Soneto

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Sonetos… Sonetos… Sonetos

José Neres


© by José Neres Este trabalho não tem fins comerciais, podendo ser reproduzido e distribuído gratuitamente, desde que sejam respeitados os direitos do autor.

Título Sonetos Autor José Neres Digitação, revisão, diagramação e capa José Neres Cidade de publicação São Luís –MA Contatos com o autor www.joseneres.blogspot.com joseneres@globo.com

É obrigação da sociedade e de todos os envolvidos no processo educacional oferecer condições de leitura e de desenvolvimento cultural a quem se interesse pelas artes em geral. Com a divulgação de nossas obras no mundo virtual, acreditamos estar fazendo nossa parte

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PALAVRAS DE APRESENTAÇÃO

Gosto muito de ler. Fui educado com a leitura de grandes escritores como Vinícius de Moraes, Gregório de Matos, Carlos Drummond de Andrade, Mario Quintana e tantos outros gênios de nossas letras. Por gostar de ler, desenvolvi também o hábito de escrever. Escrevo por qualquer motivo. Não importa se estou triste ou alegre, com ou sem dinheiro, sempre escrevo. Para mim, produzir uma linha de texto significa um ato de vitória extrema. Quando sai um soneto então, embora imperfeito como os que estão nas páginas seguintes, é motivo de júbilo, de glória. E as glorias devem ser divididas com os amigos... Por isso coloco mais esse pequeno trabalho no mundo virtual. Ele também não sairá em forma de livro tradicional. Ficará apenas na internet para quem quiser lê-lo. Vários dos poemas já foram publicados em meus outros livros, mas alguns são inéditos. Ou estavam guardados em uma gaveta ou na memória do computador. Há outros que não consegui localizar. Mas eles não fazem falta. Outro dia aparecerão... Boa Leitura. 01.01.2011 Sonetos… Sonetos… Sonetos

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PAI

Eu queria ter um pai de verdade Que me levasse para minha escola E não para com ele tirar esmola Pelas ruas sujas desta cidade. Eu queria um pai cheio de pureza Que cantasse canções de ninar À noite para embalar meu sonhar, Que me mostrasse da vida a beleza, Que um dia me trouxesse brinquedo, Que dividisse comigo um segredo, Mas não este segredo desgraçado De ter perdido infância, adolescência De ser uma mocinha na indigência... De ter filho por ele gerado.

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NATAL

Sozinho, no meio da multidão Atônita co’as compras do Natal, Fere o pobre homem uma dor letal Causada pela ausência de pão. Encostado na parede do bar Onde muitos pedem doses de whisky O pobre homem talvez ainda arrisque Breve grito de socorro soltar. Mas seus olhos paralisados ao vento Sabe: ninguém ouvirá seu lamento. Um triste frio em sua espinha corre... Último grito no silêncio some Sufocado na bandeira da fome, Em pleno Natal outro velho morre.

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BAGAGEM

Neste território, império da dor, De uma dor disfarçada e sem nome. Prima da Morte, Miséria e da Fome, Poucos, bem pouco, sabem que é Amor E disso nem é bom mesmo falar Pois num mundo onde gente come gente Saciar a fome é bem mais urgente Que levantar os olhos para o luar Com os olhos lacrimejantes de tédio Tendo o esperar como único remédio, Atravessa o homem seu próprio deserto. Ao conferir a bagagem da Vida, Vê que do deserto não há saída, Lágrimas banham seu olhar incerto.

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SONETO DO SUICIDA

De minha trêmula mão sai o fogo Que ilumina tão triste escuridão Outrora chamada Vida, hoje jogo De Vida sem vida contra a traição. No explosivo encontro de Morte e Vida Todo Sim se transformará num Não Visível em grandiosa ferida No crânio, na boca ou no coração. Depois de uma vida só de lamento Na qual prazer foi só breve momento No império da Dor e da Aflição, E agora que esperanças já não vejo, Guardo apenas em mim um vil desejo: No inferno encontrar minha Salvação!

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SONETO DAS APARÊNCIAS

Por fora quase não demonstro amar! Olhar sisudo, sorriso bem raro, Gestos comedidos num falar claro Que frases belas não sabe soltar. Por fora quase não demonstro amar! Às vezes até expressar-me tento, Mas o riso que me vem é tão lento, Que de fora ninguém pode notar. Por fora quase não demonstro amar! Por isso os outros dizem que vou sofrer Se meu par perfeito não encontrar! Por fora quase não demonstro amar! Mas, por dentro, bem dentro de meu ser, Há um mar de amor prestes a estourar.

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SONETO SEM NOME Numa praça de esperança deserta, Com vento frio a eriçar o cabelo, Silencioso soluçar de apelo Escapa de uma boca sempre aberta. Ruído bem próximo é um alerta Sobre mal próximo a envolvê-lo E em seu peito imprimir do crime o selo, Até levá-lo à triste morte certa. A fome revolve o oco da memória E ali, qual filme, passa sua história: Abandono, crime, vícios e fome. Busca em seu peito um dia de glória... Não há! Ao viver a dor que o consome, O menino esqueceu seu próprio nome!

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A MENTIRA Ela saiu da boca bem aberta, Entrou em tantos ouvidos alheios Como se fossem verdades certas Cultuadas nos jardins de teus seios. Penetrou todos os poros do corpo: Narinas e boca, ânus e vagina, Fazendo crer que era direito o torto E que treva a toda vida ilumina. Sem pensar, brincando com própria sorte Espalhou que faca não leva à morte E que do coração ninguém a tira Ela se espalhou por toda a cidade, Tentou vestir a capa da verdade... Foi sufocada por outra mentira

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A MENTIRA II Assim como em esgoto ou lixo imundo Nunca se deve tocar, o passado Também deve ficar preso no fundo Da memória sem nunca ser tocado. Ao tocar-se nele sobe um vapor De podridão que pode sufocar Até mesmo o mais puro e nobre amor E fazê-lo deixar de respirar. Quem se constrói sobre mentira tanta E que faz da mentira sua santa Não diz verdade nem quando o amor pede. Há quem viva o tempo todo em um nicho De mentiras. Tal passado é como lixo. Quanto mais se mexe mais ele fede.

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UM Mais de mil sonetos falam de amor, Dez mil idolatram a solidão, Mas estes meus têm outro sabor, Sabor de fome medo e podridão. Os meus versos dão muito mais valor Às lágrimas suadas pela mão De um pobre e sofrido trabalhador Que às gotas perfumadas da paixão Eu não posso cantar sobre uma flor Se, no mesmo jardim, no mesmo chão, O que mais brota é dor e aflição Eu, como posso escrever sobre amor Se neste momento co’exatidão Um irmão, sem pena, mata a outro irmão.

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DOIS

Ele, filho da estúpida Inflação, Vaga, triste e roto, pelo caminho Seco, agreste de amor e carinho, Onde só brota fome e decepção Mas no seu penar nunca está sozinho. Será que segue com ele um irmão? Não! Não! Muito mais... perto de bilhão De pobres seguem bem devagarinho Em busca d’água e pedaço de pão, Pra enganar fome do magro filhinho Que soluça chora e geme baixinho. Já tem no cerne a dor da inanição, Gordo presente da vó Inflação Que nina o neto já tão friozinho.

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TRÊS No meio da rua um trapo imundo, Pedaço de pano jogado ao léu, Monte de lixo debaixo do céu, Restos humanos, pedaço do mundo E pela rua passa muita gente Apressada, sem tempo para nada. Cada qual vai para sua morada, Ninguém vê o lado, segue sempre em frente. Aos poucos, vai o sol, vem o luar Chorando sobre duas pedras frias E muito pouco, muito pouco resta lá. E, sobre pedras, velas se consomem Queimando restos de dores sombrias. Dentro dos trapos jaz um corpo de homem.

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QUATRO As esperanceiras estão murchas; A última rosa já morreu Já não existe mais alegria. Não mais me pertence o que era meu Até a terra em que eu vivia, O casebre onde meu pai nasceu Desde agora já não mais são Não mais me pertence o que era meu. Casas carros mulheres dinheiro ... Tudo já tive, hoje nada é meu, Pois tudo o meu ser hoje perdeu. Só minha dor restou, nada mais; Porém a dor que mais me doeu Foi saber de que eu não sou mais meu.

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CINCO A tristeza de pobre não tem rosto De artista de cinema ou de postal De pontos turísticos. Tem , sim, gosto De esperança cortada com punhal, De feriado em dia de Domingo, De dor de dente, comida sem sal. Sofrimento de pobre bate em bingo, É certo, cruel, dolorido e real. Pobre sofre, sofre e nunca tem nome É sempre um zé ou fulando de tal. É um guerreiro, luta contra a fome. Fome: inimiga feroz e mortal, Mercadoria que não se consome, Que não sai em coluna social.

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SEIS Uma dor preenche todo o meu ser Quando passeio por minha cidade E vejo uma podre realidade Desde Pantheon até Reviver: Famélicas crianças na orfandade Social lutam pelo sub-viver, Mãos que pedem, roubam para comer Restos de fétida sociedade, Grande fábrica das humanas dores Que vem mascarada por tanto nome E muitas tintas de todas as cores E, mesmo num largo chamado Amores Choro, vendo nossos futuros homens Cheirando cola pra sufocar dores.

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SETE A solidão é a única irmã Daquele velho que vivo apodrece Nos guetos do mundo, mas não esquece O doce ácido da velha maçã, Nem todos os dias fazer sua prece Plena de dor e de esperança vã, Pedindo aos céus um novo triste amanhã Livre das dores que o corpo esmorece. Mas tem a certeza de que o espera É uma fila – insuportável fera Que cresce, cresce e que sempre tem fome. Fila – a fera que o milagre opera De do velho transformar a quimera Em grande monte de dores sem nome.

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OITO Vêem alguns do poeta-cantor A estátua entre belas palmeiras; Outros, aquela flama derradeira Do sol do mar em pesado torpor Tão cheio de poesia e de amor Oculta a Ilha as visões verdadeiras De coisas tão torpes, vis rasteiras Que, à tona, causariam terror. Olhos cegos, em miradas primeiras Vêem rapaz rico, moças solteiras; Palmeiras, flores, sabiás, amor... E os meus, que tão míopes sei que são, Só vêem drogas, fome, solidão, E gente chorando um pranto de dor.

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NOVE Na rua do Sol um menino há Cuja pele de tanto frio treme, Lá na rua dos Prazeres está Uma velha que de tanta dor geme. A rua do Egito leva ao mar, Que lava o sangue que sai da Alegria Depois d’Alecrim e Horta irrigar E no Ribeirão lavar novo dia Cujos dejetos no mar vão parar. Mas isso bem pouco te diz. Que te importa todo o povo a chorar, Se tu, em nossa bela São Luís, Depois de teu suculento jantar, Fechas os olhos... dormes... és feliz?

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DEZ De dores, fomes e angústias falei, Arrancando tudo do coração, Muito males ainda deixei Perdidos no limbo da escuridão, Onde não reina alegria nem lei Mas somente tristeza e podridão. E nesse lugar não mais mexerei Com medo de nova desilusão. A dúvida fica se algo acertei Ao longo desta breve exposição, Mas, como diria lendário rei: - Nem tudo está errado não, Já que mesmo o relógio que quebrei Duas horas marca co’exatidão.

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PARA O DIA DOS NAMORADOS

Dizem que o amor fora de moda está. Será brega suspirar pelos cantos? Ou, de feliz, derramar doces prantos Ao beijar a namorada ao som do luar? E será vergonha de amor falar? E tremer e gaguejar só de espanto Quando ela surge como por encanto Pra dizer que te viu no seu sonhar? Não! Não façamos do amor mil tormentos Cada gota de amor são sentimentos, São beijos que respiram emoções. Se beijar é só os lábios encostar. O amor é muito mais que um beijar. Amar é o cruzar de dois corações.

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SONETO DE LA DESILUSIÓN

Todo lo que sufrí hasta hoy fue por ti, Cada lágrima minha foi para te servir. Fue por ti que mi sangre salió de mi vena E, sorrindo, disse que tudo valia pena Pues lo más importante era estar a tu lado E viver como seu eterno apaixonado. Mismo sufriendo los dolores del alma Esperava teu amor com toda a calma Pero llegó el dia de mi triste sorpresa Tu estavas linda, rainha da beleza, Llena de alegrías tú estabas toda. Fiquei triste e quieto com minha dor Porque aquel era el día de las bodas E o momento da norte de meu amor.

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SONETO DO AMOR EGOÍSTA

Não. Eu não divido o amor que sinto. Ele sai de mim e para mim volta, Num sansara que não prende nem solta As amarras do meu viver absinto. Errante, nunca precisei de escolta, Nem de quem enxugasse meus lamentos Nem de quem pensasse meus ferimentos, Filhos de doce e secreta revolta. Bebi todo o meu amor até o fim Não vendo gota qualquer derramar Entre os breves limites do meu sim. No final, quando nada mais restar, Buscarei uns restos de amor por mim Onde nunca saberei encontrar.

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SONETO VAZIO

Na dura angústia em que me encontro Todo cheio de um vazio imenso Luto só por um pouco do nada Para tentar continuar vivendo. Minha mão procura um toque amigo Só espinhos no caminho encontra A língua pelo doce mel chora E o que tem? Nada. Nem mesmo fel Ainda bem longe do fim do meu Triste e seco caminho terreno À eterna inanição vivo atado Já estou a devorar migalhas Atiradas ao limo e à lama Desde meu próprio ínfimo ser.

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26 SONETO-CRIANÇA Este é apenas um soneto criança. Um soneto. Nenhuma pretensão De colocar a menor esperança No teu já tão sofrido coração. Um poemeto feito às pressas Sem se preocupar com figuras Ou pagamento d’alguma promessa Ou lembrança das muitas amarguras. E, lendo este soneto-criança, Não procures nem sinal de lembrança. Dor, tu também não a encontrarás, Porque são apenas catorze linhas, Paralelas e bem arrumadinhas, Procurando um pouco de paz.

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OUTRAS OBRAS DO AUTOR Disponíveis na Intenet • • • • •

Negra Rosa & Outros Poemas Poemas de Desamor O Último Desejo de Catirina Sombras na Escuridão 50 Pequenas Traições

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Disponíveis em Livro • O Discurso e as Ideias (esgotado) (com Dino Cavalcante) • Os Epigramas de Artur (esgotado) (com Dino Cavalcante) • Restos de Vidas Perdidas (Prêmio Odylo Costa, Filho) • A Mulher de Potifar (esgotado) • Estratégias para Matar um Leitor Formação (segunda edição em breve) • Montello: o Benjamim da Academia (disponível em algumas livrarias) • Tábua de Papel (organizador) (disponível nas livrarias)

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