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Ré em Causa Própria Adelina Barradas de Oliveira
from 51 Edição
Devia ser Sevilha às 3 da tarde e eu dormia pela certa. Ou Córdoba pelas 15 e um calor daqueles que transforma o ar em gelatina como se houvesse um descolamento de vítreo à minha frente. É igual o peso que tenho nas pálpebras e já tomei dois cafés.
Podia ser Granada às 3 da tarde e iria até Alhambra como uma princesa moura e descalça. Percorreria os jardins, os regatos saltitantes de água fresca e adormeceria num qualquer canto com sons de cigarras. Teria muitas pedras preciosas entre os dedos e um diadema vindo de África sobre os cabelos... e sonharia com férias, chá quente para refrescar e muito, muito tempo e espaço para ler e serenamente existir.
É assim que se cosem os textos pela tarde quente de trovoada. É A QUEBRA DOS SENTIDOS E A MISTURA DAS IDEIAS.
O passar pelo sono numa fração de segundos e pensar que se está noutra dimensão, quem sabe de uma outra vida, tudo misturado, mais leve e mais criativo Quando abro de repente os olhos num súbito solavanco, ainda estou sentada no mesmo sítio, mas nada tem que ver com o que me passava pelos olhos enquanto, numa fração de segundos, mergulhava noutro espaço.... É isto que nos fazem as tardes quentes à espera de trovoada, afastam-nos das notícias repetitivas que, dizem alguns, deprimem a consciência, outros, que exaltam o espírito. E estendo a mão ao último livro que ando a ler e onde aprendo que Putin não é comunista (como se isso fosse uma novidade para quem está atento há anos), que as guerras são sobressaltos exacerbados de uns para morte de outros. Como se tudo não passasse de um qualquer jogo de computador para meninos que não sabem fazer mais nada que usar uma play station....
Pode ser que seja um pesadelo, um adormecer estonteado e profundo e pode ser que, quando acordar haja só mar e uma praia para eu caminhar e estender as pernas, ler um livro e ouvir todos os sons à minha volta, individualizados e identificáveis, e que nesse universo azul e azul, e fresco e eterno, os ministros sejam iguais aos que os elegeram, possam rir e dançar e chorar sem trazerem sempre consigo um ar de Estado que não corresponde à realidade e os afasta da existência global. PODE SER QUE O VERÃO SIRVA PARA EXISTIR.
(Num Verão de 2022 de sonho em sonho.)