JUP Abril 2011

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ABRIL 2011 Cerca de 300 mil pessoas saíram às ruas de quase todo o País para fazer a sua voz soar no dia 12 de Março de 2011. O Porto foi um dos principais centros da manifestação. Dezenas de milhar de pessoas invadiram a maior sala de visitas do Porto - a Avenida dos Aliados.

DESTAQUE / P 04 - 07

Jornal da Academia do Porto | Ano XXIII | Publicação mensal | Distribuição gratuita directora Dalila Teixeira | chefe de redação Susana Campos | director de arte Sergio Alves

ESTUDAR ARTES Numa altura de crise económica, onde se fala de uma “geração à rasca”, a educação deixa de ser vista como um direito e passa a ser encarada como um privilégio ao qual nem todos podem aceder. O JUP foi saber como é ser estudante de artes em Portugal, uma das áreas que mais apoios perde com as dificuldades que o país atravessa.

FIM DE ESTÁGIOS NÃO REMUNERADOS A partir de agora os estágios não remunerados vão deixar de existir. A medida foi apresentada pelo então primeiro-ministro, José Sócrates, como uma das cinco medidas para combater o desemprego entre os jovens, especialmente aqueles que têm mais qualificações. O JUP saiu à rua para descobrir as ameaças e as oportunidades da medida.

EDUCAÇÃO / P 08

GRAFFITI Sobreviveu a cinco décadas, ultrapassou as barreiras da cidade de Nova Iorque e ganhou as ruas de todo o mundo. Hoje, o graffiti conta com a admiração de muitos que o consideravam lixo, marca lugar cativo nas ruas de todo o mundo e chega mesmo a ser, para alguns, uma actividade remunerada.

SOCIEDADE / P 12

PARKOUR ON THE STREETS Já alguma vez passaste por alguém no meio da rua a trepar paredes ou a saltar muros acrobaticamente? O JUP já. E como achámos curioso também nós “saltámos” para a rua à procura desse pessoal. São praticantes de Parkour e é usual chamarem-lhes “traceurs”.

DESPORTO / P 16


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JUP — ABRIL 2011

EDITORIAL E OPINIÃO

EDITORIAL

Dionisos e o Novo Homem

Período de Estupidez Colectiva IV

por A. Pedro Ribeiro fotografia cortesia de Alexandra Lucas Coelho

-> Depois de levado a Bruxelas voltou para Lisboa e foi apresentado à Assembleia da República que, com total unanimidade partidária, o chumbou. Sim! Estamos a falar do PEC IV. O tal que abriu caminho a uma crise política, culminou com a demissão do Governo a 23 de Março e marcou eleições para 5 de Junho. Os objectivos dos PEC I, PEC II e PEC III saíram ao lado e por isso o PEC IV tornou-se necessário e foi exigido por Bruxelas. Mas o que não foi pedido nem ordenado é que voltassem a cortar apenas no coitado do Zé Povinho. De qualquer modo PS achou que sim e ditou as regras do novo PEC. Apresentou-as e caiu redondo em resultado da aprovação, por parte da Assembleia da República, dos cinco Projectos de Resolução (do PSD, CDS, PCP, PEV e BE) que reivindicaram a rejeição do Programa. No discurso que oficializou a demissão, o primeiro-ministro demissionário acusou os partidos da oposição de” irresponsabilidade” e de terem rejeitado as propostas que o governo apresentou para evitar a intervenção internacional, sem “qualquer argumento sério” e sem “apresentarem quaisquer medidas alternativas”. Para Sócrates, a crise que atravessamos é justificada pela “sofreguidão de poder” e por “mero calculismo político”. Ora então pensemos: o PEC IV apresentava MAIS congelamento de pensões e redução nominal de parte delas; MAIS facilidade para os despedimentos; MAIS desemprego; MAIS trabalho precário; MAIS cortes no Estado social; MAIS roubos ao bolso do ‘Zé Povinho’; MAIS; MAIS e MAIS inconsciência política. Para além disso, todos sabemos (ou pelo menos todos deveríamos saber) que estas e outras medidas então propostas no PEC IV só contribuiriam para a degradação das condições de vida da população portuguesa, para aumentar as desigualdades, para reduzir direitos e, acima de tudo, acentuar as debilidades da nossa economia. Mas poucos sabem como combater e dar a volta à questão. E com tudo isto, aqui e acolá, apenas uma questão imperava: “mas afinal quando é que acaba este período de estupidez colectiva?”. Seria assim tão complicado perceber-se nas entrelinhas que as medidas do FMI já vinham sendo impostas dia após dia?! E era assim tão difícil perceber-se que o resultado dessas medidas já estava à vista de todos nós?! Resposta para isso: NÃO! Na verdade estamos mergulhados na mais profunda das recessões! Mas pelos vistos este Período de Estupidez Colectiva não desaparece… Era preciso que se tivesse compreendido que crescimento económico não se combate com cortes e mais cortes, e mais ainda quando esses cortes se revestiam de uma tremenda crueldade (PEC IV). Sim, Crueldade! Crueldade porque esses cortes apenas iam direitinhos às carteiras dos mais necessitados, às carteiras daqueles que já não estão muito longe do regresso ao tempo da “sardinha a dividir por três”. Até há cerca de uma semana atrás, pelos cafés, tascos, bancos de jardim, estações de metro, autocarros, ou até nas simples conversas lá de casa, a alternativa parecia ser só uma – “Vem aí o FMI”, ou “Agora é que o FMI vem mesmo aí e vamos estar todos tramados”. E o certo é que, uma semana depois do delírio que pautou a cena política nos últimos tempos, o recurso à ajuda externa acaba mesmo por se efectivar. Ainda que esse pedido não esteja traduzido na sigla FMI mas sim à ajuda Europeia, a mesma representa o dia em que este rectângulo à beira mar se despediu de todo um período de ambição europeia para voltar ao papel do ‘velho Portugal’ dependente, incapaz de se governar – 1983 é um bom exemplo dessa fragilidade e subordinação. Agora que corremos para eleições antecipadas e que a ajuda externa acabou mesmo por ser pedida só nos resta acreditar que uma nova etapa começará e, esperamos, que se apresente através de uma política justa, de Estado social, de combate à fraude, corrupção e podridão financeira que rouba “13 milhoes de salários mínimos” como tão bem um grupo de activistas escreveu, há cerca de duas semanas, às portas do BPN. É caso para perguntar: “dia 5 de Junho acaba finalmente este período de estupidez colectiva?”. E com o pensamento de um alguém que ainda acredita (e ainda bem!), nos despedimos até ao próximo episódio: “Hoje, mais do que nunca, convém lembrar as palavras do grande Franklin D. Roosevelt: ‘a única coisa que temos de ter medo é do próprio medo.’” •

por Joana Lleys fotografia cortesia do fotojornalista Wok-ki Park Sho

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as últimas semanas fomos confrontados/as com as aterradoras notícias sobre o tsunami e sismo no Japão no litoral nordeste, principalmente na província de Miyagi, originando um recomeço histórico para as vidas dos/as habitantes, bem como de todo o trabalho e investimento realizado economicamente nas empresas e entidades criadas até então. A existência e a saúde deste povo está entregue a uma vontade e sobretudo a uma valorização humana na reconstrução de novas vidas, lugares habitáveis, seguros, onde possam assumir o controlo do quotidiano e voltar a um ritmo que poderíamos afirmar como “normal”. Falo da “normalidade” pois a cooperação e atitude japonesas não é a vulgarmente conhecida nas culturas europeias, nem entendida como comportamentos ha-

COLABORARAM NESTA EDIÇÃO

directora Dalila Teixeira director de arte Sergio Alves chefe de redacção Susana Campos director de fotografia Pedro Ferreira

A. Pedro Ribeiro, António Gonçalves, Adriano Lemos, Christina Branco, Diana Ferrão, Daniela Teixeira, Dalila Teixeira, Diogo Saldanha, Eurico Sá Fernandes, Filipa Rodrigues, Ieva Balodel, Irina Castro, Irina Ribeiro, José Miguel Rocha, Juliana Diógenes, Joana Leys, Júlia Rocha, Janine Mouta, Liliana Pinho, Marta Gomes, Marta Costa, Nuno Matos, Nuno Moniz, Paulo Alcino, Raquel Cascarejo, Ricardo Norton, Salomé Fonseca, Sara Marques, Sandra Mesquita, Sofia Cristino, Soraia Barros, Tiago Reis, Vera Tavares

educação Júlia Rocha sociedade Dalila Teixeira e Hernâni Oliveira desporto Pedro Bartolinho cultura Liliana Pinho internacional e economia Dalila Teixiera opinião Nuno Moniz

afirma também a defesa da natureza, do planeta ameaçado. Um novo homem que se recusa a ser o macaco que mercadeja e rasteja, que está farto do paleio da economia e da competividade, que ama o conhecimento e a beleza. Um homem que não aceita mais esmolas e migalhas- se muitos pedem esmola é porque outros lhes roubaram e roubam o que é seu de direito, a sua própria vida. Um novo homem que sabe que é único e irrepetível, abençoado pela graça do nascimento que não tem preço e, por isso, próximo de Deus ou de ser, ele próprio, um deus. Um homem que está a nascer de novo, que está a tornar-se naquele que é, na criança sábia de Nietzsche. Um homem que é sobretudo Arte, a quem foi confiada a Criação, a quem compete afastar as Trevas dos mercados, do tédio e da ganância e trazer ao mundo o Amor da mulher pela criança. Um novo homem que é também dança, canto, celebração, que não aceita ser escravo de coisa nenhuma, que quer viver, gozar a vida na sua plenitude e não ter a felicidade controlada pelos media ou pelas agências de "rating". Um novo homem, Dionisos talvez.•

O exemplo Japonês

DIRECÇÃO JUP

EDITORES DIRECÇÃO NJAP/JUP presidente Ricardo Sá Ferreira vice-presidente Catarina Cruz vogal JUP Nuno Moniz vogal galerias Henrique Guedes publicidade Sara Carreira

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elo mundo inteiro há uma juventude que já não aceita passivamente a redução da vida a uma fórmula única e irreversível. As palavras de Jim Morrison, desaparecido há 40 anos, voltam a fazer sentido perante uma revolta sem líderes, sem hierarquias, não dirigida, convocada pelo Facebook. "We Want the World and We Want it Now!" de "When The Music's Over" é o grito daqueles que já nada têm a perder,

daqueles que reclamam o mundo e a vida que lhes têm sido roubados pelos banqueiros, pelos mercados e pelos políticos ao serviço destes e daqueles. No Cairo, em Atenas, mesmo em Lisboa, no Porto ou em Braga, está a nascer um novo homem. Um homem ainda em fase embrionária, o "homo sapiens-demens" de Edgar Morin que volta aos tempos bíblicos, aos ensinamentos dos mestres antigos, de Jesus, de Buda, de Platão, de Sócrates (mesmo não os lendo) mas que, ao mesmo tempo, se serve da Internet, do Facebook, para comunicar e para fazer a revolta. Como diz, Carlos Coelho (Jornal "I", 7/3/2011), curiosamente criador de marcas, "hoje, pela primeira vez na História, existe uma consciência planetária, supraterritorial, supracultural, suprarreligiosa, supra-económica e suprapolítica. Uma gigantesticamente invisível bomba nuclear, constituída pela energia atómica de cada um de nós e que nenhuma arma de guerra convencional conseguirá parar". Há uma consciência que afirma, na esteira de Nietzsche, Morrison e Henry Miller, a própria vida, a vida em si mesma, como valor fulcral- e ao afirmar a vida,

partcipações especiais — Alexandra Lucas Coelho, Wok-ki Park Sho, Valentina Camozza e Matthieu Gouzes

bituais, frequentemente praticados em sociedade. Quando estabelecemos uma comparação do povo japonês com o nosso, identificamos facilmente uma determinação que não é sucumbida e manipulada por uma catástrofe e desta vez das maiores da história do Japão. No meio da miséria, dos milhares de vidas perdidas, de famílias desestruturadas, de vivências e memórias apagadas, de dia para dia o Japão ergue-se. Gradualmente a população japonesa eleva-se entre os escombros, e torna real a dignidade e o civismo que sempre os identificou, enquanto povo e enquanto cultura. Não será por acaso que o espírito de entreajuda predomina, e que mesmo no caos instalado a população está solidária, e são inexistentes as notícias de roubos ou vandalimos de outra ordem. Na cidade de Fukushima e na

ilustradores — Ana Moreira, Francisca Santos, Mariana Lobão, Mariana A Miserável e Sérgio Cameira imagem de capa Pedro Ferreira depósito legal nº 23502/88 tiragem 10.000 exemplares design sergio-alves.com tipografia Trump Gothic by Canada Type e Mafra by DSType pré-impressão Jornal de Notícias, S.A. impressão Nave-printer - Indústria Gráfica, S.A. propriedade Núcledo de Jornalismo Académico do Porto/ Jornal Universitário redacção e administração Rua Miguel Bombarda, nº 187 - R/C e Cave | 4050-381 Porto, Portugal tlf 222 039 041 e-mail jup@jup.pt

província de Miyagi todos/as trabalham para o mesmo, na esperança de encontrarem vestígios das suas outras vidas antes do dia 11 de Março, imperando a solidariedade, o civismo, e o respeito para com o outro/a. Provavelmente seria proveitoso pensarmos no exemplo japonês e passarmos a encarar o individualismo que praticamos, como um obstáculo à evolução e crescimento de uma sociedade que serve a todos/as e é de todos/as. Não será de todo difícil no nosso dia-a-dia, olharmos para o lado e sairmos da nossa “zona de conforto” uma vez ou outra, para percebermos que a vivência em sociedade requer apenas que saibamos ceder zonas de conforto e criar identidades mútuas e inteiras.•

APOIOS Reitoria da Universidade do Porto, Serviços da Acção Social da Universidade do Porto, Universidade Lusófona do Porto, Instituto Português da Juventude


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OPINIÃO

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O que achas do fim dos estágios não remunerados? por Diana Ferrão fotografia Ana Leite

Vítor Madureira Estudante de Direito Eu acho que acima de tudo o Estado pretendia acabar com algo que é imoral: os empregadores usarem o trabalho de estagiários e, sendo trabalho, devia ser remunerado. Usam e abusam dos estagiários não remunerados; sei inclusivamente de algumas pessoas cujas despesas que têm na cidade do estágio não são pagas pelas entidades. E há ainda outro aspecto: não sei até que ponto é que a lei vai dificultar o ingresso nas empresas para estagiar, já que os estudantes tinham a oportunidade de ter um estágio não remunerado e agora não sei até que ponto haverá alunos que não vão ter essa oportunidade •

Nuno Carvalho Estudante de Psicologia Sinceramente, acho que é uma ajuda para os estagiários. Há estágios que estão longe de casa o que faz com que as pessoas tenham que se deslocar e todas as ajudas são boas. Eu concordo totalmente com o facto de serem remunerados, no fundo a pessoa está a trabalhar para aquela empresa e está a ajudá-la, e acho também que todo o trabalho, sendo bom, deve ser valorizado. •

Rui Miranda Estudante de Medicina Dentária

Carla Malafaia Estudante de Psicologia Eu acho que os estágios devem ser remunerados, independentemente de ser curriculares ou não, porque é um trabalho que se presta a uma entidade, qualquer que seja ela, e deve ser remunerado. Qualquer trabalho que se faça deve ser remunerado sempre. Claro que, por parte das entidades, o facto de os estágios serem remunerados pode dificultar, mas acho que é aí que as faculdades têm um papel essencial e deve garantir o estágio sempre. •

Penso que é uma boa medida, visto que vai permitir que os estagiários se sintam recompensados pelo trabalho que vão desenvolver, ou estão a desenvolver. A situação que se está a verificar até ao momento é que os estagiários estão a trabalhar e, não sendo remunerados, quase que entram numa situação de exploração e não acho isso muito correcto. •


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CERCA DE 300 MIL PESSOAS SAÍRAM ÀS RUAS DE QUASE TODO O PAÍS, PARA FAZER A SUA VOZ SOAR NO DIA 12 DE MARÇO DE 2011. O PORTO FOI UM DOS PRINCIPAIS CENTROS DA MANIFESTAÇÃO, DEZENAS DE MILHAR DE PESSOAS INVADIRAM A MAIOR SALA DE VISITAS DO PORTO, A AVENIDA DOS ALIADOS. texto António Gonçalves e Soraia Barros fotografia Pedro Ferreira


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> UMA NAÇÃO À RASCA

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entenas de milhares de pessoas saíram à rua por todo o país (e também no estrangeiro) no dia 12 de Março de 2011, gritando o seu descontentamento com a precariedade laboral, os recibos verdes, as medidas de austeridade, os estágios não remunerados e a falta de bolsas universitárias e muitas outras razões. A capital foi o principal palco dos protestos. Estiveram presentes, nas ruas lisboetas, mais de 100 mil manifestantes. No Porto, não se assistia a tamanha enchente nos Aliados desde a visita do Papa Bento XVI. A Organização Portuense aponta para 80 mil pessoas, a PSP fala em 50 mil. •

> NA BATALHA COMEÇOU A LUTA

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o Porto, cidade do 31 de Janeiro e da Revolução de 1820, as ruas encheram-se de forma inesperada. Pelas 15h00, os manifestantes começaram a reunir-se na Praça da Batalha. Apesar da revolta sentida nas palavras de todos e nos cartazes que traziam, o ambiente era, acima de tudo, pacífico. O único acidente do dia aconteceu quando um petardo explodiu nas redondezas da praça. O autor da brincadeira foi imediatamente capturado pela polícia e a organização conseguiu manter a ordem e a calma. De resto, as únicas armas avistadas, eram somente as palavras e os manifestantes que não se inibiam de falar em mudança e revolução. A multidão não parava de aumentar, e o número de cartazes também, alguns irónicos, outros bem directos, uns com pedidos, outros com sugestões e muitos com críticas desinibidas como era o caso de um que apenas dizia: “Politicos, Ladrões, Filhos da Puta”. O homem que o carregava, que preferiu manter o anonimato, disse, emocionado, que tinha vindo à manifestação simplesmente porque “Chega, chega de tudo. As pessoas tão fartas desta situação”. Pouco depois das 15h, a organização da manifestação põe à disponibilidade do público um microfone. Após uma breve inscrição, cada um dos revoltosos poderia utilizar o instrumento para dar uma “Lição de Civismo e mostrar como se muda o País de forma pacífica”. Com estas palavras, Inês Gregório, uma jovem da organização abriu o “fórum” a declarações. Ao microfone ouviram-se várias vozes, todas contra a precariedade, o desemprego, o emprego temporário, os salários baixos, as propinas, a falta ou o atraso das bolsas, os estágios não remunerados, as injustiças sociais, o foço entre ricos e pobres, os “políticos de carreira”, a falta de creches públicas em Portugal e a corrupção. O primeiro que subiu ao palco improvisado em frente à Igreja de Santo Ildefonso, criticou aqueles que continuam com “ a hipocrisia de dizer: mais vale um trabalho precário do que trabalho nenhum”. Por outro lado, apelavam ao cumprimento dos direitos humanos, à mudança, à reforma do sistema político e acima de tudo, à união de todos. Ouviram-se histórias de abandono de cursos universitários por falta de bolsa e até de fome nas residências. Um homem declarou: “Recebo 103 euros de Rendimento Social de Inserção, e mesmo assim, as minhas filhas não tiveram direito a bolsa na Universidade. Filhas, estou aqui por vocês.”. Cada vez que nomes como José Socrates, Cavaco Silva ou Miguel Sousa Tavares eram referidos, a multidão vaiava em uníssono. Já a Praça da Batalha estava cheia quando Susana, artista de rua, decidiu cantar para todos, a Desfolhada, de Simone de Oliveira. O público estremeceu de emoção e acompanhou a jovem cantora. Quando a música acabou, a multidão ficou a gritar “Portugal” durante alguns momentos. Sucederam-se mais alguns relatos. Para além de histórias e palavras contra o governo vigente, ouviram-se relatos de pessoas que batalharam pelo derrube do Estado Novo e de todo o Processo Ditatorial, e a confirmação de que o objectivo não era este. “ Eu lutei pelo 25 de Abril, pela Liberdade de Portugal! Depois disso só vejo Ladrões” disse emocionado um revolucionário de 1974. Muitos falaram, mas muitos ficaram também sem tempo para falar. Todos queriam mostrar a sua indignação e a cada frase citada, o público, cada vez em maior número, rejubilava em gritos de apoio. A praça da Batalha parecia não chegar para tantos manifestantes quando, pelas 15h40 se iniciou, com grandes dificuldades, a marcha que tinha como objectivo a praça D. João I. O começo ocorreu de forma pacifica, ouvindo-se que “A luta continua, quando o povo sai a Rua”. A afluência de pessoas foi tão grande que as autoridades foram obrigadas a dirigir a manifestação até ao Aliados. No coração de cidade, a massa humana entoava as músicas dos homens da luta. Frases como “E o povo pá?”, ou “O povo unido jamais será vencido” ouviam-se repetidamente. Os manifestantes eram cada vez mais, segundo a organização estavam presentes 80 mil pessoas, segundo a PSP, 50 mil. O microfone e os relatos de manifestantes reinsurgiram no meio da multidão. “Nós não estamos mal, estamos uma merda” ouvia-se. E a população gritava de emoção. As palavras de protesto continuaram até ao entardecer, embaladas por canções de intervenção rejuvenescidas, até que no crepúsculo, a população começou a dispersar. Muitos diziam que o movimento não podia ficar por ali e o dia 12 de Março era simplesmente o inicio. A organização respondeu a este apelo de forma positiva: “A luta começou hoje, a mudança é possível, nada é inevitável.” •

> MANIFESTAÇÕES DA “GERAÇÃO FACEBOOK”

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m anifestação da apelidada “Geração à Rasca” marca a chegada das redes sociais aos movimentos cívicos em Portugal. A organização do evento espalhou apelos à participação nas ruas, no entanto, o principal meio de comunicação utilizado foram as redes sociais. A participação, que superou as expectativas dos organizadores, prova que redes como o Facebook ou o Twitter, são hoje em dia, um forte meio de propaganda e um bom veículo para apelar à participação das massas em eventos como este. O protesto foi convocado através da Internet por quatro jovens e apelava à participação de “desempregados, quinhentoseuristas e outros mal remunerados, escravos disfarçados, subcontratados, contratados a prazo, falsos trabalhadores independentes, trabalhadores intermitentes, estagiários, bolseiros, trabalhadores-estudantes, mães, pais e filhos de Portugal”. O grupo auto-denominado de “geração à rasca” conseguiu muita adesão na internet mas não só, as ruas sentiram também a resposta ao apelo. •

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> MUITAS CAUSAS, UMA MANIFESTAÇÃO

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movimento de 12 de Março estava longe de ter apenas uma causa e um objectivo. Nas várias cidades portuguesas onde este se fez notar, foi possível distinguir várias tendências que estavam unidas por um sentimento comum, o descontentamento. No Porto encontrámos um grupo de amas, descontentes com as suas condições laborais, uma marcha de orgulho LBGT a favor da liberdade sexual e um grupo de Deficientes Físicos contra a descriminação. Em Lisboa estiveram presentes também vários grupos como por exemplo uma organização neo fascista. Se a manifestação era apartidária, rapidamente se percebia que também seria suprapartidária pois, vários partidos estavam presentes, mas o seu contributo era bastante tímido. Também a ideia de “geração à rasca” foi ultrapassada pela do “povo à rasca”. A Praça dos Aliados não era palco de lutas geracionais, era sim espaço para a união das várias gerações — avós, filhos e netos — todos à rasca, ou preocupados com o próximo. Alguns cartazes demonstravam o companheirismo entre famílias “Por Nós, Pela nossa Filha e Por Portugal”. Muitas pessoas que falaram ao JUP encontravam-se desempregadas, ou em situação precária, mas no meio da confusão, também se achavam vários manifestantes que estavam presentes muito por solidariedade. “ Tenho a sorte de ter um trabalho que amo e que paga o pão que preciso de ter na mesa. A crise vejo pelos meus amigos que ganham salários de miséria, que merecem condições de trabalho e não as têm” afirmou Tiago Veloso, jovem médico que sublinha Fernando Pessoa quando afirma: “Falta Cumprir-se Portugal”. João Nunes era um dos muitos desempregados presentes na manifestação, apesar de possuir um Mestrado em Economia Financeira, e revolta-se porque “os direitos pelos quais os nossos pais lutaram, são hoje negados. Não temos direito a constituir família, a uma vida digna, a um trabalho e um futuro. A austeridade devia incidir na demência política, foram tomadas muitas decisões negativas para o país, e quem paga são sempre os mesmos”. Em relação à juventude defende que “a emigração é a única solução”. Sabendo que estavam presentes pessoas muito distintas com causas e objectivos diferentes, a organização disponibilizava umas caixas para que as pessoas pudessem deixar as suas ideias e os motivos de descontentamento. Os voluntários desdobravam-se em esforços para conseguir ouvir toda a gente. •

> RECÉM LICENCIADOS À RASCA

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o final de 2010, a taxa de desemprego no país superou os 10,4% , valor acima da média da Zona Euro e da União Europeia. É cada vez mais crescente o número de recém-licenciados que integram estas estatísticas pois, o mercado de trabalho que encontram após a sua formação, está cada vez mais precário. Sónia Taboada, nutricionista, não tem boas perspectivas de futuro. Segundo a própria, “os recém-licenciados são muitas vezes estigmatizados, existindo o estereótipo de inexperientes e de incompetentes para a classe empregadora”. Também Paulo Caravalho, médico dentista, partilha a mesma opinião alegando que existe “exploração laboral” por parte da entidade empregadora bem como “remunerações precárias e sempre a recibos verdes”. Quando confrontados com a possibilidade de emigrar, ambos se mostram um pouco reciosos, uma vez que, emigrar implica “ uma série de alterações e adaptações a considerar”. No entanto, acreditam que seja “uma opção em cima da mesa”. A precariedade assala entre os mais novos e parte deles, não tem remuneração suficente para “suprir as necessidades primárias e pagar os encargos mensais”, o que contribui para alargar o prazo de permanência em casa dos pais. Da mesma forma, torna-se extremamente complicado “amealhar dinheiro para investir na formação pós-graduada ou na criação de negócios próprios”. Sobre a manifestação do passado dia 12 de Março, Paulo alega que “Enquanto tivermos um Governo prepotente, intransigente, que nega a precariedade dos seus cidadãos quando toda a gente a vê e sente e que se sente intocável na posição em que está, nada mudará”. Já Sónia pensa que “Este tipo de manifestações são uma forma da classe política e no fundo, de todo o nosso país, se aperceber da precariedade em que os jovens que querem entrar no mercado de trabalho, se encontram. Poderá ajudar a despertar “assuntos aparentemente esquecidos”. Afinal os jovens de hoje vão ser os que irão contribuir para o futuro. No entanto creio que o que se está passar é um ciclo vicioso, do qual vai ser complicado sairmos.” •

> OS ESPAÇOS DA GERAÇÃO À RASCA

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e Lisboa e Porto foram os principais centros da manifestação, onde saíram à rua 200 mil e 80 mil pessoas respectivamente, muitos outros locais foram também espaços de protesto. Em Faro, capital do Algarve, saíram à rua 6 mil manifestantes. No Minho a manifestação fez-se notar em Guimarães e, principalmente, em Braga, onde se juntaram vários milhares de participantes (a manifestação foi mesmo apelidada de “Primavera de Braga”). A cidade estudantil ouviu também o apelo online e no centro de Coimbra, reuniram-se contra a precariedade e os recibos verdes à volta de mil pessoas. Também os madeirenses saíram à rua, no entanto, a manifestação no Funchal ficou um pouco aquém das expectativas, a organização esperava 2500 pessoas, número que não foi atingido. Em Viseu e em Castelo Branco, as concentrações foram menos expressivas, não ultrapassando algumas centenas em cada uma das cidades. Também no estrangeiro a geração à rasca saiu à rua, em Barcelona, algumas dezenas de pessoas protestaram junto ao consolado Português. •


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> ENTREVISTA A INÊS GREGÓRIO O JUP falou com uma das organizadoras da Manifestação da Geração à Rasca na cidade do Porto. Inês Gregório contou-nos toda a experiencia de organizar o protesto e as expectativas de futuro. p/ Como se sente, sendo uma das principais organizadoras do protesto aqui no Porto? r/ Não fui das principais. Somos vinte e cinco principais organizadores aqui no Porto. O apelo foi lançado via Facebook a quem se quisesse reunir aqui na cidade. Deveríamos aparecer no café Avis na quarta-feira, 16 de Fevereio. As tarefas foram distribuídas nesse mesmo dia. Como fazer a divulgação, quem imprimia cartazes, quem é que sabia a receita da cola caseira... Depois de ver que estavam a crescer reacções via Facebook, preocupamo-nos em ver qual era a maneira de descolarmos da nossa manifestação movimentos que não iam ao encontro do que era pedido. E começamos a espalhar a palavra para além da rede social. Tentamos chegar a escolas, faculdades, cafés... p/ Como foi a primeira reunião? r/ Na primeira reunião conhecemo-nos, decidimos o percurso, quem iria ao governo civil. As nossas espectativas não eram encher os Aliados. A prova é que tínhamos marcado a praça D. João I como fim do percurso. Brincar com o Facebook é muito premicioso, tudo porque as pessoas fazem “clics” e nunca há uma noção exacta de quem adere. Uma coisa é dizer que estão connosco psicologicamente, outra coisa é dizer “OK, eu vou e levo a minha família toda”. A primeira previsão era entre os 500 e os 5000 manifestantes, mas nunca avançamos com números certos. p/ Fui difícil organizar uma manifestação desta dimensão? r/ Incrivelmente não foi difícil de organizar. As pessoas que participaram no protesto eram extremamente organizadas e devido a isso, o esqueleto foi-se formando muito rapidamente. O Alfredo aparecia sempre com o bloquinho dos apontamentos e a partir daí víamos aquilo que estava feito, o que faltava fazer. O que estava fechado ou não. Nunca fomos poucos. A palavra foi passando. p/ Qual foi a sensação de ver aquele mar de gente na Avenida dos Aliados? r/ Uma emoção incrível. Eu não percebi imediatamente a dimensão da multidão que tinha aderido. Como era uma das destacadas para coordenar a marcha, só me apercebi quando desci do palco improvisado, e não conseguia “furar” por aquele mar de gente. Foi um grande entusiasmo! Fiquei bastante emocionada e surpreendida pela positiva com a capacidade de mobilização das pessoas. Acusam-nos de sermos parvos e amorfos, mas perante aquele mar de gente tudo foi possível. p/ Qual será a reacção do governo face a esta manifestação? r/ Não nos interessa a mudança de cara se a política se mantiver. É bom que a partir de agora, não só as pessoas, mas também os governantes se mantenham atentos. Se for para mudar as leis e a situação actual todos temos de intervir . 300 mil pessoas na rua não podem ser ignoradas. A manifestação foi organizada de um modo pacífico, mas muitos dos manifestantes dizem não ser tão benevolentes numa próxima. p/ A manifestação passou de uma manifestação apartidária para uma manifestação supra-partidária, concorda? r/ Quando dissemos que a manifestação era apartidária não dissemos que era anti-partidos. Há uma estrutura democrática que defendemos e através da qual queremos participar activamente. Quando começou a ser divulgado este evento, foi enviado um convite aos deputados, para que enquanto cidadãos pudessem participar mostrando sempre um carácter apartidário, no sentido em que esta manifestação não defendia nenhuma bandeira, nem punha em causa nenhuma outra bandeira. A única coisa que constava era o descontentamento. Qualquer pessoa que demostrasse apoio era bem-vinda. As pessoas participaram porque ao estar ali não estavam a defender uma agenda política. Uma das grandes vitórias foi demonstrar que um movimento cívico consegue não precisar de nenhuma estrurura partidária para organizar um evento de enorme dimensão. p/ Qual o destino das folhas A4 distribuídas no dia da Manifestação? r/ Serão, numa primeira fase, juntas, organizadas e enviadas para a Assembleia da República. Para que se mostre que as pessoas têm voz e têm todas aquelas propostas. Nós tínhamos pensado em pontos estratégicos para as caixas na Praça D. João I, mas tendo em conta toda a dimensão da manifestação, e o facto de termos que nos dirigir para os Aliados, não foi possível reunir tantas folhas quantas gostaríamos, mas mesmo assim correu muito bem. p/ O que virá a seguir? r/ Neste momento estamos a analisar as propostas que foram feitas durante a manifestação. Muitas pessoas foram dando os seus contactos pessoais. Criou-se um fórum e neste fórum também serão apresentadas propostas. A partir de agora vamos tentar filtrar todas essas informações e organizá-las. Nas próximas reuniões vamos ver como isto pode ganhar outra forma. Promover encontros “cara-a-cara” ...

> PRECARIEDADE, O QUE SIGNIFICA? > ENTREVISTA A PEDRO CANDEIAS

Muito se ouve falar de precariedade, e parece um conceito bastante amplo, mas o que significa na realidade? Ser precário é estar numa situação instável, pouco segura, incerta, frágil, sujeito a eventualidades. Algo precário é algo pobre, difícil e escasso. •

O JUP esteve também à conversa com um “jovem pouco à rasca”. Pedro Candeias é um dos criadores do Porto 24, um jornal local online. Depois de trabalhar na Universidade do Porto criou a sua própria empresa. p/ Estamos numa geração que se apelida à "rasca". Revê-se nela? r/ A Geração já teve vários nomes: Geração Deolinda, Geração Parva, escolheram Geração à rasca. Mas há muita gente dessa geração que não está à rasca e não concorda com esse nome. Não me revejo na “Geração à rasca”, mas compreendo os problemas das pessoas. Acho que as pessoas têm que fazer pela vida, tal como os nossos pais e os nossos avós fizeram. Portugal está em crise desde do Afonso Henriques. p/ Qual a sua opinião sobre as manifestações de dia 12 de Março? r/ Os protestos de dia 12 foram muito amplos. As pessoas tinham razões muito diferentes para estarem ali. Todas as coisas associadas para a precariedade, muitos também por solidariedade. Acho que valeu muito a pena. Têm razões muito válidas. Eu conheço muita gente, bons profissionais, que vivem em condições precárias. p/ O Pedro tinha um emprego, mesmo assim sentiu a necessidade de criar um projecto seu. Quais as dificuldades que sentiu? r/ A principal dificuldade que sentimos foi o facto de não dominarmos os conceitos de gestão e economia. Nós não sabiamos o que era preciso para criar uma empresa. Todo o processo é complicado. Penso que todos os cursos superiores, e até profissionais, deviam fornecer formação empresarial. Falta preparação, mesmo aos licenciados, para terem iniciativa própria. p/ Que conselhos deixa a quem está em desemprego e em situação de precariedade? r/ As pessoas têm de ter iniciativa, uma mentalidade empreendedora. São precisas ideias diferentes.•

p/ Isto foi um início? r/ Isto teve de ser só o início. As pessoas sentiram demasiada adrenalina para agora ir para casa. É impossível deixar tudo morrer agora. A mudança não vai ser rápida, mas todas as manifestações do passado dia 12 exigem modificações. •

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Fim dos estágios não remunerados: ameaça ou oportunidade?

por Irina Ribeiro e Salomé Fonseca ilustração Mariana, a Miserável

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partir de agora, os estágios não remunerados vão deixar de existir. A medida foi apresentada, pelo então primeiro-ministro, José Sócrates, como uma das cinco medidas para combater o desemprego entre os jovens, especialmente aqueles que têm mais qualificações. Esta proibição estava, inicialmente, prevista no acordo de concertação de 2008, mas nunca chegou a ser regulamentada. A nova regulamentação estabelece que as empresas vão ser obrigadas a atribuírem aos estagiários um subsídio no valor mínimo que ronda os 420 euros. Além disso, têm ainda de atribuir um subsídio de refeição e um outro, que pode variar consoante as habilitações do estagiário. É também necessário um contrato escrito e uma duração mínima de 12 meses. O contrato escrito deve conter o valor da remuneração do estagiário, o período de duração, a indicação precisa da área onde se desenvolve o estágio, as funções e tarefas do estagiário e o local onde estas são realizadas, o nome do orientador e o horário de trabalho que o estagiário vai cumprir. O fim dos estágios não remunerados diz respeito apenas aos estágios extracurriculares e aos que tenham como objectivo a obtenção de qualificação para o exercício de profissão. Contudo, existem alguns tipos de estágios que não vão sofrer alterações. Ficam assim, fora da proibição, os estágios profissionais de muito curta duração: no máximo de três meses, ou de natureza curricular, que não são abrangidos pela medida.

> ARQUITECTURA E DIREITO DE FORA Porém, o facto de o fim dos estágios profissionais não remunerados não abrangerem os recém-licenciados que estão a estagiar para serem advogados e arquitectos não tem sido bem recebido pelos jovens. Os estágios já foram e, muitas vezes, continuam a ser a maneira que empresas arranjam de ter pessoas a trabalhar sem terem qualquer tipo de remuneração. Para além disso, os estagiários ficam, em muitos casos, encarregues de tarefas menores e trabalhos burocráticos que não correspondem, de todo às habilitações que têm. A ser respeitada, esta medida pode diminuir os casos de trabalho não pago e combater assim, as situações de fraude e ajudar os jovens quer a reduzir as condições de precariedade, quer a aumentar a sua independência. Em geral, os jovens estudantes concordam e apoiam a medida. A remuneração é a principal vantagem desta medida que é advogada por todos os alunos.

Filipa Magalhães não é excepção. A aluna do 3º ano do curso Administração Público-privada, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FDUC), afirma que “concorda plenamente” com a medida, visto que os jovens “são os que precisam de incentivos e que têm realmente vontade de trabalhar porque estão no auge da sua inteligência e da sua força”. Por outro lado, segundo a aluna da FDUC, uma das desvantagens é o facto de haver “menos dinheiro para o Estado e para as empresas empregadoras como forma de lucro”. Filipa Magalhães é crítica em relação ao que os jovens fazem no período de estágio e afirma que “as empresas precisam de gente nova para fazer o trabalho que eles (chefes) não gostam, como tal serão sempre precisos”. A estudante diz ainda que isto acontece “porque os empregadores sabem que os recém-licenciados querem aprender”, e também “sabem que é mais fácil contratar alguém que nunca trabalhou, para moldar a sua imagem, do que contratar alguém com 10 anos de experiência que quer fazer tudo à sua maneira”. Ana Maria Rodrigues, aluna do 2º ano do curso Turismo, Lazer e Património, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, afirma que é “uma medida boa para os estagiários, visto que estes “muitas vezes são "explorados" pelas empresas”. Além disso, a estudante universitária considera que a medida vai permitir “uma diminuição da dependência dos progenitores tão associada a esta geração”. Ao contrário de Filipa Magalhães, a aluna da FLUC acredita que uma das desvantagens da regulamentação é o facto de “nem todas [as empresas] terem capacidade de aceitar mais um trabalhador remunerado” e a consequência disto é a diminuição da “contratação dos mesmos”. Contudo, Ana Maria Rodrigues considera que a medida tem dois lados uma vez que não tem dúvidas que “a contratação vai diminuir bastante” e assim “o que pode ser uma boa oportunidade para os jovens pode representar também um obstáculo, visto que o estágio é uma maneira de adquirir experiência na área de graduação”.

> A IMPORTÂNCIA DA EXPERIÊNCIA Ana Araújo, também aluna do 2º ano do curso Turismo, Lazer e Património, tem a mesma opinião e acredita que, “os estágios disponíveis serão em menor número”, uma vez que “as empresas estarão mais apreensivas em relação aos gastos de contratação”. No entanto, a estudante afirma que, de qualquer forma, a regulamentação “vem ajudar os estudantes que querem ganhar experiência profissional”. Acrescenta ainda que este facto “irá beneficiar muita gente” uma vez que vai fazer com que tenham “algum dinheiro seu que os ajude a ser mais independentes”. Também para Sofia Duarte, aluna do 1º ano de Sociologia, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, esta nova medida assinala uma boa mudança, pois muitas vezes “os estágios são um aproveitamento por parte das empresas para terem serviço sem ter de pagar.”

Alguns estudantes, como Nuno Salgado, do 2º ano do curso Engenharia Informática, do Instituto Superior de Engenharia de Coimbra (ISEC) confessam que não conhecem bem a medida. Contudo, em geral, o aluno do ISEC acredita que “as pessoas têm direito a ser pagas pelo trabalho que exercem ou pelos seus serviços prestados, seja numa empresa ou em qualquer outro sítio”. Nuno Salgado afirma também que a medida pode ser uma boa oportunidade para os jovens mas pode ainda vir a fazer com que as empresas passem a contratar menos os recém-licenciados, uma vez que vai mudar o facto de “muitas empresas contratarem recém-licenciados apenas para ter trabalhadores e não terem gastos com os mesmos”. Contudo, as opiniões dos estudantes em relação ao facto de recém-licenciados em advocacia ou arquitectura não serem abrangidos por esta medida não têm sido unânimes. Alguns concordam com a opção, outros nem sequer percebem o porquê de isto acontecer. Ana Maria Rodrigues defende que “esta restrição não faz sentido”, visto que não percebe porque “existe remuneração para uns estágios e para estes não”. Ana Araújo é da mesma opinião. A estudante da FLUC não percebe a razão das áreas da advocacia e da arquitectura não serem englobadas na proibição, pois defende que “também eles têm os mesmos direitos”. Também Sara Coelho, aluna da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, afirma não ver “razão nenhuma para que haja discriminação nestes dois casos particulares”. Acrescenta ainda que existem “estágios que fornecem um trabalho rentável para quem os concede e, por isso, torna-se necessária e justa uma remuneração como contrapartida destes mesmos estágios”. Apenas Filipa Magalhães é de uma opinião diferente. A aluna da FDUC concorda com a restrição, na medida em que considera que a advocacia e a arquitectura “são profissões que exigem um nível superior de aprendizagem”, por isso “é preciso muita prática para poder exercer”.

> ESTÁGIO OU EXPLORAÇÃO? De qualquer forma, num país em que a palavra estágio serve, muitas vezes, para esconder a palavra exploração, esta medida traz alguma expectativa a todos os recém-licenciados que continuam a não ter a independência que um emprego, a maior parte das vezes, oferece. •


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“Não somos uma geração à rasca, somos um país à rasca!” —Francisco Mota – AEFLUP

CERCA DE 600 ALUNOS DO ENSINO SUPERIOR DA ACADEMIA DO PORTO MANIFESTARAM-SE NA SEDE DA DIRECÇÃO-GERAL DO ENSINO SUPERIOR NO DIA 24 DE MARÇO, MOSTRANDO-SE REVOLTADOS COM O PROCESSO DE BOLONHA E CORTES NAS BOLSAS.

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manifestação do Dia do Estudante pretendia levar a Lisboa "mais de cinco mil alunos". As expectativas do presidente da Federação Académica do Porto, Luís Rebelo, no dia anterior à manifestação, apontavam para a presença de cerca de 1000 estudantes do Porto. Apesar de a FAP ter disponibilizado alimentação e transporte gratuitos, a adesão não foi o que se esperava. "A manifestação ficou abaixo das expectativas. Penso que terá a ver com a queda do governo, não há efectivamente um governo contra quem contestar", admitiu Luís Rebelo. Já Francisco Mota, presidente da AEFLUP, considera que “o problema está na nossa geração. Somos passivos.” A intenção do protesto era levar os alunos a assinar o livro de reclamações da Direcção Geral do Ensino Superior. Organizou-se uma fila, à porta da DGES, e distribuíram-se senhas pelos estudantes que subiram – três a três – para escrever no livro. O objectivo inicial era o de tirar cerca de mil senhas, objectivo que não foi inteiramente conseguido, por falta de tempo e desmobilização antecipada dos estudantes. No final da tarde, Luís Rebelo revelava que tinham sido feitas apenas cerca de 300 assinaturas. Os alunos estavam conscientes da razão pela qual saíram às ruas de Lisboa numa manifestação que apelava ao fim de Bolonha e melhores condições sociais. A questão das bolsas era o que mais preocupava os manifestantes. Com palavras de ordem como "Bolonha Não!" e "Bolsas sim! Propinas não!" os estudantes fizeram-se ouvir em frente à DGES. Além da Academia do Porto, a mais representativa, estiveram também presentes a Universidade de Évora, com cerca de 90 alunos, a Universidade do Minho, com cerca de 70, seguindo-se em menor número as Universidades de Aveiro e Trás-os-Montes e Alto Douro. A Universidade de Lisboa foi a que menos precisou de tomar medidas de mobilização. A estudante de Direito da Universidade do Porto, Irma Magalhães, soube recentemente que era bolseira este ano, mas admite que, 98€ são insuficientes para cobrir os custos de alojamento, transporte e alimentação. A falta de subsídios do Estado está a afectar os seus estudos já que “os livros que precisamos para estudar são muito caros e

por isso recorremos maioritariamente às fotocópias, que mesmo não sendo permitidas por causa da questão dos direitos de autor, é a única forma que temos para estudar”, revela a aluna. Tiago Costa é estudante da Faculdade de Ciências e está neste momento a receber o valor mínimo da bolsa, encontrando-se ainda no estado de transição. “Apesar do curso de Geologia que frequento não exigir grandes custos a nível de material, o mês de Março foi marcado por grandes dificuldades uma vez que ainda só recebi uma prestação da bolsa”, refere o aluno. Tiago diz ainda que apesar de trabalhar e de ter o apoio dos pais, estes meses têm requerido grande gestão financeira. Esta acção de protesto, aprovada numa Assembleia Geral da Academia do Porto com apenas uma abstenção, foi proposta no Encontro Nacional de Direcções Associativas (ENDA) que decorreu em Coimbra no dia 13 de Março. A acção de protesto na porta da DGES foi aprovada com cerca de 40 votos a favor, 6 contra e 6 abstenções. O presidente da Associação de Estudantes da Faculdade de Engenharia do Porto, Ricardo Costa, lembra que o objectivo não é “fazer do dia do estudante o dia da Acção Social”, mas sendo que se trata de um problema que afecta, cada vez mais, a vida académica de uma geração, as direcções associativas concordaram em dar ênfase ao problema da acção social neste dia. Outras academias, como é exemplo a Academia de Coimbra, optaram por fechar as faculdades. Os alunos que se deslocaram a Lisboa consideraram

Joana Borges e Raquel Teixeira

FCNAUP

FBAUP

FADEUP

FAUP

O número de bolseiros da Universidade do Porto sofreu uma grande quebra este ano. Com esta infografia, verificamos visualmente as diferenças dos dois anos lectivos e, o número de estudantes que este ano se viu sem apoios. Estes dados foram retirados das listas fornecidas pelos SASUP (12 de Abril de 2010 e 1 de Março de 2011). Em algumas faculdades, como a Faculdade de Letras e a Faculdade de Engenharia, as diferenças são bastante evidentes. Relembramos, contudo, que estes dados ainda se encontram em actualização. Ainda podem vir a sofrer alterações, visto que alguns processos estão ainda em análise por falta de documentos ou revisão de candidatura, e vários requerimentos foram submetidos nos Serviços de Acção Social. • Sara Marques e Júlia Rocha

FPCEUP

ICBAS

FMDUP

FFUP

FDUP

FMUP

FEP

FLUP

FCUP

FEUP

> BOLSAS DE ESTUDOS 2011 EM NÚMEROS

que esta acção de protesto na DGES era suficientemente forte para que as suas vozes se fizessem ouvir, reconhecendo como drástica a medida tomada pela Academia coninbricense: “Ninguém tem o direito de impedir quem quer ter aulas de o fazer!”, reforça Adrian Pérez, estudante da Faculdade de Letras da UP. O presidente da FAP explica que, quando são apresentadas queixas no Livro de Reclamações, a DGES – organismo não político – se vê obrigada por lei a dar resposta a todas as questões levantadas. Assim, a maioria do Movimento Associativo considera que se tratou de uma “acção de sensibilização” que trará resultados a médio prazo. O presidente da AEFCUP, Cláudio Carvalho, admite que a sua Associação foi a que votou pela abstenção na Assembleia da Academia do Porto porque considera que “a moção poderia eventualmente conter outros pontos que não só a acção social”. No entanto, reconhece que a “Federação Académica tem vindo a reivindicar outras questões desde o financiamento do ensino superior até aos estágios profissionais, de uma forma mais abrangente”. Ao fim de 10 anos, a FAP saiu à rua. Apesar de acção de protesto ter tido uma adesão que não foi ao encontro das expectativas do Movimento Associativo, Luís Rebelo, presidente da FAP, sublinha que “o Porto trouxe mais de metade das pessoas que cá se deslocaram e nesse sentido a FAP tem que se dar por satisfeita.”•Henrique Figueiredo,

Londres é uma das melhores e mais cosmopolitas cidades do mundo. Aterrar aqui é assustador, mas ao mesmo tempo excitante. Estar rodeada de tudo o que alguma vez imaginei: grandes edifícios, famosos monumentos, o West End, os museus e todos os marcos da cidade deixaram-me de boca aberta. O que não se pode esquecer é que uma cidade não é apenas o que a faz famosa, e mesmo Londres tem partes que por vezes vão parecer mais pequenas do que o local de onde viemos. Foi o que me aconteceu, vim parar a North London que é exactamente o oposto do Londres que toda a gente ouve falar. Esta parte da cidade parece retirada de um filme sobre o operariado inglês dos anos 80, não há muitas pessoas glamourosas a correr de um lado para o outro mas sim pessoas mais velhas que já não trabalham e têm tempo para tudo; pequenos negócios familiares e muitos emigrantes de várias partes do mundo. É um ambiente muito diferente daquele que pensava encontrar mas, sem dúvida acolhedor. Todos aqueles estereótipos que pensava encontrar, desapareceram pouco e pouco. E agora consigo mesmo pesar em Londres a minha casa. Conhecer pessoas novas é, na minha opinião a maior e melhor parte da experiência Erasmus. Algumas universidades atribuem-nos um 'buddy'. Não foi o meu caso mas isso não me parou. O que eu decidi fazer foi conhecer as pessoas que moravam comigo. O grande desafio dos primeiros dias num novo lugar é conhecer o maior número de pessoas possível e manter uma certa ligação com elas, tentar realmente conhecê-las. Em Londres (ou pelo menos na minha universidade) não há nenhum tipo de organização para os alunos Erasmus talvez, porque muitas pessoas do estrangeiro vem já para esta cidade para estudar sem ligação a qualquer programa. Por isso, aqui vive-se uma experiência muito diferente porque depende de nós decidir o que queremos fazer e o que queremos ser. Na minha experiência, a parte académica acaba por ficar um pouco em segundo plano porque tenho apenas 4 disciplinas e muito poucas aulas. Mas quando aqui cheguei tive oportunidade de escolher as minhas próprias cadeiras (obviamente têm de ter equivalência às do meu curso: Ciências da Comunicação) mas deu-me a oportunidade de fazer escolhas tendo em conta os meus interesses e o que pretendo fazer no futuro por isso tenho agora uma aula de Produção Televisiva com todo os tipos de novas tecnologias existentes no mercado, algo que nunca teria se estivesse em Portugal. Erasmus é uma experiência que fica para vida e estou confiante de que vou voltar a Inglaterra e reencontrar os amigos que fiz para toda a vida. • texto e fotografia Marta Gomes (estudante da FLUP em Londres)

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“Roteiro” - Onde Estudas? EM CASA? NA FACULDADE? NO PARQUE? NO CAFÉ? NA HORA DE ESCOLHER MUITOS SÃO OS SÍTIOS E MÉTODOS A UTILIZAR. O JUP FOI DESCOBRIR QUAIS OS ESPAÇOS QUE O PORTO OFERECE.

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maior parte dos alunos escolhe as bibliotecas das suas faculdades para estudar. A nossa Academia conta com 30 bibliotecas que acolhem vários estudantes. Para quem não se importa de estudar com barulho à sua volta, os próprios bares são uma boa escolha. Existem porém, outros espaços dedicados aos estudantes. A Invicta oferece aos seus alunos vários locais, que apelam à concentração e que por isso, enchem na época de exames. Nos jardins do Palácio de Cristal, encontramos a Biblioteca Almeida Garrett. Apesar de grande

número de pessoas que a frequentam, o silêncio impera e é favorável ao estudo. A biblioteca disponibiliza aos seus utilizadores milhares de livros, em várias línguas, afirmando-se como um bom espaço para os alunos estrangeiros. Existe internet gratuita para todos os leitores e computadores disponíveis. Mais do que um espaço de estudo é um espaço de lazer devido à existência de um grande conjunto de filmes e CD´s. O JUP encontrou alguns estudantes na biblioteca: “Eu costumo vir estudar para a biblioteca, porque não gosto de estudar em casa, onde não tenho tanto silêncio. Escolho também a Almeida Garrett porque tem acesso à internet; não é só um espaço de estudo” disse-nos Alexandra Azevedo, aluna da FMUP. Para além da biblioteca, os próprios jardins, são uma boa escolha para quem prefere estudar ao ar livre e em contacto com a natureza, na primavera e verão. Nestas épocas, os jardins podem ser utilizados para estudar e apanhar sol: uma opção sempre agradável e saudável. A Biblioteca Municipal do Porto é também uma boa escolha, principalmente para aqueles que precisam de silêncio absoluto para se concentrar. Integrando essencialmente bibliografia nacional, a BPMP continua a receber todas as publicações editadas no país. Segundo Marta Gonçalves, aluna de Ciências da Comunicação, a Biblioteca é muito procurada pelo seu arqui-

vo, “aqui encontro quase tudo o que preciso para os meus trabalhos. Não costumo vir estudar para aqui porque, por vezes, o ambiente torna-se sonolento.” Já Catarina Santos, aluna de Ciências Farmacêuticas diz que a biblioteca tem um ambiente encorajador: “Para me concentrar preciso de silêncio absoluto, por isso estudar ao ar livre não seria uma boa opção para mim”. A BPMP é assim um espaço excelente para quem quer silêncio total. Também as residências universitárias estão dotadas de uma sala de estudo comum. Marta Gonçalves diz que este é lugar ideal para estudar: “Quando estou rodeada de pessoas que estão a estudar, sinto muita mais vontade de também ler e iniciar a preparação para os meus exames”. Mas por estudo não só se entende queimar as pestanas! Dezenas de jovens artistas dão cor aos seus trabalhos pelas ruas da cidade do Porto, estudando de uma forma diferente daquela a que estamos habituados. À conversa com duas estudantes de Belas Artes, Teresa Gomes e Joana Ornelas, o JUP ficou a saber que os alunos desta área procuram espaços como a Estação de S. Bento e os Jardins Municipais. Idealizar e projectar conceitos são os grandes objectivos destes alunos, que dizem encontrar nestes espaços, tudo o que precisam para desenhar e estudar. Se muitos procuram bibliotecas, jardins e cafés, uma parte dos alunos da Universidade do Porto preferem queimar as pestanas em casa. Estudantes contactados pelo JUP preferem estudar num ambiente já conhecido, para evitar a distracção. Várias alternativas para o estudo! • Soraia Barros e António Gonçalves

Ser mãe e estudante a full-time: uma realidade 2 em 1 A MAIORIA DE NÓS AO PENSAR EM MÃES NA UNIVERSIDADE DO PORTO IMAGINA RAPARIGAS COM GRAVIDEZES NÃO PLANEADAS, QUE TÊM DE DESISTIR OU FAZER O CURSO A UM RITMO MAIS LENTO. O JUP DECIDIU INVESTIGAR COMO É O DIA-A-DIA DE QUEM ESTUDA E TEM UM TRABALHO A TEMPO INTEIRO – SER MÃE!

Autismo no Ensino Superior AUTISMO, SÍNDROME DE ASPERGER: O QUE SÃO, QUEM AFECTAM? CADA VEZ MAIS PESSOAS SÃO DIAGNOSTICADAS COMO SOFRENDO DE UMA PERTURBAÇÃO DO ESPECTRO DO AUTISMO. A VIDA ACADÉMICA DE UM AUTISTA É AINDA DESCONHECIDA, VISTO QUE MUITOS NÃO SÃO CONSIDERADOS COMO POSSÍVEIS CANDIDATOS.

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pesar dos números aterrorizadores (cerca de 1 em cada 150 pessoas), estas patologias, altamente complexas, são pouco compreendidas. A maior parte dos casos conhecidos são relacionados com crianças, e com jovens que, por causa das suas limitações não são capazes de prosseguir os estudos no ensino superior. Há, no entanto, excepções, em que estudantes com este tipo de deficiência são perfeitamente capazes de ingressarem na faculdade. Para isso, assim como em todos os níveis de ensino são necessários apoios. Ana Maria Gonçalves, da APPDA Norte (Associação Portuguesa para as Perturbações do Desenvolvimento e Autismo) garante que, nos últimos anos já muito foi feito, mas ainda falta bastante. “A inclusão já é obrigatória, apesar da resistência de alguns professores, as coisas já são diferentes. Felizmente outros não são assim. As coisas vão melhorando, é insuficiente, mas já existe alguma coisa”, confirma a presidente da instituição. A associação, com delegação norte em Vila Nova de Gaia desde 1984, dá apoio permanente a pessoas diagnosticadas (neste momento 60) e consultas que muitas vezes permitem diagnóstico. Como em tudo o que rodeia estas crianças e jovens, nasceu de um esforço dos pais,

e tem crescido desde então. A APPDA tem uma residência e uma equipa permanentemente disponível. Em todos os níveis de escolaridade, focando aqui o ensino superior, a responsabilidade dos Ministérios da Educação e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior tem de ser assumida: “É pena que não haja mais pais a trabalhar em Ministérios, por exemplo. Porque é assim que as coisas acontecem. A obrigação dos ministérios é fazer um levantamento destas situações, como agora, nos Censos. Estas pessoas são consideradas cidadãos de segunda, é esta desigualdade na nossa sociedade que eu considero muito má”. Ana Maria Gonçalves congratula-se com a existência do decreto-lei (3/2008), que exige que haja inclusão, acompanhamento e condições específicas para pessoas com autismo, que funciona apenas a nível do ensino básico e secundário. Contudo em páginas na Internet de certas faculdades, como a FCUP há a garantia de apoio a estudantes com necessidades educativas especiais. Mas será suficiente? Não faltará apoio no ensino superior? O JUP teve conhecimento do caso de um jovem diagnosticado com síndrome de Asperger, estudante na FEUP, no 1º ano. Segundo Alzira Rebelo, mãe do jovem, o processo de candi-

datura ocorreu dentro dos parâmetros do contingente especial, apesar de o jovem ter média suficiente para se candidatar pelas vias normais, e entrar no curso desejado: Electrotecnia e Ciências dos Computadores. A mãe deste jovem garante que a recepção na FEUP foi muito positiva, especialmente da parte do gabinete de apoio ao estudante com necessidades especiais, na pessoa da Dra. Helena Lopes, psicóloga. A Dra. Helena foi a responsável por ajudar à inclusão deste estudante, desde falar com professores e alunos mais velhos, a até responsáveis da praxe académica. O caso tem sido atentamente seguido, e os professores têm sido espectaculares, garantiu a mãe. Segundo a mesma, a faculdade não estava preparada, “como ninguém está até ter necessidade de aprender, mas considero que a FEUP está a fazer tudo o que pode para o integrar.” Este jovem autista estará a receber ainda este semestre o apoio de um professor tutor. Um caso de integração bem sucedido. Infelizmente, raro. Falta percorrer um longo caminho na estrada do ensino superior, para a completa aceitação de quem é diferente, e por isso, muitas vezes esquecido pela sociedade.• Júlia Rocha

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ónica D’Alte e Lorenzza Fernandes, ambas alunas do curso de Ciências da Comunicação da Faculdade de Letras, são os casos de estudo. Mónica fez 40 anos recentemente, tem um filho e uma filha de 10 e 8 anos e está separada do marido. Depois de muitos anos a trabalhar numa editora é a sua segunda vez num curso superior – esteve a alguns créditos de acabar o agora extinto curso de Jornalismo no início dos anos 90 mas decidiu abdicar para singrar no mundo da restauração, mundo esse em que ainda trabalha no duro: tem um negócio de catering e está a restaurar um palheiro na região do Douro para rentabilizar como Turismo Rural. Apesar de estar inscrita em poucas cadeiras (uma vez que tem equivalências do curso anterior), o seu dia-a-dia é uma corrida frenética entre levar os filhos a diferentes escolas e às actividades extracurriculares e só depois deslocar-se à sua “escola” onde muitas vezes acaba por chegar atrasada, mesmo andando de automóvel – “não tenho tempo para transportes públicos” – transporte que só lhe aumenta os gastos financeiros entre gasolina e parques de estacionamento e a deixa frustrada com o dinheiro perdido quando os professores faltam. Além disto, ainda tem as tarefas domésticas habituais, cozinhar e tratar da sua cadela, Meggy

Lin. Apesar de tudo, Mónica revela-se uma mãe “fixe”. Com uma personalidade vincada e muito dinâmica e um piercing no nariz, uma rubrica numa revista de automóveis, faz trabalhos manuais e surf, está a montar a sua primeira exposição de fotografia. Diz que sobretudo procura passar tempo de qualidade com os seus dois filhos, através de piqueniques fora da cidade e idas ao cinema e ao teatro. Mónica refere que muitos dos seus professores são compreensivos com a sua condição de “mãe-estudante”, embora não sinta nenhuma ajuda por parte do Estado , tanto financeira como em termos de recursos e apoios. Faria falta uma creche, talvez. Lorenzza Fernandes, 30 anos, teve a sua filha na época de exames do seu segundo semestre na faculdade. Não trabalha, uma vez que “acha que seria impossível conciliar tudo”. A Luísa, agora com 20 meses, já teve que ir várias vezes assistir às aulas da mãe por esta não ter com quem a deixar. Lorenzza ainda crescenta com orgulho que nunca deixou para trás uma única cadeira, coisa que muitos alunos da UP sem crianças ao seu cargo não podem dizer! Verdadeiros exemplos de perseverança e capacidade de conciliação no mundo universitário. • Christina Branco


nº02 caderno cultural integrante do Jornal Universitário do Porto

destaque p/02.03

ilustração Ana Moreira

abril 2011

Estudar Arte Numa altura de crise económica, onde se fala de uma “geração à rasca”, a educação deixa de ser vista como um direito e passa a ser encarada como um privilégio ao qual nem todos podem aceder.

flash p/06.07

Hi Kifav Ca Va Photographic project of Valentina Camozza and Matthieu Gouzes offers a portrait of Lebanese people. }

entrevista p/04.05

Cristina

Nunes


02/destaque

{ parêntesis jup abril 2011

NUMA ALTURA DE CRISE ECONÓMICA, ONDE SE FALA DE UMA “GERAÇÃO À RASCA”, A EDUCAÇÃO DEIXA DE SER VISTA COMO UM DIREITO E PASSA A SER ENCARADA COMO UM PRIVILÉGIO AO QUAL NEM TODOS PODEM ACEDER. O JUP FOI SABER COMO É SER ESTUDANTE DE UMA DAS ÁREAS QUE MAIS APOIOS PERDE COM AS DIFICULDADES QUE O PAÍS ATRAVESSA: AS ARTES. por Sandra Mesquita e Janine Mouta fotografia Liliana Pinho

«Um papel Interventivo»

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stela Braga é estudante do 1º ano do curso de Arquitectura da Universidade do Porto. Uma das principais razões para enveredar pela área das artes é a dedicação que se tem pelo meio artístico. “Neste momento só vai estudar artes um estudante que tenha uma grande paixão por estas. Além de praticar o que mais gosta, é fazer um grande esforço para chamar a atenção de todos e tentar despertar a população para a cultura artística. É por vezes um papel interventivo ao nível de todas as áreas possíveis já que a arte é uma forma de expressão que pode ser aplicada a todos os temas”. E a estudante de 20 anos vai mais longe, realçando o impacto que as artes reflectem numa sociedade, ao qual muitas vezes não é dado o devido valor. “A arte entra de todas as formas nas nossas vidas, desde a visual, à auditiva, à motora, táctil…Se as ruas não tivessem cartazes, se os edifícios e as cidades fossem aberrações desorganizadas, se não houvesse música, estátuas, monumentos, pinturas, livros, nem o dia-a-dia seria

suportável! Precisamos do belo e do agradável para sermos felizes, para termos momentos relaxantes, inspiradores, de admiração, evasão e de introspecção, todo um conjunto de coisas que a arte evoca”, afirma. Porém, não é apenas de leveza de palavras que um estudante de artes ergue uma realidade e projecta um futuro à sua frente. Estela lembra que “são cursos extremamente exigentes a nível pessoal e social, sacrificam-se imensas coisas e, no fim, dificilmente se arranja trabalho pois há pouco interesse nesta área”. A estudante de arquitectura diz ainda que nem sempre é fácil obter ajuda por parte da instituição de ensino. “Não há geralmente muita ajuda por parte da faculdade para os materiais, em infra-estruturas é diferente, mas também o dinheiro que a faculdade possui não é suficiente para fazer mais. A Associação de Estudantes é que por vezes consegue alguns apoios”, conta. •

Oportunidades Jorge tem 21 anos e estuda design. Quanto às oportunidades que considera existirem para quem estuda nesta área, afirma que “cada vez é mais complicado, as nossas opções começam a diminuir e, assim, as artes em Portugal não evoluem. Todos estes cortes apenas contribuem para um atraso cultural e artístico em relação ao resto da Europa”. E tal como Estela, Jorge tem o mesmo problema relativamente ao custo dos materiais exigidos para o trabalho do curso. “Eu ando a gastar, sensivelmente 100€ por mês em material (…) no final pago dois anos de propinas num só ano e é muito. Apesar de podermos optar por materiais mais em conta, a qualidade obtida não é a mesma. Este tipo de curso e os seus gastos são um entrave para estudantes com dificuldades económicas. Estudantes esses que até podiam ter mais sucesso se fossem subsidiados”, explica. E quanto ao futuro de grande parte destes estudantes, Jorge não põe de lado a ironia. “Caixas de supermercado são o mais frequente!” afirma. •

O meu papel, como estudante de artes, é dar o meu melhor, pois é a única coisa que posso fazer de momento.

O Futuro

Isa frequenta o 3º, e último ano, da licenciatura em Teatro da Escola Superior de Música, Artes e Espectáculo. Desde cedo, que Isa Letra se interessa pelo estilismo e foi na variante de Produção e Design de Figurinos que encontrou a oportunidade de “trabalhar numa área criativa com muitas outras áreas envolvidas em que desenvolvo um trabalho de conjunto a nível de design e técnico”. Porém, em cursos como este, que contêm uma grande vertente prática, os transportes e propinas são acrescentados os custos da compra de longas listas de material. Muitos estudantes são obrigados a desistir do seu sonho mesmo antes de se candidatarem. “É um curso que exige a compra de muitos materiais, que não são baratos, e temos que cortar em muitas coisas para nos podermos manter a estudar. E há, sem dúvida, muita gente que desiste ou que não concorre por falta de condições monetárias”.


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i/ inscritos d/ diplomados Trabalhos dos Finalistas de Belas Artes, expostos na Biblioteca Almeida Garret

«O Talento não basta» Pedro Maia é professor de Desenho e Director da Licenciatura em Artes Plásticas da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Para além do reduzido investimento na área, considera que existe pouca tradição artística no nosso país. “Com a globalização e com a eventual saída da crise financeira a situação tenderá, com o tempo, a ser idêntica à de outros países considerados mais evoluídos que nós”. O professor reforça que as dificuldades não são só sentidas pelos alunos de artes mas por todos os estudantes em geral. “Hoje em dia, e na situação financeira em que está o Mundo, o nosso país e as nossas universidades, torna-se muito difícil seguir o ensino universitário senão formos filhos de pais ricos, bolseiros ou se não tivermos qualquer tipo de emprego para pagar as nossas despesas de estudante. Acredito que nas Belas Artes é preciso um certo investimento. Este factor, não só condiciona a entrada de estudantes mas, também, como tenho vindo a verificar nos últimos anos, leva à desistência dos cursos, não apenas nas Belas Artes.»

E a verdade é que o talento não basta para o reconhecimento de um artista. Vocação, trabalho e muito sacrifício são ingredientes imprescindíveis da receita para o sucesso. “O facto de aprender violino não faz de mim um compositor, nem o facto de aprender a escrever faz de mim um poeta ou um escritor. O mesmo se aplica às artes visuais”, afirma Pedro Maia. Por vezes, é também o factor sorte faz toda a diferença na carreira de um artista. “Na minha opinião, há quem tenha reconhecimento sem talento ou mérito, ou seja, pode ser reconhecido por estar no lugar certo na altura certa e por ter um bom ‘padrinho’”. Pedro Maia também deixa a seguinte mensagem a todos que ambicionam por uma carreira artística: «Que trabalhem muito, em muitas frentes e que sejam autênticos, iguais a si mesmos.» •

«Pior do que ser estudante de artes em Portugal é mesmo ser artista» Para seguir a sua vocação, mudou de cidade, arranjou um part-time e licenciou-se em Escultura na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Agora, passados quatro anos, e apesar de não exercer uma profissão relacionada com a área, Hagna Miranda tem «muitos projectos na gaveta à espera de melhores dias». Hagna diz que nunca foi fácil ser artista e “pior deve ser agora. Não só pela crise, mas pela falta de cultura e educação para a arte em geral que faz com que sejam poucos os que se interessam por investir nessa área e, consequentemente, menos espaço há para os artistas poderem sobreviver da sua arte”. Dos anos de universitária guarda boas memórias. Considera que teve uma boa formação académica e que o curso correspondeu às suas expectativas iniciais. Nos tempos livres, dedica-se ao artesanato contemporâneo e diz que “ser artista, produzir arte, não é um emprego, pelo menos não o encaro assim, vai além disso”. Apesar de não se sentir realizada profissionalmente, Hagna está certa de que “faria a mesma escolha. Acredito na Arte mesmo que não consiga viver como artista”. Aproveita também para apelar aos jovens que estudam, ou pretendam estudar na mesma área, para “que o façam por vocação e não como forma de criar uma «boa oportunidade de emprego»”. •

Mesmo antes de concluir o seu curso de Designer Gráfico na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, Rui Ricardo tinha já quatro livros de banda desenhada publicados e várias participações em revistas e fanzines locais, além de ter ganho diversos prémios em concursos. Recentemente, inaugurou a exposição “Seduce and Destroy” com alguns dos seus trabalhos. Acerca dos artistas em Portugal, o ilustrador fala-nos daquilo que considera serem as suas maiores preocupações e dá sua opinião acerca da forma como lidam com as dificuldades na zona do Porto. “Eu trabalho exclusivamente em ilustração e não dependo do estado em nenhum aspecto. Sou bem mais afectado pela crise económica geral e pela consequente escassez de encomendas. Felizmente, cá no Porto estamos habituados não ter de contar com subsídios estatais para gerir projectos interessantes e parece-me que a cidade continua bastante activa comparativamente com o resto do país neste cenário de crise”, conta Pedro. Quanto às medidas que podiam ser tomadas para dinamizar o sector artístico, o ilustrador conta que “um dos casos de maior sucesso em relação às artes cá no Porto são os espaços auto-geridos, como a Casaviva onde fazem exposições, concertos, projecções e conversas. Uma das medidas mais óbvias seria disponibilizar as casas abandonadas do Porto quer para habitação, quer para grupos dedicados à cultura. O custo é zero e as casas seriam recuperadas e mantidas por aqueles que as utilizam. Para além de dinamizar a cidade, resolve o problema da habitação. Fundamentalmente, a prioridade do governo deveria estar na qualidade do ensino para as próximas gerações continuarem a trazer-nos gente talentosa em todas as áreas”. Rui considera ainda a possibilidade dos estudantes de artes poderem adquirir um reconhecimento internacional, uma vez que ele próprio o faz sem sair de casa. “Eu vivo no Porto e trabalho via e-mail, por isso parece-me que as oportunidades são iguais para todos. É só uma questão de não se ter uma visão fechada em relação ao mundo. Para além disso, a ilustração nacional está saturada de ilustradores talentosos e não há trabalho para todos, e muitas revistas e editoras têm fechado ou cortado nos custos por causa da crise económica. Continuar a insistir num mercado nacional é uma ideia que me parece irracional, se não há trabalho num sítio, procuras noutro”. }

Alunos Inscritos no Ensino Superior Belas Artes

i/3253 d/706 i/3647 d/673 i/5585 d/1360 i/387 d/76

Artes do espectáculo

Design

Artesanato

Arquitectura e Urbanismo

i/11391 d/2264

(Dados referentes ao ano de 2009)

Entre bolsas de estudos, um part-time, e muitos sacrifícios, os estudantes tentam encontrar alternativas para reduzir ao máximo as suas despesas. “Podemos fazer as peças de roupa com materiais da escola, mas aí é trabalho nosso que tem que ficar lá porque foi feita com materiais da mesma. O que nós fazemos é comprar o estritamente necessário, e aquilo que for possível comprar de marcas brancas, em mercados, nas lojas tradicionais, nos chineses. Em termos de material de desenho, também procuramos ir às lojas que têm desconto de estudante. É tudo uma questão de procurar os melhores sítios, e de ter paciência”. Quanto ao futuro, que para todos parece incerto, Isa garante: “O meu papel, como estudante de artes, é dar o meu melhor, pois é a única coisa que posso fazer de momento. Neste mundo só os melhores vigoram e, numa área como a minha, torna-se bastante mais complicado porque não há emprego para tantos que saem das faculdades com a licenciatura. E depois perguntamo-nos: afinal para quê tantos anos de estudo, e tanto dinheiro gasto – não dizendo que é desperdício, pois é a nossa formação académica e até como pessoas que está em causa – para que serviu? Sinceramente, não sei bem qual é o meu papel como estudante de artes em Portugal, mas seja qual for, vou continuar a representá-lo”. •

Sucesso

Fontes: Pordata/ Instituto Nacional de Estatística

×Ó


*Cristina Nunes Para Portugal, com amor

É APAIXONADA POR TEATRO E JÁ PROVOU UM POUCO DE CINEMA. FOI ASSISTENTE DE AL PACINO E JÁ VIU UM ENCENADOR SER AMEAÇADO EM PALCO COM UM BIDÃO. CRISTINA NUNES ATERROU EM PORTUGAL COM UM PROPÓSITO: INCUTIR NO PÚBLICO O RESPEITO PELA VIDA DE ARTISTA. texto e fotografia Marta da Costa


entrevista/04.05

2011 abril jup parêntesis }

(P) É natural dos EUA. Foi lá que teve formação na área da representação. No entanto, voltou para Portugal. Isto não foge um pouco à regra? (R)Foge muito à regra! Não só sou dos EUA como sou de Nova Iorque. Foi lá que nasci. Os meus pais são emigrantes de uma aldeia pertencente a Chaves. Estive sempre nos Estados Unidos. Quando eu andava no liceu não sabia o que é que queria estudar na faculdade e num Verão participei num musical que a comunidade estava a preparar. Vivia em Nova Iorque, mundo do espectáculo – Broadway – e voltei para Chaves. Não acho que foi uma má escolha da minha parte. Primeiro porque acho que na comunidade em que estou dá para inovar muito e aplicar tudo aquilo que eu aprendi e toda a experiência que eu tenho. Em Nova Iorque é um bocadinho mais difícil trabalhar profissionalmente e ganhar algum tipo de dinheiro com isso. Claro que há muita gente a fazer arte, mas muitas das vezes é difícil encontrar alguém que nos dê fundos para realizar os nossos projectos. Por isso quando tive a oportunidade de vir para Chaves fazer aquilo que gosto e ser remunerada por isso, claro que aceitei (risos)! (P) Começou como actriz. Hoje é encenadora. Ainda tem muitos anos de vida pela frente. Nunca pensou em ser actriz novamente? (R)Quando iniciei o meu estudo de teatro comecei sim pela representação. Aliás, o meu curso tem especialização em representação e não na parte técnica. Eu gostava imenso de representar e, no fundo, ainda continuo a gostar. O problema que eu tenho com a representação é que requer muito de mim emotiva e fisicamente. Talvez nem tanto a parte física, mas sobretudo o lado emotivo. Eu tenho que me entregar completamente à personagem. Tenho que modificar tudo em mim e isso cansa muito uma actriz. Eu sei que tenho capacidades, mas não sei se algum dia voltarei à representação. Gosto muito da parte técnica. Já trabalhei em várias áreas, tanto em teatro como em cinema, e sinto que é muito mais fácil para mim não estar fisicamente em palco. (P) Sendo assim, de todas as áreas do teatro e cinema em que trabalhou (Operadora de Luz, Som, Guarda-Roupa, Stage Manager, Encenadora), qual foi a que lhe deu maior prazer? (R)Os projectos que nos dão maior prazer são aqueles que doem um bocadinho. (risos) Um projecto que eu nunca vou esquecer foi quando trabalhei como Assistente de Produção num filme independente para uma produtora com a qual eu trabalhei depois de ter terminado o meu curso. Estávamos a filmar em condições um bocado difíceis: acordávamos às quatro, cinco da manhã e saíamos de Nova Iorque. Eu tinha a responsabilidade de ir buscar os actores que iam filmar naquele dia e conduzir algumas horas de madrugada para Pensilvânia, onde estávamos a filmar. Era no Inverno. Filmávamos no exterior, no frio, com neve. As gravações duravam cerca de 13 a 14 horas. As máquinas ficavam com humidade por causa do frio. Quando tínhamos de passar para cenas em interior era sempre uma complicação por causa dos aparelhos e das luzes. Além disso éramos uma equipa muito pequena, com demasiado trabalho para tão poucos. Quando as gravações acabavam tinha ainda de contactar várias entidades para ter autorização para gravar em determinados locais. Foi um trabalho doloroso! Durou meses! Fui remunerada por este projecto e foi algo que adorei pois tive a oportunidade de aprender a trabalhar com máquinas digitais. Além disso o processo de edição também foi por nossa conta.

(P) Sente que há uma grande diferença entre o que se faz cá em Portugal e o que se faz nos EUA? (R) Sim! Eu nunca estudei cá, nem nunca tive a oportunidade de trabalhar com actores que tiveram formação em Portugal. Alguns dos meus alunos já tiveram aulas de teatro no liceu, mas nunca trabalhei com alguém que tivesse tido formação num instituto ou num conservatório. Por isso tenho receio em responder à pergunta porque estou a falar um pouco pela minha inexperiência... Pelo que vejo, pelos alunos que tenho, há um desenvolvimento enorme! Há uma grande diferença entre aquilo que eram e aquilo que são agora! Vieram sem treino, sem perceberem exactamente o que era a representação. Muitos pensavam que isto era um “faz de conta”. Não viam isto como uma arte como qualquer outra, em que temos de trabalhar o nosso aparelho! Por exemplo, daquilo que eu vejo na televisão, há uma mão cheia de actores que eu acho que têm mesmo valor… (P) Então o que é que faz falta a Portugal para estar ao mesmo nível da indústria americana? Talento, pelo que diz, não é o que falta. Um melhor aproveitamento desse talento…? (R) Especialização. Eu penso que precisam de pessoas especializadas na área. Faz falta apoio financeiro, porque é preciso investir na arte. Por vezes quando alguém diz que está a estudar teatro não é levado muito a sério. É necessário ter respeito pelo que é ser artista! Talento é algo que se trabalha, que se pratica todos os dias, como se de um instrumento se tratasse.

AL PACINO, SEMPRE QUE ME PEDIA ALGUMA COISA, NUNCA ME OLHAVA DIRECTAMENTE NOS OLHOS.

(P) Mesmo assim continua a ver a América como a terra das oportunidades? (R) Sim. Nos EUA, eu nunca tive uma experiência em que fosse ignorada. Quando eu estava à procura de emprego davam-me alguma oportunidade ou então eram directos comigo e diziam-me que eu não era o que eles procuravam. Aqui é muito mais difícil. Depende de quem nós conhecemos, o que dificulta muito quem procura um determinado trabalho. Nos EUA dão-te sempre oportunidade! Isso vê-se nos programas de televisão. Por exemplo, cá no Ídolos, os concorrentes que chegam à final e que ganham, têm pouco sucesso depois. Nos EUA não precisas de ganhar o Ídolos para teres sucesso! Abre-se logo uma portinha! Não importa quem conheces, mas sim aquilo que vales! (P) É fácil fazer carreira na representação nos EUA? (R) Eu não acho que é fácil, mas acho que é possível. Enquanto aqui em Portugal, eu acho que é difícil e quase impossível. É uma questão de lutarmos. Podes não vir a ganhar um Oscar, mas consegues algum papel, por exemplo, em televisão. Há sempre algum tipo de oportunidade!

(P) Marilyn Monroe disse qualquer coisa como que Hollywood é o sítio onde são capazes de pagar uma fortuna por um beijo teu e apenas uns tostões pela tua alma. Concorda? (R) Concordo. Eu nunca estive no West Coast, por isso nunca vivi essa vida, mas é conhecido como o mundo onde tens de ser bonito e seguir determinados padrões. Claro que tens de ter talento, mas Hollywood pode ser um sítio muito maldoso. Estão mesmo à procura de beleza e se tu não tens terás de lutar ainda mais. Nova Iorque é diferente – respeita a identidade de cada um. Ser diferente é uma mais-valia. Eu acho que há oportunidades para todos. Até em Hollywood eles não querem só Barbies e só Kens! O cinema também tem que ter pessoas diferentes, de outras nacionalidades e culturas.

(P) Trabalhou com nomes “Oscarizados” como Russel Crowe e Al Pacino. De que forma essa experiência contribuiu para a sua aprendizagem e formação profissional? (R) Foi num projecto realizado na escola onde eu trabalhava na altura. Era uma adaptação da peça The Resistable Rise of Arturo Ui, que se situava na Segunda Guerra Mundial. A personagem principal era o Adolf Hitler, interpretado pelo Al Pacino. Havia ainda uma série de actores conhecidos, como por exemplo o Russel Crowe. Era só gente famosa a entrar e a sair do nosso auditório porque era lá que ensaiavam e que a peça ia ser apresentada ao público. Nós podíamos assistir aos ensaios, desde que estivéssemos em silêncio. Foi impressionante ver a forma como esses actores trabalham em palco. Vi coisas que me deixaram de boca aberta e vi outras coisas que me impressionaram bastante. O Al Pacino é um actor muito reservado e trabalha mesmo num mundo só dele. Ele fechava-se no seu vestuário, onde tinha uma pequena televisão onde via obcecadamente imagens do Hitler e estudava todo o comportamento e gestos para a personagem. Quando ele saía e ia para o palco ele já era o Adolf Hitler! Eu cheguei a ser assistente dele durante dois dias e sempre que me pedia alguma coisa nunca me olhava directamente nos olhos. Tinha vários rituais: o café tinha de ser servido de tal forma, com determinada quantidade de açúcar; o peixe tinha que ser preparado de uma forma especial e os legumes deviam ser colocados no prato de uma determinada maneira. Havia ainda outro actor, que entrou no The Big Lebowski, o John Goodman, que era completamente diferente. Ele era muito impaciente: detestava ter notas do realizador, só queria estar lá fora a fumar. Um dia, e foi isto que me deixou de boca aberta, a meio do ensaio, não sei o que se passou com ele, mas ele ficou tão enervado com o encenador, que pegou num bidão que havia e atirou-o para o outro lado do palco. Parecia que ia tudo cair! Foi um comportamento que eu nunca tinha visto num actor! Claro que depois se fez um intervalo para o acalmar. Foi uma experiência excelente! Eu não sou do tipo starstruck. Eu gosto de aprender, ver e observar como estes actores criam o seu papel. (P) Passou ainda pelo Tribeca Film Festival. Em que consistiu a sua colaboração? (R) Eu trabalhei numa das primeiras edições do Tribeca Film Festival. Pertencia a um dos departamentos onde os filmes eram exibidos e éramos nós que organizávamos as palestras e preparávamos o espaço para receber as pessoas. Como participei ainda nos primeiros anos, aquilo estava ainda um pouco confuso a nível de organização, pois ainda ninguém sabia ao certo o que estava a fazer, apesar de ter sido um sucesso. Contribuiu muito para a downtown de Manhattan, porque era uma zona praticamente vazia e o festival trouxe muita gente. O que era ainda melhor era o facto de, como tínhamos um espaço só nosso, tínhamos acesso livre e podíamos ver qualquer filme que nos apetecesse (risos)! (P) É responsável pelo Departamento de Artes Dramáticas da Academia de Artes de Chaves. Como surgiu o convite? (R) O convite surgiu cerca de seis meses a um ano, já não sei ao certo quando foi, antes da Academia abrir. O Marcelo Almeida, um dos directores, tinha sido informado que havia um concurso para um espaço que iria ser cedido pela Câmara Municipal de Chaves, destinado à arte. Na altura falava-se até num Conservatório… Ele veio falar comigo e disse-me que tínhamos que criar uma proposta para entregar. Os vários departamentos juntaram-se: o Marcelo ficou com a Música, o Vítor Azevedo ficou com a Pintura e eu tratei do Teatro. A Câmara ficou contente pelo facto de sermos jovens e termos apresentado uma proposta tão inovadora. Entretanto fomos a concurso. Já não me recordo se foi apenas contra um grupo espanhol ou se foi com um outro. Acabámos por ganhar. Eu não estava cá em Portugal nessa altura. Aliás, só comecei com as aulas no ano seguinte. No primeiro ano fiz apenas um musical. O Marcelo convidou-me basicamente porque sabia que eu tinha formação em teatro e porque me conhecia e sabia que eu adoro isto. (P) O que espera estar a fazer dentro de 10 anos? (R) É difícil de responder, pois há uma versão realista e uma versão sonhadora (risos). Gostava de estar envolvida em teatro e cinema. Gostava ainda de ganhar o Euromilhões e investir numa produtora de cinema independente e, já agora, numa sala de espectáculos ao nível do Filipe La Feria. Quem sabe, um dia… }


A portrait of Lebanon THIS PHOTOGRAPHIC PROJECT OF VALENTINA CAMOZZA AND MATTHIEU GOUZES OFFERS A PORTRAIT OF LEBANESE PEOPLE. THROUGH PHOTOGRAPHS, THE OBJECTIVE IS TO BRING A TESTIMONY ON THIS POPULATION DIVIDED ETHNICALLY, RELIGIOUSLY TORN BETWEEN TRADITION AND MODERNITY, OFFERING A PORTRAIT OF A SOCIETY WOUNDED BY YEARS OF WAR, CARRIED AWAY IN THE TURMOIL OF A COUNTRY WHOSE IDENTITY IS UNDER CONSTRUCTION. WE MAKE TWO TRIPS, SPREAD OVER ONE YEAR (2009-2010), TO MEET THE DIFFERENT COMMUNITIES THAT COEXIST AND BRUSH WELL, A PORTRAIT OF POSTWAR LEBANON. } fotografias Valentina Camozza e Matthieu Gouzes www.zone2reportages.com


2011 abril jup parĂŞntesis }

flash/06.07


CULTURA

08/breves

Poetria, o mundo da poesia e do teatro

“Prepare-se a Invicta, que se vai cantar o Fado” O FADO NASCEU EM LISBOA MAS APAIXONOU A CIDADE DA PORTO. SE DURANTE ALGUM TEMPO SE PERDERAM OS ACORDES PELAS RUAS DA CIDADE, AS CASAS DE FADO ESTÃO CADA VEZ MAIS NA MODA NA NOITE PORTUENSE.

J

antares que são autênticas especialidades, petiscos, ceias, Fado Vadio e Fado de Coimbra preenchem as noites junto ao rio ou longe dele, para novos e velhos. São muitos os restaurantes que mantêm a tradição ou se renderam recentemente às cantorias dos fadistas. O Mal Cozinhado, na Rua do Outeirinho, é um dos mais conhecidos da cidade. Situado num edifício do século XIV, é de um ambiente histórico e rústico sem igual. A decoração, de onde fazem parte bustos em bronze de fadistas consagrados, completa o ambiente. Por aqui já passaram nomes como Amália Rodrigues, Dulce Pontes e Carlos do Carmo. Actualmente, de segunda a sábado das 20:30h à 01:00h, dá voz a Rosinda Maria e Valdemar Vigário, “o melhor intérprete vivo do Fado de Coimbra”, que domina a guitarra portuguesa desde os 15 anos. E escondido no Centro Comercial de Cedofeita, todas as quartas-feiras, o Cantinho da Teresinha abre as portas por voltas das 22h para receber os amantes de fado. Um local referenciado no que toca ao fado e à música portuguesa, oferece actuações de trios e de cantores residentes há mais de trinta anos. Lília Oliveira é a responsável. Conta que o espaço abriu apenas como casa de fados, mas “houve uma época em que estacionou e desde aí, o fado só voltou em 2006” porque “o fado era muito dispendioso e tinha-se de cumprir com os pagamentos, então optou-se por acabar com o fado e pôr só música de baile”. Agora misturam um bocadinho dos dois e Lília acredita que o fado voltou a ser uma das atracções deste Cantinho. Fernando Henriques é cliente há tantos anos quantos tem a casa e não poupa elogios. “Fado para mim é no Cantinho da Teresinha, porque não há casa como esta, com um bom cenário e um bom ambiente que traz aqui muitos fadistas”. E Fernando não vem sozinho, traz consigo mulher, filhos e netas. Com dezoito, quinze e três

“Swing, improviso e muito jazz”

anos, as netas “apreciam o fado, gostam e dançam”. Três gerações onde o fado se mantém vivo, mostrando que a música tradicional ainda vive nos corações dos mais jovens. Na Adega do Rio Douro canta-se o fado vadio há mais de 30 anos. Todas as terças-feiras, num horário mais prematuro (das 16:30h às 19h) se acompanha a música com petiscos num espaço animado e característico. Os xailes, os poemas, os retratos de fadistas e os acordes no ar não deixam enganar. Já O Fado é um restaurante típico situado no Largo de S. João Novo, em pleno Porto histórico. Todos os dias, excepto ao domingo, ouve-se cantar o fado pelas vozes de Leonor Santos, Fernando Moreira e Fernanda João. Das 20:30h às 02:00h, acompanhado do melhor vinho da cidade ou da comida caseirinha que O Fado oferece. E de quarta a domingo, em Matosinhos, quem faz as honras é o Janelas do Fado. Com um vasto elenco de catorze pessoas, com idades para todos os gostos, a noite é de cantoria na Rua Augusto Gomes. Num espaço moderno que conserva a tradição não existe consumo mínimo, só uma grande dose de paixão pelo fado. Uma paixão que parece ser comum a todos aqueles que do Fado fazem a sua alma e o seu negócio.} Liliana Pinho

Cultura portuguesa dá que falar na música e no cinema internacionais ANA MOURA E TERRAKOTA NOMEADOS PARA A TERCEIRA EDIÇÃO DOS SONGLINES MUSIC AWARDS 2011 E DOZE PRODUÇÕES PORTUGUESAS MARCAM PRESENÇA NO FESTIVAL INTERNACIONAL DE CINEMA INDEPENDENTE DE BUENOS AIRES.

D

epois da banda Olive Tree Dance ter marcado presença na maior feira musical do Texas, SWSX, a cultura portuguesa volta a dar que falar por terras internacionais. Ana Moura está nomeada para o prémio de melhor artista 2011, atribuído pela revista britânica “Songlines” com o seu mais recente álbum “Leva-me aos Fados”, competindo com Femi Kuti, Youssou N’Dour e Cheikh Lô (Burkina Fasso). Já os versáteis Terrakota, grupo que mistura diversas sonoridades – dos ritmos africanos ao reggae - estão nomeados para o prémio de melhor grupo com o álbum “World Massala on Ojo Musica”, juntamente com os Bellowhead, os Hanggai e o duo Lepistö & Lehti. Em 2010, os Deolinda venceram na categoria de revelação, com o álbum “Canção ao Lado”. Esta revista, dedicada à world music, atribui, todos os anos, prémios aos melhores projectos musicais nas categorias de melhor artista, grupo, colaboração multi-cultural e grupo revelação. Os vencedores serão revelados já na edição de Junho.

Mas é já em Abril que doze produções portuguesas serão exibidas, entre cerca de quatrocentos filmes, no Festival Internacional de Cinema Independente de Buenos Aires (BAFICI), Argentina. Entre estas, destacam-se um ciclo de obras de Sandro Aguilar que será um dos convidados especiais do festival e júri na secção competitiva de curtas-metragens argentinas. Entre as obras portuguesas seleccionadas figuram ainda “Mistérios de Lisboa”, do chileno Raúl Ruiz, rodado a partir do romance de Camilo Castelo Branco e o retrato documental de João Canijo sobre o Portugal de Oliveira Salazar. O festival BAFICI vai na sua 12ª edição e decorrerá de 6 a 17 de Abril. No ano passado marcaram presença cerca de 245 mil espectadores. } Liliana Pinho

{ parêntesis jup abril 2011

O JAZZ ASSUME-SE CADA VEZ MAIS FORTE NO PANORAMA CULTURAL DO PORTO. EM VÁRIOS PONTOS DA CIDADE, ENTRE MARÇO E ABRIL, DECORREM ESPECTÁCULOS PARA TODOS OS GOSTOS.

A

onda do Jazz atravessou o Atlântico e veio para ficar em terras lusas. Sejam novos ou velhos, conservadores ou vanguardistas, ninguém resiste. Apesar de os refrões não andarem de boca em boca ou não serem trauteados pela cidade, este estilo musical é cada vez mais apreciado por uma vasta legião de seguidores. Porém, segundo a perspectiva de quem gosta e frequenta habitualmente eventos relacionados, "seria importante a criação de um espaço fixo próprio para a divulgação e expansão deste género musical". O Porto tem assistido ao crescer de uma nova geração de artistas, que juntamente com a “velha guarda”, tem promovido o desenvolvimento dos sons de New Orleans. Segundo o grupo Amarelo Manga, "a divulgação dos concertos é bastante razoável e logicamente os concertos com atracções internacionais têm muito mais divulgação, é assim em todos os países". Entre as iniciativas que a nossa cidade tem oferecido à população, destacamos o Ciclo Porta Jazz. Desde o início de Março até ao final deste mês, nomes como Nuno Ferreira ou Kiko & The Jazz Refugees encantam nas noites de sábado em bares já bem conhecidos da cidade, como o Armazém do Chá ou o Bar Tribeca. Espaços como este têm ainda acolhido gigantes do Jazz que a partir das 22h30m proporcionam ao público espectáculos memoráveis de swing, muita irreverência e improvisação. Citando a cantora Renata Gonçalves, “o jazz é visceral, é música que sai do interior do corpo, das profundezas do corpo”.} Filipa Sousa, Raquel Cascarejo

e Ricardo Norton

A LIVRARIA POETRIA SURGIU NO ANO DE 2003 E DESTACA-SE POR TER SIDO A PRIMEIRA DA CIDADE DO PORTO A ESPECIALIZAR-SE APENAS EM LIVROS DE POESIA E TEATRO.

D

ina Silva, sócia gerente da livraria, acredita que “para além da especificidade da oferta, a dinâmica em termos de divulgação cultural” (como sessões regulares de poesia ou apresentações de livros) diferencia a livraria Poetria de qualquer outra livraria. As sessões de leitura têm sido “muito bem acolhidas e elogiadas pela qualidade e originalidade”, afirma. A livraria é divulgada, entre outros, através de mailing lists, “junto da imprensa para divulgar os nossos eventos” e também existe “a chamada corrente informativa do boca a orelha por parte de quem nos visita junto de terceiros”. Apesar da divulgação, em alguns artigos e sites especializados em poesia, a livraria muitas vezes não é referida. De acordo com Dina Silva, isto deve-se a “puro desconhecimento”, ainda que reconheça que “a Poetria tem já uma forte identidade a nível nacional”. No entanto, acredita também que, por ser temática, tem sido “em parte” mais difícil para a livraria continuar a existir. “O problema principal tem sido a falta de meios logísticos e humanos, além dos financeiros”, explica. A livraria Poetria tem livros cujos preços vão desde 2,50€ a 80,00€ e localiza-se na Rua das Oliveiras, junto ao Teatro Carlos Alberto.} Irina Ribeiro

TVI com aplicação específica para iPad TVI É A PRIMEIRA ESTAÇÃO DE TELEVISÃO PORTUGUESA A LANÇAR UMA APLICAÇÃO PARA O TABLET DA APPLE, IPAD

A

través desta nova aplicação, também disponível para iPhone e iPod Touch, é possível aceder a um vasto conjunto de notícias por dia acompanhadas de vídeo, informação actualizada no momento, fotos em alta resolução, partilhar conteúdos através das redes sociais Facebook e Twitter, e ter acesso à programação do canal. As aplicações, que foram desenvolvidas pela Media Capital Multimédia em colaboração com duas empresas, a Xpand IT e a Digital-Minds, ocuparam de imediato os primeiros lugares do top da Apple. O iPad tem vindo a revolucionar o mundo da tecnologia levando vários órgãos de comunicação social como o «Expresso», «Jornal de Notícias», «Diário de Notícias» e «TSF», a apostar nesta plataforma e a disponibilizar conteúdos multimédia. } Sandra Mesquita


roteiro/09

2011 abril jup parêntesis }

A Pérola do Bolhão -> Rua do Rosário, 277 António Reis é o actual proprietário da “Pérola do Bolhão”, depois de 90 anos a passar de geração em geração. A mercearia, que se situa mesmo em frente ao mercado, oferece todo o tipo de produtos, de chocolates a queijos e enchidos, passando pelo arroz, a massa e os enlatados. As especialidades são os presuntos, os fumeiros, os queijos e a grande variedade de frutas frescas e cristalizadas que se mantêm todo ano com a qualidade que lhes é característica. “Porque a fruta faz melhor que os remédios”, diz António Reis. Quanto à clientela há sempre os clientes fiéis “e os passantes” que entram porque está mesmo à mão ou precisam de alguma coisa imediata. Mas seja qual for o motivo da entrada, são sempre os mais velhos que a ela se rendem. Os mais jovens parecem preferir outras superfícies, “até porque nem comem o que os velhotes comem”, ri António. Na “Pérola do Bolhão” ainda se seguem tradições, mas há muito se deixou de fazer fiado. “Antes nós também comprávamos a crédito, agora conforme nos exigem a pronto, nós exigimos aos clientes”. E em dias de passeio nada melhor que dar um saltinho à “Pérola” para, quem sabe, matar saudades dos sabores de Natal com as melhores frutas secas da cidade. }

(1)

A Favorita do Bolhão -> Rua Fernandes Tomás, 783/785

Hoje em dia as pequenas mercearias de bairro parecem ter ficado esquecidas entre os mais velhos, enquanto os jovens dão preferências às grandes superfícies comerciais. Mas o JUP descobriu que a realidade é bem diferente e mostra algumas que, para além de produtos de qualidade e preços acessíveis, são pontos obrigatórios de paragem para quem vive “a onda revivalista”.

Aberta desde 1934, oferece “produtos muito específicos para clientela muito específica”. A especialização da “Favorita” estende-se a produtos que não se encontram nas grandes superfícies, ou pelo menos, que oferecem “uma qualidade muito superior”, afirma Nuno Rocha, o responsável. A oferta vai das especiarias importadas a uma das melhores garrafeiras do Porto, entre licores, vinhos de mesa, espumantes e whisky. Têm inclusive produtos da Zélly, equivalente à pasta Couto ou aos lápis Viarco que exportam para todo o País. Os clientes dividem-se entre os “da casa” que frequentam os estabelecimento “há 40, 50 anos” aos da “onda revivalista da Caderneta de Cromos e coisas do género que procuram o artigo mais tradicional”. Já o fiado só se faz aos clientes que não precisam dele, “até porque há pessoas que estão habituadas a isto e acabam por se estabelecer relações de amizade”. Não contes, portanto, passar a ser “cliente de livro”, mas podes sempre dar um pulinho na “Favorita do Bolhão” e escolher entre os inúmeros tipos de amêndoa acabadinha de chegar para a Páscoa. }

(2)

Pomar Castro -> Rua Miguel Bombarda, 160 A mercearia de Paula está na mesma família desde que o negócio nasceu, há 42 anos. Os produtos são do mais variado possível, mas destacam-se essencialmente as frutas, dispostas mesmo à entrada ou até penduradas no toldo. O tamanho, a cor e a forma fazem com que não passem despercebidas. Esta é uma típica mercearia de bairro, diferente das anteriores. O Pomar castro é uma mercearia mais jovem, com produtos mais tradicionais, mais variados e com menos especialização. É ainda um negócio pequeno de família e ainda não tem o estatuto das anteriores. Mas se os clientes até há pouco eram os mais antigos, agora até os jovens se rendem. “Há mais pessoas jovens que vieram para aqui morar”, diz Paula. Mas nesta mercearia também já não se usa a tradição do fiado. Se leva, paga. Senão, “perde-se o cliente e perde-se o dinheiro”, conta Paula Pertinho da sede do JUP, o Pomar Castro acalma os ratinhos no estômago dos colaboradores e das pessoas que por ali passam, com pressa ou sem ela. }

por Liliana Pinho fotografia Ana Leite (1 e 2) e Dalila Teixeira (3)

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TECNOLOGIAS

10/gadgets

01

03

Nintendo 3DS

www.nintendo.com

Google Nexus S

02 Duracell myGrid Carregar o telemóvel ou leitor de MP3 é hoje em dia uma tarefa rotineira para toda a gente. E todos sabemos que este processo implica fios, carregadores e a procura de uma tomada que esteja livre. É por isso mesmo que a Duracell se propõe a facilitar esta acção com o myGrid, um tapete carregador sem fios. O sistema myGrid é, em bom rigor, constituído pelo tapete carregador e por um conjunto de capas e clipes para os telemóveis ou outros aparelhos que se queiram carregar. Quando um aparelho equipado com uma capa ou um clipe compatível é colocado em cima do tapete começa a ser carregado, como se estivesse ligado a um carregador convencional. O tapete permite o carregamento de até 4 aparelhos em simultâneo. O ponto menos bom do myGrid prende-se exactamente com a necessidade de diversos componentes. Assim, para alguns telemóveis a Duracell proporciona bolsas protectoras que ligam à entrada de carregador e têm depois na parte traseira os conectores necessários para carregar quando pousados no tapete. Para os restantes aparelhos existe uma série de clipes que se adaptam apenas à entrada de carregador. Aqui incluem-se, por exemplo, entradas Nokia, Motorola e USB Mini. A estes clipes é depois preciso prender uma peça que fica na parte traseira e faz o contacto com o tapete. Em traços gerais, o myGrid apresenta-se como um conceito muito interessante, capaz de simplificar a tarefa de carregar telemóveis. No entanto, a necessidade de diversos adaptadores, dos quais o pacote básico apenas traz um, juntamente com um preço de 40€ pelo tapete e 20€ por cada acessório extra tornam-no menos apelativo.

O Nexus S é o novo smartphone da Google, produzido pela Samsung, que vem equipado com a mais recente versão do sistema operativo Android e já se encontra à venda em Portugal desbloqueado e através da Vodafone. A nível de software o destaque vai para a versão mais recente do Android, 2.3 "Gingergbread", e para a prontidão de actualizações. A Google aposta numa experiência mais "pura", oferecendo o sistema operativo sem modificações que outros fabricantes incluem nas suas versões de Android e que as podem tornar mais lentas. Por causa disto o telefone pode assim receber as actualizações do sistema operativo mal elas estão disponíveis, não tendo que esperar pelas adaptações do fabricante. Para além das novidades do sistema operativo, o Nexus S traz várias aplicações Google, como sejam a de acesso ao Gmail e aos Google Maps. Estão ainda, claro, disponíveis as muitas aplicações da loja Android Market. Quanto ao hardware, salta à vista o ecrã ligeiramente curvo. Não visíveis mas tão ou mais importantes são por exemplo o processador Hummingbird de 1 GHz, e o chip de comunicações próximas NFC. Este último não tem para já grandes aplicações mas promete a prazo mudar a forma como interagimos com o que nos rodeia. Assim será por exemplo possível aproximar o telemóvel de um cartaz de cinema equipado com um chip NFC para obter informação sobre o filme ou usá-lo numa loja para efectuar pagamentos electrónicos. Apesar das novidades, o Nexus S não deixa de ser uma evolução sobre versões existentes de Android não se esperando que revolucione o mercado. Os preços são de 499€ e 589€ para as versões Vodafone e desbloqueada, respectivamente. www.google.com

04 Logitech Z305 As colunas USB Z305 são a resposta da Logitech ao problema da falta de qualidade de som da maior parte das colunas que vem de raiz com os computadores portáteis. Para além de oferecerem uma melhoria de som, fazem-no de uma forma pouco intrusiva e descomplicada. As Z305 consistem num tubo de cerca de 30 cm com as colunas nas pontas e que se prende ao monitor do portátil com um clipe. Alojado no interior está um cabo USB que se liga ao computador para utilizar as colunas e na parte superior há 3 botões grandes para controlar o volume. Há ainda uma entrada standard de 3.5 mm para ligar um leitor de multimédia com um cabo auxiliar e ouvir música directamente, sem o intermédio de um computador. Quando desmontadas do monitor as colunas podem ser transportadas numa bolsa que vem incluída. Para além do aumento de volume estas colunas propiciam também um som mais claro e menos distorcido do que o das colunas de origem, particularmente para sons intermédios e agudos. Os drivers de software permitem ainda fazer ajustes a graves e a utilização de um equalizador. A disposição das colunas dão ainda lugar àquilo a que a Logitech chama de som a 360º, dado que não há uma posição privilegiada para ouvir o som. As Z305 são uma solução simples e prática para quem pretende desfrutar de uma boa qualidade de som num computador portátil sem ter que o ligar a um sistema de colunas de secretária fixo. É leve, com cerca de 200 g, e fácil de transportar e ideal para por exemplo ver um filme com o portátil ao colo. Custa aproximadamente 60€. www.logitech.com

www.duracell.com Paulo Alcino

A nova consola portátil da Nintendo está nas lojas no final de Março e traz consigo muitas e diversas novidades, tanto a nível de capacidade técnicas para correr jogos como a nível do tão badalado 3D sem necessidade de óculos especiais. Seis anos depois do lançamento da DS original, a Nintendo apresenta agora o novo modelo, a 3DS. O trocadilho com o nome aponta para uma das novidades, jogos em 3D sem óculos. Tal como a DS original, esta tem 2 ecrãs, estando o superior dotado de uma tecnologia de barreira de paralaxe que permite mostrar a cada olho uma imagem diferente e construir assim imagens 3D. A profundidade de 3D é controlada por um botão de deslize que permite ajustar entre uma imagem completamente plana e uma imagem com profundidade máxima. A desvantagem deste sistema é a necessidade de um certo alinhamento da cabeça do utilizador com o ecrã. Mas as novidades não se ficam por aqui. As muito melhoradas capacidades técnicas de processador, memória e gráficos abrem a porta a jogos muito mais exigentes do que os que a consola anterior suportava. São de se esperar adaptações de jogos que até há bem pouco tempo faziam parte do repertório de consolas não portáteis das gerações anteriores. A consola inclui ainda um par de câmaras que permitem fotografar em 3D e, mais ainda, jogar jogos de realidade aumentada, em que os objectos de jogo são mostrados em cima das imagens captadas em tempo real. A Nintendo 3DS apresenta-se como uma pequena consola portátil cheia de novidades, algumas capazes de mudar em muito este segmento de mercado. Já a etiqueta de 250€ pode levar alguns a esperar uma descida de preço antes de a comprar.

{ parêntesis jup abril 2011


CRÍTICA

música cinema

2011 abril jup parêntesis }

A Serbian Film

de Ahron Keshales e Navot Paposhaddo

Apetece-me falar mal de “A Serbian Film”. Por dois motivos: primeiro, porque uma pequena parte de mim enquanto espectador ainda acredita na publicidade que antecede a estreia de um filme; segundo, porque o filme de Srdjan Spasojevic é mesmo mau. Filme-choque do ano, polémico, pornográfico, violento, ofensivo, repulsivo, “A Serbian FIlm” tem tudo o que habitualmente não se encontra ao mesmo tempo em hora e meia de cinema. E por muito que o realizador defenda que o seu filme é uma metáfora sobre a Sérvia do pós-guerra, a verdade é que essa mensagem – ou qualquer outra – não é perceptível. O mesmo é dizer que todos os ingredientes que deram fama a “A Serbian Film” parecem gratuitos e desprovidos de sentido. De tal forma que o que o torna mesmo insuportável, é o absoluto tédio a que sujeita os espectadores durante uns longos, longuíssimos 60 minutos. Resultado: sacrifica-se a qualidade para dar espaço à provocação e obtém-se um filme fraquinho e cujo verdadeiro interesse é meramente residual. } Nuno Matos

Realizado por Ahron Keshales e Navot Paposhaddo, “Rabies” demonstra na perfeição a velha Lei de Murphy, que defende que “se algo pode correr mal, correrá mal da pior maneira, no pior momento e causando o maior estrago possível”. E neste improvável filme de terror israelita, as coisas correm terrivelmente mal para um grupo de pessoas que se cruzam no local errado à hora errada. Não se sabe se seria essa a intenção dos realizadores, mas é possível ver nestes acontecimentos tenebrosos uma metáfora da condição humana e de como esta facilmente se transforma numa selvajaria irracional. Porque de facto, e pensando bem, nada faz prever a barbárie com que somos presenteados durante uma bem passada hora e meia. Porque, e apesar do género escolhido pela dupla de realizadores, a verdade é que o filme é divertido e despretensioso. E não é todos os dias que vemos um filme de terror simpático, bem realizado, equilibrado em todas as suas facetas e que dá uma lição de eficácia à fábrica de Hollywood.} Nuno Matos

Brick by Brick

Voca People

Um som mais agressivo, uma voz mais grave, ritmos menos rápidos e mais poderosos. Assim se pode descrever a nova música dos Arctic Monkeys, “Brick by brick”, disponível online no início do mês de Março na página youtube da banda. A voz, que quase nem parece do jovem Alex Turner, perdeu também algum do seu acentuado sotaque já tão característico. A música perdeu velocidade mas ganhou mais solidez, mais profundidade e mais emoção. Mas parece ser só na sonoridade que se denota a maturidade musical que parece ter desenvolvido a banda britânica. A letra surge completa o suficiente mas pouco complexa. Como quem diz, a ideia é boa mas esperava-se um bocadinho mais. Esta nova música foi descrita apenas como um “incentivo” ao novo álbum, não tendo sido assumida oficialmente pela banda como single. No entanto, é garantido que estará presente no quarto álbum de Arctic Monkeys e quem sabe se não a ouvimos ao vivo já este ano, no Festival Super Bock Super Rock, a 16 de Junho.

O regresso dos Voca People a Portugal vem acompanhado de grandes sucessos entoados por estes verdadeiros instrumentos humanos. O talento do beatbox é aqui demonstrado pelo grupo israelita de uma forma espectacular. O espectáculo do Coliseu do Porto foi marcado por momentos de boa disposição e puro entretenimento. Muito notável o envolvimento e as brincadeiras com o público. O alinhamento era capaz de contar uma história. Desde “Holiday” de Madonna, a “Thriller” de Michael Jackson, passando por um medley dos Queen e até uma viagem cinematográfica, o talento deste grupo é inimitável, e isso viu-se bem, ao vivo e a cores no Coliseu. Com todo este talento, o espectáculo podia durar mais um pouco, tal era o envolvimento do público presente. Mas os Voca People nada deixam a desejar, e superam as expectativas, com música adequada a todas as ocasiões. Destacam no seu espectáculo o poder da voz humana e a importância da música na vida, ao dizerem repetidamente: “Music is life! Life is music!”.} Ilídio Marques

Arctic Monkeys

} Liliana Pinho

Viva México

livros

Rabies

de Srdjan Spasojevic

Voca People

O Clube de Cinema

de Alexandra Lucas Coelho

de David Gilmour

Viva México conta a história de um México que vai muito além dos postais turísticos, das praias e da Chichén Itzá. Da Cidade do México a Ciudade Juárez, de Oaxaca, a Juzchitán, passando por Ixtepec, Chiapas e pelo Ycatán, Alexandra Lucas Coelho traça-nos um retrato do México nos que diz respeito à história, cultura, património e as grandes questões e problemas que o país enfrenta como é o narcotráfico, a violência ou a emigração. A jornalista vai-nos descrevendo as suas vivências nas três semanas em que esteve no México “ de mochila às costas” em reportagem para o jornal Público. Ixtepec é a cidade onde “desaguam os pobres dos pobres, vindos de toda a América Latina (…) vêm da Guatemala, das Honduras, El Salvador, Nicarágua”, ilegais no México, fazem deste país uma porta de entrada clandestina para os Estados Unidos. “Deixaram de ser gente: são os ilegais. Lutaram pelos melhores lugares do comboio. E assim, com histórias pessoais, com conversas com pessoas de todas as idades, de todos os estratos sociais que esclarecem o leitor sobre o passado do México.

Um pai, um filho e três filmes por semana são o mote de “O Clube de Cinema”. Uma história comovente e verídica, da autoria de David Gilmour, romancista canadiano. Quando o seu filho Jesse está numa encruzilhada problemática na sua vida escolar, David decide “educá-lo” em casa. Como crítico de cinema, usa a melhor arma que conhece: a sétima arte. Uma história inspiradora e bem construída, um retrato bastante fiel e comovente. Chega a ser uma narrativa com grandes riscos sociais, retratando o período adolescente bastante acidentado de Jesse, e as atitudes algo condescendentes do pai. Neste livro, fala-se de filmes como “Os 400 Golpes”, “Instinto Fatal” e “Crimes e Escapadelas” de Woody Allen. O pai faz questão de apontar todos os pormenores a que quer que o filho preste atenção, como se estivesse a dar exemplos de vida e critica abertamente o que acha negativo. É muito interessante observar esta interacção pai/filho, e a maneira como Jesse vai crescendo e lutando contra os seus fantasmas.

} Daniela Teixeira

} Júlia Rocha

crítica/11


12/cardápio

{ parêntesis jup abril 2011

em Abril

Swans

MÚSICA

TEATRO

EXPOSIÇÕES

VÁRIOS

10 DOMINGO

ATÉ DIA 6

ATÉ DIA 9

1E2

Swans

Quack! O Musical

Survivors

Ópera: As Bodas de Fígaro

CASA DA MÚSICA 21h30 — 25€

COLISEU DO PORTO Simone

TEATRO SÁ DA BANDEIRA 10€ E 12,50€

CENTRO PORTUGUÊS DE FOTOGRAFIA

ATÉ DIA 10

COLISEU DO PORTO 21h00 — DE 10€ A 40€

5 TERÇA-FEIRA

19:30h – 25€

PEQUENO AUDITÓRIO DO RIVOLI

15 SEXTA-FEIRA

QUINTA A DOMINGO ÀS 21H30 10€ (PARA -30 E +65 ANOS: 7,50€)

Coppélia: Moscow Ballet

Pássaro

GRANDE AUDITÓRIO DO RIVOLI

9 SÁBADO

MARIA VAI COM AS OUTRAS 22h00

16 SÁBADO CDGO

Long Way to Alaska

ENTRADA LIVRE

Cinderela XXI

SÁBADO ÀS 15h00 E 17h00 DOMINGO ÀS 15h00 7,50€ A 15€

15 E 16

CENTRO CULTURAL DE CAMPO

22 SEXTA-FEIRA

Filhos de Assassinos

King Salami and the Cumberland 3

ATÉ DIA 17

ARMAZÉM DO CHÁ

21h30 — 1€

QUARTA-FEIRA A SÁBADO ÀS 21h30 E DOMINGO ÀS 16h00 A PARTIR DE 7,50€

22h00 — 22€

Exposição de fotografia do projecto de Arquitectura Social no Malawi

ATÉ DIA 16

SERPENTE – GALERIA DE ARTE CONTEMPORÂNEA Paisagens VI

TERÇA A SÁBADO DAS 15h00 ÀS 19h00 ENTRADA LIVRE

ATÉ DIA 23

SPUT&NIK THE WINDOW Exposição de ilustração de Esgar Acelerado

GALERIA AP’ARTE

Azul longe nas colinas

TERÇA A SÁBADO DAS 11h00 ÀS 13h30 E DAS 15h00 ÀS 20h00 ENTRADA LIVRE

QUINTA-FEIRA A SÁBADO 21H30, DOMINGO 16H00

Patrick Watson

PLANO B

DE 8 A 17

TEATRO CARLOS ALBERTO

TEATRO SÁ DA BANDEIRA

21H30 — DE 18€ A 30€

TEATRO NACIONAL DE SÃO JOÃO Exactamente Antunes

23 SÁBADO

COLISEU DO PORTO

Fábula Buffa

DE 28 A 15 DE MAIO

MOSTEIRO SÃO BENTO DA VITÓRIA A Morte do Palhaço

QUARTA-FEIRA A DOMINGO, 21h30

DE 28 A 15 DE MAIO TEATRO HELENA SÁ E COSTA

A Morte do Dia de Hoje

QUARTA-FEIRA A DOMINGO, 21h30

Primavera

ATÉ DIA 1 DE MAIO GALERIA MUNDO FANTASMA Seduce and Destroy

ENTRADA LIVRE

ATÉ DIA 15 DE MAIO

CENTRO PORTUGUÊS DE FOTOGRAFIA Porto Íntimo

ENTRADA LIVRE

ATÉ 17 JULHO

JARDIM BOTÂNICO DO PORTO A Evolução de Darwin

TERÇA A SEXTA DAS 10H00 ÀS 18H00 SÁBADO E DOMINGO - 10H00 ÀS 19H00 4€ (COM DESCONTOS)

Long Way to Alaska

FUNDAÇÃO DE SERRALVES Workshop : Jornada Fotográfica “Primavera em Serralves” Com António Sá

9h00-19h00 —60€

11 A 16

FUNDAÇÃO DE SERRALVES Workshop: Vídeo “Vjing” Com Tiago Pereira

19h00 ÀS 21h00 DE SEGUNDA A SEXTA E DAS 10h00 ÀS 13h00 NO SÁBADO — 130€

16 SÁBADO

COLISEU DO PORTO Palestras Life Energy 20h30 — 5€

ATÉ 30 DE JUNHO FUNDAÇÃO DE SERRALVES

Conferência O Imaterial: Os Novos Paradigmas da Contemporaneidade

QUINTA DAS 21h30 ÀS 23h00 — 5€


JUP — ABRIL 2011

U.PORTO

Verão com sabor a U.Porto PÓLOS DE MIRANDA DO DOURO E DE FAMALICÃO SÃO AS NOVIDADES DA 4.ª UNIVERSIDADE DE VERÃO. INSCRIÇÕES ATÉ 17 DE ABRIL.

U.PORTO

AGENDA 5, 12 e 26 DE ABRIL CICLO DE CINEMA “CINEWEIRD” Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP), sala B003 , 21h00 Dia 5: "Mulholland Dr.", de David Lynch Dia 12: "Memento", de Christopher Nolan Dia 26: "O Sétimo Selo", de Ingmar Bergman Entrada livre

13 e 14 DE ABRIL II UPMUN (MODEL UNITED NATIONS) Anfiteatro Nobre da Faculdade de Letras da U.Porto (FLUP), 18h30 Evento aberto ao público em geral.

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“El Cid”, de Anthony Mann (1961); apresentação por José Carlos Miranda (FLUP) Integrado no do Seminário Medieval de Literatura, promovido pelo Departamento de Filosofia da FLUP Entrada livre

18 a 21 DE ABRIL WORKSHOP DE FOTOGRAFIA DE ARQUITECTURA Sala de Formação da Reitoria da U.Porto (Praça Gomes Teixeira), 18h30 às 21h30 Inscrições através do e-mail anamartins@reit.up.pt e do telefone 220408193 Mais informações em http://bit.ly/hMwoHJ

21 DE ABRIL

Inscrições (até 4 de Abril) e mais informações em https://sites.google.com/site/upmun2011/ ou através do e-mail upmun2011@gmail.com

OFICINA DE ORIGAMI DE PÁSCOA Edifício da Reitoria da U.Porto (Praça Gomes Teixeira), 18h30 às 21h00 Inscrições através do e-mail anamartins@reit.up.pt e do telefone 220408193

14 DE ABRIL

Mais informações em http://bit.ly/giXYUh

CICLO DE CINEMA E DEBATES “ÉPICA IDADE MÉDIA” Anfiteatro Nobre da Faculdade de Letras da U.Porto (FLUP), 17h30

100 medalhas para a U.Porto

N

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o próximo mês de Julho, os banhos de sol não serão a única forma de passar o tempo para os estudantes da academia do Porto. Substitua-se a areia da praia por algumas das mais belas paisagens do país, junte-se a companhia privilegiada de Eça de Queiroz ou de Aristóteles e cumprem-se alguns dos pressupostos da Universidade de Verão 2011, o programa da Universidade do Porto que, pelo quarto ano consecutivo, conduzirá os participantes a várias zonas da região Norte para frequentar cursos de curta duração em temáticas variadas, sob orientação de docentes da maior universidade portuguesa À imagem das summer schools organizadas pelas principais universidades do mundo, a U.Verão promete uma experiência única onde aprendizagem, convívio e aventura combinam num leque de formações integradas no contexto regional. É assim que, dentro de poucos meses, a obra de Camilo Castelo Branco se revelará num percurso pelos espaços da casa do escritor, o Latim será língua oficial com vista para o Rio Douro, entre outras experiências garantidas por uma oferta recorde de dez programas / módulos distribuídos por cinco pólos. Na verdade, a Universidade de Verão apresenta-se em 2011, mais ambiciosa do que nunca. Depois de uma primeira edição totalmente centrada no pólo de Arouca, o projecto reforçou-se em 2009, com o Pólo do Porto e, em 2010, com a criação do Pólo de Baião. Este ano a U.Verão volta a crescer, passando a contar com pólos em Vila Nova de Famalicão e Miranda do Douro. Cumpre-se desta forma um caminho de consolidação que visa abrir a Universidade à região envolvente, estimulando a participação de estudantes– de graduação ou de pós-graduação - e profissionais portugueses ligados às mais variadas áreas, mas também de estudantes de outros países. É precisamente a pensar nos estudantes estrangeiros que a U.Verão 2011 arranca, a 4 de Julho, com um curso de Português no Pólo do Porto. Ao longo do mês, os participantes vão ainda

aprender as bases do Latim num curso intensivo de duas semanas, útil, quem sabe, para debater “Filosofia e teoria política” com Platão, Locke ou Maquiavel (11 a 15 de Julho). Fora da cidade, a U.Porto desce pelo Douro até Arouca e Castelo de Paiva, em cujas paisagens se vão dar a conhecer os “Espaços, modos de viver e habitar” de um dos mais impressionantes tesouros naturais do país. Já no Pólo de Baião / Santa Cruz do Douro, cabe a Isabel Pires de Lima, ex-ministra da Cultura e professora da U.Porto, liderar um percurso pela literatura portuguesa dos séculos XIX a XXI (11 a 15 de Julho). Mas é mais a norte que se revelam as grandes novidades do ano. Começando pelo Minho, o Pólo de Vila Nova de Famalicão/São Miguel de Seide reserva um roteiro pela obra de Camilo de Castelo Branco (17 a 28 de Julho), com passagem por vários locais associados ao escritor. Igualmente interessante será o Pólo de Miranda do Douro/ Picote que, tirando partido das singularidades daquela região transmontana - a língua, a música, ou a gastronomia – tem como atractivo a aprendizagem e prática da língua e cultura mirandesas. Importa reforçar que, além das aulas teóricas e práticas, todos os cursos da U.Verão incluem um programa alargado de visitas de campo e momentos de convívio. Tal é possível graças à colaboração com as diferentes autarquias envolvidas e outras instituições parceiras como a Fundação Eça de Queiroz ou a Casa de Camilo. Se estás interessado… … em participar na Universidade de Verão, só tens que escolher o(s) teu(s) programa(s) preferido(s) e inscrever-te até dia 17 de Abril. Para isso, deves preencher e enviar a ficha de candidatura, juntamente com o curriculum vitae (CV) e fotocópia do cartão de cidadão / Bilhete de Identidade, para o e-mail educacao.continua@reit.up.pt. Para mais informações (datas, preços, horários), visita o site da U.Porto em http://www. up.pt > Estudar na U.Porto > U.Verão, ou contacta a Unidade de Educação Contínua da U.Porto através do telefone 220408198. •

uma altura em que celebra o seu primeiro Centenário na qualidade de maior universidade portuguesa e líder da investigação científica no país, a Universidade do Porto prepara-se também para reafirmar a liderança ao nível do desporto universitário. Esse é pelo menos o objectivo dos 130 estudantes da instituição que se vão deslocar a Coimbra de 11 a 19 de Abril, para participar nas fases finais concentradas dos Campeonatos Nacionais Universitários (CNU’s) 2011 Partindo com o estatuto de grande candidata ao título colectivo, a U.Porto estará representada em sete das 14 modalidades em competição: Andebol (feminino), Basquetebol (feminino), Hóquei em Patins (masculino), Natação, Rugby Sevens, Triatlo e Voleibol de Praia (feminino e masculino). O principal objectivo passa por “conquistar medalhas nas modalidades em que vamos participar”, revela Bruno Almeida, director do Gabinete de Apoio ao Desporto da U.Porto (GADUP). Numa altura em que soma já cinco títulos colectivos em 2011 (Atletismo Pista Coberta, Ténis de Mesa, Ténis, Vela e Xadrez), a U.Porto vai a Coimbra para repetir o feito do ano transacto: ser a primeira classificada no ranking do desporto universitário nacional. Façanha que, em 2010, culminou com a conquista de mais de 100 medalhas, algo inédito nas anteriores edições dos CNU’s.

Perspectivando o desempenho de cada modalidade, as equipas de Andebol feminino (penta-campeã nacional universitária) e de Hóquei em Patins masculino (actual campeã e com três títulos no palmarés) procurarão revalidar os respectivos títulos nos pavilhões de Coimbra. Pretensão idêntica tem a selecção de Ténis individual feminino, dominadora dos courts nacionais desde 2005. No Rugby Sevens, assinala-se a estreia absoluta da equipa masculina, que chega às fases finais com o ouro no horizonte. Já a equipa feminina, formada em 2009, quer melhorar o bronze obtido em 2010. Igual meta tem a equipa de basquetebol feminino, apostada em reconquistar o título que lhe tem fugido nos últimos campeonatos. Repetir o feito do ano passado é por sua vez o objectivo da equipa de Triatlo, estreante em 2010 com a medalha de ouro no colectivo. Por fim, nas areias do Voleibol de Praia, a dupla feminina quer reconquistar o título nacional alcançado em 2010, ao passo que os homens buscam o sexto título em sete anos. Aqui fica a agenda dos CNU’11: Andebol e Basquetebol, de 12 a 15 de Abril; Hóquei de Patins, de 12 a 14 de Abril; Rugby Sevens a 11 de Abril; Ténis nos dias 13 e 14 de Abril; Triatlo a 16 de Abril; Voleibol de Praia nos dias 18 e 19 de Abril. O CNU de Natação prolonga-se até 15 de Maio.•

e-Learning Café: Ponto de encontro obrigatório

E

m 2008, a Universidade do Porto inaugurou o seu primeiro e-learning Café no pólo da Asprela. Lazer, trabalho e novas tecnologias combinavam então num inovador espaço que, três anos depois, é um ponto de frequência obrigatório para a comunidade académica. Instalado no complexo de residências do Pólo Universitário da Asprela (junto à estação de metro "Pólo Universitário"), o e-Learning Café é um espaço único no país, que vai ao encontro das necessidades dos estudantes da U.Porto (e não só…). A ideia passa por reunir convívio e aprendizagem num espaço multifacetado (equipado com salas de trabalho, cafetaria, uma zona chillout, entre outras valências), pensado para aproximar as diferentes comunidades que povoam o campus da U.Porto. Para a forte dinâmica do e-Learning Café - cerca de 50% dos utilizadores utilizam-no durante

todo o ano, mais do que duas vezes por semana - contribui também o programa de actividades que ali acontecem regularmente. Workshops, conferências e concertos são apenas exemplos dessa oferta. Perante isto, não estranha que a maioria dos utilizadores considerem o e-learning Café um espaço “muito importante” no campus da U.Porto. Uma realidade que a Universidade vai potenciar com a criação de um e-Learning Café no Pólo I (Campo Alegre). Ainda em esboço, o novo espaço ficará localizado no Jardim Botânico. De regresso à Asprela, o e-Learning Café da U.Porto está aberto todos os dias da semana entre as 8 e as 4 horas. Em certas alturas do ano (ex: épocas de exames) o espaço fica aberto 24 horas, respondendo assim às necessidades da comunidade académica. • textos Tiago Reis/ Gabinete de Comunicação da Reitoria da U.P.


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JUP — ABRIL 2011

SOCIEDADE

Graffiti: quando as ruas são galerias e os muros telas SOBREVIVEU A CINCO DÉCADAS; ULTRAPASSOU AS BARREIRAS DA CIDADE DE NOVA IORQUE E GANHOU AS RUAS DE TODO O MUNDO. HOJE, O GRAFFITI CONTA COM A ADMIRAÇÃO DE MUITOS QUE O CONIDERAVAM LIXO, MARCA LUGAR CATIVO NAS RUAS DE TODO O MUNDO E CHEGA MESMO A SER, PARA ALGUNS, UMA ACTIVIDADE REMUNERDADA. por Dalila Teixeira e Nuno Moniz fotografias cedidas por Maniaks

E

stávamos em 1960 quando, na periferia de Nova Iorque, surgia a cultura do Graffiti. Com frases e caligrafias elaboradas, desenhos de protesto social e cunho político, foi, por décadas, tida como puro vandalismo. Porém, e apesar de uma forma conturbada, essa arte e expressão sociocultural sobreviveu no tempo. Hoje, em pleno século XXI, a manifestação ganhou um apreço artístico nunca antes imaginável. São vários os pontos que convergiram para que a visão que hoje se tem do graffite fosse modificada. Nenhuma delas é a principal. E o importante é que uma sucessão de acontecimentos culminou na actual ideia que se tem do graffiti. Na opinião de Helena Santos, socióloga e investigadora no CETAC.media, é preciso separar conceitos já que “nalguns casos é clara violação de propriedade privada ou pública e realizada exactamente para e por isso”, alegando ainda que vários estudos mostram que o grafiti se trata de “expressões de revolta e afirmação em grupos sociais que tendem a não dispor de meios institucionais para o fazer”. Assim sendo, para a socióloga, “esta perspectiva poderá aplicar-se, quer a grupos estigmatizados e/ou considerados ‘marginais’, quer a grupos de adolescentes, ou ainda a algum graffiti político”. A sociólogo arremata separando conceitos: “tendemos a não lhe chamar graffiti, mas pichagem”. Para Helena Santos, a moeda tem também outra face: “noutros casos, em radical oposição, classificamse de obras de arte”. A investigadora conclui: “o que eu diria é que não é um fenómeno homogéneo, nem do lado da ‘produção’, nem do lado do ‘valor’ que lhe atribuímos”. Na verdade, se nas décadas de 60 e 70 do século passado se vivia a efeverscência da pop art no interior das galerias, fora delas a visão de liberdade artística começava a ser expressiva e, como tal, o graffiti não poderia ser avaliado de outra forma que não como desordem e rebeldia. Na opinião da socióloga Helena Santos, “em alguns casos ainda hoje é assim”. Porém, aqui e ali, aos poucos os ideais urbanos foram absorvidos pela população que começava a dar conta da efemeridade das coisas e, porque não, da arte e, assim, com o mesmo ritmo que modificavam os ambientes da cidade, modificava-se também o pensamento sobre o graffiti. Segundo António Soares ,agente da Polícia de Segurança Publica (PSP), “Não há duvidas que há graffitis que são autênticas obras de arte” alertando, contudo, que “há outras que são puro vandalismo e servem apenas para marcar terreno”. Porém, e apesar de todas estas alterações de pensamentos terem proporcionado ao graffiti uma outra reputação, foi também a constante vontade dizer algo a todos, de forma inclusiva e democrática, que fez desta expressão uma das mais importantes formas de arte urbana da actualidade.

› JEAN GUY Há dez anos atrás começou a fazer ‘tags’ nas estações de comboios de Marselha, em França. Com pouca informação disponível na altura queixa-se, entre uma licenciatura e dois mestrados. Foi aperfeiçoando a sua técnica - ‘skills’ para ser correcto - e agora, dez anos volvidos, viaja para todo o lado entre workshops e conferências. Encontrámo-nos com o Jean Guy, provavelmente mais conhecido por ASOL, numa antiga fábrica, em Gaia, que agora se transformou num “museu de arte urbana”, dizia-nos uma das participantes no workshop do ASOL sobre arte urbana. O workshop inseria-se num intercâmbio internacional do Grupo de Acção e Intercâmbio Artístico e Cultural (GAIAC) tendo como tema “Habitação para todos”. Jean Guy tem 30 anos e pertence à ‘crew’ PM e a uma associação cultural internacional (artes visuais, música, teatro, sociologia entre outros campos) de nome “Ice Colectivo”. Em resposta a uma primeira farpa sobre o que acha ele de paredes cheias de assinaturas pessoais, vulgo ‘tags’, a resposta foi pronta: “Um tag é caligrafia, é procurar um desenho próprio, é uma expressão de criatividade.”. Antecipando-se disse logo sentir-se “familiarizado” com as questões que são sempre levantadas, tais como a paranóia do graffiti, a propriedade privada, etc. “Tudo é político. Um tag é política”, desenvolveu dizendo que “a opinião sobre intervenção nas cidades, sobre a arte urbana, realmente evoluiu, mas que neste momento há uma má concepção sobre as várias expressões artísticas parecendo que graffiti é vandalismo e arte urbana é arte a sério”. Confessa: “existe uma diferença nas várias intervenções”. Então, onde está a diferença? Responde-nos: “ o que eu acho é que tags, graffiti e arte urbana é arte e é política. São apenas diferentes tipos de intervenção”. Pedimos que nos desse então a sua opinião sobre a visão que existe sobre o graffiti ao que prontamente respondeu: “graffiti está na encruzilhada entre questões como arte, urbanismo, vandalismo, legalidade... Portanto, um assunto complicado pelos vários pontos de vista que inevitavelmente existem”. Numa última questão sobre a pessoa, o “artista”, alertou dizendo que importante era não cair num “falso moralismo”, na “criação de pseudo identidades”. Perguntámos: falar da arte, não do artista...?”. Retorquiu com risos: “Claro”.

› OS “PUTOS” QUE GANHAM DINHEIRO A FAZER GRAFFITI Rui Roncha, Diogo Ruas e Tiago Braga; Blast, Nitro e Mots; ou simplesmente Maniaks. São os “putos” que ganham dinheiro a fazer Graffiti. Rui, 24 anos, estudante de Arquitectura da Universidade do Porto; Diogo, 24 anos, estudante da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto; Tiago, 24 anos, freelancer nas áreas

do Deejaing, Graffiti e Design. O que têm em comum? Ano de nascimento: 1986. O que os liga? A arte do Graffiti. Conheceram-se na escola secundária. Eram os três estudantes de artes e tinham alguns amigos em comum. Foi precisamente nessa altura que a amizade surgiu e acabou mesmo por ficar mais forte quando descobriram o gosto comum pelo Graffiti. E relembram: “passávamos grande parte do nosso tempo juntos a desenhar, trocar ideias e pintar”. Reconhecem ter sido influenciados pelo movimento hip hop que surgia, nessa altura, na cidade do Porto. Lembram como se estrearam: “começámos a transpor os desenhos do papel para a parede. Uns em locais legais, de dia, e outros, como adolescentes que éramos motivados pela adrenalina e talvez por um inconsciente sentimento de rebeldia, fazíamo-los em locais ilegais, de noite”. Ao JUP contam que apesar de a nível individual sempre terem mantido as assinaturas Blast, Nitro e Mots, assinavam mais em nome colectivo (Maniaks e DB) e que, “como todos os pintores deste movimento a grande motivação era espalhar o nome e melhorar a técnica”. Para além disso confessam que também queriam “demonstrar que o graffiti podia ser uma forma de expressão artística igualmente válida e não uma expressão marginal e associada a universos com conotações negativas”.

A determinada altura, este trio dá o salto para algo não tão comum por terras portuguesas. Começam a utilizar a arte do Graffiti como forma de ganhar dinheiro. “A ideia surgiu naturalmente”, dizem. E explicam: “ todos precisamos de dinheiro e todos queremos trabalhar, então porque não aliar isso àquilo que mais gostamos de fazer, num saudável espírito de trabalho e partilha?”. A ideia ficou no ar e começaram a achar que seria possível e, mais ainda, quando “as pessoas nos abordavam enquanto pintávamos na rua felicitando-nos pelo nosso trabalho e pedindo para fazermos trabalhos” relembram. Segundo Maniaks, “os contactos foram aumentando e surgindo um ‘de boca em boca’. O trabalho que faziam nas ruas estava à vista de todos e por isso confessam que esse “foi o melhor cartãode-visita” que poderiam ter tido. “Estava lá visível para ser apreciado e valorizado e assim os clientes, ou futuros clientes, sabiam o que esperar do nosso estilo de pintar, da nossa linguagem”, concluem. De facto, o graffiti enquanto actividade remunerada pode parecer, segundo eles próprios, “um contra-senso”, mas para estes jovens a verdade é que o espírito com que se faz graffiti “é o mesmo seja nas ruas ou em encomendas directas”. E clarificam: “a nossa linguagem, o nosso sentido estético é o mesmo independentemente do local. Aliás, talvez até seja um desafio maior - passamos a ser confrontados com preocupações de adaptação da nossa arte a pessoas singulares que até aqui não existia”. Para Blast, Nitro e Mots “o artista não pode trabalhar isolado do mundo. Deve sim conseguir uma situação de compromisso”. E é isso que procuram fazer. •


SOCIEDADE

JUP — ABRIL 2011

Uma Horta aqui à porta O PROJECTO “HORTA À PORTA”, PROMOVIDO PELA LIPOR, VEM QUEBRAR AS BARREIRAS ENTRE “CAMPO E CIDADE” E TRAZ OS HÁBITOS RURAIS ATÉ À ÁREA METROPOLITANA DO PORTO. CULTIVAR ALIMENTOS DE MELHOR QUALIDADE E POUPAR ALGUM DINHEIRO SÃO DOS PRINCIPAIS BENEFÍCIOS DA INICIATIVA.

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NA BOCA DO "POBO" O QUE PENSAM NUM CABELEIREIRO PARA HOMENS?! -> Dia 23 de Março, pelas 10h, no dia de votação (à tarde) do PEC IV.

p. Achas que este Governo vai cair? Dário Paulo | 40 anos Cabeleireiro r. Eu ponho a pergunta assim: há alternativas a este Governo? Mas muito honestamente, acho que este Governo vai cair.

ou problemas de saúde ou familiares”. Ana Gouveia, estudante de Engenharia do Ambiente diz que projectos deste género são benéficos tanto para a sociedade como para as famílias. Cátia Almeida, estudante de Arquitectura Paisagista, concorda, e destaca a “ligação às origens” que pode ser feita através deste projecto, mas realça que se os talhões não forem bem usados pode “não ser muito bonito”. De facto, o “Horta à porta” só parece ter coisas boas, destacando-se os benefícios ambientais, económicos e sociais. E, de acordo com …Ana Lopes a principal dificuldade ainda é apurar o interesse de possíveis entidades parceiras em ceder talhões para este projecto. A iniciativa para já só pode ser considerada um sucesso: Hoje são já cerca de 3, 5 hectares de talhões espalhados por

dezasseis projectos de “Horta à porta”, e há já uma fila de espera de 1500 pessoas. Ana Lopes conta que espera-se que até 2016 sejam o número de hortas passe de dezasseis para 25, esperando-se a cada ano conseguir mais dois espaços de hortas comunitárias. Além destas “Hortas à Porta” há ainda dois projectos paralelos, uma “Horta de Subsistência” na Maia, que se destaca das restantes por ter talhões de 100 m2, com a famílias a poder vender os seus produtos no mercado local, e assim conseguir alguns rendimentos. Além disso, no Bairro Social de S.Pedro de Rates, na Póvoa de Varzim, há também uma horta comunitária exclusiva para os moradores desse bairro.• Vera Covêlo Tavares

Trabalhadores de centros comerciais: precários ou privilegiados? socióloga Sofia Alexandra Cruz apresentou, no passado dia 18 de Março, o livro «O Trabalho nos Centros Comerciais», resultado da sua tese de doutoramento. Esta obra surge como um instinto natural da imaginação sociológica de olhar além das fachadas e, através de interrogações, procurar perceber como funciona um universo tão quotidiano como são as grandes superfícies de comércio. O livro é um avanço numa área nova e desconhecida, sendo um passo importante na transformação das opiniões de senso comum em conhecimento fundamentado. Com um pendor essencialmente qualitativo, a investigação teve como principal técnica a aplicação de mais de 60 entrevistas, tendo focalizado a sua atenção nas áreas do vestuário e da restauração. Um dos principais eixos analíticos foi a criação de uma tipologia de lojas. Tal foi necessário uma vez que esta realidade apresenta-se como complexa e heterogénea, sendo impossível generalizar uma única situação, há singularidades no universo do vestuário e da restauração. A título de exemplo, enquanto nas lojas de vestuário a faixa etária do trabalhador é determinante

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para conseguir o emprego, na restauração esse factor é mais periférico. Na mesma linha de análise, foram criados perfis tipo que abarquem a diversidade de situações dos trabalhadores. Bastará, para isso, considerar dois universos: os trabalhadores que são estudantes e os que não são estudantes. Essa divisão provoca de imediato diferenças no contexto de trabalho, no grau de satisfação com o trabalho e o seu impacto nas estruturas familiares e pessoais. Este estudo permite ainda quebrar um pouco a relação que se estabelece entre estes trabalhadores e a noção de precariedade. Essa ligação não é absoluta, já que, por exemplo, cerca de 60% dos entrevistados apresentam uma segurança e estabilidade do ponto de vista contratual, tendo um contrato sem termo o que representa um sinal de segurança e garantia do posto de trabalho, algo que no contexto económico actual é relevante. A apresentação da obra decorreu na livraria Leitura Books & Living do Shopping Cidade do Porto, um dos locais onde ocorreram as observações aos trabalhadores, e esteve a cabo de uma bolseira da investigação e de uma

João Almeida | 24 anos Estudante r. Acho que o Governo não devia cair. Acho que se devia manter porque mesmo com a hipótese e tentativas de fazer cair acho vão todos fazer o mesmo. Acho que vai cair e que é uma questão de tempo até o FMI chegar aí.

Carlos Guedes Correia | 67 anos Aposentado r. Não, neste momento acho que o Governo não devia cair. Era aprovarem o PEC e passadas 4 ou 5 semanas, irmos a eleições. Mas acho que este Governo vai cair.

José Vilela | 72 anos Aposentado r. Acho que este Governo já devia ter caído e não é de agora. Acho que vai cair a não ser que volte atrás, mas acho que não o fará.

Rafael Carvalho | 41 anps Pintor de Construção Civil r. Eu acho que este Governo devia cair, acho que não está a ser correcto. (Se vai cair) Isso é o que vamos ver. Mas quem for para lá se calhar também não vai fazer melhor.

Gaspar Cravo | 58 anos Comerciante r. Acho que esse Governo nunca devia ter existido. Acho que vai cair e deve cair.

trabalhadora de um centro comercial que deu o seu testemunho pessoal em entrevista. Actualmente a autora continua os estudos nesta área, desta vez estendendo a sua análise aos seguranças, empregados de limpeza, gestores do espaço e responsáveis pelo marketing. • Gonçalo Marques

por Nuno Moniz

uem disse que a agricultura é uma coisa das aldeias? Certamente não conhecia o projecto “Horta à Porta”. O “Horta a Porta” é um conceito de agricultura urbana que já é praticado desde 2003 em alguns locais dentro da área metropolitana do Porto. Neste projecto, os cidadãos interessados recebem, o seu pedaço de terra, com o mínimo de 25 m2, bem como uma breve formação em agricultura biológica. Não há quaisquer custos para os cidadãos, mas pede-se aos utilizadores que cumpram uma série de regras, nomeadamente, frequentar essa formação que os irão encaminhar para melhor e mais ecológicas formas de cultivo, zelar pela boa manutenção e uso do espaço que lhes foi atribuído e promover as práticas de cultivo biológico. Quem usufrui da horta pode plantar lá o que quiseres com a excepção de árvores de fruto e é também pedida diversidade nos tipos de alimentos cultivados. O contrato tem a duração de um ano, mas pode ser prolongado caso haja interesse do utilizador e se verifique que ao longo do período de contrato foram cumpridas as regras de utilização do talhão e foram usadas as práticas da agricultura biológica. E para verificar se tudo corre bem e se as pequenas hortas estão a ser bem usadas, Ana Lopes, da Lipor, a entidade ao encargo desta iniciativa explica que “faz parte da gestão deste projecto a monitorização mensal das hortas e talhões. As razões que levam as pessoas a desistir do talhão passam por mudanças profissionais, de zona de residência,

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INTERNACIONAL

INTERNACIONAL E ECONOMIA

Revolução Árabe NUM MUNDO ÁRABE CARACTERIZADO POR DITADURAS, MANIFESTAÇÃO E MUDANÇA NÃO ERAM PALAVRAS DE USO CORRENTE. MAS COMO UM FÓSFORO NUM MONTE DE PALHA SECA, O JOVEM TUNISINO QUE PEGOU FOGO A SI MESMO NUMA SITUAÇÃO DE DESESPERO ATEOU UMA ONDA DE PROTESTOS, REVOLTAS E LEVANTAMENTOS POPULARES QUE ESTÁ A ABANAR ESTES REGIMES E JÁ FEZ ALGUNS DELES CAIR. A REVOLUÇÃO ESTÁ AÍ E NINGUÉM A SOUBE PREVER. texto Paulo Alcino ilustração Francisca Santos

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acontecimento que espoletou toda esta sequência de eventos poderia não parecer nada de extraordinário: uma polícia confiscou um carrinho de vegetais a um vendedor de rua, Mohamed Bouazizi, de 26 anos. O que se seguiu já não. Mohamed foi esbofeteado e cuspiram-lhe em cima. Impedido de protestar também na esquadra de polícia, ele tomou uma acção drástica. Cobriu-se com um produto inflamável e incendiou-se. Viria a morrer a 4 de Janeiro. Noutros tempos ou noutras circunstâncias esta história poderia terminar aqui. Mas a disseminação da informação do que tinha acontecido através da Internet e das redes sociais, juntamente com a repressão violenta da polícia às primeiras manifestações pacíficas na terra natal de Mohamed ecoaram junto de muitos jovens. Jovens esses com elevadas qualificações, facilidade em comunicar, desempregados e cansados de um regime opressor. Começaram com a Internet mas rapidamente vieram para a rua: os protestos seguiram-se em catadupa e cada vez maiores, chegando à capital Tunis, inabalados pela resposta violenta que obtiveram das forças de segurança. A pressão foi crescendo e a 14 de Janeiro o presidente Ben Ali, no poder há 23 anos, fugiu para a Arábia Saudita e resignou ao cargo. O governo que se lhe seguiu também esteve pouco tempo em exercício, com várias demissões na sequência de mais protestos contra membros do antigo

regime ainda lá presentes. Era o sinal de que os restantes árabes precisavam para saber que a mudança era possível. Inspirados pelo sucesso tunisino foram marcados protestos em vários países árabes, uns mais relevantes do que outros. Entre a Argélia e o Iémen, Jordânia e Bahrein, manifestações sugiram por toda a parte. Mas foi no Egipto que se seguiu outra grande mudança. A 25 de Janeiro começaram manifestações pacíficas. Nos dias que se seguiram centenas de milhares de pessoas ocuparam a praça Tahrir no centro do Cairo, tão inflexíveis em parar com o protesto quanto o presidente Hosni Mubarak parecia com abandonar o cargo. Aqui a revolta abrangia a sociedade de forma mais alargada, jovens e não tão jovens, muçulmanos e cristãos, desempregados ou não. Mubarak ainda respondeu, primeiro com mais repressão, ordenando até um corte geral da Internet no Egipto, e mais tarde com reformas, demitindo o governo e instituindo um novo, e garantindo que não se recandidataria às eleições agendadas para Setembro, mas não teve sucesso. A população queria que ele partisse imediatamente e foi o que veio a acontecer a 11 de Fevereiro, terminando a sua presidência que durou 29 anos e tendo o exército assumido a direcção do país por 6 meses, até à realização de eleições. Actualmente a revolta grassa na Líbia mas aqui a situação é mais complicada. Os protestos começaram a 15 de Fevereiro em Bengasi, no leste do país, cidade que entretanto se constituiu como capital dos rebeldes. Daqui a revolta espalhou-se pelo país, tendo chegado às portas da capital Trípoli, no ocidente. Mas o regime do

coronel Khadafi respondeu brutalmente, usando as forças armadas para recuperar várias cidades aos rebeldes, que entretanto também se armaram. Afigurava-se pois um cenário de guerra civil que parecia pender fortemente para o lado das forças pró-regime. A informação que chega do confronto não é clara nem transparente. Sabia-se no entanto que os confrontos já estavam a decorrer nas imediações de Bengasi, tendo o regime recuperado várias cidades. Entretanto as Nações Unidas aprovaram uma resolução para colocar em prática uma zona de exclusão aérea na Líbia, impedindo Khadafi de usar a Força Aérea contra os rebeldes e que levou à intervenção militar de vários países europeus e dos Estados Unidos. À data da escrita deste artigo não era ainda possível prever o rumo dos acontecimentos para vir. Mas, posto tudo isto, a revolta árabe em bom rigor ainda só depôs 2 regimes. Se na Líbia a revolta se encaminha para uma guerra civil e no Bahrein a insurreição da população de maioria xiita contra a monarquia e governo sunitas parece difícil de travar, na Jordânia a contestação teve pouca expressão (ainda que o rei tenha demitido o governo) e na Arábia Saudita o rei fez concessões económicas logo no início de toda esta crise, tendo havido poucas manifestações. No acompanhar destes eventos há que ter em conta que entre as populações árabes e as suas motivações há semelhanças mas também diferenças. E por último, se o mundo árabe mudou, não há certezas quanto ao que daí vai resultar, se uma verdadeira democracia ou se novas ditaduras, nem do impacto que resultará a nível mundial.

Aumento dos preços dos alimentos bate recorde em Fevereiro

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ela oitava vez consecutiva, os preços dos alimentos atingiram um novo recorde a nível mundial. De acordo com os dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), o aumento de 2.2% até aos 236 pontos em Fevereiro, face a Janeiro, foi o maior registo dos últimos 20 anos. A escalada de preços fez-se sentir, particularmente, nos cereais e lacticínios. Relativamente relação à colheita cerealífera, a organização apontou o aumento da procura e a quebra de produção em 2010 como as principais causas. Em resposta, para 2011, verifica-se uma redução dos produtos em stock e uma subida dos respectivos preços. No índice estabelecido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, são medidas as variações dos preços, de acordo com uma hipotética cesta básica que contempla cereais, açúcar, produtos oleaginosos, carne e produtos lácteos. De acordo com David Hallam, director do departamento de Comércio para os Mercados/FAO, "A inesperada alta do preço do petróleo poderia exacerbar uma situação muito precária nos mer-

cados alimentícios. Isto acrescenta uma maior incerteza sobre o comportamento dos preços (...)". A carne comportou um aumento 2%, enquanto os cereais e produtos lácteos sofreram uma inflação de aproximadamente 4%. Já o preço do açucar, contrariamente ao esperado, não teve alterações significativas. Em declarações à Lusa, Abdolreza Abbassian, especialista da FAO, prevê que «o preço dos alimentos no mercado mundial deverá permanecer próximo do nível recorde atingido em Janeiro pelo menos até ao Verão, sendo factor determinante as condições meteorológicas». Apesar de ser o maior aumento dos últimos 20 anos, especialistas descartam a hipótese de estarmos a atravessar um período idêntico a 2008 (ano da crise dos alimentos’). Estima-se que o nível de preços se mantenha até ao verão, não existindo perspectivas de grandes oscilações comparativamente ao panorama actual.• Filipa Rodrigues

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JUP — ABRIL 2011

INTERNACIONAL E ECONOMIA

Grécia: Solidariedade estudantil na luta pelo direito ao trabalho

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oram necessários 44 dias de greve de fome, 100 hospitalizações e varias tentativas de negociação com o governo Grego, para os 300 trabalhadores imigrantes em situação irregular no país, verem concretizadas as suas reivindicações pelo direito ao trabalho e à vida. A greve de fome começou a 25 de Janeiro, pela ocupação do Centro Local dos Trabalhadores da Confederação dos Sindicatos em Salónica, e pela Faculdade de Direito de Atenas, sob a premissa do asilo das Universidades que lhes concede um estatuto de protecção especial que impede as forças policias de actuarem. No seu primeiro momento, a greve contou com o apoio da Convenção da União Geral de Estudantes, que reconheceu nesta luta, não só um acto de solidariedade, mas também a precariedade e a desumanização da população Grega pelas medidas de austeridade que estão a ser implementadas pelo governo Grego. A moção de apoio aos trabalhadores imigrantes, apresentada pelo sindicato dos estudantes Aristeri Enota, foi aprovada pela maioria presente na Convenção, no mesmo momento em

que se elegeu como seus representantes um grupo composto por elementos do PASOK (Partido Socialista e actual governo) e do Nea Dimokratia (Partido Conservador). A união dos trabalhadoras imigrantes com a dos estudantes é vista assim como uma medida de resistência e luta pelo direito ao trabalho com salários justos e direitos assegurados. Apesar de tudo, algumas semanas depois, sob forte influência do Governo, os grevistas instalados na Faculdade de Direito de Atenas tiveram de ser realojadas em instalações cedidas pelo Comité de Solidariedade. Em “tempos” de crise económica e de desemprego crescente é difícil mobilizar as populações para as causas humanitárias. Assim, o Comité de Solidariedade teve uma papel fundamental no alerta para as tentativas do governo Grego em criar nos imigrantes bodes-expiatórios da crise económica, alertando que os mesmos são trabalhadores em funções não desempenhadas pela população Grega. Segundo fontes oficiais do governo, estima-se que mais de 128 000 trabalhadores entraram no país em situação irregular em 2010, provenientes na sua

maioria de Magreb Central, países que se encontram sobre fortes regimes ditatoriais, em convalescença de guerra civis recentes e economias em crise. No entanto a maioria dos 300 grevistas, na sua maioria trabalhadores na ilha de Creta, trabalha à mais de 2 anos em empregos precários, de mão de obra barata e sem direitos laborais, havendo casos em que se encontram a trabalhar no país à mais de 8 anos. A greve de fome, que conseguiu superar uma escandalosa campanha de mentiras promovida pelos mídia e pelo governo, terminou na passada noite de dia 9 de Março. O governo Grego autoriza assim a legalização de todos os trabalhadores imigrantes que comprovem viverem na Grécia à 8 anos, em oposição à actual lei de 12 anos, e a redução do número mínimo de vistos de segurança social, que são usados na Grécia como prova jurídica de emprego a fim de renovar a autorização de residência e a obtenção do cartão de saúde. Aos 300 grevistas, foi permitida permanência no país até que completem os anos mínimos para se candidatarem à total residência e os documentos necessário que lhes permitem viajar livremente para os seus países de origem. A greve de fome é uma forma de resistência não-violenta, ligada a exigências de objectivos muito específicos de mudanças politicas e combate a leis ou Estados repressivos. Comummente a ingestão de alimentos sólidos é suprimida, sendo apenas ingeridos líquidos, normalmente chás e água. Alguns casos, como aconteceu com alguns destes grevistas, a ingestão de líquidos é também suprimida de forma a aumentar o peso do protesto. Apesar não ser uma forma de resistência comum, por exigir uma grande visibilidade mediática, é muito usada pelos movimentos dos Direitos dos Animais (Barry Home, Martin Balluch), dissidentes e presos políticos de regimes autoritários (Angola, Cuba, Tibete, Turquia, Sahara Ocidental) e prisioneiros que pretendem denunciar as atrocidades a que estão sujeitos nas prisões (Guantánamo).

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Geração à Rasca, um fenômeno mundial: como desenrascar? OS JOVENS TÊM ENCONTRADO CADA VEZ MAIS DIFICULDADES DE CONSEGUIR, E SOBRETUDO DE SE FIRMAR, EM UM EMPREGO NA ÁREA PROFISSIONAL QUE SE CAPACITAM. MAS ESSE FENÔMENO NÃO SE RESTRINGE APENAS A PORTUGAL

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Geração à Rasca não é só portuguesa. A Geração à Rasca ultrapassa nacionalidades. Representada pela juventude que reivindica dignidade, respeito e democracia, ela está por todo lado. A classificação da UNESCO indica que a juventude é o período entre os 15 e os 24 anos. Há especialistas, no entanto, que defendem a extensão desse limite aos 29. Com base no perfil etário da UNESCO, existem hoje 1.181.435 jovens em Portugal, segundo dados de 2009 do Instituto Nacional de Estatística de Portugal (INE). Além do INE, instituições internacionais atuam monitorando indicadores sociais, culturais e econômicos de determinadas regiões. É o caso da Organização Internacional do Trabalho (OIT, em inglês, ILO), instituição da ONU especializada em levantar dados relativos à força de trabalho no mundo. A pesquisa mais recente, ILO Global Employment Trends for Youth 2010, aponta que dos 620 milhões de jovens do mundo todo, 81 milhões (6,3%) estavam desempregados no final de 2009: “o maior número até agora”, acrescenta o relatório. Isso representa 7,8 milhões a mais de jovens desempregados em comparação com 2007. Em âmbito europeu, 8,8% da juventude está desempregada. Em Portugal, segundo o último ranking mundial da OIT, divulgado em janeiro deste ano, o contingente de jovens desempregados é de 22,1%.

Caso brasileiro Enquanto isso, no Brasil, 15,3% dos jovens se encaixam nesse perfil. É o caso do jornalista brasileiro desempregado, Eduardo Campelo, 29. “No jornalismo, quando se tem estrutura e bom salário, você é explorado. Quando não é explorado, você ganha pouco e não consegue trabalhar direito” – reclamação que poderia ter saído da boca de um jovem manifestante da Geração à Rasca portuguesa. Já o estudante brasileiro de Música, Gabriel Paiva, 23, alega que por ainda não ser formado as áreas de atuação profissional são restritas. “Estágios, apesar de não aparecerem sempre, são interessantes, mas o retorno financeiro acaba sendo baixo”, disse. Para Gabriel, ainda inexperiente no ramo profissional, Eduardo Campelo manda um recado: “Hoje a melhor coisa que se pode fazer é tentar concursos públicos. Estou preferindo um emprego que me dê boas condições de vida a me matar pelo jornalismo. É triste”. A Geração à Rasca, apesar de não ter nacionalidade, recorre aos caminhos disponíveis com base na realidade particular de cada nação. No caso do Brasil, é o concurso público, que não é, necessariamente, na área de atuação do recém-formado. Resta saber, afinal: quais são os possíveis caminhos para que Geração à Rasca portuguesa – e mundial – se desenrasque? • Juliana Diógenes

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DESPORTO

DESPORTO

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> O CORPO E A MENTE EM HARMONIA

Parkour on the streets! O HOMEM TESTA AS SUAS HABILIDADES, FÍSICAS OU MENTAIS, CONFORME OS OBSTÁCULOS QUE ENFRENTA. DE CERTEZA QUE JÁ NOS DEPARAMOS COM ALGUÉM A TREPAR PAREDES E A SALTAR MUROS, ACROBATICAMENTE. E ESTRANHAMOS! SÃO TRACEURS, PRATICANTES DE PARKOUR E O JUP “SALTOU” À PROCURA DESSES INDIVÍDUOS. por Diogo Saldanha fotografia cortesia Carlos Araújo

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á coisa de duas semanas juntaram-se no Palácio de Cristal para uma Jam. Chamam-lhes traceurs e praticam parkour. Gentilmente, Carlos ‘Jackie’ Monteiro, representante do Parkour Portugal, na zona Norte, encontrou-se connosco e numa agradável conversa deu-nos a conhecer o melhor este desporto. Mas afinal o que é isto do parkour? Parkour é uma palavra que provém de “parcour” e significa “percurso”, permitindo que uma pessoa se mova de um lado para o outro, de uma forma mais rápida e eficaz, usando meramente o seu corpo. Após a passagem do documentário “Jump London”, no canal Discovery, houve um boom de praticantes de parkour a nível mundial e, em Portugal, várias pessoas mostraram interesse e foram conhecendo melhor o desporto, criando-se, um pouco mais tarde, algumas associações. Uma das mais bem organizadas é o Parkour Portugal, que a partir do seu site prepara eventos e encontros para traceurs, a nível nacional. Carlos admite ter sido em 2005, que um amigo lhe mostrado o documentário e assim o “influenciou e fez envolver-se no parkour”, como “uma fuga à rotina, ao stress diário e uma forma de se libertar”. Pesquisou e soube de uma pessoa da sua terra, Marco de Canaveses, com o mesmo interesse e desde aí tem se juntado um grupo de amigos para se encontrarem sempre que podem, aos fins-de-semana. Jackie, antigo paraquedista militar, treina diariamente, mas é aos fins-de-semana que foge dos locais do costume (trabalho e casa) e parte em busca de novos obstáculos, e com o intuito de conhecer novas técnicas e acrobacias. É importante não se misturar Parkour com ‘free running’, uma modalidade com movimentos mais dinâmicos que exige mais preparação física e mais treino que deriva de algumas artes marciais.

> UMA MODALIDADE EM CRESCIMENTO Apesar de ser um desporto pouco conhecido, o número de praticantes de parkour tem aumentado e paralelamente aumentam os spots por todo o país. No Porto, o preferido “é o Jardim do Palácio de Cristal talvez porque oferece obstáculos diferentes no mesmo sitio”, mas o Porto não é uma cidade ainda com locais variados para a sua prática. Um pouco por todo o país vão aparecendo spots e o Google Earth até já tem marcados muitos deles, o que facilita quem procura um local onde praticar. “Tenho pena de não poder ir a outros locais do país, como muitos fazem, por falta de tempo”, mas quando puder Carlos Monteiro certamente não faltará a encontros, que o Parkour Portugal se proponha a organizar. Numa tentativa de levar o parkour a outros níveis Carlos refere que “houve pessoas que tiveram formação com David Belle”, fundador do Parkour e “obtiveram o diploma de instrutores”. João Gama é um dos mais conhecidos e tem uma escola de Parkour, em Campo Maior. Esta formação tem em vista ensinar da melhor maneira quem se interessa, e para quem é novo é importante “não se pôr a inventar”, pois apesar de ser interessante todo o cuidado é pouco. O que acontece para quem se inicia, “entusiasmado pelo que vê na televisão ou na internet põe-se a imitar os movimentos’ e saltam ‘de uma forma doida”. Portanto é preciso ter cautela e Carlos, com alguma maturidade, refere que “o aquecimento é muito importante para minimizar o aparecimento de lesões”, habituais para quem anda nestas andanças. Os tendões do calcanhar e o peito são as partes do corpo que mais sofrem pois o impacto no chão, “Aterrissage”, depois de um salto ou o impacto contra uma parede, “saut de chat”, são muito comuns. Para atenuar essas quedas muitas vezes são feitos embalos para amortecer, “Roulade”. Um dos movimentos mais usuais de se ver é o “passement”, que consiste num salto ou pulo sobre um obstáculo usando um movimento.

Esta modalidade exige muito treino e persistência, e segundo os seus praticantes, “tem a capacidade de desenvolver física e psicologicamente sendo útil para quem o pratica e para os outros”. Requer absoluta concentração e deve-se ter a perfeita consciência dos obstáculos, tanto que se deve calcular as distâncias, as capacidades de cada pessoa e os riscos que daí podem provir. Acima de tudo “deve-se respeitar os limites”, adverte Carlos. Muitas pessoas praticam os mais variados desportos até chegar ao parkour, pelo menos por enquanto, e isso só ajudará depois na sua prática, pois trabalham-se inúmeros músculos e quanto melhor propensão a pessoa tenha para se mexer, quanto mais flexibilidade e agilidade tiver, melhor será o seu “parkour”. Não existem competições, pelo menos no parkour, mas existem Jams, que são encontros que servem para mostrar novidades, e a partir de workshops demonstram-se novas técnicas e acrobacias. Trazido de França, o parkour, inicialmente visto como um desporto de rebeldes que saltavam muros “talvez para roubar”, é agora alvo de iniciativas de programas sociais, que através de Câmaras Municipais levam o Parkour até bairros sociais como uma maneira de integrar jovens e desenvolver uma postura saudável e um bem-estar social. As Câmaras Municipais ajudam igualmente na construção de novos spots e na oferta de novos equipamentos. Há assim uma sensibilização para com este desporto e também para o lado social que traz. A comunicação social “tem feito um bom trabalho e passa uma boa imagem” o que permite levar a criar iniciativas nas escolas e enriquecer a formação dos alunos. No caso de Carlos, nunca houve problemas de maior, apenas episódios com os ânimos exaltados, mas há casos em que as pessoas levam a mal. São histórias que ficam entre amigos e servem para soltar umas gargalhadas. A propósito de como os amigos no meio o tratam, Carlos Monteiro confessou que lhe chamam Jackie, “talvez porque me associem ao Jackie Chan e aos seus movimentos rápidos”, além deste ser o seu ídolo. Quem pratica este desporto e se aprofunda nos seus conhecimentos tem em estima a ideologia de “Être fort pour être utile” (Ser forte para ser útil), um mote de Georges Hebert, considerado o avô do parkour. Ah, e também convém ter em conta levar roupa prática e uns bons ténis! Gap Jump..! Saltem muito..! • *Gap Jump: Salto com velocidade de um local para outro ponto ou local, passando por uma "fenda", normalmente seguido de rolamento


DESPORTO

JUP — ABRIL 2011

DESPORTO

Taekwondo: arte marcial esquecida ou em evolução?

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ara uns é uma actividade desconhecida, mais um desporto de artes marciais. Para outros, a superação de limites, ou mesmo um rumo de vida. Certo é que “a arte de usar os pés e mãos na luta através da mente”, o Taekwondo, está a crescer a um ritmo alucinante em Portugal, mas ainda é pouco divulgada. O JUP foi perceber porquê, quais as suas origens, e quem são os atletas fiéis à modalidade no nosso país. Entre eles, descobrimos Tadeu Marques. O estudante da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto entrou na equipa Lobos Negros em finais de 2007, inicialmente por “curiosidade numa arte marcial”. Mais tarde, rendeu-se ao desporto e tornou-se atleta de alta competição. Entre treinos, torneios e a vida universitária, o desportista admite que “não é fácil prescindir de várias coisas e ter uma vida de certa forma diferente do regular, mas vale a pena. É preciso "amor à camisola".” Um “amor à camisola” partilhado por muitos atletas portugueses desde 1974, altura em que a arte marcial chegava a Portugal. Desde aí, o Taekwondo percorreu um longo e duro caminho para ser reconhecido internacionalmente. Em 1994 foi aprovado como desporto oficial dos vigésimos sextos Jogos Olímpicos que decorreriam em Sydney em 2000. Contudo, Tadeu Marques lamenta a falta de reconhecimento e lembra que “o Taekwondo tem tido resultados de marca a nível internacional, que elevam o nome de Portugal e são pouco noticiados. Com mais divulgação, as pessoas ficariam mais curiosas e havia maior procura do desporto. Portugal tem três atletas de Taekwondo no top 20 mundial e ninguém sabe!”. Uma realidade que rapidamente o JUP confirmou. Basta consultar a versão online da RTP, que em Setem-

bro de 2010 noticiava: “Nuno Costa sagrou-se campeão europeu sub-21 de Taekwondo.” Mas “a notícia divulgada pela RTP não teve grande ênfase, como se de pouco se tratasse ser campeão europeu de uma modalidade. Se fosse a Telma Monteiro até um filme faziam sobre ela! Quando o Taekwondo atinge os mesmos resultados que o Judo, era bom haver uma divulgação igual.”, lamenta Tadeu Marques Apenas com três anos de Taekwondo, Tadeu também brilhou por cá, como demonstram o título de campeão Nacional Universitário, o 5º lugar no Europeu Universitário, e a 3ª posição por duas vezes no Nacional Absoluto. Lá fora, conseguiu o 33º lugar em 107 atletas no Internacional de Paris. Além de Tadeu Marques, outros atletas já deixaram a sua marca pelo mundo: “Nos últimos Jogos Olímpicos em 2008, Pedro Póvoa ficou em 7º lugar. Tendo em conta que o Taekwondo em Portugal atravessou uma fase complicada, conseguir isso é um feito. O Taekwondo só de há quatro anos para cá teve oportunidade de se desenvolver. Até essa altura, não tínhamos nenhum registo de marca. Agora temos vários: desde o 7º lugar olímpico, ao vice-campeão olímpico da juventude, Jean Michel Fernandes, ao campeão europeu de sub21, Nuno Costa, ao 5º lugar no Mundial Universitário por Elisabete Ribeiro, aos resultados fantásticos que temos obtido no estrangeiro em provas onde participam os melhores atletas a nível mundial. Temos conquistado vários prémios de ouro e eliminado atletas olímpicos, o que mostra uma evolução enorme em tão pouco tempo. Por exemplo, o ABC Braga, está no top 20 do ranking mundial. Isso não acontece em todos os desportos.” Resultados que não têm sido valorizados, porque os apoios à modalidade

são insuficientes, conforme nos explica o Lobo Negro. “Não dá para evoluir sem trabalho, mas para trabalhar é preciso darem-nos um local de trabalho. Há dois meses eu estava a treinar 12 horas por semana, agora estou a treinar quatro horas. Falta-nos apoio.” Tadeu aponta ainda a Universidade do Porto como responsável pela falta de condições dos atletas portuenses: “Os atletas do ABC Braga estão a treinar 24 horas por semana. São mais 20 horas do que eu, o que faz toda a diferença. Essa carga horária vem em grande parte do apoio que têm da Universidade do Minho que lhes providencia o local de treino nas horas que precisam, ao passo que a Universidade do Porto retirou-nos o local de treino.” Auto-sustento dos atletas Mas os atletas de Taekwondo não se deixam vencer pelas dificuldades, e conseguimos encontrar exemplos curiosos como o de Nuno Costa, campeão Europeu de sub-21, que “fez um estágio de uma semana em Espanha, por 600 euros, suportados por ele. Isto porque a Federação não tinha dinheiro para financiar a deslocação, por falta de apoio.” “Posso referir a equipa do ABC Braga que tem trazido vitórias a atletas mundiais e olímpicos, e todas as deslocações têm sido custeadas pelos próprios e pelos responsáveis da equipa.”, acrescenta Tadeu Marques. Apesar dos obstáculos, a modalidade tem um lugar especial na vida deste jovem que augura um futuro risonho. “Em três anos conseguir o que já consegui é muito bom, mas podia conseguir muito mais se tivéssemos mais condições. As perspectivas são grandes, estamos muito bons, mas queremos ser ainda melhores.” • Sofia Cristino

O desinteressante no interessante A final da Bwin Cup realiza-se a 23 de Abril, opondo o Paços de Ferreira ao Benfica. Por conseguinte, julgo ser este um momento oportuno para efectuar uma pequena reflexão sobre aquilo que tem vindo a ser o (in)sucesso desta competição. É notório um afastamento de adeptos, jogadores e treinadores dos clubes contendores nesta Taça, que não ocupa um papel relevante nos seus planeamentos. Há explicações para tal: O formato é controverso e conta com críticas da parte de alguns treinadores, casos de Manuel Machado e Rui Vitória. A Taça da Liga assenta num formato instável, modificado inúmeras vezes, que privilegia e incentiva a presença dos “3 grandes” nas meias-finais da competição, e consequentemente de, no mínimo, um deles na final. Além disso, algumas equipas fazem apenas um jogo no seu estádio, o que é extremamente prejudicial às suas pretensões. Outro motivo para o desinteresse mais ou menos generalizado demonstrado pela Bwin Cup reside no facto de não ser um meio de alcançar as competições europeias, nomeadamente a Liga Europa. É insofismável que a concessão de uma vaga europeia ao vencedor ou finalista vencido da Taça seria um catalisador para os seus participantes, permitindo que muitos passassem a encará-la como prioritária. Por último, referir a data e o horário absurdo a que são marcados alguns jogos - não constitui motivo de admiração para nenhum adepto ver o jogo da sua equipa realizar-se a uma Quarta-Feira, por volta das 14:30h, mormente nos casos “extra-3 grandes”. Sendo uma competição que necessita de se impor, levá-la de encontro aos amantes do desporto seria um enorme passo para o sucesso. Não sou um opositor da Taça de Liga, acho até que é uma forma inegavelmente interessante de colmatar certas lacunas de um calendário futebolístico português repleto de paragens, a que nada ajudou a redução de clubes na principal liga. No entanto, urge que se tomem medidas para revitalizar a prova - contrariar as críticas aqui expostas seria um excelente ponto de partida, tendo em vista o desígnio de fazer com que passe a constar da agenda primária dos clubes. • José Miguel Rocha

Rock climbing

U

ģis Jaunskungs is a 22 year old student of “Tourism Organization and Management” in “Vidzeme University of Applied Sciences”, in Latvia, and also devoted rock climber. “I started to be engaged with rock climbing at the first year of University - that was the first time, when I held ropes, carbines and other wonderful things. I started to work in a very diverse tourism company – they offer a lot of different activities, including alpinism – it slowly, but determinately became one of my hobbies”. Later it grew from a hobby to a job – Uģis is a member and founder of “Vidzeme Association of Rock Climbing”. One of the next steps right now is to get certification to become a professional instructor. To the question how dangerous is rock climbing, Uģis casually says: “Well, from one point alpinism/rock and mountain climbing is the world’s most dangerous type of sport, but in my opinion, if you know what you are doing and you have humility against it, then everything will be alright”. “Technologies nowadays have given an enormous contribution into the development of rock climbing gear, which means that is something goes

wrong it is only because of a mistake made by a person. The first rule of climbing – check your gear twice and feel the fear, because only then you will make sure that everything is ready.” Adrenaline rush How high have you been? “I am interested in sports version of rock climbing and not mountain climbing, then height of the place doesn’t really matter – it is the curves, slopes and that kind of things that interest me. I have build up my training in Slovakian mountains, in Spain – region of Galicia, and now I have plans for Finland”. After graduation Uģis wants to expand in Latvia – to make alpinism more popular and make sure that people start to think and indulge themselves in it, because “it gives you the true feeling of freedom, adrenaline, not to mention the opportunity to test your own limits!” “Personally I want to expand my own boundaries to the maximum – a little bit bigger dream is to try out also mountain climbing and to conquer an “eightthousand” (a mountain that is 8’000 km above sea level)” and asked about his reason for climbing, he replies as it would already be

obvious – “Adrenaline, adrenaline and adrenaline!” Have you been in critical situations? “Well, there have been many sensitive situations. Once I fell of 6m, while I was hanging in a pine-tree doing my rope exercise. I try to avoid something like this happening again. I also don’t practice solo climbing. It is very dangerous and unnecessary risk”. But if you are into adrenaline rush, then very good way how to relax and get an adrenaline boost is

“jumping of the bridges, gullies and other places just with a rope that has been made into something similar to swings. Unfortunately that is also very dangerous and you need to be extremely cautious! Because of misfortune during a second jump in 1998 world lost it’s best mountain

climber Dan Osman”. In climbing such nonsense as “it (the rope) has served me good for such a long time” doesn’t work in your favor. It has served good and it is time to replace it! The price of fun The price of training in climbing varies in different places, companies and countries. The gear is not cheap and you need many different things, so if you are not rich, but passionate about it, then you simply need to slowly “overgrow” with them. The very basic gear is: harness, rock climbing shoes, rope, at least 10 carbines, slings and quickdraw. All together it would go around 900 Eiro. “You can start buying these things slowly and collect them one buy one, then it doesn’t seem that expensive” – Uģis advises. "It is forbidden to save money on gear, not to mention buying used equipment or lend someone yours, if you don’t see how it has been treated in front of your own eyes!” “You don’t have to be an athlete to do climbing. In alpinism and rock climbing the parts of your body you are using the most are your mind and brain. Yes, also mind control over body is necessary”. • Ieva Balodel

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CRÓNICAS

CRÓNICAS

JUP — ABRIL 2011

COLHER.NET

João Castro aka Tae Dezembro na Dama Aflita e ser citado em várias referências web que multiplicaram os acessos e as propostas via portfolio online. Da audience loves monster diet!

Colher é uma plataforma de divulgação do Design Gráfico Português que pode ser acompanhada on-line em www.colher.net. Ao longo de cada número do JUP vamos dar a conhecer um estudante universitário do Porto a frequentar a área do design gráfico. Neste segundo round convidamos "João Castro" também conhecido como Tae ou The Royal Style Selecta. Estudante de Design de Comunicação na ESAD (Matosinhos) e acabado de voltar de Erasmus em Barcelona. Desde sempre esteve ligado ao street art, algo que se tem reflectido no seu trabalho como designer gráfico e ilustrador. João também é um dos colaboradores da primeira publicação física do Colher com publicação programada para o próximo mês.

entrevista Eurico Sá Fernandes (via e-mail) imagens João Castro

Bom dia João, como está o tempo hoje pelo Porto? Está um bom dia para andar por mangas curtas. Nunca faz frio por estas bandas. Quem é João Castro e de onde advém os pseudónimos Tae ou The Royal Selecta? O João Castro é um alter-ego da minha hipótese de ser indivíduo. Todos os pseudónimos têm uma estrita relação com o meu trabalho para as ruas, são marcas de fuga que foram criados por mim em estúdio e que cresceram para passarem a ser verdadeiramente nomes que me chamam, mas no fundo foram identidades criadas sobre a grande desculpa do graffiti e da sub-cultura.

Actualmente estás a frequentar o terceiro ano do curso de Design de Comunicação na ESAD (Matosinhos) e acabado de regressar de erasmus em barcelona. Para ti quais são as diferenças mais marcantes entre o ensino da ESAD e em Barcelona? E qual preferes? Erasmus deu-me essencialmente a percepção de um universo de produção em design que não tem paralelo e que não pode ser transmitida pela ESAD no ambiente citadino onde se encontra, apesar dos métodos de ensino serem em todo semelhantes. Ambas as escolas focam veementemente o aspecto consumidor-público apostando no pensamento estratégico na comunicação gráfica, e nesse aspecto penso que a ESAD está melhor construída pela experiência que é transmitida nos nomes que te acompanham. Ainda assim, o ensino pela cidade bate toda essa instrução, porque, em última análise, a tua evolução enquanto designer prende-se visceralmente com a forma como se percepcionam as metas e a capacidade que se tem de se envolver em todas as obsessões, e aí a velocidade compulsiva com a qual me comprometi com os eventos incessantes faz-me preferir o ensino em Barcelona.

No verão do ano passado tiveste a oportunidade de expor na Dama Aflita, conta-nos essa experiência. A Vandal Jackpot foi o resultado de uma abordagem informal pela Dama Aflita que me permitiu fazer uma ponte há muito aguardada entre o meu trabalho de rua no Porto e as minhas aspirações como designer. Tive uma semana para explorar a galeria como o prolongamento do spray, das acções no cimento e dos saques às fachadas um casino de arte independente onde saquei de um Royal Flush e pode brincar aos High Rollers sem crédito. Foi uma oportunidade na qual tive o maior prazer gráfico por me permitirem que o público mergulhasse na obra e ser em si experiência e vector do trabalho, sem que este terminasse num suporte estático de criador-receptor.

Descreve-nos a tua secretária ou local de trabalho. Particularmente organizado: Macbook no flanco direito, monitor como avançado agressivo, 99% Graffiti enquanto art director da secretária, uma bolonhesa de caps e aerosol com molho de edições em livro do meu lado esquerdo, facebook status na vertente mobile e blocos com anotações sobre o tampo negro da secretária em cavaletes. O que fazes quando não tens ideias? Referências, referências, referências - procurar defeitos nos trabalhos dos outros. De uma forma autista este processo acaba por terminar numa ideia incerta, mas normalmente inflama o ego, e esse termina sendo o meu principal instrumento de produção.

Qual o feedback que recebeste e quais os frutos que a exposição te trouxe? A exposição trouxe uma projecção que eu não antevia. Além das apreciações e criticas por vários estúdios de design, apercebi-me que consegui apelar a um público consumidor que se estendeu muito para lá dos regulares nos circuitos de arte de galeria que me foram contactando por via directa. Com este projecto contribuí para a criação de uma nova arte de rua no Porto pela re-contextualização de objectos gráficos que advém da street art e não do graffiti local. A nível profissional permitiu-me ser convidado novamente a estar presente na exposição colectiva de

Designer / Ilustrador favorito? Staynice Studio. Tens alguma ilustração que te tenha dado um pessoal gozo? Neste momento posso citar a última, Barri Chic, por ser uma interpretação muito íntima como o de a Barcelona, apesar de regularmente todo este gozo momentâneo ser ultrapassado, em catadupa, a cada nova produção/ ilustração.

Alguma vez separaste o street art do design gráfico ou para ti é algo que combina sempre? Sempre tentei manter duas identidades paralelas para não sacrificar a alma do negócio profissional - há demasiadas vertentes em ambas as categorias para que me pudesse limitar a uma linguagem única, apesar de ser muito tentador fazê-lo. Os ideais para ambas, no entanto, mantém-se, simplicidade, objectividade, o ícone como expressão suprema e rivalidade rude. Antes de mais muito obrigado pela entrevista. Quais são as ultimas palavras para os leitores? É Jogo Sujo, ou Violência ou Glória, pá!

CONTA-ME COMO É…

… ser um Happy Duque!

H

á cerca de quatro anos que Maria Manoel vive numa zona dos arredores de Coimbra. Um misto de zona rural com características de zona residencial mas onde imperam modos de estar e vivências na sua maioria rurais. A realidade e a impressão que tenho não anda muito longe desta minha verdade, referindo-me, concretamente, à generalizada insensibilidade (completamente desumana) com que, na maioria dos casos, os animais por ali são tratados. Isto tudo para chegar ao personagem da história. Um personagem de quatro patas. O dito melhor amigo do homem, que nunca esquece o seu dono… mesmo muito tempo depois. Mr. Happy é o nome que lhe deram quando apareceu na rua onde mora Maria Manoel há coisa de quatro anos atrás. O comportamento do animal fê-la logo pensar que teria sido um cão de companhia e/ ou teria fugido ou sido abandonado. E por ali foi ficando. Contra todos os maus dizeres e olhares que recebia e para além dos seus três cães, Maria Manoel passou a alimentar também o Mr. Happy e os seus amiguinhos da rua. O tempo foi passando e há pelo menos dois episódios que marcaram a aproximação emotiva de Maria Manoel ao Mr. Happy. Um dos acontecimentos é, no mínimo, chocante. Maria estava no seu escritório, em casa, quando vê um dos seus vizinhos de pressão de ar em punho e ouve alguns disparos. Ficou assustada e foi ver o que se passava. Menina da cidade! Não está habituada nem a armas nem a caçadores! Maria achou estranha toda aquela imagem e lá pensou para com os seus botões que aquele não era propriamente o sítio mais adequado para dar tiros em pratos! É que não eram mesmo pratos, era o Mr.

Happy. Maria Manoel ficou sem pingo de sangue. Confrontou o senhor. A conversa cresceu de tom. E a GNR acaba mesmo por ser chamada. Maria rogou ao dito indivíduo cobras e lagartos e, apesar de tudo, Mr Happy sobreviveu sem mazelas aparentes. O outro acontecimento, também nada agradável para o Mr. Happy, mas que lhe serviu de lição de sobrevivência na rua, foi um atropelamento mesmo à frente da casa de Maria Manoel. A estrada é boa, muito boa aliás para automobilistas aventureiros que gostem de acelerar… Por acaso era só um cão! Desculpem a ironia mas não resisto… podia ser uma criança, um idoso ou até qualquer um de nós! Mas…. era só um cão! Umas semanas depois, Maria Manoel soube por uns vizinhos que a “rede” do canil municipal tinha andado na zona e que tinha apanhado alguns cães. O Mr. Happy estava no canil e Maria Manoel dava voltas e mais voltas à sua cabeça na tentativa de arranjar uma solução. Pensou imediatamente em adoptá-lo mas, para além de ter de esperar pelo fim da semana (questões burocráticas imaginem só!), o marido não iria achar piada nenhuma com mais um quatro patas a passear lá por casa! Foram dias improváveis para Maria Manoel. A ideia de lhe arranjar um dono tinha de ser uma realidade até ao final da semana caso contrário, o corredor da morte abrir-se-ia para o Mr Happy. Escreveu cartas, enviou e-mails e mais e-mails, colocou anúncios em tudo o quanto eram sites, e perdeu a conta às pessoas que tentou convencer a adoptar o Mr Happy. No dia 30 à noite, véspera da data limite, o telemóvel de Maria Manoel toca. Do outro lado alguém dizia que o cão do anúncio era seu, que se chamava Duque e que tinha desaparecido há cerca de

um ano e meio. As suas manchas no focinho, patas e pincel (como chama ao rabinho dele!), eram inconfundíveis. Não podia ser! Era bom de mais para ser verdade. Com certeza que a pessoa estava a confundir o cão. Um ano e meio depois? Era estranho de mais. Combinaram no dia seguinte às 10h30 à porta do Canil. A voz que no dia anterior lhe falara trémula ao telemóvel chegou pontualmente à hora marcada e, quando os funcionários do canil foram buscar o cão, só queria que vissem o reencontro dos dois…. Era o Duque, era mesmo o Duque… De entre cinco pessoas que estavam presentes optou por correr para ela e lambeu-a como se não houvesse mais amanhã. Era ele. Era mesmo ele. Ainda por cima reconhecia a dona como ninguém. O Duque foi adoptado pela segunda vez pela mesma pessoa! Quando era cachorro foi abandonado num caixote de lixo e adoptado por uma família em Lisboa que não o pôde manter por questões de saúde e dado novamente para adopção! A actual dona do Duque foi buscá-lo a Lisboa e agora a Coimbra. Hoje, sem tropeços nem fugas pelo caminho, Mr Happy Duque está felicíssimo da vida! Pela Dona do Duque!

* o nome da pessoa utilizado nesta história é fictício


DEVANEIOS

JUP — ABRIL 2011

ilustração Mariana Lobão

ilustração Mariana Lobão

Por correres, houve algo mais veloz que os teus passos ansiosos. E sabendo da brisa, do vento, do perigo das ondas, não calaste a pressa. Não pensaste que se pudessem abater sobre ti? Podias ter parado, onde param todos: no Destino. Dizem que o é quando já não há mais Terra para caminhar; que a vida se perde e se desfaz em apenas nada mais que memórias. Mas tu; tu não... tu não paraste no que eles chamam de Destino. Tu foste cega para as regras, surda para as palavras, tu só sentiste o Mar; o mar onde todos costumam parar. E era mar? Não, pensaste que era prata... … pensaste que era magia, um sopro de esperança de uma Alma já vazia... Tu querias levá-lo contigo, mas sem o aprisionar. Querias sentir a força de o ter, sem o controlar. Olhas em volta e o que vês? Areia?

Eu vejo corpos inertes, enterrados no Passado. São as mentes ocas, levadas pelas falas das más bocas, crentes que tudo acaba quando acaba o chão. Mas tu não... Sabias que ele fala; esse teu Mar? Ele tem o dom de falar... pensas que os gritos sofridos, de séculos esquecidos, prisioneiros deste céu são só o vento a passar? Pois quero-te desenganar, não existe tal verdade; são os pedidos de socorro, gritam pela liberdade. Liberdade que tu lhes concedeste. Nós soubemos, deste lado. Tão longe ainda que mais perto impossível... mas voltando atrás no tempo, não terias descoberto este pequeno sopro de vida. Esqueceste a pressa? Esqueceste quem te espera? Deixaste o Mundo atrás da porta, paraste o tempo no seu "pára, arranca, acelera"? Eu não queria perguntar, mas vais ter de perdoar: Desejaste voltar?

DEVANEIOS

Se não, eu posso responder: estavas cá: perto de quem te quer e venha quem vier, sabes que sempre estarás. E agora não corras mais; já tens o que vieste buscar Ouves aquele grito? É o suspiro infinito, da Alma que salvaste, e para onde a vais levar: é a tua. E está connosco, com muitos metros pelo meio está bem guardada eu creio, pela prata que um dia julgaste ser a vida. Tens não um; dois oceanos, para andar em frente a ti: um é a ida e outro é a volta; e a saudade permanece, e se esse céu escurece, outros hão-de brilhar mais. Sabes onde estamos, e nós sabemos de ti. Agora abre a porta ao mundo, porque ele parou aqui: onde tu brilhas e caminhas sobre prata. Bia Gaspar

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o JUP vai abrir o departamento do chinês…vem-te futrer!

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