e sim para incomodá-los em seus sonos injustos’’. Queremos, como ela, resgatar a memória ancestral e afirmar nossas raízes. É desse lugar que vamos escrever, importando pouco o padrão da norma culta da Língua Portuguesa e, ocupando um lugar muito mais central o resgate em cada frase do “pretuguês’’ de Lélia Gonzalez – antropóloga e militante negra. Com a Voz de Lélia soprando em nossos ouvidos, escreveremos também sobre a luta das mulheres negras. Abrimos essa editoria contando um pouco da história dessa mulher que foi responsável pela introdução do debate sobre o racismo nas universidades brasileiras, além de ser referência na luta negra e feminista no Brasil e no exterior. Lélia foi professora e diretora do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio nas décadas de 80 e 90. Contudo, percebemos que a Universidade não faz referência devida à intelectual: pouco no atual Departamento de Ciências Sociais, e nada em outros departamentos. O jornal também tem um espaço reservado para escrever questões relacionadas à Universidade. O primeiro texto desta editoria mostra como a universidade brasileira foi construída como um espaço eurocêntrico, com consequente negação do conhecimento negro. Temos consciência do nosso papel de pautar a luta antirracista e reivindicar a presença de epistemologias negro-africanas dentro das salas de aula. Em anexo, entregamos a vocês, alunos e professores da PUC e de outros ambientes acadêmicos, uma lista de intelectuais negras e negros que deveriam estar na bibliografia dos cursos. Queremos ressaltar que, cada vez mais, vamos estar unidos para enfrentar as expressões do racismo cotidiano nas universidades. Vamos permanecer nesse espaço, enegrecer as salas de aula e os espaços de poder, disputar os conhecimentos e pautar a produção cientifica e tecnológica. Na primeira edição, vamos começar uma campanha de mapeamento racial dos professores da PUC-Rio. Queremos saber a quantidade de professoras e professores negras/os e brancas/os da universidade. O levantamento vai nos ajudar

a sugerir mudanças para este ambiente. Assim, contamos com a ajuda dos departamentos e dos professores da PUC. O espaço aqui é curto, mas você pode acessar medium.com/jornal­-nuvem-­negra para ler outros textos e aprofundar os temas aqui levantados. Muitas questões ainda virão nas próximas edições. Aguardem. É tempo de reconhecer e assumir as contribuições do conhecimento negro-africano, pois dizem respeito não apenas aos descendentes de africanos mas a toda humanidade. Asé! Coletivo Nuvem Negra

O Coletivo Nuvem Negra é uma potência autônoma de estudantes negras e negros da PUC-Rio que reconhecem em si a necessidade de uma articulação comum, que compartilha a resistência, o afeto e o fortalecimento negro na universidade. O coletivo é um espaço de troca, afirmação da identidade negra, acolhimento e luta antirracista. Realizamos seminários, debates e encontros que possibilitem enegrecer o pensamento e as nossas reflexões. O CNN é aberto à participação de todas e todos negras e negros. Junte-se a nós!!

REUNIÕES SEMANAIS

/coletivonuvemnegra coletivonuvemnegra@gmail.com

Jornal Nuvem Negra Publicação trimestral Linha Editorial: Coletivo Nuvem Negra Editora: Gabriele Roza Edição de Texto: Juliana Santos Projeto Gráfico e Diagramação: Bruna Souza Coordenação de Comunicação: Henrique Almeida Assessoria de Imprensa: Aline Da Mata e Leonne Gabriel Azevedo Produção Geral: Esteban Cipriano

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Universidade

O papel dos coletivos negros diante da estrutura racista do Ensino Superior Lucas de Deus*

“Organizar a nossa luta por nós mesmos é um imperativo da nossa sobrevivência” Abdias do Nascimento

A universidade brasileira foi construída como um espaço de produção de conhecimentos eurocêntricos e de consequente anulação, invisibilização e negação dos conhecimentos negro-africanos. Espaço no qual os corpos negros nunca foram muito bem-vindos e acolhidos. Não por acaso, somos alvo de racismo perpetrado por alunos e/ou professores diariamente. Além disso, muitos de nós, devido à configuração racial, nos sentimos estrangeiros em nossa própria terra: atravessar os portões da PUC-Rio é praticamente visitar outro país, tamanha é a disparidade de mundos. Um exemplo desta disparidade é a nuvem de estudantes e professores brancos e a respectiva ausência de negros transitando pela universidade. Em meio a este cenário, os coletivos negros resultam da necessidade das/os estudantes negras/os estarem unidas/os e auto-organizadas/ os para enfrentar as expressões do racismo cotidiano nas universidades. Eles emergem como quilombos insurgentes no interior da

Nilma Lino Gomes

Pedagoga, doutora em antropologia, pesquisadora das áreas de Educação e Diversidade Étnico-racial, com ênfase especial na formação de professores e a Lei 10.639/03 e na atuação do movimento negro brasileiro. Ex-ministra do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos. Tornou-se a primeira mulher negra do Brasil a comandar uma universidade federal ao assumir o cargo de reitora pro tempore da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) em abril de 2013.

“Casa-Grande”. O Coletivo Nuvem Negra (CNN) é a expressão da necessidade e do anseio do negro de se ver representado, visibilizado dentro da PUC, pautando a luta antirracista e reivindicando a presença de epistemologias negro-africanas dentro da sala de aula. Construindo, deste modo, práticas pedagógicas que valorizem o povo negro como sujeito do conhecimento, ou seja, como diz Nilma Gomes, buscando “ressignificar e construir representações positivas sobre o negro, sua história, sua cultura, sua corporeidade e sua estética”. Uma integrante do CNN relatou que era muito bom olhar no olho, se reconhecer no outro e compartilhar as angústias. É nos coletivos negros que encontramos o acolhimento negado pela estrutura racista universitária. Neste quase recolhimento nos coletivos, revitalizamos nosso axé ancestral e, com isso, criamos forças e estratégias para combater, e confrontar o racismo intrínseco das universidades. *Lucas de Deus cientista social, formado pela PUC-­Rio. Ativista na luta antirracista e um apaixonado pelas danças populares de matrizes africanas.

Abdias Nascimento

Foi poeta, ator, escritor de diversos livros, dramaturgo, artista plástico, professor universitário, político e ativista engajado nas lutas libertárias do povo negro em âmbito internacional. Atuou na Frente Negra Brasileira (FNB). Foi idealizador do Teatro Experimental do Negro (TEN) em 1944, fundador do Instituto de Pesquisa e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO), do Museu de Arte Negra (MAN). Promoveu o I Congresso Negro Brasileiro em 1950. Ajudou a fundar o Movimento Negro Unificado (MNU) em 1978 e atuou em movimentos internacionais como Negritude e o Pan-Africanismo.

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voz de lélia

Lélia Gonzalez, a mulher que falava Pretuguês Milena Manfredini * Fui convocada a dedilhar uma partitura que evocasse a memória de Lélia e durante alguns instantes hesitei por insegurança. Contudo, em conversas com sua mãe Oxum, cheguei à conclusão de que nossos processos também podem ser oferendados. Escrever sobre Lélia não é uma tarefa fácil. É um escrever e apagar contínuos, pois Lélia me atravessa e só de pensar em seu nome meus olhos marejam. É com licença e deferência que começarei este texto, partindo da honestidade de pontuar meu lugar de sentimento e de fala. E pisando devagarzinho começarei... Filha de Acácio Joaquim de Almeida e Urcina Serafim de Almeida, Lélia de Almeida nasceu na cidade de Belo Horizonte, no dia 1º de fevereiro de 1935. Apesar das dificuldades financeiras e familiares, Lélia concluiu seus estudos. Cursou o ensino médio no Colégio Pedro II e graduou– se em História e Filosofia na Universidade do Estado da Guanabara. O sobrenome Gonzalez, com o qual se tornou conhecida no âmbito da militância, é fruto do casamento com o espanhol Luiz Carlos Gonzalez no ano de 1960. E mesmo após o trágico falecimento do esposo, Lélia manteve como demonstração de afeto. No ano de 1978 é incorporada ao quadro docente da PUC-Rio e ao longo de 16 anos atua como professora e, posteriormente, como diretora do Departamento de Ciências Sociais, função exercida até 1994, ano em que nos deixa em decorrência de complicações cardíacas. Lélia desempenhou diversas atividades paralelas à sua vida acadêmica. Foi professora de cultura negra na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, disputou cargos políticos, foi articuladora e fundadora do MNU – Movimento Negro Unificado e a primeira a pautar a questão de gênero dentro do movimento. Escreveu ensaios, artigos e palestrou em diversos países, mas como não era adepta da escrita tradicional acadêmica, muitos de seus textos foram publicados em jornais e revistas. Lélia por vezes enredava o português com elementos linguísticos africanos e gírias, numa tentativa propo-

Lélia Gonzalez na reunião da Diretoria do Instituto de Pesquisa das Culturas Negras - IPCN - 1986/7 Acervo JG/ Foto Januário Garcia

sital de evidenciar o preconceito linguístico racial existente na definição da língua brasileira. Como resultado desses atravessamentos, ela definia: “Aquilo que chamo de ‘pretuguês’ nada mais é do que marca de africanização do português falado no Brasil. É engraçado como eles [sociedade branca elitista] gozam a gente quando dizemos que é Framengo. Chamam a gente de ignorante dizendo que a gente fala errado. E de repente ignoram que a presença desse “R” no lugar do “L” nada mais é do que a marca linguística de um idioma africano, no qual o “L” inexiste. Ao mesmo tempo acham o maior barato a fala dita brasileira que corta os erres dos infinitivos verbais, que condensa você em cê, o está em tá e por aí afora”. Lélia considerava importante que os grupos marginalizados da sociedade produzissem seu próprio conhecimento e discurso. Sua produção intelectual nos deixou um importante legado e um dos seus principais conceitos, o “pretuguês”, ainda hoje revoluciona a escrita acadêmica dentro das ciências sociais. Definitivamente, Lélia Gonzalez é a mulher que sabia e falava o pretuguês – idioma permeado por tensões de nossas línguas vindas de África com a que foi adquirida de maneira violenta e forçosa por meio do processo de colonização. Com isso, podemos dizer que Lélia resiste – e – existe ainda hoje dentro de cada um de nós, negros, militantes ou não. * Milena Manfredini é feminista negra, graduanda de Ciências Sociais com ênfase, respiro e amor em antropologia. O cinema é sua luneta do tempo e um dos faróis de sua vida com toda certeza chama– se: Lélia Gonzalez.

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voz de lélia

O mito da democracia racial na invisibilização das mulheres negras na política Ellen Mendonça* O mito da democracia racial, a todo momento, reafirma a posição do poder do colonizador, afastando a população afro-brasileira do debate político e, historicamente, propagando uma mensagem de que mulheres negras não participam dos espaços políticos de decisão, já que são compostos na maioria por homens brancos, cisgêneros e heterossexuais. Ao colorirmos memórias acerca do poder constituinte inserindo a perspectiva de gênero, destacamos o informativo de 1988 do NZINGA - Coletivo de Mulheres Negras/ RJ, do qual faziam parte Lélia Gonzalez, Jurema Batista, Rosália Lemos, entre outras; que se mobilizaram juntamente com os Movimentos Negros para a eleição de deputados constituintes da diáspora, dentre eles, Benedita da Silva, publicizando, assim, as propostas e projetos de leis feitos na Constituinte de 1988, que foram os seguintes:

Inclusão da história geral da África e da história do negro no Brasil como matéria integrante das disciplinas de currículo escolar obrigatório. Define os crimes resultantes de preconceitos de raça ou de cor a prática de racismo constitui crime inafiançável, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei. Instituição do dia 13 de maio como “Dia Nacional de Denúncia contra o racismo.” Feriado nacional dia 20 de novembro, aniversário da morte de Zumbi dos Palmares e data consagrada pela comunidade afro-brasileira como “Dia Nacional da Consciência Negra.”

Proíbe o Brasil de manter relações diplomáticas com países que adotem políticas oficiais de discriminação racial. Propõe o rompimento de relações do Brasil com a África do Sul e com outros países segregacionistas

Assegura a categoria dos trabalhadores domésticos os direitos como: salário mínimo, irreduti-

bilidade do salário ou vencimento, 13º, repouso semanal remunerado, férias anuais remuneradas, aviso prévio, além da integração à Previdência Social.” (NZINGA INFORMATIVO, 1988, p. 08) Ao trazer essa dimensão institucional da lei para o panorama atual, vislumbrou-se a descolonização das mentes acerca da participação de negros e negras na política, evidenciando que desde sempre os Movimentos de Mulheres Negras estão organizados e resistindo; a começar de Nzinga e Aqualtune, tendo como grande marco o Conselho da Mulher em 1950, antes mesmo da articulação do Movimento Feminista. (LEMOS, 1997) * Ellen Mendonça é graduanda em Direito pela PUC-Rio, com ênfase em Direito Público.

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anexo nuvem

Intelectuais Negros: PRESENTES! Apresentamos uma seleção feita pelo CNN de negras e negros cuja produção é pautada na temática racial brasileira e internacional. São escritores, poetas, jornalistas, artistas de enorme importância na produção intelectual. Para aplicação da Lei 10.639/03 na educação, é necessário que se inclua estes e tantos outros intelectuais na bibliografia das disciplinas escolares e universitárias. Considerar a produção negra é reconhecer outra forma de conhecimento que não é a estabelecida. Incentivamos que levem essa lista para as salas de aula, acrescentem nomes e se aprofundem nas produções. É tempo de assumir as contribuições negro-africanas!

ALBERTO GUERREIRO RAMOS (1915 – 1982)

Foi sociólogo e um intelectual importante para o pensamento social brasileiro, diretor do departamento de Sociologia do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB). Grande crítico da Sociologia – a “sociologia enlatada” - e dos estudos realizados no Brasil sobre as relações raciais. Desenvolveu categorias sociológicas como “negro tema”, “patologia social do branco”, “ideologia da brancura” que recolocaram os estudos sobre o negro e questionaram o lugar social privilegiado do branco na sociedade.

AZOILDA LORETTO TRINDADE

( ? – 2015) Ativista voltada à educação das relações raciais. Doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ (2005), mestre em Educação pela FGV - RJ (1994). Foi pesquisadora do Grupo de Pesquisa Identidades e Alteridades: Diferenças e Desigualdades na Educação; coordenadora pedagógica do projeto “A Cor da Cultura”. Importante contribuição para a implementação da Lei 10.639/03. Sua tese: A formação da imagem da mulher negra na mídia; sua dissertação: O racismo no cotidiano escolar.

BEATRIZ NASCIMENTO (1942 - 1995)

CARLOS MOORE (1942 - ... )

Historiadora, poeta, escritora e ativista do movimento negro. Foi uma estudiosa sobre a temática racial, abordou em suas pesquisas os quilombos e toda experiência de resistência dos africanos e de seus descendentes em terras brasileiras, incluindo as religiões de matriz africana. Tem grande contribuição no combate ao racismo e sobre a situação das mulheres negras. Ajudou a fundar o Grupo de Trabalho André Rebouças (GTAR), em 1974, na Universidade Federal Fluminense (UFF), do qual ela se torna orientadora.

Escritor cubano, pan-africanista, doutor em Ciências Humanas e doutor em Etnologia pela Universidade de Paris VII (França). Foi professor na Universidade Internacional da Flórida (EUA), Universidade do Caribe (Trinidad-Tobago), e Universidade do Caribe Francês. Pesquisador das relações raciais e crítico do marxismo. Defende que o racismo é uma forma de consciência/estrutura de origem histórica. Autor de vários livros e artigos sobre raça e racismo.

CAROLINA MARIA DE JESUS

CLÓVIS MOURA

(1914 - 1977)

Por muito tempo foi a escritora mais traduzida do Brasil, moradora da favela do Canindé em São Paulo, trabalhava como catadora e registrava o cotidiano da comunidade em cadernos que encontrava no lixo. Seu primeiro livro, “Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada”, foi publicado em 1960. Após o lançamento, seguiram-se de três edições, com um total de 100 mil exemplares vendidos, tradução para 14 idiomas e vendas em mais de 40 países. Ela é considerada uma das primeiras e mais importantes escritoras negras do Brasil.

(1925 – 2003) Foi sociólogo, jornalista, historiador, escritor, marxista e militante do movimento negro. Desenvolveu a “Sociologia da Práxis Negra”. Questionou a visão teórica sobre a passividade do negro no Brasil, destacando a resistência à escravidão dos quilombos. Em suas pesquisas, tratou das rebeliões dos escravizados e da formação dos quilombos. O seu primeiro livro, Rebeliões da Senzala, de 1959, revê a história da escravidão e do papel do negro escravizado na dinâmica da sociedade brasileira.


anexo nuvem JUREMA WERNECK

MILTON SANTOS (1926 – 2001)

Médica, mestre em Engenharia de Produção pela Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia, UFRJ (2000) e doutora em Comunicação e Cultura pela Escola de Comunicação da UFRJ (2007). Participa da Ong Criola. Tem artigos e livros publicados sobre população negra, cultura negra, situação das mulheres negras, feminismo; racismo; saúde das mulheres negras, direitos sexuais e reprodutivos; políticas públicas para equidade de gênero e raça; saúde da população negra, bioética e direitos humanos.

Geógrafo, ganhador do prêmio Vautrin Lud, em 1994, considerado o Nobel da geografia. Foi professor na Universidade Federal da Bahia (1959-1961), professor convidado nas universidades de Toulouse, Bordeaux e Sorbonne, e no IEDES (Instituto de Estudos do Desenvolvimento Econômico e Social) na França (1964 a 1977). Lecionou na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) até se tornar professor titular na Universidade de São Paulo (USP). Destacou-se por seus estudos de urbanização e sobre os efeitos da globalização.

MOLEFI KETE ASANTE

NEUSA SANTOS SOUZA

(1942 - ... )

Pan Africanista nacionalista, historiador, filósofo, poeta, dramaturgo e pintor. Proeminente figura, é professor e Chefe do Departamento da Universidade de Temple nos E.U.A., onde criou o primeiro programa de Doutoramento em Estudos Africanos do mundo na década de 80. Possui mais de 100 prêmios e mais de 80 livros publicados. Define o conceito de Afrocentricidade como: “um paradigma baseado na ideia de que os povos negroafricanos devem reafirmar o sentido de agência para atingir a sanidade”.

seu livro mais conhecido, “Tornar-se Negro”

SUELI CARNEIRO

(1951 – 2008) Psicanalista e escritora. Foi ativista desde a década de 1980 contra o racismo no país. Escreveu artigos, crônicas e vários outros escritos em jornais e revistas. Entre suas obras se destaca o livro Tornar-se Negro: As vicissitudes da Identidade do Negro Brasileiro em Ascensão Social, em 1982. “Diante da flácida omissão com que a teoria psicanalítica tem tratado esse assunto, a autora apresenta reflexões profundas e inquietantes sobre o custo emocional da sujeição, da negação da própria cultura e do próprio corpo”.

WOLE SOYINKA

(1950 - ... )

Filósofa, doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Autora do livro Racismo, sexismo e desigualdade no Brasil e de artigos sobre gênero, raça e direitos humanos em diversas publicações nacionais e internacionais. É coordenadora executiva de Geledés - Instituto da mulher Negra. É também membro do Grupo de Pesquisa “Discriminação, Preconceito e Estigma” da Faculdade de Educação da USP, e membro da Articulação Nacional de Ongs de Mulheres Negras Brasileiras.

(1934 - ... ) Intelectual nigeriano, dramaturgo, poeta, escritor, ativista político, professor de Literatura, primeiro africano a receber o Prêmio Nobel de Literatura em 1986. Lecionou na Obafemi Awolowo University localizada na Nigéria, em 1975, University of Emory, nos EUA. Tornou-se professor emérito da Obafemi Awolowo University, em 1999. Tem criticado abertamente as administrações do governo da Nigéria e de tiranias políticas mundo afora.

Fonte das Imagens: Divulgação/Internet

Para saber mais, acesse: medium.com/jornal-nuvem-negra


escrevivência

Retomei minha voz

Esteban Cipriano*

“Eles deram socos e pontapés, depois mandaram meu filho entrar na rua e andar sem olhar pra trás” “Todo mundo pra eles é vagabundo” “Eu tomei um susto, levantei e fui abrir a porta. No que fui abrir, eles já queriam arrombar o cadeado, aí eu falei ‘calma, moço, aqui tem criança” Eu tô furioso. Não vou ficar calado, tenho ficado profundamente perturbado com nossa morte. Sendo um homem negro, gay, eu não me sinto seguro. Dentro de um carro em Costa Barros, eu sou só mais um negro morto. Não tem mestrado, doutorado, currículo certo que parem 111 tiros. Nem dá tempo de tirar a carteira da PUC do bolso. Exposto à letalidade do racismo, não tem aluno pesquisador. Rodeado de tamanha brutalidade, é só mais um negro caído. Nós vamos levantar. Chega de morte! Chega de lágrimas! Eu quero a Justiça! O genocídio do negro no Brasil está em curso, a sede de sangue negro não termina. É muito talento dizimado: matam pais, matam mães, matam nossos meninos. Eu ando na rua às vezes com medo. Eu sei minha cor, minha pertença racial. Sei que posso ser parado, posso ser agredido e ninguém fará nada por mim. Não quero mais um relatório, um noticiário, aí eu já vou tar caído. Não quero suas boas intenções, sua retórica política nem seus debates acadêmicos. Me querem preso, me querem morto. A desculpa é terem me confundido. Furadeira com pistola. Saco de pipoca com drogas. Guarda-chuva com fuzil. Só não confundem branco com preto, nem Leblon com Manguinhos. É muito corpo amontoado e todos sou Eu. Aqui no Coletivo a gente tem futuro. Futuros engenheiros. Futuras advogadas. Futuros cientistas sociais. Futuras jornalistas. Será que a gente tem futuro? A gente não pode se enganar porque o negro é descartável no Brasil. É só eu e mais quatro irmãos do Nuvem Negra darmos um rolé por aí, “vamu comemorá o lançamento du jornal!”. Será que voltaremos vivos? Lembro sempre do que minha mãe dizia: “Leva a identidade, meu filho!”. Eu não quero sua pena, seu choro seco, seu nó na garganta. Seu racismo também mora no silêncio. Pessoas que podem morrer chamadas de traficantes,

de elemento. Todos pobres, todos negros, sem nenhuma humanidade. Outro dia, logo do outro lado da rua, quase aqui, vi os herdeiros da Casa Grande fumando maconha. Não tinha suspeito, morte, nem desespero. Na mira do Estado só o preto. Eu sei que você tá me entendendo. 130 anos depois nosso povo ainda é caçado, é perseguido. Usam o mesmo discurso: por mais segurança pública no combate ao tráfico. Polícia versus traficante, mais um motivo barato. Todos pobres, todos negros. Nosso povo dizimado. Anseio. Já resistimos há séculos. Precisamos construir nossa utopia. Autonomia e solidariedade. Minha avó conta a nossa história. O caminho é esse, a rota é certa, o ódio não vai vencer. Eu não quero dizer porque já tô dizendo, retomei minha voz, pronto pra me libertar a todo momento. Quero futuro, vida, luta real. É tempo de levantarmos em todo o mundo e organizarmos nossa luta. Nós sabemos da nossa história, quem somos, de onde viemos e o que queremos. Minha República é de Palmares, e a Nuvem está só começando. Esperança é alimento vivo. Viva os nossos ancestrais! Que Exú abra os nossos caminhos. Laroyê! *Esteban Cipriano está no 8º período de Serviço Social e pesquisa políticas de ações afirmativas e Afrocentricidade

Exu é o Orixá responsável pela comunicação. É aquele que carrega a mensagem entre seres humanos e os Orixás. É o princípio do movimento, sem o qual nada acontece. É o guardião das porteiras, dos mercados. É senhor dos caminhos! “Exu matou o pássaro ontem com a pedra que jogou hoje”. Laroye é a sua saudação.

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escrevivência

Carta a uma menina como eu Daiane Goulart * Em tempos de empoderamento estético, nos quais a beleza negra é cada vez mais valorizada, me pergunto o quão difícil foi o processo de aprender a nos amar e a aceitar a nossa estética. Desde a infância, a nossa beleza é lida por meio de olhos alheios. Olhos que não estão acostumados com a nossa estética: com a protuberância das maçãs, com o tamanho da boca, com a cor da pele e com o volume do nosso cabelo crespo. Esses olhos nos rejeitam! Não fomos a menina mais bonita da sala. O menino que gostávamos não nos olhou. Aquelas pessoas não nos amavam, consequentemente, deixamos de nos amar também.

A revolução começa no amor-próprio. Aprender a nos amar é aprender a negar o lugar que a sociedade racista nos impõe. A partir do momento em que nos amarmos, não aceitaremos mais que nos diminuam. Você vai ditar o seu lugar. Você é linda! * Daiane Goulart está no 8º período História na PUC-Rio.

Mudaram as águas Kimberly Oliveira*

Mudaram as águas Rio desaguado no mar A gota que outrora fora tua, hoje navega distante.

Alisamos o cabelo, fizemos de tudo para poder nos encaixar, mas como julgar alguém que só queria ser amada? Nada disso é culpa nossa! O preterimento da mulher negra pela sociedade faz com que odiemos os nossos traços.

Mudaram as águas Lava o passado que te assombra Desenha a face dos afogados Vira NUVEM e chove o corpo.

Sofri racismo durante muito tempo por causa dos meus lábios. Eu odiava a minha boca. Precisei de quase um ano de acompanhamento psicológico para usar um batom nude. Durante a minha adolescência, eu era só um conjunto de coisas de que não gostava.

Mudaram as águas Gota tecendo o sonho Sonhando oceano Banhando a mãe África Vendo a correnteza passar.

Cada processo é diferente, mas a minha autoestima melhorou muito depois que eu aceitei meu cabelo; assim como quando eu entendi que o meu corpo também é um agente político. Meu cabelo e minha boca com cor forte representam a minha luta e fazem parte da minha militância.

*Kimberly Oliveira graduanda do 3º período de Letras Português e Literaturas.

indicação nuvem negra AFROFLIX é uma plataforma online e gratuita que disponibiliza filmes, vlogs, programas e séries produzidos, escritos, dirigidos ou protagonizados por pessoas negras. A criadora é Yasmin Thayná, aluna de Comunicação da PUC-Rio, cineasta e membro do Coletivo. Conheça mais em afroflix.com.br OCUPAR, RESISTIR, SUBVERTER é uma seleção de artigos sobre racismo,

violência, direito à cidade e outros temas por meio da ótica da Teologia Negra e de Libertação. Ronilso Pacheco, estudante de Teologia da PUC-Rio e integra o CNN, é filho dessa tradição negra. O livro ecoa esse grito negro em voz cristã junto com os gritos da terra e dos pobres urbanos.

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Para obter essa resposta e tantas outras, o Coletivo Nuvem Negra inicia uma campanha que questiona quantos professores negros e professoras negras temos na PUC­-Rio. A campanha é o ponto de partida para uma pesquisa idealizada pelo Coletivo, com a finalidade de registrar a dinâmica racial do corpo docente da universidade. A divulgação do resultado da pesquisa está previsto para o fim do semestre, e enquanto isso, acompanhe nosso processo pela página fb.com/coletivonuvemnegra.

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