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LiTeraTura iNDÍGeNa e a iDeNTiDaDe braSiLeira

Estou começando este pequeno artigo para dar o ponto inicial de uma coluna onde pretendo trazer a produção literária indígena para os leitores do Vale Vivo. Serão pequenas dicas de leitura onde apresentarei a obra e o autor em questão.

No entanto, para abrir nossa roda de conversa gostaria de refletir com vocês sobre o que é esta tal literatura indígena que vem surgindo com muita força nos últimos anos. Creio que assim ficará bem mais claro para o seu entendimento.

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LITERATURA OU ORALIDADE?

Quase sempre, quando se fala de povos indígenas, se diz que eles não são ágrafos, ou seja, não possuem escrita própria. Isso é verdade se pensarmos na escrita alfabética como aprendemos na escola. Se por outro lado, pensarmos em formas de comunicação e de transmissão de saberes, a oralidade é também um importante instrumento na formação da identidade das pessoas. Os indígenas escolheram a oralidade e com ela desenvolveram toda uma pedagogia que perdura por centenas de anos. No entanto, por força da chegada dos invasores no território

*Daniel Munduruku nacional, esses povos foram forçados a aprender a lógica do ocidente. Tiveram que conviver com a cultura hegemônica e obrigados a aprender a língua e os costumes nacionais. Por questões de sobrevivência foram para a escola e aprenderam a manipular a palavra escrita e a leitura de livros. Ainda assim, essa população não perdeu suas características de ancestralidade e ainda que vivam em contexto urbano, usem roupas ou tenham acesso à tecnologia, não deixaram de reafirmar seu pertencimento às suas culturas e aos seus modos de vida.

POSSO SER QUEM

VOCÊ

Sem Deixar De Ser Quem Sou

Foi por conta do entendimento de que é preciso dominar as ferramentas da contemporaneidade que hoje os indígenas estão tendo muita visibilidade no mundo das artes e das redes sociais. Já são diretores de cinema, atores, videomakers, cantores, cantoras, modelos, professores universitários, empresários, influenciadores e escritores. Ou seja, são pessoas que estão utilizando esses instrumentos para reafirmarem ainda mais seu pertencimento a um povo ancestral. Podem ser o que quiserem ser sem precisarem abrir mão de sua identidade étnica. Entender isso é crucial para sairmos da armadilha montada ao longo da história brasileira de que os indígenas são atrasados ou selvagens. Percebê-los como nossos contemporâneos é também nos humanizar e compreender a dinâmica da cultura humana.

Literatura Como Resist Ncia

Finalizo dizendo que há uma produção literária indígena bastante consistente e inovadora tomando corpo no nosso país. São mais de 120 autores e autoras com cerca de 400 títulos já circulando pelo Brasil. São livros para crianças, jovens, adultos, acadêmicos, poesia, romance, crônicas, contos, entre outros. São desses autores e sua produção que iremos falar nas próximas semanas aqui nas páginas de nosso Vale Vivo. Nosso objetivo é dar maior publicidade a essa produção mostrando que o domínio da escrita literária é algo recente para nós indígenas, mas que é a nossa forma de criar uma

*Professor, escritor. Autor de 60 livros para crianças e jovens. Recebeu por duas vezes o Prêmio Jabuti e boa parte de seus livros receberam o selo de altamente recomendável pela FNLIJ ponte entre nossos diferentes saberes. Ponte essa que nunca foi construída criando uma fissura na construção da identidade brasileira. Ela é, também, nossa forma de resistir.

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