Por trás do voluntariado Um retrato cruel, porém sensível, da importância de quem ajuda a remediar o abandono dos isodos que vivem no Amparo Santa Cruz
Um rio que agoniza
Metade das águas do Rio Gravataí está inutilizável. Segundo análises da Corsan, oxigênio é inexistente no local
Em tudo achai graça Gênero batizado de “Humor Gospel” arrebata milhões de seguidores nas redes sociais e em shows de stand up
CARTA AO LEITOR
Focados 4
de agosto de 2015. Tocou a sirene. Eram 19h28min no adiantado relógio da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS. Entramos todos, de peito aberto e smartphones em riste. O Jornalismo Especializado à espera. Começava, de vez, mais um semestre. Juan Domingues e Almir de Freitas, os professores, nos conduziram durante quatro meses para a preparação das reportagens que agora preenchem esta revista. Um processo rico, divergente e convergente. Quem se acostumou a falar de bolsa de valores contou história rural. Uma outra que não vivia um dia sem opinar de futebol viu-se, então, reportando uma pauta de polícia. Tudo sem aviso prévio. A ideia era abrir horizontes e preparar para um mercado volátil, incerto e, acima de tudo, exigente. Ninguém se escondeu. O desafio foi aceito. Na versão final da Revista Foco, aparecem as influências do nosso tempo e dos tempos que queremos encontrar ali adiante. O YouTube e os streamings como ferramentas de comunicação, desbancando os meios tradicionais. Revolução. Os nerds de outrora, hoje geeks, ditam moda e são tendência Pop. E o standup gospel, já ouviu falar? Pois existe e arrasta multidões. O jornal Boca de Rua, que transforma a vida de quem não tem onde morar, completa 15 anos. O jornalismo social, tão importante, não ficou de fora. Ao contrário, tem protagonismo: feminismo, cotas raciais, violência contra negros, abandono de idosos, preocupação com o meio ambiente. Tudo isso está documentado. Está focado. Nós, alunos-repórteres, ligados às mudanças, acreditamos em um mundo baseado nos Direitos Humanos, no respeito às diferenças. E acreditamos, sobretudo, no poder transformador do jornalismo. Fora o resto todo, que de resto não tem nada: uma rapaziada inquieta que deixou de lado as motivações pessoais e trabalhou em equipe. O resultado está todo aqui ao alcance da próxima página. Saímos dessa maiores e mais leves. E especializados em deixar de lado o receio e fazer um puro jornalismo. Aproveite a leitura! Seja bem-vindo!
Projeto Gráfico: Camille Rocha, Julia Lazaretti dos Santos e Lauriane de Castro Belmonte Supervisão: Almir Penha de Freitas e Juan de Moraes Domingues Reportagens: Aline da Silva Possaura, Felipe Silva Menezes, Maria Karolina Soares de Souza, Tamiris Alana Candido de Souza, Cassia Marques Martins, Elisa de Souza Pegoraro, Marina Castaldelli Spim, Rafaela Santos de Souza, Anderson Fonseca dos Reis, Laís Maria Escher, Letícia Bay de Almeida, Pedro Henrique Abdala Pinheiro, Lucas Lagni Cancello, Matheus Beling D’Avila, Pedro Zandomeneghi, Viviane Farias Helm, Marcos Antônio Júnior, Maicon Hinrichsen Baptista, Aline da Silva Possaura, André Taquari, Nunes Fagundes, Raquel Baracho de Borges, Ana Paula Silva de Abreu, Carolina Estivalet Zorzetto, Nathalye Lucas Miranda, Gisele de Lourdes Pereira, Isabella Ferreira Pereira, Nathalia Gaieski, Carolline Viana Bernardes, Cristina Fragata dos Santos, Eniederson Farezin Miranda, Sthefanie Floriano Bernardes, Bruna Reis, Gabriela Giacomini Pinto, Nathalia Hamme Pádua, Thiago Silva de Oliveira, Victória Citton
Site: revista-foco.wix.com/portal
Pontifícia Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS - Av. Ipiranga, 6681 Partenon Porto Alegre/RS CEP: 90619-900 Fone: (51)3320.3500 Prédio 7 - FAMECOS
EXPEDIENTE
Edição: Douglas Lacerda, Giovane Gonçalves Santayana e Karoline Leandro Santos
Sumรกrio
Pg 36
06_ Diversidade na cena cultural 10_ O som da Cidade Baixa Pg 68
Pg 26
bairro Menino Deus
46_ Mapa da violência no Brasil
14_ Cultura nerd dita tendência na capital
48_ Insegurança até na sala de aula
16_ Em tudo achai graça
50_ Gravataí - um rio que clama por ajuda
18_ As temáticas de gênero na sociedade
54_ Porto Alegre recicla apenas 3% dos
20_ Plataforma digital invade a comunicação
24_ Por qual caminho seguir?
resíduos produzidos diariamente
56_ Zona rural em xeque 58_ Quinta da estância se prepara para a primeira colheita de oliva
26_ Mercado pet
60_ Chuvas prejudicam safra de fumo
30_ Cada um com seus direitos
62_ Tecnologia e sustentabilidade
32_ Quinze anos do Boca na Rua
64_ Vida mais saudável
34_ O que mudou com as políticas de cotas
66_ Carreira e preconceito na arbitragem
nas universidades
Pg 50
44_ Insegurança preocupa moradores do
12_ Turismo criativo: além da selfie
22_ Da posse à portabilidade
Pg 06
42_ Juntos somos mais fortes
36_ Por trás do voluntariado
68_ Bairro tricolorado 70_ Horizonte mais curto
Grupo MA Companhia realiza espetáculo com tradução em Libras e audiodescrição
Cultura
DIVERSIDADE Na cena cultural Texto: Letícia Bay Fotos: Divulgação
Peças de teatro com recursos de acessibilidade ganham força em Porto Alegre com espetáculos que utilizam audiodescrição e tradução em Libras, promovendo a inclusão cultural, a participação de pessoas com deficiência no cenário artístico, além de quebrar paradígmas e e padrões estabelecidos nas narrativas ficcionais
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omo uma forma de inclusão e valorização da diversidade na cena cultural de Porto Alegre, as companhias de teatro estão investindo cada vez mais em peças com recursos de acessibilidade, como por exemplo, interpretação em Libras (linguagem de sinais) e audiodescrição, quando os atores narram o que se passa em cena. Segundo os últimos dados do Observatório da Cidade de Porto Alegre (Observa Poa), atualmente existem mais de 300 mil pessoas com algum tipo de deficiência em Porto Alegre, o que representa quase mais de 20% da população, o que torna importante facilitar o acesso aos diversos meios culturais e socioeducativos. Das deficiências investigadas, a visual é a que apresenta um valor mais expressivo, com 17,73% dos casos. Já os com deficiência auditiva representam 5,73% dos casos. As companhias responsáveis pela produção cultural da Capital buscam contribuir cada vez mais para que esses grupos possam participar das atividades artísticas e educativas. É o que tem ocorrido com frequência nos palcos da cidade. O grupo Signatores, que atua há cinco anos, trabalha só com atores deficientes auditivos. A equipe já recebeu diversos prêmios, entre eles o Concurso Décio Freitas da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre. Recentemente apresentou o espetáculo Alice no País das Maravilhas, no Centro Histórico Cultural Santa Casa. A peça é apresentada para surdos, com acessibilidade aos ouvintes.
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A diretora da peça Adriana Somacal, explica que o objetivo é produzir um teatro que seja acessível para todos os públicos, seja com deficiência ou não. “Usamos este modelo desde a primeira peça porque o importante é fazer teatro para todas as pessoas interessadas, por isso fazemos as narrações além da linguagem de libras”, diz. A Signatores tem como proposta colocar os artistas surdos como principais autores da produção artística. Além das adaptações, a instituição também tenta fugir de estereótipos e padrões de beleza comuns dessas narrativas, ao colocar uma atriz negra, ao invés de loira de olhos claros, para interpretar a Alice. Já na atração É Proibido Miar, da MA Companhia – Teatro, Dança e Assemelhados, os atores utilizaram esses recursos na própria dramaturgia. Os artistas descrevem o que acontece em cena e realizam a interpretação em Libras enquanto atuam. A peça, que é uma adaptação do livro de Pedro Bandeira, de mesmo título, é a primeira produção da companhia. A história contada na encenação tem como tema o respeito ás diferenças. Juliana Kersting, que atua no espetáculo, teve a ideia de fazer a adaptação. Ela conta a narrativa da peça fez com que pensasse em colocar o conceito de diversidade também na interpretação. “Li o livro É Proibido Miar, de Pedro Bandeira, quando tinha oito anos e fiquei com a história do cachorrinho Bingo guardada na minha memória”, lembra. A atriz tem um irmão com paralisia cerebral,
“Eu trouxe a ânsia de falar sobre as diferenças e a vontade de ver as pessoas reunidas em uma mesma plateia” o que fez com que estivesse atenta às causas de inclusão. “Eu trouxe a minha ânsia de falar sobre as diferenças e a vontade de ver todos os tipos de pessoas reunidas em uma mesma plateia e assistindo a um objeto artístico que não precisasse de auxílio exterior a obra”, pondera. Diferente do grupo Signatores, os artistas da MA Companhia não têm deficiência auditiva, por isso tiveram um processo especial de preparação para as encenações, com o auxílio de uma audiodescritora, uma facilitadora em Libras e psicopedagoga, especializada em educação para surdos. Quando a peça estava praticamente pronta, realizaram um ensaio aberto, onde foram convidados consultores
A peça É Proibido Miar tem como tema o respeito ás diferenças
que fizeram observações e apontamentos de pontos positivos e negativos do espetáculo. “Com relação às Libras, gravamos o ensaio e levamos para o interprete Camilo Darsie, que nos deu seu feedback e propôs ajustes na linguagem dos sinais”, lembra. Ainda segundo Kersting,apesar das adaptações o público ainda é formado na sua maioria por pessoas ouvintes e videntes. “Acredito que pelo fato de existirem poucos espetáculos preparados para receber a todos, as pessoas cegas, as surdas, as com necessidades especiais e seus familiares ainda se sentem sem estímulo para assistir teatro ou consumir um produto artístico”, avalia. Segundo a atriz, o uso de audiodescrição permite ainda que pessoas com problemas cognitivos (com Síndrome de Down, Asperger, autismo, dislexia, sequelas de AVCs, problemas neurológicos, etc), possam se beneficiar das atrações. Com a utilização dos sinais, pessoas não oralizadas, porém que escutam, podem vir a aprender alguns sinais para se comunicar. A artista completa dizendo que a deficiência não está nas pessoas, mas no ambiente, na informação e nas atitudes que não estão preparadas para a diversidade, com as adaptações nas apresentações a equipe está acolhendo um público que na maioria das vezes fica a margem dessas atividades. Outras produções com sessões adaptadas ocorreram com Inimigos de Classe, onde forma distribuídos fones de ouvido para audiodescrição, no clássico Tangos&Tragédias, também com audiodescrição e recentemente Sobre anjos & grilos, com audiodescrição e tradução para Libras.
A banda Cattarse, de Viamão, foi a primeira banda autoral a se apresentar em no Rock n’ Bira evento realizado no bar Opinião e que , tradicionalmente, dava espaço para bandas covers
O som da Cidade Baixa Música autoral em Porto Alegre Texto: Laís Escher Foto: Divulgação
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a música autoral à reinterpretação. Essas são duas das subdivisões da cena musical do bairro Cidade Baixa, de Porto Alegre. Quem está no front desta iniciativa diz que o campo é composto, majoritariamente, por festas somente com DJs e shows covers. Nayane Bragança, produtora cultural, afirma que os chamados “dias nobres” da agenda dos bares, que são as sextas os sábados, dificilmente têm programação para artistas com produção própria - com exceção de pouquíssimos estabelecimentos. “Apesar
deste cenário, há espaço para o autoral. Alguns produtores se mobilizam para tornar isso possível e, desta forma, abrir caminho para um maior espaço às bandas e eventos desta classificação”, coloca. O “Autoral Social Clube” é um exemplo de articulação que proporciona espaço para quem quer colocar a produção dos artistas - nem tão conhecidos - nos palcos. O cantor e compositor Tiago Rubens, idealizador do evento, estava com uma data agendada em um bar, propôs ao dono trazer outros parceiros músicos para tocar e fazer uma
Cultura pequena apresentação com cada um. Bibiana Petek, que faz parte da ação, classifica a iniciativa como uma amostra que nasceu sem delimitações e projetos. “Eu colhi muitos frutos com o Autoral (Social Clube). Todo mundo que faz parte colheu, na verdade. Seja pelo crescimento pessoal de ter a oportunidade de experimentar e ver como funcionam certas coisas com o público ou pelo crescimento profissional de parceria e crescimento ao lado dos outros compositores”, considera. “Parece que agora o público está voltando a dar mais atenção para a música autoral. Nos anos 80 e 90, isso já acontecia. Mas ainda assim a Cidade Baixa está meio “morta”, até mesmo as festas. Antigamente, se via a galera até 5h da manhã circulando pelas ruas do bairro nas festas e bares. Hoje, às 3h da manhã, já está tudo vazio”, diz o guitarrista Igor van der Laan. À frente da organização da Stereo Produtora, Nayane conta que as apresentações autorais ainda são eventos isolados. “Há muito mais espaço para bandas covers, pois o público de Porto Alegre ainda vai com mais frequência a esse tipo de show, mas o espaço para artistas autorais está se abrindo gradualmente, por meio de iniciativas singulares de alguns produtores”, avalia. Outras formas de apresentação – que não acontecem somente no bairro boêmio de Porto Alegre - proporcionam ao público e aos músicos experiências diferentes. Bibiana diz que ela e sua banda chegaram a realizar alguns ensaios abertos. “Quando estávamos
ensaiando e divulgando o show do centenário do Túlio Piva, íamos para a praça tocar. Preferíamos isso porque assim não tinha ninguém nos roubando – coisa que muitos bares fazem em algumas situações”, relata. A Cidade Baixa tem sediado diversos eventos de rua. Um exemplo é o “Me Gusta”, organizado pela Revista J’adore, que se apresenta como uma festa, bazar e festival de arte, moda e música. O objetivo dele é revitalizar os espaços urbanos. E a convocação do público é feita essencialmente através do Facebook. O Conjunto Bluegrass Porto Alegrense é um exemplo de banda que oscila entre a rua e as casas de shows. Embora tenha se firmado no ambiente público com a máxima “A rua é de quem está nela”, o grupo também realiza apresentações em bares. Conforme o contrabaixista José Baronio, existe espaço para os mais diversos públicos trazerem bons músicos e sonoridades diferentes. “Por ter bastante espaço, Porto Alegre acaba sendo palco para artistas de outros lugares que não tem como mostrar o trabalho nas suas cidades”, explica. Outro ponto que é unânime entre as bandas e produtores é que a estrutura dos bares não oferece os melhores equipamentos. Já é um hábito dos profissionais levar boa parte da aparelhagem necessária. “Dos estabelecimentos que estão na ativa, poucos têm um suporte bom para os artistas, em termos de infraestrutura, equipamento, acústica, profissionais técnicos de som bem
capacitados e divulgação”, avalia Nayane. Igor van der Laan, da Cattarse, relata que muitas vezes o próprio profissional do áudio contratado pelo bar é resistente ao trabalhar com o formato proposto pela banda. Isso pode comprometer a sonoridade do artista. “Você tem um equipamento que não é muito bom - embora existam alguns poucos bares que fogem desta realidade - e um responsável pelo som que não tem a mínima noção e não dá o suporte necessário e isso compromete o show”, diz Van der Laan. O espaço que outras cidades têm dado para o underground é muito significativo, e, segundo Nayane, há uma certa resistência à profissionalização e padronização dos processos neste espaço. Para ela, alguns músicos e produtores disseram que há uma ‘gourmetização’ do underground. “Penso que não é porque trabalhamos com música independente que não devemos profissionalizar os processos. Ao contrário, devemos trabalhar para cada vez mais aperfeiçoar os nossos eventos e as nossas bandas, a fim de ter processos de trabalho cada vez mais profissionais. E, caso isso signifique ‘gourmetizar’ o underground, que assim seja”, defende Nayane. Contudo, mesmo com dificuldades, a cena da música autoral segue tentando se restabelecer. Produtoras e a força dos próprios músicos têm retirado artistas talentosos do underground para espaços onde todos possam escutar o que de novo está sendo produzido.
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Turismo Criativo: além da selfie
Viajantes são nativos em modalidade pioneira na capital Texto e Foto: Pedro Abdala
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setor de turismo cresce cada vez mais no Brasil e no mundo, bate recordes com um registro adicional de 52 milhões de pessoas viajando pelo globo, segundo a Organização Mundial do Turismo. Com isso, muitas portas abrem-se tanto no campo dos negócios quanto para os viajantes. Com tantas pessoas em idas e vindas ao redor do mundo, o perfil dos turistas também mudou. Os viajantes não querem apenas conhecer os principais pontos turísticos. Eles desejam ir mais a fundo, vivenciar experiências diferenciadas e mergulhar na cultura local. Chegar em Florença e ter uma aula de degustação de vinho; conhecer na prática a arte da capoeira, em Salvador; realizar um verdadeiro tour gastronômico pelo centro de São Paulo; ou, até aprender a afiar facas com um legítimo gaúcho. Essas são algumas das infinitas possibilidades de incrementar os roteiros turísticos, além de voltar com uma bagagem cultural maior e mais profunda. É exatamente esta a proposta do “Turismo
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Criativo”, tendência que já é comum no Exterior, em países como Estados Unidos, França e Tailândia, e começa a despontar aqui no Brasil. Baseado em um programa inovador que visa oferecer aos turistas oficinas e interação com a cultura viva da cidade e as tradições do povo gaúcho, Porto Alegre é a pioneira do Turismo Criativo. O primeiro do gênero organizado no Brasil e que oferece aos visitantes experiências de aprendizagem novas e singulares, de conteúdo local vinculado ao universo da cultura, da tradição, das artes e do ambiente efervescente da metrópole que é o portão de entrada da cultura gaúcha.
Como Funciona? Quem quer propor qualquer tipo de atividade relacionada ao Turismo Criativo precisa ir no site: portoalegrecriativa.info e preencher o formulário que consta na aba “propor atividade” . Após aprovada, a atividade estará exposta no site para a escolha de quem se interessar. Depois de escolher as oficinas e atividades que deseja
realizar, as datas e horários, é só fazer contato diretamente com os realizadores das oficinas e atividades, por e-mail ou telefone, para agendar a participação. Exemplo da Oficina Criativa que ocorreu no The Best Jump, em 22 de outubro, na Sociedade Hípica Porto Alegrense, Zona Sul: “ O som de uma faca sendo afiada parece ter despertado a memória ancestral e o imaginário dos presentes. Pode parecer exagero, mas é o que acontece durante as oficinas. ”, é o que diz o cuteleiro Leandro Riva, convidado pela Secretaria Municipal de Turismo e que ensina ao público interessado a técnica de afiação de facas em pedras de afiar, da mais áspera e comum àquelas que permitem o refinamento da afiação das lâminas. Bastou começar a exposição das facas que Milton João Agnes se aproximou, com curiosidade e a convite do cuteleiro, decidiu experimentar. Logo, o som da faca sobre a pedra começou a atrair mais gente. “Fiquei curioso, porque costumo afiar minhas facas na pedra e não fica muito bom, agora aprendi uma técnica nova em que o fio
Na oficina de cutelaria, os alunos presentes aprendem a afiar corretamente suas facas
fica muito melhor”, garantiu Agnes. O servidor da Secretaria de Cultura, Augusto Constantino, também acompanha tudo. Ele é o responsável pelas atualizações dos programas e publicações de matérias no site Porto Alegre Criativa: “O turismo criativo faz parte de várias estratégias da secretaria de tentar fortalecer o setor. São linhas diferentes daquelas tradicionais referentes às viagens de lazer. O turismo criativo é composto de vivências, interagindo com a população local. É proporcionar que os visitantes tenham novas experiências de aprendizagem, cursos, workshops e outras atividades como tivemos nos últimos dois anos de uma forma bem sucedida. Exemplo foi o turismo criativo feito dentro do Acampamento Farroupilha, com atividades focadas para o tradicionalismo gaúcho. “ Afirmou, Constantino. Aos poucos essa nova modalidade vai tomando forma, apesar de ainda estar na etapa da “invenção da roda”, como o próprio Augusto se refere. Segundo ele, ainda não há possibilidade de fazer uma ação mais forte em todas as áreas. “Mas o que é notório é que há um apelo bastante forte na questão do tradicionalismo gaúcho, pois é diferente, típica da cidade e do Estado e diz respeito ao nosso folclore”, completa o servidor público. Aparentemente é isto o que as pessoas querem ver, as coisas únicas de um lugar, as suas singularidades e costumes. E agora, isto está disponível para qualquer turista.
Cultura
Cultura nerd dita tendência na Capital
Número de participantes em eventos de cosplay dobrou em cinco anos
Texto: Anderson Fonseca Foto: M.B. Ourique
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mercado da cultura nerd sofreu mudanças profundas nos últimos anos. O que antes era visto como um nicho especifico, hoje é o responsável por grande parte do lucro dos estúdios de cinema e das produtoras de conteúdos audiovisuais. As adaptações de histórias em quadrinhos (HQs) em filmes e seriados para a televisão explodiram nos últimos cinco anos. As novas tecnologias afastaram os amantes de Star Wars, super-heróis e literatura fantástica do estereótipo de inabilidade social para colocá-los como figuras que ditam tendências e orientam o mercado da cultura pop. De olho na possibilidade de aumentar o faturamento, muitas empresas estão apostando em produtos, eventos e lojas do setor em Porto Alegre. A cidade já consta em vários rankings das que mais compram livros, quadrinhos e jogos ligados à cultura nerd. De acordo com o último levantamento da Amazon, a capital é o sexto município do Brasil que mais consome este tipo de conteúdo.
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Este dado vai ao encontro da procura crescente dos gaúchos por eventos que reúnem cosplays – pessoas que se vestem como algum de seus personagens favoritos –, workshops e palestrantes internacionais. De 2010 a 2015 houve um aumento de mais de 150% no número de participantes nos dois maiores encontros do estado. A ComicCON RS, que começou sendo realizada em escolas de Porto Alegre, passou de 2.000 visitantes na primeira edição para mais de 5.000 no último ano. O idealizador do projeto, Émerson Vasconcelos, revela que ainda não consegue mensurar a importância da sua criação para o cenário local. ”Ainda me assusta que um projeto tão pessoal meu, pensado para ser um elo entre o público gaúcho e o mercado de quadrinhos, tenha uma relevância crescente no cenário. Em nenhum momento busquei transformar meu evento em um dos maiores da cidade, do estado ou do país, mas isso foi consequência da procura cada vez maior por parte do público”. Já o AnimeXtreme, terceira maior feira multitemática do país, teve mais de 20 mil
participantes nos três dias do evento este ano. Um dos criadores do encontro, Darcy Filho, ressalta que as atrações foram escolhidas com base no que o público pedia através dos canais de comunicação da produtora responsável pelo projeto. “O mercado aqui no Sul está bem aquecido, principalmente em Porto Alegre. Fomos atrás do contato direto com as pessoas. Queríamos saber qual era o real desejo deles. O retorno foi que era necessário um evento maior do que os existentes até então. Assim surgiu o AnimeXtreme, que já está indo para sua 24ª edição”. Aqueles que preferem jogos de tabuleiro, RPGs e games também encontram seus espaços. Todos os shoppings da capital contam com, ao menos, um estabelecimento para suprir esta demanda. O Beco Diagonal, loja inaugurada no início deste ano na Zona Norte, é totalmente inspirada na série Harry Potter. Além de vender artigos para todos os gostos, promove campeonatos dos mais diversos. O proprietário do espaço, Felipe Ohlweiler, conta que há desde combates com naves de Star Wars a
Cosplays dominam os eventos nerds de Porto Alegre
batalhas que podem durar mais de 12 horas no jogo de cartas Magic. “Pensamos num lugar que pudesse servir como ponto de encontro para quem gosta de cards e RPGs. Aquele velho estereótipo de geek e nerd não existe mais. Vem desde idosos que se interessam, sim, por vários itens até crianças que são fissuradas por Harry Potter, Senhor dos Anéis e vários outros filmes de ficção”. Existe até uma opção para os nerds baladeiros. O publicitário Tiago Faccio criou a festa itinerante Woodoo Lounge Party. Ela mistura games, música e toda a nostalgia dos anos 90 em um só ambiente. Pode não parecer trabalho, mas no mundo nerd isso é vida profissional. “Acho que isso diferencia nosso público. Não trabalhamos por simples imposição, mas porque sentimos satisfação naquilo que fazemos, nos divertimos. No meio disso tem um trabalho. É mais que business, é uma filosofia de vida”, afirma Faccio. Os que preferem as compras eletrônicas podem fazer isso através da criação de outro portoalegrense. Alezi Lino Goulart é a figura por trás do Nerd Universe, um dos maiores sites de vendas de artigos nerds do país. Sua loja virtual faturou mais de R$ 2 milhões no ano passado. “Grande parte do nosso fluxo de visitas vem do centro do país. Mas, proporcionalmente ao número de habitantes, o Rio Grande do Sul é o que gera mais lucro pra gente. Comecei com a loja porque, por também me considerar nerd, sentia falta de algo assim. Meus colegas e amigos aprovaram de início e já desde nosso primeiro ano de operação está sendo um sucesso”, comemora Goulart.
Comportamento
Em tudo achai graça
Humor gospel quebra padrões Texto: Cássia Marques Martins Foto: Divulgação
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ma classe de humoristas possui acesso pleno e censura quase livre na abordagem de um tema tão pretendido por muitos comediantes tradicionais: a religião. O gênero batizado de “humor gospel” pode ser contestado por evangélicos tradicionais, mas arrebata milhões de seguidores nas redes sociais e, até mesmo em shows de stand up comedy. Os comediantes são jovens, em sua maioria, assim como o público. Através de esquetes, paródias, charges, memes, apresentações e diversos recursos, fazem humor com rotinas, costumes, ditados e jargões do meio evangélico. Muitas vezes, ele vem em forma de críticas ácidas ao sistema religioso, às interpretações distintas de trechos da Bíblia e aos líderes e artistas do meio, gerando polêmicas e contestações dos mesmos. Por não estar na mídia tradicional, o gênero pode parecer pouco representativo, mas a contabilidade milionária de views prova o contrário. Um dos precursores do humor gospel em esquetes é o advogado e humorista
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Jonathan Nemer. O canal Desconfinados, de sua autoria, ultrapassa 43,5 milhões de visualizações no youtube e seus vídeos aparecem na lista dos mais populares no Brasil. Nemer - que já chamou a atenção de programas como Profissão Repórter e Jornal Hoje - é evangélico, mas ressalta que o canal não possui segmentação. Contudo, grande parte das produções evidenciam temas religiosos, como “5 formas de não paquerar na igreja”, “Circuncisão” e “Oração indireta”. O segmento passou a se consolidar em 2010, quando o humorista cearense Thiago Matso criou o primeiro blog de humor cristão, o Profetirando, inspirado em blogs como Kibe Loco e Não salvo, mas destinado a um público ainda não alcançado de maneira específica. Por ser o pioneiro, herdou também a resistência e as críticas mais rígidas. “Todas as críticas caiam em cima de mim. Hoje não, em cada esquina nasce uma página de humor gospel.” Mas ele acredita que a dificuldade não se limita a comédia de cunho religioso. “O politicamente correto tomou conta de tudo, não se pode mais brincar com ninguém ou nenhum grupo”, comenta.
O comediante, que vive do humor há 10 anos e faz stand up, também fala de temas do cotidiano, como relacionamentos, trânsito e infância. “Mesmo em bares e teatros, procuro não usar palavrão ou pornografia em minhas piadas”, diferencia. O lema “Em tudo achai graça” é uma adaptação do conselho da Bíblia “Em tudo dai graças”. Presente em diversas redes sociais, Matso calcula um alcance mensal de 300 mil pessoas. A marca possui ainda uma loja online com artigos personalizados. A sua peça “Casos e Causos” já foi vista por mais de 100 mil pessoas em todo o país. A cultura gaúcha também é representada no gênero. O Pastor Gaúcho é conhecido entre os evangélicos por suas adaptações de textos bíblicos para a linguagem dos pampas. “Ainda que tua fé seja curta feito coice de porco, nada te será impossível, tchê!”, escreve. O personagem foi criado em 2011, pelo comunicador da Rádio Felicidade Gospel Anderson Alves da Luz. A página do facebook possui mais de 166 mil curtidas e o Pastor realiza apresentações em eventos.
O criador revela que entre os gaúchos, a aceitação foi a melhor possível. “Percebi que não eram só evangélicos que curtiam e compartilhavam, pois além de lidar com a fé, estamos resgatando uma linguagem que se perdeu ao longo dos anos, é algo meio nostálgico”, explica. Ele conta que a maior resistência vem de outros estados. “Quem não conhece nossa cultura acha que é só mais um que faz piada dos cristãos.” Um dos seus inspiradores, o humorista Jair Kobe, criador do personagem Guri de Uruguaiana, avalia essa segmentação como positiva. Para ele, o humor tradicional, principalmente da televisão, apresenta mensagens opostas ao
que os evangélicos pregam. “É um nicho de mercado excelente, com um público cativo muito grande. O humor é um tema universal e utilizar para passar uma mensagem da Igreja é muito bacana”, opina. Ele acrescenta que não apenas o tema religião exige cuidado na abordagem. “Sempre irão existir fiscais do politicamente correto”, analisa. Assim como o Guri de Uruguaiana é um dos maiores embaixadores da cultura gaúcha, trazendo o gauchismo tradicional para a contemporaneidade, Kobe acredita que o humor evangélico possui o mesmo objetivo: “traduzir as mensagens para uma linguagem atual, que atraia os jovens”. A essência desse segmento não é o conteúdo exclusivo para um grupo de pessoas. Para o dono do Profetirando, o que o caracteriza é a leveza, a pureza e o humor limpo para toda a família. Matso avalia como “apelação” o uso de palavras de baixo calão e sexualidade explícita na comédia. Já o criador do Pastor Gaúcho considera que o termo humor gospel não passa de um rótulo. “É um humor sadio, eu não
“Foi-se o tempo em que éramos tachados de quadrados” preciso dizer um palavrão ou fazer uma piada preconceituosa para ser engraçado”, diz. Mas acrescenta que sempre reserva um tempo para promover a reflexão e falar do amor de Deus. “Tem muita gente talentosa nas igrejas, foi-se o tempo em que éramos tachados de quadrados e ultrapassados”, finaliza. No entanto, o uso de assuntos religiosos como matéria-prima para o humor é alvo de crítica por parte de alguns evangélicos e tabu entre lideranças, principalmente de igrejas pentecostais. “O cristão deve seguir princípios de prudência e seriedade quando se trata do evangelho. Não concordo com músicas e mensagens que modificam os princípios bíblicos, mas também discordo das críticas satíricas aos que erraram”, opina o pastor Adelar Blanco, da Igreja Evangélica Assembleia de Deus. O líder é enfático ao acrescentar: “Jesus Cristo nunca foi encontrado fazendo piada”.
O cearense Thiago Matso foi um dos precursores do gênero no Brasil, em 2010
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egundo o Disque Direitos Humanos - também conhecido como o Disque 100 - o Brasil possui o maior índice mundial de violência contra os travestis e transexuais, além de totalizar 40% dos homicídios contra a comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transsexuais e Trangêneros). A ausência de notícias que orientem essa parcela da população e o desconhecimento de informações, fazem com que as vítimas não denunciem tais crimes. Nos últimos 20 anos, as políticas públicas têm contribuído para que os transgêneros sejam reconhecidos, porém, isso acontece através do ponto de vista da patologia, ou disforia de gênero. O judiciário colhe o discurso médico para atestar que a pessoa tem o direito de ser submetida à cirurgia de troca de sexo, ou a retificação do registro civil, caso contrário estará em sofrimento psíquico. Justamente por isso, o assistente social Guilherme Gomes Ferreira afirma que o sistema público não se atenta ao social.
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“A pessoa não está em sofrimento por causa de sua identidade, mas porque a sociedade a violenta o tempo todo”, explica Ferreira, que acompanhou demandas de transexuais enquanto trabalhava na Assessoria Jurídica da UFGRS. Ferreira acredita que as pessoas devem superar as noções que têm sobre a desconstrução dessa identidade. “Não acho que a sociedade vai chegar a um momento que desconstruirá o que é ser menino e ser menina, porque a noção de desconstrução significa que nada será colocado no lugar e que teremos uma sociedade sem gênero”, argumenta. Antigamente, esses direitos eram pensados para pessoas de classes dominantes. No entanto, hoje se trabalha a percepção de que todos os grupos sociais têm direitos particulares e, assim, tenta abranger todos os grupos marginalizados historicamente que desejam afirmar seus direitos sobre essa perspectiva. “Não é de forma homogenizadora, mas equivalente”.
O comportamento éadquirido por meio de padrões comportamentais
Texto e Fotos: Marina Spim
do corpo docente e inserido nas grades curriculares, ou atividades extras escolares. “Os professores não se deram conta de que estão sendo requisitados para lidar com uma série de outras questões”, afirma Ferreira, que promoveu oficinas de gênero e sexualidade em escolas públicas, ligadas ao projeto da ONG SOMOS (que trabalha abordando temas como Direitos Sexuais, Reprodutivos e Direitos Humanos). A violência, a pobreza, a desigualdade social e as diferenças de etnia, raça e sexualidade, que pouco faziam parte do ambiente escolar, hoje em dia fazem com mais facilidade. A pedagoga Mariana Mu trabalha com crianças da Educação Infantil e tem uma visão diferente da maioria dos que já atuam em escolas há algum tempo. Ela acredita que é importante conversar sobre as diferenças e igualdades de gênero de maneira tranquila, sempre propondo questionamentos e reflexões aos alunos. “A principal questão a ser trabalhada é se existem coisas de meninos e meninas. Acredito que não e que apenas há preferências por brinquedos, brincadeiras e cores”, explica. A falta de debates sobre identidade de gênero não permite que alunos se reconheçam no ambiente escolar e promove ainda mais o preconceito trazido de casa, promovido pelos pais e familiares. “Vejo constantemente crianças reproduzindo preconceitos socialmente estabelecidos. Então, as que fogem destes padrões algumas vezes são excluídas”, finaliza.
A performatividade do gênero se baseia na repetição dos atos corporais
tos sobre essa perspectiva. “Não é de forma homogenizadora, mas equivalente”, explica o assistente social. A questão da adequação em um determinado gênero começa muito cedo na vida das pessoas, muitas vezes antes do nascimento de um bebê. A psicóloga Rúbia Dias observa que a separação de gêneros se intensifica anos mais tarde, quando os pais e a sociedade começam a educar as crianças sobre sentimentos e comportamentos, que elas podem ou não ter, dependendo se são meninas ou meninos. “A criança, nesta idade, não tem raciocínio crítico desenvolvido para saber que tais noções de certo e errado são impostas pela sociedade. Logo, se um menino gosta de brincar de bonecas, ele simplesmente gosta daquela brincadeira. São os adultos e a sociedade ao redor dele que colocam nesta brincadeira uma série de pré-conceitos e valores que não lhe pertencem ainda”, afirma Rúbia. Desde Julho de 2014, o combate à discriminação e desigualdade de gênero tem se intensificado com as metas relacionadas ao Plano Nacional de Educação (PNE). Foi proposto o prazo de um ano para que documentos relacionados à educação fossem aprovados, prevendo dez anos de novas condutas. O combate à exclusão, entretanto, vem sendo resistido pelos setores mais conservadores, que relutam em apoiar o Plano. A resistência está além dos cargos de governo, pois o debate de gênero ainda não é pensado com frequência dentro
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Plataforma digital invade a comunicação YouTube se apresenta como uma das novas formas de produzir conteúdo
Os canais Chico Rezende e Cadê a Chave? têm mais de 1 milhão e trezentos mil inscritos
Texto: Thiago Silva Fotos: Reprodução/Youtube
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m 2005, Chad Hurley, Steve Chen e Jawed Karim fundaram um pequeno site, chamado YouTube, destinado a conteúdos rápidos em forma de vídeo digital. O objetivo era torná-lo um eliminador de barreiras técnicas para maior compartilhamento nas redes. Hoje, impactado pelo boom de canais e personagens, deixou de ser uma fonte de instantaneidade para se tornar uma nova plataforma de comunicação na internet. Com o passar dos anos, o site ganhou qualidade, novos elementos e profissionalismo. Regras foram criadas para regular o que os internautas podem, ou não, postar. Vídeos de mortes e pornográficos hoje são proibidos. As músicas, antes livremente utilizadas, foram regulamentadas para que não fossem compartilhadas de maneira ilegal. Direitos autorais, agora, são cobrados. Também ganhou espaço no mercado de trabalho. Nele, é possível gravar, editar, hospedar e compartilhar conteúdo conforme a preferência. Conta com os mais diversos tipos de canais, como os de música, comédia, games, gastronomia, entrevistas, entre tantos outros. O jornalista Francisco Rezende, 30, tem mais de 200 mil inscritos no canal que leva seu nome, onde apresenta diversas esquetes sobre vários temas. “O bom do YouTube é que existe a possibilidade de passar a sua mensagem para milhares de pessoas. Acho que entretenimento sempre ajuda quem está assistindo, nem que seja apenas para ela fugir da realidade que vive.” diz Rezende. Apesar de enfatizar a importância do meio, ele assume que atualmente há outras possibilidades comunicativas.
Tecnologia “A interação do Twitter e a facilidade do Snapchat podem superar ele, mas a mensagem acaba sendo passada de forma mais fragmentada. No YouTube é mais fácil de construir uma mensagem para o público”.
Explosão do Youtube O ápice do sucesso do YouTube chegou em 2006, quando o Google o comprou por 1,65 bilhão de dólares. Hoje, mais de um bilhão de pessoas assistem vídeos por mês na plataforma. O número de horas a cada trinta dias assistidos chega a aproximadamente seis bilhões, o que totaliza quase uma hora para cada pessoa do planeta. Em um primeiro momento, se julgou que o Youtube fosse apenas um hospedeiro para conteúdos amadores e imagens de animais. Com o passar dos anos, adquiriu profissionalismo. No entanto, foi justamente a maneira descompromissada do site trouxe a popularidade desejada por seus criadores. Ele desempenha uma função técnica para os produtores de vídeo, atrai a atenção para os criações alternativas e oferece uma participação em dinheiro nas vendas de anúncios. Atualmente, diversos canais se profissionalizaram e ganharam destaque. Um deles é o Porta dos Fundos, que tem como ideia a criação de vídeos virais para a internet. O grupo chegou a ser levado à televisão, tamanho o sucesso adquirido com suas esquetes satíricas. O contabilista Murilo Cervi tem mais de 1 milhão de inscritos no canal Muça Muriçoca
e já soma 112 milhões de visualizações nas suas produções. Para ele, a plataforma é uma maneira de construir, trocar ideias e experiências. “O YouTube é fundamental na minha vida. Ser convidado por marcas e eventos é extremamente gratificante, pois através deles consigo remunerações para dar continuidade e crescer de maneira profissional”, reconhece.
Novas formas de produzir jornalismo O YouTube também pode ser um terreno jornalístico. Uma reportagem com inovações, interação e liberdade criativa pode ser hospedadas em qualquer canal. O essencial, porém, é construir uma identidade para trazer credibilidade ao material produzido. Todo vídeo - seja filmado com a câmera do celular, sentado à frente do computador ou com equipamento profissional - passa ao espectador uma informação, uma novidade ou uma opinião. Rezende acredita que é importante encontrar a “sua” forma de se comunicar com o público: “O que mais prende a atenção é a forma rápida da edição, cortes, imagens, mudança a cada 5 segundos. Um dos canais que mais chama a atenção nesse formato é o Cadê a Chave. Iniciou como um dia a dia do casal, Nilce Moretto e Leon, mas tornouse um canal de grande conteúdo histórico e relevante. Um dos vídeos que mais se enquadra nesse fenômeno é o episódio 439 chamado A Casa do Terror sobre Auschiwitz, que mostra uma visita deles ao local. Além de imagens impressionantes, o local por si só já conta uma
história, que é aprofundada por Leon com conhecimento sobre o tema. A partir de uma nova forma de interação entre os usuários, surge o conceito de primeira e segunda tela. Ele é baseado na complementação das redes sociais e da mídia televisiva. A primeira tela é o que assistimos, a exibição propriamente dita. Já a segunda é um recurso adicional onde os internautas que estão vendo o mesmo programa interagem entre si. Segundo pesquisas da multinacional Millward Brown, o YouTube ganhou o espaço da televisão e trabalha também como primeira tela. Ainda assim, existem discussões sobre o poder que as novas mídias têm sobre o jornalismo. O papel do jornalista ainda é importante para filtrar a informação, contudo, falar sobre temas tabus de uma forma mais “leve” também está a cargo dos youtubers. Chico Rezende, do canal homônimo, acredita que teremos bons jornalistas na internet no futuro, mas é necessário mensurar a credibilidade da notícia sem uma grande corporação por trás. “A internet está só começando. Apesar de muitas dúvidas sobre onde estaremos daqui a alguns anos uma coisa é certa: o futuro está aqui na internet”, finaliza.
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Tecnologia
Da posse à portabilidade
Plataformas de streaming estão mudando o consumo de música Texto: Nathalia Pádua Foto: Graphic Burger
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esde o início dos anos 2000, a indústria fonográfica brasileira é afetada pela pirataria. No entanto, a entrada das plataformas de streaming de música no país está mudando esse panorama. De acordo com um levantamento divulgado pela Associação Brasileira de Produtores de Discos (ABPD), de janeiro a abril de 2015, a venda digital de música superou pela primeira vez a venda de discos físicos no Brasil sendo que 51% dessa receita vem de serviços de música on demand. Diferente do download, o streaming permite que os usuários ouçam música online sem precisar guardar arquivos mp3 no computador - possibilitando assim que uma faixa seja ouvida enquanto é baixada. Para Rafael Achutti, CEO do Bananas Music Branding, primeira empresa brasileira a fazer curadoria musical dentro destas plataformas, a tecnologia não é novidade no país. “Se considerarmos o Youtube, os brasileiros já estão acostumados a ouvir música via streaming há muito tempo. O que mudou o consumo de música por aqui foi a entrada da
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dinâmica de plataformas musicais no mercado digital”, ressalta. O custo benefício do serviço é o principal motivo que tem levado os brasileiros a assinarem os aplicativos de streaming de música. Enquanto um disco físico ou digital custa por volta de R$30, plataformas como Rdio, Deezer e Spotify custam em média R$15 mensais e possuem acervos digitais com mais de 30 milhões de faixas. Clarissa Wolff, gerente de social media do Deezer no Brasil, acredita que o brasileiro está finalmente começando a entender o valor da música. “Aqui a gente é acostumado à pirataria e ao acesso a todo o tipo de arte de graça. No começo, ninguém queria pagar pelo serviço. Hoje, os usuários compreendem que vale a pena pagar por um conteúdo legal”, acrescenta.
Mudança no consumo de música Além de combater a pirataria, o streaming também está mudando a forma como os fãs se relacionam com a música. Nos aplicativos não é possível salvar faixas, nem mesmo utilizá-
las como despertador do celular, por exemplo. “Hoje a música deixou de ser produto de consumo para se tornar portabilidade. Uma mudança de paradigma importante, pois o que antes era posse agora é acesso”, comenta Yuri Almeida, brand content do Rdio no Brasil. Outro fator que está mudando o consumo de música é a cultura que essas plataformas estão criando em volta das playlists, dando prioridade para as seleções de músicas e deixando de lado os álbuns. “Isso faz com que as pessoas consumam músicas de diversos gêneros. Não existe mais aquela coisa xiita de só consumir um estilo musical, hoje se ouve muito mais música de acordo com o humor ou determinado momento do dia ou situação”, explica Achutti. Prova disto é que segundo o Spotify, as playlists para focar no trabalho e malhar são as mais ouvidas no aplicativo, junto com os tops hits do momento. Como o aplicativo depende da internet móvel, a qualidade do sinal de celular pode ser um problema na hora de ouvir as músicas. Para isso, os serviços do gênero fornecem alternativas para assinantes, podendo salvar as
músicas e ouvir no celular mesmo quando o sinal não estiver presente. Hoje, aproximadamente 80% dos usuários de streaming no Brasil usam a versão free das plataformas. “Grande parte da classe média brasileira possui smartphones com plano pré-pago, isso faz com que ouvir música on demand consuma muitos dados. No momento em que as operadoras fizerem planos de dados mais acessíveis, o Brasil tem potencial para estar entre os maiores consumidores de música digital do mundo”, comenta Achutti.
Um novo formato de mídia publicitária Como apenas 20% dos usuários de streaming no Brasil são assinantes, as plataformas buscam se sustentar através de investidores. Grandes empresas como Gillette, Sensodyne e Philips já fazem parte desse universo. Clarissa explicou o que faz essas corporações procurarem o Deezer: “Música é a forma de arte mais orgânica que existe. Então é natural que ela tenha o poder de conectar pessoas. E, atualmente, isso é o mais importante para as marcas: conexão, relacionamento, identificação”. Nesse sentido, as marcas encontraram no streaming de música um novo formato de mídia publicitário. Associando momentos do dia do seu público alvo à playlists que remetem a seus produtos, as marcas conseguem criar essa identidade musical junto aos seus consumidores. No entanto, Achutti revelou que o trabalho não é simples: “Para manter que os consumidores entrem em contato com a marca, as playlists precisam oferecer um conteúdo relevante e atualizado, do contrário as pessoas irão procurar outras seleções de música”.
Economia
Por qual caminho seguir?
Economistas debatem as maneiras para o Brasil sair da crise Texto e Fotos: Pedro Zandomeneghi
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as últimas duas décadas, o Brasil passou por um período de crescimento econômico. Atualmente, está em crise. As políticas fiscais do governo Dilma não surtiram o efeito desejado e com as previsões de queda do Produto Interno Bruto (PIB), a economia caminha para uma recessão. Afinal, qual é o caminho para sair dessa crise? Quais são as alternativas? O que deve ser feito? Para o economista e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) Gustavo Inácio de Moraes, o momento é propício para o fortalecimento do mercado interno e das exportações. “Nós somos quase 80 milhões, entre classe média e classe alta, o que proporciona um mercado consumidor bastante relevante”, observa. Além disso, o Brasil é um dos líderes mundiais em venda de commodities e, nos últimos anos, aproveitou bem o boom dos preços para alavancar as vendas. Com a alta do dólar, há uma facilidade maior para exportar. Entretanto, as vendas são concentradas em bens primários e há transformação envolvida nesses
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produtos, o que acarreta em alguns problemas. “Essas mercadorias têm um preço bastante baixo no mercado internacional e estão em uma cadeia bastante primitiva”, explica Moraes. Na avaliação do pesquisador e economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE) Augusto Pinho de Bem, seria “o melhor dos mundos” aproveitar a atual situação do câmbio para estimular as exportações e fomentar o mercado interno. Entretanto, esses objetivos são difíceis de serem alcançadas na atual conjuntura econômica. “Uma estratégia de fortalecimento do setor exportador implicaria em redução de custos salariais, dificultando o consumo interno”, ressalva de Bem. “Ou seja, são objetivos que acabam por afetar interesses contraditórios que são de difícil resolução, pois envolvem decisões políticas de grupos de poder que tem interesses diversos”, finaliza. Em um artigo publicado na edição de novembro da Carta de Conjuntura da FEE, a pesquisadora e economista Clarissa Black analisou o saldo da balança de pagamentos do Brasil até setembro deste ano. Apesar do
superávit de U$ 10,2 bilhões, as exportações caíram 16,78% em relação a 2014, graças à queda nos preços das commmodities, pela desvalorização do real perante o dólar e por causa da retração da economia brasileira. Contudo, a queda das importações, que foi de 23,01% e explica o balanço favorável, evidencia a inexistência de políticas econômicas para sustentar um crescimento robusto do país. “E em segundo lugar, reflete a dependência das exportações brasileiras em relação aos cíclicos e voláteis preços internacionais de commodities, além do baixo dinamismo dos produtos manufaturados brasileiros no comércio internacional”, critica Clarissa. O fato dos produtos manufaturados não estarem muito presentes na pauta exportadora pode ser explicado pela desindustrialização do país. Conforme de Bem, esse processo tem relação com a redução de investimentos na economia brasileira, influenciada tanto pelo escândalo da Lava-Jato quanto pela queda do valor do petróleo, que também atingiu a Petrobras.
Apesar de estimular as exportações, a desvalorização do real inibe o crescimento do país
A diminuição da indústria vai ao sentido contrário da necessidade mais latente da economia brasileira no momento: o crescimento. Mas como fazer isso com uma pauta exportadora frágil? Um exemplo de notórios de nação desenvolvida que exporta diversos bens primários é a Austrália, que valoriza e gerencia ambientalmente suas fontes de renda. Por que o Brasil, que possui uma indústria interna com mais potencial, não segue o mesmo caminho? Segundo de Bem, os dois países possuem dimensões geográficas e estruturas econômicas e sociais diferentes. “Caso não amplie a participação do setor industrial e desenvolva tecnologias de ponta, o Brasil está fadado a uma posição periférica na economia mundial, e será dependente dos ciclos dos preços das commodities para apresentar períodos de crescimento econômico acelerado”, prevê. Como o panorama atual não é dos melhores, uma maneira de estimular a atividade econômica, conforme o pesquisador, seria a reativação do mercado interno. Nesse caso, é preciso parar a desindustrialização. Para Moraes, se os bens primários forem valorizados, é possível que o Brasil se desenvolva como uma nação exportadora. Mas para isso, é preciso manter a indústria aquecida para desenvolver e sustentar o mercado interno. “Por ser muito forte, ele acarreta na sobrevivência da indústria em qualquer tipo de situação. Você sempre vai ter demanda por calçados, sempre vai ter demanda por têxteis”, exemplifica. “Quando eu falo em mercado interno a ser explorado, falo do Brasil ter uma economia de consumo em massa, relativamente pujante, de ter demandas, de ter assalariados”, enfatiza.
Economia
Mercado PET Setor ignora crise financeira e segue crescendo no cenário nacional Texto: Matheus d’Avila Fotos: Deise Carvalho e Alexandra Turella
Setor projeta crescimento de 7,4% para 2015 - leve desaceleração comparado ao último ano, quando índice alcançou 8,2%. Expectativa é que lucros ultrapassem a casa dos R$ 18 bilhões. Brasil já é a segunda maior economia do mundo no segmento, atrás apenas dos Estados Unidos.
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Mercado pet está cada vez mais segmentado para atender necessidades dos bichinhos
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m junho deste ano, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou uma pesquisa revelando que, no Brasil, a quantidade de cachorros de estimação já supera a de crianças até 14 anos. Os dados, obtidos em 2013, mostram que, enquanto existem 52,2 milhões de cães em domicílios do país, as crianças não passam dos 50 milhões. Isso sem contar o número de gatos, que ultrapassa os 22 milhões. Os números servem para refletir o tamanho do carinho que os brasileiros têm pelos “bichinhos” e do mercado pet, que vai no embalo desta paixão. Enquanto o setor automobilístico apresenta seus piores números desde 2003, o segmento pet espera crescer 7,4% - pequena desaceleração comparando aos 8,2% do último ano. Se em 2014 o setor movimentou R$ 16,4 bilhões, a expectativa da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet) é que em 2015 seja ultrapassada a marca de R$ 18 bilhões. O momento de instabilidade econômica que o país atravessa definitivamente não preocupa os especialistas. A consultora Kika Menezes afirma que o mercado nacional está em ebulição: “Tem gente do mundo inteiro de olho no Brasil. O grau de confiança do investidor é muito grande”. Se o Brasil é “apenas” a 7ª maior economia no planeta, no setor pet, segundo dados da Abinpet, o país já é 2º maior mercado do mundo, atrás somente dos Estados Unidos. Não é por acaso que a área vem atraindo tantos investidores. A Mars, líder nacional no segmento de rações, já está em fase adiantada para ampliar sua produção nacional em 35%. Outras grandes empresas – como a Nestlé Purina – têm planos semelhantes.
Economia O sucesso, apesar de recente, já rendeu pedidos de abertura de franquias: “A gente ainda não pensa nisso, mas também não descarta”, pondera Andreia. Se a empresa pensar em expandir no futuro, será mais uma entre as mais de 30 mil pet shops do Brasil. No Rio Grande do Sul, o setor cresce 20% ao ano, segundo o Sebreae/RS. Somente em 2012, foram abertas 114 novas pets na capital. A Luxury não é um caso único no setor. Cada vez mais, o mercado pet se segmenta para atender as necessidades dos consumidores. Todo dia surge um novo produto ou serviço
Luxury Spa Boutique oferece serviço diferenciado em Porto Alegre
Mas nem só de grandes empresas vive o mercado nacional. Segundo informações da Comissão de Animais de Companhia do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal (Comac/Sindan), 93% do segmento veterinário está diluído entre pequenos e médios empresários. O especialista em Varejo do Comac/ Sindan, André Prazeres, acredita que a procura esteja crescendo mais rápido do que a oferta: “Isso resulta em alguns profissionais despreparados. O empresário tem que se especializar, tem que entender de gestão”. Um mercado tão forte e em franca expansão é a oportunidade perfeita para quem quer investir em algo diferente. Pensando nisso, as amigas Andreia Tripovichy e Alexandra Turella resolveram inovar. Formadas em administração e apaixonadas por cães, as duas já conversavam sobre empreendedorismo quando, em 2013, Andreia enfrentou problemas de maus tratos com um de seus filhotes. Da insatisfação veio a ideia de investir em um serviço diferenciado. Em meados de 2014, as sócias abriram a Luxury Spa Boutique. “A gente buscou inspiração de fora. Em Porto Alegre não tinha nenhuma. A gente viu algumas em São Paulo, mas nenhuma que chegasse a nos inspirar. Então, o conceito a gente trouxe de fora”, conta Andréia. Além dos serviços tradicionais de banho e tosa, a Luxury oferece serviços de Spa (com direito a ofurô para cães e gatos) e creche (lazer e recreação), além de uma boutique com artigos de luxo. Também está em processo de implantação um serviço especializado de atendimento clínico e veterinário.
para os bichinhos. No Brasil, já se tem mercado de hotelaria canina, carrinhos de bebê para cachorros e fotógrafos exclusivos de animais de estimação. Nos Estados Unidos, existe, por exemplo, serviço especializado em recolher as “sujeiras” que os animais fazem em seus quintais. Se a economia interna do país ainda derrapa, o mercado pet segue alçando voos cada vez mais altos. Como lembra Kika Menezes, a tendência é que o setor siga crescendo por muito tempo: “ainda tem muitos campos inexplorados nesta área”.
Economia
Cada um com seus direitos Contribuintes desejam direitos e benefícios da previdência social Texto e Foto: Lucas Cancello
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epois de algum tempo de contribuição, os trabalhadores têm direitos a receber. Os bens e deveres de cada cidadão são fatores que interessam principalmente para aposentados e demitidos de uma empresa, mas que muitas vezes, passam despercebidos. O longo tempo na justiça preenche o pensamento em outras situações. O dinheiro, que tanto interessa, pode não ser fator fundamental na hora da aposentadoria. Diversas leis foram aprovadas de um tempo para cá, e muitas coisas mudaram. Quando o assunto é aposentadorias, hoje em dia se contribui por tempo de trabalho, sendo o homem por 35 anos e a mulher, por 30. Já o mínimo de idade são 65 anos para eles e 60 para elas. Porém, o fator previdenciário, criado no ano de 1999, inviabiliza algumas situações. Ele faz com que, quanto mais jovem a pessoa se aposentar, menos renda da aposentadoria ela ganhe. Por outro lado, a verba aumenta se o tempo de contribuição do funcionário for maior. O INSS (Instituto Nacional de Seguro Social)
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é descontado do salário do empregado dependendo da faixa salarial. Existem 2 fontes de custeio: a parte paga pelo empregado e a parte que o empregador pagará sobre o que o funcionário ganha, mas que não sai do bolso. Muitas vezes, as dúvidas surgem sobre o dinheiro vindo da empresa, e para isso, podemos verificar se o patrão está pagando a Previdência Social em dia. Neste caso, existe um pequeno “trabalho” até lá. O empregado precisa ir até uma agência do INSS com RG, CPF e o número do PIS (Programa de Integração Social) e solicitar o extrato de pagamento do INSS. A partir daí, se tem a certeza sobre o dinheiro a ser recebido. Foi informado que, a partir do dia 1º de janeiro de 2015, os contribuintes da Previdência Social que recebem um valor acima do salário mínimo, terão o benefício reajustado em 6,23%. O índice foi apresentado em conjunto dos ministérios da Previdência Social e da Fazenda. Em 2014, aproximadamente 10 milhões de contribuintes tinham benefícios acima do piso previdenciário.
Algumas alterações foram feitas na Lei 13.134, recentemente aprovadas pelo Senado e sancionadas pela presidente Dilma Rousseff, que dispõe de mudanças nas leis trabalhistas. Depois de algum tempo, Dilma editou uma medida provisória com proposta alternativa onde a aposentadoria é calculada de acordo com a expectativa de vida da população. O advogado previdenciário Rafael Sterzi de Carvalho, de 32 anos, explica uma regra básica, conhecida como 85/95, de cálculo das aposentadorias por tempo de contribuição que foi estabelecida pela Lei 13.183. Agora, o objetivo é levar o número de pontos alcançados, somando a idade, o tempo de contribuição e o ponto que depende do ano da aposentadoria do segurado. Tendo o aposentado esta soma, será possível receber o benefício integral, sem aplicar o fator previdenciário. Atualmente, a soma da idade da aposentadoria com o tempo de contribuição é de 85, como número total para as mulheres e 95 para os homens. A lei é válida até o ano de 2018.
Contribuinte deseja seus direitos na previdência social
A tendência é que esses valores aumentem ao longo do tempo, considerando a expectativa de vida do brasileiro. A regra deve aumentar, até 2027, quando será 90/100. Segundo o INSS, uma vez aposentada, a pessoa perde totalmente os direitos em receber outros auxílios que lhe são garantidos durante o período de contribuição, mesmo trabalhando normalmente e em todos os dias. Isto acontece porque ela já tem a sua aposentadoria, e não terá o direito de receber nada além da contribuição que já recebe. É o caso da dona de casa Maria Ines Lima, de 57 anos. Moradora do bairro Partenon, ela conquistou a sua aposentadoria pelo fator previdenciário e também não teve direito algum, continuando com os seus trabalhos diariamente em uma loja na zona norte da capital. Maria esperava receber um pouco pelo tempo que ainda está contribuindo, mas ficou surpresa ao saber que não teria seus direitos: “Eu esperava porque já estou aposentada, né?! O fator previdenciário tirou quase metade do meu salário, por isso eu continuo trabalhando. Queria pelo menos ter um benefício futuramente, fiquei um pouco surpresa.” – conclui. Ainda existem os casos em que o funcionário se machuca no seu local de trabalho, por acidente. Neste caso, o advogado civil Francisco Vasconcellos Junior, de 36 anos, explica que é bem fácil o trabalhador trocar de função, por conta da garantia do INSS. Já para o aposentado, as possibilidades são praticamente nulas. “O INSS facilita neste caso, porque ele visa também a segurança do aposentado e preserva os demais funcionários quanto aos riscos da profissão.”
Popular
Quinze anos do Boca na Rua Único jornal do país produzido exclusivamente por moradores de rua completa 15 anos em 2015
Texto e Foto: Gisele Vargas Pereira
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m uma sala escura do Museu de Comunicação José Hipólito da Costa, acomodados em cadeiras dispostas em um grande círculo, aproximadamente 35 pessoas se reúnem. “E então, pessoal, vamos começar?”. Assim, Charlotte Daffol, uma das colaboradoras do Jornal Boca de Rua, dá início a mais uma reunião de pauta do grupo. O burburinho cessa e uma breve apresentação de quem não faz parte do Jornal abrwe os trabalhos. Em seguida, as ideias ecoam pela sala, acolhendo quem chega atrasado. Essa rotina já dura quinze anos. Em agosto de 2000, nascia na Praça Dom Sebastião, nas imediações do Colégio Rosário, em Porto Alegre, um projeto ousado: o único jornal do país pensado, produzido e vendido exclusivamente por moradores e ex-moradores de rua. Idealizado pela Agência Livre para Informação, Cidadania e Educação (Alice), o objetivo do Boca de Rua é construir uma ponte entre esse grupo e a população que já nasceu com o privilégio de ter uma casa. Além de ser uma experiência transformadora, o envolvimento com o jornal legitima as pessoas em situação de rua. As torna cidadãs.
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A jornalista Rosina Duarte, fundadora do jornal e coordenadora da Alice, explica que no grupo não há funções definidas. “O Boca não tem cargo. Ele é decidido pelo grupo, a partir de debates sobre os principais problemas da sociedade, como moradia, trabalho, saúde e preconceito. O jornal é autogestionável e possui regras, que embora nunca tenham sido escritas, normalmente são obedecidas por todos”, afirma. Trimestral e com tiragem de 12 a 15 mil exemplares, cerca de 40 exemplares são distribuídos para cada colaborador toda semana, que o vende a R$ 2,00 e tem toda a renda revertida para si. Para a produção do periódico, Rosina diz que o projeto conta com diversas parcerias. A principal delas é a Federação dos Metalúrgicos, que paga a impressão das edições. Também há recursos adquiridos em eventos promovidos pela Alice e em prêmios conquistados. Rosina lembra que apesar do objetivo central do projeto não ser tirar as pessoas da rua e das drogas, cerca de 40% dos moradores que já passaram pelo jornal melhoraram sua condição. “É um número considerável, se pararmos para pensar que nosso
foco nunca foi é este”, comemora a jornalista. Há oito anos no projeto, Cícero Adão Gomes de Almeida, o Tinga, é um dos integrantes mais ativos nas reuniões. Propõe pautas, expõe problemas e faz sugestões de participações em eventos. “O que o Boca me proporciona? Olha, o projeto já tirou muita gente da rua, mudou muitas vidas. Além de renda e estabilidade, ele me trouxe 50 irmãos e uma mãe muito dedicada”, revela Tinga. Ele é um dos repórteres devidamente identificados com crachás que vendem o periódico nas sinaleiras de Porto Alegre. “Vende mais que Zero Hora e Diário Gaúcho!”, celebra. As reuniões ocorrem nas terças-feiras. Nelas são sugeridas e votadas as pautas, definidas as equipes de reportagem (em torno de três, todas com um acompanhante profissional), anotadas as perguntas e os materiais a serem utilizados. O Boca de Rua dispõe hoje de um gravador e uma máquina fotográfica. “Na verdade são duas, mas uma está estragada”, lamenta Rosina. Após as entrevistas, o material é transformado em texto, com passagem da linguagem oral para a escrita, cuidando sempre a ética e a clareza das informações. “O Boca trabalha com várias
“Mostra o mundo para as crianças e as mostra para o mundo”
Colaboradores do Boca de Rua comemoraram os 15 anos
propostasde pautas, mas, claro, os guris tem preferência por dar destaque à realidade deles”, avisa Rosina. Além disso, o jornal é assumidamente parcial, pois a Alice não acredita na imparcialidade das informações. O projeto já rendeu vários prêmios. Já foi objeto de mais de 50 trabalhos acadêmicos, tem dois livros publicados, duas exposições fotográficas, quatro microdocumentários e participações em grandes eventos, como o Fórum Social Mundial, fora seminários em diversas cidades. Apesar de o jornal ser voltado aos adultos, ele também trabalha com um encarte produzido por crianças em situação de vulnerabilidade social. “Este trabalho mostra o mundo para as crianças e as mostra para o mundo”. As crianças realizam o Boquinha, no entanto não vendem os jornais. “As famílias das crianças têm um ajuda de custo e as mães participam de reuniões mensais”, esclarece Rosina. “O Boca me dá muito mais do que eu poderia dar!”. Essa frase é da Charlotte, mas poderia ser de qualquer um dos integrantes do Jornal. Todos são muito envolvidos no trabalho. Interessados. Responsáveis. Profissionais. “Ao longo dos anos, a minha experiência no Boca me deu outro entendimento da sociedade”, expõe a colaboradora. O grupo não deixa de surpreender seus integrantes. Pelas decisões.
Popular
O que mudou com as políticas de cotas nas universidades Em três anos, 150 mil negros ingressaram nas universidades por meio das cotas. País deve atingir 50% das vagas até 2016.
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m 1997, apenas 2,2% de pardos e 1,8% de negros, entre 18 e 24 anos, cursavam ou tinham concluído um curso de graduação no Brasil. O baixo índice indicava que algo precisava ser feito. Foi sancionada, em agosto de 2012, a Lei das Cotas nas Universidades Brasileiras. Desde sua criação, já ofereceu cerca de 150 mil vagas para negros. O sistema foi projetado pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR). Em 2015, vai completar três anos. No Brasil, desde o período da escravidão até hoje, se passaram apenas cinco gerações. Segundo a socióloga e professora do curso de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Ruth Ignácio, a população negra ainda sofre as consequências. Sem conseguir habilitarse a competição da lógica de mercado, juntamente com a falta de instrução, continuam sendo a mão de obra mais
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barata. ”O Estado brasileiro também cria as cotas étnicas como uma medida de acelerar a economia, projetando transformar o país em potência e melhorar o mercado consumidor. Também possibilita direitos inalienáveis e o acesso a um bem que, há muitos anos, era privilégio dos brancos”, argumenta. A Lei Federal prevê que até o fim de 2016 seja reservada metade de todas as vagas em universidades e institutos federais para cotas raciais e sociais. Em 2013, primeiro ano de vigor do novo regulamento, 50.937 estudantes negros se matricularam por meio do sistema. No ano seguinte, esse número subiu para 60.731. O prazo para que todas as instituições se adaptem à obrigatoriedade vai até 30 de agosto de 2016. Segundo dados do Ministério da Educação (MEC), referentes aos dois últimos anos, das 128 instituições federais de ensino que atualmente participam do sistema, todas cumprem a legislação.
Emilyn Pedroso e Fernanda Evèlyn estudantes de serviço social e cotistas
Texto e Foto: Victória Citton
Em 2013, de acordo com a Seppir, 33% das vagas de graduação foram reservadas para cotistas, sendo 17,25% delas destinadas a estudantes negros. Já em 2014, o número de vagas subiu para 40% e de negros matriculados para 21,51%. Mesmo com a melhora nas estatísticas, há quem defenda que 50% não é suficiente, visto que as cotas são para universidades públicas. “A maioria da população do país é composta por negros e pessoas com baixa renda, logo, a sociedade não é totalmente representada por essa porcentagem”, reclama Fernanda Evélyn, estudante de Serviço Social e cotista na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A cotista conta que a adesão das cotas na faculdade foi um processo de muita luta. “Éramos mais novas na época, mas é sabido da dedicação da comunidade negra, que ocupou a reitoria da universidade em busca de seus direitos”, lembra. Fernanda faz parte do Coletivo Negração, onde é discutida a segregação, mesmo depois do ingresso na universidade. Apesar de ser a favor das cotas, ela testemunha diversas dificuldades dentro do campus. “Os cotistas sempre começam o ano letivo no segundo semestre, sendo prejudicados pela escassez de horários e disponibilidades de cadeiras, matriculando-se sempre nas vagas restantes”, critica. Segundo a pesquisa “A Política Pública de Cotas em Universidades, Desempenho Acadêmico e Inclusão Social”, feita pelos doutores em Educação Teresa Olinda Caminha
Bezerra e Cláudio Gurgel, o desempenho acadêmico dos cotistas era bastante semelhante ao dos estudantes que ingressam pelo acesso universal. Para Emilyn Pedroso, também cotista de Serviço Sociais da UFRGS, entretanto, a diferença é representada no tempo levado na graduação. “Somos prejudicados porque precisamos conciliar estudo com trabalho, e por não termos um preparo no ensino de base eficiente”, ressalta. Fernanda lamenta que a falta de auxílio e os preconceitos sofridos depois de inserção na universidade ainda são reais. Mas acha que são visíveis as diferenças dentro do ambiente acadêmico. “É possível ver uma maior circulação de negros na universidade”, destaca, e finaliza acreditando na busca por resultados a médio e longo prazo: “logo teremos representatividade na sala de aula, vamos conviver com professores negros, além de uma maior igualdade em todas as áreas”. Em três anos, a Lei de Cotas nas Universidades se mostrou um instrumento eficaz. Mais negros e pessoas de baixa renda, que antes não teriam oportunidade, entraram nas universidades. Embora discretamente, as desigualdades existentes na sociedade brasileira vão diminuindo. Antes de o projeto ser aprovado, 18 das 58 universidades federais do Brasil ainda resistiam em aplicar alguma política de cotas ou bônus. Desde o vestibular de 2013, porém, por força da legislação, todas as instituições aderiram, ampliando o número disponível de vagas de 140 mil para 188 mil.
Política de cotas garantiu mais oportunidade para os negros
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Por trás do VOLUNTARIADO Traços de vivência e descaso
Texto e Fotos: Isabella Mércio
As histórias de vidas que se cruzam e a denúncia de um abandono cruel. Idosos deixados por suas famílias têm de enfrentar o dia a dia no Amparo Santa Cruz. O relógio não importa e a noção do tempo se perdeu.
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Popular
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om os pés e o pensamento enraizados, um no chão e outro no tempo, Adair Gomes Monteiro (82) deixa escorrer uma lágrima. Sentada à direita da porta de entrada do Amparo Santa Cruz, localizado em Belém Velho, Porto Alegre, ela espera seu filho para buscála. Segundo ela, o que falta é o dinheiro. Caso contrário, já estaria embarcando em um ônibus para sua cidade natal – Santa Maria. Ela não gosta da comida, não gosta do abandono, nem do local. Ela gosta dos voluntários. Espera há três anos o dia em que sairá por aquela porta para nunca mais voltar. Foi-se a noção do tempo. O que eram três, Dona Adair transformou em um. E a vida, além de terminar naquelas paredes frias e amargas do Amparo, se torna atemporal. A pele marcada, com curvas sinuosas caídas sobre as bochechas, as pálpebras sonolentas e a memória seccionada compõem o passaporte
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para o asilo. O Amparo Santa Cruz abriga cerca de 60 idosos. A maioria não tem nenhum vínculo familiar. Nenhum. Nem um número de telefone, um endereço, um bilhete. O abandono cruel é espantoso de observar nos olhos de cada um. Cada qual com sua história, mesmo que a essa altura ela nem seja lembrada. Muitos esperam, convictos. Outros já estão conformados. “A família? Não tem família. Família morreu” – gargalha Haimundo Moelzer de Oliveira (79), também morador do Amparo Santa Cruz. A risada disfarça o choro iminente. O disfarce é a máscara utilizada pelos senhores mais receosos. O medo de admitir um sentimento diante de toda a sua história, na qual não houve preocupação e nem afeto. Descaso. Seu Haimundo mostra os dentes amarelados na mesma frequência com que a mão desliza sobre as pálpebras pesadas que escondem seus olhos claros já exauridos. Confinado em uma cadeira de rodas e com a mão esquerda quase totalmente imobilizada devido a um derrame que sofreu em 2012, ele se define, pronunciando com extrema dificuldade e engasgos as palavras, defeituoso: “Eu não gosto das visitas dessas pessoas. Elas não podem fazer nada pra mim. Eu sou defeituoso. Não corro e nem mexo a minha mão. Ela vai falar o nome agora para mim e não me lembro.” A dificuldade de cada residente do Amparo, tanto física, como é o caso de Haimundo, quanto psicológica, como a constante espera pela família e os possíveis traumas, são trabalhados
durante o tempo em que ficam na casa. Com atividades como bocha, poker, a hora do lanche e outros atrativos que os auxiliares e voluntários procuram oferecer, o tempo parece perder a extensão. Entretanto a dificuldade não existe apenas do lado interno da casa. Quem chega para ajudar, tímido e sem jeito, às vezes demora a se adaptar ao ambiente do asilo. A boa intenção nem sempre é suficiente nessas horas, pois há quem não entenda e não consiga se comunicar com quem vem de fora, tornando a ação menos prazerosa. Ismar Aguirre (79) não tem receio na hora de falar sobre os voluntários. O bigode branco e os poucos cabelos que ainda restam traçam uma vida solitária, porém precavida. “Sempre gostei dos voluntários. Gosto das pessoas, recebo bem. Tudo que vem de moças e meninos, senhores e senhoras para ajudar. Quem olha para a gente que não pode nem caminhar, né? Ajuda. Mas vou ser sincero: não são todas que gostam de conversar. O que eu quero com velho? Eles dizem bem assim. Eles pensam, essa juventude, que nunca vão ficar velhos. Essa é a verdade e eu sempre tive isso comigo”, lamenta. Quem se propõe a visitar o Amparo nunca tentou entender a colocação de Seu Ismar. Talvez nunca o tenham escutado. Não se deram ao trabalho de indagar se a posição de engajamento estava realmente fazendo a diferença na vida daquelas pessoas. Cada morador tem a sua particularidade, mas os voluntários insistem em inserir todos em um mesmo formato padrão Segundo
Popular Segundo Nina Xavier e Eduardo Motta, voluntários do Amparo, o local é uma oportunidade de ajudar os idosos, visto que ambos são tímidos para atividades sociais. “É muito pesado escutar eles falando sobre a vida deles e como eles passaram muito tempo aqui. Estão só esperando seus filhos e dizem que só vieram passar um tempinho. A gente sabe que o mais provável é que eles vão ficar aqui até o final da vida deles. Eles se sentem muito solitários e a gente percebe isso. A gente joga carta, bocha e conversa”, reflete Nina. Jonas Rosa, outro voluntário, diz que os residentes necessitam de atenção. Naquele dia ele auxiliou uma senhora a se locomover até o refeitório, para o lanche da tarde. Nos corredores mal iluminados que levam ao refeitório, Ivanor Reginatto (55), professor do colégio Anchieta e voluntário há mais de 30 anos, conduzia um dos moradores em cadeira de rodas. As paredes eram compostas por azulejos brancos e quadrados, e as arestas metálicas das portas refletiam o vazio e a frieza local. Cada um recebia uma caneca com chá de maçã e dois pães separados por uma camada de doce de leite. Agrupavam-se por interesse, amizade e comodidade. Alguns sentavam aonde os colocavam. Não havia opção. Em frente à janela, no canto direito do refeitório, um solitário senhor de barba rala fazia o sinal de positivo com a mão esquerda. Usava um boné branco para trás, parecido com uma boina, e deixava as orelhas salientes. Ocupava o canto esquerdo da mesa e comia apenas as fatias de pão. No outro lado do
Amparo, na casa principal, Dona Jurema Mello (77) tem as unhas pintadas por uma das voluntárias. Elas criam um pequeno salão de beleza toda sexta-feira. Levam a maleta cor rosa com uma infinidade de esmaltes e saem com uma infinidade de sorrisos. Jurema gosta de fazer as unhas e ondular o cabelo.“Fico muito satisfeita, alegre (pela visita). Passo uma semana me lembrando, assim, de vocês. Mas depois eu me esqueço”, conta. Reginatto explica o voluntariado como uma experiência única de vida e de aquisição de conhecimento. Conta que, todas as semanas, diferentes alunos o procuram para prestar auxílio aos idosos do Amparo. Isso o motiva a seguir nessa caminhada. Reginatto considera a solidariedade “uma das virtudes mais bonitas em um sistema capitalista, explorador e individualizado”. “Ser voluntário não é só ensinar. A gente vem aqui pra aprender. Eu me sinto um eterno aprendiz. Não tenho a sabedoria e a vivência que eles (idosos) têm, embora eu já tenha cabelos brancos e uma história pra contar”, complementa. Ele diz que o governo não presta ajuda ao Amparo Santa Cruz. Seu Ismar confirma a queixa, reforçando que, desde que mora no Amparo, nunca foi informado de nenhuma doação do governo. As obras realizadas na casa e os alimentos para os residentes provêm de doações voluntárias. A última reforma priorizada foi no refeitório. Segundo Daniela Trindade, coordenadora do Amparo, o ambiente era muito precário e dava a impressão de falta de higiene. Hoje, a casa conta com um amplo refeitório com quatro
grandes mesas espaçadas e uma cozinha em boas condições. Asilos são, muitas vezes, a forma mais fácil de abandono ao idoso. Eles passam a viver confinados, sem vínculo afetivo com familiares e em uma sofrida e eterna espera. O papel do voluntário é amenizar o sofrimento e distrair os idosos. Cada morador do Amparo Santa Cruz e das demais casas de abrigo localizadas em Porto Alegre tem sua necessidade prioritária específica. Desde a necessidade física, como alimentação e locomoção, quanto psicológica – memória, sentimentos. É difícil para quem doa (seja algo material ou não) e para quem recebe. É um grande jogo de paciência da parte dos residentes de asilos. Um jogo de promessas não cumpridas, de despedidas não concretas e de esperança. Sim, esperança. Em cada visita, em cada abraço solidário, cada minuto escutando as diferentes histórias desses idosos, um fio de esperança é tecido na vida. E de fio em fio a teia se faz.
“Passo uma semana me lembrando, assim, de vocês.” 2015/2
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A praça Alto das Acácias é a primeira nos planos do grupo de moradores, que pretende revitalizar o bairro inteiro
Juntos somos mais fortes Comunidade se une em prol da segurança Texto e Fotos: Nathalia Gaieski
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m protesto de moradores dos bairros Porto Verde e Jardim Algarve, em Alvorada, fez nascer uma ideia para o combate aos criminosos. Unidos pelo medo de assaltos, os moradores criaram 9 grupos para a comunicação direta da comunidade a partir do aplicativo What’sApp no celular. O objetivo do grupo é publicar histórias, situações, fotos e divulgar qualquer atitude suspeita que ocorra nas ruas dos bairros. Segundo os criadores do grupo, os assaltos já ocorriam há bastante tempo, mas depois
da abertura de duas ruas unindo os bairros a um novo condomínio, eles decidiram agir, montando uma barricada no local. O objetivo era coibir a ação de bandidos que utilizavam a rua como rota de fuga. Durante esta manifestação da comunidade, alguns vizinhos se conheceram melhor e trocaram ideias. Assim surgiu o grupo Vigilantes Comunitários. Uma das co-criadoras, Jandressa Wagener Toledo Dias, conta que toda vez que sai ou entra em casa, está com medo. Não somente pelos bens materiais, mas
Popular principalmente pelo filho de 3 anos que fica sentado na cadeirinha no banco de trás. Jandressa relatou várias ocasiões em que rondou as ruas próximas à sua casa antes de decidir entrar, para verificar se não era seguida ou se não havia ninguém suspeito por perto. A rotina de Jandressa é muito semelhante a dos mais de 175 mil moradores da cidade. Alvorada é considerada uma ‘cidadedormitório’. Sua proximidade com Porto Alegre faz com que grande parte de seus moradores trabalhe na cidade vizinha e retorne para casa somente à noite. Esta atitude acaba deixando as casas suscetíveis aos meliantes durante o dia, e torna as noites ainda mais assustadoras para os moradores que regressam, muitas vezes, em
seus veículos particulares. A sensação de segurança e união que o grupo trouxe para os participantes tem transformado o retorno à casa de Jandressa mais fácil e menos tenso. Mesmo rondando as ruas antes de sentir-se livre para entrar em casa, ela revela um sentimento de proteção por ter mais olhos ajudando na vigília. Nas duas ruas que motivaram a criação do grupo, havia um terreno baldio que não era cuidado por ninguém. Como o local era estratégico, um dos membros do grupo, que preferiu não se identificar, ofereceu um toldo para que abrigasse uma viatura policial. A ideia era de que a viatura pudesse se posicionar com acesso mais fácil às ruas e aos passantes. Pois foi a partir desta doação que Alex Steffani, outro co-criador do grupo, decidiu organizar um mutirão para reunir aqueles que quisessem auxiliar na manutenção do local. Em apenas um domingo, o terreno baldio se transformou em praça. Com o auxílio financeiro para a criação da praça, Steffani pediu aos membros uma doação mínima de dez reais e, com este valor, comprou tinta, ferramentas e gasolina para que os próprios moradores cortassem a grama. Com o restante do valor, eles contrataram um morador da comunidade para auxiliar na limpeza do local. O grupo também decorou a praça com pneus velhos, pintados e transformados em vasos e canteiros. A praça se encheu de vida, com balanços, lixeiras coloridas, flores, árvores, caixa de areia, escorregador e até tabuleiro de
damas. Tudo feito pelas mãos da comunidade. Dos mil membros, 90 participaram ativamente da restauração do local, de acordo com Steffani: “A união da comunidade é algo mágico, e o intuito é contagiar muito mais para continuar revitalizando os locais esquecidos pelo poder público. Não temos ideologias políticas, muito pelo contrário, acreditamos na força da união do povo sem intermediários. Juntos somos mais fortes, e aqui em nosso bairro nunca estivemos tão unidos”. Segundo Maurício Campos Padilha, efetivo na Brigada Militar há 30 anos e responsável integral de Alvorada, o número de assaltos não aumentou na região. Mas o fato de a comunidade estar unida já significa um bom sinal para o brigadiano. “É importante não ficar dentro do carro parado, observar os movimentos antes de abrir o portão e, para quem segue a pé, evitar distrações com o aparelho celular ou qualquer eletrônico que tire atenção. Se o assalto foi eminente, não se deve reagir.” Padilha fez um pedido à comunidade. Segundo ele, o comportamento típico é ligar para a polícia após o ocorrido. Mas para poder trabalhar com um sistema de prevenção, ele reforça à população que comunique qualquer situação suspeita para que seja enviada uma viatura. “Aos grupos de comunicação pelos aplicativos do celular, peço que façam contato pelo número 190, número oficial e único meio válido que mantém um registro oficial”.
Crianças brincam próximas à árvore de Natal
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Bairro Menino Deus, em Porto Alegre, foi alvo de diversas ocorrências durante os últimos meses. A região oferece uma rota de fuga rápida para a Região Metropolitana
Insegurança preocupa moradores do bairro Menino Deus Onda de crimes e assaltos causam questionamentos na população gaúcha Texto e Foto: Ana Paula Abreu
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á alguns meses a capital dos gaúchos vem sofrendo com os altos índices de assaltos e roubos. Os bairros Menino Deus e Santa Tereza são alguns exemplos de locais que têm registrado números elevados. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP), nos últimos 12 meses houve um crescente número de roubos e furtos de veículos. Estes dados foram registrados entre junho de 2014 e maio de 2015, e representam um aumento de 13% em relação ao ano anterior. No mesmo período, o crescimento dos roubos foi de 18,68% e de furtos, 9,56%.
Ainda segundo informações da SSP, os bairros mais atingidos são Centro, Cristo Redentor, Menino Deus, Vila Ipiranga, Rubem Berta, Santa Tereza, Sarandi e Petrópolis. Ipiranga, Bento Gonçalves, Baltazar de Oliveira Garcia, Assis Brasil, Sertório, Mauá, Antônio Carlos Berta, Ramiro Barcelos, Protásio Alves e Riachuelo são consideradas as avenidas mais perigosas. De acordo com a polícia, essas regiões oferecem uma rota de fuga rápida para a Região Metropolitana. Nos últimos 14 meses, foram registrados 236 furtos no Menino Deus. Estabelecimentos que costumavam abrir
Polícia no final de semana têm fechado mais cedo. Restaurantes não abrem mais à noite, por medo e falta de segurança. Quem mora no Menino Deus também diz sentir-se inseguro em relação ao bairro vizinho, que no início deste semestre foi alvo de protestos com depredação e queima de ônibus e lotação, organizados por próprios moradores. José Albuquerque, morador do bairro há 25 anos, conta que está de mudança por medo da criminalidade. “Depois que eu vi um morador aqui do bairro falecendo fiquei com medo de sair de casa. O clima está realmente pesado”, comentou. Segundo ele, a maioria das pessoas que conhece e que moram na região alegou que já foi assaltada ou presenciou um roubo. Ele acredita que de 10 de seus amigos, nove foram assaltados. “É impressionante. Outro dia sai para tomar cerveja com meus amigos e ficamos com medo. Vimos uma moça ser assaltada assim que desceu do ônibus. Ninguém fez absolutamente nada, fiquei perplexo e revoltado com a situação. Eu tive coragem de ajudar a garota, até que os bandidos fossem embora. Poderia acontecer algo pior se alguém interferisse’. O restaurante Forno & Fogão, tradicional na região desde 1970, informou que não abre mais à noite. Desde o mês de setembro a churrascaria reduziu o horário e atende apenas no almoço, pois os clientes já não estavam frequentando o local como antigamente. O policiamento no bairro é precário. Nas ruas mais movimentadas, como a Avenida Getúlio Vargas e a José de Alencar os policiais
da Brigada Militar fazem a ronda em horários específicos e alternados. Apesar disso o policiamento não ocorre diariamente, como gostariam os moradores. A onda de violência em Porto Alegre surge exatamente no momento em que a segurança pública sofre com as más condições de trabalho oferecidas pelo governo estadual. Com o estado enfrentando dificuldades financeiras, o governador José Ivo Sartori (PMDB-RS) não teve outra alternativa a não ser parcelar salários do funcionalismo público no mês de agosto. A decisão acabou expondo outros problemas enfrentados especialmente pelos policiais. Nos dias em que aderiram à greve dos servidores, inúmeros agentes permaneceram nos quarteis e não foram às ruas. Segundo o Delegado César Carrion, responsável pela 2ª Delegacia de Polícia de Porto Alegre, localizada na Av. Getúlio Vargas, o parcelamento dos salários pelo governo do estado pode ser um dos fatores que influencia nesta falta. “Acredito que tenha havido uma fragilização dos órgãos de segurança pública em função dos protestos por falta de salários. Os bandidos, creio eu, entendem que não há policiamento. Na verdade, há. Realmente diminuiu. A polícia civil, por exemplo, só tem atendido casos graves”. Passeatas e protestos têm sido realizados constantemente. Os encontros são organizados pelas redes sociais e visam chamar a atenção para a insegurança que atinge a região. O movimento S.O.S Menino Deus e a Associação dos Amigos e Moradores do Menino Deus
– ASSAMED, têm incentivado as pessoas a participarem. Além disso, representam moradores na busca por respostas e soluções às autoridades responsáveis pelo local. Um dos integrantes do S.O.S Menino Deus, Matheus Machado, trabalha no bairro há 32 anos e diz que decidiu criar o grupo com moradores com o objetivo de questionar autoridades em prol da segurança dos frequentadores do bairro. “A gente começou a ser assaltado constantemente, há mais ou menos seis meses e resolvemos criar o grupo. Fazemos nossa reivindicação sem violência, sem queimar ônibus. Só queremos segurança para o nosso bairro”.
Mapa mostra os bairros Menino Deus e Santa Tereza
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Polícia
Mapa da violência no Brasil
Pesquisa de 2015 revela que armas de fogo matam três vezes mais negros do que brancos no Brasil
Texto: Carolina Zorzetto Foto: Creative Commons
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ra uma terça-feira quando João Carlos saiu de casa para ir à padaria. Ele não voltou mais. Sem culpa, foi assassinado no caminho de volta por traficantes que o confundiram com um vizinho. A família, devastada, ficou sem pão, sem fonte de renda e sem poder ver, mais uma vez, o sorriso do Jovem de 21 anos. Esse é só mais um caso entre os 28.946 de negros que foram mortos por armas de fogo no ano de 2012, segundo o Mapa da Violência divulgado em maio de 2015. O relatório, baseado em dados de 2012, mostra que as armas de fogo vitimaram 28.946 negros, o que representa 28,5% para cada 100 mil habitantes. Em comparação, 10.632 brancos 11,8% de óbitos para cada 100 mil - morreram pelo mesmo motivo no período. Dessa forma, a vitimização negra foi 142% maior que a da população branca no Brasil. Segundo o Sociólogo especialista em Análise Social da Violência e Segurança Pública e Pós-Doutor em Criminologia, Rodrigo de Azevedo, todas as vítimas seguem um mesmo perfil. “A maioria é jovem, morador de periferia, de baixa renda, e
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muitos deles envolvidos com mercados ilegais, principalmente o mercado da droga. Junto com tudo isso tem também a questão étnica. Há um percentual bem maior de negros com essas características, justamente por serem indivíd uos nessa situação de maior vulnerabilidade social”, afirma. As regiões Norte, Nordeste, Sudeste e CentroOeste registraram, entre 2002 e 2012, aumento nos homicídios de negros por armas de fogo. No mesmo período, houve redução no número de brancos mortos. A Região Sul foi a única que obteve um resultado diferente. Apresentou maior índice de brancos vitimizados em relação aos negros. Em 2002, 2.826 brancos e 599 negros foram mortos. Já em 2012, o número de vítimas brancas subiu para 3.923, enquanto a negra foi para 1.084. Segundo Azevedo, o porquê desse acontecimento ainda é desconhecido. “Não fizemos uma pesquisa para desvendar esse acontecimento. Mas muito provavelmente seja porque o a região sul apresenta um menor percentual de pessoas negras”, supõe. Segundo o diretor do Departamento de
Homicídios, delegado Paulo Grillo, no ano de 2014 o Rio Grande do Sul registrou taxa de homicídios de 20,8 crimes por cada 100 mil habitantes. O índice acima de 10 já é considerado epidemia de morte pela ONU. “ Em números absolutos, Porto Alegre somou 570 homicídios em 2014, aumento de 67% em nove anos. Foram 342 em 2005, ocupando o terceiro lugar no ranking gaúcho”, explica o delegado. Dentre os três estados da Região Sul, o Rio Grande do Sul é o que apresenta o maior numero de homicídios por 100 mil habitantes (19,9), seguido pelo Paraná (12,2) e Santa Catarina (8,7). Na capital gaúcha, as execuções por arma de fogo tem proliferado pelas ruas em horários de grande circulação e a luz do dia. Conforme Grillo, “as mortes são inesperadas. rápidas e há muitas testemunhas”, o que torna o trabalho da polícia e dos investigadores cada vez mais difícil. Por medo, as pessoas que presenciaram os crimes nada revelam. Saindo da exceção da Região Sul em relação aos níveis de vitimização por armas de fogo de negros, existem estados, como Alagoas e
*O nome de João Carlos foi modificado a pedido da família.
Quase 30 mil negros foram mortos no ano de 2012 segundo o mapa da violência
Paraíba, onde a seletividade racial nos homicídios por arma de fogo supera a casa de 1.000%. Em outras palavras, para cada branco morto nesses estados morrem, proporcionalmente, mais de 10 negros vítimas de homicídio intencional por arma de fogo. O Mapa da Violência também revelou outro número assustador. Além dos negros serem as principais vítimas de homicídio, a quantidade de jovens mortos também é desanimadora: é mais do que o dobro da geral nacional: 47,6 para cada 100 mil habitantes. A taxa e o número absoluto de jovens mortos são os mais altos já registrados pelo levantamento. A concentração da mortalidade na juventude tem pico aos 19 anos de idade, com 62,9%. Logo depois ficam os de 20 anos, com 62,5% e, após, em terceiro lugar, vem os de 18 anos, com 57,6% das vítimas. Chama a atenção que, além de jovens e negros, maioria, é do sexo masculino. De acordo com o Sociólogo Azevedo, o motivo para explicar esses dados é discussão permanente entre os profissionais da área. “Uma explicação que pode ser dada é a defasagem da estrutura policial, junto com um sistema de policiamento absolutamente superado que temos hoje em nosso país. A divisão entre dois tipos de polícias, que não tem boa relação entre elas, dificulta ainda mais a segurança da população e dificulta a atuação das polícias”, argumenta. Azevedo cita, também, a falta de políticas de prevenção, que vai muito além da questão da segurança pública. “Isso exigiria uma atuação bem maior do governo nas áreas de maior vulnerabilidade social”, completa.
O Campus central da PUCRS é um dos atingidos pela onda de assaltos nas universidades
Insegurança até na sala de aula Casos de assaltos em universidades gaúchas são cada vez mais frequentes Texto: Nathaly Miranda Foto: André Ávila e Nathaly Miranda
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sensação de medo e insegurança que assola os gaúchos não se restringe mais somente ao passar por um beco mal iluminado à noite. A garantia de estar seguro em um local onde antes era inimaginável ser assaltado também não existe mais. As universidades gaúchas entraram de vez na rota dos bandidos que, sem vergonha das câmeras ou medo dos vigilantes dentro dos campis, agem impunes. Como a circulação de pessoas é sempre intensa nos locais, é difícil agir de maneira pontual e eficaz. Pelo
menos é o que diz o vigilante da Universidade do Vale do Rio dos Sinos Luciano Santos, que atua há 12 como segurança privado no campus central da Unisnos, em São Leopoldo. “Quando as denúncias chegam até nós, o crime já aconteceu. Na maioria das vezes redobramos a atenção, mas o que foi feito já passou, não tem como remediar”, relata Santos. O caso mais recente registrado nos arredores da universidade foi fatal. A morte do jovem estudante de geologia Frederico Almeida, de 22 anos, repercutiu massivamente nas últimas semanas. Ele foi
Polícia surpreendido e baleado por três meliantes ao sair da aula. Pedindo justiça e mais segurança, cerca de 200 pessoas realizaram uma caminhada em São Leopoldo em homenagem a Almeida. A reitoria da Unisinos disse que auxiliará a polícia nas investigações, mas não informou se a segurança será reforçada. A Unisinos não é a única universidade que sofre com a onda de assaltos. Os arrastões são frequentes no entorno do Centro Universitário Ritter dos Reis. O campus central da Uniritter fica ao lado de uma conhecida zona de tráfico de drogas da zona sul da Capital e, nas últimas semanas, as atividades criminosas aumentaram. “Não tem mais isso de ser de manhã, de tarde ou de noite. Quando eu saio da aula, lá pelo meio-dia, tem arrastão na parada de ônibus. Se tenho alguma atividade à noite na faculdade, vou de lotação ou táxi pra casa, porque sei que tem assalto à mão armada na porta”, conta Viviane Reis, estudante do 8º semestre de design da Uniritter. Cansados da violência e do descaso das autoridades, os estudantes fizeram duas mobilizações – uma no turno da manhã e outra no turno da noite – no dia cinco de novembro, pedindo mais segurança e melhor iluminação nas paradas de ônibus do bairro Orfanotrófio, principalmente próximas à universidade. Além disso, o Diretório Central de Estudantes (DCE) marcou uma reunião com a Pró-Reitoria e a Diretoria de Operações e com o tenente coronel Antônio Carlos Maciel Junior, comandante do 1º Batalhão de Polícia Militar. A Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul não fica atrás no quesito violência.
Localizada entre as avenidas Ipiranga e Bento Gonçalves, o campus central da PUCRS serve como passagem dos pedestres, logo, não há como ter controle de quem entra e quem sai. Foi numa situação assim que a Faculdade de Comunicação Social sofreu as consequências do pouco controle. Um homem que se passou por aluno invadiu uma sala de aula e exigiu que os cerca de 20 alunos presentes colocassem seus pertences dentro de uma mochila. Ele fugiu do local levando carteiras, celulares e notebooks, mas foi preso dias depois pela polícia. Mesmo com um pedido formal, a reitoria da PUCRS informou que não divulga número de assaltos dentro do campus. Entretanto, as universidades privadas não são os principais alvos da violência. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul registra, há anos, inúmeros assaltos e casos de estupro nos três campis. O Campus do Vale, localizado na zona leste de Porto Alegre, é o mais perigoso segundo quem o frequenta. Como é cercado de árvores e de pouca movimentação, facilita a ação para os bandidos. O maior medo das estudantes, contudo, são os estupros. Em 2012, uma jovem de 22 anos foi agredida fisicamente, amarrada sem roupas a uma árvore com fios de telefone e teve a boca vedada com fita isolante. O estupro só não foi consumado pois pessoas se aproximaram do local e o estuprador fugiu. A vítima passou por tratamento psicológico e a denúncia foi parar na Delegacia da Mulher. Infelizmente, a cena de filme não foi um caso isolado. Gabriela Pacheco, estudante do 4º semestre de nutrição, diz que já viu abordagens
suspeitas no Campus da Saúde, localizado na rua Ramiro Barcelos. “Já vi, sim, mas não posso afirmar se eram assaltos. São informações que se desencontram. Eu já fui perseguida à noite quando caminhava até a parada de ônibus, a rua estava deserta e tinha um homem andando logo atrás de mim. Cheguei na Osvaldo Aranha e consegui escapar, mas e se não tivesse conseguido?”, desabafa. Como é uma universidade federal, a UFRGS só pode contar com as patrulhas da Polícia Civil e da Brigada Militar. As duas unidades foram procuradas, mas até o fechamento da matéria não informaram dado algum sobre assaltos dentro ou no entorno das universidades.
Passeata pede justiça pela morte de Frederico Almeida
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Na divisa entre Porto Alegre e Cachoeirinha o rio se transforma em esgosto a céu aberto
Ambiental
Gravataí Um rio que clama por ajuda Poluição é tanta que a Corsan desativou alguns pontos de captação. Texto: Felipe Menezes Foto: Divulgação FMMA
Apenas 12% do esgoto são tratados no Rio Grande do Sul. O descontrole já inutilizou metade das águas do Rio Gravataí, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Análises feitas pela Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) mostram que o oxigênio é quase inexistente no rio, com níveis abaixo do recomendado para a vida de peixes e outros seres vivos. Também foi pesquisada a quantidade de coliformes fecais, bactérias que causam doenças. Por lei, o número não deve ultrapassar 1 mil coliformes a cada 100 ml de água. Entretanto, os níveis encontrados foram 142 vezes o volume permitido. Em mais da metade do rio, o recomendado é não entrar em contato com a água. “A classificação, conforme a legislação federal são zero, um, dois, três e quatro. A classe zero é a melhor, que se pode usar a água com tratamento primário. Já a classe dois requer
tratamento secundário com decantação, e também bastante cuidado. Na classe 4 a legislação diz que não podemos tirar água para consumo humano, apenas como paisagismo e para a função do ecossistema”, explica Samuel. No Arroio Passo das Pedras, na Zona Norte de Porto Alegre, é comum enxergar garrafas, objetos de plástico e até eletrodomésticos. Toda a sujeira vai parar diariamente no Rio Gravataí. É a contribuição do esgoto da capital na contaminação do quinto rio mais poluído do Brasil, segundo dados do IBGE. O que acontece todos os dias no Rio Gravataí preocupa a ONG de proteção ambiental APTA há muitos anos. “Pela poluição, isso aqui é um esgoto cloacal. O odor daqui é horrível, porque a água é dejeto puro. Não só cheira como é o próprio esgoto”, diz o presidente da ONG, Clóvis Braga. O que o ambientalista diz foi confirmado pelas análises da Corsan. As coletas
foram recomendadas pelo Ministério Público de Gravataí para verificar a qualidade das águas, e os resultados são assustadores. Das classes de um rio, estabelecidas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente, o Gravataí está na pior. “Ele está classificado em classe 4, onde nós temos reflexo direto da urbanização principalmente pela falta de tratamento de esgotos sanitários”, diz o secretário-executivo do Comitê de Bacia do Gravataí, engenheiro civil Paulo Robinson da Silva Samuel. A Bacia do Gravataí é formada pelos municípios de Santo Antônio da Patrulha, Taquara, Glorinha, Gravataí, Cachoeirinha, Alvorada, Viamão, Canoas e Porto Alegre. Entretanto, 90% do esgoto desses nove municípios são jogados brutos no rio, segundo dados do Ministério das Cidades. A poluição é tanta que a Corsan desativou alguns pontos de captação de água no
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Descarte irregular de lixo nas margens do canal DNOS, zona norte de Porto Alegre
Gravataí. Para não haver desabastecimento, a alternativa foi retirar a água do Arroio das Garças, que fica a pouco mais de um quilômetro da foz do Rio Gravataí. Segundo o ambientalista, a situação também pode apresentar risco de contaminação em breve. ”Sendo predominante aqui na região, o vento sul sopra os dejetos, toda a poluição e os efluentes do Rio Gravataí rumo à Estação de Captação da Corsan. A empresa não capta diretamente, mas está captando a água dessa região, porque indiretamente a água do Gravataí adentra
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o Arroio das Garças”, diz o presidente da ONG Associação para Pesquisa de Técnicas Ambientais (Apta). Entretanto, a direção técnica da Corsan garante a qualidade da água que chega aos consumidores. “Dos investimentos da Corsan, que chegam a quase R$ 4 bilhões, mais de 80% são relativos a esgotamento sanitário. Portanto, é a preocupação número 1 da empresa fazer com que haja implantação não só de redes de coleta, mas também de tratamentos de esgotos de modo adequado que possam contribuir em preservação e baixo impacto
nos nossos corpos receptores”, diz o Diretor de Operações da companhia, engenheiro químico Eduardo Barbosa de Carvalho.
Poluição X Rizicultores Classe apontada como poluidora da bacia alega estar sendo usada para desviar atenção de problema maior Em recente pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Rio Grande do Sul aparece três vezes na lista que mostra os dez rios mais água
Ambiental e termina junto ao Delta do Jacuí, entre Canoas e Porto Alegre. Percorrendo nove municípios, a Bacia do Gravataí está no centro de uma polêmica envolvendo órgãos ambientais e produtores de arroz. Em reportagem divulgada por um grande veículo de comunicação do Estado, imagens realizadas em janeiro passado mostram um avião agrícola pulverizando com agrotóxico uma lavoura de arroz e atingindo uma Área de Preservação Permanente, do Banhado Grande, entre Glorinha e Viamão. A propriedade havia sido notificada meses atrás pelos danos à mata e pelo despejo irregular de agrotóxico na água.
Safra 2015/2016 e o Uso da Bacia do Gravataí Conforme estudos do IRGA a região metropolitana é composta atualmente por
110 produtores de arroz. Segundo estimativas, a safra 2015/2016 teve uma área plantada na extensão da Bacia do Gravataí de 11.500 mil hectares. Destes, 78% são irrigados por açudes construídos nas propriedades. Apenas 22% das lavouras recebem água puxada do Rio. Neste contexto, os açudes construídos ao longo dos anos contribuem para vazão do Gravataí no verão, época de estiagem.
Afluentes e arroios do Gravataí O Rio Gravataí tem como principais afluentes os arroios Brigadeiro, Barnabé, Demétrio, Pinto, Passo Grande, Miraguaia, Venturosa, Veadinho, Chico Lomã, todos em sua margem direita; Já na sua margem esquerda, os arroios Areias, Sarandi, Feijó, Águas Belas, Passo dos Negros e Alexandrina formam seus afluentes. Os estudos
realizados sobre a cobertura , uso e ocupação do solo indicaram que prevalecem áreas de campo (50,81%), seguidas por lavoura (19,98%), mata (11,12%), área urbana (7,65%), banhado (3,96%), água (2,04%), campo úmido (1,06%), solo descoberto (2,43%) e reflorestamento (0,89%). No Rio Gravataí, que abastece 1 milhão de pessoas sozinho, as punhaladas chegam por meio dos arroios Águas Belas, Barnabé, Feijó, Areia e Sarandi. Em vez de vida e oxigênio, eles levam toneladas de fezes humanas e animais para o leito. Na foz de cada um dos arroios, a água, quase parada, revela-se pastosa e negra. Em um trecho estimado em 20 quilômetros, entre Gravataí e Porto Alegre, depara-se com cachorros e cavalos mortos. Nas margens, acumulam-se sofás, pneus, fogões, garrafas pet, sacolas de lixo — centenas delas — e até geladeiras.
Na nascente, em banhdo grande, a classificação do rio é II 2015/2
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Porto Alegre recicla apenas 3% dos resíduos produzidos diariamente O sistema de coleta de lixo da Capital, em vigor há 25 anos, não é usado de forma adequada pela população
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reciclagem retira do lixo materiais que levariam muitos tempo para se decompor na natureza. Plásticos e latas de alumínio, por exemplo, duram 450 e 200 anos no meio ambiente, respectivamente. Já o vidro, muito mais: permanece por 1 milhão de anos. Segundo dados da divisão de Destino Final do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), Porto Alegre produz aproximadamente 1.600 toneladas de lixo por dia. No entanto, apenas 3% dos resíduos são reciclados. O DMLU é o órgão responsável por realizar a limpeza da capital gaúcha. As coletas são seletivas e envolvem resíduos recicláveis - em 100% das ruas da cidade - além da domiciliar, que trata os lixos orgânicos e os rejeitos. Todo o material recolhido pela seletiva é encaminhado para as Unidades de Triagem. Lá ocorre a separação, o enfardamento e a venda para a reciclagem. “Há 25 anos a cidade está familiarizada com o sistema de coleta
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e, embora o índice de reciclagem ainda seja baixo, não há nenhuma outra capital com esse sistema oferecido”, defende o diretor da divisão de Projetos Sociais, Reaproveitamento e Reciclagem do DMLU, Jairo dos Santos. Porto Alegre também conta com a coleta automatizada, realizada desde julho de 2011, com containers espalhados no Centro Histórico, Bom Fim, Cidade Baixa, Independência e Farroupilha. Neles, o que deve ser colocado, basicamente, é resíduo orgânico: cascas e restos de frutas e legumes, sobras de comida, papel higiênico e fraldas descartáveis usados, guardanapo e toalha de papel sujos, plantas, restos de podas e varrição, pó de café e erva-mate. “É importante que a população conheça o sistema de coleta de Porto Alegre para que seja feito o descarte correto”, avisa o diretor da Divisão de Limpeza e Coleta, Felipe Kowal. Ele ainda alerta para outro cuidado que a população deve tomar: “geralmente as pessoas
A coleta automatizada permite que os cidadãos façam o descarte dos resíduos
Texto: Maria Karolina Soares Foto: Mauro Vieira / Agência RBS
não descartam materiais cortantes ou pontiagudos da forma correta. Eles devem ser embalados, para evitar lesão aos garis”. Dona Amélia Vieira, 68, moradora do bairro Cidade Baixa há 28 anos, recorda que ao longo do tempo foi se reeducando para fazer o descarte correto. “As gerações mais antigas não estavam acostumadas com essa visão do lixo. Fico feliz de ver que estão preocupados com esse assunto, que é importante para a cidade e pro mundo”, destaca. A separação e o descarte correto contribui socialmente para a geração de empregos e renda a trabalhadores formalmente organizados. De acordo com o diretor da Divisão de Destino Final do DMLU, Arceu Bandeira Rodrigues, “todos os resíduos recicláveis ou reaproveitáveis são recolhidos e encaminhados para as 19 unidades de triagem, gerando 800 empregos para pessoas que vivem da venda de resíduos”. Antônio Carlos Ribeiro, 49, conta que - como carroceiro - sobreviveu durante 7 anos com o lucro da reciclagem. A única fonte de renda dele era oriunda dos materiais que são direcionados até a Unidade de Triagem do Campo da Tuca. Hoje ele trabalha como gari em umas das Unidades de Serviço do DMLU. No entanto as dificuldades não diminuíram. O trabalho de quem varre, junta e direciona o lixo para o local correto não é fácil. “O problema é que as pessoas não se colocam no nosso lugar. A gente trabalha 24 horas por dia limpando a sujeira que elas jogam em qualquer lugar. Geralmente quem joga uma bituca no chão é quem reclama que a cidade não está limpa”, desabafa Seu Antônio.
A coleta seletiva é realizado em 100% das ruas que comportam a entrada de caminhões
O DMLU também alerta para a definição de lixo orgânico, rejeito e reciclável. Os orgânicos são compostos por resíduos domiciliares de origem vegetal ou animal, como sobras de alimentos cinzas, restos de vegetação e dejetos de animais domésticos. Os rejeitos constituem em papel laminado, lacres de iogurte e requeijão, papel engordurado e sujo, papel higiênico, absorventes, fraldas descartáveis, cotonete, bituca de cigarro, etiquetas adesivas, lâmpadas comuns (incandescente), porcelana, rolhas de cortiça e embalagens de remédio. Já o
lixo reciclável é, basicamente, todos os materiais reaproveitáveis feitos de plástico, vidro, papel seco e metal. Além de auxiliar na geração de emprego e renda, separar o lixo significa contribuir com a preservação do meio ambiente, aumentar a vida útil dos aterros sanitários e diminuir a quantidade de resíduos jogados nas ruas. Como foi dito na reportagem, Porto Alegre é uma referência no processo de coleta seletiva no Brasil. Entretanto, ainda são poucos os porto-alegrenses que aderiram à causa. O trabalho continua. A natureza agradece.
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Zona rural
EM XEQUE
720 propriedades rurais garantem a produção de frutíferas e hortaliças
Os impactos ambientais causados pela nova demarcação na Zona Sul de Porto Alegre Texto e Fotos: Tamiris Souza
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ntre as capitais brasileiras, Porto Alegre ocupa a segunda colocação em extensão agrícola, atrás apenas de Palmas (TO). São 12 mil hectares, localizados na Zona Sul e espalhados por 720 propriedades. Em 1999, esses limites territoriais foram extintos pelo Plano Diretor Urbano e Ambiental e transformados em áreas rururbanas. Por meio da Lei Complementar nº 775, as demarcações voltaram, mas com contradições e irregularidades que, segundo os críticos, seriam prejudiciais ao meio ambiente da região. O que parece algo bom para os produtores rurais é um pesadelo para os ambientalistas. A bióloga e Gestora da Reserva Biológica do Lami José Lutzenberger, Patrícia Witt, conta que a nova Zona Rural é destinada a produção primária e aos criatórios de animais. A suinocultura, por exemplo, até então não era licenciada dentro da área rururbana. Segundo ela, isso traz impactos ambientais, principalmente quanto ao uso de agrotóxicos, pois não há restrições agrícolas na região. “Falta a normativa em produção sustentável, mas há a contradição de não haver nenhum tipo de proibição sobre o uso de agrotóxicos”.
Ambiental A preocupação da bióloga se redobra quando o assunto é agrotóxicos e suinucultura. “É uma zona que tem muitas áreas úmidas, banhados, cursos d’água que desembocam no Guaíba. Vão carregar no solo esses agrotóxicos, que muitas vezes têm uma vida útil muito longa. Isso é muito prejudicial, muito maléfico para a contaminação dos lençóis freáticos, dos cursos d’água e para a própria Reserva Biológica”, avalia. De acordo com ela, não é indicado a criação de suínos em áreas alagáveis e úmidas em função dos dejetos que são jogados no solo. “Me preocupa bastante no tocante à conservação da biodiversidade. A suinucultura é uma atividade de extremo impacto ambiental”. O Técnico em Agropecuária da EMATER, Cesar Marques, contesta essa posição. Se defende dizendo que oferta de adubação orgânica da região é muito baixa, portanto, precisa desse tipo de produção. Segundo ele, a suinocultura tem um grande potencial para atender esse nicho, pois os suínos produzem um grande volume de esterco. “Pelo aproveitamento desses resíduos na compostagem, vai ser de extrema valia para os produtores de orgânicos”. Mesmo com todas as questões apresentadas por Patrícia, há produtores rurais contentes com a volta da demarcação da Zona Rural de Porto Alegre. Como Isabel da Cruz Pacheco, proprietária da Granja Lia, no bairro Lami. Para ela, a questão dos orgânicos é muito importante: “a gente já levanta essa bandeira
há muito tempo, de um alimento limpo e saudável. Isso só vem nos fortificar, nos valorizar e acima de tudo nos incentivar a continuar nesse trabalho”, comemora. Segundo a bióloga, a questão da demarcação da Zona Rural é ainda mais complexa. De acordo com a Lei Federal 9.985, do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, desde o ano de 2008, dez quilômetros em torno da Reserva Biológica do Lami já era considerado zona rural. Com a Lei Complementar 775, Art. 2º do Capítulo I, Das Disposições Gerais, a Nova Zona Rural é definida somente para a área formada pelos espaços não passíveis de ocupação intensiva. Para Patrícia, isso tem um lado positivo, mas como muitas áreas importantes ficaram de fora dessa demarcação, há problemas: “ficou uma colcha de retalhos, onde áreas importantes que poderiam ser consideradas como matrizes genéticas de povoamento, de sustentabilidade para áreas de produção, áreas de corredores ecológicos, acabam sendo usadas para outros fins. Essas zonas não se sustentam a longo prazo”, alerta. No Art. 15º do Capítulo V, Das Disposições Finais, é abordada a questão do uso do solo agrícola de terras sujeitas a intempéries ou calamidades. A bióloga avisa que a região escolhida para a área rural é de Preservação Permanente, portanto deve-se respeitar seus limites. “O uso do solo e a mudança da paisagem e das espécies sendo substituídas por outras, para uso alimentar e para criatório de animais,
pode causar sérios problemas futuros”, adverte.
Para entender Na Zona Sul e extremo Sul de Porto Alegre, 720 propriedades rurais garantem a produção de frutíferas e hortaliças, a criação de animais e agroindústrias. No ano de 1999, o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental, sob a Lei 439, extinguiu essas demarcações e as transformou em áreas Rururbanas. Nestas, devem predominar os patrimônios naturais e possibilitar atividades do setor primário, lazer, turismo e uso residencial. Para os produtores, essa denominação os prejudicava, pois impedia o licenciamento de algumas atividades agrícolas. Após 16 anos dessa norma e graças às constantes reivindicações, no dia 6 de novembro deste ano a Lei Complementar nº 775, de 23 de outubro de 2015, entra em vigor. Porto Alegre tem novamente uma Zona Rural. De acordo com a Lei Complementar Nº 775, de 23 de outubro de 2015, a volta da demarcação da Zona Rural para Porto Alegre traz algumas vantagens, tais como: - Garantirá a sustentabilidade ambiental e a tradição histórica, cultural e econômica da região sul e extremo sul da cidade. - Os produtores passarão a ter direitos a linhas de crédito especiais para atividades primárias e as políticas que fomentam a agricultura. - Possibilitará a implantação de agroindústrias familiares de transformação.
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Rural
Quinta da Estância se prepara para a primeira colheita de oliva Texto e Foto: Eniéderson Miranda
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ocalizada em Viamão, a Fazenda Quinta da Estância Grande, uma das principais no estado envolvendo turismo rural e pedagógico, participa do projeto nacional de “Desenvolvimento e adequação de tecnologias à cultura da oliveira no sul do Brasil”. Com 28 espécies em teste, a produção de azeite de oliva extra virgem utiliza as cultivares Koroneike, Arbequina, Picual e Arbosana e Mazanilha: “Nós plantamos cinco tipos de oliveira que reproduzirão já no ano que vem. São cultivas especiais que permitirão um produto extra virgem primeira prensa de excepcional buquê ou blend”, explica o diretor da Quinta da Estância, Lucídio Goelzer. Todos os azeites de oliva consumidos na fazenda, sejam nas cozinhas ou lancherias, serão substituídos pelo extra virgem produzido no local. Responsável pela pesquisa nacional sobre oliveiras, azeitonas e azeite, a Embrapa, de Pelotas, tem 36 centros de estudos no Brasil. Um deles é localizado na Quinta da Estância, no qual tem apresentado grandes resultados: “Vamos continuar nos dedicando a esta pesquisa,
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que poderá trazer uma nova possibilidade de desenvolvimento para nosso Estado”, afirmou Lucídio. Estão plantadas 29 cultivares de oliveiras e 1200 plantas no solo do local. Devido ao grande período de chuvas, granizo e ventos no Rio Grande do Sul, a Quinta da Estância começará a colheita a partir da próxima safra. E a notícia não é nada boa, como relata Goelzer: “Com o tempo que nós tivemos de chuvas absolutas, molhou o pólen e a maioria das gemas florais não foram polenizadas. Mesmo assim, foi muito desparelho. Então, como nem todas saíram e não teve material suficiente, produção será péssima no Rio Grande do Sul este ano. Somado a isso, não tivemos inverno”. Cada variedade do produto tem um período específico de vida para começar a produção. Normalmente, são de três a cinco anos, sendo que algumas delas chegam a dez anos. A oliveira é considerada pronta para a produção a partir do mês de setembro. Em 2015, o panorama está sendo completamente diferente, em função do clima absolutamente anormal e
por não ter havido um inverno rigoroso, o que auxiliou a produção. Necessitando 25 dias com a temperatura ao redor dos 10°C para entrar em dormência, a oliveira tem a possibilidade de produzir a gema floral após o período. Depois desta etapa, ela gera a flora e poliniza com a formação do fruto, entre os meses de novembro e dezembro. No Brasil, a colheita é feita precocemente entre fevereiro e maio. Segundo o diretor de Relacionamento com o Mercado da Quinta da Estância Rafael Golzer, o cultivo é uma excelente opção de renda para os produtores rurais: “Ele possui uma produção de longo prazo, já que existem oliveiras com centenas de anos. Esta agregação de renda faz com que o produtor diversifique sua receita. No nosso caso, diversificaremos na parte do turismo e ainda podemos agregar com um azeite de oliva próprio e extra virgem, com mais qualidade na alimentação de nossos visitantes. Agregaremos valor colocando um produto de qualidade nos nossos bares, restaurantes e lancherias.” A rentabilidade da oliva no Brasil é superior aos
Lucídio mostra o início da gema floral, produzida pela oliveira
aos demais países. O azeite permite uma rentabilidade de 10 mil dólares por hectare para os produtores. Na Quinta da Estância, estão plantados oito hectares de oliveiras. O azeite distribuído nacionalmente é adulterado. A mistura chega a ser 88% de outros produtos. A Embrapa adquiriu, no último ano, um equipamento de última geração para análise de azeite e, junto com o Inmetro, está definindo parâmetros para gerenciar a qualidade do produto oferecido para a população nos mercados. Com isso, as indústrias que estiverem vendendo o produto como azeite de oliva puro deverá corrigir o rótulo. O país não faz parte do COI (Comissão Olivicula Internacional), que trabalha em conjunto com a ONU e regula o comércio e a qualidade dos azeites em diversos países. O azeite extra virgem na Europa é considerado após 48 horas da colheita. Já no Brasil, ele precisa de duas virtudes, a picância e o retrogosto, que é exclusivo do azeite de oliva puro, sem nenhum tipo de mistura. Na análise realizada em território brasileiro, de 36 marcas, apenas 1 passou no teste. E ela é gaúcha: a Olivas do Sul, de Cachoeira do Sul. A segunda melhor colocada é a Carrefour, devido ao fato de a empresa importar o produto da Europa, sem ter nenhum tipo de alteração comparado com as outras marcas. A fazenda também está desenvolvendo, entre inúmeros projetos, uma criação consorciada de gado e ovelhas na mesma região das oliveiras como experimentação. São quatro hectares ao total de área. A experiência servirá como aula para os alunos que visitarem a Fazenda.
Rural
Chuvas prejudicam safra de fumo Produção deve diminuir 25% em função dos temporais que atingiram o estado Texto e Foto: Cristina Fragata
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primavera no Rio Grande do Sul começou acumulando prejuízos para os produtores de tabaco. Desde o início dos grandes volumes, agricultores enfrentam dificuldades para lidar com os ventos fortes, o granizo e o excesso de umidade nas lavouras. Do centro ao norte do estado, plantações inteiras de fumo foram devastadas pelas pedras de gelo. Segundo a Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), apenas no mês de outubro, a produção de cerca de 20 mil propriedades foi comprometida pelas tempestades. As folhas murchas e quebradas não eram o que Teresa dos Santos tinha em mente quando iniciou o plantio em sua propriedade. A agricultora de 46 anos, que cultiva fumo desde 1999, não vê mais vantagem na cultura. “Os últimos anos têm sido muito duros e o tempo não tem ajudado. Ano que vem, quero substituir o fumo por milho”, desabafa. Passado o período mais intenso de temporais, a preocupação é com o que sobrou da lavoura. Além de Teresa, outros produtores de Fontoura Xavier, no noroeste rio-grandense, temem que o retorno das chuvas lave o solo, levando o que
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sobrou das plantações. “Mesmo que não sejam tão fortes quanto as de antes, pelo tipo de terreno, podemos perder o que sobrou até dezembro”, explica Dorvalino Vieira, que também é fumicultor. Na região, o relevo predominantemente íngrime facilita a formação de valetas. Mesmo com a diminuição do volume total de água, a intensidade esporádica de precipitação pode acabar com o pouco que sobrou das plantações. As consequências financeiras devem se concretizar em dívidas para março de 2016, quando a colheita deve ser finalizada. Os dados da Afubra indicam que 14 mil plantações foram atingidas até o final do mês de outubro, um recorde nos últimos 40 anos, segundo a entidade. Comparados aos da safra anterior, os números representam 192% a mais de prejuízo. Os maiores estragos foram registrados na depressão central do estado, representado por cidades como Santa Cruz do Sul, Venâncio Aires e Cachoeira do Sul.
Classificação diminui o retorno para produtores
Além das difíceis condições de produção, os fumicultores enfrentam as fortes exigências do mercado sobre a qualidade do produto. Com oferta maior que a demanda, a indústria restringe a compra à Instrução Normativa nº 10, que estabelece uma classificação para a comercialização do tabaco no mercado interno. Segundo a Afubra, o valor repassado aos agricultores deve sofrer uma queda de até 30%. Apesar de responsáveis por cerca de 10% do tabaco mundial, os produtores gaúchos também devem ser afetados pela concorrência do mercado internacional. Junto com os Estados Unidos e Zimbabwe, o Brasil compõe o trio que oferece o tabaco de melhor qualidade no mundo. Na África, um trabalhador recebe dez vezes menos do que nas lavouras brasileiras, deixando o preço do tabaco africano muito competitivo. O fumo norte-americano, por outro lado, conta com alto investimento do governo, revertido em volume de produção. A concorrência desleal com estes países faz com que a competitividade da safra de 2015 seja
ainda mais baixa, tornando este ano difícil para os produtores do Rio Grande do Sul.
Segundo a Emater, os períodos de chuva e a umidade também devem ser motivo de alerta para os fumicultores por questões de saúde. Para quem trabalha na lavoura, a doença da folha verde do tabaco é um risco, que pode ser evitado com o uso de luvas, chapéus, calças e botas. “O agricultor deve trabalhar na lavoura em dias secos e se não for possível, proteger a pele do contato com as plantas”, alerta Jair dos Santos, técnico da Emater. Caso não seja possível adiar o trabalho para dias mais secos, os produtores podem utilizar roupas especiais, desenvolvidas especialmente para o manuseio do produto nestas condições. A vestimenta leve e impermeável foi desenvolvida por especialistas em segurança no trabalho e pode ser encontrada nas cooperativas de produtores de tabaco em todo o Rio Grande do Sul. Neste período, o contato das folhas úmidas com a pele deve ser evitado, assim como a exposição nas primeiras e nas últimas horas do dia, quando há presença de orvalho. A doença é resultado da absorção de nicotina, substância presente no fumo, pela pele, causando dores de cabeça, vertigem, náusea, fraqueza e cólica abdominal. Se ocorrer o surgimento dos sintomas, o produtor deve interromper as atividades junto à lavoura, lavar bem a pele, mantendo-se hidratado e em repouso. Se os sintomas persistirem, é indispensável buscar atendimento médico. O diagnóstico é realizado por profissionais da área da saúde, com base no histórico do trabalhador sobre a exposição ao cultivo do tabaco. Por meio de um simples exame de urina, os níveis de contitina, marcador que denuncia a quantidade de nicotina absorvida pela organismo. Se o trabalhador for exposto de forma aguda e contínua, pode desenvolver doenças pulmonares, problemas cardiovasculares e abortos, no caso das mulheres.
Plantação em Fontoura Xavier antes dos temporais
Cuidados com a saúde
Um dos principais objetivos da estufa é ajudar o produtor rural a oferecer um produto de qualidade com maior rapidez e eficência
Tecnologia e Sustentabilidade Estufa permite que produtor rural controle o clima do plantio
Texto e Fotos: Sthefanie Bernardes
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proposta do programa Juntos para Competir, parceria da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), do Serviço Nacional da Aprendizagem Rural (SENAR-RS) e Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE/RS), chamou a atenção de quem passou pela 38ª edição da Expointer, entre agosto e setembro deste ano. É uma estufa sustentável de alta tecnologia que permite o recolhimento e bombeamento da água da chuva através de um sistema alimentado por energia solar.
O projeto traz a possibilidade de distribuir para cada planta, no momento adequado, a quantidade de água necessária. Com isso, o produtor pode controlar o clima da produção. A estufa funciona da seguinte maneira: um tanque capta a água da chuva e através de um sistema de gotejamento autocompensante é possível irrigar a plantação. Quando o líquido captado entra em contato com a mangueira, há necessidade de pressurização igual em todos os pontos. Ou seja, no momento que
Rural começar a sair água na primeira estaca, a mesma quantidade sairá na última. Há, assim, uniformidade na dose e na aplicação de nutrientes. Levando em consideração a proteção de todo o produto cultivado e os equipamentos e automação para irrigação, uma estufa sustentável, de 300 metros quadrados, custa em torno de 30 mil reais. A produção é toda em substrato ou hidropônica, sendo assim, as frutas e verduras nunca entram em contato com o solo. Três opções de cultivo protegido estão disponíveis: sistema hidropônico sem solo (folhosas), sistema semi-hidropônico (morangos
em substrato) e cultivo de tomates em vasos. No caso do morango, a escolha pela suspensão se dá em função da produtividade e da mão de obra. Em uma estufa normal, de mil metros quadrados, é preciso três pessoas para trabalhar com 12 mil pés da fruta. Já em uma sustentável, que tem o mesmo tamanho, uma pessoa consegue suprir toda a demanda. Além disso, há também razões ambientais. Cascas de arroz carbonizadas e cinzas são usadas na mistura, o que leva a um substrato livre de fungos, bactérias e pragas em geral. O engenheiro agrônomo e produtor beneficiário do Juntos para Competir Paulo Rosa, de Porto Alegre, diz que nenhuma das frutas e verduras recebe aplicações químicas “devido à assepsia na produção e por terem uma dieta calculada, calibrada e medida todos os dias pela manhã”. Todos os dias é feita a extração da solução saturada do solo. Após, PH, condutividade elétrica e fertilizante são avaliados. Através de um aplicativo de celular,
o produtor acessa o site do fornecedor do sistema de automação e passa as informações coletadas. Assim tem-se uma nutrição correta e ajustada, com água em quantidade necessária. “Basta que o produtor faça esse processo passando as informações de estufa em estufa que o programador aplica as doses corretas”, diz Rosa. De acordo com o produtor rural e engenheiro agrônomo José Sérgio Muller, é possível reduzir drasticamente o número de defensivos quando a planta está equilibrada. “Dificilmente teremos um ataque de fungos ou bactérias em plantas extremamente saudáveis e é por isso que a quantidade correta de água e salinização é de extrema importância”, conclui. Com proposta sustentável, alinhada ao cultivo protegido, a Estufa Conceito tem mostrado aos produtores rurais que é possível colocar em prática um sistema correto de plantio. O programa Juntos para Competir é uma parceria da Farsul, SENAR-RS e SEBRAE/ RS. Tem como objetivo organizar as cadeias produtivas no RS, desde o começo até a industrialização e comercialização. São 26 projetos diferentes no Estado, que atendem 3 mil produtores, organizados em 150 grupos, com inúmeras finalidades. Os técnicos vão até o local entender as demandas e, através de um corpo de consultores, traçam soluções e planos de trabalho em conjunto com os produtores. Os projetos têm duração de três anos e não há custos para o produtor. Os recursos são fornecidos por instituições parceiras.
Nenhuma das frutas e verduras recebem aplicações química
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Vida mais saudável Conscientização faz procura por alimentos ecológicos aumentar Texto e Fotos: Carolline Viana
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Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) fez um estudo no qual descobriu que o aumento de agrotóxicos ultrapassava uma tonelada e que muitos desses produtos, ainda comercializados aqui, já eram proibidos em outros países. O consumo de produtos orgânicos no Brasil, apesar de representar apenas 1% de aumento, já é o indício de uma possível massificação dos alimentos agroecológicos, mesmo com o resultado altamente perigoso do outro lado da balança. Isso se dá porque a solução, apesar de tudo, é mais fácil do que se pensa. Ela envolve o aumento do consumo de orgânicos para que a produção se intensifique e cresça, ampliando o mercado saudável de forma a concorrer uma disputa párea contra os alimentos constituintes de veneno. Até mesmo o preço, que é um dos motivos reclamados pelos consumidores pode ser afetado, no caso, diminuído, com a expansão desses produtos. Além de incentivar uma alimentação de qualidade para quem consome, comprar produtos agroecológicos
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é também um fator preponderante de crescimento para a agricultura camponesa. Selecionar a agricultura ecológica, além de ter se tornado um movimento social pela qualidade de vida e estimular a agricultura familiar, é gerador de emprego e renda através das feiras ecológicas. Como, por exemplo, a Feira dos Agricultores e Ecologistas (FAE) que ocorre todos os sábado na Avenida José Bonifácio, em frente à Redenção, das 7h às 12h30. Nessa mesma feira, há 10 anos, o Sr. Eliseu Rosa da Silva, mais conhecido como Tio Juca, vende seus produtos nas bancas 6 e 8. Além dos cartões de apresentação, telefone celular e residencial, Tio Juca tem blog, facebook, e todo o carisma para incentivar os compradores a irem ao seu sítio acompanhar os modos de produção. Antes das discussões entre orgânicos e agrotóxicos, ele já plantava há 18 anos produtos sem venenos. Tem orgulho em admitir que na sua região, no Lami, foi o primeiro a implantar esse tipo de agricultura. “A produção orgânica não é nenhum decreto, mas acredito que ser um produtor é mais do que isso, é ter
convicção de saber que estamos fazendo bem para a natureza e para o consumidor”, explicou. A fisioterapeuta Simone Poletto em todos os sábados livres procura fielmente pela banca do Tio Juca. Já há 16 anos ela optou por adquirir produtos orgânicos visando colocar a sua saúde em primeiro lugar. Para ela é um modo de fuga de tantos alimentos industrializados, se tornando também uma opção de vida. Segundo a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) os malefícios dos agrotóxicos para a saúde humana são múltiplos e incalculáveis. Alguns já são conhecidos e outros ainda estão em estudo. Eles têm efeitos diretos e imediatos, além de serem cumulativos a médio e longo prazo. As pessoas mais expostas são as que trabalham produzindo os alimentos convencionais, pois se contaminam na hora da aplicação dos produtos químicos, mesmo utilizando o Equipamento de Proteção Individual (EPI). Já os consumidores, ao ingerir estes produtos industrializados, se expõem a doses máximas de princípios ativos, que possuem recomendação de quantidade pela ANVISA.
Conscientização de efeitos nocivos de produtos industrializados faz procura aumentar
Contudo vale ainda lembrar que além da dose contida naquele alimento que as pessoas irão consumir, mesmo que esteja dentro dos padrões recomendados, ainda há o consumo de água, por exemplo. Mesmo sendo consumida diariamente, sabe-se que a água é contaminada por vários princípios ativos que foram parar lá indistintamente através das chuvas, rios, córregos, fontes e ademais, ou seja, a população não ingere um único alimento contaminado e sim vários. Cada um destes alimentos possui outros princípios ativos, que ainda devem ser estudados para saber quais os efeitos da interação de tantas substâncias diferentes num mesmo organismo ao mesmo momento de consumo. A nutricionista da EMATER, Regina Miranda, observa que ainda assim com todos os prejuízos causados, a relutância da população em consumir produtos orgânicos se dá devido a falta da sua disponibilidade, seu acesso físico e econômico e, principalmente, a informação que a população têm ao seu respeito. A profissional alerta e adianta algumas consequências à saúde humana já comprovadas: cânceres, problemas neuronais, mal de Alzheimer, hidrocefalia, depressão, doenças respiratórias, dermatites, contaminação do leite humano e a diminuição da fertilidade masculina, entre outros mais. Para finalizar Regina complementa as vantagens de se consumir produtos agroecológicos: “devemos preferir alimentos agroecológicos e/ou orgânicos porque são mais saudáveis, uma vez que são livres de resíduos de agrotóxicos e tem um valor nutritivo aumentado em relação ao alimento de produção convencional”, ressaltou.
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Carreira e preconceito na arbitragem Fernanda Colombo busca se reafirmar nos campos Texto: Gabriela Giacomini Foto: Felipe Carneiro
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ma das ideias mais conhecidas sobre a arbitragem de futebol é que quanto menos ela for comentada, melhor sua atuação. Foi exatamente o contrário que aconteceu com a catarinense Fernanda Colombo Uliana, auxiliar de arbitragem que errou marcações de impedimento em jogos da Copa do Brasil e do Brasileirão de 2014. Atualmente integrando a Federação Pernambucana de Futebol, Fernanda foi protagonista de uma grande polêmica envolvendo futebol e machismo. Sua primeira partida de grande porte foi entre São Paulo e CRB, no estádio do Pacaembu, pela Copa do Brasil. Na ocasião, ela foi criticada pelos são-paulinos por causa de marcações de impedimento que não teriam existido, e ouviu o treinador do tricolor paulista, Muricy Ramalho, dizer que era “muito bonita, mas devia bandeirar melhor”. Após a polêmica, a auxiliar foi escalada para trabalhar no clássico AtléticoMG e Cruzeiro, pelo Campeonato Brasileiro. E novamente foi mal. O time alvinegro vencia por 2 a 1 quando, aos 41 minutos do segundo tempo, a
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bandeirinha assinalou impedimento do atacante cruzeirense Alisson, que estava em posição legal e sairia cara a cara com o goleiro Victor. Depois do jogo, o diretor do Cruzeiro, Alexandre Mattos, não poupou nas críticas à assistente, e sugeriu que ela posasse nua para a Playboy. Para Carlos Simon, ex-árbitro de futebol e atual comentarista da Fox Sports, a CBF também errou ao relacionar a bandeirinha para a partida. “Não deviam ter escalado ela, pois ainda não tinha muita experiência e era um jogo de grande porte, no Independência, onde a torcida fica a poucos metros dos bandeirinhas. É natural bater o nervosismo, e a pressão acabou influenciando”, avalia Simon, ao ressaltar que os equívocos de Fernanda poderiam ter sido cometidos por qualquer outro profissional, independente do sexo. Os erros da bandeirinha fizeram com que a CBF decidisse por um afastamento temporário de Fernanda, que acabou impedida de trabalhar em grandes jogos por mais de dois meses e voltou a bandeirar apenas em partidas da Série C e D e em torneios Sub-20 e de futebol feminino.
Preconceito em pauta Aos poucos, porém, Fernanda vem recuperando o espaço perdido nos principais campeonatos do futebol brasileiro. Natural do Distrito do Rio Maina, a criciumense entrou para a arbitragem em 2010. “Sempre gostei muito de futebol e vi na arbitragem uma forma de fazer parte do futebol como mulher, já que na preparação física seria difícil”, justifica. Aspirante do quadro da FIFA, a auxiliar é professora de Educação Física e desde novembro do ano passado faz parte do quadro da Federação Pernambucana de Futebol (FPF), para onde foi transferida após a grande exposição na mídia. Apesar de toda a repercussão originada nos gramados, Fernanda garante que o tempo em que ficou afastada e a troca de federação foi “positiva e de muito aprendizado”, como ela mesma afirma. No entanto, a bandeirinha acredita que ainda existe um grau de discriminação nas quatro linhas quando mulheres atuam na arbitragem.
Perspectivas Do outro lado, virando o jogo e se reafirmando ainda mais em 2015 no Campeonato Pernambucano, Fernanda esteve em ação em 24 jogos. Mas as conquistas não param por aí: a criciumense também foi eleita a melhor assistente de arbitragem do estadual juntamente com o árbitro Marcelo de Lima Henrique, e o auxiliar Clóvis Amaral, recebendo o troféu Lance Final. A premiação é oferecida aos destaques da competição por meio de votação da imprensa esportiva. Além disso, Fernanda também atuou em 2015 em jogos da série B. A bandeirinha está sem previsão de jogos próximos, mas acredita que estará de volta aos gramados já no próximo Campeonato Pernambucano, em 2016.
Bandeirinha está vinculada à Federação Pernambucana de Futebol (FPF) atualmente
“Os preconceitos no Brasil são mascarados, mas apesar disto, jamais pensei em desistir da minha carreira. Isso seria concordar com o machismo”, enfatiza a assistente. Para a assistente de arbitragem Luiza Reis, uma das duas integrantes mulheres da Federação Gaúcha de Futebol (FGF), ao lado de Andreza Mocelin, Fernanda fez bem em trocar de confederação. Mas ao contrário da bandeirinha que foi transferida, Luiza afirma ainda não ter passado por nenhum constrangimento em campo. “Tem sido bem tranquilo, tudo normal. Quando escolhemos a profissão, temos que ter consciência do que estamos sujeitos, mas para mim foi tudo positivo porque eu já esperava o preconceito e ele acabou não acontecendo”, relata Luiza.
Bairos próximos da Arena do Grêmio (Humaitá, Navegantes e Farrapos) serão beneficiados pela iniciativa gremista. Intenção é transformar o local em ponto turístico
Bairro tricolorado Texto: Maicon Hinrichsen Baptista Fotos: Divulgação
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aseado no modelo adotado pela equipe do Boca Juniors (ARG), a direção do Grêmio lançou o projeto Comunidade Tri, que visa pintar a região em torno da Arena de azul, preto e branco. A proposta visa maior integração do clube com a comunidade local e já conquistou o apoio de torcedores colorados da região. Conhecido na Argentina pelo fanatismo de sua torcida, o Boca Juniors é o mais recente exemplo a ser copiado pelo Grêmio.
Quem visita o bairro La Loca, em Buenos Aires, se sente como em uma extensão do estádio. Os arredores foram adotados pela equipe argentina, prática que o tricolor gaúcho tentará implementar em Porto Alegre. O projeto Comunidade Tri foi apresentado pelo atual presidente gremista, Romildo Bolzan Jr. e o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, é apresentado aos líderes comunitários como uma solução para tornar o local mais interessante ao comércio e
Esporte visitação. “Era uma iniciativa do presidente desde sua campanha: ter uma área de responsabilidade social com a comunidade periférica que fica em torno da Arena”, diz um dos idealizadores da proposta, o conselheiro gremista Alexandre Meyer. O dinheiro que financiaria a pintura da região viria de parcerias com a iniciativa privada e a prefeitura de Porto Alegre. O intuito é transformar os bairros em cartão postal e pontos turísticos da capital, assim como o estádio Beira-Rio. “Hoje o ônibus de turismo passa pelo estádio do nosso rival. Queremos que a Arena também esteja inserida nisso. Vemos muitos turistas indo conhecer a Arena, de fora do Estado e de outros países”, completa o conselheiro. Apesar da ideia, os membros do comitê responsável pela organização do projeto precisarão driblar um rival que não joga no campo, mas da arquibancada. Recheado de
Projeto visa pintar casas nas cores do time
torcedores colorados, lideranças comunitárias terão de ajudar o Grêmio a convencer os torcedores do arquirrival espalhados pelos bairros Humaitá, Farrapos e Navegantes, a pintarem suas casas. Segundo Meyer, o clube não pode interferir no desejo ou liberdade das pessoas. “Se as lideranças nos apoiarem, os colorados podem pintar sua casa de branca. Queremos que também se sintam contemplados por um bairro melhor”, finaliza. Mas, se depender de alguns colorados, a ideia tem tudo para sair do papel. A torcedora do Internacional Gilvana Sartori mora onde os fanáticos tricolores gostariam: do lado da Arena. Segundo ela, “é bem mais bonito e atrativo uma casa pintada com as cores do Grêmio do que com uma pintura feia ou mal acabada. Já existem vários bares e restaurantes nas imediações pintados de azul, preto e branco. Eu gosto, mesmo sendo colorada”. Ainda que sejam poucos, há torcedores do Inter que gostam e apoiam o projeto, entendendo os benefícios que ele poderá trazer para o bairro. Denise Pinto é daquelas que honra o manto vermelho e vai ao Beira-Rio sempre que o dinheiro permite. Questionada sobre a proposta gremista, ela ri. “Se isso deixar o meu bairro mais bonito, pode pintar a minha casa das três cores se quiser”, afirma. Já a estudante Tuanny Uglione Maia, que também reside em um dos bairros do projeto, afirma que apoia a causa se “eles realmente ajudarem a melhor a bairro”, mas que se nega a pintar a casa. “Minha casa já é branca, mas
se eles vierem pedir pra pintar de azul eu não vou pintar não”, afirma. Sobre a estratégia de atuação do projeto, a jovem acredita que tudo deve ser bem pensado. “A ideia é bacana. Só acho que o plano teria que ser bem elaborado, porque a estrutura do bairro está muito precária”, ressalta. Para ela, é necessário que sejam avaliados os problemas de estrutura para o local se tornar atrativo aos turistas. “Segurança em dia de eventos na Arena, todo o calçamento das ruas do bairro, porque quando chove fica quase impossível chegar ou sair do estádio”, aponta. O colorado Jair Machado de Bezerra mora no bairro Navegantes, um dos locais que também será abrangido pelo projeto gremista. Ele diz que é difícil conviver com a intensa movimentação de torcedores do Grêmio em dias de jogo na Arena. “É gremista pra lá e pra cá, parece que estou no meio da geral. Me dá até alergia ver tanto azul por aqui e eu com a minha camiseta do Inter, meio solitário”, brinca o senhor de 59 anos. Fanático pelo Internacional, Jair sabe que a rivalidade deve se estender para o âmbito social, e apoia o projeto criado pelo Grêmio. “Inter e Grêmio são clubes enormes. É natural que um ou outro tenha atitudes grandes. Essa proposta deles (do Grêmio) é ótima para a nossa comunidade, pois finalmente teremos uma vida melhor”, observa. No entanto, Jair é sucinto com relação a um assunto específico. “Podem pintar meio-fio, árvores, até os carros. Mas a minha casa não vai ser azul!”, finaliza rindo.
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Melhor treinador do Brasil há alguns anos, Tite credencia sua ida à Seleção Texto: Marcos Carvalho Jr. Fotos: Divulgação
*Esta reportagem dedica-se aos habitantes do Brasil em 2018. O gaúcho Adenor Bacchi, o Tite, vive nos dias presentes a iminência de uma carreira que provavelmente vai longe. E, se não for, é porque se perdeu na poeira do próprio voo. Aqui, no apagar das luzes desse longínquo 2015, é senso comum que ele, faixa no peito com o Timão de Itaquera, fala tranquila nas coletivas e um tonel de pólvora na beira do campo, é o melhor treinador em atividade do país. Não tem Kajuru que duvide: Tite é um sujeito vencedor.
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De 2011 até agora, com o Corinthians, são dois Brasileiros, uma Taça Libertadores, um Mundial de Clubes, uma Recopa e um Paulistão. Isso tudo levando em conta que em 2014 Tite se deu o luxo de não treinar ninguém. Meteu a viola no saco e comprou o mundo. Teve acesso aos bastidores de Real Madrid, Arsenal e Boca Juniors. Foi bem recebido. E gostou do que viu. No final desse ano sabático, trouxe na mala compactação defensiva e ofensiva, triangulações e troca de passes, marcação por setor e verticalidade, além de entender melhor como os times chegam à frente, característica que tinha dificuldades em desenvolver até sua última passagem por São Paulo. O professor foi estudar. “Às vezes um técnico entra no piloto automático, pulando de clube em clube e não consegue tempo para o que chamamos de ‘reciclagem’. Tite soube entender seu momento. O ‘ano sabático’ não foi um ano de descanso, foi ano de observações, estudos e, por conseqüência, avanços”, lembra o comentarista de futebol da Rádio Guaíba Carlos Guimarães. Tite surpreendeu o grande público quando abdicou da prancheta e recusou bons convites no ano passado. Mas ele não se importou; entende o quão benéfico é sair de cena vez ou outra e deixar saudade. Previu, também, que Luiz Felipe Scolari não seria treinador do Brasil na copa da Rússia. Pensou à frente de seu tempo. Depois das consequências altamente traumáticas da Copa sediada em nossas terras (vocês com certeza não esqueceram o porquê, em 2018), era certo, coerente e ortodoxo que
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o treinador mais preparado assumisse o altíssimo posto do futebol nacional. Três dias depois da eliminação do Brasil para a Alemanha, uma pesquisa Datafolha apontou Tite com maioria de preferência: 24%. Zico e Muricy Ramalho vinham atrás, com 19% e 14%, respectivamente. Os jornais davam Tite como novo empregado da CBF. Os corintianos já se conformavam. Adenor viu crescer às suas mãos, então, um sonho de menino.
“A principal qualidade do Tite é saber entrar na mente dos jogadores” Voltamos a 1973. Neste ano, Luiz Américo, o típico figurão de boné dos programas de auditório da despreocupada televisão brasileira, lançava “Camisa 10”, faixa mais popular de um álbum com o mesmo nome. A música teve grande repercussão na época por criticar a Seleção Brasileira de Futebol pós-1970, que depois de se tornar tricampeã no México, atravessava um período de altos e baixos
para disputar a Copa da Alemanha de 1974. Por conta disso, tornou-se um grande sucesso. Tite (ou Ade, como era chamado pela família e os vizinhos), na época um pré-adolescente, sacolevaja o corpo esguio de menino dentro da camisa amarela e verde dois números maior. Saía de casa com a bola embaixo do braço, ofereceu um beijo à mãe. Na cruzada, ouviu o som da TV valvulada: Cuidado, seu Zagallo O garoto do parque está muito nervoso E nesse meio campo fica perigoso Parece que desliza nesse vai não vai Quando não cai É camisa dez da seleção, laia, laia, laia Dez é a camisa dele, quem é que vai no lugar dele Ade não viu malícia, nem metáfora. Mas sentia o peso nas costas de uma nação que acusava o golpe. E sentiu, num suspiro adolescente, que queria ajudar. Corta para 2015: Luiz Américo, agora, é dono de uma casa noturna no Guarujá; Zagallo tornouse um aposentado que ainda tem problemas para dormir graças a uma sensação de não ter sido “digerido” até hoje. E a Seleção, bem, equilibra quase sem forças as outras duas estrelas esmeraldinas que vieram depois dessa história. O treinador do Brasil é Dunga. O mesmo que perdeu o Mundial da África nas quartas, cinco anos atrás, e que já caiu da última Copa América com escolhas que ninguém entende. Tite, quase um ano depois, surge outra vez num
Esporte horizonte que se encurta a cada má exibição transmitida na TV. E com liberação instantânea e sem ônus em caso de convocação, já prevista em contrato. Adenor quer a Seleção. “Tite tem inúmeras qualidades. É um estudioso do futebol, viveu intensamente os gramados e os vestiários como jogador, conhece muito os times que treina e os adversários. A principal qualidade dele é saber ‘entrar na mente dos jogadores’”, observa Rafel Colling, apresentador da Rádio Gaúcha. Rodrigo Bandarra, da web rádio Galera, vê no trabalho de Tite a teoria do vestiário convertida em prática. “O Tite é um agregador de grupo. Tem a habilidade de extrair o melhor que cada jogador pode oferecer. Ele trabalha o
que as empresas chamam de ‘enpowerment’, delegando confiança e credibilidade ao grupo. Além disso, é um treinador que está antenado às últimas tendências do futebol moderno, com movimentos em bloco e passes rápidos. Ganhou porque mereceu”, diz. Tite levou um Caxias fadado ao fracasso pela falta de salários em 2000 ao título do Gauchão. Um ano depois, repetiu o feito, agora pelo mesmo Grêmio que havia derrotado e faturou uma Copa do Brasil em cima do Corinthians, que agora deve lhe conduzir à Granja Comary. No mais, o treinador (com mais classificações à Libertadores da história dos pontos corridos) teve passagens importantes por outros clubes e pavimentou sua carreira com confiabilidade
“Ele entendeu o momento. O ano sabático foi de estudo e avanços” e trabalho sério. Extratos que o credenciam a alçar voos maiores. “Acho que ele, sobretudo, merece a Seleção, que é lugar para os melhores. Ele é, há uns bons quatro anos, o melhor técnico do Brasil. Com o potencial que ele tem, seu lugar é na Seleção ou (treinando algum clube da) Europa. Mas gostaria de vê-lo na Seleção”, completa Guimarães. Nós também. Porque Tite cresce na hora dos desafios. Incorpora o menino Ade e equilibra com a experiência de homem crescido. Forma, assim, o retrato mais completo do que a Seleção precisa: ganhar, com merecimento, mais uma estrela no peito em 2018.
Na comemoração do Hexa, com os atletas
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