Declaração de Maputo da Sociedade Civil Africana sobre Justiça Climática Defensores de Justiça Climática, representantes de comunidades e de movimentos sociais reuniram-se em Maputo, Moçambique de 21 a 23 Abril de 2015, para abordar as raízes, manifestações e impactos das mudanças climáticas em África e para refletir sobre as respostas necessárias para essas crises. No final das deliberações, foi acordado que África está a ser desproporcionalmente afectada pela crise climática, embora não tenha contribuído significativamente para o problema. A conferência também observou que a crise climática é de natureza sistémica e é resultado de sistemas económicos e políticos defeituosos que exigem revisão urgente. Em particular, a reunião considerou que África foi maciçamente saqueada ao longo dos séculos e continua a sofrer os impactos graves da exploração de recursos e conflitos relacionados. No encontro observou-se que a narrativa de Africa Rising (O Levantar de África) baseia-se em falsas premissas neoliberalistas que usam ferramentas como as desacreditadas medidas do PIB que são apresentadas como uma isca para atrair o continente para ainda mais extrativismo e promover o consumismo. Na reunião observou-se ainda que os abusos de direitos humanos e ambientais no continente, bem como todas as crises ecológicas, económicas e financeiras, afectam negativamente os seus povos e prejudicam a sua capacidade de se adaptar, mitigar os impactos e aumentar a resiliência colectiva à mudança climática. Condenou-se também o fosso cada vez maior entre os nossos governos e as organizações de base e o aumento da captura corporativa dos governos africanos e instituições públicas. Factos que constituem obstáculos à obtenção de justiça climática para os nossos povos. A longa caminhada para a justiça climática requer a educação em massa da nossa população, bem como dos nossos decisores políticos sobre os fundamentos da crise climática, a afirmação vigorosa dos nossos direitos e o forjar de alternativas reais, incluindo os de estruturas e sistemas sociais e políticos. Também exige lutas colectivas e populares para resistir ao neo-colonialismo, a novas formas de opressão e novas manifestações de violência, incluindo a criminalização de activistas e movimentos sociais e a xenofobia. Reconhecemos que conforme o clima vai piorando, aumentarão a escassez de recursos e as migrações, o que causará mais conflitos entre povos. Reconhecemos igualmente que a exploração de mão-de-obra estrangeira pelas corporações gera frequentemente conflitos entre vizinhos. Com justiça e igualdade como o mínimo irredutível, a conferência observou ainda e declarou o seguinte: 1. Todas as nações devem agir em conjunto para garantir que o aumento da temperatura média global não exceda 1,5 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais, uma vez que qualquer número acima deste significará África em chamas;
2. Na COP21 de Paris, exigimos que os governos africanos defendam posições que beneficiem os Africanos e Africanas e não o Banco Mundial ou as corporações; 3. Rejeitamos mercados de carbono, a financeirização da terra e dos recursos naturais, o consumismo, a mercantilização da natureza e todas as formas de escravidão de carbono; 4. Rejeitamos todas as falsas soluções para a mudança climática, incluindo a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal (REDD), as plantações industriais, a engenharia genética, os agro-combustíveis e a geo-engenharia, observando, por exemplo, que o carvão limpo não existe; 5. Rejeitamos a falsa noção de "economia verde", que nada mais é do que uma manobra para mercantilizar e acelerar a destruição da natureza; 6. A energia renovável que é socialmente controlada deve ser promovida em todo o continente; 7. Apelamos à criação de sistemas financeiros que promovam e facilitem opções de energia limpa, incluindo subsídios de apoio, empréstimos facilitados, pesquisa e desenvolvimento; 8. Exigimos o fim dos sistemas financeiros instituídos com subsídios extensos, externalização de custos, projeções demasiado optimistas, e corrupção; 9. Tomamos a decisão de trabalhar no sentido de recuperar a energia como um bem público que não tem fins lucrativos e rejeita sistemas de energia promovidos pelas corporações; 10. Dizemos não à mineração uma vez que vivíamos melhor sem actividades extrativistas extremas; 11. A nossa terra é o nosso presente e futuro e nós rejeitamos a usurpação de terra em todas as suas formas, em especial os chamados projectos de "investimento" que estão a pavimentar o caminho da usurpação de terras para uma total usurpação do continente; 12. Antes do uso de suas terras para qualquer tipo de projeto, deverá haver o completo, transparente e total consentimento informado das comunidades; 13. Em todos os casos, o bem-estar das comunidades locais e o meio ambiente deverão ter prioridade sobre os lucros das companhias de investimento. De acordo com o exposto, e por meio de outras considerações, da conferência resultaram as seguintes exigências: 1. Os governos deverão assegurar que as necessidades e prioridades energéticas das famílias locais, produtores locais e mulheres - incluindo no que diz respeito a serviços sociais, transportes, saúde, educação e assistência às crianças – deverão ser priorizadas sobre as das corporações e dos ricos; 2. Exigimos que não se concedam novas licenças de exploração de petróleo ou minas de carvão a fim de preservarmos o nosso meio ambiente e para que nos mantenhamos em linha com as demandas por parte da ciência que os combustíveis fósseis sejam deixados no subsolo para evitarmos uma mudança climática catastrófica; 3. Apoiamos e solicitamos um controle público e social da transição para energias renováveis, incluindo o de cooperativas de base comunitária, coletividades da sociedade civil e a implantação de infra-estruturas a nível local;
4. Os governos deverão desmantelar as barreiras de privilégio e poder, incluindo aquelas criadas e reforçadas pelas instituições financeiras, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial; 5. Exigimos uma urgente transferência de tecnologia para promover a produção de energia limpa, a abolição da propriedade intelectual e o aumento de fundos de pesquisa e desenvolvimento para combater as alterações climáticas; 6. Exigimos o reconhecimento pleno do saber comunitário local sobre florestas, produção alimentar e uso medicinal e cultural da terra e das florestas; o financiamento de pesquisas nessa área e que este passe a fazer parte do sistema de educação pública; 7. Exigimos uma transição urgente de formas de energia suja para sistemas de energia limpa, que assegurem que os trabalhadores e trabalhadoras estejam devidamente equipados e equipadas e munidos e munidas de novos e saudáveis postos de trabalho, criados por essa mudança; 8. Os governos deverão apoiar a produção alimentar agro-ecológica de produtores de pequena escala, priorizar a produção de alimentos sobre as culturas de rendimento, a fim de promover a segurança alimentar no contexto da soberania alimentar; 9. Os governos deverão garantir a protecção e o reconhecimento do direito dos camponeses e camponesas de guardar, vender e trocar as suas sementes, e ainda rejeitar a engenharia genética e a biologia sintética, incluindo dessas sementes manipuladas e apresentadas como sendo ‘climate-smart’; 10. Garantir o acesso, segurança, controle e direito de uso e aproveitamento de terra pelas mulheres. Reconhecemos a terra como um bem comum; 11. As plantações de árvores não deverão ser falsamente classificadas como florestas e as árvores não deverão ser vistas simplesmente como armazéns, bancos ou sumidouros de carbono; 12. Sistemas de gestão comunitária de florestas deverão ser adoptados em todo o continente, pois as comunidades têm genuíno interesse em preservar a saúde das florestas; 13. O direito à água potável deve ser consagrado nas constituições de todos os países africanos; 14. Os governos devem travar a privatização da água e restaurar o controle público até nas reservas já privatizadas; 15. Os governos devem interromper a construção de grandes barragens, outras mega-estruturas e infra-estruturas desnecessárias; 16. Os governos têm o dever de responsabilizar as corporações pelo ambiente e ecossistemas degradados por actividades poluidoras e extractivas históricas ou em curso. As corporações responsáveis pela degradação do ambiente ou ecossistemas deverão pagar pela sua restauração, mas esse pagamento não lhes dará qualquer direito sobre essas áreas; 17. Os governos deverão garantir que os custos de males sociais e de saúde resultantes do uso de energia derivada de combustíveis fósseis não serão externalizados para as pessoas e para o ambiente;
18. Os governos deverão assumir a responsabilidade de fornecer hospitais, escolas e outros serviços sociais e não deverá deixar que as empresas os providenciem como parte da sua responsabilidade social corporativa ou quaisquer outros actos de green wash (lavagem verde). Os e as participantes da conferência decidiram trabalhar com outros movimentos em África e no mundo para derrubar o sistema patriarcal capitalista promovido e protegido pelas instituições financeiras globais, pelas corporações e pela elite global, para assegurar a sobrevivência dos seres humanos e o direito da Mãe Natureza manter os seus ciclos naturais. Assinaturas: Assinantes que participaram na Reunião:
ORGANIZAÇÃO
PAIS
ORGANIZAÇÃO
PAIS
1
Justiça Ambiental
Moçambique
2
1 Representante da Tete – Comunidade reassentada em Moçambique Cateme, afectados pela Vale (Delvino)
3,4
2 Representantes da Comunidade de Benga, afectados pela Rio Tinto (Felix e Loria)
Tete – Moçambique
5,6
2 Representantes da Associação de Oleiros, afectados pela Vale (Isac e Refo)
Tete – Moçambique
7,8
2 Representantes da Comunidade da Floresta Mabu (Calisto e Alberto)
Zambézia – Moçambique
9
1 Representantes da Comunidade reassentada no bairro 25 de Setembro, afectados pela Vale (Fernando)
Tete – Moçambique
10
ACODEMUZO
Zambézia – Moçambique
11
Comunidade de Mphanda Nkuwa - Alfredo
Tete – Moçambique
12
Comunidade de Mphanda Nkuwa - Adelino
15
União Provincial de Camponeses de Niassa
17
13,14 Kutsemba (communidade) – José & Alcina
Matutuine–Mo çambique
Niassa – Moçambique
16
União Provincial de Camponeses de Nampula
Moçambique
União Provincial de Camponeses de Cabo Delgado
Moçambique
18
União Nacional de Camponeses (UNAC)
Moçambique
19
Camponeses de Regadio do Baixo Limpopo
Gaza – Moçambique
20
Liga Moçambicana de Direitos Humanos
Moçambique
21
Amigos da Terra Internacional
Internacional
22
La Via Campesina Africa
Regional
23
La Via Campesina
Internacional
24
Jubilee South Asia Pacific Movement on Debt and Development
Regional
25
Movimento Moçambicano das Mulheres Rurais
Moçambique
26
Forum Mulher
Moçambique
27
Mulher Genero e Desenvolvimento
Moçambique
28
Marcha Mundial das Mulheres
Moçambique
29
Centro Terra Viva
Moçambique
30
Livaningo
Moçambique
ORGANIZAÇÃO
PAIS
ORGANIZAÇÃO
PAIS
31
KEPA
Moçambique
32
Associação Moçambicana de Moçambique Reciclagem
33
FONGA
Gaza – Moçambique
34
Kuwuka JDA
Moçambique
35
Grupo para o Moçambique Desenvolvimento da Mulher e Rapariga
36
Kulima
Moçambique
37
ADECRU
Moçambique
38
South Durban Community Environmental Alliance (SDCEA)
Africa do Sul
39
Health of Mother Earth Foundation (HOMEF)
Nigeria
40
REDES (Amigos da terra Uruguai)
Uruguai
41
GroundWork (Amigos da Terra Africa do Sul)
Africa do Sul
42
Sabahat Alam Malaysia (Amigos da Terra Malasia)
Malasia
43
Earthlife Africa Johannesburg
Africa do Sul
44
Rosa Luxemburg Foundation Africa do Sul
45
Rede de organizações para Moçambique a soberenia alimentar (ROSA)
46
Museu da Historia Natural
Moçambique
47
Third World Network
Internacional
48
Comunidade Moçambicana de Ajuda
Moçambique
49
FUNAB
Moçambique
50
Observatorio do Meio Rural
Moçambique
51
WOMIN (Women in Mining) Regional
52
Women from Mining Affected Regional Communities United in Action (WAMUA)
53
Communidade de Shongoane
Africa do Sul
54
Go Green Tembisa
Africa do Sul
55
Soccer Legends
Africa do Sul
56
Communidade de Devine Green
Africa do Sul
57
Rural Women Assembly
Africa do Sul
58
Communidade de Tshwaranang
Africa do Sul
59
Communidade de Witbank
Africa do Sul
60
Timber Watch
Africa do Sul
61
Sustainable Energy & Climate Change Project (SECCP)
Africa do Sul
62
Communidade de Masakhane
Africa do Sul
63
Communidade de Marapong
Africa do Sul
64
HEJN (Communidade de Mpumalanga)
Africa do Sul
65
Vaal Environmental Justice Alliance (VEJA)
Africa do Sul
66
Centre for Civil Society/ Fossil Free Kwazulu-Natal
Africa do Sul
67
Zambia Association for Zambia Research and Development
68
Centre for Trade Policy and Development (CTPD)
Zambia
69
Botswana Climate Change Network (BCCN)
Botswana
70
Blue Planet Project & Council Canada/ of Canadians Internacional
71
The Trust for Community
Africa do Sul
72
The People’s Dialogue
Regional
ORGANIZAÇÃO
PAIS
ORGANIZAÇÃO
PAIS
Outreach and Education 73
LVIA (Associação Internacional Voluntaries Leigos)
Moçambique
74
Regional Campaign to Dismantle Corporate Power
Regional
75
Off the Ground
Africa do Sul
76
Mining Affected Communities Africa do Sul United in Action (MACUA)
77
Communidade de Seleka
Africa do Sul
78
Steenbokpan communidade
Africa do Sul
79
AMNCJ
Moçambique
80
WEJF (communidade)
Africa do Sul
81
Khutsong Youth Service
Africa do Sul
82
Ruth Nyambura
Quênia
83
TESE ONG
Moçambique
84,85, 3 Estudantes (Ivan, Ricardo & Harley) 86
87
Jornalista Investigativo
Cabo Delgado – Moçambique
Moçambique
Assinantes que não estiveram na Reunião, mas que solidarizam-se com a causa: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16.
GRAIN COECOCEIBA Amigos da Terra Costa Rica Amigos da Terra América Latina e o Caribe (ATALC) Amigos da Terra Brasil Sobrevivencia - Amigos da Terra Paraguay Movimiento Madre Tierra - Amigos da Terra Honduras Otros Mundos Chiapas - Amigos da Terra México CESTA - Amigos da Terra El Salvador CEIBA - Amigos da Terra Guatemala CENSAT Agua Viva - Amigos da Terra Colombia NAPE – Amigos da Terra Uganda Russian Social Ecological Union / Amigos da Terra Russia Friends of the Siberian Forests Russia Oilwatch International Oilwatch Africa Carbon Trade Watch 17. Chalimbana Headwaters Conservation Trust, Zimbabwe 18. Gaia Foundation 19. United Methodist Caretakers of God’s Creation. 20. Mupo Foundation 21. Surplus People Project 22. Movimiento Mesoamericano contra el Modelo extractivo Minero M4 23. The InterAmerican Platform for Human Rights, Democracy and Development (PIDHDD) 24. Holy Cross International Justice Office 25. The Corner House 26. Global Justice Now 27. Biofuelwatch, UK/US 28. Corporate Europe Observatory 29. Woodland League (Ireland) 30. Consumers Association of Penang (Malaysia) 31. Institute for Policy Studies, Climate Policy Programme (USA)
32. 33. 34. 35. 36. 37. 38. 39.
Earth in Brackets Grassroots International The Rules INT Lawyers (International Lawyers) Khulumani Support Group (Africa do Sul) Global Forest Coalition World Rainforest Movement Young Friends of the Earth Europe