O Turismo de Aventura na Região Amazônica: desafios e potencialidades Mirleide Chaar Bahia Tânia Mara Vieira Sampaio 1- Introdução A Região Amazônica, com sua biodiversidade, instiga interesses diversos e vem sofrendo conflitos de toda ordem, no que se refere à apropriação de áreas naturais e exploração de seus recursos. Problemas complexos, relacionados à grilagem de terras; à exploração de áreas indígenas; aos desmatamentos sem autorização e controle; a biopirataria, entre outros; tem propiciado incertezas, em nível Nacional e Internacional, sobre o futuro das áreas naturais e dos povos da floresta ali residentes. Paralelamente aos noticiários sobre os problemas enfrentados na região, o trade turístico empenha-se na divulgação da “exuberância” dos ecossistemas, dos inúmeros acidentes geográficos, dos rios caudalosos e da diversidade da flora e da fauna. Um dos grandes “trunfos” para tal divulgação é a facilidade mercadológica do termo “Amazônia”, conhecido mundialmente e vinculado à idéia de “exótico” e “ecológico”. Conviver com paradoxos complexos e tentar encontrar um caminho que possibilite a promoção de um desenvolvimento mais equilibrado e sustentável, significa o enfrentamento de conflitos sócio-ambientais (o mais recente exemplo é a tentativa de criação de uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável no Pará, culminando com a morte da irmã Dorothy Stang), da omissão histórica do Poder Público (áreas Federais sem demarcação e fiscalização), das pressões internacionais (notícias e declarações sobre a intervenção internacional na Amazônia), dos danos ambientais de grandes projetos de desenvolvimento realizados na região (extintos Projeto Jarí e Projeto Mineração Rio Norte) , entre outros. Na busca por soluções dos inúmeros problemas vivenciados pela Região Amazônica e adotando-se a lógica do lema estabelecido na Agenda 21: “pensar globalmente e agir localmente” (CONFERÊNCIA..., 2001), muitas têm sido as
alternativas propostas por vários setores e por atores diversos da sociedade, independentemente das ações empreendidas pelo Poder Público. Organizações não-governamentais (ONGs) e outras Instituições criadas com o objetivo expresso de defesa do patrimônio social, ecológico e cultural da Amazônia através de pesquisas ou intervenções práticas, vêm lutando para a concretização de projetos que possam integrar ser humano-natureza numa lógica de vivência de um novo paradigma, pautado em valores mais humanos, e afinados com os preceitos do “ecodesenvolvimento“ (SACHS,1993), que popularizou-se mundialmente pelo termo “desenvolvimento sustentável”. Na lógica do rompimento com modelos de crescimento econômico exacerbado e desequilibrado entre classes sociais, degradação da natureza e desrespeito à cultura dos povos, o Ecoturismo surge como uma das alternativa de estabelecimento de uma nova lógica, fundada nos princípios do desenvolvimento sustentável. Apesar de existirem contradições em suas concepções teóricopráticas – fato que mereceria uma abordagem extensa e profunda em um outro texto – o objetivo deste artigo é o de demonstrar o aumento da procura por vivências de lazer em áreas naturais da Amazônia, sob a forma de ecoturismo e turismo de aventura. Dentre os projetos que têm sido elaborados e implementados na Amazônia, tanto em nível governamental, como em nível não-governamental, os que fazem referência ao uso público em áreas naturais (delimitadas legalmente como Unidades de Conservação ou não), como forma de lazer (Ecoturismo, Turismo de Aventura, Atividades Físicas na Natureza) serão, portanto, o foco principal de discussão deste artigo.
2- Abordagem conceitual
Compreender novas lógicas de relacionamento ser humano-natureza requer embasamento sobre os novos paradigmas propostos para a quebra de um modelo hegemônico de desenvolvimento, baseado somente em agregados macro-
econômicos1 e que desconsideram o Bem Estar das populações como objetivo de fundo a ser perseguido. (FIGUEIREDO, 1999) A noção de que se tornara urgente e necessário um novo modelo de desenvolvimento, surge a partir de preocupações levantadas na I Conferência Mundial sobre Meio Ambiente, a Conferência de Estocolmo, em 1972. Essas idéias começaram a surgir, como nos mostra Franz Bruseke (1993). Ignacy Sachs (1993) e Olivier Godard (1997), a partir das preocupações dos pesquisadores do chamado Clube de Roma, através do estudo “Limites do Crescimento”, conjuntamente com a Conferência de Estocolmo. Possuíam uma preocupação com o crescimento populacional mundial, estabilização da relação economia versus ecologia e a conscientização e participação da população mundial. Mas essas primeiras idéias surgem com a premissa de um “congelamento do crescimento da população global e do capital industrial” (Bruseke, 1993, p.2), baseada no crescimento zero,e, portanto, criticada principalmente pelos países em desenvolvimento. (FIGUEIREDO, 1999, p.81)
As discussões continuam, resultando, posteriormente, num relatório denominado Relatório Brundtland, no qual são construídas as noções de Ecodesenvolvimento e de Desenvolvimento Sustentável, sendo o segundo termo o adotado para a utilização em documentos oficiais, com o aval da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), da Organização das Nações Unidas (ONU). Em essência, o desenvolvimento sustentável é um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender às necessidades e aspirações humanas (CMMAD, 1988, p. 49)
Para Ignacy Sachs (1993), as dimensões a serem observadas devem ter uma amplitude bem maior, capaz de abarcar aspectos defendidos inicialmente pelo “ecodesenvolvimento”, tendo cinco eixos norteadores: 1) sustentabilidade social: a meta é construir uma civilização com maior eqüidade na distribuição de renda e de bens, reduzindo o abismo social; 2) sustentabilidade econômica: privilegia a alocação e o gerenciamento mais eficiente de recursos financeiros; 3) sustentabilidade ecológica: propõe novas formas de relacionamento entre o consumo humano e os recursos naturais, desde a limitação do uso até a 1
“Índices como renda nacional, produto interno bruto, etc, que geralmente são usados para detectar a situação das nações” (Figueiredo, 1999, p. 80)
reutilização destes através de reciclagem; 4) sustentabilidade espacial: expressa principalmente nas relações das áreas rurais e urbanas, combatendo a centralização em áreas urbanas; e por fim; 5) sustentabilidade cultural: valorização de formas diversas de relação ser-humano natureza e diversidades culturais, através da etnociência, por exemplo. A busca de novos paradigmas, que transformem conhecimentos, conceitos e teoria em efetiva atuação prática, não é um processo automático e requer a conscientização do Poder Público, da sociedade como um todo e de cada indivíduo em suas ações diárias e cotidianas. É um processo dialético entre educação-reflexão-ação. Ou segundo Tânia Sampaio Esse debate nos coloca novamente diante da necessária crise de percepção que apresenta a interdependência de tudo o que forma o ecossistema e produz vida na forma de desafio para pensarmos os seres humanos como parte dessa grande "teia da vida". Uma visão que certamente terá que abdicar da concepção de centralidade. Seja ela divina ou humana ou cósmica. Nem mais teocêntrica, nem mais andro/antropocêntrica, nem qualquercoisacêntrica! Afirmamos aqui, provisoriamente, uma concepção que "explode" o centro para dar lugar a uma concepção de relações de mútuas interdependências; sem que isto desqualifique o ser humano, mas o re-signifique na relação de perceber-se como parte necessária e com necessidades de toda a complexa e múltipla diversidade do que existe no ecossistema. (SAMPAIO, 2002, p.91)
No texto de Felix Guattari (1990), é possível perceber algumas preocupações com as intensas transformações no planeta e os resultados que estas vêm causando nos indivíduos e na sociedade, inclusive citando que as relações subjetivas estabelecidas entre familiares, entre amigos, entre vizinhos e entre ser humano-natureza têm-se deteriorado muito nos últimos tempos, como reflexo de alguns valores e atitudes vividos na atualidade. É possível perceber que há uma interligação entre problemas vivenciados no seio das relações familiares, das relações de trabalho, das relações entre gêneros e das relações com o meio ambiente, e que estes problemas dizem respeito à subjetividade humana, pois como defende Felix Guattari , (...) é nesse contexto de ruptura, de descentramento, de multiplicação dos antagonismos e de processos de singularização, que surgem as novas problemáticas ecológicas (...) parece-me que elas evocam uma problematização que se torna transversal a essas outras linhas de fratura. (GUATTARI, 1990, p. 14).
A problemática ambiental, mais que uma crise ambiental, é um questionamento do pensamento e do entendimento sobre os valores vividos na atualidade e as relações estabelecidas na sociedade capitalista no que se refere à busca de um desenvolvimento pautado na lógica de dominação da natureza e dos recursos naturais. No caminho de indicação de uma nova maneira de viver e compreender as relações e no estabelecimento de um novo paradigma, ao se discorrer sobre as questões do Meio Ambiente, é possível concordar com Felix Guattari (1990), quando o mesmo afirma a importância da compreensão e da defesa de uma ecologia pautada não apenas numa consciência parcial dos perigos mais evidentes que ameaçam o meio ambiente natural e em perspectivas tecnocráticas, mas sim numa perspectiva que possa levar em consideração outros aspectos: [...] ao passo que só uma articulação ético-política – a que chamo ecosofia – entre os três registros ecológicos (o do meio ambiente, o das relações sociais e o da subjetividade humana) é que poderia esclarecer convenientemente tais questões. (GUATTARI, 1990, p.8)
Numa lógica de compreensão dos desequilíbrios ecológicos, ameaçando a vida em sua superfície, paralelamente à deterioração dos modos de vida humanos individuais e coletivos, o autor considera que não é possível haver uma verdadeira resposta à crise ecológica, se não houver uma “autêntica revolução política, social e cultural reordenando os objetivos da produção de bens materiais e imateriais” (GUATTARI, 1990, p. 9), ocorrendo não apenas em relação às forças visíveis, mas em escalas de domínios moleculares de sensibilidade, de inteligência e de desejo, nas quais a subjetividade humana está intimamente relacionada. As atitudes adotadas por cada indivíduo em relação ao seu consumo de energia; produção e destinação de seu lixo; comportamento em áreas urbanas e/ou rurais, enfim, suas ações “locais” (sua casa, sua comunidade, seu bairro, sua cidade), reflete-se em conseqüências “globais”. Ao se basear no lema proposto pela Agenda 21 (CONFERÊNCIA..., 2001), “Pensar globalmente e agir localmente”, cabem ações locais, considerando-se as peculiaridades de cada região e os anseios e necessidades daquela comunidade local. Isso vem se refletindo na construção de Agendas 21 Locais, que pretendem
estabelecer metas e ações locais, capazes de contribuir com a construção de um mundo melhor, com maior eqüidade sócio-econômica e maior sustentabilidade. Na Região Amazônica, o caminho não tem sido diferente, levando-se em consideração que alguns Municípios já fazem parte de tal discussão e elaboração de “Agendas Positivas da Amazônia”, com o compromisso de deter o elevado ritmo do desmatamento e pactuar democraticamente conjuntos de compromissos a serem buscados a fim de uma construção prática de novos modelos de desenvolvimento, calcados na sustentabilidade. (Ministério do Meio Ambiente MMA, 2005a) Segundo a Secretaria de Coordenação da Amazônia do MMA (2005a), as propostas são abrangentes e visam balizar as políticas e ações governamentais (agendas positivas estaduais e regional) em relação a região, construídas por meio de amplas consultas e participações dos Parlamentos, Governo nos três níveis,
movimentos
sociais
organizados,
representações
de
segmentos
comunitários tradicionais, entidades privadas, Organizações Não-Governamentais (ONGs), técnicos e cientistas mobilizados em todos os nove Estados que compõem a Amazônia Legal (Amazonas, Pará, Rondônia, Mato Grosso, Acre, Amapá, Tocantins e Maranhão). Contemplando aspectos variados, compõem a Agenda Positiva da Amazônia, as seguintes propostas: *Zoneamento Ecológico-econômico; *Infra-estrutura (transporte e energia); *Geração Sustentável de Emprego e Renda: -Agroextrativismo; -Produção Florestal; -Pesca; -Agropecuária; -Ecoturismo; -Biotecnologia *Licenciamento Ambiental em Propriedades Rurais;
*Instrumentos Econômicos; *Política Fundiária; *Áreas Protegidas; *Áreas Indígenas; *Ciência e Tecnologia; *Monitoramento e Controle Ambientais; *Serviços e Benefícios Ambientais; *Educação para Gestão Ambiental; *Recuperação de Áreas Alteradas; *Gestão Ambiental Urbana; *Fortalecimento Institucional; e *Legislação.
FONTE: MMA, 2005a (grifo acrescentado)
Cabe ressaltar um dos itens pontuados nas discussões da Agenda Positiva da Amazônia, foco relevante para os objetivos deste texto: o Ecoturismo. As interconexões entre este e o desenvolvimento sustentável e suas nuances no
processo dialético das relações ser humano-natureza, são aspectos a serem considerarados. A busca de experiências de lazer em ambientes naturais tem se manifestado através do interesse2 por dois conteúdos culturais3: atividades turísticas (Ecoturismo e Turismo de Aventura) e atividades físico-esportivas (esportes de aventura). Mas é preciso refletir em que lógica de valores tais atividades têm sido vivenciadas, na medida em que é possível romper com a lógica voraz do mercado; com a busca de “consumo exacerbado”; com a vivência alienada do lazer; com a busca de compensação e fuga da realidade; com o “uso” não sustentável da natureza; com a vivência de valores individualistas. O Lazer, enquanto manifestação humana e direito inalienável das pessoas, traz em seu bojo possibilidades de contestação e mudança de valores, que expresso através de ações culturais, pode possibilitar a transformação do estilo de vida das pessoas. Mas para isso é preciso compreendê-lo, não como um instrumento de dominação e de alienação, que impede a visão crítica das pessoas e camufla a realidade e os conflitos sociais existentes na sociedade, e sim como uma perspectiva de outras vivências modificadoras de valores e atitudes. (...) situações de lazer geradoras dos valores que sustentam a Revolução Cultural do Lazer. São reivindicadas novas formas de relacionamento social mais espontâneas, a afirmação da individualidade e a contemplação da Natureza. Observam-se mudanças nas relações afetivas, nas considerações sobre o próprio corpo, no contato com o belo, em síntese, na busca do prazer. (MARCELLINO, 1983, p. 15)
Portanto, a concepção de Lazer enraizada nos valores capazes de propiciar o descanso, o divertimento e o desenvolvimento individual e social – fundamental para a presente abordagem –, encontra-se na proposta de Nélson Marcellino (1987) que associa estas ações humanas, marcadas pela livre adesão e o prazer, com um entendimento de cultura em seu sentido ampliado. O Turismo Ecológico ou Ecoturismo surge como uma alternativa de se contrapor à lógica do turismo de massa (estandardizado e predatório), e procura 2
O interesse deve ser entendido como o “conhecimento que está enraizado na sensibilidade, na cultura vivida” (DUMAZEDIER, 1980, p. 32) 3 Joffre Dumazedier (1980), propõe que de acordo com o interesse das pessoas, os conteúdos culturais do lazer podem ser concebidos em cinco modalidades: atividades sociais; atividades físico-esportivas; atividades intelectuais; atividades manuais; atividades artísticas. A estes, Luiz Otávio Camargo (1992), acrescenta o conteúdo das atividades turísticas.
cada vez mais defender a proposição de roteiros personalizados, preocupados com o mínimo impacto e com grande interesse paisagístico-ecológico. (SERRANO, 1997) No documento “Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo”, lançado em 1994 pelo Ministério da Indústria, Comércio e Turismo – MICT e pelo Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal – MMA, o Ecoturismo, que se traduz numa multiplicidade de vivências em áreas naturais4 – dentre estas, algumas atividades físicas na natureza (nem sempre vinculadas à aventura e ao risco) e o Turismo de Aventura (atividades com características mais fortemente vinculadas à “aventura”, ao “risco” e ao “radicalismo”) –, traz em seu bojo a discussão de ter como seu elemento fundante, o desenvolvimento sustentável. (...) é um segmento da atividade turística que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio natural e cultural, incentiva sua conservação e busca a formação de uma consciência ambientalista através da interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das populações envolvidas. (BRASIL-MICT/MMA, 1994)
No entanto, muitos são os autores e autoras (Dóris Ruschmann; Célia Serrano; Silvio Figueiredo; Maria Célia Coelho; Luzia Coriolano; Ricardo Uvinha; entre outros), que têm procurado fazer análises críticas sobre as concepções teórico-práticas dos projetos e ações executados em todo o Brasil, os quais se autodenominam de ecoturismo e turismo de aventura, mas que no entanto, refletem práticas pouco preocupadas com os preceitos defendidos originalmente. O Turismo de Aventura, situado na polissemia do termo e da multiplicidade das
atividades
do
ecoturismo
(SERRANO,
2000),
remete
às
mesmas
preocupações em termos de planejamento, gestão e sustentabilidade. Tem sido incluído nas discussões gerais sobre Ecoturismo, no que se refere ao Poder Público, com sua inserção nos projetos maiores de desenvolvimento do “Turismo Verde”, do Governo Federal, que visa desenvolver o ecoturismo na Amazônia brasileira e está inserido no programa “Avança Brasil”. (MMA, 2005a). Abarca o
4
De acordo com Célia Serrano (2000, p. 9), “podemos considerar o Ecoturismo como uma idéia “guarda-chuva”, pois envolve uma multiplicidade de atividades como trekking, hiking, escaladas, rapel, espeleologia, mountain biking, cavalgadas, mergulho, rafting, floating, cayaking, vela, vôo livre, paragliding, balonismo, estudos do meio, safári fotográfico, observação de fauna e de flora, pesca (catch-release), turismo esotérico e turismo rural, para citar as mais usuais”.
Programa de Desenvolvimento de Ecoturismo na Amazônia Legal - PROECOTUR e amplia a previsão de recursos na mesma direção. (MMA, 2005a) O Instituto Brasileiro de Turismo – EMBRATUR realizou em Caeté-MG (abril de 2001) uma oficina de planejamento, com o objetivo de elaborar um Plano de Ação, subsidiando a fundamentação de uma Política Nacional de Fomento ao Turismo de Aventura e de conceber a estrutura básica de um Guia Nacional de Turismo de Aventura e de um Manual de Orientação aos Municípios. Como resultado dessa oficina, foi sistematizado, por meio de um relatório, o Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável do Turismo de Aventura - PNDSTA (BRASIL/EMBRATUR, 2001). No Relatório, a conceituação do “turismo de aventura” que faz parte do referido plano é de: Segmento do mercado turístico que promove a prática de atividades de aventura e esporte recreacional, em ambientes naturais e espaços urbanos ao ar livre, que envolvam emoções e riscos controlados, exigindo o uso de técnicas e equipamentos específicos, a adoção de procedimentos para garantir a segurança pessoal e de terceiros e o respeito ao patrimônio ambiental e sociocultural (BRASIL/EMBRATUR, 2001, p. 7)5.
Na Oficina, foram analisadas as modalidades de turismo de aventura e identificadas as consideradas principais nos diferentes ambientes: aéreo, terrestre e aquático. “As modalidades de turismo de aventura identificadas foram analisadas, destacando-se aquelas consideradas mais atrativas, com maior risco para o praticante, com maior impacto ambiental e as consideradas melhor, mal ou pouco exploradas”. (BRASIL/EMBRATUR, 2001, p. 1). No meio acadêmico, já existe um vasto campo de pesquisas, percorrido por autores e autoras, que têm se dedicado à temática específica de turismo de aventura, esportes de aventura, esportes radicais, a exemplo de Heloísa Bruhns, 2003; Alcyane Marinho, 2003; Vera Costa, 2000; Ricardo Uvinha, 2003; Gisele Schwartz, 2005; entre outros).
5 Segundo o relatório, no desenvolvimento do conceito os participantes consideraram a conveniência de se definir melhor o nome do segmento. Entre as expressões “esportes outdoor”, “esportes radicais”, “esportes de aventura” e, para melhor diferenciação do segmento Turismo de Esportes, foi proposta a adoção de um nome simples e marcante, que melhor caracterizasse o conceito expresso para o segmento: “Turismo de Aventura” (“adventura”, do latim “o que há por vir”) (BRASIL/EMBRATUR, 2001, p. 7).
Ricardo Uvinha (2003), por exemplo, discorre sobre as relações do turismo de aventura e as atividades constituídas em suas bases estarem ligadas, em especial, a três elementos: risco, tecnologia e ecologia. E também faz referência às preocupações com os valores embutidos em algumas dessas práticas, tanto no que diz respeito ao crescimento mercadológico, como em relação aos impactos causados por estes. Uma das preocupações a serem pontuadas nesse texto, diz respeito às práticas do Turismo de Aventura numa lógica consumista e não-sustentável, com atividades executadas de forma desordenada e sem planejamento, resultando em impactos sócio-ambientais. No Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável do Turismo de Aventura (BRASIL/EMBRATUR, 2001), os participantes da elaboração do documento iniciaram uma etapa de análise de situação, identificando os principais aspectos que, considerados como problemas – pontos fracos e ameaças –, comprometem o desenvolvimento do turismo de aventura de forma sustentável, o qual possui como atividade principal o esporte de aventura. Dentre os problemas apontados e as limitações a serem superadas, dois itens chamaram a atenção por possuírem relação direta com o assunto aqui tratado. Um deles diz respeito aos impactos causados pelos esportes de aventura e o outro se refere à falta de regulamentação capaz de normatizar tais atividades.
QUADRO 01: Problemas apontados no Desenvolvimento Sustentável do Turismo de Aventura. ITENS SELECIONADOS Impactos
Regulamentação
PROBLEMAS Necessidade de restrições de tais atividades em Unidades de Conservação (UC); Inobservância da capacidade de carga no ambiente; Impacto ecológico e social; Impacto ambiental Não regulamentação da atividade; Inexistência de normatização; Inexistência de legislações pertinentes; Inexistência de parâmetros qualitativos das operadoras e dos profissionais envolvidos; Desorganização das normas de ensino/conduta; Deficiência dos meios de definir responsabilidades nas áreas de interação de atividades; Pequena responsabilidade civil ou criminal dos agentes que vendem ou operam as atividades ao ar livre; Inexistência de órgão de regulamentação e certificação dos
destinos; Ausência de auto-regulamentação; Não-credenciamento dos guias, monitores e instrutores.
FONTE: BRASIL/EMBRATUR (2001, p. 14).
Analisando o levantamento, é possível não apenas identificar as dificuldades em relação aos prováveis impactos, como perceber a falta de normatização em relação a quem pratica, opera ou vende produtos referentes a esportes de aventura. Além disso, na falta de legislação pertinente, não há como fiscalizar a operacionalização de tais atividades no meio ambiente, o que o torna vulnerável. É possível demonstrar alguns impactos apontados por Mirleide Bahia (2002), na análise que faz de alguns esportes na natureza e seus possíveis impactos negativos6.
QUADRO 02: Possíveis Impactos Negativos resultantes da Prática de Esportes na Natureza. ESPORTE Asa Delta ou Vôo Livre e Paraglide ou Parapente
POSSÍVEIS IMPACTOS NEGATIVOS
Balonismo
Pára-quedismo, Base Jump e Sky Surf
Treck
Aquaride ou Bóia Cross, Rafting e Canoagem
6
Impacto nas trilhas onde o salto acontece, Poluição: barulho, lixo, Alteração e destruição da vegetação, Alteração no habitat de animais, Compactação e erosão do solo, Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. Poluição: queima de gases, barulho, lixo, Possíveis alterações na vegetação de onde o balão decola e pousa, Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas, Compactação do solo (pouso e decolagem). Pequena compactação do solo (pouso), Alteração e destruição da vegetação. (pouso), Alteração no habitat de animais (pouso), Poluição: barulho, lixo, Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. Mesmas alterações da asa delta, com o detalhe de utilizar asa delta motorizada, aumentando a poluição pelo barulho e por emissão de gases produzidos pelo motor. Poluição: barulho, lixo, Distúrbios e alteração da fauna, Possíveis quebras de pequenos pedaços de rocha em
GRAU DE INTENSIDADE Baixo
Baixo
Baixo
Baixo
Baixo
Análise semelhante pode ser encontrada na dissertação de mestrado de Alexandre Prado (2001)
(Caiaque) Esqui na Água,
Jet Sky Skyder Parasail, Wake board
Mergulho
e
Dive Cave
Surf, Wind Surf e Vela
Pesca Esportiva
corredeiras (contato com os bóias ou caiaques), Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. Poluição por meio da emissão de gases do motor da lancha (que reboca esqui, parasail, prancha) e motor do Jet Sky, Poluição: barulho, lixo, algum derramamento de combustível na água, Distúrbios e alteração da fauna, Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. Alterações na fauna subaquática por ocasião dos mergulhos, Poluição: barulho, lixo, Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. Alteração e Distúrbios da fauna marinha, Poluição: lixo, Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas.
Poluição: emissão de gases produzidos pelo motor da lancha e petróleo (combustível), barulho e lixo, Distúrbios e Alteração na fauna marinha e seu habitat, Alteração e destruição marinha, Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. Trekking ou Por tais modalidades utilizarem trilhas para chegar a pontos de descida, subida ou mesmo a caminhada Haking pela mata, há impacto na utilização das trilhas, Impacto na vegetação onde se fixa o equipamento de Canyoning segurança (canyoning, escalada, cascade, Escalada espeleologia, rapel), Poluição, barulho, lixo, Cascade Distúrbios, alteração e destruição do habitat e Espeleologia vegetação (trilha), Compactação e erosão do solo, Rapel Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. Mountain Bike Compactação e erosão do solo, Poluição: barulho, lixo, e Alteração e destruição da vegetação e do habitat de animais, Bicicross Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. Off -Road (Rally) Impacto na abertura e utilização de trilhas, Compactação e erosão do solo, Motocross Poluição: barulho, lixo, emissão de gases e petróleo (combustível), (Enduro) Alteração e destruição da vegetação e do Habitat de animais, Interferência social e cultural em comunidades próximas envolvidas. FONTE: BAHIA (2002, p. 132-133)
Médio (Utilização de Equipamentos Motorizados)
Baixo
Baixo
Médio (no caso da pesca em lancha, utilização de equipamentos motorizados) Baixo
Baixo
Médio (utilização de equipamentos motorizados).
Verifica-se que os praticantes de esportes realizados na natureza apresentam características um pouco diferenciadas (em sua maioria dizem entender a relação dialética ser humano-natureza de forma mais responsável, consciente e equilibrada), porém cabe ressaltar dois aspectos relevantes: a) mesmo considerados de baixo impacto, os esportes apresentam alguns tipos de alterações na natureza; b) não há como esquecer que, juntamente com impactos no meio ambiente natural, é possível haver alterações no meio social, cultural e econômico de comunidades diretamente envolvidas.
3 - O Ecoturismo na Amazônia
Na Amazônia, o turismo em áreas naturais e o ecoturismo têm sido explorados principalmente nos Estados do Pará e do Amazonas, neste último, em escala maior devido possuir uma melhor infra-estrutura, com hotéis de selva e hotéis ecológicos (lodges), barcos ecológicos, roteiros pelas matas, etc. No Pará, o desenvolvimento ainda é lento em áreas naturais e há o predomínio de algumas dessas áreas na divulgação e implantação de projetos (Ilha do Marajó, Santarém e Sul do Pará). (FIGUEIREDO, 1999) Algumas ações do Poder Público e outras, independentes, realizadas por ONGs e Instituições privadas poderão ser visibilizadas a seguir.
3.1 - Algumas ações do Poder Público Na formulação de planos de desenvolvimento para o turismo ecológico na Amazônia,
inicialmente
tomaram
frente
alguns
órgãos
governamentais
7
(EMBRATUR, IBAMA, extinta SUDAM e MMA) . Atualmente, com a formulação das “Agendas Positivas da Amazônia”, tendo como um de seus itens o desenvolvimento do ecoturismo, é lançado o Programa de Desenvolvimento de Ecoturismo da Amazônia Legal – PROECOTUR. O Programa tem como executor o MMA/Secretaria de Coordenação da Amazônia – SCA, em parceria com o Ministério do Esporte e Turismo – MET , o Instituto Brasileiro de Turismo – EMBRATUR, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos 7
Segundo Silvio Figueiredo (1999), alguns documentos foram produzidos: Linhas Básicas para um Programa de Desenvolvimento do Turismo na Região Amazônica (1995), e Estratégias para o Desenvolvimento Integrado do Ecoturismo na Amazônia Legal (1997).
Recursos Naturais Renováveis – IBAMA e os nove Estados que compõem a Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins). Sua coordenação está a cargo da Unidade de Gerenciamento do Programa – UGP, no âmbito da SCA, juntamente com os Núcleos de Gerenciamento do Programa – NGP, instituídos nos Estados e no IBAMA. (MMA, 2005a)
Com a intenção de empreender ações em nível local, a proposta do PROECOTUR vem se implementando através da criação de Grupos Técnicos Operacionais – GTOs, compostos por membros municipais de planejamento e/ou de turismo, representantes locais de turismo ou agências de meio ambiente, presidentes ou membros de ONGs locais, por operadores particulares de turismo e de hotelaria, que serão os principais condutores de coordenação das atividades em nível local. (MMA, 2005a) Para melhor articulação das ações, segundo o documento elaborado pelo Governo Federal, os Estados passam a ser divididos em Pólos de Ecoturismo. Os pólos são as zonas prioritárias nas quais o poder público implantará projetos e normas visando à atração de empreendimentos ecoturísticos particulares. Não são necessariamente definidos geograficamente podendo consistir de corredores turísticos ou de grupos de atrativos complementares unidos por um roteiro turístico. Seu planejamento visa maximizar a competitividade da região como destino de ecoturismo internacional; minimizar a concorrência entre estados, mediante a identificação de nichos de mercado diferenciados para cada estado; maximizar a viabilidade econômica e minimizar os riscos financeiros dos empreendimentos de ecoturismo a serem implantados em cada pólo. (MMA, 2005a)
É possível perceber, que representantes das populações tradicionais (moradores de áreas protegidas ou não protegidas legalmente), não são citados explicitamente como participantes do processo de discussão, elaboração e execução das ações pretendidas nas áreas naturais da Amazônia. Vindo ao encontro das preocupações levantadas por Antônio Diegues (1997), no que se refere
à
exclusão
da
participação
das
populações
tradicionais
dos
empreendimentos de turismo e, até mesmo, de seus locais de moradia em áreas naturais protegidas, refletido no modelo equivocado de “natureza intocável e intocada” e no desrespeito às culturas locais e seus modos de viver e de se relacionar com o meio ambiente.
Movimentos de resistência de algumas dessas comunidades – por causa de sua exclusão das áreas e dos processos de discussão, elaboração e participação de projetos –, têm sido apontadas como bons exemplos da luta por sua visibilidade sócio-cultural e a imposição de seus direitos perante o Poder Público. Em alguns Estados, como São Paulo, Amazonas e Pará, elas começaram a se organizar em associações locais, mobilizando-se e reivindicando das autoridades do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) seus direitos ao território ancestral, ao seu modo de vida e às suas tradições. Em alguns casos, como na Estação Ecológica de Mamirauá (Amazonas), com a ajuda de organizações não-governamentais, estabeleceram seu próprio plano de manejo, reservando alguns lagos para preservação permanente e reprodução das espécies, outros para a pesca de subsistência e ainda outros para a pesca comercial realizada por pescadores de outras áreas (Ayres e Ayres, 1993). Processo semelhante está ocorrendo na Floresta Nacional do Tapajós (Pará), onde os comunitários resistiram às ameaças de expulsão por parte do IBAMA e hoje exigem participar do plano de manejo da floresta, contribuindo com seu vasto conhecimento sobre a fauna e a flora. (DIEGUES, 1997, p. 91)
No estudo feito por Oduval Lobato Neto (1999), sobre o desenvolvimento do Ecoturismo e Turismo de Aventura no Estado do Amazonas, focalizando prioritariamente em que medida os investimentos feitos pelo Poder Público nos empreendimentos denominados “Hotéis de Selva” (Lodges) atendiam aos preceitos básicos estabelecidos nas “Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo” – em especial no que se refere ao bem-estar das populações envolvidas
–,
o
autor
verificou
que
“o
exemplo
do
Amazonas
está
consideravelmente bem distante de proporcionar o envolvimento das populações locais e gerar os benefícios desejados pela sociedade”. (LOBATO NETO, 1999, p. 148) Entre os aspectos de maior relevância, detectados pela pesquisa, destaca-se o de recursos humanos, no qual se verifica uma situação em que a quase totalidade dos empregos ofertados nos empreendimentos são ocupados pela população de Manaus, a mesma coisa ocorrendo em relação à origem dos insumos e matéria-prima, utilizados pelos empreendimentos. (LOBATO NETO, 1999, p. 149)
A partir do mês de Maio de 2005, o PROECOTUR iniciou um processo de capacitação profissional dos diversos segmentos que compõem a cadeia de
ecoturismo nos pólos da Amazônia Legal. Segundo o MMA (2005b), o objetivo é de “trabalhar com conceitos orientados por princípios de sustentabilidade ambiental, social e econômica, levando-se em consideração a realidade da atividade ecoturística local”. A meta é capacitar 1,8 mil pessoas da região amazônica, entre empreendedores e profissionais do setor turístico/ecoturístico (hospedagem, alimentação, serviços e entretenimento), guias locais, estudantes, barqueiros, operadores de turismo, membros de comunidades tradicionais e de associações, taxistas, artesãos e outros que trabalham diretamente no atendimento aos visitantes (MMA, 2005b)
3.2 - A participação de algumas ONGs No Estado do Amazonas, especificamente no corredor ecológico que aglomera as reservas de Mamirauá, Amanã e Parque Nacional do Jaú, denominado
“Reserva
de
Desenvolvimento
Sustentável”,
o
Instituto
de
Desenvolvimento Sustentável Mamirauá vem atuando desde 1999, com a aplicação de técnicas de manejo florestal, programas de saúde, educação e alternativas de trabalho como o ecoturismo e o artesanato, com o objetivo de buscar desenvolvimento sócio-econômico das comunidades que habitam a região. O programa de Ecoturismo é uma alternativa econômica para os comunitários da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. No interior da reserva, construída em troncos de árvores flutuantes, no rio que leva ao lago Mamirauá, encontra-se a Pousada Uacari. O projeto organizou cursos de guias para moradores. Os guias comunitários levam os turistas a diferentes passeios ecológicos, como o de canoa, por lagos e igarapés e as caminhadas, por trilhas na floresta. Durante os passeios os guias orientam os ecoturistas, sobre a ecologia das espécies animais, vegetais e os cuidados com a natureza. (INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL MAMIRAUÁ – IDSM, 2005)
Foto 01-Reserva de Desenvolvimento Sustentável – Mamirauá – AM / Foto: IDSM, 2005)
A ONG Projeto Saúde e Alegria, por sua vez, vem promovendo o turismo através de um programa denominado “Projeto Bagagem”, uma iniciativa sem fins lucrativos que organiza expedições pelas comunidades ribeirinhas da Amazônia, com o objetivo de fortalecimento das comunidades do Brasil. Em janeiro, foi anunciada a 6ª expedição, para uma viagem de nove dias e oito noites pelos rios da região. A viagem é toda feita de barco, os participantes dormem em rede e a troca cultural entre comunidades e participantes acontece durante momentos especialmente reservados para isso (...) Os participantes são incentivados a levarem seus talentos e conhecimentos para serem partilhados nas comunidades que por sua vez terão também bastante a ensinar ao grupo de visitantes. (PROJETO BAGAGEM/AMAZÔNIA. ORG, 2004)
4- Turismo de Aventura na Amazônia: o caso do Estado do Pará
Em 20 de novembro de 2002, a Companhia Paraense de Turismo – PARATUR, convocou representantes de instituições, entidades e empresas ligadas ao Turismo de Aventura no Estado para uma reunião na qual foi feita a instalação e posse do Comitê de Turismo de Aventura do Estado do Pará, com o objetivo de normatizar as atividades deste segmento e elaborar a Política Nacional de Turismo de Aventura. Todos os meses ocorrem reuniões para dar andamento às questões pertinentes deste segmento, no sentido de seguir com as metas estabelecidas no Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável do Turismo de Aventura, iniciado na reunião de Caeté – MG, em 2001. (BRASIL/EMBRATUR, 2001) Algumas atividades têm sido organizadas e realizadas no Estado do Pará, com a participação esporádica do Poder Público, mas sem uma política específica voltada ao segmento. Muitos grupos independentes – formados por ex-integrantes das forças armadas, profissionais de turismo, profissionais de educação física, praticantes de esportes de aventura, entre outros – no intuito de desenvolver tais atividades no Estado, tem-se mobilizado para organizar atividades e/ou eventos na região, alguns de forma contínua, outros de forma sazonal. O levantamento foi realizado em 2001 e atualizado em 2002, apontando potencialidades da região
para a prática de atividades na natureza, tendo estas um caráter de aventura ou não. (BAHIA, 2002) •
Cavalgada Marajoara: Realizada de 05 a 09 de setembro de 2001, a Cavalgada Marajoara
percorreu os municípios de Soure e Salvaterra, na ilha do Marajó, tendo como objetivo principal traçar um roteiro de turismo rural para a região. •
Surf: A modalidade é praticada em vários locais do Estado (na orla marítima,
como Salinas, Marudá, Algodoal, Ajuruteua, ou em praias de rios), tendo seu maior atrativo quando da “Pororoca 8“. O fenômeno provoca ondas muito grandes – em 2001 aconteceu a maior “Pororoca” dos últimos tempos, com ondas de 3,8 metros de altura – sendo estas aproveitadas para a prática do surf, passando o evento a fazer parte do cenário nacional no circuito anual da modalidade. Os meses de março, abril e setembro são os mais propícios. Desde 1999 acontece um campeonato de “Surf” na Pororoca, patrocinado e organizado pelo Governo do Estado, por meio da Secretaria Executiva de Esporte e Lazer (SEEL), do qual participam atletas de nível nacional. Alguns eventos são promovidos pela Associação Paraense de Surf e valem como pontuação para campeonatos organizados pela Federação de Surf do Pará, que adota os mesmos critérios utilizados no circuito Mundial de Surf. Um dos exemplos é o Campeonato Paraense de Surf, que possui várias etapas, sendo realizado em locais diferentes. •
Corridas de Aventura: O Grupo ATAQ (Aere, Terra et Aqua), um grupo independente, formado por
praticantes de esportes de aventura organizou uma pequena corrida de aventura, considerada a primeira realizada no norte do Brasil, em agosto de 2000. A
8
Pororoca: “estrondo”, em tupi-guarani. A Pororoca é um fenômeno provocado pelo encontro das águas do Rio Amazonas com o oceano Atlântico, acontecendo para isso as marés de sizígia, conhecidas na região como “marés vivas”. Sempre ocorre nos três dias que antecedem ou seguem as luas nova ou cheia. Outra condição fundamental é que as águas do estuário do Amazonas e dos rios estejam cheias
primeira etapa ocorreu no município de Paragominas e a segunda, na Ilha de Caratateua (Outeiro). A Expedição Mata Atlântica (EMA) 2001 – Amazônia9 foi realizada no Estado do Pará,
no Pólo Tapajós, no oeste do Estado. Aconteceu de 23 de
novembro a 01 de dezembro de 2001, com a participação de 48 equipes de 17 países e diversos Estados brasileiros. Foram sete dias de competições nos municípios de Santarém, Monte Alegre e Alenquer, explorando áreas naturais de florestas, rios, morros, corredeiras e áreas alagadas, totalizando um percurso de 450 km, que inicialmente seria de 550 km, porém, devido algumas dificuldades, foi diminuído em 100 km no município de Alenquer.
FOTO 02: - Rappel na cachoeira do igarapé do Ambrósio-PA/ Foto: PARATUR
Algumas outras corridas de aventura começaram a ser organizadas pela Associação de Esportes de Aventura e Natureza da Amazônia – KALUANÃ e deram início ao circuito paraense de corridas de aventura, a partir do ano de 2002. •
CANOAGEM: O Governo do Estado, por meio da Secretaria Executiva de Esporte e Lazer
(SEEL), desenvolve, desde dezembro de 1999, em parceria
com o Governo
Federal e Prefeituras, Federações, Associações e Clubes de vários municípios paraenses, um projeto intitulado “Navegar”, o qual, segundo o coordenador do 9
Foi a primeira vez, que a prova com nome Mata Atlântica aconteceu fora dela.
projeto na SEEL, atende mais de mil alunos e acontece em cinco municípios: Santarém, São Domingos do Capim, Soure, Tucuruí e Salinas. As modalidades que fazem parte do projeto são: Vela, Canoagem e Remo. (SECRETARIA EXECUTIVA DE ESPORTE E LAZER, 2000a) A Canoagem também tem sido desenvolvida no Município de Belém, pela Prefeitura Municipal, por meio da Secretaria Municipal de Educação, sob a responsabilidade da Coordenadoria de Esporte, Arte e Lazer (CEAL). Após a implantação em Belém, foi ampliado para a Ilha de Caratateua (Outeiro), banhada pela Baía do Guajará, nas dependências do Centro de Formação de Praças (CFAP) e, posteriormente, no ano de 2000, passou a atender moradores de algumas das 39 ilhas que cercam a capital paraense. O atendimento se dá na ilha do Combu, situada na margem esquerda do rio Guamá, e é a mais próxima de Belém. •
Pesca Esportiva10: A pesca esportiva desponta, como um dos principais atrativos nas diversas
áreas, o que necessitou de uma atenção especial para a sua regulamentação no Estado do Pará, a fim de estabelecer critérios que disciplinassem a atividade no Estado, tendo sido sancionada a Lei nº 6.167, de 07 de dezembro de 1998 (SECRETARIA EXECUTIVA DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE, s.d).Com a regulamentação, passa a ser responsabilidade da Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente – SECTAM, exercer a gestão ambiental da atividade de pesca esportiva no território do Estado do Pará, podendo fazê-lo mediante a criação de reservas de pesca esportiva11 e de sítios pesqueiros.12
10 Apesar de não fazer parte das atividades de aventura, a pesca é uma atividade característica na região, com um calendário extenso de torneios de pesca esportiva por todo o Estado. 11 Constituem as reservas de pesca esportiva, além dos elementos do sistema hídrico de expressiva piscosidade, a área de preservação permanente do seu entorno, as áreas de domínio público ou privado necessárias à interligação dos elementos e espaço territorial equivalente ao limite máximo de dois quilômetros além da área de preservação permanente (Decreto Lei 3.551, de 06.07.99). 12 Constituem os sítios pesqueiros, além do elemento do sistema hídrico de expressiva piscosidade individualmente considerado, no todo ou em parte, a área de preservação permanente de seu entorno e o espaço territorial equivalente ao limite máximo de dois quilômetros além da área de preservação permanente (Decreto nº 3.551, de 06 de julho de 1999).
•
JOGOS INDÍGENAS13: Os Jogos Indígenas vêm acontecendo desde 1998. No Pará, aconteceram
em 2000 e 2002. Classificados como o “Maior Encontro das Nações Indígenas do Brasil”, quando acontece a “União das Tribos”, os “III Jogos dos Povos Indígenas” reuniram 631 participantes de 34 etnias de todo o Brasil (25 tribos). Em 2002, os jogos aconteceram em Marapanim-PA, na praia do Crispim, onde foram construídas uma arena e uma aldeia. (SECRETARIA EXECUTIVA DE ESPORTE E LAZER, 2000b)
Foto 03: Arco e Flecha / Foto: Ray Nonato
•
Off Road: Todas as competições acontecem em trilhas com mata fechada, contendo
áreas de areal, igarapés, serra e outros obstáculos naturais, a fim de “enriquecer” o percurso a ser percorrido
pelos competidores. Inicialmente é feito um
levantamento das áreas de um município, a abertura de uma trilha e o seu mapeamento para a elaboração de uma planilha. Algumas competições são organizadas por praticantes, porém todas devem ter a supervisão da Federação Paraense de Automobilismo (FEPAUTO) e Federação Paraense de Motociclismo
13
Os Jogos Indígenas inicialmente tiveram uma característica de jogos na natureza. Atualmente fazem parte dos Jogos de Identidade Cultural. (GOVERNO DO PARÁ, 2000)
(FEPAM), de acordo com o tipo de prova (enduro ou rally14). Muitas competições obtêm apoio da iniciativa privada e algumas, de órgãos governamentais. Existe ainda um clube que reúne adeptos do esporte off road, envolvendo veículos 4x4, denominado “Jeep Clube do Pará”, o qual elabora uma agenda anual de eventos, caracterizada por atividades que não possuem conotação competitiva. Estes são denominados de “Expedições” e acontecem mensalmente. •
Jogos da Natureza: Em 1998, a Prefeitura Municipal de Belém, por meio do Projeto Verão,
criou os “I Jogos da Natureza”, com o envolvimento organizacional de várias Secretarias, dentre elas a Secretaria Municipal de Educação, por meio da Coordenadoria de Esporte, Arte e Lazer (CEAL), e da Companhia de Turismo de Belém (BELEMTUR), tendo sido realizados na Ilha do Mosqueiro (PA), no mês de julho. Os “II Jogos da Natureza” aconteceram em julho de 2000, com modalidades diversas a serem realizadas em Belém e nas Ilhas de Cutijuba, Icoaraci, Outeiro e Mosqueiro. (PREFEITURA MUNICIPAL DE BELÉM, 2000) •
PÁRA-QUEDISMO: O pára-quedismo iniciou suas atividades no Estado do Pará na década de
70 (aproximadamente em 1972). Algumas atividades, além das demonstrações e torneios, são desenvolvidas nas categorias existentes no pára-quedismo: Trabalho Relativo (TR);Trabalho Relativo de Velame (TRV); Free-Fly; Sky-Surf; e Pouso de Precisão. Organizado pelo Aeroclube do Pará (clube independente). •
Rapel A modalidade tem sido desenvolvida, prioritariamente, no meio urbano, em
pontes e prédios. No entanto, alguns locais fora de Belém têm sido freqüentados por praticantes desta modalidade. Geralmente praticado na Grande Belém (Mosqueiro, Ilha de Caratateua e Icoaraci), e em outros municípios do Estado (Irituia, Capitão Poço, Santarém, Marabá e Salinópolis). Atualmente organizado
14
As competições Off road são divididas em dois tipos: Enduro, que tem a participação apenas de motocicletas, e Rally, que possibilita a participação de automóveis e motocicletas. (BAHIA, 2002)
por grupos independentes (Rapel& Cia; Associação Kaluanã, Grupo Espeleológico Paraense – GEP/UFPA).
5- Conclusão Não basta formular diretrizes e planejamentos para a implementação de projetos de ecoturismo e turismo de aventura, se esses não tiverem bases sólidas na construção democrática e participativa de todos os atores envolvidos. A sociedade civil, em parceria com o Estado, devem ser os principais articuladores de todo o processo, chamando a população para participar, minimizando as contradições, bem como serem responsáveis por fomentar a promoção de pesquisas na área, como forma de encontrar melhores caminhos. Também deve ter sua parcela de participação no controle e fiscalização das ações de desenvolvimento do ecoturismo e do turismo de aventura. Ao setor privado cabe agir com responsabilidade e dentro dos preceitos de sustentabilidade, e como forma de participar ativamente desse processo, deve conscientizar-se da necessidade de alocar parte de seus lucros para a conservação ambiental, se não por compromisso real com a integridade do meio ambiente, que seja para a preservação de seus “negócios” com o aumento de qualidade. Afinal, sociedade civil organizada e aliada ao Estado, tem potencial de interferir no mercado. As ONGs devem participar de todo o processo e lutar pela busca do exercício da cidadania das comunidades dos núcleos receptores. E por fim, aos turistas cabe o respeito pelas culturas locais, a valorização da diferença e uma verdadeira conscientização ecológica. O lazer, vivenciado através dos dois conteúdos culturais aqui mencionados (ecoturismo e esportes de aventura), com seu caráter “descompromissado”, se diferencia dos valores hegemônicos do mundo das “obrigações”, e pode contribuir, de maneira eficaz para a riqueza cultural, para a pluralidade na convivência, para o estabelecimento do repertório de outros valores que não os institucionalizados e internacionalizados. Cada vez mais precisamos do lazer que leve a convivencialidade, mesmo, por paradoxal que isso possa parecer, sendo fruído individualmente. Convites à convivência significam, do meu ponto de vista, minimizar os riscos da exacerbação dos próprios componentes do jogo: a “competição”, que não leve à violência; a
“vertigem”, que não leve ao risco não calculado de vida; a “imitação” que não promova o fazer de conta imobilizante da pior fantasia; o binômio “sorte/azar”, que não provoque alheamento. (MARCELLINO, 2001, p. 57)
A proposta de uma educação através da vivência consciente do lazer, em busca de um lazer mais crítico-criativo (Marcellino, 1987), compreendendo outros valores que não sejam os de mercado e rompendo com essa lógica hegemônica; bem como uma educação propiciada através da aventura (Barros, 2000; Oliveira, 2000), capaz de modificar atitudes e adquirir valores mais humanos de convivência com o outro e com a natureza; além da percepção sobre a importância da relação dialética ser-humano natureza; podem ser caminhos viáveis para se pensar no estabelecimento de novos paradigmas acerca do meio ambiente e das relações vividas na sociedade atual. Na Amazônia, algumas “trilhas” já foram percorridas, com tropeços e quedas. Boas práticas de planejamento, participação coletiva e execução de projetos de Ecoturismo e Turismo de Aventura têm sido identificadas, mas o caminho é longo e muito há de ser feito por todos, começando por mudanças em atitudes individuais e locais, no vislumbre de uma mudança global.
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