L E O AY R E S trabalhos 2011-2014
Existe um sexto sentido. E um sétimo, um oitavo, um nono, um décimo... Existem vinte sentidos. Manipular as luzes, transfigurá-las, gerar desequilíbrio e confusão são táticas para estimulá-los. Os espectadores podem circular livremente pelos trabalhos e participar, trazer o elemento do acaso, sempre presente. Os trabalhos se desenvolvem na junção de objetos previamente elaborados com objetos encontrados no local onde é instalado, o que produz situações caóticas e ocupações do espaço com proposições poéticas por meio de reflexos, luzes e espelhos. O resultado final também podem ser vestígios de performances. A conclusão das instalações pode ocorrer minutos antes da abertura da exposição, ou estar em contínuo processo.
Vista da exposição Tananan Opera Chanchada no Centro Cultural Ibeu (Rio de Janeiro, RJ), 2013
Ta n a n a n O p e r a C h a n c h a d a individual realizada em junho de 2013 na Centro Cultural Ibeu curadoria de Ivair Reinaldim assista ao vĂdeo
E s c a d a p a r a s u b i r n a m e s a d a g a l e r i a , 2013 escada, mesa, computador e pessoa trabalhando 80 x 80 x 90 cm
S e m t í t u l o , 2013 banco de madeira com almofada, televisor, dvd player com monitor, fita adesiva prateada o vídeo mostra uma mão acendendo repetidamente um isqueiro, onde se lê FUCK 80 x 50 x 50 cm assista ao vídeo
S e m t Ă t u l o , 2013 base de abajur, rede plĂĄstica, bolinhas espelhadas e luz dicroica 160 x 30 x 30 cm
S e m t í t u l o , 2013 lâmpada amarela, braço de gesso, purpurina, grafite e flores dimensões variáveis
S e m t Ă t u l o , 2013 lustre, cĂşpula de abajur, ralador, rede, bola espelhada, luzes piscando 230 x 50 x 50 cm
Discoteca de mão, ou da amizade como modo de vida Terão que inventar de A a Z uma relação ainda sem forma que é a amizade: isto é, a soma de todas as coisas por meio das quais um e outro podem se dar prazer. Michel Foucault
De repente, começamos a espiar, a observar à distância, a nos colocar no lugar do artista, na posição de voyeurs. E é estranha a sensação de ambiguidade despertada: um pouco de desconforto e muito de curiosidade. Quase como se estivéssemos invadindo um mundo íntimo, particular, uma situação da qual não nos caberia participar, e, ao mesmo tempo, experimentássemos uma espécie de familiaridade, de proximidade com aqueles que são observados, com o lugar que acolhe essa relação aparentemente distanciada. Como não sentir empatia? Por que não nos deixar seduzir? Partilhar é também abandonar-se. E se é de afeto que trata Leo Ayres, do processo recíproco de afetar e afetar-se, Discoteca de Mão só pode ser uma súmula poética. Podemos aí vislumbrar um pouco de cada um dos seus trabalhos, um apanhado das questões que instigam e interessam o artista, mas também a insinuação de novas possibilidades a serem exploradas. Tanto quanto o gesto lúdico da lanterna que ilumina o globo espelhado, sensibilizamo-nos pelo desejo-inquietação do estar junto através da constituição co-partilhada de um tecido afetivo, pelo anseio subjacente da amizade como modo de vida. Esse desejo-inquietação é a matéria pulsante trabalhada pelo artista, desdobramento de anseios íntimos transplantados para a dimensão pública da exposição. Assim, a galeria passa a ser um
ambiente múltiplo, um misto de espaço expositivo e coleção de fragmentos de uma disco club imaginária. Na parede o instante congelado, o rastro de uma passagem, como se estivéssemos diante de uma fotografia desumanizada, porém desejante da presença daqueles que a animariam. Não são mais as frações de espelho que projetam pontos de luz sobre nós, mas nós que nos projetamos – que projetamos nossos desejos – sobre essas superfícies marcadas na escuridão do dancefloor. Ao sugerir, dissimular e estender poeticamente a abrangência de sua proposta para dentro e fora da galeria, Leo reafirma o convite à participação. Não basta alimentar o sentimento de empatia, mas também a vontade de co-atuar, de passar de observante a observado, colocar-se de fato no lugar do outro. Desse modo, somos instigados a completar aquilo que não nos é dado, a inventar uma relação ainda sem forma. Na grande performance por ele sugerida, precisamos somar para tecer a trama imaginária que nos une, para construir a amizade possível, mesmo que hipotética, entre espectador e artista, entre um eu e um outro. Ivair Reinaldim Agosto 2011
performers: Pedro Gallego e Marcelo Amorim D i s c o t e c a d e m ã o , 2011 vídeo 3’45” assista a um trecho do vídeo
Deixe as luzes acesas individual realizada em 2012 no Centro Cultural do Banco do Nordeste (Fortaleza, CE) com curadoria de Luiza Interlenghi
S e m t í t u l o , 2012 parquet criado com mil tacos feitos de acrílico espelhado dimensões variáveis
Deixe as luzes acesas Cada mar tem seu farol. A intermitência das marés e a força do vento insistem em fazer e desfazer desenhos nas dunas do litoral. Por um momento, o brilho noturno do Farol do Mucuripe, há muito apagado, volta a iluminar a cidade de Fortaleza, poeticamente refletida na galeria do Centro Cultural do BNB. A orla da Beira Mar é redesenhada por Leo Ayres, com um chão de espelhos iluminado pelo brilho tênue de uma pequena réplica deste farol. Nesta mesma paisagem em que a galeria é transformada, certas luzes que pontuam a noite do Rio de Janeiro, onde vive o artista, reaparecem em mapas, desenhos e vídeos, como um duplo, um improvável espelhamento. Mapas – do Rio e de Fortaleza – traçam rotas possíveis em cada uma das cidades. Por vezes, evocam deslocamentos solitários e, por sua pragmática, levam à desorientação do viajante que não encontra ali vestígios de espaços vividos. Mas, nas dobras de seus labirintos, todo mapa também leva a aproximações. A excitação desses possíveis encontros produz fagulhas no escuro, que o artista registra em desenhos com perfurações feitas com agulha. A cada ponto alguma luz atravessa o papel negro. O brilho das ruas, então, extravasa o risco minucioso e vazio daqueles traçados. Na série Ritmo da noite, o glamour das discotecas e o erotismo compartilhado entre luz e sombra são revividos. Sobre um fundo preto no formato de antigas capas de vinil, o artista captura com desenhos e colagens reflexos de um globo de espelhos, como se registrasse o ritmo destas fugazes aparições. A pintura, aplicada como máscara num exemplar da capa da trilha de Saturday Night Fever, filme antológico de 1977 com John Travolta, apaga os elementos da imagem. As luzes coloridas do piso, porém, restam acesas. Os vestígios do corpo desaparecem quando a mão que quer tocar estrelas, na capa do álbum Time (1970), também recoberta com tinta negra, se torna uma sombra ambivalente, notada por sua presença opaca. A década que Leo Ayres não viveu é resgatada como emblema de uma ambígua experiência contemporânea: a intensidade aumentada das paixões vividas à sombra e sua atração pelo brilho revelador do espetáculo.
No jogo poético de Deixe as luzes acesas esse glamour, até então construído pelo artista entre a intimidade do quarto (como no vídeo Discoteca de mão, 2011) e o caráter público da obra (Strangers in the Night, 2011), é traduzido como o encontro ficcional entre as luzes de duas cidades. A capital do estado conhecido como “terra da luz”, onde o artista por dez dias fotografou, é observada em paisagens íntimas, como a dos seus pés sobre o tapete de banheiro do quarto de hotel em que se hospedou – cujo nome é vertido em amar-se. Mas, também a céu aberto, com enquadramentos que incluem a cúpula espelhada do planetário do Dragão do Mar, apresentada em um monitor na galeria. Sua imagem invertida, posicionada próximo ao piso espinha de peixe de espelhos, pode ser confundida com um globo espelhado suspenso em uma das pistas de dança da cidade, quando exposto à luz do dia. Um mapa sensível do Rio de Janeiro orienta a aproximação do artista com Fortaleza. Se as evidências geográficas mostram que ambas as cidades abrem-se para um vasto horizonte onde, quando perdidos, buscamos o rumor de um farol, o artista indaga até que ponto a trilha que anima o jogo de luz das casas noturnas cariocas coincide com a pulsação da noite dessa outra cidade. Os vídeos Discoteca de Mão e Strangers in The Night, de ações com objetos de espelho criados pelo artista, registram a aproximação de desconhecidos, na intermitência da penumbra e na ausência da palavra. Ambos sugerem o quanto essa delicada atividade noturna cria seus próprios traçados urbanos. Deixe as luzes acesas reúne registros imaginários de uma espera e cria inesperadas estratégias de sedução, como um encontro às cegas. Luiza Interlenghi Maio 2012
F a r o l d e M u c u r i p e , 2012 maquete com luz piscando, areia 30 x 30 x 40 cm (farol)
S e m t Ă t u l o , 2012 mapa da cidade de Fortaleza feito com pepel preto perfurado, acrĂlico, luzes coloridas 80 x 50 x 30 cm
S e m t Ă t u l o , 2012 detalhe
P a r a t a p a r o s o l , 2011 cart達o postal perfurado 10 x 15 cm
C a m p o m i n a d o , 2014 instalação realizada durante o evento #obaoba no Ateliê 397 (São Paulo) Os tacos da sala, que estavam soltos, foram retirados e embaixo deles foram colocadas pequenas lanternas de led. Ao final, as lanternas foram levadas pelos participantes.
C a m p o m i n a d o , 2014 detalhe
F a z v i s t a s , 2014 l창mpada fluorescente amarela dentro de sacola com padronagem de tigre com os olhos perfurados 50 x 40 x 30 cm
Ta n a n a n O p e r a C h a n c h a d a ( v i t r i n e r e m i x ) , 2013 série de 10 entrevistas realizadas dentro de instalação executada no Armazém Artur Fidalgo assista ao vídeo de uma entrevista
Sem título Instalação realizada no sótão da galeria durante a Bienal Anual de Búzios em 2013. Os visitantes podiam subir a escada e conhecer o espaço modificado com luzes coloridas e objetos encontrados no próprio local. A sala possui dimensões aproximadas de 2 x 3 m.
S e m t í t u l o , 2013 vista da instalação
S e m t í t u l o , 2013 vista da instalação
S e m t í t u l o , 2013 vista da instalação
S e m t í t u l o , 2013 vista da instalação
S e m t í t u l o ( b u b b l e b u t t ) , 2014 vídeo, corda de varal, pregadores, cueca vermelha, short azul, meias brancas dimensões variáveis
A exposição foi realizada no 8.Salon em Hamburg, Alemanha. Cada artista recebeu uma bandeira de um país participante da Copa do Mundo. Recebi a Rússia e brinquei com o fato de ser um país homofóbico. O vídeo mostra um rapaz rebolando com as roupas do varal assista ao vídeo.
A i n d a q u e a t a r d i n h a , 2014 espelhos, projetor e materiais encontrados instalação realizada em 2014 no Palácio das Artes (Belo Horizonte, MG) dentro da exposição Improvável, com curadoria de Paula Borghi 500 x 500 cm assista ao vídeo
Ainda que a tardinha (detalhe)
O B A B A R , 2014 guarda sol, l芒mpadas coloridas girat贸rias, carrinho de compras, isopor, fitas adesivas, cerveja, gelo 200 x 120 x 120 cm
#OBAOBA
O projeto #obaoba consiste em chamar artistas contemporâneos para ocupar boates com seus trabalhos. Atuei como mediador/ curador/organizador/divulgador. Não havia texto de parede ou qualquer identificação dos trabalhos, tornando tudo como uma grande instalação. Foram realizadas três edições em 2014, sendo duas no Rio de Janeiro (La Paz e Fosfobox) e uma em São Paulo (Ateliê 397). A ideia era criar novos espaços para a circulação dos trabalhos e pensar no que a cena artística tem se tornado. Com o advento das redes sociais, as exposições parecem ser pensadas não no espaço em si, mas em um evento fotografável e com artistas que “bombem” no instagram, facebook e twitter. Por isso pensar na ideia da festa e sua efemerabilidade.
foto: Marcos Chaves / performers: Leo Ayres e Dudu Quintanilha Mor te S úb ita 2013 performance com diversas duplas dançando com copos e velas até que os copos caíssem e as velas se apagassem
foto: Isabel Bahiana Wotzasek
Leo Ayres (Rio de Janeiro, 1975) Estudou de 2005 a 2009 na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Foi selecionado em 2010 no Novíssimos do Ibeu (Rio de Janeiro, RJ) e no Programa de Exposições do MARP (Ribeirão Preto, SP). Expôs individualmente no Centro Cultural Ibeu ( Tananan Opera Chanchada , 2013), Centro Cultural do Banco do Nordeste ( Deixe as luzes acesas , 2012), Galeria Oscar Cruz ( Como eu , 2011), Cosmocopa ( Discoteca de mão , 2011) e Furnas Cultural ( Operação: Camuflagem , 2008).