Christina Elisa Baumgarten
Imperial Hospital de Caridade de Florian贸polis Uma obra constru铆da com amor e altru铆smo 220 anos
Resgate de Mem贸ria
Imperial Hospital de Caridade de Florian贸polis
Missão: Prestar serviços de saúde de qualidade, com profissionais qualificados e éticos, através da busca de novas tecnologias, valorizando o cliente e respeitando o meio ambiente.
Valores: Atendimento humanizado: atendimento de pacientes, com afeto e empatia
Busca constante da qualidade e da responsabilidade ambiental
Comportamento ético e credibilidade: confiança no corpo clínico e funcional
Respeito à religiosidade, às crenças e valores individuais.
Ser hospital filantrópico e atuar na valorização do cliente
Hospital Jesus, Maria e JosĂŠ - 1789
Santa Casa de Misericórdia da Ilha de Santa Catarina – 1792
Hospital Militar - 1821
Hospital da Caridade dos Pobres - 1827
Imperial Hospital da cidade do Desterro - 1845
Hospital de Caridade do Desterro – 1889
Hospital de Caridade de Florian贸polis - 1894
Imperial Hospital de Caridade de Florian贸polis - 2008
O Irmão Joaquim Joaquim Francisco do Livramento, ou simplesmente
Verdadeiro homem de Deus, iluminado e guiado
o Irmão Joaquim, foi a alma e a força motriz do sur-
pela filosofia crística, seguiu pela vida como um farol
gimento e mantença do Imperial Hospital de Carida-
a iluminar a vida de todos que tiveram a honra e a
de de Florianópolis, em seus primórdios.
benção de cruzar com tão inspirada personalidade!
homens s o d s a u g n li s a e lass “Ainda que eu fa seria como o r, o m a e s es v ti o e dos anjos, e nã lo que retine. ba m cí o o m co u o metal que soa profetizar, e e d m o d o e s es v E ainda que ti a ciência, e a d to e s o ri té is m s conhecesse todos o tal que ra ei n a m e d , fé a toda ainda que tivesse vesse amor, ti o ã n e , s te n o m transportasse os nada seria. s meus bens o s o d to e s is u ib tr Ainda que dis ainda que e , es br o p s o d para o sustento ado, e não m ei u q er s ra a p o rp entregasse o meu co veitaria.” ro p a e m to is d a d tivesse amor, na Coríntios s o a a rt a C a n , São Paulo
A Beata Joana Joana Gomes de Gusmão, ou simplesmente a Beata Joana foi o anjo que, com doçura, doação e ternura femininas soube imprimir à obra do Hospital de Caridade o perfume das grandes almas, que se doam em prol do bem da humanidade, fazendo a caridade sem olhar a quem, espalhando em torno de si o verdadeiro amor!
ança, o er p es a , fé a em ec man “Agora pois, per s é o amor.” te es d r io a m o s a amor, estes três; m oríntios C s o a a rt a C a n São Paulo,
Oração do Senhor Jesus dos Passos Meu Jesus, Senhor dos Passos, Açoitado, coroado de espinhos, Escarnecido e cuspido, condenado à morte, Carregando a cruz, caído por terra, Pregado no madeiro. Vós sois a vítima das nossas iniquidades. Eu quero acompanhar Os vossos dolorosos passos Rumo ao Calvário, em cujo cimo Consumiu-se a vossa vida. Mas do vosso sacrifício Brotou a nossa salvação. Senhor dos Passos, Perdoai as minhas maldades E apagai os pecados de todo o mundo; Meu Jesus, Senhor dos Passos, Tende piedade de nós! Vós que sois Deus, Com o Pai, na unidade do Espírito Santo, Amém!
Apresentação A história do Imperial Hospital de Caridade está profundamente arraigada à história de Santa Catarina e, principalmente de Florianópolis e do seu povo. O ideal dos seus fundadores confunde-se, no tempo, com o ideal de todos aqueles que lutaram pela defesa e desenvolvimento de Santa Catarina e da Vila do Desterro. A determinação dos membros da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, com o imprescindível apoio do Irmão Joaquim, ainda inspirados pelos ideais da Beata Joana de Gusmão, motivaram a população e os governos para a construção do Imperial Hospital de Caridade. Instituição que, em 01 de janeiro de 1789, abria suas portas para atender toda a população, seus habitantes e os viajantes cujas embarcações aportavam nas águas seguras da lha de Santa Catarina. As portas do Hospital nunca mais foram fechadas nos seus 220 anos de existência, exceto por alguns dias após incêndio de 1994, que destruiu grande parte da instituição. A ancestralidade do trabalho assistencial do Imperial Hospital de Caridade à população é comprovada por documentos desde o século XVIII, quando ainda não eram reconhecidos direitos ao povo e o conceito de cidadania não passava de uma abstração. Note-se que a “Declaração dos Direitos do Homem
e do Cidadão” só foi aprovada pela Assembléia Na-
nologias que possam proporcionar tratamento ade-
cional Constituinte da França em 26 de agosto de
quado aos doentes não é universal.
1789, quando o Hospital já estava funcionando há
O desenvolvimento tecnológico ao invés de dimi-
7 meses e 25 dias, atendendo a todos que necessi-
nuir, aumentou as desigualdades, não erradicou a
tassem de assistência hospitalar. Os princípios de
fome nem as doenças e a população de milhões de
liberdade, igualdade e fraternidade já eram pratica-
carentes continua aumentando. Para muitos brasi-
dos na instituição que nunca discriminou ninguém
leiros que vão a óbito enquanto aguardam nas filas
no seu atendimento.
de espera serviços hospitalares, o desenvolvimento
A memória do Imperial Hospital de Caridade está
tecnológico não lhes dá qualidade de vida nem lhes
preservada nos documentos cuidadosamente con-
assegura o Direto à Saúde, positivado no art. 196
servados no Centro de Memória Professor Henri-
da Constituição da República Federativa do Brasil.
que Fontes, instalado no vão central da bicentená-
É para esse segmento da nossa sociedade que a
ria instituição, de onde se extraiu subsídios para a
bicentenária instituição continua investindo seus
produção desta obra.
recursos nas ampliações e nas aquisições de novos
Nesta publicação, com textos e imagens, procura-se
equipamentos que atendam as carências do nosso
apresentar, de forma condensada aspectos relevan-
povo para as gerações atuais e futuras.
tes da trajetória do Imperial Hospital de Caridade
Espera-se que esta publicação possa mostrar à so-
nos 220 anos de existência, dando um testemunho
ciedade o papel do Imperial Hospital de Caridade,
do altruísmo de todos os que dedicaram parte de
no trabalho de assistência hospitalar, em Florianó-
suas vidas no trabalho da assistência hospitalar.
polis e no Estado de Santa Catarina.
Esta obra evoca o passado, mas, também refere-se a atualidade e ao planejamento para o futuro, pois, situações idênticas àquelas que motivaram nossos
Valter Brasil Konell
antecessores a implementar melhorias na institui-
Provedor do Imperial Hospital de Caridade
ção ainda existem no contexto atual, conseqüência da inobservância dos princípios de equidade e justiça social. Constata-se que há muitas pessoas doentes perambulando pelas ruas das cidades, enquanto buscam por uma oportunidade de atendimento em hospitais. A possibilidade de acesso aos equipamentos e tec-
Sumário: Capítulo I - Contextos históricos da narrativa - pg 32 Capítulo II - 1750 - A Vila do Desterro no século XVIII e os primórdios da colonização catarinense - pg 38
Capítulo III - 1762 – Em meio ao verde, surge uma alva capelinha - pg 48 Capítulo IV - 1764 - Uma imagem persistente, a do Senhor dos Passos - pg 56 Capítulo V - 1775 – Um encontro inesquecível - O Irmão Joaquim e Joana de Gusmão - pg 72
Capítulo VI - 1782 – Os primórdios do HC - o início de uma grande obra - pg 94 Capítulo VII - 1789 – Nossa Senhora do Desterro jamais será a mesma - pg 110 Capítulo VIII - 1800 – O progresso marca a Vila do Desterro e o seu Hospital de Caridade - pg 122
Capítulo IX - 1845 – Uma visita imperial - pg 138 Capítulo X - 1864– O lazareto - pg 148 Capítulo XI - 1889 – Um século de Hospital e começa um novo Brasil - pg 154 Capítulo XII - 1892 – Trinta e oito anos exemplares - pg 162
30
Capítulo XIII - 1922 – O Hospital de Caridade de Florianópolis acompanha a evolução social brasileira - pg 178
Capítulo XIV - 1930 – Madame Josefina - pg 188 Capítulo XV - 1955 – Ainda e sempre o voluntariado - pg 194 Capítulo XVI - 1963 – O Hospital abre espaço para a escola - pg 204 Capítulo XVII - 1987 – O Tombamento do Conjunto Arquitetônico do Imperial Hospital de Caridade - pg 212
Capítulo XVIII - 1994 - Uma perda inenarrável: o Grande incêndio - pg 218 Capítulo XIX - 1995 – Inicia um período de recuperação e crescimento - pg 230 Capítulo XX - 2009 – 220 anos do Imperial Hospital de Caridade de Florianópolis - pg 246 A atualidade de seu patrimônio físico, arquitetônico e humano - pg 248 Os Provedores do Imperial Hospital de Caridade - 250 A Procissão do Senhor dos Passos na atualidade e a fábrica de velas - pg 258 A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos na atualidade - pg 266 O Cemitério da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos - pg 280 Depoimentos - pg 284 O Futuro - pg 292
31
Cap铆tulo I
Contextos hist贸ricos da narrativa
32
33
Em 2009 o Imperial Hospital de Caridade comple-
pela contextualização histórica da época em que os
ta 220 anos, respaldado na mesma filosofia que
fatos aqui narrados aconteceram.
levou a sua criação, em 1789. Conceitos que hoje
Na segunda metade do Século XVIII, época desde
mudaram, visões sociais que evoluíram, naquela
qual a narrativa inicia, o mundo vivia quase que
época eram questões indiscutíveis, tidas como leis
num obscurantismo em matéria de medicina. Havia
imutáveis. Para entendê-la, as personagens que
muito mais empirismo e misticismo envolvendo as
dela fazem parte, e porque agiram da forma como
questões da saúde e da cura do que uma visão aca-
o fizeram, é necessário realizar um rápido passeio
dêmica e científica. Epidemias grassavam ao redor do mundo, ceifando milhares de vidas. Só a varíola matou aproximadamente 500 mil pessoas na Europa, por volta de 1780. As chamadas “Pestes” assumiram, neste período, proporções devastadoras. As palavras latinas “Pestes” e “Pestilentia” eram usadas para indicar qualquer doença com mortalidade elevada que acometia grande número de pessoas ao mesmo tempo, sem indicar, obrigatoriamente, a doença em questão. O historiador Oliveira Lima, em seu livro “D. João VI no Brasil”, no qual narra o período em que a Corte Portuguesa viveu no país, destaca a precariedade da medicina de então: “As operações mais fáceis costumavam ser praticadas pelos barbeiros sangradores e para as mais difíceis recorria-se a indivíduos mais presunçosos, porém no geral ignorantes de anatomia e patologia. A autorização para fazer cirurgias e clinicar era dada mediante um exame perante o juiz comissário, ele próprio um ignorante da ciência da medicina. Os candidatos eram admitidos nesta prova se comprovassem um mínimo de quatro anos de prática numa farmácia ou hospital.
34
Ou seja, primeiro se praticava a medicina e depois se obtinha a autorização para exerce-la. Outro exemplo dessas concepções equivocadas
“Como autodefesa, não havia nada melhor do que
está nas citações abaixo, feitas por “autoridades” de
fugir da região antes que ficasse infectada e tomar
saúde naquela época conturbada:
purgativos de pílulas de aloés, diminuir o sangue pela flebotomia e purificar o ar pelo fogo, reconfortar o coração com Sene e coisas perfumadas e
“Devido a uma infecção do hálito que se espalhou
abrandar os humores com terra da Armênia, resis-
em torno deles, enquanto falavam, um infectava
tindo à putrefação por meio de coisas ácidas.” (Guy
o outro... e não faziam só morrer quem quer que
de Chaullac, Médico)
falasse com eles, como também quem comprasse,
Foi somente no final do Século XVIII e, notada-
tocasse ou tirasse alguma coisa que lhes pertences-
mente, no primeiro quartel do Século XIX que teve
se.” (Michelle Piazza, Monge Franciscano)
início um processo de conscientização das noções
35
de saúde pública, com a intervenção do Estado, in-
dos indivíduos estava nas mãos de leigos, curio-
cluindo a fiscalização de locais de trabalho, a obri-
sos, charlatas e interesseiros de toda ordem. Isto,
gatoriedade da incineração ou sepultamento dos
no caso das pessoas que possuiam recursos. Não
cadáveres, o controle sobre o comércio de alimen-
os tendo, ficavam à mercê da sorte. Esta extrema
tos e as primeiras medidas visando o saneamento
penúria da maior parte da sociedade, notadamen-
das habitações nos aglomerados urbanos.
te em colônias abandonadas à própria sorte, caso
Assim sendo, até então, a saúde da maior parte
do Brasil, exarcebou o espírito cristão dos cidadãos mais abastados, que sentiam-se na obrigação de auxiliar os semelhantes em situação de desvalimento. Liderados não raro por pessoas vocacionadas na missão de auxiliar o próximo, reuniam-se em irmandades, academias e associações que tinham por objetivo precípuo a união de esforços para estes fins. Essas organizações, notadamente as irmandades, têm as suas origens na Idade Média. Baseadas no ideal da fraternidade e da união, as irmandades floresceram em plenos séculos XIV e XV por toda a Europa, dando respaldo a diversos movimentos humanos. Para os cidadãos mais ilustres desta época medieval, assumir a criação de enjeitados, o tratamento de enfermos, o sustento dos pobres e a caridade para com os idosos e os desvalidos era um dever inalienável, uma vez que a figura do Estado Protetor era praticamente inexistente. A maior parte das nações, governadas por castas de nobres corruptos e refestelados num poder que herdavam sem questionamentos, deixavam à míngua a grande massa pobre, adulando apenas aos nobres e a quantos lhes servissem os interesses. A injustiça grassava livre e campeava a desgraça entre os mais
36
desvalidos. Este estado de coisas levou à sucessiva
“tirador” de esmolas, andador ou esmoler, como
criação de confrarias, primeiramente lideradas por
se denominava naquela época o indivíduo que se
religiosos (freiras e sacerdotes) seguidos depois por
dispunha a percorrer regiões as mais extensas em
leigos que, inspirados nos bons exemplos daqueles,
busca de recursos para as obras de caridade em
seguiam-lhes os passos e criavam as suas próprias
nome das quais pedia, era visto como indivíduo da
confrarias, com o objetivo de praticar a caridade,
maior nobreza de caráter possível, e sempre rece-
seguindo assim os preceitos da Igreja Católica que
bido com respeito por tantos quantos ele cruzasse
era, nesta época, a religião dominante ao redor do
o caminho, ou batesse à porta. A diferença funda-
mundo. Países de maior fé, como Portugal e Es-
mental é que estas pessoas (normalmente homens,
panha, destacaram-se na criação e fortalecimento
devido aos riscos que tal empreitada representava
dessas irmandades e confrarias, sob os auspícios
para as mulheres) o faziam sob o signo de uma ir-
da Santa Madre Igreja. Dentre as mais arraigadas
mandade, confraria ou obra assistencial. Imbuídos
devoções católicas destacavam-se o Culto ao Divino
de imenso espírito de desprendimento carnal, cum-
Espírito Santo, ao Santíssimo Sacramento e as pro-
priam longos e desafiadores trajetos, percorridos a
cissões do Senhor dos Passos e do Senhor Morto.
pé, sem praticamente recurso algum além da pro-
Estas, não raro, serviam de inspiração e signo sob
funda fé que professavam. Estes deixaram indelével
o qual se estabeleciam as confrarias e irmandades.
marca nas obras para as quais contribuíram.
Assim sendo, não é de se admirar que estes rituais, tão fortemente praticados em Portugal, fossem transferidos para a província de Santa Catarina, uma vez que a primeira forte leva migratória que ocupou o Estado foi constituída principalmente de açorianos, portanto, povos de tradições portuguesas, que traziam este mesmo ideal de vida cristã. Por outro lado, se a nobreza pessoal e a moral cristã apontavam para a prática da caridade como obrigação essencial de todo bom seguidor da religião, motivo de orgulho para os cidadãos mais nobres das comunidades organizadas, a prática de esmolar, hoje tida como vergonhosa, era uma atividade considerada o suprassumo da nobreza pessoal. O
37
Capítulo II
1750
A Vila de Nossa Senhora do Desterro no Século XVIII
38
e os primórdios da colonização catarinense
39
Foi em 1726 que o perdido povoado de Nossa Se-
sombrosas para aquela população perdida no meio
nhora do Desterro foi elevado à categoria de vila. A
de um universo próprio e inimaginável ao habi-
ilha, conhecida durante muito tempo como “Ilha dos
tante de hoje. Para se ter uma ideia da desolação
Patos” era um ponto perdido na imensidão inexplo-
em que viviam, uma única edição domingueira do
rada do Brasil. Seus poucos habitantes viviam com
Jornal “The New Yok Times” de hoje contém maior
tanta rusticidade que beirava a selvageria. A vida
quantidade de informação do que um habitante da
sossegada e pacífica que levavam, dividida entre a
Vila de Nossa Senhora do Desterro daquela época
pesca e a caça de subsistência, incipientes práticas
chegava a receber durante toda a sua vida.
de agricultura e uma rústica criação de animais, ti-
A passagem de algum cientista, viajante estudioso
nha poucas vezes a sua rotina quebrada por algum
estrangeiro, era algo inédito e admirável para aque-
acontecimento notório.
la gente simples e rudimentar. Foi, porém, graças
As raras naus que por aqui passavam, levando e
a estes aventureiros que chegou aos nossos dias o
trazendo os primeiros exploradores de um mundo
conhecimento de como viviam nossos antecedentes
desconhecido e ameaçador, traziam novidades as-
neste pequeno pedaço de paraíso hoje denominado
40
Florianópolis.
preponderavam sobre os ditos “nativos”.
A população da Vila de Nossa Senhora do Desterro,
Suas feições e porte eram também mais belos, os
que contava em torno de cinco mil almas, era cons-
hábitos mais cosmopolitas e o conhecimento de
tituída por aproximadamente 50% de habitantes
mundo muito mais alargado. Traziam consigo,
“nativos”, o que equivalia a dizer que eram oriun-
profundamente arraigado, o pensamento religioso
dos da micigenação de portugueses degredados e
reinante no mundo dito civilizado daquele século.
fugitivos que vinham dar com os costados nesta
Eram profundamente apegados ao culto exterior da
terra perdida de leis e aqui acabavam se misturan-
Igreja, aos Santos e às imagens que os representa-
do a indígenas, caboclos e negros, e os outros 50%
vam. Estas eram de fundamental importância para
de açorianos, ou seja, provenientes das Ilhas dos
a representação externa da sua fé, e era um dos
Açores que vinham sendo instigados a emigrarem
mais altos valores daquele povo que, para sobre-
para esta região a fim de colonizá-la. Estes traziam
viver em terras novas e inóspitas se via obrigado a
um modo de vida mais sofisticado, maior conheci-
abrir mão de crenças e valores milenares a fim de
mento filosófico e científico, e consequentemente
se abrir para o novo e o inusitado. Desafio enorme
41
para os dias de hoje, impensável para aquelas épo-
que de qualquer noção científica para se prevenir
cas onde o conhecimento de mundo escasseava.
ou curar de doenças. Naquela época remota, ado-
As doenças eram o grande terror de todas as popu-
ecer era receber uma condenação quase que fatal
lações, e as epidemias grassavam no mundo com
de morte. As mais simples gripes levavam à morte
força avernal. Basta mencionar que, em pleno Sécu-
dezenas de habitantes, em questão de semanas, e
lo XVIII, uma epidemia de varíola arrebatou quase
um terror se espalhava entre as pessoas ao menor
500 mil vidas na Europa. Além da temível varío-
sintoma de algum mal.
la, havia a sífilis, a hepatite, as gripes, as pestes, a
A graciosa Vila de Nossa Senhora do Desterro, no
tuberculose, a lepra... Eram doenças mortais e que
entanto, amanhecia a cada dia abençoada por um
apavoravam uma população que nada conhecia de
sol de meridiana beleza, que punha reflexos dou-
medicina e saneamento e, de certa forma, valia-se
rados na imensidão de água pura que a cercava,
muito mais de crendices e mezinhas caseiras do
fornecendo alimento abundante e saudável, garan-
42
tindo a força e resistência de seus habitantes.
ritmo à Vila com seu jeito mais cosmopolita, suas
As doenças eram atribuídas, naquela época de
construções mais elaboradas e o seu natural sen-
pouco conhecimento científico e muito empirismo
so de organização. Entre as casinhas caiadas, que
baseado numa observação afoita dos fatos, princi-
reverberavam ao sol, foram surgindo estradinhas
palmente ao ambiente atmosférico. Acreditava-se
poeirentas que as ligavam e permitiam que suas
que, a partir do céu e do terreno em que viviam
moradoras se visitassem, trocassem mezinhas ca-
os habitantes dos diferentes locais, estes poderiam
seiras, compotas de frutas e receitas de rendas de
avaliar suas qualidades e defeitos e assim se tratar
bilro, uma arte que nenhuma “Dona” que se prezas-
das enfermidades mais comuns. Dentro deste ponto
se podia deixar de conhecer. Nas janelas, lutando
de vista, era a Vila do Desterro um lugar abençoado
bravamente contra um sol persistente, balançavam
pela saúde natural.
cortinas de rendas delicadas, ostentando as pren-
Aos poucos, os açorianos foram impondo novo
das das senhoras daqueles lares. Ao lado das mo-
43
radias, foram surgindo quintais, caprichosamente
imensas caravelas que traziam sucessivas levas
cercados com varas de bambu, dentro dos quais
de colonizadores provenientes dos Açores. Na sua
eram criados bois, porcos e galinhas. As primeiras
maior parte jovens dispostos a conquistar terras,
tentativas comerciais surgiram e gradativamente, a
haveres e posses que lhes dessem a projeção social
Vila de Nossa Senhora do Desterro ia adquirindo
que não tinham podido obter em sua terra natal.
feições de um pequeno e agradável burgo.
De resto, o eterno móvel que fez com que pionei-
Era agora muito mais comum a chegada de navios,
ros de todos os quadrantes do mundo acorressem
44
para as novas terras que iam sendo descobertas e,
mento que trazia e que fazia dele exímio construtor,
passo a passo, ampliavam a noção do mundo então
uma raridade muito bem vinda naquele ermo. Logo
conhecido.
chamou a atenção das moçoilas casadouras do lo-
Em 1738 a Vila de Nossa Senhora do Desterro as-
cal, pois o casamento era essencial naquela época,
sistiu a chegada de um homem que, de certa forma,
tanto como forma de sobrevivência e eternização
modificaria os rumos da cidadela com sua mão de
do nome e da família, como forte elemento de equi-
ferro e senso invencível de organização. Chegava
líbrio e ascenção social. Apesar das inúmeras pre-
para governar a capitania o Brigadeiro José da Silva
tendentes à disposição, foi a jovem e delicada Ma-
Paes, proveniente do Rio de Janeiro.
riana Jacinta da Vitória que chamou a sua atenção
Como militar que era, implantou uma disciplina
e, sem muitas delongas, fez-lhe a corte, levando-a
férrea à cidade, trazendo ordem e inovadora siste-
ao altar da rústica choupana de palha que fazia as
mática de controle ao modo pacato e algo indisci-
vezes de igreja no dia 29 de abril de 1750.
plinado de viver dos ilhéus. Implantou as milícias
O jovem casal compartilhava de planos e sonhos
que, de uniforme e armados, impunham a paz e a
semelhantes, e logo a prosperidade começou a
segurança num território ainda escasso de leis e or-
habitar aquele lar. Com a família constituída e
denações sociais. Deriva do colete verde que fazia
a descendência garantida, Tomáz entregou-se
parte do uniforme dos milicianos o apelido até hoje
às atividades comerciais e construtivas que ga-
atribuído aos catarinenses: barriga verde.
rantiriam o futuro da sua prole. Logo tornou-se elemento ativo e respeitado da comunidade, ocupando cargos estratégicos junto ao governo da
Foi numa destas caravelas, que chegavam constan-
capitania, além de conduzir com sucesso seus
temente com novas levas de imigrantes açorianos,
próprios negócios, envolvendo-se inclusive na
que chegou o jovem Tomáz Francisco da Costa,
construção da Igreja Matriz de Nossa Senhora do
contando apenas 20 anos e repleto de esperanças
Desterro, acalentado sonho da totalidade dos ha-
e planos. Deixara para trás, no Faial de onde provi-
bitantes do local. A construção iniciou no ano de
nha, a segurança do lar paterno para buscar a for-
1753, contando com a entusiasmada participa-
tuna em terras distantes e desconhecidas e nada fa-
ção de todos os moradores da vila. As senhoras,
ria com que ele desistisse de alcançar seus planos.
ao passarem pelo azafamado canteiro de obras,
Assim que se estabeleceu na vila, construindo para
benziam-se e faziam o sinal da cruz, enquanto um
si uma casa bem no coração da povoação, colocou
ar de realização e incontida alegria assomava-se
em ação seus planos, bem respaldados no conheci-
aos seus rostos. Teriam em breve a sua igreja...!
45
Poderiam assistir missas, confessar-se, rezar na
eclesiástica que a comandava, que aquela gente
paz e calma do familiar ambiente religioso den-
encontrava consolo para todo tipo de mal. Era lá
tro do qual haviam se criado em sua terra natal!
que todas as iras eram apaziguadas, as desavenças
Os corações vibravam com esta possibilidade, o
vencidas, os ódios aplacados, pais e filhos tinham
mais acalentado sonho dos desterrenses. Nada se
a oportunidade de se perdoar, dívidas eram nego-
comparava, em importância na escala de valores
ciadas, doenças eram dizimadas e todos os males
daquela gente, a possuir a sua própria igreja e
desapareciam. A subida glória de poder prostar-
poder assistir, diuturnamente, as missas canta-
se diante de uma imagem e elevar aos céus uma
das em latim, a liturgia envolvente que elevava a
sofrida prece era a suprema realização que todos
alma e era a garantia de todo o cristão contra os
aspiravam, ali ou em qualquer outro povoado da-
males deste mundo!
quelas perdidas eras. Mães que perdiam filhos com
Era na igreja, e principalmente junto à autoridade
frequência assustadora, ansiavam pelo dia em que
46
poderiam, através das velas acesas e das promessas
Entre 1748 e 1756 mais de cinco mil açorianos
sussurradas ao pé do altar, recuperar a possibilida-
instalaram-se na Ilha de Santa Catarina, mais espe-
de de vencer as enfermidades avassaladoras com o
cificamente na Vila de Nossa Senhora do Desterro,
poder inabalável de sua fé.
transformando este mero ponto povoado da costa
(A tão esperada Igreja Matriz da Vila de Nossa Se-
brasileira num animado entreposto de troca de pro-
nhora do Desterro só teve sua construção finaliza-
dutos, produção integrada e troca de ideias e co-
da em 1773)
nhecimentos. A Vila recebeu também muitos portugueses, provenientes de uma Lisboa arrasada pelo monstruoso terremoto que a abalara em 1755.
47
CapĂtulo III
1762 Em meio ao verde, surge uma alva capelinha
48
49
De quando em quando, surgiam oriundas da corte, personalidades admiráveis, que ocupavam a total atenção dos desterrenses enquanto aqui permaneciam. Tudo era alvo de intensa atenção: seus trajes, seus maneirismos, sua forma de falar, as notícias e conhecimentos que traziam, as novidades que podiam comunicar. Mas nenhuma personalidade impactou tanto a vila quanto a de Dona Joana Gomes de Gusmão. Paulista de nascimento, nobre em todos os gestos e delicada figura, ela impressionou a população desde o dia em que aqui chegou, silenciosa e cercada de uma aura de nobreza inexplicável. Trazia o hábito branco empoeirado, os pés escalavrados da longa peregrinação que fizera, mas nenhum destes fatores diminuía a natural presença carismática e a beleza peregrina de suas feições delicadas. Pouco falava, não era dada aos sorrisos, mas sua presença era daquelas de calar reis e imperadores. A força enigmática de seu olhar denotava uma fé incomum e uma inabalável certeza na realização de todos os seus planos. E eles não eram poucos, logo o soube a população da Vila. Trazia consigo, inseparável, uma estátua do Menino Deus, da qual não se afastava jamais, e apesar de sua natural discrição e silêncio, logo toda a vila ficou sabendo da sua triste e bela história. Enviuvara há poucos anos e, em cum-
50
primento a uma promessa feita ao esposo quando
dias e dias, nas terras inóspitas e desconhecidas,
ainda vivo, abandonara os planos de um possível
seu coração conheceu uma inexplicável paz, daque-
novo matrimônio, como era muito comum naquela
las que transparecia em seus mínimos gestos e nos
época em caso de viuvez feminina, trocando a vida
olhos aveludados com que mirava, desassombrada,
de senhora da corte brasileira, de família conhecida
o mundo ao seu redor. O silêncio de semanas cami-
e respeitada, pela vida errante dos seres entregues
nhando por entre a mata, os rios, as montanhas e
a uma causa de fé.
as imensas extensões verdes de uma terra ainda tão
Seu propósito era fazer a caridade junto aos mais
inexplorada, trouxera-lhe uma admiração contida e
aflitos, necessitados e desvalidos deste mundo. As-
profunda pela beleza do universo e, por extensão,
sim o prometera ao adorado esposo e tomara-se de
um amor desmedido pelo seu Criador. Como ado-
tal convicção na realização destes votos que nada
rar e servir condignamente tão Grande Senhor, Pai
mais existia para ela, a partir daqueles dias de pro-
Amoroso capaz de uma criação tão esplêndida, era
vação.
o que seu coração se perguntava a todo instante. A
Ato contínuo a morte do marido, desfizera-se de
resposta ressoava no silêncio daquela alma ilumi-
todas as suas posses, vendendo propriedades, ani-
nada, inspirada pelas palavras do inefável mestre
mais e demais bens e ingressara na Ordem Terceira
que perecera na cruz: - Servindo aos seus filhos, é
de São Francisco, a fim de tomar votos. Ao cabo do
ao Pai que estarás servindo!
período necessário para receber autorização, ado-
Joana sentiu o chamado ressoar no fundo da sua
tou o alvo burel com o qual vestiu-se pelo resto dos
alma alva e pura, sentiu-se senhora do seu destino
seus dias. A tradição da fé religiosa, fundamente ar-
e rompeu com toda e qualquer convenção huma-
raigada desde menina, desabrochara com força de-
na que pudesse impedir a vocação de transbordar,
pois da viuvez, e os votos feitos ao marido moribun-
indômita, daquela alma iluminada: serviria a Deus
do foram apenas o pretexto para entregar-se a uma
de maneira integral, servindo aos mais pobres,
vocação que trazia em germe n’alma desde a mais
aos mais miseráveis, àqueles que até a comisera-
tenra infância. E parecia que Deus havia preparado
ção humana abandonasse... estes seriam seus mais
condignamente esta sua serva, pois da união não
queridos protegidos e amados. Foi com esta pureza
houve filhos, e Dona Joana pôde seguir, célere, à
de alma e firmes intenções, depois de passar por
vocação que o coração determinava.
este período de profunda introspecção que a levara
Nas longas peregrinações que fizera, palmilhando o
ao cimo da compreensão da divindade que havia
sertão desde as terras paulistas até chegar ao Des-
dentro dela, que Joana chegou a Nossa Senhora do
terro, nos ermos silenciosos que atravessara por
Desterro e, em poucas semanas, tornou-se uma das
51
figuras mais queridas e respeitadas do local.
Certo dia, sua caminhada levou-a a galgar um pro-
Como o período de peregrinação dera-lhe formidá-
montório acentuado, do alto do qual descortinou-se
vel resistência física, apesar dos 68 anos que conta-
a mais encantadora visão que seus olhos já haviam
va ao chegar na Vila de Nossa Senhora do Desterro,
avistado: iluminada sob o sol, uma lagoa dourava-
em 1756, percorreu a pé toda a extensão conheci-
se toda, espreguiçando-se em alvas areias contor-
da e possível da formosa ilha que sentira ser seu
nadas de um verde inexprimível. Seus olhos enche-
novo lar, buscando um recanto onde estabelecer
ram-se de lágrimas, tal a emoção que a paisagem
suas obras. Trazia consigo uma certeza: precisava
lhe inspirava. Ali estava o cenário escolhido como
construir uma capelinha onde entronizar a sua in-
palco para a sua obra. Tomada de um sentimento
separável imagem do Menino Deus, oportunizando
de profundo agradecimento, ajoelhou-se aos pés
aos seus protegidos a experiência profunda de fé
da formidante paisagem e orou sentidamente ao
que ela mesma vivenciara. E para tanto, buscava o
pai, agradecendo tanta bondade e generosidade na
cenário ideal.
composição da delicada paisagem que ora vislum-
52
brava.
a prática organizada da caridade, mantinham-se
Celeremente, tratou do necessário e estabeleceu-se
com base nas contribuições de seus afiliados, mas
às margens da lagoa de beleza inexplicável, numa
a “Beata” Joana, como passou a ser conhecida, logo
casinha de pau-a-pique e chão batido, numa pobreza
transcendeu esta contingência, colocando-se acima
e simplicidade que lhe traziam profunda alegria ín-
das injunções materiais tão prementes à época.
tima. A senhora da nobreza, filha do poderoso Fran-
Sua luta em prol da construção de uma capelinha
cisco Lourenço, que conhecera as honras e glórias
para a entronização do seu amado Menino Deus, no
da corte, agora habitava em pobreza indescritível,
entanto, ainda se prolongaria por mais seis anos,
mas jamais sentira-se tão realizada. O fausto da vida
até que pudesse ver seu sonho realizado.
na importante cidade de Santos, substituira-o pela
Muitas manhãs, ao nascer do sol, Joana punha-se
riqueza de uma paisagem ímpar, que se oferecia
a mirar o horizonte e orava contrita, emocionada,
aos seus olhos a cada manhã, com beleza sempre
imaginando que ali, diante daquela paisagem ins-
renovada. Naquela verdadeira catedral ao ar livre,
pirada, ergueria a suprema homenagem que al-
sentia-se presa de uma felicidade indescritível, que
mejava fazer à sua fé, mas o Divino Gestor tinha
a levava aos píncaros da realização e recrudescia à
outros planos. As dificuldades se avultavam, as in-
força férrea para ajudar aos seus pobrezinhos. Saía
gerências empreendidas por ela não logravam êxito
diariamente a esmolar, buscando juntar recursos
e, quando tudo parecia certo, alguma contingência
para a construção da capelinha, enquanto agrupa-
externa impedia o início da obra, levando mais uma
va em torno de si meninas desvalidas às quais bus-
vez seus planos ao malogro. Humilde e resignada-
cava orientar como mãe dedicada, educando-as nas
mente, Joana intuiu que o Pai devia ter outros pla-
primeiras letras, nos saberes caseiros e no básico
nos para a sua empreitada e mudou seus sonhos,
para torná-las moças recatadas.
renunciando à felicidade de residir diante de tão
Não tardou a estabelecer relações amistosas e res-
belo espetáculo da natureza, transferindo-se para
peitosas com o clero local e, tomando conhecimento
a vila, onde imaginava, deveria concentrar seus es-
da existência da Ordem Terceira na vila, (estabele-
forços para construir a capela.
cida desde 1744), enviou um singelo requerimento
Certo dia, numa de suas muitas caminhadas em
solicitando ingresso na mesma. Foi prontamente
busca de esmolas para avultar os recursos que já
atendida, embora tivesse solicitado, no requeri-
somavam uma bela quantia, esperando o sucesso
mento, a isenção de pagamento de anuidade, uma
da empreitada, avistou ao longe um promontório
vez que não possuia recurso algum. As ordens re-
acentuado, no alto do qual uma luz peregrina bri-
ligiosas, que se estabeleciam a fim de oportunizar
lhava de forma intensa e incomum. Pressurosa, su-
53
Documento original assinado por Joana de Gusmão solicitando permissão para a instalação da Capela. biu a colina e, em meio a uma catedral de árvores
Ele parecia estar apenas esperando, pois assentiu
centenárias, descortinou uma visão privilegiada:
imediatamente com a empreitada da Beata, fazendo
até onde seus olhos podiam alcançar desenrolava-
a doação das terras necessárias. Sem mais delon-
se o lençol prateado do mar, a entrada do porto
gas, ela tratou dos ultimatos para a construção da
e a barra, a vila ao longe, preguiçosa ao sol... era
tão almejada Capela.
possível avistar todo o território já explorado da
Joana conseguira amealhar, com doações e esmo-
Ilha de Santa Catarina dali. O local era estratégico
las, a impressionante quantia de 250$000 (duzen-
e Joana entendeu na hora as intenções do Altíssi-
tos e cinquenta mil réis), o que permitiu o imediato
mo. Daquele ponto de vista seria possível zelar por
início da singela construção. Além da Capela-mor
toda a povoação, a região e estender um lençol de
e da nave principal, fez construir também uma hu-
bençãos sobre o povo. Este era o lugar determinado
milde moradia, onde passou a residir e permaneceu
por Deus para a construção da capela, ela o sentia
até sua morte.
no mais profundo do seu íntimo.
A construção, finalizada em 1762, tratou de doar à
Não tardou a travar conhecimento com o proprietá-
Ordem Primeira Franciscana, fiel aos votos que fize-
rio das terras, o nobre Senhor André Vieira da Rosa.
ra, de não possuir mais nenhum bem neste mundo.
54
Mas não era chegado o tempo do descanso, e Jo-
que continuava agregando em torno de si, ou es-
ana continuou suas obras. Os pobres, desvalidos e
molava pelas cercanias buscando recursos para sua
miseráveis avultavam à sua volta e sua fama já se
pobre gente.
fizera grande. Assim, todos quantos se encontra-
A cada alvorecer, mirando a paisagem que se des-
vam necessitados a buscavam de mãos estendidas.
cortinava em inexprimível beleza, Joana bendizia
Joana não sabia dizer não, se necessário tirava do
ao Pai pelas bençãos recebidas; a cada pôr do sol,
próprio alimento para que não faltasse o essencial
quando vinha caminhando depois de suas exausti-
a quem necessitava. Fazia-se surda aos apelos do
vas peregrinações em busca de esmolas, ao aproxi-
próprio corpo e não conhecia fome, descanso ou
mar-se do promontório, avistava a alva capelinha
privilégio. Ou estava cuidando de enfermos e des-
luzindo ao poente e sua alma se enchia de exalta-
validos, ou encontrava-se instruindo meninas órfãs
ção pela bondade do Criador!
55
CapĂtulo IV
1764
Uma imagem persistente, a do
56
Senhor Jesus dos Passos
57
O marulho da água despertou o pescador que,
sembarque e, sem maiores delongas, pularam todos
desde muito cedo, pusera-se a esperar pelos fartos
na areia suja de detritos e algas que beirava o porto
peixes que, com o nascer do sol, aproximavam-se
de Nossa Senhora do Desterro. O capitão, identifi-
do porto buscando alimentação. Bem diante de
cado graças às insígnias de seus trajes, não hesi-
si o assustado madrugador avistou uma caravela
tou e, sem pejo algum, arrojou-se ao solo e beijou-o
de três mastros, cujas velas estavam enfunadas
repetidamente, num gesto incontido. Os marujos,
pela brisa matinal, e que entrava célere na barra
algo relutantes, acabaram imitando o gesto do seu
da Vila do Desterro, sob os gritos desordenados
superior, demonstrando um alívio difícil de enten-
da tripulação que preparava a abordagem.
der, vindo de homens tão acostumados ao mar.
A embarcação não tardou a fundear muito pró-
O mistério logo se desfez; a caravela, proveniente
ximo ao porto e tão logo foi possível, baixou um
da Capitania de São Salvador fizera-se ao mar há
escaler com doze homens fortes a bordo. Com
longínquos cinco meses e não lograra atingir seu
apenas algumas remadas atingiram o local de de-
objetivo, que era a Capitania do Rio Grande, no
58
extremo sul da colônia. Trazia a bordo a mais solene das cargas: uma imagem de Nosso Senhor Jesus dos Passos, esculpida em madeira pelo artista bahiano Francisco Chagas, conhecido pela alcunha de “O Cabra”. A encomenda devia chegar a Porto Alegre, onde uma população aguardava ansiosa pela presença de uma benção divina, mas o capitão não conseguia transpor a barra que levava ao porto de destino. Além do que, o mar situava-se distante da vila de Porto Alegre, e fazia-se necessário atravessar uma barra feroz e transpor longo trecho de água doce, singrando o Rio Guaíba, e a viagem vinha se revelando impossível. O exausto e assustado capitão já perdera vidas, estava sem mantimentos e água e temia uma revolta da tripulação exausta e amendrontada. Havia sido a imponente presença da imagem que evitara até agora desgraças maiores, mas nem a fé daqueles marujos calejados poderia impedir um desastre se algo diferente não acontecesse. Depois de tomar ares e um bom trago de aguardente, o capitão do navio apresentou-se ao Governador
- Estou convencido de que este orago não deseja
da Capitania de Santa Catarina, o severo Brigadei-
chegar ao porto do destino inicial; tenho mesmo
ro Francisco Antônio Cardoso de Menezes e Sousa.
para mim que escolheu esta bela ilha para ficar,
Contando-lhe o ocorrido, desabafou:
porque todas as vezes que tentamos transpô-la,
- Doutor Governador, eu não quero mais transpor-
foi logo depois de passar por aqui que nossos pro-
tar esta estátua. Se nós afundarmos, a desgraça de
blemas começaram. Houve até uma noite em que
perder a imagem vai recair sobre a minha família
a viração foi tão forte que a estátua moveu-se e,
até a sétima geração! – E assim dizendo fez nervo-
quando fomos acomodá-la, estava voltada para cá,
samente o sinal da cruz, demonstrando um misto
como a sinalizar que este era o seu destino!
de superstição e fervor religioso.
O homem arfava e benzia-se repetidamente, mos-
59
trando toda a carga de misticismo comum aos homens do mar. O Brigadeiro, homem contido e ponderado, qualidades indispensáveis ao bom exercício do pesado cargo que ocupava, nada disse. Ficou pensativo, mas avaliava mentalmente os prós e contras de tal aquisição. Sabia perfeitamente que o povo da Vila ressentia-se da pouca assistência espiritual que lhe era prestada quando algum padre missionário por ali passava, ou quando vinha algum religioso enviado da Vila de Santo Antônio dos Anjos de Laguna, especialmente para proferir missas e realizar casamentos, batizados e outros sacramentos. Uma imagem como esta poderia significar uma consolação inestimável ao povo, mas... por outro lado, a responsabilidade pesava nos ombros do Brigadeiro, conhecedor que era da intrincada política da coroa portuguesa, à qual tudo estava afeto, inclusive uma questão religiosa importante como esta. Decidiu então visitar o navio, a fim de avaliar a imagem antes de tomar uma decisão. No dia seguinte, às primeiras horas do alvorecer, o escaler se fez ao mar e em poucos instantes Menezes via-se diante da imagem do Senhor dos Passos. Quando a mesma foi respeitosamente descoberta dos panos que a cobriam, sobreveio um encanto insuperável que fez assomar funda emoção ao coração do governador. Era simplemente impressionante. Tanto na altura e na compleição física, quanto principalmente na expressão dolorosamente compassiva com que mirava os circunstantes, parecen-
60
do ter o dom de acompanhar quem para ela olhava. Cada detalhe do rosto maltratado, do corpo lacerado pela injustiça de que fora alvo, o Nosso Senhor
Os preparativos para o desembarque do Nosso Se-
estava retratado com arte, minúcia e destreza pela
nhor dos Passos na Ilha de Santa Catarina se fizeram
mão hábil do escultor. Os cabelos, compostos por
céleres. O Governador providenciou um improvisa-
longos cachos lustrosos e naturais, emolduravam
do andor, avisou as autoridades religiosas do local,
uma face lacerada e sofri-
sem esquecer de Dona Jo-
da, onde imperava a com-
ana de Gusmão, com quem
paixão, dom supremo do
entrou em tratativas para
Amado Mestre Jesus.
alojar a imagem na Capela
O corpo encontrava-se em
do Menino Deus, único lo-
decúbito dorsal, com um
cal disponível, uma vez que
dos joelhos apoiado ao
a igreja matriz continuava
solo, numa exata reprodu-
em construção e tardava a
ção da primeira queda do
ficar pronta.
Senhor na sua via crucis
Emocionada, a beata sen-
rumo ao calvário. Pesada
tiu que o plano divino mais
cruz estava apoiada às
uma vez se cumpria, com a
suas costas com tamanha
inesperada chegada desta
perfeição, que quase se
bênção para toda a popu-
podia sentir o peso dela
lação.
nos ombros, a maltratar o
No dia aprazado, a popu-
idolatrado carregador.
lação acorreu ao porto,
O Governador não teve
para assistir, contrita, ao
mais dúvidas. Tal imagem
desembarque do Senhor
traria grande consolação ao sofrido povo da vila
Jesus dos Passos em terras desterrenses.
de Nossa Senhora do Desterro, e supriria a imensa
A emoção tomou conta de todos assim que pu-
demanda religiosa do povo que ele comandava. O
deram visualizá-la, em toda a sua magnitude. Co-
capitão da embarcação, aliviado, leu nos olhos e na
berta com uma túnica de tecido roxo, a coroa de
expressão contrita do governador que havia ganho a
espinhos resplandecendo ao sol, a cabeça da mo-
batalha e conseguido resolver seu grande dilema.
numental imagem moveu-se para um lado e para
61
o outro assim que iniciou a sua movimentação, a
Tavares Ferreira, Manuel de Sousa e Silva, Antônio
fim de colocá-la no andor. Senhoras desmaiaram de
de Miranda Jordão, Manuel Fernandes Lessa, Ma-
tamanha emoção, enquanto até os mais endureci-
nuel Ramos de Araújo e Miguel Gonçalves Leão; o
dos homens descobriam a cabeça e punham-se de
Sargento de Ordenanças Tomáz Francisco da Costa;
joelhos diante dela. Enquanto passava, lentamente
os Tenentes Antônio Martins Couto e Crasto, Gui-
carregada sobre o andor que se fizera às pressas
lherme Barbalho Bezerra e João da Costa da Silveira;
para o desembarque, pela primeira vez a sagrada
o licenciado Vicente Ferreira Victório e os cidadãos
imagem do Senhor Jesus dos Passos desfilou pela
Fernando de Queirós Pinto, Manuel de Medeiros e
cidade, numa tradição que se repetiria pelos sécu-
Sousa, Francisco José Castro, Manuel Vieira Maciel,
los vindouros na monumental Procissão do Senhor
Antônio Luiz de Escovar e Araújo e ainda o humil-
dos Passos, atualmente uma das maiores festas re-
de andador da Venerável Ordem Terceira, Gregório
ligiosas do sul do país.
José de Freitas Lisboa.
Persistente, a imagem escolheu o seu lugar e foi solenemente entronizada na alva capelinha, tão ansiosamente almejada pela iluminada beata Joana,
- Senhores – disse o Governador – Estamos viven-
revelando que os planos do Altíssimo sempre su-
do um momento histórico na vida da nossa Vila de
peram em muito a nossa vã imaginação! Eram os
Nossa Senhora do Desterro da Ilha de Santa Cata-
últimos dias do ano de 1764.
rina! Por um capricho do destino, ou mesmo por determinação divina, não podemos afirmar porque está além da nossa sabedoria, passamos a ser os le-
Poucos dias após o ocorrido, nos primeiros dias
gítimos possuidores de uma imagem única, impres-
do ano de 1765, o Governador Menezes mandou
sionante, que desde já projeta a sua força espiritual
chamar, ao Paço do Conselho da Vila, local onde
sobre a nossa povoação. Cumpre-nos agora exercer
exercia seu cargo, os mais notáveis homens da so-
o nosso papel, zelando por ela, guardando-a, plane-
ciedade local.
jando e executando de que forma ela vai abençoar e
Lá estavam reunidos o Ouvidor Duarte de Almeida
proteger a nossa cidade. Nossa primeira responsa-
Sampaio; o Vigário Padre Inácio José Galvão; o Pro-
bilidade é indenizar o capitão do navio que a trouxe,
vedor da Fazenda Real Félix Gomes de Figueiredo;
uma vez que ele não pode retornar com a algibeira
os padres Marcelino de Souza e Abreu e Manuel
vazia ao seu porto de origem, e sem a mesma. Por-
Fernandes da Silva; o Sargento-mor Jacinto Jaques
tanto, recomendo veementemente que, nos moldes
Nicós; os Capitães José Bernardo Galvão, Antônio
da nossa pátria, formemos imediatamente uma ir-
62
mandade que assuma estas graves responsabilidades a partir de agora!
Uma entusiasmada salva de palmas irrompeu imediata, coroando a peroração do Governador, e aqueles destemidos homens aceitaram, unanimemente a árdua tarefa de responder pela imagem do Senhor dos Passos, iniciando uma responsabilidade para com toda uma filosofia e prática da caridade tão reiteradamente pregada pelo Nosso Senhor em seus evangelhos. O Governador, que era Cavaleiro da Ordem de Cristo em sua terra natal, não teve dificuldade alguma em estruturar, com a ajuda do Vigário Padre Inácio José Galvão e outros auxiliares, as bases estruturais da Irmandade. Todas as providências foram tomadas e apenas alguns dias depois, no mês de janeiro de 1765, aconteceu a primeira reunião oficial, que instituiu a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos. Mal sabia, naquela data, o quarto governador da Província de Santa Catarina, que seus dias na Provedoria da Irmandade e na Governadoria da província estavam contados. Menos de seis meses depois do início das atividades, a Irmandade perdia seu primeiro dirigente, que fora chamado ao Rio de Janeiro, para assumir seu posto no Regimento Novo de Infantaria, onde era Coronel. Ele recebeu com alegria a notícia da transferência, uma vez que muitas eram as suas desavenças no exercício de um cargo civil. Homem de diciplina e
63
pensamento militar, exercia com desconforto estas
(Seu vaticínio se mostrou verdadeiro quando, em
funções submetendo, não raro, os homens da co-
1777, os espanhóis tomaram a Ilha de Santa Catari-
munidade que chefiava à uma descabida disciplina,
na praticamente sem resistência e submeteram-na
obrigando civis a exercerem funções oficiais, muita
a seu domínio por um ano.)
vez sob a ameaça do chicote, e atraindo desta forma muitos desafetos e críticos. Outra questão que lhe trazia desassossego era a
Substituiu-o na provedoria o Ouvidor Duarte de Al-
questão da proteção à Ilha. Vivia a defender a ne-
meida Sampaio, tendo permanecido nos cargos os
cessidade de tropas mais aguerridas e preparadas
demais irmãos: como secretário o Tenente Antônio
para exercer proteção àquelas terras, mas infeliz-
Martins Couto e Crasto e como Tesoureiro o Padre
mente nunca foi ouvido.
Dr. Inácio José Galvão. As eleições da Irmandade
64
aconteciam sempre anualmente na mesma data, a
distraído, passava horas olhando para o céu, numa
02 de maio de cada ano. Em 1766 foi reeleito o Pro-
espécie de enlevo difícil de se compreender pelos
vedor D. Duarte de Almeida Sampaio, sendo eleitos
seus rudes pais. Embora gente de bem na socieda-
secretário e tesoureiro, respectivamente, Tomás Car-
de local, eram ambos iletrados e o arrebatamento
doso de Almeida e Tomáz Francisco da Costa.
constante do filho inquietava-os sobremaneira. Não
O novo tesoureiro, personagem já conhecido desta
conseguiam entender como uma criança em tão
narrativa, era homem dos mais devotos e dedicados
tenra idade sabia e entoava cânticos religiosos com
às boas causas da religião Católica Apostólica Ro-
voz de anjo, encantando a quem o ouvia, e como
mana, que professava com fervor inquestionável.
o natural bulício de uma criança podia ser substi-
Porém, como homem de negócios promissor da
tuído por horas e horas na contemplação de uma
vila, não descurava da casa de comércio e das mui-
imagem santa. Outro aspecto curioso era a total
tas posses que amealhara naqueles anos de intenso
ausência de timidez na criança. Falava com os pas-
trabalho e dedicação, juntamente com sua esposa
santes, emprestando especial simpatia aos pobres
Mariana.
e lazarentos que perambulavam pela vila, e o pai
Possuíam àquela altura grande prole, e aí residia a
o flagrara, recentemente, ajoelhado aos pés de um
maior preocupação do nobre Sargento de Ordenan-
mendigo limpando suas feridas com pedaços de
ças, cargo que recebera por méritos acumulados.
pano rasgados de sua própria camisa.
Seu sexto filho, batizado Joaquim Francisco e que
Horrorizado com o risco de contágio por doenças
contava apenas cinco anos de idade, vinha lhe dan-
em uma criança de tão tenra idade, que com certe-
do muitas preocupações.
za não resistiria à contaminação, praticamente ar-
Embora fosse uma criança esperta e saudável, não
rancara-o de lá, enquanto bradava com o meninote,
queria trabalhar nos negócios do pai. Empreen-
repreendendo-o. O filho olhou o pai com ar cândido
dedor, o Sargento Costa dedicava-se, além do seu
e respondeu, com voz doce e suave:
natural ofício de construtor, ao Moinho de Vento
- Mas, papai, ele estava sofrendo! Nosso Senhor Je-
que instalara num terreno baldio da vila, à casa de
sus Cristo nos ensinou a auxiliar a todos os nossos
comércio montada no centro da povoação e a di-
irmãos necessitados!!
versas plantações que possuía em terrenos diver-
Tamanho tirocínio numa criança tão pequena as-
sos localizados fora do eixo central da comunidade.
sustou o Sargento Costa, fazendo-o olhar com es-
Naquela época começava-se muito cedo, auxiliando
tranheza para o pequenino, como se estivesse dian-
nos afazeres da casa paterna, mas Joaquim Fran-
te de um estranho.
cisco era uma criança diferente. Sempre com um ar
Tais acontecimentos tiravam o sossego do casal
65
que, à noite na cama, punha-se a elucubrar sobre
a causa cristã para toda a vida.
os fatos acerca da vida do filho:
Joana contou-lhe sobre a capelinha no alto do mor-
- Sabe, Tomáz, acho que nosso filho é um santo...!
ro, sobre a pequenina imagem do Menino Deus que
- Deixa disso, Mariana! Ele é apenas uma criança...
tanto idolatrava e a do Senhor dos Passos, que viera
diferente! Precisamos discipliná-lo para que pare
abençoar a Vila de Nossa Senhora do Desterro de
com estas doideiras e se dedique ao que é realmen-
maneira tão especial, obtendo nesta narrativa a to-
te importante para seu futuro: o trabalho!
tal atenção de Joaquim. A impressão que o encontro deixou na alma daquela criança foi tão funda quanto perene. Passou dias
Na manhã seguinte, ao sair da porta de casa rumo
e dias quieto, meditativo, e quando a mãe, preocu-
ao serviço, bem cedo pela manhã, Tomáz deparou-
pada com o ensimesmamento do rapaz perguntou
se com uma cena inusitada, que lhe causou funda
se ele precisava de algo, pediu para ser levado à
emoção: viu seu pequeno filho, cujos alourados ca-
capelinha do alto do morro, para ver a “Beata”. Nes-
belos formavam um natural halo de luz em volta da
ta época Joana contava 78 anos e as forças come-
cabeça, olhando embasbacado para a Beata Joana
çavam a abandoná-la. As irmãs que viviam com ela
de Gusmão, que aquela manhã madrugara para ti-
desvelavam-se em cuidados e faziam de tudo para
rar esmolas pelas suas obras de caridade.
impedi-la de sair às ruas para esmolar, uma vez que
Esta, ao passar diante da casa dos Costa, deparara-
já demonstrava claros sinais da fraqueza caracterís-
se com aquela criança de olhos únicos, especiais, e
tica de tão avançada idade.
nada disseram um ao outro. Uma natural atração os ligou, a mesma veneração pelas obras da fé que encantava a boa senhora ressoava no coração da
Enquanto isto acontecia, a Irmandade do Senhor
criança. Ela o chamou, ele aproximou-se e ficaram
Jesus dos Passos ia recebendo um número cada
a conversar, porém dois diálogos aconteceram de
vez maior de novos adeptos, todos interessados em
maneira paralela. Enquanto a Beata perguntava da
participar em suas atividades e, principalmente, au-
vida e das coisas cotidianas, recebendo respostas
xiliar na organização da procissão, data máxima do
educadas e cordiais do menino, os corações de am-
calendário de acontecimentos da Vila.
bos entoavam a mesma canção devocional de amor
Anualmente a população ia engrossando o evento,
a Deus e ao Senhor Jesus. As almas reconheciam-se
tornando-o cada vez mais prestigiado, e o número
como semelhantes e, inspirado naquele modelo de
de tarefas aumentava proporcionalmente à sua im-
pureza, muito em breve também Joaquim abraçaria
portância. Desde que a imagem fora solenemente
66
conduzida, num andor improvisado, desde a em-
A renda de Irmandade do Senhor Jesus dos Passos,
barcação que a trouxera até a Capela do Menino
a fim de fazer frente às inúmeras e crescentes des-
Deus, naquela inesquecível manhã de 1764, ficara
pesas que iam se avolumando, provinha de esmolas
como que automaticamente instituído o ritual da
e da contribuição dos irmãos, mas se tornava cada
procissão, que tanto alento trazia às almas dos ha-
vez mais difícil a conciliação de contas, uma vez
bitantes daquela remota terra insular.
que a entidade já iniciara com um vultoso débito
Desde a primeira procissão oficial, realizada no ano
de 178$345 réis resultante do pagamento do ca-
seguinte, 1765, foram instituídos e instalados, ao
pitão do navio que deixara em terras catarinenses
longo de todo o itinerário, pequenos oratórios alu-
a santa imagem, bem como das primeiras despesas
sivos às estações da via sacra, nos quais se deposi-
necessárias aos paramentos e translado da mesma,
tavam esmolas.
desde o navio até a capelinha. Avultavam também
67
os gastos com cera, cada vez mais numerosos, obrigando os irmãos da Mesa Administrativa a adiantarem dinheiro do seu bolso para fazer frente às despesas. Dos 100$000 réis gastos no exercício de 1767, 35$520 mil réis foram equivalentes aos gastos com a cera para as velas. Mas a Irmandade tinha uma preocupação bem maior do que esta. A imagem do Senhor dos Passos, imponente e majestosa, requeria um local mais adequado à visitação dos fiéis. A modesta Capela do Menino Deus, ainda por acabar, não comportava um altar à altura da sua imponência. Por outro lado o povo, para satisfazer a sua fé, acorria constantemente a esta, onde a imagem estava por empréstimo. Urgia construir um local mais amplo que ela estava a pedir e merecer. A melhor ideia era ampliar a própria Capela onde se encontrava, mas a Irmandade se via a braços com dificuldades imensas para alcançar este fim. Isto sem falar na principal preocupação dos irmaõs, sempre zelosos de suas responsabilidades como guardiões do Senhor dos Passos: seguir a filosofia do Mestre e Senhor, praticando a verdadeira caridade aos pobres. A vila pululava de mendicantes, doentes e idosos no desvalio, as carências e necessidades eram prementes e a Irmandade sentia-se instada a fazer algo de efetivo em prol desta pobre gente. Os historiadores da medicina são unânimes em afirmar que o século XVIII foi um período de estagnação em termos de descobertas biomédicas ou de conquistas terapêuticas. Foi, no entanto, uma época
68
marcada pela revolução produzida com a filosofia
ples de higiene. O somatório era trágico: uma sim-
natural, cujo ideal era a constante busca de inte-
ples ferida podia levar à morte qualquer indivíduo,
gração de saberes. A medicina dos séculos XVII e
mesmo os mais saudáveis.
XVIII teve seu percurso determinado pelo empiris-
Era este quadro que angustiava os integrantes da
mo e pelo racionalismo, acrescido do método de-
Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, bem como
dutivo de Descartes, fundamentado em conclusões
a necessidade urgente de ampliar a capela na qual
lógicas. O resumo desta situação é que o povo, de
a imagem estava entronizada, quando a Beata Jo-
uma maneira geral, estava abandonado à própria
ana de Gusmão ingressou em seus quadros como
sorte. Destarte, esta situação era muito mais gra-
irmã. Trazendo inata em si a consciência do espírito
ve nos ermos dos sertões quase desabitados deste
de caridade, a boa mulher iniciou imediata campa-
imenso país. A total ausência de profissionais da
nha, esmolando pelas cercanias do Desterro a fim
cura, mesmo os chamados cirurgiões barbeiros,
de arrecadar fundos para os planos da Irmandade,
que possuiam um conhecimento prático eivado de
apesar da avançada idade e saúde já debilitada. Ou-
preconceitos e empirismo, mas ainda assim podiam
tros irmãos abnegados também se puseram à rua,
auxiliar de modo geral, devastava as populações do
esmolando em favor da obra da Capela.
interior de maneira inclemente.
Na procissão daquele ano de 1766, a segunda a
Somado a este quadro dantesco da saúde pública,
realizar-se, foram introduzidas três práticas tra-
encontrava-se a completa ausência de saneamento
dicionais até os dias de hoje: a representação do
básico, e o desconhecimento das regras mais sim-
lenço com que Verônica enxugou o rosto de Cristo
69
a caminho do Calvário, a música acompanhando a
ram a construção célere do importante edifício.
procissão e a distribuição de cartuchos de amen-
O custo total da obra avultou a 421$810 réis, as-
doim coberto com açúcar.
sim divididos:
No que tange à música, o primeiro regente foi o
Salários dos pedreiros, serventes e materiais,
Irmão José de Almeida Moura que, além de músico,
pago em agosto 1769: 34$060
era também mestre de primeiras letras na vila. A
Em setembro: 52$450
Irmandade do Senhor Jesus dos Passos pagou a ele
Em outubro: 58$670
9 mil réis pela música naquele primeiro ano, o que
Em novembro: 106$750
não o impediu de contribuir com 1280 réis para a
Em dezembro: 119$140
campanha de construção da Capela.
Esmolas dadas aos escravos que trabalharam nas obras: 50$740, totalizando então os 421$810 réis devidos à construção. A este total deveria ser acres-
Graças as articulações políticas dos seus integran-
cida uma parcela devida ao administrador da obra,
tes, a Irmandade solicitou e obteve, na data de 3
justamente o Tesoureiro da Irmandade do Senhor
de julho de 1767, um significativo aporte finan-
jesus dos Passos e pai de Joaquim, o Sargento de
ceiro do Bispo do Rio de Janeiro, bem como a au-
Ordenanças Tomáz Francisco da Costa, mas este
torização para a devida ampliação da Capela. Mas
doou seu trabalho como esmola à Irmandade.
as obras iniciaram apenas no ano seguinte, 1768,
Para a inauguração, a Capela foi solenemente en-
uma vez que a Irmandade almejava arrecadar to-
galanada com uma belíssima cruz de jacarandá,
dos os fundos necessários até a conclusão da obra.
castiçais de estanho, campainha e cortinas de ta-
E assim se fez, dando-a por concluída em apenas
fetá. Todas estas despesas acarretaram um déficit
quatro meses, a dezembro de 1769. No período
no caixa da Irmandade e mais uma vez o pai de
anterior à construção, foi grande o empenho da Ir-
Joaquim compareceu com sua ajuda, cobrindo com
mandade e todos os seus integrantes, bem como de
recursos próprios os 46$085 réis faltantes para o
toda a comunidade desterrense. A bolsa da Irman-
encerramento das atividades do ano.
dade correu pelas portas de toda a vila e arrecadou
A população acorreu em massa à celebração oficial
esmolas totalizando quase 50$000 réis, sem falar
de inauguração, feliz e aliviada por haver contribuído
na caixinha da Capela, que recolhera mais 21$985
para dar um local à altura da Imagem do Senhor Je-
réis. Vários devotos tiraram esmolas nas freguesias
sus dos Passos, que velava do alto do morro, dentro
vizinhas ao Desterro, recursos estes que, somados
da alva Capela, pela população de toda a Vila de Nos-
às esmolas doadas pelos Irmãos em mesa, permiti-
sa Senhora do Desterro da Ilha de Santa Catarina!
70
71
CapĂtulo V
1775 Um encontro inesquecĂvel
72
73
Aos 87 anos, Joana estava bastante enfraquecida
Joaquim, por outro lado, reverberava em juventu-
pelas lutas travadas ao longo de uma vida difícil e
de. Contava agora 14 anos e estava no auge de seu
sofrida. A população do vilarejo idolatrava-a qua-
vigor juvenil. Seu pai, D. Tomáz Francisco da Costa,
se como uma santa, procurando-a para toda sorte
aquele mesmo homem cuja extensa folha de servi-
de orientação, desde as espirituais até as mais sim-
ços prestados à Vila já lhe haviam rendido um título
ples e corriqueiras indicações de conduta pessoal.
de Sargento de Ordenanças e todo o reconhecimen-
Apesar da fraqueza que lhe impunham os muitos
to da comunidade, membro fundador da Irmandade
anos vividos de maneira árdua, jamais se negava
do Senhor Jesus dos Passos e construtor da Capela,
a receber ninguém, a todos ouvindo com bonda-
não se conformava. Seus muitos negócios estavam
de e trazendo sempre pronta a resposta franca e
a exigir a atenção de todos os filhos, mas Joaquim
objetiva, sem deixar de ser bondosa. Também não
não se adaptara a nenhuma atividade profissional
descuidara das meninas abandonadas as quais, ao
nas quais ele havia tentado enquadrá-lo. Havia o
tomar conhecimento, recolhia e terminava de criar
moinho, as criações de animais, as plantações de
e educar dentro dos preceitos sociais adequados.
milho, aipim e verduras, a casa de comércio e o
Estas protegidas, bem como as auxiliares que vi-
negócio das construções, mas em nenhuma dessas
viam com ela a fim de ajudar em suas boas obras,
atividades o filho se adequara. De todas permane-
também a viam como uma santa, e a respeitavam
cia alheio, sempre com os olhos postos no alto, um
de tal forma que bastava um olhar da mestra para
ar vago de quem não pertence ao mundo material
que as aprendizes baixassem os olhos e corrigissem
e o total desinteresse pelas coisas da matéria. Tra-
qualquer comportamento que fosse alvo de repri-
balhando na casa de comécio da família se dera o
menda da veneranda senhora.
maior desastre, pois era preciso vigiá-lo, ou tratava
Sua capelinha brilhava, imaculadamente branca,
de doar bens, víveres e mesmo dinheiro do caixa
na intensa luz insular da capital da província. A
para quem por ali passasse, esmolando ou necessi-
construção anexa ao original, mandada fazer pela
tado de algo. Espertos, os mendigos já conheciam a
Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, tornara-a
proverbial bondade do rapaz e, aproveitando-se da
ainda mais bela e majestosa, apesar de toda a sua
ausência do pai ou de irmãos mais velhos, iam bater
singeleza. Era contrastante ver a simplicidade de
à porta da casa pedindo ajuda. Joaquim exultava de
sua construção, sentindo ao mesmo tempo a força
alegria quando conseguia fazê-lo, dizendo sempre
espiritual da sua presença no cimo do Monte de-
que, além de fazer a caridade “que Nosso Senhor
nominado pelos antigos de “Bela Vista”, não sem
nos ensinou” ainda estava a auxiliar na salvação da
motivo.
alma de seu pai. Foi necessário excluí-lo das ativi-
74
dades comerciais da família, para evitar maiores
pontos de vista divergentes causaram sérios incô-
prejuízos e, por fim, o pai resignou-se, deixando-o
modos a ambos até o dia em que, finalmente, o pai
entregue ao seu processo interior de devoção.
compreendeu que a grandiosidade da alma do filho
Na cabeça do bom homem, estes assuntos estavam
ultrapassava o seu parecer mundano. Mas até che-
irremediavelmente separados. Considerava-se – e
gar esta data ainda muitos fatos ocorreriam.
certamente o era – homem pio e generoso, que contribuía substancialmente para a caridade na vila, doava dinheiro, trabalho e dedicação como tesoureiro
Joaquim ia com frequência visitar Dona Joana, e
da Irmandade e principal construtor da região. Mas
juntos oravam em contrito silêncio na paz da Ca-
não conseguia apreender o significado que o filho
pela. Ali suas almas se elevavam e ambos pareciam
dava à questão da dedicação à causa religiosa. Seus
cercados de uma aura de santidade tão evidente,
75
que ninguém ousava interrompê-los. Pouco fala-
santos e... sua voz então falhava, presa de dúvidas
vam, e só vez por outra Joana dava alguns sábios
e angústias íntimas que só a alma experiente de
conselhos de matrona experiente das coisas do
Joana podia compreender. Embora compartilhasse
mundo ao jovem rapaz, quando este se exaltava na
do mesmo ideal caritativo, era uma mulher vivida,
manifestação da sua vontade de salvar o mundo
alquebrada pelos anos e pela experiência, e apren-
todo.
dera a exercer a paciência e a resignação.
- Senhora Dona Joana, há tanto a ser feito! Eu sin-
Então, docemente, acalmava a alma indômita do
to que tenho uma missão nesta vida, e já esperei
seu pupilo:
demais. Preciso trabalhar pela causa do Nosso Se-
- Calma, Joaquim. A tua hora vai chegar, sinto que
nhor Jesus, da Sua Santa Mãe, de todos os nossos
ela está bem próxima! Enquanto isto, urge que te
76
prepares, instruindo-te com as boas leituras, o si-
do Mestre José, exemplificando para os teus co-
lêncio, a oração e a meditação. Deus precisa dos
legas o respeito que ele merece. Todos estes são
seus soldados muito bem preparados para lutar o
deveres que alegram o Pai, e se os cumprires, esta-
bom combate. Mira-te no exemplo do Nosso Mes-
rás por ora fazendo a tua parte. Desafios maiores
tre Jesus; antes de ser o salvador do mundo, foi
virão quando estiveres preparado para eles, nunca
o filho amoroso, o irmão compassivo, o compa-
antes e nem um segundo depois das deliberações
nheiro fiel de quantos lhe cruzaram o caminho. Tu
do Divino Gestor!
também tens as tuas responsabilidades. Sê bom fi-
As palavras ao mesmo tempo suaves e firmes da
lho para tua mãe, Dona Mariana, que é uma santa
boa senhora acalmavam o coração do jovem, e ele
e caridosa mulher, e para Dom Tomáz, que tanto
ia para casa carregado de boas intenções, redo-
se aflige por ti. Sê companheiro compassivo e bom
brando nestas ocasiões o carinho pela família e
exemplo para teus irmãos e irmãs; sê bom aluno
todos que o cercavam.
77
vário, proveniente do Rio de Janeiro. A belíssima imagem viera para completar, juntamente com o O período de provedoria do Ouvidor Dr. Duarte de
Senhor Jesus dos Passos, o conjunto iconoclástico
Almeida Sampaio frente a Irmandade do Senhor Je-
da procissão que, a cada ano, reunia maior núme-
sus dos Passos finalizara em 1772, depois de sete
ro de fiéis e crescia em importância. O Senhor do
anos de dedicação e esforços realizados em prol da
Calvário possuía um resplendor de prata com pe-
entidade. Deixara-a com senso do dever cumprido,
dra carmezim, uma grande cruz de madeira e mais
uma vez que a Capela para abrigar a Imagem do
uma urna com vidraças, equipada com um colchão
Senhor dos Passos fora construída e equipada, a
forrado de tafetá cor de pérola, um lençol de cassa
procissão anual estava consolidada, mais de uma
riscada e um véu de ló branco decorado com ramos
centena de irmãos já estavam devidamente inscri-
de ouro. A imagem possuía braços articulados, de
tos nos anais da Irmandade e, para sua alegria e
modo a poder representar Jesus em duas posições:
glória, ainda pudera adquirir, no último ano de seu
crucificado e morto, depositado no féretro.
exercício no cargo, uma imagem do Senhor do Cal-
Na eleição daquele ano os irmãos quiseram recon-
78
duzi-lo ao cargo, mas ele objetou veementemente.
José dos Santos; a viúva Ana Francisca de Jesus;
A Irmandade precisava de alguém de pulso firme,
o vigário da Lagoa, Padre Manuel da Cruz Gomes;
força na condução de seus destinos e ele estava
Francisco dos Santos Xavier, que era então um ci-
minado pela doença e pela avançada idade. Com
dadão emérito da vila e ocupava, por merecimento,
efeito, apenas alguns meses depois veio a falecer,
o posto de Sargento-Ajudante; Dona Caetana da Sil-
comprovando que fora justo com a entidade até
veira, filha de um dos instituidores da irmandade; o
nesta sua última decisão.
Capitão João de Andrade, (que viria ser esmoler da
Foi velado e sepultado na Capela do Menino Deus
entidade na região da Lagoa, no período de 1780
e do Senhor Jesus dos Passos, como rezava a tradi-
a 1801), Manuel Vieira Quaresma, que também se-
ção daquela época.
ria esmoler da Irmandade no futuro; Ana Maria de
(Somente em 1842 a Irmandade obteria autoriza-
Jesus, irmã de Joaquim e segunda filha de Tomáz
ção para a instalação do cemitério oficial onde são
Francisco da Costa a ingressar na irmandade – seu
sepultados, desde aquela época até a atualidade, os
irmão Miguel Francisco já o fizera em 1774; o casal
seus membros.)
João Homem Coelho e Catarina de Jesus; Francisco
Em seu lugar foi eleito Pedro da Costa Marim, que
Vieira, Domingos da Rosa e Antônio de Melo Albu-
era Sargento-mor da Vila. Como secretário foi eleito
querque.
Francisco José Castro e Tomáz Francisco da Costa
Os graves desígnios que se desenhavam sobre a
voltou a ser reconduzido ao cargo de Tesoureiro,
Vila e seus moradores levaram a Mesa Administra-
em substituição a Manuel Dantas. O novo prove-
tiva da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos a
dor não foi reeleito, por motivos políticos. Acabou
tomar uma atitude surpreendente. Enquanto uma
sendo expulso da Província, vitimado por uma in-
azáfama bélica movimentava a ilha, a vila e seus
justiça da Corte Portuguesa, e só foi devidamente
moradores por conta da guerra entre Portugal e
inocentado quando o venal Marquês do Pombal
Espanha e as incríveis intrigas políticas que mo-
perdeu seu proverbial poder, com a morte do Rei
vimentavam as cortes europeias, e reverberavam
Dom José I. No lugar de Pedro da Costa Marim foi
sobre a colônia brasileira, a Irmandade optou por
eleito provedor Félix Gomes de Figueiredo, que era
eleger um provedor, no mínimo, diferente do usual:
também Provedor da Fazenda Real.
o Alferes Antônio José da Costa, de apenas 30 anos.
No ano de 1776 quatorze novos irmãos foram ad-
Félix Gomes de Figueiredo, homem experimentado
mitidos na Irmandade do Senhor Jesus dos Pas-
nas lides políticas da corte portuguesa, sabia muito
sos: Tomás de Aquino, que passou a ser esmoler
bem que, como Provedor da Fazenda, sua presença
da Irmandade em São José; o mestre carpinteiro
à frente de uma entidade chamaria atenção sobre
79
ela, no caso de uma possível invasão espanhola.
tripulantes, totalizando 19 mil homens. Nunca uma
Quanto mais obscura fosse neste grave momento
força tão poderosa atravessara os oceanos em dire-
de crise internacional a existência da Irmandade,
ção às terras brasileiras.
menos problemas ela teria para continuar exercen-
A Espanha vinha para retomar o Rio Grande do sul,
do seu nobre papel, sem maiores interferências. As-
anexando a ele a Ilha de Santa Catarina, a respeito
sim sendo, o rapazola foi escolhido e toda a Mesa
da qual sabiam os espanhóis, sobejamente, que era
Administrativa, muito mais experiente e matreira,
mal guardada.
continuou gerindo, em conjunto, os destinos da Ir-
No exato dia em que a formidante esquadra pai-
mandade do Senhor Jesus dos Passos e suas graves
rou à frente da Ilha de Santa Catarina, o luto cobriu
responsabilidades. Comparado com os provedores
Portugal com a morte do Rei Dom José I. Ele foi
anteriores, que haviam sido um Governador Geral,
substituído pela filha Maria I, entre muitas intrigas
um Ouvidor Geral, um Sargento-mor Comandan-
e disputas pelo poder.
te de Fortaleza e um Provedor da Fazenda Real, o
A força espanhola pairou majestosa frente à ilha
jovem Alferes não tinha nenhum peso social nem
mas, em vez de demandar a barra, foi fundear livre-
político, o que para aquele momento representava
mente na enseada das Canasvieiras, junto à ponta
a melhor atitude a tomar.
do norte. Todos os fortes portugueses renderam-se
Não foi preciso esperar muito para ter certeza de
sem um único tiro, pois a superioridade espanhola
que a atitude tomada revelara-se acertada. No iní-
era tão notória que de nada adiantariam atos de
cio do ano de 1777 as funestas previsões do fa-
heroísmo isolado. A esquadra portuguesa compos-
lecido ouvidor e provedor Dr. Duarte de Almeida
ta de 12 navios que patrulhava as águas do sul, e
Sampaio se tornaram realidade e a Ilha de Santa
que poderia ter feito algum movimento em prol da
Catarina foi tomada pelos espanhóis, sem que a po-
defesa desta terra, sumira-se sorrateira na enseada
pulação e as tropas para ali deslocadas a fim de
das Garoupas tão logo avistara a frota espanhola,
protegê-la tivessem como reagir à soldadesca co-
e fizera-se ao mar rumo ao Rio de Janeiro, abando-
mandada pelo bravo capitão espanhol Dom Pedro
nando os ilhéus catarinenses à própria sorte. O alto
de Zeballos. A corte reunira na capital da província,
comando militar português rendeu-se, para deses-
contando com a força regular e as extraordinárias
pero e desonra de muitos civis e militares de menor
para lá enviadas, cerca de 2 mil homens. A Espanha
patente que, no entanto, não eram apoucados em
enviou uma formidável expedição composta de 19
brio pessoal e queriam lutar em defesa da terra. Em
navios de guerra e 97 navios mercantes, com 632
poucos dias a Ilha estava completamente nas mãos
canhões, 10 mil soldados, 550 sapadores e 8.500
dos espanhóis.
80
Briosos e cientes de sua superioridade em forças e
que é mais concernente com as almas pias: galgou
contingente, desembarcaram e tomaram posse da
celeremente o Morro da Bela Vista e foi se albergar
Vila sem maiores transtornos. Não interessava ao
perto de Dona Joana de Gusmão, esperando a pro-
imponente Dom Pedro de Zeballos, agora transfor-
teção divina que certamente recairia sobre tão boa
mado em Vice-rei por obra e graça dos soberanos
mulher.
da Espanha, fazer uma tomada violenta que pu-
Dona Joana nem titubeou, nem demonstrou fra-
desse comprometer a sua estratégia. Assim sendo,
queza. Organizou as massas e mandou rezarem o
nada fez aos aterrorizados desterrenses, embora
terço enquanto uma pequena força-tarefa de mu-
estes se escondessem apressados à chegada daque-
lheres cozinhava aipim e fazia pães para alimentar
les. Muitos moradores fugiram para o continente,
a multidão que se aglomerara em volta da sua casa.
em demanda da mataria fechada que os poderia
Naqueles dias Joaquim não desgrudou do seu lado,
ocultar aos conquistadores, enquanto outros se li-
auxiliando em tudo quanto pôde, socorrendo aflitos
mitaram a fechar portas e janelas e se encolheram
e doentes, varrendo o chão do grande acampamen-
dentro de suas casas. Mas a maior parte fez aquilo
to com vassouras improvisadas com galhos amar-
81
rados e executou um sem número de tarefas, alegre
fica durante aquele ano em que durou a ocupação.
de poder ser útil ao seu semelhante. Sua verdadeira
Extremamente religiosos e algo supersticiosos, os
vocação florescia naqueles momentos de angústia
espanhóis ficaram impressionadas com a atmosfe-
e dor: cuidar do próximo, levar alívio a quem so-
ra mística da ilha. A Capela no alto do Morro da
fre, mitigar a fome, a sede e as dores dos aflitos de
Bela Vista, contendo aquela imagem imponente que
todo o mundo. Os doentes eram seu alvo preferido
velava pela ilha, e ainda por cima construída pelo
e deles cuidava com um desvelo incomparável, cha-
zelo e vontade de uma mulher que, àqueles rústicos
mando a atenção de quantos viam aquele jovem,
homens de guerra mais parecia uma santa, compu-
na flor da idade, ajoelhado diante dos mais abjetos
nha uma situação que em muito impressionou os
indivíduos para socorrê-los.
dominadores e favoreceu os dominados. Somadas
Mas as esperadas e temidas hostilidades não acon-
as questões financeiras e religiosas, o saldo da ocu-
teceram. Os espanhóis negociaram a sua estada na
pação acabou sendo favorável aos catarinenses.
ilha conquistada com surpreendente cordialidade e
A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, oculta
educação, e se estabeleceram sem mais delongas na
através da provedoria do insignificante Alferes An-
Vila, iniciando uma estratégia de conquista das mais
tônio José da Costa e sem realizar praticamente ne-
interessantes. Começaram a comprar dos ilhéus
nhuma reunião, nem outras atividades que sobre
tudo aquilo que necessitavam para a subsistência
ela pudessem despertar atenção, permaneceu em
dos mais de 2 mil homens que lá permaneceram
vigilante silêncio durante todo aquele ano. Ninguém
para garantir a posse castelhana da ilha, pagando
se filiou, também para não despertar suspeitas, e o
bem e em metal sonante. Logo os comerciantes e
dinheiro que a entidade possuía ficou silenciosa-
trabalhadores dos diversos ofícios começaram a
mente escondido num buraco cavado sob a cama
ver o lado prático da presença dos espanhóis: a
do casal Mariana e Tomáz Francisco da Costa, os
possibilidade de fazer bons negócios.
pais de Joaquim.
Assim sendo, trataram de conviver, da melhor ma-
Porém a roda do destino continuava movendo o
neira possível com seus invasores, evitando confli-
carro da intrincada política europeia. Morto Dom
tos e maiores sofrimentos decorrentes destes. Salvo
José I, aceitou a nova Rainha, D. Maria I, a demissão
melhor juízo, não havia nada a fazer, nem forças
do temível Marquês de Pombal, mudando assim o
suficientes para resistir, então a melhor política era
rumo da história. A Rainha Viúva, D. Mariana Vi-
a da conciliação, e foi isto que fizeram os dester-
tória, que era irmã do Rei de Espanha, conseguiu
renses. Os fatores religiosos foram determinantes
junto a ele o restabelecimento da paz entre as duas
para o estabelecimento de uma convivência pací-
nações, com a assinatura do Tratado de Santo Ilde-
82
fonso.
período. Sabedores da constante mudança de ru-
É curioso elucubrar se, nos faustosos salões onde
mos políticos, tinham no fundo a certeza de que
se deram essas negociações, em meio à complexa
a situação se afigurava temporária, assim sendo,
etiqueta dos encontros de cabeças reais, alguém
nada fizeram no sentido edificante. O novo gover-
sabia da existência daquela pequena ilha que ama-
nador encontrou a Vila numa situação miserável, e
nhecia a cada dia iluminada por um sol incompa-
foi necessário que empregasse todas as suas forças,
rável, que colocava um brilho inusitado numa alva
conhecimento, diciplina e espírito de liderança para
capelinha, que por sua vez, abrigava seres de escol
as obras da reconstrução.
que, sem nem sequer ter consciência, lutavam por
Durante todo o período da ocupação espanhola,
um mundo melhor e iriam ser determinantes para
não deixou de arder um único dia a lâmpada do
o futuro daquela nação embrionária! O fato é que,
Senhor Jesus dos Passos, iluminando a Capela e os
no Tratado celebrado, ficou determinado que a Ilha
corações aflitos que ali acorriam para orar e buscar
de Santa Catarina seria devolvida, num período de
forças mediante a situação indefinida que viviam.
quatro meses, aos seus legítimos donos, a coroa portuguesa. Na data de 30 de julho de 1778 Francisco Antônio da Veiga Cabral da Câmara, fidalgo da Casa da Rainha Fidelíssima e Governador nomeado da Ilha de Santa Catarina assinou, juntamente com Guilherme Vaughan, Marechal de Campo dos Exércitos de Sua Majestade o Rei da Espanha, o Termo de Entrega da Ilha. No dia 02 de agosto seguinte a população assistiu, aliviada, as quatro fragatas espanholas sumirem no horizonte encapelado do oceano, levando consigo as amargas lembranças daquele período de desonra e humilhação. Aquele período de um ano e meio de ocupação deixou a Vila de Nossa Senhora do Desterro devastada. Naturalmente, os espanhóis nada haviam feito no sentido de preservar o patrimônio construído da pequena povoação, nem contribuído para seu desenvolvimento durante aquele
83
Envergonhado, Joaquim dominou a natural ânsia juvenil e ajudou D. Joana a se deslocar para a Capela. Sentados no frescor da sombra que as protetoras paredes ofereciam, nimbados pelo halo de luz emitido pela lâmpada sempre acesa do Senhor Jesus dos Passos, entregaram-se ao ritual das orações. Depois de longo silêncio, Joana respirou fundo e disse, pausadamente: - Joaquim, avizinha-se a minha partida deste mundo. Sinto fraquejarem minhas forças e, a cada dia, aproximar-se de mim o Reino do Pai. Antes que Joaquim, que já se preparava para arguir contra aquela colocação, sequer falasse, Joana levantou a mão, imperiosa, e prosseguiu: - Não percas tempo em discutir, menino! As leis do Pai devem ser seguidas e meu tempo nesta terra está se encerrando. Mas antes de partir, quero encarregar-te de uma missão que muito fará pela tua alma... Vais ser a partir de agora o responsável pela lâmpada do Senhor Jesus dos Passos e por todo o Assim que se deu a libertação, Joaquim recebeu,
asseio e guarda da nossa Capela! Do teu zelo vai
em sua casa, um chamado de Dona Joana. Acorreu
depender a manutenção desta chama acesa sem-
pressuroso em demanda da boa mulher, subindo
pre, iluminando as almas dos nossos desterrenses e
aos trotes o morro até o pé da capelinha. Beijou res-
chamando-os para a fé contrita que devem profes-
peitoso a mão da veneranda senhora e, afoito como
sar, bem como os cuidados necessários que a nossa
todos os jovens, arguiu sobre o chamado.
Capela tanto merece. Sei, meu querido menino, da
- Calma, meu filho! A tua juventude não encontra
vontade que tens de ajudar a todos. Sinto que fa-
ressonância neste velhos ossos. Quero falar-te, mas
rás lindas obras no decorrer da tua existência. Mas
vamos com calma! Ajuda-me, para que possamos
também sei que enfrentarás enormes dificuldades.
sentar-nos na Capela e primeiramente oremos ao
Então, quero deixar-te, como dádiva maior do meu
Pai Santíssimo.
coração, os presentes conselhos que devem guiar-
84
te quando enfrentares as turbulências naturais às
Recebe a dificuldade como ensejo de combate.
consciências que verdadeiramente amam a Deus.
Aceita a dor como mensagem de despertamen-
Quando te defrontares com as piores situações, não
to. Acolhe a provação com alegria. Considera o
te esqueças:
problema como exame do teu aprendizado. Escuta o grito da perseguição com os ouvidos do entendimento.
A semente, para libertar o vegetal que conduz
E, se for necessário sofrer todas as dores para
em germe, não se nega a vencer o solo que a
atestar a excelência das tuas convicções em Je-
agasalha...
sus Cristo, não te deixes entibiar.
O rio que busca o oceano não se detém ante os
Recorda a “via dolorosa”... que não é somente
obstáculos que lhe impedem o curso...
uma demonstração de tragédia evangélica, mas
A dificuldade é, assim, teste de resistência em
apelo veemente a falar pelos séculos, e atende
forma de ensejo alentador.
ao chamado incompreendido que te acena.
Se a dor, em sua apresentação multiforme, te
Os triunfadores, na Terra, são apenas corações
chega às portas do coração, para, momentanea-
enganados. Os sorridentes, na Terra, são somen-
mente, para orar e reabastecer o espírito. Atra-
te companheiros infantis. Os felizes, na Terra,
vés da prece lenificadora, a doação celeste te al-
são igualmente almas equivocadas.
cançará o entendimento, revigorando as fibras
Os verdadeiros heróis, na Terra, são aqueles
da vida para o prosseguimento da jornada.
que, ignorados, se fizeram pães para estômagos
85
vazios, agasalhos para corpos desnudos, alber-
Ergue-te acima de todas as vicissitudes e fiel a
gue para almas vencidas pela ventania, clari-
ti mesmo no dever maior, alcançarás a paz com
dade para os que dormem na treva e esperança
a consciência, após a vitória sobre as dificulda-
para os aparvalhados pelo medo, paralisados no
des.
desequilíbrio... e não se jactam por tanto. Ante as dores, na Terra, não há lugar para relacionar queixas, nem lamentações, nem calú-
Joaquim não tinha palavras para responder ou ar-
nias.
guir. Sentia-se como que tocado por um anjo, en-
Cumpre com teu dever.
levado pelas belas palavras e conselhos daquela
Se aguardas compreensão humana, despertarás
verdadeira santa. Beijou-lhe as mãos, com respei-
nas palhas queimadas pelo desconforto e pelo
to e amor incontidos, e voltou, silencioso e pensa-
desengano.
tivo, para a sua casa. A partir daquele dia, zelou
Se desejas, entretanto, servir Àquele que é de to-
com denodo incomparável pela lâmpada do Senhor
dos Senhor e Mestre, continua vencendo a difi-
Jesus dos Passos e pela Capela, não havendo um
culdade maior que reside no teu íntimo – o ego-
dia, independente do tempo, das condições e dos
ísmo, alma do orgulho, e seiva de outros males.
seus afazeres, em que não se fizesse a caminho da
86
Capela para executar as humildes tarefas de que
celos decidiu pela entrega definitiva desta à Irman-
fora investido. No dia 16 de novembro de 1780,
dade do Senhor Jesus dos Passos. Isto fez com que
com 92 anos, Dona Joana entregou a alma a Deus,
muitos cidadãos se animassem a ingressar em suas
pacífica e mansamente, assim como tinha vivido to-
fileiras, sendo em número de 105 os registros de
dos aqueles anos. Foi velada e chorada por todos
ingresso, somente em inícios de 1781.
os desterrenses, que sentiram partir, com ela, um pedaço do paraíso na terra.
No dia 19 de outubro de 1781 o Juiz Ordinário da
Enquanto os rumos da Vila e da Capitania iam sendo
Vila compareceu ao consistório da Irmandade e, em
traçados nas mesas dos políticos da corte, Joaquim
conjunto com o então Provedor Manuel de Souza
descobria, a cada dia, a força da sua vocação reli-
Medeiros, consignou o Termo de Entrega definitiva
giosa. Amadurecera surpreendentemente naquele
da Capela:
período, e mais uma vez a sabedoria de D. Joana revelara-se profunda, dando ao rapaz aquelas tarefas na Capela. Na observação disciplinada e diária
“Aos dezenove dias do mês de outubro de hum
do trabalho para o qual havia sido incumbido des-
mil setecentos e oitenta e um, no consistório e
pertaram suas verdadeiras convicções e teve toda
plena Mesa Administrativa da Irmandade do
a certeza do seu papel no mundo. A partir daquele
Senhor Jesus dos Passos, onde se achavam pre-
dia, nada demoveria aquele jovem de cumprir com
sentes o irmão provedor e mais irmãos de Mesa
os desígnios traçados para ele pelo Pai Celestial!
Administrativa, ali apareceu presente o Juiz Ordinário Capitão Domingos Gil da Silveira, para fazer entrega à mesma mesa, não só do Templo
No exercício de 1780 a 1781 foi eleito Provedor
do Senhor Menino Deus, como também de todos
da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos o Capi-
os bens, assim móveis como de raiz e também
tão Antônio Martins Couto e Crasto, um dos ins-
papéis concernentes à mesma igreja, em virtude
tituidores. Os ingressos nas fileiras da Irmandade
das ordens que teve do ilustríssimo e excelentís-
recomeçaram e foram recrudescidos assim que a
simo Senhor Vice-rei do estado e do Ilustríssimo
Capela passou definitivamente à sua guarda. Com
Senhor Governador desta ilha que, sendo apre-
o falecimento sucessivo de Dona Joana e, um pou-
sentadas em plena mesa, fez esta recebimento
co depois, da Beata Jacinta Clara da Vitória, para
dos bens seguintes:
quem aquela passara a guarda da Capela, o imóvel
Uma Capela com paredes de pedra e cal feita
ficara sub júdice até que o Vice-rei Luiz de Vascon-
às instâncias da falecida Dona Joana Gomes de
87
Gusmão e por despacho de excelentíssimo e re-
paramentado dos devotos da mesma santa; e da
verendíssimo Bispo Dom Frei Antônio do Des-
parte do Evangelho se acha colocada a Capela
terro; a qual tem 40 palmos de frente e 66 de
desta venerável Irmandade do Senhor Jesus dos
comprido até o arco da Capela-mor; e esta tem
Passos; e à mesma igreja se acha junto um so-
de fundo 30 palmos com sua tribuna; e a mes-
brado com três quartos e a este anexa uma casa
ma Capela ornada com dois altares colaterais
que serve de cozinha; e nos fundos da mesma
pequenos e outro da parte da epístola, em que
Capela, duas moradinhas de casas térreas e de
se acha colocada a Senhora Santa Rita, sendo
pau-a-pique, em que assistiam as beatas. Entregou mais uma escritura de aforamente de seis braças de frente e fundos que direitamente pertencerem, sitas na Rua do Livramento, de que é enfiteuta o Major Tomás Francisco da Costa, e paga anualmente seis mil e quatrocentos réis. Os bens móveis pertencentes a tal Capela são: Uma imagem do padroeiro, o Menino Jesus, com as suas vestimentas, ornado com uma coroa de prata, com o seu topázio, quatro pares de botões de ouro, uma cruz e cordão do mesmo, e também um relicário de ouro ornado com a mesma imagem; uma imagem de Santa Ana, com resplendor e coroa de prata; um cálix de prata dourado, com patena e colher do mesmo; duas coroas pequenas de prata com que estão ornadas duas imagens de barro; um arcaz de canela, onde se guardam os ornamentos; um relicário de metal com sua luneta de prata; uma lâmpada pequena de latão; um sino pequeno de bronze, quebrado; um turíbulo e naveta de latão. Os ornamentos entregues são: 2 amitos lisos; 4 alvas, três de renda e uma lisa;
88
3 cordões com seus paramentos, dois de damas-
É também entregue um preto por nome Pedro,
co e um de seda;
de nação Angola.
5 véus de cálix de cores; 4 toalhas do altar maior, e outras duas dos alta-
De cujos bens a mesma mesa se deu pro entregue
res colaterais;
com o recebimento que fez. De que, para constar,
3 bolsas de corporais, com seus corporais;
mandou fazer o presente termo, em que assinou
1 guarda do sacrário, bordada a fio de ouro;
o mesmo Juiz Ordinário, com o Provedor e mais
1 capa d´asperges branca;
irmãos de Mesa Administrativa desta benerável
2 dalmáticas;
irmandade, e eu, Luiz Rodrigues Pereira, Secre-
2 véus de ombros;
tário atual da mesma, que o escrevi.”
1 tapete de papagaio;
Assinaturas:
1 cruz esmaltada de madrepérola;
Juiz Domingos Gil da Silveira
3 frontais, dois de damasco e um de seda;
Provedor Manuel de Souza Medeiros
1 missal
Irmãos Vigário Inácio José Galvão, José da Gama
1 cortina de damasco carmezim, com seus ga-
Lobo Coelho, Francisco José Ferreira, Antônio
lões de seda, que servem para a boca da tribuna,
Martins Couto e Crasto, Domingos da Ponte Ca-
e outras ditas de pano de linho;
bral, Lourenço José Peneda, Francisco Homem da
89
evidenciado, nesta data, todo o patrimônio da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos: A curiosa relação foi elaborada em ordem alfabética:
1 arcaz de madeira de óleo, com dois gavetões e ferragens douradas; 1 andor do Senhor dos Passos, com suas ferragens e 8 almofadinhas de ombros, pertencentes ao mesmo andor; 1 bandeira de tafetá roxo, com cordões, borlas, varal e pirâmide; 9 balandraus de tafetá roxo; 1 Capela do Senhor dos Passos, de pedra e cal, com sacristia e consistório; 6 castiçais de madeira pintados para o altar e 4 castiçais de estanho pequenos; 2 cruzes de madeira para o ombro do Senhor, uma cruz grande do Calvário e um título de madeira, pintado para a mesma, com dois parafusos; 1 cruz pequena de jacarandá, marchetada, com Costa, João de Bitancurt Pereira, Tomás Francisco
Calvário para o altar;
da Costa, José da Costa Cidade, Manuel José Ma-
1 cálix de prata, com patena e colherinha do
chado, Antônio Lopes da Costa e Manuel Gomes
mesmo;
de Ataíde.
4 cadeiras rasas de jacarandá, com assento de amem carmezim; 2 cortinas de tafetá roxo da boca da tribuna;
Aproveitando o ensejo, o mesmo secretário que la-
2 cortinas de ruão preto, do pavilhão do Se-
vrara o Termo de recebimento inventariou os bens
nhor;
da Irmandade, relativos à Capela que havia sido
1 sobrecéu de ruão preto do mesmo pavilhão;
mandada construir pela Irmandade, ficando assim
11 cortinas grandes de ruão preto para a arma-
90
ção dos passos;
mentos, cruz e cabeleira;
2 retalhos do mesmo ruão que ficaram de resto;
1 imagem do Senhor do Calvário, idem;
2 cortinas de chamalote roxo, com galões, para
1 imagem de São João, idem;
o andor do Senhor;
Insígnias dos anjos da procissão: um açoite,
1 sobrecéu de chamalote do mesmo cortinado;
uma coluna, uma cruz, um cálix, uma coroa de
1 campainha de metal;
espinhos, uma escada, uma cana verde, uma lan-
1 caixinha de esmolas da Capela;
ça, um martelo, três cravos e duas verônicas do
2 caixinhas pequenas com fechadura;
senhor;
1 coberta de carneira vermelha para o altar;
6 lanternas de folhas de flandres, pintadas, com
1 coberta de chita para a mesa;
seus paus;
1 corda delgada de linho para as cortinas;
1 lâmpada de latão, com vidro e corda;
1 copo de vidro;
Livros: 2 da Receita e Despesa; 1 das Entradas; 1
1 frontal de chamalote branco e encarnado;
dos Anuais; 1 dos Termos da Mesa Administrati-
8 forquetas de ferro, com hastes de pau, perten-
va; mais um livro em branco para os termos da
centes ao andor do Senhor;
mesa; 1 de Inventários;
2 galhetas de vidro, com pratinho do mesmo;
1 missal novo, 1 missal velho e uma estante do
2 peças de galão branco para armação dos passos;
missal, com seu pano de chamalote;
1 imagem do Senhor dos Passos, com seus para-
1 mesa grande do consistório;]
91
Ornamentos, a saber:
4 varais de pau, pertencentes ao andor;
1 casula de chamalote branco e encarnado;
2 tapetes de papagaio, um grande e um pequeno;
1 estola e manípulo da mesma;
1 trombeta, com capa e vestimenta da figura;
2 bolsas para corporais, com seus corporais e
5 toalhas do altar, 1 toalha de mão e 1 lisa;
guardas;
Terra: seis braças de frente, no caminho da
3 palas;
Tronqueira que vai para o morro, e fundos até
2 amitos;
Amaro de Sousa.
2 alvas; 1 cordão;
Estava assim, evidenciado, todo o patrimônio da Ir-
2 manustérgios;
mandade do Senhor Jesus dos Passos naquele lon-
1 pedra d´ara;
gínquo ano de 1781.
4 véus para cálix, de cores;
92
93
Cap铆tulo VI
1782
Os prim贸rdios do HC
94
o inĂcio de uma grande obra
95
Fora-se um anjo, ficara outro. Com a morte de D. Joana, acabava-se uma era de doação, amor e autoridade moral na Vila de Nossa Senhora do Desterro. No entanto, seus ensinamentos haviam calado fundo numa alma já preparada para os sacrifícios. Quando entregou as funções de guardador da lâmpada do Senhor dos Passos, em outubro de 1781, Joaquim já tinha seus planos traçados. As honrarias e glórias mundanas não o atraíam, e também não sentia-se motivado a seguir a carreira eclesiástica, como queria o pai. Seu destino era o mundo, sua missão, a de salvar vidas, seu fanal, o anonimato das grandes almas. Dona Joana deixara marca indelével naquela alma alva e pura com seus conselhos e orientações. Travou-se uma grande batalha na casa da Família Costa quando Joaquim comunicou a sua decisão. O Sargento-mor Tomáz Francisco da Costa, agora um dos cidadãos mais eméritos da Vila, promovido que fora, por méritos e serviços prestados, ao posto de Sargento-mor, finalmente depois de muita luta interna, aceitara que seu filho era definitivamente diferente. No seu entendimento, então, o caminho a seguir era a carreira eclasiástica, que lhe permitiria cumprir com esta vocação, sendo útil ao próximo sem abrir mão do status conquistado a duras penas pela família. Mas Joaquim tinha outros planos. À prisão das salas empoeiradas, das mentes enclausuradas e da ortodoxia tradicional das organizações humanas, fossem elas quais fossem, preferia a liberdade dos campos, da imensidão da natureza
Imagem da Nossa Senhora do Livramento
96
sob o céu azul. Queria ser livre, agir pela própria
de zelar pelos seus destinos enquanto estivesse na
cabeça, sem necessitar seguir ordens ou sujeitar-se
Corte Imperial. Surgira uma grande oportunidade,
a orientações com as quais, sobejamente o sabia,
e a Joaquim foi oferecida viagem à terra natal dos
nem sempre concordaria. Assim como Dona Joana,
pais, a Ilha do Faial, nos Açores, juntamente com
queria mandar no seu destino, atuar de acordo com
um franciscano graduado que para lá partia, a fim
a sua consciência e agir onde se fizesse e sentisse
de assumir um alto cargo eclesiástico. Joaquim foi
necessário, trajetória impossível para um pupilo de
firme e manteve sua vontade mesmo quando, ao
qualquer ordem religiosa.
ser instado sobre sua pretensa “teimosia” pelo ami-
No entanto, apesar de sua veemente discordância,
go do pai, respondeu que não estava preocupado
acatou os desejos do pai e se dispôs a ir para o Rio
com vantagens, postos e cargos:
de Janeiro, em demanda da Ordem Fransciscana,
- O que eu desejo mesmo é a liberdade de ajudar
para nela entrar como Irmão Leigo. Mais uma vez
meus irmaõs, sem as injunções e facilidades ter-
recordava os conselhos da benfeitora quando, ainda
renas que poderiam me desviar do meu destino! –
em vida, acosenlhara-o a ser manso e cordato com
dissera inflamado e de olhos postos no céu. O que,
seus pais. Sabia perfeitamente e sentia internamen-
na ocasião, foi considerado bravata da juventude,
te que, fosse como fosse, Deus se encarregaria de
revelar-se-ia como a máxima clareza daquela alma
traçar seu destino. Antes de partir, numa comoven-
de escol, preparada pela Providência Divina para
te e singela cerimônia que bem demonstrava o seu
exercer na terra um mandato sacrificial.
desapego das coisas da matéria, abandonou o so-
Joaquim partiu para Portugal tão logo foram apres-
brenome paterno “Costa”, adotando “Livramento”,
tadas as providências necessárias, de lá retornando
numa homenagem à Nossa Senhora do Livramento,
somente no ano seguinte, diretamente para a sua
de quem era devoto contrito.
terra natal. Do que viu e viveu naquele período nada
Todas as providências tomadas no sentido de fazê-
falou nem comentou, mas voltou mudado, diferen-
lo ingressar na Ordem, porém, resultaram infrutí-
te. Parecia que dez anos haviam se passado, e não
feras. Severas penalidades políticas recaíam sobre
dez meses. O rapaz amadurecera repentinamente
esta no exato período em que Joaquim foi ao Rio
e, nas suas feições graves, poucas vezes se via a
de Janeiro, resultando infrutíferas as suas tentati-
sombra de um sorriso. Jamais se diria, olhando-se
vas de ingressar como irmão junto aos francisca-
à primeira vista, que era um moço de apenas 21
nos. Daquele insucesso passou a outro, decidindo
anos. No entanto, era terno e meigo no trato com
viajar para Portugal, mesmo indo contra a vonta-
as pessoas, respeitando a todos, mas desvelando-
de de um grande amigo de seu pai, encarregado
se de maneira incomparável com os pobrezinhos,
97
doentes, famintos e miseráveis.
português que descrevia as obrigações de todo cida-
A família ficou infeliz com o retorno do rapaz, o
dão para com seus conterrâneos. As Misericórdias
que aos olhos deles, configurava-se num insuces-
eram a pedra de toque do surgimento da maior par-
so. Voltara da mesma forma como fora, pelo menos
te das irmandades e confrarias desde a Idade Média,
aparentemente. Não conseguira ingressar em ne-
mas acabavam se tornando uma filosofia distanciada
nhuma ordem e continuava determinado a não tra-
da realidade com o passar dos tempos.
balhar nos negócios paternos. Pelo julgamento ex-
Ora, a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, além
terior, parecia perdido e sem rumo. Interiormente,
de já estar com 17 anos desde sua criação, fora fun-
porém, havia uma determinação férrea guiando-o
dada por homens que, a par de sua imensa e valiosa
no rumo correto. Se havia algo que Joaquim sabia
boa vontade, eram na sua maioria iletrados, portan-
exatamente, era onde queria chegar!
do desconhecedores das leis exaradas pela Coroa e seus muitas vezes confusos meandros filosóficos. A entrada de novos irmãos tivera a faculdade de vas-
No exercício de 1782 a 1783, esteve à frente da Ir-
cularizar a entidade, trazendo um conhecimento in-
mandade como Provedor o Capitão Francisco José
telectual que iria enriquecê-la sobremaneira. Prova
Ferreira, que era Ajudante de Ordens do atual Go-
disto é que, fiel à filosofia das Misericórdias, o novo
vernador da Província, Francisco de Barros Morais
provedor houve por bem instituir, apenas dois dias
Araújo Teixeira Omem. A Irmandade do Senhor Je-
depois da sua posse, a caridade e atendimento aos
sus dos Passos passara por um grande período de
pobres como objetivo precípuo e razão de ser e exis-
renovação naqueles últimos anos. Com a chegada de
tir da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos.
muitos neófitos, a instituição tornara-se ainda mais
O novo provedor Francisco José Ferreira também
importante e forte junto à comunidade. Além dos
tinha outra característica especial; como auxiliar
instituidores, todos eles verdadeiros pilares da so-
direto do governador, gozava da sua companhia e
ciedade, novos e importantes participantes tinham
sofria a sua influência. Este governador tornou-se
vindo engrossar as fileiras da Irmandade, trazendo-
notório pelo seu elevado senso de humanidade e
lhe novas injunções sociais. Eram novas visões que
muitos historiadores não hesitam em afirmar que
se iam agregando ao valor original da entidade. O
foi ele o verdadeiro inspirador do surgimento do
novo provedor era um exemplo disto, um homem
Hospital da Caridade dos Pobres da Vila de Nossa
instruído e preocupado com as mazelas da comuni-
Senhora do Desterro.
dade onde estavam inseridos, além de conhecedor
Na Ata da reunião de 5 de julho de 1782 ficou re-
das “Misericórdias”, instituição oficial do governo
gistrada a histórica decisão:
98
“Determinaram que, visto não haver nesta vila a Santa Casa de Misericórdia, para remédio dos pobres e necessitados, e sem embargo de que a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos desta mesma vila não tem ainda suficiente fundo para os socorrer nas suas enfermidades, contudo, se assistirá dos mesmos pequenos rendimentos dela aos ditos pobres que necessitarem, dando-lhes não somente sepultura na nossa Capela quando falecerem, acompanhados da mesma Irmandade, mas também contribuindo-lhes com o sustento e remédios necessários para o seu curativo e pelo amor de Deus, e mandando-os recolher para este efeito em alguma casa, quando forem totalmente destituídos de todo o socorro, enquanto se não faz hospital próprio para o dito fim; porque esperam, da vontade e misericórdia de Deus, que todas as dificuldades e obstáculos, que ao presente parecem invencíveis, se hão de dissipar com muita facilidade, pela altíssima providência do mesmo Senhor, que não deixará de inspirar aos moradores desta vila a caridade que se deve praticar com os pobres e miseráveis, a quem Jesus Cristo tanto nos recomenda; igualmente devemos confiar na piedade da nossa Soberana, que não deixará de contribuir para um fim tão santo, todas aquelas comodidades e rendimentos que o podem fazer perdurável e subsistente; da mesma forma que se pratica nas outras terras, onde há estabelecida a Santa Casa de Misericórdia, concedendo-nos as mesmas prerrogativas, isenções e privilégios, que ela tem debaixo da sua Proteção Real; para o que se devem intentar todos e quaisquer requerimentos que forem necessários a este respeito e que fizerem a bem o dito estabelecimento; não deixando contudo, presentemente, enquanto isto não se consegue, de praticar sempre com os ditos pobres, tudo o que couber às limitadas forças da Irmandade, como acima fica dito; e, quando o número dos pobres assistidos for grande e a necessidade o permitir, sairão quatro irmãos de balandrau, com as suas alcofas a pedir esmolas pelas portas dos moradores desta Vila. Os ditos pobres, que pedirem à Irmandade a esmola de lhes mandar assistir, enquanto não formalizado o dito hospital, devem suplicá-la, por petição, ao Provedor, que então, servir na Irmandade, apresentando juntamente Certidão de Pobreza, passada pelo reverendo pároco; e para que os ditos pobres venham no conhecimento desta resolução a seu respeito, se lhes fará saber por um edital que se mandará afixar na porta da Igreja Matriz desta vila.”
99
A Ata foi assinada pelo provedor Francisco José
zar a caridade aos pobres, aquela histórica reunião
Ferreira e pelos irmãos: Vigário Inácio José Galvão,
traçara outros rumos e descrevera necessidades da
Luis Rodrigues Pereira, Aleixo Maria Caetano, To-
Irmandade, todas focadas no objetivo de fortalecer
máz Francisco da Costa, José Luis do Livramento,
a entidade e sua atuação e importância na comuni-
Frei Francisco de Sales, Jacinto Jaques Nicós, João
dade da Vila, numa clara demonstração do conheci-
Tavares Fernandes, José da Gama Lobo Coelho, An-
mento e intelectualidade de seus novos dirigentes.
tônio Henriques de Miranda, Francisco Homem da
Na manhã seguinte, uma comunicação declaratória
Costa, Frei Antônio Augostinho e Manuel de Sousa
estava afixada nas portas da Igreja Matriz, causan-
Medeiros.
do grande alegria aos poucos que possuíam conhe-
Se estes homens tinham consciência de que, naque-
cimento suficiente para lê-la, uma vez que o núme-
le momento,
ro de analfabetos avultava na vila, notadamente
estavam escrevendo uma das mais importantes pá-
na camada mais pobre da população, justamente
ginas da história da cidade, do estado e mesmo do
aquela que mais se beneficiaria desta resolução.
Brasil, não se sabe. Mas o fato é que aquela Ata teve
Mesmo sem saber ler, a notícia espalhou-se como
sua importância histórica registrada para sempre
rastilho de pólvora, causando algum alvoroço entre
nos anais catarinenses. Além da decisão de priori-
os mais necessitados da vila:
“A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos desta Vila faz público aos moradores dela que está na resolução de exercitar, com os que forem pobres, toda a caridade que couber nas limitadas forças com que ainda se acha, dando-lhes não somente sepultura na sua igreja, mas ainda contribuindo com algumas esmolas para o seu curativo; e, no caso de serem absolutamente destituídos de todo o socorro, também os mandará recolher em casa particular, onde sejam assistidos pelo amor de Deus, porque esperam que todas as pessoas, a quem a Providência Divina tem feito menos necessitadas nesta vila, contribuirão com suas esmolas para ajudarem a estabelecer uma obra que será agradável aos olhos de Deus e muito meritória para os que a praticarem. Pelo que qualquer pessoa que tiver precisão do referido recorrerá ao provedor atual da mesma Irmandade.”
100
de tudo, um iluminado, alguém realmente voltado ao bem da comunidade. Naquela histórica reunião Uma das primeiras pessoas a ler a comunicação
da irmandade, da qual ele fizera parte, ouvira com
foi Joaquim. Era muito cedo quando ele passou em
atenção as explicações do provedor, exaradas quem
frente à Igreja, onde sempre fazia um stacatto para
sabe, da cabeça do Governador Geral, de quem o
benzer-se diante da imagem de Nossa Senhora do
provedor era pupilo. Entendera que a caridade para
Livramento. Logo divisou o papel preso à porta, e
com os necessitados era uma obrigação dos mais
aproximou-se para ler a comunicação. Forte emo-
abastados, uma forma de agradecer a Deus toda a
ção assomou-lhe a alma, naquele momento sentiu
sua misericórdia com que conseguira vencer, caso
que o destino abria-lhe as portas do céu. Aquilo era
dele. Sabia-se afortunado, apesar de todo o inaudi-
a resposta às suas constantes preces, quando a alma
to esforço empreendido para galgar os degraus da
vazava num preito ao Altíssimo, solicitando orien-
fortuna e da ascensão social, e portanto, entendera
tação para a sua vida, a forma pela qual deveria dar
que devia sua cota de retribuição à sociedade. Ele
vazão à sua vocação. Ali estava a efetiva resposta,
faria a sua parte, o filho a dele, e assim a família
cunhada naquelas poucas e esclarecedoras linhas.
devolveria a Deus as graças recebidas.
Aquilo que ele vinha fazendo há tempos, desde que
Deram-se as mãos com calor e amizade súbitas, úni-
se entendia por gente, para dizer a verdade, era o
cas, e a partir daquele dia cessaram as desavenças
verdadeiro caminho, entendia agora. Dali saiu, cé-
em família. Dom Tomáz passou a apoiar as atitudes
lere, em demanda do pai e foi ter com ele animado
caridosas do filho e este, por sua vez, pôde dar ple-
como poucas vezes se o vira. Conversou longamen-
na vazão à vocação meritória que revelara desde a
te com Dom Tomáz acerca dos seus planos e comu-
mais tenra idade.
nicou que, a partir daquele dia, passaria a trabalhar
Joaquim desvelava-se em cuidados com os pobres
efetivamente no atendimento aos doentes pobres
e necessitados. Seu dia era curto para tantas visitas
e desvalidos, atendendo-os com desvelo ímpar e
aos “seus doentinhos”, como ele mesmo os chama-
que, nas horas que sobrassem, passaria a esmolar
va, e para a coleta do necessário ao atendimento
para reunir fundos para a construção de uma San-
destes. Fazia questão de manter um voto pessoal
ta Casa na Vila. Dom Tomáz fitou-o longamente e,
de pobreza, e nada aceitava de sua família, prefe-
subitamente, enxergou seu filho sob uma nova di-
rindo buscar na prática do peditório o necessário
mensão. Sempre se sentira incomodado com a cha-
aos miseráveis que assistia com desvelo ímpar.
mada esquisitice do filho, mas naquele momento
Para si mesmo, só aceitava o essencial, vivendo de
pôde finalmente compreender que ele era, acima
maneira ascética e simples, em conformidade com
101
sua crença pessoal. Sacrificava-se ao extremo, mos-
ligiosas e sociais para as quais se aprestava. Bem
trando desta forma a alma de escol que habitava
elaborado, deve ter sido inspirado nos Compro-
aquele corpo já macerado pela vida sacrificial que
missos de outras Santas Casas existentes no Reino
escolhera.
Português, e que sempre haviam atraído a atenção
Enquanto Joaquim fazia, de forma independente e
e cuidados da Corte Portuguesa e seus soberanos.
dedicada, o seu trabalho, a Irmandade continuava
Católica e pia, a Rainha Maria I era bastante sen-
sua gestão política para a constituição de uma San-
sível ao trabalho da Caridade. A Irmandade, devi-
ta Casa.
damente orientada pelo provedor, organizou um
Mais uma vez mostrou-se a sagacidade do Provedor
dossiê completo dos seus trabalhos, anexando do-
e dos novos irmãos dirigentes que compunham a
cumentos comprobatórios das atividades de atendi-
Mesa Administrativa, uma vez que o mesmo tratou
mento já realizadas, bem como da disponibilidade
de elaborar formalmente o Compromisso da Irman-
que havia na terra para o carreamento dos recursos
dade, constando de 35 artigos que exaravam não
à instauração de um hospital.
só a finalidade principal da entidade, a caridade aos
A petição, datada de 3 de novembro de 1782, tinha
pobres, como também todas as outras funções re-
o seguinte teor:
“Senhora, Dizem o Provedor atual e mais Irmãos da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos da Vila de Nossa Senhora do Desterro da Ilha de Santa Catarina que, falecendo da presente vida a Beata Dona Joana Gomes de Gusmão, lhes foi dada por ordem do Vice-rei do Estado do Brasil a administração da Igreja do Menino Deus, que a dita beata tinha erigido, por terem os suplicantes na dita igreja a imagem do Senhor dos Passos, e poderem com mais decência tratarem da subsistência do mesmo templo, como se vê da certidão junta do Auto de Posse que se lhes deu. E, considerando os suplicantes a grande pobreza que há na dita ilha, e a falta de socorros que experimentam os ditos pobres por não se haver estabelecido ainda nela a Santa Casa de Misericórdia, nem algum outro hospital de caridade, e só assim o Militar, como se vê na certidão junta e seu apenso; Desejando ser-lhes útil no modo possível, não só determinaram dar-lhes sepultura na dita igreja, pelo amor de Deus, como se vê na certidão número 03, que mandaram fixar
102
na porta da Igreja Matriz da mesma Vila, e da atestação junta do reverendo pároco a respeito dos falecidos, mas também lhes têm feito a caridade de suprir do próprio fundo dos seus pequenos anuais, e de esmolas que tem recebido neste mesmo ano, aos mais indigentes e necessitados nas suas moléstias, como mostram na Atestação junta número 5, do Cirurgião-mor Antônio da Silva Gomes, que os tem assistido pelo amor de Deus, e que estão atualmente praticando, apesar das pequenas forças com que se acham; E porque os rendimentos anuais quase certos da Irmandade não passam de 95.680 réis como se vê da atestação junta número 6, e as sobreditas circunstâncias constituem um objeto certamente digno da real atenção de Vossa Majestade em benefício dos ditos pobres, sendo a benigna piedade de Vossa Majestade o mais sólido fundamento que anima os suplicantes a desprezarem todos os obstáculos, que aliás seriam insuperáveis, a não intervir a alta proteção de Vossa Majestade; Pretendem a este fim que Vossa Majestade se digne conceder-lhes em cada ano a esmola de 2,5% do que renderem os dízimos pertencentes à Provedoria desta Ilha de Santa Catarina, ou a metade da maioria em que cada um ano forem excedendo os ditos dízimos do que hoje rendem conforme a certidão junta número 7; Não só para a ajuda de poderem fundar, junto a dita igreja, um hospital próprio para recolher os pobres enfermos, mas também para a sua subsistência; e da mesma sorte os campos de Araçatuba, os quais ainda não foram concedidos a pessoa alguma, como se vê da certidão junta número 8 e seu apenso, no qual se mostram as diferentes pessoas que ali metem gado com a licença do Governador atual desta ilha; e tudo o mais que expressa nos 35 capítulos juntos a este requerimento visto que eles contribuem para o bem comum, como se vê da atestação junta do Senado da dita Vila número 9, no qual o dito senado não só dá o seu consentimento nos 10 réis, que se pedem ao povo por cada alqueire de farinha que sair, mas igualmente implora da sua parte a Vossa Majestade esta mesma graça, por conhecer a sua boa aquisição, em benefício dos pobres, doentes e miseráveis; Portanto pede a Vossa Majestade que seja servida, atendendo ao que fica expressado, confirmar os sobreditos capítulos juntos a este requerimento e o mais que nele se referem, concedendo expressamente à Irmandade do Senhor Jesus dos Passos desta vila, licença para fundar o dito hospital; e que ela goze, debaixo deste mesmo nome de Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, todas as prerrogativas, privilégios e liberdades respectivas às Santas Casas de Misericórdia, visto que ela tem tomado a si a administração que compete a mesma Santa Casa, mandando Vossa Majestade passar as provisões e ordens necessárias para a sua execução e cumprimento. Espera receber mercê.”
103
Como se pode inferir, na leitura e análise do requerimento, era uma verdadeira peça de estratégia política, destinada a sensibilizar o coração da soberana. As rodas do destino moviam-se, lentamente, no rumo da instauração do meritório intento de tantas almas bem intencionadas: um hospital voltado para a caridade, construído com amor e altruísmo. Enquanto toda esta movimentação colocava a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos no olho do furacão dos acontecimentos que levariam à fundação do hospital, Joaquim preparava-se para a sua missão. No início de 1783, ingressou na Ordem Terceira de São Francisco como noviço, a fim de poder usar o hábito descoberto e tornar-se um dos seus devotos. Pelo período de um ano serviu à ordem, em silêncio e humildade, aprestando-se aos mais humilhantes trabalhos, sempre com alegria e devoção incomparáveis, o que levou seus superiores a elogiar constantemente o desempenho do rapaz. Com 23 anos, completou seu período de serviço na Ordem e passou a ser chamado de Irmão Joaquim. Adotou o simplório hábito da Ordem e, desde aquele histórico momento, nunca mais vestiu outra roupa em sua operosa vida. Enquanto Joaquim se preparava para a sua vida sacrificial, a Irmandade continuava operosa e realizadora. No transcorrer daqueles anos de 1783 e 1784 muitas atividades movimentaram a entidade. A 2 de maio de 1783 houve nova eleição da Mesa
104
Administrativa, assumindo o cargo de Provedor o Capitão José da Gama Lobo Coelho. O provedor que deixava o cargo, o realizador Capitão Francisco José Ferreira fez grandes recomendações ao companheiro que assumia o cargo, para que não deixasse esmorecerem as obras da caridade, destacando serem elas o objetivo precípuo da Irmandade. Também recomendou que o novo provedor desse andamento à obra de reforma do adro da Capela, que se encontrava em processo. Mas seus receios revelaram-se infundados, porque o provedor neófito assumiu com a mesma gana de realização que caracterizara a sua gestão, e logo arregaçou mangas, pondo-se ao trabalho. As obras continuaram sem interrupção, e todos os outros trabalhos e preocupações da entidade se mantiveram em completa atividade, para gáudio da vila, que só tinha a ganhar com a eficácia cada vez maior da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos. Durante a gestão de Lobo Coelho aconteceu um fato da maior importância. Ao morrer, no final do ano de 1783, o Irmão Vicente Ferreira Victório legou à Irmandade três quartos da botica da sua propriedade. Em vida fora grande benfeitor da mesma, preparando e doando medicamentos para os pobres assistidos pela caridade da confraria, completando agora a sua obra com o legado. Depois de algumas pequenas controvérsias geradas por minúcias do testamento, a Irmandade aceitou o legado e nomeou justamente o experiente Capitão Francisco José Ferreira como procurador para fins de administração do negócio. Este assu-
105
106
miu a tarefa com mesma competência e denodo em
suas necessidades básicas. Joaquim o fazia espon-
tudo o que fazia, tratando de regularizar os negó-
taneamente, da maneira mais silenciosa e humilde
cios algo enrolados da mesma, e se não completou
que seu coração indicava.
o trabalho porque a morte o ceifou, logo no início
No ano de 1787, as engrenagens começaram a
do ano seguinte.
mover-se no sentido objetivado pela Providência
Enquanto a Irmandade ia trabalhando e se aperfei-
Divina. Na eleição anual da Mesa Administrativa
çoando cada vez mais, tanto na compreensão quanto
da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, Tomáz
na execução da caridade para com os necessitados,
Francisco da Costa, que continuava assíduo colabo-
Joaquim fazia o seu trabalho. Recolhia e atendia en-
rador e benfeitor da mesma, foi novamente eleito
fermos entre os mais miseráveis da Vila e suas cer-
Tesoureiro e deu início a uma campanha que leva-
canias, sem ostentar medo algum de contágio. Tra-
ria à construção do Hospital da Caridade dos Po-
tava feridas abertas e purulentas como quem cuida
bres da Vila. Como Provedor, assumiu o também
da mais alva e macia pele de bebê, atendendo com
Provedor da Fazenda Real Manuel José Ramos e
igual desvelo leprosos, tuberculosos e portadores
como Secretário, o almoxarife Manuel Fernandes
dos outros males que tanto assustavam a maior
Lessa. Como Procurador, assumiu o Vigário Manuel
parte da população e, por isto mesmo, eram os mais
de Sousa de Menezes; Irmãos da Mesa Administra-
relegados em matéria de atendimento e socorro. Vi-
tiva, o Vigário-da-vara Agostinho José Mendes dos
via de maneira simples, significando praticamente
Reis, os Capitães Miguel Francisco da Costa (irmão
nada em custos para a família, que fazia questão de
de Joaquim), João de Andrade, Antônio Rodrigues
poupar de gastos e preocupações. Realizava o seu
Rachadel, Antônio Luiz Pereira, José da Silva Mafra,
trabalho debaixo de uma tapera de palhas, em uma
Rodrigo Antônio Gonçalves, Pedro José da Silva, An-
área de terras contígua à Capela do Menino Deus,
tônio Manuel de Andrade, Francisco da Rocha Cota,
cedida pelo mesmo proprietário do lote original, o
José Pereira da Costa e Antônio Lopes da Costa.
benemérito André Vieira da Rosa, que era primo de
Como Provedor por devoção ficou o Capitão José
seu pai. Sempre que os acerbos trabalhos de aten-
da Gama Lobo Coelho, que deixava o cargo; como
dimento aos doentes o permitiam, saía a esmolar
Procurador na Vila da Laguna continuou o Sargen-
em nome da caridade, fazendo-o com humildade
to-mor Jerônimo Francisco Coelho, e como anda-
exemplar. Vale lembrar que, nesta época, todas as
dor, Manuel Francisco de Bem. Para aias do Senhor
Irmandades e confrarias possuíam seus andadores
dos Passos foram eleitas as senhoras Dona Inácia
oficiais, esmoleres que atuavam oficialmente em
Maria da Conceição e Dona Maria Josefa.
nome das mesmas, e eram por elas sustentados em
107
adjacentes às já doadas à Irmandade. A nova doação consistia numa área de 10 braças de frente
(As aias do Senhor dos Passos, cargo instituído
por 12 de fundo.
na Mesa Administrativa da Irmandade em 1782,
O Tesoureiro acrescentou ainda que tomava a si
eram senhoras donas escolhidas na nata da socie-
a responsabilidade de executar a obra, que nestas
dade desterrense, pois era cargo de subida honra
alturas já estava riscada por ele, exímio e expe-
e conferia às escolhidas a tarefa de, na véspera
rimentado construtor, responsável entre outras,
do dia da Procissão do Senhor dos Passos, vestir
pelas obras do edifício da Câmara e Cadeia Muni-
e aprontar a santa imagem)
cipal, executadas durante o mandato do Governador Teixeira Omem. O Tesoureiro informou também à Mesa Administrativa, e neste particular
A quase totalidade dos eleitos pagou a mesada,
não pôde deixar de sentir uma ponta de orgulho,
segundo consta do termo lavrado e assinado por
que a quantia apresentada em dinheiro era in-
todos os presentes.
tegralmente resultante do dedicado trabalho de
Apenas dois meses depois da eleição, no dia 05 de
seu filho Joaquim que, em prol do sonhado hospi-
agosto de 1787, aconteceu uma reunião histórica
tal, havia tirado esmolas nos últimos meses e lhe
da Mesa Administrativa da Irmandade. Convoca-
entregara o resultado integral deste trabalho. In-
dos, acorreram os irmãos integrantes da mesa e
formou também que o mesmo continuaria a exe-
receberam as importantes notícias: primeiramen-
cutar espontaneamente este trabalho, bem como
te, que a partir daquela data separavam-se, de-
ele e todos os que quisessem auxiliar na obra.
finitivamente, as finanças da Irmandade e as da
Entusiasmados, os irmãos assinaram o termo que
caridade dos pobres. E em segundo lugar, mas
decidia pelo imediato início dos trabalhos que le-
não menos importante, a Irmandade recebeu o
variam à construção do referido hospital.
comunicado do Irmão tesoureiro, Tomáz Fran-
Quando a construção já contava com os alicerces
cisco da Costa que, havendo consentimento da
e estavam sendo levantadas as paredes, eis que
mesa, se iniciaria em breve a construção do tão
surgiu um problema inesperado. Manuel Zefirino
almejado hospital da Vila. Para isto, o tesourei-
de Souza Coutinho, genro do doador das terras
ro apresentou à Mesa Administrativa a vultosa
resolveu reclamar a posse das mesmas e impedir
quantia de 88$705 réis e ainda a autorização do
a construção do hospital. Embora fosse membro
Capitão André Vieira da Rosa para que a constru-
da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e já
ção se procedesse em terras de sua propriedade,
tivesse ocupado cargos diversos na Mesa Admi-
108
nistrativa, não tivera escrúpulos em atrapalhar
Orgulhoso do feito e reconciliado no mais fun-
o andamento das obras, impedindo o acesso dos
do d’alma com o filho, sentiu o coração inundado
trabalhadores à fonte de água, indispensável aos
de alegria ao olhar para a humilde construção,
trabalhos. Este fato revoltou os irmãos e recrudes-
destinada a recolher pobres e desvalidos deste
ceu as ações em prol da construção, resultando
mundo, dando-lhes a verdadeira caridade prega-
inclusive na elaboração de uma correspondência
da pelo Nosso Senhor Jesus Cristo.
ao Vice-rei, solicitando a doação de mais terras
Localizado à direita da construção original, era
e queixando-se do faltoso. Estas súplicas foram
um edifício branco, de paredes caiadas e aparên-
atendidas e, ainda naquele ano, a Irmandade re-
cia simples, mas que crescia por ombrear-se com
cebeu em doação um terreno mais de 200 vezes
a Capela do Menino Deus, uma construção que,
superior à área doada por André Vieira da Rosa.
pela sua importância, destacava-se contra o ver-
O ano de 1788 findava quando Tomáz Francisco
de vigoroso do morro que a abraçava.
da Costa deu por encerrada a obra do hospital.
109
CapĂtulo VII
1789
A Vila de Nossa Senhora do Desterro jamais serĂĄ a mesma
110
111
A Irmandade fixou o primeiro dia do ano de 1789 para a inauguração oficial do Hospital, denominado Jesus, Maria e José. Para tanto, foram recolhidos os pobres que estavam albergados nas casas de beneméritos moradores da Vila e instalados na nova construção, para alegria geral. O povo da Vila acorreu em massa para a inauguração. A construção destacava-se pelas seis portadas em arco baleno, bem no estilo arquitetônico açoriano tradicional. Dona Mariana, mãe de Joaquim, pessoalmente costurara cortinas para as portadas, em barbarisco e amem carmezim, graciosamente enfeitadas com galões de seda amarela. Tudo havia sido aprestado com bom gosto e cuidados, apesar da extrema simplicidade. Tomáz Francisco da Costa mandara vir do Rio de Janeiro uma pintura de Jesus, Maria e José, que representava o nome dado ao hospital, de autoria de Francisco
José Mendes dos Reis. Joaquim, por sua vez, enfeitara os quartos claros e amplos com arranjos de flores de pano e papel, arte que executava com bom gosto e habilidade incomparáveis e que, nos dias posteriores, passou a ensinar aos enfermos, numa inédita iniciativa de terapia ocupacional com os internados. O povo da vila admirava-se percorrendo as salas humildes, verificando as enxergas nas quais alojavam-se os infelizes socorridos pela caridade da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e verificando com quanto cuidado e capricho tudo havia sido feito.
112
Quadro original da Sagrada FamĂlia adquirido em 1788, pertencente ao acervo do IHC atĂŠ os dias atuais.
113
Em seguida a bênção paroquial, houve Missa com o Te-Deum entoado com um vigor inesperado, por exaltação a tão grande e bela realização. Poucos locais daquele extenso e perdido Brasil Colônia de então podiam orgulhar-se de possuir seu hospital próprio. Joaquim sentia-se exultante. Apesar de sua proverbial discrição, naquele dia permitiu-se algumas expressões externas de felicidade, bem como percorreu uma a uma as pessoas presentes à inauguração, pedindo esmolas em nome do recém-inaugurado recinto, no que foi prontamente atendido. O resultado daquele trabalho foi a coleta de 5$440 réis. Por todos os lados, de todas as bocas ouviam-se exclamações de alegria e surpresa: - Nossa Senhora do Desterro jamais será a mesma! Agora possuímos nossa própria Santa Casa! Deus haverá de olhar com desvelo ainda maior por esta vila! Os gastos totais com a construção e equipagem do modesto hospital totalizaram 1:084$356 réis (Hum conto, oitenta e quatro mil, trezentos e cinquenta e seis réis). A despesa avultava e a Irmandade ficou com uma substancial dívida, que foi em grande parte quitada graças ao esforço do Irmão Joaquim e de seu pai. Sem ambos, jamais a obra teria sido levada a efeito. Tiveram uma coragem e um denodo inequívocos, colocando os interesses da comunidade muito acima dos pessoais. Do valor total, mais de cinquenta por cento foi resultado direto do trabalho de esmoler de Joaquim e pelo menos vinte por
114
cento saiu diretamente do bolso de seu pai, o que os transforma nos verdadeiros agentes realizadores da obra, em todas as suas instâncias. Quanto à Irmandade, teve o fundamental papel de incentivar a ratificar estas ações, dando respaldo e apoio às frutíferas atividades de pai e filho. Assim que foi inaugurado o hospital, a Irmandade nomeou médico o Cirurgião-mor Antônio da Silva Gomes e como seu ajudante José Caetano da Silva; ambos iniciaram trabalhando pelo Amor de Deus, e só no ano seguinte, graças aos esforços de Joaquim, a Irmandade pôde remunerar seus serviços. Também nesta ocasião a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos instituiu a prática de eleger um Mordomo do Hospital a cada mês. O primeiro a ser nomeado foi justamente Tomáz Francisco da Costa, uma homenagem aos seus esforços. Ombreando com o filho, enfrentou os árduos primeiros tempos, que tiveram em Joaquim um verdadeiro herói. O rapaz crescia diante da comunidade, com os avultados trabalhos que realizava. Incansável, multiplicava-se junto aos leitos dos doentes, atendendo a todos com desvelo e carinho incomparáveis e, nas poucas horas vagas, saia a esmolar em prol das despesas do nosocômio. A comunidade da vila agora via com outros olhos o garoto lunático, o filho perdido de Dom Tomáz e Dona Mariana. Sua imagem avultava-se, crescia e impunha a força do caráter que desabrochava com a fé inquebrantável que ele agora revelava. Em fevereiro foi indicado mordomo o Capitão Manuel de Souza Medeiros e
115
em março o Capitão José Joaquim Jacques Nicós. Em abril foi escolhido como Mordomo do hospital o Sargento-mor Francisco Borges de Castro e assim sucessivamente, todos os irmãos da mesa foram se sucedendo na importante tarefa, cuidando das despesas e do dia-a-dia burocrático da grande obra que se consolidava cada vez mais. O Cirurgião-mor Antônio da Silva Gomes lutava com grandes dificuldades para o atendimento aos enfermos internados no hospital, sendo a maior dela a incipiência da medicina de então. Os simplórios medicamentos disponíveis à época, provenientes da Botica da Irmandade, resumiam-se às chamadas pílulas tóssicas e antiespasmódicas, o mel rosado, os emplastros vesicatos, unguento basilicano, nitrato de prata, o óleo de fígado de bacalhau, a água destilada de alface e as infusões de flores de laranja, anis, eucalipto, lobélia, beladona, erva cidreira,
116
hortelã, louro e cereja, os cataplasmas e o óleo de
uma vez que os portadores deste mal eram vistos
amêndoas doces. Para os casos mais graves, recor-
como pecadores, portadores de um sinal maligno
ria-se às pílulas de ópio, ao azougue (mercúrio) e
que os obrigava a viver no ostracismo até serem
ao láudano, medicamentos há muito extintos, devi-
colhidos pela morte.
do sua periculosidade. Os escravos castigados pe-
Aos doentes era reservado, além do medicamento
los seus proprietários e que baixavam ao hospital,
possível, o cuidado básico de que eram mais neces-
que a todos atendia sem distinção, eram tratados
sitados: higiene, alimentação adequada e uma cama
de maneira torturante: as feridas ocasionadas pelas
limpa e boa para dormir. Este tratamento era, mui-
chibatadas eram lavadas com vinagre e pimenta,
tas vezes, a cura para os males apresentados. Tam-
pois acreditava-se que tais substâncias evitavam
bém era ainda empregada a flebotomia, ou seja, o
infecções.
indivíduo era sangrado, porque se acreditava que
Era uma medicina incipiente, típica de uma época
os males circulavam pelo sangue e que, diminuin-
ainda balda de recursos e conhecimentos. Aos lasa-
do-se o volume do mesmo, diminuía-se a virulência
rentos, que era como se denominavam os portado-
da doença. Para este procedimento eram emprega-
res de hanseníase naquela época, era simplesmen-
das práticas odiosas como o uso de ventosas ou, o
te dado cuidado básico, alimentação e isolamento,
que era pior, sanguessugas
117
toda a ilha de Santa Catarina e em seguida alongaram-se para o continente, compreendendo as Enquanto isto, a união de esforços do Irmão Joa-
localidades da Freguesia das Necessidades, Arma-
quim e da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos
ção da Lagoinha, Armação da Barra do Norte, Vila
revelava-se produtiva e eficaz. Enquanto Joaquim
Nova, São Miguel e Enseada de Brito. Mas ele sa-
operacionalizava todo o necessário ao funciona-
bia que o Hospital Jesus, Maria e José necessitava
mento do hospital, a Irmandade estendia seus
de ainda mais. Comunicou ao pai que pretendia ir
longos e já poderosos braços políticos e sociais,
à Capitania de Rio Grande, onde residia seu irmão
gestionando os poderes públicos e econômicos
José Francisco de Faria e Costa, pois desta forma
privados em prol da grande obra. O trabalho des-
teria alargado o território no qual podia atuar no
tes abnegados benfeitores ultrapassou as barrei-
petitório de esmolas em prol da Santa Casa.
ras físicas e saiu portas a fora do edifício, da vila e
Em reunião urgente da Irmandade, foi aprovada a
finalmente até do Brasil.
solicitação de Joaquim, e a ele destinaram um par
Joaquim cedo compreendeu que sua missão ali
de botas para a longa peregrinação. Pobre de todo
estava conclusa. Seria cômodo, prazeroso até, per-
recurso, ele se pôs em marcha, rumo à Capitania
manecer junto aos seus amados doentes, atenden-
pretendida. Dias e dias sob sol causticante e chuva
do-os e levando conforto espiritual e físico. Mas a
inclemente, enfrentando os rigores da natureza e
casa necessitava de mais, muito mais. E uma forte
cansaço extremo não fizeram esmorecer as forças
voz interna alertava-o que somente ele poderia
do jovem, antes pelo contrário, ansiava por fazê-
viabilizar o necessário ao crescimento da mesma.
lo. Muitas vezes ouvira calado e ensimesmado as
O trabalho que ora vinha realizando muitos pode-
narrativas da Senhora Dona Joana, quando conta-
riam fazer. Mas arremessar-se a campo, enfrentar
va das suas peregrinações antes de estabelecer-se
perigos desconhecidos e bater nas portas necessá-
definitivamente na Vila de Nossa Senhora do Des-
rias, por mais impenetráveis que fossem, esta era
terro. Enquanto ela falava, sua alma viajava nas
missão para almas forjadas no fogo da verdadeira
asas da imaginação, e sonhava! Ansiava por viver
fé, e portanto cabia a ele fazer-se ao pó da estrada
igualmente uma experiência espiritual qual a que
e buscar estas realizações.
ela narrava, com os sonhadores olhos postos no
Mais uma vez abandonou o conforto de uma si-
céu. Sabia, intuitivamente, que o silêncio da longa
tuação conhecida e saiu a esmolar, em busca de
e solitária caminhada, em contato direto com os
recursos para o seu amado hospital.
elementos naturais, tinha o condão de ligar o ho-
Suas peregrinações iniciais estenderam-se por
mem ao seu Criador de uma maneira inexplicável.
118
Só mesmo vivendo a experiência para compreen-
rir uma vida errante, buscando com a sua verve o
dê-la na sua plenitude. Ainda assim, sem perder
convencimento das autoridades e quem de direito
de vista seu objetivo principal, Joaquim bateu em
para a dilatação das obras da caridade em todo o
todas as portas que encontrou nos ermos do sul
continente brasileiro.
da imensa colônia portuguesa denominada Brasil,
“Sou um cidadão de Deus, estou a serviço dele, e
desde a Ilha de Santa Catarina até a Capitania de
onde eu for necessário devo me apresentar!” – en-
Rio Grande, e idem no retorno.
tendeu ele no mais profundo imo d’alma, sentindo
A cidade de Porto Alegre representou mais uma
que seus dias na paz e calma do hospital cons-
angústia para o contrito coração do benfeitor. Sen-
truído na bela terra insular do Desterro ficariam,
do a capitania mera comandância militar, onde a
daquele momento em diante, definitivamente para
atividade bélica ocupava o primeiro plano de todas
trás.
as funções estatais, encontrou o povo à míngua de
E assim foi feito. Ao retornar à terra natal, entre-
todo atendimento. Pobres, doentes e desgraçados
gou à Mesa Administrativa da Irmandade a vul-
abundavam pelas ruas da capital da capitania,
tosa quantia de 270$940 réis, fruto da operosa
inspirando profunda comoção ao seu coração. Ali
viagem. E se preparou para os novos embates que
também havia muito o que fazer, a necessidade
a missão a que se propusera exigiria dele em fu-
de um hospital era tanta ou mesmo maior que a
turo próximo. Daquela data em diante, nunca mais
da Vila de Nossa Senhora do Desterro, onde pelo
pôde dedicar dias e dias ao atendimento amoro-
menos as autoridades mantinham um olho atento
so dos doentes no Hospital Jesus, Maria e José.
na população civil, ao contrário dali.
Transformou-se em soldado da causa da caridade
Inconformado, conversou longamente com o ir-
e, por conta da missão que abraçara, tornou-se ci-
mão sobre as providências necessárias e visitou,
dadão do mundo. Viajou para Portugal no início
no centro da cidade, pessoas que, a exemplo do
de 1790, levando na bagagem petições para a Rai-
que ele fizera na Ilha de Santa Catarina, também
nha D. Maria I, para o provedor da Santa Casa de
recolhiam doentes e desvalidos a fim de lhes ofe-
Portugal e para o notável Joaquim Pedro Quintela,
recer a caridade do atendimento fraterno.
lisboeta que tinha vultosos negócios em Santa Ca-
As impressões daquela visita calaram fundo ao
tarina, como arrendatário da pesca de baleias.
seu coração, imprimindo-lhe, definitivamente, o
Nas petições iam os anseios daquela boa gente,
caráter de abrangência a cuja obra se obrigaria
que só visava dotar o Hospital da verba necessária
pelo resto da vida. Ao sossego do Hospital, onde
para poder atender, com zelo e dignidade, os des-
gostava de trabalhar e se recolher, teria que prefe-
validos da Vila de Nossa Senhora do Desterro.
119
Suas instâncias revelaram-se positivas, tanto que
(As costas europeias tornaram-se uma visão co-
em junho de 1792 a Irmandade do Senhor Jesus
mum para Joaquim, que lá voltou nos anos de
dos Passos recebeu uma carta da Santa Casa de
1798, 1803, 1807, 1826 e finalmente em 1829,
Misericórdia de Lisboa, comunicando que, em res-
quando lá faleceu no Porto de Marselha, aos 68
posta à sua solicitação, Sua Majestade Dona Maria
anos, aguardando um navio para retornar ao
I havia concedido a quantia anual de 300$000
Brasil.
réis para a subsistência do Hospital, anexando a
Nos períodos em que esteve no Brasil, não aban-
cópia do Decreto. A Santa Casa aludiu, na Carta,
donou um minuto a faina laboriosa a que se havia
a necessidade de mudar-se o nome do estabeleci-
proposto, deixando um rastro de benemerência
mento para Santa Casa de Misericórdia, bem como
por onde passou. Além das Santas Casas de Mise-
adaptar alguns dos capítulos do Compromisso da
ricórdia da Ilha de Santa Catarina e de Porto Ale-
Irmandade, de modo a adequar-se às normas exi-
gre e do Asilo para meninos abandonados no Rio
gidas pela soberana em todas as Santas Casas que,
de Janeiro, deixou também um asilo para menores
sob a sua proteção, cobriam de cuidados o mundo
abandonados em Salvador, na Bahia; um seminá-
português.
rio, na cidade de Jacuecanga, denominado Casa
No retorno de Portugal, Joaquim deixou-se ficar
Pia de Jacuecanga; o Seminário de Nossa Senhora
na Corte. Lá, além das instâncias para a instala-
do Bom Conselho, de Itú, em São Paulo e um asilo
ção, em terras catarinenses, da Congregação do
para meninos desamparados no Bairro Sant´Ana,
Desagravo do Santíssimo Sacramento, organiza-
na cidade de São Paulo.)
ção religiosa que conhecera em Lisboa, iniciou os trabalhos com vistas à instalação de um lar para recolhimento de meninos abandonados.
O perfume da caridade marcou-lhe os rastros,
Muitas e acerbas tarefas esperavam Joaquim
para sempre evidenciados pela vida missionária,
que, por poucas vezes e raro tempo pôde voltar
inspirada nos ensinamentos do nosso Mestre Je-
à sua amada ilha natal. As múltiplas missões das
sus Cristo, que deve ter se orgulhado deste dileto
quais espontaneamente se encarregava tomavam
filho, que honrou o nome do Pai celestial!
todo o seu tempo e drenavam suas energias. Em 1796 retornou a Portugal, visando os trabalhos aos quais havia se proposto, e somente por carta soube da morte do amado pai, Tomáz Franscisco Da Costa.
120
121
CapĂtulo VIII
1800
O progresso marca a Vila do Desterro e o seu Hospital de Caridade
122
123
A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos não es-
mão Joaquim a Lisboa em 1790, solicitando que, a
moreceu diante das iniciais dificuldades que re-
exemplo de outras Santas Casas existentes no mun-
presentavam a manutenção do hospital. Tomando
do português, pudessem também ser agraciados
conhecimento, através de uma correspondência
com as mesmas receitas destinadas às entidades
recebida da Santa Casa de Lisboa, de quais eram os
co-irmãs.
direitos destas sacrossantas instituições, enviaram
É o seguinte o teor da correspondência:
uma petição à soberana de Portugal, levada pelo Ir-
Senhora, Dizem o provedor e irmão da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos da Vila de Nossa Senhora do Desterro da Ilha de Santa Catarina que, falecendo da vida presente a Beata Dona Joana Gomes de Gurmão, lhes foi dada, por ordem do Vice-rei do Estado do Brasil, a administração da Igreja do Menino Deus, por ficarem pertencendo à Real Coroa como bens vagos, e terem os suplicantes na dita igreja a imagem do Senhor dos Passos, e poderem com mais decência tratarem da subsistência do mesmo templo; e tomando a si a dita irmandade, por verem a grande pobreza que há na dita ilha e a falta de socorro que experimentavam os ditos pobres nas suas enfermidades, por não se haver estabelecido ainda nela a Santa Casa de Misericórdia, e desejando ser-lhes útil no modo possível, lhes principiaram a assistir desde o ano de 1782 em suas casas, curando-os até ficarem restabelecidos, e falecendo, lhes davam mortalha e os sepultavam na dita capela; até que, imediato a mesma, levantaram um hospital público, com o título de Santa Casa da Caridade dos Pobres, onde admitem, tratam e curam, com zelo e pelo amor de Deus os pobres miseráveis e indigentes, e lhes dão sepultura, inda também em outra pequena casa têm e curam os pobres lázaros, como fazem certo pelas atestações ns. 1 até 4. E porque os rendimentos dos anuais da dita Irmandade e esmolas que tem tirado pelos povos, e outras que tem diligenciado o Irmão Joaquim Francisco do Livramento, para o que se ofereceu e lhe puxou a sua vocação
124
em que se tem empragado com exemplar vida e caridade, é com que os suplicantes têm feito as sobreditas assistências, e não chegam para tão pia e santa obra digna da real clemência de Vossa Majestade em benefício dos ditos pobres, e sendo o mais sólido fundamento que anima os suplicantes para desprezarem todos os obstáculos, que aliás seriam insuperáveis, a não intervir a Alta Proteção de Vossa Majestade. Pretendem para este fim e pedem a Vossa Majestade que, para subsistência do mesmo hospital e cura dos pobres miseráveis, administrado por aquela Irmandade, que Vossa Majestade se digne conceder-lhes e confirmar-lhes os cinco capítulos juntos com todas as prerrogativas, privilégios, isenções liberdades respectivas às Santas Casas da Misericórdia, visto que a dita Irmandade tem tomado sobre si a administração que compete à mesma Santa Casa, mandando Vossa Majestade passar as provisões necessárias para a sua execução e cumprimento. Espera receber mercê.
Assinam: Vigário Agostinho José Mendes dos Reis,
•
Recebimento de taxa por cada embarcação que
Provedor Manuel José Ramos, Secretário Manuel
entrar na Ilha; a contrapartida era o atendimen-
Fernandes Lessa, Tesoureiro Aleixo Maria Caetano,
to aos marítimos que adoecessem;
Procurador Tomáz Francisco da Costa, Tomás An-
•
tônio Pereira, Antônio Pereira Gomes, José Pereira
Envio de um sacerdote ou religioso para servir de capelão no Hospital;
da Costa, Antônio de Bitancurt Cidade, José Luis do
•
Monopólio nos sepultamentos, podendo cobrar
Livramento, Tomás José Freire, José da Costa Cida-
pelas tumbas (no caso, tumba era uma espécie
de e José Joaquim Jacques Nicós.
de maca onde se transportavam os defuntos
As cinco prerrogativas, privilégios, isenções e liber-
até a sepultura)
dades solicitadas eram: •
•
Equiparação com as outras Santas Casas de Misericórdia da Coroa Portuguesa;
Antes, porém, de serem atendidos pela Coroa Por-
Participação tributária em cada alqueire de fa-
tuguesa em sua petição, tinham vendido inúmeros
rinha, feijão, milho, trigo e arroz que embarcas-
imóveis legados à Irmandade por irmãos que fale-
sem para fora da terra;
ciam, e não raro lançavam mão dos próprios bolsos
125
para fazer frente às imensas despesas decorrentes
Portuguesa começaram a falhar, colocando a Ir-
da manutenção do hospital.
mandade e o Hospital em situação assaz difícil. Uma
Assim que a Irmandade passou a receber a subven-
reunião convocada às pressas pelo então Provedor
ção anual da Coroa Portuguesa, em 1792, e viu as
da Irmandade, Manuel José Ramos, na data de 22
necessidades mais prementes finalmente atendidas,
de janeiro deste ano, dava conta de que nada havia
deu início aos melhoramentos que entendia neces-
sido recebido por conta dos 300$000 réis que de-
sários para a natural evolução daquela instituição.
viam ser pagos pela Fazenda Real. A velha estirpe
Em reunião de 27 de fevereiro de 1796 o Provedor
de irmãos como Tomáz Francisco da Costa, que es-
de então, Brigadeiro José da Gama Lobo Coelho co-
tavam sempre prontos para lançar a mão ao bolso
municou à Mesa Administrativa que havia recebido
em caso de necessidade também desaparecera, e
autorização do Chefe da Igreja para colocar na Ca-
uma nova era de dificuldades assolava a entidade.
pela um sacrário com o Santíssimo Sacramento. O
Eram novos tempos, o início da desafiadora e incrí-
intuito era levar conforto espiritual aos enfermos
vel segunda década da Santa Casa de Misericórdia
internados naquela casa, através do remédio para
da Ilha de Santa Catarina.
as enfermidades da alma, uma vez que as do corpo
“Padrões de Têmpera da velha gente desterrense
já estavam em processo.
são a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e o seu Hospital de Caridade – padrões tornados elementos de civilização.” (Henrique Fontes, citado
Seguiu-se então um período de tranquilidade para
por Nereu do Vale Pereira in Memorial Histórico
a Irmandade, com as contas do Hospital equilibra-
da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos)
das e os procedimentos arranjados de forma a beneficiar os carentes e necessitados da Ilha. Neste período foram provedores da Irmandade, além de
A nova década entrou célere e conturbada. Em
Manoel José Ramos, que permaneceu no honroso
1800 a Capitania de Santa Catarina, Governada
cargo por longos seis anos, o Capitão Miguel Fran-
pelo Tenente Coronel João Alberto de Miranda Ri-
cisco da Costa e o Coronel Antônio José da Costa
beiro e tomada por intrigas políticas que haviam
(irmãos de Joaquim), Manoel Fernandes Lessa e
deposto o seu antecessor, Manuel Soares Coimbra,
Tomáz Francisco da Costa que, em última gestão,
contava com aproximadamente 25.000 habitantes.
finalmente assumiu a provedoria da Irmandade, fi-
Existiam 3 engenhos de açúcar, 192 engenhocas
nalizando sua participação em maio de 1796.
de moer cana para alambiques, 4 engenhos de pilar
Em 1797 os pagamentos provenientes da Coroa
arroz, 37 moinhos e atafonas, 884 bolandeiras de
126
mandioca e 32 cortumes. O comércio marítimo era
Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, a Facul-
feito por cerca de 20 embarcações do Desterro, de
dade de Medicina da mesma cidade e finalmente a
São Francisco e da Laguna. 1798 marca também o
extinção completa da Fisicatura-mor. Os curandei-
ano da criação do serviço de correio no Brasil e em
ros e sangradores foram desautorizados, excluídos
Santa Catarina.
do conjunto de atividades legais e as parteiras fo-
Até então, considerando que o Brasil vivia no perí-
ram desqualificadas para uma posição subalterna
odo colonial, o modelo de organização dos serviços
aos médicos formados.
da saúde obedecia ao padrão de Portugal. A estru-
Todos estes fatos refletiam também na Santa Casa
tura administrativa da fisicatura era representada
de Misericórdia da Ilha de Santa Catarina, sempre
pelo Físico-mor e pelo Cirurgião-mor do Reino que,
carinhosamente chamada de Hospital da Caridade
usando de suas atribuições, estabeleciam regimen-
dos Pobres pelo povo da Vila de Nossa Senhora do
tos sanitários versando especialmente sobre a le-
Desterro. A nomenclatura oficial, obrigatória pelo
galização e fiscalização do exercício da medicina e
Estatuto das Santas Casas e adotada por força da
também eram os responsáveis pelos avisos, alvarás
necessidade, a fim de receber os recursos prove-
e provisões a serem executadas pelos seus repre-
nientes da Coroa Portuguesa nunca caíra no com-
sentantes no Brasil. Em 1782, a Rainha D. Maria I
pleto agrado do público, permanecendo a institui-
criara a Junta do Proto-Medicato, em substituição à
ção com o nome “popular” de Hospital da Caridade
estrutura da Fisicatura. Esta instituição era forma-
dos Pobres.
da por um conselho de deputados e controlava não só o exercício da medicina como também a venda de medicamentos.
Importantes fatos políticos que sacudiram o Brasil
As práticas médicas, a cargo das Santas Casas de
em sua totalidade no início desta década, interferi-
Misericórdia, dos Hospitais Militares e dos denomi-
ram também sobre os habitantes da Vila e sobre o
nados físicos, os cirurgiões-barbeiros, os barbeiros
seu Hospital. Foram a Guerra da Independência e,
sangradores, os boticários curandeiros e as partei-
no caso da Província de Santa de Santa Catarina, a
ras não só eram alvo de muito misticismo e des-
consequente Guerra da Cisplatina.
conhecimento, como também padeciam da intensa
O conflito iniciou em 1821, quando o Império do
burocracia que os engessava.
Brasil e as Províncias Unidas do Rio da Prata tra-
Com as mudanças implantadas entre 1820 e 1830,
varam renhidas batalhas pela posse da Província
criaram-se importantes marcos no processo de ins-
Cisplatina, região onde atualmente se situa a Repú-
titucionalização da medicina, tais como a criação da
blica do Uruguai.
127
Localizada na entrada do estuário do Rio da Pra-
pelo Príncipe Regente português, Dom Pedro I, sob
ta, a Província Oriental era uma área estratégica,
a alegação de que a Rainha Carlota Joaquina, sua
fornecendo a quem a possuísse o domínio sobre a
mãe e filha do Rei da Espanha, tinha direitos su-
navegação ao longo de todo o Rio da Prata (hoje
cessórios sobre a região. Ocorre que as agitações
Rio Uruguai), além do acesso aos rios Paraná e
políticas internas que vinham sacudindo o Brasil le-
Paraguai. Esta região vinha sendo alvo de disputa
varam o Príncipe Regente a declarar a Independên-
entre Portugal e Espanha desde 1680, e sua posse
cia em 7 de setembro de 1822 e quem era aliado
já havia sido tratada em vários acordos territoriais,
virou inimigo. A Província Cisplatina, território es-
o último aqui mencionado, o Tratado de Santo Il-
tratégico para o Brasil, presisava então ser retoma-
defonso, de 1777. Neste, a região fora entregue à
da ao próprio exército português, o que motivou a
Espanha em troca da Ilha de Santa Catarina, que
chamada Guerra Cisplatina. Não foi só nesta região
estava dominada pelos mesmos.
que houve conflitos e batalhas. A maior parte da
Em 1816 o território foi novamente invadido pelos
oficialidade que servia no Brasil era portuguesa e
portugueses, através do Comando do General Car-
apresentou renhida resistência à independência. O
los Frederico Lecor, Barão da Laguna, e as hostili-
Ministro José Bonifácio de Andrada e Silva determi-
dades reiniciaram.
nou severas medidas para coibir estas resistências
Em 1821 o território foi oficialmente incorpora-
nas províncias revoltosas, que eram além da Cis-
do ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves
platina, a Bahia, o Piauí, o Maranhão e o Grão-Pará.
128
Para este fim providenciou a compra de armas e
sabiamente, calou-se a respeito do assunto, acatan-
navios, o recrutamento de tropas nacionais e o
do as ordens do novo Imperador. Mas este teve que
contrato de estrangeiros (mercenários), bem como
voltar às pressas para a Corte, por causa da morte
medidas repressivas, tais como o confisco de bens
prematura de sua mulher, Carolina Josefa Leopol-
e a expulsão daqueles que não aceitassem a eman-
dina, Arquiduquesa da Áustria. A luta porém, con-
cipação política do Brasil.
tinuou renhida. O Império Brasileiro iniciou uma ofensiva terrestre a partir daquele ano de 1826, por meio da concentração de tropas aqui no sul.
Foi nesta ocasião que o Imperador, num ato infeliz,
A guerra foi marcada por diversas escaramuças
assinou decreto mudando o nome da Vila de Nos-
de pequena monta, que não resolviam o problema,
sa Senhora do Desterro para simplesmente Vila do
mas geravam muitos feridos graves e enfraqueciam
Desterro. Perdeu-se a força da conotação religiosa
as forças de ambos os lados. Somente as Batalhas
do nome, ficando apenas um substantivo que dava
de Sarandi e Passo do Rosário foram encontros mi-
a ideia de abandono, isolamento. (Muitos historia-
litares de maior vulto e em ambas o Exército Impe-
dores atribuem a esta mudança a perda de força do
rial Brasileiro saiu derrotado, gerando mais um rio
nome, que acabou sendo substituído por Florianó-
de feridos que lotou os hospitais da região sul do
polis, em 1894, através de uma Lei Estadual)
país. Em 1827 o Brasil foi definitivamente derrotado na Batalha de Monte Santiago e, a partir daí, a paz foi negociada com a intermediação da França e
Com a Guerra da Cisplatina, deslocou-se para a re-
da Grã-Bretanha.
gião o novo Imperador do Brasil, Dom Pedro I, a
Mais uma vez, quem salvou o Hospital de Caridade
fim de comandar o cerco a Montevidéu. Nesta oca-
foi o Irmão Joaquim. Estando na Corte Imperial do
sião mandou requisitar – e é alí que os conflitos
Rio de Janeiro quando recebeu a notícia de que o
recaem exatamente sobre o Hospital de Caridade
seu amado hospital tinha se transformado em unida-
– os hospitais do sul do Brasil para a comandância
de militar, recorreu ao Vice-rei, o Marquês do Lavra-
militar. As batalhas geravam rios de feridos graves,
dio, clamando contra a injustiça desta medida, uma
que invadiam os hospitais, tomando todos os leitos
vez que desalojava os pobres e infelizes. A influência
e cada espaço dos hospitais, inviabilizando o seu
da autoridade moral deste já se mostrava cabal, uma
atendimento primordial, que era para os desvali-
vez que já no dia seguinte foi expedida uma ordem,
dos. Num cenário de tamanha indefinição política
exarada pelo próprio Vice-rei, no sentido de restau-
quanto este, nada havia a se fazer e a Irmandade,
rar os objetivos primordiais do Hospital.
129
Com imensa alegria o Provedor da Irmandade, Sar-
O problema atingiu proporções alarmantes durante
gento-mor Anacleto José Pereira da Silva recebeu
o século XVIII, quando a moral social, em consequ-
a notícia da liberação, e logo a Irmandade se pôs a
ência das grandes transformações sociais, políticas
braços para recuperar o hospital, vilipendiado pela
e econômicas, sofreu grande decadência. As mulhe-
ação militar.
res que concebiam prole bastarda não conseguiam se impor sobre o julgamento da sociedade, e como não desejassem se expor à censura e à exclusão so-
Durante séculos, um dos graves problemas enfren-
cial, tratavam de se esconder durante a gravidez e,
tados pela sociedade ocidental foi lidar com os
tão logo nascesse o filho, abandonavam-no de al-
enjeitados, ou seja, as crianças que, concebidas de
guma forma, sendo a mais comum deixá-lo à porta
maneira reprovável pela sociedade de então, eram
de alguma casa, o que ocasionava frequentes tragé-
rejeitadas por suas mães.
dias, uma vez que as indefesas criaturas ficavam à
130
mercê do ataque de cães, do frio e das intempéries.
responsabilidade, bem como os recursos existentes
Foi para solucionar este grave problema que surgi-
para tal.
ram as chamadas rodas de enjeitados.
Na Vila de Nossa Senhora do Desterro a Câmara Mu-
Por outro lado, era encargo legal das antigas câ-
nicipal impetrou ação visando transferir esta respon-
maras municipais do Brasil Colonial a proteção
sabilidade para o Hospital da Caridade dos Pobres.
às crianças expostas. Naquela época cunhou-se o
Lembrando que das Misericórdias, decreto maior
termo “Enjeitado” para estas crianças que a misé-
que regia seus destinos e açoes, fazia parte a ca-
ria, o pudor ou o preconceito maternos levavam a
ridade para com estas crianças abandonadas, a Ir-
abandonar sob o véu da escuridão noturna. Com a
mandade do Senhor Jesus dos Passos tomou a si
independência do Brasil e a consequente balbúrdia
a tarefa de recolhê-las, instalando para tanto uma
política que se instalou num país que, se perdera
“Roda dos Enjeitados”. Era uma engenhoca de ma-
a identidade antiga – de colônia – ainda não en-
deira que girava sobre seus gonzos, permitindo que
contrara a nova – de nação independente – a ques-
em um compartimento fechado fosse colocada a
tão dos enjeitados ficou ainda mais complicada. As
criança rejeitada e seus pertences básicos, girando-
Câmaras Municipais, por falta de outro recurso,
se-o depois para o lado de dentro. Desta forma, a
acabaram transferindo para as Santas Casas esta
criança ficava protegida do frio e das agruras da
131
noite, único período em que as mães, acobertadas
varas de canequim, 2 rodas de cadarço para cintei-
pelas sombras, vinham depor os filhos a serem do-
ro e seis camisas ou, no caso de não haver camisas
ados, e a identidade da depositante era também
prontas, tecido fino para confeccioná-las. Jesuína,
mantida em sigilo até dos próprios recolhedores.
lamentavelmente faleceu apenas oito meses depois,
A primeira criança a ser depositada na roda do
em fevereiro do ano seguinte.
Hospital de Caridade foi uma menina, na noite de
A segunda exposta foi batizada de Maria, e foi reco-
12 de junho de 1828. Apesar da tristeza que cerca-
lhida 11 dias depois de Jesuína, mas desta vez, ao
va tal fato, a chegada da pequena menina foi feste-
invés de usar a roda do Hospital da Caridade dos
jada como símbolo de mais uma realização em prol
Pobres, quem a abandonou deixou a criança dian-
da caridade dos pobres da Vila. Foi imediatamente
te da porta de Dona Felizarda Luiza Cândida Maes.
batizada de Jesuína, numa clara referência ao Se-
A ilustre senhora recolheu a criança, entregando-a
nhor Jesus dos Passos, e passou para a tutela da
em seguida à Irmandade, responsável legal por es-
Irmandade, que havia nomeado, imediatamente à
tes casos.
decisão de abraçar tal causa, um irmão para dirigir
Durante todo o ano de 1828 continuaram sendo
os serviços, denominado “Mordomo dos Expostos”,
depostas inúmeras crianças, totalizando 24 ao final
bem como uma rodeira, senhora encarregada de
daquele período.
verificar, todas as manhãs, se havia algum exposto
(A Roda dos Expostos perdurou até 1894 quando,
na roda. Em caso positivo, era função desta mulher
com a diminuição acentuada da deposição de crian-
dar-lhe as primeiras atenções e comunicar o Mor-
ças, foi extinta oficialmente pela Irmandade.)
domo dos Expostos, para as devidas providências, que incluíam a identificação de uma ama interessada em criá-lo, mediante o recebimento de um pro-
Antes de ser extinta, no entanto, a Mordomia dos
vento mensal. A primeira rodeira da Mordomia dos
Expostos da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos
Expostos foi Joana Maria da Silva, e foi dos braços
deu muito trabalho e preocupações. A prova cabal
dela que o Mordomo dos Expostos recebeu a pe-
disto está exposta, de maneira clara, num manifesto
quena Jesuína.
público redigido em 1868 pelo Provedor Substituto
Ao Mordomo dos Expostos também cabia o acom-
José Gonçalves dos Santos Silva:
panhamento e fiscalização dos préstitos das amas autorizadas pela Irmandade.
Informações sobre a Mordomia dos Expostos im-
Cada criança enjeitada, ao ser entregue à ama es-
plantada a partir de junho de 1828 e que foi conhe-
colhida, recebia como dote 4 côvados de baeta, 2
cida publicamente como “Roda dos Expostos”.
132
Ao Público: Circunstâncias compromissais da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Imperial Hospital de Caridade me colocaram à frente desta, como provedor substituto pelos restantes mais de cinco meses, e assim e conjuntamente, à frente da administração dos expostos, que lhe foi anexada em 1828 pela caridosa anuência da Irmandade às propostas do Poder Governativo Provincial, que se obrigou a fornecer à Irmandade o custo da respectiva criação; custo que, por encurtar, direi que era finalmente suprido pela Repartição da Fazenda Provincial, a quem a Irmandade prestava conta do dinheiro para este fim recebido. Assim foi, enquanto as Assembleias Legislativas da Província, no desempenho de suas funções, consideraram dever sagrado este que lhes impunha a humanidade, o interesse social e a convenção. Enquanto consideraram que os alimentos indispensáveis à vida da infância desvalida deviam ter nas leis do orçamento a mesma indispensabilidade, porque “o pão nosso de cada dia nos daí hoje” que a Deus pedimos, não podia ser proposto para futuras épocas, pois que isto equivaleria a dizer-se-lhe: morram de fome que nós depois proveremos a sua sustentação, enquanto consideram que este pão cotidiano, ainda nos apuros de concorrência na lei do orçamento, devia ter preferência sobre as coisas de utilidade às vezes problemática, mas não de necessidade, e até sobre as necessárias, mas não indispensáveis. E enquanto consideraram que, se o povo semi-bárbaro e selvagem autoriza os pais a matar os filhos que não podem criar, o Brasil como nação civilizada, puna no seu código criminal o infanticídio, cujo corolário é o provimento à respectiva alimentação. Deixou de assim ser, quando a Assembleia Legislativa da Província enjeitou os enjeitados, que já o eram por seus progenitores, mais humanos contudo, uma vez que os tinham levado à roda ou a alguma outra casa, onde supuseram haver algum coração caridoso na posse de meios para fornecer-lhes a indispensável alimentação. Não peguei na pena para acusar, mas simplesmente para pedir esmola; pedido que me traz com vigor a necessidade, da qual nada sei que me exima, de indicar os fatos que a ele me levam. Estancadas assim, para os expostos em criação, as fontes oficiais da província, ainda fora desta conjectura outra, no Ministério dos Negócios da Agricultura, ao qual
133
representando eu a eles, apresentasse estes mais ou menos 60 infantes agora a meu cargo, e pedisse para eles serem considerados como imigrantes, e como tal se lhes adiantasse a módica quantia regulada e determinada pela Presidência da Província em Ofício de 21 de outubro de 1857, para a sua alimentação até os sete anos, na esperança de que ainda que só metade deles sobrevivam, indenizarão a sociedade suficientemente pela natureza das coisas, e amplamente pelo inerente amor pátrio, o qual também futuro, se deve esperar dos filhos destes dispendiosos imigrantes. Há contudo, uma outra fonte de caridade, que a residência e domicílio de quase 40 anos me tem feito conhecer, no coração da povoação catarinense; a esta pois e por agora prefiro, e a ela recorro. Não me julgo autorizado a pedir esmolas senão para o Imperial Hospital de Caridade, assim para este a peço, mas nada me obsta a que eu vos proponha a condição de que o produto das esmolas assim colhidas, seja primeiro aplicado a mais urgente necessidade, qual seja, o pagamento dos alimentos dos expostos em criação, mas posto a crédito do referido hospital, que assim substituirá os credores originais, que vêm executando suas tarefas com penosos sacrifícios. Julgo do meu dever, falando-vos do segundo enjeitamento, não omitir o efeito de ter ele produzido e acumulado uma nova dívida, pela criação já finda dos expostos chegados aos sete anos de idade, dívida esta que segundo um apanhado é de 11:680$161 réis devidos a 91 credores, a maior parte quase tão indigentes quanto os expostos que criaram, possuindo a mais que estes a maioridade e, consequentemente, a maior ação. Não é porém para estes que eu agora peço esmolas, mas para a urgente necessidade de socorrer os infelizes em criação, tanto os que estão em poder das amas às quais foram entregues e cuja dívida monta a 6:355$144 réis incluindo 61 credores, como de 3 que ainda se encontram na Roda, onde se acham partilhando com os doentes do hospital os escassos recursos deste, pois não achamos quem os tome por causa da falta de pagamento da criação. A vós, pois, corações caridosos e povoação catarinense, toca socorrer com aquilo que a caridade de cada um ditar e ajudar, as mínimas quantias podem produzir avultada soma, para suavizarmos a má sorte destes nossos filhos, cujo alimento foi suprimido no orçamento, destarte para promover o equilíbrio da receita com a despesa aumentada com sobrenadantes verbas, não como esta, indispensáveis.
134
Para facilitar-vos a expressão da vossa caridade, simbolizada nas esmolas que assim imploro, recorri aos senhores Antônio Jaques da Silveira, Livramento Filho&Vieira e Mancio&Filho, os quais também caridosamente se prestaram ao serviço de recolhêlas. Ainda que a vossa caridade não careça, tenho como meu dever citar São Paulo, quando diz, em Coríntios 13,13: Agora pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade, estas três virtudes; porém a maior delas é a caridade. Consistório da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Imperial Hospital de Caridade na cidade do Desterro, a 1º. De janeiro de 1868 – O provedor substituto José Gonçalves dos Santos Silva.
No dia 27 de fevereiro de 1842, uma reunião da
havia mais lugar, e em segundo lugar, o excesso
Mesa Administrativa da Irmandade havia delibe-
de cadáveres ali sepultados, no piso e nas paredes,
rado sobre um importante assunto: a questão do
estava chegando ao ponto de provocar um odor de-
cemitério da Irmandade. Dois motivos transfor-
sagradável no ambiente.
mavam aquele assunto em matéria fundamental
O segundo aspecto era que, de acordo com as de-
para a Irmandade: primordialmente, a tradição que
terminações que regiam as Santas Casas à época
levava muitas pessoas da comunidade a se filiar
de D. Maria I, o monopólio de realizar todos os en-
em uma irmandade religiosa, para garantir o seu
terros na Vila pertencia à Irmandade, mesmo da-
sepultamento, uma vez que não havia cemitérios
queles que não pertenciam a esta e, portanto, não
públicos. Não foi diferente com a Irmandade do Se-
eram enterrados na Capela. Isto obrigava a uma
nhor Jesus dos Passos, responsável pela inumação
atividade penosa quem estivesse responsabilizado
dos seus irmãos. Até aquela data, estes haviam sido
por este transporte, tanto na ida quanto na volta,
sempre sepultados na Capela, mas esta prática não
uma vez que a Irmandade disponibilizava caixões
podia prosseguir. Em primeiro lugar, porque não
para empréstimo, que eram utilizados durante o
135
velório. Na hora do enterro, o defunto era retirado, embrulhado em um lençol e colocado na catacumba, devendo o caixão ser reconduzido aos domínios da Irmandade para novas utilizações. Esta prática existia para fornecer à entidade mais um meio de arrecadação e subsistência de suas importantes obras. Assim sendo, a Mesa Administrativa deliberou e decidiu enviar uma correspondência à Assembleia Legislativa Provincial, solicitando permissão para a instalação de um cemitério em área adjacente ao hospital, pertencente à Irmandade. Algumas semanas depois a Irmandade foi autorizada, e iniciou a instalação de seu próprio cemitério. Deste período antecendente à construção do novo hospital, quando o mesmo recebeu a chancela do Imperador, destaca-se o fato de que o Provedor eleito em 1843, Manuel Francisco Pereira Neto faleceu, assumindo interinamente neste período, primeiro o Capitão Miguel Joaquim do Livramento e posteriormente o Major João Antônio Lopes Gondim. Fervoroso cultuador da memória de Dona Joana Gomes de Gusmão, este mandou exumar os restos mortais da beata e recolheu-os em uma urna, solenemente instalada na Capela Menino Deus. A urna e a imagem olham-se desde então, perpetuando o fervor e dedicação daquela santa mulher pelo seu orago maior.
136
137
CapĂtulo IX
1845
Uma visita Imperial
138
139
Dom Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo
da raça branca sobre a negra, o futuro imperador
Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leo-
foi educado com concepções muito mais abertas,
cádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Bragança
libertárias e igualitárias. A tolerância do Impera-
e Habsburgo, chamado de “O Magnânimo”, foi o
dor não se restringia aos negros, mas também aos
segundo e último Imperador do Brasil. Sucedeu
muçulmanos, pois acreditava que a paz mundial
ao pai, D. Pedro I, que abdicou em seu favor para
seria sempre uma utopia enquanto não se esta-
tomar a coroa de Portu-
belecesse uma sincera con-
gal, à qual renunciara
ciliação entre ocidente e
em nome de sua filha
oriente. O mesmo se esten-
mais velha, Dona Ma-
dia aos judeus, como mos-
ria da Glória. Pelo lado
tra uma resposta dada, em
materno era sobrinho
carta, ao amigo Gobine-
de Napoleão Bonapar-
au, quando este o ques-
te e primo dos Impe-
tionou sobre a ausência
radores Napoleão II
de leis contra estes no
da França, Francisco
Brasil: “Não combaterei
José I da Áustria e
os judeus, pois da sua
Maximiliano I do Mé-
raça nasceu o Deus da
xico. Seu reinado ini-
minha religião!” Era um
ciou no dia 7 de abril
estudioso, apreciador
de
quando
das artes, das ciências
contava apenas cin-
e da cultura, e apesar
co anos.
da timidez que fez
1831,
(Seu império estender-se-ia até 1889, quando foi
com tivesse poucos bons amigos, várias vezes co-
deposto, totalizando 58 anos como monarca bra-
mentou com estes que “a ser Imperador, preferia
sileiro)
ser professor”. Tinha mentalidade democrática e
Quando criança, Dom Pedro II recebeu uma gran-
só impunha suas vontades quando o pesado exer-
de influência por parte do pai e também de seus
cício do cargo para o qual havia sido preparado
mestres quanto às demais etnias e culturas exis-
desde a mais tenra idade o exigia. Solitário, havia
tentes no mundo. Em um período da história em
ficado no Brasil apenas na companhia de três ir-
que era tido como fato “científico” a supremacia
mãs mais velhas naquela tenra idade, sujeito a um
140
regime intenso e exigente de educação integral
safios, distanciado daqueles primeiros tempos nos
para o cargo que assumiria de maneira integral,
quais os abnegados irmãos instituidores proviam
antes de completar a maioridade (18 anos).
o necessário ao seu funcionamento. As dificulda-
Resumindo, o Imperador Dom Pedro II foi um ho-
des e necessidades só faziam crescer e o dinheiro
mem de ideias avançadas e humanistas, um refor-
proveniente da Coroa Portuguesa minguara de
mador voltado para a cultura, a educação e a paz.
vez, deixando a Irmandade a braços com dificulda-
Criou e reformulou es-
des imensas, quase insuperáveis.
colas e faculdades, ten-
Durante este regime monár-
do fundado em 1838
quico brasileiro, no entanto,
o Instituto Histórico e
criou-se outro mecanismo de
Geográfico
Brasileiro
auxílio às obras de caridade,
sob a inspiração do
projetos de beneficência e
Institut Historique de
edificação de igrejas: o direi-
Paris, além de muitas
to a promover loterias, com a
outras entidades simi-
reserva de um prêmio de 12%
lares ao redor do país.
para o organizador. Esta prá-
Era conhecido como
tica correu o Brasil salvando
mecenas,
utilizando
da penúria as antigas san-
inúmeras vezes re-
tas casas, agora relegadas à
cursos de sua fortu-
própria sorte. Na província
na pessoal para au-
de Santa Catarina não foi di-
xiliar obras voltadas
ferente. A Assembleia Geral
para a investigação
Legislativa concedeu o be-
científica, as culturas e as artes.
nefício das loterias à Irmandade do Senhor Jesus
Assim que completou a maioridade, casou-se por
dos Passos e ao seu Hospital de Caridade. Com es-
procuração com a princesa italiana Teresa Cris-
tes recursos, somados aos magros proventos dos
tina de Bourbon-Duas Sicílias, que foi sua única
imóveis que já incorporavam o patrimônio da en-
consorte e a quem foi fiel até a morte.
tidade, por obra e graça da dotação testamentária
Enquanto estes fatos agitavam a corte brasileira,
de muitos irmãos falecidos, foi que a Irmandade
na Vila do Desterro a vida prosseguia celeremen-
manteve de pé o seu tão importante hospital, ape-
te. O Hospital de Caridade enfrentava grandes de-
sar de todos os revezes e dificuldades.
141
Mas o edifício que abrigava a instituição, construí-
das obras. Ficou-se sabendo que o Imperador Dom
do em 1789 pelo valoroso tesoureiro Tomáz Fran-
Pedro II, acompanhado de sua esposa, Imperatriz
cisco da Costa já contava 56 anos e, naquele perí-
Dona Teresa Cristina e de grande séquito, visitaria
odo, não recebera praticamente nenhum cuidado
a Ilha de Santa Catarina, como parte de uma exten-
especial no sentido de sua preservação ou refor-
sa viagem pelo continente brasileiro que faziam,
mas. Urgia reformá-lo e também ampliá-lo, uma
para que a Imperatriz conhecesse seus domínios.
vez que a demanda de doentes na Vila e na Ilha
A notícia causou, ao mesmo tempo, alvoroço e
aumentavam a cada dia, comprometendo a qua-
animação. Já se conhecia a fama da generosidade
lidade dos serviços prestados pelos profissionais
do Imperador, notadamente com obras que be-
que nele atuavam, ainda, muito mais pelo amor de
neficiassem a camada mais pobre e desprotegida
Deus, do que por qualquer tipo de compensação
da população. A Irmandade imediatamente cogi-
financeira.
tou atrair a atenção e a simpatia dos Imperadores
Uma reunião em 7 de junho de 1845 selou o novo
para as obras da caridade dos pobres, através do
desafio da Irmandade: convidar os engenheiros
auxílio ao seu hospital. E foi com grande animação
Coronel Sepúlveda e Carpineti para elaborarem
que o cortejo real foi aguardado em terras catari-
planta e projeto a fim de erigir um novo hospital.
nenses.
Estes acabaram indicando Mariano Moreno, uma argentino que havia se exilado na Vila do Desterro, fugindo da tirania dos Rosas, e ali mantinha
A manhã estava clara e bela, daquelas mais es-
uma escola.
meradas que a Ilha de Santa Catarina é capaz de
O argentino, conhecedor das artes do desenho
produzir. A exuberância de sua natureza parecia
arquitetônico, apresentou à entidade, em reunião
especialmente preparada para receber a real visi-
com data de 30 de julho seguinte, um trabalho
ta: havia finalmente chegado o dia aprazado para
esmerado, detalhado e extremamente apropriado
a visita do Imperador Dom Pedro II. A Vila esta-
às necessidades delineadas pela Irmandade para
va engalanada com bandeirolas, flores e atavios,
o hospital. A Mesa Administrativa, liderada pelo
e todas as senhoras donas haviam colocado seus
então provedor, o Comendador João Francisco de
melhores vestidos para recepcionar tão nobre visi-
Souza Coutinho, deliberou e decidiu-se pela acei-
ta. Empertigados em suas casacas pretas, transpi-
tação do projeto, partindo celeremente para a par-
rando ao sol abrazador de um outubro primaveril,
te de orçamentos e execução.
os homens mais notáveis da Vila aguardavam a
Mas um importante fato mudou os planos de início
chegada da nau que traria a comitiva real.
142
Quando esta se aproximou do porto, dando condi-
berço. Recebeu as homenagens, tendo sido cortês
ções de desembarque, todos os olhos se voltaram
até onde determinava a educação e altivo até onde
para as reais figuras, que tão ansiosamente haviam
exigia a importância do título que defendia com
sido esperadas. O jovem loiro, de tristes olhos
honradez e ética ímpares.
azuis e magra figura causou imensa surpresa: ele
A Imperatriz era uma jovem de traços feiosos, sem
não parecia muito mais do que um menino!
graça nem a beleza que se esperava de uma italia-
A investidura do cargo maior da nação e o extenu-
na, mas era muito gentil e educada, e logo todos
ante preparo educacional de longos anos haviam
ficaram cativados pela sua presença carismática.
emprestado à sua figura um ar tão imperial que
As recepções prosseguiram ao longo de todo o dia,
era difícil imaginar que o Imperador do Reino do
finalizando com um grande banquete ao anoitecer,
Brasil tinha, naquela data, apenas 19 anos (ele fa-
no qual foram servidas as iguarias da terra: pei-
ria 20 daí a dois meses, pois nasceu a 2 de dezem-
xes, frutos e legumes frescos, assados em telhas
bro). No entanto, ele se portou à altura do cargo
de barro cozido, conforme a tradição açoriana pre-
para o qual fora educado a vida inteira, desde o
servada ao longo do tempo.
143
No dia seguinte chegou o grande momento. A co-
além de humanista de estirpe e formação, o Impe-
mitiva real foi levada ao alto do Outeiro do Me-
rador se condoía da situação amarga em que vivia
nino Deus, para visitar o Hospital da Caridade
uma larga parcela da população, e não limitava
dos Pobres, sua singela igreja e as obras que ali
esforços para minorar os males que os atingiam.
se desenvolviam. Ambas as majestades rezaram
Comoveu-se profundamente com as obras do hos-
contritos diante da Imagem do Senhor Jesus dos
pital, verificando pessoalmente as dificuldades in-
Passos e observaram tudo, em intrigante silêncio,
gentes com as quais lutavam os profissionais da
enquanto os Irmãos os acompanhavam, expectan-
medicina naquela casa caindo aos pedaços e, para
tes. Dona Teresa Cristina caminhava vagarosa e
surpresa e alegria de todos os integrantes da co-
elegantemente entre os doentes, fazendo um gesto
mitiva, ordenou imediatamente a condução célere
de carinho ali, um agrado aqui, enquanto Dom Pe-
das obras, que desejava ver conclusas o quanto
dro II olhava tudo com extrema atenção.
antes, sob a responsabilidade financeira do Im-
Como verdadeiro brasileiro de nascimento e alma,
pério. Emprestando mais do que solidariedade e autoridade real, doou também do seu próprio bolso – fazendo juz à fama que o acompanhava – a expressiva quantia de 10:000$000 réis para as obras. Dona Teresa Cristina acompanhou-o, doando também da sua fortuna pessoal a quantia de 1:200$000 réis para o mesmo destino. O Imperador ainda fez mais: doou ao hospital também uma banheira de mármore, que acompanhava o imponente cortejo real para os banhos da Imperatriz. Tamanha magnanimidade despertou os mais veementes protestos de consideração e carinho por parte da população da Ilha. Se dependesse daqueles corações, estaria para sempre eternizada a autoridade do Imperador Dom Pedro II. Apenas uma semana depois teve lugar a cerimônia oficial do início das obras: com uma colher de pedreiro e um martelo, o Imperador iniciou simbolicamente as obras de construção do Hospital
144
145
de Caridade da Vila do Desterro da Ilha de Santa Catarina. O Bispo Diocesano Dom Manuel do Monte Rodrigues de Araújo, Conde de Irajá, benzeu as pedras que o Imperador assentara com a colher de pedreiro e todas as altas autoridades da Vila, da Província e da Comitiva Real aclamaram o efetivo início das importantes obras. Apenas alguns dias depois a comitiva real partiu, deixando os corações cheios de esperança diante daquela nova realização.
Mas as obras, desta vez, não correram céleres como da primeira, nas mãos do saudoso tesoureiro e construtor Tomáz Francisco da Costa. Muitas dificuldades e a complexidade da nova construção prolongaram a sua execução por quase uma década, ficando completamente concluída a construção apenas em 1854. Embora no já no ano seguinte à sua visita, 1846, o Imperador tivesse autorizado a Irmandade a acrescentar o título de Imperial ao Hospital de Caridade, através de carta enviada à mesma, quando este foi inaugurado, no ano de 1854, nem ele nem a Imperatriz estiveram presentes a esta cerimônia. Com a imagem desgastada pelas constantes divergências políticas que tinha que enfrentar, o Imperador já amargava grande derrotas no congresso e iniciava a derrocada que levaria à sua deposição, em 1889. Mas naquele dia 5 de março de 1854 este fato
146
ainda estava distante, e principalmente fora do
desapareceu definitivamente do cenário da Ilha de
foco de preocupações dos habitantes do Desterro,
Santa Catarina. Mas se desapareceram os vestígios
que festejaram alegremente a inauguração do seu
físicos, ficara a herança moral. As figuras queridas
novo hospital.
e abnegadas continuavam, como permanecem até
Os pacientes foram transferidos da velha casa
hoje, pairando sobre o Hospital e a Irmandade,
para a nova... e a antiga construção, erguida pe-
protegendo-os e abençoando a sempre crescente
las mãos de Tomáz Francisco da Costa, graças às
obra de amor e dedicação!
esmolas obtidas pelo seu filho, o Irmão Joaquim,
147
CapĂtulo X
1864
O lazareto
148
149
Os mais antigos registros históricos escritos dão
desvelo com que o Mestre dos Mestres sempre tra-
conta de que a Lepra, também conhecida como
tou estes doentes, curando-os e destinando a eles
Hanseníase, sempre representou uma ameaça à so-
especial atenção. Pelo exemplo, condenou silencio-
ciedade, fazendo com que se isolassem os doentes
samente a perseguição de que eram alvo, tendo ins-
portadores deste mal.
pirado vidas missionárias com a de Maria Madale-
No Egito antigo, há referências à existência da do-
na, que após a sua conersão dedicou o restante dos
ença datando de mais de 3 mil anos. São inúmeras
seus dias a cuidar destes doentes, com desvelo in-
as referências à doença também na Bíblia. E a antiga lei israelita obrigava os religiosos a saberem reconhecer e identificar a doença. Durante muito tempo a doença - que é transmissível, causada por uma bactéria e afeta prioritáriamente pele e nervos - foi incurável e muito mutiladora, forçando o isolamento dos pacientes em leprosários, principalmente na Europa da Idade Média, onde eram obrigados a carregar sinos para anunciar a sua proximidade. No Brasil colonial existiram leis que exigiam a captura dos portadores da doença, para que fossem confinados em leprosários.
(Esta lei compulsória foi revogada apenas em 1962)
Na província de Santa Catarina as coisas não se passaram de forma diferente. Havia os doentes e havia a discriminação. Mas um fator fez toda a diferença. A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, entidade que preconizava - e o faz até os dias atuais – a caridade inspirada pelo Senhor Jesus Cristo, lembrou-se do carinho e
150
comparável. Seguindo seus ensinamentos, a Irman-
então criado o lazareto.
dade estava preocupada em dar sobrevida decente
Assim que finalizou a construção do novo hospi-
e caridosa aos portadores deste mal. Desde a funda-
tal, em 1854, a Irmandade imediatamente iniciou
ção do Hospital, em 1789, estes doentes receberam
a construção de um casarão destinado a isolar os
atenção e atendimento, mas o isolamento sempre
portadores de hanseníase, oferecendo aos mesmos
havia sido um grande desafio, causando apreensão
mais dignidade no atendimento. A construção foi
inclusive nos outros enfermos ali internados. Foi
doação do casal Martinho José Callado e sua esposa Dona Rita, ambos pertencentes aos quadros da Irmandade. A obra foi concluída em 1864 e oficialmente entregue à Irmandade no dia 10 de dezembro. Era provedor então o Capitão de Mar e Guerra Francisco Luiz da Gama Rosa, que presidiu a cerimônia de entrega e, logo depois, os doentes foram instalados na moderna e saudável construção, cujos imensos janelões deixavam ver uma paisagem deslumbrante e consoladora para quem, como aqueles doentes, não podia sair à rua. Durante a construção, haviam ocupado a provedoria, respectivamente, as seguintes Dignidades: No período de 1854 a 1856 o Major Alexandre Francisco da Costa, que como principal providência fizera contratar irmãs de caridade para auxiliar nos serviços do Hospital, sempre assoberbado de doentes e falto de braços para auxílio aos poucos profissionais que se apresentavam para o exaustivo e pouco remunerado trabalho; No período de 1856 a 1858 o Tenente-Coronel Francisco Duarte Silva e no período de 1858 a 1864 o Comendador Francisco José de Oliveira. Em 1864 assumira então o Capitão de Mar e Guerra Francisco Luiz da Gama Rosa, que estava à frente
151
da entidade quando da finalização da obra do ca-
roda dos expostos, que funcionava desde 1822,
sarão.
mostrava cada vez menor utilidade. Passavam-se
Infelizmente a instalação do Lazareto tivera uma
meses sem que uma criança fosse deposta na roda,
consequência funesta. As sete irmãs de caridade da
e a Irmandade iniciou deliberações visando a extin-
Ordem de São Vicente de Paula, contratadas pela
ção da Mordomia dos Expostos. Porém, que fazer
Mesa Administrativa de 1854 e que haviam chega-
com as raras crianças que ainda eram abandonadas
do ao Desterro em 1856, acompanhadas de padres
pelas mães invigilantes?
lazaristas que tinham vindo para prestar socorro
Para solucionar este enigma, a Irmandade do Se-
espiritual, voltaram para a França, sua terra natal,
nhor Jesus dos Passos substituiu a Mordomia dos
deixando uma grande lacuna no atendimento aos
Expostos pela dos Órfãos, visando encaminhar es-
doentes. Mais uma vez o voluntariado de pessoas
tas crianças que, porventura fossem ainda localiza-
bondosas, caracterizadas pelo desprendimento, foi
das no abandono.
a salvação do hospital. Também acontecera que,
A primeira criança a ser oficialmente tutelada pela
nos oito anos em que haviam permanecido na Ilha,
nova Mordomia foi a menina Mariana Rosa, de 12
as sete freiras haviam treinado e ensinado alguns
anos. Deu entrada em dezembro de 1869 e iniciou
ex-pacientes que, por falta de terem para onde ir,
um processo que perduraria até 1887, com muitos
deixavam-se ficar no Hospital de Caridade, trans-
poucos resultados de ordem prática. Durante todo
formando-os em eficientes enfermeiros. A união de
aquele período, deram entrada na Mordomia do Ór-
esforços destes ex-pacientes e dos voluntários foi o
fãos apenas quatro crianças, levando a Irmandade
que manteve os serviços de enfermagem ativos.
a extinguir também aquele procedimento, tratando
( A Irmandade somente voltaria a conseguir con-
de casos excepcionais de maneira pontual, sem a
tratar irmãs de caridade para os serviços de enfer-
necessidade de um padrão estabelecido. As meni-
magem do Hospital de Caridade mais de 30 anos
nas que eram acolhidas ficavam sob a tutela das
depois, em 1897, quando as Irmãs da Ordem da
freiras, que as criavam e treinavam para os traba-
Divina Providência vieram da Alemanha para pres-
lhos de enfermagem e os meninos eram entregues
tarem os mesmos serviços)
a mulheres que, mediante um salário mensal, os criavam como filhos. Os anos corriam céleres, e o Hospital avultava em
Resolvido o problema dos leprosos, a Irmandade
importância para toda a comunidade catarinense.
debruçou-se sobre outros ingentes problemas so-
Já eram relativamente comuns a chegada de pa-
ciais que acometiam a sociedade desterrense. A
cientes provenientes de outras cidades do Estado
152
e até, excepcionalmente, de fora dele. A grande
Doutor Frederico Rolla. De origem europeia, o mé-
afluência de enfermos e as necessidades da região
dico utilizava medicamentos novos, tais como o eli-
obrigaram a Irmandade a promover uma ampliação
xir paregórico, a morphinna, o óleo de fígado de ba-
nas instalações do Hospital, com a construção de
calhau, o Bálsamo Tolú e as pílulas de ópio. Ainda
duas novas alas que foram incorporadas ao corpo
eram, no entanto, largamente utilizadas as infusões
do edifício principal. Estas ficaram prontas e foram
de eucalipto, lobélia, beladona, erva cidreira, horte-
postas em atividade no ano de 1882, quando era
lã, canela, louro e cereja.
chefe médico do Imperial Hospital de Caridade o
153
Capítulo XI
1889
Um século de Hospital
154
e comeรงa um novo Brasil
155
Enquanto a vida corria em tranquilidade e paz na
cos, profissionais liberais, jornalistas, estudantes,
província de Santa Catarina, fervia a política na
artistas e comerciantes estava crescendo nos gran-
Corte Imperial do Rio de Janeiro.
des centros urbanos e desejava maior liberdade e
A instabilidade advinha da crise econômica que as-
participação nos assuntos políticos do país. Além
solava o país e que era originária, por sua vez, da
disso, era uma classe altamente identificada com o
Guerra do Paraguai, também chamada de Guerra
ideário republicano, o que os fazia apoiar os movi-
da Tríplice Aliança. Esta contenda havia gerado ele-
mentos pelo fim da monarquia. Além disto, e como
vadas despesas financeiras ao país, cobertas com
fator adicional agravante da questão da monarquia
capitais externos. Os empréstimos brasileiros ele-
brasileira, havia o fato de que o Imperador Dom
varam-se de 3 milhões de libras esterlinas em 1871
Pedro II não possuía filhos homens, apenas filhas.
para quase 20 milhões em 1889, o que causou uma
Todos os varões nascidos de seu matrimônio com a
inflação da ordem de 1,75% ao ano. Somada a esta
Princesa Teresa Cristina haviam falecido em tenra
aflição, havia outra grave questão interna. A classe
idade. Sobraram as mulheres e o trono seria ocupa-
média brasileira, composta por funcionários públi-
do, após a sua morte, pela filha mais velha, a Prin-
156
uma vez que o provedor, sendo militar, pôde prever todos os atos provenientes da revolta dos militares e proteger tão honrada e necessária instituição. O Coronel Villela nem hesitou em mudar, rapidamente, a nomenclatura do Imperial Hospital de Caridade, suprimindo o nome que o aliava a um período agora encerrado da história brasileira. Celeremente, o Hospital adotou o simples nome de Caridade, evitando títulos que pudessem incorrer em classificações injustas, uma vez que aquela instituição cesa Isabel. Acontece que Isabel era casada com o
estava e sempre estará acima destas injunções da
francês Gaston de Orleãns, o Conde d´Eu, que era
sociedade.
extremamente antipático ao povo brasileiro. Para completar a complexidade do quadro, havia também a questão abolicionista. Desde que o Imperador abolira o tráfico negreiro, em 1850, as elites agrárias tradicionais do país haviam se organizado contra ele e reivindicavam constantemente indenizações do estado proporcionais à gradual extinção do regime escravagista. Multiplicava-se a propaganda republicana nos principais centros do país levando, a 15 de novembro de 1889, à Proclamação da República. Foi neste mesmo ano em que os rumos do Brasil mudaram drasticamente, que o Imperial Hospital de Caridade da Vila do Desterro completou um século de existência. No ano em que todos estes fatos modificaram a face do país para sempre, era Provedor da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Imperial Hospital de Caridade o Coronel Virgilio José Villela, o que em muito auxiliou a entidade,
157
A caridade verdadeira não tem pátria, nem regime
assumir a provedoria em 1890. Como ficasse gra-
político, nem tampouco partidos políticos. Pertence
vemente doente durante este segundo mandato, foi
à esfera do Criador, tão somente.
substituído pelo irmão, Alfredo Theotônio da Costa,
O Provedor Villela esteve à frente da Irmandade e
que era então o Vice-provedor. Foi neste período
seu hospital por oito longos anos, levando-o a su-
que este elaborou o mais extenso e organizado re-
perar todo o período de instabilidade política com
latório de todas as atividades da Irmandade e do
relativa tranquilidade. Antecedeu-o e sucedeu-o na
Hospital jamais elaborado até então. O documento,
provedoria José Theodoro da Costa, que voltou a
denominado:
Breve Notícia sobre a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos
Instituição da Irmandade e erecção da Capella
Fundação da Igreja do Menino Deos e do Hospital de Caridade
Traços biographicos do Irmão Joaquim e da Beata Dona Joana Gomes de Gusmão E outros factos notáveis
Santa Catharina – 1892
158
Vice-provedor: Alfredo Theotonio da Costa (a falta do provedor se deve ao motivo antes exposto, de que o mesmo se achava afastado por estar gravemente enfermo) Secretário: Francisco Xavier Pacheco Adjunto do Secretário: João Floriano da Silva Thesoureiro: André Wendhausen Procurador Geral: Francisco Firmo de Oliveira Mordomo do Culto: Eugênio José Antônio Bruno Mordomo das Orphãs: Major Affonso de Albuquerque e Mello Mordomo dos Expostos: Patrício Marques Linhares Consultores: Alfredo da C. e Albuquerque, Joaquim Antônio Bruno, José Coelho de Brito, José Luiz dos Santos, Miguel V. Cardoso da Costa e Pedro Marques da Silva. José Theodoro da Costa O provedor vai então narrando a tocante história da chegada da imagem do Senhor dos Passos à Vila Foi impresso na Typographia do Apostolo, no Rio
de Nossa Senhora do Desterro, fala em seguida da
de Janeiro e dedicado, misteriosamente, “à dadivo-
consequente fundação da Irmandade do Senhor
sa irmã e distincta catharinense Dona Carolina Emi-
Jesus dos Passos, passa em seguida aos fatos que
lia Paranhos Conceição”, segundo o próprio autor,
levaram à construção da Capela para a imagem e
“em homenagem à fervorosa devoção que consagra
destaca a instituição da caridade dos pobres.
ao Senhor Jesus dos Passos.”
Em seguida dedica longas páginas às histórias do irmão Joaquim e da Beata Joana Gomes de Gusmão, falando ainda sobre a criação e construção do Hos-
O Relatório inicia descrevendo toda a nominata da
pital de Caridade. Narra também as diversas refor-
Mesa Administrativa da Irmandade no período em
mas e ampliações executadas, bem como a institui-
que foi elaborado:
ção do cemitério, das catacumbas, da pia batismal,
159
das irmãs de caridade e do Lazareto. Ao final, resume assim a existência da nobre instituição:
Actualidade O Hospital de Caridade, a mais elevada e providente das concepções humanitárias, essa instituição que já conta 104 annos de benéfica existência, desempenha a sua grandiosa missão conservando as suas portas sempre abertas para os infelizes que a ella recorrem em busca de allivio para suas dôres, de remédio para suas enfermidades. A receita no biennio de 1890 a 1892, que hoje finda, foi de 51:508$714 réis e a despeza de 63:313$728 réis, havendo portanto um déficit de 11: 805$014, imputavel em grande parte ao pagamento de fornecimentos feitos no biennio anterior. A elevação de preços que tem attingido os principaes generos de consumo e a grande aflluencia de enfermos que diariamente procura o hospital, a ponto de já serem insufficientes os leitos de todas as enfermarias, são as principaes causas determinantes do estado economico pouco lisongeiro deste estabelecimento. A renda ordinaria, que provem das três seguintes verbas, foi no dito biennio de 34:168$655, a saber: Juros de appolices:.......................................................................25:224$240 réis Alugueis de casas:.........................................................................5:040$000 réis Contribuição arrecadada pela Alfandega:........................3:904$415 réis Correspondem aquelles juros a 355 apolices da divida publica de diferentes valores, que o hospital possue, representando o valor nominal de 238:500$000 réis. No dia 1º. De julho de 1890 existiam nas enfermarias 76 doentes e no decurso
160
do biennio entraram 650; dos quaes tiveram alta por curados 506, fallecceram 140 e existe hoje em tratamento 80. A porcentagem geral dos obitos foi de 19,2% e a dos curados de 69,6%. Além dos enfermos tratados no hospital, outros, reconhecidamente pobres, e por não poderem medicar-se ahi, foram soccorridos de medicamentos em suas casas. Os doentes nestas condições elevaram-se a 151, sendo aviadas pela pharmacia 495 receitas contendo 677 phormulas. Por conta da renda pagam-se doze pensões a viuvas pobres e honestas, despendendose 73$000 réis mensalmente. Além destas pensões paga-se a Amélia Moreira de Lima a mensalidade de 40$000 réis, onus com que o Irmão benfeitor Antônio Joaquim Wanzeller legou ao hospital a casa de sobrado sita a Rua João Pinto, na qual funcciona o Club 12 de Agosto. Com médico, pharmaceutico, enfermeiros, porteiro, cozinheiro, serventes, lavadeira e coveiro despende-se mensalmente 723$000 réis. (mantida a grafia original do documento)
O relatório finaliza com uma lista completa dos
sobre a Província de Santa Catarina. Em 1894 uma
Provedores e com as orações e cantos dedicados ao
lei estadual altera o nome da cidade do Desterro
Senhor dos Passos.
para Florianópolis, numa homenagem a Floriano
Ficou assim, registrada para a posteridade, a real e
Peixoto.
inteira situação e o histórico da Irmandade do Se-
Justamente nesta época assumiu a provedoria o
nhor Jesus dos Passos e seu Hospital de Caridade.
Coronel Germano Wendhausen, cujo mandato de 38 anos foi o mais longo e um dos mais produtivos de toda a história da Irmandade e do seu hospital.
Os novos ventos republicanos sopravam também
161
CapĂtulo XII
1892
Trinta e oito anos exemplares Germano Wendhausen Provedor no perĂodo 1892/1930
162
163
Audacioso e capaz, o Provedor Germano Wendhau-
Filho de Heinrich Wendhausen e Marie Eva Gesser,
sen foi eleito para a provedoria da Irmandade no
ambos imigrantes alemães provenientes da região
dia 2 de maio de 1892, contando apenas 39 anos.
da Wesphalia, Germano nasceu no dia 12 de março
Florianopolitano de origem germânica, o Coronel
de 1853 e cresceu sob a intensa diciplina da casa
Wendhausen permaneceu no cargo por longos e
paterna, uma pequena hospedaria na Vila de Nossa
profícuos 38 anos, encerrando o longo período de
Senhora do Desterro, localizada na antiga Rua São
doação amorosa em 1930, com a sua morte.
Franscisco, hoje Deodoro.
A estirpe conferida pela ascendência germânica
Germano foi o sexto filho do casal, tendo sido pre-
contou muito para o denodo com que o ainda jo-
cedido por João, Maria Luíza, Pedro, Catarina e An-
vem Provedor assumiu a entidade, abraçando a
dré. Depois dele ainda nasceram Fernando e Henri-
causa do Hospital de Caridade como se fosse a sua.
que, totalizando oito filhos.
164
Germano revelou veia política desde muito jovem.
ministrativa, referente ao biênio 1892/1894, fica-
Fez parte do movimento abolicionista e republicano
ram registrados os nomes dos eleitos:
de Santa Catarina, tomando parte do ato de posse
Para Provedor: Germano Wendhausen, com 36
do Governo Provisório de Santa Catarina, em 18 de
votos. Os demais candidatos que se apresentaram
novembro de 1889 e sendo em seguida eleito vere-
para o cargo, juntos, alcançaram apenas 3 votos.
ador da Câmara Municipal da antiga Desterro. Em
Foram eles o então Provedor Interino, Alfredo The-
outubro de 1893, contando 40 anos e recém-em-
otônio da Costa, com 2 votos e José Silva de Sousa
possado como Provedor da Irmandade do Senhor
Junior, com um voto.
Jesus dos Passos e Hospital de Caridade, foi nomeado Comandante Superior da Guarda Nacional de Florianópolis, incorporando o posto (coronel) que carregaria pela vida toda. Como vereador atuante, ocupou inúmeras vezes o cargo interino de Prefeito de Florianópolis, nos anos de 1893, 1903, 1904, 1905 e 1906.
Germano Wendhausen promoveu grandes transformações e melhorias tanto na irmandade como, principalmente, na sua obra maior, o Hospital da Caridade dos Pobres. Em seu mandato foram instituídos o atendimento aos tuberculosos, incluindo a construção do Pavilhão Josefina Boiteux, o atendimento à ginecologia e obstetrícia, a construção da gruta dedicada à Nossa Senhora de Lourdes, a criação de enfermarias pediátricas, a implantação dos serviços de Raio X e um novo centro cirúrgico, todas realizações que guindaram o Hospital de Caridade ao posto de centro avançado em tecnologia da saúde daquela época. Na Ata da reunião de eleição para a nova Mesa Ad-
165
escolher outro postulante ao cargo. No dia 18 de junho daquele ano foi eleito como novo tesoureiro o irmão Antônio Venâncio da Costa. No dia 1º. De julho a Irmandade reuniu-se, solenemente, para a “Acta de Juramento e Posse das novas dignidades que tem que servir no biênio compromissal de 1892 a 1894.” Os novos investidos foram abençoados pelo Capelão da Irmandade, Cônego Joaquim Eloy Medeiros. O irmão do provedor eleito, André Wendhausen, ocupava então o cargo de tesoureiro e fez a entrega solene de 245$955 réis ao próximo tesoureiro. Naquele ano a Mesa AdmiPara Vice-provedor foi eleito Wenceslau Martins da
nistrativa realizou reuniões mensais, promovendo a
Costa, com 35 votos. Foram eleitos como Secretário
atualização de muitos dos assuntos pertinentes ao
João Maria de Bittencourt Cidade e como Adjunto
Hospital que permaneciam pendentes. Muitas re-
Pompílio Vespasiano Duarte Luz. Na tesouraria as-
formas de pequena monta foram efetuadas, resul-
sumiram como Tesoureiro José Silveira de Sousa
tando na maior funcionalidade do estabelecimento.
Junior e como Procurador Geral Francisco Firmo de
Na reunião realizada em 8 de novembro daquele
Oliveira. Os mordomos eleitos na ocasião foram:
ano já se registrava o reflexo de todas estas ações.
Mordomo do Culto Divino: Eugênio José Antônio
Foi lido um ofício expedido pelo Presidente do Esta-
Bueno
do, comunicando a entrega de 12:000$000 réis ao
Mordomo dos Expostos: Candido Melchiades de
Hospital por conta das loterias que então ainda se
Sousa
realizavam. O auxílio vinha destinado a promover a
Mordomo das Órfãs: Antônio Luiz do Livramento
construção de uma nova ala à esquerda do prédio principal do Hospital. Durante o ano seguinte, 1893, o Coronel assumiu
Apenas alguns dias depois da eleição a nova Mesa
a prefeitura da capital de 1º. de janeiro a 8 de no-
Administrativa da Irmandade já sofria o primeiro
vembro, ficando então licenciado, sendo substituí-
revés: o tesoureiro eleito, José Silveira de Sousa Ju-
do pelo Vice-provedor, Wenceslau Martins da Cos-
nior não quis assumir o cargo, obrigando a Irman-
ta. O mesmo aconteceu durante praticamente todo
dade a promover uma reunião extraordinária para
o decurso do ano de 1894, com a ascensão dele ao
166
cargo de Comandante Superior da Guarda Nacio-
Uma interessante Ata de uma reunião extraordiná-
nal de Florianópolis. Foram dois anos seguidos em
ria da Mesa Administrativa do Hospital, datada de
que o Coronel necessitou afastar-se dos encargos
22 de dezembro, traça um claro perfil do quadro
pertinentes à provedoria, deixando em seu lugar o
de fiuncionários do Hospital de Caridade, dando a
seu vice.
dimensão dos trabalhos por este realizados:
Quando retornou e reassumiu o cargo, na reunião
1 médico, que recebia um salário de 165$000
de 25 de novembro de 1894, Germano Wendhau-
réis;
sen encontrou o Hospital em situação financeira de-
1 farmacêutico, que recebia a mesma remuneração,
vastadora. Tanto que, na reunião que a Irmandade
165$000 réis;
realizou em 15 de dezembro, a mesa deliberou que,
2 ajudantes de enfermeiros, com o salário de
se não fossem solucionados os graves problemas fi-
30$000 cada;
nanceiros atuais, seria realizada uma diminuição do
1 enfermeira, com o mesmo salário;
Hospital, com a junção de enfermos e fechamento
1 ajudante, cujo salário importava em 20$000;
de uma das enfermarias, bem como a dispensa de
2 serventes das enfermarias dos homens, com salá-
alguns dos funcionários.
rio de 25$000 cada; 2 serventes das enfermarias das mulheres, com salário de 15$000 cada;
O ano seguinte foi bastante atribulado para questão
1 servente e condutor, cuja remuneração era de
da saúde em todo o Brasil. Grassava uma epidemia
25$000;
de varíola e todos tinham muito medo de contrair
1
a temida doença.
40$000;
Em agosto daquele ano a Mesa Administrativa do
1 ajudante de cozinha, com salário de 30$000;
Hospital foi chamada à sede do Conselho Municipal
1 lavandeira, cujo salário somava os mesmos
para uma reunião de urgência. O Governador solici-
30$000;
tou que o Hospital instalasse uma enfermaria junto
1 coveiro e capinador, com um salário de 12$000;
ao Lazareto para atender doentes infectados pela
1 porteiro, cujo salário era também de 30$000.
varíola, pelo qual se dispôs a entregar à Irmandade
Esta era, em 1895, a nominata de funções profis-
a quantia de 12:000$000 para as obras de adapta-
sionais do Hospital, que empregava então 26 dife-
ção necessárias. E assim o Hospital de Caridade de
rentes pessoas.
Florianópolis mais uma vez estendeu sua caridosa mão aos mais necessitados.
167
cozinheiro,
recebendo
a
remuneração
de
Na mesma reunião:
dem, com vistas à contratação, aprovado algumas
“Com a palavra o irmão provedor disse que, sen-
semanas depois.
do de grande valia ao Hospital a construção de um
É a seguinte a íntegra do contrato aprovado na
compartimento ao lado norte do sobrado deste es-
Mesa Administrativa da Irmandade:
tabelecimento, sito a Rua João Pinto, nesta capital, embaixo do qual ficará um armazém para depósito, mandou que se fizesse aquela obra, bem como os
“Contracto Provisório entre a Irmandade do Senhor
consertos, pintura e douramento dos altares da Ca-
Jesus dos Passos e Hospital de Caridade da Capital
pela desta Irmandade.”
do Estado de Santa Catharina e as Irmãs da Divina Providência de Münster da Allemanha.
De origem germânica, o Coronel Wendhausen co-
Artigo 1º. __ O Hospital de Caridade do Desterro
nhecia de sobra as virtudes das irmãs da Ordem
será dirigido pelas Irmãs da Divina Providencia de
da Divina Providência, estabelecida em Münster,
Münster da Allemanha no que diz respeito a admi-
na Alemanha e iniciou tratativas a fim de contratar
nistração interna do estabelecimento, prestando os
os seus serviços para os serviços de enfermaria do
mesmos serviços que costumam prestar em todos
Hospital de Caridade. Na reunião de 19 de abril de
os estabelecimentos deste gênero confiados aos
1896 foi lido pela Mesa Administrativa, o modelo
seus cuidados, inclusive a fiscalização dos provi-
de contrato a ser aprovado e enviado à mesma or-
mentos de despensa, cozinha, rouparia, fábrica de costura, lavanderia, arsenal cirúrgico, igreja do Menino Deus e as mais dependências da casa.
Artigo 2º. __ O número das religiosas empregadas será fixado pela Mesa Administrativa, segundo as exigências do serviço, de acordo com a Superiora, não excendendo o número de oito.
Artigo 3º. __ Ás irmãs é confiado o tratamento dos doentes, quer pobres quer pensionistas, de um e outro sexo, e bem assim dos inválidos, expostos e orphãos, quando os houver. As Irmãs não tratarão
168
por si mesmas das pessoas affectadas de doen-
nistração da Irmandade e terá as obrigações que
ças syphiliticas nem de mulheres em seus partos;
lhe impõe o respectivo Compromisso.
n´estes dois casos os doentes serão tratados por ajudantes sob a direção das mesmas Irmãs.
Artigo 9º. __ A administração da Irmandade e Hospital tem entrada franca por toda a casa, exceptu-
Artigo 4º. __ As Irmãs terão toda a liberdade para
ando somente os commodos reservados às irmãs,
observarem suas regras e costumes.
nos quais só terá ingresso com particular permissão da Superiora e somente nos casos permittidos
Artigo 5º. __ A superiora administrará o estabe-
pela regra.
lecimento em tudo quanto diz respeito ao serviço interno do hospital, de conformidade com as attri-
Artigo 10º. __ As irmãs receberão do Hospital ali-
buições designadas ao administrador no Artigo 83
mentação, roupa de cama, roupa lavada, moveis e
e seus paragraphos do Compromisso, e mais ainda
utensilios indispensaveis ao seu uso, e uma pensão
organizará as folhas de pagamento de todo o pes-
de trinta mil réis mensaes cada uma. Ellas terão di-
soal do hospital, exceptuando médico, pharmaceu-
reito em caso de doença às visitas do médico e dos
tico, capellão e sachristão na forma já estabelecida,
remedios da pharmacia. Em caso de morte de algu-
e procederá de accordo com o Provedor no que diz
mas das irmãs pertence a Meza fazer o enterro.
respeito ao serviço do Hospital e da Igreja. Artigo 11º. __ As irmãs terão compartimento reserArtigo 6º. __ À superiora compete designar empre-
vado para dormitorio, refeitorio, sala de trabalho e
go as demais irmãs e ella terá plena liberdade em
gabinete da Superiora.
mudar as irmãs e seus empregos e só ella lhes dará ordens.
Artigo 12º. __ As despezas com a viagem das irmãs serão feitas pela Administração do Hospital,
Artigo 7º. __ A nomeação dos médicos, pharmaceu-
mediante accordo previo entre o provedor e a Su-
ticos e outros empregados, bem como a sua despe-
periora ou seu representante, pagando-se em duas
dida, serão feitas de accordo com o Compromisso.
prestações: a 1ª. quando entrarem em exercicio, e a
A Superiora tem o direito de pedir a despedida de
segunda na renovação do presente contracto. Caso
doentes e de empregados insubordinados.
não se realize a segunda condição, a Administração perderá a 1ª. prestação e as irmãs não terão direito
Artigo 8º. __ O Capellão será nomeado pela Admi-
a 2ª.
169
Artigo 13º. __ Correrão por conta das Irmãs as despesas feitas com viagem no caso de serem ellas mudadas por seus Superiores maiores.
Artigo 14º __ No caso de inutilizar-se alguma Irmã por doença, no serviço da casa, ou por velhice, poderá ella permanecer no estabelecimento com todos os direitos de suas companheiras, menos a pensão.
Artigo 15º. __ Este contracto provisorio terá valor só por um anno desde a entrada das Irmãs em exercício no Hospital, e findo o anno será revisto para ser definitivo.”
(mantida a grafia original do
No dia 1º de janeiro de 1897, data em que a Irman-
documento)
dade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital de Caridade completou 132 anos, foi realizada uma festa comemorativa, Da comemoração fizeram parte uma missa cantada em louvor à comemoração, aproveitandose também a ocasião para o benzimento da nova cruz mandada vir da Europa para melhor equipar a Capela do Menino Deus. Um dos pontos altos da comemoração foi um presente especial recebido pela Irmandade, um rico paramento de seda branca para o serviço da Igreja. Quem presenteava eram nada mais nada menos do que a esposa e filha do Provedor, Senhora Thereza Machado Wendhausen e sua filha Thereza Maria. A festa transcorreu solene, enquanto os corações se alegravam, em uníssono, pela importante data.
170
chamar-o á sua presença e interrogou-o, sendo-lhe n’essa ocasião declarado por aquele irmão ser tudo A personalidade forte e reta do Provedor Germa-
verdade e que conhecia ser muito culpado, mas
no Wendhausen transparecia na maneira como,
pedia-lhe que o desculpasse, pois, promettia-lhe
de forma única, conduzia a entidade. Primava pela
emendar-se, porque estava sinceramente arrepen-
moralidade e, em ata do dia 28 de março de 1897,
dido, para prova do que, desde aquelle momento,
é possível perceber toda a sua retidão de caráter,
não trabalharia mais no recinto do estabelecimen-
uma vez que a reunião fora convocada, unicamen-
to, revisando-se imediatamente.
te, por uma importante questão de ordem promo-
Depois d’aquele irmão ser severamente reprehen-
vida pelo mesmo, como é possível depreender da
dido e ter-lhe prometido emendar-se, era de espe-
leitura da referida Ata:
rar que cumprisse a sua palavra de honra, como prometera, porém não o fez, pois passado poucas semanas, tratou novamente, aquelle irmão, fallas
“Aos vinte e oito dias de mês de março de mil e
com a sobredita moça, prevalecendo-se passou
oitocentos e noventa e sete, achando-se reunidos
isso dos dias prometidos à vesitação dos enfermos
no consistório da Irmandade do Senhor Jesus dos
(quinta-feiras e domingos), porém como ella se ti-
Passos e Hospital de Caridade d’desta Capital, o
vesse passado, juntamente com as enfermas, para
irmão Provedor, Germano Wendhausen, dignida-
a enfermaria das invalidas enquanto se conserta a
des e consultores abaixo assignados, e havendo
enfermaria das mulheres, não o poude fazer com
numero legal, foi aberta a sessão, declarando o
receio de ser visto dos empregados do estabeleci-
irmão provedor que a mesma tinha por fim levar
mento, e então procurou corresponder-se com ella
ao conhecimento da mesa o procedimento immo-
por meio de um bilhete que amarrou n’uma corda
ral do irmão Antonio Joaquim Sneiro que, estando
e desceo-o por uma das janellas da enfermaria dos
trabalhando nas obras d’este Hospital, namorou-se
homens. Mas isso foi, ainda assim, visto pelos em-
de uma moça paralhytica das pernas, a qual moça
pregados, que logo comunicarão a elle provedor,
acha-se aggregada a este estabelecimento. Avisado
sendo-lhes então ordenado não o deixarem mais
o irmão provedor d’este fato, pelos empregados do
entrar no estabelecimento.
estabelecimento, bem como, de que se correspon-
Ainda com a palavra, o mesmo irmão provedor,
dião por bilhetes, estando essa resolvida por convi-
dice que aproveitava a acosião para apresentar a
te d’aquelle irmão a sahir do estabelecimento e ir
mesa uma proposta na qual pedia para ser elimi-
morar fora em companhia de uma preta, mandou
nado d’esta irmandade o referido irmão Sneiro, que
171
pela sua conduta immoral no recinto do Hospital,
desta Ata. O Mordomo do Culto divino menciona a
achava-se incursso no Artigo 15 § 1º do compro-
doação da Irmã Dona Carolina Paranhos de Souza
misso; e de conformidade com o Artigo 16 do com-
Conceição, que é a mesma senhora a quem o Pro-
promisso nomeava os irmãos Pedro Gevaerd, Lauro
vedor anterior havia, tão gentilmente, dedicado o
Linhares e Augusto Lopes da Silva para, em comu-
trabalho biográfico que fizera publicar, a respeito
nicação, darem seu parecer a respeito, o que os re-
da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospi-
feridos irmãos o fizerão, declarando não poder nem
tal de Caridade em 1892. Os folhetos doados foram
mais um momento continuar a fazer parte d’esta
exatamente estas publicações, que alguns meses
irmandade um individuo de tão indigna conducta.
depois deram motivo para outra doação vultuosa
Submettida a sobredita proposta á discussão e vo-
em dinheiro que a mesma senhora coletou, venden-
tação, foi aprovada unanimemente pelos mesários
do-os na então capital do país, a cidade do Rio de
presentes, bem como que, no livro matricula, fosse,
Janeiro.
além da eliminação, declarando os motivos que a isso dérão logar. Em seguida o Irmão Mordomo do Culto comunicou
No dia 29 de agosto de 1897 finalmente chegaram
que a Irmã Dª Carolina Paranhos de Souza Concei-
a Florianópolis cinco Irmãs de Caridade da Ordem
ção offereceu á esta Irmandade e Hospital 400 fo-
da Divina Providência, provenientes da cidade de
lhetos que tratão sobre os factos notáveis d’este Es-
Hamburgo, na Alemanha. Eram elas as Irmãs Alber-
tabelecimento e Irmandade. A mesa mais uma vez
tina, Bartholomea, Camilla, Carola e Georga.
reconhecida à aquella virtuosa Irmã, deliberou que
Germano Wendhausen havia feito publicar, na Im-
se lhe agradece tão valiosa offerta.
prensa da capital, a chegada de tãos nobres servi-
E, nada mais havendo a tratar, foi encerrada a ses-
doras, a fim de atrair o público para a festividade da
são. Eu, Marcos Antonio de Souza Aragão, Secre-
recepção das freiras, o que efetivamente aconteceu.
tário, lavrei a presente acta que assigno com os
A Capela do Menino Deus estava lotada quando ini-
presentes.”
ciou a missa, rezada pelo Reverendo Vigário Fran-
(mantida a grafia original do documento)
cisco Topp, Capelão Interino da Irmandade e pelo Reverendo Humberto. A missa foi ainda abrilhantada pela “música do
Além da pertinente análise das questões morais
Corpo de Segurança” especialmente enviado pelo
que tanto preocupavam aqueles nobres senhores,
Governador Hercílio Luz, que também enviara seu
outro fato interessante pode ser inferido na leitura
Ajudante de Ordens para representá-lo.
172
Após a missa uma comissão da Irmandade, acom-
A Irmandade despendera a vultosa quantia de
panhada do povo em geral, escoltou as recém-che-
3:000$000 réis com a aquisição de móveis, uten-
gadas até o Hospital, onde uma singela surpresa as
sílios, roupas de cama e outros objetos necessários
esperava. Todos os funcionários do hospital e doze
à boa acomodação das Irmãs. Ao povo, que tinha
meninas vestidas de branco deram as boas vindas
naquele momento a oportunidade de conhecer as
às Irmãs, e enquanto as mesmas adentravam o re-
recentes reformas promovidas, foi solicitada co-
cinto, uma chuva de pétalas de flores perfumadas
laboração, tendo sido imediatamente recolhidos
as recebeu.
265$000 réis entre os presentes. E assim as irmãs
Recentes reformas promovidas no Hospital melho-
se instalaram e iniciaram as suas atividades no
ravam ainda mais o seu aspecto geral, bem como
Hospital de Caridade de Florianópolis, para alegria
promoviam uma boa acomodação para as freiras,
geral e grande benefício dos enfermos, órfãos e ex-
para cuja coordenação foi imediatamente nomeada
postos ali instalados.
a Irmã Albertina.
Ao longo dos anos seguintes as eleições foram se
173
procedendo como rezava o Compromisso da Irman-
e a inauguração da primeira linha de bondes elétri-
dade, com pequenas alterações e sempre manten-
cos, em São Paulo, na área médica o Brasil assistia
do à frente da administração o denodado Coronel
a criação do Instituto Soroterápico Federal, a inau-
Germano Wendhausen, que deixava a sua marca de
guração do Hospital de Caridade do Pará e a de-
empreendedorismo, realizações e caráter integro.
vastação do Estado de São Paulo por uma epidemia de sarampo. Naquele ano o médico francês Chapot Prévost, residente no Brasil, tentou pela primeira
Finalmente, o mundo viu nascer um novo século. O
vez a separação cirúrgica de duas irmãs siamesas,
ano de 1900 entrava cheio de novidades e trazendo
enquanto no Estado de Pernambuco, o médico bra-
novos ares para a medicina do século XX.
sileiro Amóbio Marques realizava a incrível façanha
Enquanto o país era agitado por fatos importantes
da primeira raquianestesia aplicada no país.
como a criação da Faculdade de Direito de Porto
No Hospital de Caridade esta verdadeira revolução
Alegre e o reconhecimento do Curso de Medicina
também tinha seus reflexos. O médico do HC, Dr.
da mesma cidade, a abertura do Moinho Matarazzo
Urbano Ferreira da Motta dirigiu um requerimento oficial à Mesa Administrativa da Irmandade informando que, devido ao grande número de doentes que acorriam aquele estabelecimento, bem como a necessidade cada vez mais frequente de realizar cirurgias, necessitava urgentemente de um auxiliar, a fim de coadjuvá-lo em suas tarefas. Este fato foi um marco na história do Hospital de Caridade que, até então, desde a sua longínqua fundação, em 1789, sempre tivera apenas um médico formando a sua equipe de atendimento. A Irmandade deliberou sobre o assunto e, prontamente, criou o cargo de Médico Adjunto, nomeando para o cargo o Dr. Antônio Vicente Bulcão Vianna. Também no mesmo ano foram adquiridos na Europa artigos como louças e camas de ferro esmaltado, importados pela Cia Carl Hoepcke. Igualmente durante aquele ano o Hospital de Cari-
174
dade precisou ser novamente isolado, devido aos diversos casos de varíola atendidos no mesmo.
pobres. Em outubro 326, sendo 297 para as enfer-
A última ata do ano de 1900 registrou, pela primei-
marias e 27 para fora, aos pobres; em novembro
ra vez, um levantamento parcial do movimento de
451, sendo 410 para as enfermarias e 41 para fora,
doentes do Hospital de Caridade:
também aos pobres.”
“Existiam em 31 de agosto 65 doentes, entraram
Desta data em diante, as atas das reuniões da Mesa
34 em setembro, dos quais saíram curados 24 e
Administrativa da Irmandade passaram a registrar,
faleceram 2, ficando em tratamento a 20 de setem-
periodicamente, os números de entrada e saída de
bro 68 doentes; entraram em outubro 24, saíram
enfermos, bem como a movimentação da farmácia
curados 30, faleceu 1, ficando em tratamento a 31
do mesmo hospital.
de outubro 64 doentes; entraram em novembro 40,
Em 1905 o Coronel Germano Wendhausen ficou
saíram curados 23 e faleceram 5, ficando a 10 de
gravemente doente, e esteve afastado praticamente
dezembro 16 doentes no hospital. Pela farmácia fo-
durante o correr do ano todo, ficando em seu lugar,
ram aviados, no mês de setembro, 413 fórmulas,
como Provedor Interino, o Capitão Cantídio Alves
sendo 394 para as enfermarias e 19 para fora, aos
de Sousa, 1º. Secretário da Irmandade do Senhor
175
Jesus dos Passos e Hospital de Caridade. Quando
primeira pedra da nova ala do Hospital, na parte sul
reassumiu, na sessão da Mesa Administrativa de
do complexo. O local, previamente determinado, fi-
11 de março de 1906, dirigiu ofício agradecendo
cava no frontispício que dava para o pátio então
não só a imensa dedicação de toda a mesa, como
existente entre este e o lado sul da Igreja, a distân-
também a celebração de uma missa cantada em
cia de oito metros e oitenta centímetros do ângulo
ação de graças pelo restabelecimento de sua saú-
da frente da mesma. Ali foi feita uma abertura no
de. Apesar de contar apenas 53 anos, o Coronel já
alicerce adredemente preparado e aposta uma pe-
denunciava o desgaste de uma vida extremamente
dra de mármore, com as seguintes inscrições escul-
agitada, dedicada principalmente ao bem alheio. A
pidas: XXII – II – MLCCCCVIII. Biennio MLCCCCVI
Ata faz referência ao mal que acometera o Prove-
a MLCCCCVIII. Uma caixa de cobre mandada fazer
dor, denominando-o de “Insulto Apoplético”. (este
especialmente para o cerimonial continha, além da
termo referia-se a acidente vascular cerebral, popu-
pedra de mármore, exemplares dos Jornais da cida-
larmente denominado Derrame)
de (A Fé, do dia 15.02; Reforma, do dia 21.02 e O Dia, de 22.02), e diversas moedas em prata, bronze e níquel, cunhadas em diferentes anos. O Capelão
Ainda neste ano, no mês de novembro, a Irmandade
benzeu a caixa e o Vice-provedor, Capitão Antônio
do Senhor Jesus dos Passos e Hospital de Carida-
Venâncio da Costa, de posse dos mesmos instru-
de cedeu ao Governo do Estado uma área de terras
mentos empregados pelo Imperador Dom Pedro II
para que o mesmo ali construísse um asilo para alie-
nos idos de 1845, uma colher de pedreiro e um
nados, ou Hospício, como se denominavam naquela
martelo, deu a primeira pancada representando o
época as instituições destinadas ao atendimento de
início das obras. O Provedor, Coronel Wendhausen,
pacientes com distúrbios psíquicos e mentais.
estava presente ao ato, mas a fraqueza devido a doença que o acometia impedia-o de fazer o esforço necessário ao significativo ato.
No ano de 1907, uma cerimônia solene marcou a vida da Irmandade. No dia 22 de fevereiro a Mesa Administrativa reuniu-se na Capela do Menino Deus
E assim seguiu o árduo cotidiano da entidade e sua
e, devidamente paramentada com balandraus e in-
obra maior, o Hospital de Caridade.
sígnias, assistiu a missa rezada pelo irmão Capelão
As rendas ainda eram provenientes, principalmen-
Reverendo Padre Archangelo Ganarini em louvor
te, de participação nas loterias estaduais, esmolas
pelo ato que a seguir seria realizado: a aposição da
e legados deixados por irmãos e simpatizantes que
176
faleciam. A administração deste espólio era muitas
vos às sequelas dos diversos derrames de que fora
vezes dificultosa e desgastante, tanto quanto o co-
acometido o obrigassem a constantes afastamentos
tidiano de uma instituição que, a par da sobrevi-
do cargo, como por exemplo nos anos de 1917,
vência, jamais podia fechar suas portas às neces-
1918, 1919 e 1920, nos quais permaneceu pra-
sidades prementes de uma comunidade eivada de
ticamente durante todo o execício em tratamento
problemas e carências.
de saúde, muitas vezes fora do Estado e, em pelo
Ainda assim a Irmandade honrava seu legado prin-
menos uma ocasião, fora do país.
cipal, o compromisso com a caridade aos pobres, ampliando o hospital, realizando obras, reformas e os acréscimos necessários ao bom funcionamento
O complexo religioso e hospitalar da Irmandade
do estabelecimento, sem esquecer as festividades
pontificava no alto do morro, não só iluminando a
santas anuais, como a Procissão do Senhor dos Pas-
cidade, como abençoando todos os seus morado-
sos e a Festa de Vera Cruz.
res. Pairavam acima da magnífica e já imponente
Também seguiam corretas e serenas as eleições
construção, que os anos e os incansáveis trabalhos
bianuais para a composição de Mesa Administra-
dos irmãos haviam acrescentado em tamanho e vo-
tiva da Irmandade e seus consultores. O Coronel
lume, as inesquecíveis figuras da Beata Dona Joa-
Germano Wendhausen seguiu sendo reeleito quase
na Gomes de Gusmão e do Irmão Joaquim, eternos
sempre por unanimidade, embora os males relati-
benfeitores daquela obra!
177
Capítulo XIII
1922 O Hospital de Caridade de Florianópolis acompanha a evolução social brasileira
178
179
Na década de 1920 a 1930 o Hospital de Caridade
nes de Oliveira (1º. Tenente Médico do Exército),
de Florianópolis refletiu, com perfeição, as revolu-
Raymundo Theófilo de Moura, também médico mi-
ções que vinham modificando o mundo e trazendo
litar, e Carlos José de Azevedo Correia, entre outros.
novas visões sobre a medicina, a sociedade e a inte-
Embora o sistema de atendimento em dupla, com-
ração entre o Estado e as associações que existiam
posta de Médico-chefe e Adjunto continuasse em
para promover o bem social. Foi nesta época que
vigor durante quase toda a década, ao final desta,
iniciou a escalada da conscientização das obriga-
o Dr. Bulcão Vianna, que voltara a prestar serviços
ções do governo em relação a estes deveres.
ao hospital, tivesse levado à Mesa Administrativa
Nesta década, e ainda sob a gestão empreendedora
reivindicação dos profissionais da área médica do
do Coronel Wendhausen, a Irmandade do Senhor
Hospital para que fosse aumentado o quadro, pois
Jesus dos Passos contratou, pela primeira vez em
dois profissionais não conseguiam mais absorver
sua história, um seguro contra incêndio, para as-
toda a demanda gerada pelo constante afluxo de
segurar o patrimônio físico do Hospital de Carida-
enfermos para aquele estabelecimento.
de e Igreja do Menino Deus. O seguro foi contra-
A farmácia do Hospital continuava ativa, mas in-
tado à Companhia Alliança da Bahia pelo valor de
gentes dificuldades daquela década levaram a ad-
100:000$00 réis.
ministração da Irmandade a decidir pelo fim da
O Hospital entrou na década de 20 com um con-
distribuição de medicamentos aos indigentes da
junto de 11 irmãs de caridade da Ordem da Divina
cidade, destinando-se a medicação ali produzida,
Providência prestando serviços de enfermagem e
manipulada e distribuída, apenas aos doentes in-
a Superiora passou a ser a Irmã Carola, uma vez
ternados no Hospital.
que a Irmã Clementina encontrava-se em avançada idade, mas ainda residindo no Hospital, onde estas caridosas servidoras tinham o direito de permanecer até a sua morte, se assim o desejassem. A situação dos serviços médicos, embora não fosse ainda a ideal, já apresentava significativa evolução em relação aos primórdios históricos do Hospital. Serviram naquela década como médicos do Hospital de Caridade os Doutores Bonifácio Cunha, Pedro de Freitas Cardoso, Joaquim Ferreira Lima, Firmino da Silva, Calixto Medeiros, Ezequiel Antu-
180
Também nesta década foi instituida a “Sala do Banco”, espécie de consultório onde os médicos recebiam pacientes, examinavam e decidiam pela internação ou não. Assim denominada por causa da existência de longos bancos de madeira pintados de branco nos quais os pacientes aguardavam atendimento, a “Sala do Banco” diminuiu sensivelmente o número de pacientes em regime de internação no Hospital e qualificou os serviços prestados aos remanescentes. Outra grande dificuldade da Irmandade permanecia sendo a administração de espólios a ela legados. Não raro os herdeiros excluídos do seu pretenso direito legal questionavam as heranças legadas à Irmandade, obrigando a Mesa Administrativa a constituir advogados e se envolver em longos e desgastantes litígios em prol da manutenção dos seus direitos. Também os bens legados, na sua grande maioria, apresentavam irregularidades documentais, o que agravava os cuidados necessários na gestão dos mesmos, causando todo tipo de contratempo contra os quais precisava lutar a Irmandade. Muitas vezes o espólio incluía a tarefa de cuidar de algum parente remanescente idoso, que passava a morar no Hospital, constituindo outra fonte de transtornos e gastos. Era grande ainda, naquela década, o número de pessoas residentes no Hospital. Além das freiras, diversos funcionários tinham este direito, alguns inclusive acompanhados dos familiares, sem falar em ex-pacientes que não tinham para onde ir e deixavam-se ali ficar, acabando por torna-
181
rem-se auxiliares de serviços gerais treinados pelas
com o processo necessário para a sua inscrição no
freiras. Acrescida daqueles anciãos que formavam
Ministério da Fazenda e recebeu um número de
uma espécie de “herança” da Irmandade, avultava a
cadastro, adotando oficialmente a nomenclatura:
quantidade de pessoas que lá vivia e precisava ser
Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital
alimentada e atendida em suas necessidades, o que
de Caridade de Florianópolis. O nome da benemé-
aumentava sensivelmente as responsabilidades da
rita instituição era alvo de constantes equívocos.
já atribulada Mesa Administrativa da Irmandade.
Alguns ainda a denominavam Santa Casa, enquan-
Isto sem falar na constante necessidade de refor-
to outros usavam a nomeclatura abandonada com
mas, ampliações e aquisições no complexo hospita-
a Proclamação da República, o título de Imperial.
lar do Menino Deus, em função da manutenção da
O Hospital Jesus, Maria, José, depois denominado
qualidade nos serviços oferecidos.
Hospital da Caridade dos Pobres da Vila do Des-
Porisso, naquela década foram constantes os ofí-
terro ganhava, a partir daquele momento, nome e
cios encaminhados ao governo estadual, ocupado
sobrenome oficiais.
pelos ilustres Hercílio Luz e Adolpho Konder, solicitando auxílio para obras na instituição e outras demandas específicas. Como um reflexo desta cons-
A leitura das Atas daquela década demonstram a
tante necessidade de pedir recursos, a Irmandade
aflição vivida pela Mesa Administrativa na gestão
sentiu necessidade de oficializar e legalizar a sua
do Hospital. Assim o secretário descreve, em ata, as
existência e de sua grande obra, o Hospital de Cari-
palavras do Provedor:
dade. Pensando nisto, em 1922 a instituição entrou
182
“Embora fosse corrente a opinião de todos nós, de que a receita do Hospital não correspondia, desde tempos atrás, as necessidades, acrescidas pelos preços excessivos de todos os gêneros de consumo procurou-se sempre evitar a reducção dos benefícios costumados, entretanto via-se forçado a pedir sérias providências no sentido de serem as despesas reduzidas. Sabia que nenhuma outra economia poder-se-ia fazer senão em detrimento dos benefícios dispensados, pois que em tudo se observa o mais restricto escrúpulo nos gastos. Manteve até há pouco a esperança de que, com o recebimento dos quatro contos restantes do auxílio concedido na Lei Orçamentária do Estado, dos juros das apólices municipaes e a rápida construção da “Villa Operária” (a Ata faz menção a um projeto imobiliário que a entidade intentou realizar naquela época, a fim de arrecadar fundos, e que acabou não logrando o êxito esperado) se pudesse, mais ou menos, dar o necessário equilíbrio financeiro de que, com insistência, falava-se na encampação da dívida municipal relativa a emissão de apólices, em cuja hypothese, ficariamos desobrigados de todos os compromissos e decorrentes de empréstimos; contra a sua expectativa porém, apesar dos seus constantes pedidos e dos Irmãos Procurador Geral e Secretário aos dirigentes dos negócios da Fazenda, não se logram receber o citado benefício e assim os juros de apólices municipais; quanto a construcção das casas, embora a sua diligência em obter as plantas apresentadas à Repartição de Obras Públicas devidamente aprovadas e orçadas, até agora o não conseguira. Lastimava que não tivesse comparecido a reunião o Irmão Thesoureiro, a fim de por a Mesa no corrente do estado precário das nossas finanças, pois que pelos balancetes apresentados não se ode evidencialo, accusam saldo, entretanto despesas ordinárias, relativas ao fornecimento mensal de víveres e dietas, carne, artigos de padarias e medicamentos há meses deixam de serem pagas. Devemos cerca de 15 contos e temos necessidades urgentes de rouparia e louças; e casas necessitam de reparos de certa monta. Como veem os Irmãos Mesários, se não é desanimadora a situação em que nos achamos, certo reclama sérias providências, e neste sentido pede suas luzes e resolução. Seguiu-se com a palavra o Irmão Mordomo Pompílio Luz que, abundando em considerações, propos que sem contestações, deverse-ia por em prática medidas tendentes a diminuir as despesas que desde tempos se vinham avolumando e que a Mesa mui judiciosamente ia tolerando, em razão da epocha de miseria occasionada pela guerra europea; lembrava o alvitre de ser limitado de 100 a 110 o número de doentes, suppressão do receiptuário para fóra do estabelecimento e licenciamento de um médico, medidas estas que se deveriam adoptar em carater de urgencia.” (mantida a grafia original)
183
rúrgico, obras a cargo do Sr. Vitalli, um pedreiro italiano muito habilidoso, que prestava inúmeros e dedicados serviços à Irmandade.
A longa e produtiva gestão do dedicado Coronel Wendhausen chegava ao fim, marcando a passagem do inesquecível provedor. Como já ficara cabalmente comprovado na homenagem que o mesmo recebera em vida, quando, no ano de 1914, assistiu a inauguração do busto em bronze mandado fazer em São também desta década a implantação de servi-
homenagem a sua incansável dedicação, toda a Ir-
ços ginecológicos, obstétricos e pediátricos. Eis aí
mandade prezava e admirava o dedicado Irmão, que
uma prova cabal da evolução no conceito de saú-
tanto fizera pela causa da Irmandade e seu Hospital.
de pública. Os partos que, durante centenas de
Naquela ocasião, um discurso do seu orador oficial,
anos haviam sido realizados no recinto dos lares,
Sergio Nolasco de Oliveira e Paz, destacara com be-
por parteiras e curiosas, passavam definitivamente
leza e emoção ímpares todas as virtudes de caráter
para o domínio da medicina, com o consequente
e fibra de Germano Wendhausen. O longo discurso,
atendimento por médicos profissionais, formados
um libelo em homenagem ao denodo daquela perso-
em Universidades.
nalidade, merece ser conhecido por todos:
A Provedoria do Hospital de Caridade iniciara, no final de 1919 as gestões para a construção de uma “Sala de Operações”, uma vez que o nível de complexidade dos procedimentos executados no Hospital de Caridade vinha aumentando gradativamente. O local destinado a receber o futuro Centro Cirúrgico era aquele onde então funcionavam o Laboratório da Farmácia e o Refeitório das Irmãs de Caridade. Estes foram transferidos para outras dependências e o local, aprazível, claro e arejado, foi reformado e adaptado para receber o modesto complexo ci-
184
“Meus Senhores, o valor dos grandes homens mede-se pela importância dos serviços que prestam à humanidade (Voltaire). As nações mais antigas e cultas do mundo amaram estremecidamente os seus varões mais ilustres, os seus denodados heróis. Em vida pagaram-lhes o tributo de sua admiração, e na morte, para lhes perpetuarem a memória, celebraram em sua honra magnifícas festas públicas. Em toda Grécia honrava-se Hercules, em Atenas, Teseu; em Esparta, Aquiles; em Salamina, Agar. Esmirna levantou um templo a Homero, Alexandre Magno estimava tanto as obras deste imortal poeta, que as guardava cuidadosamente em precioso cofre que encontrara entre os despojos da Paris; e invejava Aquiles a fortuna de ter sido o protagosnista de sua Iliada. Em roma, quando Vergílio entrava no teatro a recitar os seus versos, todo o povo se levantava e lhe fazia o mesmo acatamento que a Cesar. Esse nobre e louvavel costume, observado religiosamente nas idades primitivas do genêro humano, transmitido de século em século, chegou ao conhecimento das nações modernas, dos povos contemporâneos, que os seguem e abraçam, conforme no-lo atesta a história. José Bonifácio, o intrépido patriarca da nossa independência, embora tivesse sido alvo de intrigas políticas e sofresse por isso a prisão e o degredo na ilha do Paquetá, mais tarde a posteridade lhe reconheceu o mérito e para lhe galardoar os assinalados serviços que prestara a sua pátria, ergue-lhe formoso monumento no largo de São Francisco onde ainda se vê. Feitos de tal ordem, de tão assinalado civismo, de tão pronunciado devotamento, praticados para maior realce da bravura, da hombridade, da sisudez de caráter e da virtude, deveriam necessariamente ter gerado nos corações dos povos vindouros dignos imitadores. Aproveitando pois, a trilha que nos abriram, e o nobilitante exemplo que nos deixaram os nossos briosos antepassados, aqui nos reunimos também hoje para rendermos um preito de admiração e reverência a um dos mais conspícuos catarinenses: o Coronel Germano Wendhausen; para, assistindo a inauguração do busto fundido em bronze que a mesa
185
administrativa lhe ofertou, cobri-lo com pétalas de odoríferas flores, fornecidas pelo júbilo que vai na alma e pelos suaves laços de simpatia, amizade e profundo reconhecimento que me ligam a tão distinta individualidade. Exmo. Coronel Germano Wendhausen, a homenagem de que sois alvo na presente solenidade é justa e digna de todos os nossos aplausos e louvores, sob qualquer ponto de vista que se a considere. Pois, ela não só é a expressão do culto tributado ao mérito, pelos inolvidáveis serviços prestados a causa dos desvalidos, que vêm neste pio estabelecimento encontrar conforto e lenitivo a seus males; mas é um poderoso incitamento à prática da virtude, um precioso tesouro legado à juventude catarinense, que irrequieta e exuberante de vida, vem surgindo das camadas populares, qual mimosa bonina, que brota perfumosa por entre as verdes moitas de extensa campina. Incontestavelmente sois um benemérito, não só pelo acerto, zelo, docilidade com que tendes mantido de pé com tão notável prosperidade esta agremiação religiosa, conduzindo-a pela via do dever e da retidão; como pelos úteis e reais melhoramentos que lograstes realizar no Hospital de Caridade durante a vossa fecunda e benéfica administração. Pois, cada uma das pedras deste opulento edifício está como que indicando à geração presente e às vindouras o trabalho, a solicitude, a dedicação que vos caracterizam e que, qual auréola refulgente, tornará imorredouro o vosso nome. Aceitai, portanto, sinceras congratulações por esse auspicioso fato, e vo-las apresentando, eu suplico ao onipotente Deus que vos dilate a existência por longos anos; pois a missão que vos confiaram ainda não terminou. Eu vislumbro na fachada da igreja e na frente da ala direita do hospital indícios de que carecem de obras de estética, de aformoseamento, e compreendo que não se poderão realizar sem o vosso valioso concurso, sem a vossa solicitude e perseverança. Porém, independente delas, outras há que igualmente esperam pelo auxilío de vosso forte braço. Eu, como todos os espíritos calmos e refletidos deste abençoado torrão, anelamos vê-lo na vanguarda da política catarinense, conquistando aquela posição a que tendes direito pelo vosso critério, competência e incontestável civismo!”
186
Coronel foi reconduzido ao cargo por unanimidade de votos, embora pela primeira vez não tivesse loAs palavras do orador foram um verdadeiro vatí-
grado comparecer à Assembleia, tão enfraquecido
cinio. O Coronel ainda permaneceu à frente da Ir-
se encontrava.
mandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital de
No entanto, apenas vinte dias depois, a 22 de maio,
Caridade por longos 14 anos, até seu desapareci-
faleceu levando com ele a honra de uma estirpe
mento, em 1930.
de heróis como poucos se viu. Foi pranteado e ho-
Na última gestão, compreendida no período de
menageado por toda a sociedade florianopolitana,
1928 a 1930, fora eleito muito mais pelo respeito
como digno representante dos mais altos ideais da-
que merecia de seus pares do que pela sua capaci-
quela sociedade.
dade de trabalho, uma vez que a doença o mantinha
Em seguida o Vice-provedor Anthero Francisco de
quase que preso à casa e ao leito. O Vice-provedor,
Assis foi eleito para o cargo que vagara, permane-
Anthero Francisco de Assis cumpriu praticamen-
cendo como Provedor oficial até maio de 1942. O
te o período inteiro de dois anos desta derradeira
sucessor do Coronel seguiu-lhe os passos, dedican-
gestão como Provedor substituto. Ainda assim, na
do-se a Irmandade e seu hospital até ser colhido
eleição ocorrida em 02 de maio de 1930 o honrado
pela morte, neste mesmo ano de 1942.
187
CapĂtulo XIV
1930
Madame Josefina
188
189
Embora se acredite que a interferência dos problemas de um país, ou bloco de países, na economia dos demais é um fenômeno recente, atualmente denominado globalização, esta crença é completamenbte equivocada. Um bom exemplo disto é o que aconteceu no Brasil em 1930. Como consequência da quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque, em 1929, seguida da grande depressão na economia americana, o Brasil mergulhou numa grave crise econômica e política. Fábricas fecharam, demissões em massa ocorreram, salários caíram e uma massa de dois milhões de
derrubar a chamada “República Velha”. Esta alian-
desempregados se formou no país. Para agravar
ça depôs o presidente Washington Luís e deu pos-
ainda mais a situação, o principal produto de ex-
se a Getúlio Vargas na Presidência da República a
portação brasileira, o café, entrou em grave crise
partir de 1930, inaugurando a Era Vargas. É claro
internacional e as vendas caíram vertiginosamente,
que tal comoção política teve reflexos em toda a
fazendo minguar a elite cafeeira paulista.
sociedade brasileira e igualmente em Santa Catari-
Todo este quadro conflagrado gerou também uma
na. Era governador nesta época o Dr. Fulvio Aducci,
grave crise política que levou a formação de um
porém o mesmo foi obrigado a renunciar ao cargo,
novo partido político, a Aliança Liberal, visando
assumindo uma Junta Governativa e iniciando um longo período de intervenção no estado. O primeiro Interventor Militar foi o General Ptolomeu de Assis Brasil, que permaneceu dois anos no cargo. Enquanto isto acontecia, importantes fatos interferiram no destino da Irmandade e seu hospital. Um dos mais ilustres filhos da terra, o Almirante Henrique Adolfo Boiteux, viria a influir profundamente na existência e nas finanças do estabelecimento. Nascido na cidade de Tijucas, o menino veio, em tenra idade, na companhia dos pais, residir na capital do Estado. Ali foi batizado, cursou primeiras
190
letras e preparou-se para mergulhar numa vida de
provedor no exercício da provedoria interina foi
feitos e realizações exemplares. Casou-se em 1899
quem recebeu o ilustre visitante e as notícias que a
com a francesinha Josephine Vincent e o casal vi-
todos emocionaram sobremaneira.
veu em profunda harmonia e inefável amor até o
O Almirante, com seu jeito resoluto, trazia tudo re-
falecimento da mesma, em 1927. Moravam no Rio
solvido e comunicou aos presentes a doação que
de Janeiro, mas vinham com muita frequência a
seria integralizada naquele momento.
Florianópolis, que era a cidade do coração do Almi-
Com ele vinham as plantas devidamente aprova-
rante. Quando aqui se encontravam, frequentavam
das e legalizadas, os projetos e orçamentos cons-
eventos sociais e benemerentes, sempre cônscios
trutivos e finalmente o contrato celebrado com a
de sua responsabilidade como cidadãos exemplares
firma Theodoro Gründel & Cia, já contratada para
que eram. Josefina visitou diversas vezes o Hospital
as obras do pavilhão.
de Caridade, e o casal acabou ajudando com esmo-
E o mais importante: uma ordem de pagamento, em
las constantes as obras do mesmo.
nome da Irmandade, no valor de 100:000$000 réis
Quando Josefina adoeceu gravemente, vindo a fa-
(cem contos de réis)!
lecer com apenas 46 anos, pediu ao marido que
Jamais a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos
fizesse, em seu nome, um legado ao Hospital de
recebera tamanho donativo. E ainda acompanhado
Caridade da terra que aprendera a amar. Após seu
de todas as providências legais necessárias para
passamento, o viúvo inconsolável, com coração de
a concecussão do desejo da inesquecível Madame
eterno companheiro ferido, ensejou fazer-lhe uma
Josefina: a instalação de um pavilhão destinado ao
homenagem inesquecível. Para tanto vendeu a bela
atendimento e tratamento dos tuberculosos. Do va-
mansão que tinham construído na cidade do Rio de Janeiro, e para a qual haviam contado suas esforçadas economias, a fim de fazer doação integral deste dinheiro ao Hospital de Caridade de Florianópolis. O Almirante Henrique Boiteux veio para Florianópolis, a fim de tomar todas as providências e, na inesquecível e memorável noite de 5 de julho de 1927 compareceu, emocionado e feliz, diante do Consistório da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos para participar da reunião. Anthero Francisco de Assis, na ocasião ainda Vice-
191
polis recebeu, engalanada e feliz, o presente que Madame Josefina dera à coletividade: um pavilhão especialmente construído e equipado para atender e tratar tuberculosos, um dos males mais comuns e aflitivos daqueles tempos. O Almirante Henrique Boiteux, profundamente emocionado, acompanhou as Dignidades e demais autoridades na primeira visita ao estabelecimento, verificando o apuro e capricho com que tudo havia sido aprestado. A empresa contratada revelara-se tão eficiente e honesta que a Irmandade a contratara, pela quantia adicional de 21:500$000 réis, para obras de conslor total, 95:423$000 réis destinavam-se ao cum-
trução da nova torre e outras reformas na Igreja do
primento do contrato firmado com a construtora
Menino Deus. Discursos emocionados evocaram a
e o restante para a aquisição da rouparia do ca-
inesquecível lembrança de Josefina Boiteux e exal-
sarão. Os únicos e singelos pedidos do Almirante
taram a desprendida atitude do Almirante.
foram para que uma Imagem de Nossa Senhora da
Para servir no casarão, foram contratadas as en-
Conceição fosse entronizada no recinto, por ser a
fermeiras Maria Marthendal e Rosa Veiga, antigas
santa de especial devoção da sua amada e falecida
serviçais da casa, conhecidas das freiras e também
esposa, e que em nome dela fossem rezadas duas
uma engomadeira e uma lavadeira. Estas se faziam
missas. Os integrantes da Mesa Administrativa,
necessárias porque toda a rouparia do casarão de-
com os corações emocionados, não só se compro-
veria ser lavada à parte, uma exigência da saúde
meteram a atender pressurosamente aos desejos
pública motivada pelos altos índices de contágio
expressos pelo mesmo, como também solicitaram
daquela enfermidade.
que um busto de Madame Josefina fosse enviado
Pelo menos até a década de quarenta do Século XX,
àquela instituição, para que a mesma recebesse a
a tuberculose pulmonar foi a principal causa de mor-
merecida homenagem por parte da Irmandade, no
te, tanto nos hospitais como fora deles. Era doença
que o Almirante concordou imediatamente.
que aterrorizava jovens e idosos, pois até então suas
As obras de construção tiveram início imediato e
possibilidades de cura eram raras. A maior parte dos
ficaram concluídas em março do ano seguinte.
atingidos pelo temível mal faleciam no curso de um
No dia 15 de abril de 1928 a cidade de Florianó-
ano. Tanto que o Governo Getúlio Vargas criou o
192
Serviço Nacional de Tuberculose e, logo depois, foi
apenas em 1963 a Santa Casa de Porto Alegre pôde
deflagrada uma grande campanha de combate à do-
colocar em funcionamento um serviço semelhante,
ença, denominada Campanha Nacional Contra a Tu-
com espaço especialmente dedicado ao tratamento
berculose. Muitos hospitais e Santas Casas do Brasil
dos chamados “tísicos”.
intentaram construir pavilhões nos moldes do “Casa-
Mais uma vez a Irmandade do Senhor Jesus dos Pas-
rão Josefina Boiteux”, porém a escassez de recursos
sos e Hospital de Caridade faziam história e acres-
impediu a maior parte das iniciativas. Florianópolis,
centavam no seu iluminado firmamento mais uma
no entanto, graças à estrela da benfeitora, foi pre-
estrela a brilhar, zelando pela saúde e bem estar dos
cursora também neste aspecto. Só para exemplificar,
cidadãos da abençoada Ilha de Santa Catarina.
193
CapĂtulo XV
1955
Ainda e sempre o voluntariado
194
195
Completar 190 anos não foi realização de pequena
contraste de sentimentos em que se consubstancia
monta. Ainda mais quando a entidade em questão
o viver; é procurar nas gerações idas as lições dos
dedicara-se, ao longo de todo este tempo, ao bem
nossos maiorais como incentivo e poderoso im-
alheio, fazendo a caridade preconizada pelo Mestre
pulso de nossas ações; é buscar nas gerações que
Jesus sem medir esforços ou pesar os sacrifícios
passam o reconfortante estímulo do exemplo que
necessários à construção do bem comum. Esta tem
instrui e educa, da coragem que enobrece e exalta.
sido a história da Irmandade do Senhor Jesus dos
É rejubilarmo-nos com as glórias dos nossos ante-
Passos e Hospital de Caridade de Florianópolis. Ao
passados, que pairando hoje em regiões superio-
longo de quase dois séculos o sol insular iluminou
res, recebem como o suave cicio de uma prece a
incontáveis e valorosos homens e mulheres que
nossa recordação; é invocar os espíritos superiores
doaram esforços, sacrifícios, recursos, tempo e in-
em nosso auxílio, convictos de que “os vivos serão
teligência em prol do bem alheio sem estabelecer
sempre governados pelos mortos”, recordar é final-
diferenças preconceituosas, antes pelo contrário,
mente um incentivo constante e perene para os que
escolhendo para beneficiar aqueles mais humildes,
procuram pautar a sua vida pela regra do justo e
miseráveis, desprovidos de qualquer valia perante
honesto – “sublime virtude sem a qual a vida é len-
à sociedade voraz.
to suicídio, ao passo que enobrecida pelo cumpri-
O Desembargador Anthero Francisco de Assis, que
mento do dever, santificada pelo amor universal é
com tanta nobreza de caráter ocupara interinamen-
o instrumento mais precioso do espírito para o seu
te o cargo de provedor nos últimos anos da prove-
aperfeiçoamento indefinido”.
doria de Germano Wendhausen e, posteriormente, abraçara com desvelo incomparável a tarefa até a sua morte, em 1942, em ocasião festiva fizera uso emocionado da palavra, assim sintetizando a trajetória da lídima instituição:
“Senhores, em discurso pronunciado em outra ocasião tão solene como esta, disse o que agora, pela oportunidade, me ocorre repetir: - recordar é reviver o passado, é sentir novamente as doces e violetas emoções oriundas do prazer e da dor, eterno
196
Felizes aqueles pois, quer sejam indivíduos, quer sejam associações, que vendo na ampulheta do tempo escoar-se mais um ano de sua existência e lançando um olhar retrospectivo para os anos decorridos recordando as páginas já lidas do grande livro da vida, podem, de cabeça erguida, firme como os fortes, dizer: - há já decorridos tantos anos desta minha existência e durante esta longa trajetória, tendo por bússola o dever e por farol o direito, tenho seguido rumo seguro em demanda do meu destino. Felizes aqueles que apoiados em tão confortável convicção, encontram sanção poderosa
ta a esta bela cidade, lançando a vista para o seu
nas homenagens e nos aplausos dos que os cercam,
encantador panorama, descortina desde logo este
como evidenciamos no presente caso.
estabelecimento, que na magnitude de sua beleza,
Senhores, viver é lutar, e lutar assídua e constante-
impõe-se a contemplação, e assim, impulsionado
mente pelo bem estar moral e material. Só assim e
pelo desejo de conhecer a causa de sua impressão,
melhor tem vivido quem maior tempo tem lutado
procura desde logo visitá-lo. Galgando esta colina
na rota do dever, afrontando desassombradamente
em cujo cume ele se ostenta, sente-se desde logo
e repelindo com dignidade os tropeços de toda or-
dominado pelo respeito e veneração devidos a tudo
dem que surgem para embaraçar a sua ação. Neste
quanto é grande, nobre e santo nos seus intuitos.
caso acha-se a Irmandade do Senhor Jesus dos Pas-
Penetrando nesta casa, é o seu espírito penetrado
sos fundada há bem mais de um século, que hoje
pela doce e suave impressão de que está em um
em amplexo fraternal, festejamos.
estabelecimento que é santo, porque aqui a dor –
Já disse alguém com muita propriedade e eloquên-
esta irmã predileta da humanidade, este sentimen-
cia: ascender a encosta do Menino Deus é penetrar
to pelo qual, na frase de Max Jordan, o homem ad-
no vasto edifício que a culmina – esta tradicional
quire a consciência de si mesmo – encontra abrigo
Santa Casa – aberta à cura de todos os sofrimen-
seguro, proteção infalível, consolação eficaz; que é
tos, ao tratamento de todos os enfermos, é prepa-
santo pela prática constante da caridade – a mais
rar o espírito sob as sensações mais várias, sob o
bela virtude em que se resume todas as outras, por-
recolhimento e a admiração que as grandes obras
que todas dimanam dela como no nosso sistema
inspiram. Sim, meus senhores, o viajante que apor-
solar toda luz irradia do sol – que é santo porque
197
seu objetivo é a caridade, a suprema emanação do
na, afrontando as maiores dificuldades, tem ela, de-
Criador, a sua própria virtude, que ele confere à
sassombradamente, prosseguido na meritória obra
criatura. E assim, dominado por tal sentimento, é
daquele que, como já disse alguém, foi a caridade
induzido a indagar a história desta instituição que
revestida no invólucro humano, protótipo da abne-
tem a seu cargo a mais santa das missões sociais.
gação das comodidades terrenas, o filho espiritual
Simples e encantadora na sua simplicidade, como
de São Francisco de Assis, o sucessor e continuador
tudo o que emana de Deus é a história desta casa.
da sublime obra de São Vicente de Paula, o predes-
Foi em 1764 que esta veneranda imagem, destina-
tinado “Irmão Joaquim”.
da aos nossos vizinhos do sul aportou a esta cidade
Não é o momento oportuno, meus senhores, para
com o firme propósito de aqui permanecer, e desde
fazer a apologia deste santo varão, que tem no co-
então, indescritível é o culto que se lhe consagra.
ração de cada catarinense um altar, onde com a
Em 1765 fundada foi, definitivamente, esta irman-
máxima devoção é cultuada a sua memória. O seu
dade e desde então até hoje, com verdadeiro fervor
grande feito constituiu um verdadeiro apostolado,
evangélico, com a diciplina admirável que aqui rei-
abraçado por muitos outros, cujos nomes longo se-
198
ria mencionar, e assim a sua grande obra ostenta-se
último mandato para o qual fora eleito pelos interi-
hoje, pujante e forte como poderoso incentivo aos
nos Cantídio Alves de Sousa e Julio Pereira Vieira,
vindouros, que jamais poderão olvidar o seu edifi-
assumiu a provedoria outro grande realizador, que
cante exemplo e jamais esquecerão a sua brilhante
deixaria marca indelével na instituição: o Desem-
norma de conduta. Li algures, senhores:
bargador João da Silva Medeiros filho, cujo longo
- “Os homens que através do tempo, em sua marcha
período de provedoria abarcaria mais de três dé-
ascencional de progresso, destacam-se à rotina por
cadas, encerrando-se apenas em 1975. Filho de
feitos de valor, têm tido e terão sempre, nos faustos
Laguna, o brilhante jovem formara-se Bacharel
da humanidade um lugar e data consagrados, quais
em Direito pela Faculdade Nacional de Direito do
marcos milenários assinalando-lhes as glórias e re-
Rio de Janeiro e fazia brilhante carreira na capital,
nome à gratidão dos pósteros.”
tendo se tornado, inclusive, por casamento, genro
Desta espécie foi o benemérito Irmão Joaquim e os
do inesquecível Governador Hecílio Luz. No auge
não menos beneméritos continuadores desta cruza-
da carreira, aos 63 anos, tornou-se Provedor da Ir-
da do bem, dentre os quais permitam-me destacar o
mandade. Também ocupava, desde o ano anterior
nome do Provedor Coronel Germano Wendhausen,
(1942) o cargo de Presidente do Tribunal de Justi-
que por muitos anos administrou este estabeleci-
ça de Santa Catarina, sendo portanto membro des-
mento com verdadeira dedicação, abnegação incon-
tacado da sociedade florianoplitana.
testável e alto critério digno dos mais alevantados
Com ele, iniciou-se uma nova era no Hospital de Ca-
encômios. Os seus antecessores também fizeram
ridade, guindada tanto pelas descobertas científicas
juz aos nossos aplausos e bênçãos, por terem insti-
que se avolumavam, modernas gerações de medica-
tuído e mantido esta casa com admirável dedicação
mentos que revolucionavam a cura e equipamentos
em tempos outros, nos quais o princípio da solida-
avançados que agilizavam o diagnóstico e traziam
riedade humana foi violentamente substituído pelo
esperanças de cura baseadas na inovação, quanto
mais depravado egoísmo.”
pelo empreendedorismo e espírito realizador do seu novo provedor. Homem extremamente bem relacionado, tinha gê-
Sintetizava assim o nobre provedor, nesta emocio-
nio forte e não suportava nenhum tipo de afronta
nada peroração, o espírito reinante na casa e nos
à sua impoluta personalidade, o que o levou a pro-
corações de todos aqueles que até então tinham
tagonizar diversos debates filosóficos quando no
deixado a sua marca na sublime trajetória.
exercício do cargo.
Em 1943, após a sua morte e o cumprimento do
Assim que iniciou seu período de provedoria, usou
199
enfermarias gerais para adultos, um refeitório, uma sala de curativos, varanda, instalações sanitárias, cinco enfermarias dotadas de sanitários e sala de curativos específicas para crianças e uma cozinha auxiliar. No andar superior ficavam uma sala de espera, duas salas de curativos, um laboratório, quinze apartamentos particulares com banheiro, quatro quartos simples, três salas reservadas, dois refeitórios, duas enfermarias gerais, um centro cirúrgico e um novo dormitório para as Irmãs de Caridade.
de toda a sua reputação e prestígio, conseguindo atrair a atenção do Vice-presidente da República, o
No ano de 1950 o Hospital de Caridade contava
catarinense Nereu Ramos, para as ingentes neces-
com uma equipe de 26 freiras da Ordem da Divina
sidades do Hospital. Logo suas iniciativas diplomá-
Providência prestando serviços, o que fazia avultar
ticas deram bom resultado e o Governo destinou
significativamente os gastos do estabelecimento.
vultosa verba para a realização de uma grande am-
Somente com os salários mensais pagos a elas a Ir-
pliação necessária às novas demandas da comuni-
mandade dispendia Cr$ 3.870,00, além da remune-
dade de todo o estado, que acorria ao Hospital de
ração devida aos outros 45 funcionários fixos que o
Caridade, tido como referência em qualidade, exce-
Hospital possuía então.
lência e benemerência. As obras iniciaram-se ainda em 1943 e foram concluídas três anos depois. Uma grande cerimônia que reuniu, no alto do Morro da Bela Vista, as maiores autoridades estaduais e municipais, foi a solenidade de entrega da obra finalizada, presidida pelo próprio Nereu Ramos. Com um custo total de Cr$ 1.789.630,00, compreendia uma área construída de 1.139 metros quadrados, com dois pavimentos. No térreo fora construído um consultório, três
200
Na reunião da Mesa Administrativa de setembro de
çada em Cr$ 680.000,00 (seiscentos e oitenta mil
1950 José Elias, então Presidente do Clube 12 de
cruzeiros) e obrigava a Irmandade a fazer grandes
Agosto, compareceu perante à entidade para solici-
sacrifícios.
tar permissão a fim de realizar profundas reformas
No plano de contrução, estavam especificados to-
na sede, cujo imóvel era de propriedade da Irman-
dos os detalhes, que mostram o estilo construtivo
dade do Senhor Jesus dos Passos.
adotado na época:
(Esta parceria iniciara-se em 1872, quando o clube
•
paredes de alvenaria de tijolos com 0,30m. de
foi fundado por um grupo de jovens desterrenses,
espessura, recobertos com argamassa de cal de
sob a presidência de Estevão Pinto da Luz, ocupan-
pedra e areia na proporção 1 x 3;
do um velho sobradinho na Rua Augusta, atual João
•
Pinto)
Vergas dos vãos de portas e janelas de concreto armado;
Acompanhado do Engenheiro Dr. Ruy Soares, o
•
Pé direito de 3,50m.
Presidente levou um plano completo das obras
•
Telhado com armação em madeira de lei e co-
pretendidas, as quais foram aprovadas pela Mesa
bertura de telhas planas estilo francesa;
Administrativa, uma vez que faria valorizar o imó-
•
vel pertencente a mesma. Na mesma reunião o
Revestimento externo com reboco de argamassa;
provedor aproveitou para consignar um pedido
•
Instalações sanitárias, copa, depósito, sala para
de aumento do aluguel pago pelo clube, uma vez
curativos e dois laboratórios revestidos com
que o Hospital passava por uma aflitiva situação
azulejos brancos medicinais, rodapé e acaba-
financeira e também, mais uma vez, se encontrava
mento de 1,50m. de altura;
em obras. Naquele ano a Mesa Administrativa da Ir-
•
mandade dera início a uma nova obra de reforma e
Assoalhos de tábuas em madeira de lei e ladrilhos de cerâmica;
ampliação do complexo hospitalar, executada pelo
•
construtor João Batista Berreta. Da obra fez parte
Todas as peças com forro de madeira tipo Paulista;
a construção do terceiro pavimento da ala direita
•
As esquadrias e aberturas de madeira de lei;
do hospital, edificado sobre a enfermaria e demais
•
O acesso do segundo para o terceiro piso com
dependências do segundo pavimento, fruto da obra
uma escada em madeira de lei;
patrocinada sob os auspícios de Nereu Ramos.
•
As paredes internas e externas com três de-
A nova construção, que previa uma área total cons-
mãos de caiação com cal de pedra, cola e cor.
truída de 176 metros quadrados e que viria com-
(As obras foram inauguradas em março de 1952)
pletar a construção finalizada em 1946, fora or-
201
A decoração natalina do IHC é sempre executada pelos integrantes do voluntariado. Muitas outras obras, aquisições e realizações pon-
piritual e emocional prestado aos pacientes. O ca-
tuaram a Provedoria do Desembargador João da
rinho suave que a alma feminina sabe emprestar
Silva Medeiros Filho, alinhando o Hospital de Cari-
àquele que sofre criava funda lacuna no Hospital,
dade de Florianópolis aos maiores centros médicos
motivando algumas senhoras da sociedade a preen-
do país.
cherem esta lacuna com a criação do voluntariado.
A Galeria de Benfeitores da Irmandade localizada
Com este intuito foi criado, no ano de 1955, o “Vo-
no Consistório, prática iniciada no final do Sécu-
luntariado da Esperança”, uma iniciativa nobilitan-
lo XVIII, já estava grandemente enriquecida pelos
te que teve a liderança das senhoras Ketty Merlin e
retratos de inúmeros nomes da cidade e do país,
Lilian Muller.
benfeitores inesquecíveis que se perfilavam lado
Também vale registro a atuação incansável dos mé-
a lado, enfrentando dificuldades e protagonizando
dicos do corpo clínico do Hospital de Caridade, com
atos heroicos em prol da entidade.
destaque nesta época para os Drs. Arthur Pereira
Totalmente dedicados à complexa administração
Oliveira, Polydoro Ernani de São Thiago, Danilo
da casa, tarefa que mostrava-se cada vez mais de-
Freire Duarte, Vidal Dutra Filho, Wilson Mendonça,
safiadora, os integrantes da Irmandade pouco po-
Godofredo Bastos, Paulo de Tarso Fontes, Renato
diam fazer em prol do alívio espiritual cotidiano
Costa, Dib Mussi, Mario Wendhausen, Walmor Zo-
dos enfermos que acorriam, em números cada vez
mer Garcia, Julio D. Vieira, Gilberto Guerreiro da
mais avantajados, àquela digna instituição. Assim,
Fonseca, Henrique Prisco Paraiso, Oswaldo Luiz
formara-se uma lacuna na questão deste apoio es-
Rosário e Ayrton Ávila da Luz.
202
Nesta época os médicos prestavam seus serviços
Atualmente, o Grupo de Voluntárias da Esperança
nos hospitais – e no Caridade não era diferente – de
é uma sociedade civil beneficente, sem fins lucrati-
forma gratuita e humanitária, percebendo apenas
vos e devidamente registrada em cartório. Realiza
uma pequena ajuda de custo.O sustento da casa e
trabalhos diversos com os pacientes e funcionários
da família tinham que obtê-lo atuando em consultó-
do hospital, incluindo terapias ocupacionais como
rios clínicos que, gradativamente, haviam surgido
pintura, passeios, palestras, bingos e atividades de
em substituição às “salas de banco”. Assim sendo,
dança, além de lazer e recreação aos mesmos pa-
os profissionais que lá atuaram nesta época deixa-
cientes.
ram o seu preito de dedicação e doação em prol
O grupo já conseguiu, com a sua mobilização, a
desta grande obra que, a passo e passo, entrava na
instalação de um elevador, a construção do Ane-
era da modernidade.
xo Joana de Gusmão, com 44 leitos masculinos e femininos voltados ao atendimento de pacientes portadores de câncer e a distribuição sistemática
(Quanto ao voluntariado, com o passar dos anos o
de kits de higiene pessoal conseguidos através de
trabalho cresceu e passou a requerer maior aten-
doações.
ção e organização. Uma Assembleia Geral realizada
As voluntárias da esperança estão sempre de bra-
em 26 de maio de 1988 criou uma estrutura admi-
ços abertos para atender aos que delas necessitam,
nistrativa para o serviço, incluindo uma diretoria
proporcionando momentos de alegria e consolo aos
composta de Coordenação, Conselho Deliberativo
que passam pelo Hospital de Caridade!)
e Conselho Fiscal.
203
CapĂtulo XVI
1963
O Hospital abre espaço para a escola
204
205
Florianópolis, 18 de maio de 1953. Excelentíssimo Senhor Comendador Desembargador Medeiros Filho D.D. Provedor da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital de Caridade Nesta Capital Senhor Provedor, De acordo com o entendimento verbal havido entre Vossa Excelência e uma comissão de professores desta faculdade, solicito, pelo presente ofício, que por parte do Hospital de Caridade sejam entregues a este estabelecimento de ensino superior, para fins de aulas práticas da cadeira de anatomia a serem lecionadas pelo respectivo professor Dr. Roldão Consoni, os cadáveres de indigentes não reclamados pelas respectivas famílias. Este pedido tem por fundamento a necessidade de aperfeiçoar-se o ensino prático nesta escola, como ocorre em outros centros culturais do país, entre os quais a cidade de Porto Alegre para exemplificar, cujas Faculdades de Medicina e Odontologia, são supridas com cadáveres fornecidos para este fim pela Santa Casa de Misericórdia, instituição análoga ao Hospital de Caridade dessa capital. Agradecendo antecipadamente a Vossa Senhoria as providências que forem tomadas relativas ao pedido supra, valho-me da oportunidade para reiterar-lhe do meu alto apreço e distinta consideração. Dr. Polydoro Ernani de São Thiago Diretor da Faculdade de Farmácia e Odontologia
206
Esta correspondência, lida na reunião da Mesa Administrativa da Irmandade de 21 de maio do ano em curso foi a primeira sinalização da longa e produtiva parceria que se estabeleceria, em breve, entre o Hospital de Caridade e o ensino médico na Capital. A Faculdade de Medicina ainda não havia sido fundada, e Farmácia e Odontologia foram os estudos que antecederam, na área da saúde, o seu surgimento. Esta Faculdade voltada para as áreas de Odontologia e Farmácia funcionou, no início de suas atividades, no correr da década de 1950, num prédio situado à Rua Esteves Junior, n. 01, de pro-
Provedor Dr. João da Silva Medeiros Filho
priedade do Hospital de Caridade. A Mesa Administrativa da Irmandade, ciente da delicadeza do caso a ser tratado, demorou bastante a
que acabou não sendo efetivado, ficando esta sede
responder ao ofício do diligente médico, consultan-
então à disposição desta novel universidade.
do antes as Universidades e Hospitais das cidades
Neste mesmo ano, os primeiros 27 alunos pres-
de Curitiba e Porto Alegre. Somente depois de cien-
taram o vestibular e iniciaram os estudos sob a
tificados de que o procedimento existente era legal
supervisão do mesmo Dr. Polydoro Ernani de São
e seguro, regido por contrato entre as partes, foi
Thiago. É dele a narrativa que segue, descrevendo
que deu prosseguimento à parceria que redunda-
o início das atividades da escola junto ao Hospital
ria, alguns anos depois, na transferência da Escola
de Caridade:
de Medicina para o Hospital.
“Quando a primeira turma de alunos estava promo-
A Faculdade de Medicina de Florianópolis nasceu
vida ao terceiro ano, cumpria iniciar-se o ciclo do
sem sede no ano de 1960. Assim que foi fundada,
ensino profissionalizante, programado pela Cadei-
e eleita a sua primeira diretoria, começou a busca
ra de Clínica Médica, com a disciplina de Semiolo-
por uma sede própria. O primeiro e tímido endere-
gia – Iniciação ao Exame Clínico. O ensino prático
ço, localizado à Rua Dr. Ferreira Lima, fora obtido
desta matéria exigia a presença física de doentes
através da doação de cotas de um futuro colégio
em meio hospitalar. Com o passar do tempo, a po-
207
pulação de Florianópolis e arredores, bem como
tes, que permaneciam internados em tratamento.
de todo o estado vinha tomando conhecimento da
Estava assim, formado o quadro ideal para estabe-
quase lendária fama do Hospital de Caridade, como
lecer-se uma parceria com a Faculdade, a fim de
instituição de saúde voltada para a caridade irres-
oferecer aos alunos possibilidade da vivência no
trita e indiscriminada. Os doentes de todo o tipo e
cotidiano médico profissional.”
de todas as idades, sobretudo os pobres e desvalidos só dependiam dele – o hospital lá do outeiro do Senhor dos Passos. Eram comuns os comentá-
O Hospital de Caridade cedeu à Faculdade de Me-
rios de cura, tratamentos de urgência eficazes e
dicina todas as suas unidades destinadas aos aten-
salvadores, de socorros a qualquer hora do dia e
dimentos médico-hospitalares, com exceção do
da noite numa cidade que não contava com servi-
Centro Cirúrgico.
ço de Pronto Socorro. As Irmãs de Caridade eram
Assinado um convênio, o ensino das clínicas ini-
extremamente dedicadas e as únicas enfermeiras,
ciou com o ano letivo de 1963, num anfiteatro
auxiliadas por jovens aprendizes treinadas por elas
e nas enfermarias gerais para tratamento de in-
mesmas. Dispunham destas atendentes subalternas
digentes.
e de alguns ex-doentes, os quais, quando egressos
Naquela época ainda era precária a estrutura para
com alta hospitalar, ficavam desamparados na co-
socorro aos enfermos que acorriam todos ao Hos-
munidade, sem apoio familiar, não tendo para onde
pital de Caridade, em busca de atendimento. As
ir ou morar. Treinados pelas irmãs, precária mas
enfermarias eram do tipo generalista, com leitos
suficientemente remunerados para atenderem às
paralelos e pacientes reunidos face a face. Não ha-
necessidades pessoais, dispondo de casa e alimen-
via unidade ambulatorial e os pacientes externos,
to, auxiliavam no trato geral dos também indigen-
quando não internados e atendidos diretamente
208
nas enfermarias, recebiam socorro nas pequenas
ra, Ernesto Francisco Damerau, Antônio Moniz de
salas de curativo existentes, sobretudo à noite.
Aragão, Roldão Consoni, Joaquim Madeira Neves
Os estudantes encontraram nessa estrutura a situ-
e Polydoro Ernani de São Thiago.
ação perfeita para o aprendizado e convívio com
A partir do segundo semestre letivo, a Universida-
a miséria humana, com as dificuldades e a fragili-
de iniciou uma ampla reforma no antigo casarão
dade de quem se encontra doente, principalmente
Josefina Boiteux, instalando neste, um anfiteatro
os desprovidos de posição social. Embora as ins-
para aulas teóricas e uma unidade ambulatorial
talações do Hospital de Caridade não oferecessem
incluindo consultórios médicos, postos de enfer-
toda a estrutura ideal para o aprendizado da ciên-
magem e salas de curativo.
cia médica, eram muito úteis o seu laboratório de
(Estas reformas tornaram-se mais profundas e ex-
análises, a farmácia de dispensação com setor de
tinguiram definitivamente o velho casarão no ano
manipulação, e os setores de radiodiagnóstico, ra-
de 1975, quando as exigências da faculdade leva-
dioterapia, eletrocardiografia. A equipe de enfer-
ram à sua demolição)
magem composta pelas Irmãs de Caridade e seus auxiliares também teve grande colaboração na formação acadêmica dos futuros médicos, doando atenção, tempo e conhecimentos aos alunos. A Faculdade iniciou com um único funcionário administrativo, que atendia tanto as funções burocráticas quanto servia de bedel junto ao corpo docente que, por sua vez, era composto dos seguintes professores: Doutores Samuel B. Pessoa, Arthur Pereira Olivei-
209
Em 1965 aqueles mesmos 27 alunos que, durante
Roberto Vieira Sampaio
três anos haviam trilhado os corredores do Hospi-
Alberto Eduardo Martins
tal de Caridade, aprendendo no árduo cotidiano a
Décio Andrade Pacheco
prática médica, colaram grau numa cerimônia emo-
Maurilio Lopes Silva
cionante.
Saulo Fernandes Linhares
Eram eles:
Anete Hoffmann
Abelardo Viana Filho
Décio Ritzmann Madeira Neves
Artur Melo Fernandes
Odilon Borini
Léa Schmidt
Savas Apóstolo Pitsica
Peter Goldenbeg
Delmar Cervieri
Carlos Alberto B. Pinto
Ossamu Sawada
Léo Mayer Coutinho
Seiya Pedro Kamimura
Roberto Moreira Amorim
Evandro Ferreira Hostalácio
Cid Santaella Redorat
Osvaldo Vieira
Milton Wayhs
Solon Back
210
Humberto Polesso Paulo Roberto Gouveia da Motta Waldemar Barbosa
O Reitor da Universidade, nesta casião, era o também médico Professor João Davi Ferreira Lima e o Diretor do Curso de Medicina, Emil Flygare. Como Patrono da turma foi escolhido o Professor Polydoro Ernani da São Thiago e o Paraninfo foi o Professor Roldão Consoni, que tantas aulas haviam ministrado à frente dos pacientes e aparelhos do Hospital de Caridade. Os outros professores foram também homenageados e a emoção tomou conta Doutor Antônio Moniz de Aragão
de todos quando foi proferido o Juramento de Hi-
pócrates que, desde 640 A.C. representa o substrato maior do mandato da medicina. Os professores do curso também foram todos homenageados e um deles, em especial, sentia-se emocionado naquele momento: era o Professor Doutor Antônio Moniz de Aragão que era irmão atuante na Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e assumiria, em 1976, a Provedoria, permanecendo no cargo por seis anos, até 1982. As especialidades médicas, procedimentos, exames e terapias foram sendo dinamizados e altamente qualificados a partir desta década, não só num reflexo dos avanços que ocorriam em todo o país e no mundo, mas também como prova da excelência do obras de adaptação do edifício para acomodar
Hospital de Caridade, ainda e sempre um local vol-
a Faculdade de Medicina.
tado para a cura nos seus mais evoluídos moldes.
211
Cap铆tulo XVII
1987
O Tombamento do Conjunto Arquitet么nico do Imperial Hospital de Caridade
212
213
duzentos anos de existência, e seu hospital estava prestes a completar este período também. Uma história poderosa, importante, abrangente e que começava a se perder no roldão da vida moderna. Preciosos e antigos documentos se encontravam encaixotados de maneira inadequada, em local úmido e sujeito à ação destrutiva de ratos e insetos por falta do conhecimento específico no armazenamento dos mesmos. Como se sabe, durante muito tempo a sociedade A década de oitenta entrou acelerada e repleta de
brasileira não valorizou o hábito de se voltar so-
novidades. Desde 1972 o Hospital de Caridade já
bre seus próprios passos, analisando e estudando o
possuía a sua Unidade de Tratamento Intensivo
passado para entender o presente e traçar o futuro.
e era cada vez mais qualificado, não só o corpo
Vagarosamente, este conceito foi se instalando, e o
médico da entidade, bem como os equipamentos,
poder público foi criando mecanismos que pudes-
instalações, diagnósticos, exames e tratamentos
sem abarcar esta nobilitante e árdua tarefa, a de
realizados. Médicos de todo o Brasil eram atraídos
resgatar da poeira do tempo o nó da história. Gra-
pela fama de centro de excelência do Hospital, bem
dativamente, as autoridades constituídas da Capital
como a oportunidade de qualificar seu trabalho
do Estado de Santa Catarina voltaram o seu olhar
atendendo aos mais desvalidos que, ainda e sem-
para a bicentenária instituição.
pre, continuaram a ser um dos focos mais importantes do estabelecimento. Em 1982 assumiu a provedoria Charles Edgar Moritz, membro destacado e líder da comunidade florianopolitana que já ocupara, entre outras cadeiras, a de Presidente da Associação Comercial e Industrial de Florianópolis durante 12 anos anos, de 1947 a 1959. O experiente administrador já contava na época 70 anos. A Irmandade contabilizava, nesta época, mais de
214
Pontificando no alto do Morro, sempre firme a ze-
vezes cansados ombros a severa responsabilidade
lar pela saúde de toda uma comunidade, o Hospi-
pela existência, manutenção e equilíbrio do Hospi-
tal tivera, durante um longo período, que contar
tal de Caridade.
apenas com a abnegação inquestionável dos inte-
Tarefa sem dúvida das mais nobres, merecedora
grantes da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos.
dos mais honrosos louros, porém de alta complexi-
Voluntariamente abrindo mão de suas obrigações
dade e difícil consecução. Assim como os médicos
diuturnas, estes nobres membros da comunidade
do qualificado corpo clínico do Hospital de Carida-
vinham sendo o sustentáculo de tão valiosa institui-
de vinham lutando diuturnamente pela vida, numa
ção. Assim como, anualmente, há mais de 200 anos,
batalha sem quartel travada contra todos os tipos
vinham carregando nos ombros o andor que con-
de males que acometem a saúde humana, os dignís-
duzia o adorado Senhor Jesus dos Passos, naquela
simos irmãos que compuseram as incontáveis Me-
que se tornou a maior cerimônia religiosa popular
sas Administrativas da Irmandade lutaram a bra-
do sul do país, a Procissão do Senhor dos Passos,
ços com dificuldades tão complexas quanto, para
carregavam também nos sempre calejados e muitas
manter vivo aquele verdadeiro coração da saúde
215
to, catalogação e recuperação do acervo histórico da instituição. Nessa ocasião foi dado início a todo um processo de valorização e recuperação do patrimônio material e imaterial da entidade. Todas estas ações levaram a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital de Caridade a comemorarem, em 1989, o segundo século do Hospital com a publicação de um folder que resgatava a importância da instituição como forte referencial humano, paisagístico e cultural da nossa capital.
A provedoria de Charles Edgar Moritz prolongouse até 1995 e foi um dos períodos mais difíceis da vida do Hospital de Caridade. Como realização importante desta época ficou marcada a criação do primeiro centro de imagens, equipado com tomógrafo e ressonância magnética. Também foram montadas clínicas com aparelhos complexos tais catarinense. Os governos das esferas estadual e municipal voltaram finalmente as suas atenções para o Hospital de Caridade, buscando entender e suprir suas necessidades mais prementes. A década de oitenta marca um período de maior participação entre as esferas pública e particular pela busca de soluções para os problemas do Hospital. Desta conscientização foi que decorreu, em 1987, a assinatura de um convênio entre a Irmandade, o Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis e o Arquivo Histórico da cidade para o levantamen-
216
como os de Litotripsia extracorpórea, angiografia digital periférica, medicina nuclear, endoscopia digestiva e videolaparoscopia através de um processo de terceirização, que acabou por causar grandes problemas ao Hospital, hoje solucionados através da ação firme e competente da atual Mesa Administrativa. Apesar das imensas dificuldades desta época, a instituição seguia célere no rumo da consagração quando ocorreu uma catástrofe que ficará, para sempre, marcada a ferro e fogo na alma do povo florianopolitano: um incêndio de proporções devastadoras consumiu, com voracidade inenarrável, uma boa parte de seu patrimônio físico.
217
Capítulo XVIII
1994
Uma perda inenarrável: o Grande Incêndio
218
219
O dia 05 de abril de 1994 não será facilmente apagado da memória do florianopolitano. Foi nesta noite, por volta das 23h00 que o Hospital de Caridade começou a arder numa grande fogueira que, sem dó nem piedade, consumiu quase 80% do seu patrimônio físico. Os primeiros gritos de socorro ressoaram na calma noite insular quase como uma inacreditável quimera de horror. O incêndio teve início no lado direito da capela, no conjunto construtivo composto de três andares. Esta parte da construção abrigava, no andar térreo, o setor de fisioterapia; no 2º. andar ficava a Ala São Camilo, onde já não se internavam mais pacientes; as sete salas que compunham esta área do 2º. andar estavam destinadas a armazenamento de materiais diversos, estar e jogos para funcionários do Hospital e uma sala de costura com máquinas, armários, roupas e materiais diversos destinados à confecção. Lá trabalhavam quatro costureiras e o laudo pericial deduziu que foi ali o foco inicial do incêndio. No 3º. Andar ficava a Ala do Senhor Jesus dos Passos, destinada a pacientes portadores de moléstias cancerígenas e recebendo tratamento de radioterapia, alguns em estado terminal. Ao todo estavam internados no Hospital de Caridade naquela noite 184 pacientes, o que ocasionou uma luta ingente contra as chamas para salvar os enfermos. Os que podiam, sacaram sozinhos os equipos que traziam instalados junto ao corpo e saíram correndo para fugir das chamas. Os mais incapacitados contaram As obras de recuperação...
220
com a boa vontade de vizinhos que acorreram para
populares, na mais lúgubre procissão jamais pro-
salvá-los, removendo-os pelas janelas de forma a
tagonizada naquele local, quem jazia de joelhos era
colocá-los a salvo das chamas que aumentavam fe-
o Hospital de Caridade, enquanto as chamas con-
rozmente.
sumiam mais de 200 anos de história, heroísmo e
Começaram a chegar Irmãos, integrantes da ir-
dedicação. A dor estampada nos rostos atônitos dos
mandade e da mesa administrativa, logo seguidos
transeuntes, funcionários e colaboradores traduzia
de autoridades civis e militares, médicos do corpo
a angústia íntima que ia na alma coletiva da cidade
clínico e funcionários. Todos ajudavam, procuran-
de Florianópolis, com a perda de um dos seus maio-
do salvar equipamentos, móveis, documentos, tudo
res referenciais.
aquilo que pudesse representar a sobrevivência do
Num cenário dantesco, pacientes em macas jaziam
grande hospital vitimado pela catástrofe.
nos gramados em volta da construção, iluminados
Enquanto a Imagem do Senhor Jesus dos Passos
pelo claror das chamas e rodeados de objetos os
descia a ladeira do Menino Deus nos ombros dos
mais diversos, que iam sendo salvos à medida que
221
se estabelecia uma corrente de solidariedade. Humildes moradores da Favela do Morro do Mocotó neste momento mostraram que os mais de dois séculos de dedicação aos desvalidos tinha a sua justa recompensa: vieram em massa de suas casinholas penduradas nas encostas e trabalharam arduamente na recuperação, primeiramente de pessoas, seguidos de todos os objetos possíveis. A crônica falta de equipamentos que acomete até hoje as nossas corporações cobrou o seu preço. Os bombeiros levaram quase duas horas para conseguir acionar as mangueiras e iniciar o aplacamento
das chamas que, a esta altura, já lambiam todo o edifício, com exceção da Capela que, milagrosamente, salvou-se quase intacta da grande catástrofe. Bombeiros de outras cidades acorreram ao chamado de socorro do majestoso hospital e, nas primeiras horas da manhã o sol iluminou um cenário de guerra: escombros enegrecidos pelas chamas, paredes desabando, objetos atirados em volta numa confusão indescritível e o ar atônito e desconsolado de quem ali vivera tantos anos sem jamais imaginar ou esperar que algo assim pudesse ocorrer. Ao todo atuaram na tentativa de salvamento do Hospital 90 bombeiros, 14 viaturas especiais, inclusive oito caminhões tanques provenientes das cidades de Blumenau, Itajaí, Brusque, Balneário Camboriú e Tubarão. Foram consumidos 330 mil litros de água na tentativa de aplacar as chamas. O desânimo dos membros da Mesa Administrativa da Irmandade só não foi maior porque o Governador do Estado, Antônio Carlos Konder Reis e o Se-
222
cretário de Saúde, João Ghizzo Filho, prometeram
de rescaldo do incêndio e o levantamento do mon-
ajuda imediata, garantia de salário aos servidores
tante da perda. Os pacientes internados já estavam
do hospital e pronta recuperação!
acomodados nos Hospitais Celso Ramos, Universi-
- Vamos restaurar o Hospital de Caridade e deixá-lo
tário, de Apoio, Regional, Militar do Exército e da
ainda mais belo e melhor! – foi a promessa do Go-
Polícia Militar. O SESC ofereceu suas dependências
vernador e comitiva, clamor que se repetiu e ouviu
para o staf do Hospital. O auditório foi designado
na multidão que cercava o outeiro incandescente.
para reuniões da irmandade e atividades adminis-
Ao amanhecer do dia 06 de abril foi possível avaliar
trativas e a quadra de esportes para a colocação e
toda a extensão da tragédia: o incêndio, que inicia-
guarda de todos os objetos salvos. O mais triste e
ra na Ala São Camilo, logo se alastrara por todo o
irreparável saldo foi o de vítimas fatais: sete pesso-
corpo arquitetônico do hospital. A cobertura, cuja
as perderam a vida por entre as chamas que consu-
sustentação era de madeira, queimou rapidamente,
miram o estabelecimento.
provocando desabamento. A estrutura antiga, toda a base de madeira, facilitou a progressão do fogo; as paredes, por sua vez, não suportaram o calor e desabaram; os consultórios foram destruídos; nem mesmo as estruturas mais recentes haviam resistido, tudo foi brutalmente atingido e, no dia seguinte, os corredores mostravam toda a dimensão da tragédia: o fogo destruíra a Emergência, os laboratórios, a UTI, a Unidade Coronariana, o Centro Cirúrgico, as alas de cardiologia, Centro Pós-Operatório e Hemodinâmica. Haviam sido irremediavelmente perdidos todos os equipamentos de Raio X, os aparelhos de radiologia e hemodinâmica, além de mobiliário, documentos e equipamentos administrativos em geral. Logo iniciaram-se as árduas providências a serem tomadas: o doloroso levantamento do número de vítimas fatais do incêndio, identificação de local para acomodar os pertences do hospital, trabalhos
223
No dia 8 de abril o Governo do Estado fez publicar Nota Oficial na imprensa, relatando as primeiras providências tomadas, com o seguinte teor:
“O Governo do Estado, diante da ocorrência que destruiu 70% das instalações do Hospital de Caridade em Florianópolis, lamentavelmente ceifando vidas humanas, na noite do último dia 05 e estendendo-se pela madrugada do dia seguinte, está acompanhando atentamente a evolução dos acontecimentos e prestando toda a assistência necessária para atenuar o sofrimento por que passa a comunidade catarinense. Logo que informado do incêndo, o Governador Antônio Carlos Konder Reis deslocou-se para o local do sinistro, acompanhado dos Secretários de Segurança Pública, Vilmar Loef, e da Saúde, João Ghizzo Filho, do Comandante da Policia Militar, Coronel Jurandir Henrique Hostins e do Diretor Presidente da CASAN, Antônio Henrique Bulcão Vianna, permanecendo no local até as 4h30min, orientando pessoalmente os trabalhos de combate ao fogo, de resgate às vítimas e de transferência dos atingidos para outras instituições hospitalares da capital. Cabe ressaltar a solidariedade da população florianopolitana, particularmente os moradores das imediações do Hospital de Caridade, que durante toda a noite, juntamente com o Corpo de Bombeiros, Polícias Militar e Civil, demais órgãos da administração pública, bem como os próprios servidores da instituição, que participaram dos trabalhos de salvamento. Estiveram envolvidos nesta operação 90 bombeiros, além de 14 viaturas especiais para combate a incêndios, sendo 8 caminhões tanques que utilizaram 330 mil litros de água para debelar as chamas. O pronto atendimento do Corpo de Bombeirs evitou que fossem atingidas outras áreas, incluindo a Ala Radiológica. Durante reunião realizada ontem no Palácio Santa Catarina, e presidida pelo Governador, com representantes da comunidade, da Prefeitura Municipal de Florianópolis e da Mesa Administrativa do Hospital de Caridade, liderada pelo Provedor Charles Edgar Moritz, foi aprovada a execução de um convênio com recursos do Governo do Estado, no valor de Cr$ 162.000.000,00 (cento e sessenta e dois milhões de cruzeiros reais) para o pagamento dos funcionários e do custeio do hospital. Através da Fundação Vida estão sendo recolhidos donativos, principalmnente cobertores, lençóis e roupas. O governo estadual adotará todas as providências que se fizerem necessárias não só para a reconstrução do que foi destruído, como também para o reaparelhamento desta tradicional instituição, que embora não pertencendo à rede hospitalar do Estado, vinha prestando inestimáveis seviços, ao longo do tempo, à população catarinense.
Goveno do Estado”
224
Neste mesmo dia o Diário Oficial do Estado de Santa Catarina publicou, nos Atos do Poder Executivo, o Decreto no. 4.400, que declarava “Situação de Emergência na área hospitalar e pública do complexo do Hospital de Caridade”. Também o Prefeito Municipal de Florianópolis, Sérgio José Grando, assinou neste mesmo dia o Decreto no. 138 no qual era declarado “Estado de Calamidade Pública na área onde se situa o Hospital de Caridade de Florianópolis.” Todos os poderes da sociedade uniam-se para contornar a catástrofe e devolver à nobre instituição o brilho que sempre ostentara. Nos dias seguines, revelou-se por inteiro o maravilhoso espírito de solidariedade do povo catarinense. Doações e auxílios diversos começaram a chegar de todos os lados, enquanto poder público, empresas e instituições enviavam auxílio, recursos e oferecimentos para a recuperação ampla do mesmo hospital. No dia 9 de abril os escombros do Hospital de Caridade receberam uma visita ilustre, que bem de-
da Capital, Sérgio Grando, o Ministro recebeu das
monstrava a importância da instituição: o Ministro
mãos de Charles Edgar Moritz uma correspondên-
da Saúde, Henrique Santillo, visitou a cidade com o
cia solicitando ajuda financeira para a reconstru-
único objetivo de conhecer a extensão da tragédia.
ção.
Acompanhado pelo provedor e demais irmãos da
Os trabalhos continuaram acelerados nos dias que
irmandade, além de políticos como o Senador Espi-
se seguiram à tragédia. Técnicos vasculhavam os
ridião Amin, Deputados Federais Luiz Henrique da
escombros em busca de respostas e do caminho
Silveira, Neuto de Conto e César Souza e do Prefeito
para a reativação, campanhas mobilizavam a so-
225
ciedade, partes não afetadas do Hospital eram ana-
ra. Por parte do corpo clínico foram indicados os
lisadas a fim de receberem licença para voltarem
médicos que já estavam em cargos administrativos:
à ativa e a Mesa Administrativa da Irmandade do
Armando Taranto e Libório Soncini, diretores clíni-
Senhor Jesus dos Passos, mais uma vez, mostrava
cos do Hospital, além de Ari Oswaldo Carvalho.
a toda a sociedade catarinense, toda a força do seu
Foram ainda nomeados para assessoria jurídica os
carisma e tradição. O empenho era ímpar, incompa-
advogados Francisco de Assis Zimermmann Filho,
rável, todos concentrados em devolver à vida aque-
Lecyo Mendes Slovinski e Hylton Gouveia Lins.
le paciente terminal, como tantas vezes acontecera
No dia 13 de abril uma tocante cerimônia como-
dentro de suas seculares paredes.
veu a comunidade florianopolitana. A Imagem do
Foram oficialmente nomeados para integrar a Co-
Senhor Jesus dos Passos, que se encontrava no Gi-
missão de Reconstrução os seguintes irmãos: Jor-
násio do SESC, em meio a catadupas de objetos, do-
ge Miguel Mandalis, Aloísio Acácio Piazza, Nivaldo
cumentos e mobiliário da entidade, foi solenemente
Machado, Paschoal Simone e Nereu do Vale Perei-
transferida para a Catedral Metropolitana da cida-
226
de. Mais uma vez, no espaço de poucos dias ela protagonizava uma procissão inusitada, porém sempre cercada pelo fervor do povo que, ainda uma vez, acorreu em massa para acompanhá-la.
No decorrer dos dias seguintes, técnicos da Defesa Civil, CASAN, CELESC e TELESC trabalharam com afinco para reativar a casa. Equipes trabalhavam na limpeza dos locais, a fim de viabilizar o retorno gradativo dos setores administrativos, da comissão de recuperação e da Irmandade. A Campanha para arrecadação de fundos para a reconstrução ganhou um apreciável incentivo com a decisão do Governador Antônio Carlos Konder Reis, divulgada no dia 14 de abril. A CODESC foi autorizada a lançar uma loteria instantânea, a Catarininha, em favor do Hospital de Caridade. Desta forma o solidário governador reeditava uma antiga medida utilizada há séculos pelo governo provincial para auxiliar o Hospital em seu nascedouro. No dia seguinte, 15 de abril, outra grata notícia. Uma construtora de Florianópolis ofereceu seus serviços gratuitos para a demolição das paredes que, ameaçadas de ruir, foram condenadas pelos técnicos da Defesa Civil. As obras iniciaram no mesmo dia e, logo que concluídas, a área sinistrada foi coberta com tapumes. O Hospital, lenta e gradativamente, saía do coma e recuperava um pouco da sua beleza e imponência. Outra excelente notícia e que ajudou
227
a elevar o moral das equipes de reconstrução foi a doação de 2 milhões de dólares por parte da CNI, para as obras de recuperação. O Senador Albano Franco e o Presidente da FIESC, Osvaldo Moreira Douat fizeram o anúncio conjunto, trazendo um novo alento para a Mesa Administrativa da Irmandade e para toda a comunidade que, incansavelmente, auxiliava e acompanhava, apreensiva, todo o processo da reconstrução. Representantes da Empresa de Cerâmicas Portobello S.A procuraram a Comissão de reconstrução, comunicando a doação de 10 metros quadrados de pisos para revestir todo o novo Hospital. Finalmente, no dia 20 de abril, o Secretário de Estado Mário Cesar Moraes apresentou um relatório oficial ao Governador, informando todos os dados referentes à avaliação global do sinistro, bem como as ações necessárias para a imediata retomada das atividades hospitalares possíves. A Comissão Nacional de Energia Nuclear havia rastreado o local em busca de vestígios de radiação, emitindo um parecer corroborando a ausência de dano radiológico naquelas instalações; A Comissão Mnicipal da Defesa Civil ratificava a interdição da área mais atingida, a demolição de paredes ameaçadas, a limpeza e guarda cuidadosa de todo material original que serviria de modelo para futuras obras de restauro no imóvel tombado; A Diretoria de Polícia Técnica comunicava haver encerrado as investigações técnico-científicas ne-
228
cessárias;
parte do Governo do Estado, o Hospital de Carida-
O Corpo de Bombeiros atestava a inalteração nas
de reabriu suas portas, primeiramente de maneira
condições de segurança das áreas não sinistradas;
parcial e, a pouco e pouco, os demais serviços e de-
A CELESC informava ter procedido o isolamento
partamentos foram sendo reativados enquanto um
das áreas atingidas e a energização das não atin-
ambicioso projeto de reconstrução, restauro e me-
gidas, bem como as adaptações necessárias para
lhorias ia sendo desenvolvido. Com o respaldo de
devolver o fornecimento de energia;
toda a comunidade catarinense, as áreas atingidas
A CASAN informava os diversos serviços realizados
foram sendo reconstruídas, modernizadas e adap-
para melhor operação do fornecimento de água no
tadas às novas necessidades de uma comunidade
local;
em constante evolução, preparando aquele estabe-
E finalmente a TELESC infomava que restabelecera
lecimento para a entrada no novo milênio.
as ligações telefônicas.
O período de provedoria de Charles Edgar Moritz
A partir da análise e aprovação deste relatório por
findou-se em 1995, com a eleição de Aloísio Acácio Piazza, em maio de 1995.
...devolveram a comunidade um novo hospital!
229
Capítulo XIX
1995
Inicia um período de
230
recuperação e crescimento
231
A Mesa Adminstrativa eleita que assumia, naquela data, o solene compromisso de reerguer o Hospital de Caridade, estava assim constituída: Provedor: Aloísio Acácio Piazza 1º. Vice-provedor: Paschoal Simone Neto 2º. Vice-provedor: Geraldo Nicodemos Vieira 3º. Vice-provedor: Laudares Capella Procurador Geral: Jorge Miguel Mandalis Procurador Adjunto: Valter Brasil Konell Secretário Geral: Nereu do Vale Pereira Secretário Adjunto: Carlos A. da Silva Faria Tesoureiro Geral: Milton César Pires Tesoureio Adjunto: Edgar Rutkoski Mordomo do Culto Divino: Rogério João Laureano Mordomo Adjunto: Laurindo Altino Cordeiro
Consultores Titulares: Nivaldo Machado, Jorge
Aloísio Acácio Piazza
Humberto Barbato, Protásio Leal, Walter Kuenzer, Armando Antônio Heil, Azomar Pereira do Nascimento.
Eleito a 2 de maio de 1995 e tendo tomado posse em julho seguinte, o Provedor Aloísio Acácio Piazza assumiu unindo duas características fun-
Suplentes: Alfredo Manuel Barbosa, Manuel José
damentais para a fase de crescimento que viria a
Prates, Carlos Augusto Caminha, Paulo Armando
seguir: a experiência, não só como irmão presen-
Ribeiro, Jorge Cherem Sobrinho, Alberto João da
te em toda a gestão do provedor anterior, Charles
Cunha.
Edgar Moritz, como também de membro e cidadão atuante, vereador em diversas gestões e inclusive
Conselho Fiscal: Valério Matos, João Jorge de
tendo ocupado a presidência daquela casa no ano
Lima, Celso Ciriaco da Luz.
de 1985 e a vontade de realizar o trabalho necesSuplentes: João de Deus Machado Neto, Valdemi-
sário à plena recuperação do Hospital.
232
ro Julio Ferreira, Júlio Cesarino da Rosa Filho.
junto. Na esfera patrimonial, foram realizadas grandes e profundas reformas, ações de recuperação da
Uma das primeiras atividades da nova Mesa Ad-
engenharia do conjunto arquitetônico e grandes
ministrativa foi procurar o Banco do Brasil em
aquisições. Desta iniciativa fizeram parte a re-
busca de linhas de crédito para dar suporte aos
construção e adaptação de todas as alas de in-
muitos investimentos necessários para deflagrar
ternação do hospital, bem como a construção de
e completar o arrojado plano da Irmandade: re-
novas alas; a implantação de uma nova lavande-
cuperar o Hospital de Caridade e colocá-lo entre
ria, para garantia dos processos de assepsia do
os mais destacados e atualizados centros de diag-
hospital e finalmente a adequação dos espaços
nóstico e tratamento médico do país.
existentes para o surgimento de novos serviços e
A partir desta data a Irmandade travou uma bata-
atendimentos no hospital.
lha pela reconstituição do conjunto arquitetônio
Na área técnica, equipamentos atualizados ti-
e médico do seu Hospital de Caridade, através de
veram o condão de colocar o Hospital em linha
inúmeras e consistentes ações.
com os mais avançados centros médicos do país.
A Comissão de reconstrução, desta feita contan-
Foram instalados e colocados em funcionamento
do com a atuação precisa e eficaz de Laudares
uma Agência Transfusional, as áreas de diagnós-
Capella e Valter Brasil Konell, continuava desen-
tico por imagem e outras especialidades de alta
volvendo atividades as mais diversas no sentido
complexidade.
de recuperar e otimizar o Hospital.
E finalmente, na área cultural e humanística, sur-
As atividades foram desenvolvidas em três fren-
giram iniciativas de peso como o resgate e pu-
tes distintas. Enquanto a Irmandade usava toda
blicação do trabalho: Memorial Histórico da Ir-
a sua força, embasada no conceito secular de
mandade do Senhor Jesus dos Passos, Volumes I
probidade e dedicação que ostentava, para obter
e II. O trabalho, uma reedição das obras do his-
linhas de crédito e financiamento, doações e ou-
toriador Henrique da Silva Fontes, organizadas e
tras formas de ajuda – uma espécie de espórtu-
comentadas pelo Professor Nereu do Vale Perei-
la contemporânea – o corpo clínico se esmerava
ra, que teve o condão de resgatar mais de 200
na busca técnica pela excelência em serviços de
anos de história dos baús do passado direto para
saúde. Ao mesmo tempo, iam sendo desenvolvi-
a atualidade.
das ações em prol do resgate e manutenção da memória patrimonial, cultural e artística do con-
233
No dia 17 de abril de 1998 foi solenemente rei-
trativa ficou assim constituída:
naugurada a Ala Nossa Senhora das Graças, mais
Provedor: Laudares Capella
uma das obras que fizeram parte do plano de re-
1º. Vice-provedor: Valério José de Matos
cuperação do Hospital de Caridade. A Irmandade,
2º. Vice-provedor: Rogério João Laureano
através de ingentes esforços, não só vinha devol-
3º. Vice-provedor: José Alfredo Mussi
vendo integralmente o hospital à sua comunidade,
Procurador Geral: Saulo Nunes de Sousa
como o fazia acrescido de muito mais capacidade,
Procurador Adjunto: Augusto Wolff
modernidade e eficácia. Esta obra foi também um
Secretário Geral: Valter Brasil Konell
marco da gestão do Provedor Aloísio Acácio Piazza,
Secretário Adjunto: Luiz Mário Machado
que cedeu lugar ao seu sucessor, Laudares Capela.
Tesoureiro Geral: Edgar Rutkoski
Este foi eleito na reunião realizada em 19 de abril
Tesoureiro Adjunto: João José Ballstaedt
de 1999 e a nominata completa da Mesa Adminis-
Mordomo do Culto Divino: Jorge Miguel Mandalis Mordomo Adjunto: Valdemiro Julio Ferreira
Consultores Titulares: Jorge Humberto Barbato, Walter Kuenzer, Ernesto Francisco Damerau, Carlos Alberto da Silva Faria, Paulo César de Oliveira e Paulo Armando Ribeiro.
Suplentes: Alfredo Manuel Barbosa, Manuel José Prates, Ariel Botaro Filho, Jorge Cherem Sobrinho, Alberto João da Cunha e João Salvador Bonatelli.
Conselho Fiscal: João Lucio da Costa Baracuhy, João de Deus Machado Neto e Julio Cesarino da Rosa Filho.
Suplentes: Carlos Augusto Caminha, Belmonte Miranda e João Jannis.
Laudares Capella
234
Os novos tempos faziam-se presentes também na ir-
Com a saída de Laudares Capella, a Comissão de
mandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital de
Reconstrução passou a ser coordenada por Valter
Caridade. A modernidade, os novos conceitos admi-
Brasil Konell, o qual, com ações competentes e pre-
nistrativos, a constante necessidade de atualização
cisas, fez com que o Hospital entrasse no século XXI
começaram a fazer parte dos integrantes da Mesa
a bordo das mais modernas técnicas, instalações e
Administrativa que agora, uniam a boa vontade e
equipamentos médicos à disposição no mercado. A
espírito de doação, a capacidade administrativa e
complexidade gradativa ia sendo enfrentada com
conhecimentos específicos de cada cargo ocupado.
uma Mesa Administrativa cada vez mais preparada
A complexidade na administração do Hospital as-
para tais desafios.
sim o exigia, e mais uma vez a Irmandade mostrou-
O símbolo da nova era que vinha despontando foi a
se preparada para os novos desafios.
deflagração de inúmeras ações que visavam, além
Nesta época, sendo Governador do Estado Espiri-
de destacar a excelência do Hospital como centro
dião Amin Helou Filho, o Hospital de Caridade re-
médico, ações que visavam a humanização, tais
cebeu grande amparo financeiro, uma vez que este
como o nascimento de um centro voltado para a
político nutre especial simpatia pela Irmandade,
guarda de documentação e pesquisas, anexando to-
da qual é membro. As dificuldades vividas então,
dos os documentos relativos a Irmandade e Hospi-
por conta da crise dos convênios de saúde, espe-
tal e que se encontravam espalhados entre Arquivo
cialmente no IPESC e na Unimed, foram em parte
Morto, Departamento de Estatística de Controles
atenuadas pela ação dele e de outros políticos sim-
Médicos e outros. Deixando de ser vistos como
páticos à causa da Irmandade e do seu hospital.
mero acúmulo de informações armazenadas, estes
235
documentos passaram a ser vistos como o tesouro que realmente são. Sem limitar-se a mera prática arquivística, o Centro de Pesquisas passou a contar
Em 2003 assumiu a provedoria o advogado Val-
com serviço de profissionais de história e pesquisa,
ter Brasil Konell. Profundamente envolvido nos
voltando-se para a guarda, catalogação, análise e
destinos do Caridade desde a década anterior,
correto aproveitamento do rico acervo documental
imprimiu um novo estilo na administração da
recuperado.
casa.
Desnecessário acentuar o valor informativo desta
Longe iam os tempos em que homens iletrados,
documentação que, muito mais do que comprovar
empregando apenas uma imensa boa vontade e
todas as atividades da Irmandade e do Hospital ao
recursos materiais, administravam o pequeno e
longo de todos estes anos, é um verdadeiro retra-
incipiente estabelecimento dedicado a socorrer
to do cotidiano da comunidade desterrense desde
os pobres e desvalidos. Agora, homens prepara-
seus primórdios.
Também neste período foi iniciado um extenso e abrangente programa de treinamento dos colaboradores do Hospital, bem como o início das ações de informatização de todos os sistemas de controle internos, que seria completamente implantado em 2003, visando a qualificação dos serviços. O terceiro milênio também trouxe para o Hospital de Caridade a realização de transplantes, as mais complexas operações existentes. No dia 17 de maio de 2000 um transplante de rins realizado ocupou as manchetes dos principais jornais do Estado. Era o Caridade em nova era, vencendo uma década de inenarráveis dificuldades financeiras, até um escândalo de desvio de verbas e todos os outros fatores complicadores de uma sociedade convulsionada por problemas estruturais qual a brasileira.
Valter Brasil Konell.
236
dos, profissionais de gabarito e empreendedores com um currículo invejável de realizações estavam à testa da entidade, emprestando sua capacidade e senso administrativo ao complexo empreendimento que, a cada dia, crescia em oferta de serviços e oportunidades. A primeira obra que o novo provedor executou, dada a urgência da mesma, foi uma ampla reforma no Pronto Atendimento, dando a este ares de centro de primeiro mundo, seguido de um novo espaço para a Internação.
Algumas das mais importantes realizações da gestão do Provedor Valter Brasil Konell são:
Completa informatização do Hospital, inclusive com a digitalização dos prontuários médicos;
Humanização de todas as áreas destinadas à internação, dentro dos atuais conceitos de hotelaria hospitalar, com ênfase na decoração, agradabilidade e embelezamento dos espaços. Para tornar ainda mais agradáveis os ambientes, foi criado o Projeto “Adote uma parede”, através do qual artistas locais foram convidados a doar obras ao Hospital, diminuindo assim a tradicional frieza das paredes hospitalares. Hoje os toques de cor e arte estão por toda parte no IHC;
237
Assinatura de convênio com o Governo Estadual para a liberação de R$ 1 milhão em recursos a serem utilizados na ampliação do HC;
(As obras já iniciaram, com previsão de término em 2010)
Lançamento inédito de um Planejamento Estratégico para a instituição, bem como uma profunda reforma administrativa que implantou uma provedoria proAmpliação da Nutrição;
fissional e altamente capaz à testa da entidade;
Inauguração da Ala Nossa Senhora do Livramento,
Inauguração da Ala Nossa Senhora da Saúde, fecha-
em parceria com a Unisul e Governo do Estado; a
da havia seis meses para reformas; Depois desta, a
ala, localizada na área sul do complexo hospitalar
área passou a oferecer 11 apartamentos com in-
do Caridade, oferece 14 leitos para atendimento a
fraestrutura moderna e ambiente confortável. Além
pacientes do SUS e convênios com direito a quarto
do leito do paciente, os apartamentos contam com
coletivo. Toda a área foi dotada de amplos banhei-
bicama para acompanhante, telefone, banheiro,
ros, aparelhos de TV com controle remoto, sala de
poltrona, mesa para refeições, frigobar, ar condi-
estar, armários com chave, mesa de refeições com
cionado Split com controle, aparelhos de TV com
armários, camas com manivela e suporte para soro,
controle, TV por Cabo e acesso à Internet.
painel de cabeceira de leito completo com lâmpada, campainha e rede de oxigênio, entre outros itens. Aprovação do Projeto de Lei que muda o limite de ocupação da área comunitária institucional (ACI) do Hospital de Caridade, permitindo assim a construção do novo centro cirúrgico;
238
Inauguração do novo edifício garagem, com a im-
Aprovação de convênio com o BNDES, através da
plantação de 80 novas vagas, distribuídas em três
interveniência do BRDE, para financiamento de R$
pavimentos, ampliando a capacidade total de esta-
10 milhões ao IHC;
cionamento para 260 vagas.
Realização do primeiro transplante de coração da Inauguração de um espaço especial para transplan-
cidade de Florianópolis, no Hospital de Caridade;
tados na Unidade Coronariana (UNICOR), o que
A equipe médica, composta pelos Drs. Frederico Di
proporcionou ao IHC a possibilidade de realizar
Giovanni e Everton Luz Varella, transplantou um
transplantes dentro das mais atualizadas e exigen-
novo coração na paciente Maria de Lourdes Sch-
tes normas internacionais.
mitz da Luz.
239
delo Primus Essential, fabricado pela Siemens, foi adquirido por 400 mil dólares – repassados pelo Alteração do nome do Hospital, que volta a denomi-
Governo do Estado – qualifica o atendimento aos
nar-se Imperial Hospital de Caridade de Florianó-
pacientes do SUS e demais convênios, oferecendo
polis, por uma sugestão do Historiador e Ex-Desem-
maior precisão.
bargador Professor Norberto Ungaretti, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina. Aquisição do Tomógrafo Multislice-64, único de Santa Catarina. Foram investidos US$ 1 milhão na Inauguração do novo centro de radioterapia do HC,
compra e instalação do Aquilion 64, um dos mais
equipado com acelerador linear de fótons e elé-
modernos aparelhos de exame do país.
trons, sendo o único no Estado de Santa Catarina. Para abrigar o novo equipamento, o prédio ficou em reformas durante oito meses. O acelerador Mo-
Além de todas estas importantes obras, Valter Bra-
240
sil Konell ainda realizou muitas outras que, se de
lançamento do DVD Projeto Memória Hospital de
menor monta, não são de menor importância no
Caridade; a finalização das obras de reforma do
contexto de uma entidade que coloca em primeiro
Centro Cirúrgico; a implantação da mudança no
plano a promoção humana, tais como a criação do
sistema de fornecimento de oxigênio; a
SAC do Hospital e a Pastoral dos Enfermos; a Ter-
implantação da Farmácia Satélite, da Sala de Higie-
ceira reforma do Cemitério da Irmandade; a inaugu-
nização e do Refeitório;
ração da Farmácia Popular, fruto de um convênio entre o Hospital e órgãos do governo; a aprovação do novo “Compromisso” da entidade, adequado às
A atual Mesa Administrativa, a primeira a ser eleita
atuais exigências do Código Civil; a implantação do
por voto secreto de todos os Irmãos, de acordo com
serviço de visitas pós-internação aos pacientes; o
o novo Compromisso, é a seguinte:
241
Provedor: Valter Brasil Konell
Titulares: Ernesto Franscisco Damerau, Saulo Nu-
1º. Vice-provedor: José Carlos Pacheco
nes de Sousa, Dauth Emmendörfer, Rogério João
2º. Vice-provedor: Francisco Carlos Heizen
Laureano.
3º. Vice-provedor: Alaor Francisco Tissot
Suplentes: João Salvador Bonatelli, João Mário Zo-
Procurador Geral: Ennio Carneiro da Cunha Luz
mer, João Ari dos Santos Dutra, Nilton Brasil Pache-
Procurador Adjunto: Luiz Mário Bratti
co, Ronaldo Furtado Koerich e José Vitthinrich.
Secretário Geral: Mario Cesar Moraes Secretário Adjunto: Altair Acelon de Melo
Conselho Fiscal:
Tesoureiro Geral: Pedro Moreira Filho
Titulares: Hélio da Costa Bez, Antônio Obet Koerich
Tesoureiro Adjunto: Herondino Henrique Cordeiro
e Nelson Pedrini.
Mordomo do Culto Divino: Carlos Roberto dos Santos
Suplentes: Maurício Fernandes Pereira, Roberto Al-
Mordomo Adjunto: Rita de Cassia Ocampo More
varez Bentes de Sá e Vilmar Amorim Porto.
Bertotti
Conselho Consultivo:
A Mesa Administrativa do Imperial Hospital de
Presidente: Salomão Antônio Ribas Junior
Caridade, coordenada pelo Provedor Valter Brasil
Secretário: Felipe Otávio Boabaid
Konell e constituída por gerentes, coordenadores
242
e representantes do Corpo Clínico continua atuan-
instalações técnicas; no 4º. Pavimento localizar-se-á
do pró-ativamente na implantação e adaptação do
a Unidade Coronariana (Unicor) e finalmente no 5º.
Planejamento Estratégico. Arrojado e perpassado
Pavimento será instalada uma moderna Unidade de
por uma visão de futuro, focando ações até o ano
Terapia Intensiva.
de 2011, o planejamento prevê uma plena adapta-
O orçamento total da obra é de R$ 22 milhões, sen-
ção do IHC, seus gestores, corpo clínico e funcio-
do que deste montante, 10 milhões já foram capta-
nal às novas diretrizes que possam funcionar como
dos através de convênio com o BRDE.
marcos realizatórios. Para tanto, estão alinhavadas
A equipe administrativa do IHC, consciente de que
ações tais como as que já foram deflagradas des-
não bastam leitos para atender as necessidades da
de que este foi implantado, há dois anos, entre as
população, mas são necessários também instala-
quais se destacam, por exemplo, a criação de uma
ções de alta complexidade e investimentos em tec-
Intranet e a implantação de um Plano de Cargos e
nologia, busca obter o aprimoramento das terapias
Salários.
e diagnósticos precisos.
De olho no crescente crescimento populacional de Florianópolis e, por extensão, de todo o Estado de Santa Catarina, de onde acorrem pacientes para buscar a excelência já conhecida do Imperial Hospital de Caridade, a Mesa Administrativaa da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos busca arrojados investimentos. A expansão da área física do Imperial Hospital de Caridade é um destes passos. A obra que se encontra em andamento resultará em significativa ampliação do espaço físico do Hospital. Será construído um novo bloco intensivo com cinco pavimentos construídos e mais área de refúgio, pouso e decolagem. No térreo ficarão a garagem e recepção; no 1º. Pavimento será criada uma área multiuso e enfermagem; no 2º. Pavimento estará um novo centro cirúrgico e uma passarela ligando este novo bloco ao complexo já existente; no 3º. Pavimento estarão
243
Como diz o Provedor Valter Brasil Konell, “O IHC quer garantir no futuro o lugar que ocupa no cenário atual, como um hospital filantrópico que se destaca pelo atendimento e qualidade de seu corpo clínico, pelo seu excelente corpo de enfermagem e serviços de apoio, bem como a oferta de equipamentos que facilitam e dão segurança aos serviços médicos oferecidos.”
Números majestosos demonstram a magnitude atual do Imperial Hospital de Caridade. Em 2008 os números acumulados demonstram cabalmente este fato. Com uma taxa média de ocupação de praticamente 100% dos seus 224 leitos, o IHC atendeu este ano, em média, 39.282 pacientes/dia, realizou 3.508 cirurgias, 14.870 atendimentos no Pronto Socorro e 34.954 aplicações de radioterapia. Foram servidas 520.999 refeições e processados 364.752 quilos de roupas, tudo isto realizado e coordenado por uma equipe de 800 funcionários. Voltando os olhos para 220 anos atrás, quando a inesquecível figura do Irmão Joaquim subia o outeiro do Menino Deus, pressuroso, em busca dos seus probrezinhos, o que se vê é uma entidade que soube evoluir sem esquecer suas raízes, sua filosofia e causa maior. O Imperial Hospital de Caridade continua, imponente e majestoso, a zelar pela saúde do povo catarinense, independente de sua classe social ou posses. Os pobres e desvalidos que, outrora, en-
244
contraram consolo e guarida no pequeno estabe-
e, assim, realizar um pouco da caridade preconiza-
lecimento, construído graças ao esforço de Tomáz
da pelo Nosso Senhor Jesus Cristo.
Francisco da Costa e seu filho Joaquim, secunda-
O Senhor Jesus dos Passos deve estar zelando,
dos por tantos outros abnegados que imprimiram
amoroso e feliz, por esta grande obra que repre-
seu nome nesta inesquecível história, continua de
senta o corolário da sua nobre filosofia de vida:
portas abertas aos necessitados, representando
fazer o bem sem distinção, auxiliando os seme-
uma esperança de cura e apoio.
lhantes como se a Ele o fizessem.
O Hospital que, outrora, recebeu ajuda, apoio e
A aura de luz, bênção e proteção que jorra do Pla-
colaboração de centenas de abnegados anônimos,
no mais Alto sobre o Imperial Hospital de Caridade
hoje continua sendo oportunidade de trabalho dig-
é a garantia de que ele continuará, pelos séculos
no, desenvolvimento profissional e, acima de tudo,
vindouros, inspirando a caridade e a nobreza nos
uma suprema possibilidade de auxiliar o próximo
corações dos florianopolitanos.
245
CapĂtulo XX
2009
220 anos do Imperial Hospita
246
al de Caridade de Florian贸polis
247
A atualidade de seu patrimônio físico, arquitetônico e humano O Imperial Hospital de Caridade é hoje uma reconhe-
amor e carinho, ou seja, de forma humanizada como
cida obra de benemerência e um nome referência em
determina a dignidade para com todo ser humano.
saúde no Brasil. Primeiro Hospital do Estado de Santa
Seus 224 leitos ativos estão divididos em quinze alas
Catarina, é respeitado e acima de tudo benquisto por
de internação: Ala Coração de Jesus, com doze apar-
todo o povo catarinense, como modelo no atendimen-
tamentos; Ala Dr. Antônio da Silva Gomes, com onze
to médico-hospitalar. Está localizado na Rua Menino
apartamentos; Ala Irmã Bernadete, com vinte e um
Deus, nº 376, no centro de Florianópolis, desde que
leitos; Ala Irmão Joaquim, com treze apartamentos;
iniciou suas atividades em 1789, naquele que era en-
Ala Joana de Gusmão, com quarenta e quatro leitos,
tão o outeiro da Bela Vista.
sendo vinte e dois masculinos e vinte
Atualmente com aproximadamente
e dois femininos; Ala Menino Deus,
23 mil metros quadrados de área
com cinco apartamentos; Ala Nossa
construída, 224 leitos para atendi-
Senhora da Saúde, com onze apar-
mento de clínica médica e cirúrgica
tamentos; Ala Nossa Senhora das
nas mais diversas especialidades, o
Graças, com vinte e cinco leitos; Ala
hospital possui um quadro multi-
Senhor dos Passos, com dez aparta-
profissional com 800 funcionários,
mentos; Ala São Camilo, com doze
corpo clínico qualificado, parcerias
apartamentos; Ala São José, com de-
com clínicas especializadas em di-
zesseis apartamentos; Ala São Roque,
versas especialidades e diagnóstico
com treze leitos; Ala Nossa Senhora
por imagem, buscando sempre os
do Livramento, com quatorze leitos;
mais avançados recursos no setor
Unicor (Unidade Coronariana), com
saúde hospitalar, para a segurança e bem estar dos
dez leitos; UTI geral (Unidade de Terapia Intensiva),
pacientes e seus familiares.
com sete leitos; um centro cirúrgico, com oito salas;
O Imperial Hospital de Caridade traz consigo uma lon-
uma central de material esterilizado (CME), uma Uni-
ga história de bravura e honestidade, porém o mais im-
dade de Pronto Atendimento 24 horas, Ambulatório
portante é a lealdade que mantém com os seus clien-
de Cardiologia com equipamentos para exames pré
tes/pacientes sem distinguir cor, raça ou religião. Seus
e pós-operatórios de cirurgia cardíaca, acompanha-
funcionários atendem todos com muita dedicação,
mentos dos pacientes com implante de marca-passo,
248
consultas e outros atendimentos, Centro de Infusão,
do de Santa Catarina. Para manter-se no mercado e
Centro de Radioterapia, Centro de Atendimento Buco
prestar um serviço de qualidade, o hospital traçou
Maxilo Facial e o recente Centro de Diagnóstico e
seu planejamento estratégico, definindo sua missão,
Terapia pela Imagem, incluindo o Tomógrafo Multis-
visão, os fatores críticos de sucesso, os pontos fortes
lice Computadorizado de 64 cortes, único de Santa
e fracos, as ameaças, as oportunidades, seus valores e
Catarina.
as questões estratégicas:
Missão: Sua estrutura administrativa é ágil e dinânima, sendo
Prestar serviços de saúde de qualidade, com profis-
constantemente revista e adequada às necessidades
sionais qualificados e éticos, através da busca de no-
que o Imperial Hospital de Caridade manifesta. Dessa
vas tecnologias, valorizando o cliente e respeitando o
forma busca, através de seus serviços e produtos, ofe-
meio ambiente.
recer o melhor aos seus clientes/pacientes, possibilitando, difundindo e consolidando a criação de uma cul-
Valores:
tura de humanização democrática, solidária e crítica,
•
melhorando a qualidade e eficácia do atendimento.
Atendimento humanizado: atendimento de pacientes, com afeto e empatia
Atendendo as atuais exigências dos Órgãos Governa-
•
mentais para o credenciamento dos serviços de alta
Busca constante da qualidade e da responsabilidade ambiental
complexidade, o Hospital de Caridade mantém o Pro-
•
grama de Humanização, oferecendo aos seus clientes
Comportamento ético e credibilidade: confiança no corpo clínico e funcional
um ambiente confortável, agradável e uma assistência
•
de qualidade. A meta do hospital é trabalhar com me-
Respeito à religiosidade, às crenças e valores individuais.
dicina avançada, ou seja, alta complexidade na gestão
•
da saúde, consolidando, assim, sua marca no merca-
Ser hospital filantrópico e atuar na valorização do cliente
249
Os Provedores do Imperial Hospital de Caridade Inicialmente eleitos para um mandato de um ano,
celência em diagnóstico e tratamentos de saúde em
os provedores eram e continuam sendo a primeira
todo o sul do país.
autoridade no âmbito da Irmandade. Denominados
O primeiro provedor, e também a pessoa que emu-
de Dignidades por força estatutária, vêm represen-
lou as ações em prol da criação da irmandade foi o
tando, ao longo dos 244 anos de existência desta
Governador Geral da Província de Santa Catarina, o
douta instituição, o seu espírito e a sua força maior.
Brigadeiro Francisco Antônio Cardoso de Menezes
De um modo geral, nos primeiros tempos da ins-
e Souza, português de alta estirpe que, ao concordar
tituição, jamais permaneciam mais de um ano ou
com a permanência da imagem do Senhor Jesus dos
dois no cargo, sendo exceções os casos do segundo
Passos na Ilha, sabia que uma confraria adequada
provedor, Dr. Duarte de Almeida Sampaio, Ouvidor
para zelar pela mesma deveria ser criada.
Geral da Capitania, que permaneceu sete anos no
Vale também registro a passagem algo efêmera do
cargo e do Provedor da Real Fazenda, Manoel José
Sargento-mor Tomáz Francisco da Costa na prove-
Ramos, que permaneceu no cargo entre os anos de
doria da Irmandade, no período de 1795 a 1796,
1787 e 1793, perfazendo seis anos de trabalho, e
talvez um reconhecimento tardio pela batalha sem
que retornou ao posto por duas outras gestões.
quartel travada pelo mesmo para a construção do
Depois destes, seguiu-se um longo período de troca
Hospital da Caridade dos Pobres. Sensibilizado com
anual ou bienal de provedores até o advento do Dr.
a entrega espiritual de seu filho Joaquim Francisco
Germano Wendhausen, que realizou o mais longo
do Livramento, dedicou-se de corpo e alma a esta
e profícuo período de provedoria, permanecendo
causa, não descansando enquanto não entregou o
por 38 anos no cargo, entre 1892 e 1930. Após
hospital construído e equipado à comunidade des-
ele, uma nova estirpe de provedores seguiu-lhe
terrense, em 1789.
os passos, permanecendo por longos períodos na
Em 1892, estando a finalizar o mandato à frente
provedoria, como é o caso de Anthero Francisco de
da entidade o Vice-provedor Alfredo Theotônio da
Assis, João da Silva Medeiros Filho, Antônio Mu-
Costa, em substituição ao irmão José Theodoro da
niz de Aragão e Charles Edgar Moritz, entre outros.
Costa, gravemente enfermo e impossibilitado de
A larga experiência, associada à vontade férrea de
exercer o cargo para o qual fora eleito, escreveu
auxiliar os semelhantes oferecendo seu trabalho e
o mais extenso e completo relatório jamais elabo-
conhecimentos tem sido a marca registrada destes
rado até então. Nesta bela e rara joia da literatu-
beneméritos administradores, graças aos quais o
ra desterrense, como a ela se referiu o historiador
Imperial Hospital de Caridade não só continua de
Henrique Fontes, o narrador se debruçou sobre a
pé, como também ostenta o título de centro de ex-
realidade das obras da Irmandade do Senhor Jesus
250
dos Passos, contribuindo para a posteridade com
“Conta presentemente a Irmandade do Senhor Je-
informações preciosas e importantes da história da
sus dos Passos com 415 irmãos. A receita do biênio
instituição e seu hospital.
foi de 4:710$970 réis e a despesa de 4:443$590,
Também relacionou, num trabalho minucioso e
passando o saldo de 267$380 réis para a receita
apurado, todos os provedores até aquela data, per-
do hospital, em conformidade com o que reza o
mitindo que fossem até hoje lembrados e homena-
Compromisso. A cera entrada no mesmo período
geados pela sua doação de tempo, sabedoria e tra-
elevou-se a 1.106 quilos e o pessoal remunerado
balho em prol do Hospital da Caridade dos Pobres.
compõe-se do capelão e do sacristão, vencendo
Alfredo Theotônio da Costa finaliza o documento
aquele 50$000 réis e este 65$000 réis mensal-
com um resumo da situação da Irmandade naquela
mente.”
atualidade:
251
da Silva Gomes, primeiro profissional a clinicar no recém-inaugurado hospital, contando com apenas O Doutor Polidoro Ernani de São Thiago, que foi
um ajudante. Ele assumiu a provedoria no período
médico efetivo do corpo clínico do Hospital de Ca-
de 1806 a 1808, quando ainda atendia neste.
ridade e Professor de Clínica Médica da Faculdade
O segundo foi Antônio Moniz Aragão, que ocu-
de Medicina escreveu, em 1994, depois do grande
pou a provedoria no período compreendido entre
incêndio que acometeu o nosso hospital, um ar-
1976 e 1982.
razoado sobre a sua história, no qual destaca em
De resto, sempre ombrearam, lado a lado, profis-
especial a atuação do Provedor Desembargador
sionais da medicina e da administração, dando
João da Silva Medeiros Filho, quando da ocasião
cada qual a sua importante parcela para que a ins-
de outro importante marco na história do Hospi-
tituição se fortalecesse cada vez mais.
tal, a introdução da parceria com a Faculdade de
Vale ressaltar também a atuação dos provedores
Medicina:
que estiveram à frente do Hospital de Caridade
“Homem íntegro, enérgico, intolerante ao des-
quando ocorreu a grande catástrofe do incêndio
mando e à anarquia, porém complacente, fino e
que acometeu a instituição em 1994, tanto Charles
educado, aceitou com compreensão os excessos
Edgar Moritz, que era o provedor quando o gran-
da álacre e agitada juventude estudantil, que anu-
de desastre ocorreu, quanto Aluísio Acácio Piazza,
lou parte do seu sossego. Tornaram-se proverviais
que assumiu em 1995 e levou à frente a grande
a consideração e o respeito com que tratava os
obra da restauração do mesmo hospital, iniciada
membros do corpo docente, a princípio bem pou-
pelo seu antecessor. Foram valorosos guerreiros
cos, porém mais tarde numerosos. Só so tratava
de uma causa santa e nobre.
por Doutores e Professores, jamais pelo próprio
O atual provedor da Irmandade e do Imperial
nome, mesmo aos jovens, entrando ou saindo da
Hospital de Caridade, Valter Brasil Konell, entrou
faixa dos trinta anos, ele octogenário.”
para a Irmandade em 1964 e é membro da Mesa Administrativa desde 1995. É Mestre em Ciências Jurídicas e Pós-Graduado em Administração Hos-
Interessante observar que, apesar da estreita e
pitalar. Ele representa o novíssimo pensamento
inseparável ligação entre a Irmandade e seu hos-
administrativo à frente de instituições similares.
pital, apenas dois provedores, em toda a história
Nas suas palavras define as causas que o levaram
da Instituição, foram também médicos do mesmo
a mudar os planos que havia traçado, de atuar
hospital. O primeiro foi o cirurgião-mor Antônio
em direito ambiental, voltando-se para a impor-
252
tante missão abraçada, a gestão do Hospital de
médico-hospitalar à população, preferencialmente
Caridade:
aos pobres e desvalidos, assegurando o direito de
“A filantropia hoje é conceituada como a prática
acesso aos modernos processos terapêuticos.
de ações e serviços que visam o desenvolvimento
O Hospital de Caridade, comprometido com os
da pessoa, fornecendo os instrumentos necessá-
preceitos da Igreja Católica Apostólica Roma-
rios para o exercício da cidadania, cuja inspiração
na, além de proporcionar o acesso dos usuários
é a igualdade social e política, indispensável para o
do SUS aos procedimentos de alta complexidade
exercício de direitos. Um deles é o da saúde, asse-
e custo, compromete-se a dar aos seus usuários,
gurado constitucionalmente a todo brasileiro. Isto
principalmente os mais carentes, um tratamento
significa que a população não tem necessidade de
humanizado, tratando as pessoas com amor cris-
mendigar por ações e serviços que visem a pro-
tão e respeito, preservando a dignidade dos pa-
moção, proteção e recuperação da saúde. Há um
cientes. Neste trabalho de filantropia voltada para
dever prestacional, por parte do Estado, de ser-
a cidadania, conta com o apoio dos seus funcio-
viços assistenciais de saúde, envolvendo o direito
nários e membros do Corpo Clínico, muitos dos
de acesso aos recursos profiláticos e terapêuticos.
quais, também membros da irmandade. Sem eles
Os hospitais filantrópicos, atualmente, são organi-
não seria possível.”
zações complexas, direcionadas para a implementação de processos diagnósticos e terapêuticos, integrados às políticas públicas de saúde, sociais e
Enfim, o ideal seria que pudéssemos enumerar
econômicas. Sob esta ótica, o conceito de filantro-
alguns atributos de caráter de cada um dos va-
pia também evolui e interage com o conceito de ci-
lorosos 77 provedores que, nestes 244 anos de
dadania, porque vai além do simples atendimento
existência, estiveram à frente da Irmandade do
caridoso e assistencialista que marcou a atividade
Senhor Jesus dos Passos e principalmente de sua
das instituições filantrópicas no passado.
obra mais lapidar, o Imperial Hospital de Carida-
A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospi-
de, que completa 220 anos. Porém, a poeira do
tal de Caridade mantem-se atenta às mudanças so-
tempo sonega à história os subsídios necessários
ciais havidas, principalmente no campo do Direi-
para tal cometimento, certamente porque os mes-
to, pleiteando novos credenciamentos com o SUS
mos atuaram, abnegadamente, muito mais no si-
– Sistema Único de Saude, para assegurar à sua
lêncio operoso de seus gabinetes de trabalho do
vinculação as políticas públicas de saúde, manten-
que no ruído embriagador dos salões da vaidade
do-se fiel ao compromisso de prestar assistência
humana.
253
Relação de Provedores: Francisco Antonio Cardoso de Menezes e Souza (Governador, Brigadeiro)................................................................. 1765 Dr. Duarte de Almeida Sampaio (Ouvidor geral)...................................................................................................... 1765 a 1772 Pedro da Costa Marim (Tenente-Coronel).................................................................................................................. 1772 a 1773 Félix Gomes de Figueiredo (Provedor da Real Fazenda)....................................................................................... 1773 a 1774 ..................................................................................................................................................................................................... 1774 a 1776 Antonio José da Costa (Coronel)..................................................................................................................................... 1776 a 1779 João Marcos Vieira (Capitão)........................................................................................................................................... 1779 a 1780 Antonio Martins Couto e Crasto (Capitão)................................................................................................................. 1780 a 1781 Manoel de Souza Medeiros (Capitão)........................................................................................................................... 1781 a 1782 Francisco José Ferreira (Capitão e Aj. Ordens do Gov.)........................................................................................ 1782 a 1783 José da Gama Lobo Coelho (Brigadeiro)...................................................................................................................... 1783 a 1785 Antonio Martins Couto e Crasto (Capitão)................................................................................................................. 1785 a 1786 José da Gama Lobo Coelho (Brigadeiro) .................................................................................................................... 1786 a 1787 Manoel José Ramos (Provedor da Real Fazenda).................................................................................................... 1787 a 1793 Miguel Francisco da Costa (Capitão)............................................................................................................................ 1793 a 1794 Antonio José da Costa (Coronel)..................................................................................................................................... 1794 a 1795 Thomaz Francisco da Costa (Sargento-mor).............................................................................................................. 1795 a 1796 José da Gama Lobo Coelho (Brigadeiro)...................................................................................................................... 1796 a 1797 Manoel José Ramos (Provedor da Real Fazenda).................................................................................................... 1797 a 1799 Manoel Fernandes Lessa................................................................................................................................................... 1799 a 1801 Jacinto Jorge dos Anjos (Capitão-mor)........................................................................................................................ 1801 a 1806 Antonio da Silva Gomes (Cirurgião-mor)..................................................................................................................... 1806 a 1808 Manoel Francisco da Costa (Capitão-mor).................................................................................................................. 1808 a 1809 Anastacio Silveira de Souza.............................................................................................................................................. 1809 a 1811 Francisco Borges de Castro (Sargento-mor).............................................................................................................. 1811 a 1812 Manoel José Ramos (Provedor da Real Fazenda) interinamente...................................................................... 1812 a 1815 José Luiz do Livramento (Tenente-coronel)............................................................................................................... 1815 a 1816
254
Manoel da Costa Fraga (Sargento-mor)....................................................................................................................... 1816 a 1817 Dr. Ovidio Saraiva de Carvalho e Silva (Juiz)............................................................................................................. 1817 a 1818 Jacinto Jorge dos Anjos Corrêa (Capitão-mor)......................................................................................................... 1818 a 1819 Francisco Luiz do Livramento (Comendador)........................................................................................................... 1819 a 1820 José Joaquim da Silva (Capitão)...................................................................................................................................... 1820 a 1821 José Luiz do Livramento (Tenente-coronel)............................................................................................................... 1821 a 1824 João de Bittencourt Pereira Machado e Souza (Capitão)...................................................................................... 1824 a 1826 Anacleto José Pereira da Silva (Sargento-mor)......................................................................................................... 1826 a 1827 Francisco de Albuquerque e Mello (Presidente da Província, Brigadeiro).................................................... 1827 a 1830 João Luiz do Livramento (Sargento-mor)................................................................................................................... 1830 a 1831 Manoel Antonio da Luz...................................................................................................................................................... 1831 a 1832 Francisco Luiz do Livramento (Comendador)........................................................................................................... 1832 a 1833 Domingos Luiz do Livramento (Capitão)..................................................................................................................... 1833 a 1834 Marcos Antonio da Silva Mafra (Comendador)........................................................................................................ 1834 a 1835 João Antonio da Costa (Capitão)..................................................................................................................................... 1835 a 1836 Francisco Luiz do Livramento (Comendador)........................................................................................................... 1836 a 1837 João Francisco Cidade........................................................................................................................................................ 1837 a 1838 José Maria da Luz................................................................................................................................................................. 1838 a 1839 Martinho José Callado........................................................................................................................................................ 1839 a 1841 Marcos Antonio da Silva Mafra (Comendador)........................................................................................................ 1841 a 1842 Manoel Francisco Pereira Netto..................................................................................................................................... 1842 a 1843 Miguel Joaquim do Livramento (Capitão).................................................................................................................. 1843 a 1844 João Antonio Lopes Gondim (Major)
interinamente
João Pinto da Luz (Comendador)................................................................................................................................... 1844 a 1845 João Francisco de Souza Coutinho (Comendador).................................................................................................. 1845 a 1849 José Maria do Valle (Comendador)............................................................................................................................... 1849 a 1852 Polydoro do Amaral e Silva (Comendador) . ............................................................................................................. 1852 a 1853 Anastacio Silveira de Souza
interinamente
255
Agostinho Leitão de Almeida (Comendador) ........................................................................................................... 1853 a 1854 Alexandre Francisco da Costa (Major)
interinamente........................................................................... 1854 a 1856
Francisco Duarte Silva (Tenente-coronel)................................................................................................................... 1856 a 1858 Francisco José de Oliveira (Comendador).................................................................................................................. 1858 a 1864 Francisco Luiz da Gama Rosa (Capitão de mar e guerra)..................................................................................... 1864 a 1866 Antonio Joaquim Wanzeller............................................................................................................................................. 1866 a 1867 José Gonçalves dos Santos Silva (como substituto)................................................................................................ 1867 a 1868 Antonio Mancio da Costa (Tenente-coronel)............................................................................................................. 1868 a 1870 Manoel Luiz do Livramento (Tenente-coronel)........................................................................................................ 1870 a 1871 Dr. Olympio Adolpho de Souza Pitanga....................................................................................................................... 1871 a 1874 Affonso de Albuquerque e Mello.................................................................................................................................... 1874 a 1876 Dr. Joaquim da Silva Ramalho......................................................................................................................................... 1876 a 1878 Dr. Joaquim Augusto do Livramento............................................................................................................................ 1878 a 1880 José Theodoro da Costa..................................................................................................................................................... 1880 a 1882 Virgilio José Villela (Coronel).......................................................................................................................................... 1882 a 1890 José Theodoro da Costa..................................................................................................................................................... 1890 a 1891 Alfredo Theotonio da Costa (Vice-provedor)............................................................................................................. 1891 a 1892 Germano Wendhausen....................................................................................................................................................... 1892 a 1930 Anthero Francisco de Assis............................................................................................................................................... 1930 a 1942 Cantídio Alves de Souza..................................................................................................................................................... 1942 a 1943 Julio Pereira Vieira
interinamente, pelo falecimento d.a.
João da Silva Medeiros Filho............................................................................................................................................ 1943 a 1975 José Rocha Ferreira Bastos............................................................................................................................................... 1975 a 1976 Antonio Moniz de Aragão.................................................................................................................................................. 1976 a 1982 Charles Edgar Moritz.......................................................................................................................................................... 1982 a 1995 Aloisio Acácio Piazza........................................................................................................................................................... 1995 a 1999 Laudares Capella................................................................................................................................................................... 1999 a 2003 Valter Brasil Konell.............................................................................................................................................................. 2003 a 2009
256
257
A Procissão do Senhor Jesus dos Passos na atualidade A Procissão do Senhor Jesus dos Passos representa
Em Florianópolis é realizada desde 1766, sendo
a via crucis, ou seja, o caminho do sofrimento, cru-
mais recentemente fixado o dia da sua realização
cificação, morte e ressurreição de Jesus.
no 5o. domingo da quaresma.
É uma das mais antigas tradições do catolicismo,
A primeira procissão de que se tem notícias aconte-
havendo inúmeros registros de sua realização em
ceu quando a imagem do Senhor Jesus dos Passos
Portugal desde o século XIV na quinta-feira da se-
chegou à antiga Vila de Nossa Senhora do Desterro
mana santa; controvérsias litúrgicas ocorridas no
da Ilha de Santa Catarina e foi desembarcada do
Século XIX anteciparam sua realização para o dia
navio que a transportava, em andor, percorrendo
anterior e, em época mais recente, firmou-se na
as ruas da cidade até ser instalada na Capelinha do
quinta-feira da semana anterior ao domingo de Ra-
Menino Deus, construída por Dona Joana Gomes de
mos.
Gusmão.
258
Mesmo sem ter esta intenção formal, o povo acompanhou, contrito e emocionado, o cortejo que se formara para o transporte solene da sagrada imagem pelas ruas da cidade até o local destinado a ela, e assim realizou-se a primeira procissão da história da capital do Estado de Santa Catarina, embora esta não seja considerada na contagem oficial. A sua presença na cidade deu origem à Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, constituída inicialmente para zelar por ela, e em seguida para outras obras de caridade e doação altruística. No ano seguinte, a procissão já obedeceu as normas e regras pré-determinadas pela Irmandade, que procurou seguir a tradição da pátria mãe nos
259
trâmites de sua organização. Em 1892, num bem formulado relatório que historiava toda a existência da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e as suas atividades até então, o Vice-provedor Alfredo Theotônio da Costa assim descreveu a procissão, que ali já possuía 127 anos de tradição:
“De todos os atos religiosos que celebram-se nesta capital, e em todo o Estado mesmo, é, sem dúvida alguma, a transladação da imagem do Senhor Jesus dos Passos o mais imponente e edificante. A imensa onda de penitentes, que em santo recolhimento acompanha-a, as inúmeras velas de cera acesas que eles conduzem, traduzindo a fé que arde em seus contritos corações, e os merencórios sons da música que se ouvem durante o trajeto do préstito, fazem recordar a lúgubre tragédia do Gólgota e, conturbando a alma do mais obstinado ateu, elevam-na a estas místicas regiões onde se contempla a gloriosa Majestade Divina. Não menos edificante é a procissão da mesma imagem, ato em que a Igreja Católica comemora o inaudito atentado praticado há 19 séculos ao redentor da humanidade, condenado em virtude de uma iníqua sentença a sofrer afrontosa morte naquele ignominioso patíbulo. Que de reflexões não sugere a uma alma crente e verdadeiramente cristã este quadro desolador? Que de emoções não experimenta um coração materno ao assistir a esta tocante cena, quando atribulada mãe encontra o seu inocente
260
e estremecido filho em lastimoso estado, cercado de algozes, que o conduzem para o lugar do seu doloroso martírio?Porém os profetas já haviam predito este cruento acontecimento. O Homem Deus devia morrer para remir-nos da culpa original.”
Agora já são 243 anos nos quais a Procissão do Senhor Jesus dos Passos mantém-se como uma das maiores festas de fé e de religiosidade popular de Santa Catarina. São quatro as cerimônias mais importantes desta Festa: a lavação da imagem do Senhor Jesus dos Passos, três dias antes da procissão, por crianças de até seis anos; a missa e a Procissão do Carregador no Sábado de manhã, com a mudança das alfaias do Hospital para a Catedral; à noite a Procissão das imagens do Senhor Jesus dos Passos e de Nossa Senhora das Dores e no Domingo à tarde a Procissão com o Sermão do Encontro das duas imagens. A Procissão da Mudança é a transferência organizada, em séquito a pé, de todas as alfaias necessárias à montagem dos cenários, ambientes e demais utensílios sacros que compõem a grande celebração. Para a procissão oficial são necessários muitos utensílios, móveis, escadas, adornos e outros. Por causa disto é que surgiu esta “procissão da mudança”, na qual as alfaias devem ser transportadas, não sem sacrifício e esforço físico,
261
pelo povo simples, muitas vezes em pagamento de alguma promessa ou simplesmente num ato contrito de devoção. A Procissão da Transladação das Imagens consiste na transferência das imagens do Senhor Jesus dos Passos e de Nossa Senhora das Dores para a catedral, para que a imagem do Senhor Jesus dos Passos possa, no dia seguinte, empreender a via crucis, galgando o promontório no alto do qual está a Capela, representando o ponto elevado do calvário de Cristo. Esta tradição iniciou em segredo, quando as estátuas eram transferidas ocultas por biombos, em absoluto silêncio, pelas ruas escurecidas da cidade. Com o passar do tempo, o povo passou a acorrer às centenas, milhares de pessoas, para acompanhar e reverenciar, de forma silenciosa, este translado, e o cortejo transformouse em cerimônia solene, incorporada à tradição como um todo. Nesta procissão noturna, o andor da imagem do Senhor Jesus dos Passos é carregado pelos homens, que vão se revezando e o de Nossa Senhora das Dores, pelas senhoras. Na Procissão Oficial, que acontece domingo à tarde, as duas imagens seguem com o acompanhamento dos membros da Irmandade com seus balandraus, do Arcebispo, do Clero, das Autoridades, do povo e das bandas que percorrem as ruas centrais da Cidade. Os mais ilustres irmãos e autoridades estaduais disputam esta grande honraria, integrando o Guião – conjunto de pessoas que transportam um grande estandarte roxo contendo a inscrição
262
S.P.Q.R – ou carregando os andores com as santas imagens. O significado da inscriçao é: Senatus Populusque
Romanum (Senado e Povo de Roma). As figuras que acompanham a procissão no domingo à tarde são representadas por nove mulheres com trajes típicos: túnicas de uma só cor até os pés, lenço e arco cobrindo a cabeça, numa alusão à santidade. Elas representam Maria Madalena, São João Evangelista, José de Arimatéia, Nicodemos, as três Beús (viúvas que, à época, acompanharam os passos de Jesus até sua morte) e os escravos Simão e Cirineu, que cederam a escada para a retirada do corpo de Cristo. Durante a Procissão, em lugares pré-fixados que representam as estações da Via Crucis, uma cantora lírica escolhida representa Verônica e entoa cantos, relembrando o sofrimento das mulheres de Jerusalem. Após o canto, soa a matraca e o cortejo prossegue. Ao atingir a Praça XV de Novembro, em frente à Catedral Metropolitana, acontece o comovente “Encontro” das duas imagens: o Senhor Jesus dos Passos, o filho, e Nossa Senhora das Dores, a mãe. Ali é proferido o “Sermão do Encontro” por uma autoridade eclesiástica especialmente convidada. Após estes atos, as duas procissões se unificam e seguem em direção à Capela Menino Deus. Um dos momentos mais emocionantes da Procissão acontece ao sopé do Morro da Bela Vista, do Hospital, quando a imagem do Senhor Jesus dos Passos
263
é levada a fazer um giro de 360 graus, como que
totalmente artesanal, aproveita as sobras de cera
abençoando e se despedindo por mais um ano, da
das velas acesas pelos milhares de devotos do Se-
Cidade. Ao término da Procissão as imagens retor-
nhor Jesus dos Passos.
nam à Capela Menino Deus do Hospital de Carida-
A Procissão do Senhor Jesus dos Passos é palco das
de, onde no decorrer do ano recebem as visitas, as
mais tocantes e fervorosas demonstrações da pro-
orações e os pedidos dos membros da Irmandade,
funda crença que anima o nosso povo e transforma
de milhares de enfermos, bem como de seus devo-
esta ilha num local tão abençoado e especial, capaz
tos, aguardando a Procissão do próximo ano.
de se transformar no cenário de vida de criaturas
Como antigamente não havia fábrica de velas, a
inesquecíveis como a Beata Joana Gomes de Gus-
Irmandade achou por bem produzir suas próprias
mão e o Irmão Joaquim que, com toda a certeza,
tochas para a procissão. Até hoje o processo, que é
velam por ela lá do Alto!
264
265
A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos na atualidade como 12 foram os apóstolos de Cristo. Fiel aos princípios que nortearam a sua criação, há 243 anos, a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos continua velando pela fortaleza espiritual da Ilha de Santa Catarina, e levando à frente seus objetivos precípuos, que pouco mudaram ao longo destes mais de dois séculos, conforme se compreende, numa simples leitura do seu Compromisso (Estatuto). Embasada nas milenares tradições portuguesas, a
Vivenciando, ao longo de 244 anos, o espírito e a
Irmandade do Senhor Jesus dos Passos foi consti-
matéria deste ideal e embuídos de verdadeiro amor
tuída nos mesmos moldes das congêneres da então
cristão, os integrantes da Irmandade do Senhor Je-
pátria mãe do Brasil Colônia. Rezava a tradição que
sus dos Passos, que hoje se elevam a mais de mil
as irmandades deveriam possuir 24 irmãos insti-
integrantes,
tuidores, devendo o corpo diretivo, também deno-
Cristo na Terra, velando e protegendo a Ilha e todo
minado mesa administrativa, conter 12 membros,
o Estado de Santa Catarina!
266
são verdadeiros representantes do
COMPROMISSO DA IRMANDADE DO SENHOR
cutar o decreto da Assembléia Legislativa Provin-
JESUS DOS PASSOS E HOSPITAL DE CARIDADE
cial, que houve por bem sanccionar, approvando o Compromisso da Irmandade do Senhor Jezus dos
(mantida a grafia original do documento)
Passos e Hospital de Caridade, desta cidade como acima se declara.
Francisco José de Souza Soares D’Andrea, Presiden-
Para Vossa Excellencia ver
te da Província de Santa Catharina.
Manuel da Costa Pereira
Faço saber a todos os seus habitantes, que a Assem-
Publicada e sellada nesta Secretaria do Governo da
bléia Legislativa Provincial Decretou, e eu sancio-
Província de Santa Catharina, aos 20 de abril de
nei a Lei seguinte.
1810.
Artigo Único: Fica approvado o Compromisso da
Bernardo Joaquim de Mattos
Irmandade do Senhor Jezus dos Passos, e Hospital de Caridade, abaixo transcripto, e assignado pelo
Registrada a folha 30v. do livro 2º de Registro de
Presidente, e Primeiro Secretário da Assembléia;
lei de Províncias. Secretaria do Governo da Provín-
revogadas as disposições em contrario.
cia de Santa Catharina, em 2 de maio de 1840.
Mando, portanto a todas as autoridades, a quem o
Manoel da Costa Pereira
conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumprão, e fação cumprir inteiramente
COMPROMISSO
como n’ella contem. O Secretário desta Provincia a faça imprimir, publicar e correr. Dada no Palacio do
Da Irmandade do Senhor Jezus dos Passos e Hospi-
Governo da Provincia Santa Catharina, aos vinte e
tal de Caridade.
nove dias do mês de abril de mil oitocentos e quarenta, décima nona da Independência e do Império.
Capitulo Primeiro
(L.S.) Francisco José de Souza Soares D’Andrea
De número e qualidades dos Irmãos, sua admissão e obrigacoens em geral.
Carta de lei pela qual Vossa Excellencia manda exe-
267
Artigo 1º - A Irmandade se comporá de indefinido
domingo da quaresma; e a terceira no dia da com-
numero de Irmãos e Irmãs.
memoração dos defuntos, para os responsórios que se devem rezar de manhã pelas almas dos Irmãos
Artigo 2º - Os que houverem de ser recebidos como
fallecidos.
Irmãos, devem professar a Religião do Estado, ter
A primeira e a terceira reuniões serão na Igreja do
bons costumes, e a idade de dezoito anos.
Memnino Deus, e a segunda na Igreja Matriz às trez horas da tarde.
Artigo 3º - Os que quiserem ser Irmãos os farão saber por escripto, ou vocalmente, a qualquer Mem-
Capítulo Segundo
bro da Meza, que o proporá, e sendo acceito assim lh’e fará constar.
Dos cazos em que os Irmãos hão de ser despedidos
Artigo 4º - Cada Irmão, e Irmã à entrada dará huma Esmolla, segundo a sua devoção, que não poderá
Artigo 7º - Os irmãos hão de ser despedidos da ir-
ser menor que mil reis, e contribuirá com o annual
mandade: 1º) quando por sua conduta immoral, e
de seiscentos e quarenta reis, excepto no anno em
desregrada, se tornarem indignos d’ella; 2º) quan-
que servir algum dos cargos da Meza, que então
do não se quizerem prestar no serviço do culto, e
dará a jóia que para o dito cargo adiante se esta-
do hospital, que diretamente lhes pertencer; 3º)
belece.
quando se provar inexactidão dolosa nas contas que houverem de prestar dos bens e dinheiros da
Artigo 5º - Os Irmãos tem de obrigação accudir
Irmandade, que em razão de algum dos casos lhes
quando sejão chamados pela Campainha da Irman-
pertença administrar.
dade, ou por aciso do Procurador da Meza, à Igreja, e acceitar as ocupacoens que lhe foram dadas, para
Artigo 8º - A despedida dos irmãos compreendidos
o serviço do Culto, do Hospital ou de Misericórdia.
em alguns dos parágrafos do artigo antecedente, será proposta em Meza por qualquer dos Mezarios,
Artigo 6º - Além desta especial obrigação, serão
que a motivará pela forma mais resumida, proce-
obrigados os Irmãos a se reunirem três vezes no
dendo-se logo a votação por meio das espheras
anno, salvo impedimentos de moléstia, estando na
brancas, e pretas, sem proceder discussão alguma.
Cidade: a primeira reunião será antes do dia trez de
A maioria de huma só esphera despede, ou conser-
maio para a eleição da Meza; a segunda no quinto
va o Irmão. Despedido, se lavrará o termo assigna-
268
do pela Meza, elegendo-se na forma do Capítulo 4º
muito em vista, que de maneira alguma se deve
que sustitui no cazo de ser algum empregado.
applicar os rendimentos dos Projetos, os legados que houverem, e a prestação da Fazenda Pública,
Artigo 9º - O Irmão que assim for despedido, terá
que não seja nas despezas do Hospital, e em obras
recurso na Meza do anno seguinte, se pretende
de Misericórdia. As despezas do Culto serão feitas
justificar-se, e então poderá ser de novo admitido,
pelas Esmollas e Jóias dos Mezarios, procurando-se
procedendo-se a votação por esphera, depois de
que as Festas se facão com toda a decência, mas
ouvidas as razoens que allegar por escripto.
sem luxo e desperdícios, e reservando-se sempre alguma quantia cada anno para reparos da Igreja,
Capítulo Terceiro
alfaias, &.
Da Meza da Irmandade, e suas atribuiçoens
Artigo 14 - A Meza prestará todos os socorros corporaes, e espirituaes aos Réos, que tenhão de sofrer
Artigo 10 - A Meza da Irmandade do Senhor Je-
pena capital, desde que estes subirem para o Orató-
zus dos Passos que está erecta na Igreja do Menino
rio até a execução da Sentença, depois do que lhes
Deus desta cidade do Desterro se comporá de hum
darão sepultura no Cimitério da Irmandade.
Provedor, hum Secretário, hum Theroureiro, hum Mordomo dos Expostos, e vinte e quatro irmãos.
Capítulo Quarto
Artigo 11º - Eleger-se-hão igualmente doze Mordo-
Da Eleição da Meza
mos do Culto Divino. Artigo 15 - Reunida a Meza e Irmãos na épocha Artigo 12 - A Meza da Irmandade compete, tanto a
estabelecida no artigo 6º, com os Irmãos presentes,
geral direcção da mesma Irmandade a respeito do
se procederá a eleição da que os deve substituir,
Culto, Hospital, e obras de Misericórdia, que ella
propondo o Provedor trez Irmãos, sobre os quaes
tem de escrever, como a geral administração de seu
correrá escrutinio por meio de espheras brancas, e
Patrimônio, e de todos os negócios a ella perten-
pretas, e o que reunir maioria, ainda que seja hum
centes, desempenhando cada hum dos Mesários as
só voto, será eleito Provedor.
incumbências que lhe pertencer. Artigo 16 - Da mesma sorte, proporão o SecretáArtigo 13 - A Meza, logo que for empossada, terá
rio, o Thesoureiro quem os substitua., ficando elei-
269
tos aquelles, que mediante o escrutinio obtiverem
Capítulo Quinto
maioria. Da posse na nova Meza Artigo 17 - Em vista da relação nominal dos Irmãos da Irmandade mais folgados, que o Secretário deve
Artigo 23 - No dia primeiro de junho, tendo prece-
apresentar, eleger-se-hão o Mordomo dos Expostos,
dido os necessários avisos por parte do Provedor
e os vinte e quatro Irmãos para a nova Meza.
da Meza, se reunirá esta sem os irmãos novamente eleitos e tomarão assento pela forma seguinte:
Artigo18 - O Secretário lançará por Termo os nomes de todos os votados para os cargos de Provedor,
Artigo 24 - O Provedor transacto e o novamente
Secretário, Thesoureiro, Mordomos dos Expostos, e
eleito, tomarão a cabeceira da Meza ficando aquelle
Irmãos da Meza, e o mesmo de votos de obrigação.
a direita deste.
Artigo 19 - Concluída a Eleição e lavrado pela Meza
Artigo 25 - A direita do primeiro seguir-se-há toda
e Irmãos presentes o Termo de Posse da mesma
a Meza transacta.
Eleição, referenciada pelo Secretário, para ser publicada no Dia de maio pelo Pregador.
Artigo 26 - Os mais irmãos da Meza eleita assentarse-hão a esquerda do novo provedor, sem prece-
Artigo 20 - Nenhum irmão se poderá escusar dos
dentes, até a sua posse.
cargos da Meza, salvo nos casos de impedimento por moléstia grave e auzência para fora do Distric-
Artigo 27 - O Secretário apresentará immediata-
to, com immediata reeleição.
mente os Livros, e Contas de Receitas e Despezas da Irmandade e Hospital; e o Thesoureiro os Or-
Artigo 21 - No caso de impedimento ou recusa
çamentos da sua despeza, procedendo-se logo no
exercerá o cargo o immediato em vagas.
exame das contas e verificação dos saldos, quanto haja, que serão igualmente apresentados para se-
Artigo 22 - No caso de empate da eleição, ocorrerá
rem entregues ao novo Thesoureiro.
segundo escrutínio que será circunscripto aos que obtiverão a maioria igual de votos, e se ainda assim
Artigo 28 - Achando-se conformes e legaes as con-
apparecer novo empate a sorte o decidirá.
tas do Thesoureiro e certos os saldos que ellas apresentarem, se lavrarão os precisos Termos em
270
que se declaram saldadas as contas e quite o Thesoureiro de sua responsabilidade.
Artigo 34 – Empossada, como fica determinado, a nova Meza, o Provedor levantará a sessão; e virá
Artigo 29 - Quaesquer erros, enganos ou faltas que
com os Irmãos eleitos despedir os da Meza finda à
se encontrarem, serão declaradas nos Termos, afim
porta da rua.
de que a nova Meza proceda contra quem de Direito houver, para indenização da Irmandade.
Artigo 35 – A posse dos Mordomos do Culto Divino reduz-se unicamente ao aviso, que o Secretário
Artigo 30 - Findo ezame das contas, lavrados e as-
deve fazer por escripto, no dia seguinte ao da pu-
signados os termos e empossado o novo Thesou-
blicação da eleição.
reiro dos saldos que houver, passará o Provedor a fazer huma exposição em geral do estado dos diffe-
Capítulo Sexto
rentes ramos da administração a cargo da Irmandade depois do que, o Mordomo dos Expostos fará
Do Provedor
hum relatório circunstanciado do ramo respectivo as suas incumbências.
Artigo 36 – O Provedor he o Presidente da Irmandade, o principal administrador dos seus bens, e di-
Artigo 31 - Esta exposição deverá ser feita por es-
retor de todos os seus negócios, ou estes respeitem
cripto, visto que ella tem de servir como guia a nova
ao Culto, ou a administração do Hospital, e obras
Meza, para melhor desempenho dos seus deveres.
de Misericórdia.
Artigo 32 - Finda leitura da exposição e relatório
Artigo 37 – Além de que lhe incumbe o artigo 3º,
o Secretário transacto lavrará o termo da posse da
pertence-lhe privativamente:
nova Meza, que será assignado pelo actual Prove-
§ 1º - Convocar a Meza todas as vezes que os ne-
dor e depois pelo novamente eleito e por todos os
gócios da irmandade o representarem.
irmãos de huma e outra Meza.
§ 2º - Propor os negócios, que devão ou tenhão de ser tratadas em Meza, levar a discussão e votação,
Artigo 33 – Assignado o termo de posse, a nova
e decidir a votação no caso de empate.
Meza tomará o assento nos lugares em que até en-
§ 3º - Assignar todos os despachos a que se devem
tão estavão os irmãos da transacta, e estes se mu-
em Meza ou fora della.
darão para os lugares que aquella ocupava.
§ 4º - Dar ordens para o acompanhamento dos en-
271
terros dos irmãos defuntos.
cujas decisão se não possa dar sem sua deliberação,
§ 5º - Nomear, e despedir com voto da Meza o Ca-
o Provedor a convocará, como fica estabelecido no
pellão, Médicos, Cirurgiões, Enfermeiros e demais
§ 1º Capitulo 6º artigo 37.
Empregados da Igreja e Hospital. § 6º - Admitir no Hospital a qualquer enfermo que
Artigo 41 - O Provedor visitará o Hospital o mais
necessite cura, achando-se nas circunstâncias do
amiúdo que lhe for possível, informando-se do
Regulamento, bem como com o voto da Meza, man-
estado dos doentes, seu tratamento, conduta dos
dar prestar assistência médica do Hospital aos que
Enfermeiros, Médicos, Cirurgioens, e de mais Em-
padecem de moléstias contagiosas.
pregados.
Artigo 38 – O Provedor no acompanhamento dos
Artigo 42 - Procurará ver igualmente, e informar-
enterros e naquellas funcções a que a Irmandade
se do tratamento dos Expostos, e da educação que
terá, por insígnia, uma vara de prata; seu lugar he
se lhe dá, quando em tempo de recebê-la.
sempre atrás da irmandade. Artigo 43 Artigo 39 – O Provedor terá hum dia de conferên-
Dará de Jóia a quantia de vinte mil
reis.
cia, em cada semana, no Consistório da Irmandade, a que assistirão o Secretário, o Thesoureiro e aque-
Capítulo Sétimo
les dos mesários que tenhão negócios a tractar ou a expor; para isso o Provedor fará avizo a Meza, do
Do Secretario
dia que pretende fazer a conferência; estas conferências poderão ser mais espaçadas, permitindo-o a pouca concorrência dos negócios, não deixando
Artigo 44 - O Secretario, alem do mais que se se
com tudo de fazer-se duas em cada mez.
lhe incumbe neste Compromisso, terá a seu cargo o lançamento das Actas, e Termos da Meza, e as con-
Artigo 40 – Nestas conferências não só se despa-
tas de Receita e Despeza, recebendo do respectivo
charão os requerimentos cujo objecto não depen-
Thesoureiro os documentos a respeito.
der da votação da Meza, mas também se decidirão aquelles negócios, e se darão aquellas providencias,
Artigo 45 - O Secretario, logo que se der a criar
que da mesma sorte exijão deliberação della; se
algum Exposto, o que lhe será annunciado pelo En-
nestas conferencias porem apparecerem negócios,
fermeiro do Hospital, procederá inmediatamente
272
ao assento delle, que conterá: 1º o dia da apresen-
Do Thesoureiro
tação: 2º seu sexo: 3º Nome: 4º raça: 5ºdia em que se dá a criar: 6º o nome da pessoa encarregada da criação: 7º dia em que esta deverá findar: para es-
Artigo 50 - O Thesoureiro he o Guarda dos Cofres
tes assentamentos haverá hum Livro próprio, e na
da Irmandade, e seu único claviculario, e por isso a
caza dos destines se lançara a verba dos que falle-
Eleição para este cargo deverá recahir sempre em
cerem, e o destino dos que se criarem.
hum dos Irmãos mais bem estabelecidos, e de notório credito, e reetidão.
Artigo 46 - Os rendimentos e as despezas propriamente da Irmandade, como serão entradas de
Artigo 51 - Ao Thesoureiro pertence arrecadar toda
Irmãos, annuaes, jóias dos Mezarios, Esmollas da
a receita da Irmandade, e do Hospital, e as pres-
Caixinha, promessas ao Senhor Jesus dos Passos;
tações com que a Fazenda Publica concorrer para
gastos das Festas, e Procissão, Suffragios pelos Ir-
este, e para os Expostos; bem como conservar e
mãos fallecidos, reparos da Igreja, e Paramentos,
guardar os Alfaias, e Paramentos da Igreja.
serão extremados, e escripturados em Livros á parte dos rendimentos e despezas propriamente do
Artigo 52 – Todas as despezas necessárias, ou seja
Hospital.
com o Culto, ou com o Hospital, e Expostas, serão authorizadas pela Meza, e feitas pelo Thesoureiro,
Artigo 47 - A Despeza com os Expostos será tam-
que entregará ao Secretário immediatamente todos
bém escripturada em hum Livro próprio para isso,
os documentos de sua despeza, para serem lança-
com as clarezas precizas.
das na forma do artigo 48.
Artigo 48 - Nenhuma despeza será lançada se não
Artigo 53 – Qualquer receita que haja de entrar
vista do Documento que a comprove.
para os cofres da irmandade, será communicada também ao Secretário, para ser lançada na forma
Artigo 49 - Sempre que não estiver presente o Pro-
do artigo 41.
vedor, o Secretario tomará a Cadeira da Presidência, e dirijira todos os negócios da Irmandade.
Artigo 54 – He da inteira competência de Thesoureiro a administração dos terrenos e cazas, da ir-
Capitulo Oitavo
mandade e do Hospital com aluguel e reparos.
273
Artigo 55 – O Thesoureiro, quando deixar o cargo,
jão inválidos, se continuará o pocerro.
se lhe não levará em conta divida alguma proveniente de alugueis de cazas e terrenos.
Artigo 59 - O Mordomo dos expostos procurará, logo que alguns delles completar a idade de dez
Capítulo Nono
annos, engajei-o com algum mestre d’arte, ou officio que lhe dê applicação, e o sustento: este enga-
Do Mordomo dos Expostos
jamento, em que o mestgre se obrigarà a sustentar s sentir o exposto, apresentai-o prompto no officio,
Artigo 56 – Sendo a criação dos Expostos huma das
ou arte, dentro de hum tempo dado, será feito por
maiores obras de Misericórdia que a Irmandade do
escripto, e perante o juiz d’Orfãos. Mas conhecen-
Senhor Jezus dos Passos da Cidade de Desterro tem
do-se que o Exposto tem talento, e propensão para
a exercitar, a Eleição do Mordomo dos Expostos,
seguir o estudo das Ciências, o Mordomo o proporá
deverá rechair sempre em hum Irmão, que é gran-
á primeira Autoridade da Província para que o re-
de probidade bem conhecida humanidade, zelo, e
commende à Assemblea Legislativa Provincial.
interesse e pelo amor dos homens, pois que tem a
desempenhar deveres paternaes para com os filhos
Artigo 60 - Pelo que pertence as Expostas, o Mor-
da Irmandade, que assim devem ser considerados
domo as arranjará a cargo, ou a serviço de alguma
os Expostos sob sua administração.
família honesta, que se queira encarregar da sua manutenção, e educação: para isso, e para o en-
Artigo 57 – Ao Mordomo dos Expostos pertence
gajamento de que trata o artigo antecedente, se-
o particular administração delles; cuidará em que
rão preferidas as pessoas, que tiverem crindos os
seja tratados com todo o desvelo e caridade; visi-
expostos,quando idôneas.
tará amiúdo daí em diante não dá pra entender o resto da frase – só algumas palavras.
Artigo 61 - Em todo o caso, o Mordomo fará muito por caxar as Expostas logo que chegarem á idade
Artigo 58 - Os Expostos serão considerados taes,
própria, agenciando-lhes algum Dote, ou Esmolla,
para serem soccorridos até que sejam engajados
para principio do seu estabelecimento.
para aprenderem arte, ou ofício, fazendo-se possíveis diligências para que desde a idade de seis anos
Artigo 62 - O casamento, neste cazo será proposto
freqüentem as escollas de Instrucção primária. A
em Meza, e resolvido a vinta das informações, que
Aquelles, porem que por qualquer defeito fizico se-
o Mordomo deve dar do marido, que se propõe a
274
Exposta, o qual deverá ser homem de bons costu-
cravos.
mes, e que tenha bens, officio, ou emprego de que se mantenha.
Artigo 66 - De comum acordo, harmonia e boa in-
telligencia com o Thesoureiro, farão quanto estiver
Artigo 63 - Acontecendo que o casamento seja ar-
ao seu alcance para que os enfermos não experi-
ranjado, pela mesma Exposta, e seu futuro marido,
mentem a menor falta em seu tratamento, e curati-
fica o Mordomo exonerado da agencia do Dote, ou
vo, cortando pela raiz os abuzos, que o tempo tenha
Esmola, que então será dada pela Meza, quando a
introduzido, e propondo a Meza aquellas inova-
Irmandade esteja em estado de poder faze-la; mas
çõens, que julgarem úteis a Administração.
sempre inquirirá da conducta, qualidades, e estado do Noivo para informar a Meza, quando este reque-
Artigo 67 - Farão que se lance no inventario as rou-
rer o consentimento.
pas e moveis com que se argumentarem os bens do Hospital: e bem assim, que se sabida, em tempo, a
Artigo 64 - A Exposta que se cazar sem consenti-
quanto se inutilizar.
mento da Meza, perde o direito a qualquer Dote, ou Esmolla, por parte della.
Artigo 68 - De acordo com o Thesoureiro farão os pedidos de tudo quanto for necessário ao Hospital,
Capitulo Décimo
como roupas, moveis, utencilios, concertos &, que
Dos Irmãos de Meza
levarão ao conhecimento da Meza para esta julgar a maneira, e quantidade que se deve comprar, ou
Artigo 65 - Os vinte e quatro Irmãos de Meza, além
mandar fazer.
da obrigação de pedirem esmollas dous em cada meza, visitarão o Hospital nas epochas, e pelo tem-
Artigo 69 - Os Irmãos de Meza darão de Jóia a
po que o provedor marcar; e porque a prosperidade
quantia de trez mil reis.
deste estabelecimento depende da rigorosa e fiel observância do seu Regimento; para esta se obter,
Capitulo Undécimo:
cimpre que os Mezarios visitadores empreguem toda a attenção nestas visitas, e informem ao pro-
Das Mordomas do Culto Divino
vedor quanto observarem, e julgarem útil ao bom regimen ecconomico da caza, bem como do que for
Artigo 70 - As Mordomas do Culto Divino darão a
relativo ao comportamento dos Empregados e Es-
jóia de dous mil reis, ou mais segundo a sua devo-
275
ção , e cuidarão , huma em cada mez , da lavagem ,
as quantias de que necessitar para as despezas pre-
e engomagem da roupa da Igreja.
cisas ao desempenho de seus encargos.
Capitulo Duodécimo
Capitulo décimo terceiro.
Do Procurador
Do Capellão.
Artigo 70 - Haverá hum Procurador , que cuidara
Artigo 76 - A Irmandade terá hum Capellão, a quem
dos feitos da Irmandade , e perceberá pela agencia
dará moradia no Hospital, ração diária, ordenado
as vantagens , que a Meza lhe estipular.
annual, e as Missas livres, excepto as das Sextas feiras, que serão sempre da sua obrigação e pela
Artigo 72 - A nomeação do Procurador compete
intenção dos Irmãos, e Benfeitores da Irmandade,
ao Provedor com o voto da Meza: deverá recahir
vivos, e defuntos.
em pessoa de notória probidade , e bom conceito , que será conservada no emprego em quanto bem
Artigo 77 - O Capellão, além dos outros deveres que
servir.
lhe são impostos neste compromisso, confessará os enfermos em artigo de morte, administrando-lhes
Artigo 73 - Logo que conste ao Procurador que falle-
os Sacramentos da Eucharistia, e extremaunção; as-
ceu alguém com Testamento se dirigirá ao Cartório
sistirá a seus íltimos momentos, e os encommenda-
competente a tomar conhecimento das disposições
rá, no acto de serem sepultados.
testamenteiras e quando alguma seja em beneficio da Irmandade , ou Hospital , procederá nas diligen-
Artigo 78 - As Missas, que segundo este Compro-
cias precisas para a verificação do Legado.
misso se houverem de dizer em sufrágio pelos Irmãos, serão dadas ao Capellão.
Artigo 74 - O Procurador não poderá propor acção alguma nos da Irmandade e Hospital, sem especial
Artigo 79 - O Capellão quando impedido, porá em
authorisação da Meza, a quem dará conta, em todas
seu lugar hum Sacerdote para suprir o seu impedi-
as Sessões, do estado das cauzas, e seu andamen-
mento, debaixo das regras, e obrigaçoens imposto-
to.
as neste Compromisso, no que for possível.
Artigo 75 - O Procurador receberá do Thesoureiro
Capitulo décimo quarto
276
cissão dos Passos, na forma que se acha estabeleDo Andador.
cida.
Artigo 80 - O Andador da Irmandade será sempre
Artigo 84 - Além das Festas e Procissão acima ditas,
nomeado d’entre os Irmãos pobres, e conservado
que infalivelmente se farão todos os annos, poderá
emquanto bem servir; terá moradia nas cazas do
o Provedor, ou Meza, celebrar os Officios da Sema-
Hospital, e huma ração igual a dos Enfermeiros, e
na Santa, e outras quaesquer Festas do anno com
ordenado proporcionado.
tanto que o facão á sua custa.
Artigo 81 - He do dever do Andador servir de Sa-
Capitulo décimo Sexto
christão na Igreja, fazer os avizos que lhe forem ordenados pela Meza, Provedor, e secretário; abrir
Das disposições Geraes.
com a campanhia sempre que se houver de chamar os Irmãos para algum acto da Irmandade; acompa-
Artigo 85 - Satisfeitas as disposições dos artigos
nhar com a companhia adiante menor Irmandado
82,83, as sobras serão aplicadas às despezas do
todas as vezes que ella subir em Corpo, e tirar Es-
Culto, concertos, e reparos, e quando estes não fo-
mollas para o Hospital todos os Domingos.
rem de urgencia, se applicarão-lhes sobras as despezas do Hospital, Expostos e obras Pias.
Capítulo décimo quinto Artigo 86 - A cobrança das dividas activas da IrDas Festas da Obrigação da Irmandade.
mandade, e o pagamento das passivas, será hum dos primeiros deveres da cada Meza, logo depois
Artigo 82- A Mesa da Irmandade festejará o seuO-
de empossada, havendo-se por mui recommendado
rágo o Senhor Jesus dos Passos, no dia da Invenção
este serviço.
da Santa Cruz com Missa Cantada, Sermão ao Evangelho, e Te Drum Leudamus (obtendo para isso as
Artigo 87 - No dia da posse da nova Meza se pu-
precisas licençs) e Sermão a noite. Estas solemni-
blicará o Balanço da Receita e Despeza anno fin-
dades terão lugar no todo, ou em parte, segundo as
do, affixando-se na Porta da Igreja, e nos logares
possibilidades da Irmandade.
públicos da Cidade, ou inserindo-se nos Jornais da mesma.
Artigo 83- No Domingo da paixão, terá lugar a Pro-
277
Artigo 88 - No dia da Invenção da Santa Cruz, e no
Artigo 93 - A acquisição por compra de qualquer
da Procissão dos Passos, estará o Hospital ornado
Próprio, ou outros bens moveis, e de raiz, que te-
e aberto para receber as visitas dos fiéis, que a elle
nhão de fazer parte do Patrimônio do Hospital, não
se quizerem dirigir, estando o Provedor e Mezarios
sera feita sem voto das duas terças partes dos Ir-
presentes para manterem a ordem, e o decoro que
mãos Mezarios, e attendendo-se a que por seme-
deve reinar em semelhantes ocasiões.
lhante compra não venha a faltar o dinheiro preciso para as despezas do Hospital, e dos expostos.
Artigo 89 - O Casamento das Expostas será celebrado com assistência do respectivo Parocho, e licença
Artigo 94 - Os suffragios pelas almas dos Irmãos,
do ordinário; e terá logar sempre que for possível,
que falescerem, consistirão em seis Missas de Cor-
no dia da Invenção da Santa Cruz.
po Presente.
Artigo 90 - Haverá no Hospital hum Regimento fei-
Artigo 95 - A Meza mandará celebrar todos os an-
to pela Meza da Irmandade, em que com especiali-
nos huma Capela de Missas por intençõa dos vivos,
dade se trate dos deveres da cada hum empregado
e defuntos.
do mesmo Hospital. Artigo 96 - O Irmão que fallecer, e que for sepultarArtigo 91 - Este Regimento não poderá ser alterado
se em Jazigo que não seja da Irmandade, fica priva-
em nenhuma das suas disposições, ou sejão admi-
do do acompanhamento da mesma Irmandade, pois
nistrativas, econômicas, ou penaes, se não passa-
que de longo tempo he esta a pratica estabelecida.
dos cinco annos, e com a approvação das duas terças partes dos Irmãos Mezarios, e assim d’ahi em
Paço da Assemblea Legislativa da Província de San-
diante.
ta Catharina em 27 d’Abril de 1840.
Artigo 92 - Os Próprios, e quaesquer outros bens
Miguel de Souza Mello e Alvim - Presidente da As-
moveis, ou de raiz, que fizerem o Patrimônio do
sembléia Legislativa Provincial.
Hospital, ou sejão adquiridos por Esmolla e Legados, ou sejão comprados pela Irmandade, não pode-
Silvério Candido de Faria - Primeiro Secretário.
rão em caso algum ser alienados sem precendencia de Resolução Legalutiva da Assemblea Provincial.
278
279
O CemitĂŠrio da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos
280
281
O CemitĂŠrio da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos
282
283
Depoimentos O que se lerá neste belo livro é a materialização de
Luiz Henrique da Silveira
tudo o que foi arrolado acima, inclusive a gênese
Governador do Estado de Santa Catarina e membro
de uma grande tradição – a do Senhor Jesus dos
da Irmandade
Passos.
Em seu magistral "Dom Quixote", Cervantes sinteti-
Trata-se de um relato, ao mesmo tempo, preciso e
za toda a magnitude envolvida no, aparentemente
apaixonado, de um dos símbolos coletivos da gente
simples, ato de se registrar e analisar fatos históri-
catarinense. Seu objeto de estudo tem significado
cos: “A história é êmula do tempo, repositório dos
exemplar na trajetória da sociedade desterrense,
fatos, testemunha do passado, exemplo do presente,
florianopolitana ou mesmo catarinense.
advertência do futuro”. Quando professor de História do Colégio Coração de Jesus, em Florianópolis,
A recuperação de sua história, bela e trágica, e de
tinha essa definição como norte do meu nobre mis-
seus personagens, altruístas uns, pios e devotos ou-
ter daqueles tempos.
tros, revela boa parte do nosso passado e testemunha os modos de vida, as relações sociais, as cren-
Outro que rende homenagens à História, mas com
ças e valores dos grupos sociais que construíram e
tintas tipicamente eslavas, é o poeta russo Alexan-
deram forma ao nosso Estado.
der Pushkin, para quem “o respeito pelo passado é Esses fragmentos do passado, que dão relevo a ele-
o traço que distingue a instrução da barbárie".
mentos de uma paisagem que, para o bem e para Benedetto Croce, o grande filósofo italiano, revela
o mal, sofreu profundas modificações ao longo do
seu dom ubíquo de dar sentido às coisas ao dizer
tempo, funcionam como “chaves” para a reconsti-
que “a cultura histórica tem o objetivo de manter
tuição e entendimento das sucessivas camadas da
viva a consciência que a sociedade humana tem do
ocupação humana e dos remanescentes que chega-
próprio passado, ou melhor, do seu presente, ou
ram até nós.
melhor, de si mesma”. Esse conceito de mudança e continuidade é essenJá o escritor anglo-americano Henry James dizia
cial para a compreensão da natureza da interação
ser “preciso muitíssima história para forjar uma pe-
entre o homem e o seu meio ambiente físico e cul-
quena tradição”.
tural, bem como para dar sentido à sua existência e significado às suas ações presentes, relativizando-
284
as e redimensionando-as, dando-lhes consistência
materiais e simbólicos. A primeira dá sustento; a
histórica e desmediocrizando o seu cotidiano.
segunda, sentido”.
Num país castigado por tantas carências básicas
Apesar de ter bem claras as suas prioridades, vol-
(ou vitimado por catástrofes, como a que acaba de
tadas, como não poderia deixar de ser, à inclusão
se abater sobre nós, catarinenses), não é raro ou-
social e à emancipação do cidadão catarinense, o
vir críticas ao apoio estatal às artes, manifestações
Governo do Estado não descuida do apoio à difusão
consideradas elitistas. A esses críticos, pelo menos
dos bens simbólicos, patrimônio imaterial que nu-
duas belas respostas podem ser dadas. A dos Titãs:
tre a alma e dá sentido ao futuro.
“A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”, e a do escritor Frei Betto: “A vida
É por isso que apoiamos esta iniciativa e a ela nos
brota de duas lavras: a da enxada e a das artes, bens
associamos para viabilizar essa belíssima obra.
285
Depoimentos Dario Berger Prefeito Municipal de Florianópolis
O sonho de morar numa cidade perfeita, limpa e servida, tanto de belas construções quanto de bons espaços públicos, habita o imaginário de qualquer pessoa. Quem não sonha cercar seus olhos de beleza, de tal forma que os trajetos de ida e vinda da vida cotidiana sejam enriquecidos por estas vivências. Igualmente é anseio de todo cidadão possuir, ao alcance da sua necessidade, os serviços que garantem a manutenção da vida e da dignidade.
A interferência na paisagem cotidiana, presente desde que o homem passou a desbravar as matas e construir as suas urbes tem sofrido modificações constantes, a medida que a compreensão humana foi migrando para novas necessidades e se sofisticando com novas descobertas.
Um dos fatores que mais incrementaram e modificaram este processo foi o atendimento às necessidades básicas das comunidades, quesito no qual se destaca a oferta de atendimento na área da saúde. Dentro deste contexto, a nossa cidade de Florianópolis conta com um estabelecimento que, além de ser destaque estadual em qualidade e otimização
Cometa raro que traça um brilho no cosmo quan-
de processos, é um dos grandes orgulhos arquitetô-
do da sua passagem, o “nosso” Imperial Hospital de
nicos e humanísticos da capital do Estado de Santa
Caridade tem traduzido no atendimento dedicado
Catarina: o Imperial Hospital de Caridade.
e humanitário à toda a comunidade a sua imensa
286
recurso, modificou definitivamente a face da cidade deixando, de maneira indelével, a sua marca.
A sociologia e a antropologia compreendem os seres humanos como entes que se defendem melhor coletivamente e assim, a idéia de organizar num livro todo este rico acervo, contar esta história de generosidade, bravura e sobrevivência é uma forma de eternizar fatos tão importantes quanto fundamentais para a compreensão mais clara da nossa sociedade.
A construção de um complexo biográfico interativo, provido de todos os suportes de segurança que a combinação binária pode proporcionar, que se baste no oferecimento de formação pedagógica, informação, trabalho, consumo e entretenimento, é um fato sociológico e tanto.
Exatamente por isto reputamos a obra como um empreendimento maduro, responsável e vital para a preservação desta nossa memória coletiva. A escritora blumenauense Christina Baumgarten, autora do trabalho cumpre, com a publicação desta obra, um ritual imutável à vida, que, bem anterior à comodidade, é uma resposta que a sociedade vai dando a necessidade de olhar a sua própria volta,
vocação para a generosidade, razão maior pela qual
avaliar seu passado, entendendo desta forma seu
foi fundado há 220 anos e permanece com suas
presente e, o que é mais importante, moldando um
portas abertas até os dias atuais. Atendendo as ne-
novo futuro!
cessidades de uma comunidade ingente de todo o
287
Depoimentos José Carlos Pacheco
A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos desde sua
Presidente do Tribunal de Contas do Estado e 1º
vive uma história rica em acontecimentos especiais.
Vice-Presidente da Irmandade do Senhor Jesus dos
Sua trajetória se confunde com a própria história do
Passos
Estado de Santa Catarina. Uma história de constru-
Fundação em 1º de Janeiro de 1765 (244 anos),
ção, trabalho, seriedade, ética e compromisso com Felicito aqueles que tiveram a oportunidade de ler
a vida religiosa e da saúde do povo catarinense.
a presente obra que relata a história bicentenária de uma das mais antigas e prósperas instituições de
É preciso, portanto, reconhecer sua respeitabilida-
Santa Catarina, a Irmandade do Senhor Jesus dos
de - construída pela tenacidade, visão futurista, me-
Passos e o Hospital de Caridade.
didas concretas e interesses administrativos legíti-
288
mos de gerações de homens e mulheres de talento,
do passado ou mesmo projetar o futuro apenas
que, com ousadia e dedicação, lançaram as bases
com histórias.
sólidas para que o Imperial Hospital de Caridade, seja hoje forte, independente, respeitado, ausente
O Imperial Hospital de Caridade é fruto do pionei-
de velhos paradigmas e legitimado pela credibilida-
rismo e da determinação dessas pessoas que, in-
de no ramo hospitalar no Estado.
teragindo, encontraram as soluções para manter em funcionamento até os dias atuais essa magní-
Só é possível preservar a história de uma institui-
fica obra, patrimônio do povo de Santa Catarina e
ção e suas várias formas de manifestação conhe-
que dela usufrui excelente assistência hospitalar,
cendo-a e fomentando a sua disseminação. Olhar
através de uma competente equipe médica e enfer-
para o passado, entendê-lo e reconhecer sua rela-
magem com equipamentos de ponta no mercado
ção com o contexto atual é valorizar a construção
mundial.
de um mundo cada vez melhor para as próximas
Ser membro da Irmandade do Senhor Jesus dos
gerações.
Passos, mantenedora do Imperial Hospital de Caridade, é ter consciência e responsabilidade por
A procissão do Senhor dos Passos, realizada há 242
aquilo que por ele fazemos e muito mais, por aquilo
anos, é a maior e mais antiga e tradicional celebra-
que não fazemos. Da doação que disponibilizamos
ção de religiosidade popular do Estado. Por esta
como indivíduos dotados de fraternidade para com
razão, é a primeira manifestação cultural registra-
uma instituição filantrópica, o beneficiado é o indi-
da como patrimônio imaterial de Santa Catarina. O
víduo mais carente, precisando de uma sociedade
registro equivale a um tombamento aprovado pelo
mais justa e igualitária.
Conselho Estadual de Cultura e instituído pelo Ministério da Cultura do Governo Federal.
Esta publicação é uma pesquisa com fundamentação histórica. Com base na História presente, res-
O Imperial Hospital de Caridade, título oficial de
gata o passado e olha para o futuro. A leitura desta
que é possuidor, tem brilhante história de sucesso
obra é um passeio pelas reminiscências despertan-
e orgulho através de seus 218 anos de ininterrup-
do curiosidade e proporcionando cultura acerca da
tas atividades (Século XVIII) com o Irmão Joaquim
instituição que guarda, em cada momento, uma his-
Francisco do Livramento e Joana de Gusmão. Estes
tória e uma projeção para o futuro.
sim são heróis e mitos. Porém, não podemos viver
289
Depoimentos da Capitania por José da Silva Paes, a Irmanda-
Carlos Humberto Corrêa
de ajudou a receber os contingentes açorianos
Presidente do Instituto Histórico e Geográfico
transferidos para ilha, olhou assombrada a inva-
de Santa Catarina
são dos espanhóis em 1777, teve conhecimento e aplaudiu da transferência da Família Real para o
Muito poucas instituições públicas identificam-
Brasil e o estabelecimento do Reinado nestas ter-
se, ao longo de seu transcurso histórico, tão bem
ras sul-americanas e da Independência logo após.
com a comunidade em que se inserem, sejam elas
Seus Irmãos, membros da Irmandade, festejaram a
quais forem os seus objetivos e dimensões, quanto
chegada de D. Pedro I na cidade e, como os demais
o Imperial Hospital de Caridade de Florianópolis
catarinenses, também aplaudiram a Abdicação e a
com a capital catarinense. Esta dificuldade torna-
volta do Imperador à sua terra natal. D. Pedro II
se ainda maior quando a instituição é uma casa de
visitou o Hospital em 1854 e o presenteou com o
saúde umbilicalmente ligada a um templo e a uma
título de Imperial Hospital de Caridade.
irmandade religiosa. A pequena vila deixou de ser vila e passou a ser O Imperial Hospital de Caridade e a Irmandade
cidade que trocou o nome de Nossa Senhora do
do Senhor Jesus dos Passos, entretanto, são, po-
Desterro para, simplesmente, Desterro. Suas prin-
demos dizer sem erro, “a cara de Florianópolis” e
cipais lideranças, agora, como no período ante-
talvez nenhuma outra se identifique mais com a
rior, faziam questão de participar da Irmandade
cidade e com o povo que nela reside.
e o título de Provedor era honra maior para quem o portava somente concedido às mais altas perso-
Isto se deve ao fato de a Irmandade ter sido criada
nalidades.
em meados do século XVIII, em 1765, na então
Proclamada a República, o Imperial Hospital de
vila de Nossa Senhora do Desterro, da Capitania
Caridade não perdeu sua dignidade e a Irmandade
da Ilha de Santa Catarina, e desde lá ter acompa-
do Senhor Jesus dos Passos continuou a ser sím-
nhado seguidamente a evolução política, social
bolo de status para quem dela participava. Da pe-
e econômica da pequena comunidade de então,
quena igreja, do alto da colina em que havia sido
que resultou na sociedade da capital catarinense
fundada em 1762 pela beata Joana de Gusmão,
de hoje. A Irmandade do Senhor Jesus dos Pas-
seus fiéis assistiram, temerosos, em 1893, a en-
sos praticamente nasceu com a Capitania. Criada
trada da frota revolucionária que invadia a cida-
apenas vinte e seis anos depois da sua instalação
de e a transformava em capital de uma república
290
revolucionária. Era a segunda invasão naval que
inserido e com quem tem convivido durante estes
assistiam sem, contudo, se abalarem. Se em 1777
mais que duzentos anos, mas expressa também, e
a cidade fora invadida por estrangeiros espanhóis
principalmente, a evolução das várias etapas da
que os respeitaram, não seria agora, por irmãos
história da Medicina em Santa Catarina e dos que
brasileiros, que haveriam de ser tomados pelo
a ela se dedicaram durante séculos. Inicialmente
medo.
era uma medicina colonial, a bem da verdade, an-
Os homens não eram mais os mesmos de um sé-
terior à Medicina científica, mas que com certeza
culo antes. Haviam desaparecido várias gerações
curou muita gente ou diminuiu o sofrimento de
que ali mesmo, nos fundos do Hospital, eram en-
outros que não foram poucos. O Hospital já serviu
terradas. Os fiéis, estes sim eram precisamente os
para práticas conservadoras no seu início, para a
mesmos, receosos, todavia destemidos diante dos
aplicação de medicinas que iam sendo descober-
invasores, pois se sentiam protegidos pela cente-
tas aos poucos e, mais tarde, viu surgir os remé-
nária imagem barroca do Senhor Jesus dos Passos
dios, as vacinas e os antibióticos. Inicialmente apa-
que desde 1764 encontrava-se abrigada na pe-
relhou-se de instrumentais primitivos para depois
quena igreja da colina.
se adaptar a aparelhos os mais avançados. Não se descuidou do progresso científico e chegou à era
E esta proteção permitiu que a Irmandade e o Hos-
da informática. Em 1962 serviu como Faculdade
pital passassem o período republicano sem pro-
de Medicina onde se formaram competentes pro-
blemas, até 1994, quando trágico incêndio tomou
fissionais.
conta do Hospital, deixando, porém, a igreja e suas
Mas tudo isto precisava ser contado e registrado,
imagens principais, intactas. Todo o povo foi con-
este, finalmente, é o objetivo desta publicação que,
vocado e ajudou a reerguer aquela casa de saúde
com as ilustrações que comporta, passa a ser um
tão estimada. Por isso, o Imperial Hospital de Ca-
registro expressivo da trajetória de um extenso
ridade e a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos
caminho que jamais terá um fim e que a cada pe-
são identificados com Florianópolis, porque com a
queno passo diário, completa a realização de um
cidade cresceram, tiveram os mesmos sofrimentos
sonho.
e com ela se tornaram adultos à custa de muitas
Parabéns aos organizadores e editores que apron-
lágrimas e alegrias.
taram uma obra necessária e à sociedade catarinense que possui uma instituição como esta. Para-
O Imperial Hospital de Caridade, porém, não re-
béns a todos nós.
presenta somente a sociedade na qual ele tem se
291
O futuro Em futuro próximo, o Imperial Hospital de Caridade, obedecendo a uma estratégia arrojada e adaptada às necessidades da sociedade neste terceiro milênio, representará o que há de mais atualizado em tecnologia e descobertas científicas voltadas para a longevidade e qualidade de vida. Isto tudo sem esquecer o atendimento humano e personalizado, inspirado na diretriz de proporcionar à população carente, o acesso aos procedimentos de alta complexidade. Todos os que lá atuam trazem bem clara a lembrança das inesquecíveis personalidades da Beata Joana de Gusmão e do Irmão Joaquim, abnegados benfeitores cuja aura de pureza e dedicação paira ainda sobre o abençoado outeiro da Bela Vista onde, um dia, ousaram sonhar com um mundo melhor. Este mundo está sendo construído, pelas mãos de cada colaborador do Imperial Hospital de Caridade que, acima de tudo, honra esta herança de doação e bondade sublimes!
292
293
Glossário de termos específicos (para entender a história)
Alfaia – paramentos de igreja.
Casula – vestimenta sacerdotal que se põe sobre a
Alva – espécie de túnica, veste talar de pano bran-
alva e a estola.
co.
Carmesim – de cor vermelha, muito viva.
Amem – espécie de tecido resistente e de tramas
Cinteiro – faixa utilizada antigamente para pres-
fechadas.
sionar a área abdominal dos recém-nascidos, a fim
Arcaz – grande arca com gavetões, usada em sa-
de manter o umbigo em sua cavidade.
cristias, para guardar vestes e objetos sagrados.
Consistório – assembleia de cardeais presidida
Amito – é uma das vestes sagradas usadas na litur-
pelo papa. Também usado para a denominação de
gia romana. É um retângulo de tecido branco, nor-
lugar onde se reúnem Irmandades.
malmente de linho ou algodão e com uma cruz ao
Compromisso – obrigação ou promessa mais ou
meio, tendo fitas ou cordões em duas das pontas.
menos solene, acordo entre litigantes pelo qual se
Serve para colocar à volta do pescoço, atando-se no
sujeita à arbitragem a decisão de um pleito. No caso
peito com as fitas. Todos os ministros que vestem
das Irmandades, é o termo utilizado para designar
alva, podem vestir o amito. O seu uso é obrigatório
o Estatuto.
sempre que a alva ou túnica não cubra totalmente a
Corporais – pano sobre o qual o sacerdote põe o
roupa que se usa por debaixo na zona do pescoço.
cálice e a hóstia no altar.
Baeta – espécie de tecido simples e grosseiro.
Côvado – Antiga unidade de medida de compri-
Balandrau – antiga vestimenta de capuz e mangas
mento equivalente a três palmos, ou seja, 0,66m.
largas, roupa usada por algumas irmandades em
Damasco – tecido de seda lavrada, que se fabricava
cerimônias religiosas.
em Damasco.
Braça – antiga unidade de comprimento, equiva-
Dalmático – paramento que diáconos e subdiáco-
lente a 2,20 m, unidade de comprimento do siste-
nos vestem sobre a alva (túnica ).
ma inglês, equivalente a cerca de 1,80m.
Enfiteuta – pessoa que tem ou recebe por enfiteuse
Burel – tecido grosseiro de lã utilizado para confec-
o domínio útil de um prédio.
ção de roupas religiosas, hábito de frade ou freira.
Enfiteuse – direito real alienável e transmissível ao
Cálix – cálice em latim
herdeiro e que confere a alguém o pleno gozo do
Canequim – tecido fino empregado na confecção
imóvel mediante a obrigação de não deteriorá-lo e
de vestes infantis.
de pagar um foro anual, em numerário ou em fru-
Cassa – tecido muito fino, de linho ou de algodão.
tos, também denominado aforamento.
294
Espórtula – gorjeta, esmola
Ostensório – custódia onde se ostenta a hóstia
FISICATURA-mor - órgão que fiscalizava e regu-
consagrada.
lamentava as profissões ligadas à “Arte de Curar”
Pálio – manto, capa.
e pertencia ao Estado. Foi criada em Portugal, em
Pataca – moeda antiga de prata, do valor de 320
1521 e tinha delegados nas colônias. A Fisicatura-
réis – quantia equivalente a essa moeda.
mor expedia Licenças e Cartas que davam autoriza-
Patena – disco circular, de ouro ou de metal doura-
ção para as pessoas exercerem atividades de Mé-
do, que serve para cobrir o cálice e receber a hós-
dico, Boticário, Cirurgião, Sangrador, Partejador e
tia.
Curandeiro. Os Licenciados eram autorizados para
Quadro – aquilo que tem a forma de um quadrilá-
curar pela medicina prática. Foi extinta por volta
tero (4 lados)
de 1828 com a criação das Escolas de Medicina em
Réis – Réis era o plural do nome das unidades mo-
Salvador – BA e no Rio de Janeiro – RJ.
netárias de Portugal, do Brasil e de outros países
Frontais – tela ou ornato que reveste a frente do
lusófonos, que também é denominada como real,
altar, frente do altar.
sendo utilizada desde o período colonial até o ad-
Guião – pendão ou estandarte que vai à frente de
vento de moedas substitutas. Conto de réis é uma
procissões ou irmandades.
expressão adotada no Brasil e em Portugal para in-
Lazareto – edifício para quarentena de indivíduos
dicar um milhão de réis. Sendo que um conto de
com suspeita de contágio.
réis correspondia a mil vezes a importância de mil
Ló – tecido fino como escumilha.
réis.
Manutérgio - toalha com que o sacerdote limpa as
Ruão –tecido de linho que se fabricava em Ruão
mãos depois de lavá-las.
(Roen, na França)
Missal – livro que encerra as orações da missa.
Resplendor – objeto decorativo utilizado em ima-
Mordomo – administrador dos bens de uma casa,
gens santas.
uma irmandade ou de uma confraria.
Relicário – recinto especial, urna ou cofre próprio
Naveta – vaso pequeno, com o feitio dum barco,
para guardar as relíquias de um santo.
onde nas festas de igreja se serve o incenso para
Sapadores – soldado que executa trabalhos de
os tributos.
sapa – abertura de trincheiras, fossos ou galerias.
Orago – oráculo, templo onde se dão oráculos.
Turíbulo – vaso onde se queima incenso nos tem-
Também empregado para Imagens às quais se atri-
plos, incensário.
buem poderes extraordinários.
295
Linha do Tempo 29 de abril de 1750 – casamento de Tomáz Francisco da Costa e Mariana Jacinta da Vitória, pais do Irmão Joaquim, na Vila do Desterro;
1688 – nascimento de Joana Gomes de Gusmão, em Santos/SP;
22 de março de 1761 – batismo de Joaquim F. da Costa;
16 de março de 1762 – Joana de Gusmão recebe em doação, de André Vieira da Rosa, dez braças em quadro de um terreno para construir a Capela do Menino Deus e inicia a sua construção;
296
1753 – Inicia-se a obra de construção da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Desterro
20 de março de 1761 – nascimento de Joaquim Francisco da Costa;
1756 – Joana de Gusmão chega à Vila do Desterro já vestindo o hábito da Ordem Terceira da Penitência; Neste ano a população da Vila do Desterro estava assim constituída: 1.084 casais das ilhas, 3.421 filhos das Ilhas 1.097 casais da terra, 3.446 filhos da terra
1764 – Chegada da imagem do Senhor dos Passos à Vila do Desterro. Procedente da Bahia e com destino ao Rio Grande do Sul;
297
Linha do Tempo 1765 – Criação e instalação da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos com 24 participantes;
1766 – Acontece a primeira procissão oficial do Senhor Jesus dos Passos, já com a estátua oficial, “adquirida” ao capitão do navio que a transportava;
25 de fevereiro de 1777 – Os espanhóis invadem e se apoderam da Vila do Desterro, apenas um dia após a morte do Rei de Portugal, D. José I, que foi sucedido pela filha Maria I;
Dezembro de 1769 – inauguração da Capela do Senhor Jesus dos Passos anexa a do menino Deus;
298
3 de julho de 1767 – Permissão dada à Irmandade para construir uma capela anexa a do menino Deus, a fim de alojar a estátua do Senhor Jesus dos Passos; Admissão das primeiras três mulheres na Irmandade, entre elas Dona Joana de Gusmão, demonstrando seu caráter não discriminatório desde a origem;
27 de julho de 1768 – inicio da construção da Capela do Senhor Jesus dos Passos;
1768 – Neste ano foram introduzidas na procissão as seguintes práticas: representação do lenço com o rosto de Cristo no caminho do calvário, música e os tradicionais cartuchos de amendoim coberto com açúcar para os anjos;
299
Linha do Tempo
16 de novembro de 1780 – Falecimento de Joana de Gusmão 19 de outubro de 1781 – A posse e guarda da Capela do Menino Deus é entregue oficialmente à Irmandade do Senhor Jesus dos Passos;
1781 – Joaquim Francisco da Costa muda seu nome para Joaquim Francisco do Livramento, numa homenagem à Nossa Senhora do Livramento e vai para o Rio de Janeiro, a fim de entrar na Ordem Franciscana; do Rio vai a Portugal e retorna em 1782 para Desterro;
300
1779 – Irmão Joaquim se torna responsável pela lâmpada do Senhor Jesus dos Passos na Capela do Menino Deus, tarefa que mantém com absoluta integridade e lisura até outubro de 1781; 1780 – Construção da nova sacristia da Capela do Senhor Jesus dos Passos;
03 de novembro de 1782 – A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos envia um requerimento a Rainha D. Maria I, solicitando autorização e recursos para a construção de um hospital na Vila do Desterro;
05 de julho de 1782 – A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos institui a “Caridade dos Pobres”, ordem para a prática oficial da esmola em nome dos pobres e doentes da Vila do Desterro; esta foi a primeira iniciativa oficial em prol do cuidado com a saúde da população carente da Vila;
301
22 de janeiro de 1784 – Morre o Capitão Francisco José Ferreira, provedor
Linha do Tempo 11 de novembro de 1783 – Morre o Irmão
do exercício 1782/1783, que foi o responsável pelo estabelecimento da assistência aos pobres como objetivo primeiro e principal da Irmandade,
Vicente Ferreira Victório e deixa como legado
atendendo-os em suas necessidades,
à Irmandade ¾ da sua botica;
principalmente nas doenças;
1º. De janeiro de 1789 – início das atividades do Hospital, com a denominação de Jesus, Maria, José. Houve o recolhimento dos doentes que estavam sendo tratados em suas casas às expensas da Irmandade;
Janeiro de 1790 – Viagem do Irmão Joaquim
a
Portugal,
levando
um
03 de janeiro de 1792 – A Irmandade recebe
requerimento à Rainha D. Maria I a
uma carta contendo Decreto de Sua Majestade
respeito do Hospital da Caridade dos
D. Maria I concedendo uma subvenção anual de
Pobres de Florianópolis;
300 mil réis ao Hospital da Caridade dos Pobres da Vila do Desterro;
302
07 de agosto de 1787 – Tomáz Francisco da Costa, Tesoureiro da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e pai do Irmão Joaquim apresenta à Mesa Administrativa da entidade uma relação de esmolas “tiradas” pelo filho, o Irmão Joaquim, para a construção do hospital da Irmandade; ao mesmo tempo declara abraçar a tarefa da construção do Hospital;
08 de junho de 1788 – Despacho do Vice-rei Luiz de Vasconcelos, concedendo terras adjacentes as de André Vieira da Rosa, que já as havia doado desde a construção da Capela de D. Joana, para a ampliação das obras do Hospital;
Julho de 1796 – falece Tomáz Francisco da Costa, principal responsável pela construção do hospital;
27 de fevereiro de 1796 – A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos recebe autorização da Igreja para colocar na Capela um sacrário com o Santíssimo Sacramento, a fim de ser administrado aos enfermos do hospital;
303
Linha do Tempo 1802 – Irmão Joaquim viaja novamente a Portugal, a fim de lutar pela Instalação de uma Santa Casa de Misericórdia em Porto Alegre, intento alcançado em 1803. A inauguração do Hospital se deu apenas em 1826;
13 de março de 1816 – O Hospital de Caridade passa a ser Hospital Militar;
Fevereiro de 1842 – A Irmandade
1840 – Primeira publicação oficial do “Compromisso”
obtém
da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital
da
Provincial
Assembleia a
permissão
Legislativa para
de Caridade, aprovado pela Assembleia Provincial
a
e sancionado pelo Presidente da Província de Santa
instalação do cemitério;
Catarina, Francisco José de Sousa Soares D´Andrea;
1843 – O Provedor Major João Antônio Lopes Gondim manda recolher numa urna as relíquias de Joana de Gusmão, que fica guardada na sacristia da Capela Menino Deus;
304
1820 – A Irmandade do Senhor Jesus dos Passos institui a “Mordomia dos Presos”, para dar especial atenção aos apenados necessitados
de
atendimento
24 de fevereiro de 1823 – Um
médico.
Decreto do Imperador Dom
Vigorou até 1896.
Pedro I altera o nome da Vila de Nossa Senhora do Desterro para Vila do Desterro;
1829 – Falece o Irmão de
12 de junho de 1828 – a
França,
primeira criança enjeitada é
quando vinha retornando
colocada na Roda dos Expostos,
para a terra natal. Contava
instituída pelo Hospital da
então 68 anos;
Caridade dos Pobres;
Joaquim Marselha,
no na
Porto
18 de junho de 1846 – Data da Carta do Imperador autorizando o Hospital de Caridade a adotar o título de Imperial.
30 de julho de 1845 – Assinada a autorização para ampliação do Hospital de Caridade e lançamento da Pedra Fundamental, com a presença do Imperador D. Pedro II, acompanhado de Dona Teresa Cristina e outras autoridades.
305
Linha do Tempo 05 de março de 1854 – Inauguração
Outubro de 1856 – Chegam ao Desterro sete freiras da Ordem de
solene das novas instalações e
São Vicente de Paula, provenientes da França, para trabalhar como
adoção oficial da nomenclatura
enfermeiras do Imperial Hospital de Caridade. Elas vêm acompanhadas
Imperial Hospital de Caridade;
dos padres lazaristas, enviados para prestar socorro espiritual aos habitantes do local;
29.08.1897 – Chegam a Florianópolis as Irmãs Albertina, Bartholomea, Camilla, 22.02.1907 – Aposição da
Carola e Georga, freiras da Ordem da
Pedra
das
Divina Providência, provenientes da
obras de ampliação sul do
Alemanha, para administrar e trabalhar
Hospital;
no Hospital de Caridade;
Fundamental
1924 – O Cemitério da Irmandade recebe a primeira ampliação;
1922 – Adoção oficial do nome “Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital de Caridade
de
Florianópolis”,
adquirindo
também o CGC (hoje CNPJ) próprio;
306
Dezembro de 1864 – É concluída a edificação denominada Casarão, que funcionava como área de 1882 – Inaugurada uma
isolamento do Hospital (lazareto);
nova etapa construtiva do Hospital de Caridade;
1892 – Assume a provedoria do Hospital de Caridade o Coronel Germano Wendhausen,
1891 – Com o advento
cujo mandato de 38 anos foi o mais longo
do regime republicano no
de toda a história do HC. Também neste
Brasil, o Hospital passa a
ano, uma lei estadual altera o nome da
denominar-se Hospital de
cidade de Desterro para Florianópolis, em
Caridade de Santa Catarina;
homenagem a Floriano Peixoto;
09 de abril de 1938 – Expedido Certificado de Entidade de fins filantrópicos ao Hospital de Caridade, pelo Conselho Nacional do Serviço Social;
1929 – é inaugurado o Pavilhão Josefina Boiteux, construído do lado direito da Capela, em homenagem e com doações feitas pelo viúvo da ilustre dama, que falecera no Rio de Janeiro, em 1927;
307
Linha do Tempo
17 de novembro de 1946 – Inauguração da nova ala com a presença do Dr. Nereu Ramos, Vicepresidente da República;
1943 – Inicia-se a construção de uma nova ala no Hospital de Caridade, com 2.160 metros quadrados em dois pavimentos, com o auxílio dos Governos do Estado de Santa Catarina e do Brasil;
1963 – Obras de ampliação no HC visam a ampliação das enfermarias para estágio dos acadêmicos, a partir da demolição do Pavilhão
04 de maio de 1962 - O
Josefina Boiteux;
Hospital é declarado como Utilidade Pública Federal;
1972 – Segunda grande reforma e ampliação do Cemitério da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos;
1974 – Criação do Serviço de Terapia Intensiva do Hospital de Caridade;
308
1950
–
Inicio
das
obras de ampliação da construção nova;
1952 – Inauguração da nova ala, construída sobre os dois andares edificados na grande obra anterior, patrocinada pelo Governo Federal;
20 de agosto de 1959 – O Hospital é declarado como Utilidade Pública Estadual;
1955 – Iniciado, pelas Senhoras Ketty Merlin e Lílian Müller, o
serviço
denominado Esperança”,
de
voluntariado
“Voluntárias que
obteria
da seu
registro oficial no dia 26 de maio de 1988;
1962 – É implantada a estrutura de ensino universitário médico no Hospital de Caridade, em parceria com a Universidade; O Dr. Damerau assume a chefia do setor de cirurgia do hospital; também neste ano são introduzidas as cirurgias vascular e cardíaca nas especialidades do IHC;
309
Linha do Tempo 1985
–
Implantado
o
serviço
Novembro de 1986 – É oficialmente iniciado o projeto de
de radioterapia no Hospital de
recuperação da memória histórica do Hospital de Caridade,
Caridade, o primeiro do sul do
em parceria com o IPUF – Instituto de Planejamento Urbano
Brasil;
de Florianópolis;
24 de outubro de 1995 – Criação da Fundação Cultural Senhor Jesus dos Passos,
tendo
como
constituidores
os membros do Conselho Consultivo 1997 – Inauguração da Biblioteca do Hospital de Caridade;
1996
–
Implantada
e inaugurada a nova lavanderia do Hospital;
da Irmandade. É doada a construção denominada “Casarão” para servir de sede à Fundação;
03 de fevereiro de 1998 – Reinauguração de diversas alas e espaços do Hospital, recuperados do incêndio de 1994;
25 de março de 1998 – Lançamento dos livros: Memorial Histórico da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, Volumes I e II, organizados pelo Professor Nereu do Valle Pereira;
310
Maio de 1987 – Concluída a catalogação da documentação histórica
do
Hospital
de
05 de abril de 1994 – Grande
Caridade;
incêndio destrói quase 80% do Hospital de Caridade;
06 de abril de 1994 – Publicada a
Declaração
de
Estado
de
15 de agosto de 1994 –
Calamidade Pública no Hospital
reabertura do Hospital após
de Caridade pelo Prefeito Sérgio
o sinistro sofrido;
José Grando;
20 de janeiro de 1999 – Inicia o processo de demarcação do Área de Preservação da Mata Atlântica pertencente à Irmandade do Senhor Jesus dos Passos e Hospital de Caridade, futuro Parque Ecológico Menino Deus;
12 de maio de 1998 – Expedido o Certificado de Utilidade Pública Municipal para o Hospital de Caridade;
311
Linha do Tempo 15 de maio de 2000 – A equipe do Hospital de Caridade realiza transplante de rins;
Abril de 2000 – é realizada uma reforma na Capela do Hospital;
30 de janeiro de 2006 – A Câmara Municipal de Florianópolis aprova Projeto de Lei que muda o limite de ocupação da área comunitária institucional (ACI) do
2006
Hospital de Caridade, permitindo assim a
reforma do Cemitério
construção do novo centro cirúrgico;
da Irmandade;
25 de outubro de 2006 – Assinatura de convênio com o Governo Estadual para a liberação de R$ 1 milhão em recursos a serem utilizados na ampliação do HC;
As obras são iniciadas, com previsão de término em 2010;
312
–
Terceira
Setembro de 2002 – Parceria entre a Irmandade do Senhor 01 de janeiro de 2001– Inauguração do Museu Sacro da Capela do Menino Deus;
Jesus dos Passos e a ACIF – Associação Comercial e Industrial de Florianópolis para um projeto de ampla divulgação da Procissão do Senhor Jesus dos Passos;
Dezembro de 2005 – Criação da Pastoral dos
Enfermos
12 de dezembro de 2002
do
– inauguração do Centro
Hospital de Caridade;
de
Memória
Professor
Henrique da Silva Fontes; 03 outubro 2004 – A Procissão do Senhor Jesus dos Passos é declarada Patrimônio Imaterial do Estado de Santa Catarina.
24 de novembro de 2006 – A Mesa Administrativa e Provedor do Hospital de Caridade lançam um Planejamento Estratégico para a instituição;
313
Linha do Tempo 01 de janeiro de 2007 – 14 de dezembro de 2006 – Sessão do Conselho
Inauguração da Ala Nossa
Pleno da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos
Senhora da Saúde, fechada
aprova o novo “Compromisso” da entidade,
havia
adequado às atuais exigências do Código Civil;
seis
meses
para
reformas;
Dezembro de 2007 – O HC comemora inúmeras obras importantes, com destaque para: mudança no sistema de fornecimento de oxigênio, reforma e ampliação do estacionamento com implantação do Edifício Garagem, implantação da Farmácia Satélite e Sala de Higienização do Refeitório e instalação do novo Acelerador Linear;
Março de 2008 – Aprovação de convênio com o BNDES, com a
HC a fim de viabilizar a construção do
interveniência
novo Bloco Intensivo;
do
BRDE,
para
financiamento de R$ 10 milhões ao
314
23 de Março de 2007 –
Abril de 2007 – Inauguração
Inauguração do novo edifício
do Espaço Especial para
garagem;
transplantados da Unidade Coronariana (UNICOR);
09 de maio de 2007 – Acontece, pela primeira vez na história da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, uma eleição com voto secreto de todos os irmãos e irmãs integrantes da Irmandade. O processo iniciou-se em dezembro de 2006 quando, em sessão plenária, foi aprovada a proposta de alteração do Compromisso da entidade, modificando o sistema de voto para eleição da Mesa Administrativa do Hospital de Caridade;
30 de abril de 2008 – É realizado o primeiro transplante de coração da cidade de Florianópolis, no Hospital de Caridade;
315
Linha do Tempo
30 de maio de 2008 – Aprovada a alteração do nome do Hospital, que volta a denominar-se Imperial Hospital de Caridade de Florianópolis;
Julho de 2008 - Inauguração do novo centro de radioterapia do HC, equipado com acelerador linear de fótons e elétrons, sendo o único no Estado de Santa Catarina. Para abrigar o novo equipamento, o prédio ficou em reformas durante oito meses. O acelerador Modelo Primus Essential, fabricado pela Siemens, foi adquirido por 400 mil dólares – repassados pelo Governo do Estado – qualifica o atendimento aos pacientes do SUS e demais convênios, oferecendo maior precisão.
316
2008 - Aquisição do Tomógrafo Multislice-64,
único
de
Santa
Catarina. Foram investidos US$ 1 milhão na compra e instalação do Aquilion 64, um dos mais modernos aparelhos de exame do país.
317
A autora: Christina Elisa Baumgarten, escritora blumenauense de
cia. “De hoje em diante vou fazer o que eu gosto!”
52 anos, tem nesta a sua 25ª. obra publicada sob o selo
Mas como ganhar dinheiro escrevendo? Montei, em mi-
da HB Editora, da qual é titular. Como boa escritora, é ela
nha própria casa, um pequeno escritório de assessoria
quem conta a sua trajetória de “contadora de histórias”,
de comunicação e, ao mesmo tempo em que fazia vários
como gosta de se denominar:
cursos pertinentes à área, fui amealhando alguns clientes na base do relacionamento e do esforço próprio. Pro-
“Sempre sonhei em ser escritora. Desde menina rabisca-
curei conhecidos, bati em muitas portas e muitas me fo-
va frases soltas em papéis, escrevia poesias e as publicava
ram fechadas, mas alguns bons amigos acreditaram no
nos jornaizinhos da minha escola. Mas, naquele tempo,
meu sonho e eu comecei lentamente a estruturar uma
escritor nem era considerado profissão, e só excêntri-
carreira. Publiquei artigos em jornais, até tive uma pá-
cos de famílias ricas é que podiam dar-se a este “luxo”, o
gina voltada para o público feminino num jornal, para a
“beletrismo”. O caminho natural para
qual eu mesma precisava vender a publicidade a fim de
os meus sonhos seria o curso
mantê-la, escrevi roteiros para vídeos promocionais, dis-
universitário de Jornalismo,
cursos para políticos, ou seja, aproveitei toda e qualquer
mas nunca tive oportunidade
oportunidade de ganhar meu sustento escrevendo.
de fazê-lo. Acumulei anos desta
Meu grande impulso veio com a confiança irrestrita que
frustração até o dia em que resolvi,
em mim depositou meu primo Roni Baumgarten. Ele fi-
já com 36 anos, dar meu grito
nanciou meu projeto de publicar um romance sobre a
de guerra e independên-
história da nossa família, desde que nosso tetravô viera da Alemanha, e abriu para mim, uma porta que jamais se fecharia: o resgate das memórias! Descobri que eu sempre sonhara com isto, escrever sobre o passado como uma contadora de histórias, sem liames com o viés acadêmico. O segundo trabalho nesta linha firmou meu talento: escrever a trajetória da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina, que completava 50 anos. É claro que eu fui buscar conhecimento e aprendizado através de cursos, palestras, oficinas e simpósios, mas o mais importante aprendi a cada trabalho, desenvolvendo uma técnica única, absolutamente autoral, que foi se tornando conhecida e admirada. Hoje meu projeto
318
se nacionalizou e sou espontaneamente procurada por
• Trama urdida na dor ou seis contos sobre a alma
empresas e entidades de todo o país para o desenvol-
feminina
vimento de projetos. Em 2006 aconteceu algo que me trouxe muito orgulho: ganhei a concorrência para ela-
Biografias:
borar o livro comemorativo aos 25 anos da Volkswagen
• O Mágico de três continentes - A História de Walter
Caminhões e Ônibus, mesmo concorrendo com gigantes
Mogk
como a Editora da Fundação Getúlio Vargas.
• Mundo Novo – Biografia de Hubert Schildwachter
Este é meu 25º. livro e posso afirmar que, a cada livro
• O pai do concreto armado – Biografia de Emilio
lançado, é como se me nascesse mais um filho, não só
Baumgart
pelo amor e cuidado envolvidos no processo, mas principalmente pela percepção que tenho de que cada obra
Historiografias:
desta acrescenta mais conhecimento e compreensão
• A reinvenção da economia catarinense A história da
para a humanidade.
FIESC e seus líderes
Utilizo como parâmetro principal para o meu trabalho
• ADAC – uma década de conquistas
os princípios do sábio filósofo francês Voltaire (1694-
• Dos Camarins ao Grande Espetáculo - 145 anos de
1778) que, em sua obra máxima “A filosofia da história”,
História do T.C.G
condena os historiadores puramente acadêmicos, que
• SENAI Blumenau – 50 Anos da
se deixam cegar pelo pó das bibliotecas e não buscam o
Conhecimento.
conhecimento que está em cada personalidade humana.
• Os Bandeirantes da Era Moderna
Nas mais de 500 entrevistas que já realizei ao longo dos
• ABIP 50 anos - O Milagre Moderno da Multiplicação
últimos anos, adquiri meu maior aprendizado, abando-
• ABAM 50 anos de Amor e Cidadania
nando o conceito cristalizado de que há “sábios” e “ig-
• Arte em Movimento 20 anos de
norantes”. Somos todos conhecedores da maravilhosa
Blumenau
diversidade de nuances da raça humana!”
• Colégio Sinodal Doutor Blumenau – Um Doutor em
Indústria do
Pró-Dança de
Educação Algumas das principais obras já publicadas pela
• Sua Majestade, o Itajaí-Açu – Histórias, lembranças e
autora:
heranças de um rio.
Romances históricos:
Participante em inúmeros concursos de âmbito nacional,
• O Espírito de uma Época
com diversas premiações e inclusões em antologias
• A Geografia da Esperança
regionais e nacionais.
319
320
A Obra e seus patrocinadores Um preito de agradecimento Somente quem olha para o passado pode construir o futuro. Por isto, apoiar projetos que registram o que passou, a história do homem e suas complexidades, é muito importante. Estes registros são a silenciosa construção de novos ícones, que vão nortear a nossa vida no futuro, determinar a nossa maneira de nos relacionarmos e compreendermos o mundo a nossa volta. Por outro lado, a influência da arte gerada pela mente humana é primordial para a humanidade. Ler é ainda a mais fascinante viagem pelo universo da imaginação, sendo capaz de levar o ser humano a realizar grandes feitos. Ter consciência cultural é utilizar a cultura como mecanismo de criatividade e inovação, seja nos negócios, no serviço executado ou como ferramenta de motivação nas unidades geradoras de produção. Unir todos estes fatores, assinando uma obra como a do resgate histórico do Imperial Hospital de Caridade de Florianópolis é uma demonstração de inequívoca consciência cultural, social e comunitária. Os mecenas que, históricamente, tem permitido o florecimento das artes, e que encontraram a sua vertente moderna através do patrocínio de obras como esta, merecem nosso aplauso e nosso profundo preito de agradecimento. Foi graças a sensibilidade das diretorias das empresas Baesa S.A, Enercam S.A., Tractebel Energia S.A., Eletrosul, Banco do Brasil e BRDE que esta obra chegou ao grande público. Que, assim como abençoa toda a cidade de Florianópolis e a grande obra caritativa descrita nestas páginas, o Senhor Jesus dos Passos possa abençoar o rumo destas grandes organizações!
Obra executada com recursos oriundos da Lei Rouanet.
321
Notas Bibliográficas Capítulo I: Memórias Históricas da Província de Santa Catarina, reimpressa em 1877. CABRAL, Dr. Oswaldo Rodrigues,
LACOMBE, Lourenço Luis & LEMOS, Renato – Viagens pelo Brasil: Bahia, Sergipe e Alagoas – 1859, Editora Letras & Expressões e Bom Texto, ISBN 8587723324.
GRMEK, Mirko. “Le concept de maladie”. In GRMEK, Mirko (org) Historie de la pensée médicale em Ocident. Vol. 2 De la Renaissance aux Lumières. Paris, Ed. Senil, 1997, p. 158.
Capítulo III: Memórias Históricas da Província de Santa Catarina, reimpressa em 1877. CABRAL, Dr. Oswaldo Rodrigues,
MAZZOLINI, Renato G. “Les lumières de la raison – des systemes medicaux à l’ organologie naturalista”. In GRMEK, Mirko (org) Historie de la pensée médicale em Ocident. Vol. 2 De la Renaissance aux Lumières. Paris.
FONTES, Henrique da Silva, A Beata Joana de Gusmão. FONTES, Henrique, O Irmão Joaquim, o Vicente de Paula Brasileiro, biografia I, 1761 a 1829, Florianópolis 1958.
ROSEN, George. Da Policia Médica à Medicina Social: ensaio sobre a assistência médica. Rio de Janeiro: Edição Graal, 1979.
Capítulo IV: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos; Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas);
Capítulo II: Memórias Históricas da Província de Santa Catarina, reimpressa em 1877. CABRAL, Dr. Oswaldo Rodrigues, - A criação da Paróquia do Desterro, na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, volumes VIII e IX, anos de 1919 e 1920. FONTES, Henrique, O Irmão Joaquim, o Vicente de Paula Brasileiro, biografia I, 1761 a 1829, Florianópolis 1958.
PAIVA, Padre Joaquim Gomes de Oliveira, Joaquim Francisco do Livramento, notícia bibliográfica, publicada na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo VIII, ano de 1846, 2ª edição, págs. 391 a 401; republicada na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, volume I, ano de 1902, págs. 49 a 59.
PEREIRA, Moacir, Senhor dos Passos Protetor de Florianópolis, Florianópolis, 2004. DOMINGUES, Ângela. Para um melhor conhecimento dos domínios coloniais – a constituição das redes de informação no império português em finais do Setecentos. História, Ciências, Saúde. Manguinhos. Ciência & Viagens, vol. VIII, Suplemento, 2001, p. 823-838.
FONTES, Henrique, O Irmão Joaquim, o Vicente de Paula Brasileiro, biografia I, 1761 a 1829, Florianópolis 1958.
322
DUARTE, Paulo de Q. Lecor e a Cisplatina 18161828. v.2.Rio de janeiro: Biblioteca do Exército, 1985.
EDLER, Flávio. De olho no Brasil – a geográfica médica e a viagem de Alphonse Rendu. História, Ciência, Saúde. Manguinhos. Vol. VIII, suplemento, 2001 Ciência & Viagens, p. 925-943.
SCHEINA, Robert L. Latin America´s Wars: the age of the caudillo, 1791-1899, Brassey´s, 2003. Capítulo V: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos; Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas);
CALMON, Pedro. História do Brasil (7 vols). Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1959. CALÓGERAS, Pandiá. Formação Histórica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935.
Capítulo VI: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos; Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas);
FONTES, Henrique da Silva, A Beata Joana de Gusmão. Memórias Históricas da Província de Santa Catarina, reimpressa em 1877. CABRAL, Dr. Oswaldo Rodrigues, SANTOS SILVA, José Gonçalves dos, Cartas acerca da Província de Santa Catarina. V. texto, pág. 77.
FONTES, Henrique, O Irmão Joaquim, o Vicente de Paula Brasileiro, biografia I, 1761 a 1829, Florianópolis 1958.
FONTES, Henrique, O Irmão Joaquim, o Vicente de Paula Brasileiro, biografia I, 1761 a 1829, Florianópolis 1958.
Capítulo VII: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos; Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas);
PEREIRA, Moacir, Senhor dos Passos Protetor de Florianópolis, Florianópolis, 2004. CARNEIRO, David. História da Guerra Cisplatina. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1946. DONATO, Hernani.Dicionário das Batalhas Brasileiras. São Paulo: Editora Ibrasa, 1987.
323
Notas Bibliográficas: compreensão do passado: o historiador e a arqueologia das palavras”. In: ZIERER, Adriana (coord.). Revista Outros Tempos, São Luís, Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), volume 1, 2004 (ISSN 1808-8031). (2).
SANTOS SILVA, José Gonçalves dos, Cartas acerca da Província de Santa Catarina. V. texto, pág. 77. - Notícias bibliográficas da Irmã Joana Gomes de Gusmão e do Irmão Joaquim Francisco do Livramento, nos Anais do Museu Paulista, tomo V.
CARNEIRO, David. História da Guerra Cisplatina. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1946.
FONTES, Henrique, O Irmão Joaquim, o Vicente de Paula Brasileiro, biografia I, 1761 a 1829, Florianópolis 1958.
DONATO, Hernani.Dicionário das Batalhas Brasileiras. São Paulo: Editora Ibrasa, 1987.
FURTADO, Júnia Ferreira. “Arte e segredo – o licenciado Luís Gomes Ferreira e seu caleidoscópio de imagens”. In FERREIRA, Luís Gomes. Erário mineral. Organização Júnia Ferreira Furtado. Belo Horizonte, Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, Rio de Janeiro, Fundação Oswaldo Cruz, 2002, vol.1, p. 3-30.
DUARTE, Paulo de Q. Lecor e a Cisplatina 18161828. v.2.Rio de janeiro: Biblioteca do Exército, 1985. SCHEINA, Robert L. Latin America´s Wars: the age of the caudillo, 1791-1899, Brassey´s, 2003. DONATO, Hernani. Dicionário das Batalhas Brasileiras. São Paulo: Editora Ibrasa, 1987.
Capítulo VIII: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos; Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas); Livros de Registro dos Expostos;
OLIVEIRA LIMA, Manuel de. Formação Histórica da Nacionalidade Brasileira. Rio de janeiro: Companhia Editora Leitura, 1944. RIO BRANCO, Barão do. Efemérides Brasileiras.Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1938. ROCHA POMBO, José Francisco da. História do Brazil (5 vols.)Rio de Janeiro: W.M. Jackson, 1935. VARNHAGEN, Francisco Adolfo (visconde de Porto Seguro). História Geral do Brasil (8 vols.). São Paulo: Edições Melhoramentos, 1959.
RIO BRANCO, Barão do, Efemérides Brasileiras, 2ª edição.
Capítulo IX: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros;
SANTOS SILVA, José Gonçalves dos, Cartas acerca da Província de Santa Catarina. V. texto, pág. 77. - Notícias bibliográficas da Irmã Joana Gomes de Gusmão e do Irmão Joaquim Francisco do Livramento, nos Anais do Museu Paulista, tomo V. COSTA, Ricardo da. “O conhecimento histórico e a
324
Livros de Entrada de Enfermos; Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas); Livros de Registro de Receituário do Hospital e da Farmácia; Livros de Registro de Conhecimentos dos legados deixados ao Hospital e Irmandade; Livros de Relação de novos irmãos e irmãs admitidos; Livros de Registro dos Orfãos; Livros de Registro de Batizados; Livros de Registro de Corresponência; Livros de Registro da Procuradoria Geral; Livros de Registro de Imóveis; Livros de Registro de Pacientes (internações); Livros de Registro de Cirurgias; Livros de Registro de Consultas; Livros de Registro de Pessoas sepultadas no cemitério da Irmandade; Livros de Registro de Óbitos de pacientes; Livros de Registro de Apólices; Livros de Registro de Visitas de Pessoas Ilustres; Livros de Registro de Contratos.
BUENO, Eduardo – Brasil: uma História, Editora Ática, ISBN 8508082134. CALMON, Pedro, A vida de D. Pedro II, o rei filósofo, Biblioteca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 1975. CARVALHO, José Murilo de – D. Pedro II,Companhia das Letras, 2007, ISBN 978853590969. DORATIOTTO, Francisco – Maldita Guerra: nova história da Guerra do Paraguai, Cia das Letras, ISBN 8535902244. LOEWENSTAMM, Kurt – Imperador D. Pedro II: O hebraísta no trono do Brasil, 1825 – 1891, Centauro, ISBN 8588208253. OLIVEIRA, Antônio Carlos – Dom Pedro II, Imperador do Brasil, Callis Editora, ISBN 8586797197. NABUCO, Joaquim, Um Estadista do Império, Companhia Editora Nacional, 1936.
CALMON, Pedro. História do Brasil (7 vols). Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1959.
RIOS FILHO, Adolfo Morales de Los – O rio de Janeiro Imperial, Universidade Editoria, ISBN 8574750166.
CALÓGERAS, Pandiá. Formação Histórica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935.
SCHWARCZ, Lilia Moritz – As Barbas do Imperador, Cia das Letras, ISBN 8571648379.
DONATO, Hernani. Dicionário das Batalhas Brasileiras. São Paulo: Editora Ibrasa, 1987.
VAINFAS, Ronaldo – Dicionário do Brasil Imperial, Objetiva, ISBN 8573024410.
OLIVEIRA LIMA, Manuel de. Formação Histórica da Nacionalidade Brasileira. Rio de janeiro: Companhia Editora Leitura, 1944.
Capítulo X: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos;
RIO BRANCO, Barão do. Efemérides Brasileiras.Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1938. ROCHA POMBO, José Francisco da. História do Brazil (5 vols.)Rio de Janeiro: W.M. Jackson, 1935.
325
OLIVEIRA, Antônio Carlos – Dom Pedro II, Imperador do Brasil, Callis Editora, ISBN 8586797197.
Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos; Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas); Livros de Registro de Receituário do Hospital e da Farmácia; Livros de Registro de Conhecimentos dos legados deixados ao Hospital e Irmandade; Livros de Relação de novos irmãos e irmãs admitidos; Livros de Registro dos Orfãos; Livros de Registro de Batizados; Livros de Registro de Corresponência; Livros de Registro da Procuradoria Geral; Livros de Registro de Imóveis; Livros de Registro de Pacientes (internações); Livros de Registro de Cirurgias; Livros de Registro de Consultas; Livros de Registro de Pessoas sepultadas no cemitério da Irmandade; Livros de Registro de Óbitos de pacientes; Livros de Registro de Apólices; Livros de Registro de Visitas de Pessoas Ilustres; Livros de Registro de Contratos.
NABUCO, Joaquim, Um Estadista do Império, Companhia Editora Nacional, 1936.
SCANTIMBURGO, João de – Tratado Geral do Brasil, Companhia Editora Nacional.
RIOS FILHO, Adolfo Morales de Los – O rio de Janeiro Imperial, Universidade Editoria, ISBN 8574750166.
TORRES, João Camilo de Oliveira, A Democracia Coroada, José Olympio, 1952.
TORRES, João Camilo de Oliveira, A Democracia Coroada, José Olympio, 1952.
Capítulo XII: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos; Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Se-
Livros de Entradas de Irmãos; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas); Livros de Registro de Consultores; Livros de Registro de Matrícula; Livros de Registro de Consultas; Livros de Registro de Pessoas sepultadas no cemitério da Irmandade; Livros de Registro de Óbitos de pacientes; Livros de Registro de Apólices; DOLHNIKOFF, Mirian – O pacto imperial: Origens do federalismo no Brasil do século XIX, Editora Globo, ISBN 8525040398. DORATIOTTO, Francisco – Maldita Guerra: nova história da Guerra do Paraguai, Cia das Letras, ISBN 8535902244. LOEWENSTAMM, Kurt – Imperador D. Pedro II: O hebraísta no trono do Brasil, 1825 – 1891, Centauro, ISBN 8588208253.
Capítulo XI: Livros de Registro de Atas; Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Livros de Registros de Receituário Médico;
326
nhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações (esmolas); Livros de Registro de Receituário do Hospital e da Farmácia; Livros de Registro de Conhecimentos dos legados deixados ao Hospital e Irmandade; Livros de Relação de novos irmãos e irmãs admitidos; Livros de Registro dos Orfãos; Livros de Registro de Batizados; Livros de Registro de Corresponência; Livros de Registro da Procuradoria Geral; Livros de Registro de Imóveis; Livros de Registro de Pacientes (internações); Livros de Registro de Cirurgias; Livros de Registro de Consultas; Livros de Registro de Pessoas sepultadas no cemitério da Irmandade; Livros de Registro de Óbitos de pacientes; Livros de Registro de Apólices; Livros de Registro de Visitas de Pessoas Ilustres; Livros de Registro de Contratos.
CALMON, Pedro. História do Brasil (7 vols). Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1959. CALÓGERAS, Pandiá. Formação Histórica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935. BUENO, Eduardo – Brasil: uma História, Editora Ática, ISBN 8508082134. CALMON, Pedro, A vida de D. Pedro II, o rei filósofo, Biblioteca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 1975. CARVALHO, José Murilo de – D. Pedro II,Companhia das Letras, 2007, ISBN 978853590969. SCANTIMBURGO, João de – A crise da República Presidencial, Livraria Pioneira Editora.
Capítulos XIV a XX: Livros de Registro de Atas; Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos; Livros de Registro de Doações Livros de Relação de novos irmãos e irmãs admitidos; Livros de Registro de Corresponência; Livros de Registro da Procuradoria Geral; Livros de Registro de Imóveis; Livros de Registro de Pacientes (internações); Livros de Registro de Cirurgias; Livros de Registro de Visitas de Pessoas Ilustres; Livros de Registro de Contratos.
DOSSE, François. História a prova do tempo: da história em migalhas ao resgate do sentido. São Paulo: Editora da UNESP, 2001. CALMON, Pedro. História do Brasil (7 vols). Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1959. CALÓGERAS, Pandiá. Formação Histórica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935.
Capítulo XIII: VAINFAS, Ronaldo – Dicionário do Brasil Imperial, Objetiva, ISBN 8573024410.
Jornais, folders, folhetos e outras publicações internas da Irmandade do Senhor dos Passos e Hospital de Caridade.
COSTA, Ricardo da. “O conhecimento histórico e a compreensão do passado: o historiador e a arqueologia das palavras”. In: ZIERER, Adriana (coord.). Revista Outros Tempos, São Luís, Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), volume 1, 2004 (ISSN 1808-8031). (2).
327
2009, Christina Elisa Baumgarten. Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 5988/73. Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida ou transmitida por quaisquer meios, sem prévia autorização da editora. Livro: Imperial Hospital de Caridade – Uma obra construída com amor e heroísmo – 220 anos.
362.1108164 B438i Baumgarten, Christina Elisa Imperial Hospital de Caridade de Florianópolis : uma obra construída com amor e altruísmo: 220 anos / Christina Baumgarten. – Blumenau : HB Editora, 2008. 336p. : il. col. ISBN: 978-85-86864-50-6 1. Imperial Hospital de Caridade – Florianópolis – História 2. Saúde – Florianópolis – História 3. Hospitais – Florianópolis I. Título II. Título: Uma obra construída com amor e altruísmo: 220 anos.
Pesquisas, entrevistas e texto original: Christina Baumgarten
Coordenação do Projeto: José Carlos Pacheco
Fotos: Marcello Sokal
Valter Brasil Konel
Auxiliares de pesquisa:
Revisão:
Fernanda Pakuczewsky
Jairo Pacheco Martins
Wendy Daniela Volppe Perez André Luis da Silva
Projeto Gráfico e Editorial:
Letícia Carneiro
Herman Baumgarten Editora Ltda. Rua Antônio Carlos Ferreira, 196
Equipe de Apoio:
88010-250 – Agronômica – Florianópolis/SC
Rita Peruchi
Fones: (48) 3209 5318 e (47) 3322 6306
Giberto Bordão de Moura
Site: www.hbeditora.com.br
André Luis da Silva Letícia Carneiro
Edição de arte e diagramação:
Wendy Daniela Volppe Perez
Ermelino Rocha Junior - Designer Gráfico
328
Desenhos Especiais: Raphael Sombrio
Impressão: Grafica Palotti S.A – Santa Maria/RS
Obra editada com recursos da Lei Rouanet – MinC Março 2009.
Agente Cultural Armando Appel – Ala Cultural
Apoio Cultural: BAESA ENERCAM TRACTEBEL ELETROSUL BANCO DO BRASIL BRDE
Iconografia: Estudo de fotos especialmente produzidas para o livro: Marcello Sokal Fotos do arquivo do Imperial Hospital de Caridade Fotos do Arquivo Histórico de Florianópolis
329
Bibliografia Fontes Impressas:
rio da Irmandade; Livros de Registro de Óbitos de pacientes;
Documentos Históricos da Irmandade: (309 livros
Livros de Registro de Apólices;
consultados)
Livros de Registro de Visitas de Pessoas Ilustres;
Livros de Registro de Atas;
Livros de Registro de Contratos.
Livros de Anuais: Livros de Despesas diárias do Hospital de Caridade; Outros Livros e publicações:
Livros de Registros de Receituário Médico; Livros de Registro de Pedido de Gêneros; Livros de Entrada de Enfermos;
Memórias Históricas da Província de Santa Catarina,
Livros de Entradas de Irmãos;
reimpressa em 1877.
Livros de Inventário dos bens da Irmandade do Se-
CABRAL, Dr. Oswaldo Rodrigues,
nhor Jesus dos Passos;
- Assuntos Insulanos, contribuição ao estudo do po-
Livros de Registro de Doações (esmolas);
voamento de Santa Catarina pelos Casais açorianos
Livros de Registro dos Expostos;
e madeirenses.
Livros de Registro de Receituário do Hospital e da
- Os Jesuítas em Santa Catarina e o Ensino de Huma-
Farmácia;
nidades na Província.
Livros de Registro de Conhecimentos dos legados
- Os Juízes de Fora, nos Anais do I Congresso de His-
deixados ao Hospital e Irmandade;
tória Catarinense, volume II.
Livros de Registro de Consultores;
- Laguna e outros Ensaios.
Livros de Registro de Matrícula;
- Medicina, Médicos e Charlatões do passado.
Livros de Relação de novos irmãos e irmãs admiti-
- Raízes seculares de Santa Catarina, em Publicação
dos;
Comemorativa do Centenário da Comarca da Lagu-
Livros de Registro dos Orfãos;
na.
Livros de Registro de Batizados;
- A Venerável Ordem Terceira da Ilha de Santa Ca-
Livros de Registro de Corresponência;
tarina.
Livros de Registro da Procuradoria Geral; Livros de Registro de Imóveis;
FONTES, Henrique da Silva, A Beata Joana de Gus-
Livros de Registro de Pacientes (internações);
mão.
Livros de Registro de Cirurgias;
- A criação da Paróquia do Desterro, na Revista do
Livros de Registro de Consultas;
Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina,
Livros de Registro de Pessoas sepultadas no cemité-
volumes VIII e IX, anos de 1919 e 1920.
330
- Discurso de Posse no Instituto Histórico e Geo-
Setecentos. História, Ciências, Saúde. Manguinhos.
gráfico de Santa Catarina, na Revista do Instituto
Ciência & Viagens, vol. VIII, Suplemento, 2001, p.
Histórico e Geográfico de Santa Catarina, volume
823-838.
III, 1914. EDLER, Flávio. De olho no Brasil – a geográfica méPAIVA, Padre Joaquim Gomes de Oliveira, Joaquim
dica e a viagem de Alphonse Rendu. História, Ci-
Francisco do Livramento, notícia bibliográfica, pu-
ência, Saúde. Manguinhos. Vol. VIII, suplemento,
blicada na Revista do Instituto Histórico e Geográ-
2001 Ciência & Viagens, p. 925-943.
fico Brasileiro, tomo VIII, ano de 1846, 2ª edição, págs. 391 a 401; republicada na Revista do Institu-
FURTADO, Júnia Ferreira. “Arte e segredo – o licen-
to Histórico e Geográfico de Santa Catarina, volume
ciado Luís Gomes Ferreira e seu caleidoscópio de
I, ano de 1902, págs. 49 a 59.
imagens”. In FERREIRA, Luís Gomes. Erário mineral. Organização Júnia Ferreira Furtado. Belo Horizonte,
RIO BRANCO, Barão do, Efemérides Brasileiras, 2ª
Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históri-
edição.
cos e Culturais, Rio de Janeiro, Fundação Oswaldo Cruz, 2002, vol.1, p. 3-30.
SANTOS SILVA, José Gonçalves dos, Cartas acerca da Província de Santa Catarina. V. texto, pág. 77.
GRMEK, Mirko. “Le concept de maladie”. In GRMEK,
- Notícias bibliográficas da Irmã Joana Gomes de
Mirko (org) Historie de la pensée médicale em Oci-
Gusmão e do Irmão Joaquim Francisco do Livra-
dent. Vol. 2 De la Renaissance aux Lumières. Paris,
mento, nos Anais do Museu Paulista, tomo V.
Ed. Senil, 1997, p. 158.
FONTES, Henrique, O Irmão Joaquim, o Vicente de
MAZZOLINI, Renato G. “Les lumières de la raison
Paula Brasileiro, biografia I, 1761 a 1829, Floria-
– des systemes medicaux à l’ organologie natura-
nópolis 1958.
lista”. In GRMEK, Mirko (org) Historie de la pensée médicale em Ocident. Vol. 2 De la Renaissance aux Lumières. Paris.
PEREIRA, Moacir, Senhor dos Passos Protetor de Florianópolis, Florianópolis, 2004.
DOMINGUES, Ângela. Para um melhor conhecimento dos domínios coloniais – a constituição das redes de informação no império português em finais do
331
Bibliografia COSTA, Ricardo da. “O conhecimento histórico e a
DONATO, Hernani. Dicionário das Batalhas Brasi-
compreensão do passado: o historiador e a arque-
leiras. São Paulo: Editora Ibrasa, 1987.
ologia das palavras”. In: ZIERER, Adriana (coord.). Revista Outros Tempos, São Luís, Universidade Es-
OLIVEIRA LIMA, Manuel de. Formação Histórica da
tadual do Maranhão (UEMA), volume 1, 2004 (ISSN
Nacionalidade Brasileira. Rio de janeiro: Companhia
1808-8031). (2).
Editora Leitura, 1944.
DOSSE, François. História a prova do tempo: da his-
RIO BRANCO, Barão do. Efemérides Brasileiras.Rio
tória em migalhas ao resgate do sentido. São Paulo:
de Janeiro: Imprensa Nacional, 1938.
Editora da UNESP, 2001. ROCHA POMBO, José Francisco da. História do Brazil (5 vols.)Rio de Janeiro: W.M. Jackson, 1935.
CARNEIRO, David. História da Guerra Cisplatina. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1946.
VARNHAGEN, Francisco Adolfo (visconde de Porto DONATO, Hernani.Dicionário das Batalhas Brasilei-
Seguro). História Geral do Brasil (8 vols.). São Pau-
ras. São Paulo: Editora Ibrasa, 1987.
lo: Edições Melhoramentos, 1959.
DUARTE, Paulo de Q. Lecor e a Cisplatina 1816-1828.
BUENO, Eduardo – Brasil: uma História, Editora Áti-
v.2.Rio de janeiro: Biblioteca do Exército, 1985.
ca, ISBN 8508082134.
SCHEINA, Robert L. Latin America´s Wars: the age
CALMON, Pedro, A vida de D. Pedro II, o rei filóso-
of the caudillo, 1791-1899, Brassey´s, 2003.
fo, Biblioteca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 1975.
ROSEN, George. Da Policia Médica à Medicina Social: ensaio sobre a assistência médica. Rio de Ja-
CARVALHO, José Murilo de – D. Pedro II,Companhia
neiro: Edição Graal, 1979.
das Letras, 2007, ISBN 978853590969.
CALMON, Pedro. História do Brasil (7 vols). Rio de
DOLHNIKOFF, Mirian – O pacto imperial: Origens
Janeiro: Editora José Olympio, 1959.
do federalismo no Brasil do século XIX, Editora Globo, ISBN 8525040398.
CALÓGERAS, Pandiá. Formação Histórica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935.
332
DORATIOTTO, Francisco – Maldita Guerra: nova
TORRES, João Camilo de Oliveira, A Democracia Co-
história da Guerra do Paraguai, Cia das Letras, ISBN
roada, José Olympio, 1952.
8535902244. VAINFAS, Ronaldo – Dicionário do Brasil Imperial, Objetiva, ISBN 8573024410.
LACOMBE, Lourenço Luis & LEMOS, Renato – Viagens pelo Brasil: Bahia, Sergipe e Alagoas – 1859, Editora Letras & Expressões e Bom Texto, ISBN 8587723324.
Fontes Eletrônicas:
LOEWENSTAMM, Kurt – Imperador D. Pedro II: O
Catálogos Temáticos da Biblioteca Nacional da Aju-
hebraísta no trono do Brasil, 1825 – 1891, Centau-
da (www.ippar.pt)
ro, ISBN 8588208253.
Dicionário Histórico de Portugal (www.arqnet.pt) Fundação Joaquim Nabuco (www.fundaj.gov.br)
OLIVEIRA, Antônio Carlos – Dom Pedro II, Impera-
Arquivo Nacional do Brasil (www.historiacolonial.
dor do Brasil, Callis Editora, ISBN 8586797197.
arquivonacional.gov.br) Wikipédia, a enciclopédia livre (www.wikipedia.
NABUCO, Joaquim, Um Estadista do Império, Com-
org)
panhia Editora Nacional, 1936.
Governo de Santa Catarina (www.sc.gov.br) Geocities (www.geocities.com/historia)
RIOS FILHO, Adolfo Morales de Los – O rio de
Sua Pesquisa (www.suapesquisa.com)
Janeiro Imperial, Universidade Editoria, ISBN
Mundo Vestibular (www.mundovestibular.com.br/
8574750166.
articles) Fatos do Brasil (www.ponteiro.com.br)
SCANTIMBURGO, João de – A crise da República
Radar Sul (www.radarsul.com.br/historia.asp)
Presidencial, Livraria Pioneira Editora.
E-biografias.net Calendário de Datas (www.unificado.com.br)
SCANTIMBURGO, João de – Tratado Geral do Brasil,
Casa Imperial do Brasil (www.casabrasil.net)
Companhia Editora Nacional.
Conselho Federal de Medicina (www.cfm.org.br) ANPUH (www.rj.anpuh.org)
SCHWARCZ, Lilia Moritz – As Barbas do Imperador, Cia das Letras, ISBN 8571648379.
333
334
Este livro foi impresso na fonte Kozuka Mincho Standart, corpo 10 e impresso em papel couchĂŞ matt 150gr. pela GrĂĄfica Pallotti e Editora para a Hermann Baumgarten Editora Ltda. Blumenau, 2009.
335
336
337
338