JUP Novembro 2008

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Jornal da Academia do Porto ¶ Ano XX ¶ Publicação mensal ¶ Distribuição Gratuita ¶ Director:André Vieira; Director de Fotografia: José Ferreira; Directora de Paginação: Ana Rita Monteiro ¶

NOVEMBRO ‘08

Portugal: o país dos festivais?

O JUP esteve de férias, mas nunca parado. Vê o roteiro dos festivais a que o JUP foi.

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Ensino Superior: triagem no acesso ao emprego? Simon Charlesworth, autor do livro “A phenomonology of working class experience”, falou com o JUP sobre os problemas de integração dos alunos licenciados num sistema economicista.

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O Momento da Verdade

A televisão está num impasse. Para um aumento de conteúdos nos quais a estrela é o cidadão comum, qual a fronteira entre entretenimento e a venda da intimidade?

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DESTAQUE NOVEMBRO´08 JUP

Lápiz Azul | Editorial André Vieira (andrefbvieira@gmail.com)

DR. SHOPPING A aposta na educação tem sido a bandeira dos sucessivos governos portugueses. Demonstrado o afecto pela parte dos governantes, mais efusivamente por alguns e talvez um pouco mais contido por outros, esperam-se, de qualquer forma, medidas com a mesma grandeza. O governo de Sócrates tem-nos brindado com campanhas de modernização da escola portuguesa. As imagens que nos chegam a casa mostram-nos escolas equipadas com computadores ligados à Internet, professores tão felizes que até entoam hinos ao Magalhães e crianças e jovens esperançados de um futuro ainda distante e aparentemente promissor. Pois imaginando uma linha temporal, digamos que este é o ponto alto da vida destes que são o futuro do país. Senão vejamos, habituados que estão a um sistema de ensino onde a tecnologia de ponta é o motor do sucesso escolar, onde o sistema de presenças não é determinante para o êxito, terminado o secundário, a entrada no ensino superior pode revelar-se uma barreira nesta rampa de lançamento que esbarra num muro. Quem opta pela via do ensino superior pretende, acima de tudo, garantir na conclusão de uma licenciatura todas as qualificações que permitam no mínimo a sua entrada no mercado de trabalho e, como é óbvio, na sua área de formação. Na verdade, aquilo que acontece, nos agora três anos de uma grande maioria dos cursos, é o desvanecer de grande parte dos projectos de vida traçados no momento decisivo em que se põe um pé no futuro. Aquilo que nos é prometido - àqueles que têm a sorte de estudar numa pública- é que, por mil euros anuais, temos a hipótese, não de nos tornarmos especialistas em determinada matéria, mas sim de ficarmos com umas luzes. Surge um novo conceito de autodidacta obrigado a um sistema presencial cujas ferramentas são atiradas para as suas mãos, para posteriormente se sujeitarem a avaliação. Acabada a licenciatura, depois de um estágio curricular, a procura por um emprego, entre os 150 mil que este Governo nos garantiu, é uma luta que acaba quase sempre no mesmo sítio. Depois de vários estágios não remunerados onde nos garantiram que as hipóteses de assinar contrato eram mais do que prováveis, resta-nos aquele centro comercial novo que abriu mesmo ao lado do outro que abriu dois anos antes. A campanha pela formação, que este Governo tanto privilegia, acaba por ser a ponte para que brevemente todos possam entrar num centro comercial e encontrar nos balcões e no atendimento das lojas pessoal qualificado, num espaço onde todos terão no seu crachá, antes do nome, o título Doutor.

INDEX 2 DESTAQUE O Momento da Verdade 4 EDUCAÇÃO 8 SOCIEDADE 12 INTERNACIONAL 14 U.PORTO 16 COMPLEXOS ARTÍSTICOS 18 ECONOMIA 20 CULTURA 23 Cardápio NOVO! 24 Portugal: o país dos Festivais? 28 AMBIENTE 29 DEVANEIOS 30 OPINIÃO

DESTAQUE O QUE ESCONDE O MOMENTO DA VERDADE Mariana Duarte

Se à primeira vista o novo programa da Sic pode parecer mais uma dose de entretenimento inofensivo, as consequências que emergem da exposição da intimidade individual podem ser bem mais perversas. À conversa com especialistas de diferentes áreas, o JUP procurou explorar as questões éticas, morais e deontológicas que este tipo de programas levanta. E entender, afinal, o que é a verdade do Momento da Verdade. Programas de entretenimento focados na vida íntima das pessoas já são um habitué no panorama televisivo, tanto nacional como internacional. O Momento da Verdade é mais um. No entanto, este programa – trazido da estação norte-americana Fox para a televisão portuguesa pela mão da Sic – baseia-se num formato que permite expor a intimidade do indivíduo de uma forma mais directa, imediata e profunda. Os concorrentes, apoiados pela presença de familiares e amigos, são confrontados com uma série de perguntas acerca da sua vida íntima e, simultaneamente, submetidos a um teste do polígrafo. O objectivo é “contar toda a verdade”, como explicou Teresa Guilherme na apresentação do programa à imprensa. “Se o concorrente disser uma mentira, perde”, referiu a apresentadora. O participante tem de passar por seis níveis de dificuldade, ou seja, o carácter íntimo das questões vai crescendo até ao último patamar que corresponde ao prémio máximo de 250 mil euros. O Momento da Verdade é, então, um híbrido entre um reality show e um concurso. “Num certo sentido, este programa é a mesma coisa do que o Big Brother. Mas vai ainda mais longe nos limites da exposição individual”, diz José Azevedo. O sociólogo especialista em Comunicação e professor na Faculdade de Letras da Universidade do Porto explica que “no Big Brother havia a observação do outro, das acções do outro; aqui (no Momento da Verdade) estou a observar o outro e a saber assuntos que mesmo mais ninguém sabe”. O programa da Sic apresenta-se, assim, como um revelador dos segredos mais íntimos de um cidadão normal. Que consequências podem advir dessa exposição pública? Qual o impacto na vida social e na vida privada dos participantes a médio e longo prazo? Fernando Barbosa, psicofisiologista e docente da Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto, considera que os efeitos do programa no próprio concorrente e em terceiros “dependem, em certa medida, de critérios individuais de sucesso. Se um concorrente persegue a celebridade instantânea a qualquer preço ou tem como única ambição conseguir uns milhares de euros, é possível que no fim tenha a impressão subjectiva de ter valido a pena, mesmo que as suas relações sociais fiquem irremediavelmente devastadas.” O primeiro concorrente do programa é bom exemplo: ganhou 25 mil euros, mas ficou sem esposa. Entre outras coisas, confessou ter tido relações sexuais fora do casamento. “Para que prevaleça um sentimento de auto-realização é preciso que o candidato não seja afectado ou não se deixe afectar por emoções concorrentes, como a vergonha ou a culpa”, acrescenta Fernando Barbosa. “Neste caso, além do isolamento social do próprio, o que estaria em causa seria o impacto nocivo para outros significativos, afectados pelas suas revelações, pressupondo que não partilham dos mesmos objectivos e que não beneficiam da mesma insensibilidade à vergonha e à culpa”, sublinha o psicofisiologista. Dado as potenciais consequências prejudiciais aos níveis individual, social e relacional, porque é que uma pessoa se dispõe a revelar em praça pública o seu íntimo e, por vezes, a humilhar-se a si próprio e/ou humilhar os que lhe são chegados? “Certamente que alguns participantes terão motivações financeiras; outros serão incentivados pelos 15 minutos de fama profetizados por Warhol. Também

é plausível que a maior parte deles persigam ambos os objectivos, mas há ainda outros que terão motivos insondáveis”, afirma Fernando Barbosa. Se o que desperta o interesse do indivíduo em participar é mais ou menos evidente, a falta de consciência, por parte dos concorrentes, das possíveis repercussões da exposição da vida íntima é questionável. José Azevedo entende que

Renato Amaral

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“as pessoas, quando participam neste tipo de programas, não têm plena consciência dos efeitos que isso pode ter”. Contudo, o sociólogo considera que os concorrentes não são “completamente inocentes”, pois, como assevera Suzana Cavaco, professora de Ética e Deontologia Profissional no curso de Ciências da Comunicação da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, “As pessoas não vão ao engano. Há uma bateria de perguntas que são feitas previamente…”. Antes da gravação do Momento da Verdade, o candidato já respondeu a uma série de questões, donde são seleccionadas algumas para serem colocadas no programa. Assim, o concorrente só não sabe quais são as escolhidas e qual foi o resultado do polígrafo. No entanto, voltar atrás não se afigura uma hipótese admissível para os participantes. José Azevedo esclarece: “quando se aceita um primeiro compromisso, e ainda por cima quando se assina nesse sentido, é muito difícil desistir, voltar atrás. E quanto mais as pessoas são colocadas na situação, mais são levadas a fazer coisas que elas próprias não esperariam fazer.” Fernando Barbosa conclui que “uma coisa é conhecer previamente as questões que irão ser feitas e ter o discernimento racional para lhes responder. Coisa diferente é ter a capacidade para estimar a forma como os outros podem reagir e antecipar as eventuais consequências das suas respostas.”


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A consciência da televisão Apesar de as pessoas não terem totalmente presente os efeitos que podem florescer da exposição da sua intimidade, os entrevistados sublinham que elas não são inocentes, mas há “uma certa ingenuidade”, aponta Suzana Cavaco. “Mas eu não acredito que a televisão esteja ingénua nesta questão”, afirma a professora. José Azevedo acredita que a televisão é que é a grande responsável: os candidatos ao Momento da Verdade “não entendem completamente o que é que aquilo significa, mesmo que sejam livres de recusar ou aceitar. Acho que os profissionais têm de ter a responsabilidade ética de controlar os desejos de popularidade que essas pessoas possam ter, de controlar a não exibição das mesmas.” É inevitável surgirem questões éticas, deontológicas e morais quando se fala de programas sustentados pela exibição da vida íntima de um indivíduo. Paralelamente, levanta-se o debate em torno do papel da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), o órgão regulador dos mass media em Portugal. O sociólogo José Azevedo defende que “este tipo de programas devia ser um pouco mais regulado. Muitas vezes, estes programas têm um efeito mais negativo do que muitas outras coisas com que a ERC se preocupa.” O professor da Faculdade de Letras considera necessário desenvolver-se um trabalho com os profissionais de televisão no sentido de “reforçar a compreensão da dimensão ética” que está adjacente à actividade dos mesmos. José Azeredo Lopes, presidente do conselho regulador para a Comunicação Social, mostrou num artigo de opinião (“A verdade e o seu momento”) no Jornal de Notícias de 24 de Setembro a sua indignação pelo Momento da Verdade. Condenou o facto de o operador televisivo (a Sic) “em posição de força, explorar até ao tutano a fraqueza alheia e o sonho do ganho de uma grande soma em dinheiro para induzir, para dizer o menos, à prática de comportamentos que, em circunstâncias normais, ninguém aceitaria”. Todavia, José Azeredo Lopes crê que “pelo menos numa análise inicial, o programa Momento da Verdade não viola a lei. É também minha convicção que a lei não deve proibir este ou programas congéneres.” A este propósito, Francisco Rui Cádima afirma que “se o regulador se indigna mas se ao mesmo tempo acha que o programa não viola a lei é porque, provavelmente, é um regulador de uma lei algo desregulada.” O professor do Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade Nova de Lisboa e crítico de televisão justifica recorrendo à legislação. “No número um do Artº 27 da Lei da Televisão – Limites à liberdade de programação – diz-se que ‘A programação televisiva deve respeitar a dignidade humana e os direitos, liberdade e garantias fundamentais’, mas se houver desrespeito pela dignidade da pessoa humana, a lei não prevê qualquer contra-ordenação, nem leve, nem grave, nem muito grave. O programa em causa limita-se, portanto, a atentar contra a dignidade da pessoa humana e a estar bem com a lei…É, infelizmente, o que temos!”, diz em tom de desabafo Rui Cádima. Suzana Cavaco, por outro lado, põe a tónica na autoregulação. “Muitas questões não se resolvem através da lei e tal não me parece bem. Acho que a comunicação social deve funcionar muito mais numa base de auto-regulação, de sensibilização para questões éticas e deontológicas, do que pela imposição de certos tipos de conduta.” Joaquim Fidalgo, ex-provedor do Público, apela também para um caminho de sensibilização em alternativa à proibição. “Acho que os membros da ERC podem chamar a atenção para os aspectos negativos do programa em termos de ética e de respeito pela dignidade das pessoas; acho que podem censurá-lo moralmente, mas duvido que possam ou devam intervir em termos de censura legal ou proibição formal.” O docente da Universidade do Minho salienta que “o problema de fundo só se resolve quando nós todos, globalmente, dissermos que não queremos esses programas, que não os achamos correctos. Como? Deixando de os ver, deixando de ir lá…”

gia do Momento da Verdade. Normalmente, exceptuando alguns casos, eles funcionam como esponjas de audiências. Porque se sentem as pessoas tão atraídas pela revelação das vidas privada e íntima de desconhecidos? O psicofisiologista Fernando Barbosa diz que a Psicologia tem várias explicações. “O Homem vem equipado com uma curiosidade natural, quase visceral, que tanto pode incitar à exploração do desconhecido e à descoberta científica como pode incitar a comportamentos de feição voyeurista. Em qualquer dos casos, este prazer assenta numa emoção primária universal à espécie humana e que orienta o comportamento de uma forma muito forte.” Por vezes, o ser humano tem mesmo de empreender um “esforço racional”, como aponta Barbosa, para não ver estes programas que são quase como ímanes. “A questão do íntimo sempre despertou curiosidade, ainda por cima neste caso (programa Momento da Verdade), em que se trata de um íntimo secreto”, acrescenta José Azevedo. O sociólogo refere ainda que o facto de o concorrente ser uma pessoa normal, de não ser uma vedeta, permite a existência de um processo de identificação. Apesar de considerar que “o problema também está na audiência”, Francisco Rui Cádima remete a sua origem para os emissores e para os decisores políticos. Estes últimos, “porque estruturam e concedem licenças para mercados impossíveis, onde emergem operadores a que nada mais resta do que nivelar por baixo”, clarifica o crítico de televisão. Joaquim Fidalgo acredita numa mudança progressiva dos gostos do público. Como refere, nem sempre os espectadores aderiram a programas focados na intimidade das pessoas. “Já tivemos programas que provocaram grandes protestos e acabaram por não captar audiências, como o Bar da TV ou o Acorrentados.” E, “apesar de tudo, o Momento da Verdade não é um campeão esmagador de audiências como foi o Big Brother há uns anos. Os realityshows, em termos gerais, já tiveram melhores dias do que têm hoje.” O importante, como menciona o ex-provedor do Público, é, num processo de alfabetização mediática, incitar ao debate público destas questões polémicas relativas aos média, “estimulando a nossa consciência cívica e as nossas próprias responsabilidades enquanto espectadores, esperando que o próprio mercado deixe de querer tais subprodutos, por falta de audiência.”

“Os concorrentes são confrontados com uma série de perguntas acerca da sua vida íntima e submetidos a um teste do polígrafo.”

Códigos deontológicos para o entretenimento como reforço da responsabilidade social das empresas média Claude-Jean Bertrand, investigador de sistemas de responsabilização dos média falecido no ano passado, defendeu, como podemos confirmar no livro da sua autoria “A Deontologia dos Media”, a criação de códigos deontológicos para o entretenimento de modo a evitar a ausência de uma “ética mínima” que muitas vezes se verifica em programas de entretenimento. Joaquim Fidalgo concorda com o autor, pois “assim como há uma ética jornalística, concretizada num código deontológico, devia haver uma ética das empresas de média, abrangendo os domínios da informação e do entretenimento.” Para o professor da Universidade do Minho, estes códigos de conduta permitiriam “dar expressão” ao dever de responsabilidade social das empresas de bens média. “No caso das televisões privadas de sinal aberto (como é a SIC e também a TVI) isso é ainda mais pertinente, pois elas estão a utilizar um bem público, o espaço radioeléctrico, que lhes foi concedido através de um contrato de concessão que tem associado um caderno de encargos”, afirma Joaquim Fidalgo. Este caderno de encargos implica uma série de obrigações quanto à linha de programação dos canais privados. A ERC fixou, através de uma deliberação (1-L/2006 com a data de 20 de Junho), entre outras coisas, o dever de diversificar “os géneros da programação emitida no chamado horário nobre (20h0023h00)”. Neste sentido, Fidalgo considera pertinente “ler esses cadernos de encargos e compará-los com o que é a programação monotemática da Sic e da TVI no chamado

“A televisão sem ética de antena não é mais senão um perigoso analgésico pós-laboral com graves efeitos secundários para a saúde da opinião pública e da democracia.”

A força do voyeurismo e a necessidade de alfabetização mediática O público não deixa de ser também parte responsável na estimulação do fabrico de programas que seguem a tipolo-

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prime-time, todos os dias da semana: novelas, novelas e só novelas.” Ainda relativamente à produção de códigos de entretenimento apologizada por Bertrand, Francisco Rui Cádima perfilha também da opinião do investigador. “A televisão sem ética de antena não é mais senão um perigoso analgésico pós-laboral com graves efeitos secundários para a saúde da opinião pública e da democracia”, remata. Suzana Cavaco indica a importância de o código deontológico é uma necessidade. Só dessa forma é que pode ser sustentável. “Para ser cínico é melhor não existir”. A professora especializada em ética e deontologia jornalística considera que “no mundo do entretenimento, o bom senso e o bom gosto devem por si só dar todas as respostas. Deve passar por uma vontade interior de fazer bons programas”.

A verdade do Momento da Verdade Voltando de novo o foco sobre o programa que conduziu a todas as reflexões acima expostas. O modo como o Momento da Verdade apresenta o valor da verdade revela-se uma questão pertinente. “Gostava de ter aqui pessoas que queiram contar a verdade toda”. O desejo de Teresa Guilherme encerra a premissa do programa. Mas será que a verdade é tirar o véu a todos os nossos segredos? O psicofisiologista Fernando Barbosa diz que o programa mostra a “verdade como um valor a perseguir de forma absoluta e libertadora, sabendo nós que nem todas as verdades devem dizer-se.” Suzana Cavaco segue o mesmo raciocínio: “qualquer ser humano que viva em sociedade não pode dizer tudo o que pensa e com toda a frontalidade. Imagine se toda a gente arrancasse as máscaras…”. A professora da Faculdade de Letras da UP sublinha que a verdade tem limites e o limite é a intimidade do indivíduo, que representa o “núcleo duro”. O sociólogo José Azevedo vê esta distorção da verdade como uma forma de “tentar vender o programa como um produto positivo”. Fica o pensamento de Aristóteles, recordado por Fernando Barbosa: o Homem sensato pensa tudo o que diz, mas não diz tudo o que pensa. No Momento da Verdade é o polígrafo que dita a verdade ou a mentira da resposta do concorrente. O polígrafo é um instrumento que monitoriza determinadas reacções de uma pessoa. Faz a medição de alterações fisiológicas – batidas do coração, pressão arterial e respiração – que depois são analisadas pelo examinador (normalmente um psicofisiologista forense) para perceber se o indivíduo está a mentir ou não. Bob Lee, operador de polígrafos e antigo director executivo de operações no fabricante de polígrafos Axciton Systems, afirma na peça de investigação do jornalista Kevin Bonsor, “Como funcionam os polígrafos”, que os exames realizados pela máquina “não são capazes de detectar especificamente se uma pessoa está a mentir”. São sim capazes de detectar “comportamentos considerados mentirosos” através das respostas psicofisiológicas. Destas informações é possível inferir que as interpretações do operador do polígrafo constituem um elemento-chave na “sentença” do examinado. Daqui decorre um risco, como explica Kevin Bonsor: “às vezes o examinador de polígrafo pode interpretar mal a reacção da pessoa numa pergunta em particular.” Estes erros podem suceder se o examinador não preparou o examinado apropriadamente na sessão do pré-teste ou se não fez uma leitura correcta das reacções recolhidas pelo teste. Há dois processos pelos quais uma resposta pode ser mal interpretada, demonstra Bonsor: falso positivo, quando “a resposta de uma pessoa sincera é determinada como sendo mentirosa”; e o falso negativo, quando “a resposta de uma pessoa mentirosa é determinada como sendo sincera”. É esta natureza subjectiva, intrínseca a todo o comportamento humano, a principal barreira na admissão dos testes do polígrafo em tribunais, no julgamento de pessoas acusadas da prática de algum crime. Para além deste facto, os que são submetidos ao teste do polígrafo podem conseguir alterar o desempenho da máquina, por meio da ingestão de químicos ou “dizendo mentiras convencidos de que estão a reportar a verdade”, explica Fernando Barbosa. Como sublinha o psicofisiologista, “estamos longe da propalada infalibilidade”. Barbosa assinala que a revisão da literatura científica sobre o uso das técnicas poligráficas como via de detecção de mentiras referem “índices de precisão muito variáveis”. “Recordo-me de ler uma revisão de 2002 em cujos autores reportavam índices de 20% de omissões e 16% de falsos positivos. Ou seja, há um número não menosprezável de mentirosos que escapam e, mais importante, também há verdade que são mentiras”, acrescenta Fernando Barbosa. O Momento da Verdade parece não ter em conta as dúvidas que ainda rondam a fiabilidade do polígrafo. O equipamento é apresentado como o decisor máximo, que, sem margem para erros, dita verdade ou mentira. “O programa falha ao apresentar as respostas como absolutas”, afirma Suzana Cavaco. Até que ponto é legítimo fazer crer que uma máquina - cuja fidelidade ainda é questionável - valida o ser humano e a sua intimidade? “Seria serviço público a comunicação social, os jornalistas, investigarem a fiabilidade do equipamento”, sugere a professora. E, consequentemente, investigarem “a credibilidade do programa”. Fica lançado o desafio.


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EDUCAÇÃO NOVEMBRO´08 JUP

EDUCAÇÃO CALOIROS DA UP ENFRENTAM NOVOS DESAFIOS

Cátia Monteiro

O JUP foi conhecer novos estudantes da UP e perceber como vivem a entrada no Ensino Superior e no ambiente Universitário. O início da vida universitária é uma etapa marcante, plena de desafios e de mudanças. Novos colegas, novas amizades, novos ambientes, novas aprendizagens e novas experiências pintam a entrada dos caloiros no ensino superior. Na bagagem, os alunos do primeiro ano trazem, num misto de ansiedade e de entusiasmo, muitas expectativas em relação à vida académica. Para Pedro Almeida, aluno da Escola Superior de Enfermagem de Santa Maria, a intenção de criar novas amizades é uma delas: “Sem dúvida este é um momento da minha vida pelo qual sempre esperei. Penso que aqui irei criar amizades que se irão prolongar por muito tempo e claramente decidir a minha vida.” A Praxe e as festas são actividades aliciantes para os novos caloiros, portanto conciliar a “boémia” e o estudo é o desafio que se impõe: “Penso que a vida académica é feita por cada estudante. Da minha parte quero aproveitar ao máximo todos os momentos, como as festas, cafés e praxe, tendo sempre a noção dos limites, uma vez que haverão momentos de diversão e momentos de seriedade, de estudo”, declarou ao JUP Celine Mateus, da Escola Superior de Enfermagem de Santa Maria. Para os novos alunos da Academia, a entrada no ensino superior é um passo importante para a obtenção não só de competências a nível profissional mas também de aprendizagens para a vida, tal como considera Marta Oliveira, aluna do curso de Ciências da Comunicação: Jornalismo, Assessoria e Multimédia da Universidade do Porto: “Espero que estes anos contribuam largamente para o meu crescimento pessoal e que me sejam transmitidos os conhecimentos necessários à entrada no mercado de trabalho e uma formação prática direccionada para as exigências profissionais.”

Universidade do Porto: “O horário tira-me muito tempo porque tenho grandes intervalos entre as aulas. As viagens de ida e volta são também um problema pois demoro mais de 2h nessas viagens. Isto faz com que desperdice tempo para outras actividades”. “À terça-feira saio das aulas às 18H e tenho treino às 19H, por isso tenho de levar o equipamento para a faculdade”, acrescentou ainda o caloiro da FCUP.

Ameaça de Desemprego O desemprego é uma ameaça constante para os estudantes. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2007 existiam em Portugal 448 mil

“Existem muitas dificuldades, é um facto, mas existem também oportunidades. Ter um curso superior ainda é uma mais valia mas não é suficiente, longe disso.”

A entrada no ensino superior implica gastos com propinas, livros e deslocações, o que para muitos dos novos estudantes da Academia, é uma dificuldade. É o caso de Daniela Queirós, um caso entre muitos. “As minhas maiores dificuldades ou dores de cabeça é sobretudo em relação a finanças, pois o curso de enfermagem requer alguns livros um pouco mais caros, que não são obrigatórios, mas é sempre mais positivo tê-los e claro, como pagamos prestação também fica mais pesado.” – declarou ao JUP a aluna da Escola Superior de Enfermagem de Santa Maria. A elevada carga horária e as longas viagens de transportes públicos no trajecto entre a casa e a faculdade são também um problema que exige uma melhor gestão do tempo, principalmente para quem tem de conciliar as aulas com a prática desportiva. Daniel Monteiro, federado em ténis, considera que a falta de tempo para praticar desporto é a principal dificuldade com que se deparou desde que entrou na Faculdade de Ciências da

José Ferreira

Principais dificuldades: finanças e falta de tempo para outras actividades

licenciados no desemprego. No entanto, estes valores não afastaram os 53062 estudantes que se candidataram este ano ao ensino superior. Apesar de considerar um curso superior “uma mais valia”, Eliana Ramos da Escola Superior de Enfermagem de Santa Maria, acredita também que “hoje em dia ter um curso não serve de muito para garantir a empregabilidade”. Marta Oliveira, aluna de Ciências da Comunicação, tem consciência de que a entrada no mercado de trabalho não é fácil, no entanto acredita que com esforço

é possível ultrapassar os obstáculos: “É importante lutar por um objectivo e não desanimar perante os obstáculos. Existem muitas dificuldades, é um facto, mas existem também oportunidades. Ter um curso superior ainda é uma mais valia mas não é suficiente, longe disso. É necessário um grande espírito de perseverança e ser-se francamente bom na área respectiva.” Cientes de que a formação é muito importante para vingar num mercado de trabalho cada vez mais exigente, os jovens entram no primeiro ano já a pensar no mestrado e no doutoramento.

UNIVERSIDADE DO PORTO: INSTITUIÇÃO PÚBLICA MAIS PROCURADA E COM MÉDIAS MAIS ELEVADAS.

Ana Sofia Moura

A Universidade do Porto foi a mais procurada pelos estudantes no acesso ao ensino superior. Os resultados da primeira e segunda fase do concurso de 2008/2009 traduzem-se em 4247 alunos colocados na instituição. De todos os cursos da UP sobra uma vaga, em História da Arte.

No ranking das universidades mais procuradas, (taxa de preenchimento de vagas), ficaram o Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa com 100%, seguido da UP com 99,9% e da Universidade Técnica de Lisboa que obteve 99,8%, de acordo com a Análise Descritiva de Acesso ao Ensino Superior da Reitoria da UP. Em termos unitários, a UP foi a instituição que mais vagas colocou à disposição – 4248. Perante estes resultados, o reitor da Universidade do Porto aponta o empenho em ser sempre melhores e a oferta de cursos cada vez mais atractivos , multidisciplinares, de formação sólida, exigente e que contribuam para estruturar pensamento como factores de preferência dos alunos pela UP. A divulgação da instituição através da Universidade Júnior e da Mostra da UP é uma aposta que, segundo José Marques dos Santos, permite ir mostrar aquilo que de melhor se faz na Universidade. A nível internacional estão em curso protoco-

los com as universidades do top 100 e do top 25 dos rankings internacionais, com a preocupação de que a qualidade esteja sempre presente e em primeiro lugar. Os principais objectivos da UP para 2009 dizem respeito à análise do processo de Bolonha, de forma a corrigir aquilo que está mal, ao paradigma ensino/aprendizagem” que “é um processo complexo que exige uma mudança de mentalidade muito grande dos docentes”, explica o reitor. Por outro lado, o insucesso/sucesso escolar e a empregabilidade vão continuar na mira da UP. Os resultados do 1ºObservatório de emprego montado pela reitoriada UP estão prestes a sair e vão ser seguidos, primeiro de ano a ano, e depois de cinco em cinco, por forma a corrigir posíveis deficiências. O aumento da mobilidade dos estudantes ao abrigo do programa erasmus é outra das ambições já que, um dos principais objectivos da UP é a internacionalização e a entrada, até 2011, no top 100 das melhores universidades europeias.


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CAVACO SILVA INCENTIVA JOVENS EMPREENDEDORES Cátia Monteiro

Inserido no Roteiro da Juventude, o Chefe de Estado visita o Porto para conhecer projectos sociais organizados pela FAP e pela Câmara Municipal do Porto. O Presidente da República, Cavaco Silva, levou a cabo nos passados dias 3 e 4 de Outubro a primeira jornada do Roteiro da Juventude. Subordinado ao tema “Autonomia dos Jovens e Associativismo”, o Roteiro teve como objectivos dar voz aos projectos dos jovens, estimular a participação na vida cívica e valorizar o associativismo. A ideia de realizar o Roteiro da Juventude surgiu durante uma reunião entre Cavaco Silva e várias organizações de jovens, que se realizou em Maio no Palácio de Belém. O Presidente da República passou pela Lousada e Vila Meã, onde conheceu casos de sucesso de jovens agricultores, o chefe de Estado visitou ainda o Porto para conhecer alguns projectos de carácter social promovidos pela Federação Académica do Porto e pela Câmara Municipal. Cavaco Silva declarou que o Roteiro pretende mostrar os “bons exemplos” de trabalhos feitos por jovens e consequentemente estimular a competitividade do país: “não me peçam para apresentar desgraças, porque não é assim que damos a esperança de que Portugal precisa, porque não é assim que estimulamos a competitividade dos portugueses.”

Na sessão, foram recordados casos de sucesso como o Projecto Aconchego, que promove o alojamento de estudantes do ensino superior em casas de idosos residentes na baixa do Porto, do projecto “Medicina na Periferia”, que consiste na realização de rastreios em aldeias por estudantes do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar e do “Porto de Futuro”, que visa promover o sucesso escolar de crianças em risco de abandonar os estudos. Em destaque estiveram o associativismo e participação cívica, o presidente da República referiu a importância das associações de estudantes e disse que “as associações de estudantes são escolas de cidadania em vários domínios”. O encontro contou também com a presença de Ivo Santos. De acordo com o presidente da Federação Académica do Porto “o Roteiro da Juventude pode traduzir-se numa mensagem de esperança para os estudantes que muitas vezes se sentem um pouco desiludidos e até mesmo com as perspectivas defraudadas relativamente ao seu futuro”. Cátia Monteiro

O QUE FAZER DEPOIS DA LICENCIATURA? Cristiana Afonso

Número de licencidados desempregados tende a aumentar e não há soluções à vista. A pergunta impõe-se a milhares de jovens licenciados, que investiram parte do seu tempo e da sua vida numa formação que acreditaram ser a melhor e a mais capaz de lhes oferecer a possibilidade de um emprego e de realização profissional. Mas a realidade não é essa. E o número de jovens licenciados desempregados ou a trabalhar em áreas que não correspondem à sua área de formação tende a crescer de ano para ano. Só em 2007 eram mais de 59 mil os lecenciados no desemprego, o aumento entre 2005 e 2007 foi de cerca de 30%, refere o INE (Instituto Nacional de Estatística). Já em Fevereiro de 2008, e segundo o IEFP (Instituto do Emprego e Formação Profissional), estavam inscritos nos centros de emprego 9.129 desempregados com habilitação superior, o que corresponde a 23,5% do total de desemprego entre licenciados. Por enquanto, para os jovens, o desemprego parece não ter fim à vista. E muitos, como Renata Silva, consideram que as perspectivas de emprego são más. “A situação tem tendência a piorar e não vejo nada a ser feito para que se evite isso. Se conseguir emprego noutra área (porque até para aí está mau) já me vou dar por contente.” Já para as autoridades políticas a siuação é diferente e muito mais optimista. A 4 de Abril de 2008, ouvimos Mariano Gago dizer que “o número de profissionais que sai dos cursos superiores todos os anos para o mercado de trabalho não chega e são todos absorvidos pelo mercado.” Facto é que os licenciados se vêem a braços com estágios não remunerados sem fim, ou com trabalhos pagos a recibos verdes. Por outro lado, as vagas nas universidades são quase totalmente preenchidas, há casos de abertura de novos cursos, multiplicam-se os caloiros, enquanto ao mesmo tempo o país se recente com a crise mundial, a economia não se desenvolve e as oportunidades de emprego não se criam. Mesmo assim, Érica Vilarinho, aluna do último ano da licenciatura em Ciências da Comunicação na UP, acredita na possibilidade de encontrar emprego. Diz-se “uma

optimista, gosto de pensar que vou conseguir o emprego dos meus sonhos após o estágio, mas no fundo sei que para isso é preciso sorte, mais até do que competência. Há que pôr os pés no chão e batalhar; não há remédio.” Uma notícia recentemente publicada no JPN (Jornalismo Porto Net) indica que mais de metade dos licenciados da FLUP, FEP e FPCEUP está em situação precária. O estudo desenvolvido por investigadores do Instituto de Sociologia da FLUP, “Precariedade profissional dos diplomados da Universidade do Porto em Ciências Sociais, Humanidades e Administração e alternativas de inserção futura”, teve como ponto de partida inquéritos na Internet a 7757 licenciados entre 1997 e 2004 nas faculdades referidas. O objectivo era perceber o tempo médio para encontrar o primeiro emprego e em que situação laboral se encontravam no verão de 2006. Os resultados revelaram que 53% dos licenciados estava em situação precária e 18% trabalhava a recibos verdes. A UP continua a ser a mais procurada. É, segundo o reitor, José Marques dos Santos, uma “universidade com valor”, que tem vindo a crescer no número e qualidade da sua produção científica. No entanto, também ela não assegura um futuro com emprego aos milhares de jovens que a escolhem porque a vêem nas melhores posições dos rankings internacionais. O reitor defende que, actualmente, já não faz sentido pensar em cursos com emprego imediato e acrescenta que “a

primeira formação é para ganhar competências de empregabilidade e não de emprego.” Talvez então se justifique que os jovens de hoje prolonguem a vida na casa dos pais e a dependência financeira dos mesmos, não invistam em casas e carros próprios, nem contribuam para o aumento da natalidade. A população envelhece e a idade de reforma aumenta.

uma boa qualificação profissional, porque afinal o mercado de trabalho é, cada vez mais, para os bons”, explica Érica Vilarinho. Outros consideram que o principal problema dos mestrados são os custos. Mais formação implica mais investimento. Por isso, nem sempre a continuidade dos estudos é uma opção viável.

Estudar no estrangeiro

U.Porto

Futuro passa pelos mestrados As soluções passam cada vez mais pelo estrangeiro, pela continuidade dos estudos através do mestrado, mesmo sem antes ter qualquer experiência profissional, ou pela aposta no empreendedorismo e na criação do próprio emprego. Quanto à continuidade dos estudos através de mestrado, e que veio ser incentivada pela divisão do curso em ciclos pelo Processo de Bolonha, é uma forte possibilidade para alguns, que acreditam que mais formação só pode trazer mais benefícios.“Faz toda a diferença, sem dúvida. Apesar de, hoje em dia, ser mestre ou doutor, não nos dar garantias de nada, mas é indispensável

Michel Moutinho, estudante de Farmácia na Universidade de Santiago de Compostela, decidiu optar desde início pela formação fora de Portugal. O número de desempregados condicionou a escolha “principalmente devido à situação em que o país se encontra actualmente, em que a taxa de desemprego é cada vez maior, tanto a nível de licenciados como a nível de não licenciados, e neste caso, o estrangeiro oferece uma melhor qualidade e uma maior escolha a nível de emprego.” Apesar de não descartar a hipótese de regressar a Portugal, acredita que primeiro “será melhor obter uma formação inicial fora do país, visto que a formação em Portugal é muitas vezes precária, e além disso, a nivel económico e monetário, o estrangeiro oferece melhores condições. Portanto, talvez volte a Portugal, mas apenas quando já tiver uma vida estabilizada e garantida.”

Observatório de Emprego Na Universidade do Porto estão quase a sair os primeiros resultados do Observatório de Emprego. O objectivo é acompanhar o percurso dos estudantes após a licenciatura e tentar perceber em que pontos é possível corrigir deficiências. Muitos estudantes acreditam que também passa pela universidade a responsabilidade de orientar os jovens no que toca às questões do emprego. Renata Silva diz que é “necessário promover feiras de emprego e abrir mais e melhores estágios, por exemplo. Afinal de contas, já que pagamos propinas é para nos darem o melhor.”


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O Desempregado do Mês | Crónica José Ferreira (hermesmarana@gmail.com)

EMPREGABILIDADE DO EMPREGO Desde sexta-feira que notícias da cimeira euro-asiática e os ecos da crise mundial invadiram os media. Nada de diferente até aqui, até porque desde de 2003 que a crise é o prato do dia nos media. Resta saber se ainda temos apetite para continuar a alimentar a barriguinha que segura a tanga com notícias tão pouco optimistas. Acima de tudo, para muitos é difícil aceitar que o investimento feito por si ou pelas suas famílias não tem o peso devido na hora de encontrar emprego. Numa entrevista para o JPN a 10 de Outubro de 2008 o Reitor da Universidade do Porto foi questionado sobre o que se poderia fazer para reduzir os números de licenciados que estão desempregados ou que não estão empregados na sua área de formação, ao que este respondeu ser “totalmente contra dizer que não se oferecem cursos com emprego imediato ou pensar que a pessoa vai exercer uma profissão rigorosamente na área em que se formou. Isso já foi chão que deu uvas. Já não é verdade, nem deve ser. A primeira formação é para ganhar competências de empregabilidade e não de emprego. Depois na vida profissonal a pessoa vai procurar a área onde vai encontrar emprego, também a universidade deve ter capacidade de lhe dar formação nessa área de emprego.” Ora, podemos tirar um curso, mas este não nos garante emprego – dá-nos algo de muito mais impalpável: empregabilidade. E se isso não acontecer, ou se por acaso não se encontrar emprego na área em que nos deram empregabilidade, podemos sempre procurar novamente a faculdade e pagar, para nos darem empregabilidade numa nova área. Um esboço de um negócio quase perfeito. Agora passemos ao desempregado do mês propriamente dito, o qual, vendo bem as coisas, pode até ser o leitor. Falando de formação e emprego e empregabilidade, temos a história de uma pessoa licenciada em História da Arte pela Universidade do Porto com uma média final bastante apelativa e simbólica do esforço pessoal e financeiro efectuado. Após dois anos e meio a fazer formações complementares e vários trabalhos pontuais encontrou emprego como empregada de escritório numa empresa. Até parece uma miragem hoje em dia, mas o contrato expira em Junho e as prespectivas de ser passada aos quadros da empresa são poucas. Ou ainda outra história de uma outra pessoa, também licenciada em História da Arte que, embatendo num mercado cultural e artístico fechado, fez uma formação profissional que lhe deu empregabilidade para encontrar emprego como maquilhadora. Talvez a UP deva investir em cursos profissionalizantes deste género. As histórias são muitas, tantas quantos os licenciados empregues em certos cursos de empregabilidade sem emprego garantido. Mas não nos enganemos, o que se pretende não são garantias de emprego. São as mesmas garantias que se pedem aos bancos e restantes parceiros económicos antes de um negócio. Garantias essas que visam a salvaguarda do nosso investimento. Garantias essas que também fazem com que o ensino superior seja algo de útil, um passo mais numa formação que se quer contínua e de qualidade e, acima de tudo, acessível a todos e não apenas aqueles que têm tempo e dinheiro suficientes para investir num negócio que especula com os futuros de cada um.

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SOCIEDADE “DIGAME COMO SE SENTE” MEDICALROBOT AO SERVIÇO DA SAÚDE Sara Moreira

Desde Fevereiro de 2008, a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto tem vindo a desenvolver um projecto que une a robótica à saúde: o MedicalRobot. Uma iniciativa pioneira em Portugal. A família do MedicalRobot era de jogadores da bola. Foi a partir do projecto de Futebol Robótico da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) que nasceu a ideia de tirar partido da robótica em função da saúde. O Hospital de São Martinho, em Valongo, foi quem lançou o desafio. É nesta instituição que o projecto está a ser testado desde inícios de Outubro. “Na verdade, o Futebol Robótico representa um ensaio sem objectivo”, diz o Professor António Moreira. O responsável pelo projecto justifica assim o interesse de aplicar as potencialidades de um robot capaz de jogar futebol no campo hospitalar. Esta ideia não é completamente original, já que nos Estados Unidos a empresa Intouch Health criou algo de semelhante. No entanto, trata-se de uma iniciativa pioneira em Portugal, a de, com o apoio de tecnologias, facilitar a comunicação entre o médico e o paciente. Tudo isto feito através da reutilização de equipamento do Futebol Robótico da FEUP. Entre os meses de Fevereiro e Julho de 2008, o ex-aluno Tiago Costa, recém-licenciado em Engenharia Electrotécnica e Computadores, realizou o estágio de final de curso onde teve a oportunidade de adaptar os robots existentes na FEUP à nova realidade que se pretendia criar, tendo em vista um objectivo principal: possibilitar a movimentação autónoma de um robot, de uma origem a um destino, sem choque. Para tal, é preciso dotá-lo da capacidade de se localizar num mapa. Para lá chegar, há que passar por várias fases. Inicialmente, foi elaborada toda a vertente estática da ferramenta. A vídeo-conferência está funcional, o robot possui

um sensor que lhe “permite ver” quando o doente acorda. Ao verificar tal acontecimento, ele envia um alarme através da rede informática do Hospital. O enfermeiro que recebe o alarme dirige-se ao quarto do paciente e, a partir daí dáse início à vídeo-conferência, com o médico deslocalizado. Isto é, o MedicalRobot comporta-se mais como um complemento ao serviço actual nas áreas de internamento e de pós-operatório, do que como uma entidade autónoma em termos de decisões críticas. “Falar em Inteligência Artificial, parece-me demasiado, porque não há aprendizagem. Gosto de pensar que se trata de um robot criado com uma tecnologia complexa e que trabalha de forma a complementar e a aliviar o serviço humano num hospital.”, afirma o responsável do projecto a propósito da tendência para se confundir a Robótica com a Inteligência Artificial. Desde o início do ano lectivo 2008/09, e terminado o estágio de Tiago Costa, quem está agora empenhado nos melhoramentos e desenvolvimentos do MedicalRobot é Manuel Gouveia, também ex-aluno e recém-formado em Engenharia. Algumas das tarefas que tem vindo a realizar, orientadas também por António Moreira, tratam da afinação da odometria - isto é, a distância percorrida - e também da auto-localização em determinado momento. Segundo o Professor, transplantar esta questão da auto-localização do campo de Futebol Robótico para o contexto hospitalar é um verdadeiro desafio, pois o robot usa os seus sensores para saber onde está. Enquanto no Futebol existem as linhas brancas do relvado que permitem guiar o robot em qualquer altura, no Hospital só existem os móveis e um ou outro pormenor específicos de cada edifício e serviço. Uma das preocupações no desenvolvimento do projecto

foi a de o tornar o mais barato e economicamente interessante possível. Poderiam, por exemplo, ter sido usados sensores a laser complexos, mas que dificultariam a viabilidade da implementação do projecto no mercado. António Moreira defende que a solução encontrada com sensores ultra-sons e infra-vermelhos não deixa de ter qualidade e, se tem falhas, são admissíveis (como, por exemplo, cinco cm de desvio ao percorrer um corredor). Também a opção por tecnologias livres para o desenvolvimento das capacidades do MedicalRobot fez com que o custo fosse amenizado (ver caixa). Em termos de custos, no que diz respeito ao software, há uma grande dificuldade em quantificar a sua complexidade em termos monetários. Já o encargo financeiro com o hardware ronda os 10.000€. Para desenvolvimento futuros, imagine-se a possibilidade de ter uma máquina ao serviço que consiga realizar tarefas rotineiras, como a medição de sinais vitais simples, por exemplo, a tensão. Daí é feito o registo dos dados levantados, directamente no software desenvolvido no hospital. Num extremo está a pulsação de um paciente e, no outro, está o sistema de informação complexo da unidade de saúde. O MedicalRobot poderá criar essa ponte. Outras tarefas em mente, ainda na perspectiva do “depois”, envolvem transporte de materiais consumíveis e meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDST`s), através de um sistema intrincado e altamente especializado de localização e deslocalização em edifícios ligados à saúde. Ficam, certamente, dados os primeiros passos na criação de uma promissora especialidade médica que é a Medicina Robótica.

António Moreira

As Tecnologias que sustentam o MedicalRobot Sistema Operativo Robot, Linux & Hospital de São Martinho, Windows Sistema de Vídeo-Conferência Ekiga (ferramenta open source) Programação do Robot Linguagem Lazarus, open source e flexível, o que permite a fácil interligação entre plataformas de diferentes sistemas operativos (Windows e Linux, por exemplo)


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CÂMARA DO PORTO PROCURA NOVA SOLUÇÃO PARA O BOLHÃO Mafalda Ferreira

A Câmara Municipal do Porto voltou atrás na decisão de entregar a obra de requalificação do Mercado do Bolhão à TramCroNe. Rui Rio garante estar a estudar soluções mais equilibradas a serem apresentadas num curto espaço de tempo. A Plataforma de Intervenção Civica, por seu lado, já apresentou uma nova proposta baseada no anterior projecto do arquitecto Joaquim Massena. O Mercado do Bolhão é um dos edíficios mais antigos e emblemáticos do Porto. Se em tempos foi sinónimo de comércio tradicional, hoje é uma sombra do que já foi. O estado de degradação do edifício levou à proposta da sua reabilitação. Em Dezembro de 2007, a TramCroNe (TCN), empresa holandesa que ganhou o concurso público de Abril lançado pela Câmara Municipal do Porto, foi escolhida para levar a cabo o projecto. Porém, depois da aprovação da Assembleia Municipal, o projecto de modernização do mercado proposto pela TCN atraiu novas polémicas, tornando-se alvo de grande contestação por parte da Plataforma de Intervenção Cívica (PIC), um movimento composto por cidadãos portuenses e associações locais. O projecto apresentado pela TCN pressupunha uma total mudança no interior do edifício, ocupando 62% do espaço total do mercado com lojas, restaurantes e supermercado. Isto, aliado a espaços para circulações e armazéns, deixaria apenas 3% da área total para o mercado tradicional. Com o argumento de que o Bolhão seria demolido na sequência do projecto da TCN, a PIC originou várias dinâmicas de protesto contra o projecto. Desde manisfestações de rua diante do Parlamento - em que os protestantes envergavam t-shirts com a mensagem “O Bolhão é do Porto não o deixe destruir” - a uma petição que foi assinada por cerca de 50 mil pessoas. O movimento de contestação de cidadãos do Porto chegou a atingir a Assembleia da República e os tribunais. Com o fim das negociações com a TCN, a Câmara Municipal do Porto concentra-se agora em encontrar uma nova solução para o processo de modernização do Mercado do Bolhão. Rui Rio, Presidente da Câmara do Porto, demonstrou o desejo de tal solução ser apresentada num curto espaço de tempo. Se essa possibilidade se verificar, o autarca afirma que “não vai aparecer uma coisa sem coerência, só para se dizer que a Câmara foi rápida”. Lino Ferreira, vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade da Câmara Municipal do Porto, sublinhou que a instituição “cumprirá as suas responsabilidades e encontrará uma solução para o Bolhão”. Rui Rio recusa qualquer solução que implique o individamento da Câmara ou o aumento do seu passivo. Afirma ainda que o concurso agora anulado procurava “que o investimento não fosse feito com dinheiros públicos” e definiu que o edifício do Bolhão tinha que ser preservado, bem como a manutenção da componente do comércio tra-

dicional. O autarca acrescentou que está a ser estudada a possibilidade de incluir um parceiro privado no projecto de reabilitação do mercado. De acordo com António Almeida Rebelo, adjunto da Vereação do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade, neste momento ainda estão a ser estudadas soluções para o processo, apesar da esperança de se encontrar novas alternativas até ao fim do passado mês de Setembro. A PIC já reagiu a esta decisão da Câmara, apresentando uma nova proposta de modernização do mercado com base no projecto de arquitectura de Joaquim Massena apresentado no Ateneu Comercial do Porto. O plano de Massena prevê a recuperação do mercado mantendo a sua estrutura tradicional e acrescentando-lhe algumas vertentes de modernização, como um espaço de museu, uma galeria intermédia e um parque de estacionamento a nível do subsolo. Também é sugerido o aproveitamento da praça do Mercado como espaço cénico para que o Bolhão possa ter uma vertente mais cultural durante a noite. A execução deste projecto, de acordo com as estimativas realizadas, teria um prazo de dois anos e um investimento de 16 milhões de euros. A gestão do mercado passaria a ser assegurada por uma parceria público/ privada estabelecida entre a Câmara, o comércio tradicional e os cidadãos. Para tal, a PIC propõe uma candidatura de fundos comunitários do QREN (Quadro de referência Estratégico Nacional). Enquanto o projecto se rodeia de polémicas e tentativas falhadas, os lojistas ainda terão de esperar pelo novo Mercado que lhes foi prometido há tanto tempo.

José Ferreira

OS JOVENS E A POLÍTICA NA UNIVERSIDADE DO PORTO

Sara Riobom

“O homem é um animal cívico, um animal político”. Milhares de anos após ser escrita, a frase de Aristóteles impõese pela urgência de ser reaprendida pelas gerações mais recentes. Na busca da política na vida dos estudantes da UP encontrámos um enorme vazio entrecortado, aqui e além, por pequenas ilhas de activismo. Na última sessão comemorativa do 25 de Abril, Cavaco Silva dirigiu-se ao país manifestando a sua preocupação relativamente à alienação política dos jovens portugueses. A sondagem efectuada pela Universidade Católica (UC), “Os Jovens e a Política”, confirma a apreensão do Presidente da República. É cada vez mais notório o desinteresse desta faixa etária pela política: apenas 5,3% dos inquiridos a consideram muito importante na sua vida. Este mesmo estudo permite auferir o baixo nível de conhecimentos políticos da nossa geração, sendo que só 20,3% dos inquiridos sabe o número de Estados pertencentes à União Europeia e apenas 54,9% que o PS tem maioria absoluta na Assembleia da República. Os estudantes da Universidade do Porto (UP) não constituem excepção a este cenário desanimador. Apesar de existirem bastantes alunos filiados nas juventudes partidárias são pouquíssimos os que escolhem a universidade como espaço de intervenção política. Os núcleos políticos na universidade são praticamente inexistentes, à excepção do Núcleo de Estudantes Socialistas do Porto (NESUP), criado recentemente. “A nossa geração tem um fenómeno interessante”, diz Pedro Barrias, ex-presidente da Federação Académica do Porto (FAP), “pois os nossos membros não são activos em estruturas políticas, mas nas de apoio social e nas culturais

têm tido muita intervenção”. De facto, constata-se que os alunos intervêm socialmente através de programas de voluntariado, associações estudantis, núcleos culturais, desportivos e religiosos. Mais raramente surgem movimentos independentes tais como o abaixo – assinado por uma extensão da Cinemateca Portuguesa à cidade do Porto, elaborado por estudantes da universidade, que teve um impacto político de relevância assinalável. Segundo Pedro Barrias, há vários motivos para esta ausência de pró-actividade política. Um dos principais é a falta de valorização do jovem activista por parte da sua rede familiar e social. “Para os nossos pais, estar no associativismo é estar nessas coisas que não interessam. Eles, que fizeram a revolução, pedem-nos que sejamos amorfos, impávidos e serenos.” O relatório do fórum da juventude organizado pela FAP no verão passado também menciona a existência dessa falta de interesse da população. O documento assinala que “tal sentimento resulta de uma desconfiança social em relação à grande maioria das instituições, mas em especial às de actividade política. Em alguns casos, até numa desconfiança nas instituições do Estado.” Barrias confirma: “penso que um jovem da nossa idade se sente mais realizado a trabalhar, por exemplo, no banco alimentar do que a intervir politicamente. São acções mais descomprometidas, informais, sinceras. Não prejudicam os

estudos e são menos atacados socialmente”. Outro factor apontado unanimemente pelos estudos referidos é o autismo social da camada mais jovem da sociedade. Sentimento que leva os jovens a responder, quando inquiridos sobre as razões para não pertencerem a associações, coisas como “não estou interessado”, “tenho coisas mais importantes para fazer” e “não me quero meter em problemas”. Perante este panorama, urge a criação de medidas que aproximem os jovens da política. O estudo da UC mostrou que este grupo etário é favorável à criação de novos mecanismos de intervenção, bem como à implementação de processos de democracia directa, tais como o referendo. Já o relatório da FAP considera essencial o “reconhecimento e a valorização social da intervenção cívica dos jovens e a valorização dos seus contributos e opiniões”, salientando que iniciativas como os encontros entre o Presidente da República e os jovens, realizados no Âmbito do seu Roteiro para a Juventude são “de extrema importância e pertinência e traduzem-se num contributo inestimável para o solucionar da participação e envolvimento entre os jovens e a politica.” De uma forma ou de outra, arranjar meios para poder dizer que “os jovens não se resignarão”, como afirmou Ivo Santos, o actual presidente da FAP.


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UMA ANÁLISE SOBRE O RELATÓRIO DA ENTRADA NO MERCADO DE TRABALHO DOS LICENCIADOS DE GESTÃO E ECONOMIA Ricardo França

Tal como numa edição passada do JUP, procuramos dissipar a nébula da empregabilidade em volta dos alunos da FEP, desta feita tendo por base o inquérito datado de Março de 2008, resultante das respostas dos alunos licenciados em 2005/2006. Na verdade, através dos dados recolhidos é perceptível que a FEP continua a ter boas saídas profissionais, quer seja em termos de rapidez ou qualidades das mesmas. Cerca de 53,5% dos inquiridos começaram a trabalhar até um mês após terem finalizado o curso. Aumentando o tempo de colocação para seis meses, tem-se uma boa percentagem de cerca de 92% dos inquiridos. Como se pode ainda concluir da leitura do relatório em questão, é de notar que em geral os alunos com média igual ou superior a 14 valores têm um tempo de colocação mais curto. Para todo este processo de entrada no mercado de trabalho, a dinâmica da Bolsa de Emprego da FEP parece assumirse como uma plataforma relevante, pois foi através da mesma que cerca de 43,4% dos inquiridos conseguiu o seu primeiro emprego. Dos inquiridos, apenas 1,5% estavam desempregados até à data da realização do referido inquérito. É no curso de Gestão e em licenciados com médias mais baixas que se verifica maior desemprego. Nesta perspectiva, é de notar uma vantagem para o sexo feminino, pois é o sexo masculino que está mais presente nos inquiridos ainda desempregados. É também importante assinalar a forte relação positiva existente entre o salário e a média do curso: cerca de 70% dos inquiridos com média igual ou superior a 14 valores aufere um salário médio mensal superior a € 1000. Nesta perspectiva, devemos também realçar que após um ano e

meio de colocação no mercado, a maior parte dos licenciandos obtém entre € 750 a € 1000 mensais. Note-se que cerca de 96% trabalha por conta de outrem, com incidência no sector privado e dentro da sua área de formação (94,2%). Apesar de se constatar que cerca dos 83% dos inquiridos se encontravam a trabalhar na região Norte do País, e tal como relatado pelo JUP na última análise, verifica-se já uma certa pressão de mobilização geográfica (também internacional). Aliás, exemplo disso é a comunidade “fepiana” existente em Lisboa, algo comentado pela FEP (não presente no relatório). De notar que ao nível da área de empregabilidade predomina o desempenho de funções relacionado com Actividades Financeiras, Serviços Prestados às Empresas e, com menor percentagem, o Comércio por Grosso e Retalho (10,2%). Ou seja, de forma natural, parece-nos que os sectores da Banca e Seguros, Consultoria e Auditoria continuam a ser as grandes preferências, sendo que cerca de 61% dos inquiridos foi contratado por grandes empresas (mais de 250 trabalhadores). Em tom de conclusão, parece-nos importante referir que neste inquérito foram ainda identificadas algumas lacunas, quer ao nível da formação académica quer ao nível das competências pessoais. Há uma especial referência para as disciplinas das áreas de Informática, Gestão e para a formação ao nível das denominadas “soft skills”, exemplo de Apresentação em Público, Estratégias de Comunicação e Tomada de Decisão. Terminamos com a dica da praxe: para mais informação e alguns conselhos podem e devem consultar o Serviço de Integração Académica e Profissional da FEP.

DR/ José Ferreira

Ainda no decorrer do 2º semestre do último ano lectivo, o Gabinete de Apoio ao Aluno da Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP) finalizou mais um importante estudo sobre as saídas profissionais desta instituição. O JUP, aproveitando a recém chamada de atenção feita na FEP para este tema e para este estudo, deixa-vos uma análise rápida e concisa, procurando tocar nos pontos que porventura serão mais relevantes.

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Simon Charlesworth, sociólogo, em entrevista

O ENSINO SUPERIOR É UMA MANEIRA DE TORNAR SELECTIVO O ACESSO AO EMPREGO Bruno Monteiro

A viagem desde Manchester durou pouco mais de duas horas. O céu plúmbeo combina com o tom da paisagem. As fábricas em redor estão silenciosas. De Rotherham a Swinton sucedem-se ininterruptamente os armazéns vazios e os amontoados de sucata. Foi aqui que Simon Charlesworth, sociólogo, escreveu o seu perturbador livro «A phenomenology of working class experience» (Cambridge University Press, 2000).Bem-vindos à «dead man`s town». Quando fala de «dimensão pessoal da classe», na qual a economia é constituída fisiológica e interpessoalmente, a que se refere? O funcionamento de qualquer sistema económico está relacionado com a existência de um determinado sistema de disposições relativamente ao mundo, requerendo sacrifício, investimento, capacidade para relacionamentos e uma aptidão para adquirir competências. O problema é que a economia funciona de tal maneira que muitas pessoas não estão em condições de adquirir essas disposições. Uma questão fundamental numa sociedade altamente desigual é o modo como os indivíduos percebem o que é constitutivo da presença dos outros. Para os membros da classe operária, a sua presença constitui-se em relação a uma forma de realização que é indeterminada, deslocada relativamente às formas publicamente reconhecidas e valorizadas. Eles existem através de formas sociais atrofiadas apoiadas em formas relacionalmente empobrecidas. Estando sujeitos a um olhar avaliador que salienta quais os aspectos de valor constitutivos da associação e que estabelece as bases da interacção, eles são negativamente posicionados por esse olhar, de que resulta a auto-inibição nas interacções. É no interior dessa não-realização que tentam a realização pessoal, acabando por experimentar a existência como significando não-ser e negação. É nessa medida que se tornam “desajeitados”, “sorumbáticos”, “demasiado tensos”, “desinteressantes”. Eles não são alguém que um painel de avaliação desejasse seleccionar, porque o seu comportamento manifesta uma ausência dos aspectos “humanos” associados a quem é valorizado socialmente. É possível que aqueles que percepcionam os pobres através destas “indicações” de valor tácitas, não verbais, pretendam não ter intenções discriminatórias e psicologizem os resultados da pobreza. Como se a miséria que os pobres sofrem os conduzisse a ser desajustados nas relações interpessoais. O pobre acaba por ser enclausurado em formas de apresentação que mediam a estrutura de classes através da manifestação do sentido da posição social. Por isso, podem ele ser percebido como alguém com atitude “negativa”. Se os jovens trabalhadores estão cada vez mais aprisionados em padrões de consumo imitativos é precisamente por causa dessa conexão entre forma incorporada e valor social. Quando procuram incorporar valor, e já que as disposições que são a verdadeira marca do valor burguês estão fora do seu alcance, acabam desprezados por carecerem da subtileza natural dos inventores deste culto da pessoa. Eles são por isso os “gunas [CHAVs]” ou a “escumalha”.

so a formas de personalidade. A educação, em si e por si, não. O ensino superior massificado é uma maneira de legitimamente tornar selectivo o acesso ao emprego, ao mesmo tempo que constitui os meios que controlam o acesso a esse mesmo emprego pelo controlo do acesso às formas simbólicas produzidas através de envolvimentos pessoais. Não só condiciona o acesso ao emprego pela posse de credenciais académicas, como cria a necessidade destas serem adquiridas e ratificadas por formas simbólicas cuja taxa de câmbio é controlada fundamentalmente através de redes institucionais e interpessoais.

Se esse «espaço das aparências» media a constituição de valor e reconhecimento sociais, porque considera que nas instituições académicas há pessoas que enfrentam processos de denegação dessas distinções? Este é um sistema suportado na constituição de significados elitistas que, instantaneados interpessoalmente e tornados reais pela injusta distribuição de recursos, são usados para embelezar um ambiente constituído para venerar o grupo instituidor, dotado “naturalmente” dessas propriedades. A universidade não implica envolvimento activo para a maioria daqueles que, estando social e geograficamente distantes dela, acabam por limitar-se a cumprir curricularmente ou a perceber o seu fracasso em termos pessoais.

Nestas condições, o grupo dos eleitos pode designar aqueles que a universidade não foi capaz de implicar activamente como simplesmente “os que não querem participar”. As pessoas das regiões mais empobrecidas do espaço social carecem do acesso a recursos e formas de estarem envolvidos em modalidades que sejam interpessoalmente realizadoras. No entanto, o que eles tendem geralmente a encontrar é uma administração anónima de produções simbólicas. Aqui, a degradação é um processo social levado a cabo dentro das redes institucionais e ocupacionais.

“As pessoas das regiões mais empobrecidas do espaço social carecem do acesso a recursos e formas de estarem envolvidos em modalidades que sejam interpessoalmente realizadoras.”

“Se os jovens trabalhadores estão (...) aprisionados em padrões de consumo imitativos, é por causa dessa conexão entre forma incorporada e valor social.”

Em várias ocasiões, refere o «plano circunscrito de realização», o «terreno de negação», que as pessoas das classes dominadas enfrentam em instituições públicas, como o centro de emprego ou a escola. O que realmente representa o sistema de ensino nestas condições? A extensão da escolarização relaciona-se com a distribuição legitimada do emprego. É uma maneira de fabricar emprego para clientelas influentes no seio da população, nomeadamente criando no mercado de trabalho a necessidade de provas simbólicas produzidas por meio das circunstâncias relacionais a partir das quais as instituições educacionais surgem. Na realidade é o emprego e todas as formas de “acção” relacionadas com as práticas de emprego que contam. O problema é que o emprego facilita o acesBruno Monteiro


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INTERNACIONAL NOVEMBRO´08 JUP

INTERNACIONAL Presidenciais Americanas

COMO É VOTAR PELA PRIMEIRA VEZ NO “COMMANDER INCHIEF”?

Francisca Fortuna

Após quase dois anos, a longa caminhada até à Casa Branca está a chegar ao fim. No dia 4 de Novembro, os eleitores são chamados às urnas e finalmente será decidido o sucessor de George W. Bush. Para tentar perceber como que é participar neste demorado processo, o JUP falou com dois jovens eleitores norte-americanos que, pela primeira vez, irão votar em eleições presidenciais.

É a primeira vez que vais votar? Apoiante Democrata (AD): Sim, estou muito entusiasmada por ter a oportunidade de votar. Apoiante Republicano (AR): É a primeira vez que vou votar para eleger o Presidente dos Estados Unidos, todavia, já votei no cáucus do meu estado e antes já tinha votado para eleger governadores e para eleger os representantes do Congresso.

Consideras que votar é um direito ou uma obrigação? AD: Considero que votar é um direito que qualquer cidadão americano deve ter. No entanto, todos temos a obrigação de expressar a nossa opinião sobre quem deve governar, tendo em conta a crise por que estamos a passar. AR: Votar é um privilégio. Todos os cidadãos americanos, com idade superior a 18 anos, podem votar, mas não são obrigados. Todavia, muitas pessoas lutaram e morreram para me dar o privilégio de votar e não votar é desrespeitar esses homens e mulheres que defenderam o meu país.

O que te faz acreditar em Obama/McCain? O que faz dele o candidato mais indicado para ocupar a presidência dos Estados Unidos? AD: Na minha opinião, Obama é o mais indicado porque, apesar de jovem, é experiente e muito inteli-

gente. Nunca me tinha sentido patriota até assistir a um discurso de Obama. Ao contrário do que sinto agora com o presidente Bush no poder. Obama deixa-me feliz por ser americana. AR: Acredito que McCain é o melhor candidato por várias razões. A principal é a sua experiência: os inúmeros anos no Exército; os 4 anos na Casa dos Representantes; e os 21 anos como Senador. Tem o recorde de combate aos gastos desnecessários, e além disso, confio no seu conhecimento de política externa e na sua experiência a defender este país. Obama tem uma política de despesas e de impostos muito descuidada, além de que não tem experiência absolutamente nenhuma. Obama não é senador nem há um ano. A sua falta de experiência chega a ser perigosa.

Jonathan Turk

Gillian Amanda Hubler, estudante na Des Moines Community College e residente na cidade de Bondurant, tem 19 anos e é apoiante de Barack Obama. Jonathan Turk, estudante na Iowa State University e residente na cidade Ames, tem 20 anos e apoia Jonh McCain. Ambos são residentes do estado de Iowa e participam activamente nas campanhas dos seus candidatos. Por ser um pequeno estado, apenas com 3 milhões de habitantes, o Iowa é o primeiro a receber o caucus. Este estado tem, assim, uma grande importância visto ser o primeiro a concentrar a atenção do povo americano, da classe política e dos Média nacionais e internacionais.

Qual é a melhor proposta de Obama/ McCain? AD: Considero que a melhor proposta de Obama é a sua política de educação, designadamente sobre a faculdade. Ele acredita que todos devem ter o direito à educação. No seu sítio oficial pode ler-se: “Obama acredita que se deve equipar os distritos mais pobres, sejam rurais ou urbanos, com recursos suficientes e necessários para providenciar aos alunos mais desfavorecidos a oportunidade de alcançarem o máximo da sua capacidade” AR: Os pontos fortes de McCain são a política externa e a energética. O candidato republicano conhece a situação no Iraque e sabe que os americanos não podem apenas abandonar o território. Tem consciência do que tem de ser feito no Iraque e no Afeganistão para que não seja deixado, nestes territórios, um “vazio político” quando as tropas americanas se retirarem. Compreende, ainda, que é necessário investir em energias alternativas.

Consideras que os jovens se interessam pela política americana? AD: Considero que os jovens eleitores estão a aderir a esta campanha como nunca tinha acontecido. Estão a começar a perceber que conseguem mudar o rumo do país participando na campanha política. Os jovens Americanos não querem a mesma América que tivemos no passado. Tenho-me apercebido que muitos jovens preferem o candidato democrata devido ao que a América se tornou enquanto o presidente Bush esteve no poder. Precisamos de mudança e essa mudança reside na política de Obama, que acredito que será o próximo presidente dos Estados Unidos da América. AR: Os estudantes estão mais interessados nesta eleição por causa da mensagem de mudança e de esperança que ambos os candidatos transmitem. Temos tido candidatos de diferentes “etnias” (assim no original): temos uma mulher candidata a Vice-presidente, um afro-americano candidato à presidência. É óptimo e entusiasmante ver as barreiras a desaparecerem.

Como funciona a eleição do Presidente dos EUA O processo de eleição do Presidente dos Estados Unidos é bastante longo e complexo. Começa quando um político declara formalmente ao partido a intenção de participar no processo de indicação de candidatos. Se vários políticos o fizerem, os partidos escolhem os seus candidatos através das eleições primárias ou através dos caucus. Os caucus são pequenas assembleias eleitorais, durante as quais os participantes designam delegados entre os candidatos concorrentes. Posteriormente, estes escolherão, delegados do condado, depois do distrito, para no fim chegarem ao Estado. São estes últimos representantes que irão à convenção do partido e votarão no candidato definitivo. Por outro lado, as primárias, organizadas em 40 Estados, são escrutínios com urnas e voto secreto. Estas têm também como objectivo designar delega-

dos para as convenções de cada partido, no entanto fazem-no directamente ao nível do Estado, simplificando o processo. Na convenção de cada partido é nomeado o candidato oficial, começando assim a campanha eleitoral. Segundo o artigo 2º da Constituição americana de 1787, O Chefe-de-Estado do país não é escolhido por votação directa, mas sim através do “electoral college system”. No dia 4 de Novembro, os eleitores vão às urnas para escolherem os chamados grandes eleitores que por sua vez, integrarão o Colégio Eleitoral e ficarão comprometidos a votar no candidato do seu partido. Cada estado tem direito a um número de grandes eleitores determinado pela soma do número de senadores e pela soma da bancada de deputados federais, que varia conforme a população, apurada por censos realizados em cada 10 anos. O candidato que reúne um maior número de vo-

tos num determinado estado elege todos os grandes eleitores a que esse estado tem direito. Neste sentido, pode acontecer que um candidato consiga mais votos populares na soma de todos os estados mas que reúna menos grandes eleitores, o que não permitirá que se torne presidente. Foi o que aconteceu com Al Gore em 2000, e que lhe custou a presidência para George W. Bush. Cada um dos grandes eleitores tem direito a um voto para Presidente e a um voto para o Vice. Estes só podem ser eleitos por maioria absoluta, ou seja, o candidato eleito tem de reunir pelo menos 270 dos 538 grandes eleitores possíveis. Resta-nos esperar pelo dia 4 de Novembro que respeita o princípio de que a eleição presidencial é sempre realizada na primeira terça-feira depois da primeira segunda-feira do mês de Novembro, para conhecer o 44º presidente a ocupar a Casa Branca.


JUP NOVEMBRO ‘08 INTERNACIONAL

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Presidenciais Americanas

OBAMA OU MCCAIN  WHO’S BEST FOR EUROPE?

No passado dia 7 de Outubro, no auditório da Faculdade de Economia da Universiteit Maastricht, Holanda, Ivo Daalder, colaborador na Brookings Institution em Washington e Tod Lindberg, colaborador na Hoover Institution em Stanford debateram como o resultado das eleições norte-americanos afectará a Europa: “who’s best for Europe?” (quem é melhor para a Europa?) Este debate não teria nada de peculiar, não fosse o caso de ambos serem conselheiros no campo da política externa de Obama e McCain, respectivamente. O representante europeu neste debate foi Charles Clarke, ex-ministro do governo de Tony Blair. O auditório estava completamente preenchido, o que mostra como estas eleições estão a ser seguidas com particular interesse por quase toda a Europa. Charles Clarke frisou que independentemente de quem seja o próximo presidente norte-americano, o mais importante é que este deverá ter em consideração que os EUA não são uma potência isolada. A América terá de colaborar com o resto do mundo para resolver os problemas mais importantes do momento: globalização, terrorismo, alterações climáticas e a crise financeira. Tanto Lindberg como Daalder tiveram o cuidado de afirmar que, apesar de estarem próximos da campanha, não a representam. Contudo, Daalder pareceu incorporar

Ricardo Araújo

Marília Cunha

mais o papel de colaborador do senador Obama, mostrando-se até mais comunicativo. No essencial, os dois representantes não discordaram muito nos pontos discutidos. Ambos referiram a necessidade de continuar a mandar tropas para o Afeganistão, contando os EUA com o apoio da Europa; referiram também a importância de combater as alterações climáticas. No que concerne à proliferação nuclear, Daalder foi peremptório, afirmando que o senador Obama mostra-se contra a utilização de armas nucleares e frisando a importância da cooperação. Lindberg mostrou-se céptico, não acreditando que todos os países se mostrem dispostos

a colaborar no que concerne à não utilização das armas nucleares. Após o debate, no período de perguntas e respostas, uma estudante perguntou a Tod Lindberg se considerava possível que os apoiantes de Hillary Clinton votassem em McCain, após a derrota desta. Daalder interrompeu, em tom de brincadeira, dizendo que a sua avó era apoiante de Hillary, mas que agora votaria em Obama. Dito isto, o auditório rompeu numa chuva de aplausos. A pergunta inicial ficou sem resposta, mas a avaliar pela recepção do público, ficamos sem dúvidas sobre a preferência dos europeus.

América do Sul

ESQUERDA POPULISTA CRESCE NA AMÉRICA LATINA

Cláudia Sobral

Na Venezuela e na Bolívia vivem-se novos tempos.

O “socialismo bolivariano” de Hugo Chávez

Morales em defesa da comunidade andina

Hugo Chávez e Evo Morales estão decididos a levar

Depois de falhar uma tentativa de golpe de estado contra o governo de Carlos Andrés Pérez, da Acção Democrática, em 1992, Hugo Chávez chega à presidência da Venezuela, em 1998, por via democrática, com 56% dos votos. Em 1999, uma nova Constituição, proposta pelo novo presidente, foi aprovada em referendo, com 71% de votos a favor. Entrou, então, em vigor a Constituição da República Bolivariana da Venezuela. Foi reeleito em 2000, com 60% dos votos, numas eleições em que a abstenção foi elevada, e em 2006, com 62% dos votos. Pouco depois de vencer pela última vez, Hugo Chávez quis deixar bem claro à oposição que o projecto para o socialismo bolivariano é inegociável. Este “socialismo bolivariano”, constantemente referido pelo presidente, que até mudou o nome do país para República Bolivariana da Venezuela, assenta no anti-imperialismo, na autosuficiência económica, na distribuição da riqueza, na eliminação da corrupção, no patriotismo e na democracia. Este último aspecto tem sido alvo de algumas críticas. Fala-se numa revolução permanente, que está a ser feita aos poucos e não de um dia para o outro, tal como a de Fidel Castro, em Cuba. Chavéz não gosta de que o confundam com um comunista. Alberto Garrido, analista político que segue de perto a evolução da Venezuela de Chávez disse, em entrevista à BBC Mundo, que o socialismo venezuelano “tem um alto grau de originalidade” e que não deve ser comparado com o castrismo, apesar de ser conhecida a boa relação entre ele e o antigo líder cubano. Neste último mandato, Chávez propôs algumas alterações à Constituição. Um dos aspectos a mudar seria o limite de mandatos para o presidente. Considera que o povo deve ter o direito de escolher livremente o seu presidente e, segundo ele, com um limite de mandatos isso não é possível. Com propostas muito polémicas, o novo documento acabou por não ser aprovado. Uma das críticas apontadas prendeu-se com o facto de conferir demasiados poderes ao presidente, uma tendência já patente no documento de 1999. Entretanto, Chavéz anunciou a nacionalização de tudo aquilo que outrora fora do estado. “A nação deve recuperar a propriedade dos meios estratégicos de soberania”, disse, citado pela BBC Mundo, no discurso em que apresentou os novos ministros, depois das últimas eleições. Manifestou intenções de nacionalizar a Companhia Anónima Nacional de Telefones da Venezuela (CANTV), o Banco Central da Venezuela e de assumir o controlo da refinação de petróleo na Facha Petrolífera de Orinoco. Para além disto, não renovou a licença de emissão da Radio Caracas Televisão (RCTV), uma estação televisiva privada, o que fez com que fosse acusado pelo secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, de estar a pôr em causa a liberdade de expressão. Em resposta a Chávez, a direcção da estação disse, segundo a BBC Mundo, que a licença só não foi renovada por o governo não se identificar com a sua linha editorial “independente”.

Evo Morales, seguidor de Chávez, foi eleito presidente da Bolívia em 2005, com maioria absoluta. Filiado no Movimento para o Socialismo (MAS) e antigo dirigente sindical dos cocaleros (proutores de coca), este é o primeiro presidente de origem indígena do país. A Bolívia já era, antes de Morales, um país muito instável a nível político, mas a situação agravou-se quando as reformas socialistas deste presidente começaram a ser implementadas. “Estamos a criar outra forma de governar, mas não tem sido fácil”, explicou Morales numa entrevista ao jornal New York Times. A Bolívia é um país dividido. Apesar da capital, La Paz, ser na parte ocidental, são as províncias orientais - Santa Cruz, Tarija, Beni e Pando -, da chamada Meia-Lua, que concentram grande parte da riqueza da nação. Esta divisão acentuou-se desde que Evo Morales chegou ao poder e começou a pôr em prática políticas socialistas que favorecem apenas as camadas mais baixas da população, onde se inclui a comunidade indígena, que representa cerca de 55% do total de habitantes. A nacionalização das terras, depois redistribuídas, e do gás e do petróleo não agradou aos proprietários e empresários. Para além disto, foi aprovada uma Constituição sem a participação dos partidos da oposição, que a consideram, portanto, ilegal. Os governadores da Meia-Lua exigem, então, autonomia em relação ao governo central. Foram já realizados referendos nas quatro regiões, não reconhecidos por Evo Morales, que, no entanto, acabou por aceitar negociar estatutos de autonomia. O presidente percebeu que é difícil implementar medidas contra a vontade dos governadores das quatro regiões mais ricas do país. Um outro referendo, convocado pelo presidente em Agosto deste ano, que colocava em jogo a sua permanência no poder, acabou por reforçar o seu estatuto. Morales não só continuou no cargo, como também conseguiu obter 60% dos votos a favor da continuidade do seu mandato (tinha vencido as eleições com 54% dos votos). Sente, agora, que tem mais legitimidade para governar. Mas isto acabou por acentuar as divisões já existentes, pois os governadores não aceitam submeter-se ao presidente. Mesmo depois de se tornar presidente, Morales não deixou de defender os cocaleros, como fazia nos tempos em que estava no sindicato. O presidente boliviano incentiva a produção da folha de coca, a que os EUA pretendem pôr termo. Esta divergência constitui um dos pontos de atrito entre a Bolívia e a grande potência americana. Morales não cede nesta questão, por se tratar de uma tradição que remonta há séculos e que constitui a forma de subsistência de muitos bolivianos. “Não é possível que seja legal a coca para a Coca-Cola e ilegal para a comunidade andina”, argumentou numa entrevista à BBC Mundo.

o socialismo à América Latina. E, apesar de todas as críticas, já se viu que o povo quer continuar a vê-los no poder. Na América Latina, tem-se assistido a uma conquista do poder por uma esquerda populista. Os principais actores do movimento, Hugo Chávez e Evo Morales. É, de facto, na Venezuela e na Bolívia que esta transição para o socialismo tem suscitado mais problemas, quer a nível interno, quer externo. Hugo Chávez, pelas polémicas em que se envolve e pela forma agressiva como, por vezes, se dirige a líderes de outros países, já não passa despercebido no cenário internacional. O presidente da Bolívia, Evo Morales, enfrenta uma crise política interna, que poderá vir a ter como última consequência a divisão do país. O Equador e a Nicarágua seguem o exemplo destes dois presidentes. Outros países tendem para a esquerda menos radical, como a Argentina, o Chile, o Brasil, o Paraguai ou Uruguai. Mas nem todos se rendem a esta tendência generalizada. Políticos de extrema-direita governam alguns países desta zona do continente americano. Veja-se os casos de Felipe Calderon Hinojosa, no México, e de Álvaro Uribe, na Colômbia. A extrema-direita convive, assim, com uma esquerda populista, que procura, cada vez mais, afirmar-se na América Latina. Andrés Oppenheime, autor de Contos-do-Vigário - O engano de Washington, a mentira populista e a esperança da América Latina e vencedor de um Pulitzer, em 1987, opõe-se às políticas de Chávez e Morales, e defende a ideia de que a América Latina poderia estar muito melhor se não fosse a tendência populista dos seus chefes de estado. No entanto, “Brasil, México, Chile, Colômbia e Peru, entre outros, estão a romper com a antiga praga latinoamericana das políticas radicais, que resultam em instabilidade, fuga de capitais e pobreza”, escreve Oppenheime num artigo de opinião para o jornal The Washington Post. Chávez e Morales manifestam-se contra o imperialismo norte-americano e o neo-liberalismo. Em 2004, o presidente da Venezuela, em conjunto com o então dirigente de Cuba, Fidel Castro, criaram, em resposta à Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), a Alternativa Bolivariana para os Povos da América (ALBA), à qual a Bolívia também aderiu. O objectivo da ALBA é fazer frente à “liberalização, desregulamentação e privatização dos serviços”, como se lê num documento da organização. Outros países aderiram à organização, entretanto.


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U.PORTO NOVEMBRO´08 JUP

U.PORTO AGENDA 28 DE OUTUBRO LANÇAMENTO DO LIVRO “VINHO, GASTRONOMIA E SAÚDE” Salão Nobre da Reitoria da Universidade do Porto, 18 horas. Apresentação do livro “Vinho, Gastronomia e Saúde”, da autoria Hipólito Reis, professor jubilado de Bioquímica da Faculdade de Medicina da U.Porto e editado pela Editora UP. A apresentação da obra estará a cargo de Daniel Serrão, professor jubilado da Faculdade de Medicina. Preço: 35,00 euros.

U. Porto

28 DE OUTUBRO MICROSOFT APRENSENTA “IMAGINE CUP 2009” Na sala B032 da FEUP, 15 horas. Representantes da multinacional Microsoft vão estar na Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP), no próximo dia 28 de Outubro, para uma sessão de esclarecimento sobre o “Imagine Cup 2009”. Trata-se de um concurso mundial de tecnologia patrocinado pela Microsoft, em que o objectivo passa pela criação de soluções inovadoras capazes de ajudar a melhorar a vida dos cidadãos. Para a edição de 2009, o tema escolhido pela organização do concurso reflecte a preocupação mundial com uma questão muito particular: “Resolver os problemas mais difíceis do mundo”. MAIS INFORMAÇÕES: http://www.imaginecup.com 30 DE OUTUBRO CONFERÊNCIA SOBRE ESTUDOS DE ARQUITECTURA POPULAR E ATRIBUIÇÃO DO PRÉMIO MARQUES DA SILVA Auditório Fernando Távora, FAUP, 18h30. - Conferência Arquitecto Marques da Silva, às 18h30, sob o tema “Arquitectos, Engenheiros, Antropólogos: Estudos sobre Arquitectura Popular no Século XX Português”, por João Leal, professor associado com agregação no Departamento de Antropologia da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Nova de Lisboa e investigador do CRIA-Centro em Rede de Investigação em Antropologia. - Entrega do Prémio Arquitecto Marques da Silva, às 19h30, relativo ao biénio 2005-2007, a Nuno Miguel Martins Travasso (na foto). O Prémio Arquitecto Marques da Silva é entregue ao melhor aluno de Arquitectura na Faculdade de Arquitectura da U.Porto, no biénio que terminou. PROMOÇÃO: Instituto Marques da Silva, Universidade do Porto. 3 E 4 DE NOVEMBRO FMUP DISPONIBILIZA VACINA CONTRA GRIPE A ESTUDANTES, FUNCIONÁRIOS E DOCENTES Faculdade de Medicina da U.Porto: Salão de Alunos (videoteca, piso 1), para estudantes, e Serviço de Higiene e Epidemiologia, para docentes e funcionários, das 8h30 às 16h30. No âmbito do Plano de Contingência Contra a Gripe, promovida pela FMUP em parceria com o Hospital São João. A administração da vacina contra a gripe está indicada como meio de prevenção para os profissionais dos serviços de saúde. Consequentemente, é recomendável que todos os que trabalham em ambiente hospitalar adiram a esta directriz preventiva. 4 DE OUTUBRO WORKSHOP “NARIZ VERMELHO” Departamento de Medicina. Promovido pela Associação de Estudantes do Instituto de Ciêncinas Biomédicas Abel Salazar. INSCRIÇÕES (limitadas e com caução de 5€): Para alunos com o cartão AEICBAS/BPI: 27 e 28 Out. Para alunos sem o cartão: 29, 30 e 31 Out. MAIS INFORMAÇÕES: http://aeicbas.blogspot.com/ ATÉ 7 DE NOVEMBRO HOMENAGEM A UMA FIGURA EMINENTE DA U.PORTO: EMÍLIO PERES (1932-2003) - “Ementas Emílio Peres”, iniciativa em parceria com restaurantes localizados na zona do Jardim da Cordoaria: “Porto e Vírgula” (Campo dos Mártires da Pátria, 51), “Chic Dream” (Campo dos Mártires da Pátria, 64) e “Irene Jardim” (Praça Parada Leitão, 17); - Exposições “Olhares”, no átrio da Reitoria da U.Porto, e “A Paixão pela Faiança”, na Fundação Maria Isabel Guerra Junqueiro e Luís de Mesquita Carvalho (Rua de D. Hugo, nº15, Porto); - 7 de Novembro, às 17h30: Lançamento do livro de homenagem a Emílio Peres, com intervenções de: Maria Daniel Vaz de Almeida; Helena Ávila; João Madureira; Hélder Pacheco; José Pedro Lima Reis e Sérgio Vinagre.

E-LEARNING CAFÉ (agenda de eventos programados, porque o inesperado é sempre possível no e-learning café)

13 A 15 DE NOVEMBRO FEP JUNIOR CONSULTING NA FEIRA DO EMPREENDEDOR Centro de Congressos da Alfândega do Porto. A FEP Junior Consulting, júnior empresa sedeada na Faculdade de Economia da Universidade do Porto, vai participar pelo sétimo ano consecutivo na Feira do Empreendedor, um evento organizada pela ANJE - Associação Nacional de Jovens Empresários, de 13 a 15 de Novembro de 2008, no Centro de Congressos da Alfândega do Porto. A FJC é o parceiro oficial deste evento que assume a designação de Academia dos Empreendedores. Uma marca de âmbito nacional, lançada em 1997, promovida pela ANJE, com o apoio do Instituto de Emprego e Formação Profissional, que pretende mobilizar os jovens portugueses para a necessidade de desenvolvimento de uma nova consciência empreendedora. A edição deste ano, a 11ª, tem como tema principal a “VONTADE DE VENCER”. O conceito desta feira tem por base a reunião num mesmo espaço físico, de um conjunto de produtos/serviços, formação e informação de apoio a empreendedores com condições especiais exclusivas, entre eles: - Empreendedores por conta própria - que pretendam iniciar; ampliar; actualizar; internacionalizar e promover os seus negócios; ou ainda aceder a todo um conjunto de potenciais parceiros, produtos e serviços em condições especiais feira; - PME´s - Que procuram e oferecem soluções ao nível: financeiro; recursos humanos; marketing e publicidade, tecnologias da comunicação e informação, consultadoria e formação, saúde e lazer, entre outras; - Empreendedores e trabalhadores por conta de outrem - que pretendam aceder a todo um conjunto de ferramentas indispensáveis para melhorar o seu desempenho; - Franchising - Que oferecem ou procuram soluções ao nível do: fornecimento de oportunidades de negócios devidamente testados; - Jovens à procura do 1º emprego ou desempregados; - Estudantes do Ensino Superior e Profissional e Secundário com mais de 17 anos; - Consumidores em Geral que pretendam aceder a produtos/serviços de elevada qualidade a preços especiais exclusivos feira do empreendedor. MAIS INFORMAÇÕES: www.anje.pt/feira. 15 DE NOVEMBRO WORKSHOP “MÁQUINAS DIGITAIS – 2ª FASE” No edifício da Reitoria, Praça Gomes Teixeira. Para quem frequentou workshops anteriores. Os interessados poderão inscrever-se junto de Ana Martins, pelo telefone 220 408 193 ou pelo e-mail anamartins@reit.up.pt. MAIS INFORMAÇÕES: http://sigarra.up.pt/reitoria/noticias_geral.ver_noticia?p_nr=590 19 DE NOVEMBRO “LONG-TERM COGNITIVE AND AFFECTIVE IMPACT OF THE TECHNOLOGY ENABLED ACTIVE LEARNING (TEAL) STUDIO PHYSICS FORMAT ON LEARNING OUTCOMES OF MIT STUDENTS” Na sala B026 da FEUP, 14h30. A sessão contará com a presença da professora Judy Dori, investigadora principal do projecto TEAL Studio Physics, que apresentará o seminário “Long-term cognitive and affective impact of the Technology Enabled Active Learning (TEAL) studio physics format on learning outcomes of MIT students”. MAIS INFORMAÇÕES: formint@fe.up.pt. 12 DE DEZEMBRO DIA DA FACULDADE DE DIREITO DA U.PORTO Sessão Solene, com início às 14.30 h, no Salão Nobre da Faculdade de Direito da U.Porto. ATÉ 31 DE DEZEMBRO CANDIDATURAS AO PRÉMIO JOE BARBOSA Atribuído ao melhor trabalho de investigação na área da protecção ambiental e no valor de 1000 euros. DESTINATÁRIOS: Investigadores da U.Porto (isoladamente ou em colaboração com equipas de investigação externas à Universidade) com projectos que contaram com a participação de estudantes ou investigadores com idade não superior a trinta anos. MAIS INFORMAÇÕES: http://sigarra.up.pt/up/noticias_geral.ver_noticia?P_NR=5346 ATÉ 31 DE DEZEMBRO I MOSTRA DE SEMIÓTICA DA COMUNICAÇÃO - “A PROMOÇÃO DA CIDADE DO PORTO ENQUANTO DESTINO TURÍSTICO” A mostra decorre, inicialmente, num website onde se podem ver os trabalhos dos grupos seleccionados. É a primeira do género e nasce de uma iniciativa do curso de Ciências da Comunicação da Universidade do Porto, com o intuito de divulgar os trabalhos feitos no âmbito da disciplina de Semiótica da Comunicação, leccionada no 2º ano. A iniciativa está associada ao Festival UFRAME que decorreu em Outubro. MAIS INFORMAÇÕES: http://www.icicom.up.pt/Imostrasemiotica.com/,comissao.executiva.semcom@gmail.com

A PARTIR DE NOVEMBRO TERÇAS-FEIRAS, 22 HORAS LÍNGUA CAFÉ Aulas de línguas organizadas pelos estudantes de ESN. Curso de línguas informal, organizado pela ESN-Porto e que consiste na realização de aulas no e-Learning Café, onde cada participante vai aprender e/ou ensinar uma língua. NOVEMBRO E DEZEMBRO EXPOSIÇÃO – ILUSTRAÇÃO DE LIVROS INFANTIS, POR RAQUEL LEITÃO Com o apoio da Editora Civilização, que lançará em breve uma obra com textos de Luísa Ducla Soares e ilustrações de Raquel Leitão. DIA 20 DE NOVEMBRO, ÀS 21h30 CONCERTO E CONVERSA SOBRE A EVOLUÇÃO E NOMES GRANDES DO JAZZ. O jazz, desde as suas origens no ragtime e no blues até ao estilo de fusão jazz-rock eléctrico do final dos anos 60, tem sido uma forma de arte evolutiva. Cada período estilístico contou com músicos inovadores e compositores criativos que transformaram a expressão musical. Novas técnicas instrumentais e sistemas de composição e de arranjo foram constantemente desenvolvidos de forma a dar resposta à necessidade de se ouvir algo fresco, exigente e vital. Esta conferência musical multimédia dividir-se-á em duas partes, apresentando uma perspectiva cronológica da evolução do jazz americano e colocando em destaque os músicos inovadores de cada período estilístico. Michael Lauren Colectivo: António Aguiar – contrabaixo, Hugo Alves – trompete, Lars Arens – trombone, Fernando Bouzon - saxofones, Sérgio Carolino – tuba e trombone baixo, Kiko – canto, Ricardo Matosinhos – trompa, Mário Marques – saxofones, Telmo Marques – piano, José Luís Rego – saxofone /clarinete, Rogério Ribeiro – trompete, Gileno Santos – trompete, Mário Santos – saxofones, Ruben Santos – trombone, Aires Silva – banjo/guitarra, Michael Lauren – bateria/direcção artística 21 DE NOVEMBRO, 21H30 BANSURICOLLECTIF O Bansuri é uma flauta indiana tocada desde tempos ancestrais. Nessa época, os homens improvisavam sons inspirados na natureza. Este colectivo de improvisadores formou-se à volta desses princípios: improvisar sons que procuram o ser, em oposição à complexidade social. Um quarteto de jazz e um bailarino apaixonado pela improvisação formam um colectivo de improvisadores em constante criação e procura. Colectivo: Lander Van Den Noortgate – Saxofone Alto, Frederik Meulyzer - Bateria, Koenraad Ecker – Guitarra, Rui Salgado – Contrabaixo e Composição, Yvan Bertrem - Performer


JUP NOVEMBRO ‘08 U.PORTO

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À PROCURA DE NOVAS FÓRMULAS PARA MEDIR INSUCESSO NO ENSINO SUPERIOR JC/REIT

O debate “O Sucesso e o Abandono Escolar no Ensino Superior” tornou clara a urgência em encontrar indicadores eficazes do sucesso no Ensino Superior. A questão é complexa e implica um conjunto articulado de aspectos. Entre outros factores, a nota de acesso parece estar relacionada com o sucesso, assim como as relações sociais e as questões emocionais. A “survival rate”, termo inglês para “taxa de sobrevivência”, assim mesmo, com esta quase despropositada carga dramática, é o indicador internacionalmente usado para medir a taxa de (in)sucesso no Ensino Superior. No caso dos estudos de Ensino Superior, a “taxa de sobrevivência” traduz a relação entre o número de diplomados de um determinado curso de ensino superior e o número de estudantes que entra nesse mesmo curso, recuando no tempo um período correspondente ao número de anos lectivos desse curso. Ou seja, relacionam-se directamente dois valores que não correspondem aos mesmos estudantes e que pouco tem a ver um com o ouro. Pois bem, no debate organizado pela Reitoria da U.Porto que decorreu no passado dia 16 de Outubro, intitulado “O Sucesso e o Abandono Escolar no Ensino Superior”, no edifício das Matemáticas da Faculdade de Ciências da U.Porto, moderado por António Magalhães (FPCEUP e CIPES), ficou bem patente quão polémico é o uso exclusivo deste indicador, entre os estudiosos das questões do Ensino Superior e, nomeadamente, na opinião dos autores dos dois estudos apresentados. Unânime também, pelo menos de acordo com as opiniões expressas no debate, parece ser a necessidade de encontrar um conjunto de indicadores que traduza mais fielmente a complexidade da questão. Não por acaso, recentemente o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas pediu ao Governo para excluir esse indicador da fórmula de financiamento das universidades. “A ‘taxa de sobrevivência’ é um indicador que não mede o que se propõe medir”, lamentava Hernâni Veloso Neto, um dos investigadores de “Os Estudantes e os seus Trajectos no Ensino Superior: Sucesso e Insucesso, Factores e Processos, Promoção de Boas Práticas”, estudo coordenado por António Firmino da Costa e João Teixeira Lopes, e desenvolvido pelo ISFLUP (Instituto de Sociologia da Faculdade de Letras da U.Porto) e pelo CIES do ISCTE. O indicador omite o que acontece aos estudantes entre a entrada no curso e o diploma: por exemplo, os que mudam de curso dentro da

mesma instituição de ensino superior, ou os que mudam de instituição, em muitos casos, devido a factores que não dependem dessa instituição. Há estudantes que entram num determinado curso, logo com a intenção de transitar para outro no ano ou anos subsequentes. Outro fenómeno conhecido e que contribui para uma menor “survival rate” é a entrada “prematura” no mercado de trabalho, em muitos casos por iniciativa das empresas e ainda antes da conclusão do curso, e que deve ser visto como um factor positivo e não o contrário.

A importância da família e amigos

Do estudo nacional em que participou o ISFLUP (com o CIES – Centro de Investigação e Estudos de Sociologia), e para apresentação nesta sessão, foram particularizados aspectos como a proposta de um novo sistema de indicadores de sucesso e outros mais directamente relacionados com a U.Porto. João Teixeira Lopes, investigador e professor da FLUP, destaca a dificuldade e o risco de isolar factores de influência no sucesso ao longo do percurso do estudante e a necessidade de o acompanhar, e adaptar o ensino, tanto quanto possível, às suas necessidades, porque cada caso é um caso. “É preciso tratar diferente o que é diferente para conseguir oportunidades iguais para todos!”, alerta. O coordenador (com António Firmino da Costa) do estudo refere que um dos aspectos da investigação que mais surpreende é a importância das relações sociais que o estudante estabelece e do seu grupo de amigos, para o seu sucesso escolar. Do estudo realça ainda a influência das questões afectivas, concretamente episódios de desestruturação familiar e ruptura afectiva. Por outro lado, José Manuel Mendes, da FEUC-CES (com a participação de investigadores da mesma instituição, do CIES-ISCTE e do ISEG), coordenador de “Factores de Sucesso e Abandono Escolar no Ensino Superior em Portugal”, que estuda factores de sucesso no percurso estudantil em três instituições, Universidade Técnica de Lisboa,

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BREVES

OM/SASUP

Nos próximos 4 anos, a Universidade do Porto, em parceria com a empresa Ideia Biba vai distribuir 4.000 bicicletas à sua comunidade de estudantes, incluindo os de mobilidade, funcionários e professores. Segundo as previsões, pelo menos um quarto deste número deverá ser atingido até ao final deste ano lectivo. Este projecto tem como objectivo aumentar o uso deste meio transporte por parte dos estudantes, funcionários e docentes da U.Porto, promovendo a preservação ambiental e os hábitos de vida saudáveis. Todos os interessados em adquirir uma BUTE – Bicicletas de utilização estudantil – deverão candidatar-se através do preenchimento de um formulário disponível em www. sas.up.pt que deverá ser envidado para bute@ sas.up.pt até 30 de Novembro. A U.Porto fará a entrega das primeiras 500 BUTE durante o mês de Dezembro e as restantes serão distribuídas em acções a anunciar. As necessidades individuais de entrega evidenciadas na ficha de inscrição serão tidas em conta. A listagem de todos os candidatos será colocada em www.sas.up.pt. A distribuição das BUTE será realizada mediante a assinatura de um contrato celebrado entre o candidato, a U.Porto e a Ideia Biba. A aquisição desta bicicleta pressupõe algumas regras a serem impreterivelmente cumpridas sob pena de anulação do contrato. Por exemplo, o equipamento não pode ficar retido mais de 72 horas consecutivas, é proibido o transporte de mercadorias e passageiros em troca de pagamento, não é permitida a participação em corridas nem guiar embriagado. Todos os danos provocados na bicicleta terão de ser reparados pela Ideia Biba, existindo uma

U. Porto

ISCTE e Universidade de Coimbra, destaca, entre outros: o peso da média de acesso como factor relacionado com a taxa de (in)sucesso, assim como a colocação em primeira opção, a motivação para o curso e as condições sócio-económicas. O Reitor da Universidade do Porto, presença atenta no debate, interveio no final para sublinhar a necessidade de analisar, com a ajuda destes e de outros estudos, o que corre menos bem em termos de sucesso no percurso estudantil para, depois, avançar com medidas de correcção. Perante as exigências de sucesso que se colocam hoje às universidades, José Marques dos Santos, defendeu a necessidade de criar mecanismos que permitam às universidades escolher os seus candidatos.

tabela de preços que inclui cada uma das suas componentes. O regulamento pode ser integralmente consultado no sítio dos Serviços de Acção Social da Universidade do Porto (SASUP).

U. Porto

O preço social da refeição nas cantinas dos SASUP aumentou para os 2,15 euros (aumento de 0,15 euros). Por deliberação do Ministério da Ciência e Ensino Superior, o preço mínimo da refeição social a ser praticado pelos Serviços de acção Social das instituições de Ensino Superior é equivalente a 0.05% do valor do salário mínimo em vigor, prevendo-se a sua actualização no início de cada ano lectivo. O preço social da refeição nas 9 cantinas sob a alçada dos Serviços da Acção Social da Universidade do Porto (SASUP) acompanha, portanto, a evolução do rendimento mínimo. Este ano, o valor calculado através da fórmula 0.05% x salário mínimo em vigor é de 2,13 euros, sendo dada a liberdade às instituições de fixar o seu preço acima deste, tendo em consideração os diversos factores da respectiva estrutura de custos. No caso dos SASUP, o Conselho da Acção Social decidiu arredondar para a unidade monetária mais corrente, fixando o preço a praticar em 2.15 euros. O custo unitário médio por refeição servida nas cantinas dos SASUP foi no ano transacto de 3.81 euros, o que significa que, por cada refeição servida, os Serviços da Acção Social suportam o encargo adicional de 1.66 euros.

A U.Porto vai em busca do Tri nos Jogos Galaico-Durienses, na Universidade do Minho dias 18, 19 e 20 de Novembro. A delegação de atletas da U.Porto que será composta, este ano, por 52 elementos, e tentará um feito inédito, ser tri-campeã. Esta competição contempla várias modalidades tais como: o Badminton, o Jucata (junção de Judo, Karaté e Taekwondo), Ténis de Mesa, Xadrez, Basquetebol misto, Futsal para ambos os sexos e Voleibol misto. Para integrar esta delegação vencedora é necessário frequentar as modalidades dinamizadas pelo Gabinete de Actividades Desportivas da Universidade do Porto (GADUP).


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COMPLEXOS ARTÍSTICOS NOVEMBRO´08 JUP

COMPLEXOS ARTÍSTICOS

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JUP NOVEMBRO ‘08 COMPLEXOS ARTÍSTICOS

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4 1 Manuel Ribeiro 2 José Ferreira 3 Marco Paskin 4 Marco Paskin

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ECONOMIA NOVEMBRO´08 JUP

ECONOMIA O INSISTENTE PERCURSO DA CRISE FINANCEIRA

Tiago Pereira

A falência do Lehman Brothers, o quarto maior banco de investimento dos Estados Unidos, e a agonia do AIG (American International Group), o maior segurador mundial, reforçaram os receios dos especialistas, alarmaram os mercados, instalaram a desconfiança e marcaram o rumo da crise financeira, que endureceu na segunda quinzena de Setembro e acalmou com as enérgicas intervenções estatais.

Após o plano norte-americano, veio o plano europeu. Numa acção concertada entre os chefes de Estado dos países da União Europeia, tomaram-se as medidas que os mercados ansiavam, tal foi a subida das bolsas e a descida da EURIBOR, taxa a que os bancos da Zona Euro emprestam dinheiro entre si. Inspirados pelo primeiro-ministro inglês, Gordon Brown, os países europeus acordaram intervir nos bancos que fraquejassem, recapitalizando-os, via injecções de liquidez, ou tomando participações accionistas, num cenário de nacionalização parcial. O próprio governo português disponibilizou um plano de garantia de 20 mil milhões de euros. Porém, não obstante a aceitação deste plano nos mercados, importa estar atento aos impactos no futuro. De acordo com os economistas, a crise, que afecta sobretudo os bancos, terá impactos na economia real. Afectará empresas e particulares, porque ambos terão maiores dificuldades de financiamento. A escassez de liquidez implicará o pagamento de juros maiores, ainda que se preveja a descida das taxas depois das medidas anunciadas. E, havendo empresas a passar por problemas, uma das formas mais simples de conter custos é despedir trabalhadores.

E a banca portuguesa, está segura? Após o fundo de garantia disponibilizado pelo governo português, sem dúvida. Os bancos gravemente atingidos são, pela sua natureza, os hipotecários e os de investimento. Os bancos hipotecários têm como principal actividade a concessão de crédito à habitação. Se esses créditos se tornam incobráveis, os bancos ficam com as habitações, daí o nome hipotecário, mas não as conseguem vender em virtude da estagnação do mercado da habitação. E assim não conseguem os fundos de que necessitam. Os bancos de investimento concedem crédito às empresas para que estas possam desenvolver a sua actividade e desenvolvem produtos financeiros estruturados, como fundos de investimento, que vendem a outros bancos. Estes produtos são aplicações financeiras, de espécie e risco diversos, e que oferecem uma dada rentabilidade. No fundo, são títulos cuja performance depende do comportamento de várias variáveis, tais como o desempenho de alguns índices bolsistas e a cotação das matérias-primas nos mercados internacionais. Com a crise, a volatilidade dos rendimentos daqui provenientes cresceu e os clientes começaram a desinvestir destes produtos, contribuindo para a descapitalização destes bancos.

Sara Araújo /José Ferreira

Decretar o fim de uma crise ou, noutras palavras, o início de uma retoma, não é um exercício simples, nem deve ser levianamente executado. No princípio, era só a exposição ao crédito subprime a penalizar os resultados da banca. Entretanto, com a evolução da situação, começou a pairar o espectro da falência sobre algumas instituições. Indicando alguns casos anteriores, os britânicos nacionalizaram o Northern Rock e o americano Bear Stearns foi adquirido pelo JP Morgan, numa operação abençoada pelo governo norte-americano, que também foi chamado a intervir nos bancos hipotecários Fannie Mae e Freddie Mac. No mesmo dia em que a Universidade do Porto despertava para mais um ano lectivo, o mundo acordava para a primeira grande falência da crise financeira. Até aí, as autoridades centrais tinham salvo todos os bancos, nacionalizando, injectando liquidez ou patrocinando a sua compra por outras instituições. O objectivo era salvaguardar a segurança e a saúde da economia e do sistema financeiro. Deixar falir criaria desemprego, destruiria as poupanças dos clientes, geraria ainda mais instabilidade e colocaria o mundo em profunda depressão, pelas múltiplas relações que se processam, internacionalmente, entre os bancos em causa e as demais instituições financeiras e não financeiras. Ora, o tesouro nacional não tem verbas suficientes para acudir todos os enfermos. Nem, de acordo com os peritos, deve fazer disso uma regra. Tal potenciaria aquilo a que se chama risco moral, isto é, perante a certeza de que os governos interviriam, os visados não teriam qualquer interesse em fazer os seus melhores esforços para evitar males maiores, porque haveria sempre um escudo protector. Além disso, na falência do Lehman houve claramente um problema de escolha. Para poder intervir no terceiro maior banco de investimento norte-americano, o Merrill Lynch, deixou-se morrer o quarto. Os dois maiores bancos de investimento dos EUA, o Goldman Sachs e o Morgan Stanley, também eles penalizados, nos resultados e nos mercados accionistas, transformaram-se em bancos comerciais. Todos estes problemas, geograficamente localizados nos EUA, despoletaram a reacção BushPaulson, que assumiu a forma de um plano bastante criticado, mas que se impunha. Algo teria que ser feito para mitigar os efeitos da turbulência, evitar uma recessão e devolver a confiança. Todavia, as dúvidas em torno do plano Paulson, o seu chumbo inicial no congresso norte-americano e as suas sucessivas revisões transmitiram insegurança aos agentes económicos.

Descapitalizados e sem liquidez, os bancos não conseguem satisfazer os seus compromissos de curto prazo, o que, num ambiente de crescente pânico, redunda em problemas mais graves que podem conduzir à falência, levando à intervenção das entidades públicas. Além disso, o acesso ao crédito no mercado monetário interbancário, fonte privilegiada de financiamento de bancos hipotecários e de investimento, complicou-se com o decorrer da crise e o consequente aumento das taxas de juro. A grande diferença entre esses bancos e a banca tradicional reside na capacidade para receber depósitos. Em Portugal, apenas existe banca tradicional, a de retalho ou comercial, que não tem problemas de liquidez, porque recebe muitos depósitos e é muito mais regulada e supervisionada. Os mais atentos retorquirão que,

só para exemplificar, existe um CaixaBI – Banco de Investimento ou um Millennium Investment Banking, mas estes organismos não são totalmente autónomos. Estão integrados nas estruturas dos respectivos bancos e, por isso, protegidos. Têm como funções, muito genericamente, a gestão de activos financeiros, como carteiras de acções ou fundos de investimento, e o desenvolvimento de actividades de project-finance, ou seja, financiamento de projectos de investimento, bem como outras actividades de suporte às empresas, como dispersão de acções em bolsa. O negócio da banca está, desde a sua génese, assente na confiança. E confiança é a palavra-chave. Entrar em alarmismos e correr, em massa, aos bancos para levantar as poupanças é suicida. Tal atitude só iria precipitar o fim do sistema.

Há que esperar a sua regeneração e não enterrá-lo de vez. As consequências, aí sim, seriam nefastas. Há que acreditar no sistema porque ele é de um equilíbrio notável. Vejamos: o clima de tensão actual está a obrigar os indivíduos a refrearem o seu consumo e a pouparem mais, o que é saudável, porque a poupança gera investimento. Com a queda do consumo e da procura, o preço das matérias-primas, depois de ter batido recordes, está a descer. Hoje, o preço do barril de petróleo é bastante menor e, consequentemente, os preços dos combustíveis estão mais baixos. Futuramente, quando a confiança voltar em definitivo e, com ela, o consumo em força, o preço da energia voltará a subir. A economia-mundo é um sistema interdependente que vive de impulsos e mecanismos de transmissão.


JUP NOVEMBRO ‘08 ECONOMIA

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Cronologia da Crise Julho de 2007 - Primeiros sinais da crise do subprime

Março 2008 - Bear Stearns comprado pelo JP Morgan

Agosto de 2007 - Começam as injecções de liquidez, por parte do Banco Central Europeu e da Reserva Federal dos EUA, no sistema financeiro

Julho 2008 - Abbey adquire o britânico Alliance & Leicester

Setembro de 2007 - As enormes filas de clientes à porta do Northern Rock aceleram o banco para o abismo Outubro de 2007 - Citigroup e UBS revelam perdas com o subprime - Presidentes do Merrill Lynch e do Citigroup pedem a demissão Fevereiro 2008 - Northern Rock nacionalizado pelo governo britânico

Agosto 2008 - Banco Central da Dinamarca compra o Roksilde em parceria com 100 outras instituições Setembro 2008 - Fannie Mae e Freddie Mac nacionalizados pelo governo norte-americano - Falência do Lehman Brothers - Merrill Lynch comprado pelo Bank of America - Reseva Federal dos EUA salva o AIG, injectando-lhe 85 mil milhões de dólares. - Goldman Sachs e Morgan Stanley convertem-se em bancos comerciais - Falência do Washington Mutual

ADAM SMITH

Rui Vilas

- Abbey compra o Bradford & Bingley - Governo alemão intervém no Hypo Real Estate - Governos do Benelux nacionalizam o Fortis e o Dexia - EUA lançam o plano Paulson Outubro 2008 - Islândia entra em bancarrota - Bancos centrais descem as taxas de juro - Estados europeus aprovam plano contra a crise Nota: De todos estes, apenas o Washington Mutual era um banco comercial. Foi a maior falência bancária de sempre. Detinha depósitos no valor de 188 mil milhões de dólares. Apesar dos problemas por que passava, foi a avidez dos clientes no levantamento dos depósitos que descapitalizou o banco e determinou a sua falência. Este exemplo é ilustrativo de que é fundamental manter a calma nestas situações e deixar o sistema reabilitar-se.

ECONOPEDIA

Tiago Pereira

Apesar de ter vivido há mais de dois séculos, Adam Smith deixou-nos uma obra francamente actual. Pioneiro da escola clássica, ainda hoje as suas

A partir desta edição, o JUP, reforçando a vertente académica que lhe está no ADN e no

teorias são alvo de estudo e de desenvolvimento científico por parte de vários

próprio nome, terá, nesta secção de Economia, um pequeno espaço dedicado à explicação

economistas.

de termos técnicos com que o português comum se confronta no seu quotidiano. partes, a primeira refere-se às “Causas de Melhoramento” (Trabalho, Preço, Renda, etc.), a segunda intitula-se “Natureza, acumulação e utilização de capital”, a terceira incide sobre crescimento e desenvolvimento económico, a quarta é reservada à Política Económica, e a última discute as Funções do Estado. Nesta obra, Adam Smith foi buscar o conceito de mão invisível à sua “Teoria dos Sentimentos Morais”, aplicando-o para defender a organização em mercado livre. Esta metáfora exprime a ideia que, se todos os membros procurarem, individualmente, maximizar o seu bem-estar, a comunidade estará também a maximizar o seu bem-estar. Se, por um lado, estudar Economia nos dias de hoje envolve conhecimentos bastante mais aprofundados sobre um leque de matérias bastante heterogéneo, por outro, não convém perder a noção que a Economia estuda o bem-estar das pessoas, procurando matematizá-lo de forma a ganhar consistência científica. Daí todos os números, modelos e estatísticas. Existe uma relação muito forte entre riqueza e felicidade e a preocupação da Economia é maximizar ambas.

DR

Aquele que é considerado o pai da Economia nasceu em 1723, na Escócia. Estudou Filosofia na Universidade de Glasgow e, três anos mais tarde, em Oxford, para onde ganhou uma bolsa. Ingressou na carreira académica, primeiro em Edimburgo, e, depois, em Glasgow. Em Edimburgo, conheceu David Hume, uma das suas grandes referências e de quem se tornou amigo pessoal. Publicou “A Teoria dos Sentimentos Morais” em 1759. Após uma proposta altamente lucrativa, abandonou o ensino para ser tutor privado do Duque Henry Scott durante dois anos, acompanhandoo numa viagem pela Europa. Tal permitiu-lhe conhecer proeminentes figuras da época como Benjamin Franklin e François Quesnay. Após esse serviço, voltou para casa, onde escreveu “A Riqueza das Nações”, publicado em 1776. Uma obra de sucesso instantâneo que lhe mereceu enorme reconhecimento. Adam Smith faleceu em 1790, gozando, à data, do estatuto de Reitor Honorário da Universidade de Glasgow. Tendo escrito várias obras, Adam Smith é principalmente reconhecido pelas duas anteriormente referidas: “A Teoria dos Sentimentos Morais” e “Uma Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações”, conhecida simplesmente como “A Riqueza das Nações”. “A Teoria dos Sentimentos Morais” insere-se na Filosofia Moral, um tema muito debatido na altura. Neste ramo, em traços largos, procura-se apurar as causas do sentido da ética, isto é, o que nos faz considerar algo como bom ou mau, como correcto ou incorrecto. Adam Smith defende que a moralidade é algo da nossa natureza e não da nossa razão. Logo no primeira frase, Adam Smith refere que, por muito egoísta que um Homem seja, existem certos princípios na sua natureza que lhe despertam interesse na felicidade e sucesso dos outros, apesar de nada obter disso, que não o prazer de “a ver”. Esses princípios são devidamente definidos ao longo da obra, assim como as situações em que se aplicam. De referir que é nesta obra que, pela primeira vez, é referido o conceito de mão invisível, repetido mais tarde e com maior relevo n’ “A Riqueza das Nações”. “A Riqueza das Nações”, sua obra mais conhecida pelos que estudam Economia, descreve com uma minúcia exemplar grande parte dos mecanismos que se podem observar na sociedade. Dividida em cinco

Motivados pela crise financeira, escolhemos para este mês a palavra “liquidez”.

liquidez, s.f. 1. qualidade ou estado daquilo que é líquido; 2. propriedade de um activo financeiro. In “Dicionário Ilustrado da Língua Portuguesa”, Porto Editora.

O termo “liquidez” exprime a velocidade ou a facilidade com que um activo pode ser transformado, a um preço justo, em moeda ou meio de pagamento. Um activo é tanto mais líquido quanto mais fácil for de transformar em moeda. Por isso se diz que a moeda é a própria liquidez. Dizer que os bancos necessitam de liquidez é dizer que precisam de dinheiro. Estranho, dirão. Então os bancos recebem tanto dinheiro e não têm dinheiro? O dinheiro que se deposita, apesar de nosso, não está sempre ao nosso alcance. É utilizado para conceder crédito, realizar investimento e constituir reservas. Existem vários tipos de reservas. Contudo, para simplificar, assumamos que existem dois: as reservas legais, que resultam da aplicação de uma taxa, fixada pelo Banco Central, sobre o montante de depósitos captado, e as livres, que são constituídas de acordo com a vontade do próprio banco. As reservas, sobretudo as legais, têm subjacente a ideia de segurança. Uma instituição carente de liquidez não é necessariamente uma instituição condenada à falência. O problema de liquidez é um problema de curto prazo. Uma sociedade pode ser extremamente rica em outros activos, mas não ter dinheiro para satisfazer as suas necessidades imediatas. Contudo, se as situações se extremarem, os problemas de liquidez poderão conduzir à falência. É o caso típico dos bancos que recebem enormes filas de depositantes tentando resgatar os seus depósitos. O que lhes falta, num primeiro momento, é liquidez. Pelo que já foi explicado acima, os bancos não têm todo o nosso dinheiro, a todo o momento. O que é natural, faz parte do seu mecanismo de funcionamento. No entanto, face à pressão das

pessoas, os bancos acabam por conseguir essa liquidez através da venda ao desbarato dos activos que possuem, ou endividando-se mais do que permite a sua capacidade. Assim, satisfazem alguns depositantes, mas, no fim do processo, ficam sem liquidez e sem activos, mas com muitos passivos, de que os depósitos são um exemplo. Tornam-se insolventes e aí é impossível levantar os depósitos. As pessoas perdem o seu dinheiro. Se, atempadamente e sem pressões dos clientes, os bancos, numa estratégia racional, venderem os activos que querem alienar, a preço justo, alcançam toda a liquidez que necessitam. É a estratégia que está a ser seguida, neste momento, pelo BPN. Está a vender alguns dos seus activos, como a seguradora Real, para arrumar a casa. E não só o BPN, a generalidade da banca portuguesa anda a abastecer-se de liquidez há já algum tempo, numa atitude prudente e que lhe tem permitido ultrapassar bem esta crise. Millennium bcp, BPI e Banif fizeram, recentemente, operações de aumento de capital. A CGD emitiu obrigações. O activo mais líquido é a moeda, as notas e as moedas que passam diariamente pelas nossas mãos. No entanto, os depósitos à ordem são também muito líquidos, sendo substitutos perfeitos da moeda. Outros activos, como os depósitos a prazo, são designados de quase moeda, porque, apesar de não tão líquidos, é de relativa facilidade a sua transformação em moeda. Títulos com maturidades ou prazos muito elevados são já pouco líquidos. Por exemplo, aquelas aplicações financeiras que obrigam à imobilização do capital durante vários anos são de difícil transformação em liquidez.


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CULTURA NOVEMBRO´08 JUP

CULTURA

START! NO STOP.

Filipa Mora

Aconteceu no espaço do Centro Comercial Stop, cada vez mais (re)utilizado como lugar de ensaio para vários projectos portugueses e menos como plataforma urbana comercial, o START! Uma iniciativa integrada no festival Future Places, organizado pelo Programa UTAustin|Portugal e, cujo objectivo é demonstrar o potencial dos media digitais a nível local. START - o início da reciclagem e reutilização O “ensaio massivo” aberto ao público reuniu vários projectos que utilizam e mantêm vivo os três pisos do centro comercial. Num final de tarde de sexta-feira onde compareceram, pelo menos, 70 dos 100 que aí ensaiam frequentemente, pretendeu dar-se uma voz colectiva ao quase esquecido, pelo público geral, Stop. Há muito que o espaço deixou de funcionar maioritariamente como plataforma comercial e (ce)deu lugar a várias bandas para os respectivos ensaios. Com ensaio marcado para as 18h e alinhamento devidamente definido e distribuído tanto pelo tempo disponível (1h) como pelos 3 pisos, houve espaço para uma mini jam, acústicos comandados por sms, solistas espalhados pelos corredores, vozes em improviso e minutos dedicados ao hino de Elgaland Vargaland (http://www.elgaland-vargaland.org/). Cada projecto no seu espaço ou espalhados pelo espaço do Stop. De piso para piso, as sonoridades diferiam assim como a própria utilização do local. Umas salas de ensaio mais confortáveis, outras menos, umas com uma parafernália musical maior, outras com apenas 2 CD Jotas; em tudo diferem menos no sentimento comum de empenho e dedicação em reutilizar o abandonado espaço. A heterogeneidade sonora para lá das portas, aberta durante 1h ao público, uniu-se num esforço de reciclagem e da criatividade. Aconteceu das 18h às 19h de 10 de Outubro no CCStop e contou com a colaboração dos vários músicos e presença de

curiosos, uns mais conhecidos que outros. Artur Pimenta Alves, frequentemente associado a projectos da Universidade do Porto, circulava com ar interessado pelas várias salas onde disse encontrar “um mundo completamente escondido no C.C.Stop “. A opinião é unânime: estas iniciativas são necessárias e imprescindíveis para a conservação do local. “É bom para o centro e para toda a gente, isto dá vida ao local que está quase sem ninguém.” , comenta Horácio Reigada, segurança há já 14 anos do adormecido centro comercial. Já Rui Couto, membro de uma das bandas incluída no START, considera a iniciativa um “elogio à criatividade, onde a música gerada pela música cria todo um ambiente e um momento único comum da criação individual de cada um.” Já passava das 19h15 quando Heitor Alvelos, um dos curadores do Future Places, agradeceu vivamente a todos aqueles que contribuíram para a fénix renascida do C.C.Stop.

STOP – o fim de um centro comercial Centro comercial que, se antes significava um problema, surge agora como solução para a falta de local de ensaio para vários músicos. Solução paga, evidentemente, por uma “módica” renda mensal de cerca de 200€ (variando consoante tamanho e localização da loja arrendada como “estúdio” para ensaios). Cada

José Ferreira

grupo é responsável pelo espaço que é “seu” por arrendamento, assim como todo o isolamento sonoro necessário e outras modificações. Apesar de tudo, Rui Couto, enquanto utilizador de uma sala de ensaios, alerta para a necessidade de uma “organização funcional” dentro da já natural desorganização que sustenta aquele ambiente underground. As sugestões passam por tentar suprimir as dificuldades de acessibilidade – contando com apenas um elevador a funcionar (para transportar o material de 100 bandas que se estendem pelos três pisos do centro) – a melhorar a pouca luminosidade do local. Segundo o mesmo, são os seguranças que muito dão ao espaço, acabando por resolver uma série de percalços. Que com o START tenha começado, verdadeiramente, uma nova era, tanto para os músicos como para o C.C.Stop, que subsiste praticamente dessas mesmas pessoas.

U.FRAME: CINEMA UNIVERSITÁRIO DE TODO O MUNDO NO PORTO

Luís Lago

De 1 a 5 de Outubro o auditório da Biblioteca Almeida Garrett foi palco da primeira edição do U.Frame, um Festival de Cinema Universitário organizado em conjunto pela UP e pela Universidade da Corunha. O evento apresentou 94 curtas-metragens vindas de várias universidades espalhadas pelo Mundo, junto com conferências, workshops, masterclasses, festas no Plano B e bolos e sumos de graça. U.Frame? Talvez por falha da organização, o Festival passou quase despercebido. A única cobertura nos mass media de que me apercebi foi uma mensagem de rodapé na Sic Notícias. Algo do género: “Festival de Cinema Universitário começa amanhã no Porto”, sem mencionar o nome, a hora, os dias e o local onde se iria realizar. Fruto desta falha de comunicação, algumas sessões tiveram praticamente desertas. Uma começou mesmo com a plateia vazia, e só eu, o apresentador improvisado Ricardo Alves e dois fotógrafos (um deles, o do JUP) presentes. Noutra, os únicos presentes foram alunos de Ciências da Comunicação. Dispensados das aulas, os alunos deste curso foram obrigados a marcar presença em algumas sessões. Apesar de muitos dos não interessados terem conseguido quebrar esta regra, os poucos que foram contrariados incomodaram quanto baste, grunhindo de aborrecimento o tempo todo.

94 Filmes, 19 Horas de Exibição A assistência reduzida não fez de todo jus à qualidade dos filmes. Sim, o piano minimal como banda sonora padrão torna-se irritante depressa e em muitas curtas a acção não avançou durante 20 minutos (Metrónomo, estou a olhar para ti), mas apesar disso o balanço final foi excelente.

José Ferreira

Da Alemanha, Estados Unidos e Israel, vieram grandes produções praticamente impossíveis de realizar no nosso país. Para além dos grandes orçamentos, ficou também claro o investimento das Universidades desses países na formação de actores. Até mesmo em termos musicais, como se viu em One More Game with You, brevemente no Disney Channel (rezo eu). Mas os bons filmes não se fazem só de grandes orçamentos. A curta alemã “Black Platoon”, deve ter tido um investimento astronómico mas o argumento foi com certeza encontrado no caixote do lixo do “Comedy Inc”. Nas animações, a chave foi a simplicidade. A tecnologia CGI trouxe maus resultados: personagens grotescas e pouco expressivas (destaque para “Solo”, vencedor do prémio de melhor animação) e cores que flutuavam entre o demasiado soturno e o demasiado berrante. Para além disso, muitas animações neste estilo pareciam saídas dos anos 90 (“Clip” lembrou o vídeo “Blue” dos Eiffel 65). Curtas como “Bad Habit Little Rabit”, “My Happy End” e “Gott un die Well”, feitas, aparentemente, de forma tradicional tinham um aspecto muito mais polido e agradável. Nas curtas documentais, alguns portugueses conseguiram brilhar. “Aleluia”, sobre o fabrico e venda de figuras religiosas no nosso país e “Gentes do Mar”, vencedor do Prémio de Melhor Documentário conseguiram dar uma visão real dos seus objectos de estudo, sem aborrecer. Mas também houve trabalhos cansativos, como “Gestos em Cadeia”, do

qual já não me lembro de nada, excepto de que quase passei pelas brasas. Quanto aos filmes experimentais, género mais dado a exageros técnicos sem sentido, houve várias surpresas positivas. Entre algumas curtas maçadoras como o youtube poop de 20 minutos “Copyleft” e o já mencionado “Metrónomo”, encontramos trabalhos fascinantes como “Echo” e “Nine.5”. Mas a grande revelação foi “Che Che Gorgeous”. Começando com um plano geral de minhocas com cabeças humanas a grunhir, levando-nos até a um estúdio em que um homem gordo interpreta um registo melancólico de “Forever Young”, “Che Che” foi sem dúvida o filme mais bizarro do festival.

Créditos Finais Para poupar os espectadores a discursos longos e aborrecidos, a entrega dos prémios teve lugar no Palacete Balsemão, numa cerimónia exclusiva a participantes e organizadores do Festival. Entre intermináveis agradecimentos, destacou-se a intervenção do porta-voz do jurí, Mário Augusto, que à força toda tentou distanciar-se da sua imagem pública. O homem famoso por se sentar em amena cavaqueira com a nata de Hollywood, afirmou por várias vezes não ser fan apenas do “cinema pipoca”, mas que só este dava para vender o seu programa.


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Simian Mobile Disco no Eco UnderSky

“QUANDO AS MÚSICAS NÃO SÃO ESTIMULANTES, TEMOS DE DEITAR TUDO AO LIXO” Filipa Mora

Fato preto. Camisa branca. Metros de altura que me obrigam a um olhar ascendente até encontrar a extremidade loura de James Shaw. Está sozinho e o outro James não veio, o que faz com que este James se restrinja a apenas um dj set de Simian Mobile Disco. A Alfândega do Porto iluminada e a vista privilegiada do outro lado do rio torna o momento profissional mais lírico e só os kicks de Bloody Beetroots que ecoam para fora do edifício me despertam para o trabalho. E começa a agradável conversa com o inglês simpático de sorriso contagiante e humor tímido. JUP – Vocês têm remixes altamente cotadas e conhecidas como de referência. O que preferem? As vossas próprias produções ou remisturar algo que já existe?

processo de criação/produção temos de dar um nome qualquer em segundos. Então é tipo “como vamos chamar-lhe?” ok, pode ser one.wav” [risos]

Simian Mobile Disco (SMD) - Eu acho que acaba por ser a mesma coisa. Quando fazemos uma remix (rmx), pensamos nela como uma música completa, e quando a acabamos, pensamos nela como se já fosse nossa. Não há grande diferença, é muito semelhante o empenho que dedicamos tanto a uma coisa como outra. Acabamos por criar, de forma diferente, algo novo. Existindo já numa versão ou partindo do zero, resulta sempre num produto novo. É uma tarefa difícil.

JUP - Os vossos vídeos… Não posso evitar a pergunta que, se calhar, vos foi feita mais vezes. No vídeo da “Hustler”, é mesmo verdade que vocês “drogaram” de forma leve aquelas raparigas? SMD - [risos] Não temos nada a ver com isso! Foi um amigo nosso que fez isso tudo. Ele ligou-nos a meio da noite e dissenos que estava a gravar outro videoclip para outra banda.

JUP – Como é o processo de remisturar? Qual é o primeiro passo? Escolhem o artista, a música, o desafio em si? SMD- Normalmente ouvimos uma música e pensamos se podemos apresentá-la de um ângulo diferente. E como trabalhamos muito rápido, em menos de um dia podemos modificá-la , caso estejamos empenhados em reconstruir essa mesma música. Como no álbum passado, tínhamos cada vez mais propostas para remixes…E adorávamos faze-las mas chegou a um ponto em que tivemos de recusar, caso contrário nunca acabaríamos o álbum. [risos]

JUP – Que era New Young Poney Club. SMD - Sim, NYPC. E ele tinha um equipamento que dava para rodar e filmar daquela maneira. E nós não tínhamos dinheiro para pagar mas ele queria mesmo fazer o vídeo e, basicamente, o que aconteceu foi dar champanhe e isso a amigos e

JUP - Más músicas são fáceis de remisturar? Vocês já chegaram mesmo a afirmá-lo... SMD - Para ser sincero, não sei bem. Eu acho que a razão pela qual dissemos isso é que quando temos de fazer um remix duma música boa, já sentimos que está tudo feito. O que quer que adicionemos ou alteraremos na música não se justifica por podermos estragar o trabalho já feito. Temos receio disso. Se mexermos nelas, vamos acabar por fazer asneira. E quando é ao contrário, quando as músicas não são tão estimulantes e boas, temos de deitar tudo ao lixo, retirar o que achamos que fica mal e reconstruir a música para que se torne boa. JUP- Vocês conseguem uma fusão entre o maximal/electro e esta nova “era” do rock, indie, o que resulta nesse vosso som peculiar. Como equilibram isso? Começa a ser natural as bandas terem um dj a acompanhá-las. SMD – Para ser sincero, não sei bem. Acho que nunca pensamos muito nisso, acaba por acontecer naturalmente. Acho que o nosso background ajuda muito, sempre ouvimos muita electrónica mas crescemos em bandas. Acaba por sair assim naturalmente. JUP – O que é pensas destas novas “ondas”? Como se houvesse uma nova vaga francesa e outra, a alemã, cada uma muito peculiar mas, igualmente, populares. Achas que, hoje em dia, ser-se alemão é uma vantagem no panorama electrónico? SMD- Historicamente, sim. Se vives em Berlim, podes fazer música electrónica. Quando sais lá, quando fazes um dj set lá, é muito diferente de nos EUA. As pessoas sentem as coisas de forma diferente. É possível tocar-se lá minimal e o público estar atento, os americanos são muito mais rockabillys. JUP – E sobre o futuro electrónico? É a idade de ouro para mais música híbrida?

JUP – Sei que vocês têm alguma dificuldade em dar nomes às músicas, tanto que nem pensam muito nisso. Nas vossas próprias palavras, é muito “em cima do joelho”. E agora? Já é mais fácil? SMD – Isso deve-se à forma como trabalhamos. Como usamos patterns, vamos gravando de x em x tempo e a meio do

Sara Araújo

SMD - É um fenómeno interessante. Temos assistido a imensas coisas a misturarem-se cujo resultado é, deveras, curioso. Do meu ponto de vista, há imensa música, imensas pessoas a fazerem música. Há tanta porcaria por aí, precisamente por esse factor, mas simultaneamente, descobrem-se ideias bastante boas, criativas e bem produzidas. Felizmente, as coisas vãose alterando e tudo se adapta.

resultou naquilo. Gostámos do resultado. Ele fez o vídeo para nós e concordámos. Não nos metemos muito no processo dos videoclips. JUP - O que podemos esperar do teu dj set? SMD – Não sei bem… JUP - Algum italo disco? SMD - Estava a pensar, como é um público pequeno, tocar algo mais agressivo. Resulta bem, normalmente. Acho que é preciso equilibrar o que nós gostamos com gosto do público e ver o que eles querem; caso contrário, não tem piada tocar para pessoas que se sintam desconfortáveis com o teu som, caso só sejas completamente egoísta no teu dj set. E também gosto de aproveitar para passar músicas nossas novas para ver a reacção do público. Acima de tudo, é equilibrar os hits com unreleaseds, por aí. Gosto de ver a reacção das pessoas e dar-lhes o que elas querem e o que eu quero também, claro!


22

CULTURA NOVEMBRO´08 JUP

Conta-me como é Ricardo Alves

CONDUZIR ONLINE

Publicado em 1998 pela Sierra Entertainment, Grand Prix Legends (GPL) mantém a sua reputação como o rei dos simuladores de corridas. Num mercado obcecado pela última tecnologia e pelos melhores gráficos, algo mais foi necessário para trazer tal longevidade ao jogo. “O sucesso do jogo não se deve apenas à sua forma final” - diz-nos António – “Após a divulgação, muitos indivíduos com paixão pelo jogo foram-no melhorando com a criação de novos mods (modificações). O jogo original é uma reprodução do campeonato de Fórmula 1 de 1967. Depois apareceram os mods para as temporadas de 65, 69 e 66 (...) Um piloto português que é o Toni Mau já recriou para o jogo vários circuitos portugueses como por exemplo o circuito de Vila Real, de Lordelo do Douro e também o Circuito da Boavista”. É esta comunidade internacional que mantém um jogo com dez anos como a referência no que toca a simuladores de corridas, jogos menos imediatos do que o costume, que mantêm o realismo através de características como a possibilidade de alterar a própria afinação dos carros. A fatia portuguesa desta comunidade tem corridas uma vez por semana, às Terças e, encontros duas vezes por ano, por norma uma almoçarada na Mealhada. Sobre a distribuição etária dos pilotos da liga: “Há de tudo. Eu e o meu colega de equipa somos os mais velhos: Eu tenho 55 e ele tem 57. Mas depois temos quarentões, trintões, trintinhas, vintões, vintinhas... A nível mundial acho que o mais velho é um piloto texano, que tem 92 anos e ainda corre”. Fico a saber que os pilotos que representam a liga portuguesa no campeonato mundial de GPL conseguiram chegar às meias-finais. Apesar de também se dedicar à pintura, e de ser associado do Clube de Xadrez do Porto há muitos anos, o hobby predilecto de António é claramente o GPL: a paixão pelo automobilismo que foi acendida naquele Agosto de ‘58 ainda dura. “O som deste carro é hipnotizante” – estamos agora no escritório, onde se senta o cockpit: computador, volante, pedais. A um canto está um cavalete, e frente a este a cadela Merry. António mostra-me os replays das voltas-record dos melhores pilotos de GPL, aqueles que pela sua perfeição na condução ele apelida de aliens. O jogo despoleta, aqui em

DR

No ano de 1958, o nono Grande Prémio do campeonato de Fórmula 1 foi vencido pelo piloto Stirling Moss, ao volante de um Vanwall. Entre o público reunido à volta do Circuito da Boavista estava António Veríssimo, uma criança em idade pré-escolar fascinada com a procissão de bólides. Meio século depois, António Veríssimo, aposentado, pertence à liga GPLPT, o campeonato português online do jogo Grand Prix Legends. Falamos com ele sobre os carros, os pilotos, o jogo.

António, a ternura pelo automobilismo. E a mim também, apesar do apenas cíclico contacto que tenho com o desporto. O piloto conhecido como António Verissimus fala-me de como a sofisticação e complexidade do jogo o surpreenderam quando o jogou pela primeira vez, de como adquirir o volante foi estritamente necessário para jogar com um mínimo de eficiência. Conversamos e concordamos sobre o

potencial dos videojogos para ter espectadores e não apenas jogadores. Por fim, tive a oportunidade de conduzir um Lotus no jogo, mas a honra do JUP não podia ter ficado em piores mãos: um despiste na primeira curva parabólica do circuito antigo de Monza atira o carro numa cambalhota espalhafatosa. Decididamente, GPL não é um jogo para domingueiros.

As Aventuras dos Cinco | Opinião Daniel Reifferscheid

CINCO MARAVILHAS DO CINEMA POP JAPONÊS É fácil ter preconceitos contra o cinema japonês. Tal como ocorre com todos os cinemas “nacionais”, assumir-se como fã pode ser mal entendido como um gesto de rebelião enfadonha contra a supostamente sempre malévola Hollywood e os seus filmes pipoca. Pior, uma pessoa arrisca-se a ser metida no mesmo barril com toda a espécie de transmutações perturbantes de otakus. No melhor dos casos, assumem que somos fã do cinema gore – o que, com todo o respeito pelo pessoal que passa horas a discutir decapitações, também não é o meu caso. Mas há muito mais para amar no cinema japonês. Ficam aqui cinco exemplos: 1- “Kumonosu-jô” de Akira Kurosawa (1957) Akira Kurosawa é hoje em dia tido como um dos mestres do cinema mundial, mas é preciso não esquecer que, na altura, os seus filmes eram grandes êxitos de bilheteira e que, como tal, o seu espírito está imprimido no DNA da cultura Pop nipónica. O meu Kurosawa favorito, “Trono De Sangue” no português, é uma adaptação de “McBeth” no Japão medieval. Toshiro Mifune, num dos papéis mais furiosos da sua carreira, é o guerreiro corrompido pela ambição, simbolizada primeiro por um espírito malévolo e depois pela sua esposa (Isuzu Yamada, magistral.)

Interiores teatrais contrastam com a atmosfera épica e a meticulosidade histórica das batalhas nesta sórdida crónica dum colapso. 2- “Zatoichi Monogatari” de Kenji Misumi (1962) Zatoichi é um dos maiores ícones do cinema samurai: herói de vinte e seis filmes (se não contarmos o remake recente a cargo de Takeshi Kitano) e uma série televisiva, o espadachim cego é uma parte essencial do imaginário pop-cultural japonês. E é este o filme em que tudo começa: “Zatoichi Monogatari” atrai não pela inovação, mas por seguir estritamente todas as regras do cinema samurai: há o ronin andante com um passado misteriosos, há a corrupção omnipresente, os combates tanto físicos como existenciais. Tal como o Oeste americano ou as metrópoles da lei seca, o Japão feudal proporciona um cenário de decadência moral quase total, questão de lei do mais forte e lei do dinheiro. A atracção reside em ver como homens honrosos tentam sobreviver num cenário destes. 3- “Tokyo Nagaremono” de Seijin Suzuki (1966) Conhecido no mundo ocidental como “Tokyo Drifter”, este filme de yakuzas é uma das maiores obras-primas da era dourada da Pop Art. Suzuki fazia policiais para os es-

túdios Nikkatsu; trabalhando com poucos meios, conseguiu criar uma obra que cada vez mais se afastava dos filmes de yakuza tradicionais e se aproximava de nomes como Godard e Antonioni. “Tokyo Drifter” tem um enredo labiríntico, mas a verdade é que o impacto visual garante que, embora confuso, o espectador nunca se sinta entediado: clubes Mod com cores berrantes, shots tão próximos que Leone acharia um exagero, yakuzas com fatos tão absurdamente elegantes que mereciam um Óscar. Mas os encantos de “Tokyo Nagaremono” não são apenas estéticos: se prestarmos atenção, encontramos uma história sobre fidelidade, honra e traição. 4- “Kyokatsu Koso Waga Jinsei” de Kinji Fukasaku (1968) Aos quinze anos, a turma de Kinji Fukasaku foi ordenada pelo governo japonês a trabalhar numa fábrica de munições. A fábrica foi atacada pelos americanos, e Fukasaku teve que enterrar com as suas próprias mãos colegas perecidos. Começou aí um sentimento de ódio e desconfiança contra o mundo adulto que iria percorrer a obra do realizador. Este filme, traduzido com o título “Blackmail Is My Life”, insere-se facilmente nestes moldes: os protagonistas da história são um grupo de jovens chantagistas

que vivem à custa de figuras respeitáveis da sociedade burguesa. São amorais e oportunistas, mas há no grupo um sentido quase infantil de ternura e camaradagem que faz com que fiquemos do seu lado contra as forças do mundo adulto. Com um estilo nitidamente influenciado pela nouvelle vague, “Blackmail Is My Life” é um filme dinâmico e tocante. 5- “Gojira Tai Mekagojira” de Jun Fukuda (1974) Não será consensual que uma das mais-valias do cinema é a possibilidade de visualizar imagens que nunca poderíamos encontrar na realidade? Os filmes do Godzilla preenchem sem dúvida este requisito. A ideia de basear toda uma franchise à volta de monstrengos a lutar, sem grandes preocupações de lógica, é bela na sua simplicidade. As cenas que separam estes confrontos – políticos e militares a discutir, famílias pacatas a fornecer diálogos pouco naturalistas sobre o Godzilla e quem quer que ele esteja a combater – são ao mesmo tempo entediantes e fascinantes. Funcionam como as cenas de diálogo em filmes pornográficos dos anos 70: servem como cápsula temporal, e como “design porn”. O filme aqui escolhido, no qual o Godzilla defronta pela primeira vez a ameaça de Mechagodzilla, é uma boa introdução ao estilo.


JUP NOVEMBRO ‘08 cultura

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cardápio

nov. 08 Filipa Mora e Bruno Silva

MÚSICA

17Seg.

Beach House Passos Manuel

1Sáb.

19Qua.

Passos Manuel

Cinema Batalha

A silver Mt. Zion 2Dom.

Peter Murphy Coliseu do Porto

3Seg.

Brandi Carlile 21Sex.

Emir Kusturika & The No Smoking Orchestra Pavilhão Municipal de V.N. Gaia

Ladytron

30Dom.

5Qua.

Teatro Sá da Bandeira

Casa da Música

These Arms Are Snakes Russian Circles Porto Rio

7Sex.

Red Snapper Indústria

Alborosie Human Chalice Youth Culture Mighty Lion’s Sound Bob Figurante & Sista Pat & Ras Damula Teatro Sá da Bandeira

8Sáb.

Nouvelle Vague Teatro Sá da Bandeira

Joan as Police Woman

Centro Cultural de Vila Flor, Guimarães

10Seg.

The Matthew Herbert Big band Casa da Música

14Sex.

Cut Copy Boyz Noize

Black Strobe Yuksek

teatro Set. 24Qua. a 2Dom.

Persona de Ingmar Bergman Estúdio Zero

Set. 25Qui. a 31Sex.

Estados Eróticos imediatos de Sören Kierkegaard Seiva Trupe - Teatro do Campo Alegre

Out. 24Sex. a 9Dom.

O Concerto de Gigli TECA

Out. 27Seg. a 8Sáb.

Diz que diz TECA

7Sex. a 23Dom.

O Mercador de Veneza

DANÇA TECA

Plano B

Museu de Serralves

10Seg. a 16Dom.

Cinamina - Festival Internacional de Cinema de Animação Espinho

Out. 29Qua. a Dez. 19Sex.

Ciclo de Estudos Contemporâneos ciclo da vida 22Qua. a Fev. 8Dom.

Christopher Wool - pintura Museu de Serralves

BREVES Rita Oliveira

Festa cinema francês A Festa de Cinema Francês dá a volta a Portugal entre 2 de Outubro e 2 de Novembro. Além de Lisboa, Almada, Coimbra e Faro a 9º edição do festival vai estar no Porto de 21 a 26 de Outubro. O filmes serão exibidos nas salas de cinema do centro comercial Cidade do Porto e ainda no auditório da Fundação de Serralves por 3,5€ cada bilhete. No Porto poderemos assistir a filmes como “Faubourg 36” de C. Barratier, (21.10), “Les bureaux de Dieu” de Claire Simon, (22.10), “Tout est pardoné” de M. Hansen-Love (23.10), “Chrysalis – Um futuro próximo” de Julien Leclerq, (24.10), e “PrometsMoi” de Emir Kusturika, (25.10) ou “Toi et moi” de J. Lopes-Curval. Ao todo vão ser apresentadas 45 longas-metragens, 36 das quais nunca antes estreadas em Portugal.

Ciclo de cinema italiano

15Sáb.

Infadels You Should Go Ahead

Exposição de Juan Muñoz uma retrospectiva

Teatro Nacional de S. João

Out. 31Sex. e 1Sáb.

Casa da Música

1Sáb. a Jan. 18 Dom.

Casa da Música

Casa da Música

Lisa Ekdahl

DIVERSOS

O Concerto de Gigli 25Ter.

O Lago dos Cisnes Ballet Imperial Russo Coliseu do Porto

De 9 a 29 de Outubro, o cine-estúdio do teatro de Campo Alegre recebe o ciclo de cinema italiano. A novidade em relação ao último ciclo de Cinema Italiano que houve na cidade (na Faculdade de Letras da UP) é o preço dos bilhetes que custam 3,5 euros (o ciclo realizado na FLUP tinha entrada livre). As propostas da Medeia Filmes trazem à sala de cinema filmes de Fellini (A Doce Vida, Amarcord e 8 e ½), Antonioni (Blow-up história de um fotógrafo e Profissão: repórter), Visconti (Sentimento e O Leopardo) e Pasolini (Decameron, Contos de Canterbury e As mil e uma noites) e ainda as gerações seguintes como Moretti (Abril), Benigni (Monstro), Bertolucci (O último tango em Paris), Belochio (Bom dia, Noite) ou Martone (O odor do sangue). As sessões decorrem entre as 18h30 e as 22h.


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CULTURA NOVEMBRO´08 JUP

PORTUGAL: O PAÍS DOS FESTIVAIS? Filipa Mora, José Ferreira, Marco Eira, Rita Monteiro, Sara Araújo.

O JUP esteve em alguns festivais de Verão e registou aquilo que achamos ser os melhores momentos. Claro que nem tudo é cor-de-rosa e os nossos colaboradores apontaram também os aspectos menos positivos. BEAT IT

4

Recém-nascido, o festival chegou ao Porto pelas mãos do Plano B e parceiros, numa noite repleta de bons kicks desde o maximal ao electro-pop – Trentemoller, Dusty Kid, Polysics, !Trash Yourself, Etienne de Crécy, David Carreta. Com local inicial previsto para a praia, junto do Edifício Transparente, o festival foi alterado para o Pavilhão Rosa Mota, Jardins do Palácio de Cristal, o que retirou alguma ambiência que se esperava para esta noite. Apesar da mudança de local, as sonoridades fizeram-se sentir num público reduzido mas empenhado em aquecer o grande pavilhão.

+ A performance de Etienne de Crecy, com a sua plataforma gigante e luminosa em forma de um grande cubo complexo e alvo de variadas projecções. Visualmente potente. Preço acessível para os 5 lives apresentados e uma logística elevada numa só noite. Bom feedback do público. - O fraco concerto dado por uns pouco entusiasmados Ladytron com falhas técnicas. O público aguardava especialmente este concerto com alguma curiosidade. Barriga pouquíssimo cheia. Esperemos que tragam mais energia à Casa da Música, em Novembro. FM.

2

SUDOESTE

Zambujeira do Mar. 6 a 10 de Agosto O Sudoeste é um dos maiores e mais importantes festivais de Verão de Portugal na actualidade. Em 5 dias, desde o Fado até ao Rock, do Reggae ao Electrónico, este festival começa a ser mais do que um simples cartaz apetrechado de grandes nomes da música. O grande parque de campismo acondicionado especialmente para a ocasião, com boas condições que a organização proporciona aos festivaleiros “Sudoenos” torna-se uma hipótese de umas férias baratas. No palco principal estiveram nomes como Björk, Goldfrapp, Franz Ferdinad, Yeal Naim, The Chemical Brothers, Vanessa da Mata, Nitin Sawhney, Brandi Carlile e Shout Out Louds. Outros três palcos receberam calorosamente artistas como Cut Copy, Junior Boys, Fanfarlo e os portugueses Deolinda, Vicious Five e Camané. A grande novidade desta 12ª edição do festival foi sem dúvida o Palco Kubik sempre lotado, com participações de nomes do mundo da electrónica como Booka Shade, Dezperados, Gui Boratto e Tiefschwarz.

+ Björk, finalmente, trouxe o imaginário do seu novo álbum, com revisitação à discografia que fez o percurso desta cantora atípica, encantando a plateia do festival. The Chemical Brothers trouxe o ambiente mais eufórico do festival, com um jogo de luzes, lasers e animações no ecrã que fizeram deste concerto um momento memorável, e o Sudoeste Alentejano nunca mais foi o mesmo. - Falha na segurança, tráfico de drogas e furtos facilitados. ME.

3

PAREDES DE COURA

Paredes de Coura. 31 de Julho a 3 de Agosto

A mudança de data do Festival Paredes de Coura este ano veio por bem. Exceptuando o primeiro dia que se fazia adivinhar o mau tempo já habitual, o sol reinou. Assim, proporcionou-se um dos grandes momentos do festival, ao entardecer Au Revoir Simone com a sua electrónica dos seus femininos e psicadélicos conjugou-se na perfeição com as cores do pôr-do-sol que nos envolviam. Outro grande momento foi o concerto de DEUS. Estes actuaram de corpo e alma e o público vibrou com os devaneios instrumentais, que acompanhados de luzes strob nos induziam ao trance. Apenas uma nódoa negra a apontar: parece que o punk não é um género musical fácil de escutar para quem está na terceira idade. É pena porque esperava-se mais dos nossos queridos Sex Pistols, é que nem a euforia dos neo-punks presentes no público os fez tocar punk no tempo certo.

+ As promessas de chuva não se concretizaram, embora as capas de água tenham esgotado no próprio dia. Mars Volta , DEUS e Thievery Corporation foram as bandas mais aplaudidas. - A terceira idade a notar-se no concerto de Sex Pistols. SA.

ANTIPOP

Forte de S. Tiago da Barra, Viana do Castelo. 31 de Julho a 2 de Agosto

Palácio de Cristal, Porto. 6 de Setembro

Pelo 4º ano consecutivo, as sonoridades electrónicas chegam à cidade de Viana de Castelo. Com vista para o rio e o porto da cidade, este festival privilegia o que de melhor se produz no electro, techno e minimal. Com nomes como Modeselektor, Micro Audio Waves, Josh Wink, Marc Houle, Gabriel Ananda, entre outros; a edição deste ano foi sentida de forma bastante calorosa pelo público cada vez mais fiel de ano para ano, contando já com imensos galegos.

+ Prima pela excelência do cartaz com um line-up de qualidade. Este ano, actuação de Modeselektor. - Este festival urbano conta as vantagens do próprio conceito mas continua com algumas coisas por resolver – não há sistema de pulseira, o que faz com que as pessoas não possam reentrar da área do recinto. A partir do momento em que é “picado” o bilhete, as pessoas não podem fazer um intervalo e circular pela cidade e voltar a entrar no festival. Este factor de desconforto podia ser diminuído caso a organização oferecesse boas alternativas dentro do recinto, disponibilizando, por exemplo, uma boa área de chill-out (que continua fraco). FM.

5

Sara Araújo

1

MARÉS VIVAS

Cabedelo, Vila Nova de Gaia. 17 a 19 de Julho

A chegada ao recinto do Festival Marés Vivas, apesar de claramente assinalada, é sempre algo complicada devido aos acessos. Talvez os transportes públicos e uma pequena deslocação a pé sejam a melhor opção. Contudo, nestes dias de verão, é impossível não gostar da vista que se tem sobre a foz do Douro e sobre o Porto, ali já tão perto do outro lado. Depois de passarem os vários espaços comerciais disponíveis, no palco Rádio Comercial, apenas mais pequeno em tamanho, mas não em condições e qualidade de som, os concertos já começaram e vão estender-se depois ao palco principal que fica na outra ponta do recinto. Com uma selecção de bandas secundárias mais apelativas para um público mais jovem, entre elas os Tara Perdida, Mazgani, Lulla Bye e Per7ume, só quando a hora dos concertos no palco principal se aproxima, é que a faixa etária dos presentes no recinto se altera. Este ano, pudemos contar com as presenças de grandes clássicos como Peter Murphy, The Sisters of Mercy e Riders on the Storm, a nova formação dos antigos membros dos The Doors, e também novos valores musicais como os Shout Out Louds e o português Slimmy. Sem dúvida, este é um festival a estar atento.

+ Espaço organizado com uma vista magnífica sobre a foz do Douro e um palco com óptimas condições de luz e som. - O preço das bebidas algo inflacionado e, para quem vinha de mais longe, estacionamento e acessibilidades reduzidas. JF.

6 INTERCÉLTICO DE SENDIM Parque da Eira, Sendim. 1 a 3 de Agosto

Não fosse o caminho a percorrer para chegar a Sendim, tudo seria mais fácil. Depois de horas de curvas a proporcinar belos vómitos, e de montarmos acampamento no espaço gratuito para os participantes, as noites do Festival esperavam-nos com o ambiente habitual de festa. De gente que não consegue manter os pés colados ao chão, de tanto querer dançar. Este ano, o cartaz voltou a surpreender, com bandas de incursões experimentais e de influências da Europa de Leste, além de muitos portugueses, principalmente do Sul do País, assim como os Galegos Luar na Lubre. Ao sair da Península Ibérica, no segundo dia de festival, deparamo-nos com uns confusos Voanerges, vindos da Ucrânia, em antítese com Shooglenifty, escoceses com muito fôlego e performers da gaita de foles tradicional, e os improváveis húngaros Kerekes Band que proibiram a timidez dos que se encontravam no recinto do Festival.

+ A vivacidade rock dos escoceses Shooglenifty e a magia modernamente encantada da flauta pastoril dos húngaros Kerekes Band. - O caminho a percorrer para chegar a Sendim. RM.

7 MÚSICAS DO MAR

Póvoa de Varzim. 30 de Agosto a 2 de Setembro

O Festival Músicas do Mar na Póvoa do Varzim voltou à cidade entre os dias 28 e 30 de Agosto. Insere-se no programa AnimaPóvoa e é organizado pela Câmara Municipal. Carlos Seixas, também responsável pelo festival Músicas do Mundo em Sines, volta a ser o programador da edição deste ano. A aposta foi, mais uma vez, num cartaz ecléctico, mantendo as linhas condutoras da primeira edição: quantidade e qualidade em concertos de entrada gratuita, combinação que é rara hoje em dia. Os concertos são divididos pelas ruas da cidade, pelo Largo do Passeio Alegre, pelo Diana Bar e pelo Auditório da Lota. Com uma média de 3 concertos gratuitos por dia (sim, leram bem), este festival tem todos os elementos para chamar a si os muitos veraneantes de Agosto. O festival abriu com a actuação, no Diana Bar, dos portugueses Nobody´s Bizness, com os seus blues clássicos. Depois, ao ar livre, os ritmos africanos de Dele Sosimi, músico nigeriano radicado em Londres, tomaram conta do palco do Passeio Alegre. E isto foi apenas o começo: durante estes três dias passaram pelos vários palcos e pelas ruas da Póvoa bandas como os portugueses Deolinda, os Serra-lhe Aí!!! e a sua música de taberna, os Dengue Fever e a sua música cantada em Khmer e Inglês, os estranhos ritmos e ambientes dos finlandeses Alamaailman Vasarat, os “Martelos do Submundo”, que misturam habilmente ritmos da música folk do norte e centro da europa com ambiências do heavy-metal; o neozelandês Aron Ottingnon, um pianista premiado e cujos concertos são uma viagem da música clássica ao jazz, passando pelo rock e por sonoridades de influência maori e os Hoba Hoba Spirit, de marrocos, a quem coube as honras de encerrar o festival. Mas nem tudo são rosas: uma das maiores dificuldades em dias de festival é encontrar estacionamento perto do recinto para aqueles que preferem não usar o metro para se deslocarem até lá. + A quantidade e qualidade de concertos gratuitos. - Pouco estacionamento perto do recinto. JF.

8

ECO UNDERSKY

Alfândega do Porto. 14 a 16 de Agosto

Inicialmente previsto para um lugar ao ar livre, esta 2ª edição começa logo menos bem, ao ser alterado para o Edifício da Alfândega do Porto, que acolheu da forma menos agradável possível o festival. Nomes como The Bloody Beetroots, Simian Mobile Disco, Dieselboy, Goose, Mr.Oizo, Blackdisco, etc. Uma boa aposta no que melhor se anda a fazer dentro do electro, drum’n’bass e breakbeat.

+Os bons nomes que vieram valem por si só. - Uma organização que deixa muito a duvidar. Um li-

geiro caos organizado com alterações desconhecidas ao público no line-up, quase cancelamento do último dia de cartaz, com alteração de local para outro espaço, sem a maioria dos nomes agendados para esse último dia. Local pouco adequado às necessidades acústicas do festival, bastante ressonância sonora. Pouco público e de faixa etária juvenil q.b. . Cancelamento de Adam Freeland e The Bombazines. Ressonância acústica deficiente. FM.


JUP NOVEMBRO ‘08 CULTURA

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4 3 7

9

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1 8

GEO FESTIVAL

5

Alguns dos Festivais moveram o JUP este verão.

9 GALAICOFOLIA

Castro de S. Lourenço, Esposende. 31 de Julho a 3 de Agosto

No dia 31 de Julho, a primeira edição do Galaicofolia tomou o Castro de S. Lourenço de assalto e trouxe consigo a festa e alegria da música folk. Com uma forte aposta em conteúdos pensados para toda a família e em nomes fortes da música, durante 3 dias, a festa regressou ao antigo castro galaico, levando miúdos e graúdos a estar em maior contacto com as suas raízes culturais. Com um recinto dividido em dois espaços, o Castro e o FIK, a organização assumiu-se desde logo como um dos pontos fortes do festival. No Castro, podíamos encontrar artesãos, merchandising, a zona alimentar com petiscos típicos, um espaço para as crianças se entregarem a actividades lúdicas, reconstituições históricas da invasão romana e da vida castreja e, nas habitações reconstruídas do castro, havia um espaço de histórias dedicado aos mais novos. O espaço FIK era dedicado apenas aos concertos, mas tinha também zonas alimentares, porque não se pode fazer a festa de barriga vazia. Outro dos pontos fortes foi o cartaz com grandes nomes da folk nacional e internacional. Uma das primeiras bandas a pisar o palco do espaço FIK foi Julie Fowlis, cantora escocesa que usa o gaélico para se exprimir musicalmente. Pela primeira vez no nosso país, encantou a plateia com sonoridades e ritmos que nos fazem sonhar. Da música nacional, foram chamados ao palco durante o festival Os Gaiteiros de Lisboa, banda que já dispensa apresentações, os Monte Lunai, que começam a dar os primeiros passos sob os holofotes e a que convém estar atento, e os Arrefole, que também procuram um lugar cativo em cima dos palcos. O festival encerrou a 3 de Agosto com os Red Hot Chili Pipers (não confundir com os Red Hot Chili Peppers) e com a sua actuação galvanizante. O que dizer de um colectivo que se baseia na forca das gaitas de fole escocesas para fazer versões folk musculadas de clássicos da música rock? As acessibilidades ao recinto, apesar dos esforços da organização, foram das principais queixas registadas. Apesar de existirem paragens assinaladas em Esposende e uma camioneta que ligava a cidade ao castro, muitos visitantes queixaram-se da distância, da facilidade de acesso e da sinalização que conduzia às paragens.

+ organização do espaço e uma aposta em actividades lúdico-históricas para grandes e pequenos - acessibilidades e sinalização das paragens do transporte colectivo associado. JF.

2

1 Beat It (Sara Araújo) 2 Sudoeste ( Marcos Paskin) 4 Anti-Pop (Luís Pinto) 5 Marés Vivas ( José Ferreira) 6 Intercéltico de Sendim (DR) 7 Festival do Mar (José Ferreira) 8 Ecoundersky (Sara Araújo) 9 Galaicofolia (José Ferreira)

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CULTURA NOVEMBRO´08 JUP

críticas O misticismo no Porto

Secret Chiefs 3 Joana Coimbra

DR

Na noite de 30 de Setembro o Plano B foi um lugar demasiado pequeno para acolher uma banda como os Secret Chiefs 3 (SC3). Uma casa esgotada (e algumas pessoas à porta, sem bilhete) foram o prenúncio de uma grande noite de música experimental de contornos world music. A juntar a isso, o facto de ser data única em Portugal – os SC3, enquanto objecto de culto que são, devem ter trazido à Invicta públicos de outras zonas do país - o que contribuiu certamente para a lotação esgotada. O colectivo encabeçado por Trey Spruance (ex – Mr. Bungle) brindou uma audiência expectante com uma setlist a percorrer alguns trabalhos menos recentes da banda – especialmente Book Of Horizons, de 2004 e Book M, de 2001- mas a grande novidade foi a inclusão de temas inéditos, não incluídos em nenhum álbum da discografia da banda. A receptividade em relação a estes temas foi, no entanto, muito

positiva. Em todo o concerto se sentiu mesmo que a empatia do público em relação ao colectivo norte-americano foi acima da média, algures entre os boquiabertos de espanto pela incrível concretização e técnica que vinha do palco e os mais entusiastas que iam aplaudindo temas como Vajra, The 4 (Great Ishraqi Sun), Brazen Serpent ou Renunciation. O set foi oscilando entre os temas mais emblemáticos da banda e espaços mais respiráveis, jams que ajudaram a criar ambientes esotéricos, místicos e cinematográficos. A nível de som, as composições soaram mais “despidas” em relação aos álbuns, mais pesadas. Os trabalhos de SC3 têm uma envolvência muito forte que é difícil transpor para um palco, e nesse aspecto, as opiniões divergem: há quem ache o som menos rico e orgânico, há quem o ache mais intenso, pesado e impactante. O ponto alto do concerto foi a última música, Renunciation. A introdução ao tema foi parti-

cularmente intensa, com um diálogo bastante interessante entre o kamancheh e a guitarra, ao qual depois se juntou o violino e os riffs ska e toda a envolvência da música persa. Quem lá esteve certamente não vai esquecer este apoteótico final – agora disponível no youtube. O único senão diz respeito à própria sala na qual decorreu o concerto. O espaço era pouco para a quantidade de pessoas que lá estavam e o palco é bastante baixo, o que levou a que apenas os privilegiados das primeiras filas conseguissem ver o que se passava em palco. A música, no entanto, valeu pelo resto. A julgar pelo saldo positivo desta estreia é de esperar que os Chefes Secretos voltem a Portugal no futuro. Resta-me fazer a vénia à Soopa e à Amplificasom que proporcionaram um evento musical digno de registo para fãs de sonoridades menos convencionais e que, infelizmente, não têm ainda muito espaço no circuito portuense de espectáculos.

Depois de levar quatro bailarinos a interpretar Fernando Pessoa numa partida de futebol, o coreógrafo Paulo Ribeiro trocou a bola por sapatos altos e cinco mulheres. Em “Feminine”, o universo pessoano e o desassossego do seu heterónimo, Bernardo Soares, dançaram ao som de citações do poeta feitas pela voz do escritor e crítico Richard Zenith, uma composição de Nuno Rebelo. O quinteto feminino, formado pela actriz portuguesa, Margarida Gonçalves e quatro bailarinas de nacionalidades diferentes - ,Elisabeth Lambeck, Erika Guastamacchia, Leonor Keil,

e São Castro- subiu ao palco nos passados dias 5 e 6 Setembro do Teatro Nacional de São João para “cantar” a mensagem de pessoa em três línguas: português, italiano e inglês. (Ainda possível ver dia 22 e 23 de Novembro, na Culturgest, em Lisboa.) Num cenário futurista, colorido pela música de Bob Marley, o espectáculo desdobrou-se em saltos altos e passos de dança contemporânea, que se misturaram a vozes, monólogos, poemas e música. Em cima do palco do TNSJ, as cinco mulheres foram felinas, obsessivas, poetas. Sedução é a palavra certa para, na confusão de

puf ’s e segredos sussurrados ao ouvido, encontrar alguma coisa de constante. A ideia de Paulo Ribeiro foi interpretar a simbologia da mulher na obra do poeta e escritor português, figura que sub repticiamente, e quase de forma platónica- tirando Álvaro de Campos- tacteava quase como aparição os seus poemas. Talvez por isso, a melhor forma encontrada pelo coreógrafo foi tornar as cinco mulheres presentes confusas, perdidas num universo de contornos pouco definidos, no entanto, sedutores, jogando com a sátira, os lugares- comuns e a magia feminina.

O diálogo mudo dos olhares em contraste com a avalanche de confissões. É nesta linha ténue em que se encontram Elizabeth Vogler e Alma, personagens da peça teatral Persona, apresentada até o mês de Novembro pelo grupo “As Boas Raparigas…” e com guião do filme homónimo (1966) do cineasta sueco Ingmar Bergman. Na trama, Elizabeth Vogler é uma famigerada actriz que cessa de falar durante a representação teatral de Electra e, por isso, é internada numa clínica, onde passa a receber os cuidados da jovem enfermeira Alma. Constatada que a mudez da actriz é opcional, a analista sugere que Vogler e Alma passem um tempo numa casa de veraneio, isoladas numa ilha. O silêncio de Vogler faz com que Alma revele cada vez mais os seus profundos desejos e reminiscências, num verdadeiro monólogo observado pela actriz emudecida. Inicia-se assim o processo catártico entre ambas personagens, em que ocorre mais do que uma troca de identidades: trata-se do reconhecimento de si no outro, a descoberta de que o ser humano somente enxerga o outro por meio

de seus próprios espectros. Eis a confirmação da pluralidade do ser a partir da ideia existencialista de que as máscaras (personas) desmascaram muito mais do que encobrem a personalidade humana, uma vez que revelam as escolhas que cada pessoa faz para ser aceite no cerne social. A adaptação de João Pedro Vaz leva aos palcos os silêncios tão inerentes à obra bergmaniana não só por meio do aparato técnico de iluminação e cenário, bem como pela simbiose interpretativa das actrizes Maria do Céu Ribeiro e Sandra Salomé. A peça mantém a sobriedade numa linguagem orgânica, em que a tensão claustrofóbica exposta no filme passa a ser vivenciada pelo público na peça teatral, favorecida pelo espaço estrito do Estúdio Zero, na Rua do Heroísmo. As actrizes ora se aproximam, ora se distanciam do público de acordo com as circunstâncias de cada acto, provocando na plateia do teatro, o reconhecido marco de interactividade do cinema bergmaniano, em que muitas vezes as personagens interrompem o fluxo da acção para falar com o espectador olhando para a câmara.

As linguagens teatral e cinematográfica estão intersectadas crucialmente quando se trata do duelo entre corpo e alma. No palco, a posição corporal das personagens em cada cena garante momentos de extrema apreensão, como a repulsa que Vogler possuía à ideia de ser mãe (não é por acaso que Bergman faz referência ao complexo de Electra) e a sensualidade que une as duas personagens. Se no cinema o olhar já está direccionado, no teatro quem determina para onde olhar é o espectador. Uma adaptação consistente requer que cada forma de expressão artística seja respeitada em seu suporte, com as proporcionalidades criativas e as limitações. A isto, a peça teatral Persona tem oferecido àqueles que se permitem assistir a um intenso processo de descobertas a partir dos estilhaços de sentimentos que ficam depois de tantos medos e angústias. Persona é, sem dúvida, a prudência das inconsequências humanas, o cheiro doce das manhãs caladas, os corpos cansados pela constante vigília que a vida exige para que não se perca a direcção...

A noite começou com o já habitual ambiente descontraído e espontâneo do Porto-Rio. Desta vez, o Barco Gandufe recebeu os The Allstar Project (Portugal) e os Caspian (EUA). Um concerto para pouco mais de 50 pessoas. Eram cerca das 22h45 quando o palco se abriu para os The Allstar Project, uma das melhores bandas da cena nacional. “Polaris”, “Frienemies” e “Lasers go trough monkeys” foram alguns dos temas que espalharam pelos presentes a plenitude e, até, o orgulho no rock português. Os acordes secos e solitários enchiam a pequena sala de grandes expectativas e as batidas atiladas acabavam com qualquer dúvida que se pusesse sobre se esta banda está aqui para ficar ou não. A banda de “Your reward…a bullet” não deixou ficar mal aqueles que se deslocaram até à Rua do Ouro para os ver actuar.

Talvez, porque ainda ousam fazer música, como disseram ao JUP os guitarristas Sawyer e Nuñez: “O nosso objectivo é fazer música só. Sabemos que nunca faremos o resto (vulgares posturas associadas a famosas bandas de rock). E as chatices começam quando se deixa de fazer música. Isso ainda não aconteceu connosco e já lá vão sete anos.” Por volta das 24h os Caspian subiram ao pequeno, mas recheado e vigoroso palco do Portorio. Não foi preciso pedir: já todos se balançavam, cada um por si, a sentir bem dentro de cada um a melodia vigorosa das três guitarras, do baixo e da bateria que tomavam conta do palco. De salientar o final do concerto, quando os três guitarristas da banda se uniram ao baterista, num intenso e singular momento, tocando os quatro, a mesma bateria, acompanhada apenas pelo único baixo que permanecia, apa-

rentemente, consistente. Os críticos qualificam a sua música de “obraprima conceptual” e, naquela segunda-feira, para aqueles que lá estiveram, o termo fez todo o sentido. Em conversa com o JUP, Chris Friedrich, o baterista da banda, confessou qual o grande segredo para que assim seja: “Liberdade. Muito mais liberdade. E o palco é toda uma perspectiva diferente do mundo.” Para todos, uma surpresa. Mesmo para os que já tinha visto/ouvido. Bandas como estas são sempre um prazer. Não que ninguém esperasse um bom concerto. De certo, todos o temiam. Mas, o rock é mesmo assim, cheio de comoções melódicas, delicadas e sadias. Uma noite muda de palavras, mas gritante de música e emoção. Repleta de suor cheio e vigorante, querido e sentido. Foi intenso. Bem ao jeito do post-rock.

Feminine no TNSJ

Fernando Pessoa de saltos altos Filipa Cardoso

DR

Adaptação de João Pedro Vaz e guião de Ingmar Bergman

Persona e a vigília do silêncio Manaíra Aires

DR

Caspian e The Allstar Project

Depois do rock o que é que vem? Rita Oliveira

Rita Oliveira

não recomendado

pouco recomendado

recomendado

bastante recomendado

obrigatório


JUP NOVEMBRO ‘08 CULTURA

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recomendações

DR

Elegy Realizador

Isabel Coixet Estúdio

Lakeshore Entertainment

DR

Squarepusher Álbum

Just A Souvenir Editora

Warp Records

DR

Flight – Explorer, Vol. I Autor

Vários Editora

Villard

Há filmes comummente adjectivados de “difíceis”, devido ao facto de serem textualmente imperceptíveis, porque opacos quanto à natureza ou sentido dos recursos técnicos utilizados, ou por legitimamente serem considerados feios ou ritmicamente desinteressantes e, por conseguinte, difíceis de suportar. Elegy, de Isabel Coixet, não pertencendo a nenhuma destas categorias, encerra um certo grau de dificuldade pelo facto do seu sentido mais profundo não se manifestar na primeira apreensão que fazemos do filme. Isto, claro está, de acordo com a mais subjectiva das considerações sobre uma película pois isso do que vem a ser o “sentido último da obra de arte” tem um só dono, ainda que no exercício da crítica raramente se resista à tentação de provar e degustar a propriedade sobre a questão. Desconfie-se do crítico asceta. Elegy, baseado em The Dying Animal, de Philip Roth, apresenta-nos como figuras centrais o britânico sexagenário David Kepesh (Ben Kingsley),

um aclamado académico e radialista cujo espírito severamente descomprometido e hedonista, qual membro de um Bloomsbury Group fora de época, o levou a viver em Nova Iorque, e a pungente aluna Consuela (Penélope Cruz) que uma vez exaluna rapidamente passa a disciplinada aprendiz de cultura e também de sexo. Na órbita desta relação surge o amigo e confidente George (Dennis Hopper), cujos episódios de companheirismo com Kepesh nos proporcionam os melhores momentos de cinematografia do filme. Elegy vai além das suas temáticas mais evidentes (como a das inseguranças de uma “primavera tardia”, a do homem enquanto sexo fraco, ou até mesmo a da morte, que a etimologia deixa adivinhar) falando-nos, em última análise, do despertar de instintos básicos pela via da espiritualidade artística e estética, das pontes entre estes dois pólos, propondo a falência da tese que contrapõe o Homem comum, invariavelmente concentrado nos

seus órgãos genitais, nas palavras de Schopenhauer, ao artista enquanto ser maior e quase etéreo. Se mais assumida ou melhor explorada esta questão, mais interessante seria o filme, cujas debilidades o transformam numa obra de qualidade média: a má gestão da figura de Consuela que leva a sucessivas sequências dotadas de uma maior dignidade publicitária do que propriamente cinematográfica; uma voice-over quase sempre perdida ou inoportuna; as referências e citações artísticas fáceis porque previsíveis ou demasiado explícitas; um certo descontrolo emocional no clímax, à sombra do que sucede em obras anteriores da realizadora. Elegy não deixa de ser um filme plenamente recomendável, pela maturidade dos actores que nele intervêm, pelos inteligentes diálogos no masculino, pelo bom trabalho plástico de que é objecto, e também por constituir um passo coerente na construção da interessante linguagem que particulariza a obra de Coixet. Joaquim Guilherme Blanc

Tom Jenkinson, nome incontornável na cena IDM britânica dos últimos anos, virtuoso do baixo e arquitecto das mais improváveis composições sónicas, desde o drum n’ bass ao acid jazz, passando pela música concreta, lança no final deste mês um novo registo: Just A Souvenir. Os conhecedores mais ávidos da sua obra decerto perceberão o alarido em volta deste lançamento: Tom Jenkinson, a.k.a. Squarepusher tem percorrido ao longo de mais de dez anos um trilho de lançamentos mais que inesperado, oscilando entre géneros, desafiando convenções, ultrapassando-se a si mesmo. Just A Souvenir é o seu décimo segundo lançamento, e a questão impõe-se: o que vai ele fazer agora? Just A Souvenir é paradoxalmente igual e diferente a todos os outros álbuns de Squarepusher: igual no sentido de se esperar o inesperado, o bizarro (quase até de forma frustrante - não é para qualquer um) como em qualquer outro trabalho do músico; diferente porque todos os álbuns, ainda que orgânicos, são diferentes entre si. Este registo segue a tendência cada vez maior

do músico em descolar-se da sonoridade drum n’ bass característica dos seus primeiros álbuns e flui no sentido do jazz e da combinação improvável entre analógico e digital. Os contornos deste álbum foram desenvolvidos a partir de um suposto devaneio mental de Jenkinson – nele, o músico teve a visão de uma banda de rock a dar um concerto, que envolvia eskimós e cabides fluorescentes (coat hanger é o nome de uma faixa do álbum), entre outros delírios e psicadelismos que, no entanto, fazem sentido depois de se ouvir Just A Souvenir. É possivelmente o álbum de Squarepusher que mais se afasta da electrónica e, em última instância, não me parece muito descabido colocar-lhe o rótulo de prog-rock. Star Time 2 parece ser ainda um resquício do anterior Hello Everything, de baixo pulsante, funk e adocicada, a faixa mais catchy do álbum. Mas ao percorrer o álbum não encontramos muita convergência em termos de sonoridades: há espaço para faixas mais fáceis como a já mencionada Star Time 2 que coexistem com autênticos delírios em que o funk se transfor-

ma em jazz acompanhado das típicas batidas em contratempo. Em Coat Hanger e A Real Woman surge um elemento novo e pouco usual na música de Jenkinson – o vocoder, a remeter para o garage rock. Esta viagem de 44 minutos – outra novidade, visto que normalmente os álbuns de Squarepusher têm maior duração – conta ainda com algumas incursões, à maneira de interlúdios, em que o baixo se destaca em riffs distorcidos e os pontuais elementos electrónicos são pormenores a não descurar. Obrigatório para os fãs, desaconselhado para curiosos. Este álbum pode provocar efeitos secundários vários, desde náuseas a sensações de paranóia e frustração. Mas não é, de todo, indecifrável. Para quem reconhece em Jenkinson as qualidades de um músico não menos que genial, entende que algo como este Just A Souvenir é apenas mais um passo evolutivo no seu percurso sempre imprevisível. E, daqui a um ou dois anos a pergunta irá inevitavelmente voltar a ser feita: E agora, Squarepusher? Joana Coimbra

Cada vez mais, a antologia parece ser o futuro da banda desenhada independente americana. Nomes como “Mome”, “Flight” e “Popgun” trazem regularmente novos autores vibrantes e (cada vez mais) obras inéditas de grandes nomes do meio. Destas três (e existem mais), a “Flight” é provavelmente a mais aclamada (discutível se será a melhor – pessoalmente, o meu coração pertence à “Popgun”), pelo que o lançamento de “Explorer”, o seu novo título de colectânea virado para um público mais juvenil, é um evento a assinalar. E ao crítico, coloca uma tarefa difícil: é que para quem escreve sobre B.D., já é de praxe ter que mencionar vezes infinitas que a banda desenhada não é apenas um meio infantil, que nela podem ser contadas histórias válidas para todo o tipo de público. Com a chegada de “Explorer”, tenho agora que montar a defesa distinta que, mesmo quando falamos de arte direccionada para crianças, não há

razão porquê não deveria apelar a adultos, e isso não apenas numa óptica de escape infantil. Isso não obstante, é claro que numa obra explicitamente direccionada para um público juvenil as regras não são iguais a, digamos, as que valem para a última obra de Clowes ou Frank Miller. Não faz grande sentido debruçarmo-nos excessivamente sobre as qualidades pedagógicas de “Explorer”, mas digamos resumidamente que as melhores selecções do volume dominam bem o segredo da boa literatura infantil: a moral deve servir como um subtexto, apreendido quase subconscientemente pelo leitor enquanto este foca a sua atenção na cor, na aventura e no humor da história. O primeiro volume de “Explorer” dá-nos uma selecção de histórias eclécticas: predomina a ficção científica, mas há também lugar para fantasy, steampunk e histórias do dia-a-dia. Nesta última categoria, encontramos, a que considero a melhor

obra do volume: “Jellaby: First Snow” de Kean Soo é um episódio estupidamente querido, sempre com aquele levíssimo toque de melancolia tão tradicional no estilo; a relação entre a pequena Jellaby e o seu monstrinho aguenta comparações com duplas clássicas como Calvin e Hobbes ou Doraemon e Nobita. Na ficção científica, destaque para a anarquia bizarra de “All In A Day’s Work” (Steve Hamaker) e “Zita The Spacegirl” (Ben Hatke), que domina de forma magistral o humor metafísico do género. “Missile Mouse”, de Jake Parker, é a imagem da capa, mas trata-se do elo mais fraco na colecção: uma história feia em todos os sentidos que se fica pelos clichés da ficção especulativa. “Explorer” é, de certa forma, superior à maioria dos volumes da sua revista-mãe: com a limitação da escrita para um público menor de idade, impõe-se mais disciplina e reduz-se a tendência para a choraminguice. Daniel Reifferscheid

não recomendado

pouco recomendado

recomendado

bastante recomendado

obrigatório


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AMBIENTE NOVEMBRO´08 JUP

AMBIENTE CARROS HÍBRIDOS: AMIGOS DO AMBIENTE E DA CARTEIRA, INIMIGOS DOS CEGOS Rita Oliveira

Há já algum tempo que os carros híbridos estão no mercado e até nas estradas portuguesas, mas ainda pouco se falou sobre o assunto. O que é um automóvel híbrido? Na sua concepção actual, é um veículo que integra a energia eléctrica e a energia térmica para a sua propulsão. Emissões poluentes nulas (quando apenas o motor eléctrico é utilizado), consumo inferior com a mesma potência, incentivos governamentais que reduzem o imposto automóvel em 50% e ainda manutenção mais barata são as ofertas mais tentadores destes carros ecológico Veículos movidos a bateria ou, no caso de estar desligada, movidos a GPL ou gás natural, possuem uma avançada tecnologia que oferece ao condutor uma condução mais segura e confortável como a travagem regenerativa (o motor funciona como gerador de energia, o que vai fornecer energia eléctrica para as baterias), assistência à tracção do motor eléctrico ( é fornecia potência adicional de forma a auxiliar a combustão interna quando o veículo está em esforço) ou o sistema de paragem automática (sistema que permite a poupança de energia numa condução própria de centros de grandes cidades, ou seja, numa condução que implique muitas paragens). A Nissan, a Honda e a Toyota são três das empresas que se disponibilizaram para testar os carros híbridos em Portugal, mas a maior impulsionadora é mesmo a AHEG, empresa que clama o conforto, potência, dinâmica e economia automóvel como as suas principais intenções ao lançar no mercado português carros deste tipo. No passado ano de 2007, já se pôde registar um aumento da venda de carros híbridos (só pela Honda), conseguindo esta triplicar os valores relativos ao ano de 2006. Nos últimos tempos têm sido desenvolvidas estratégias de marketing que sensibilizem os conduto-

res e os consumidores apelando à responsabilidade social, consciência ecológica, integridade, respeito e inovação tecnológica. No entanto, há quem veja os pontos mais negativos destes carros ecológicos: o facto de o motor dos carros híbridos ser silencioso torna a viatura imperceptível para os invisuais. O motor de um carro funciona como principal indicador da sua presença para um cego e, uma vez silenciado o motor, a sua percepção tornar-se-á muito mais difícil para um peão cego. No meio da cidade o risco aumenta ainda mais pois os ruídos intensificam-se anulando

qualquer possibilidade de ouvir os sons produzidos pelos carros híbridos. Estes carros diminuem grandemente quer a poluição atmosférica, quer a poluição sonora, no entanto, para um invisual, a presença de um pequeno e perceptível ruído assume-se como fundamental para a sua segurança rodoviária. Segundo a ACAPO (Associação de Cegos e Amblíopes de Portugal), a solução passaria então por uma adaptação levada a cabo pelos movimentos internacionais de cegos.

DR

PORTUGAL SEM DINHEIRO PARA CUMPRIR QUIOTO Cláudia Sobral

Portugal não consegue respeitar os limites de emissão de gases com efeito de estufa e o fundo criado para comprar créditos de poluição está com pouco dinheiro. Os Verdes acusam o governo de adiar a resolução do problema. O Fundo Português de Carbono (FPC) está apenas com um terço das verbas previstas. O objectivo maior do fundo, é assegurar a Portugal a compra de créditos de poluição a outros países, caso não se consigam respeitar os limites de emissão de gases com efeito de estufa impostos pelo Protocolo de Quioto. Numa altura em que o prazo de cumprimento do protocolo, que vai de 2008 a 2012, está em curso, Portugal ainda não consegue cumprir esses limites. Está-se a emitir mais 40% de gases do que em 1990, quando o máximo permitido está fixado em 27%. O FPC tem disponíveis apenas 54 milhões de euros, um valor irrisório quando comparado com os 159 milhões que estavam previstos para o período de 2006 a 2008 e os 354 milhões que deverá ter em 2012. Isto porque a origem do dinheiro do FPC está na transferência dos activos financeiros, na taxa que se começou a aplicar sobre as lâmpadas de baixo consumo e, também, no aumento do imposto sobre o gasóleo de aquecimento, fontes que não renderam tanto quanto se esperava. Os activos financeiros foram transferidos para o FPC apenas em 2008, tendo os de 2007 ficado de fora, a taxa sobre as lâmpadas de baixo consumo foi criada em 2007, mas só começou a ser aplicada em 2008, não havendo, portanto, receitas relativas ao primeiro ano, e o imposto sobre o gasóleo

de aquecimento não gera lucros significativos. E para piorar a situação, está prevista uma subida dos preços do carbono até 2012. O Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (MAOTDR) reconhece que o dinheiro de que o fundo dispõe neste momento é insuficiente para comprar os créditos de poluição de que Portugal necessita. “É verdade que o cumprimento do Protocolo de Quioto, na vertente coberta pelo FPC, não fica assegurada, salvo se se garantirem novas fontes de financiamento para o fundo, como admitidas no OE 2009”, lê-se num comunicado do ministério. Joaquim Calé, assessor de imprensa do MAOTDR, considera, no entanto, que o facto de ainda não ter sido reunido a totalidade do dinheiro não significa que isso não possa ainda vir a ser conseguido dentro do prazo estipulado. “Está-se a trabalhar nesse sentido e espera-se criar novas formas de financiamento para o fundo”, disse. No entanto, não pôde precisar que formas de financiamento serão essas, dado que a resolução do problema ainda está a ser estudada. A deputada Heloísa Apolónia mostra-se céptica. Diz que “Os Verdes” já alertam os governos para a questão de Quioto desde 1997 e que o actual executivo está-se a desleixar,

mesmo agora que já entrámos no período de cumprimento do Protocolo de Quioto. Defende que em vez de se comprar créditos de poluição aos outros países, deveriam ser tomadas medidas internas para diminuir a emissão dos gases e dá o exemplo da promoção dos transportes públicos. “Os Verdes” nunca concordaram com a criação do FPC. Acham que adiar a efectiva redução da emissão de gases com efeito de estufa não vai resolver a situação. “Essa teoria de deixar tudo para o fim é muito má. O problema agrava-se e os portugueses vão pagar do bolso”, disse. “O governo preferiu criar um fundo para comprar créditos aos outros países em vez de diminuir a emissão de gases e pelos vistos nem o fundo funciona”, continuou a deputada do grupo parlamentar “Os Verdes”. Parte do dinheiro do FPC será usada para investimentos em projectos que visam reduzir a emissão de gases com efeito de estufa em diversas áreas, como a dos transportes, eficiência energética, gestão de resíduos e efluentes, processos industriais e florestas e uso do solo. Vinte e nove milhões de euros do FPC foram, já em 2006, aplicados no Luso Carbon Fund, o primeiro fundo de carbono privado português. Segundo o jornal Público, o FPC tenciona, ainda, investir quarenta e três milhões de euros em fundos estrangeiros.


JUP NOVEMBRO ‘08 DEVANEIOS 29

devaneios

SOB O EFEITO PLACEBO. Talvez a verdade fosse mentira se estivesse sob algum efeito. Poderia acreditar naquilo que normalmente não acredito. Diria até que tudo o que acreditamos não passa de uma grande mentira. Um placebo é nada mais que uma mentira. Por outro lado, e se a mentira fosse o reflexo da verdade? O que não existe e se dá nome é mentira, então, o que não se vê, por exemplo Deus, pode ser uma mentira, mas grande parte das pessoas acreditam na sua existência, sendo assim uma verdade. Posto isto, a verdade de uns é a mentira de outros. E, embora tudo seja causa ou efeito do que nos rodeia, o que é certo é que necessitamos de acreditar para tornar as coisas verdade. Ora, um político acredita no seu discurso e torna-o verdade. Desta forma, capta a atenção do público acabando por o conquistar, independentemente do que diga. A verdade deixa, então, de ser fruto da nossa decisão e passa a ser daquele que melhor a souber defender. Talvez tudo fosse mais fácil se estivesse sob algum efeito. ricardo araújo

Que seja sob o efeito placebo.

A página Devaneios está aberta à tua participação. Envia os teus textos e fotografias para jup@jup.pt


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OPINIÃO NOVEMBRO´08 JUP

OPINIÃO Festim Nu Miguel Carvalho (migueldeazevedocarvalho@gmail.com)

CONTRA O BRASIL MAIS OU MENOS Ganga Impura é o nome de uma recém lançada colecção da Bertrand apadrinhada pelo escritor Francisco José Viegas. O nome deste conjunto vem, certamente, do soneto “Língua Portuguesa” de Olavo Bilac – um brasileiro – o que descreve na perfeição o que esta colecção se propõe. Na capa do primeiro número lê-se “Contra o Brasil”, assina Diogo Mainardi – brasileiro, outra vez – e aqui é assinalável a incursão pela ficção brasileira quando geralmente nos quedamos pelas crónicas (de Veríssimo e em viagem aérea para Porto de Galinhas, de preferência) ou anúncios nos Classificados. Nada contra o cronista por cá editado pela Ambar, até porque capas com altos-relevos são a melhor invenção desde a HP 660c, mas há coisas que cheiram mal quando passam do prazo. Aqui, colecção literária séria e humilde coluna de opinião, o que se quer é mostrar o Brasil invisível, ou “Brasis”, cortesia oitocentista. O livro de Mainardi é protagonizado por um anti-herói que usa sem parcimónia do humor destrutivo contra qualquer noção de nacionalismo e resulta numa longa pesquisa do autor de comentários anti-Brasil ao longo do tempo protagonizados por diversas personalidades (Eça, Darwin, Camus, etc). Apresentações feitas, alguma opinião. Depois de colonizador militar, Portugal é hoje colonizado pelo Brasil. Não que isto se configure necessariamente uma ameaça ou um triste fado, até porque “contaminação cultural” é um conceito que faz tanto sentido como o de “prazer culpado”. Os prazeres são para serem vividos de cuecas na mão e xaropes nada têm a ver com cultura. O problema é a taxinomia dessa cultura miscigenada, qual é o Brasil que conhecemos? O Brasil é tanto “padres e senhores doutores” como só “Garota de Ipanema”. Alegria festiva, demência exuberante e edénica, tropicalismo à flor da pele? Sim, as crianças nos posters de propaganda maoista também estão sempre a

sorrir. Um país que é quase um continente não pode ser um caldo verde-e-amarelo de profissionais da boa disposição. Até como produtor de novelas parece ultrapassado e ultimamente fala-se mais nele por força do Acordo Ortográfico (apoiado por pessoas de grande elevação lusófona como o angolano Águalusa) do que por outra coisa qualquer. Temos sempre, ontem como hoje e amanhã, o futebol: nem o Prémio Camões 2008 escapa à tirania benigna da torcida e de cinco taças do mundo e, verdade seja dita, pouca gente escreve tão bem sobre futebol como eles. Mas o futebol de rua, viveiro de talentos incontáveis, também existe na Holanda, mas por lá chama-se “Voetbalstrat”. A bossa nova hoje não é mais que um género ideal a exercícios de autofagia, ou então um new-lounge composto por versões estéreis e agónicas do britpop com cheiro a Brasil. É tão representativo de um país como um postal. Ficado pela música, há uma miríade de brilhantes artistas brasileiros que vale a pena descobrir (perdão: “achar”). Não estou a pensar no tédio sónico de gente como os Tribalistas ou Adriana Calcanhoto, mas na escatológica poesia de Rogério Skylab, no esforço comovente de Sónia Rocha, no tresloucado amadorismo de Marli, nas rimas esvoaçantes de Ronei (“o poeta da rima”) e nas bandas de frevo e forró que anunciam o nome da gravação no início do primeiro tema do DVD número três (Limão Com Mel, Aviões do Forró, etc). Já alguém pensou em trazer ao palco da Queima gente como a Xuxa? Não percebo qual é o critério de programação que ela não cumpre e nunca vou perdoar à FAP (ou seja a quem for) não poder assistir ao tema “Meu Cãozinho Xuxo” interpretado ao vivo. E para os adeptos mais fervorosos do “brasileirismo militante” atente-se à amplitude de registos emocionais entre o efusivo Ângelo Máximo (“Domingo Feliz”) e o pudibundo triste Gilliard (“Aquela nuvem que passa”, uma espécie de Panda Bear da sertaneja), contra-

riando qualquer lombrosianismo brasileiro numa batalha em que o vencedor é o ouvinte atento. Roberto Carlos, o rei? O meu é Odair José, o “Bob Dylan da Central Brasil”, sempre equilibrando um sorriso triste (e brega) na cara. Os exemplos são quase inesgotáveis. Destaque ainda para o neófito Jorge Vercilo e a sua paixão canibal pela popculture: “Prazer! Me Chamam de Homem-Aranha, seu herói” ou “Monalisa, seu quase rir ilumina tudo ao redor”. Sem nunca esquecer Márcio José e as suas óperas do quotidiano, um quase-Woody Allen sul-americano, os Cavaleiros do Forró como reis do duplo sentido (“Chupa que é de Uva” VS “Senta que é de Menta”) e todo esse capim, mais verde quando verde e amarelo. Ou as edições de gibis da Abril. Ou as piadas do Costinha, o Solnado que atravessou todo o oceano que nos une à distância de um abraço em português.

nho. Espero que não da maneira dele. Não sei se Deus é brasileiro, mas se for, e como diria João César das Neves, deve ser horrível. Mas pode ser mulher. Estou só a confabular, ou melhor, estou a ser pitequeiro. Esta coluna devia-se chamar “postulado pitequeiro”. Para o final deixei o melhor: sabem por que em Portugal não há mais árvores? Cortaram todas em busca da raiz quadrada. Adeus país dos bons selvagens.

Recentemente, descobri um user brasileiro no YouTube, extremamente bélico e agressivo, com grande certeza que o futuro será canari-

têm a ver com cultura.”

“Os prazeres são para serem vividos de cuecas na mão e xaropes nada

F. O.Dias

Rita Falcão Monteiro (ritafalcao@gmail.com)

A NECESSIDADE AGUÇA O ENGENHO Eis o admirável mundo novo: milhares de licenciados - ou, num futuro próximo, mestrados com a graça de Santa Bolonha - saem todos os anos para o mercado de trabalho, cheios de entusiasmo. Munidos de um canudo e de um sorriso, não fazem ideia do que os espera. Cheios de esperança sobre os ombros; esta depositada pelos pais, professores, amigos e irmãos. Querem ser donos deste mundo, querem projectos importantes, um gabinete com o nome da porta, uma cadeira de couro, giratória e com espaldar alto. Querem trabalhar sem se preocuparem com dinheiro, desde que o tenham para a vida cheia de cultura ou viagens com que sonham. Quando caem no mundo – no mundo real, digo – é tudo diferente (desiludem-se, eles). Não basta o currículo, o diploma com boa média. Não basta ser metódico e responsável – coisas que nem o currículo nem o diploma revelam – tem de haver sempre mais qualquer coisa. A preocupação destes jovens licenciados já não é com o que vão receber, mas se o emprego que agora têm,

amanhã ainda existe. O problema já não é a pouca qualificação dos trabalhadores, mas sim o excesso dela, para as funções postas a concurso - se isto não tivesse a ver com escalões de salário que os patrões não querem pagar, era tudo muito bonito: seríamos um país de elites intelectuais. Isto só aumenta a probabilidade de úlceras e esgotamentos aos próprios desempregados e aos pais, que não vêem retorno no investimento que fizeram na formação superior. Mas há soluções várias para estes pobres novos desempregados. Na maior parte das vezes, é o sorriso. É o que nos faz conseguir o emprego, e não necessariamente trabalhar. São as interacções pessoais e as interligações sociais, são as bajulações em tempos de faculdade, são favores e mercês disponibilizados, é boa-vontade gratuita – sempre previstas de antemão, sem cálculo exacto das proporções destas operações arriscadas. Aí estão sempre sorrisos envolvidos. O ‘sorriso’ também acontece através de um tio, grande amigo do futuro patrão, um amigo que “até tem uns connects” e que

pode facilitar a entrada num determinado meio, ou só mesmo o sorriso despudorado de quem não tem nada a perder e quer subir a escada da vida a galope, derrubando aqueles que não se seguram bem nos seus lugares. Há dois tipos de sorrisos: os de quem sabe o que quer e os simpáticos, solícitos, mendigando a esmola. Esses normalmente esmorecem passado pouco tempo, ficando baços e pálidos. Tornam-se revoltados, imobilizam ao fim do pouco tempo em que esperam pelas esmolas do mundo laboral – que não vêm. Depois procuram outras soluções: sorriem a empregos fora da área – quando a inocência já se lhes foi -, ao telemarketing, a estágios de 3 a 6 meses não remunerados – ou mais, porque “conta para o currículo” -, e até dão um sorriso azedo à derradeira cadeira do supermercado – não é de couro nem tem espaldar alto, mas, vá lá, é giratória. Pormenores. Aqueles que procuram outros voos, aventuram-se em estágios profissionais internacionais – e aí o currículo ganha um bónus cho-

rudo – ou mesmo experiências de mobilidade ainda no curso superior – com equivalências manhosas e muitas festas - mas sempre com o dito “enriquecimento sociocultural”. Os que gostam mais do “lado de lá” do que da província tuga, enfiada cá no sul da Europa e rodeada de uma Espanha que nos ultrapassa em larga escala, por lá ficam. Alguma vantagem há-de ter esta mobilidade que o espaço Schengen – e outros que tais, neste mundo global - instituiu, que nos permite procurar uma outra vida à nossa escolha, sem entraves políticos, onde os licenciados possam ser seres humanos realizados e dar o seu “contributo à humanidade”. Mas, se assim é, que o nosso país tem quase mais licenciados do que telemóveis ou festivais de verão, defeito algum se pode apontar aos “espertos” que abandonam o nosso país, que carece de investimento interno, para se tornarem grandes nomes em países estrangeiros. Migração qualificada em massa? Não deve demorar para acontecer.


JUP NOVEMBRO ‘08 OPINIÃO 31

Sara Moreira

HOJE NÃO ME VOU QUEIXAR Ai é tão longe, e doem-me as costas, ui que não tenho dinheiro, e a gasolina está tão cara, aquele gajo só me quer lixar. Não arranjo emprego, é tudo tão difícil, não consigo fazer nada, o trânsito, as compras. O verão fora de época, e a ela dói-lhe sempre a cabeça, a mim ninguém me compreende, os meus pais são forinhas, e este quer ultrapassar-me. Estás cheio de pressinha!! “Raisparta” o fumo, o barulho, o stress. Existe um agente infeccioso que paira sobre os ombros das boas gentes desta terra. É geral: todos insistem em problematizar. E o errado nisto é que esse brainstorming de tudo o que é mau não funciona como alavanca na busca de soluções que confortem. Este agente infeccioso altamente contagioso, tem o dom de colar à pele uma máscara. A da fusão do coitadinho. Para quem vem de fora, vê no Porto, se despido desta doença, uma cidade viva, agora de Baixa ressuscitada e coisas, eventos, turistas, casas lindas. Eu cá não vejo melancolia alguma. Mas ouço-a, quando sobre mim cai o eco das pessoas. Porque será tudo tão complicado? Aos raros excêntricos, que se permitem a liberdade de acreditar, olha-se como patetas alegres. Coitados, andam tão enganadinhos!... E fazem coisas estranhas, como trazer estojos de lápis de cera nos bolsos, ou flores nas mãos. E aquela expressão na cara! De sorriso ao desbarato, como se fosse de se dar nos dias que correm!... Isto dizem eles, verdadeiros coitados. Eles invejam porque “só a nós, os valentes, ocorrem ideias extraordinárias”, disseram-me em tempos. E quem contou essa, também ofereceu outra história, valiosa, extraordinária. Num arquipélago tropical vulcânico, um milionário passeia no seu iate até atracar numa ilhota onde um pescador assa o seu peixe na fogueira. Diz-lhe o milionário que arranje um barquinho para que possa encontrar mais peixe e vender o que não precisa e com isso pode depois arranjar um outro barco, dividir tarefas, investir os lucros, abrir um negócio de conservas, guardar o excesso, para depois construir uma casa espectacular. O pescador pergunta-lhe só o que fazer depois de ter essa casa e todo o dinheiro. O milionário diz-lhe que aí pode des-

cansar, viver tranquilo. “Mas isso é o que faço agora”, responde o pescador. Um destes dias, enquanto subia uma das muitas montanhas que o Porto tem, ali ao lado de Mouzinho da Silveira, na rua de São João Novo, sentia o leve esforço que desperta o estar bem. Lá ao fundo ouvia alguém a cantar muito afinado, mas muito muito alto, alguma coisa romântica em inglês. Cada vez mais próxima a voz, mais e mais intensa no desenrolar da acção, em direcção a mim, ele vem… é este? Não! E passa o miúdo de 7 anos, oculinhos catitas, para o gorducho, com headphones, a interpretar cheio de feeling a balada do novo século. Enquanto ele descia em direcção ao Cubo na Ribeira, as pessoas paravam, vinham espreitar às portas das lojas, às janelas. E depois riam-se de tão inusitado cenário! Daqui compreendo que o estado de espírito com que interpretamos as rotinas da nossa vida (que nada mais são do que a vida em si), depende do quão ágeis somos no balanço entre o deixar estar – aceitar, sem querer influenciar – e a marca da nossa diferença. A auto-determinação, que me permite saber, segura, que hoje, não me vou queixar. Vou cantar aos berros na rua, vou mostrar-me disponível, vou contar uma história, ensinar alguma coisa, a fazer um origami, vou por aí, aproveitar aqueles momentos em que sou só eu e a cidade. Vou sorrir sinceramente por conseguir ver nos gestos das pessoas que estão vivas, e sentem. E com isto quero dizer o que se segue. Que está agora a começar o ano lectivo, ou o sexto bimestre, ou o Outono (pode escolher-se um começo aleatório). Está agora a começar um novo dia, e era lindo se, pelo menos durante este novo dia que começa, todos não problematizassem. A ver se o agente cai dos ombros para o chão, espezinhado por quem acredita que a vida pode ser boa, sem queixinhas.

Daniel Reifferscheid

A ÚLTIMA SEDUÇÃO Quando bateram à porta do meu escritório, eram duas da tarde e a minha cabeça doía como se alguém estivesse lá dentro a re-encenar a batalha da Baía dos Porcos. Estava a sofrer duma ressaca descomunal – demasiadas caipirinhas, demasiadas noites a dançar Nu Metal no Pherrugem. Já não tinha idade para essas coisas. A minha auto-medicação consistia em quantidades prodigiosas de café e na última edição do “Paródia Nacional”. Contacto com o mundo exterior? Impensável. - Entre lá! – disse eu, para me ver defrontado com a figura familiar de Miguel Carvalho. Um homem inquieto de temperamento febril, recursos extensos e barba saliente. Não era a primeira vez que procurava os meus serviços, mas desta vez seria diferente. - Daniel, tenho uma proposta para ti – lançou ele, esvaziando uma mala cheia de dinheiro na minha mesa. - Isto é para quê? - Um artigo de opinião.

- Não! – a violência no meu tom era mais que aparente – já não alinho nestas coisas. Tenho um emprego de secretária como presidente do NJAP/JU; paga bem, dá prestígio na comunidade e não tenho que arriscar o meu pescoço. Voltar para o jornalismo? Voltar aos bairros de lata, aos locais de má fama, aos espancamentos rotineiros e ao fedor da sarjeta? Nem se me prometesses a Rita Hayworth, meu amigo. O Miguel não parecia ter sido convencido pelo meu discurso: - Daniel, não te estou a pedir que voltes. Apenas que faças um último trabalho. Olha, o jornal tem um espaço em branco. – disse, apontando para uma mancha fantasmagórica na edição do JUP que tinha trazido. - Ainda não entendeste? Estou fora. “Finito”. Isto já não é o meu mundo: não odeio o Brasil, não sou desempregado e se tivesses noção da enxaqueca com que ando decerto entenderias que não é hoje que não me vou queixar. - acendi um cigarro, em

desespero. - E no entanto escreves para cultura. – acusou o meu interlocutor, sorrateiramente. - Isso é diferente, Miguel. Escrever para cultura é quase como ter um blog ou lavar os dentes. Vem naturalmente às pessoas civilizadas. - Mas o mundo precisa de ti! Tudo indica que o Obama vai ganhar, e depois como fazer? A grande maioria dos colunistas nos jornais diários vai estar sem assunto se não podem despejar ódio sobre os americanos. Precisamos de gente como tu, que odeia coisas mais triviais. Precisamos de…Ideologia & Bolachas. Ideologia & Bolachas. O nome soava tão oco na minha mente, depois daquela fatídica noite. Ainda consigo ouvir os gritos, o terror que se instalou quando o triste dramaturgo cuja peça eu tinha descrito como “algo que Ibsen teria feito se fosse béda estúpido” sacou o seu copo de leite e, im-

placável, as devorou assim mesmo, à minha beira. Desde então não conseguia escrever. - Vá lá – o maldito editor parecia adivinhar os meus pensamentos – fá-lo pelas bolachas. Elas não teriam querido que ficasses assim. - Maldito sejas, Carvalho. Sim, vou escrever a tua danada coluna – mas só desta vez, ok? Depois disto, estás por conta própria. Como um comboio na noite, percebes? - SHALOM! – gritou Miguel, enquanto os seus braços me apertavam num abraço que faria crer que eu tinha acabado de salvar a sua avó e deixado afogar a sua sogra – 3000 caracteres, e vê lá se entregas a tempo, ok? O confronto bélico na minha cabeça tinha passado da guerra moderna para conflitos líricos da Idade Média, em vez de canhões sentia somente flechas. E já não via tudo em triplicado. Sentei-me na cadeira e comecei a digitar.

FICHA TÉCNICA DIRECÇÃO DO NJAP/JU – Presidente: Daniel Reifferscheid. Vice-Presidente: Cíntia Morais. Tesoureira: Marta Leal. Vogais: Luis Lago (JUP), Filipa Mora (aguasfurtadas), Miguel Carvalho (espaços JUP), Tiago Cruz (galerias) DIRECÇÃO DO JUP - Director: André Vieira; Directora de Paginação: Ana Rita Monteiro; Director Fotográfico: José Ferreira. Editores - Educação: Cristiana Afonso; Sociedade: Mariana Duarte; Cultura: Filipa Mora; Internacional: Luis Lago; Economia: Tiago Pereira; Opinião: Miguel Carvalho Colaboraram nesta edição (por ordem alfabética) : André Vieira, Ana Ribeiro, Ana Rita Monteiro, Ana Sofia Moura, Bruno Monteiro, Bruno Silva, Cátia Monteiro, Cláudia Sobral, Cristiana Afonso, Daniel Reifferscheid, Filipa Cardoso, Filipa Mora, Francisca Fortuna, F. O. Dias, Joana Coimbra, Joaquim Guilherme Blanc, Jonathan Turk, José Ferreira, Luís Lago, Mafalda Ferreira, Manaíra Alves, Manuel Ribeiro, Marília Cunha, Mariana Duarte, Marco Eira, Miguel Carvalho, Renato Amaral, Ricardo Alves, Ricardo Araújo, Ricardo França, Rui Vilas, Sara Araújo, Sara Moreira, Sara Riobom, Tiago Pereira. Imagem da Capa: Ana Ribeiro I.C.S.: n.º113204/88 Depósito legal: n.º 23502/88 Tiragem: 10.000 exemplares. Design Logo JUP: Bolos Quentes; Design Editorial/Grafismo: Ana Rita Monteiro/Ricardo Araújo; Paginação: Ana Rita Monteiro; Pré-impressão: Jornal de Notícias, S.A. Impressão: Naveprinter - Indústria Gráfica do Norte, S.A. Propriedade: Núcleo de Jornalismo Académico do Porto / Jornal Universitário. Redacção e Administração: Rua Miguel Bombarda, 187 - R/C e Cave / 4050-381 Porto / Portugal / Tel: 222039041 / Fax: 222082375 / E-mail: jup@jup.pt / Apoios (2007): Reitoria da Universidade do Porto, Serviços da Acção Social da Universidade do Porto, Instituto Português da Juventude


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