JORNAL PEDAL Nº6

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passeios nocturnos para mergulhar em gelados... No número duplo do Pedal, uma celebração dos meses "J", derretemo-nos numa entrevista suada com um DJ Ride mecânico de bicicletas e, após limparmos o pó à cara, viajamos da Holanda à China, passando por Portugal para descobrir caminhos e a construção de espaço, o desenho ao serviço da bicicleta e o futuro de arquitecturas cicláveis. Torramos o corpo com contos vindos da dimensão erótica para festejar hormonas pedaleiras trazidas pelas curvas de calor e afogamos tudo num caldo mecânico, a hipótese única para esborratar e fantasiar com o teu Pedal. Há ainda uma bicicleta a prémio quase, quase pronta a atirar ao mais hábil e destemido dos concorrentes! Venham e enterrem-se nesta areia salgada à sombra de mojitos em selins e piña coladas sem travões. JB

Dose dupla Pedal, Jornal Pedal a dobrar, concentrado Pedal. Sim, o necessário para apanhar a brisa ciclável deste Verão, aguardando o escaldante Agosto. É tempo de aventura em rodas, trilhar o asfalto quente em modo férias ou escapadelas até à praia mais próxima ou, ainda,

Nº6 – JUNHO/JULHO DE 2012 Ficha Técnica Director: Bráulio Amado (BA) ba@ jornalpedal.com Director Adjunto: Luís Gregório (LG) lg@jornalpedal.com Editor: João Pinheiro (JP) jp@jornalpedal. com Redacção: Ricardo Sobral (RS) rs@ jornalpedal.com, João Bentes (JB) jb@ jornalpedal.com Colaboraram nesta edição: Fotografia: Ricardo Filho de Josefina Ilustração: José Macena Textos: Duarte Nuno, Lars Garcia, Banda Desenhada: Rick Smith Revisão: Babelia Traduções babelia.pt Design e Direcção de Arte: Estúdio HHH Comunicação: Helena César Departamento Comercial e-mail: rs@jornalpedal.com tlm: 915044437/935586915/933514506 Distribuição: Algarve: Bike Postal Porto: Roda Livre Lisboa: Camisola Amarela

JORNAL PEDAL é uma marca registada / Morada: Praça Gonçalo Trancoso nº2 – 2º esq, 1700-220 Lisboa Tel: 935586915/933514506/915044437 e-mail: info@jornalpedal.com web: facebook.com/JornalPedal / jornalpedal. com / twitter.com/JornalPedal Impressão: Empresa Gráfica Funchalense S.A. funchalense.pt | email: geral@egf.com. pt Tel. 219677450 Fax 219677459 Tiragem: 5.000 exemplares Depósito Legal: 340117/12 O JORNAL PEDAL faz parte da Cooperativa POST postcoop. org As opiniões expressas no JORNAL PEDAL são da exclusiva responsabilidade dos respectivos autores, e não vinculam ou reflectem necessariamente a posição da direcção do jornal. Jornal Pedal é uma publicação gratuita que não pode ser vendida.

CURTAS

BIKE POSTAL

CONGRESSO INTERNACIONAL DE CICLISMO O Cine-Teatro de Anadia acolheu no início de Julho o congresso organizado pela Federação Portuguesa de Ciclismo, sob o lema “Pistas para o Futuro”. A programação deste ano foi bastante vasta e diversificada, incluindo temas como o “ciclismo e a nova cultura urbana”, “ciclismo enquanto actividade económica” e “evolução do ciclismo em Portugal”. Entre as figuras ilustres do ciclismo, estiveram também presentes o presidente da União Ciclista Internacional (UCI), Pat McQuaid, e o histórico director da Volta a França, Jean-Marie Leblanc. uvp-fpc.pt

Desde Junho, é possível utilizar estafetas em bicicleta no Algarve, mais concretamente, em Portimão. A Bike Postal é a empresa ideal para transportar encomendas de uma forma ecológica, económica e rápida e junta-se, assim, a um leque de empresas que trabalham a pedal, presentes de norte a sul do país. Contactem a Bike Postal, caso queiram que o Jornal Pedal vos seja entregue à porta, uma vez que será ela a responsável pela nossa distribuição nesta cidade. bikepostal.com

ECOTOPIA BIKE TOUR 2012

Pela terceira vez, este projecto salta para o selim. Vive-se uma utopia a pedal de mais de dois mil quilómetros e dois meses. A comunidade independente, nómada e autogestionada segue rumo ao norte da Itália a partir da Catalunha. Este ano, o tema é o Decrescimento, “desafiando a mentalidade destrutiva do crescimento, económico e de produção, que não tem em conta valores e problemas sociais e ambientais”. Há ainda o desafio de cruzar os Pirinéus e os Alpes. É possível juntar-se em qualquer altura do percurso. Toda a informação em ecotopiabiketour.net.bikepostal.com.

VOLVO OCEAN RACE STOP OVER LISBON nega corrida urbana

A Volvo Ocean Race é uma das provas mais duras de vela, cujo percurso é uma volta ao mundo passando por nove localizações ao longo de oito meses. Por motivo da passagem por Lisboa, foi proposta uma corrida urbana em bicicleta para testar o pedal dos velejadores mais duros do mundo, iniciativa que não obteve resposta por parte da Lagos Sports, entidade organizadora do evento na capital portuguesa. Homens corajosos, é certo, mas ficou por saber se têm o estômago necessário para comer sete colinas de uma vez. volvooceanrace.com

BROMPTON Por VIC LEE

Numa segunda participação com a Brompton, Vic Lee adorna uma edição limitada a 500 bicicletas da marca. Este modelo recria o universo gráfico da cidade londrina e aperalta-se dos melhores componentes possíveis numa bicicleta Brompton. De número limitado e procura elevada, exemplares desta bicicleta podem ser encontrados à venda em Portugal. bromptonportugal.com

"mouraria alleycat" no bike.pop

gratuito para quem trouxer a sua bicicleta. A primeira edição da corrida "Mouraria Alleycat" será no dia 22 (18h00). Esta é a segunda vez que se realiza o evento Bike.Pop, depois da participação, em Abril, na Capital Europeia da Cultura – Guimarães 2012. aimouraria.cm-lisboa.pt

JOGOS OLÍMPICOS 2012

Celebra-se a 29 de Julho a cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos Londres 2012. Esta edição conta com cerca de 103 atletas portugueses distribuídos pelas diversas modalidades e no ciclismo de estrada conta com André Cardoso, Manuel Cardoso, Nélson Oliveira e Rui Costa. Toca a dar ao pedal na Londres 2012! comiteolimpicoportugal.pt

SURF AT LISBON FILM FESTIVAL

Lisboa acolheu, de 14 a 17 de Junho, a primeira edição deste festival de cinema dedicado ao surf, no cinema São Jorge. Diz quem foi que gostou e sentiu vontade de ir à praia logo a seguir, para compensar as horas de sol perdidas dentro da sala. Mas como nem só de pranchas vive o Homem, também houve filmes com bicicletas, as curta-metragens “Jim's Lines”, de Patrick Trefz (já exibida no Bicycle Film Festival Lisboa, em 2009), e La Ruta Norte, de Kepa Acero, sobre uma viagem de bike pelo Caminho de Santiago acompanhada de uma prancha de surf. surfatlisbonfilmfest.com

O Largo do Intendente está em festa durante todo o mês de Julho, sendo palco de espectáculos e eventos para celebrar a recente reabilitação desta zona da cidade. A programação inclui o Bike.Pop, dinamizado pela Cooperativa Cultural POST em parceria com a LARGO Residências. Sempre aos Domingos, há diversas actividades incluindo check-up

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Beautiful bikes for beautiful people

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CONCURSO

Finalistas: Sara Raquel Montagem & Sinalética

Luís Beltrão Composição Gráfica

A ideia deste concurso surge da visão partilhada entre o Jornal Pedal e a Brompton e aquelas coisas do andar de bicicleta na cidade, que de certa forma nos une. É inegável o prestígio desta marca e desde que entrámos nesta história das bicicletas reconhecemos-lhe qualidade e um espaço muito bem sedimentado no universo das bicicletas dobráveis, que apesar de tudo ainda nos é um pouco estranho, pois gostamos de rodas grandes. Bastam umas horas em Londres para nos cruzarmos com uma mão cheia de Bromptons com sujeitos engravatados ou um jovem designer ao guiador. A realidade portuguesa é bem diferente, por isso sabíamos que oferecer uma Brompton seria também um desafio e, de certa forma, motivo de orgulho poder oferecer uma bicicleta como esta, não estando ilibados destes jogos do marketing. Nunca tínhamos gerado uma competição deste género e, como tal, foi uma descoberta, desde a programação, gestão do concurso, interacção com os candidatos até à reacção às propostas que nos foram enviando. Ao longo de mais de um mês recebemos quase uma centena de respostas ao mote inicial “desdobra a tua criatividade”, que em retrospectiva faz mais sentido do que inicialmente teríamos imaginado. Pois esse também foi o mote que, inconscientemente, usámos para construir este jornal. Recebemos fotos, vídeos, músicas, ilustrações, montagens, mais fotos, textos (prosa e poesia), manifestos ou outras coisas que misturavam isto tudo. Depois de publicadas no Facebook, foram seleccionadas as cinco propostas que mais “gostos” tiveram. E no dia 27 de Julho é anunciado o vencedor, escolhido por um júri constituído por três pessoas do mundo das artes e duas do Jornal. É impossível ter a noção real do que este concurso gerou mas gostamos de acreditar que a quem os vários posts do Facebook chegou, tenha questionado uma outra forma se deslocar nas cidades, ou cimentado essa crença. Agradecemos imenso a todas as pessoas que nos enviaram propostas, às outras que de alguma forma participaram no concurso, à Loja Mega Aventura e à Art Chiado por todo o apoio e, em especial, à Brompton Portugal, que esteve sempre ao nosso lado assim que foi preciso.

Eva Vieira Video stop-motion

Cláudio Marques Vídeo

Diana Guerreiro Fotografia

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CONTO

Lars Garcia

Era uma sexta-feira à tarde e, nessa noite, tinha um jantar com a minha ex-namorada. Na verdade, não tinha pressa de chegar a lado nenhum, não vejo com bons olhos reencontros com essa menina e, por isso, vou a estes rendez-vous a contra gosto. Ir ter com a minha ex-namorada não foi o capítulo que eu recordo dessa sexta-feira, pouco interessa esse episódio na história desse dia. Eu tinha saído do trabalho com tempo para chegar a casa e tomar um duche à vontade, o caminho é uma rotina simpática que eu e a minha bicicleta fazemos sem pensar. Nesse dia era isso que se passava, talvez por ser tão repetitivo e automático em mim, fazia a descida aguda que antecede a subida suave rapidinho, sem preocupação e a controlar a actividade que não deixa nunca de ser rotineira. Imerso neste vazio que nada interessa, a minha roda da frente bateu e eu voei. Em segundos dou por mim no chão algo nervoso e à primeira vista parece tudo bem, ainda não tinha olhado para a bicicleta mas eu não achei que me tivesse ferido nada de especial. Tinha visto o carro a alguma distância e consegui travar o suficiente para não ser ainda mais violento, nitidamente não consegui parar. A dona do carro saiu imediatamente e confirmou o local onde eu bati, não deixei de reparar como as suas pernas bem feitas ficavam deveras agradáveis nos jeans justos que ela estava a usar. Interrompi esse pensamento quando ela se dirige a mim de maneira algo agressiva: —Você não me viu? O meu pára-choques desmontou-se, está no chão! Num flash passou-me pela cabeça como os carros novos são inacreditavelmente frágeis, um toquezinho e o pára-choques vai ao chão mas apenas consegui dizer: —Desculpe, não consegui parar. Ao que ela muito prontamente respondeu; — Não conseguiu parar? Essa tem piada, claro que não conseguiu parar, vinha a fazer a descida como um louco. Vocês pensam que é tudo vosso, mas o que é certo é que o meu pára-choques está no chão, e agora? Quem é que paga? Tem seguro? Não, não tem. Se calhar nem dinheiro tem, estou feita, vou ter que gastar dinheiro numa coisa sem jeito nenhum e o culpado é um anormal que nem sequer num carro é capaz de andar e, pelos vistos, menos ainda de bicicleta. Confesso que fiquei com muita vergonha, não só por estar a ser desconjuntado daquela maneira mas porque a minha bicicleta não tinha nada, não consegui dizer nada que aliviasse a tensão da senhora e acabei por estar ali alguns minutos a ouvi-la enquanto ela reclamava comigo e com o mundo, mais comigo definitivamente. Rompi o silêncio com alguma revolta: — A senhora tem razão, eu não devia ter estragado

o seu fragilíssimo carro, não devia ter chocado contra si e na verdade deveria pagar o arranjo, algo que tenciono fazer. Mas não creio que seja justo estar aqui a descompor-me por causa de uma situação que foi claramente um acidente. Não sei qual é o seu problema para além daquele que está a nossa frente, e não me parece que seja eu o culpado, por isso não vou admitir que esteja a falar comigo nesse tom. Saiu-me directo e sem hesitações, reparei que ela reagiu às minhas palavras e apresentava agora uma cara bem mais simpática, foi então que fiquei surpreendido com as suas feições, tinha umas linhas bem definidas e uma pele que dava agora muita vontade de tocar, tinha uns olhos verdes completamente desarmantes que olhavam apesar de nervosamente de uma maneira intensa para mim, o cabelo loiro dela brilhava e parecia um tecido de seda que enquadrava aqueles lábios finos. Ela não era muito nova, devia estar nos seus 40, mas sim, era gostosa. O decote era o sidekick que eu achei quase anedótico fazer parte da situação, era uma blusa larga e com os botões abertos até ao ponto que faz um homem encará-la sem olhar para a face. Ela já tinha parado o carro em cima de um passeio, e foi no momento em que eu a encarava sem receio que ela ignorou o pára-choques caído e se sentou no capot, aí lançou a bomba. — Eu vou-lhe dizer o meu problema… Neste momento lançou a mão à minha camisa e disse com o ar mais sério do mundo: — Há muito tempo que ninguém me manda uma boa trancada, tenho uma vida relativamente feliz, poucas coisas me incomodam na minha existência, mas se havia coisa que eu gostaria e começo a acusar imenso é a falta de alguém que me faça vir como se eu fosse morrer a seguir. Eu já nem penso em sexo com tudo, contentava-me só com um orgasmo, mas um daqueles que me pusesse as pernas a tremer. Confesso que fiquei nervoso, fiquei também surpreendido com a velocidade com que o meu pénis ficou erecto, mas na verdade ela assustou-me. Do susto inicial comecei a sentir a polvorosa de tensão sexual, ela era super sensual e tinha acabado de me gritar ao ouvido: “Eu quero que tu me faças”, estava tudo lançado. Se quiser eu arranjo-lhe o pára-choques com fita adesiva só para podermos sair daqui, posso por a minha bicicleta no seu carro e vamos a qualquer lado. Ela aceitou as condições com um acenar de cabeça e entrou no carro, esperou enquanto eu desenrascava o arranjo, tirei a roda da frente coloquei a bike no banco de trás à frente da cadeira de crianças e entrei. A noite já estava totalmente instalada quando entrámos na auto-estrada, disse-me que iríamos a uma estação de

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serviço num sítio mais sossegado onde eu lhe iria fazer um show de língua como ela lhe chamou. Já nas traseiras de uma lavagem de carros junto à vedação da auto-estrada ela parou o carro, puxou o banco dela para trás e ordenou-me: — Agora vais chupar a minha concha e só vais parar quando eu me vier. Passei atabalhoadamente por cima do travão de mão aproveitando para lhe apalpar os seios e assumi a minha posição, puxei os jeans para baixo e comecei a beijar encarecidamente a sua vagina. O resultado foi imediato, em segundos ela estava a gemer e a agarrar os meus cabelos da nuca, acariciava-lhe gentilmente o clítoris com a ponta da minha língua e posso dizer que naquele momento estava totalmente duro de tesão, tive o instinto de afagar o meu pénis mas ela não me deixou. — Estás aqui para me fazer vir, por isso ao trabalho. — Disse ela em êxtase. Eu acedi, compenetrei-me completamente na tarefa em mãos e, deixem-me ser literal, comecei a acariciá-la com a mão, tinha de a ocupar com algo e percebi logo que ela gostava, fê-la apertar as pernas e exclamar de prazer, foi um estimulo para mim e tomei conta da sua vagina, neste ponto lambia-a de maneira frenética ao mesmo tempo que sentia as contracções no interior dela. Normalmente não gosto de vaginas depiladas, mas aquela era o meu recreio. Ela cheirava muito bem, algo que ia bem com a sua pele suave e extremamente apetecível, mas no carro começava também a sentir-se aquele cheiro a sexo que coloca o acto numa dimensão mais carnal. Neste momento, não pensava no jantar que me estava a baldar com a minha ex-namorada, não pensava nas chamadas não atendidas que provavelmente o meu telemóvel já notificava; pensava só naquela mamasita sexy que eu estava a fazer. Neste momento ela começa a gritar: “Estou-me a vir, estou-me a vir!”. Eu continuei até ela me puxar a cabeça para trás - agora que penso nisso, de maneira algo violenta - em acto continuo ela abre a porta do carro, vai ao banco de trás pega na minha bicicleta, na roda e atira ambas pela vedação. Eu saí do carro incrédulo, a pensar o que estaria ela a fazer, teasing pensei inocentemente. Corri para ver o que havia depois da vedação, quando olhei para trás ela já tinha o carro a trabalhar e preparava-se para sair. Ainda devo ter gritado para ela voltar, não tenho a certeza, ela já ia longe quando me apercebi da situação em que estava. Sorrio quando penso que só bati no carro dela porque tenho fixed gear, não dá propriamente para parar quando queremos, talvez eu não consiga nunca parar quando quero, até porque para a semana tenho um jantar com a minha ex-namorada.

Ilustração — Bráulio Amado

* texto com conteúdo explícito


CONTO

Ricardo Sobral rs@jornalpedal.com

Os meus amigos ciclistas ficam surpreendidos quando lhes digo que vou a pé para algum lado. Parece-lhes estranho, nalguns casos mesmo descabido. Tento explicar-lhes que tem as suas vantagens. Dizem-me “para quê perder tempo se podes ir mais depressa de bicicleta?” numa primeira fase de choque e espanto, avançando depois para comentários mais jocosos. “Não tens pedalada” é talvez o meu preferido, por ser gratuitamente óbvio. Gosto de andar a pé, é um facto. Sempre gostei mas só recentemente me vi confrontado com a necessidade de justificar esta opção de transporte – aliás, chamar-lhe “opção de transporte” é já de si uma justificação para uma coisa tão simples que não devia precisar de explicações, quanto mais ser defendida. Percebo que se possa achar fascinante que o ser humano seja o único primata bípede e se discutam as possíveis razões evolutivas que nos trouxeram até aqui. Agora, questionar o uso dessa faculdade que se adquire aos doze meses de vida como se fosse um atavismo cultural já me parece excessivo. Um bêbedo que não consegue andar é normal. Um sóbrio que anda é uma extravagância. Entre piadas e estupefacções, dei por mim a fazer exercícios de retórica numa tentativa de normalizar o meu comportamento desviante, aos olhos dos ciclistas.

O que percebi é que nada mudou no mundo tirando, talvez, a forma como nos deslocamos. Senão reparem, quando tenho que justificar o andar a pé, os meus argumentos são os mesmos que qualquer ciclista aponta a um automobilista: é um meio de transporte muito ecológico porque, além de não produzir emissões de CO2, não contribui para uma indústria poluente como a das bicicletas – que implica a produção de óleos e lubrificantes à base de petróleo e peças feitas a partir de minérios cada vez mais escassos – nem depende (tanto) de bens importados de paragens longínquas e exóticas que aumentam substancialmente a sua pegada ecológica, também conhecida por emissões de CO2, também conhecida por poluição. Estacionamento é um problema que não existe quando vou a pé porque não tenho que procurar um local visível e uma estrutura robusta para prender a bicicleta, nem saber se o meu cadeado é seguro para determinadas zonas e horas. Estacionamento à porta pode parecer uma ideia brilhante, mas não ter que estacionar de todo é que é. Outra vantagem a reter: intermodalidade com os transportes públicos, horários e condições de acesso? Deixem-me rir. Depois, há toda uma nova perspectiva da cidade que se adquire, é uma descoberta que se faz como quando se

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experimenta usar a bicicleta numa base regular. Novos percursos, melhores caminhos com piso mais agradável, passeios mais largos... a lista de preferências é infinda. Para mim, a grande diferença está na velocidade a que a cidade passa por nós e no que ela me permite apreender. Deslocando-me mais devagar, consigo descobrir novos restaurantes e lojas mais depressa do que a “Time Out”. Menos é mais. E numa lógica de transporte pós-rodinhas tudo se torna mais relaxado. Andar de bicicleta é fixe e dá-nos uma sensação de adrenalina que, a pé, é substituída por uma calma que nos permite pensar, seja no que for. Quem vai de bicicleta tem que estar atento ao trânsito (chato), aos carros (chatos) e aos peões (lentos) que se atravessam sem aviso, sem olhar para os ciclistas. Agora compreendo-os. Eles estão ocupados a pensar em coisas muito mais importantes do que nas bicicletas. Estão a pensar na vida, na sua e na dos outros, nas bolas do vestido da rapariga que atravessa e em como ficarão vistas do avesso. Mas a minha vida não mudou e tão-pouco deixei de andar de bicicleta. Nada disso. Passei apenas, isso sim, a fazê-lo quando estou com pressa. Experimentem! Não perdem nada, nem tempo. Vão ver que pelo caminho vos surgem ideias brilhantes, nem que seja para criticar este texto.


R D ID J E

ENTREVISTA

O engenheiro das Caldas

A cidade das Caldas da Rainha já nos habituou a fenómenos artísticos que vão do artesanato fálico aos mais recentes artistas viris. Um deles é o DJ Ride, que trabalhou numa loja de bicicletas para poder começar a fazer música a sério. Um caso de sucesso saído daquela cidade do faroeste português para conquistar o mundo no leste europeu, no campeonato mundial de DJ em 2011. Já conhecíamos o artista mas passámos a conhecer também o ciclista e o nerd da tecnologia. No fim, percebemos que se trata da mesma pessoa e que tudo isso é coerente com o seu trabalho. Está prestes a lançar um novo álbum - "Life in Loops" - do qual já se conhece o primeiro single, "Here Before".

...não sou nada o típico gajo da noite, não fumo, bebo pouco... e como gosto mesmo de bikes, ando sempre que posso, continua a ser a minha paixão. Texto: Ricardo Sobral Fotografia: Ricardo Filho de Josefina (ricardofilhodejosefina.com)

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No último álbum deixaste de usar o prefixo DJ, o que aconteceu? Queria dar mais ênfase à produção e à composição musical. Às vezes as pessoas, por falta de informação, se calhar pensam que aquilo é um trabalho editorial muito à base de cut and paste e sampling, também é, mas há muita composição de teclados e músicos convidados. Claro que o meu trabalho começou sempre no sctratch e é indissociável dessa parte do turntablism, a maior parte do meu trabalho é pôr som e fazer live acts e os pratos estão sempre lá, o DJ está sempre associado, agora claro que eu não sou um DJ convencional de press play e acertar batida, acho que isso qualquer um consegue fazer. Gosto muito mais de fazer live acts e algo mais rico a nível de performance em cima do palco com as máquinas do que propriamente estar a acertar uma batida e carregar no play, isso para mim é um bocado boring. E resultou? Resultou e não resultou, mas não me arrependi. Acho é que o público português é um bocado lazy no sentido em que, qualquer trabalho com uma componente conceptual mais forte, não se dá muito ao trabalho de pesquisar. "Psychedelic Sound Waves" [2009] foi um dos CDs que me deu mais prazer fazer e é um bocado o meu statement sobre a música electrónica naquela altura. Ainda agora acho que continua actual, mas por ser um álbum denso, com muitos layers e muitas variações, acho que o pessoal não entendeu muito. Houve até quem dissesse que este álbum, se calhar no futuro, até vai ser reeditado porque as pessoas daqui a uns anos vão olhar para isto de outra maneira. Tem muitas coordenadas e às vezes as pessoas não estão para se dedicar a um álbum, querem é ouvir o single, isso também me entristece um bocado. Então tu não trabalhas tanto para o single? Não, não tanto. Mas para o meu próximo álbum ["Life in Loops"] tive um cuidado acrescido com os singles, com uma componente radio friendly mais forte do que o anterior, porque também estou a precisar de voltar. Desde 2009 tenho estado um bocado afastado da produção, estive mais a tocar ao vivo, e agora é muito importante para mim voltar e ter sons na rádio, sons outra vez a passar que as pessoas partilhem porque, como o meu trabalho começou a ganhar mais posição, é importante alimentar também essa parte e ter uma música catchy. O formato canção agrada-me muito e são timings. Na altura do "Psychedelic Sound Waves" apeteceu-me fazer uma coisa mais experimental e agora apetece-me fazer uma coisa mais groovy, mais soulful e com muitos vocais, as pessoas mais depressa partilham e fica no ouvido. Depois do Campeonato Mundial de DJs na Polónia, onde ganhaste juntamente com Stereossauro na categoria Show, com o projecto Beatbombers, qual foi o impacto disso para o público português? Sentiram mais abertura ao estilo “o que vem de fora é bom”? Isso notámos, muito. O projecto Beatbombers ganhou muito com isso, foi bom para consolidar o nome. Mas não acho que tenha havido assim tantas propostas [para espectáculos] que capitalizassem isso de outra maneira, claro que houve mais buzz e isso ajuda sempre. E houve essa coisa do “eles ganharam lá fora, então são mesmo bons”. Parece que tens que vingar lá fora e depois é que és bem recebido cá e, claro, que sentimos isso na pele cada vez mais. O teu nome, Ride, está ligado à tua história com bicicletas? O nome Ride vem mesmo das bicicletas e de uma altura pré-música. Comecei a andar mais a sério para aí com doze anos. A minha primeira bicicleta foi uma do ferro-velho que o meu pai restaurou, aquelas BMX com amortecedor no meio. Quando comecei a andar mais comprei uma Giant, que já era aquela bicicleta com uma boa suspensão, travões de disco hidráulicos, porque eu gostava de fazer descidas. Depois modifiquei-a toda, andava só com travão atrás, houve uma altura em que andei com single-speed só para skate park. E partia tudo, basicamente, os quadros, as peças...

ENTREVISTA

...o BMXTB (Nicolai), que por acaso tinha a geometria do meu corpo e era como eu gostava, baixinho, tipo quadro de BMX. Foi por isso que comprei a Trek, para ter aquele estímulo de uma bike nova, a minha bike de sonho. minhas cenas, estive quase para construir uma mesa de mistura, com o meu próprio controlador midi, só que depois ganhei um sponsor de uma mesa que já tinha isso e era um bocado redundante, deixei a ideia. Como eram as tuas bikes, tinhas preferências? Eu comprava os quadros com tamanho mais pequeno porque gostava do híbrido da BMX com montanha. Tive sempre quadros muito pequenos mas com roda 26'', que depois “quitava” com travões de disco e isso tudo. Mais tarde, comecei a trabalhar em part-time numa loja de bicicletas mítica nas Caldas, a Bike Box, que estava a bombar bué porque tínhamos a representação da Nicolai que, na altura, era uma marca de quadros um pouco fetiche, e lá consegui comprar em segunda-mão um quadro de dual, o BMXTB, que por acaso tinha a geometria do meu corpo e era como eu gostava, baixinho, tipo quadro de BMX. Como é que aconteceu ires lá parar à loja? Precisava de dinheiro e gostava de bikes [risos]. No início só ajudava, depois comecei a ganhar experiência, viram que eu era um puto de confiança e comecei a vender. Fui mecânico também muito tempo e a certa altura já ficava a gerir a loja. Isto foi engraçado porque acho que me ajudou, bué novo, a estar em contacto com compra e venda de cenas e ter visão para receber as pessoas. Ao início comecei a trabalhar lá porque queria uma bicicleta boa, depois passei a precisar mesmo de dinheiro para a música. Então foi através das bikes que ganhaste um nome e dinheiro para a música? Eu já usava Ride como nickname no IRC, era um viciado naquilo e um bocado tipo hacker. Mas comecei a fazer beats antes do scratch e de ser DJ e, quando comecei a ter que assinar as produções, usava Ride. Depois, já como DJ, mantive o nome porque era também uma alcunha, na altura éramos muito putos e tratávamo-nos uns aos outros pelos nicknames do IRC. Ficou Ride porque era catchy, pequeno e como DJ queres ter um nome simples que fique bem nos flyers. E financiou também o material [de música]. Mesmo mais tarde, já depois de ter o prato e a mesa de mistura, quando queria um processador de efeitos ou uns pedais para usar na produção, ia lá outra vez à Bike Box fazer uns fins-de-semana para ganhar uns trocos. Hoje é a música que paga as bicicletas, era impossível na altura gastar o que gastei na de downhill que comprei há dois anos, a Trek Session 88. Isso é interessante... bikes, IRC, música... há aqui um ponto de ligação? Sim, muito. Estive para seguir robótica, a minha cena era ir para engenharia electrotécnica, fazia robôs em casa e gadgets. É uma coisa que vem um bocado do meu pai, que é mesmo aquele típico faz-tudo-em-casa. Para mim montar e desmontar uma bike era peanuts. Consideras-te um nerd? Completamente. Sou dos maiores nerds, mesmo na música, se for preciso até sei os nomes dos gajos comerciais que eu detesto porque gosto de conhecer tudo. Estou sempre a par dos fenómenos de tecnologia, gadgets, bikes... e sempre gostei de fazer eu próprio as 7

Como é que chegas ao videoscratch e como é que está a correr? Eu queria fazer um live act mais forte que tivesse uma componente cómica ao mesmo tempo, algo que o pessoal ficasse “ok, isto é novo”. Por exemplo, brincar com vídeos virais ou mesmo gravar uma cena com o iPhone e fazer scratch nisso. Acho que o videoscratch é novo porque estás a dar cor ao scratch, que é uma coisa muito nerd. É impensável fazer uma hora de scratch num festival mas se fizeres um espectáculo de videoscratch em que numa hora as pessoas estão a ver o "Family Guy", o Bruno Aleixo (que fizeram sketches de propósito para nós), cenas de filmes, scratch em guitarras com o Jimmy Hendrix a aparecer, isso já prende a atenção. Tentei elevar a fasquia pessoalmente, fazer o live act totalmente diferente, e é um work-in-progress porque, desde a estreia no Lux em Fevereiro, já houve coisas que melhorámos. É de bike que te moves pelas Caldas? Epá... gosto bué de carros também [risos]. Agora estou a acabar o meu álbum e não consigo andar de bicicleta. Como sou um bocado maluco, chego a casa todo dorido e cansado, não dá para estar a produzir, fico sem paciência para pegar nas máquinas e nos teclados. Mas ando muito e cada vez mais. Por causa da night life e de andar sempre de um lado para o outro, tinha que ter um desporto e não queria ginásio. Foi por isso que comprei a Trek, para ter aquele estímulo de uma bike nova, a minha bike de sonho. Isso tem-me feito muito bem porque, embora a minha vida seja noctívaga, não sou nada o típico gajo da noite, não fumo, bebo pouco... e como gosto mesmo de bikes, ando sempre que posso, continua a ser a minha paixão. Adoro fazer downhill, descer escadas e saltar. É mesmo pela adrenalina, que foi sempre o que procurei nas bicicletas. Pelo entusiasmo com que falas das bikes, e que pões em tudo o que envolve tecnologia de alguma maneira, podias ter sido um rider em vez de DJ? O que é que correu mal? Sim, eu entrei em competições mas... não ganhava. Fazia dirt, não cheguei a entrar em downhill porque não tinha uma bicicleta para isso, mas fazia dual e perdia sempre. Então tive que ir para os campeonatos de DJ para ganhar [risos]. Foi isso. E a música sempre foi mais forte. Compor e fazer música experimental, estar com os teclados e com as groove boxes, na altura nem usava muito computadores, por isso a música sempre foi mais forte que as bicicletas. Off the record... Irrita-me um bocado os posers das bikes. Porque na minha altura, quando era mais hardcore, não era cool ter uma bike. Adoro quando é genuíno, mas aquele pessoal que é só pela moda e gasta bué numa bicicleta para estar parada na sala, só com as cores e para ter a foto no Facebook, epá isso não... Há um buzz enorme nas bikes e isso é brutal, estou mesmo contente de ver as pessoas começarem a andar mais de bicicleta nos grandes centros urbanos, mas por outro lado, teres uma bicicleta bué croma para estar parada, isso aí é estúpido.


A r q u i t ec t u r a c i c l áv e l

o d e s e n h o a o s e r v i ç o d a b i c i c l e ta Existem estruturas arquitectónicas desenhadas em to rn o d o as su n to cicl ável, espaç os d edicados ao descanso da máquina a pedais, à sua arru mação e à sua circu l ação. M ais, há espaç os q u e f o m e n ta m o c l u b i s m o e o c u lt o , a c o m p e t i ç ão e a a d m i r aç ão, au t ê n t i c a s m a n i f e s taç õ e s d e u m a vo n ta d e d e d e s e n h a r pa r a a b i c i c l e ta . S ão edifícios que se tornam especiais pela abordag em d e proj ecto, espaç os q u e rel acio nam pro p o r ç õ e s i m p l í c i ta s ao c o n j u n to c i c lo - m ec â n i c o e a o H o m e m - u t i l i z a d o r . Se a p o n t a r m o s o v e l ó d r o m o, a t í t u lo d e e x e m p lo, t r ata d e u m a t i pologia conhecida, com mais de um século de e xist ên cia ( 1 870) , u m espaç o q u e serve à pr át i c a d e s p o r t i va d e p r ova s d e v e lo c i da d e . Ta m b é m a v i a d e c i r c u l aç ão d e d i c a da à b i c i c l e ta é elemento de trabalho urbano presente e consolidado, mas que devido à necessidade e ao incentivo da circul ação cicl ável em cidades, começa a tomar novas formas, novas abordagens ao desenho e sua aplicação. Há ainda tipologias arquitectónicas emergentes, c o m o pa r q u e s pa r a e s tac i o n a r b i c i c l e ta s , t e m p o r á r i o s e permanentes, projectos e o b r as criad os par a arru mar a b i c i c l e ta à s e m e l h a n ç a d o q u e d e s e n vo lv e m o s pa r a o au tomóvel durante décadas. A vo n ta d e i m p u l s i o n a at é e s paç o s d e pa r t i l h a d a c u lt u r a d a b i c i c l e ta , e s paç o s e m q u e o objectivo é garantir as cond i ç õ e s pa r a a p r át i c a c o m u m d a c u lt u r a c i c l áv e l . S u r g e o c lu b e d e b i c i c l e ta s ta m b é m como uma tipologia arquitectónica recente. Entramos aqui no campo da tipologia do espaç o arquitectónico, definições e composições inovador as que ost e n ta m o p r a z e r d e c i c l a r e r e v e l a m u m a vo n ta d e d e m u da n ç a , u r b a n a e s o c i a l . E s tá a acontecer.

O Velódromo Olímpico de Berlim é um espaço que sendo minimalista revela uma nítida admiração pela prática do ciclismo de velocidade, um desenho para a bicicleta. Foi desenhado em 1992 e construído em 96 pelo atelier francês Dominique Perrault Architecture (DPA, perraultarchitecte.com), um atelier de escala considerável, multinacional. Conta-nos Dominique: "Temos escritórios em Paris, uma colmeia de desenvolvimento multidisciplinar, onde cerca de 80 abelhas trabalham a arquitectura e o planeamento urbano em escalas diferentes. Temos ainda atelier em Madrid e em Renens, na Suíça." A oportunidade de desenhar o Velódromo Olímpico em Berlim surge no seguimento de uma competição de arquitectura para o edificado dos Jogos Olímpicos de 2000 no contexto do pós-Alemanha unificada, em que o DPA ganha o primeiro prémio, jogos estes que embora não concretizados em Berlim, deixam para trás presenças urbanas notáveis.

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Velódromo.Berlim D PA ( D o m i n i q u e P e r r au lt A r c h i t ec t u r e ) © G e o r g e s F e s s y / D P A / A d agp

Velódromo.Berlim D PA ( D o m i n i q u e P e r r au lt A r c h i t ec t u r e ) © G e o r g e s F e s s y / D P A / A d agp

Texto: João Bentes

"Um velódromo é um edifício mais ou menos redondo, mais ou menos a lt o , m a i s o u m en os b elo." DPA


Ponte cicl ável . Lisboa MXT s t u d i o © MXT s t u d i o

"Como arquitecto, a minha vontade era expressar a essência de pedalar através da arquitectura." DPA A abordagem do projecto de Perrault relaciona-se directamente com o contexto simbólico da reunificação alemã e em oposição ao edificado monumental existente, construído para os Jogos de 1936. "Tentei substituir a arquitectura fascista por um pomar de 500 macieiras onde enterrei dois volumes puros: o velódromo e a piscina. Era preferível promover a arquitectura rural para que as pessoas se esquecessem de lugares autoritários." É um edifício que cumpre funções multi-disciplinares, englobando a prática de outros desportos para além da velocidade em bicicleta, mas com grande ênfase neste último. Em termos espaciais, Perrault tenta criar um sistema de variações em volta do círculo e da curva que têm a sua origem no coração do velódromo. A pista aqui é vista como o centro gravitacional do espaço cuja consequência é um efeito de centrifugação que relaciona o edifício com o movimento que é gerado nas provas que abriga. "Como arquitecto, a minha vontade era expressar a essência de pedalar através da arquitectura. Uma certa ambivalência entre equilíbrio e tontura, entre estática e dinâmica. Em termos arquitectónicos, a forma é pura. Por trás dessa simplicidade do edifício há uma lógica e técnica infraestrutural pesada." De facto, no interior do velódromo existe uma câmara imensa, ocupada por uma pista oval em madeira e uma cobertura metálica com estrutura a nu criando um ambiente de tensão que contrasta com a suavidade da pista, que intensifica quer a visualização, quer a própria competição. O espaço, já em si circular, foca a atenção na velocidade aqui praticada. A pista ciclável é o principal objecto deste espaço e eleva a bicicleta a um nível de admiração do poder da máquina e, consequentemente, do atleta como herói. Apontamos agora, por momentos, à via ciclável, à vontade, já geracional, de percorrer a cidade em bicicleta, como meio de praticar uma rotina diária ou de assistir à cidade com uma outra atenção. Para tal, são desenvolvidas nervuras urbanas que nos permitem cruzar a cidade de uma forma mais livre e segura, criando uma relação especial com a paisagem urbana e os elementos que, paralelamente, também a percorrem. Em Lisboa, como parte de uma iniciativa para a exposição Experimenta Design 2009, foi desenvolvido um projecto para uma nova ponte ciclável que atravessa uma via rodoviária, sobrepondo-a. O atelier MXT (mxtstudio.com), vencedor do primeiro prémio desta competição, é uma parceria entre os arquitectos Telmo Cruz e Maximina Almeida, englobando ainda, por vezes, a colaboração de outros profissionais tendo em conta a dimensão e especificidade do projecto, procurando a investigação da arquitectura vocacionada para a compreensão da complexidade da cidade. Neste projecto, parte-se de uma base que considera o elemento tipológico como um desenho de fluxos urbanos,

Ponte cicl ável . Lisboa MXT s t u d i o © MXT s t u d i o

dizem-nos os autores: "Esta ponte pertence aos novos mapas, de novas acessibilidades, nos quais filigranas de caminhos, novos e existentes, se sobrepõem, cruzam e ligam às actuais infra-estruturas das cidades restabelecendo continuidades onde agora diferentes velocidades o impedem. No local e contexto do projecto desta ponte, azinhagas e alamedas das quintas de Benfica, da Luz e de Telheiras, são uma oportunidade para construir este novo mapa, literalmente descolando do solo uma nova rede de caminhos, em parte memória de anteriores azinhagas, passando sobre a grande artéria rodoviária, que é a 2ª Circular." "A solução é dificilmente repetível, o processo de investigação é cada vez mais necessário e oportuno." MXT No fundo, o projecto aponta para uma recuperação de continuidade urbana que se perdeu ao longo de décadas e, consequentemente, para a intensidade de relações dos que utilizam as vias de comunicação. Uma estrutura percorrível entre duas margens de uma grande via de circulação automóvel composta pela conexão de vários tramos metálicos com o objectivo de manter um seguimento, um símbolo para uma vontade de um fluxo contínuo urbano, proporcionando uma descoberta paisagística completamente nova e reservada aos que se movem a pé ou de bicicleta. “Torna-se um referencial à mobilidade, simultaneamente vinculado e vinculante de cenários futuros", como referem os autores. Os parques para a bicicleta, como tipologia, são matéria em desenvolvimento. Surgem da necessidade extrema de arrumar grandes quantidades de bicicletas e é notável em países “super-cicláveis” como é o caso da Holanda. A situação holandesa ofereceu condições políticas e sociais que permitiu à implantação de um sistema eficaz de circulação em bicicleta ao longo de anos, tratando-se de uma prática a aumentar, dando azo a autênticos aglomerados de bicicletas arrumadas junto a estações de caminhos de ferro ou outros locais públicos. Nesse sentido, têm sido desenvolvidas iniciativas que elevam a arrumação de rua a edifício como solução do problema.

"Uma ponte cicl ável , antes de tudo é o desenho de um bocado d e cidad e ." MXT

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"Entretanto, acabámos por fazer um miradouro para os ciclistas e utilizadores observarem o centro histórico de Amesterdão." VMX JORNAL P E DAL

Em 2001, o VMX (vmxarchitects.nl), atelier holandês orientado para a arquitectura internacional, desenvolveu, a convite directo do município, uma solução temporária para arrumar 2.500 bicicletas junto da estação central de Amesterdão. Leon Teunissen diz-nos que a intenção era "construir uma arrumação o mais atractiva possível como estímulo à sua utilização. Entretanto, acabámos por fazer um miradouro para os ciclistas e os utilizadores observarem o centro histórico de Amesterdão." O facto de se tratar de uma presença temporária, acrescenta, “ajudou a lidar com a relação com o centro histórico. Começamos por resolver uma forma, seguimos para uma maneira de produzir e montar tendo em conta a sua função. Desde a sua implementação é um dos edifícios mais fotografados em Amesterdão e está a funcionar há mais de dez anos." A solução temporária é uma estrutura flutuante que se eleva na paisagem por cima de água, consistindo num sistema de rampas que combina a circulação e o arrumo. Trata-se de uma presença contemporânea que contrasta com a massa urbana secular que a envolve. No interior, existe uma estrutura metálica aberta fazendo-se sentir o ambiente de uma rua que percorremos num pavimento inclinado em busca do lugar para estacionar a bicicleta. Nesse pedalar, avistam-se momentos urbanos de Amesterdão por entre as bicicletas já arrumadas que servem de "parede" modeladora do espaço. Para Leon, a sua utilização acaba por ocasionar uma "construção do entusiasmo. A estrutura é agora utilizada por patinadores e skaters e até uma ópera foi escrita para o edifício". A necessidade presente em 2001 foi crescendo, tendo em conta a situação, sobretudo, das estações ferroviárias holandesas, montando o cenário para novos pedidos de uma arquitectura ciclável. Em 2010, a Câmara Municipal de Zaandam lança o concurso para a elaboração de um parque para bicicletas permanente, um edifício, um conceito solidificado e dedicado apenas ao parqueamento das bicicletas. A resposta premiada foi dada pelos Nunc Architecten (nunc.nl), atelier holandês interessado especialmente em desafios actuais, composto por Johan Krol e Steven Brunsmann e, ainda, completado por colaborações a nível nacional e internacional, incluindo Portugal. Como projecto de competição, o objectivo era "criar uma sensação espacial de um armazém típico do rio Zaan, através de uma abordagem simples e directa, utilizando materiais locais e a luz como ferramenta espacial modeladora do percurso. A relação com a rua principal também era importante, queríamos que fosse um edifício aberto no qual se pode facilmente parquear a bicicleta experimentando um edifício arquitectonicamente dedicado a esse acto". Como estratégia de elaboração, uma vez que é uma tipologia no início do seu desenvolvimento, basearam-se em alguns dos exemplos de parqueamento existentes procurando a base do propósito espacial de ênfase na bicicleta como prática diária, como objecto de uma cultura, pretendendo tocar o conceito de “catedral para a bicicleta”.

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Temporary Bicycle Shed. Amesterdão

"Criámos uma clara celebração da utilização d a b i c i c l e ta ." VMX

V MX © V MX

Por um lado, é equacionada a qualidade do percurso no interior do edifício e, por outro, a forma como se parqueia (estacionamento elevado, simples, duplo, mecanismos semi-automáticos e outros). Durante o processo foi também importante elaborar uma estrutura espacial que poderá ser experienciada por qualquer pessoa, ciclista ou não. Trata-se de um edifício público, o que fez com que se introduzissem serviços públicos como balneários e uma oficina para bicicletas como complemento programático. "Nós pedalamos todos os dias." NUNC Architects

O resultado é um edifício armazém com uma fachada luminosa, no qual se entra para um vazio que distribui o estacionamento em dois pisos, cada um com um sistema mecânico simples de dois níveis de parqueamento. A forma como é aqui encarada a arquitectura utilizando a repetição da bicicleta estacionada como composição espacial mutante permite o usufruto da acção de parquear pelo percurso que se faz no interior do espaço e pelo facto de ser o utilizador a parquear a própria bicicleta.A vontade de encontrar estratégias para promover a melhor utilização de bicicletas em cidades manifestase também no desenho do Bike Hanger, projecto desenvolvido pelo atelier Manifesto Architecture (mfarch.com). Este é o atelier fundado por Jeeyoung An e Sang Hwa Lee, sediado em Nova Iorque e em Seul, que procura constantemente dar respostas inovadoras e provocatórias envolvendo a maneira como se encara o dia-a-dia e o que nos rodeia. O projecto para o "penduradouro de bicicletas" é uma resposta para melhorar a cidade. Conta-nos Sang Lee: "depois de reparar no aumento explosivo da utilização de bicicletas nas ruas de Nova Iorque e Seul, reparamos que cada vez mais pessoas utilizam a bicicleta como o seu principal meio de transporte. Os municípios F i e t s e n pa k h u i s . Z aa n d a m nunc architecten estavam a criar mais infra-estruturas architecten / PurePictures cicláveis. No entanto, sentimos que havia um assunto por resolver, não havia uma forma eficiente para acomodar mais arrumo para bicicletas. Como pessoas que pensam em formas de melhorar as condições urbanas, o Bike Hanger foi a nossa solução para implantar um sistema de arrumação vertical que se aproveita dos espaços urbanos mal aproveitados ao invés de roubar espaço público de circulação pedonal".

"Existe u m va zi o luminoso no centro que indica o percurso onde poderemos deixar a nossa b i c i c l e ta a s a lv o ." NUNC


"A bicicleta é um objecto com mais de duzentos anos de existência e não está obsoleto." MANIFESTO

"Os pavilhões para bicicletas são actualmente um tema popular na China, quase como os salões de massagens em Amesterdão." NL ARCH

de bicicletas ocasionará a formulação de novas soluções tipológicas, menos ou mais informais, de partilha do espaço urbano que habitamos com a bicicleta.

O Bike Hanger, podendo ser considerado como uma peça de equipamento urbano com tendência arquitectónica, é um modelo desenhado para ser facilmente instalado em qualquer situação urbana com necessidade de uma solução para zonas densas e congestionadas. O conceito é simples e provém da base conceptual do composto ciclável. Como refere Sang Lee, "a bicicleta é um exemplo de engenharia pura e funcional desenhada para o simples propósito de transportar uma pessoa de forma eficiente o mais longe possível com o mínimo esforço. Pareceu-nos natural que o Bike Hanger se parecesse com uma bicicleta já que o nosso objectivo era mover uma grande quantidade de bicicletas na vertical com o mínimo de esforço humano". O resultado é um sistema mecânico rotativo que actua em cadeia e que é activado com o auxílio de uma bicicleta estática. São autênticas torres de exposição de bicicletas que oferecem uma arrumação que garante a sua segurança e que sugere uma paisagem ciclável. Estas torres podem ser facilmente multiplicadas em vários pontos de um conjunto urbano e em vários cenários urbanos. Foi apresentado como protótipo na Bienal de Design da Coreia e são, actualmente, disponibilizados dois modelos base, o primeiro munido de um sistema de roda simples e um outro de roda dupla como resposta a escalas diferentes. Como desenho que eleva a bicicleta a um patamar importante na vida urbana, Sang Lee acrescenta que "ao contrário de inúmeras outras invenções, a bicicleta tem mais de duzentos anos e não está obsoleta. De facto, tornou-se ainda mais relevante. Esta é uma afirmação forte que resulta do sucesso do seu desenho e importância. Não obstante o avanço tecnológico nos próximos anos, a bicicleta continuará a ser uma ferramenta essencial à vida urbana moderna". A cultura da bicicleta em si é visível e está a aumentar, dando azo ao desenvolvimento de novos desafios urbanos e arquitectónicos com o objectivo de abrigar os que cultivam activamente esta cultura. Na China, é proposto o Bike Club pelos NL Architects (nlarchitects.nl), atelier holandês que se dedica à busca de alternativas para a forma como vivemos e que envolve pessoas de várias nacionalidades, do Japão a Portugal. Um projecto para um clube de bicicletas em que os frequentadores poderão usufruir de um espaço de convívio ciclável. Indicanos Kamiel Klaasse, um dos principais elementos dos NL: "a VANKE, uma corporação para a habitação, pediu-nos para apresentar uma proposta para um clube de bicicleta como parte de um centro hoteleiro em Sanya. Nesse contexto, tivemos a oportunidade de pensar no papel das bicicletas na arquitectura." A ideia é simples, trata-se de um pavilhão de vidro com uma grande cobertura para sombreamento com a possibilidade de usar-se como mini velódromo. "O edifício é mais pequeno do que as pistas oficiais olímpicas, por isso no início não sabíamos se iria resultar."

Como abordagem conceptual para o clube de bicicletas, Kamiel fala de influências arquitectónicas dos anos 30, indica a fábrica da FIAT, em Turim, como uma das referências inconscientes para este projecto. "O entusiasmo do projecto é que este funciona em níveis diferentes. A grande cobertura é funcional num clima tropical e a sua função adicional activa o edifício e a zona como um todo, especialmente porque este estará rodeado por cerca de 20 blocos de apartamentos que olham directamente para a mini pista. Para além disso, a sua geometria faz lembrar o Pagode Asiático: contém pontas curvadas similares." Neste momento, o atelier encontra-se a desenvolver o modelo de projecto para a implantação de um protótipo, estudando e aperfeiçoando os ângulos e as curvas do desenho ciclável, esperando desenvolver a tipologia noutras localizações chinesas. Depois de percorridos alguns exemplos de dedicação do desenho à bicicleta, questionamos o futuro de uma arquitectura especializada na relação com o assunto ciclável.

"Na Holanda, a arquitectura de relação com a bicicleta é incontornável." NUNC

"Todos teremos que concordar que o mito do carro morreu, a liberdade que permitia tornou-se num constrangimento e em stresse." DPA Dominique aponta a bicicleta e o peão como elementos que se referem a uma nova escala urbana e que promovem meios de transporte alternativos, factor que torna a bicicleta importante. No entanto, “não suficientemente”, refere. A bicicleta, a seu ver, permanece como um objecto mecânico que requer manutenção e infra-estrutura fazendo com que seja utilizável apenas em algumas urbes. "O crescente uso das bicicletas vai seguramente encontrar soluções mais planeadas." MXT
 Maximina Almeida e Telmo Cruz, arquitectos do MXT Studio afirmam, partindo do que se passa com a reconversão arquitectónica, "que a arquitectura de qualidade é sempre generosa e que se presta às mais inesperadas utilizações" Nesse sentido, defendem que o aumento da utilização

B i k e C l u b . Sa n y a NL a r c h i t e c t s © NL a r c h i t e c t s

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pá g i n a 1 1 B i k e Ha n g e r . S e o u l + L o n d r e s Ma n i f e s t o A r c h i t e c t u r e © Ma n i f e s t o A r c h i t e c t u r e

Para os arquitectos Nunc, nos Países Baixos, é uma tipologia arquitectónica a ser desenvolvida num futuro próximo. Referem que, no futuro, os parques improvisados junto às estações e a outros locais públicos deverão passar a integrar o próprio edifício, objecto que têm também desenvolvido em concursos de ideias. Nesse prisma, será uma oportunidade para desenvolver novas abordagens à temática do parque de bicicletas e, de uma forma geral, à arquitectura de relação com a bicicleta. Os holandeses VMX, embora nunca se tenham especializado, têm vindo a receber pedidos para desenhar arrumos para bicicletas e, actualmente, estão envolvidos num desenho para uma estação ciclável em Oldenzaal e uma outra em Alkmaar, ambas nos Países Baixos. Afirmam e contribuem para um futuro de uma arquitectura de relação com o objecto ciclável. "As cidades deviam levar as bicicletas mais a sério." NL ARCH Também os NL Architects esperam que o planeamento ciclo-urbano tenha um papel mais importante no futuro, defendendo que as bicicletas são cruciais para a vida urbana, são rápidas, eficientes, saudáveis e divertidas e que, nesse sentido, teremos de organizar melhor as proximidades, garantir que trabalhamos o suficientemente perto de casa para conseguir uma deslocação facilmente ciclável. "Os pedidos para uma arquitectura de relação com a bicicleta tenderão a aumentar nos próximos anos." MANIFESTO Para os Manifesto Architecture, faz sentido que pelo aumento da utilização das bicicletas em cidades, os pedidos para uma arquitectura de resposta a esse acontecimento tendam a aumentar. No entanto, acreditam que apenas uma arquitectura que dê prioridade à função e à engenharia antes da estética terá sucesso.

"A i d e i a e r a b a s ta n t e simples: um pav i l h ã o d e vidro com uma grande cobertura de sombre amento e a sua utiliz ação como mini v e l ó d r o m o ." NL ARCH


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YEHUDA MOON

CONTO

Duarte Nuno etraud_@hotmail.com

A lei que proíbe a caça a cavalo foi aprovada quase por maioria. Para muitos fazia sentido, para outros nem tanto, mas para o Rafael di Barros... nem sabia que isso existia em Portugal. E quem é Rafael di Barros? Rafael di Barros é um senhor de olho azul que parece que tem sempre algo para dizer, mas prefere guardar ou não tem mesmo nada para dizer, é engenhoso na arte da serralharia, mas é burro que nem um tamanco. Quando, por exemplo, ouviu falar da não promulgação da caça a cavalo, teve o seguinte comentário: “Mas... caçar cavalos? Isso é parvo porque eles estão nos estábulos.” — ri-se e continua o disparate — “O meu vizinho Peres, lá em Rogil, tem para aí um bando de sete cavalos e três éguas.” — e fica a rir sozinho enquanto dá toques nos braços das outras pessoas do café à espera de reacção. Um idiota autêntico e não no bom sentido da palavra. “É caça a cavalo, não ao cavalo.” - diz uma voz rouca e gasta pelo tempo e mais pelo fumo — “Burro.” — diz em surdina. di Barros faz o ar de aluado que já percebeu. Depois de meia hora calado, que foi um sossego

a beber e a depenicar uma travessa de pipis, veio com uma ideia, que ainda estou para perceber se é parva ou eu não percebi. “Se não dá para caçar com cavalo, caça-se com bicicleta” — a cadeira cai da excitação — “daquelas todo-o-terreno com rodas largas.” Toda a gente fica de boca aberta a olhar para ele a tentar perceber se é a sério ou não. Até o Tiago da Ti’ana sai da casa-de-banho com as calças na mão e pergunta: “O que é que se passa?” “Uma ideia parva!” — diz a voz rouca e gasta pelo tempo e mais pelo fumo. “Mete na conta que eu amanhã pago. Tenho que fazer uma coisa.” — sai pela porta e nem apanha a cadeira. À saída quase que bate na mesa de matraquilhos, entorna uma mesa cheia de cervejas e três dos bêbedos vêm a correr atrás dele. Mas estão tão bêbedos que o da frente tropeça e os outros dois seguem-lhe o caminho. Um porque tropeçou mesmo no que caiu e o outro porque se desequilibrou ao tentar desviar-se e ficou agarrado ao sinal de trânsito. Rafael chega afogueado à sua oficina e tranca-se a sete chaves. Nem eu, como narrador omnipresente,

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consigo ver o que ele está a fazer. Dois dias dentro da oficina e não consigo mesmo saber o que ele está a preparar. Só consigo ouvir a máquina de soldar acompanhada com uma luz azul intensa e martelos. Bato à porta para fazer o meu papel mas ele nem ouve. Finalmente, sai e eu estava no café do senhor da voz rouca e gasta pelo tempo e mais pelo fumo quando Rafael di Barros entra de peito feito. “Venham ver a minha última criação!” No meio da estrada onde raramente passava um carro que seja, estava uma bicicleta com um suporte no guiador para a caçadeira. “Uma bicicleta pensada para a caça, não grossa.” — e faz questão de referir — “Não grossa. Quem quer experimentar?” As bocas de quem está a ver não fecham. Mas um carro todo artilhado faz a curva e crava-se directamente no protótipo. Nada se aproveita, nadinha mesmo. Nada de nada. O senhor da voz rouca e gasta pelo tempo e mais pelo fumo diz para terminar: ”Ideias idiotas acabam assim.”



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