Sexta-feira, 9 de junho de 2017
ESPECIAL 55 ANOS
Sabores de
Guabiruba BIANCA LEMOS
Cultura rica faz do município um reduto de boa comida, boa bebida e boas histórias
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Sabores de Guabiruba
EDITORIAL
possível contar a história de qualquer cidade, estado, país ou civilização por meio da comida. A forma como se come e se bebe é reflexo dos costumes de cada povo, mesmo que no dia a dia não nos demos conta. Em Guabiruba, a relação com o alimento é especial. Não há como falar do desenvolvimento da cidade, que neste dia 10 completa 55 anos de emancipação político-administrativa, sem contar a história da culinária - escrita a cada dia, com forte inf luência dos imigrantes alemães e italianos. Exemplo disso é a tradição que, até hoje, perdura e se populariza a olhos vistos. É o caso das cervejarias artesanais, que vieram junto com os imigrantes alemães e austríacos que aportaram na região, no século 19, quando Guabiruba nem sonhava em ser uma cidade. Assim como a cerveja, os imigrantes alemães, mas também os italianos e poloneses, tinham como costume de fazer kuchen, hoje conhecidas como as cucas. Essas delícias permeiam toda a cultura culinária guabirubense e é um traço irrefutável de nossa ligação com os antepassados. Durante os famosos “café com cuca” já se formaram muitas conversas. Algumas delas resultaram até em namoros e em casamentos. Mais uma vez, a comida integrou, uniu e fortaleceu a sociedade de Guabiruba. As igrejas, há décadas, veem na produção de cucas uma importante fonte de renda para a manutenção dos trabalhos. Os peixes também são parte bastante importante da mesa do guabirubense. As primeiras comunidades estabeleceram-se às margens dos ribeirões, que, à época, eram rios mais caudalosos. O peixe, por consequência, é assíduo frequentador dos pratos. A “tradição peixeira” de Guabiruba ainda existe por meio das lagoas que muitos mantêm em seus sítios, e por iniciativas maiores, como o pesque-pague de Paulo Dirschnabel, que funciona há décadas no bairro Pomerânia e o restaurante Lá nas Trutas, no Lageado Alto. As evidências da ligação historicamente
PREFEITURA DE GUABIRUBA/DIVULGAÇÃO
É
Alimentando a história
Não há como falar do desenvolvimento de Guabiruba sem contar a história da culinária
importante e íntima entre o povo de Guabiruba e a comida são muitas. É uma história em desenvolvimento, que se renova a todo o momento. Os pubs, febre nos últimos cinco anos no Brasil, também chegaram à cidade e ganharam personalidade local. Os modernos bares, com foco nas cervejas de vários estilos, já se consolidaram no município. Não é à toa que o proprietário do Gurmàn Selective Pub, Cledson Kormann, afirma que é “possível viver apenas dos guabirubenses”. Assim como o fez no passado, a cidade abraça essa nova tradição culinária e a incorpora no seu cotidiano. No fundo, no fundo, a boa comida e a boa bebida tem apenas um único objetivo: criar laços. É assim dentro de casa, é assim nos encontros entre amigos e é assim nas cozinhas das igrejas. Parabéns, Guabiruba! Sua história é deliciosamente contagiante.
Fundado em 1954
Cachaça artesanal e união .............................................................................. 4 Conversas mais doces ................................................................................... 6 Fisgados pela boa conversa ........................................................................ 8 Gelada e bons amigos ........................................................................... 10 e 11 Cucas feitas com amor e fé ............................................................ 12 a 14 Sabor dos antepassados .................................................................................. 16 Delícias da infância .......................................................................................... 18 Comida que vem da roça .................................................................... 20 e 21 Tradição de quinta-feira .................................................................... 22 a 24
Jornal O Município
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Claudio José Schlindwein
Julia Fischer Barni
Editor-executivo Andrei Paloschi - editor@omunicipio.com.br
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Cachaça artesanal e união Bebida tipicamente brasileira é produzida à moda antiga no município nho do bairro São Pedro, o escambo - a maneira mais antiga do mundo de negociação - ainda existe. A produção no Alambique Albrecht é, não só artesanal, mas natural. Tita segue à risca os ensinamentos do pai e não gosta de apressar os estágios de feitura do destilado. Desde a moagem da cana-de-açúcar até o líquido no copo, vão três dias de trabalho e espera. A cada safra, ele faz entre 8 e 9 mil litros de pinga.
Tita Albrecht produz quase 10 mil litros de cachaça por safra
Da madeira ao líquido Osmar Vicentini, antigo morador do Lageado Alto, é outro que ainda hoje faz a cachaça. A produção dele é totalmente artesanal, mas vai além. Também faz outros destilados, como o uísque americano, e também cerveja. Mas a cachaça é motivo de orgulho para Vicentini, que passou um tempo na Itália e Alemanha, onde aprendeu sobre a produção de bebidas. Na cozinha onde o “mestre cuca” cria as bebidas, há um barril de carvalho. Pequeno, aparentemente normal. Mas Vicentini tem um carinho especial por ele. “Plantei a madeira dessa barrica, deixei crescer por 30 anos, cortei a madeira, fiz o barril com madeira arcada com o fogo, como se faz na Itália, e fiz a cachaça”, diz. A cachaça feita por Vicentini não é vendida, é apenas combustível para conversas e encontros em família e amigos. Vicentini mantém, em sua propriedade, lavouras de milho e de cana-de-açúcar, que são usadas para fazer as bebidas. Uma garrafa de uísque, por exemplo, recebe o milho e demora quatro anos para ficar consumível, conta. “A gente tem isso no coração e na mente. A vida é um conhecimento, tu vens desenvolver, participar e viver no mundo e depois vai embora. Tens que aproveitar bem o mundo, e tu só consegues fazer isso quando tiras conhecimento dele, sabedoria, e aplica isso”, afirma Vicentini.
Osmar Vicentini investe na produção de cachaça e de outros destilados
FOTOS ELIZ HAACKE
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os dias atuais, nos quais as pessoas se conectam, cada vez mais, pela internet, Osmar Vicentini e Pedro Albrecht, o Tita, preservam um costume antigo: a cachaça artesanal com os amigos. O primeiro vive no Lageado Alto, o outro, no São Pedro. Mas os dois produzem a bebida tipicamente brasileira com o objetivo de presentear e reunir amigos e familiares para um cachacinha e um bom bate-papo. Há diversos produtores de cachaça e destilados em Guabiruba. É só conversar com a população, pedindo informações sobre onde comprar cachaça, que logo te indicam um ponto mais próximo. Neste universo, estão inseridos Tita e Vicentini. Os dois, ainda hoje, fazem a bebida do mesmo jeito que aprenderam com os mais velhos. Tita Albrecht é proprietário do Alambique Albrecht, localizado numa transversal da rua São Pedro. Com 47 anos, ele toca o legado deixado pelo pai, que começou a produção da cachaça na década de 1970. Em 2005, Tita perdeu o pai, que era companheiro na produção da bebida. Apegado ao legado familiar, não pensou duas vezes e, junto com a esposa Irani Albrecht, resolveu continuar com a produção. “Somos seis irmãos, como sou o mais novo, fiquei. Espero que o meu filho goste também. Por isso quero ampliar em um ou dois anos, mas sempre artesanal, coisa pequena”, diz Tita. O alambique é bastante conhecido na região - recebeu gente até da Alemanha, como conta o orgulhoso Tita -, mas não é uma empresa formada. A fama é fruto do trabalho dos Albrecht. Tita tem uma confecção e trabalha na roça, onde tem 6 mil pés de cana. O método de produção é totalmente artesanal. Não há garrafas ou rótulos. Os clientes levam o vasilhame, ou então, levam a cana-de-açúcar para ser matéria-prima. Tita faz a cachaça e fica com parte da bebida como pagamento. Neste canti-
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Conversas mais doces Docinhos e geleias, com pão quentinho e café, unem gerações
Esmeralda Maria Kormann, moradora do Aymoré, é uma das guabirubenses que mantém viva essa tradição. Ela aprendeu a fazer geleia aos 16 anos, com a vó Alvina Boos, e com a mãe Iracema
Morgana Schaefer faz sucesso com as receitas de sua oma
MARCOS BORGES
Doce sabor
Esmeralda Kormann faz geleias há mais de 40 anos
DAIANE BENSO
O
costume de tomar um bom café com doces e geleias, com amigos e vizinhos, não tem época. É um símbolo da integração da comunidade por meio da comida em qualquer idade. Morgana Schaefer, moradora do Centro, é conhecida pelos docinhos que faz - uma tradição que ela herdou de família, como a sua marca denuncia: Oma Anna. A guabirubense juntou o interesse pela cozinha com o amor pela vó e começou a fazer os doces em 2015. “São as mesmas receitas que eu comia quando ia à casa da minha oma quando era criança”, conta. Os doces da avó já eram bastante conhecidos na cidade, por isso a neta aproveitou para divulgar, inicialmente, entre pessoas mais próximas. O sucesso foi quase imediato. Hoje, Morgana recebe encomendas e já planeja se dedicar mais à atividade. Ela trabalha parte do dia no escritório de despachante de seu pai. A guabirubense diz que os doces seguem à risca as receitas da oma. “Ela tinha dois livros de receitas, eu fiquei com um. Ela era cozinheira, trabalhou em casa de família de Brusque. Alguma coisa ela acabou trazendo dessas famílias, acho que é o caso da cuca de mel”, lembra. Ela faz vários tipos de doces, mas a “joia da coroa” é a cuca de mel. O nome, à primeira vista, é estranho, mas o sabor conquista qualquer um, conta Morgana. A receita é muito popular na Áustria e na Alemanha. “O de cuca de mel acho que ninguém tem por aqui. É um doce alemão-austríaco, bem tradicional, mas nunca vi por aqui. Se eu liberar, todo mundo vai fazer. Essa receita vai ficar bem guardadinha”, diz.
Boos foi se aperfeiçoando. Hoje, faz semanalmente diversos sabores, principalmente de banana, tangerina, laranja, figo, pêssego, abacaxi, xinxim e carambola. Esmeralda conta que aproveita as frutas da época, que tem em casa, para fazer a geleia. Em média, por ano, Esmeralda faz mais de 300 vidros de compota de geleia. Há dois segredos essenciais para uma boa geleia: o descanso de um dia para o outro das frutas e o tempo de cozimento. A preparação exige cuidado e perícia. No caso da tangerina, é preciso descascar a fruta à noite, tirar a semente, cortar em pedaços e colocar num recipiente com água e deixar por aproximadamente cinco horas. Além disso, Esmeralda diz que a cada 12 tangerinas é preciso colocar duas com casca. “Se não tiver algumas com casca não é geleia. É para dar um gostinho especial”. Vera Kistner, também moradora do Aymoré, faz geleia há mais de 20 anos para o consumo próprio ou para presentear os amigos. Algumas vezes ela acaba vendendo para vizinhos e para eventos. São vários os sabores do doce que Vera produz: laranja, tangerina, abacaxi, jabuticaba, ameixa, pêra, banana, amora. “Faço praticamente toda a semana. Quando tem fruta eu aproveito”. Em média, são preparados cerca de 15 vidros por mês. A moradora de Guabiruba conta que aprendeu a receita com sua patroa e se especializou em novas técnicas por meio do curso disponibilizado pela Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri). “A geleia é uma das receitas que eu mais gosto de fazer e quando se faz com amor as coisas dão certo”. Assim como Esmeralda, Vera afirma que o segredo para que o doce fique saboroso é deixar de um dia para o outro num recipiente com água. “Pra não amargar, essa é a receita”.
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Fisgados pela boa conversa Município se destaca na criação de trutas e tilápias em meio à natureza
MARCOS BORGES
Paulo Dirschnabel administra o pesque-pague que leva seu sobrenome há mais de 20 anos
DIVULGAÇÃO
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uabiruba fica a mais de 50 quilômetros de distância da praia mais próxima e não tem um rio de grande volume. No entanto, o peixe vivo também faz parte da culinária da cidade. Quando se fala em comer peixe em Guabiruba e na região, o restaurante Lá nas Trutas logo vem à mente. Localizado numa região de altitude, no bairro Lageado Alto, o estabelecimento recebe a comunidade semanalmente. O nome já denuncia o foco do restaurante: as trutas. Peixe originário do Hemisfério Norte, onde é mais frio, ele foi introduzido no Brasil por meio da criação em laboratório. Hoje, alguns locais conseguem criá-lo. São poucos. O Lá nas Trutas é um deles. Paulo Roberto Kormann, proprietário do restaurante, conta que a escolha do local, distante cerca de 14 quilômetros do Centro, não foi por acaso: a espécie precisa de água fria e limpa para se reproduzir. Ali, a temperatura é mais baixa - em média cinco graus a menos do que na região central - e a qualidade da água é melhor. O processo é longo e exige muita dedicação. A truta passa por quatro tanques e cada um representa uma fase de crescimento – desde a criação de alevinos (os filhotes) até o peixe pronto para o abate.
Paulo Roberto Kormann encontrou no Lageado Alto as condições ideais para a produção da truta
Um processo que dura cerca de dez meses em cada um deles. O peixe vai para a mesa quando atinge 300 gramas. Esses fatores foram determinantes para a abertura do espaço, mas o principal foi oferecer um ambiente diferente aos guabirubenses e aos visitantes. “Eu gosto de um ambiente de mato, de natureza. Imaginei que durante a
semana o pessoal estaria em atividade nos centros e seria bom trazê-los para um ambiente diferente, cheirar a natureza”, diz Beto. Com a vida moderna que deixa a quase todos cheios de tarefas e sem tempo para apreciar a beleza da natureza, Beto “acertou na mosca”. O restaurante abre apenas nos fins de semana, e sempre com bastante público. “Gostamos muito de conversar. Quando movimento é muito grande não dá para dar toda atenção, mas tem a acolhida, o ‘seja bem-vindo’. E tem a natureza, que oferece um ambiente onde eles podem andar livres. Às vezes, aparecem as cotias que tratamos”, diz o empresário. Gente de longe também incorporou a truta, e a boa conversa, à sua dieta. Beto conta que já recebeu gente da Alemanha, dos Estados Unidos, da Argentina, do Canadá, do Japão, da Itália e de outros países. Os alemães, geralmente de Karlsdorf e Schwarzwald, costumam voltar regularmente. Alguns já estiveram no Lá nas Trutas mais de cinco vezes.
Negócio de família O pesque-pague do seu Paulo Dirschnabel, no bairro Pomerânia, também já é destino certo. O desenvolvimento da família aconteceu em torno do estabelecimento, que tem sido frequentado por centenas de pessoas de toda a região há anos. Dirschnabel já nem lembra há quantos anos se dedica ao pesque-pague. Mas “faz muito tempo”, mais de 20 anos, com certeza. Os filhos ajudaram-no a tocar o negócio quando pequenos, e agora eles deverão assumir a direção. O pesque-pague tem cerca de mil tilápias e algumas carpas. O número de visitantes não é o mesmo do passado, mas o proprietário lembra com carinho das amizades que fez, e até hoje mantém, graças ao estabelecimento. “Tinha muito contato com as pessoas. Eram tantos que, para almoçar, era preciso esperar a vez”, conta. Os tempos são outros, mas ainda há quem busque nos pesque-pagues o peixinho para o almoço de domingo. No momento, por causa do período de alimentação das espécies, o estabelecimento está fechado.
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Gelada e b
Tradição centenária de produzir cer
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ultura é um conjunto de conceitos, conhecimentos e costumes de um determinado grupo. Ela abrange desde a religião até a comida e a bebida. Guabiruba é conhecida pela sua cultura germânica. Um exemplo irrefutável deste legado pode ser visto na quantidade de cervejeiros artesanais que há na cidade: cerca de 80. Os guabirubenses preservam até hoje o costume de fazer a própria bebida para confraternizar com os amigos. Ao fazer isso, muitas vezes sem saber, eles estão levando adiante um hábito que, com certeza, fez parte do cotidiano de seus antepassados, no estado de Baden-Württemberg, de onde veio a maioria dos imigrantes no século 19. A Alemanha é vista como “a nação da cerveja” até os dias atuais. E não é por acaso. A cerveja foi descoberta, provavelmente, acidentalmente pelos sumérios, no ano 6.000 a.C.. A receita foi repassada a cada povo ao longo da história e a bebida ganhou cada vez mais adeptos. Até que chegou aos povos germânicos, que começaram a produzir a bebida por volta de 800 d.C. Foram essas tribos que deram origem aos reinos e ducados que hoje formam a Alemanha. Sabe-se que a cerveja ganhou popularidade entre os germâni-
cos, e muitos se aventuraram a produzi-la, o que resultava em diferentes gostos. Foi por causa dessa falta de padrão que nasceu a famosa Lei da Pureza Alemã (Rei-
nheitsgebot) de 1516. O duque Guilherme IV, da Baviera, proclamou, em 23 de abril daquele ano, a receita “oficial” da cerveja: água, malte de cevada e lúpulo. Nada
mais. Desde então, esse é o parâmetro de qualidade no mundo inteiro. Tudo isso tem ligação direta com os alemães, e por consequência com os guabirubenses. A antiga Cervejaria Estrela, que funcionou na cidade no século passado, é um exemplo da ligação entre Guabiruba e a famosa gelada. Por isso, não é surpresa que existam tantos cervejeiros, de vários níveis de qualificação. Há gente como o grupo Fünf Freunde (Cinco Amigos, em alemão), do Aymoré, que faz simplesmente para o consumo próprio; como a Eichenlaub Bier, do São Pedro, que já faz eventos maiores; e a mais famosa de todas: a Kiezen Ruw, cervejaria conhecida em todo o estado e que deu origem à onda cervejeira que existe atualmente. A vasta quantidade de cervejeiros também refinou o paladar dos guabirubenses. O público tem ido além da tradicional pilsen - e os estilos ipa, apa, weiss e outros, de escolas belga, alemã e americana, também têm sido bastante pedidos. Essa retomada do amor pela produção de cervejas teve início há menos de uma década, e uma das precursoras foi a Kiezen Ruw, localizada nos rincões do bairro Planície Alta - numa região alta, cercada pela natureza.
ELIZ HAACKE
De Guabiruba para o estado
Marcelo Alexandre Ferreira é o mestre cervejeiro encarregado de manter a qualidade da bebida
Quem prova um dos dez estilos de cerveja produzidos pela Kiezen Ruw pode sentir o sabor do malte e demais ingredientes, mas, na verdade, tem um só sabor: Guabiruba. A cervejaria foi fundada há cerca de seis anos, e seu início foi à moda artesanal. Maurício Gonçalves de Oliveira, de Florianópolis, foi morar em Brusque para trabalhar como médico. Mas além da Medicina, ele também tinha como paixão a produção da bebida em casa, apenas para consumo entre amigos. Já casado com a brusquense Roberta Albani Ruzinsky Gonçalves de Oliveira, o médico resolveu abrir uma cervejaria. Ele já havia comprado um sítio no bairro Planície Alta, em Guabiruba, à esta altura. “Ele fazia a cerveja em casa, mas se animou a abrir a cervejaria. Pesquisamos a qualidade da água, e o resultado foi muito bom. A água da Planície Alta é muito pura, de alta qualidade, então não tivemos dúvidas de que abriríamos ali”, conta Roberta. Hoje, o casal vive em Florianópolis, mas abrir a fábrica noutro endereço sequer cruza o pensamento deles. Roberta afirma que o plano para o futuro é manter a cervejaria como está: pequena e aconchegante. O mestre cervejeiro Marcelo Alexandre
Ferreira é o responsável pela produção. Na fábrica, são feitos os estilos belga, americano, inglês e alemão. São dez tipos ao todo, servidos tanto no pub próprio quanto em outros estabelecimentos. O pub da Kiezen foi aberto há cerca de um ano e já é um sucesso. Localizado numa região de pouco acesso, atrai cerca de 200 pessoas aos sábados. Nas sextas, a clientela é menor, mas significativa. O velho estilo à moda de Guabiruba de um local pequeno, boa bebida e muita conversa persiste, ainda que a Kiezen já seja conhecida em todo o estado. Prova desse sucesso é que, aproximadamente, 70% do que é produzido vai para Florianópolis. O litoral e Joinville correspondem a 15%, enquanto que o restante fica em bares de Guabiruba e Brusque. Ferreira conta que o público é bastante variado, e as cervejas outrora conhecidas de um seleto número de pessoas já são mais apreciadas. “Hoje, há uma procura muito grande pela americana ipa e a apa. As americanas são muito procuradas pelo amargor e o gosto frutado que têm”, afirma. Pessoas de vários lugares procuram a Kiezen Ruw, que faz parte da Rota da Cerveja na região. Até mesmo gente do Nordeste do país visita o lugar.
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vejas é resgatada pela atual geração
Pelo prazer de beber veja hoje, amanhã tu fazes de novo e não tem mais o mesmo gosto, sempre altera um pouco”, afirma Kowalsky. Hoje, eles já produzem cervejas de vários tipos, como bock, weizen, entre outros, além da tradicional pilsen. “Muita gente ainda não tem conhecimento desses inúmeros estilos de cerveja”, afirma Kohler.
ANIJU FOTOGRAFIAS
A Kiezen Ruw influenciou muitos guabirubenses, que nas suas dependências fizeram curso para aprender a produzir a cerveja. Foi assim que nasceu o Fünf Freunde, grupo de Valentin Kohler, João Antônio Covastky, conhecido como Kowalsky, Amilton Cardoso, Alcides Seubert e Wilson Koehler. O primeiro a se interessar pela arte de fazer a bebida foi Valentin. Ele fez um curso na Kiezen Ruw e depois convidou Kowalsky. E então vieram os demais. Em 8 de agosto de 2013, eles fizeram a sua primeira panela de bebida. A ideia é reunir um grupo de amigos, bebendo, comendo e conversando. E nada mais. “Não vemos como uma empresa, é um resgate cultural. Por que o que está acontecendo hoje já acontecia nas décadas de 1920, 1930, mas nas décadas de 1960 e 1970, isso foi deixado de lado”, afirma Valentin. Alcides diz que “fazendo a cerveja acaba-se dando mais valor à bebida”. Os cinco se juntam semanalmente ou sempre que possível, em um local especialmente preparado com todos os equipamentos, na propriedade de Kohler. Produzir a cerveja é uma terapia para os cinco amigos. “Podes fazer uma cer-
Histórias marcantes Foi a cerveja que levou os cinco a se aventurarem a ir para São Francisco do Sul, no Norte do estado, para um festival cervejeiro em janeiro de 2014. “Conversamos entre nós: será que vamos ter clientela para a nossa cerveja?”, relembra Kohler. Os cinco amigos, espertos e bem-humorados, resolveram não contar com a sorte. Em vez de apenas levar a sua produção de cervejas e esperar que o público viesse até a sua barraca, levaram o próprio público. Kowalsky conta que encheram um ônibus com amigos e parentes e foram para São Francisco do Sul. A estratégia deu certo. Durante todo o festival, a barraca permaneceu cheia de visitantes, que ao longe já viam a aglomeração.
Grupo de amigos faz cerveja desde 2013
ANIJU FOTOGRAFIAS
momentos de integração
Luan Carlo de Pinho, Anderson Groh e Marco Aurélio Hodecker criaram a Eichenlaub
No bairro São Pedro, a Eichenlaub Bier é um exemplo da nova geração cervejeira da cidade. Marco Aurélio Hodecker, engenheiro civil, Luan Carlo de Pinho, funcionário do setor administrativo, e Anderson Groh, estudante de Engenharia Química, começaram a fazer cerveja há pouco mais de um ano. Tudo iniciou de forma bastante amadora, aprendendo a fazer pela internet. Depois que já haviam “pegado o jeito”, os três começaram a chamar amigos para eventos no sítio de um tio de Hodecker, onde há uma área de festas com espaço. “Os primeiros eventos eram mais amigos e amigos de amigos, era mais controlado. Hoje, não temos mais esse controle”, conta Hodecker. No início, eram 20 ou 30 convidados; atualmente, o número ultrapassa 150. O foco dos três é a comida típica de Guabiruba - o bom joelho de porco, por exemplo -, para harmonizar com as cervejas. Eles já produzem mais de dez
estilos de cervejas, mas a cada evento são servidos de cinco a seis. Hodecker conta que, ainda hoje, fazer cerveja junto com Pinho e Groh é um passatempo divertido, feito aos sábados e domingos. Cada produção leva, em média, 6 horas para ficar totalmente pronta. As conversas com os amigos que vão aos eventos, feitos esporadicamente, a cada 40 ou 50 dias, compensam o esforço. Ele conta que até mesmo pessoas do estado de São Paulo foram à Eichenlaub, além de gente de São João Batista, Nova Trento e outras cidades da região. Ainda que a ideia seja aumentar a produção, os três não querem perder a identidade - assim como a “irmã mais velha” Kiezen permanece na mesma essência. O rancho onde ocorrem as conversas tem mais de 100 anos de história, e a natureza no entorno permanece preservada. O clima calmo e o vento no rosto devem permanecer como um dos atrativos da Eichenlaub.
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Cucas feitas c Voluntários se dedicam há
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erca de 15 pessoas se aglomeravam no canto da cozinha, batendo, mexendo e revirando massa em várias bacias grandes. O entra e sai era constante para dar conta de tanto trabalho. Ainda assim, os voluntários da Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, do Centro, não desanimavam. Nem mesmo o cansaço das várias horas de dedicação não parecia ser um problema. A cena descrita aconteceu no dia 6 de maio, uma sexta-feira à tarde. Os voluntários, que se dividiam entre a cozinha e a organização das mesas tinham que deixar tudo pronto para que, à noite, quando a tradicional Festa de Maio começasse, nada estivesse inacabado. A dedicação podia ser percebida a olhos vistos. A cena se repete há décadas, para essa e outras festas, em vários cantos de Guabiruba. Roseméri Kohler Bohn, Maria Darci Erthal, Evelise Seubert Kohler e Eliane Wippel Kohler são apenas quatro das pessoas que fazem as cucas, tradicional bolo alemão tipicamente consumido no Vale do Itajaí. Nenhuma delas é cozinheira, tampouco são remuneradas para estarem no salão de festas organizando e - literalmente - botando a mão na massa. Fazem por vontade própria, e fazem bem, a julgar pela fila que se formou para comprar as cucas. “Fazemos para ajudar a comunidade, trazer dinheiro para a igreja, para a secretaria e casa paroquial”, disse Roseméri, afirmação que foi repetida também pelas outras três. “Temos que fazer a festa para manter e melhorar a igreja”, completou Evelise. A entrevista ocorreu no meio da cozinha do piso superior do salão de festas. Conseguir reunir as quatro, mesmo que por 10 minutos, não foi fácil. Roseméri saiu atrás de cada uma, pois o trabalho era intenso. Depois de juntas, enquanto contavam sobre o seu trabalho, outras mulheres continuavam a assar, bater, mexer e preparar mais cucas e pães. O trabalho não podia parar, afinal de contas, o público, lá
Equipe que produz e vende cucas na Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro
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com amor e fé décadas para ajudar a igreja
FOTOS ELIZ HAACKE
embaixo, fazia fila para comprar os bolos. Em meio à entrevista, com todas sentadas em cadeiras simples, devidamente “uniformizadas” com seus aventais, ao longe se ouviu uma voluntária entusiasmada que quis deixar sua contribuição à reportagem: “bom para a depressão”, gritou. A afirmação pode não ter comprovação científica, entretanto, a cuca serve como elo entre as pessoas - voluntários e comunidade -, e isso tem seus efeitos benéficos a quem se dedica à igreja com tanto carinho.
Ajuda do coração O grupo é envolvido com os assuntos da Igreja Matriz de Guabiruba. Elas ajudam há anos nas festas e em outras ações que envolvem as famosas cucas. Evelise Kohler é a caçula, já que participa das atividades há “apenas” 10 anos. No ano passado, por exemplo, elas, junto com os demais voluntários, as-
saram mais de 2 mil cucas para uma promoção durante o ano, com o objetivo de arrecadar dinheiro para a nova secretaria paroquial. Os números relacionados a cucas em Guabiruba são sempre grandes, na casa dos milhares. Os motivos são simples: a iguaria alemã é quase unanimidade e a qualidade da cuca da Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro atrai muita gente, inclusive de cidades da região. Na última festa, foram mais de 1 mil cucas vendidas. Os sabores? Abacaxi, nata, farofa, queijo, coco e banana. Não há um preferido, todos saem quase igualmente. Além disso, os voluntários da paróquia também cozinharam mais de 6 mil cachorros-quentes e milhares de outros pratos para os dois dias de celebrações da comunidade. As quatro reconheceram o cansaço. Nem todos aguentam, e não são raros os casos de voluntárias ou voluntários que passam um dia no serviço e desistem. No
Wesley Andrioni, um dos homens que ajuda no preparo das cucas
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entanto, Roseméri, Evelise, Eliane e Maria fazem porque sentem no coração o desejo de colaborar. “É gratificante, mas como se diz, nós estamos à frente, envolve muitas pessoas. Queremos agradecer a todos. Porque só nós não conseguimos fazer nada. Quem quiser participar, que se sintam convidados”, afirmou Roseméri. Engana-se quem pensa que a ajuda vem apenas de gente mais velha ou de mulheres. Dentre os voluntários estava Wesley Andrioni, que ajudou na Festa de Maio pelo segundo ano consecutivo. “Ajudo mais pelo amor, não recebemos nada em troca, mas de ver o grande número de vendas, que não damos conta, é muito prazeroso”, disse, entre uma corrida e outra.
Uma semana Quem foi ao salão de festas voltou para casa com a cuca quentinha, pronta para ser degustada junto com um bom café. Mas o que poucos sabem é a dedicação dos voluntários para que a festa desse certo. As cucas eram assadas na hora da venda ou poucos minutos antes, mas a produção havia começado há muito tempo. Roseméri e companhia iniciaram a preparação dos abacaxis e bananas quatro dias antes. Estão previstas novas promoções de cuca neste ano. As quatro voluntárias e os demais já estão comprometidos com a causa. Desta vez, o objetivo é arrecadar dinheiro para o salão de festas e para a casa paroquial.
Formam-se várias filas à espera das famosas cucas
Na ordem, Maria Darci Erthal, Roseméri Kohler Bohn, Evelise Seubert Kohler e Eliane Wippel Kohler na cozinha
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FOTOS ELIZ HAACKE
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Dona Renata Schumacher Kormann administra o restaurante conhecido pelo famoso marreco recheado
Rosana Mannrich faz handkäse há quase 40 anos para a família
Sabor dos antepassados Culinária alemã com toque caseiro atrai visitantes de todo o país
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uem conhece a culinária alemã sabe que se trata de uma cozinha rica, à base de carnes e batatas, com muitas variedades de sobremesas e bolos. Em Guabiruba, muitas donas de casa e o tradicional Restaurante Schumacher continuam a servir as iguarias. Um dos pratos mais conhecidos da culinária germânica é o marreco recheado. Fazê-lo pode parecer fácil à primeira vista, contudo, somente quem tem o dom - vindo dos antepassados -, sabe colocar aquele sabor especial. O Schuma, como é mais conhecido o restaurante, é famoso Santa Catarina afora. O restaurante serve, dentre outras coisas, o marreco recheado, seu carro-chefe, e tornou-se referência em culinária alemã na região. Renata Schumacher Kormann, proprietária do estabelecimento, conta que a comida faz sucesso principalmente com gente de fora. “Nosso forte é gente de Brusque, Florianópolis, Balneário Camboriú, Gaspar, essas pessoas nos vi-
sitam durante a semana, e também de Guabiruba, claro”, conta. O Schuma atende há mais de 60 anos, sendo que há quase 44 Dona Renata o administra. Ela conta que é bastante corriqueiro que pessoas de longe procurem por ela, mesmo ela não os conhecendo. Ela lembra que, recentemente, um homem de Fortaleza (CE) esteve na cozinha do Schuma pedindo pela “Dona Renata”. Ele havia conversado com outro cearense, que esteve no restaurante. Quando soube que o companheiro iria a Balneário Camboriú, logo lhe recomendou que procurasse pelo Schuma, em Guabiruba, e pela simpática proprietária. Já idosa, Dona Renata não consegue mais atender tanto quanto no passado, para sua tristeza. “A idade está aí, eu tenho pena, porque eu gosto de lidar com o público. Meu Deus, como vem gente de fora, até do Rio de Janeiro e São Paulo!”. Se depender do público, no entanto, o restaurante continuará. Até hoje, os almoços têm casa cheia.
Queijinho de mão A culinária alemã tem alguns pratos simples e, ao mesmo tempo, saborosos. É o caso do handkäse feito por Rosana Mannrich. Em bom português, a iguaria significa “queijinho de mão”. Tradição familiar, a cozinheira faz até hoje para as filhas, Tamara e Cláucia, e para o marido Mário. “A minha mãe fazia isso, e desde que eu casei, há 38 anos, eu faço handkäse”, conta Rosana. Ela também faz handkäse para a Pelznickelplatz, a Casa do Pelznickel, na época de Natal. Feita com queijinho e sem precisar ir ao fogo, a comida é fácil de fazer e integra também as cestas de café colonial que Rosana prepara para vender. A cozinheira é conhecida na cidade pelo talento na hora de fazer não só o handkäse, mas também as cucas e outras comidas. O segredo para manter a tradição e agradar o público é um só: “Tudo que eu faço, coloco o carinho e o meu amor para aquela pessoa que estou levando. É por isso que fica tão gostoso”, afirma Rosana.
Handkäse Ingredientes: • 500g de queijinho • Sal a gosto • Pimenta moída
Modo de fazer: Amassar com a mão todos os ingredientes juntos; Dividir a massa em bolinhos e formatá-los com as mãos (no tamanho da sua preferência); Deixar pelo menos 8 horas descansando em uma tábua, com um pano por baixo e por cima, para que a água seja sugada pelo tecido; Rosana indica esperar cerca de dois dias, que é quando fica mais saboroso;
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Márcio e Ivan ajudam na preparação da polenta com galinha
delícias da infância Grupo se especializou em preparar comida italiana paras as igrejas
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uabiruba é reconhecida por ser majoritariamente alemã, mas, pelo menos na culinária, os guabirubenses têm o coração dividido. Um grupo de voluntários é famoso pelas massas italianas que faz. As receitas foram aprendidas com os pais, na infância, e ainda hoje conquistam o paladar da população. Márcio Colombi, natural de Botuverá, mas morador de Guabiruba há 13 anos, é o “líder” do grupo. Juntos, eles fazem comida italiana em paróquias da região. A polenta com galinha velha ou o aipim com bacon são quase uma unanimidade. Colombi aprendeu a cozinhar com a mãe quando era criança e morava no Lageado, em Botuverá. “Às vezes eu ia junto ajudar a mãe nos casamentos que ela fazia. Ajudava fazendo de tudo: macarrão caseiro, orelha de gato, etc. Dos homens, fui eu que mais herdei esse gosto. Somos em 11 irmãos, e todos cozinham”, conta.
Como herança, ficaram algumas das receitas à moda antiga. “Não uso máquina para cortar frango, corto tudo na mão”, revela. A tradicional polenta cortada na linha é uma das iguarias feitas por Colombi - e pedida por muitos. É por isso que ele, assim como Ivan, André, Ernesto e outros, é voluntário. Não ganham um tostão para ir às igrejas fazer comida italiana, mas vão porque gostam, como uma forma de agradecimento à comunidade. Colombi faz polenta na Capela Nossa Senhora da Imaculada Conceição, no Jardim Maluche, em Brusque, há 26 anos. Em Guabiruba, faz mais de uma década que, junto com os colegas, participa das festas em diversos bairros. Ao falar de comida italiana em Guabiruba, o primeiro nome que vem à cabeça é o de Colombi. Há sete anos, ele também realiza a Festa Italiana, que em 2017 foi no dia 20 de maio, com o objetivo de perpetuar a
cultura italiana e integrar a comunidade. “Dá muito trabalho, cansa muito, mas é a alegria e o dom de cozinhar. Às vezes, eu levanto e penso ‘não vou mais’, mas aí não vejo a hora de estar cozinhando de novo”, conta, aos risos. Ainda que tenha recebido o conhecimento culinário da mãe, Colombi também “inventa na cozinha” e muda um pouco os pratos quando é possível. Ele gosta de usar queijo colonial. Achar o produto não é fácil, mas ele tem conseguido. Os queijos encontrados nos mercados, argumenta o cozinheiro, não são tão bons. Nas festas, os pedidos variam, mas, de modo geral, a boa polenta com galinha velha, o aipim com bacon e o macarrão lideram a preferência do público. Colombi ressalta que há uma equipe por trás da preparação destes pratos. “Sozinho ninguém faz nada, eu estou à frente, mas é só pedir que eles estão comigo”. Ivan Schlindwein, de Guabiruba, tem
sobrenome alemão, mas o estômago, pelo menos, é italiano. Assim como Colombi, faz parte do grupo folclórico Tutti Buona Gente (Todas boas pessoas, em português), e há sete anos ajuda nas festas fazendo a boa comida italiana. “A minha história com a comida vem de muito cedo, de criança, ajudando a mãe em casa. A gente foi crescendo e gostando. Fomos convidados a ajudar nas paróquias, então estamos fazendo direto a comida”, diz. Schlindwein reveza-se com os demais do grupo para mexer o panelão de polenta. Exige força, resistência e não é fácil. O trabalho não remunerado, no entanto, é motivo de confraternização entre as pessoas da cozinha e de felicidade para ele. “A gente não ganha em dinheiro, mas, em compensação, ganha saúde. A recompensa vem através de Deus, por isso somos voluntários e fazemos por amor”, afirma Schlindwein.
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Agricultura familiar é importante componente da merenda escolar
Comida que
Pecuária e agricultura alimentam as
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agricultura e a pecuária são, historicamente, a fonte do alimento do guabirubense. Muito antes dos pubs, cervejarias e restaurantes, a população local criava e plantava o que iria para o prato dos filhos, com a roça para subsistência e os animais para o abate e para o leite. Essa cultura perdeu adeptos, mas ainda persiste. É comum, ainda hoje, os encontros entre amigos para uma porcada, com linguiça, morcilha e o torresmo, apro-
veitando tudo que os animais podem oferecer. As delícias não param por aí: o queijo artesanal, feito em casa, não pode ficar de fora do café da tarde. No entanto, mais do que a produção caseira, as atividades garantem alimentos para as novas gerações. Cerca de 30% do que é usado para fazer a merenda escolar nas creches da rede municipal foram produzidos por agricultores familiares da região, boa parte deles de Guabiruba.
Segundo a prefeitura, foram investidos 44,81% dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) na agricultura familiar. Em números reais, corresponde a R$ 135,8 mil. Tarcísio Decker, pecuarista do bairro Guabiruba Sul, foi o primeiro a aderir ao programa. Ele fornece queijo colonial, leite e queijinho para as escolas e também tem uma marca própria, que leva o seu sobrenome. Ele tem vacas de leite em sua pro-
priedade, e também planta milho, para fazer a silagem. Decker diz que a agropecuária representa a sua vida. “Para falar a verdade, trabalho com isso desde criança. Depois, casei, e mantive animais de leite. É praticamente a vida inteira, são mais de 50 anos trabalhando com isso”. Decker se sente orgulhoso ao ver as crianças se alimentarem com o queijo que ele produziu. Ele tem um neto na Educação Infantil, por isso o trabalho
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Tarcísio Decker fornece queijo colonial, leite e queijinho para as escolas
Aos 79 anos, Jorge Dirschnabel se orgulha de ainda trabalhar na lavoura
vem da roça
crianças das escolas do município é motivo de ainda mais orgulho para o pioneiro morador do Guabiruba Sul.
Tudo que se planta cresce A agricultura também é motivo de integração e desenvolvimento para a cidade. Os agricultores Jorge Dirschnabel e Marcelo Wippel são orgulhosos de seu trabalho. Dirschnabel, 79 anos, é um exemplo da perseverança da agricultura em Guabiruba, uma cidade majoritariamente in-
dustrial hoje em dia. Prestes a completar 80 anos, ele não quer nem ouvir falar de largar o cabo da enxada. Dirschnabel planta aipim e entrega aproximadamente 2 mil quilos para a merenda escolar. Tudo dá muito trabalho, mas ele mesmo planta e só precisa de ajuda na hora de descascar e empacotar os vegetais. “Meus filhos me falam para sentar na sombra e colocar a perna para o alto. Mas eu falo para eles que carro velho no ran-
cho termina de enferrujar, não posso ficar parado”. A família dele cresceu ao redor da agricultura, e não é à toa que a atividade é muito importante para o senhor. Marcelo Wippel, 33 anos, produz arroz integral e branco para o programa de agricultura familiar. Ele planta em sua propriedade no Aymoré cerca de 10 hectares de arroz, o que totaliza aproximadamente 10 mil quilos por safra. Mensalmente, Wippel leva 900 quilos de arroz para a prefeitura usar na me-
renda dos pequenos. A agricultura, e o fato de poder, literalmente, ajudar no futuro de Guabiruba, também é motivo de alegria para ele. “A agricultura vem de pequeno, está no nosso sangue, então você ver a planta crescendo e o resultado final, nos pratos das crianças, é muito gratificante”, afirma Wippel. Ele cresceu trabalhando no campo, desde antes dos 15 anos. Tanto a família materna quanto a paterna são de agricultores, e ele busca manter esse legado.
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Tradição de
Costume de sair para beber antes do FOTOS ELIZ HAACKE
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ezava a tradição regional, e não se sabe exatamente o porquê, que quinta-feira era o dia de “o homem sair para beber”. O costume, hoje em dia já ultrapassado diante de um mundo moderno, deu origem a três pubs em Guabiruba. Assim como os “pubs originais” britânicos, o Gurmàn Selective Pub, o M’s Gourmet Pub e o Schweigert Bier Pub têm foco na cerveja e na comida de bar. Com uma tradição cervejeira de dar inveja a grandes cidades, Guabiruba já desenvolveu um público que anseia pela boa bebida, que vai além da simples cerveja pilsen. Em comum, os três pub têm a sua origem: os proprietários eram pessoas que faziam cerveja artesanalmente. Para aproveitar a oportunidade, juntavam amigos para “tomar uma gelada e bater um papo”. Aquilo que era um passatempo tornou-se coisa séria e hoje, dois deles já funcionam para atendimento ao público, o outro inaugurará em breve. Ainda que tenham deixado de ser essencialmente artesanais, os três estabelecimentos mantêm como missão principal a boa conversa e a descontração entre a comunidade.
Da degustação ao profissionalismo O Gurmàn é o mais conhecido entre eles. O ambiente foi pensado com cuidado para garantir o estilo de pub. O proprietário Cledson Kormann entrou em contato com o mundo cervejeiro em casa. Assim como tantos outros guabirubenses, ele tinha como hobby fazer a própria bebida. “Comecei fazendo cerveja caseira, artesanal. Depois de um tempo, passei a lecionar cursos de produção de cervejas. Aí fizemos um lugar aqui, bem pequeno, para degustá-las”, conta Kormann. Quando fez o primeiro espaço, no mesmo endereço, na rua dos Imigrantes, logo na entrada da cidade, Kormann já assessorava algumas cervejarias e amigos na
Cledson Kormann lecionava cursos antes de ter o pub
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quinta-feira
fim de semana dá origem aos pubs
fabricação da cerveja. Assim como os outros, ele faz parte de uma geração de cervejeiros que nasceu nos últimos sete anos. “A coisa evoluiu naturalmente para um pub, com foco na cerveja”, diz Kormann. O bate-papo e a boa bebida começaram a atrair cada vez mais pessoas, e o pub passou, inclusive, por reformas e ampliações desde que iniciou suas atividades, em 2015. O horário de atendimento é diferenciado: quintas-feiras à noite e sábados durante o dia. O motivo não podia ser outro: quinta foi escolhida por ser um dia no qual tradicionalmente os homens saíam com amigos. Hoje em dia, o público é composto tanto por homens quanto por mulheres. Kormann conta que às quintas, geralmente, a clientela é mais masculina, enquanto que no sábado há muitos casais e até mesmo famílias. A comida é escolhida para harmonizar com um dos sete estilos de cervejas - servidas na pressão (chope). Atualmente, o Gurmàn não produz mais a bebida no mesmo espaço, mas, segundo Kormann, há um forte controle para que a receita seja seguida à risca.
Hobby que virou negócio
Maicon e Maurício Cruz abriram o pub, inicialmente, para atender os amigos
Na rua dos Imigrantes, pertinho do portal de entrada da cidade, há o M’s Gourmet Pub. O estabelecimento nasceu em 2016 graças ao hobby dos irmãos Maicon e Márcio Cruz de fazer cerveja caseira e chamar os amigos para boas conversas. O passatempo dos irmãos de fazer a própria cerveja foi ganhando envergadura. Os amigos e familiares já sabiam do hobby e os procuravam. Foi aí que veio a ideia de criar um pub. O espaço para festas já existia, pois o terreno é relativamente grande. O que precisou foi da força de vontade dos dois. Não demorou para que o M’s começasse a funcionar. O horário de funcionamento? Somente quintas-feiras. No início, era fechado ao público masculino, mas hoje é frequentado também por mulheres. A clientela mudou, mas a
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essência de tratar todos como amigos e manter um “clima caseiro” ainda permanece e é cultivado. Atualmente, o M’S não produz mais a própria cerveja, mas compra da Kiezen Ruw, também de Guabiruba. “Os nossos pratos são gourmet, mas diferenciados, para um público que gosta de consumir uma cerveja e uma culinária de boteco”, afirma Maicon.
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Hilário Schweigert aprendeu a fazer cerveja e reúne amigos regularmente
Caldeirão de sabores O Schweigert Bier Pub, localizado no Aymoré, abrirá ao público somente em setembro. No entanto, o espaço está praticamente pronto. O proprietário Hilário Schweigert recebe, por enquanto, apenas amigos para tomar cerveja e conversar. A história do futuro pub teve início há uma década. Foi quando começou a fazer licor de guaco e limãozinho, cachaça tradicional na região. “Era a bebida dos meus avós. Eles iam para a roça buscar trato e quando chegavam em casa molhados, minha vó fazia esse limãozinho caseiro, para não ter hipotermia”, conta. Schweigert chamava os amigos quando fazia a bebida. Juntos, faziam um mutirão para espremer a fruta e fazer a cachaça. Depois, a conversa e a cerveja rolavam por horas. Afeito às tradições familiares, o guabirubense se interessou, também, pela produção cervejeira. “Apareceu o festival de cerveja em Guabiruba há alguns anos. Fiquei interessado. Eu faço limãozinho, cachaça e guaco, por que não fazer cerveja?”, conta o produtor de bebidas, que se inscreveu e fez um curso online para aprender o ofício. “Elaboro todas as minhas receitas. Minha pilsen é diferente de todas as outras. Mas o meu carro-chefe é uma que faço com baunilha. Por que baunilha? Porque ela tem um aroma bom, é anti-inflamatória, botamos coisas boas na cerveja”, conta. Schweigert gosta de inovar nas suas receitas e nem sempre segue a Lei da Pureza Alemã de 1516. “Tem gente que diz que sou o bruxo do caldeirão”, comenta, em tom de brincadeira. Rapidamente, ele trocou a panela de 20 litros por uma de 150. Os amigos também embarcaram na ideia e os encontros para fazer a bebida - e tomar, é claro - tornaram-se semanais
ou até bissemanais. Ele passou a receber solicitações de gente que também queria participar dos encontros. “Eu já tinha um quiosque, fazia uma carne e chamava o pessoal. Mas
sempre tinha aquele que falava que não tinha convidado. Então, me deu a vontade de abraçar mais gente que também gosta desse tipo de bebida”. A construção do pub está na fase final,
assim como a legalização. A previsão é que em setembro ele passe a atender o público. A ideia é que abra de terça a domingo, mas as quintas devem ficar reservadas para os homens.