14 REPORTAGEM
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DOMINGO-FEIRA
FORTALEZA - CEARÁ - 17 DE MAIO DE 2020
AURELIO ALVES/O POVO
DESCOBERTAS PARA A VIDA TODA LAIS OLIVEIRA ESPECIAL PARA O POVO
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A pedagoga Sônia Maria Araújo Gonçalves, de 61 anos, nunca esperou um dia precisar fazer home office. A pandemia fez ela deixar a rotina na assessoria técnica da Coordenadoria de Protagonismo Estudantil da Secretaria da Educação do Estado do Ceará (Seduc), onde trabalha há 25 anos. As dúvidas eram recorrentes no começo, mas Sônia garante que já “tira de letra” as webconferências, até então desconhecidas. Na quarentena, a internet foi ainda mais incorporada ao cotidiano de quem está em casa; oportunidade de descoberta e aprendizado. Antes o celular era só para contatar os familiares no WhatsApp ou no Facebook. Hoje Sônia comemora sua mais recente descoberta virtual participando de uma live na qual comentou sobre a experiência da aprendizagem cooperativa. “Fiquei muito nervosa, mas deu certo. Quando terminei, me senti mais realizada. Estou me sentindo mais jovem e isso é muito bom”, relata. Agora, a pedagoga é quem ensina o “bê-á-bá” da cultura tech aos familiares menos experientes, entretanto ela confessa que a adaptação teve seus reveses. “Tive que aprender e fui me virando. Nos primeiros dias eu era tão nervosa! Achava que ia cair o sinal e não ia ter mais jeito”, conta aos risos. Com a ajuda do genro e da filha, ela entendeu que o temor não era necessário. Para o futuro, quando se aposentar, Sônia já faz novos planos: abrir seu próprio restaurante, divulgar na internet e convidar a clientela mais próxima via chamada de vídeo. “Abri minha mente. Antes eu não tinha essa ideia, acho que esse foi um aprendizado.” Reencontrar os familiares à distância, realizar uma consulta virtual, fazer compras pelo aplicativo
do supermercado ou mesmo solicitar o auxílio emergencial do Governo Federal. A necessidade de estar presente na esfera online, como teve Sônia, e de ter acesso à internet se evidenciou com a pandemia, expondo também como a desigualdade atinge quem está do outro lado do abismo digital no Brasil. A professora Lis de Maria Martins, da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC), considera que o cenário atual pode abrir caminho para o reforço às políticas públicas de acesso democratizado às tecnologias. O País ainda tem 20,1% da sua população sem acesso à internet, segundo a Síntese de Indicadores Sociais (SIS) do Ins-
DONA SONIA Gonçalves passou a “tirar de letra” as webconferências
tituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizada com dados de 2018. Para a pesquisadora do Laboratório de Pesquisa Multimeios da UFC, outro ponto é o diálogo suscitado entre gerações de jovens conectados com os idosos, “colaborando para a inclusão digital desses sujeitos sociais”. “Creio que estamos incorporando essa ‘cultura’ de distanciamento social necessária. Talvez levaremos um tempo para retomarmos aos abraços apertados, e as relações virtuais sejam reforçadas. Penso que, após a quarentena, teremos incorporados outros modos de sentir, estar, viver no e com o mundo.”