Historia da guerra de Juazeiro em 1914

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Autor: João de Cristo Rei Cordel (re)publicado pela Coleção Centenário - Cordéis Clássicos Xilogravura da capa da reedição (Editora IMEPH, 2012): José Lourenço



Vou descrever a batalha Da guerra de Juazeiro, Para se vê entre a luta De metralha e Fuzileiro O poder de meu Padrinho A vitória do romeiro. Antes de travarem a luta Meu Padrinho disse assim: — O governo do Estado Se revoltou contra mim, Para tomar Juazeiro Prender tudo e me dar fim Mas ele está enganado Aqui não entra ninguém Juazeiro é todo meu E da mãe de Deus também Parte aqui na minha terra O cão, não teve e nem tem. Não tenho medo de homem Por mais que seja graúdo, Acima de mim só Deus Homem rico e casacudo Querendo me dominar Se derrota e perde tudo. E disse ao Doutor Floro Vamos cavar os valados Que Franco Rabelo vem Com seus batalhões armados E nós não temos trincheiras Para enfrentar os malvados.


Então Doutor Floro urgente Juntou o povo romeiro E começou trabalhando No cerco de Juazeiro Tanto no terreno baixo Como no despenhadeiro. Homem, mulher e menino Com seu ferrinho na mão Para cavar os valados Chegavam de prontidão Antes que a tropa inimiga Encostasse o batalhão. Enquanto o povo no campo Lutava sem ter apelo Organizando as trincheiras Esperando o desmantelo No Crato já se encontrava O batalhão do Rabelo. Quando o Doutor Floro souber Que a tropa tinha chegado, Disse a meu Padrinho Cícero Nosso reforço é tomado A tropa já está no Crato E nós não temos valados. Lhe responde meu Padrinho Não temos a quem temer, Nossa senhora os prendeu, E só vão aparecer Quando eu fizer os valados


Eles veem para morrer. Enquanto a tropa no Crato Se encontrava em reboliço Os romeiros nas trincheiras, Cavavam barro maciço Com sete dias entregaram, A meu Padrinho o serviço. Então meu Padrinho disse: — Entrem nas trincheiras agora Que os nossos inimigos Vão chegar sem ter demora Porém só atirem neles Quando eu mandar sair fora. Previnam seus armamentos E vão tomar posição Aguardando as minhas ordens Esperando o batalhão Quando for tempo eu aviso Do combate a invasão. Com esta ordem os romeiros Para os valados Marcharam Esperando os batalhões Que sem demora chegaram Ruflando tambor de guerra Pras trincheiras avançaram. Quando bradaram as cornetas E marcharam em direção Do povo de meu Padrinho Ele disse a guarnição:


— Saiam foram das trincheiras Atirem no batalhão. Nisso os romeiros saíram Para fora das trincheiras, E rolando pelo chão Deram a descarga primeira, Derrubaram o batalhão E conquistaram a bandeira. Meu padrinho vendo isto Disse aos seus nessa hora: — Recebam uma benção minha, Outra de Nossa Senhora E vão tomar o quartel Da tropa inimiga agora. Nesse mesmo instante o povo Sem temer ao desacato Cada um tomou seu rumo Pela estrada e no mato Uns pra tomar Juazeiro Outros pra tomar o Crato. O Crato já se encontrava Sem os habitantes dele Embora que não tivesse Nada com esse e aquele Se afastaram do perigo Antes de caírem nele. Então o povo romeiro Que seguiu na retaguarda


Para atacar o quartel E conquistar sua armada Tomaram conta de Crato As quatro da madrugada. Entraram pelas muradas Furando as casas por dentro E assim todos em paz Sem morte sem ferimento Se apossaram do quartel E tomaram o armamento. Enquanto a tropa lutava Para tomar Juazeiro O batalhão que se achava No campo sem paradeiro Ou fugia ou se entregava Para o pastor do romeiro. Os homens que a meu Padrinho Se entregavam arrependidos Ele dizia: — Não roubem Nem maltratem os oprimidos Que eu garanto vocês Nem morrer, nem ser ferido. Deram um combate tão grande Nas fronteiras dos Macacos, Que durou vinte e três horas Lá por dentro dos buracos Dessa vez os homens fortes Ficaram medrosos, fracos. Armaram contra os romeiros


Um canhão grande demais Porém quando detonaram O estampido voraz, A peça rodou o pé Deu o tiro para trás. Noventa e cinco por cento Dessa vez se liquidaram Os que ficaram com vida Ao Rabelo então mandaram Pedir novos batalhões Que sem demora chegaram. Quando suspenderam a luta Meu Padrinho saiu fora E disse: — Daquele fogo Vocês escaparam agora, Foi coberto com o manto Da Virgem Nossa Senhora. E continuou dizendo: — A luta vai para a frente As tropas vem com vontade De tomar nosso ambiente, E é desta vez que vai Morrer aqui muita gente. Mas quem fizer meu mandado Ver dinheiro e não roubar Ver cachaça e não beber, Ver mulher e respeitar, Dentro da luta sangrenta Tem Deus para lhe ajudar.


Quando ele disse assim Chegou pela retaguarda, Um protetor lhe dizendo: — Baixa Dantas foi tomada, Pelas tropas do Governo As duas da madrugada. Nisso meu Padrinho disse: — Juntem-se meu povo agora, Vão retomar Baixa Dantas E depois vão sem demora, A capital Fortaleza Botar o governo fora. Então os romeiros foram Seguindo o ponto de vista, Lutar no campo da morte Contra a fração rabelista. Em dois combates perderam Nos três ganharam a conquista. Meu Padrinho nesse dia Viu um portador chegar E lhe disse: — Meu Padrinho Eu vim aqui lhe avisar Que Jota da Penha vem Sua cabeça tirar. Lhe respondeu meu padrinho: — Volte para lhe dizer Que junte lá sua tropa E venha para morrer Ele não sabe eu quem sou


Mas agora vai saber. Dizendo assim mandou logo Os romeiros lhe encontrar E eles foram em seguida Com o valentão brigar Nesse encontro dia e meio Se viu o fogo estalar. Quando o valentão se viu No cerco da desventura Gritou: — Romeiros se rendam Que minha parada é dura, Eu sou o Jota da Penha Homem que bala não fura. Os romeiros lhe disseram: — Vamos ver se fura ou não! Deram nele uma descarga Deixaram morto no chão, E foram pra Fortaleza Para findarem a questão. Chegaram à capital Deixaram o reforço atrás, E foram com os graúdos Das camadas sociais, Botaram o governo fora Terminaram a guerra em paz. Então meu Padrinho disse: — A guerra acabou-se agora, Mas dessa grande batalha Quem nos tirou para fora,


N達o foi o poder humano Foi Deus e Nossa Senhora. ----FIM----


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