Inquilino
JĂşlio Tigre
Inquilino
JĂşlio Tigre
7 A experiência privada com a arte publica no Projeto Inquilino
25 Inquilino I Maruípe 538
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Inquilino I I Fátuo
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Inquilino I Presença
A experiência privada com a arte publica no Projeto Inquilino
Este estudo propõe uma reflexão sobre o Projeto Inquilino, em suas três edições destacando-se a experiência com espaços não convencionais de arte na cidade, a partir de relações com a experiência privada sensível, focando-se na experiência sinestésica de cada observador/partícipe, no factual do evento produzido e produzindo pela e na memória pessoal e coletiva. Os conceitos de publico e privado na relação com o espaço da residência (casa) catalisam o conceito de habitar como o elemento potencializador do privado na intercessão entre observador, cidade e obra. O Projeto Inquilino na sua terceria edição intitulado Presença remete a experiências atávicas com a residência, a casa. Um ninho bachelariano, núcleo de intimidades produzido pelo habitar, pelo abrigar-se na cidade. A casa, contaminada pela intervenção que a anima, entrega seu corpo com iluminação cinética e sons gerados na estrutura do imóvel, redimensiona seu novo estado, do inanimado ao animado. Cinema, palavra-chave, extrato de luz que virtualiza o real antes mesmo deste adensar-se em imagens luminosas no cérebro do observador. A realidade constatada pelo tátil, confundindo o olho. Presença como o dasein Heidegeriano. Presença se dá na ausência dando espaço ao presente do sentir, no evento do eu que se abre para o mundo e reciprocamente, como quer Henri Maldiney, na verdade do sentir, do já vivido que está no agora, no presente. Uma presença a fundar o originário. Enfim, o Projeto Inquilino, como obra pública, reorganiza a lógica pontual de espaços de habitação, transporta a cidade arquitetônica, a redimensiona como cidade documento e como cidade arte. Palavra chave: Artes Contemporânea. Arte pública. Habitar. Julio Cesar da Silva Doutorando no programa Lenguages y Poéticas en el Arte Contemporaneo na Universidad de Granada, Espanha.
Ventre Em 2005 numa terça feira um grupo 15 de pessoas entravam pela primeira vez na residência da rua Maruipe do bairro de Vitoria, sem saber ao certo o que encontrariam lno seu interior. Na varanda, cada participante recebeu duas varetas de bambu, com as quais deveriam interagir com um novo instrumento. Dentro da casa, havia 40 fios de aço tencionados por pedras de todos os tamanhos, presos ao forro de madeira que cobria todos os ambientes do imóvel. Durante quase duas horas, os visitantes interagiram com o lugar buscando um diálogo sonoro percurssivo entre si e os outros. Esta experiência foi gravada e depois remasterizada em um cd com o seguinte titulo: “Memória acústica da residência 538 da Avenida Maruipe”. Assim, nascia o projeto Inquilino que, nesta primeira edição chamou-se atividade autónoma de intervenção pública “Ventre acústico”. A iniciativa nesse momento se voltava para uma atitude politizada frente as instituições de arte num posicionamento critico, não esquecendo a situação local que favoreciam na ocasião esta reflexão: um espaço expositivo sendo fechado com pouco apoio a iniciativas criativas. É importante lembrar que Vitória passava por uma situação em que praticamente não havia a presença do institucional. Ao optar por propriedades privadas já de imediato evitaríamos lidar com espaços públicos que de alguma forma envolveriam poderes públicos e institucionais, pois acreditávamos que, ao buscar o privado empreenderíamos o dialogo com um proprietário particular que seria introduzido no projeto como agente também da proposta ao ceder ou alugar de forma simbólica o espaço, para tanto, ele deveria ser convencido da proposta que o agregaria como participe direto, relação geralmente impossível de ser estabelecida com pessoas jurídicas. Outra característica importante, e esta já se deslumbravam em intervenções anteriores é a situação do imóvel, este deveria estar abandonado, isto é, sem uso na sua finalidade, a residência. Posto assim não descartaria imóveis que de alguma forma foram deslocados desta função, ampliando nossa opção para imóveis não só em ruínas, mas todo aquele que tenha sofrido este deslocamento. O inquilino foi neste momento a resposta a esta situação, uma saída e ao mesmo tempo a entrada noutra dimensão do fazer, dar visibilidade a arte. Porém, já vínhamos de um experiência anterior com intervenções sendo realizadas em locais específicos geradores das propostas e acabavam por dilatar o tema da desfuncionalidade de espaços urbanos. No encarte do cd produzido na ocasião de sua primeira edição o Inquilino trazia o seguinte texto:
O projeto propõe ocupar temporariamente residências abandonadas que preferencialmente sofrerão num futuro reformas, ou condenadas a demolição. As intervenções nestes espaços buscam explorar a acústica, registrando os resultados na interações com o publico. Estas instalações sonoras estarão sujeitas as especificidades da cada locação, variando na forma e nos materiais. A intervenção ficar’a montada durante trinta dias, possibilitando quatro encontros com um publico diferente a acada apresentação. Os registros sonoros serão editados e remasterizados na forma de um cd de audio a cada edição. Definidos como uma “arqueologia acústica”, serão identificados pelos respectivos endereços das locações.1 A residência privada apresentou-se nesta primeira proposta como um espaço delimitado com características especificas para o que foi ali instalado. As pedras que foram usadas na instalação também foram retiradas do mesmo local, numa pequena área nos fundos da casa. Elas pareciam ter sido trabalhadas pela água como seixos rolados. Curiosamente, na história geográfica local foi relatado que naquele local existira uma nascente, e que ao escavar foi encontrado vestígios destas pedras por onde a água de todo o morro era direcionada, por se tratar no passado de uma grota dentro da mata que outrora existiu ali. Estas informações reforçaram a busca por uma relação entre a casa e a água que no passado vertia para este mesmo lugar. As pedras penduradas na casa agora faziam às vezes de extensores para os fios que por sua vez vibrariam em ondas, um fluxo de dentro para fora daquelas paredes. A participação do publico nesta primeira proposta era efetiva, pois seriam os agentes que moveriam este fluxo que produziriam a performance sonora que numa exploração coletiva fariam soar o aparato em que se transformou toda a casa. O sentido privado da experiência aqui não se apresenta se não levarmos em conta que somente poucos convidados compareceram ao evento, ao reconhecer que tanto o espaço não acomodaria um grupo muito extenso assim como o circuito de divulgação teria este controle, um grupo pequeno se comparado com as galerias e museus. Não podemos falar desta proposta sem ressaltar a presença performática do publico, a predisposição dos mesmos ao adentrar a residência, o que confere por si só uma atitude participativa, pois o espaço apresentava algum deterioro ameaçando ruir, mesmo assim, cada um se colocava na experiência por livre arbítrio, o que infringe sobre o observador um responsabilidade da qual busca se excluir com as garantias de segurança física e mental que outros espaços oferecem. Nessa experiência, cada “inquilino” que entrar e desfrutar de determinada experiência é de inteira responsabilidade do mesmo,
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Texto extraído do encarte do Projeto Inquilino Av. Maruipe 538, 2005.
reforçar com um aviso na porta. Então teremos que avaliar esta decisão como sendo o primeiro passo do observador que passa a ser também o agente gerador da obra ao se colocar no risco das operações que deverá processar. A partir de então, ele se inclui como um happening que vai sendo gerado nos interstícios entre a proposta do autor e respostas do observador tornando-se cúmplice na produção da obra. Aberto a um publico diferente, no período de dois dias, esta edição apresentou outra característica seu autogerenciamento, o autor, passa por facilitador da experiência, mas não coordena os atos que se desenrolam no decorrer do evento, o publico junto a este terceiro personagem que aqui ficou oculto, pelo fato de que as características latentes da intervenção, montagem, material empregado questões visuais e sonoras acabaram por encobri-lo. A residência exerce sobre o visitante uma influencia que, a principio, ficou encoberta pela dimensão da intervenção na casa, exerce um fascínio, e ele vem de encontro a nossa relação com a morada, com o habitar mais genuíno construído na privacidade como nos relacionamos com ela. Assim adentrar a casa de outrem é sempre na possibilidade de desvelar um pouco como ele vive. Em Bachelard “a casa é nosso canto no mundo” (1974, p. 358) que nos da proteção e nos permite a liberdade de nos revelarmos para nos mesmo, onde imaginação e memória se comungam na construção de uma imagem da eterna morada com a qual divagamos. No Inquilino esta realidade se impôs à medida que o projeto avançou, esta primeira edição pouco deixou transparecer esta qualidade do espaço escolhido no que se refere a tudo aquilo que ele representa antes de qualquer intervenção. Ventre Acústico produziu algo como uma explosão do núcleo da casa que reverberou para fora, alcançou distancias, deslocou a relação dos observadores para com o instrumento em que ela fora transformada. Nas edições subseqüentes, vai ficar cada vez mais evidente a importância desta relação como um local especifico, a residência privada. Nas intervenções que foram realizadas e de como foi planejado e a interação com o publico foi levado cada vez mais em conta este significado.
Fátuo Na sua segunda edição em 2006, o Inquilino ocupou não somente um, mas dois andares de um edifício de apartamentos no Centro da cidade de Vitoria, o Edifício Paulo Rubens Co. Nele estava presente um grupo de rapazes que passavam ali os dias temporariamente preparando material para a organização de haves estabelecendo ali um local de trabalho, que ao término de uma temporada voltavam às suas casas deixando o edifício vazio. Esta edição se valeu pela relação existente entre moradores flutuantes e a residência, o que tornava este espaço algo fluido, sem as cristalizações promovidas por relações duradoras e hábitos estratificados pelo convívio diário. Estávamos diante de uma zona instável de relações temporárias de ocupações passageiras determinadas por fluxos que iam e vinham sem demarcar um território propriamente dito, somente ocupações cuja função terminada era novamente desabitada sem estabelecer vínculos. O edifício Paulo Rubens Có foi construído pelo patriarca de uma família cujo neto recebeu de empréstimo para usar temporariamente o imóvel ocupando-o enquanto houver trabalho a ser executado. Sendo assim, alguns apartamentos foram recuperados, limpos para este fim, os dois últimos andares ficaram abandonados, espaços que foram ocupados para executarmos a segunda edição do projeto Inquilino. Nesta edição, buscamos entender este novo espaço e tudo o que compete a sua utilização por parte dos moradores temporários, como estabeleciam este habitar e de que forma alteravam a função do imóvel, organizando de forma improvisada. Isso foi determinante no processo de criação e execução da intervenção. Outro fator que também influenciou os trabalhos no edifício, foi a crise imobiliária que se apresentou, na ocasião, na busca por imóveis em Vitoria. O aumento de custos e dos alugueis promovidos pela imediata sensação de lucros fáceis e especulação que se implantou na região, proporcionada pelas descobertas realizadas pela Petrobrás no Estado, situação que ainda vem se estendendo até os dias de hoje; contrastava com a situação do edifício vazio localizado em área privilegiada sem planos para sua ocupação efetiva, enquadrando-o na situação de investimento em busca de oportunidade. O apartamento da cobertura encontrava-se mais deteriorado com infiltrações na laje que produziram uma malha de fungos no teto. Inabitável, sua planta também havia sido alterada, pois algumas paredes haviam sido suprimidas, proporcionando um salão com amplitudes não convencional para um apartamento. Nele surgiu a opção de trabalhar com um elemento químico extraído da hulha e do petróleo, o Naftaleno,
popularmente conhecido no formato de naftalina. A naftalina é comumente usada como repelente de insetos. Para essa intervenção, ela foi moldada na forma de uma gota medindo aproximadamente 30 centímetros de altura por 18 centímetros na base mais larga, fundidas somente numa fina casca oca de naftaleno, que no final dos trinta dias da exposição as 360 peças que ocupavam todo o andar além de criar um ambiente impactante, tanto pelo odor característico do material quanto pelas formas que ocupavam todo o piso desapareceriam. As formas colocadas na penumbra eram como fantasmas a habitar aquele lugar abandonado, uma relação de repulsa e atração desafiava os visitantes. O medo de uma contaminação deixava sempre no ar uma suspeita de risco. É claro que, no ambiente estávamos sob uma situação suportável, novamente era colocado para o observador o sentido de responsabilidade que cada um teria que assumir perante a obra ali exposta. Mais uma vez era sua a decisão de adentrar ou não em um ambiente que aparentemente o ameaçava enquanto oferecia uma experiência com a poética das formas, mas tornava esta experiência dentro dos limites de tolerância que variavam de sujeito para sujeito. Nos relatos apresentaram-se algumas curiosas descrições como os que afirmavam que em algumas áreas do apartamento se localizavam bolsões de odor e noutras eram inexistentes. A obra ao mesmo tempo em que repelia, o visitante também o atraia para seu interior. Em um dos quartos havia a presença de uma projeção com áudio de um vídeo. A imagem era projetada nas quatro paredes do recinto deslocandose como que num farol. Uma plataforma giratória fazia arrastar a imagem em forma circular de um céu de fundo azulado com suas nuvens brancas, que, por sua vez, também fora gravados com a câmera girando, com isto, os dois movimentos se juntavam para fazer com que aquela imagem não só percorresse as paredes mas também girasse em seu próprio eixo como uma mó a comprimir a linha do piso no quarto. Uma relação entre este andar o térreo foi estabelecida pelo poço do elevador, em todos os outros andares as portas foram hermeticamente fechadas para deixar escapar somente na entrada do edifício no térreo o odor característico. Ali todo o espaço foi preenchido com lã sintética iluminada internamente com luz branca de um tubo florescente de dois metros essa caixa branca recepcionava os visitantes na entrada convidando a subir as escadas indo de encontro aos pisos superiores. Nesta conjunção entre térreo e o ultimo andar produzia esta descendência entre os dois espaços. Ao subir pelas escadas, o observador teria que passar primeiro pelas intervenções realizadas no terceiro andar. O visitante, ao chegar no terceiro andar encontrava-se somente com um dos quartos ocupado por um dos inquilinos temporários. Este quarto recebeu uma porta que impedia o acesso em seu interior. Realizada em
alumínio com 390 monóculos sem suas partes trazeiras que só permitiam ver imagens desfocadas dos elementos iluminados dentro do quarto. Na escada que dava acesso para o ultimo andar foi instalado um sistema de fios que redesenhavam os degraus do piso ate o teto. Sobre a parede era projetado em loop um fragmento de filme 16 mm institucional da empresa Petrobras, projetado por antigo projetor que possuía um sistema de roldanas com lixas por onde passava a película que tinha sua emulsão destruída progressivamente produzindo na imagem uma infinidade de linhas verticais. Esse fragmento escolhido era uma seqüência onde uma explosão no leito de um rio tornava branca temporariamente a parede revelando um pouco mais os fios de aço descritos anteriormente. Esse fragmento possui uma trilha sonora também em loop tornou-se a monofônica e exasperante estrutura musical quase minimalista, o que parecia ser um fragmento da Cavalleria rusticana de Pietro Mascagni. Ao subir pela escada, o observador/participe acionava os fios por um sistema de plataformas de madeira como pedais sobre os fios presos na parede contraria, revestindo cada degrau acrescentando a trilha notas distorcidas de suas pegadas na escada. As intervenções orquestravam uma incongruente opereta com sons e imagens unidas numa trama que versava sobre a impermanência e o temporário. Num texto feito na ocasião publicado no http://jtigre.multiply.com : com a intenção de acrescentar informações sobre o evento. Fátuo ocupou temporariamente os dois últimos andares do Ed. Paulo Rubens Có. Para os que atenderam ao convite presenciaram uma série de ações permeadas pelas hipérboles visuais produzidas pelas obras. A impermanência das imagens era uma constante sugerida pelas articulações entre as instalações, evidenciadas por ações que perpetravam sua dissolução, cada fração ordenava-se como um enclave sonoro produzindo com mais uma nota a opereta tosca dos instrumentos, a afinação temporária era formada pela conjunção quase ensaiada das máquinas ocupantes. Inquilinos. As imagens de um dos quartos dos moradores temporários dissolveram-se pelas lentes do portal monocular, células de um único olho, só permitem enxergar as cintilações das luzes estrategicamente posicionadas: nada mais é passível de identificação. O loop da película 16 mm encontrada repete a explosão branca na parede, enquanto seus fotogramas são paulatinamente digeridos, destruídos pelas lixas instaladas no projetor, as ranhuras se apresentam como linhas verticais, tramando a imagem de rastros, a trilha se compôs numa repetição lamurienta integrada
aos ruídos capturados pelos fios, corda de piano instalada nos degraus da escada integra-se a esta composição sonora os ruídos do vídeo instalação Mó-farol: uma plataforma giratória que arrasta a imagem pelas paredes do quarto. Um disco de nuvens girando como um farol contornando as quatro paredes do quarto coalhado de naftalinas, elas ocupavam todo o terceiro andar, o cheiro evidenciava-se em bolsões de ar em localizações cambiantes. Podemos enumerar cinco itens nesta intervenção do Inquilino: O elevador, a porta, a projeção junto à escada, as naftalinas e o farol/mó. Eles se dividem nas proposições que apesar de estarem relacionadas no conjunto trazem características individuais marcantes, na estrutura, nos meios e nos materiais. Junta-las dentro de um mesmo discurso depende de um esforço por parte do visitante, esforço este não minimizado pela presença de um texto, sinalizações ou guias, ou qualquer outra coisa que não seja a obra. Não há nada externo a elas a não ser sua localização no edifício que as enlace numa questão. Diferentemente da primeira edição onde havia a repetição do mesmo gesto, com as pedras, os fios fixados ao forro de madeira, aqui uma serie de elementos propõe uma complexa elaboração, o visitante pode empenhar sua busca a partir de qualquer um dos elementos. Evidentemente que terá que passar pelo terceiro andar antes de aceder a cobertura para ver as naftalinas, porém suas investidas na busca por sentido poderá ser empreendida solitariamente. Este livre arbítrio no vivenciar e buscar entender o conjunto, acaba por permitir uma variada forma de relatos. Cada visitante pode empenharse por buscar construir um percurso por aquilo que lhe mais interessou no conjunto. Interesse, esta é a palavra aqui que determina a diferença dentro das duas propostas. Convidado a entrar na residência, o sujeito estabelece a ocupação2 e por fim a espacialidade que ao voltar-se para as coisas mundanas do mundo vai ocupando-se do mundo encontrado e com ele estabelecendo os parâmetros para buscar entende-lo como entorno. As intervenções sobrevivem neste dilema, do que esta ali como sendo permanente e o que se destaca como temporário, porém, faz parte de uma existência muito mais permanente, por se tratar de algo que se diferencia do mundano e estabelece na experiência a construção 2 A “Topologia do ser”: lugar, espaço e linguagem no pensamento de Martin Heidegger / Ligia Teresa Saramago Pádua; orientador: Paulo Cesar Duque-Estrada; co- orientadora: Márcia Cristina Ferreira Gonçalves. – Rio de Janeiro: PUC - Rio, Departamento de Filosofia, 2005.
da memória. Fátuo combina elementos que mesmo na diversidade das proposições tem como tema o transitório, o temporário. Em algumas das intervenções é preciso conhecer o material empregado para que este sentido aflore como no caso do naftaleno, porém na conjunção das imagens, fugidias. Esse reforça o sentido do inapreensível, e produz uma imagem mental do conjunto que vai se alterando na medida em que o visitante trava contato com toda a intervenção. É impossível, depois de passar diante de cada detalhe que compõe o conjunto desmembrá-los como se fosse obras autônomas. Nessa segunda edição, mais uma vez foi usado um circuito de convites, porém, desta vez fez-se uso da forma impressa. Nele constava o titulo e o nome do projeto além do endereço com o dia e hora da abertura ao publico. Compareceu um pequeno e seleto grupo de visitantes. A interação mecânica presente no primeiro Inquilino esta ausente aqui. Somente a escada lembra aquela ocasião onde os sons são produzidos sob interferência do visitante, mas de forma involuntária. A residência, por sua vez, perdeu ainda mais sua característica de espaço privado. O edifício desconfigurou-se como residencial mudando seu aspecto para outro como o de uma oficina. A impessoalidade na forma e nas relações dos seus usuários temporários acabou por redimensionar o espaço alterando sua função originaria.
Presença Na terceira edição o projeto Inquilino alterou por completo sua proposta anterior no que diz respeito à autonomia frente ao institucional, quando recebeu como premio a bolsa Ateliê do Edital N˚11 da Secretaria de Cultura do Estado do Espírito Santo em 2010. A inclusão do projeto num edital e a injeção de verba publica comprometeu na sua proposição ideológica e política, rejeitando a participação de qualquer instituição no gerenciamento e nos campos decisórios sobre os caminhos da gestão publica do evento e direcionamentos na sua divulgação. Entre os aspectos de mais impacto estão a imposição sobre a participação de um orientador e o de ordem financeira na bolsa mensal que viabilizaria as montagem da instalação. Porém, é preciso que se diga que a instituição pouco inferiu nestes contextos somente se posicionando frente à apresentação final dos resultados gerados pela bolsa.
O projeto foi aprovado por uma curadoria nomeada pela instituição que o avaliou nos seus aspectos formais (execução) e conceituais. Após sua aprovação no que tangia os aspectos legais, presença dos quesitos que validariam caso fosse selecionado pela já citada comissão. Com isso, a instituição deixou de imiscuir-se no andamento do projeto, limitando-se a receber um relatório burocrático mensal que a respaldase do acompanhamento no emprego da verba publica. Se na seleção do projeto a comissão tomou conhecimento da proposta na seqüência dos fatos, na execução pouco ou quase nada influiu, não acompanhando o desenvolvimento da proposta. Não conhecendo a natureza da proposta a instituição se colocou a parte, deixando margem para que o projeto Inquilino continuasse com autonomia em alguns fatores que o viabilizaram. Destacamos os itens: Locação e participação de terceiros, continuamos com a estratégia inicial em obter a residência por empréstimo diretamente com o proprietário. e convite feito a amigos interessados em participar voluntariamente. Outro ponto importante foi a relação com a vizinhança onde se deu à intervenção, o envolvimento com os moradores no entorno foi importante, principalmente por se tratar de uma residência que não possui rede elétrica e hidráulica. No caso especifico desta Terceira edição, a rede elétrica recebeu devida atenção sendo necessário reinstalá-la, o que acabou por proporcionar uma série de ocorrências que fizeram parte do processo gerador da intervenção na residência. Para se efetivar a instalação de uma rede elétrica em uma residência na área urbana é necessário localizar seu endereço e o histórico de consumo no passado. Esta busca revelou a ausência de registros na empresa fornecedora do endereço proporcionando uma série de reflexões a respeito de existência legal e de um endereço. O vazio em um mapeamento urbano, o imóvel sem morador produzindo dividas como usuário dos bens gerados pela rede gerando a perda da identidade do imóvel, e por fim, sua total inexistência no mapa urbano. Estes fatores foram tomados como assuntos geradores da proposta, comparecendo nos relatórios a respeito dos processos: O velho sobrado 427, esquina da Maria Saraiva com a Rua Graciano Neves encontram-se dormente, ali o tempo passa muito lentamente lavorando aquelas ruínas tão características do abandono, a ferrugem queima os ferros. O vento descasca as paredes, o sol resseca os telhados trincando a velha cerâmica portuguesa. A idade vem trazendo as cicatrizes no musgo e nos micro vegetais urbanos. Em volta o movimento mais acelerado da cidade contrasta com aquela duração quase monástica de uma velha sepultura. O edifício range, enverga, mas resiste às intempéries e assombra a rua.
A residência encontra-se fechada a mais de dez anos. Perdeu seu vinculo com o censo urbano, já não enumera as fileiras dos lugares habitados nem mesmo possui um numero. Não tem endereço, perdeu seus ocupantes. Esta oca de vida. Já não pulsa com as vidas existindo e gerando memórias. Ela a muito vem desatando devagar cada laço de memória. Cada vez mais distantes ela é um quadro desbotado de esquecimento. A nossa historia começa então no dia 16 de julho de 2010. Planejei iniciar a apropriação do lugar reinaugurando um endereço através da sua localização no pedido para religar a rede elétrica. Retomar a artéria do movimento de elétrons da cidade através da transfusão diária que faria com que devolvendo novamente seu endereço e a energia pudesse ressuscitar o local. Na empresa distribuidora de energia não foi encontrado o endereço e nem registros de seus antigos ocupantes, porém a recepcionista fora categórica: se lá existe um velho padrão então tem de existir uma velha conta, e para que eu possa liberar para você o fornecimento temos que examinar se tem dividas passadas. Foi aí que me veio à pergunta: mas a divida só pode ter sido gerada por um usuário com seu nome e CPF. Mas se este usuário deixou a residência sem pagar a conta esta passa ao endereço. Então a residência passa ser o usuário e se ela herda esta conta isso significa que foi ela quem usou a energia e não pagou e não o antigo morador. Isto dit,o assim soa como se de repente esta velha residência assumisse o papel de sujeito, de entidade autônoma, um ser vivo produzindo dividas para com uma sociedade.3 A via-crucis atrás do endereço da velha casa da Graciano Neves ou Maria Saraiva ainda gerou outros momentos curiosos sobre a existencia e não existencia. Localizada numa esquina entre duas ruas, o antigo endereço simplesmente desapareceu no registros da municipalidade. Recorri ao IPTU, sem sucesso, até que vasculhando o andar térreo do sobrado em meio ao entulho descobri um velho talão de cobrança. A partir deste pude retomar minhas pesquisas sobre o velho casarão, seu endereço e sua identidade na cidade localizando seus registros na prefeitura, encontrando inclusive as plantas do imovel original e as alterações sofridas mais tarde. Resolvido o problema do endereço e da rede elétrica, a bolsa me permitiu uma imersão na residencia que ainda não havia experenciado. Durante quatro longos meses estive na casa observando e registrando detalhadamente os dias e as noites dentro dela. O velho sobrado ficava em uma esquina uma localização de duplo endereço um na rua Graciano Neves 425 e outro na rua Maria saraiva 48 embaixo funcionou um bar conhecido na vizinhança e este ficou sendo uma das referencias para sua localização, O Bar da Zilda, que agora funcionava nesta mesma rua em outro imóvel. 3 Primeiro relatório julho de 2010do projeto Inquilino terceira edição.
A medida que ia estabelecendo uma relação com o lugar ficou cada vez mais evidente meu interesse pela luz no seu interior. As horas dos dias revelavam cada qual uma reorganizaçao de sombras dentro da casa. Cada espaço da casa foi vivenciado em quatro horarios distintos: pela manhã na aurora, ao meio dia com o sol a pino, a tarde depois das 16:00 horas e no angelus quando a luz natural ia sendo substituida pela iluminaçao publica das ruas que criavam uma serie de rebatimentos do desenho das janelas nas paredes do imovel. Neste Inquilino diferente dos outros, a residencia passa a ser o alvo de minhas intenções sendo assim, a intervenção estaria submetida a casa e sua abertura para a visita. Nesta experiencia a casa tornou-se o personagem principal de um roteiro que ia sendo lentamente elaborado, percebi como a aura do privado emanava dentro daquela residencia como se ela ainda fosse abitada. Aos poucos fui compreendendo que ali fui construindo o habitar, onde estabeleci algumas considerações que diria sem temor, afetivas. Este tempo dentro da residencia foi de extrema importância para o processo de elaboração daquilo que nomeei: “presença”. A residIência, por fim, revelou ser a parte mais importante deste projeto, no que tange o espaço privado enquanto funcional. Nesse sentido, de privado denota uma serie de agenciamentos que influiriam de forma decisiva na interveção a ser realizada. O sentido do privado nos invade assim que adentramos nestes espaços, nossa experiencia com eles traz esta presença do particular desse espaço, porém, este receio e muito mais no cuidado não perder nada na curiosidade intrinsica que lamentamos pelo outro, pelo bisbilhotamento do reino de um rei destituido, do revirar gavetas e cofres atraz de uma historia,em busca do outro, vem de encontro a nossa nescessidade de comparações que estabelece o que somos frente as diferenças, que geralmente se revelam. Procuro ir à residência todos os dias, às vezes vou pela manhã outras pela tarde, pretendo também passar uma noite ali, estar dentro desta casa é aos poucos construir um Lugar, preciso habitar este espaço. Isto me faz lembrar o texto de Heidegger, Construir, habitar, pensar, nele a idéia de habitar é a de construir esta relação. Podemos construir varias habitações materialmente falando sem habitar realmente nenhuma delas, pois habitar é estabelecer uma relação para alem do uso, da função do lugar, é mais profundo, habitar é estabelecer uma troca de essências. 4 4
Esta reflexão nos alerta sobre este fazer. Construir é estabelecer Segundo relatório da Bolsa Ateliê 2010, Secult ES.
a relação com o entorno que nos coloca cientes do existir. O tempo perpassa o mundo inanimado da matéria que o recobre para encontrar em nos sua escencia como linguagem, podemos traduzir esta experiencia na oralidade ou nesta construção que a escrita me permite porem, é preciso ainda muito mais para que a experiencia possa ser um ponto neste espaço banal de nosso existir, é reconhecer que cada um que adentrar a casa vai construir a sua maneira este habitar. Habitar esta relacionado de como vivemos e nos relacionamos com a as coisas, a pergunta heideggeriana que é sobre nosso ser-no-mundo ou podemos dizer : de como habitamos esse mundo. 5 Numa relaçao de que o habitar se baseia em construir este mundo que nos circunda , o Inquilino terceira ediçao se fixou no habitar para ocupar este local que passa a se constituir como lugar a partir das vivencias ali empreendidas, na continuidade do que nos fala Heidegger a de que o habitar não mais se da na experiencia do ser no mundo mas sim na linguagem. O inquilino pretendeu incorporar à linguagem a casa, seu espaço cotidiano e ordinario por meio da intervenção. A proposta então surge da ideia de animar o aparente inanimado para que tempo e espaço confluam para um ponto. Este ponto é o da irreversibilidade que a linguagem propõe sobre o obvio. A casa preservada em seu estado animada sob aspectos presentes na luz e no som, combinados proporcionaram a experiencia particular de cada individuo que nela adentrou. Trazer movimento a casa atravez da iluminação sinetica revelou uma proximidade com o cinema, mas de que cinema estamos falando? Entemos um pouco mais se buscarmos a produção de um Andrei Tarkovsk ou de um Sokurov. Nos habitamos uma casa ate assombrá-la. Isto me lembra o filme de Aleksandr Sokurov outra referencia para este nosso processo. A humble Life que se passa na residência de uma velha senhora japonesa perdida no longínquo vilarejo de Aska no Japão uma contemplativa e sensibilíssima reportagem onde a casa esta o tempo todo em foco, ate confundirmos a moradora com o lugar. A casa é a personagem deste documentario sentimental, não ha dialogos apenas a voz do cineasta comentando algumas memorias e aspectos referentes a casa em questão e umas poucas informações sobre sua moradora mas o essencial para transformar aquelas imagens em um sujeito esta na casa de 100 anos e ali a unica 5 JESUS, Marcos Paulo Alves de. Considerações sobre o habitar cotidiano no pensamento de Martin Heidegger. “Existência e Arte”. Revista Eletrônica do Grupo PET – Ciências Humanas, Estética e Artes da Universidade Federal de São João DelRei – Ano III – N˚3 – Janeira e dezembro de 2007. Pag. 01.
moradora que ficou de uma familia , então vamos penetrando este ambiente pela lente de Sokurov que vai nos colocando tão perto das ranhuras que quase podemos toca-las, quando acompanha a senhora no trabalho diario com os kimonos tambem percorre com detalhes suas mãos e cabelos tão proximo que nos acanha, espreita-a na sua existencia dentro daquela casa com o tempo passando pelos ventos, fumaça e sons distantes, a casa não esta em silencio , ela range e estala, o fogo trepida e vapores destas existencias colocam em evidencia um movimento, a casa é uma entidade que o cineasta lamenta por nunca mais poder reve-la. Dentro da casa vemos os objetos de uso comum, adormecidos eles exercem um fascinio das coisas sem suas funções, acabam por imantar o lugar com presenças , de fazeres estanques , produzem alguma estoria , intercalando imagens mentais. Sokurov foi aluno de Andrei Tarkovsk, outro cineasta que explora os lugares e objetos como coadjuvantes, de sua autoria cito Stalker uma ficção muito distante de A Humble Life, mas de igual maneira o lugar torna-se no decorrer do filme um personagem tão misterioso quanto os três homens que vão cada qual a sua maneira ali buscar o impossível. Estes exemplos apresentam imagens destes lugares e objetos sem nenhuma alteração sem qualquer maquiagem que modifique sua natureza superficial, uma demorada tomada de uma xícara sobre uma mesa ou como em A humble Life de uma chaleira de ferro chiando sob a crepitação das brasas no centro de uma sala vazia é o suficiente para tocar no interior destas coisas banais, dado o tempo na presença desta duração que é permitido ao cinema explorar.6 A casa no Inqulino Terceira Edição é ao mesmo tempo: um local real, a casa intacta com suas deteriorações; vestigios, sem nenhuma melhoria a não ser uma limpeza superficial; e ficcional, as intervenções realizadas. Porém, as luzes que se movem revelam seu sistema elétrico, os sons produzidos também podem ser constatados nos motores girando as palhetas fazendo soar os fios de aço. Tudo esta a mostra, mas mesmo assim a ficção se impôs para algumas experiencias. Oito fios trespassam todos os ambientes da casa na horizontal em alturas diferentes, paredes foram perfuradas de maneira que os fios as atravessem sem tocá-las, cada fio tem seu motor/palheta/captador, alem de soar acusticamente dentro da casa. O som era reproduzido eletronicamente no forro da casa por um amplificador junto a duas caixas passivas. As luzes foram estrategicamente fixadas proximas aos orificios por onde passam os fios.
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Segundo relatório da Bolsa Ateliê 2010, Secult. ES.
Os spots possuem movimento como faróis, hora e outra a luz projeta-se por estes orifícios criando circulos luminosos que logo desaparecem para reaparecer noutra volta das lampadas. As sombras de rebatedores com os cinco retangulos cortados são projetadas e se movem comforme os movimentos. No banheiro ficou a Colmeia, banheira com uma resitencia eletrica industrial que aquecia a agua ate que uma nuvem de vapor se elevasse. O piso no formato de colmeia foi reproduzido com latex e transformado em cortinas de um suposto box. O som era impactante neste local por causa da abertura no teto para acesso ao forro. Nesta edição uma estratégia foi montada nas visitações de maneira a colocar em cheque cada observador/experienciador. Inicialmente ele deveria agendar o dia e a hora de sua visita às instalações dentro das datas propostas. Chegando no dia e hora marcados, ele era convidado a assinar um termo de responsabilidade onde assumia todos os riscos ao adentrar no imovel. Recebia também as informações de que não haveria nenhuma outra pessoa dentro de imóvel no momento de sua visita, seguranças ou outro visitante, não haveria cameras registrando sua passagem, ou qualquer informação sobre onde entrar ou não (como faixas de segurança). Recebia apenas poucas recomendações quanto a não se precipitar dentro do imóvel antes de qualquer analise cuidadosa de seus espaços internos. A intervenção localizava-se no segundo andar do sobrado, o que proporcionava um isolamento ainda maior da rua. Na portaria ficava os recepcionistas que conduziam os agendamentos. Ao adentrar pela porta, o visitante se deparava com uma escadaria que logo a frente dobrava a esquerda, momento determinante no que se refere a algumas desistencias dos visitantes. Estar só na residencia para a maioria dos convidados era o maior desafio, dividir a responsabilidade obrigando o observador a assumir uma conduta participativa, um compromisso onde ele era responsavel pela condução de sua experiencia, sem a posição confortável respaldada pelas garantias e facilidades propostas pelas instituições de arte tais como: texto, guia e segurança. Saindo de uma visita passiva para outra comprometida tanto com questões de ordem fisicas quanto conceituais o observador passa a ser responsavel pela experiência. O privado não só é respaldado pelo espaço residencial como também pela imposição de uma visita solitaria. A experiencia do sujeito é particular sem acompanhantes, sem câmeras resgistrando. Sua presença dentro da casa, estar completamente só dentro de um espaço/obra tarnar a esperiência intransferivel. Ao sair da casa o visitante era convidado a comentar sua experiencia frente a uma câmera.
A casa dos outros O projeto Inquilino começou inicialmente como uma ideia de manifestar-se contra uma situação de carencia dentro do meio artistico de Vitória, no Espirito Santo e pelo desejo de buscar estimular a criação. Aquilo que começou como uma prática atrelada a uma manifestação ganhou a dimenção, onde pratica e pensamento se coadunam de forma a redimencionar a proposta inicial, aquilo que sempre esteve por ali, porém, o olhar ampliou-se por entendermos a dimensão do gesto realizado na trama complexa de uma cidade. As expereincias com o inquilino vem construindo uma outra imagem que se funde a já existente sobre a cidade que cada observador traz consigo. A casa residencial trouxe esta nova dimensão que foi buscar extender nossa observaçao a respeito do habitar que fixa por um tempo consideravel nosso existir. Ocupar-nos desta construçao refere-se tambem ao ato de criar. Em nossa proposta para o edital 11, o projeto fez menção ao Ateliê, o espaço pela tradição reconhecido como o da criação. Não poderiemos deixar de nos referir a este espaço tambem como um ateliê, um atelie em campo ampliado onde ele é ao mesmo tempo espaço de processos de criação e tambem a propria obra como expressão quando o habitamos através da poética. Citando as palavras de Hölderlin atravéz de Heideger “..poeticamente o homem habita..”7. Habitamos enquanto construimos os entre lugares, cada objeto se imanta de nosso interesse, de intencionalidade. Nos localizamos no entre, no desvão da possibilidade e do uso. Nos acercamos reconstruindo o entorno e nos localizamos fisicamente no espaço, ainda assim a deriva dentro de um ilimitado espaço interior do pensamento, do não puramente fisico, não temos dele uma dimensão e localização exata. Divagamos entre o racionalismo, no qual buscamos dominar para exercer com ele nosso livre arbitrio. O controle sobre o fisico e o muitas vezes involuntario e inconsciente poder da dúvida. Como poderemos estar o tempo integral atento às relações que envolvem o habitar? Dentro de nossa casaca de ferro da consciencia onde nos colocamos na vigilia de cada ação perpetrada, não estariamos de costas para este oceano que se estende a nossa volta, o mundo fisico? Sem estabelecer medidas, duração e localização, a deriva está a casa onde habitamos conceitualmente. Enquanto refletimos, sentimos por onde se da a medida do tempo, 7 HEIDEGGER, Martin. Ensaios e conferencias/Martin Heidegger; Trad. de Emmanuel Carneiro Leão, Gilvan Fogel, Márcia Sá Cavalcante Schuback, - 3˚ edição – Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2006, p 165.
tentamos sem sucesso, de dentro, observar-nos existindo, como num eterno movimento? Mera ilusão, existindo nos desgastamos, somente nas palavras simulamos alguma eternidade, linguagem é por onde habitamos este mundo, por onde definimos o sentir e nos representamos. Na linguagem, estamos presentes.
Bibliografia BREA, José Luiz. Ornamento y utopia: La audición de la escultura em los años 80 – 90. Revista Arte, n°4, vol.1, 1996 KWON, Miwon. “Um lugar após o outro: anoaçoes sobre Site Specificity”. Revista Octuber, 80. TIGRE, Julio. “Algum lugar algum”. Vitória. Lei Rubem Braga, 2005. SENNETT, Richard. “Carne e pedra”. Trad. de Marcos Aarão Reis. Rio de Janeiro. Record, 1997. JACQUES, Paola Berenstein. “Estética da ginga: a arquitetura das favelas através da obra de Hélio Oiticica”. Rio de Janeiro. Casa da Palavra, 2001. FERVENZA, Hélio. “O+E Deserto”. São Paulo. Escrituras editora. 2003. BACHELARD, Gaston. “A poética do espaço”. Trad. de Antonio de Pádua Danesi. São Paulo. Matins Fontes, 1993.
Inquilino I - MaruĂpe 538
Inquilino II - Fรกtuo
Inquilino III - Presenรงa